cinema mar.2023
Close, de Lukas Dhont (Bélgica, Holanda, França | 2022, 104’)
destaques de março 2023
Na cidade mais populosa do Distrito Federal, encontram-se viajantes do tempo, jogadores de futebol, guerreiras urbanas, grandes nomes do rap e patrulheiros intergalácticos. É nesse cruzamento que se criam os filmes de Adirley Queirós, que estará no Cinema do IMS para discutir e apresentar uma retrospectiva integral de seu trabalho: do primeiro ao mais recente longa-metragem, passando por seus primeiros curtas, em cópias 35 mm, e uma série para a televisão. Esta é a mostra Ceilândia mon amour ou Brasília Y love you demais: os filmes de Adirley Queirós.
Na Sessão Mutual Films, será exibida, em cópias restauradas, uma seleção de obras produzidas no primeiro estúdio independente de cinema do Irã pelos cineastas e poetas Ebrahim Golestan e Forough Farrokhzad. Os filmes serão apresentados pela cineasta Mitra Farahani, responsável por produzir as restaurações.
Em um de seus filmes mais celebrados, Eduardo Coutinho passa sete dias conversando com moradores de um edifício de conjugados em Copacabana. Lançado em 2002, Edifício Master poderá ser revisto nos Cinemas do IMS, em cópia 35 mm. Entre as estreias do mês, estão ainda Medusa, de Anita Rocha da Silveira, e Close, de Lukas Dhont, indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.
[imagem da capa]
Branco sai, preto fica, de Adirley Queirós (Brasil | 2014, 95’)
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Fora de campo, de Adirley Queirós (Brasil | 2009, 52’)
Medusa, de Anita Rocha da Silveira (Brasil | 2021, 127’)
Era uma vez Brasília, de Adirley Queirós (Brasil, Portugal | 2017, 100’)
14:00 Perlimps (80’)
16:00 Close (104’)
18:00 Mato seco em chamas (153’) 9 15:00 Mato seco em chamas (153’)
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18:00 Medusa (127’)
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14:00 Perlimps (80’)
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14:00 Perlimps (80’) 16:00 O massacre da serra elétrica (83’)
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14:00 Perlimps (80’)
16:00 Close (104’)
18:00 Mato seco em chamas (153’) 10
15:00 Mato seco em chamas (153’)
18:00 Close (104’) 17
14:00 Perlimps (80’)
16:00 Close (104’)
18:00 Medusa (127’)
14:00 Close (104’)
16:00 Rap, o canto da Ceilândia + Dias de greve (39’), sessão apresentada por Adirley Queirós
17:00 Mato seco em chamas (153’), seguido de debate com Adirley Queirós e Kleber Mendonça Filho
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14:00 Close (104’)
16:00 Fantasmas da casa própria: ep. 1, 2 e 3 (78’)
18:00 A cidade é uma só? (79’)
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14:00 Close (104’)
Sessão Mutual Films, apresentadas por Mitra Farahani, Aaron Cutler e Mariana Shellard
16:00 Curtas do Estúdio Cinematográfico Golestan (69’)
17:45 Tijolo e espelho (130’)
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16:00 O último país (71’)
14:30 O último país (71’)
16:00 Era uma vez Brasília (100’)
18:00 Mato seco em chamas (153’)
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14:00 Perlimps (80’)
16:00 Close (104’)
18:00 Mato seco em chamas (153’)
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15:00 Mato seco em chamas (153’)
18:00 Close (104’)
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14:00 Medusa (127’)
16:30 Fantasmas da casa própria: ep. 4 e 5 (52’)
18:00 Branco sai, preto fica (95’)
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14:00 Medusa (127’)
16:30 Fora de campo + Meu nome é Maninho (67’)
18:00 Edifício Master (110’)
Programa sujeito a alterações. Eventuais mudanças serão informadas em ims.com.br.
Para melhor receber os visitantes em exposições e eventos e ampliar as reservas técnicas dos acervos, o IMS Rio fechará para reformas a partir de 27 de março. Futuras atividades do Cinema do IMS na cidade durante este período serão informadas no site e nas redes sociais do IMS.
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Ceilândia mon amour ou Brasília Y love you demais: Os filmes de Adirley Queirós
As máquinas do tempo e do espaço no cinema de Adirley Queirós
Carol Almeida
Dimas Cravalança é um personagem do tempo-Exu, aquele que, num mesmo instante, se abre para a frente e para trás. Dimas vem de um futuro que já passou, ao mesmo tempo que é trovador de um passado que ainda insiste em acontecer de novo e de novo e de novo. Dimas, interpretado por Dilmar Durães, é um personagem de ficção enviado do futuro, no filme Branco sai, preto fica , segundo longa-metragem de Adirley Queirós. Mas será também neste texto uma máquina do tempo para pensar os pontos onde ontem, hoje e amanhã se encontram no cinema de Adirley. Um cinema que agora, com o lançamento de Mato seco em chamas, codirigido pela realizadora portuguesa Joana Pimenta, firma definitivamente suas raízes nas estrelas.1
Falar de temporalidades na obra de um realizador que costuma ser lido na chave da territorialidade é uma tentativa
de aproximação da sua obra como algo fundado na ideia de que toda periferia é, sobretudo, o espaço onde se levantam as asas do Anjo da História. Me refiro, claro, à famosa figura do quadro da Paul Klee, Angelus Novus , a partir da leitura de Walter Benjamin: o rosto do anjo está virado para o passado, contemplando ruínas e catástrofes empilhadas umas sobre as outras, enquanto suas asas se posicionam de forma que qualquer vento o empurra para o futuro.
O vento que bate em Ceilândia, cidade-satélite do Distrito Federal onde Adirley vive e filma, é carregado de poeira e fuligem de carro suspensa no ar. Uma densidade que vai aos poucos se incorporando numa estética de ruínas futuristas no cinema de um sujeito que, tal como Dimas, observa tudo ao redor do “ponto de vista da laje”2 quando, no primeiro plano
de seu primeiro filme, vemos uma panorâmica de um bairro de Ceilândia enquanto um dos personagens fala: “Isso aqui é uma história de sangue, suor e lágrimas. Isso aqui é batalha de muita gente.” Para falar das políticas de segregação territorial do Brasil, nada melhor que falar do ponto de vista de alguém que, de cima dessa laje, consegue enxergar o centro (neste caso, a cidade de Brasília) sem ser jamais enxergado por ele.
1. No romance A parábola do semeador , de Octavia Butler, uma das personagens, vivendo em uma distopia, diz: “O destino da semente da terra é criar raízes entre as estrelas”.
2. O termo “ponto de vista da laje” é cunhado por César Guimarães em GUIMARÃES, César.
“Noite na Ceilândia”. In: forumdoc.bh.2014: 18º
Festival do Filme Documentário e Etnográfico
– Fórum de Antropologia e Cinema . Belo
A intenção de se marcar em um lugar e contar o mundo a partir dele, assim como a de escrever a história a contrapelo do tempo linear – citando novamente Walter Benjamin –, já está dada desde seu momento inaugural, com o curta Rap, o canto da Ceilândia, de 2005, filmado ainda com os rolos 35 mm da época da graduação em cinema na UnB. O filme usa o rap como uma força que simultaneamente rememora a fundação de Ceilândia como projeta aqueles corpos periféricos para a frente.
Horizonte: Filmes de Quintal, 2014, pp. 193-206.
Disponível em: www.forumdoc.org.br/ensaios/
ceilandia-capital-da-dor.
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É, portanto, pelo barulho do bater das asas do Anjo da História que vemos Dimas aterrissar como uma vibração a anotar atentamente em seu caderno velho tudo que vê nesse território de sangue, suor e lágrimas. Nas idas e vindas no tempo, ele começa a perceber alguns gestos que vão se repetindo no cinema de Adirley: pessoas negras e periféricas em contemplação existencial diante do mundo, estados existenciais incendiários, incêndios e explosões que são fabulados não somente como uma ação que desencadeia outras ações, mas como manifestos que precisam durar na tela do cinema. A duração como o testemunho de uma existência que atravessa tempos distintos, e o fogo como a imagem de uma hipnose catártica que se destina a dar outros desfechos narrativos a uma população que costuma ser encarcerada na gramática audiovisual ora da vítima do sistema, ora da vilã nesse sistema. O fogo, aliás, pode ser tanto uma fogueira que destrói objetos – sofás, carros, viaturas de guerra – quanto a ponta de um cigarro se acendendo lentamente, a fumaça
saindo da boca de homens e mulheres que controlam a meditação de um trago. É preciso usar a máquina do tempo de Dimas para entender como esses gestos vão se acumulando e se transformando: aquilo que começa em 2005 como um
documentário expositivo a estabelecer a relação entre Ceilândia e o rap não apenas como uma expressão cultural, mas sobretudo como uma força trabalhadora que engaja a comunidade, vai gradualmente abrindo espaço para um
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cinema que se entende ele mesmo como uma força de trabalho a produzir novas imagens de “status cinematográfico” e, ao mesmo tempo, uma outra comunidade que passa a reimaginar o espaço, agora também mítico, de Ceilândia. Uma cidade que, graças ao cinema de Adirley, se torna um campo de fabulações futuristas que nasce de dentro dos escombros e de ruas nunca calçadas.
