IMS Rio: os filmes de maio/2018

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INSTITUTO MOREIRA SALLES

RETROSPECTIVA

CINEMA

MAIO 2018

SERGIO OKSMAN


A TEORIA DO IMPOSTOR UMA CONVERSA COM SERGIO OKSMAN por Daniele Dottorini

O futebol, dirigido por Sergio Oksman, é o mais recente lançamento da Coleção DVD | IMS. De 3 a 13 de maio, a Sala José Carlos Avellar apresenta uma retrospectiva dos filmes do diretor, além de uma sessão de curtas-metragens selecionados por Oksman. Na terça-feira, 8 de maio, a exibição de O futebol, às 19h30, será seguida por uma conversa com Sergio Oksman e Barbara Rangel.

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Gostaria de começar esta conversa sobre as maneiras de escrever um documentário partindo de um filme que, em minha opinião, é um ponto de virada na sua carreira: A esteticista. O filme descreve sua própria transformação. A primeira sequência depois do prólogo é editada como um documentário comum: imagens da personagem, e ela falando dela própria. De repente, o movimento é interrompido, a tela fica preta, e escutamos um telefonema entre você e a protagonista, no qual você menciona que gostaria de alterar o projeto inicial, fazer outro filme. A partir de então, o filme muda dramaticamente, expondo o seu processo, os mecanismos internos do filme. Não foi um movimento coerente, algo planejado. Até então, eu estava tranquilo com o caminho que escolhi seguir, com a abordagem de reportagem que usava para construir meus filmes, tanto faz qual fosse o assunto. Minha abordagem ao cinema documental era a de fazer longas reportagens e, até então, eu estava satisfeito com isso. Tinha proposto uma reportagem-documentário para a televisão sobre essa mulher, que conhecia desde que eu era criança. O produtor concordou com minha proposta, insistindo que o filme deveria seguir um padrão jornalístico, conferindo se a história dela era verdadeira ou não. Isso foi há quase 20 anos. Na época, eu era um rapaz bastante ingênuo ainda. Por isso não me envergonho do filme. Ignorei ele por um bom tempo, mas sei que foi fundamental para a minha carreira. Por ter ouvido as histórias dela inúmeras vezes, sempre com as mesmas palavras, os mesmos exemplos, da maneira como sempre repetimos as nossas histórias, senti que estava muito mais interessado em desconstruir esse discurso do que em fazer algo que seguisse o “padrão jornalístico”. Essas histórias incríveis sobre a experiência dela em Auschwitz, se fossem inventadas, seriam maravilhosas. Tentei convencer o produtor de TV a deixar de lado essa ideia de investigação e dar espaço somente para as palavras da mulher, a história dela, deixando a cargo do espectador a decisão de acreditar ou não. Ele não concordou com isso, então fiz o meu trabalho, preparei um filme de TV convencional, de 50 minutos, e entreguei. Depois disso, assisti ao que gravei por dois anos, tentando ter uma ideia do que fazer com aquilo. O que surgiu é uma espécie de analogia entre a figura do diretor de cinema, que manipula o gravado, e a personagem, que manipula a sua história. Porém, isso que conto agora é uma reelaboração a posteriori. Para falar a verdade, queria muito ter agora essa mesma abordagem inovadora sem estar consciente disso, como antes. Pouco tempo atrás, tomei um café com uma amiga que trabalha na mesma universidade que eu, diretora e professora muito boa. Temos alguns alunos em comum, inclusive um cujo trabalho este ano foi um fracasso espetacular. Nesse dia, estávamos comentando o assunto, e ela disse: “É claro, o problema é que ele


assistiu às obras completas de James Benning. Do contrário, não teria sido tão ruim.” Portanto, ele fracassou por conhecer muito bem o trabalho de Benning. Talvez tivesse fracassado de qualquer maneira, mas é diferente. Na época que gravei A esteticista, não tinha visto todos os filmes de Benning, e quando me deparei com o problema de não saber como dar continuidade ao filme, quando não sabia o que fazer, comecei a experimentar livremente com a edição. Eu era mais livre, permitia-me seguir a minha intuição. Queria me afastar o mais radicalmente possível de uma estrutura confortável, então comecei a brincar. Parecia interessante, mas ainda não sabia como transformar aquele material em um filme. Por um bom tempo, pensava nele como um experimento fracassado, mas mudei de ideia. Agora sei que foi um passo importante na minha carreira. É verdade, como você diz, que, no terceiro minuto, o filme mostra um ponto de virada. É como se fosse uma mudança nos meus interesses. Por outro lado, condenou-me à pobreza, e troquei um emprego confortável na televisão pela indigência típica de um documentarista espanhol. No entanto, você aprende algo de fundamental: não há fórmulas, em cada filme você experimenta uma forma por conta própria. Foi um processo de escrita a posteriori, que se desenvolveu durante a fase de edição. Com certeza. Além disso, pensei no quanto o início do filme me incomodava; eu me sentia prisioneiro das imagens que filmei. Só depois de um bom tempo comecei a ver aquelas imagens como algo estranho, como se tivessem sido encontradas, e essa foi a única maneira possível que achei para trabalhar nelas. E também, por estar no filme como personagem, precisei passar a me ver como um personagem, e não como eu mesmo. Eu me exponho bastante no filme. Dividir-me em dois, vendo-me como um personagem, foi algo tão importante que nem percebi o quanto me expunha. Num festival de cinema, lembro-me de que, depois de uma exibição, uma mulher da plateia, acho que dinamarquesa, disse: “Você parece ser uma pessoa decente, mas na verdade é um filho da puta.” Isso realmente me atingiu, pois não me enxergo nesse comentário; no filme, sou um personagem inventado, manipulado. As frases e palavras que se escutam foram gravadas num estágio posterior. Naquele momento, estava fazendo um experimento, o de me transformar num personagem. Se a heroína do filme falava dos experimentos de Mengele, por que eu não poderia me transformar numa espécie de Mengele? Portanto, dublei a voz do diretor (isto é, a minha), escolhendo palavras mais ríspidas, usando um tom mais autoritário, com o objetivo de enfatizar essas semelhanças. Trata-se, então, de uma mentira. Assim como em O futebol, em que não sou o filho do personagem, embora tenhamos o mesmo sobrenome, e o personagem do pai não

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é meu pai. Pensando intuitivamente, eu desencadeei, com A esteticista, um processo de criação de personagens, inaugurado pelo diretor de cinema do filme. É uma obra de editor, pois foi na fase de edição que pude experimentar com essa forma radical. Por um longo período – como mencionei anteriormente –, o filme pode ter parecido um experimento metalinguístico, algo que considero muito entediante e datado, mas gostei de revê-lo um tempo atrás. Reconheço sua importância no meu desenvolvimento pessoal. Por anos, senti vergonha do filme, pelo o que ele mostra e revela. Tem uma cena (não lembro se foi incluída na versão final) na qual a mulher fala do suicídio da mãe, e dá para se escutar minha voz perguntando: “Você se incomodaria de repetir essa parte do suicídio da sua mãe?”. Hoje em dia, eu nunca conseguiria fazer algo desse tipo; eu me tornei, ao mesmo tempo, alguém mais sensível e mais desumano. Naquela época, tudo isso era graças à ingenuidade juvenil e uma certa falta de direcionamento. Você é um árduo defensor da ideia de que, na fase da escrita, o personagem é construído; constrói-se como um ser ficcional, de alguma maneira. Isso remete ao trabalho de um romancista que escreve em primeira pessoa. Não estou pensando no filme como uma forma literária (seja lá o que podemos querer dizer com isso), mas refletindo na forma literária como uma metáfora poderosa ou um dispositivo cinematográfico. Por exemplo, Notas sobre o outro é todo sobre a construção de personagens, numa espécie de espiral de identidades ficcionais que remete a outro filme, Uma história para os Modlins. Tudo o que você disse tem muito que ver com a construção do eu. Quando trabalho num filme, passo mais tempo pensando no método de abordagem do que no “tema” do filme. Como fazer o filme? Como realizá-lo neste momento da minha vida? Como ter uma ideia, como abordar o tema? Afinal, meus filmes são passos deste “processo de aprendizagem”, o que parece algo bacana, mas que, na verdade, é muito trabalhoso. Eu queria ter tido os professores que lecionam na faculdade onde dou aula e alguém que me ensinasse o que se ensina aos nossos alunos: teria me poupado uns 20 anos. Eu aprendi fazendo, e continuo aprendendo. Além disso, costumo ser muito inseguro, ainda que agora seja menos, pois estou mais ciente dos limites da minha ignorância. Todo filme é, com certeza, a criação de personagens e uma encenação de mim mesmo. Em certo sentido, estou mais presente em Notas sobre o outro do que em O futebol, paradoxalmente, no sentido de que sinto que esses personagens são mais parecidos comigo.

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Chegando neste ponto, gostaria de fazer uma digressão. Embora esteja descrevendo uma impostura, sou um impostor num sentido muito específico. Por exemplo,


estamos numa entrevista, estou conversando com você. Chegamos ao ponto em que não sei se o que estou falando é resultado da minha reflexão ou uma montagem de uma série de frases e pensamentos de outras pessoas, como Carlos Muguiro, com quem trabalhei por anos, ou Emilio Tomé, o roteirista que trabalhou comigo em Uma história para os Modlins. Sinto-me um grande impostor nesse sentido, porque acredito ter certas qualidades, mas os filmes que faço não me representam por completo. Não sou esses filmes, eles são maiores do que eu, são o resultado do trabalho de mais de uma pessoa, e os créditos iniciais e finais não fazem jus a isso. Meus filmes também são dos outros envolvidos no projeto. Não estou dizendo isso por falsa modéstia, mas porque é verdade. Portanto, é difícil falar, sabendo que o que estou dizendo foi, na verdade, dito por outras pessoas. Em certo sentido, não sei até que ponto sou um bom diretor, se sou talentoso ou se sou simplesmente um bom produtor capaz de discernir, de entender que filme deve ser feito e quando um filme está pronto. Claro, esta é uma das tarefas específicas de um diretor – saber quando um filme pode ser considerado finalizado –, e uma das mais difíceis. Ao final, estou falando com você ciente de que estou construindo um personagem. Afinal, você está falando de uma prática que faz parte de nossa vida diária, uma vez que somos seres sociais, sempre conscientes dos vários papéis que interpretamos como atores sociais. Trabalhar com as diversas construções dos nossos personagens significa ser responsável também por isso. Lembrei-me recentemente de um episódio da minha infância. Quando eu era criança, fazia aulas de natação, e as primeiras não foram na piscina, mas fora d’água. Colocavam-nos em fila diante de uma parede e nos ensinavam a dar as braçadas. Lembrando-me desse episódio ontem à noite, pensei: “Caramba, esta é a imagem representativa do que eu faço: 40 anos tentando entender o amor, ser um diretor de cinema e um escritor, dando braçadas fora d’água!” Terrível, não?

Trecho de entrevista originalmente publicada no catálogo do 57º Festival dei Popoli (2016), em Florença, Itália. [Íntegra do texto, em inglês e italiano: bit.ly/57popoli] Tradução: Antônio Xerxenesky. Imagens: Da esq. para a dir., A esteticista, O futebol, Uma história para os Modlins.

Talvez seja um pouco exagerado... Talvez, mas você precisa pular na água, Daniele!

