INSTITUTO MOREIRA SALLES
CINEMA
R E T R O S P E C T I VA
ABRIL 2017
J OÃO P EDR O R ODRIGUES
JOÃO PEDRO RODRIGUES
O ponto de partida para esta nossa revisão da obra do realizador português João Pedro Rodrigues é o lançamento brasileiro do seu mais recente filme, O ornitólogo, que estreou em agosto último na competição do Festival de Locarno. A descoberta desse filme um tanto biológico e carnal, sacro e aventureiro, nos sugere oferecer esta oportunidade de (re)descobrir em sala de cinema a obra completa de um dos grandes autores contemporâneos. João Pedro Rodrigues opera a partir de uma ideia inicial de cinema de Portugal, mas que se desenvolve rumo à leveza, não apenas na liberdade de pensar e ser da natureza humana, mas que deseja o mundo, muitas vezes a partir de Lisboa. Vale ressaltar que sua obra tem destaque, como já defendemos acima, no cinema atual como um todo, mas é possível também pensá-la como blocos de enorme interesse numa cinematografia portuguesa nesse momento histórico pós-João Cesar Monteiro (1939-2003) e, em especial, Manoel de Oliveira (1908-2015), que, para o bem e para o mal, exerciam o papel de astros de primeira grandeza nas imagens e ideias filmadas em Portugal.
De 30 de março a 12 de abril, o IMS-RJ realiza uma retrospectiva da obra de João Pedro Rodrigues, com exibições em 35 mm de O fantasma, Odete, Morrer como um homem e Parabéns!, além de exibições em DCP dos demais filmes do realizador. No sábado, 8 de abril, às 16h30, será exibido O ornitólogo, seguido por conversa entre João Pedro e João Rui Guerra da Mata e Kleber Mendonça Filho.
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O programa que organizamos no IMS chega também num momento em que João Pedro tem exatos 50 anos. Sua trajetória, que começou no final dos anos 1980, é marcada por um trânsito constante pelo multiformato, e muito nos agrada poder exibir filmes de diferentes durações, tanto em cópias 35 mm como em digital. Afirmo isso pois se torna cada vez mais difícil a programação de copias em película, por isso também uma das nossas defesas constantes nesse trabalho de curadoria e difusão do cinema na segunda década dos 2000. O fluxo de cinco longas-metragens de JPR até agora é marcado pela constância do curta-metragem e do que alguns chamam de “média”, aparentemente sem as preocupações e os abandonos frequentes dos formatos mais curtos (e menos “nobres”), observados na maior parte dos realizadores no mundo. De fato, os filmes de curta duração de João Pedro Rodrigues guardam chaves tão importantes para observar a sua obra como os longas, que inegavelmente fizeram o seu nome a partir de estreias prestigiosas em Veneza, Cannes (Quinzena dos Realizadores, Un Certain Regard) e Locarno. Como pode ocorrer em primeiros filmes (muitos deles curtas-metragens), seu segundo curta, Parabéns! (1997), traz coordenadas para entender o ponto de vista marcado desse autor. Em Parabéns!, um rapaz recebe no dia de seu aniversário uma amorosa chamada telefônica da namorada, mas logo ele próprio percebe que há um homem na sua cama. Como geralmente ocorre em lotes de filmes mostrados juntos, conexões tornam-se possíveis, como associar Parabéns! à chamada telefônica de O que arde cura (filme de
João Rui Guerra da Mata de 2012, com quem realizou a boa vibe que é o curta China, China). Rui é o parceiro artístico de João Pedro, e é JPR quem atua ao telefone em O que arde cura. Esse telefonema existe não apenas como comunicação de afeto, mas como expressão de um amor bruto por Lisboa, num momento histórico e simbólico do bairro do Chiado. Sabe-se que O fantasma, o primeiro longa-metragem (2000) de JPR, com base afetiva de Louis Feuillade, teve impacto no cinema português pelo pioneirismo de abordar com franqueza um personagem homossexual. Sérgio vaga por uma Lisboa claramente associada ao lixo. Seria isso fruto de um autor que desbravava território virgem não apenas no seu cinema, mas nas imagens produzidas na sua cidade e no seu país? Os filmes de João Pedro não parecem encaixar-se tão facilmente no rótulo queer. Essa obra parece ir ainda mais longe, com filmes marcados pelo melodrama, o pop, o fetiche e questões de gênero. Um filme pé na porta, e bruto, que é O fantasma nos levaria a Odete (2005), a observação de uma mulher, caixa de supermercado e filmada com patins de rodinhas nos pés, que passa a crer num tipo de transmigração da alma pelo corpo a partir da morte de um homem e da proximidade com o companheiro do morto. A atmosfera de uma escola literária romântica remixada com o toque inconfundível de um autor moderno ajudou a sedimentar João Pedro como um realizador que já parecia completo, e que viu em Morrer como um homem (2008) uma expansão ainda maior dos seus super talentos. Se temos o homem lutando contra seu corpo em Morrer como um homem (“Eu vivi como uma mulher e quero morrer como um homem”), a personagem, envenenada por silicone vazado no organismo, e o filme parecem fugir com gosto das próprias convenções de um cinema normalmente queer, da afirmação fácil de uma identidade. No mesmo tema, veja O corpo de Afonso (2012), um filme sensacional sobre história e a imagem masculina, cujo fato de ter sido feito sob encomenda (Fundação da Cidade de Guimarães) nos diz algumas coisas sobre JPR. E quando essas observações nos levam a um mercado de animais em Macau (Alvorada vermelha, 2011) ou à crônica fantástica de uma festa popular de rua transformada numa espécie de estonteante zombie movie (Manhã de Santo António, 2012), as imagens de João Pedro Rodrigues ganham a larga expansão confirmada em O ornitólogo, em que pela primeira vez usa tela larga CinemaScope. Esse filme de aventura rio abaixo e floresta adentro mantém sua origem luso-ibérica em cada quadro, e enriquece essa filmografia única, cuja escrita deve ser descoberta sempre. Kleber Mendonça Filho 3
ENTREVISTA: JOÃO PEDRO RODRIGUES
A conversa abaixo, entre João Pedro Rodrigues e Antoine Barraud, foi extraída do livro Le jardin des fauves [O jardim das feras, em tradução livre], publicado na França por Post-Editions em parceria com o Centro Georges Pompidou. No livro, esta série de conversas revela o processo criativo, os métodos e as inspirações de João Pedro Rodrigues. Agradecemos a Antoine Barraud, a Sebastien Raimondi e ao próprio João Pedro Rodrigues pela publicação do trecho que segue. Durante a filmagem de O ornitólogo, você dizia que não sabia quantos planos haveria em tal ou tal cena, e quando eu perguntava isso ao seu assistente, ele respondia que também não sabia. É verdade, talvez seja o filme em que eu tenha feito a decupagem mais tarde. Eu a descobri ao longo do processo. A cada noite antes da filmagem e durante a própria filmagem. Era sobretudo à noite, quando eu preparava a cena do dia seguinte, que eu começava a ter ideias. Em uma filmagem, que parte você deixa para o imprevisto? Eu tento não deixar nada ao sabor do acaso, tento prever tudo. Ao mesmo tempo, eu tento também deixar tudo ao acaso, pois não quero ser muito rígido em relação a alguma coisa, como eu talvez tenha sido no início. Eu preparo muito também, porque fico angustiado com o início de uma diária em que eu não saberia o que fazer. Eu me sentiria perdido. Eu tenho que ter ao menos uma ideia. Em seguida, ela pode evoluir quando eu ensaio com os atores. Para este filme, muitas cenas envolvem um único personagem. Esse personagem evolui em um espaço determinado e há poucas interações com outros personagens que poderiam justificar uma mudança da decupagem, levar a outros modos de fazê-la. Mas eu acho que, em dado momento, tudo se tornou bastante natural, à medida que eu conhecia Paul, eu conhecia também seu corpo. Quando você chega num set com tudo na cabeça, é uma satisfação fazer tudo como previsto ou uma decepção relativa? Eu tento sempre me surpreender comigo mesmo de uma maneira ou de outra. Nos outros filmes, eu tinha feito um número maior de ensaios nas próprias locações, porém dessa vez, como encontramos Paul relativamente tarde, não pudemos ensaiar na locação, no norte de Portugal. Então ensaiamos na minha casa, o que é bem diferente. Ainda mais que os ensaios tinham muitas vezes cenas com diálogos, e Paul ainda não falava português! Era um obstáculo.
