Volume 1 • Número 16 Março 2021 ISSN 2525-4294
Março 2021 ISSN 2525-4294
Volume 1 • Número 16
Educação Integral: Reflexões sobre educação na perspectiva da integralidade humana INEQ / FAEP VOLUME 1 - NÚMERO 16 – (MARÇO DE 2021) Periodicidade: Trimestral
CARTA AO LEITOR – REVISTA MARÇO/2021 Na primeira edição do ano de 2021, o Conselho Editorial da Revista “Educação Integral: reflexões sobre educação na perspectiva da integralidade humana” propõe o desencadear de uma trajetória de diálogos com os leitores, no sentido de manter uma interlocução que possibilite o compartilhamento de ideias e saberes ao longo do ano. Nesta carta ao leitor, apontamos a necessidade de vasculhar os registros escritos em outras edições da nossa revista, nos quais destacamos nosso posicionamento em relação à Educação Integral: “Compreendemos a Educação Integral como uma rede complexa de fatores que possibilitam a construção da personalidade dos educandos, a ampliação das potencialidades humanas e a constituição das identidades. ” (Edição de Dezembro de 2020). A retomada desta afirmação conduz a nossa reflexão para destacar como protagonistas do processo educativo: os educandos, os profissionais da educação, a comunidade local e as famílias dos educandos, que devem agir de forma conjunta na construção da Educação Integral, na perspectiva da qualidade social. Neste sentido, consideramos Educação Integral aquela que envolve todos os responsáveis pela educação apontados na legislação: Constituição Federal/1988 - Art. 205: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.” Este movimento conjunto, de compartilhamento no processo educacional só poderá ocorrer se as famílias e a comunidade local participarem, com os profissionais da educação e os educandos, da construção do Projeto Político – Pedagógico. Na relação com as famílias, as trocas e construções estabelecidas na organização da documentação pedagógica também são elementos essenciais para alcançar os objetivos da Educação Integral. Desta forma, considerando que a Educação envolve a apropriação do patrimônio histórico e cultural da humanidade, o processo de aprendizagem deve ser garantido por uma construção curricular, que será desencadeada pela escuta atenta de todos os protagonistas, que trabalharão para estudar e compreender a realidade social e a realidade educacional complexas, organizar saberes para elaborar ações e projetos necessários para transformação das situações reais analisadas, em um movimento contínuo interdisciplinar, intersetorial e coletivo. Portanto, iniciamos os diálogos deste ano, retomando algumas das diferentes facetas da Educação Integral e esperamos que os artigos possam desencadear inúmeras reflexões, possibilitar análises críticas e problematizações sobre os diferentes temas, provocando no leitor o desejo de escrever textos para dialogar com todos que organizam, produzem artigos e realizam leituras que potencializam o seu compromisso com a educação.
Os conceitos contidos nesta revista são de inteira reponsabilidade dos autores. É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem prévia autorização dos autores.
CONSELHO EDITORIAL Profº Dr. Claudinei Aparecido da Costa Profº Dr. Clemente Ramos dos Santos Profº Dra. Vania Aparecida da Costa Profª Ms. Ana Maria Gentil EDITOR CHEFE Profº Dr. Claudinei Aparecido da Costa REVISÃO E NORMATIZAÇÃO DE TEXTOS Prof. Marcos Alves da Silva CAPA E PROJETO GRÁFICO Fernando Silva de Araujo INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO e QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL – INEQ Rua Santa Ângela, 252, Vila Palmeiras, Freguesia do Ó, São Paulo – SP - Cep: 02727-000 Tel.: (11) 2771 5080 e-mail: educacaointegral@ineq.com.br ISSN 2525-4294
Prof. Dr. Claudinei Aparecido da Costa Diretor-geral
INEQ - Educação integral
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Catalogação na Publicação Serviço de Biblioteca e Documentação INEQ Instituto Nacional de Educação e Qualificação Profissional / FAEP Faculdade de Educação Paulistana / FAETI Faculdade de Educação e Tecnologia Iracema
Educação Integral
Revista do Instituto Nacional de Educação e Qualificação Profissional Faculdade de Educação Paulistana e Faculdade de Educação e Tecnologia Iracema. n. 16 (março, 2021) São Paulo: INEQ/ FAEP/FAETI (2021) Trimestral Endereço eletrônico: https://ineq.com.br/revista/ ISSN 2525-4294
Wilma Aparecida Cavazini – Bibliotecária CRB 8 2665
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INEQ - Educação integral
APRESENTAÇÃO REVISTA EDUCAÇÃO INTEGRAL – MARÇO/2021
Na primeira edição do ano de 2021, o Conse-
leitores e a provocação para desencadear mo-
lho Editorial da revista “EDUCAÇÃO INTEGRAL:
vimentos de luta pela educação de qualidade
REFLEXÕES SOBRE EDUCAÇÃO NA PERSPEC-
social, via movimentos diversos e escritas pro-
TIVA DA INTEGRALIDADE HUMANA” retoma
positivas.
a necessidade de buscar uma educação de qualidade para todos, compreendendo que
Destacamos o Artigo “A RELEVÂNCIA DA
esta educação deva considerar a integralidade
AVALIAÇÃO FORMATIVA NA EDUCAÇÃO DO
humana, a complexidade da realidade e a inter-
SÉCULO XXI”, porque consideramos que, am-
dependência dos espaços e dos sujeitos para
pliar saberes e pensares sobre a avaliação, co-
a organização de projetos educativos. Reafir-
labora, de forma significativa, com a reflexão
mamos que a educação não alcançará a verda-
sobre a Educação Integral, na perspectiva da
deira qualidade, se não atuar para resolver as
educação integrada. O autor do texto explicita
desigualdades na apropriação do patrimônio
o compromisso da escola com a avaliação, no
histórico e cultural da humanidade e assegurar
sentido de identificar a necessidade de reorga-
o acesso, a permanência e a qualidade da edu-
nizações do ensino para concretizar as apren-
cação para todos os brasileiros.
dizagens, de forma contínua e transformadora.
Desta forma, os textos que compõem a revista
O Artigo “A SAÚDE ALIMENTAR DE ESTUDAN-
desta edição abor dam diferentes temas, que
TES DA REDE PÚBLICA” provoca o repensar
podem dialogar com as ideias de Educação
sobre o olhar da escola sobre a integralidade
Integral que expusemos na Carta ao Leitor e
presente na realidade concreta, que envolve as-
na introdução desta Apresentação. Os artigos
pectos intelectuais, afetivos, sociais e físicos.
devem interagir também com os estudos e ex-
Muitas vezes, a escola esquece a importância
periências de todos aqueles que procuram co-
de trabalhar esses aspectos conjugados, prin-
nhecimentos, saberes, práticas e deleites nas
cipalmente, no que ser refere à preocupação
páginas desta revista.
com o corpo, como elemento material. As reflexões do texto remetem também a um aspec-
Portanto, objetivamos a interlocução com os
to importante da Educação Integral: a interseINEQ - Educação integral
5
torialidade.
ção das diferenças.
Ao considerar os movimentos de reorganiza-
Portanto, a preocupação com a Educação In-
ção de planejamento e repensar a educação,
tegral está presente, de forma intensa, nas
pela avaliação formativa, bem como, a neces-
escolas de Educação Infantil. Nos Artigos que
sidade de olhar para o desenvolvimento inte-
abordam esta etapa da Educação Básica, os
gral, problematizamos nossas práticas educa-
leitores poderão dialogar com textos, que refle-
tivas em tempos de pandemia, quarentena e
tem sobre o trabalho com as crianças peque-
isolamento social. No momento atual, as preo-
nas, envolvendo a comunicação e o registro,
cupações dos educadores são as aulas remo-
em todas as suas interações com a realidade
tas e as vídeo–aulas, principalmente pelo fato,
e com o outro.
de grande parte da população, ter dificuldades diferenciadas no acesso à internet. O Artigo
No Artigo “A IMPORTÂNCIA DA LEITURA PARA
“AULAS EM EAD MUDOU A ROTINA NA ESCO-
O DESENVOLVIMENTO DA APRENDIZAGEM
LA PÚBLICA” colabora com as reflexões sobre
NA EDUCAÇÃO INFANTIL”, a autora aborda a
a utilização das tecnologias digitais pela edu-
necessidade do trabalho com as diferentes lin-
cação e os desafios da escola para possibilitar
guagens e gêneros textuais, destacando que
que educandos e educadores mantenham, da
podemos nos comunicar e compreender as
melhor forma possível, o diálogo provocativo e
ideias e sentimentos de escritores, utilizando
propositivo na Educação à Distância.
diferentes formas de expressão: desenho, teatro, roda de conversa, diálogos orais, escritas
Em tempos de quarentena e isolamento social,
compartilhadas e brincadeiras.
as maiores problematizações envolvem a Educação Infantil, considerando a necessidade da
Nos artigos citados abaixo, o leitor também po-
interação, do brincar, das experiências em dife-
derá vivenciar momentos de apropriação cultu-
rentes espaços e expressão por meio de “cem
ral e fruição. A autora do texto “LITERATURA
linguagens”.