De dentro de seu contêiner/máquina do tempo, Dimas anota: a habilidade dos trabalhadores que lidam com solda e mecânica em Dias de greve (2009) em algum momento se muta nas ações de reparo de uma pequena e remendada nave espacial com cheiro de fumaça e graxa em Era uma vez Brasília (2017). A contemplação frustrada de Maninho diante da precarização de seu ofício como jogador de futebol em Fora de campo (2010) se espelha em todos os momentos que Marquim e Sartana/Shokito olham pro horizonte de Ceilândia maquinando a explosão de uma vingança contra a arquitetura do apartheid em Branco sai, preto fica (2015). Da mesma forma, em A cidade é uma só? (2011), a campanha de Dildo para deputado distrital enquanto lida com o cotidiano de ser um trabalhador precarizado que passa longas horas na condução entre Ceilândia e Brasília é
também a campanha de Andréia em Mato seco em chamas (2022), exigindo o fim do toque de recolher e a ressocialização da população carcerária. O PCN (Partido da Correria Nacional) de Dildo é coligado com o PPP (Partido do Povo Preso) de Andréia. Entender o cinema de Adirley como um manifesto dessa força de trabalho é fundamental para perceber como se estabelecem as imagens em seus filmes. Se, por um lado, elas são herdeiras de uma cinefilia dos filmes de ação – os debates sobre Mad Max e Blade Runner no cineclube da Ceicine contam várias histórias –, por outro, elas quebram com algumas regras da gramática do cinema de gênero. Isso acontece quando, por exemplo, Adirley usa fotos, vídeos e áudios de arquivo de um Brasil que produz a toda hora provas contra si mesmo. Ou quando permite a seus personagens, sempre habitando a turva borda entre a realidade e a ficção, que eles mesmos ditem o que vai ou não entrar no filme. E, mais do que isso, ditem quanto tempo a câmera precisa repousar sobre seus rostos.
Há nos filmes de Adirley um pacto de trabalhador para trabalhador com a equipe no set , o que também acontece na parceria com Joana Pimenta em Mato seco em chamas e Era uma vez
Brasília. Isso se manifesta de várias formas. Primeiro, no tempo de duração das filmagens e dos filmes: é preciso respeitar o cotidiano da periferia, seus sons e barulhos, e filmar nas horas que as ruas permitem. Do mesmo modo que é preciso, às vezes, desrespeitar as regras de quanto tempo deve durar uma sessão comercial de cinema. Segundo, no trabalho de cocriação com os atores. Dilmar Durães, Marquim da Tropa, Wellington Abreu e, mais recentemente, Andréia Vieira, Joana D’Arc Furtado e Léa Alves da Silva, as protagonistas de Mato seco em chamas, são em diversos momentos autoras/es desse cinema. E, claro, nas trocas com a equipe de arte, fotografia e som que, ao longo dos últimos anos, foi criando traços estéticos próprios em esquema de cooperativa: juntas, as pessoas entendem que os barulhos metálicos das máquinas, a visualidade das gambiarras e o gradativo processo de noites mais longas que os dias, vão construindo uma outra Ceilândia. Um território que aparece agora para o cinema brasileiro tal como estrelas que, na escuridão do céu, emitem uma luz vinda direta do passado diante de olhos que visualizam outros modos de vida na suspensão gravitacional do universo.
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Tesouros do Irã: filmes do Estúdio Cinematográfico Golestan
Aaron Cutler e Mariana Shellard
A Sessão Mutual Films de março de 2023 agradece de forma especial Ehsan Khoshbakht, cujos textos sobre os filmes e cineastas citados podem ser conferidos em inglês no blog Notes on Cinematograph (notesoncinematograph.blogspot.com/).
Em 1953, um golpe de estado patrocinado pelos EUA, com apoio da Inglaterra, destituiu o então primeiro-ministro do Irã, Mohammed Mossadegh, que havia acabado de nacionalizar uma das maiores petrolíferas do país, pertencente a uma empresa inglesa. Com a condenação e prisão do primeiro-ministro, o xá Mohammad Reza Pahlavi expandiu seu poder e instaurou um governo monárquico, iniciando novamente o processo de privatização dos poços de petróleo. Apesar de autoritário, o governo do xá promoveu uma grande modernização no Irã, com rápida urbanização, distribuição de renda, reforma agrária, avanço na infraestrutura e na alfabetização, realizando o que ficou conhecido como Revolução Branca. Foi também durante o reinado do xá, antes da Revolução
Islâmica que derrubou a monarquia em 1979, que o escritor, tradutor, fotógrafo e cineasta iraniano Ebrahim Golestan produziu a totalidade de sua obra cinematográfica, um projeto que buscou encarar a realidade iraniana moderna em toda sua complexidade. Mesmo com o apoio da família real, Golestan não poupou críticas à mesma e sofreu censuras frequentes como consequência.1
O cineasta migrou definitivamente para a Inglaterra em 1975, onde comemorou seu centenário no ano passado, uma ocasião celebrada com retrospectivas e homenagens em diversos países. Golestan nasceu em outubro de 1922 na cidade de Shiraz, em uma influente família aristocrática. Seu avô havia sido um importante aiatolá, e seu pai, diretor de um jornal liberal chamado Golestan (que significa
1. Uma boa visão geral do momento histórico em que Golestan produziu seus filmes foi escrita em inglês pela cineasta e professora de cinema Mehrnaz Saeed-Vafa e publicada na revista online Rouge em 2007: rouge.com.
au/11/golestan.html.
“jardim de flores” em persa) e membro da assembleia constitucional que elegeu o xá. Aos 22 anos, Ebrahim se tornou membro do Partido Tudeh (o partido comunista do Irã), onde editava seu jornal, e, em 1945, traduziu para o persa trechos do livro História do Partido Comunista da União Soviética (Bolcheviques) (1938), de Josef Stálin. Porém, se desligou do partido em 1947 devido a diferenças intelectuais. Desde jovem, Golestan foi estimulado a ter uma consciência crítica e a seguir uma vida intelectual e literária. Publicou seu primeiro livro de contos já na década de 1940 e traduziu para o persa obras de importantes escritores dos séculos XIX e XX, como Tchekhov, Dostoiévski, Faulkner, Hemingway e Mark Twain. Seu trabalho na literatura – seja com tradução, seja com prosa original – se baseou em um princípio de conflito dialético, no qual forças divergentes conversam para comparar visões divergentes do mundo.
Autodidata, também trabalhou como fotógrafo e, após ganhar uma competição de fotografia, em 1945, comprou uma câmera 8 mm. Logo adotou o formato
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16 mm e foi comissionado para registrar imagens do Irã para corporações midiáticas estrangeiras, como a BBC, na Inglaterra, e a NBC, nos Estados Unidos (entre elas, imagens do julgamento de Mossadegh, uma figura que Golestan via com simpatia). Passou a trabalhar para o consórcio petrolífero Western Oil Companies, produzindo filmes educativos e imagens para noticiários. Golestan posteriormente negociou a compra dos equipamentos que havia adquirido pela empresa e montou um estúdio independente de cinema, a primeira entidade dessa natureza em um país cuja indústria cinematográfica era então dominada por filmes populares e de gênero (hoje conhecidos como filmfarsi). Os direitos do primeiro filme de Golestan como diretor, De uma gota ao mar (Az ghatreh ta darya, 1957) – um documentário didático de meia hora de duração sobre a construção de instalações petroleiras no Irã – ficaram com os produtores industriais que o comissionaram.2 Os direitos de todos seus outros filmes ficaram com ele mesmo.
A equipe do Estúdio Cinematográfico
Golestan era composta principalmente
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2. Este filme pode ser visto hoje no website da videoteca de British Petroleum: bpvideolibrary. com/record/234.
por jovens não profissionais, para os quais o cineasta ofereceu treinamento. Mas também contou com a participação de artistas já conhecidos, como a poeta Forough Farrokhzad (1934-1967), que possuía uma fama considerável por poemas que descreviam a vida interior e espiritual feminina, em versos livres com uma franqueza emocional incomum na sociedade iraniana da época. Farrokhzad começou no estúdio em 1958 como recepcionista, mas logo passou a editar o filme de Golestan Um fogo (Yek atash, 1961), que acompanha de forma sóbria e retrospectiva o processo de extinção de um incêndio em um poço no sudoeste do Irã. Ela também escreveu, dirigiu e editou o curta-metragem documental
A casa é escura (Khaneh siah ast, 1962), um olhar poético e compassivo sobre habitantes de um abrigo de pessoas com hanseníase no norte do Irã mantido pela esposa do xá (após a conclusão das filmagens, Farrokhzad adotou um menino que nasceu na colônia). A casa é escura se tornou uma grande referência nacional e internacional. Ganhou o prêmio principal no Festival Internacional de Curtas-Metragens de Oberhausen após Golestan recusar o convite do Festival de Cannes, cujos organizadores propuseram passar
o filme apenas para convidados, pois temiam o impacto sobre o público geral.3
Os curtas-metragens dirigidos por Golestan também ganharam prêmios em festivais europeus, como no de Veneza. Essas obras autorais foram rigorosamente esculpidas como filmes-ensaios que combinaram leveza de montagem com uma densidade de pensamento, ao contemplar as implicações de determinados assuntos para a sociedade iraniana. Entre eles, estão dois filmes sobre o impacto ambiental e social da indústria petrolífera: Um fogo (1961), e o média-metragem Onda, coral e rocha ( Moj o marjan o khara, 1961), sobre o processo de desenvolvimento de um terminal de exportação de petróleo no Golfo Pérsico que levou riquezas naturais para fora do Irã. As colinas de Marlik ( Tappe-haye Marlik, 1963) reflete de forma existencial e lírica sobre achados arqueológicos na região que dá nome ao filme, com imagens em close-up dos objetos. Uma abordagem
similar é adotada em As joias da coroa iraniana (Ganjineha-ye Gohar, 1965), documentário sobre os tesouros da família real que foi parcialmente censurado devido às críticas que faz à mesma, contrastando as riquezas dos reis à miséria da população. Colheita e semente (Kharman va bazr, 1965) evidencia a precariedade da vida dos camponeses iranianos a partir de entrevistas in loco, e foi imediatamente banido, sem poder ser exibido fora do país.