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A ESPESSURA DO FIO Luis Fernando Moura

Segundo documentário de longa-metragem de Eduardo Coutinho, O fio da memória foi encomendado por ocasião do centenário da abolição da escravidão, em 1988. Passados 30 anos, o filme será exibido no Cinema do IMS Rio remasterizado em DCP, nos dias 11 e 13 de maio.

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Retornar a O fio da memória (1991) não é só pôr a obra de Eduardo Coutinho em perspectiva a partir de um ponto de inflexão – é seu segundo longa documentário, filmado três anos após a finalização de Cabra marcado para morrer (1985), logo, continuidade imediata para uma obra de divisão e, como tal, laboratório explícito. É, ao mesmo tempo, reconstituir – ou, se não tanto, sussurrar – uma genealogia para o cinema brasileiro contemporâneo situado em certo espectro de urgências de racialização. Como se o filme, feito por encomenda para pontuar o centenário da Lei Áurea, redispusesse a fecundação de imagens em torno da experiência de populações negras no país. Talvez notemos, na sua elucubração inventariante – uma investigação pautada em notar vestígios e ofertas históricas da escravidão –, um panorama de figuras recentemente encarnadas com a frontalidade da convicção e a monumentalidade do trauma em obras de diversos artistas, negras e negros, e com as quais o filme traça agora um intercâmbio de visões e distrações. A performance A árvore do esquecimento (2013), de Paulo Nazareth, o curta Travessia (2016), de Safira Moreira, o faz-tudo de Jota Mombaça, para incorrer em apenas algumas vizinhanças. A postura derivada do jornalismo, marca de um dos pontos de enunciação do filme – e que, a depender do que se quer, talvez se ressinta de rasuras expositivas-ilustrativas (sociológicas, como em Bernardet) –, pôde já oferecer, no mínimo, uma cartilha ampla de verbetes; inscrições para formas de trabalho, ancestralidade, espiritualidade, arte popular, mas também da vulnerabilidade e da violência íntimas à experiência negra. Quando mais modesto, O fio da memória tem a justeza de uma introdução, com os limites e as oportunidades decorrentes. Quando mais precioso, a contiguidade entre documento e entrevista acarreta na espessura das aparições. Como disse Coutinho a Inácio Araújo, à época do lançamento, ele buscava aqui “as coisas que estão lá no fundo”. E, assim como acontecia em sua obra-prima, a investigação histórica parece, como condição processual, cercar um território onde, eventualmente, poderá cavar arroubos no fluxo de chances entre tomada e escrita. Já nos primeiros minutos do filme, a apresentação de cartões-postais que, no século XIX, exibiam fotografias de pessoas escravizadas, seguida por retratos filmados, e também anônimos, de negros e negras no presente da filmagem, não será assim mera exposição indexical, mas anunciação fundante de um arco para a lacuna, se não do sequestro da possibilidade de rememorar, reconhecer e tolerar diante de um corpo perdido, um a um, para sua rostidade confiscada. Mais à frente, a Michelle Mattiuzzi da performance-filme Experimentando o vermelho em dilúvio (2016), que veio há pouco cruzar nossas ruas com uma máscara de ferro, habita inevitavelmente a imagem da Escrava Anastácia, entidade mítica de aparência similar que incorporou cicatriz da insurgência.


A volta à fotografia de trabalhadores que, em ação da PM carioca, foram aprisionados por correntes entre seus pescoços, e que escandalizava a imprensa em 1982: o intolerável a reportar o irrepresentável. Assim como a visita à favela de Chapéu Mangueira para conversa com Benedita da Silva, então expoente de representatividade e deputada federal – como não lembrar, hoje, Marielle Franco –, a sequência em que o filme reúne três daquelas vítimas da força policial vem, décadas depois, confirmar a contundência desses documentos a uma história de “h” maiúsculo, ainda que, como em Cabra marcado..., atravesse o possível, o plausível e o desejável. Como veremos em ambas as entrevistas, esta é essencialmente uma pesquisa de Eduardo Coutinho, e o que está “lá no fundo” pede as condições da escuta; o acesso às notas ao mesmo tempo testemunhais e romanescas do relato individual. “Quem quer falar? Pode falar o que quiser”, diz o entrevistador em um centro de acolhimento a jovens abandonados. Neste sentido, a vontade genuína de ouvir lastreia, como o que há de mais precioso a se descobrir, a outorga de um fio de memória alternativo, persistente. Do fim ao princípio, ao longo de duas horas, se ora a voz de Ferreira Gullar faz as vezes de uma consciência impessoal narradora, em terceira pessoa, ciente de razoável factualidade das coisas do mundo, ora é interpelada ciclicamente pela de Milton Gonçalves, que reencena registros escritos e falados deixados por Gabriel Joaquim dos Santos, filho de escravos nascido em 1902 e morto em 1985, três anos antes das filmagens. Sua voz secreta, precisa ou imprecisa, desnecessária à legibilidade institucional, por sua vez rasura a prioridade da ciência com a aurora fúnebre de tempo outro do espírito, descrevendo jardins, objetos que colecionava, seus sonhos; enumerando eventos e prospecções políticas; usando a palavra, em suma, desbastando a matéria da letra. A palavra de um corpo que viveu; fundo mais ou menos lá no fundo, mais fundo, para um filme de conversação histórica, feito da defasagem entre uma fala e outra, impregnado tanto pelo desconcerto da amnésia quanto pelo desejo de assimilação. “Aqui já foi um cativeiro muito perigoso. E aí ficou o Brasil por conta de nós próprio.”

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Como responder a esta generosa Carta Branca? Que filmes escolher?

A ESCOLHA IMPOSSÍVEL Ismail Xavier

Minha decisão foi compor uma seleção de filmes marcantes na minha formação de cinéfilo e/ou na minha vida de professor. São obras a que retornei com prazer ao longo dos anos, companheiras de viagem pelas quais tenho especial apreço. Não se trata de uma escolha ditada apenas pela qualidade estética e pelo interesse temático, e está descartada a ideia de uma lista dos “melhores filmes”. Vale aqui o painel montado a partir do que saltou à memória e depois se ajustou em desempates a fórceps para chegar ao formato da mostra. Entre contemplar uma gama bastante ampla, seja de contextos nacionais, modos de produção, movimentos estéticos, cineastas e períodos históricos, ou compor um conjunto mais restrito, assumi esta segunda opção, adotando duas premissas: incluir apenas filmes realizados no hemisfério norte, de um lado e de outro do Atlântico, e não escolher dois filmes do mesmo cineasta.

Entre os dias 26 e 31 de maio, o Cinema do IMS Rio apresenta um programa de nove filmes escolhidos por Ismail Xavier: seus clássicos pessoais, que o acompanharam ao longo de seus 70 anos. Ismail é professor emérito da USP, teórico e crítico de cinema.

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Neste sentido, o caso mais complicado foi o de Godard, pois de imediato prevaleceu o senso da enormidade de seu impacto, produzindo uma oscilação entre pelo menos dois filmes. Viver a vida (Vivre sa vie, 1962) é, em verdade, o primeiro na escala da emoção, presente quando revejo este filme decisivo na minha iniciação ao “cinema de arte”, como se dizia. Meus primeiros passos de cinéfilo se deram em grupo, quando o incentivo e o papo entre amigos foram ajudando a apurar a percepção e o gosto estético, junto com o hábito de leitura da crítica. Em 1965, fui sozinho a uma sessão no cine Bijou para assistir ao filme. Foi uma revelação, o prazer da descoberta e a empatia total que dividem minha iniciação em um antes e um depois. No entanto, o que está na Mostra é Duas ou três coisas que eu sei dela, o filme-ensaio em que o impacto se renovou e minhas referências se ampliaram, sendo a obra de Godard que mais revi em minhas aulas, sempre aprendendo algo mais e ensinando algo mais. O elenco incluído na mostra deixa claro o quanto aquele primeiro jogo da memória evidencia a forte presença de uma cinefilia marcada pelo gosto cultivado no contato com a nouvelle vague, o cinema moderno italiano e os Cinemas Novos da América


Latina, não excluída a atração pelo cinema que marcou o (meu) tempo da inocência – o western e, grosso modo, o “filme policial” ou thriller. Daí a inserção de duas obras-primas nitidamente “reflexivas”, O homem que matou o facínora e Um corpo que cai, numa escolha que expressa uma preferência minha pelos filmes que trazem em seu programa poético uma nítida reflexão sobre o próprio cinema. Além dos filmes de John Ford e Hitchcock, que explicitam de forma notável os pressupostos estéticos e a relação com o espectador própria a um gênero clássico, selecionei notáveis exemplos de um metacinema movido pelo impulso de ruptura e inovação, articulado a uma posição política, como no filme-ensaio multifacetado de Godard e em Dziga Vertov, uma vez que Um homem com uma câmera, nesta rota dos “reflexivos”, salta aos olhos como o arquimodelo do filme sobre o próprio cinema e sua circunstância. (Sim, este é o único documentário. E por que não também o cinema-verdade de Jean Rouch ou o documentário poesia de Patricio Guzmán ou...?) Antonioni, em O eclipse, constrói uma poética da imagem-tempo na qual o sentimento inexorável da duração se entrelaça com lampejos de “consagração do instante”, que logo se dissolve, evocando a célebre frase de Méliès em 1895 – “No cinema, as folhas se movem” –, matriz da percepção de que o cinema captura o detalhe evanescente, porém essencial, que pode estar fora do jogo dramático, mas está em cena. Tomás Gutiérrez Alea, em Memórias do subdesenvolvimento, comenta a conjuntura política cubana dos anos 1960 a partir de um olhar oblíquo e uma vivência peculiar do tempo, atravessada pelo diálogo com Antonioni na atenção ao revelador descompasso entre o protagonista e seu entorno. E há os mestres da ironia, Buñuel e Fassbinder. O primeiro, em O anjo exterminador, retoma o seu momento das rupturas de 1928-1931, mas em outra chave, nesta que é a mais surrealista de suas obras realizadas no México, orquestração de estranhamentos não mais pautada pela montagem agressiva que figura o desejo, mas pelo gradual movimento rumo à barbárie, dada a decomposição das máscaras e etiquetas de uma elite sem saída. O segundo retoma, em O casamento de Maria Braun, o “milagre alemão”, que se seguiu ao trauma da guerra, compondo uma cáustica paródia das chamadas alegorias de fundação nacional pelo percurso de uma notável Maria Braun, que não é a Maria de Metrópolis, de Fritz Lang (1927), nem a Braun companheira de Hitler. Assombrado pelos traumas da guerra, se tece o encontro amoroso de Hiroshima mon amour, de Alain Resnais (roteiro de Marguerite Duras), filme cujo tom recitativo e cuja poética das repetições instaurou uma reinvenção da palavra no cinema, tonificando a insistência da memória, o diálogo dos amantes e a evocação documental do massacre instantâneo em sua experiência limite.

Imagens: Da esq. para a dir., O casamento de Maria Braun (1978), de Rainer Werner Fassbinder; O anjo exterminador (1962), de Luis Buñuel; Duas ou três coisas que eu sei dela (1967), de Jean-Luc Godard.

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SESSÃO CINÉTICA: RETRATOS DE IDENTIFICAÇÃO O LUGAR DO "LÁ" Luiz Soares Júnior Acervo do Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, Fundo Polícias Políticas.