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O que você ensaia quando ensaia? Você realmente ensaia o texto? Porque, com exceção de Odete, em que a interpretação é mais excessiva, você pede com frequência aos seus atores uma atuação mais neutra… Em Morrer como um homem, por exemplo, como se tratavam de atores que vinham sobretudo do mundo do espetáculo, eles tinham a tendência a exagerar nas atuações. Maria Bakker, ela também, exagerava, mas isso correspondia perfeitamente ao que eu procurava. Maria Bakker é uma planta selvagem, é preciso deixá-la ser o que é! Aliás, você a deixa ser o que é… Neste filme, estamos bem próximos da concepção que Robert Bresson tinha dos atores, de um lado, o modelo, a "não atuação", subentendido que é a encenação, sozinha, que permitirá exprimir a emoção; por outro lado, aquela de Jacques Rivette, que pede apenas aos atores que “sejam”. Na filmagem de Morrer como um homem, Fernando Santos, que fazia o papel de Tonia, tinha um modo de atuação muito diferente daquele de Alexander David, o jovem que encarna Rosário. No início era muito difícil. Talvez seja o filme em que eu tenha encontrado a maior dificuldade para achar um bom equilíbrio. Ao filmar, entendi que não seria preciso “conter” tanto Fernando/Tonia, porque isso se tornaria falso. Ela
As personagens Maria Bakker e Paula, de Morrer como um homem, de João Pedro Rodrigues.
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deveria parecer um pouco exagerada, em seu personagem de mulher não mais tão nova, infeliz e um pouco sofredora… Talvez seja isso o que você sugere: ela deveria ser “ela”. Ela deveria no entanto ser “quem ela é” (ou quem ele é, eu não sei como dizer). Alexandre é bem mais neutro. Essas atuações distintas trouxeram algo ao filme, enquanto que, no início, eu tinha a tendência de tirar demais, de dizer muito “não” ou “menos, menos, menos”. No modelo bressoniano, tiramos… tiramos o falso sentimento, a intenção, a entonação, tiramos, tiramos, tiramos. Em Rivette, deixamos os atores “ser”, o que é bem diferente. Rivette trabalhou com Bulle Ogier ou com outras atrizes em diversos filmes, mas ele às vezes tinha essa sensação de ter esgotado este “ser”. Quanto a você, você raramente trabalha com os mesmos atores em vários filmes, com exceção de Cindy Scrash em A última vez que vi Macau, mas ela tinha apenas um papel pequeno em Morrer como um homem. Os “naturais”, como Fernando Santos ou Ricardo Meneses, o ator de O fantasma, você não trabalhou mais com eles. Estaria isso ligado ao fato de você tê-los deixado “ser”? Ao fato de que é difícil “ser” de uma outra maneira, uma outra vez? Sim, eu acho que eles se tornaram tanto meus personagens que não os vejo atuando em outro papel. Eles ficam ligados aos seus personagens, como se fosse algo esgotado. É duro dizer isso, mas é como se isso não fosse mais possível. Para Rivette, visivelmente, Bulle Ogier era a aparição absoluta, o fascínio total. Ele nunca se cansou dela. Eu acho que Rivette realmente deixava os atores livres e que ele dava muito poucas indicações. Enquanto eu, eu dou muitíssimas indicações. Eu fiquei mesmo surpreso de constatar a que ponto eu falava com Paul, durante as tomadas de O ornitólogo. Você quer dizer que você ouvia sua voz durante a montagem? Sim, eu falo o tempo todo. Eu digo “mais pra lá”, “mais à esquerda, mais à direita, não, ali, olha ali”... e é insuportável! [risos] Houve momentos em que Paul ficava furioso! Em particular nas cenas com caiaque, quando não havia muita coisa a fazer em um espaço tão confinado, com a pá. Ele deveria apenas observar com o binóculo e, em um determinado momento, depois de uma tomada, ele me disse: “Sabe, João Pedro, às vezes eu também gosto de fazer do meu jeito”. Ele não aguentava mais! [risos] Você não me disse o que ensaiava, quando ensaiava. 6
O texto, para que eles o saibam bem. Em O fantasma, ensaiamos muito, mesmo sendo um filme com poucos diálogos. Ensaiamos as cenas nas próprias locações, eu
sozinho com Ricardo, o ator, ou com a menina ou com os outros. Eu tentei ensaiar o máximo possível, também porque eu estava pouco seguro. Mas, pouco a pouco, eu entendi que não era útil fazer tantos ensaios. O que você ensaiava exatamente? Gestos, ações? Sim, gestos. Eu tentava saber exatamente onde colocar a câmera e como se movimentar. Ricardo fez um estágio com os lixeiros. O filme me veio à cabeça porque eu tinha adquirido o hábito de olhar o caminhão dos lixeiros pela janela, à noite, na frente de casa. Eu olhava essas pessoas e me perguntava quem eram. Com frequência, eram jovens, e podemos imaginar que veio também a partir de uma espécie de fantasma, não em relação a uma pessoa em particular, mas em relação a esta vida. Depois eu entrei em contato com eles, antes mesmo de escrever o roteiro, e pedi para acompanhá-los. Eu entrei em contato com aqueles do posto mais perto de casa (esse onde acabamos por filmar). Eu ia cerca de duas vezes por semana, durante seis meses. Eu não fazia muitas perguntas, eu os observava trabalhar. Eu ficava nos caminhões, foi assim que eu descobri o lixão que aparece no filme. Obviamente, conversávamos um pouco, também, porque eu não estava ali apenas para vê-los trabalhar. Eram homens e mulheres, eles falavam comigo, e eu falava com eles também. Tradução: Barbara Rangel
João Pedro Rodrigues
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SESSÃO CINÉTICA: RITA AZEVEDO GOMES MEU CORAÇÃO ESTÁ PERDIDO EM SETE BOCADOS
Na quinta-feira, dia 13, às 18h30, o cinema do IMS-RJ exibe Correspondências, um filme de Rita Azevedo Gomes realizado a partir da correspondência dos poetas Sophia de Mello Breyner Andresen e Jorge de Sena. Após a sessão, haverá um debate com os críticos da revista Cinética, disponível em: revistacinetica.com.br
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“Os anjos, pelo som da voz, conhecem o amor de um homem; pela articulação do som, sua sabedoria; e pelo sentido de suas palavras, a sua ciência.” A frase de Emanuel Swedenborg recitada sobre a tela preta é o preâmbulo que abre Correspondências, um mote que serve de alicerce às experimentações de Rita Azevedo Gomes. Inspirado nas cartas trocadas entre dois poetas, Sophia de Mello Breyner Andresen e Jorge de Sena, entre 1957 e 1978, durante o exílio dele do regime salazarista, o longa-metragem tem como dispositivo realizar um conjunto de operações justamente na pronúncia da fala, na incorporação do texto pelo corpo do ator, na expressão do dizer e nas múltiplas maneiras como a palavra vem à tona. Basicamente, um filme que opera na mise-en-scène do texto. Isso poderia não significar muito, visto que quase todo o cinema ficcional é de alguma maneira perpassado por operações sobre um texto que lhe dá origem. Mas aqui o problema, além de se tornar transparente e centro das atenções contra a opacidade tradicional do clássico narrativo, ganha duas dimensões que raramente vemos colocadas em jogo, criando um tipo de experiência deveras singular. A primeira delas é que, a rigor, não há uma narrativa diegética. O pouco de trama que existe é conduzido única e simplesmente pela leitura das cartas. O que o filme exibe é uma quimera de múltiplos registros em caráter de esboço, que vem de lugar nenhum e não vai para lugar algum, algo próximo à espectralidade derridiana, rastros nem vivos nem mortos que fogem à dialética metafísica, pedaços reunidos mais por um sentimento ou uma memória que