3. Uma entrevista em inglês com Golestan de 2016, no qual ele comenta a realização de A casa é escura e outros filmes do estúdio, pode ser conferida na página do YouTube do festival Il Cinema Ritrovato, de Bolonha: youtube. com/watch?v=rKSFKce83qg.
Os filmes de ficção de Golestan incluem o curta-metragem Namoro (Khestegarsi, 1961), no qual Farrokhzad aparece como atriz em uma história que observa os rituais iranianos de relacionamento, e dois longas, em que o cineasta aprofundou seu desejo de destacar as desigualdades sociais de seu país a partir de narrativas novelísticas. O primeiro, Tijolo e espelho (Khesht o Ayeneh, 1964), foi filmado em preto e branco em Teerã, majoritariamente durante a noite, pelo cinegrafista Soleiman Minasian, com vistas urbanas panorâmicas. Ele foi o primeiro filme iraniano a usar som direto. A história acompanha um casal em crise que perambula em busca de uma solução para um bebê que é encontrado pelo protagonista no banco traseiro de seu táxi. A jornada de Hashem (Zackaria Hashemi) e Taji (Taji
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Ahmadi) revela mercados noturnos, ruas vazias e áridas, um bar cheio e esfumaçado e ruas diurnas com passantes ao fundo, que ocasionalmente olham com curiosidade para a câmera. Os personagens coadjuvantes do filme criam um coro de críticas e reclamações à vida cotidiana local. Uma velha vivendo no esqueleto de um edifício em construção aponta para uma especulação
imobiliária descontrolada que levou o preço da moradia às alturas e desabrigou aqueles que não podiam pagar. Um delegado de polícia, desiludido com seu serviço, sugere a um cidadão que o mais eficiente seria comprar uma arma e defender-se por conta própria. Uma enfermeira de orfanato amarga (e possivelmente pervertida) expressa desdém pela quantidade de crianças abandonadas. Os
protagonistas também não escapam da sensação eminente de desespero e desalento, expressa na paranoia sofrida por Hashem, com medo de assumir a namorada, e na mágoa de Taji, que projeta na criança uma família sonhada. Tijolo e espelho foi tido nos anos subsequentes como uma obra inaugural do cinema moderno iraniano, e muitos críticos estrangeiros o compararam a importantes
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filmes europeus realizados no mesmo momento. Golestan, porém, não assumiu influências cinematográficas e preferiu citar exemplos da literatura de sua cultura, em particular da poesia e seu poder de expressar as complexidades fugazes da alma e do espírito humano. O título do filme foi tirado de uma frase de Attar de Nixapur, poeta persa dos séculos XII e XIII: “O que o Jovem vê no espelho, o Velho vê no tijolo de lama”.4 A técnica de jump cuts utilizada brevemente no filme veio, segundo Golestan, de um poema de Saadi de Shiraz, do século XII, ao descrever o estado psicológico de um caçador à noite em busca de sua presa.5 E há a provável influência de Farrokhzad – que faz uma ponta em Tijolo e espelho como a mãe que abandona a criança –, na maneira cuidadosa que dezenas de crianças no orfanato são filmadas, cada uma de forma individualizada, em uma longa sequência documental que remete a A casa é escura.
Em 1967, a morte súbita de Farrokhzad em um acidente de carro abalou Golestan.
4. A frase foi traduzida para o inglês por Golestan.
5. Golestan aprofundou esta referência ao introduzir (em inglês) uma sessão da versão restaurada de Tijolo e espelho em Veneza em 2018: youtube.com/watch?v=7x1XsAkpoDc.
Ele parou de dirigir filmes e deixou o Irã. Voltou pontualmente nos anos seguintes, vendeu os equipamentos de seu estúdio e encerrou suas atividades definitivamente na década de 1970. Fez mais um longa-metragem durante esse período, a comédia burlesca O tesouro secreto do vale Jinn (Asrar-e Ganj-e Darre-ye Jenni, 1974), na qual um camponês (interpretado pelo ator popular Parviz Sayyad)
encontra um tesouro inestimável que leva ele e sua vila à loucura. O filme foi idealizado por Golestan como um aviso à crescente decadência e ao desperdício que ele viu no Irã, com diversos integrantes do grande elenco representando versões de figuras que contribuíram para o fim de uma era. O tesouro secreto do vale Jinn entrou em cartaz no Irã por alguns dias e logo foi censurado.
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Golestan previu as dificuldades para seu filme e, por isso, publicou a história na forma de romance antes de voltar para a Inglaterra. Nas décadas seguintes, se tornou cada vez mais uma figura idiossincrática: nunca voltou ao Irã, porém é considerado um dos escritores modernos fundamentais do país (tanto por sua habilidade literária quanto por suas posições políticas). Residiu no exterior, mas não autorizou as traduções de seus livros e contos para outras línguas, devido à crença de que as particularidades de suas escolhas artísticas fazem sentido apenas em persa. 6 Foi influente para outros cineastas iranianos (tanto aqueles a quem apoiou e que começaram na época pré-Revolução, como Masoud Kimiai, Amir Naderi e Abbas Kiarostami, quanto seu próprio neto, o cineasta Mani Haghighi), mas seus filmes ficaram praticamente
6. Uma notável exceção foi publicada em inglês (com tradução de Abbas Milani) no final de 2022 para marcar o centenário de Golestan –um breve livro de memórias sobre um encontro com o poeta galês Dylan Thomas durante a visita dele ao Irã em 1951. Ver: magepublishers. com/an-encounter-with-dylan-thomas/. As impossibilidades da tradução literária é um dos temas da conversa entre Golestan e Thomas.
inacessíveis em cópias de boa qualidade. Em 2016, o festival Il Cinema Ritrovato, em Bolonha, realizou uma retrospectiva dos filmes do Estúdio Cinematográfico Golestan com a presença e ajuda de seu fundador.7 O curador da retrospectiva, Ehsan Khoshbakht, percebeu a fragilidade de várias cópias e ajudou a lançar um projeto na Cinemateca de Bolonha para a restauração dos filmes existentes do estúdio. Para produzir as restaurações, ele envolveu a artista e cineasta Mitra Farahani, que estava trabalhando na realização do documentário Até sexta, Robinson (À vendredi, Robinson, 2022), sobre um encontro organizado por ela entre Golestan e Jean-Luc Godard –razão pela qual Farahani também ajudou a produzir o último longa-metragem de Godard, Imagem e palavra (Le Livre d’image, 2018). Foram necessários meses para convencer Golestan a doar para a cinemateca seu acervo de negativos e cópias dos filmes, que tinha levado consigo para a Inglaterra. Embora a maioria das restaurações tenha sido concluída, o
projeto segue em andamento – inclusive com a busca de pelo menos um filme ainda não encontrado.
O filme mais conhecido do Estúdio Cinematográfico Golestan continua sendo A casa é escura, que, em 2022, entrou na lista da revista inglesa Sight & Sound dos melhores filmes de todos os tempos.8
Na época em que trabalharam juntos, Farrokhzad e Golestan estavam envolvidos amorosamente, o que causou atenção pública (inclusive, pelo fato de Golestan ser um homem casado). A admiração intelectual mútua do casal levou também a uma influência artística mútua, enriquecida por sensibilidades concretas e líricas, com cada um apoiando a carreira e as ambições do outro. Como Farahani comentou ao apresentar um programa dos filmes restaurados em 2019, “havia uma espécie de simbiose intensa de intuições e formas que circulavam entre Ebrahim Golestan e Forough Farrokhzad [...]. O fruto de sua curta colaboração é uma efervescência intelectual
7. Informações sobre a retrospectiva podem ser encontradas em inglês e em italiano em: festival.ilcinemaritrovato.it/en/sezione/ golestan-film-studio-tra-poesia-e-politica/.
8. Ver: bfi.org.uk/sight-and-sound/greatest-films-all-time. A casa é escura entrou no 101° lugar da lista (empatado com Os renegados, de Agnès Varda, e Onde começa o inferno, de Howard Hawks), e foi um dos poucos curtas-metragens e filmes iranianos citados.
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e criativa; é impossível pensar no trabalho de um sem pensar no trabalho do outro.”9
No Brasil, atualmente há um projeto
9. Ver: 2019.festival-lumiere.org/en/lecture-zen/ interview-with.html.
de tradução do persa para o português da poesia de Forough Farrokhzad pela professora e poeta Thaís Chagas. A seguir, a tradução de um poema de Farrokhzad, cuja versão original foi publicada em 1962, o mesmo ano da realização de seu filme:
a conquista do jardim10
sobre nossas cabeças o corvo que salta da geada até uma vaga ideia conturbada mergulha numa nuvem dispersa e sua voz a atravessa e se amplia no horizonte. feito uma pequena lança carrega as notícias da cidade até nós.
todos sabem todos sabem que você e eu vimos o jardim da oca geada pegamos as maçãs e dos ramos vimos um homem longe, perdido todos estão com medo todos estão com medo mas você e eu nos unimos às luzes à água ao espelho11 e nós não temos medo não falo da união precária entre dois nomes que abraçam antigas páginas d’um cartório
falo das minhas madeixas agraciadas com a antecipação incendiária dos teus beijos,
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da intimidade de nossos corpos, do brilho de nossa nudez feito escamas de peixe n’água falo da vida prateada da canção que uma pequena fonte canta n’alvorada na umidade das florestas nos encontramos, aos coelhos selvagens na madrugada perguntamos, e no mar, pela sua ansiedade gelada e nas conchas cheias de pérolas. e na estranheza das montanhas conquistadas e às mais jovens águas: o que temos de fazer? todos sabem todos sabem no silencioso sono de simurgh12 entramos e no jardim, a verdade encontramos no semblante constrangido d’uma flor desconhecida encontramos a permanência d’um momento sem fim: quando dois sóis encaram um ao outro e não há medo do sussurro no escuro então falo do dia e das janelas abertas e do ar fresco
e d’um fogão onde queimam coisas inúteis e a terra que é fértil d’uma outra embarcação e nascimento e evolução e exaltação falo de nossas afáveis mãos que construíram por noites pontes da mensagem do perfume da brisa da luz venha para o campo para o grande campo me chame, detrás dos ares onde respiram as flores e os cervos que se unem ao seu par pois cortinas estão repletas d’uma oculta raiva e as pombas, inocentes, vislumbram diante da altura de suas brancas torres-plumas a terra
10. O texto em persa pode ser conferido no site pontesoutras. wordpress.com/2020/10/ 06/3-poemas-de-forough -farrokhzad-por-thais-chagas, junto a traduções para português de mais dois poemas de Farrokhzad.