Retratos de identificação, de Anita Leandro

Na quinta-feira, dia 10, às 19h30, o cinema do IMS Rio exibe Retratos de identificação, de Anita Leandro. Após a sessão, haverá um debate com os críticos da revista Cinética, disponível em: revistacinetica.com.br

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Em crítica, fala-se comumente em efeitos de fora de campo, retórica destinada a ativar na cabeça do espectador a ideia, sugerida embora, de que ao campo preexiste sua alteridade incomensurável, de natureza tópica (a equipe, a câmera de filmar) ou transcendental-significativa (a Memória, o Imaginário): a pontualidade ou vastidão do fora de campo desvelado vai decidir em geral da grandeza do filme; pensemos, por exemplo, em thrillers, neste travelling dianteiro que progressivamente vai se aproximando do corpo a quem segue, na noite alta; não é preciso ser um espectador contumaz para saber que a pessoa perseguida pela câmera pode ser assassinada, pois é por intermédio desse efeito de fora de campo que se assinala seu desaparecimento iminente do campo, sua captura pelo invisível, e em filmes mais convencionais será esse “efeito de” o leitmotif majoritário das ações que ocupam o campo, empenhadas em um desvelamento da identidade do criminoso: no cinema dito clássico, o fora de campo, relegado injustamente pelos resenhistas de domingo às margens de uma diegese grandiloquente, ciosa de seus efeitos ilusionistas de sutura, é que em verdade


será o mestre de cerimônias dramático, figurativo do filme: o seu Sésamo oculto e decisivo. Mas isto se pensarmos classicamente, e vermos o fora de campo “lançado pelo campo” como a dobra ou o suporte de uma vida ativa do espectador, que agarrará de forma diligente a isca lançada e se empenhará em verticalizar o filme (diegético, tópico) de domingo em um Filme da História do cinema; porém, e quando o fora de campo abandona as margens, aprofunda a fresta em uma rentrée obscena, e se torna a matéria imaterial (Lacan diria sempre melhor; um objeto a) de um filme, aquilo que justamente não pode ser mostrado, sob pena de quebrar o contrato imaginário, feito de reserva figurativa e contenção dramática, entre aquele que tudo pode revelar (o artista, e pensemos que o cinema, pela sua natureza fotográfica-mimética, é aquela arte que potencialmente pode flertar com a pornografia) e o espectador, aquele que “deve” tudo acolher, sem no entanto ter o direito, dadas as condições fenomenológicas terríficas a que está submetido (sentado numa cadeira, hipnotizado por um halo intensivo de luz, seviciado pela escuridão e impossibilitado de se mover pela multidão aglomerada), de corresponder adequadamente à violação a que está sendo exposto; perceberam o que se joga aqui, como fora de campo inescapável das fotos recortadas sobre o abismo, mas também na cadeira pática do espectador de cinema? Sim, trata-se de tortura, aqui como lá. Nicole Brenez, em um texto curto, mas impactante, sobre a polêmica que opôs o evocativo Shoah, de Lanzmann, à recuperação alegorista do luto Histórias do cinema, de Godard, escreveu que os grandes filmes jamais feitos não nos foram mostrados, talvez porque, mesmo se feitos, jamais poderiam nos ser mostrados: o que aconteceu no campo de trabalhos forçados de Treblinka, no gulag soviético? O que aconteceu “lá”? – e pensemos com Brenez que a tortura é o lugar deste impossível lá, deste no man’s land onde se origina todo “aqui”; a tortura é aquele lugar limítrofe de insignificância onde se funda toda Significação, e, no caso do cinema, arte realista, a tortura é mais decisiva que a Morte, porque a primeira poderia ser filmada; quantas vezes ela nos foi ofertada num repasto lúgubre que se confundiu em geral com um cine terminal? Matou a família e foi ao cinema, Saló, Gloria mundi, de Papatakis, os corpos segmentados/seccionados de Paolo Gioli… Não foram muitos os experimentos que ousaram assinalar este lá, e voltar ilesos. Os filmes clássicos jamais no-la revelaram em Cena, e foi preciso esperar o classicismo tardio (já um tanto mortuário, incapaz de crer totalmente nas potências do campo) de A morte num beijo (Kiss Me Deadly, 1955) para que tivéssemos acesso a este in extremis da percepção, ainda assim diferido pelos planos de pés balouçantes e ângulos agudos dos instrumentos da operação brutal: só podíamos contemplar o horror protelado pelos seus significantes agonísticos.

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E não é de certa maneira esta a operação “de base” que orienta Anita Leandro em seu Retratos de identificação? A tortura só nos pode chegar diferida pelo infinito trabalho da foto, por esta sincrética mediação que imprime à “impressão de verdade” do registro ditatorial uma cicatriz fantasmática, sequestrando as imagens da fotorreportagem médico-legal para um domínio a serviço de um outro logos, que leve as fotos tiradas por eles a coincidir com o relato elegíaco enunciado por nós (os discursos em off de Espinosa, Guarany…); Dora, Chael, ao longo do découpage assombrado pelo fondu (lembremo-nos precisamente deste crescendo funesto do close de Chael, que abandona as entranhas da profundidade de campo para apoderar-se completamente do filme, bordas e centro confundidos em um mesmo vórtex alucinante…), abandonam o médico-legal para se encaixar talvez numa novela familiar, cujo lugar decisivo é a palavra; Schelling dizia numa carta que toda imagem habitada por uma palavra passa a falar tanto ou mais que, e Retratos... exercita a letra dessa fórmula; na dialética hegeliana como no grande cinema mortuário que se debruça sobre seus limites e oclusões, a palavra-chave é trabalho, mas o trabalho do filme não vai se limitar ao terrífico quadro-negro de fundo que assinala metonímica, mas também metaforicamente, o Inominável da tortura; há esse jogo mais estrutural entre a foto alterada (ensombrecida, enviesada, índex figurativos de alterização do registro pelo relato, ou da percepção de choque pela anamnese) e a palavra narrativa; por sua vez, este “jogo” é submetido a um movimento reverso e complementar de fuga da imagem e de fixação da palavra: os mortos se animam e retrocedem diante de nós, como se esta vida autônoma fornecida à imagem pedisse ao relato dos sobreviventes um take a break!, uma pausa aliciante, para que esta imagem empreinte de fantasma possa também ser o lugar de uma enunciação; mas não é só; falei acima em novela familiar, mas tratam-se de dois álbuns aqui: o primeiro um thriller kammespiel (o assédio da polícia, o “aparelho” desbaratado), centrado na mecânica novelística das táticas de resistência – discurso aos favelados dentro do carro, os tiros dados por Dora e Chael das janelas e, finalmente, a descrição mais taquigráfica das torturas –; e o segundo de natureza um tanto épica, com aquele plano geral e aglomerado dos guerrilheiros de partida para o Chile; entre o instantâneo concentracionista do primeiro e o painel aventuresco do final, paira a imagem de Dora, experiência e efígie na qual afinal se resumem os efeitos possíveis do fora de campo no cinema: assim como a dor e o opróbrio da tortura só se atualizaram verdadeiramente para Dora no 1976 de seu suicídio, o fora de campo só nos aparece integralmente ao cabo do filme, como efeito acumulado de: o filme; é ao morrer que começamos a narrar, e, no cinema, arte fait divers do fantasma, não seria diferente. 12


OS FILMES DE MAIO O processo, de Maria Augusta Ramos

ARÁBIA

de João Dumans e Affonso Uchôa (Brasil, 2017. 96’. Exibição em DCP) ATÉ 16 DE MAIO

Roteiro: Affonso Uchôa, João Dumans. Fotografia: Leonardo Feliciano. Som: Gustavo Fioravante. Desenho de som e mixagem: Pedro Durães. Produção: Marcela Jacques, Laura Godoy. Montagem: Luiz Pretti, Rodrigo Lima. Com Aristides de Sousa, Murilo Caliari, Glaucia Vandeveld, Renata Cabral, Renato Novaes, Adriano Araújo, Renan Rovida, Wederson Neguinho.

André é um garoto de 18 anos que mora perto de uma antiga fábrica de alumínio, em Ouro Preto. Um dia, ele encontra o caderno de Cristiano, um operário que sofreu um acidente. Em entrevista à Screendaily, Affonso Uchôa relaciona o filme a seu trabalho anterior, A vizinhança do tigre: “Arábia é ao mesmo tempo uma continuação e um desvio em relação a A vizinhança do tigre, meu filme anterior, em que trabalhamos juntos pela primeira vez. Os dois filmes têm o mesmo protagonista (Aristides de Souza), e ambos são filmes políticos, na medida em que se dedicam às vidas de pessoas marginalizadas. Mas Arábia é claramente um filme ficcional, com influências inclusive mais teatrais. A vizinhança do tigre era mais como um documentário, não tínhamos nenhum orçamento para filmar, a equipe era pequena, isso quando eu não filmava sozinho.” Arábia foi premiado no Festival de Brasília de 2017 nas categorias de Melhor Filme, Melhor Ator, Melhor Trilha Sonora e Melhor Montagem. [Íntegra da entrevista com os diretores, em inglês, em: goo.gl/hpDDFP]

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O PACTO DE ADRIANA El pacto de Adriana de Lissette Orozco (Chile, 2017. 96'. Exibição em DCP) A PARTIR DE 11 DE MAIO Roteiro: Lissette Orozco. Fotografia: Julio Zúñiga, Daniela Ibaceta, Brian Martínez. Montagem: Melisa Miranda. Música: Santiago Farah, Anita Tijoux. Produtores: Gabriela Sandoval, Carlos Nuñez, Benjamín Band.

Quando criança, Lissette Orozco tinha em sua tia Adriana um exemplo. Ao descobrir que ela trabalhava para a polícia secreta do ditador chileno Augusto Pinochet, Lissette decide enfrentar Adriana. "Como admirava muito minha tia, meu primeiro impulso era fazer um filme para apoiar sua inocência", conta Orozco em entrevista à equipe da 41ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, na qual recebeu o prêmio de Melhor Filme. "Mas, durante o processo, as coisas foram mudando. Era muito forte entrevistar alguém que dizia coisas terríveis sobre ela e chegar em casa e receber uma mensagem dizendo: ‘Oi, meu amor, como você está?’. Já estava filmando há três anos quando pensei em parar tudo. Se continuasse com o documentário, trairia minha tia e atingiria toda minha família. Mas minha natureza nunca foi de deixar algo pela metade, e havia uma equipe que estava nesse projeto. Por isso, tentei fazer o filme mais coerente possível e que não traísse a mim mesma. Assumi o risco de cortar os laços com pessoas da minha família, porque acredito que este trabalho é uma contribuição importante para a memória histórica do Chile e de outras partes do mundo. Não é um conflito de querer desmascarar minha tia, mas o conflito ético de até onde vão os laços afetivos e morais. Na primeira exibição, uma jovem de 19 anos não entendia porque, no meio do filme, parte do público estava rindo ironicamente da minha tia. Pessoas que têm consciência política não acreditam nela desde o início. Mas essa menina não. Ela viveu comigo todo o descobrimento. É para a geração dela que esse filme é importante, porque não foi feito com carga política, mas com honestidade." [Íntegra da entrevista em: bit.ly/el-pacto]

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ANTES QUE TUDO DESAPAREÇA Sanpo suru shinryakusha de Kiyoshi Kurosawa (Japão, 2017. 129’. Exibição em DCP) ATÉ 8 DE MAIO Roteiro: Sachiko Tanaka, Kiyoshi Kurosawa. Fotografia: Akiko Ashizawa.

Três alienígenas viajam para a Terra em uma missão de reconhecimento para preparar uma invasão em massa. Tendo tomado posse de corpos humanos, os visitantes roubam de seus hóspedes a essência do seu ser, o senso do bem e do mal, de propriedade, família e pertencimento.