INFANTIL E FORMAÇÃO DO LEITOR” destaca o poder da literatura no desenvolvimento da cria-
Para pensar sobre Educação Infantil, destaca-
tividade e na potencialização da imaginação,
mos o Artigo “EDUCAÇÃO INCLUSIVA NA EDU-
apontando as raízes dos nossos pensares so-
CAÇÃO INFANTIL: Acolhimento e Respeito à
bre leitura e Educação Infantil, reveladas pela
Diversidade”, que considera a importância das
história. A construtora do artigo indica o cami-
interações na organização dos espaços e tem-
nho divertido e desafiador da Literatura Infantil
pos nas instituições educativas para a peque-
para crianças e adultos.
na infância, com a finalidade de possibilitar a
6
convivência com a diversidade, rompendo com
Para complementar a fruição da leitura, o autor
atitudes preconceituosas e discriminatórias. A
do texto: “AS CRÔNICAS DE NÁRNIA, DE C. S.
autora propõe o planejamento de práticas pe-
LEWIS: UM CONTO DE FADAS MODERNO?”, ar-
dagógicas que possibilitem a constituição de
gumenta sobre a possibilidade de incluirmos o
um sentimento de pertencimento e valoriza-
conjunto de Obras denominadas “Crônicas de
INEQ - Educação integral
Nárnia” em um gênero narrativo - conto de fa-
na realidade, de tal forma que “corpo e mente”
das, proporcionando ao leitor do texto um des-
estejam em “perfeita harmonia”, concretizando
velamento talentoso e perspicaz das caracte-
a Educação Integral.
rísticas narrativas e estruturais de ambos. Ao ler este Artigo, podemos passar por momentos
Ao refletir sobre as inúmeras expressões hu-
de grande aprendizagem em relação à literatu-
manas na Arte, podemos aprofundar nossos
ra e à estrutura textual, bem como, caminhar-
saberes, propondo para os educadores um es-
mos com o autor do Artigo nas histórias fan-
tudo que possibilite o diálogo entre a Música
tásticas tecidas por C.S. Lewis.
na contemporaneidade e pensadores importantes da modernidade. No Artigo “FRITJOF
O Artigo “O REGISTRO DE PRÁTICAS NA EDU-
CAPRA E ZYGMUNT BAUMAN: REFLEXÕES
CAÇÃO INFANTIL E SUA IMPORTÂNCIA” apre-
SOBRE A EDUCAÇÃO MUSICAL CONTEMPO-
senta, nas linhas e entrelinhas, o poder de ins-
RÂNEA”, a autora explicita a necessidade da
tigar os leitores a pensar como o registro e a
uma abordagem mais complexa para a edu-
documentação pedagógica são elementos
cação musical, conduzindo o nosso olhar para
necessários, tanto para repensar as práticas
uma visão sistêmica e alertando para a “ame-
pedagógicas, no que se refere a organização
aça” da superficialidade no trabalho com a
dos tempos e espaços, como para construir
música e na formação do professor, nos quais
momentos significativas na relação com as fa-
os espaços e tempos da expressividade e da
mílias. A autora defende, de forma brilhante, a
criatividade podem ser reduzidos significativa-
necessidade do registro para a construção da
mente. A partir destas reflexões, podemos in-
memória, das identidades e da práxis docente.
tegrar elementos essenciais para a construção de um conceito mais ampliado e consistente
Para finalizar, apontamos a importância das
de Educação Integral.
leituras dos Artigos: “A EVOLUÇÃO DO DESENHO INFANTIL e “A DANÇA COMO ARTE E
Portanto, nesta breve apresentação, aponta-
TERAPIA”,. Ambos destacam a necessidade
mos alguns elementos essenciais dos Artigos
do trabalho com a expressão humana, integra-
desta edição da revista, para que os leitores
dos nas experiências artísticas, como essen-
possam experimentar momentos enriquece-
ciais para o compartilhamento dos elementos
dores e prazerosos. Destacamos a possibilida-
da cultura, o prazer na expressão de ideias e
de de os leitores serem provocados a dialogar
sentimentos e a revelação e transformação da
com os autores e com os organizadores da re-
realidade. No primeiro Artigo, a autora desta-
vista, escrevendo textos que possam compor
ca que, no trabalho com os educandos, não
as próximas edições. O movimento dialógico
se trata apenas de interpretar desenhos, mas
que queremos desencadear concretiza a ver-
de conhecer profundamente os sujeitos que
dadeira vivência da Educação Integral.
desenham e significam o mundo. No segundo Artigo, a construtora do texto indica a necessidade de comunicação pelo movimento, que possibilita a ação de crianças, jovens e adultos INEQ - Educação integral
7
SUMÁRIO
10 15 21 33
8
A DANÇA COMO ARTE E TERAPIA – Flavia Chieregatto Vilas Boas
O REGISTRO DE PRÁTICAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL E SUA IMPORTÂNCIA – Anna Gabriella Batista
AS CRÔNICAS DE NÁRNIA, DE C. S. LEWIS: UM CONTO DE FADAS MODERNO? – Evandro Fantoni Rodrigues Alves
FRITJOF CAPRA E ZYGMUNT BAUMAN: REFLEXÕES SOBRE A EDUCAÇÃO MUSICAL CONTEMPORÂNEA. – Fabiana Pereira Dutra Vieira
42
A EVOLUÇÃO DO DESENHO INFANTIL – Carolina Chinarelli A. Silva
51
AULAS EM EAD MUDOU A ROTINA NA ESCOLA PÚBLICA – Claudia de Almeida Barreto
INEQ - Educação integral
SUMÁRIO
58 66 77
EDUCAÇÃO INCLUSIVA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: ACOLHIMENTO E RESPEITO À DIVERSIDADE – Daniela Xavier Domingues Cunha A IMPORTÂNCIA DA LEITURA PARA O DESENVOLVIMENTO DA APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL – Elizabeth Neves Nogueira
SER NEGRO E CRIANÇA: UM OLHAR NEGRO NA EDUCAÇÃO INFANTIL – Jane Francisca Queiroz Almeida
84
A SAÚDE ALIMENTAR DE ESTUDANTES DA REDE PÚBLICA – Jorge Henrique Silva Bueno
90
A RELEVÂNCIA DA AVALIAÇÃO FORMATIVA NA EDUCAÇÃO DO SÉCULO XXI – Marcos Alves da Silva
93
LITERATURA INFANTIL E FORMAÇÃO DO LEITOR – Silvia Cavanha Buratinne
INEQ - Educação integral
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A DANÇA COMO ARTE E TERAPIA
Flavia Chieregatto Vilas Boas¹
RESUMO A pesquisa descritiva realizada, teve as conO presente artigo aborda a utilização e impor-
cepções expressadas correlacionadas aos
tância da dança como arte e terapia, e discute
preceitos teóricos trazidos pelos Parâmetros
sua viabilidade de inserção no contexto edu-
Curriculares Nacionais, Diretrizes Curriculares
cacional. Sabe-se que, tudo que se move, tem
Nacionais e outros documentos legais, bem
vida, e a dança consiste na sucessão de movi-
como a utilização, enquanto referenciais teó-
mentos e sua integração. Por meio deste fenô-
ricos, autores renomados no segmento retra-
meno, o indivíduo pode se expressar, transmitir
tado.
seus sentimentos, estabelecer relação com o
Palavras-chave: Dança; Arte terapia; Educa-
outro, se comunicar, vivenciar corporal e emo-
ção.
cionalmente; a dança traz a sensação de alegria e, por isso, movimentar-se alegremente é
ABSTRACT
uma de suas características, evidenciando-a por meio da expressão de movimentos.