os perpassa do que pela lógica linear e evolutiva. São quadros de entrevista, encenações de declamações, leituras dramáticas, offs sobre paisagens nebulosas, diálogos entre personagens, sketches de cena, imagens de arquivo reais ou simuladas, making ofs, sons radiofônicos, sobreposições etc. Todos sem um encadeamento evidente entre si, conduzidos unicamente pela leitura das cartas, de modo que cada uma dessas imagens isoladas se coloque como um exercício, experiência ou prática da diretora em investigar as muitas possibilidades cinematográficas de dispor corpos no espaço, de entonação e movimentação. Um trabalho de perscrutar a cada instante novas possíveis formas de composição e declamação das cartas. São fragmentos que, como as cartas, acontecem em lugares e tempos distintos, ora evocando, ora não, aquilo que está sendo lido no texto. Mas que, sobretudo, se reúnem por suas afinidades ou correspondências (como o título faz menção) uns com os outros, do mesmo modo como Sophia e Jorge se reconheciam à distância, há anos sem se ver. As imagens, assim como os dois poetas, se reconhecem no tom de exílio, isolamento e busca por liberdade, no humanismo sem pontos de contato com o mundo exterior, dominado pelo pragmatismo e pelas muitas formas ditatoriais de
totalitarismo. “Por nós, por ti, por mim, falou a dor”, diz uma das citações. A forma expressa o conteúdo em um dispositivo cinematográfico hiperbólico que tende ao infinito, à repetição, expandindo-se a partir desse único centro propulsor, criando uma multiplicidade que nasce de um uno – o uno como sentimento comum que transforma todas as coisas longínquas em correspondentes, todas as leituras como visões do mesmo. Que, enfim, transforma todos esses registros isolados em uma obra de arte. Essa lida com o texto remete ao trabalho de Bressane na última década, embora aqui haja mais preocupação com a fidelidade e menos subjetivismo. Também com a tônica de um Moscou, de Coutinho, em sua procura pela expressão de uma força amorfa em registros aparentemente banais. Com a liberdade operacional de Miguel Gomes em relação ao clássico Mil e uma noites, embora a preocupação de desvendar um Portugal contemporâneo, múltiplo e vívido seja substituída em Correspondências pela necessidade de lidar com o vespeiro de sua herança cultural. Porque, em certos momentos do filme de Rita Azevedo Gomes, fica evidente que o esforço da diretora é também por narrar os escombros de uma ideia de nação baseada no uno. É nesse ponto que nos vemos diante da segunda dimensão que o filme abre diante do problema da dramaturgia do texto. Isso porque muito do imaginário cultural português é fortemente povoado pelo classicismo, pela reverência à literatura como forma artística superior, pela palavra como suporte da poesia; uma estabilidade dos elementos que há anos João César Monteiro combatia. E, aqui, Rita Azevedo Gomes confronta o modo tradicional da declamação e da composição, lançando ambas ao abismo do sentido, ou melhor, procurando fazer com que se tornem o invólucro dessa experiência de ruína. Trata-se de, por meio dela, libertar um sentimento de esfacelamento, de multiplicidade, para que uma nova forma de unidade, menos hirta e autoritária, possa ser procurada. “A dor é evidente quando liberta”, recita uma das personagens na sequência final. A proposição não é uma superação da literatura por um cinema como a arte total de Canudo; e, não à toa, Correspondências é pontuado por um esforço multimidiático tremendo, recorrendo à música e à pintura, por exemplo, e apontando o cinema como mais um veículo de expressão artística, capaz de estilhaçar os grilhões de uma tradição hirta, na qual quiçá o próprio salazarismo se baseou, que sufoca o esfacelamento da identidade de uma nação e procura impor a imagem do que ela deve ser. Entre os escombros, uma nova forma mais liberta de unidade talvez possa ser encontrada para que, assim, a própria ideia de Portugal seja efetivamente reinventada. Pedro Henrique Ferreira
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VÍDEO NAS ALDEIAS
No dia 14 de abril, a sessão das 17h de Martírio, de Vincent Carelli, Ernesto Carvalho e Tita, será seguida por um debate com Carelli, por ocasião do lançamento da ZUM #12, revista de fotografia contemporânea editada pelo IMS. Nesta edição, Fabiana Moraes conversa com Vincent Carelli e Ana Carvalho, curadora do Festival Fórumdoc.BH, sobre o cinema indígena brasileiro e o projeto Vídeo nas Aldeias, criado em 1986. Abaixo, um pequeno trecho da matéria: Criado há 30 anos, o projeto Vídeo nas Aldeias provocou uma pequena revolução ao dar condições para que as populações indígenas do Brasil investigassem sua vida e seu entorno com uma câmera, algo que historicamente havia sido realizado por não índios. O projeto, iniciado pelo franco-brasileiro Vincent Carelli, teve seu embrião na ONG Centro de Trabalho Indigenista, e sua primeira oficina de formação, na aldeia Xavante de Sangradouro, em Mato Grosso, completa 20 anos. Chamado de “Alemão” nas ruas da Vila Mariana, bairro de São Paulo, Carelli nasceu em Paris e mudou-se para o Brasil com cinco anos. Em uma foto de 1959, aos seis anos, Carelli aparece brincando de arco e flecha. O instrumento de combate seria mais tarde substituído por outro instrumento, também de guerra: a câmera.
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Entre os dias 13 e 19 de abril, a sala José Carlos Avellar exibe o filme Martírio, de Vincent Carelli, Ernesto Carvalho e Tita. Será exibido, em conjunto, Corumbiara, de Vincent Carelli, também produzido no âmbito do projeto Vídeo nas Aldeias.
Aos 16 anos, Carelli viajou para o sul do Pará com frei José, um dominicano que mantinha contato com indígenas. A primeira visita foi aos índios Xikrin-Kayapó. Voltou de lá para dedicar-se à produção de imagens que desmontam os lugares-comuns associados aos índios, como os estereótipos de pureza e passividade. A ele se somaram outros não índios talentosos, como Tatiana Almeida (a “Tita”) e Ernesto Carvalho, codiretores do premiado documentário Martírio (2016), além de Ana Carvalho. Juntos, formam a equipe do Vídeo nas Aldeias, que produz e divulga filmes realizados por índios, além de hospedar um acervo significativo de documentários, reportagens e registros do cotidiano de várias aldeias brasileiras. A forma de trabalho do Vídeo nas Aldeias é a mesma de 30 anos atrás, com a participação quase exclusiva dos indígenas na captação das imagens e a colaboração de vocês no processo de edição? AC: Ao longo desses 30 anos, o Vídeo nas Aldeias criou uma abordagem própria, que não é exatamente um método, mas um princípio. Não existe um modo indígena específico de fazer cinema, existe um conjunto de posturas e práticas de filmagem. São experiências que geram resultados diversos em relação aos povos e seus filmes, que revelam formas de ver, estar e sobreviver no mundo. Em 1986, nas primeiras experiências, era apenas Vincent com uma câmera colocada a serviço dos índios; não era possível equipar as aldeias com câmeras, microfones e ilhas de edição. A