11. Estes elementos fazem parte da celebração matrimonial persa ( ayné va shamdoon).
12. Ser da mitologia persa. É uma criatura gigante e alada; na literatura clássica persa (poesia sufi), aparece como uma metáfora para Deus; é uma figura feminina e reside em locais onde há muita água. Na lenda, conta-se que Simurgh viveu 1.700 anos antes de banhar-se em chamas.
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Ceilândia mon amour ou Brasília Y love you demais: Os filmes de Adirley Queirós
“Eu gosto da cidade, de filmar aqui. Eu pouco saio da cidade. E tem muitas histórias daqui que eu ainda quero contar”, Adirley Queirós declara em uma entrevista a Amanda Seraphico para a revista Beira. Mais tarde, na mesma entrevista, o cineasta dirá: “Na minha cabeça, o cinema é a experiência do corpo na cidade”.
Ao longo de quase duas décadas de produção, Adirley Queirós e seus parceiros e parceiras não apenas posicionaram Ceilândia num certo mapa do cinema nacional, como também driblaram as expectativas correntes do que pode um filme de periferia. Nos seus longas, médias e curtas reunidos nessa retrospectiva, está posta uma multiplicidade de formas, invenções e desejos. Uma obra realizada desde a Ceilândia que parece, filme a filme, interrogar os limites de si mesma e do próprio cinema. O que pode um documentário? O que pode um filme de gênero? Como extrapolar o talvez batido debate dos limites entre realidade e ficção?
Ao longo do mês de março, o Cinema do IMS será frequentado por essas experiências, ideias e personagens. Operários em greve que redescobrem o prazer de uma pelada durante a semana e trabalhadores do campo que se articulam na luta por reforma agrária. Representantes do Partido da Correria Nacional e do Partido do Povo Preso. Grandes nomes do rap e do futebol que sobrevivem nas periferias das indústrias cultural e esportiva. Viajantes no tempo, patrulheiros intergalácticos e guerreiras urbanas lendárias.
Junto a eles, Adirley Queirós estará conosco para discutir seus filmes e apresentar seus primeiros curtas-metragens em cópias 35 mm.
[Citações da revista Beira extraídas de: bit.ly/adirlapr]
Rap, o canto da Ceilândia
Adirley Queirós | Brasil | 2005, 15’, 35 mm (Cinco da Norte)
Diálogo com quatro consagrados artistas do rap nacional (X, Jamaika, Marquim e Japão), todos moradores da Ceilândia, cidade-satélite de Brasília. O filme mostra a trajetória desses integrantes no universo da música e faz um paralelo com a construção da cidade onde moram.
Trabalho de conclusão de curso de Adirley Queirós na UnB, Rap, o canto da Ceilândia conquistou os prêmios, na categoria curta-metragem, de Melhor Filme do júri oficial e do júri popular no Festival de Cinema de Brasília, em 2005. Sobre as origens do filme, comenta o diretor em entrevista ao portal CineFestivais:
“Eu estava lendo o Milton Santos e o que eu entendia dele era a relação entre espaço e território. Então em Rap, o canto da Ceilândia, para mim, o canto não é a música, é o espaço. O que que eu fiz na verdade? A Ceilândia é o espaço do rap. Depois de São Paulo, tem Ceilândia no rap. Até os
anos 2005, 2006, 2007, os dois maiores lugares onde existia rap no Brasil eram São Paulo e depois vinha Ceilândia. X Câmbio Negro, DJ Jamaika, Álibi, esses caras todos saíram de lá. O meu recorte então era: eu escolhi os personagens em torno de uma ideia assim, todos eles têm quase a mesma idade de Ceilândia. Então eu peguei quatro rappers que vieram no processo da Ceilândia, que chegaram, que nasceram ali. A primeira geração da Ceilândia. Então esses caras eram nascidos em 1970, 71, 69, 68. O recorte era formatar um filme que fale de território com homens de 35 anos e que o rap seja uma questão de trabalho, muito mais do que musical. O rap enquanto relação de trabalho.”
Rap, o canto da Ceilândia será exibido junto ao curta-metragem Dias de greve, ambos em cópias 35 mm.
[Depoimento extraído de: bit.ly/rapadirl]
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
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Dias de greve
Adirley Queirós | Brasil | 2009, 24’, 35 mm (Cinco da Norte)
Uma greve de serralheiros é deflagrada em uma periferia da capital federal. Neste período, muito mais que despertar para uma consciência de classe, os operários redescobrem uma cidade e um tempo que não mais lhes pertencem.
Em entrevista à revista Trip, o cineasta conta que o filme tem origem em “uma história muito alucinada. Os caras me chamaram para uma entrevista, a mulher me perguntou o que é que eu queria fazer, aí eu disse que estava adaptando a obra do Albert Camus. [...] Que era mentira... Eu tinha lido Camus e falei que ia adaptar, isso ao vivo para a televisão. Então, nisso, a conversa foi andando, foi andando. Ela pediu para eu ficar mais um bloco, eu fiquei, aí eu falei, antes dela perguntar, ‘nós estamos fazendo um filme do Albert Camus, nós não temos dinheiro, quem quiser ajudar’, eu dei um telefone de um amigo meu, ‘o produtor é esse aqui’. E coloquei o telefone. Quando acabou
a entrevista, a gente tinha na época 25 mil levantados. Aí eu voltei para a Ceilândia e falei: ‘Cara, agora tenho que fazer esse filme’. Não existia filme. Então a gente organizou um grupo que depois deu origem ao que a gente chama de CeiCine [Coletivo de Cinema da Ceilândia] e começamos a discutir livros do Albert Camus para fazer um filme. Então tem o filme Dias de greve.”
Dias de greve será exibido junto ao curta-metragem Rap, o canto da Ceilândia, ambos em cópias 35 mm.
[A íntegra da entrevista pode ser lida em: bit.ly/diasadirl]
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Fora de campo
Adirley Queirós | Brasil | 2009, 52’, Arquivo digital (Cinco da Norte)
Entre cerca de 500 clubes de futebol profissional no Brasil, apenas 8% fazem parte da chamada “elite” do esporte. A esmagadora maioria dos jogadores convive, assim, com condições precárias de trabalho, sem contratos ou carteira assinada, recebendo salários atrasados, sem férias ou benefícios. Neste documentário, Adirley Queirós e o codiretor Thiago Mendonça abordam o cotidiano de jogadores e ex-jogadores de futebol da segunda e terceira divisões do Distrito Federal. Assim como em Rap, o canto da Ceilândia, o filme parece interessado na dimensão do trabalho na vida de seus personagens, que vivem ou viveram à base de uma carreira que para muitos jovens periféricos representa o grande sonho da ascensão social.
Um mundo de clubes pequenos, longe dos patrocínios milionários e de uma infraestrutura técnica e médica, em que atletas como Maninho,
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que foi campeão pelo Guarani (SP), continuam a esperar uma segurança sempre distante. Um ex-jogador como Bé, ex-integrante do Vila Nova goiano, hoje trabalha como segurança. Raros, como Marquinhos Carioca, sobrevivem como técnicos depois de pendurar as chuteiras.
Realizado com recursos do edital DocTV, o filme de algum modo ecoa experiências da vida do próprio diretor, que dos 14 aos 24 anos se dedicou ao futebol profissional, tendo jogado nas equipes do Taguatinga e do Ceilândia.
Fora de campo será exibido junto a Meu nome é Maninho.
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
A cidade é uma só?
Adirley Queirós | Brasil | 2012, 79’, DCP (Vitrine Filmes)
“Daí eu pensei em como fazer um filme bem legal, agradável e gângster: Brasília, I love you.”
Nancy, Dildu e Zé Roberto vivem em Ceilândia. Nancy revisita a própria infância, quando foi uma das crianças usadas pelo governo em uma campanha para remover os moradores dos arredores de Brasília e enviar para territórios mais distantes. Dildu é faxineiro e candidato a deputado distrital. No mercado imobiliário, Zé Roberto negocia lotes nos arredores de Ceilândia.
Vencedor em 2012 dos prêmios de Melhor Filme pelos júris oficiais da Mostra Aurora do Festival de Tiradentes, do Forumdoc.bh e do CachoeiraDoc, A cidade é uma só? traça uma reflexão em torno dos 50 anos de Brasília a partir dos contínuos processos de exclusão dos trabalhadores que ergueram e mantém a cidade de pé.
“O modo como o A cidade é uma só? foi feito já parte de uma urgência”, comenta o diretor em
entrevista concedida em 2014 à revista Cinética.