This monograph discusses the use and importance of dance as art and therapy, and discuss
Quando associada a um objetivo maior, como
your educational context insertion viability.
arte terapia, a dança pode ser o principal ins-
The dance is the succession of movements
trumento para habilitação e reabilitação em
and your integration. By means of this pheno-
saúde, utilizando técnicas diversas relaciona-
menon, the individual can convey your feelin-
das com a prática da dança para a reeduca-
gs, establishing relationship with each other,
ção motora e mental. Assim, quando inserida
communicate, experience bodily and emotio-
no ambiente escolar, a dança permite que os
nally; the dance brings the feeling of joy and,
alunos vivenciem e adquiram consciência do
therefore, move happily is one of its characte-
próprio corpo, tornando as expressões mais
ristics, showing the through movement expres-
naturais, os movimentos mais espontâneos e
sion.
não seja um adulto reprimido no futuro. 1 Pedagoga; Psicopedagoga cliníca e institucional; Licenciada em Artes visuais. Autora do Livro “A PSICOMOTRICIDADE E A ARTE PROFESSORA DE EDUCAÇÃO INFANTIL NA PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO”. Contato: fla.vilasboas@ gmail.com
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INEQ - Educação integral
When associated with a larger goal, such as
própria história, externando suas vivências,
art therapy, dance can be the main instrument
emoções e potencialidades que, por vezes,
for empowerment and rehabilitation in health,
se mantém inertes em seu consciente e que
using various techniques related to the practi-
aguardam o momento de serem convidados a
ce of dance for the motor and mental re-educa-
vir à tona.
tion. Therefore, when inserted in the schools, the dance allows students to experience and
Partindo do pressuposto de que o movimen-
acquire awareness of the own body, making it
to é um fenômeno característico da vida, de
the most natural expressions, the more sponta-
modo geral, e a dança – como uma de suas
neous movements and not be an adult repres-
representantes na sociedade humana, propicia
sed in the future.
o acesso à subjetividade, desenvolve potencialidades e oferta bem-estar ao indivíduo.
Descriptive research carried out, had the conceptions related to theoretical precepts expres-
Dançar é como crescer:
sed brought by legal documents and renowned
um processo lento, cheio de surpresas e
authors.
lutas.
Keywords: Dance; art therapy; education.
A realização de feitos que parecem impossíveis de se concretizar;
INTRODUÇÃO
acrobacias que exigem muito mais que horas de trabalho
A temática discorrida no trabalho desenvolvido
que só ousadia tem capacidade de expli-
consiste na reflexão e discussão da viabilidade
car.
de inserção da dança no processo de Arte te-
Um constante aprendizado para o qual
rapia, isto é, uma união entre Arte e Psicologia,
nem sempre é necessário nos preparar.
destacando sua aplicação e benefícios oferta-
É preciso ter talento.
dos na vertente educacional. É averiguada a
Saber misturar, em doses certas, força e
relação entre dança e o self².
sensibilidade. Conhecer limites e capacidades.
Sabe-se que a disciplina híbrida de Arte terapia
Sem temer o fracasso
tem o fazer artístico como mecanismo tera-
amar.
pêutico. Assim, o intuito dessa vertente se fun-
Amar-se.
damenta na autoexpressão do indivíduo, uma
Sem medos.
vez que relaciona a exploração de aspectos do
Corpo e mente em perfeita harmonia.
consciente e inconsciente por meio da expres-
Essa integração, o segredo da eterna li-
são artística.
berdade, que nos permite alcançar voos muito, mais muito maiores.
O ato de dançar, por sua vez, se fundamenta
Isto é dançar! (Autor desconhecido)
na sucessão e integração de movimentos; mobiliza o corpo e o suscita a participar de sua
O ato de dançar faz parte do princípio humano,
2 - Expressão da língua inglesa que significa “si mesmo”, isto é, o conhecimento que o indivíduo tem sobre si próprio. INEQ - Educação integral
11
já que, desde os primórdios de nossa existên-
A dança, então, proporciona aos seres huma-
cia, o ser humano dança para se conectar con-
nos uma experiência de conexão do indivíduo
sigo mesmo e com seus iguais. Por meio do
consigo mesmo, onde prevalecem os movi-
ambiente em que estamos inseridos, sofremos
mentos naturais oriundos da vontade própria
diversos estímulos e, simultaneamente, nosso
de seus atuantes. Ela traz a sensação de ale-
corpo também é responsável por uma produ-
gria, de extravasamento, e movimentar-se
ção de incontáveis estímulos. Esses estímulos
alegremente retrata esse humor através da
são revividos quando se dança e despertam no
expressão de movimentos. Esses movimen-
indivíduo expressão de vida, transmissão de
tos motivados pela emoção podem transmitir
sentimentos, comunicação, vivência corporal e
expressões francas e diretas de sentimentos
emocional.
reprimidos.
A dança é movimento e não pode ser satisfa-
De certo modo, a realidade vigente reprime
toriamente descrita e verbalizada; é essencial
nossas emoções e naturalidade, já que exige
vivê-la, senti-la, experimentá-la. É um fenôme-
uma postura e comportamento pré-estabele-
no que sempre se concretiza no presente, mas
cidos nos diversos segmentos que estabele-
que se conecta com o passado e pode projetar
cemos contato diário. Em decorrência desse
luz no futuro do indivíduo. É possível obter-se
padrão a ser seguido na vida moderna, nos
autoconceito, auto realização e autoconfiança
espaços urbanos, fez-se reduzir-se a possibili-
através da experiência de movimentos que ofe-
dade de exploração das múltiplas capacidades
reça a oportunidade de mover-se, aprender por
da corporeidade e consequente interferência
meio de movimentos, ser criativo através do
na expressão do psiquismo. Por isso, muitas
movimento, aprender modelos rítmicos de mo-
são as pessoas que recorrem a processos te-
vimento, descrever, ao manipular o corpo, as
rapêuticos para a resolução de problemas cuja
diversas relações espaciais, aprender padrões
origem passam a ser desconhecidas, objeti-
básicos de dança e combinar atividades de
vando ao auxílio do autoconhecimento.
movimentos com a música, a arte, a ciência, a matemática e a linguagem artística. Tudo isso
Há uma grande variedade de terapias, cada
e mais ainda, pode ser obtido através da expe-
qual tem sua finalidade e detém de uma indica-
riência da dança. E ainda, ninguém determinou
ção específica. No caso, abordaremos a Arte
até hoje o que o corpo pode fazer; somos nós
terapia, isto é, um recurso que visa interligar
mesmos quem descobrimos, fazendo, colo-
os universos interno e externo de um indivíduo,
cando em prática o movimento.
por meio de sua simbologia; “é uma forma de usar a arte como meio de comunicação entre
Woodmann (2006, p.98) afirma que, aquele
o profissional e um paciente, buscando uma
que detém de baixa autoestima, sofre a conse-
produção artística a favor da saúde” (PORTO,
quência da falta de experiências lúdicas e cor-
s.d.).
porais, pois, segundo o autor, no decorrer do
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desenvolvimento humano, aprendemos a não
Compreende-se como Arte um conjunto de ati-
usar nosso corpo como forma de expressivida-
vidades capazes de fazer com que o ser huma-
de e naturalidade.
no expresse suas emoções, sua história e sua
INEQ - Educação integral
cultura, tendo como aportes alguns valores es-
à sensação; assim ocorre sucessivamente, “de
téticos, como beleza, harmonia e equilíbrio. A
modo contínuo e quase que instantâneo, numa
arte pode ser representada de várias formas,
velocidade maior que a da corrente elétrica”
em especial na música, na escultura, na pintu-
(FEIJÓ, 1992).
ra, na dança, entre outras. No segmento da dança, há ainda, dentro do 1. Os benefícios da dança no contexto escolar
movimento, fatores básicos, como o tempo, espaço, fluência e peso. O tempo é resultante
Podemos considerar que a apreciação do mo-
da combinação de unidades de tempo repre-
vimento se inicia na infância, que deve ser esti-
sentada pelos símbolos musicais, sendo que
mulada nas instituições de ensino. Entretanto,
estes proporcionam a formação de um com-
durantes os anos escolares, tal fato deveria es-
passo musical. Espaço seria referente ao tra-
tar nos planejamentos com as turmas, pois a
jeto percorrido pelo movimento. Por sua vez, a
dança e a música ressaltam muitos benefícios
fluência é a ligação sem interrupção entre um
no contexto escolar.
movimento e outro. Peso indica a leveza com que o movimento será feito ou não.