câmera guiada pelo olhar e pelas demandas dos índios foi o embrião de um cinema que nasceu da colaboração entre brancos e índios e da apropriação de uma tecnologia não indígena na construção de um cinema indígena. Os processos de formação são imersivos, de longa duração, e neles orientamos in loco a construção do trabalho. Mas no campo são apenas eles, a câmera e seus personagens, seus espaços, suas questões. Eles filmam e, no fim do dia, vemos juntos o material. A produção de um filme nasce do desejo da comunidade de fazer cinema, nunca de uma demanda externa. O processo começa com uma oficina de captação e produção audiovisual que dura de 20 a 40 dias, durante os quais os participantes filmam diariamente. No final de cada dia, vemos o material e discutimos as questões estéticas, éticas e técnicas que surgem. As aldeias são equipadas com câmeras e ilhas de edição para que o trabalho continue na nossa ausência. As oficinas de tradução e edição são a segunda parte do projeto. A tradução das falas e diálogos revela aos não índios a profundidade do material. É um processo coletivo, sempre realizado em espaço aberto, com toda a comunidade assistindo, uma alegria. Depois, iniciamos a edição. O primeiro corte é feito na aldeia. Os cineastas indígenas e a comunidade discutem e decidem o roteiro, o que vai ser mostrado, o que não vai etc. A montagem fina acontece na sede do Vídeo nas Aldeias, onde estão os equipamentos mais robustos para finalizar as produções, com a participação de cineastas que acompanharam o processo. De que forma essa estratégia contribui para a formação do olhar desses povos? AC: Essa formação contínua, colaborativa e de longa duração permite que formas particulares de apropriação surjam ao longo do processo. Cada grupo se revela nos modos de produção dessas imagens. Esse aprendizado prático permite que as diferentes estratégias cinematográficas se manifestem. VC: O processo ajuda a desconstruir a linguagem televisiva, a única que lhes é familiar hoje em dia; desenvolve a escuta, a observação e o respeito ao tempo próprio do mundo indígena. Mas é importante também que eles entrem em contato com outros repertórios, como os da videoarte, da animação e da ficção, o que permite a cada um
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encontrar sua linguagem e seus temas preferidos. No começo da formação, a autoria é coletiva, mas, aos poucos, alguns se destacam e resolvem realmente seguir na produção de registros e histórias, e a autoria passa então a ser individual ou em parceria. Quais questões surgem durante a produção dos filmes? VC: Os povos mais presentes são aqueles com os quais construímos relações de formação continuada duradouras: os Mbya-Guarani do Rio Grande do Sul, os Ashaninka e os Huni Kuin, do Acre, os Xavante, e os Kuikuro, de Mato Grosso. Cada um traz questões específicas: os Guarani tratam do aspecto espiritual; os Ashaninka, do ambiental; os Huni Kuin, do mundo da Jiboia, dos seus ensinamentos de cantos e pinturas; os Xavante, dos grandes rituais de iniciação que estruturam sua sociedade. No caso dos Kuikuro, há também as grandes festas, mas, agora que o cineasta Takumã começou sua carreira solo, ele tem procurado novos assuntos, como os antropólogos, os missionários, a vida de sua família na cidade. Em termos gerais, não é um cinema de questões abstratas, mas de imersão na vida cotidiana, principalmente dos jovens, ainda que, no caso das aldeias, haja sempre uma interação entre jovens e velhos. Eles não raciocinam com abstrações: é preciso entrar na vivência, principalmente se o objetivo for desenvolver uma linha de cinema direto, mostrar a realidade sem se impor a ela. Os primeiros filmes costumam registrar o cotidiano, os personagens, e só depois surgem as questões. Os Ashaninka gostam de ficção e das cerimônias de iniciação. Conforme a produção amadurece, aparecem os assuntos religiosos, as disputas políticas, e os filmes se tornam mais complexos. Já fizemos oficinas tentando impor temas, mas é difícil começar por recortes temáticos. É melhor deixar fluir, partir de uma ideia geral, “um dia na aldeia”, e ver o que acontece. Como os índios encaram os conceitos de ficção e não ficção? Na cultura indígena há tabus visuais, como as cenas de sexo, parto, doença ou morte para nós? VC: Eles aprendem o que é ficção, e alguns gostam até mais que da linguagem documental, porque querem encenar histórias tradicionais. Há tabus, que variam de um povo para outro, principalmente resguardando áreas que são consideradas de conhecimento reservado. Alguns proíbem a filmagem de rituais xamânicos, mas no Xingu não há restrições quanto a isso. Para outros, a imagem é tabu, mas isso muda com o tempo e no convívio com integrantes de uma sociedade da imagem. Vocês apresentam um repertório cinematográfico não indígena nas oficinas? Como é a reação? 12
AC: Exibimos desde clássicos do cinema mudo, como Charles Chaplin e Buster Keaton, até referências importantes do cinema documentário moderno, como Jean
Rouch e Robert Flaherty. Mas a referência essencial são os filmes realizados por outros povos indígenas. Como disse certa vez o cineasta Ashaninka Isaac Piyãko, “você vê o mundo do outro e olha o seu”. Uma troca fundamental de pontos de vista e perspectivas acontece nesse intercâmbio de imagens, histórias e cosmologias. Agora, os filmes de artes marciais são imbatíveis, a meninada se diverte. VC: O fascínio dos índios é ver e conhecer outros índios. É uma necessidade de se posicionar no mundo, mas da perspectiva de povo nativo. Quais questões estéticas surgem na produção dos cineastas indígenas? AC: Os filmes produzidos nas oficinas exibem diferentes usos e funções da imagem, revelando o projeto político e estético de cada povo. Nenhuma oficina é igual à outra. É uma produção absolutamente extensa e diversa que revela a singularidade, as lutas, cosmovisões, identidades e formas de apropriação dos recursos visuais. Nos Mbya-Guarani, vemos uma forma especial de expressar a questão da espiritualidade e da duração do tempo, os territórios de trânsito e de fronteira. Já com os Maxacali, a câmera é uma máquina de ver o invisível, um instrumento xamânico. Eles têm vida ritual intensa, cotidiana, ininterrupta. A câmera Maxacali é uma câmera ritual. Outro exemplo são os Xavante ou os Huni Kuin. O problema da origem do mundo, os rituais de iniciação e a transmissão de saberes aparecem nos filmes de todos eles, sempre inseridos no tempo atual. Essas questões latentes emergem nas oficinas, não são predeterminadas. Fica evidente que existem diversos usos e funções da imagem; que cada grupo, ao fazer suas escolhas temáticas e estéticas, manifesta uma determinada crença nas imagens, seja como elemento de transformação da experiência no mundo, como no cinema militante, seja como forma de contato com o invisível, com o mundo dos sonhos, dos espíritos, do tempo, da pessoa, da palavra, como acontece entre os Guarani, por exemplo. VC: Os sonhos são muito importantes para os índios, tanto para a condução da vida pessoal quanto da coletiva. O senso estético muito apurado de suas culturas transparece nos enquadramentos, no olhar, mas a estética nunca é discutida de maneira abstrata. O realizador Wewito Piyãko, por exemplo, é um grande desenhista, o enquadramento dele é clássico. Um dos filmes mais incríveis é Bicicletas de Nhanderu, sobre a espiritualidade na cultura dos Mbya-Guarani da aldeia Koenju, em São Miguel das Missões, no Rio Grande do Sul. Tudo o que acontece na aldeia tem um significado espiritual: chuva, trovão, raio. Tupã fica bravo com isso e aquilo, recolhe o pedaço de pau que é uma mandinga; as crianças pegam frutas na mata, a velha benze, faz uma reza, purifica; o espiritual está sempre presente. Isso não se ensina, isso se manifesta.