O PROCESSO

de Maria Augusta Ramos (Brasil, Alemanha e Holanda, 2018. 139’. Exibição em DCP) A PARTIR DE 18 DE MAIO

Roteiro: Maria Augusta Ramos. Fotografia: Alan Schvarsberg. Montagem: Karen Akerman. Som: Marta Lopes. Edição de som: Bernardo Uzeda. Direção de produção: Paula Alves. Produção: Maria Augusta Ramos. Coprodução: Paulo de Carvalho, Gudula Meinzolt, Wout Conijn.

Em cerca de 450 horas de material filmado, Maria Augusta Ramos acompanhou o processo que culminou no impeachment da presidente Dilma Rousseff. Concentrada em sua defesa, formada por José Eduardo Cardozo, Gleisi Hoffmann e Lindbergh Farias, a diretora faz um estudo particular dos bastidores desse momento histórico, ao longo de reuniões e discussões no Senado Federal, mas também por meio das expressões de seus protagonistas e dos defensores do impeachment. Em entrevista à Deutsche Welle, ao ser perguntada sobre a abordagem do ponto de vista da defesa de Dilma Rousseff, Maria Augusta responde: “Não é que seja a perspectiva da defesa: eu acompanho muito mais os bastidores da defesa porque a defesa me deu esse acesso. Eu tive acesso a reuniões da liderança da esquerda, da minoria que era contra o impeachment. A oposição não me deu esse acesso. Se tivesse dado, eu certamente teria filmado mais. Mas eu acho que era importante, sim, apresentar o argumento da direita, o argumento pró-impeachment. Para expor isso, eu escolhi, por exemplo, o senador Cássio Cunha Lima, que tem uma lógica de argumentação inteligente, ou que, pelo menos, faz sentido. Também a advogada Janaína Paschoal, que, independentemente de você concordar ou discordar dela, teve um papel essencial no impeachment. Essas pessoas são ouvidas e contempladas no filme, mas, sem dúvida, eu tive muito mais acesso à perspectiva da esquerda.” [Integra da entrevista em: bit.ly/DWprocesso]

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O FIO DA MEMÓRIA

de Eduardo Coutinho (Brasil, 1991. 120’. Exibição em cópia DCP remasterizada) DIAS 11 E 13 DE MAIO

Diretor assistente: Sergio Goldenberg. Fotografia: Adrian Cooper. Som: Cristiano Maciel, Jorge Saldanha. Montagem: Gilberto Santeiro. Montagem de som: Hercília Cardillo. Música original: Tim Rescala.

Segundo documentário de longa-metragem de Eduardo Coutinho, O fio da memória foi realizado, sob encomenda, por ocasião do centenário da abolição da escravidão no Brasil, completado em 1988. O filme procura condensar, em personagens e situações do presente, a experiência negra no Brasil a partir de dois eixos – as criações do imaginário, sobretudo na religião e na música, e a realidade do racismo, responsável pela perda de identidade étnica e pela marginalização de boa parte dos milhões de brasileiros de origem africana. Originalmente filmado em 16 mm, o documentário será exibido em cópia digital remasterizada.

NO INTENSO AGORA de João Moreira Salles (Brasil, 2017. 127'. Exibição em DCP)

Roteiro e texto: João Moreira Salles. Montagem: Eduardo Escorel, Laís Lifschitz. Música original: Rodrigo Leão. Produção executiva: Maria Carlota Bruno. Pesquisa de imagens: Antonio Venancio. Edição de som e mixagem: Denilson Campos. Coordenação de pós-produção: Marcelo Pedrazzi.

Feito a partir da descoberta de filmes caseiros rodados na China em 1966, durante a fase inicial da Revolução Cultural, No intenso agora investiga a natureza de registros audiovisuais gravados em momentos de grande intensidade. Às cenas da China, somam-se imagens dos eventos de 1968 na França, na Tchecoslováquia e, em menor quantidade, no Brasil. As imagens, todas elas de arquivo, revelam o estado de espírito das pessoas filmadas e também a relação entre registro e circunstância política. O ponto de partida do filme foram imagens captadas pela mãe do diretor, encontradas por ele na época da finalização de Santiago (2007). “Eu precisava de imagens da casa onde minha família morou, na Gávea, e pedi a alguém para procurar”, conta João Moreira Salles em entrevista ao jornal O Globo. “Encontramos as imagens, mas eu não sabia direito o que eram, qual o sentimento dela durante a viagem. Aí encontrei uma reportagem que ela escreveu sobre a viagem, em forma de diário, para a revista O Cruzeiro. Fiquei muito impressionado com a comoção dela diante de tudo o que viu lá. Minha mãe e a Revolução Cultural são opostos absolutos, seria fácil imaginar uma reação dogmática. Mas não, ela ficou deslumbrada com aquilo. E eu fiquei tocado com esse deslumbramento dela e com a intensidade com que ela o descreveu, porque minha mãe foi perdendo isso com o tempo.” [Leia a entrevista completa de João Moreira Salles para O Globo: goo.gl/PhCNxe]

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O BEBÊ DE ROSEMARY Rosemary's Baby de Roman Polanski (EUA, 1968. 136'. Exibição em DCP) DIA 13 DE MAIO, ÀS 19h30 Roteiro: Roman Polanski. Fotografia: William Fraker. Direção de arte: Richard Sylbert. Som: Harold Lewis. Efeitos especiais: Farciot Edouart. Montagem: Sam O'Steen, Bob Wyman. Produção: William Castle. Com Mia Farrow, John Cassavetes, Ruth Gordon, Sidney Blackmer.

Um jovem casal, Rosemary (Mia Farrow) e Guy Woodhouse (John Cassavetes), se muda para um antigo e espaçoso apartamento em Nova York, em um edifício famoso por acontecimentos trágicos. Quando Rosemary engravida, ela passa a ter estranhas alucinações e desconfia que seus vizinhos fazem parte de uma sombria conspiração. Ira Levin, autor do livro de 1967 que inspirou o filme, escreveu no epílogo de uma reedição de 2003: “Tendo observado que a maior parte do suspense nas histórias de horror acontece antes, e não depois, do horror aparecer, me veio a ideia. Um feto poderia criar um suspense muito eficaz se o leitor soubesse que aquilo se tornaria algo muito diferente de um bebê. Nove meses inteiros de antecipação, e o terror dentro da heroína.” No mesmo texto, Levin conta que o contrato para a produção cinematográfica fora fechado antes mesmo de o livro ser publicado, e que na primeira adaptação para o cinema de uma obra literária feita por Roman Polanski, “o resultado é possivelmente a adaptação fílmica mais fiel já feita. Ele incorpora páginas inteiras de diálogos e até usa cores específicas mencionadas.” O curta Uma história para os Modlins, de Sergio Oksman, é parte da programação de maio no Cinema do IMS e conta vestígios da história de Elmer Modlin, um figurante de O bebê de Rosemary. [Leia o texto original completo em inglês no site da Criterion Collection: bit.ly/2qEXO5i]

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QUARTA

TERÇA 1

11h30 No intenso agora

2

14h00 Em nome da América 15h50 Imagens do Estado Novo 1937-45

15h30 No intenso agora

QUINTA 3

18h00 Arábia

15h50 Antes que tudo desapareça

19h50 Antes que tudo desapareça

18h10 Arábia Sergio Oksman 20h00 A esteticista

20h00 Arábia

8

15h00 Antes que tudo desapareça

9

14h00 Imagens do Estado Novo 1937-45

10

17h30 Arábia

14h00 Arábia

20h00 Goodbye, América

16

14h00 Arábia

15h50 O pacto de Adriana

15h50 O pacto de Adriana

17h40 No intenso agora

Ópera na Tela 18h30 A donzela na neve

Sessão Cinética 19h30 Retratos de identificação sessão seguida de debate com os críticos da revista Cinética

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MAIO 2018 18

15h00 O processo

23

15h00 O pacto de Adriana

15h00 Imagens do Estado Novo 1937-45 Lançamento: Canal Thomaz Farkas 19h30 Vitalino Lampião + Beste + Hermeto campeão

20h00 O pacto de Adriana

22

14h00 Imagens do Estado Novo 1937-45 Sergio Oksman 18h30 Gilberto Gil, um ministro ao vivo

Sergio Oksman 18h10 Carta Branca: Sergio Oksman

Sergio Oksman Lançamento DVD | IMS 19h30 O futebol seguido de debate com Sergio Oksman e Barbara Rangel

15

14h00 Arábia

24

14h00 O pacto de Adriana 16h00 1930 - Tempo de revolução + 32 - A guerra civil

17h00 O processo Ópera na Tela 19h30 Um baile de máscaras

17h50 35 - O assalto ao poder 19h40 O processo

29

15h00 O pacto de Adriana

30

15h00 O pacto de Adriana

17h00 O processo

17h00 O processo

Carta Branca: Ismail Xavier 19h50 Um corpo que cai

Carta Branca: Ismail Xavier 19h50 O eclipse

31

11h30 No intenso agora Carta Branca: Ismail Xavier 14h00 Hiroshima meu amor 15h40 O processo Carta Branca: Ismail Xavier 18h10 Memórias do subdesenvolvimento 20h00 O casamento de Maria Braun


SEXTA 4

14h00 Arábia

SÁBADO 5

Sergio Oksman 20h00 O futebol

16h00 Goodbye, América 18h00 Carta Branca: Sergio Oksman

19h30 A esteticista

12

20h00 Arábia

13

11h30 No intenso agora 14h00 O pacto de Adriana

NO SÁBADO, 12 DE MAIO, NÃO HAVERÁ SESSÕES DE CINEMA

15h50 No intenso agora

11h30 No intenso agora Sergio Oksman 15h00 Gilberto Gil, um ministro ao vivo

Sergio Oksman 18h30 Notas sobre o outro + Uma história para os Modlins

18h10 Arábia

14h00 O pacto de Adriana

6

14h00 Imagens do Estado Novo 1937-45

15h50 Antes que tudo desapareça

11

11h30 No intenso agora

DOMINGO

16h00 O fio da memória Sergio Oksman 18h30 Notas sobre o outro + Uma história para os Modlins

18h10 O pacto de Adriana 20h00 O fio da memória

19h30 O bebê de Rosemary

18

Canal Thomaz Farkas 14h00 Vitalino Lampião + Beste + Hermeto campeão

19

11h30 No intenso agora

20

13h30 O conto da Princesa Kaguya

14h00 Imagens do Estado Novo 1937-45

16h00 1930 - Tempo de revolução + 32 - A guerra civil

15h30 No intenso agora 18h10 Retratos de identificação

17h50 O pacto de Adriana

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15h30 Imagens do Estado Novo 1937-45 19h40 O processo

17h50 35 - O assalto ao poder

19h40 O processo

19h40 O processo

26

11h30 No intenso agora

11h30 O pacto de Adriana

19h40 O processo

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11h30 No intenso agora

14h00 Imagens do Estado Novo 1937-45

Carta Branca: Ismail Xavier 14h00 Um homem com uma câmera

Carta Branca: Ismail Xavier 18h10 Duas ou três coisas que eu sei dela

15h30 O conto da princesa Kaguya

19h50 O homem que matou o facínora

Carta Branca: Ismail Xavier 18h00 O anjo exterminador 19h40 O processo

Programa sujeito a alterações. Confira a programação completa do Instituto Moreira Salles em cinema.ims.com.br, em nossas redes sociais ou pelo telefone 3284-7400

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ESPECIAL INFANTIL

O CONTO DA PRINCESA KAGUYA Kaguya-hime no monogatari de Isao Takahata (Japão, 2013. 137’. Exibição em DCP legendado em português) DIAS 20 E 27 DE MAIO Direção de animação: Osamu Tanabe. Pintura e textura: Masaya Saito. Direção de arte: Kazuo Oga. Música: Joe Hisaichi.