Para Freire (1992), o movimento consiste “mais do que simples deslocamento do corpo no es-
Nosso corpo, explica Cohen (1997), move-se
paço; ele objetiva e a desenvolver áreas como
como nossa mente se move. As qualidades
a coordenação motora dos grandes e peque-
de qualquer movimento são as manifestações
nos músculos, equilíbrio, velocidade, agilidade,
de como a mente é expressa através do cor-
ritmo, assim como também, correr, saltar, pu-
po que está em movimento. As mudanças nas
lar, rastejar, arremessar”, experiências motoras
qualidades do movimento indicam que a men-
conquistadas desde a primeira infância.
te mudou o foco sobre o corpo. Ao contrário, quando dirigimos nossa mente ou a atenção
Quando captamos um estímulo do meio am-
para diferentes áreas do corpo e iniciamos o
biente, muitas vezes proporcionadas no am-
movimento a partir dessas áreas, mudamos a
biente escolar, despertamos através de nossos
qualidade do nosso movimento. Então, acha-
sentidos, sentimos sensações. Essas sensa-
mos que o movimento pode ser um modo de
ções são oriundas do contato com o mundo
observarmos a expressão da mente por meio
sem que seja tomada consciência do mesmo³.
do corpo; isso também pode ser uma maneira de produzir mudanças na relação mente-cor-
Para que ocorra o movimento, portanto, neces-
po. Assim, a dança desperta ao nosso cérebro,
sita que se percorra toda as fases: movimento
cognições que contribuem para a memória,
desenvolve a sensação, a sensação à percep-
criatividade e inteligência, contribuindo para
ção, a percepção à cognição e pulsão, a cog-
um ótimo desempenho na aprendizagem.
nição e pulsão ao movimento, e o movimento
Neste sentido, se justifica o emprego da Edu-
3 - Essa sensação seria o “sentir intuitivo, comumente expresso por “eu tive a sensação de...” quando alguém quer se referir a algo não esclarecido. INEQ - Educação integral
13
cação Física nas instituições de ensino, já que
nal, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo
pode auxiliar na construção do conhecimen-
Horizonte, 2009.
to por meio do movimento corporal, transfor-
BEJÁRT, Maurice. Prefácio. In: GARAUDY, Ro-
mando o ambiente em um espaço rico para a
ger. Dançar a vida. 6ª edição [tradução: Anto-
aprendizagem e criação.
nio Guimarães Filho e Glória Mariane] Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1913.
A expectativa da Educação Física escolar tem
BETTI, Mauro. Educação Física Escolar. Ensi-
como objetivo a reflexão sobre a cultura corpo-
no e pesquisa-ação. – 2.ed. – Ijuí: Editora Unijí.
ral, contribui para a afirmação dos interesses
2013.
de classes das camadas populares, na medida
BRANDÃO, C.R. O que é educação. São Paulo:
em que desenvolve uma reflexão pedagógica
Brasiliense, 2006.
sobre valores como solidariedade substituin-
BRASIL, S. de E. F. Parâmetros Curriculares
do individualismo, cooperação confrontando a
Nacionais. Primeiro e segundo ciclos do ensi-
disputa, distribuição em confronto com a apro-
no fundamental: educação física. Brasília: Mi-
priação, sobretudo enfatizando a liberdade de
nistério da Educação/Secretaria de Educação
expressão dos movimentos – a emancipação
Fundamental, 1997.
– negando a dominação e submissão do ho-
BREGOLATO, R.A. Cultura corporal da dança.
mem pelo homem.
São Paulo: Ícone, 2006. CARBONERA, Daniele; CARBONERA, Sergio
Sendo assim, a dança pode ser entendida
Antonio. Monografia – A importância da Dan-
como manifestação artística, expressão e lin-
ça no contexto escolar. Cascavel: ESAP/Fa-
guagem corporal, ritmo, movimento, folclore,
culdade Iguaçu, 2008. Disponível em: <http://
conjunto de passos, e muitas outras expres-
www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/
sões usadas popularmente, sendo inegável o
File/2010/artigos_teses/EDUCACAO_FISICA/
fato de que ela faz parte da vida do homem,
monografia/DANCA_ESCOLA.pdf>. Acesso em
em qualquer sociedade e contribui para o re-
01 mar. 2018.
laxamento da mente, trazendo benefícios tera-
CARRANO, Eveline. Estudos em Arte terapia:
pêuticos e sadios.
diferentes olhares sobre a arte. Rio de Janeiro: Wak, 2009.
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14
INEQ - Educação integral
O REGISTRO DE PRÁTICAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL E SUA IMPORTÂNCIA
Anna Gabriella Batista RESUMO
memories and identity of young children. In short, any and all information existing in registration do-
O presente artigo, elaborado a partir de pesquisa
cuments should and can enhance the reflection on
bibliográfica, é uma reflexão sobre os registros
the writing of the educator's practice and its analy-
das práticas na educação infantil e sua importân-
sis for the preparation of the planning. This record
cia ação docente, onde registrar pode represen-
information should be considered research, as it
tar componente necessário para a construção
is elaborated through the educator's writing nar-
de marcas, memórias e identidade de crianças
rating biographical, historical and reflective situa-
pequenas. Em suma, toda e qualquer informação
tions about the experiences of young children in
existente em documentos de registro, devem e
their learning and development, in addition to the
podem enaltecer a reflexão sobre a escrita da prá-
discoveries of the world around them. In this way,
tica do educador e sua análise para a elaboração
the register stands out as an element capable of
do planejamento. Estas informações de registros
contributing to the reflection of the praxis develo-
devem ser consideradas pesquisas, pois são ela-
ped in early childhood education.
boradas através da escrita do educador narran-
Keywords: Pedagogical documentation; Early
do situações biográficas, históricas e reflexivas
Childhood Education and Practice Registration.
sobre as vivências das crianças pequenas em sua aprendizagem e desenvolvimento, além das
INTRODUÇÃO
descobertas do mundo que a cerca. Destaca-se desta forma, o registro como elemento capaz de
A escola de Educação Infantil deve ser um am-
contribuir para reflexão das práxis desenvolvidas
biente de transformação, mudança e criação, com
na educação infantil.
a premissa de garantir aos pequenos e pequenas,
Palavras-chave: Documentação pedagógica; Edu-
aprendizagem, desenvolvimento, formação, aces-
cação Infantil e Registro de práticas.
so à cultura, aos diferentes saberes, ao respeito e a coletividade. E neste ambiente é onde acontece
ABSTRACT
e se constrói histórias, que devem ser guardadas e registradas.
This article, based on bibliographic research, is a
reflection on the records of practices in early chil-
As crianças pequenas são seres ativos em sua
dhood education and its importance as a teaching
aprendizagem, são produtoras de conhecimento
action, where registration may represent a neces-
e que deixam marcas, que são registros de seus
sary component for the construction of brands,
pensamentos, ações, conhecimentos, conquistas INEQ - Educação integral
15
e emoções.
rias e histórias. De acordo com Freire (1996): “A escrita reflexiva é uma arma de apuração do
Se as crianças na Educação Infantil são produ-
pensar. E, para fazê-la, é preciso reservar tem-
toras de conhecimento e seres extremamente
po”.
capazes, como descrever o educador na Edu-
Sabendo da importância do ato de registrar,
cação Infantil, ele deve ser um intelectual e
cabe a questão: Os educadores possuem tem-
principalmente um pesquisador reflexivo sobre
po de qualidade para a elaboração e reflexão
a infância e sua magnitude. Um autor de sua
de seus registros de práticas.
prática, de seu trabalho com as crianças, cos-
turando um dia a dia complexo e pedagógico.