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TERÇA
QUARTA
QUINTA 30
R E T R O S P E C T I VA
J OÃO P E DR O R ODRIGUES
março
15h00 O ornitólogo 17h30 O ornitólogo 20h00 Alvorada vermelha A última vez que vi Macau
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15h00 O ornitólogo
15h00 O ornitólogo
15h00 O ornitólogo
18h00 Mahjong
17h30 O ornitólogo
18h30 O que arde cura
Manhã de Santo António
Iec Long
20h00 Odete
O corpo de Afonso
20h00 O ornitólogo
20h00 O ornitólogo
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12 15h00 O ornitólogo
14h00 Martírio
17h30 O ornitólogo
17h30 O ornitólogo
20h00 O fantasma
19h45 Camouflage self-portrait
Sessão Cinética 18h30 Correspondências sessão seguida de debate com os críticos da revista Cinética
2017 ABRIL 14
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15h00 O ornitólogo
Morrer como um homem
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19 14h00 Martírio
14h00 Martírio
17h00 O ornitólogo
17h00 O ornitólogo
19h15 Martírio
Ópera na Tela 19h15 Os dois Foscari
SEXTA 31
março 15h00 O ornitólogo
SÁBADO 1
17h30 O ornitólogo
2 14h30 O ornitólogo
15h00 O ornitólogo
17h00 China, China
18h00 Esta é a minha casa Viagem à Expo
Odete
20h00 Parabéns! O fantasma
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DOMINGO
20h00 O ornitólogo
19h30 Morrer como um homem
8 15h00 O ornitólogo 18h00 Esta é a minha casa
14h00 Iec Long A última vez que vi Macau
9 14h30 O ornitólogo 17h00 Mahjong
16h30 Allegoria della prudenza O ornitólogo - sessão seguida de
Viagem à Expo
O que arde cura Parabéns
debate com João Pedro Rodrigues, João Rui Guerra da Mata e Kleber Mendonça Filho
20h00 O ornitólogo
China, China 20h00 Allegoria della prudenza
20h00 Alvorada vermelha Manhã de Santo António O corpo de Afonso
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O ornitólogo
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14h00 Corumbiara
14h00 Martírio
14h00 Martírio
Lançamento ZUM #12 17h00 Martírio sessão seguida de debate com o diretor Vincent Carelli
17h00 Corumbiara
17h00 Corumbiara
19h15 Martírio
19h15 Martírio
É TUDO VERDADE 2017 De 20 a 30 de abril, o IMS-RJ recebe o É Tudo Verdade - Festival Internacional de Documentários em sua 22ª edição. Ao longo desses anos, o evento se firmou como o mais importante festival do gênero na América Latina, e o IMS exibe destaques desta edição, como a Competição Latino-Americana e a mostra O Estado das Coisas, além das Retrospectivas Internacional e Brasileira. A entrada é gratuita, e a programação completa pode ser conferida em www.etudoverdade.com.br
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OS FILMES DE ABRIL
Imagem: O ornitólogo, de João Pedro Rodrigues
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PARABÉNS!
de João Pedro Rodrigues (Portugal, 1997. 15’. Exibição em 35 mm ) 31 DE MARÇO, 20h 9 DE ABRIL, 17h
Roteiro e direção de fotografia: João Pedro Rodrigues. Montagem: Vitor Alves. Som: Nuno Carvalho, Miguel Sotto Mayor.
A escuridão silenciosa do quarto é interrompida por uma mensagem de parabéns gravada na caixa postal. Um despertar brusco para Chico, no dia em que faz 30 anos. Tarde demais para encontrar com a namorada, tarde demais para ir à reunião na EXPO’98 e, ainda por cima, sente uma ressaca de morte. Na cama, deitado ao seu lado, está o jovem com quem passou a noite. Segundo curta-metragem de João Pedro Rodrigues, Parabéns! recebeu menção especial do júri no 54º Festival Internacional de Cinema de Veneza, em 1997.
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ESTA É A MINHA CASA de João Pedro Rodrigues (Portugal, 1997. 51’. Exibição em cópia digital) 2 DE ABRIL, 18h 7 DE ABRIL, 18h
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João Pedro Rodrigues filma a viagem de férias de uma família de emigrantes, os Fundo, de Paris até a sua terra natal, em Trás-os-Montes. Imagens do cotidiano do casal em Paris – ele é sapateiro, ela é porteira – são alternadas com momentos das férias e registros da jornada que fazem de carro pelas estradas da França e da Espanha até Portugal.
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VIAGEM À EXPO de João Pedro Rodrigues (Portugal, 1999. 54’. Exibição em cópia digital) 2 DE ABRIL, 18h 7 DE ABRIL, 18h
A capital portuguesa era então presença frequente nos meios de comunicação franceses em virtude da EXPO’98. Um ano depois de Esta é a minha casa, João Pedro Rodrigues volta a filmar a família Fundo, que passa as férias de verão em Lisboa: num périplo pelas zonas históricas da capital, pelos arredores da cidade, na visita que fazem à Expo ou ao Estádio da Luz.
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O FANTASMA
de João Pedro Rodrigues (Portugal, 2000. 90’. Exibição em 35 mm ) 31 DE MARÇO, 20h 11 DE ABRIL, 20h
Argumento: João Pedro Rodrigues, Paulo Rebelo, José Neves, Alexandre Melo. Fotografia: Rui Poças. Montagem: Paulo Rebelo, João Pedro Rodrigues. Direção de arte e figurino: João Rui Guerra da Mata. Edição de som e mixagem: Nuno Carvalho. Com Ricardo Menezes, Beatriz Torcato, André Barbosa, Eurico Vieira.
Sérgio passa os dias entre um quarto alugado num hotel barato, sexo anônimo e o seu trabalho na recolha de lixo no setor norte de Lisboa. No entanto, uma noite, os seus olhos deparam com o fantasma dos seus sonhos, que se torna uma obsessão. Primeiro longa-metragem de João Pedro Rodrigues, O fantasma fez parte da seleção oficial do 57º Festival Internacional de Cinema de Veneza, em 2000.
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ODETE
de João Pedro Rodrigues (Portugal, 2005. 101’. Exibição em 35 mm ) 1 DE ABRIL, 17h 5 DE ABRIL, 20h
Roteiro: João Pedro Rodrigues, Paulo Rebelo, Francisco Frazão, João Rui Guerra da Mata. Fotografia: Rui Poças. Montagem: Paulo Rebelo. Direção de arte e figurino: João Rui Guerra da Mata. Som directo: Luís Botelho. Edição de som e mixagem: Nuno Carvalho.
Odete trabalha em um hipermercado e sonha em ter um filho. Quando insiste no assunto com o namorado, ele a abandona. Pedro e Rui estão juntos há um ano. Na noite em que comemoram o primeiro aniversário de namoro, Pedro morre num brutal acidente de carro. De modo inesperado, Odete aparece de surpresa no funeral de Pedro, dizendo que espera um filho dele. Nas semanas seguintes, enquanto sua barriga cresce, visita diariamente o túmulo onde, eventualmente, encontra Rui. Dentre os prêmios recebidos por Odete, está a menção especial dos Cinémas de Recherche do Festival de Cannes, em 2005.
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CHINA, CHINA
de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata (Portugal, 2007. 19’. Exibição em DCP)
1 DE ABRIL, 17h 9 DE ABRIL, 17h
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Roteiro: João Rui Guerra da Mata. Fotografia: Rui Poças. Montagem: Rui Mourão. Som: Nuno Carvalho.
China desce as escadas em direção ao bairro Martim Moniz, em Lisboa. “China, China!”, gritam as crianças quando ela passa. China vai fugir para longe. Deixar tudo: o marido, o filho, o trabalho. Ela só quer ser feliz em outro lugar. O filme foi selecionado pela Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes, em 2007.
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MORRER COMO UM HOMEM de João Pedro Rodrigues (Portugal, França, 2009. 133’. Exibição em 35 mm ) 1 DE ABRIL, 19h30 12 DE ABRIL, 19h45 Roteiro: João Pedro Rodrigues, Rui Catalão, Joao Rui Guerra da Mata. Fotografia: Rui Poças. Montagem: Rui Mourão, João Pedro Rodrigues. Direção de arte: João Rui Guerra da Mata.
Tonia, uma veterana dos espetáculos de travestis lisboetas, acompanha seu namorado Rosário na luta contra a dependência de heroína. Enquanto isso, o mundo à sua volta implode: o espetáculo de travestis agoniza, a concorrência de artistas mais novas ameaça o seu estatuto de vedete, e seu filho, um soldado desertor, retorna ao seu encontro. Pressionada por Rosário a realizar a cirurgia de redesignação sexual, Tonia luta contra as suas mais profundas convicções religiosas. O filme fez parte da mostra Un Certain Regard do Festival de Cannes, em 2009.
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CAMOUFLAGE SELF-PORTRAIT de João Pedro Rodrigues (Portugal, 2008. 3’. Exibição em cópia digital) 12 DE ABRIL, 19h45 Imagem: João Pedro Rodrigues, Nuno Gil.
Durante a realização de Morrer como um homem, João Pedro Rodrigues filma a si próprio com o telefone celular enquanto passa a maquiagem de camuflagem que os soldados usam no filme.
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ALVORADA VERMELHA de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata (Portugal, 2011. 27’. Exibição em DCP) 30 DE MARÇO, 20h 8 DE ABRIL, 20h Roteiro e fotografia: João Pedro Rodrigues, João Rui Guerra da Mata. Montagem: João Pedro Rodrigues, João Rui Guerra da Mata, Rui Mourão. Som: Carlos Conceição, Nuno Carvalho.