Uma jovem veio do mundo da lua para nosso mundo. Por que ela escolheu trocar a lua pela Terra? Por que ela teve que voltar para a lua? Esta é a história da princesa Kaguya, a heroína de O conto do cortador de bambu, clássico relato popular japonês. Falecido em abril de 2018, o diretor Isao Takahata deu o seguinte depoimento à época do lançamento do filme: “Há pouco mais de 50 anos, a Toei Animation começou a desenvolver um projeto de longa-metragem de animação baseado no clássico O conto do cortador de bambu. O diretor deveria ser Tomu Uchida, um dos grandes realizadores da época. O filme não chegou a ser feito, mas o diretor Uchida queria fazer do projeto um novo tipo de desafio: todos os funcionários da produtora seriam convidados a enviar roteiros. Eu não enviei um roteiro, em vez disso escrevi uma cena que serviria de prólogo: a princesa e seu pai conversam antes de ela partir da lua. Eu ainda consigo ver claramente minha cena da princesa Kaguya com seu pai, o rei da lua. Ela nos conta algo importante sobre o pecado da princesa e sua punição. Mas não coloquei esta cena no começo do filme. Pensei que, se pudesse contar ‘a verdadeira história’ da princesa Kaguya, não precisaria de um prólogo. Se a princesa Kaguya fosse mostrada como alguém com que o público consiga se identificar, ela ficaria na memória. Foi com tal ambição que fiz O conto da princesa Kaguya. Para ser franco, não sei dizer o que existe de contemporâneo nesta história, mas estou certo da contemporaneidade da expressão visual que conseguimos criar graças ao talento e à habilidade da equipe de animação. Do planejamento à finalização da história da princesa ‘nascida’ de um broto de bambu e criada por um cortador de bambu e sua esposa, foram oito anos de trabalho. Um trabalho prazeroso, tanto que, quando nos dissemos, alegres, que ‘terminamos’, logo acrescentamos: 'Que pena!'."

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SESSÃO CINÉTICA

RETRATOS DE IDENTIFICAÇÃO de Anita Leandro (Brasil, 2014. 73'. Exibição em DCP)

DIAS 10 E 19 DE MAIO A sessão do dia 10/5 será seguida de debate com os críticos da revista Cinética Imagem: Marcelo Brito. Som: Alexandre Nascimento. Montagem: Anita Leandro, Joana Collier, Isabel Castro.

Durante a ditadura militar, presos políticos eram fotografados em diferentes situações: investigações, interrogatórios, exames de corpo de delito, processos de banimento, inquéritos policiais militares e necropsias. Confrontadas ao testemunho de sobreviventes, essas fotografias, tiradas com o objetivo de controle dos prisioneiros, ressurgem no filme.

ÓPERA NA TELA

A DONZELA NA NEVE

Snegurotchka uma ópera de Nikolai Rimsky-Korsakov, dirigida por Dmitri Tcherniakov e regida por Mikhail Tatarnikov (França, 2016. 205'. Exibição em DCP)

Libreto: Nikolaï RimskiKorsakov. Orquestra e coro da Ópera Nacional de Paris. Elenco: Aida Garifullina, Yuriy Mynenko, Martina Serafin, Ramón Vargas, Thomas Johannes Mayer, Ekaterina Semenchuk, Vladimir Ognovenko.

DIA 16 DE MAIO ÀS 18h30

Snegurotchka, a donzela da neve, nasceu da união entre o Pai Geada e a Fada Primavera. Para proteger a filha do Deus Sol, que prometeu derreter o coração da donzela, os pais a escondem em uma pequena aldeia. A cada duas semanas, às quartas-feiras, a sala José Carlos Avellar recebe o festival Ópera na Tela. Uma série de programas organizados pela Bonfilm Audiovisual, com filmagens de encenações realizadas na Ópera de Paris, Ópera do Estado da Bavária, Teatro Antigo de Taormina, Grande Teatro do Liceu de Barcelona, Teatro Real de Madri e Teatro Alla Scala de Milão.

ÓPERA NA TELA

UM BAILE DE MÁSCARAS

Un ballo in maschera uma ópera de Giuseppe Verdi, dirigida por Johannes Erath e regida por Zubin Mehta (Alemanha, 2016. 145'. Exibição em DCP) DIA 23 DE MAIO ÀS 19h30

Libreto: Antonio Somma. Coro e orquestra da Ópera do Estado da Bavária. Elenco: Piotr Beczala, George Petean, Anja Harteros, Okka von der Damerau, Sofia Fomina, Andrea Borghini, Anatoli Sivko.

O conde de Warwick analisa a lista de convidados para o seu próximo baile de máscaras e encontra entre os nomes uma antiga paixão. Porém, os preparativos para a festa podem revelar um complô contra o anfitrião. Encenada pela primeira vez em 1859, tem libreto inspirado na morte do rei sueco Gustavo III, assassinado em um baile de máscaras. Sob a direção de Johannes Erath, esta versão da obra apresentada na Ópera do Estado da Bavária abstém-se do contexto histórico e destaca o conflito entre os personagens.

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RETROSPECTIVA DE 3 A 13 DE MAIO

SERGIO OKSMAN

Uma história para os Modlins (2012), de Sergio Oksman

A ESTETICISTA La esteticién de Sergio Oksman (Espanha, 2004. 90'. Exibição em DCP) DIAS 3 E 5 DE MAIO Roteiro: Sergio Oksman. Fotografia: Adolpho Cañadas. Montagem: Fernando Franco, Sergio Oksman. Edição de som: Nacho Arenas. Produção executiva: Sergio Oksman.

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O médico nazista Joseph Mengele dedicou parte de seus testes experimentais em seres humanos para provar que as mulheres ruivas tinham um nível de sensibilidade diferenciado. A narradora do filme, Emmy Blum, se estabeleceu em São Paulo nos anos 1950, onde trabalhou como esteticista. Deportada da Hungria em 1944, ela viu Mengele pela primeira vez no pátio principal de Auschwitz. Algumas semanas depois, tornou-se uma de suas cobaias. Depois da guerra, seus caminhos se encontraram novamente no Brasil. Sessenta anos depois, Emmy concorda em participar de um documentário sobre sua vida. Logo, o filme muda de marcha, tornando-se uma reflexão sobre as armadilhas da memória e as dificuldades de refletir o passado em um filme. Em entrevista a Javier Fuentes Feo e Antonio Hidalgo, Oksman explica: “Eu vejo este filme como uma primeira tentativa de romper com uma série de heranças que comprometiam muito meu trabalho, que não me deixavam ver, que não me deixavam me aproximar dos personagens. Eu tinha moldes absolutamente prontos para trabalhar, que permaneceram por muito tempo, pois continuei trabalhando para a televisão. [...] Foi uma primeira tentativa de rasgar um pouco esse discurso e assumir que todo filme, todo discurso de um diretor, é algo arbitrário, e creio que o filme deve ter as chaves para que o espectador possa intuir qual teria sido o processo de fazê-lo e de como ele foi construído.” [A entrevista pode ser vista na íntegra em: bit.ly/EsteticienOksman]


GILBERTO GIL, UM MINISTRO AO VIVO Gilberto Gil, un ministro en directo de Sergio Oksman (Espanha, 2006. 50'. Exibição em DCP) DIAS 6 E 10 DE MAIO Fotografia: Jordi Abusada. Som: Nuno Duarte. Montagem: Fernando Franco. Edição de som: Nacho Arenas.

No final de 2002, o recém-eleito presidente Lula ofereceu a Gilberto Gil o cargo de ministro da Cultura. O cantor aceitou com uma condição: ele continuaria trabalhando como músico nos finais de semana. Desde que assumiu sua posição, em 2 de janeiro de 2003, Gil manteve as duas agendas. Para este documentário, uma equipe o seguiu durante um período de duas semanas.

NOTAS SOBRE O OUTRO Notes on the Other de Sergio Oksman (Espanha, 2009. 13'. Exibição em DCP) DIAS 5 E 13 DE MAIO Roteiro: Carlos Muguiro, Sergio Oksman. Fotografia: Daniel Sosa. Som: Carlos Bonmatí. Montagem: Sergio Oksman, Fernando Franco. Edição de som e mixagem: Nacho Arenas. Produção executiva: Mario Madueño, Samuel Martínez.

Todo verão, um grupo de sósias de Ernest Hemingway se encontra em Key West, na Flórida, para escolher o mais autêntico entre os imitadores. Um dia, em 1924, o verdadeiro Ernest Hemingway também quis ser outra pessoa. Em entrevista à Cineuropa, Sergio Oksman discorre: “Este filme é um ensaio que associo mais a uma ficção da realidade do que a um documentário realmente. Eu tentei contar uma história em potencial que poderia ter acontecido, conectando elementos isolados, associando diferentes peças de um quebra-cabeça (uma fotografia, uma corrida de touros, pessoas fingindo ser outra pessoa...).” [Íntegra da entrevista, em francês, em: bit.ly/2K8igU0]

GOODBYE, AMÉRICA Goodbye, America de Sergio Oksman (Espanha, 2006. 72'. Exibição em DCP) DIAS 6 E 9 DE MAIO Roteiro: Carlos Muguiro, Sergio Oksman, Elías Querejeta. Fotografia: Paul Mailman, Rafael de la Uz.

Seu nome é Al Lewis. Ele tem mais de 90 anos. Ele está sentado na frente de um grande espelho. Pairando em torno dele, o maquiador lentamente muda o rosto de Al para que ele se pareça com o vovô, da série americana Os monstros. Enquanto o processo de maquiagem acontece, a memória fantástica de Al relembra cenas que não apenas marcaram sua vida, mas a de muitos outros.

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UMA HISTÓRIA PARA OS MODLINS A Story for the Modlins de Sergio Oksman (Espanha, 2012. 26'. Exibição em DCP) DIAS 5 E 13 DE MAIO Roteiro: Carlos Muguiro, Emilio Tomé, Sergio Oksman. Fotografia: Migue Amoedo. Som: Carlos Bonmatí. Montagem: Sergio Oksman, Fernando Franco.

Depois de aparecer no filme O bebê de Rosemary, de Roman Polanski, Elmer Modlin fugiu com sua família para uma terra distante, onde ficaram trancados em um apartamento escuro por 30 anos. “Mesmo enquanto espectador, eu percebi que os filmes de que gosto são sempre filmes que põem o cinema em questão”, comenta Sergio Oksman em entrevista a Daniele Dottorini. “Isso afeta minha própria forma de fazer filmes. Criar formas que desafiam os temas do cinema, para além dos temas discutidos no filme, é precisamente o que eu tentei fazer em Uma história para os Modlins e O futebol. [...] Sobre Modlins, por exemplo, posso te dizer que havia muitas versões para o filme. De início, junto com Carlos (que novamente escolheu deixar a produção para que eu terminasse), decidimos trabalhar com o material de arquivo, digitalizando-o, em certo sentido tirando dele a dimensão material. Contudo, se o filme não tivesse passado por 15 versões diferentes, nós nunca teríamos chegado à final, à que você viu. Cada passagem adicionava e absorvia algo.” Uma história para os Modlins recebeu 75 prêmios internacionais, incluindo Melhor Documentário de Curta-Metragem no festival É Tudo Verdade (2013) e o prêmio Goya na mesma categoria (2013). LANÇAMENTO DVD | IMS

O FUTEBOL

de Sergio Oksman e Carlos Muguiro, dirigido por Sergio Oksman (Espanha, 2015. 68’. Exibição em DCP) DIAS 4 E 8 DE MAIO A sessão do dia 8/5 será seguida por uma conversa com Sergio Oksman e Barbara Rangel

Roteiro e montagem: Carlos Muguiro, Sergio Oksman. Fotografia: André Brandão. Som direto: João Godoy, Vitor Coroa. Edição de som e mixagem: Eduardo G.castro. Pós-produção: José Fontes. Produção executiva: Guadalupe Balaguer Trelles, Sergio Oksman. Com Simão Oksman, Aílton Braga, Sergio Oksman.