A partir deste questionamento surgiu o desejo
Assim como as crianças, o educador é um ser
de pesquisar este tema, de acordo com várias
social e histórico que constrói experiências e
teorias, registrar a prática é um valioso instru-
histórias, e o registro de sua prática é a forma
mento de trabalho reflexivo para os educado-
de produzir marcas, memórias e refletir sua
res, mas infelizmente ainda existem muitos di-
práxis e as teorias que a embasam.
ficultadores no cotidiano das escolas infantis que não garantem momentos de qualidade tan-
Quando se fala em registro, a referência é a
to para o educador realizar seu registro, quan-
ação de escrever sobre a prática pedagógica,
to para compartilhar e discutir sobre o mesmo
um ato de relatar, narrar, analisar, refletir, pes-
em coletivo, para a construção de ideias e pla-
quisar e relembrar. Existem diferentes formas
nejamentos coerentes com a infância.
de registrar, como diários de bordos, semanários, relatórios de desenvolvimento, planos de
O registro envolve conceitos, imagens, a
aula, projetos, entre outros. Cada documento
produção de valores, ideais, deveres, di-
possui uma intencionalidade e objetivo dentro
reitos, visão de mundo, decifração e des-
do planejamento da escola e do educador. Se-
velamento da realidade, projetos, propos-
gundo Lopes (2009):
tas. Não se trata absolutamente de uma tarefa fácil, mas, com certeza, é muito
O registro docente constitui instrumento
bonita! É uma das experiências mais for-
favorável à reflexão e a construção de
tes e significativas do ser humano: poder
uma postura investigativa por parte do
participar da formação do outro. Tudo
professor, contribuindo assim para o pro-
isso pede, pois, do professor uma revi-
cesso de formação.
são de compreensão de sua atividade e de sua atitude profissional. (VASCON-
Outro fato relevante é que através do registro
CELLOS, 2007, p.48)
da prática, encontra-se uma forma de externar
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e valorizar a Educação Infantil, as vivências, os
A pesquisa bibliográfica se deu por meio dos
momentos e o desenvolvimento, registrados
estudos de alguns autores tal como, Freire
entrelaçam elementos distintos e complemen-
(1996), Lopes (2009), Vasconcellos (2007),
tares, fundamentados em aprendizagem, evi-
entre outros. O método da pesquisa será qua-
denciando a construção de uma história pau-
litativo, uma vez que foi elaborado através de
tada em práticas onde tanto a criança pequena
pesquisas bibliográficas, o que justifica a rele-
quanto o educador deixa suas marcas, memó-
vância de reunir informações que possibilitem
INEQ - Educação integral
a compreensão do significado do registro da
tual, emocional, social e moral de cada
prática na Educação Infantil, contribuindo de
criança é cuidadosamente cultivado e
forma informativa para a melhora de práticas,
orientado. (EDWARDS p. 13, 2016)
propiciando aos educadores novos assuntos e abordagens para sua práxis.
O conceito de registro de práticas na Edu-
cação Infantil deve ser entendido enquanto
No desenvolvimento é descrito sobre a impor-
elemento intrínseco ao fazer pedagógico co-
tância do registro da prática e sua relevância
tidiano. Ao registrar sua prática o educador,
na contribuição de conhecimento e reflexão
observa a criança pequena em seu processo
sobre os diferentes saberes e fatos que envol-
de construção do conhecimento, fornecendo
vem a infância e a Educação infantil.
informações importantíssimas para planeja-
mento, este processo construído com base na
Por fim, será descrita as considerações finais,
observação se faz das ações, dos interesses
onde de forma resumida trará a reflexão sobre
e das necessidades dos pequenos, esta pode
a presente pesquisa com uma análise crítica
ser considerada uma prática de escuta e olhar
e que apresenta contribuições significativas
sensível, que futuramente será transformada
para a mudança da prática em docente.
em registro histórico e de memória.
1. Registrar práticas e sua importância para a
O registro de prática também pode ser con-
Educação infantil
siderado uma ferramenta de pesquisa para o educador, ele favorece o conhecimento dos
Em meados de 1990 a experiência vivida na
percursos de desenvolvimento do bebê e da
cidade italiana de Reggio Emilia na Educação
criança pequena, permitindo que se aproxime
Infantil, trouxe uma grande reflexão para a Edu-
de sua lógica e evidencie a potencialidade da
cação e educadores de maneira geral, pela pri-
criança, sendo protagonista de suas experiên-
meira vez em muito tempo, as crianças peque-
cias e marcas. De acordo com Malaguzzi:
nas e suas potencialidades foram amplamente valorizadas e suas práticas de registros foram
Documentar sistematicamente os pro-
divulgadas pelo mundo. Esta abordagem passa
cessos e os resultados dos trabalhos
a ser reconhecida pela excelência na qualidade
com as crianças serve para três funções:
das vivências educativas proporcionadas às
Oferecer as crianças uma memória do
crianças pequenas, desenvolvidas com base
que disseram e fizeram que sirva como
na “Teoria das Cem Linguagens” elaborada e
um ponto de partida para os próximos
difundida pelo pedagogo Loris Malaguzzi, que
passos; oferecer aos educadores uma
esteve à frente da direção das pré-escolas mu-
ferramenta para compreensão, pesqui-
nicipais da cidade, em parceria com educado-
sa e renovações contínuas; oferecer, à
res, crianças, famílias e moradores da cidade.
comunidade, algumas informações detalhadas sobre o que ocorre nas escolas,
O sistema de Reggio pode ser descrito
como um meio de tornar a escola real-
sucintamente da seguinte maneira: ele
mente pública. (MALAGUZZI, p. 53, 2001)
é uma coleção de escolas para crianças pequenas, nas quais o potencial intelec-
O ato de registrar a prática também pode ser INEQ - Educação integral
17
considerado um registro autobiográfico, que
para compreender a complexidade de registrar
constitui um importante instrumento de refle-
sua prática é necessário que se torne pesqui-
xão e análise das ideias, opiniões e pensamen-
sador, leitor e escritor. Zabalza afirma que:
tos do educador, neste registro é exposto sua interpretação da prática e da ação cotidiana
O próprio fato de escrever, de escrever
das crianças, este conhecimento se torna ma-
sobre sua própria prática, leva o profes-
terial reflexivo que contribui inteiramente para
sor a aprender através da sua narração.
o planejamento de novas vivências e ações pe-
Ao narrar sua experiência recente, o pro-
dagógicas.
fessor não só a constrói linguisticamente, como também a reconstrói ao nível
Registrar a prática através da observação das
de discurso prático e da atividade profis-
ações cotidianas das crianças pequenas, ga-
sional. Quer dizer a narração constitui-se
rantindo que estas experiências sejam contem-
em reflexão. (, p.29, 2004)
pladas com criticidade, reflexão e sabedoria, faz com que o relato produzido pelo educador,
A intencionalidade de registrar as vivências
repense posturas, espaços, materiais e mo-
e ações das crianças pequenas norteia uma
mentos pedagógicos, e garantam o desenvol-
aprendizagem permeada pela concepção de
vimento cognitivo, físico e social imerso numa
que a criança é produtora de conhecimento, que
infância plena de saberes e direitos, ao regis-
possui potencial e que demonstra sua própria
trar tais vivências significa que o educador se
cultura. Partindo deste pressuposto, o registro
apropria do fazer em sua relação com a teoria,
do educador também contempla o saber do
em um processo de reflexão contínua sobre
processo de desenvolvimento e aprendizagem
sua prática.
da criança, não é como um mero registro escrito e burocrático. Esse processo de escutar, ob-
Um dos principais objetivos do registro de
servar e registrar a evolução física, cognitiva e
práticas é a compreensão do modo como se
social da criança pequena acontece quando o
é educador, ou seja, o que o educador sabe
educador acredita que além da linguagem oral
sobre a criança pequena? O que pensa? O que
também a corporal tem muito a lhe dizer. Nas
valoriza e prioriza? A elaboração do registro é a
breves considerações acima é possível identi-
partir da observação e da interpretação daquilo
ficar a relevância do registro das práticas, onde
que é vivenciado pelas crianças, através desta
a práxis pedagógicas se concretizam em um
conjuntura tanto as crianças pequenas, quan-
constante movimento de repensar e refletir, e
to o educador, desenvolvem a consciência de
certamente contribui para a Educação Infantil
suas ações e constroem juntos significados
e uma infância de equidade e qualidade.
individuais e coletivos compartilhando entre
18
si diferentes possibilidades de aprendizagens.
Ao registrar as experiências vividas pelas crian-
Ao pensar no registro do educador, nasce à re-
ças pequenas, o educador torna-se um instru-
flexão sobre a sua relação com o que escreve:
mento de comunicação e divulgação de uma
O que o educador lê? O que escreve? Será que
proposta pedagógica que reconhece a criança
escreve? Para quê? Para quem? Todos estes
como ser pensante e produtor de cultura. O
questionamentos apresentam uma relação
registro de prática torna a Educação Infantil e
com a formação e atuação do educador, pois
a infância visível e acessível democraticamen-
INEQ - Educação integral
te para as famílias e comunidade, criando um
Registrar, tais experiências infantis, significa
ambiente de interlocução sobre o desenvolvi-
apropriar-se analiticamente do fazer, abrir es-
mento e aprendizagem das crianças.
paço ao diálogo e à reflexão junto aos pares, e produzir conhecimento. São diferentes as pos-
O registro é um grande instrumento para
sibilidades, que responderão também as diver-
a sistematização e organização dos co-
sas necessidades manifestadas pelo coletivo
nhecimentos. É também a possibilidade
da escola; é nesses espaços que será possí-
de que a roda não se feche em si mesma,
vel avaliar e construir formas mais adequadas
mas se abra para o mundo. Através de
de documentar as experiências dos pequenos
textos, os conhecimentos ali gestados
e pequenas a depender da intencionalidade e
podem, por exemplo, atingir outros gru-
das condições materiais e humanas disponí-
pos. (WARSCHAUER, 1993, p.56)
veis.