“Ele foi pensado como um projeto de documentário, com duas personagens, mas no meio da filmagem nós tivemos uma crise, porque, apesar de eles estarem contando a história da Ceilândia, de um período que foi tenso, pauleira, eles faziam isso de forma muito nostálgica. Nesse momento, a gente teve um insight: se a gente fizer o filme desse jeito, a gente está fodido, porque só vai reforçar a narrativa oficial sobre a cidade. Apesar de ser uma narrativa histórica, ela é sempre contada de maneira que parece que tudo foi lindo, né?
Inclusive, era um recorte de geração dos personagens: ‘a nossa geração foi linda, sofreu muito. Vocês não entendem nada.’ A gente criou, então, novos personagens para provocar esse embate político. Era um filme que pensava num embate muito mais interno, na própria cidade. Apesar de meus filmes anteriores terem passado fora, a preocupação maior naquele momento era criar uma relação com os artistas locais, o que era também uma possibilidade explícita de enfrentamento. Eles jamais aceitariam uma narrativa dessa história com dois personagens que, na cabeça deles, eram dois loucos, grotescos. A perspectiva política então nasce a partir do local, e essas coisas locais, que se colocam ali, são também nacionais.”
[Íntegra da entrevista em: bit.ly/cidadeadirl]
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
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Branco sai, preto fica
Adirley Queirós | Brasil | 2014, 95’, DCP (Vitrine Filmes)
Tiros em um baile de black music na periferia de Brasília ferem dois homens, que ficam marcados para sempre. Um terceiro vem do futuro para investigar o acontecido e levantar provas contra o Estado brasileiro.
“Era uma tentativa de uma espécie de cinema terrorista”, diz Adirley sobre o longa-metragem em entrevista à revista Cinética. “Além disso, tinha o desejo de que os personagens pudessem se divertir mais com o filme. Porque essa história do documentário é muito foda, o cara chega sempre contando as misérias dele, né? É uma relação em que um expõe as misérias dele para o outro se sensibilizar e sair tranquilo dali no final, né? No Branco sai, preto fica, a gente queria que eles tivessem uma espécie de alegria com o filme. Uma espécie de vontade. E no caso estou falando deles, mas de mim também, porque também me interessava muito fazer um filme de gênero, uma
aventura, pensando naquilo que eu assistia e gostava, lá atrás, também entendendo que, no tipo de filme que a gente faz, com a estrutura que a gente tem, essa busca da aventura sempre vai dar em uma outra coisa.”
“A minha busca era que esses caras pudessem ter o espaço deles como um espaço de criação. O Marquinho [do Tropa, que participara de quase todos os projetos anteriores do diretor] me reivindicou isso: ‘Eu não quero contar essa história pra você. Você já contou, lá no começo você já fez o Rap, já está bom. Eu queria andar no filme. Queria levantar da cadeira e andar. Vocês não fazem cinema?’ Isso é uma forma de intervir radicalmente no que o outro quer de você, e eu acho que esse tipo de intervenção traz muito mais possibilidades do que aquela coisa do documentário tradicional, que tem que estar aberto para as situações. Imagina, a gente não tem uma indústria, a gente não tem grana… se a gente propõe fantasias, é muito mais aberto ainda! Porque a gente não consegue fazer. A gente não sabe fazer, não tem grana pra fazer, e a gente não tem paciência pra fazer isso. Você faz a fantasia, e não está exatamente como você queria, mas vamos assim mesmo [risos]. Sem falar que todos os filmes que a gente faz são feitos por cinco pessoas. Mesmo a ficção tem que caber num carro. Então é uma aventura também nesse sentido: pode sempre ser um desastre fatal.”
Dentre diversos prêmios, Branco sai, preto fica foi eleito Melhor Filme pelo júri oficial do 47º Festival de Cinema de Brasília, em 2014.
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Meu nome é Maninho
Adirley Queirós | Brasil | 2014, 15’, Arquivo digital (Cinco da Norte)
Durante a passagem da Copa do Mundo do Brasil, acompanhamos Maninho, um ex-jogador de futebol profissional que hoje trabalha como ambulante em Brasília, vendendo água e bandeiras das seleções.
O curta-metragem é parte da série A Copa passou por aqui, do canal SporTV. Alguns anos depois de ter colaborado com Adirley Queirós em Fora de campo, Maninho retorna em um contexto que destoa dos sonhos que alimentava no documentário anterior. Nesta retrospectiva, os dois filmes serão exibidos na mesma sessão.
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
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Fantasmas da casa própria
Adirley Queirós e Cássio Oliveira | Brasil | 2016, 5 episódios de 26’ cada, Arquivo digital (Cinco da Norte)
Enquanto um golpe parlamentar depõe a então presidenta eleita Dilma Rousseff, ouve-se falar em algumas coisas estranhas acontecendo por Ceilândia e seus arredores. Lobos circulam pelas ruas. O banco de sangue é roubado e especula-se que possa ter relação com vampiros. Toque de recolher e dispersões de gás se tornam rotina. Pelo menos é o que se tem visto e ouvido por aí. Fantasmas da casa própria é uma série de cinco episódios que aborda a sedimentação dos processos de desigualdades sociais e de raça, a partir das relações de moradia e das disputas em torno do território da cidade. Não é obrigatório assistir aos episódios na sequência para a fruição da série. Exibições gratuitas. Distribuição de ingressos 60 minutos antes das exibições.
Episódio 1 – Golpe
Adirley Queirós e Cássio Oliveira | Brasil | 2016, 26’, Arquivo digital (Cinco da Norte)
Érika Maria é uma jovem de classe média alta engajada nos movimentos pró-impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Durante o processo, ela elabora ações para colaborar com a pauta antigoverno, como a criação de uma ONG e um canal no YouTube que registra sua ação política.
Episódio 2 – Bob
Adirley Queirós e Cássio Oliveira | Brasil | 2016, 26’, Arquivo digital (Cinco da Norte)
Bob Nickson é um solitário cantor de música brega que vaga pelo mundo da noite tocando nas periferias de Brasília. Para quitar sua dívida da casa própria, Bob contrata Barbosa, um corretor de imóveis encarregado de negociar seus shows.
Episódio 3 – Rádio
Adirley Queirós e Cássio Oliveira | Brasil | 2016, 26’, Arquivo digital (Cinco da Norte)
Drica, Agostinho e Barbosa são apresentadores do Ecos da noite, as notícias que brotam de Brasília, um programa feito numa rádio comunitária.
Episódio 4 – Vampiro
Adirley Queirós e Cássio Oliveira | Brasil | 2016, 26’, Arquivo digital (Cinco da Norte)
Em 2016, entre os meses que precedem a mudança presidencial no Brasil e a euforia pela chegada das Olimpíadas do Rio, o governo do Distrito Federal entra com uma ação de processo de venda do edifício Ônix, despejando seus antigos moradores, incluindo Zé Maria, um guia turístico filho de pioneiros da construção com uma estranha obsessão por sangue humano.
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Episódio 5 – MST
Adirley Queirós e Cássio Oliveira | Brasil | 2016, 26’, Arquivo digital (Cinco da Norte)
O cotidiano de luta pela reforma agrária da comunidade Dom Tomas Balduíno, um assentamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra no estado de Goiás.
Sobre este último episódio, escreveu Francis Vogner dos Reis, coordenador curatorial da 25ª Mostra de Tiradentes, edição que rendeu homenagem a Adirley Queirós:
“Mais do que um registro prosaico do dia a dia, o episódio faz uma espécie de ensaio musical da mística do MST, seus cantos em uníssono, sua imagem numerosa de militantes que são voz e imagem desse corpo coletivo. A sequência final, fascinante: crianças do acampamento à noite no escuro e com lanternas cantam dentro de uma barraca de lona. O que liga essa cena a um expediente comum da obra do diretor é aquilo que liga o presente a um outro tempo. No caso aqui não se vai para o passado como geralmente vemos nos filmes de Adirley, mas se avança, se faz uma elaboração sobre o futuro. As crianças cantam o futuro de uma ‘pátria operária e camponesa, livre e forte, construída pelo poder popular’. É nesse ponto, em que crianças cantam um futuro livre, que vemos uma nota diferente de seus outros filmes, nos quais o confronto ao fim se impõe. Aqui, na profecia coletiva das crianças, há a possibilidade de um outro mundo porvir.”
[Citação extraída de: bit.ly/fantasmadirl]
Era uma vez Brasília
Adirley Queirós | Brasil, Portugal | 2017, 100’, DCP (Cinco da Norte)
Em 1959, o agente intergaláctico WA4 é preso e lançado no espaço. Recebe uma missão: vir para a Terra e matar o presidente da República, Juscelino Kubitschek, no dia da inauguração de Brasília. Sua nave perde-se no tempo e aterrissa em 2016 em Ceilândia, cidade-satélite de Brasília. Este é um documentário gravado no ano 0 P.G. (pós-golpe), no Distrito Federal e região.
No 50º Festival de Brasília, o filme recebeu os prêmios de Melhor Direção, Melhor Fotografia e Melhor Som. Em entrevista a Adriano Garret para o portal CineFestivais, um dia após a exibição no festival, Adirley Queirós comenta as ideias em torno do filme e a recepção anticlimática do público:
“A conversa do grupo [da CeiCine – Coletivo de Cinema de Ceilândia] era justamente essa: como que a gente podia radicalizar esse filme? O que estava muito claro é que a gente procuraria uma
narrativa usando poucos elementos e buscando entender como que esses elementos (cenário, fotografia e som) estariam ligados principalmente a uma ideia de deslocamento. Então tinha essa radicalidade, sim, essa vontade de fazer um filme que estivesse fora de uma curva como a do Branco sai, preto fica, que tinha uma curva catártica, ou coisa assim. Então tinha essa vontade de fazer algo que saísse desse lugar.”