Sobre o filme, selecionado pelo Festival de Locarno, conta João Rui Guerra da Mata: “Vivi parte da minha infância em Macau. Foram tempos de fascínio e aventura. Trinta anos depois, voltei para lá com o João Pedro Rodrigues para filmarmos A última vez que vi Macau. O João Pedro só conhecia Macau pelos filmes e livros. Mostrei-lhe o Mercado Vermelho: os gestos, a rotina banal dos trabalhadores, os cheiros, as cores... o sangue. E outra vez o fascínio, a aventura. E a descoberta de um mundo que resiste, que o Ocidente esqueceu ou evita mostrar. Assim surgiu Alvorada vermelha, entre a vida e a morte, o real e a ficção. Entre animais decepados e sereias, mulheres-peixe que não usam sapatos porque não têm pés.”
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MANHÃ DE SANTO ANTÓNIO de João Pedro Rodrigues (Portugal, França, 2012. 25’. Exibição em DCP) 4 DE ABRIL, 18h 8 DE ABRIL, 20h Roteiro: João Pedro Rodrigues. Fotografia: Rui Poças. Montagem: Mariana Gaivão. Som: Nuno Carvalho. Com Alexander David, Lydie Bárbara, Maria Leite, Mariana Sampaio, Miguel Nunes.
Manda a tradição que no dia 13 de junho, dia de Santo Antônio, o padroeiro de Lisboa, os namorados ofereçam vasos de manjericos enfeitados com cravos de papel e bandeirolas com quadras populares como prova do seu amor. Sobre o filme, exibido no encerramento da Semana da Crítica do Festival de Cannes em 2012, diz João Pedro Rodrigues: “Imaginei uma imensa coreografia de Santo Antônio, um tipo de homenagem inconsciente a uma das celebrações mais populares de Lisboa.” “A ideia para esse filme veio de uma foto que tirei com meu celular enquanto voltava pra casa em Lisboa, no primeiro metrô da manhã que seguiu às celebrações de Santo Antônio, no 13 de junho. Naquela tarde, eu tinha tomado o último metrô para o centro da cidade. O trem estava cheio. Meninos e meninas de várias tribos urbanas gritavam de alegria. Alguns cantavam ao som dos bongos, outros dançavam. Bebiam drinques estranhos, em garrafas plásticas que eram passadas de um para o outro. O último metrô marcava o início de uma festa que durava a noite toda. Nas primeiras horas da manhã, tomei o primeiro trem de volta para casa às 6:30. O contraste não podia ter sido maior. Embora estivesse tão cheio quanto na noite anterior, fazia agora absoluto silêncio. O trem não levava pessoas, mas corpos exaustos, semiadormecidos, que acordavam como que por instinto quando chegavam ao seu destino. Eles saíam mecanicamente, sempre no mesmo ritmo e em silêncio, sem dar tchau, como se todos e cada um estivessem sozinhos. Ao sair do vagão, não resisti a olhar pela janela: vi uma imagem similar a tantas outras que havia testemunhado ao longo da manhã, mas esta me parecia resumir, de alguma forma, aquela estranha apatia. Lá dentro, três rapazes dormiam: dois deles sentados de frente para o outro e um terceiro deitado de cara no chão, ocupando parcialmente o corredor. Foi essa imagem que eu fotografei com meu telefone. Fui em direção à saída andando atrás de um grupo de rapazes e moças. Quando alcancei a rua, observei as outras saídas do metrô. De todas vinham jovens, se movendo da mesma forma, no mesmo silêncio, em uma cidade que ainda dormia. Já na rua, cada um voltou para suas casas, com a mesma forma mecânica de andar, em um ritmo alcoolizado que, para mim, parecia eminentemente coreografado. Inevitavelmente pensei nas coreografias geométricas e melancólicas de Buster Keaton ou Jacques Tati, e mesmo nas peças de Pina Bausch.”
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O QUE ARDE CURA de João Rui Guerra da Mata (Portugal, 2012. 26’. Exibição em DCP) 6 DE ABRIL, 18h30 9 DE ABRIL, 17h Roteiro: João Rui Guerra da Mata, João Pedro Rodrigues. Fotografia: Rui Poças. Montagem: Mariana Gaivão. Som: Nuno Carvalho. Com João Pedro Rodrigues.
Na madrugada de 25 de agosto de 1988, Portugal acorda com o maior incêndio de que se tem memória desde o Grande Terremoto de 1755. Em Lisboa, o bairro do Chiado arde. Do outro lado da cidade, longe da fumaça e do fogo, Francisco recebe um telefonema inesperado. “O que arde cura tem para mim um significado muito especial, porque representa mais de duas décadas de amizade com o João Figueiras e a continuação da cumplicidade de trabalho com o João Pedro Rodrigues, que se iniciou em 1997 com o seu curta-metragem Parabéns!”, conta João Rui Guerra da Mata. “Eu estava interessado em filmar em estúdio. Um corpo de homem em um único cenário. Um tipo de espaço fechado de concentração, onde os eventos do mundo exterior entrassem pelo rádio e pela televisão. Som e projeção de imagens que se misturassem com os sentimentos contraditórios do personagem. Um filme de ficção contaminado por imagens documentais.”
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A ÚLTIMA VEZ QUE VI MACAU de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata (Portugal, França, 2012. 82’. Exibição em DCP) 30 DE MARÇO, 20h 8 DE ABRIL, 14h Roteiro e fotografia: João Pedro Rodrigues, João Rui Guerra da Mata. Som direto: Nuno Carvalho, Carlos Conceição, Leonor Noivo. Montagem: Raphaël Lefèvre, João Pedro Rodrigues, João Rui Guerra da Mata.
"30 anos depois, estou a caminho de Macau, para onde jamais voltei desde que era criança. Em Lisboa, recebi um e-mail de Candy, uma amiga sobre quem nada sabia há anos. Ela me disse que estava envolvida de novo com um cara errado, e me pediu para ir a Macau, onde aconteciam 'coisas estranhas e assustadoras'." "Cansado, depois de um longo voo, me aproximo de Macau à bordo da barca que me leva de volta à época mais feliz da minha vida." - João Rui Guerra da Mata O filme recebeu a menção especial do júri no Festival de Locarno, em 2012.
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O CORPO DE AFONSO de João Pedro Rodrigues (Portugal, 2013. 32’. Exibição em DCP) 4 DE ABRIL, 18h 8 DE ABRIL, 20h Roteiro e fotografia: João Pedro Rodrigues. Som: Carlos Conceição, Nuno Carvalho. Montagem: Mariana Gaivão.
Como seria o corpo do primeiro rei de Portugal, d. Afonso Henriques, figura tutelar, alvo de mitificações sucessivas no decurso da História portuguesa? Parte da seleção do Festival de Locarno de 2013, o curta investiga o fascínio pela figura de d. Afonso Henriques, que, nas palavras de João Pedro Rodrigues: “É velho de séculos; o distante monarca foi frequentemente invocado pelos seus sucessores. No auge da expansão dos 'Descobrimentos' e achando a sepultura original demasiado modesta, d. Manuel I faz trasladar os restos mortais do seu antecessor para um novo e esplendoroso túmulo [...]. Trezentos anos mais tarde, d. Miguel, em plena luta fratricida com o seu irmão d. Pedro, e em busca de legitimação 'superior', decide abrir o túmulo na igreja de Santa Cruz de Coimbra; persistindo a figura de um grande homem, ganha força a imagem da envergadura imponente do fundador da nação. Na atribulada década de 1930 e aproveitando a vaga nacionalista do final do século XIX (que, paradoxalmente, levou à queda do regime dinástico de que d. Afonso Henriques é primeiro nome), António de Oliveira Salazar surge ilustrado como 'defensor de Portugal', travestindo-se para isso de rei medieval, emulando a popular escultura vimaranense da autoria de Soares dos Reis. [...] Estas e outras invocações, muitas delas com muito pouca credibilidade, fizeram descer uma névoa de misticismo e incerteza sobre a real figura.” “A mais recente tentativa de abertura do túmulo de d. Afonso Henriques data já deste século, mas foi frustrada por 'impedimento superior' de última hora, deixando por revelar o que verdadeiramente se encontra no interior do túmulo. O cinema revela-se, então, como o meio ideal para tentar encontrar um corpo para o mito fundador da nacionalidade, o corpo de d. Afonso Henriques, logrando, talvez, revelar o que à Ciência não é permitido e que a História não consegue deslindar.”