Portanto é de suma importância a sociali-
Quando o educador registra sua prática e a
zação dos registros de práticas como uma
ação das crianças pequenas, ele documenta
ferramenta que divulga e publica as experi-
memórias, ou seja, tal registro torna-se a pos-
ências e ações das crianças, compartilhando
sibilidade de conservar as histórias e marcas
este registro com todos, além das famílias e
vividas dentro da escola de Educação Infan-
comunidade, mas também entre os demais
til. O registro é uma narração única, singular,
educadores, com contexto, interação e através
que possui significado quando coerente deve
da discussão possa se construir diálogos re-
ser profundo ao garantir à reflexão e permitir à
flexivos, onde as ações e propostas assumirão
elaboração de um sentido inteiramente ligado
sentidos variados num percurso individual e
a infância, o ato de registrar por parte do edu-
coletivo tanto das crianças quanto do educa-
cador estabelece uma relação em estar e do-
dor. De acordo com Freire (1996): “O registrar
cumentar vidas, memórias históricas, sociais e
de sua reflexão cotidiana significa abrir-se para
pessoais.
o seu processo de aprendizagem”. É através do registro de práticas na Educação
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Infantil que as produções, ações, vivências e diferentes linguagens das crianças pequenas
Através de pesquisas bibliográficas, foi realiza-
podem ter visibilidade, lhes conferindo legitimi-
da uma análise, com o intuito de compreender
dade e voz, o que oportuniza aos pequenos e
a importância do registro de práticas na Educa-
pequenas, problematizarem e articularem suas
ção Infantil, o que enalteceu o seu significado
aprendizagens e desenvolvimento, acompa-
para a reflexão do planejamento do educador.
nhado do educador. Quando o educador com-
O educador com sua autonomia ao registrar,
preende que a criança pequena é um sujeito
se torna um mediador e escritor da história de
social, a escola de Educação Infantil torna-se
crianças pequenas, bem como de sua própria
um lugar não somente onde se traduz a cultu-
história de ação docente. Quando registra o
ra, mas também onde se realiza a valoriza uma
educador expressa a base de seu conhecimen-
cultura de infância.
to e saber, o respeito e valorização que tem pela infância e dá voz aos pequenos e pequeINEQ - Educação integral
19
nas que junto a ele vivenciam e experienciam
e desenvolvimento possuem tamanha impor-
momentos diversos.
tância que devem ser considerados registros históricos que contribuem para novas aprendi-
Ao refletir sobre o registro de práticas o edu-
zagens e descobertas, valorizando a infância.
cador permite que as informações contribuam como estratégia e transforme práticas tradicionais, estimulando por meio da narração o
REFERÊNCIAS
autoconhecimento e a importância de registrar memórias, criando novas perspectivas para
EDWARDS, Carolyn. As Cem Linguagens da
um planejamento com a premissa de valorizar
Criança – A abordagem de Reggio Emília na
a infância.
Educação da Primeira Infância. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.
Fica evidente que na Educação Infantil, o for-
FREIRE, Madalena. Observação, registro e re-
talecimento da formação humana e intelectual
flexão – Instrumentos Metodológicos I. São
se dá através da interação do educador com as
Paulo: Espaço Pedagógico, 1996.
crianças pequenas, a participação intensa da
LOPES, Amanda Cristina Teagno. Educação In-
criança dentro das ações propostas demons-
fantil e registro de práticas. São Paulo: Cortez,
tra as necessidades de se registrar com inten-
2009.
cionalidade e coerência, destacando vivências
MALAGUZZI, Loris. La educación infantil en Re-
onde os interesses peculiares e naturais da in-
ggio Emilia. Barcelona. Octaedro; Rosa Sensat,
fância sejam ressaltados.
2001. VASCONCELLOS, Celso dos Santos. Coorde-
Deve se considerar que o registro de práticas
nação pedagógica: do projeto político pedagó-
possui em sua essência uma função social e
gico ao cotidiano da sala de aula. 8. Ed. São
histórica como um processo complexo, que va-
Paulo: Libertad, 2007.
loriza o desenvolvimento infantil, que enxerga
WARSCHAUER, Cecília. A roda e o registro:
a criança pequena como um ser em formação,
uma parceria entre professor, alunos e conhe-
mas com capacidades potentes, que constrói,
cimento. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.
transforma e que é agente do seu conhecimen-
ZABALZA, Miguel A. Diários de aula: um instru-
to. Ao aprofundar-se nos estudos compreen-
mento de pesquisa e desenvolvimento profis-
de-se que o registro de práticas na Educação
sional. Porto Alegre: Artmed, 2004.
Infantil faz com que o educador experimente o mundo dentro do contexto físico, cognitivo e sócio cultural da criança pequena, e reconstrói seu fazer, seu pensamento e reflete sobre seu planejamento. Por fim, há de se destacar que o registro da prática do educador na Educação Infantil, documenta marcas, histórias e experiências da criança pequena, possibilitando com que sua expressão, sentimentos, emoções, conquistas
20
INEQ - Educação integral
AS CRÔNICAS DE NÁRNIA, DE C. S. LEWIS: UM CONTO DE FADAS MODERNO?
Evandro Fantoni Rodrigues Alves¹
RESUMO A literatura infantil é um dos campos mais estudados dentro do contexto maior da teoria e crítica literárias, e dentro desse campo destacam-se os chamados Contos de Fadas. Sem uma definição fixa, e tributários de diferentes origens – tais como as culturas célticas/bretãs, árabes, e medievais em geral – os contos de fadas cristalizaram-se no formato como os conhecemos no século XVII, com a organização e publicação de histórias populares por Charles Perrault, atingindo seu auge nos dois séculos seguintes. Mas podemos nos questionar se tal gênero literário encontrou seu ocaso no final do século XIX, ou se de alguma forma teria se adaptado e continuado a ser publicado sob diferentes formas. É pensando nisso que o presente artigo vai se debruçar sobre a obra As Crônicas de Nárnia, de C. S. Lewis, que é hoje considerada uma das mais importantes, emblemáticas e influentes obras da literatura infantil, procurando entender o processo de construção dessa obra, procurando elementos que possam sustentar nossa hipótese inicial de que o clássico de Lewis – em termos de narrativa, conteúdo, temática e estrutura, além de público alvo – poderia ser considerada, como alguns autores já classifi-
caram, um conto de fadas moderno. Palavras-Chave: Literatura Infantil; Contos de Fadas; C. S. Lewis; As Crônicas de Nárnia. ABSTRACT The children’s literature is one of the most studied fields inside the greater context of literary theory and literary criticism, and inside this field the Fairy Tales get a special place. Without an unique definition, and having different origins – like the celtic/ british, Arabic and medieval cultures – the fairy tales has achieved the format as we know today on the 17th century, with the organization and publication of the folk stories by Charles Perrault, and has got its top during the following two centuries. But we could ask ourselves if this kind of literature has found its end in the end of the 19th century or if it has been adapted and kept being written and published under different forms. It’s with these thoughts in mind that the present article will bend over the The Chronicles of Narnia, from C. S. Lewis, which is nowadays considered one of the most important, emblematic and influent children’s literature work, trying to understand the writing process of these books, searching for the aspects that could support our initial hypothesis