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Sergio e seu pai, Simão, não se viram ao longo de 20 anos. A realização da Copa do Mundo de 2014 no Brasil fornece ao filho, que mora na Espanha, um pretexto para conviver algum tempo com o pai, retomando o antigo hábito de assistirem a jogos juntos. Segundo Sergio Oksman e Carlos Muguiro, as primeiras palavras anotadas no caderno de trabalho durante o processo de elaboração do filme foram: “Gravar a Copa com Sergio e Simão, um pai e um filho, infância, ficção da realidade, voltar atrás, reproduzir as circunstâncias da felicidade da infância, construir o imaginário, regras de futebol, eclipse”. “Nessa sequência de palavras”, comentam os autores, “estavam anotadas as ideias que continuamos desenvolvendo ao longo dessas três semanas, antes do início da Copa, e isso nos permitiu adentrar num território totalmente desconhecido. Mais do que uma solução para o roteiro, para a história, para o enfoque narrativo, para o conteúdo dramático, o que estávamos realmente buscando era justamente o esquecimento, a viagem, a transformação, o cinema no presente, a ausência de palavras. Esse território que marcava limites desconhecidos para nós. Não era um problema de roteiro, e sim de metodologia.” O futebol é o mais recente lançamento da coleção DVD | IMS. A edição é acompanhada pelos extras Bloco de notas, anotações filmadas sobre o processo de realização; Alemanha, de Sergio Oksman, uma nota para o terceiro aniversário da final da Copa de 2014; além de um livreto com ensaio de João Moreira Salles e depoimento de Carlos Muguiro e Sergio Oksman.


CARTA BRANCA: SERGIO OKSMAN DIAS 6 E 9 DE MAIO

"Na primeira vez que assisti a cada um dos filmes desta Carta Branca", comenta Oksman, "senti uma espécie de estremecimento, uma breve sensação de infinito, como experimentava às vezes na infância. Como se tudo estivesse contido aí, mas fosse ao mesmo tempo inapreensível. Dava prazer e medo, juntava berço e tumba na mesma palpitação. São filmes aos quais regresso sempre, filmes que dou de presente aos novos amigos e que projeto aos alunos no primeiro dia de aula. Filmes que pouco a pouco foram se misturando às minhas próprias percepções da realidade e que falam sobre mim tanto ou mais que os meus próprios trabalhos."

ACHO QUE ERA ASSIM NO VÍDEO (I Think This Is the Closest to how the Footage Looked / Ani choshev she’ze hachi karov le’eich she’hazilum niraa) de Yuval Hameiri (Israel, 2012. 9'. Exibição em DCP)

Um homem recria uma memória perdida: o último dia com sua mãe. Objetos ganham vida no esforço de reproduzir um momento que se foi.

MESMO QUE ELA FOSSE CRIMINOSA...

(Eut-elle été criminelle...) de Jean-Gabriel Périot (França, 2006. 9'. Exibição em DCP)

França, verão de 1944, período da Liberação.

O EXPERIMENTO MARINA

(The Marina Experiment) de Marina Lutz (EUA, 2009. 18'. Exibição em DCP)

O pai de Marina se comunicava com ela unicamente a partir de câmeras e gravadores. 12 anos após a morte de seu pai, a diretora passa a catalogar as milhares de fotografias, filmes e gravações sobre sua infância nos anos 1960 e 1970.

LIMITES: 1ª PESSOA

(Límites: 1ª persona) de Elías León Siminiani (Espanha, 2009. 8'. Exibição em DCP)

De quem uma vez amou uma mulher em um deserto com uma câmera.

OMA

de Michael Wahrmann (Brasil, 2011. 22'. Exibição em DCP)

Ela fala alemão. Eu falo espanhol. Ela não escuta. Eu não entendo.

ALGUMAS HISTÓRIAS SOBRE UM HOMEM

(Kilka opowieści o człowieku) de Bogdan Dziworski (Polônia, 1983. 20'. Exibição em DCP)

A câmera registra o comportamento de Jerzy Orłowski em diferentes situações. O jovem não possui ambos os braços.

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LANÇAMENTO

CANAL THOMAZ FARKAS

QUINTA-FEIRA, 17 DE MAIO, ÀS 19H30 Sessão seguida de debate com Consuelo Lins e Cristiane Lima

Na noite de lançamento do Canal Thomaz Farkas, no Rio de Janeiro, o Cinema do IMS exibirá três filmes que compõem o acervo do portal: Vitalino Lampião, de Geraldo Sarno, Beste, de Sérgio Muniz e Hermeto campeão, de Thomaz Farkas. Após a exibição, haverá um debate com as professoras e pesquisadoras Consuelo Lins e Cristiane Lima.

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O principal objetivo do projeto Canal Thomaz Farkas é difundir a produção cinematográfica do húngaro radicado no Brasil. A partir de 16 de maio, estarão disponíveis on-line (no endereço www.thomasfarkas.com), 34 filmes de curta e média-metragem que contaram com a participação de Farkas, seja como diretor, produtor ou diretor de fotografia. Farkas, um “baiano de alma”, como se definia, foi um dos mais importantes nomes da consolidação da tradição moderna da fotografia brasileira (seu acervo fotográfico se encontra sob os cuidados do IMS). Mas também desenvolveu uma sólida produção cinematográfica, com filmes marcantes na história do cinema documentário brasileiro, e que seriam o início de uma transformação que influenciaria diversos realizadores. Mesmo tendo continuado sua produção de filmes até os anos 1980, em títulos como Hermeto campeão (1981), a Caravana Farkas é seu legado mais conhecido. Composta por duas séries de filmes – Brasil verdade (1964-1965) e Heranças do Nordeste (1969-1970) –, a Caravana investigou manifestações culturais dos rincões do país. Realizada sob a sombra do regime militar, optou por buscar a cultura popular brasileira como forma de lidar com a realidade política da época, considerando que a transformação social do país estaria ligada à expressão tradicional de um Brasil afastado do eixo urbano e industrial. A Caravana Farkas reuniu diversos realizadores, muitos deles ainda jovens, como Geraldo Sarno, Paulo Gil Soares, Sérgio Muniz, Maurice Capovilla, Guido Araújo, Manuel Horácio Giménez, Affonso Beato, Lauro Escorel, Eduardo Escorel, Sidnei Paiva Lopes, Edgardo Pallero, Vladimir Herzog, entre outros. Este feliz encontro de alguns nomes que teriam papel de destaque na cinematografia brasileira nos anos seguintes pode ser agora conferido no canal. Além de tornar acessíveis os filmes, o Canal Thomaz Farkas, de modo inédito, vai além. Após um cuidadoso mapeamento de documentos e fotografias, estarão disponíveis, na página de cada obra, fotografias das filmagens, documentos de produção e peças de divulgação. Outro destaque do canal é a publicação on-line, pela primeira vez, da tese de doutorado Cinema documentário: um método de trabalho, defendida por Thomaz Farkas em 1972 na Escola de Comunicações e Artes (Departamento de Jornalismo e Editoração) da Universidade de São Paulo.


VITALINO LAMPIÃO de Geraldo Sarno (Brasil, 1969. 9’. Exibição em cópia digital)

Montagem: Geraldo Sarno. Fotografia: Thomaz Farkas, Geraldo Sarno. Narração: Othon Bastos. Produção: Thomaz Farkas e Saruê Filmes.

Do barro de telha ou massapê, começa a surgir, pelo trabalho do ceramista Manuel Vitalino dos Santos, uma imagem de Lampião, o rei do Cangaço. Segundo o artista, filho do Mestre Vitalino, o mais famoso artesão do barro do Nordeste, seria preferível abandonar a arte a ter que mudar sua forma artesanal de produção. Tradição e consumo são discutidos quando a arte chega para ser comercializada na Feira de Caruaru, em Pernambuco. Marcando a trilha sonora, a voz do cantador Severino Pinto.

BESTE

de Sérgio Muniz (Brasil, 1970. 20’. Exibição em cópia digital)

Roteiro: Cinema de Cordel. Fotografia: Thomaz Farkas.

O título se refere à forma deformada que se pronuncia a palavra “besta” (arma medieval) no norte da Bahia, e que ainda era presente na memória cultural da região.

HERMETO CAMPEÃO de Thomaz Farkas (Brasil, 1981. 43’. Exibição em cópia digital)

Roteiro: Thomaz Farkas. Produção: Rui Pereira e Kiko Farkas. Imagens: Pedro Farkas. Som direto: David Pennington. Montagem e composição: Junior Carone. Mixagem: José Luis Sasso. Música: Hermeto Pascoal.

Fotografias apresentam Hermeto Pascoal em meio aos instrumentos que toca no estúdio em sua casa. Nos ensaios, os sons são descobertos, e o improviso dá o tom. Hermeto discorre sobre a construção autodidata de seu conhecimento teórico sobre música e sua posição política sobre o mercado. Os músicos que integram a sua banda falam sobre o processo conjunto de criação e a admiração que sentem pelo multi-instrumentista. Em 1982, o filme de Thomaz Farkas recebeu os prêmios de Melhor Roteiro no Festival de Gramado e Melhor Filme Documentário na XI Jornada Brasileira de Curta-Metragem, em Salvador.

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GETÚLIO VARGAS 1930-45 QUATRO FILMES DE EDUARDO ESCOREL

Em 1990, Eduardo Escorel recebeu da Secretaria de Cultura de São Paulo um projeto sobre os 60 anos da Revolução de 1930, elaborado por André Singer e Claudio Kahns. Desde então, realizou três filmes para a TV e, mais recentemente, Imagens do Estado Novo 1937-45, um longa-metragem em duas partes lançado nos cinemas este ano. "A grande diferença para os outros episódios está na tentativa de indicar no próprio título que o documentário é não apenas sobre o Estado Novo, mas sobre as suas imagens. Ele interroga, questiona e faz uma exegese das próprias cenas que está usando", comenta Escorel para o jornal O Globo. [Íntegra da matéria: bit.ly/gl-escorel]

1930 - TEMPO DE REVOLUÇÃO de Eduardo Escorel (Brasil, 1990. 49’. Exibição em cópia digital)

DIAS 20 E 24 DE MAIO Roteiro: Sérgio Augusto. Texto: Sérgio Augusto e Eduardo Escorel. Argumento: Antonio Pedro Tota.

Panorama político e cultural do período iniciado, em 1922, com a posse do presidente Artur Bernardes, a Semana de Arte Moderna e o Levante do Forte de Copacabana. As revoltas tenentistas, a Coluna Prestes e a crise econômica, a partir de 1929. A deposição do presidente Washington Luís por uma junta militar e a posse de Getúlio Vargas na chefia do Governo Provisório, em outubro de 1930.