“Lá no Branco sai tinha muito essa vontade de fazer um filme que vai explodir Brasília, um filme que vai ser catártico, em que a música será muito presente, no qual as vozes das pessoas serão fundamentais; tinham todos esses elementos que seguravam o filme assim. Já o Era uma vez é muito silencioso, quase não tem música, tem um ou outro encontro de diálogo, e eles são muito vazios, porque estamos em um momento que é muito isso, né, cara? Esse discurso todo não leva a lugar nenhum. Há muito discurso e pouca possibilidade de que esse discurso se efetive entre nós enquanto uma ação.”
“A sensação que eu tive com o Era uma vez é exatamente a sensação que tive com Dias de greve, igualzinha, só que a pauta era outra. Naquele momento era pior ainda, porque eu tinha feito o Rap, o canto da Ceilândia, que estourou, o público em Brasília riu, bateram palma pra caralho, o que inclusive me incomodou na época. Depois, em 2009, quando lancei o outro filme, tinha uma expectativa enorme, ‘o cara que fez o Rap’, e lembro que me perguntaram: ‘Por que você não seguiu o caminho do Rap? Por que você não foi nesse caminho de positividade, de todo mundo junto, unido?’ E no Dias de greve foi exatamente o mesmo disso agora, porque é um filme que cai
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num vazio, dá uma deprê, as pessoas comentam pouco, muita gente não gosta, falam que o filme é triste, melancólico.”
“O que se esperava nesse momento então era um filme que estivesse antenado com a pauta política de Fora Temer. Meu filme não é Fora Temer, ele é anti-Temer. Eu não estou dizendo ‘fora Temer’, eu estou dizendo ‘saia daí, usurpador, você tem que ser punido, condenado por isso, você tem que pagar por um crime de lesa-pátria que você tá fazendo de dilapidação de todo um imaginário brasileiro, dilapidação das leis de trabalho’, essas coisas todas. O que a gente está falando com o filme é bem por aí.”
Era uma vez Brasília marca o início da colaboração do diretor com Joana Pimenta, que aqui assina a direção de fotografia e é diretora, junto a Adirley, de Mato seco em chamas.
[A íntegra da entrevista pode ser lida em: bit.ly/ eraumadirl]
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Mato seco em chamas
Joana Pimenta e Adirley Queirós | Brasil, Portugal | 2022, 153’, DCP (Vitrine Filmes)
Léa conta a história das Gasolineiras de Kebradas, tal como ecoa pelas paredes da Colmeia, a prisão feminina de Brasília, Distrito Federal, Brasil.
A dupla Joana Pimenta e Adirley Queirós já havia trabalhado junta em Era uma vez Brasília (2017), ela como fotógrafa e ele como diretor. Neste novo filme, constroem, junto a talentoso elenco e reduzida equipe, um conto em torno de um grupo de mulheres que encontra petróleo e começa a produzir a própria gasolina num terreno em Sol Nascente, em Ceilândia. A partir de então, elas marcam seus nomes nos jogos de poder e na história da região.
Sobre a seleção do elenco, Joana Pimenta comenta em entrevista à crítica e pesquisadora Lorenna Rocha: “Quando escolhemos as pessoas com quem vamos trabalhar, nós a escolhemos porque temos uma grande curiosidade, um grande interesse em saber mais sobre elas. Talvez mais do que elas estarem ou não próximas do papel ou
arquétipo que construímos, sabe? Porque filmamos sem roteiro, né? Então, escolhemos pessoas com quem nós queremos viver durante 18 meses. Com quem achamos que vamos estar muito interessados naquilo que elas têm para dizer. Então, essa curiosidade, a performance dessa curiosidade, do encontro da câmera e do corpo da atriz, torna-se essencial. Muitas vezes nós não sabemos o que elas vão falar, nem para onde vão se mexer. Nosso trabalho de direção e de direção de fotografia é quase fazer performance ao vivo. [...] Por isso acho também que, quando a gente faz o trabalho de seleção das atrizes, pode até demorar muito, mas é imediato. Procuramos a personagem de Chitara durante seis meses. Mas quando conversamos com a Chitara, foi tudo muito imediato. A sensação era que nós queríamos saber tudo sobre ela.”
“Não queríamos fazer um filme com a premissa do empoderamento”, declara Adirley em outro momento da mesma entrevista. “Nos primeiros roteiros, a personagem Chitara chamava-se Pantera. Essa coisa ‘clássica’ de querer empoderar. Mas, depois… Chitara vem de onde? Dos Thundercats, pô! A Chitara [interpretada por Joana D’Arc Furtado], quando era pequena, na roda de capoeira, era chamada de Chitara. Essa coincidência, muito espiritual, apareceu. Chitara e Léa propõem esse jogo da roda também, sabe? Porque, apesar de serem irmãs, elas se reencontraram no filme. Mato seco em chamas produz um elemento que é criar um mundo em que elas possam existir, que as lendas delas, que não são de derrota, possam existir.”
“O povo periférico, quando tem 40, 50 anos, tem muito isso de esconder suas histórias, porque
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Filmes em cartaz
elas são sempre associadas a maloqueiros, puta, a tudo que é visto como pejorativo, não o contrário. O filme propõe que essas histórias que vão ser contadas por elas não sejam histórias de derrotadas. São lendas. Vocês [Léa, Andréia e Chitara] são lendas do cinema brasileiro, do cinema mundial. [...] O empoderamento aqui é no sentido de dizer: ‘Essa história é minha, sou dona dessa história, eu sei a lenda que existia nos anos 1980. Eu sei como vivi a cadeia. E a cadeia, apesar de ser pesada, a gente só sobrevive nela contando e recontando nossas aventuras, entendeu?’”
Ingressos: R$ 15 (inteira) e R$ 7,50 (meia).
Close
Lukas Dhont | Bélgica, Holanda, França | 2022, 104’, DCP (O2 Play)
A intensa amizade entre dois garotos de 13 anos de idade, Leo e Remi, é subitamente interrompida. Lutando para entender o que aconteceu, Leo se aproxima de Sophie, a mãe de Remi.
Close é o segundo longa-metragem de Lukas Dhont e rendeu ao diretor o Grande Prêmio do Júri do Festival de Cannes 2022, junto a Stars at Noon, de Claire Dennis, e uma indicação ao Oscar 2023 de Melhor Filme Estrangeiro. Em entrevista à revista Vanity Fair, Dhont comenta:
“O momento em que eu percebi, ‘ok, este é um novo trabalho’, foi quando me deparei com uma pesquisa da psicóloga nova-iorquina Niobe Way, que acompanhou a vida de 150 meninos ao longo de cinco anos. Quando ela os entrevistou aos 13 anos e eles falavam sobre seus amigos, contavam como se fossem histórias de amor. Eles se atreviam a usar a palavra ‘amor’ um para o outro
da maneira mais delicada e bonita. E, então, conforme ela os acompanha, você percebe como esses meninos, à medida que eles crescem e as expectativas de masculinidade se tornam mais fortes sobre eles, se desconectam completamente dessa linguagem. Sinto que vivemos em uma sociedade em que masculinidade e intimidade são conceitos muito difíceis de se entrelaçar. Sinto que dizemos aos homens que o único lugar onde eles podem encontrar intimidade neste mundo é através do sexo e que expressar amor e vulnerabilidade para outro homem parece ser algo impressionantemente complexo. Muitas vezes temos imagens de comportamento tóxico – de violência, de guerra – representadas quando se trata de masculinidade, mas raramente vemos uma amizade íntima e bonita em que dois meninos se deitam juntos na cama e só querem estar tão próximos quanto são capazes. [...] Em Close, nós tentamos verdadeiramente fazer uma obra que abordasse, por um lado, a fragilidade e a ternura, mas também o que acontece quando privamos os jovens dessa fragilidade.”
[Íntegra da entrevista, em inglês: bit.ly/closeluk]
Ingressos: terça, quarta e quinta: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia); sexta, sábado, domingo e feriados: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia).
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[Íntegra da entrevista em: bit.ly/jamatoseco]
Medusa
Anita Rocha da Silveira | Brasil | 2021, 127’, DCP (Vitrine Filmes)
Uma reinterpretação livre do Brasil nos anos do governo Bolsonaro, filmada como uma distopia em que o fator social evangélico define normas estéticas, morais e de comportamento. O filme de Anita Rocha da Silveira encontra-se em algum lugar entre o Rio de Janeiro realista e o do cinema autoral de gênero híbrido, sci-fi, gótico. Mulheres jovens agridem-se sob a sombra de uma mítica liderança, homens obedecem à filosofia de milícias armadas e religiosas. Uma enorme liberação de energia.
“Meu ponto de partida para Medusa foi uma série de reportagens que eu li sobre garotas que se juntavam para bater em outras garotas”, conta a diretora Anita Rocha da Silveira em entrevista ao Papo de Cinema. “[A vítima] era considerada promíscua, por conta das fotos que postava nas redes sociais, que seriam fotos sensuais demais, e, nesse discurso, era importante deixar a vítima feia, cortar sua cara ou seu cabelo. [...] Eu vi como essa violência contra mulheres passava pelo avanço conservador.”
Medusa teve sua estreia mundial na Quinzena dos Realizadores, em Cannes, em 2021. No Festival do Rio, recebeu os prêmios de Melhor Direção, Melhor Longa-Metragem e Melhor Atriz Coadjuvante.
[Assista à entrevista completa: bit.ly/medusaan]
Ingressos: R$ 15 (inteira) e R$ 7,50 (meia).
O massacre da serra elétrica
The Texas Chainsaw Massacre
Tobe Hooper | EUA | 1974, 83’, DCP (Synapse)
Disfarces de pele na cara. O filme de Tobe Hooper é uma máquina de energia que se alimenta de ansiedade e da sugestão da ação violenta, um mecanismo de tensão como poucos no cinema. Vê-lo numa sala de projeção é uma experiência poderosa e memorável. Uma família caipira vive isolada no interior do Texas. Sua casa é um açougue para os inocentes. Uma obra de arte radical em imagem, montagem e som.