1 Doutorando em Literatura e Crítica Literária pela PUC/SP. Mestre em Literatura e Crítica Literária pela PUC/SP. Especializações em Ensino de Xadrez, pelo INEQ; e em Arqueologia, Cultura e Sociedade, pela UNISA. Autor dos livros Siamo Qui! Os italianos de Alcântara Machado, e De Homero e Ruth Rocha. Um estudo do processo de adaptação das personagens da Odisseia para jovens leitores. Professor de História na Rede Pública Municipal de São Paulo. E-mail: evandro.fantoni. ra@gmail.com INEQ - Educação integral
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that this Lewis’s classical – in terms of narrative, content, theme and structure, besides the target audience – could be considered, like some authors has already classified it, a modern days fairy tale. Keywords: Children’s Literature; Fairy Tales; C. S. Lewis; The Chronicles of Narnia. INTRODUÇÃO Dentro da literatura infantil, um dos campos mais estudado é aquele dos contos de fadas, considerados por muitos estudiosos como uma das mais importantes manifestações literárias voltadas para os jovens leitores ao longo do tempo. A partir do século XVII, quando Charles Perrault organizou e publicou a primeira coletânea de contos de fadas, a produção desse tipo de literatura cresceu exponencialmente, atingindo seu auge nos séculos XVIII e XIX. Naturalmente também cresceram as pesquisas e estudos acerca desse tão importante gênero literário. No presente artigo, revisitamos algumas teorias acerca dos contos de fadas, bem como algumas de suas características definidoras e parâmetros de análise a fim de determinar se a obra As crônicas de Nárnia, da autoria de C.S. Lewis poderia – por sua estrutura e conteúdo – ser considerada um conto de fadas moderno. Para tanto – diante da evidente impossibilidade de abordarmos a obra como um todo, por se tratarem de sete livros – escolhemos o segundo volume d’As Crônicas de Nárnia – O leão, a feiticeira e o guarda-roupas – para estudarmos mais detidamente, procurando estabelecer paralelos entre a obra de Lewis e as características definidoras dos contos de fadas, apresentados para nós por Ana Lúcia Merege. 1. Contos de Fadas: Alguns conceitos
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INEQ - Educação integral
Os Contos de Fadas estão entre as mais importantes manifestações da literatura infantil, e são estudados em diversas áreas do conhecimento humano, com abordagens bastante específicas em cada uma delas, embora não pareça existir uma definição única para eles, conforme nos diz – de forma bem humorada – J. R. R. Tolkien, em seu ensaio “Sobre histórias de fadas”. A definição de histórias de fadas – o que é ou o que deveria ser – não depende, portanto, de qualquer definição ou relato histórico sobre elfos ou fadas, mas sim da natureza do Belo Reino, do Reino Perigoso e do ar que sopra nessa terra. Não tentarei definir isso nem descrever diretamente. Não é possível fazê-lo. O Belo Reino não pode ser capturado numa rede de palavras, porque uma de suas qualidades é ser indescritível, porém não imperceptível. (TOLKIEN, 2006, p.16. Grifos do autor) Mesmo que não haja uma definição única dos contos de fadas, é possível fazer um rastreamento de suas origens ou, para sermos mais específicos em nosso estudo, dos diferentes troncos de histórias maravilhosas que dariam origem – já no século XVII – ao gênero literário que chamamos de contos de fadas. De acordo com Ana Lúcia Merege, os contos de fadas são tributários de três fontes diferentes, sendo que a primeira delas é chamada de fonte oriental, por ser originária dos contos maravilhosos da Índia, posteriormente sintetizados pelos árabes muçulmanos nos contos das Mil e uma noites, chegando à Europa através da presença desses povos na Península Ibérica. A segunda dessas fontes é o chamado mundo clássico – aqui entendido como as antigas civilizações de Grécia e Roma – cujas narrativas
heroicas, como a Ilíada e a Odisseia, e as fábulas, como as de Ésopo, influenciaram a literatura fantástica, sobretudo entre os populares. A terceira dessas fontes é denominada por Merege, em sua obra Os contos de fadas, de célticas-bretãs, por incorporarem elementos dessas duas culturas nas narrativas fantásticas que dariam origem aos contos de fadas, sendo que os mais significativos desses elementos poderiam ser encontrados na tradição oral dos celtas, que Estava impregnada de elementos sobrenaturais, refletindo um sistema de crenças que admitia a existência de uma alma em todos os seres, a transmigração de espíritos pra diferentes corpos e as transformações do corpo físico. Os temas podiam ser de natureza metafísica, como Os cantos de Taliesin, ou, frequentemente, poemas amorosos, ou ainda odes de exaltação a reis e heróis. (MEREGE, 2010, p.28. Grifos da autora) A partir dessas diferentes fontes, cujas narrativas maravilhosas foram sendo passadas ao longo dos séculos, estabeleceu-se, já no século XVII uma estrutura narrativa característica, que viria ser chamada de “contos de fadas”, e o primeiro a adotar essas especificidades é aquele que é considerado o pai dos contos de fadas enquanto gênero narrativo: Charles Perrault, com a publicação dos Contos da mãe gansa, em 1697, conforme nos informa Nelly Novaes Coelho, em seu livro O conto de fadas. A História da Literatura registra que a primeira coletânea de contos infantis foi publicada no século XVII, na França, durante o faustoso reinado de Luís XIV, o rei Sol. Trata-se dos Contos da Mãe Gansa (1697), livro no qual Charles Perrault (poeta e advogado de prestígio na corte)
reuniu oito estórias, recolhidas da memória do povo. (COELHO, 2012, p.27) Tendo todos esses aspectos em mente, ainda que não seja possível chegarmos a uma definição para o que seriam os contos de fadas, podemos encontrar um ponto de partida – para usarmos a expressão de Merege – para sua caracterização A clássica pergunta “o que é conto de fada?” só pode ser satisfatoriamente respondida se levarmos em conta os vários fatores envolvidos em sua criação, transmissão e caracterização como gênero narrativo. Um bom ponto de partida é fornecido por Ana Maria Machado, segundo a qual o conto de fadas seria a história popular, de origem diferenciada em relação aos clássicos, que surgiu anonimamente no seio do povo e foi sendo recontada durante séculos. A essa definição acrescentaremos que o conto de fadas é também a história autoral, escrita ou narrada segundo o modelo aceito para o conto de fadas e evocando a mesma atmosfera de sonho, ideal e sobrenaturalidade. Por fim, não podemos deixar de contemplar os aspectos sociopsicológicos do gênero, reconhecendo a ligação de alguns de seus elementos-chave com os símbolos e arquétipos da memória coletiva. (MEREGE, 2010, p.15. Grifos da autora) Como é possível observar na citação acima, são mencionadas algumas características narrativas e estruturais que poderiam nos ser úteis não para estabelecer uma definição limitante, mas sim uma série de elementos considerados invariáveis, e que nos servirão de guia para a análise da obra As Crônicas de Nárnia que faremos mais adiante. INEQ - Educação integral
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Novamente recorremos aos estudos de Merege, que apoiada nos trabalhos de Coelho e Vladimir Propp, estabelece cinco elementos que estão sempre presentes nas narrativas de contos de fadas. Ainda que as formas pelas quais esses elementos se manifestam possam variar muito, suas características fundamentais invariáveis.