32 - A GUERRA CIVIL de Eduardo Escorel (Brasil, 1992. 48’. Exibição em cópia digital)

DIAS 20 E 24 DE MAIO

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Produção: Cláudio Kahns. Argumento: Paulo Sérgio Pinheiro, Túlio Kahn. Roteiro: Sérgio Augusto. Texto: Sérgio Augusto, Eduardo Escorel. Narrador: Edwin Luisi. Música: Hermelino Neder. Edição: Aritanã Dantas.

Para os paulistas, no início da década de 1930, o Governo Provisório de Getúlio Vargas se tornara uma ditadura. Havia insatisfeitos em todo o país, mas só os paulistas se levantaram em armas. A guerra civil durou três meses. No conflito, houve cerca de 800 vítimas fatais, mais do que o número de soldados brasileiros mortos na Segunda Guerra Mundial. Apesar do apoio maciço da população e do alistamento espontâneo de 45 mil civis, os paulistas acabaram derrotados. O documentário retrata esses eventos e questiona a noção ainda hoje dominante de que a guerra civil tinha propósitos separatistas.


35 - O ASSALTO AO PODER de Eduardo Escorel (Brasil, 2002. 98’. Exibição em cópia digital)

DIAS 20 E 24 DE MAIO Direção de produção: Bia Ribeiro, Martha Ferrans. Argumento: Paulo Sérgio Pinheiro, Túlio Kahn. Roteiro e texto: Sérgio Augusto, Eduardo Escorel. Narrador: Paulo Betti. Música: Hermelino Neder, Newton Carneiro. Montagem: Pedro Bronz. Fotografia: José Tadeu Ribeiro.

O ano de 1935 estava chegando ao fim quando três levantes militares, em três diferentes capitais brasileiras, tentaram derrubar o governo de Getúlio Vargas. Liderada por membros do Partido Comunista do Brasil, a insurreição deflagrada em Natal, no Recife e, por último, no Rio de Janeiro foi um fracasso militar e político. Em poucos dias, o movimento foi inteiramente dominado. O governo de Getúlio foi implacável com os insurretos. Vários deles foram brutalmente torturados, e até quem era mero simpatizante do Partido Comunista, sem qualquer envolvimento com o levante, acabou preso. Com base em imagens inéditas encontradas em arquivos europeus e norte-americanos, o filme conta ainda com depoimentos de vários participantes do levante e intervenções de historiadores.

IMAGENS DO ESTADO NOVO 1937-45 de Eduardo Escorel (Brasil, 2016. 227'. Exibição em DCP)

Roteiro: Flávia Castro, Eduardo Escorel. Produção: Cláudio Kahns. Montagem: Pedro Bronz, Eduardo Escorel. Pesquisa: Antonio Venancio, Letícia Carvalho.

Recorrendo a vasto material de arquivo, entre cinejornais, fotografias, cartas, filmes familiares e de ficção, trechos de diário e canções populares, o documentário examina a herança do Estado Novo (1937-1945), comandado por Getúlio Vargas. A partir da comparação e da análise desses registros heterogêneos, produzidos para fins diversos, o filme reavalia esse momento histórico em suas fontes de inspiração externas, formas de funcionamento e contradições.

Foto: 10 de novembro de 1937. Getúlio Vargas anuncia pelo rádio, do palácio Guanabara, a decretação do Estado Novo. Diante de Getúlio, estão, entre outros, os ministros da Fazenda, Sousa Costa, do Exército, Eurico Gaspar Dutra, da Justiça, Francisco Campo, e o chefe de Polícia, Filinto Müller. FGV/CPDOC – Divulgação

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CARTA BRANCA:

ISMAIL XAVIER

DE 26 A 31 DE MAIO

Um homem com uma câmera (1929), de Dziga Vertov

O ECLIPSE

L’Éclisse de Michelangelo Antonioni (Itália, França, 1962. 126’. Cópia restaurada em DCP) DIA 30 DE MAIO, ÀS 19h50

Roteiro: Michelangelo Antonioni, Tonino Guerra, Elio Bartolini. Fotografia: Gianni Di Venanzo. Direção de arte: Piero Poletto. Música: Giovanni Fusco. Montagem: Eraldo Da Roma. Produção: Raymond e Robert Hakim. Com Alain Delon, Monica Vitti, Louis Seigner, Rosanna Rory, Lilla Brignonne, Francisco Rabal.

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Para evitar problemas financeiros e ter uma vida mais confortável, Vittoria (Monica Vitti) viveu por três anos com Riccardo, jovem funcionário de uma embaixada. Após romper com ele, ela começa a ter um caso com Piero (Alain Delon), um jovem corretor da Bolsa de Valores. “Depois de O eclipse, muitas pessoas me perguntaram: ‘O que você fará agora?’. Significado: ‘Agora que você disse o que queria dizer’. Antonioni continua: “Seria muito indecoroso de minha parte acreditar que conduzi com meus filmes um estudo conclusivo sobre sentimentos. Acredito, pelo contrário, que ainda há muito a dizer e a mostrar. É uma tarefa que não posso fazer eu mesmo, mas acho que valeria a pena. É importante tentar entender o homem de hoje também sob esse aspecto. O que temos até agora? Examinamos, vivissecamos, analisamos detalhadamente seus sentimentos. Isso nós fomos capazes de fazer. Mas não para descobrir novos. Eu gostaria de saber mais sobre esses resíduos. Talvez tenhamos que voltar ao começo e nos perguntar o que é um sentimento. E identificá-lo quase como um efeito – de acordo com o significado científico da palavra – em relação não só ao seu protagonista, mas também ao seu observador.” [Trecho de artigo originalmente publicado em 1963 no livro Screenplays of Michelangelo Antonioni, e disponível, em inglês, no site da Criterion Collection: bit.ly/eclissecc]


MEMÓRIAS DO SUBDESENVOLVIMENTO Memorias del subdesarrollo de Tomás Gutiérrez Alea (Cuba, 1968. 97’. Cópia restaurada em DCP) DIA 31 DE MAIO, ÀS 18h10 Roteiro: Tomás Gutiérrez Alea, Edmundo Desnoes. Fotografia: Ramón F. Suárez. Música: Leo Brouwer. Montagem: Nelson Rodríguez. Produção: ICAIC. Com Sergio Corriere, Daisy Granados, Eslinda Núñez, Beatriz Ponchova, Omar Valdés, René de la Cruz.

Sozinho em Havana, depois que sua mulher e seus pais migram para Miami nos primeiros meses da revolução de Fidel Castro, um homem observa a cidade a uma certa distância. “O telescópio na varanda de Sergio é o símbolo mais contundente da sua atitude perante a realidade”, observa o diretor. “Ele analisa a cidade. Vê tudo de cima e de longe, é capaz de julgar a realidade – a partir de seu ponto de vista subjetivo –, mas não participa dela ativamente.” Mistura de ficção e documentário, o filme, explica Alea, alterna o ponto de vista subjetivo e distanciado do personagem com a possibilidade de nos aproximarmos da realidade que só o cinema nos oferece. Cópia restaurada pela Cineteca di Bologna no laboratório L' Immagine Ritrovata, em associação com o Instituto Cubano del Arte e Industria Cinematograficos (ICAIC ). Restauração financiada pela George Lucas Family Foundation e por The Film Foundation's World Cinema Project.

DUAS OU TRÊS COISAS QUE EU SEI DELA Deux ou trois choses que je sais d’elle de Jean-Luc Godard (França, 1966. 90’. Cópia restaurada em DCP) DIA 26 DE MAIO, ÀS 18h10 Roteiro: Jean-Luc Godard. Fotografia: Raoul Coutard. Música: René Levert. Montagem: Françoise Collin, Chantal Delattre. Produção: Anatole Dauman, François Truffaut. Narração: Jean-Luc Godard. Com Marina Vlady, Roger Montsoret, Anny Duperey, Jean Narboni.

Um retrato das transformações urbanas e a história de uma jovem mulher que passa a trabalhar como prostituta. Sobre o filme, Godard conta: “O que mais me animou foi que a história coincide basicamente com uma das minhas teorias mais profundas. A ideia de que, para viver na sociedade parisiense de hoje, em qualquer nível, a pessoa é forçada a se prostituir de uma maneira ou de outra, ou então viver de acordo com as condições que se assemelham às da prostituição. Durante a produção do filme – em seu discurso, isto é, seu curso descontínuo –, eu quero incluir tudo: esporte, política, até mantimentos. Veja um homem como Édouard Leclerc, um homem realmente extraordinário com ou sobre quem eu adoraria fazer um filme. Tudo pode ser colocado em um filme. Tudo deve ser colocado em um filme. Quando as pessoas me perguntam por que eu falo – ou minhas personagens falam – sobre o Vietnã, sobre Jacques Anquetil ou sobre uma mulher que engana o marido, eu encaminho o interrogador ao seu próprio jornal. Está tudo ali. E está tudo misturado. É por isso que sou tão atraído pela televisão. Um telejornal composto de documentos cuidadosamente preparados seria extraordinário. Ainda mais se alguém conseguisse que editores de jornais fossem alternados na edição dos telejornais. É por isso que, em vez de falar em cinema e televisão, prefiro usar termos mais generalistas, como imagens e sons.” [Íntegra do depoimento no livro Godard on Godard, p. 239, disponível em: bit.ly/JLGonJLG]

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UM HOMEM COM UMA CÂMERA Chelovek s kinoapparatom de Dziga Vertov (URSS, 1929. 68’. Cópia restaurada em DCP) DIA 27 DE MAIO, ÀS 14h Câmera principal: Mikhail Kaufman. Montagem: Elizaveta Svivlova, Dziga Vertov. Com Mikhail Kaufman.

Conforme advertem os letreiros de apresentação, os únicos do filme, este “registro em seis rolos de celulóide são fragmentos do diário de um cinegrafista e representam uma experiência cinematográfica de comunicação de acontecimentos visíveis sem a ajuda de legendas intercalares, sem a ajuda de um roteiro, sem ajuda do teatro, sem cenário e sem atores. Esta obra experimental foi feita com a intenção de criar uma linguagem absolutamente cinematográfica e verdadeiramente internacional, baseada em um total afastamento das linguagens do teatro e da literatura.” As preocupações estéticas e políticas que resultariam em Um homem com uma câmera já estavam presentes na Resolução do Conselho dos Três em 10/04/1923, texto do grupo formado por Vertov, seu irmão Phillip Kaufman e Elizaveta Svilova: “Eis, cidadãos, o que vos ofereço em primeira mão, em lugar da música, da pintura, do teatro, do cinematógrafo e de outras efusões castradas. No caos dos movimentos, o olho apenas entra na vida ao lado daqueles que correm, fogem, acodem e se empurram. Um dia de impressões visuais escoou-se. Como recriar as impressões desse dia de um modo eficaz, num estudo visual? Se for preciso fotografar sobre a película tudo o que olho viu, será o caos. Se montarmos com uma certa ciência, o que foi fotografado ficará mais claro. Se jogarmos fora o supérfluo, ficará ainda melhor. Obteremos um resumo organizado das impressões visuais recebidas pelo olho comum.” No mesmo texto, o Conselho defende: “O principal, o essencial, é a cinessensação do mundo.” Em pesquisa feita pela revista Sight & Sound com 340 críticos, cineastas e programadores de cinema, o filme de Vertov é apontado como o “melhor documentário de todos os tempos”. A cópia DCP exibida no Cinema do IMS foi restaurada pela Lobster Films em 2K, a partir de uma cópia de nitrato dos primeiros anos de lançamento do filme, levada à Europa no início da década de 1930 pelo próprio Vertov e preservada nos arquivos do EYE Filmmuseum, em Amsterdã. [Tradução da Resolução do Conselho dos Três de Marcelle Pithon, in: A experiência do cinema, organização de Ismail Xavier, Graal/Embrafilme, 1983]

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O HOMEM QUE MATOU O FACÍNORA The Man who Shot Liberty Valance de John Ford (EUA, 1962. 123'. Exibição em DCP) DIA 26 DE MAIO, ÀS 19h50 Roteiro: James Warner Bellah, Willis Goldbeck. Fotografia: William H. Clothier. Direção de arte: Eddie Imazu, Hal Pereira. Música: Cyril Mockridge. Montagem: Otho Lovering. Produção: Willis Goldbeck. Com John Wayne, James Stewart, Vera Miles, Lee Marvin, Edmond O'Brien.