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MAHJONG
de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata (Portugal, 2013. 35’. Exibição em DCP) 4 DE ABRIL, 18h 9 DE ABRIL, 17h
Roteiro: João Pedro Rodrigues, João Rui Guerra da Mata. Fotografia: José Magro. Som: Adrian Santos, Nuno Carvalho. Montagem: Mariana Gaivão. Música: Luís Fernandes. Com Anne Pham, Fernando Vhou, João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata.
Varziela, Vila do Conde, a maior Chinatown de Portugal. Um homem de chapéu e uma mulher desaparecida. Um sapato de salto alto, uma peruca loira e um vestido chinês. O confronto entre o Vento Leste e o Dragão Vermelho; os pontos cardeais trocados como num derradeiro jogo de Mahjong. “Em 2012, a equipe que produz o festival Curtas Vila do Conde lançou-nos o desafio de rodar um filme no norte de Portugal com uma equipe constituída por estudantes”, contam os realizadores sobre o curta, que também fez parte da seleção oficial do Festival de Locarno, em 2013. “O Dario Oliveira, um dos diretores do festival, sugeriu fazermos um filme na Varziela. Filmamos no verão de 2012 com três estudantes e o Pedro Maia, que já tinha trabalhado conosco em Morrer como um homem (2009). Mahjong vem prolongar a veia asiática dos filmes que começamos a realizar em conjunto em 2007, com o curta China, China, rodado em Lisboa, no bairro Martim Moniz, e que se prolongou no curta Alvorada vermelha (2011) e no longa A última vez que vi Macau (2012), estes últimos rodados majoritariamente em Macau. Se A última vez que vi Macau era um documentário sobre um lugar imaginário, Mahjong é a imaginação de um lugar real.” RETROSPECTIVA JPR
ALLEGORIA DELLA PRUDENZA de João Pedro Rodrigues (Itália, Portugal, 2013. 2’. Exibição em DCP) 8 DE ABRIL, 16h30 9 DE ABRIL, 20h Fotografia: João Pedro Rodrigues. Som: Nuno Carvalho. Montagem: Tomás Baltazar.
Tomando de empréstimo seu título de um quadro de Ticiano Vecellio que representa as três idades da vida e três cabeças de animais (lobo, leão e cachorro), João Pedro Rodrigues homenageia ao mesmo tempo Ticiano, o realizador japonês Kenji Mizoguchi, e o realizador português Paulo Rocha.
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IEC LONG
de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata (Portugal, 2014. 31’. Exibição em DCP) 6 DE ABRIL, 18h30 8 DE ABRIL, 14h
Argumento, fotografia, montagem: João Pedro Rodrigues, João Rui Guerra da Mata. Som: Carlos Conceição, Elsa Ferreira, Nuno Carvalho.
Macau, ilha de Taipa. Foi em Macau que primeiro se ouviu a palavra "panchão" para designar fogos de artifício. Do chinês pantcheong, ou pau-tcheong, consta nos dicionários como um regionalismo macaense também chamado “estalo da China” ou “foguete chinês”. Em 2014, quem vive na antiga e desativada Fábrica de Panchões Iec Long? O curta foi selecionado para o Forum Expanded do Festival de Berlim e para o festival Cinéma du Réel.
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O ORNITÓLOGO
de João Pedro Rodrigues (Portugal, França, Brasil, 2016. 118’. Exibição em DCP) DE 30 DE MARÇO A 19 DE ABRIL A sessão de 8 de abril, às 16h30, será seguida por um debate com João Pedro Rodrigues, João Rui Guerra da Mata e Kleber Mendonça Filho
Roteiro: João Pedro Rodrigues, João Rui Guerra da Mata. Fotografia: Rui Poças. Som: Nuno Carvalho. Direção de arte: João Rui Guerra da Mata. Montagem: Raphaël Lefèvre. Música original: Séverine Ballon. Com Paul Hamy, Xelo Cagiao, João Pedro Rodrigues, Han We, Chan Suan, Juliane Elting.
Fernando, um ornitólogo solitário, desce um rio em um caiaque, na esperança de encontrar as raras cegonhas-pretas. Absorvido pela imponência da paisagem, deixa-se distrair e é engolido pelas águas. Salvo por duas jovens chinesas em peregrinação a Santiago de Compostela, Fernando adentra uma floresta sombria e misteriosa ao tentar regressar a onde partiu. “Santo Antônio é uma figura essencial e onipresente na cultura e na sociedade portuguesas”, escreve João Pedro Rodrigues. “Não obstante tratar-se do santo mais celebrado do mundo, a sua aura tem uma influência muito particular em Portugal, onde é o franciscano mais célebre. Tal deve-se provavelmente ao fato de ter nascido em Lisboa entre 1191 e 1195, onde foi batizado Fernando. E também porque, como tantos outros portugueses de renome, levou uma vida de viagem por terra e por mar. [...] Como todos, sei porque invocamos Santo Antônio, em que ocasiões o celebramos e o que representa. Reconheço-o nas igrejas e na arte. Reconheço a sua presença em mim.” “Tal reconhecimento constitui uma observação fria e objetiva, e não é de modo algum um sinal de religiosidade. Para os portugueses, Santo Antônio é alguém com quem coexistimos, alguém com quem negociamos, alguém por quem por vezes mostramos simpatia, outras vezes aversão e outras, ainda, apenas curiosidade. Queria descobrir de que forma Santo Antônio vivia dentro de mim. De início comecei esta viagem sem qualquer pesquisa formal, apenas com as peças incompletas de um puzzle, sem grande preocupação de rigor. Sabia que Santo Antônio tinha a capacidade de perceber todas as línguas; que tinha ressuscitado um jovem com um sopro mágico; que tinha pegado o Menino Jesus nos braços, um abraço que quis manter em segredo. Sabia do seu fascínio pela natureza e pelos animais; que tinha abdicado do seu passado aristocrático e da sua riqueza, guardando apenas o estritamente essencial, o seu conhecimento e erudição. Sabia que foi acolhido pelos franciscanos após o naufrágio no sul de Itália, e evidentemente conhecia a lenda do barco à deriva. Aliás, foi esta última imagem, este navio perdido, que veio a ser o ponto de partida para a minha história.”
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"A floresta, uma expressão do inconsciente coletivo, é um lugar imaginário que mistura o catolicismo, a superstição e a tradição. Não está muito distante das contradições espirituais em que vivemos. Aliás, um dos aspectos mais notáveis da antiga devoção a Antônio é o fato de a religião e o paganismo estarem tão harmoniosamente imbricados que se torna difícil distinguir o que vem de onde. É o aspecto que mais rigorosamente reflecte a natureza do filme: a própria essência de Santo Antônio e a sua existência em mim. Finalmente, pesquisei e estudei a vida de Santo Antônio, que já tinha evocado, através dos mitos e do folclore que o rodeiam, no meu curta-metragem Manhã de Santo António. Quanto mais aprendia sobre ele, maior era o seu mistério. Queria divertir-me com o personagem, arranhar a sua imagem intocável, restaurar uma certa beleza. Santo Antônio foi constituído como símbolo da família e do casamento durante a ditadura de Salazar, e essa representação totalmente forçada permanece com frequência nos nossos dias. A devoção a este santo e as festividades de 13 de junho, por ocasião do aniversário da sua morte, embora reinventadas após a queda da ditadura e a revolução de 25 de abril de 1974, ainda estão contaminadas pelo simbolismo de uma época anterior. Consequentemente, a minha reapropriação da vida do santo é propositadamente transgressiva e iconoclasta. Embora tenha usado algumas passagens do sermão de 1222 e alguns episódios reais da sua vida, a minha imaginação, juntamente com o João Rui Guerra da Mata, foi aos poucos tomando conta da escrita. É o espírito, a trajetória que insufla vida no filme e conduz Fernando à sua nova identidade." “A reflexão sobre a espiritualidade, que iniciei em Morrer como um homem e evocamos na viagem em A última vez que vi Macau, conduziu-me, sem dúvida, a este novo projeto.” O ornitólogo é exibido nos cinemas brasileiros como parte da Sessão Vitrine Petrobras. Pelo filme, João Pedro Rodrigues recebeu o Leopardo de Ouro de Melhor Diretor no Festival de Locarno, em 2016.