“O massacre da serra elétrica surge da minha sensibilidade e minhas reações aos tempos”, disse Tobe Hooper ao jornalista Phil van Tongeren por ocasião da exibição da restauração 4K de seu filme no Offscreen Festival, em Bruxelas. “Estudei o que é que fazia os filmes de horror funcionarem e decidi ambientar uma história no território da morte. Um fator importante foi preparar o público com uma atmosfera meio assustadora e pegajosa. Depois daquela primeira cena no cemitério, o filme começa a construir um manto… pegajento. Essa é uma boa palavra, ainda que eu não saiba se é de fato uma palavra.”
[Íntegra da entrevista de Tobe Hooper, em inglês: bit.ly/tbserra]
Ingressos: terça, quarta e quinta: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia); sexta, sábado, domingo e feriados: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia).
O último país
Gretel Marín | Brasil, Cuba, Angola | 2018, 70’, DCP (CUP Filmes)
O último país foi filmado em 2015, quando a diretora Gretel Marín decidiu voltar a Cuba para testemunhar as mudanças que estavam acontecendo no seu país de origem e questionar o que elas significavam para amigos, vizinhos e a população em geral. Nesse processo, a diretora acaba por realizar também uma investigação interior em torno de patriotismo, esperança, pertencimento e das próprias contradições.
“Viver longe de Cuba não me parecia dramático até começar a entender que o país iria mudar e que eu não estaria lá para testemunhar”, declara Marín. “Eu sabia que Cuba precisava se abrir ao mundo, mas temia que com essa renovação o melhor de um sistema cheio de contradições e utopias também desaparecesse.”
Ingressos: terça, quarta e quinta: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia); sexta, sábado, domingo e feriados: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia).
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Perlimps
Alê Abreu | Brasil | 2022, 80’, DCP (Vitrine Filmes)
Claé e Bruô são agentes secretos de reinos rivais. Eles precisam superar suas diferenças e unir forças para buscar os Perlimps, criaturas misteriosas capazes de encontrar um caminho para a paz em tempos de guerra. Indicado ao Oscar de Melhor Animação em 2016 por O menino e o mundo, o diretor Alê Abreu estreou Perlimps na edição de 2022 do Festival de Animação de Annecy. “No meu processo de trabalho”, comenta o diretor em entrevista ao portal Tela Viva, “vou colecionando fragmentos, coisas que me chamam a atenção, me brilham aos olhos e ao coração e vou guardando. Sempre foi assim. Quando estava terminando O menino e o mundo, já tinha anotações do que seria meu próximo projeto. [...] Tinha uma cena na cabeça, um momento que considero o começo de tudo e que representa o que o filme mais tarde virou. É um menino saindo da floresta, todo maquiado, e caindo numa poça d’água. Sai dela e vemos na água o espe-
lho desse menino, que revela que ele estava em outro lugar, como se fosse outra dimensão. Ele sai inundado para um lugar mais mundano, pé no chão. Isso é o que talvez simbolize o que temos. Foi o plano que mais me disse a respeito do que eu queria fazer.”
“Tudo veio daqueles papéis de ideias e referências que eu tinha no início. São como peças lançadas num tabuleiro, que instigam a gente a criar e como conectá-las entre si. Esse foi o desafio. A questão da polarização, por exemplo, já estava no inconsciente da gente. Ela aparece no filme meio escondida, com a força da metáfora. Eu mesmo entendi isso só depois. É quase que um caminho às avessas: ouço o inconsciente e, mais tarde, busco explicação. Nesse ‘buscar explicação’ entendi a força dessas personagens.”
[Depoimentos de Alê Abreu extraídos de: bit.ly/ aaperlimps]
Ingressos: terça, quarta e quinta: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia); sexta, sábado, domingo e feriados: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia).
Sessão especial
Edifício Master
Eduardo Coutinho | Brasil | 2002, 110’, 35 mm (VideoFilmes)
Durante uma semana, Eduardo Coutinho e sua equipe conversaram com 27 moradores de um enorme edifício de apartamentos em Copacabana. Entre eles, um casal de meia-idade que se conheceu pelos classificados de um jornal, uma garota de programa que sustenta a filha e a irmã, um ator aposentado, um ex-jogador de futebol e um porteiro desconfiado de que o pai adotivo, com quem sonha toda noite, é seu pai verdadeiro. Uma oportunidade de assistir a um dos grandes documentários da carreira de Eduardo Coutinho em cópia 35 mm. Em 2002, o filme recebeu o Kikito de Ouro de Melhor Documentário no Festival de Gramado e o Prêmio de Melhor Documentário pela crítica da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Em entrevista a Ruy Gardnier, Eduardo Valente e Cleber Eduardo para a revista Contracampo, Coutinho relata:
“O filme nasceu da ideia da Consuelo Lins, que trabalha comigo, de fazer um filme sobre um prédio em Copacabana. Eu então roubei a ideia, com o consentimento dela, porque me interessava filmar em um universo com limites claros. Não queria fazer filme sobre a classe média, mas sobre um universo que não se conhece. Tinha de ser em prédio grande, de apartamentos conjugados e com perfil familiar, caso contrário inviabilizaria a filmagem. O desafio seria extrair um material interessante de pessoas normais. É muito mais fácil fazer um filme sobre marginais que sobre pessoas de classe média.”
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“No caso do Master, achei que ia me lascar. As experiências de vida eram menos fortes, as pessoas eram mais fechadas, a narrativa das experiências era menos rica. Eu precisaria de muitos personagens para dar um filme. Não haveria relatos extraordinários. A diversidade de experiências é que seria essencial naquele universo. Tinha de ser um filme longo, de quase duas horas, com 27 apartamentos. Cortamos 10. Também não podia ter eixo temático, ao contrário de Santo forte e Babilônia 2000. O prédio é apenas uma pista falsa. Isso era um complicador dramatúrgico. Como eu ordenaria esse material se havia todos os temas possíveis? Decidi pela montagem caótica. Procurei conservar a ordem da filmagem, que não tinha um padrão. Isso não leva ninguém a ter certeza do que virá depois de cada personagem. Não há uma regra.”
“Talvez pelas histórias de vida do Edifício Master serem menos extraordinárias que as de Santo forte e Babilônia 2000, fica mais evidente que o importante é como os personagens falam de si e não o que eles estão falando. A garota de programa sintetiza essa ideia ao dizer que precisa acreditar em suas mentiras para contá-las. Não interessa, então, nem se o relato é verdadeiro. Interessa a narrativa em si.”
Sessão Mutual Films
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Tesouros do Irã: Filmes do Estúdio Cinematográfico Golestan
Antes da Revolução Islâmica de 1979, o Irã passava por um período de crescente desenvolvimento tecnológico e social, porém, permeado pela violência do reinado do xá Mohammad Reza Pahlavi, que, além de oprimir críticos e opositores políticos, estava envolvido em diversos casos de corrupção. Imerso nesse ambiente de conflitos e desilusões, o escritor, tradutor, fotógrafo e cineasta Ebrahim Golestan (nascido em 1922) produziu o conjunto de sua obra cinematográfica através do primeiro estúdio independente de cinema de seu país. A Sessão Mutual Films apresenta uma seleção desses filmes (todos restaurados pela Cinemateca de Bolonha) ao longo de dois programas. Enquanto os curtas-metragens documentais do Estúdio Cinematográfico Golestan da década de 1960
oferecem críticas sociais abordando temas variados, como a indústria de petróleo, a vida camponesa durante uma reforma agrária e o legado da família real iraniana através de suas joias e tesouros, o longa-metragem de ficção Tijolo e espelho (1964) mistura dramaturgia neorrealista com elementos documentais ao retratar um casal de classe trabalhadora em Teerã que entra em crise ao deparar-se com um bebê abandonado. As exibições no Rio de Janeiro serão apresentadas presencialmente pela cineasta iraniana Mitra Farahani, que dirigiu um documentário sobre Golestan e produziu as restaurações de seus filmes. As exibições em São Paulo, além dos filmes dirigidos por Golestan, contarão com o aclamado curta-metragem documental do estúdio, A casa é escura (1962), dirigido pela renomada poeta iraniana Forough Farrokhzad.
A curadoria e produção da Sessão Mutual Films são de Aaron Cutler e Mariana Shellard.
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[Íntegra da entrevista em: bit.ly/ecedmaster]
Curtas do Estúdio Cinematográfico Golestan
Ebrahim Golestan/Forough Farrokhzad | Irã | 1961-
1965, 69’ (IMS Rio) / 91’ (IMS Paulista), 35 mm para DCP (Cinemateca de Bolonha)
Um fogo
Yek atash
Ebrahim Golestan | Irã | 1961, 25’, DCP
Colheita e semente
Kharman va bazr
Ebrahim Golestan | Irã | 1965, 29’, DCP
As joias da coroa iraniana
Ganjineha-ye Gohar
Ebrahim Golestan | Irã | 1965, 15’, DCP
No final da década de 1950, Ebrahim Golestan montou uma pequena equipe de jovens técnicos para iniciar o Estúdio Cinematográfico Golestan, a primeira produtora independente de cinema no Irã. Entre 1958 e 1967, a produtora realizou diversos documentários de curta e média-metragem sobre as riquezas e mazelas do país. O programa no IMS apresenta três desses filmes que foram dirigidos pelo próprio Golestan.