O senador Ransom Stoddard volta à cidade onde passou a juventude para o enterro de um amigo. Lá, revive os anos de sua iniciação política e conta a verdadeira história sobre como o terrível bandido Liberty Valance foi morto. O crítico Roger Ebert narra um debate com John Ford, em 1968, após uma exibição de A longa viagem de volta (The Long Voyage Home, 1940): “Perguntaram se sua postura com relação ao western teria se alterado em uma carreira que inclui O cavalo de ferro (The Iron Horse, 1924), No tempo das diligências (Stagecoach, 1939), Paixão dos fortes (My Darling Clementine, 1946) e O homem que matou o facínora (1962): ‘Não, ainda é a mesma de sempre,’ ele disse, com uma leve ironia. ‘Eu nunca assisto a westerns e nunca pensaria em ler um conto ou romance western. Eu apenas os faço para fugir da poluição de Hollywood. É muito divertido estar lá fora, em locação, na boa companhia de cowboys e dublês. Eu sou apenas um diretor que trabalha duro.’ Mas e as mudanças no seu trabalho entre O cavalo de ferro e Facínora? ‘Ah, o Facínora. Sim. O cara não dá um beijo no cavalo e parte em direção ao pôr do sol.” [Íntegra do relato de Roger Ebert em: bit.ly/jf-valance]

UM CORPO QUE CAI Vertigo de Alfred Hitchcock (EUA, 1958. 128’. Exibição em DCP) DIA 29 DE MAIO, ÀS 19h50 Roteiro: Alec Coppel, Samuel Taylor. Fotografia: Robert Burks. Direção de arte: Hal Pereira, Henry Bumstead. Música: Bernard Herrmann. Montagem: George Tomasini. Som: Harold Lewis, Winston Leverett. Efeitos especiais: John Ferren. Produção: Alfred Hitchcock. Coprodução: Herbert Coleman. Com James Stewart, Kim Novak, Barbara Bel Geddes.

Na trama, James Stewart é um detetive aposentado que tem medo de altura. Ao aceitar o pedido de um amigo para vigiar sua mulher, interpretada por Kim Novak, ele revisita traumas provocados por sua fobia. Um corpo que cai foi apontado como “O melhor filme de todos os tempos”, em uma pesquisa organizada em 2012 pela revista Sight & Sound, do British Film Institute. Para chegar ao resultado, a publicação entrevistou 846 críticos de cinema, acadêmicos, distribuidores, roteiristas e programadores de todo o mundo – número bem maior do que os 144 entrevistados para indicar o melhor filme de todos os tempos nas pesquisas anteriores, feitas de dez em dez anos, desde 1952, quando Ladrões de bicicletas (Ladri di biciclette, de Vittorio De Sica, 1948) ficou em primeiro lugar. Um corpo que cai entrou pela primeira vez na lista na pesquisa de 1972, na 11ª posição, ocupando nas votações das décadas seguintes o sétimo, o quarto e o segundo lugar. Entre 1962 e 2002, o filme mais votado foi Cidadão Kane (Citizen Kane, de Orson Welles, 1941).

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HIROSHIMA MEU AMOR Hiroshima mon amour de Alain Resnais (França, Japão, 1959. 92’. Cópia restaurada em DCP) DIA 31 DE MAIO, ÀS 14h Roteiro: Marguerite Duras. Fotografia: Michio Takahashi, Sacha Vierny. Montagem: Jasmine Chasney, Henri Colpi, Anne Sarraute. Música: Georges Delerue, Giovanni Fusco. Com Emmanuelle Riva, Eiji Okada.

Um encontro ocasional em Hiroshima faz surgir um romance entre um arquiteto japonês e uma atriz francesa, que está na cidade participando de um filme sobre a paz. A relação amorosa constitui a base para Resnais explorar a natureza da memória, da experiência e da representação. Além de amantes, eles também se tornam confidentes, o que traz à memória uma história, nunca contada antes, do primeiro amor dela. Durante a Segunda Guerra Mundial, em Nevers, ela se apaixonou por um soldado alemão. No dia em que a cidade foi libertada, ele foi baleado e morto, e ela, submetida à humilhação e à desonra pública.

O ANJO EXTERMINADOR El ángel exterminador de Luis Buñuel (México, Espanha, 1962. 95'. Exibição em DCP) DIA 27 DE MAIO, ÀS 18h Roteiro: Luis Bunuel, Luis Alcoriza. Fotografia: Gabriel Figueroa. Direção de arte: Jesús Bracho. Música: Alessandro Scarlatti. Montagem: Carlos Savage. Produção: Gustavo Alatriste. Com Silvia Pinal, Enrique Rambal, Jaqueline Andere, Antonio Bravo.

Após o jantar em uma luxuosa mansão, os convidados percebem que, inexplicavelmente, estão impossibilitados de partir. Buñuel conta no livro Meu último suspiro que “O anjo exterminador é um dos raros filmes meus que às vezes revejo. [...] O que vejo nele é um grupo de pessoas que não pode fazer o que tem vontade: sair de um aposento. Impossibilidade inexplicável de satisfazer um desejo simples. Isso acontece muito nos meus filmes. Em A idade do ouro, um casal quer se unir sem conseguir. Em Esse obscuro objeto do desejo, trata-se do desejo sexual de um homem envelhecido, que nunca se satisfaz. Em Ensaio de um crime, Archibaldo de la Cruz tenta em vão matar. Os personagens de O discreto charme da burguesia querem a todo custo jantar juntos e não conseguem. É bem possível que haja outros exemplos.”

O CASAMENTO DE MARIA BRAUN Die Ehe der Maria Braun de Rainer Werner Fassbinder (Alemanha, 1978. 120'. Exibição em DCP) DIA 31 DE MAIO, ÀS 20h

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Roteiro: Pea Fröhlich, Peter Märthesheimer. Fotografia: Michael Ballhaus. Som: Jim Willis. Música: Peer Raben. Montagem: Juliane Lorenz, Franz Walsch.

Na Alemanha de 1943, Maria se casa com Hermann Braun, eles têm uma noite juntos, antes do noivo voltar ao fronte de batalha. Ao fim da guerra, Maria vive à espera de seu marido e precisa encontrar meios para sobreviver sozinha. O filme é o primeiro da trilogia de Fassbinder sobre o pós-guerra alemão, seguido por Lola e O desespero de Veronika Voss, ambos lançados em 1981. Os três filmes são protagonizados por mulheres desafiadas pelo contexto social da Alemanha nos anos 1950.


DVD | IMS LANÇAMENTO

O FUTEBOL (Espanha, 2015) dirigido por Sergio Oksman Extras: Bloco de notas: comentários sobre o processo de realização; Alemanha: nota para o terceiro aniversário da final da Copa de 2014. Livreto com depoimento de Sergio Oksman e Carlos Mugioro e ensaio de João Moreira Salles.

Instituto Moreira Salles

Sala José Carlos Avellar

Rua Marquês de São Vicente, 476. Gávea. Telefone: (21) 3284-7400

Ingressos

WWW.IMS.COM.BR

Aberto ao público de terça a domingo, das 11h00 às 20h00. Guarda-volumes aberto até 20h00. Acesso a portadores de necessidades especiais. Estacionamento gratuito no local. Café, wifi Fundado em 1992, o IMS é uma entidade civil sem fins lucrativos que tem por finalidade exclusiva a promoção e o desenvolvimento de programas culturais. O IMS Rio abriga espaços expositivos, sala de cinema, sala de aula, biblioteca, cafeteria e loja de arte. O ims possui também centros culturais em São Paulo e Poços de Caldas.

Superintendente Executivo: Flávio Pinheiro Coordenação do ims Rio: Elizabeth Pessoa Curadoria de cinema: Kleber Mendonça Filho Produção de cinema e DVD: Barbara Alves Rangel Assistência de produção: Ligia Gabarra, Thiago Gallego Projeção: Adriano Brito, Edmar Santos

OS FILMES DE MAIO Programa apresentado com apoio da Cinemateca do mam do Rio de Janeiro, da revista Cinética, do Festival Ópera na Tela, das distribuidoras Bonfilm, FJ Cines, Inquieta Cine, Pique-Bandeira Filmes, VideoFilmes, Vitrine Filmes, Zeta Filmes e do Espaço Itaú de Cinema. A exibição de Memórias do subdesenvolvimento tem o apoio de:

O lançamento do Canal Thomaz Farkas, no dia 17/5, tem entrada gratuita. As senhas serão distribuídas 30 minutos antes do início da exibição. para Arábia, Antes que tudo desapareça, O pacto de Adriana, No intenso agora, Imagens do Estado Novo 1937-45, O processo e o festival Ópera na Tela: terça, quarta e quinta: R$ 22,00 (inteira) e R$ 11,00 (meia) sexta, sábado, domingo e feriados: R$ 26,00 (inteira) e R$ 13,00 (meia) para as demais sessões: R$ 8,00 (inteira) e R$ 4,00 (meia) Meia-entrada com apresentação de documentos comprobatórios para professores da rede pública municipal, estudantes, menores de 21 anos, maiores de 60 anos, portadores de hiv e aposentados por invalidez. Cliente Itaú: desconto para o titular ao comprar o ingresso com o cartão Itaú (crédito ou débito). Ingressos e senhas sujeitos à lotação da sala. Capacidade da sala: 113 lugares. Ingressos disponíveis também em www.ingresso.com Devolução de ingressos: em casos de cancelamento de sessões por problemas técnicos ou por falta de energia elétrica, os ingressos serão devolvidos. A devolução de entradas adquiridas pelo ingresso.com será feita pelo site. Sessões para escolas e agendamento de cabines pelo telefone (21) 3284 7400 ou pelo e-mail imsrj@ims.com.br As seguintes linhas de ônibus passam em frente ao IMS-RJ: Troncal 5 - Alto Gávea - Central (via Praia de Botafogo ) 112 - Alto Gávea - Rodoviária (via Túnel Rebouças) 538 – Rocinha - Botafogo 539 – Rocinha - Leme Ônibus executivo Praça Mauá - Gávea

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INSTITUTO MOREIRA SALLES

CINEMA

MAIO 2018

CARTA BRANCA: ISMAIL XAVIER FORD • FASSBINDER • RESNAIS • GODARD • BUÑUEL VERTOV • GUTIÉRREZ ALEA • ANTONIONI • HITCHOCK 36


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