SESSÃO CINÉTICA
CORRESPONDÊNCIAS de Rita Azevedo Gomes (Portugal, 2016. 145’. Exibição em DCP)
13 DE ABRIL, 18h30 / Sessão seguida de debate com os críticos da revista Cinética Roteiro: Rita Azevedo Gomes. Música: Alexander Zekke. Edição: Rita Azevedo Gomes, Patrícia Saramago.
Jorge de Sena, forçado a sair de Portugal por razões políticas, parte para o Brasil e depois para os EUA, sem nunca ter conseguido regressar a Portugal. Durante cerca de 20 anos de exílio, mantém correspondência por carta com a poeta Sophia de Mello Breyner Andresen. O filme estabelece um diálogo entre Sophia e Sena. Diálogo em que se revelam suas opiniões divergentes e, acima de tudo, o esforço de preservar uma amizade até a morte.
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ÓPERA NA TELA
OS DOIS FOSCARI ópera em 3 atos de Giuseppe Verdi (Itália, 2016. 129’. Exibição em DCP) 19 DE ABRIL, 19h15 Teatro alla Scala de Milão Maestro: Michele Mariotti Direção: Alvis Hermanis Orquestra do Teatro alla Scala
Os dois Foscari são Francesco e seu filho Jacopo, que voltou do exílio para enfrentar as acusações de traição. Jacopo é inocente, mas nem os apelos de sua mulher Lucrecia nem os do seu poderoso pai são suficientes para salvá-lo da condenação pelo hostil Conselho dos Doze.
SESSÃO VITRINE PETROBRAS
MARTÍRIO
de Vincent Carelli, Ernesto de Carvalho e Tita (Brasil, 2016. 162’. Exibição em DCP) 13 A 19 DE ABRIL A sessão de 14 de abril, às 17h, terá entrada franca e será seguida por um debate com Vincent Carelli.
A grande marcha de retomada dos territórios sagrados Guarani Kaiowá pelas filmagens de Vincent Carelli, que registrou o nascedouro do movimento na década de 1980. Vinte anos mais tarde, tomado pelos relatos de sucessivos massacres, Carelli busca as origens desse genocídio, um conflito de forças desproporcionais: a insurgência pacífica e obstinada dos despossuídos Guarani Kaiowá frente ao poderoso aparato do agronegócio. "Todo dia, bate à porta das nossas consciências, através das redes sociais, a notícia de um assassinato brutal, de um violento despejo", declara Vincent Carelli. "Do outro lado, na grande imprensa, nas sentenças judiciais, nos discursos dos lobistas do agronegócio, vemos a ignorância ou a omissão total da história, a inversão cínica de papéis se apropriando da palavra 'resistência', frente ao suposto 'terrorismo' dos índios. Fazer Martírio se tornou uma compulsão necessária para mim, que tenho a vida atada à deles, para Ernesto e Tita, que me acompanharam nessa jornada. Um compromisso moral, ético, político e, sobretudo, afetivo, com os povos Guarani Kaiowá."
CORUMBIARA de Vincent Carelli (Brasil, 2009. 117’. Exibição em DCP) DE 14 A 16 DE ABRIL
Em 1985, o indigenista Marcelo Santos denuncia um massacre de índios na Gleba Corumbiara (RO), e Vincent Carelli filma o que resta das evidências. Bárbaro demais, o caso passa por fantasia, e cai no esquecimento. Marcelo e sua equipe levam anos para encontrar os sobreviventes. Duas décadas depois, Corumbiara revela essa busca e a versão dos índios.
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Premiado como Melhor Filme no Festival de Cinema de Gramado, em 2009, o longa constitui-se como testemunho de uma busca para esclarecer e revelar ao mundo o genocídio silencioso de três povos indígenas e sua trajetória ao longo das últimas três décadas.
DVD | IMS ÚLTIMO LANÇAMENTO
Instituto Moreira Salles Rua Marquês de São Vicente, 476. Gávea. Telefone: (21) 3284-7400 WWW.IMS.COM.BR
PHOTO Os grandes movimentos fotográficos Os pioneiros A fotografia surrealista A nova objetividade alemã
Superintendente Executivo: Flávio Pinheiro Coordenação do ims-rj : Elizabeth Pessoa Curadoria de cinema: Kleber Mendonça Filho Produção de cinema e DVD: Barbara Alves Rangel Assistência de produção: Thiago Gallego
A fotografia encenada Primeiro volume da série de documentários proposta por Luciano Rigolini, com concepção de Stan Neumann e consultoria de Quentin Bajac. (Foto: Cindy Sherman)
Aberto ao público de terça a domingo, das 11h00 às 20h00. Guarda-volumes aberto até 20h00. Acesso a portadores de necessidades especiais. Estacionamento gratuito no local. Café wifi As seguintes linhas de ônibus passam em frente ao IMS-RJ: Troncal 5 - Alto Gávea - Central (via Praia de Botafogo ) 112 - Alto Gávea - Rodoviária (via Túnel Rebouças) 538 – Rocinha - Botafogo 539 – Rocinha - Leme Ônibus executivo Praça Mauá - Gávea
O programa de abril tem o apoio da Sessão Vitrine Petrobras, da Cinemateca do MAM do Rio de Janeiro, do festival Ópera na Tela, do festival É Tudo Verdade, das revistas Cinética e ZUM, do Vídeo nas Aldeias, das distribuidoras Vitrine Filmes, Bonfilm e do Espaço Itaú de Cinema. A Retrospectiva João Pedro Rodrigues tem parceria da Vitrine Filmes e apoio cultural da Embaixada de Portugal no Brasil e do Camões - Instituto da Cooperação e da Língua:
Sala José Carlos Avellar Ingressos Retrospectiva João Pedro Rodrigues: para O ornitólogo: R$ 12,00 (inteira) e R$ 6,00 (meia) para as demais sessões da retrospectiva: R$ 8,00 (inteira) e R$ 4,00 (meia) para Corumbiara e Sessão Cinética: R$ 8,00 (inteira) e R$ 4,00 (meia) para Martírio: R$ 12,00 (inteira) e R$ 6,00 (meia) para a sessão de Ópera na Tela: R$ 22,00 (inteira) e R$ 11,00 (meia) As sessões do festival É Tudo Verdade têm entrada franca. Meia entrada com apresentação de documentos comprobatórios para professores da rede pública municipal, estudantes, menores de 21 anos, maiores de 60 anos, portadores de HIV e aposentados por invalidez. Cliente Itaú: desconto para o titular ao comprar o ingresso com o cartão Itaú (crédito ou débito). Passaporte no valor de R$ 40,00 com validade para 10 sessões das mostras organizadas pelo IMS. Ingressos e senhas sujeitos à lotação da sala. Capacidade da sala: 113 lugares. Ingressos disponíveis também em www.ingresso.com Devolução de ingressos: em casos de cancelamento de sessões por problemas técnicos ou por falta de energia elétrica, os ingressos serão devolvidos. A devolução de entradas adquiridas pelo ingresso.com será feita pelo site. Sessões para escolas e agendamento de cabines pelo telefone (21) 3284 7400 ou pelo e-mail imsrj@ims.com.br
Programa sujeito a alterações. Confira a programação completa do Instituto Moreira Salles em www.ims.com.br, em nossas redes sociais ou pelo telefone 3284-7400
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INSTITUTO MOREIRA SALLES
CINEMA
ABRIL 2017
VÍDEO NAS ALDEIAS
MARTÍRIO CORUMBIARA 28