O impactante Um fogo, vencedor de dois prêmios no Festival Internacional de Cinema de Veneza, retrata de forma processual os esforços de uma equipe de trabalhadores para conter as chamas de uma fuga de gás em um poço de petróleo no sudoeste do Irã. Com uma abordagem sutilmente crítica, as imagens impressionantes da labareda de fogo expressam o poder destrutivo do dinheiro sobre a natureza. Colheita e semente apresenta a situação de permanente escassez de pequenos agricultores iranianos, mesmo após a reforma agrária do início dos anos 1960, através de uma série de conversas in loco com os habitantes de uma aldeia empobrecida. O filme, que foi censurado e confiscado à época e exibido fora do Irã apenas décadas depois, é uma crítica explícita a uma reforma malsucedida em termos da democratização da terra. As joias da coroa iraniana foi comissionado pelo então diretor do Banco Central do Irã, porém Golestan não poupou críticas ao luxo e excessos da família real frente à vida sofrida de grande parte da população. O filme confronta imagens fotográficas, filmagens das vastas paisagens do país e de camponeses arando a terra com as das inestimáveis joias reais que se encontram no Museu do Banco Central do Irã. Logo no início, ouvimos a narração de Golestan enquanto estu-
damos as joias resplendentes de perto: “Esses tesouros não possuem equivalentes em tamanho e valor. Eles foram deixados pelos reis. Eles também são a história de um povo.”
As exibições do programa em São Paulo também contam com o filme A casa é escura, que foi produzido por Golestan, comissionado pela Sociedade de Assistência à Pessoa com Hanseníase e dirigido por Forough Farrokhzad, uma celebrada e polêmica poeta iraniana que compunha a equipe do estúdio (no Rio de Janeiro, A casa é escura passará em março na Cinemateca do MAM). O filme é fruto dos 12 dias que Farrokhzad passou em uma colônia de pessoas com hanseníase perto da cidade de Tabriz, após conseguir a confiança dos que ali viviam isolados em uma condição deplorável devido à doença e que possuíam um forte ressentimento daqueles que vinham de fora para observá-los. Ela se deu conta de que a vida ali não era diferente do cotidiano de qualquer outro ser humano, e assim convidou o público a perceber o comum numa condição limítrofe. Testemunhamos o cotidiano de homens, mulheres e crianças em diferentes estágios da doença, enquanto ouvimos informações objetivas sobre a hanseníase, narradas por Golestan, e uma súplica a Deus, narrada por Farrokhzad. A casa é escura, que ganhou a competição principal do Festival Internacional de Curtas-Metragens de Oberhausen e é tido hoje como um dos melhores documentários de todos os tempos, é ao mesmo tempo uma alegoria sobre uma sociedade doente e um chamado compassivo contra o preconceito.
Os filmes do programa foram restaurados em 4K pela Cinemateca de Bolonha dentro de um
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projeto maior da restauração da obra do Estúdio Cinematográfico Golestan. As restaurações foram produzidas por Mitra Farahani, cineasta iraniana e autora de um documentário sobre Golestan (Até sexta, Robinson / À vendredi, Robinson, de 2022), que irá introduzir o programa presencialmente no IMS Rio.
Tijolo e espelho
(Khesht o Ayeneh)
Ebrahim Golestan | Irã | 1964, 130’, 35 mm para DCP (Cinemateca de Bolonha)
“Nada refletia/ Nos olhos da coruja além de angústia/ Medo era o único sinal de vida”, ouve-se no rádio do táxi de Hashem (interpretado por Zackaria Hashemi), enquanto ele dirige pela noite escura de uma Teerã moderna, em 1963. O poema narrado pelo diretor de Tijolo e espelho, Ebrahim Golestan, define o temperamento do filme e de uma época na qual a desigualdade social e a repressão do Estado dominavam a vida cotidiana no Irã. O taxista de classe média baixa se depara com um bebê abandonado por uma passageira no banco de trás de seu carro. Ele procura desesperadamente pela mulher e encontra apenas ruínas. No esqueleto de um edifício em construção, residem três pessoas: uma velha, uma grávida em prantos abandonada pelo marido e um músico com deficiência física. Dali, Hashem segue para o bar onde deve entregar o táxi a um colega, que o recebe furioso. Senta-se com um grupo de amigos que, ao vê-lo com a criança nos braços, logo começam um parlapatório de julgamentos. A garçonete Taji (interpretada por Taji Ahmadi), amante de Hashem, expressa compaixão diante da situação e passa a acompanhá-lo na jornada em busca de uma solução. Eles caminham por ruas comerciais dormentes, discutem sobre ficar ou não com o bebê e expressam a intimidade de um casal em crise em uma cidade cosmopolita e esfacelada.
O título do primeiro longa-metragem de ficção de Golestan vem de versos do poeta persa
clássico Attar de Nixapur: “O que o Jovem vê no espelho, o Velho vê no tijolo de lama”. O filme foi realizado por uma equipe de cinco pessoas, com várias interrupções por motivos técnicos. Golestan o realizou após dirigir uma sequência notável de curtas-metragens documentais e casou o impulso documental de filmar atores não profissionais em locações reais com uma forte sensibilidade literária. Ao longo de sua jornada, o angustiado Hashem e a esperançosa Taji se deparam com personagens que funcionam, junto às vozes no rádio, como uma espécie de coro, entre eles, um policial sóbrio, um doutor agitado, uma enfermeira de orfanato amargada pelo abandono constante de bebês e um tabelião que questiona a viabilidade de criar filhos. Todos vivem sob uma cortina de paranoia que perdura de uma noite sombria ao dia seguinte incerto.
Tijolo e espelho foi selecionado para a competição do Festival Internacional de Cinema de Veneza em 1964, porém, por razões logísticas, estreou apenas no ano seguinte, no Festival Internacional de Novo Cinema de Pesaro. Nas décadas subsequentes, ele ganhou reputação como a primeira obra-prima de ficção do cinema moderno iraniano, e passou a ser uma referência crucial para a nova onda cinematográfica do país e para as gerações subsequentes de artistas. O filme foi restaurado pela Cinemateca de Bolonha em 4K, em 2018, a partir do negativo original de câmera e do negativo iraniano de som, sob a supervisão do cineasta. A sessão de Tijolo e espelho no IMS Rio será introduzida presencialmente pela cineasta iraniana Mitra Farahani, que produziu a restauração.
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Curadoria de cinema
Kleber Mendonça Filho
Programadora de cinema
Marcia Vaz
Programador adjunto de cinema
Thiago Gallego
Produtora de programação de cinema
Quesia do Carmo
Assistente de programação/ produção
Lucas Gonçalves de Souza
Projeção
Adriano Brito e Edmar Santos
Legendagem eletrônica
Pilha Tradução
Revista de Cinema IMS
Produção de textos e edição
Thiago Gallego e Marcia Vaz
Diagramação
Marcela Souza e Taiane Brito
Revisão
Juliana Travassos e Flávio Cintra do Amaral
Os filmes de março
O programa do mês tem o apoio da Mutual Films, da Cinemateca de Bolonha, da produtora Cinco da Norte, das distribuidoras CUP Filmes, O2 Play, Synapse, VideoFilmes, Vitrine Filmes e do projeto Sessão Vitrine. Agradecemos a Adirley Queirós, Andreia Queirós, Joana Pimenta, Carol Almeida, Aaron Cutler, Mariana Shellard, Abbas Milani e Franco Errico, da Universidade de Stanford, Ehsan Khoshbakht, Emanuela Siqueira, Joana Ascensão e João Pedro Bénard, da Cinemateca Portuguesa, José Quental e Cinemateca do MAM Rio, Mehrnaz Saeed-Vafa, Mitra Farahani e Écran Noir Productions, Tadeu Capistrano, da UFRJ, e Thaís Chagas.
Meia-entrada
Com apresentação de documentos comprobatórios para professores da rede pública municipal, estudantes, menores de 21 anos, portadores de Identidade Jovem, maiores de 60 anos, pessoas que vivem com HIV e aposentados por invalidez. Cliente Itaú: desconto para o titular ao comprar o ingresso com o cartão Itaú (crédito ou débito).
Venda de ingressos
Sessão Mutual Films
Ingressos à venda na bilheteria, para sessões do mesmo dia. Vendas antecipadas no site ingresso.com. Ingressos e senhas sujeitos à lotação da sala (113 lugares).
Devolução de ingressos
Em casos de cancelamento de sessões por problemas técnicos ou por falta de energia elétrica, os ingressos serão devolvidos. A devolução de entradas adquiridas pelo ingresso.com será feita pelo site Sessões para escolas e agendamento de cabines pelo telefone (21) 3284 7400 ou pelo e-mail imsrj@ims.com.br.
Programa sujeito a alterações. Acompanhe nossa programação em cinema.ims.com.br e facebook.com/cinemaims.
As seguintes linhas de ônibus passam em frente ao IMS Rio:
Troncal 5 - Alto Gávea - Central (via Praia de Botafogo)
112 - Alto Gávea - Rodoviária (via Túnel Rebouças)
538 – Rocinha - Botafogo
539 – Rocinha - Leme
Ônibus executivo Praça Mauá - Gávea.
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Exibição Edifício Master
Edifício Master, de Eduardo Coutinho (Brasil | 2002, 110’, 35 mm)
Colheita e semente (Kharman va bazr), de Ebrahim Golestan (Irã | 1965, 29’)
Visitação
Terça a sexta, das 12h às 18h
Sábado, domingo e feriados (exceto segundas), das 10h às 18h
Entrada gratuita.
Mais informações: ims.com.br
Rua Marquês de São
Vicente 476
CEP 22451-040
Gávea – Rio de Janeiro
21 3284 7400
imsrj@ims.com.br
ims.com.br
/institutomoreirasalles
@imoreirasalles
@imoreirasalles
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