mais adiante como critério de análise a fim de verificar a sustentabilidade de nossa hipótese de que As Crônicas de Nánia poderiam ser consideradas um conto de fadas moderno – consideramos importante apresentar a obra que estudaremos mais a fundo, bem como da vida de seu autor. 2. C. S. Lewis e As Crônicas de Nárnia
a) A aspiração ou desígnio: o motivo nuclear que leva o herói à ação. Pode ser um dever, [...] uma tarefa, [...] um ideal ou aspiração. O desígnio é sempre o ponto de partida da história. b) A viagem: Em geral, o herói empreende uma jornada, deixando seu lar. [...] Em alguns casos, porém [...] ele é despojado de seus direitos ou sua identidade, passando a viver num ambiente hostil, ainda que continue em sua própria casa. c) O desafio ou obstáculo: Este pode aparecer como algo físico, [...] uma fera, uma profecia, [...] uma tarefa aparentemente irrealizável ou um antagonista. [...] O desafio é essencial para o herói: é o ordálio, a prova pela qual ele passa para merecer sua recompensa e/ou alcançar a redenção. d) O mediador: O herói é sempre auxiliado por um objeto encantado [...] ou um ser mágico, [...] que às vezes assume a forma animal. [...] A esperteza de um amigo ou criado ou algum talento especial do herói (ou de seu aliado) podem também bastar à remoção do obstáculo. [...] e) A conquista do objetivo: Finalmente, o herói cumpre seu propósito. [...] Nos contos de fadas é a hora do “felizes para sempre”. (MEREGE, 2010, p.11-12) Tendo trazido alguns breves conceitos acerca das origens e definições dos contos de fadas, bem como dos elementos considerados invariáveis nesse gênero – os quais utilizaremos
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INEQ - Educação integral
Clive Staples Lewis foi um dos mais importantes pensadores do século XX, e mesmo hoje, passados quase sessenta anos de seu falecimento – no ano de 1963 – ele ainda é um dos autores mais lidos e influentes escritores ingleses, sendo considerado ao mesmo tempo um fenômeno e uma anomalia por Robert MacSwain, na introdução da obra C. S. Lewis além do universo mágico de Nárnia, que organizou ao lado de Michael Ward. C. S. Lewis é um fenômeno e uma anomalia ao mesmo tempo. É um fenômeno no sentido de que, quase cinquenta anos após sua morte, continua a ser um dos autores mais famosos e um dos maiores Best-sellers do mundo. E ele mantém essas qualidades não apenas em um gênero, mas em muitos: literatura infantil, ficção científica, teologia, filosofia, apologética cristã, autobiografia, ensaio, romance e poesia. De modo extraordinário, toda essa produção foi incidental a sua carreira profissional, em Oxford e em Cambridge, como acadêmico de grande renome, devido a seu profundo conhecimento das literaturas medieval e renascentista. Apesar das enormes mudanças no modo como a literatura em geral é estudada, e a despeito de mudanças substanciais no panorama acadêmico das áreas em que Lewis foi grande especialista, suas publicações acadêmicas ainda são bastante importantes, tanto
para estudantes como para especialistas. (MAC SWAIN; WARD, 2015, p.1) Apesar de ter publicações em diferentes áreas do conhecimento, como vimos na citação acima, Lewis destacou-se de forma mais intensa e evidente com obras que abrangem três grandes áreas do pensamento ocidental, sendo que a primeira delas é a religião cristã, defendida de uma forma mais pura do que institucionalizada, conforme nos informa Alister McGrath em sua obra A vida de C S. Lewis. Do ateísmo às terras de Nárnia. [...] escritor e apologista cristão, preocupado em comunicar e compartilhar sua rica visão do poder intelectual e imaginativo da fé cristã – uma fé que ele descobriu já adulto e considerou racional e espiritualmente irresistível. [...] Sua obra Cristianismo puro e simples é muitas vezes citada hoje em dia como a obra religiosa mais influente do século 20. (MC GRATH, 2013, p. 13. Grifos do autor) A segunda grande área em que as obras de Lewis encontram terreno fértil e exercem grande influência é a da crítica literária, posto que ele foi um dos mais importantes críticos e professores do seu tempo, ocupando cadeiras em Oxford e Cambridge, sendo indicado para a Academia Britânica, e lotando salões com suas reflexões acerca da literatura inglesa. [...] notável professor e crítico literário de Oxford que lotava salões de palestras ao apresentar suas reflexões espontâneas sobre a literatura inglesa e que seguiu em frente para se tornar o primeiro titular da cadeira de Literatura Medieval e Renascentista da Universidade de Cambridge. [...] A vocação profissional de Lewis apontava para a vida acadêmica. Sua indicação como membro da Academia Bri-
tânica em julho de 1955 foi uma demonstração pública de sua grande reputação intelectual. (MC GRATH, 2013, p. 14) É, contudo, pelo alcance de suas obras na terceira grande área na qual Lewis atuou, que o crítico é mais conhecido: a escrita de obras literárias diversas, sobretudo de fantasia, entre as quais destaca-se – com uma repercussão raras vezes alcançada por qualquer obra literárias, menos ainda por aquelas dedicadas ao público infantil. Lewis foi o criador do fabuloso mundo de Nárnia; o autor de alguns dos livros infantis mais conhecidos e discutidos do século 20, que continuam atraindo leitores entusiásticos e vendendo aos milhões. Cinquenta anos após sua morte, Lewis ainda é um dos escritores mais influentes de nossa época. Juntamente com seu igualmente famoso colega e amigo J. R. R. Tolkien (1892-1973), escritor de O senhor dos anéis, Lewis é amplamente conhecido como uma referência literária e cultural. Os mundos da literatura e do cinema foram profundamente influenciados por esses dois autores de Oxford. (MC GRATH, 2013, p.13) O mundo de Nárnia, citado acima, é considerado até os dias de hoje um dos mais importantes e completos mundos de fantasia já criados, a ponto de Lloyd Alexander – um importante escritor norte-americano, autor de mais de quarenta livros, em sua maioria de fantasia para crianças – ter afirmado que Like his fellow genius Tolkien, CS. Lewis has redefined the nature of fantasy, adding richness, beauty, and dimension. His Narnia chronicles are not only breathtaking and heartlifting adventures for young and old, they are, as well, reflecINEQ - Educação integral
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tions of Lewis’s most deeply held beliefs in matters of faith and hope, good and evil, the truly miraculous and the miraculously true. In our times, every fantasy realm must be measured in comparison with Narnia. ² (IMBORNONI, s/d) As crônicas de Nárnia são compostas por sete livros, publicados entre os anos de 1950 e 1956, cuja ordem cronológica (dentro do universo ficcional, e não de publicação) seria O sobrinho do mago, O leão, a feiticeira e o guarda-roupa, O cavalo e seu menino, O príncipe Caspian, A viagem do Peregrino da Alvorada, A cadeira de prata, e A última batalha. Todos os sete livros narram as aventuras de crianças e jovens do nosso mundo em um outro reino mágico, o mundo de Nárnia, criado pelo leão Aslam, uma das personagens mais emblemáticas de toda a literatura do século XX. Essas aventuras mágicas são sempre recheadas de momentos épicos e fantásticos, que prendem a atenção do leitor ao longo das mais de setecentas páginas que compõe os sete livros somados. Além disso, as personagens – mesmo as não humanas, como animais falantes, e seres míticos, tais como centauros e gigantes – possuem construções profundas que transmitem valores aos leitores – poderíamos enxergar aqui uma primeira relação com os contos de fadas, aproximando-nos à ideia de moral defendida por Perrault, conforme vimos acima – ao mesmo tempo em que os fazem refletir sobre suas próprias vidas e escolhas, conforme nos informa McGrath.
As crônicas de Nárnia esclarecem como os seres humanos se veem a si mesmos, como enfrentam suas fraquezas e como tentam se tornar as pessoas que devem ser. Elas tratam da busca de significado e da virtude, não apenas da busca de explicação e do entendimento. Esse talvez seja o fator que explica seu forte apelo: as crônicas de Nárnia falam de escolhas a fazer, de certo e errado, e de desafios a enfrentar. Todavia, essa visão de benignidade e grandeza não é exposta como uma argumentação lógica ou raciocinada; é, antes, afirmada e explorada por meio da narrativa de uma história – uma história que prende a imaginação. (MC GRATH, 2013, p.284) De acordo com o próprio Lewis – no ensaio “Tudo começou com uma imagem...” – até mesmo ele desconhece todos os detalhes do processo de criação das suas próprias obras, mas que elas teriam sempre se iniciado com uma imagem que se formava em sua cabeça, e a partir dela desenvolvia-se toda a narrativa. O editor me pediu para dizer como eu vim a escrever O Leão, a Feiticeira e o Guarda-roupa. Vou tentar, mas você não deve acreditar em todos os autores que lhe contam sobre como eles escreveram seus livros. Não porque eles queiram contar mentiras, e sim porque um homem que escreve uma história está empolgado demais com a história em si para relaxar e perceber como está fazendo isso. [...] Todos os meus sete livros de Nárnia [...] começaram com imagens em minha cabeça. No começo não eram uma histó-
2 - Tradução livre: Como seu colega gênio Tolkien, CS. Lewis redefiniu a natureza da fantasia, acrescentando riqueza, beleza e dimensão. Suas crônicas de Nárnia não são apenas aventuras emocionantes e emocionantes para jovens e velhos, mas também são reflexos das crenças mais profundas de Lewis em questões de fé e esperança, bem e mal, o verdadeiramente milagroso e o milagrosamente verdadeiro. Em nossos tempos, todo reino de fantasia deve ser medido em comparação com Nárnia.
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ria, apenas imagens. O Leão [, a feiticeira, e o guarda-roupa] começou com uma imagem de um Fauno carregando um guarda-chuva e de um pacote em uma floresta nevada. Essa imagem esteve em minha mente desde os dezesseis anos. Então, um dia, quando eu tinha cerca de quarenta anos, eu me disse: “Vamos tentar fazer uma história sobre isso”. [...] Assim, você vê que, em certo sentido, eu sei muito pouco sobre como essa história nasceu. Ou seja, não sei de onde as imagens vieram. E não acredito eu alguém saiba exatamente como “se inventa coisas”. Inventar é uma coisa muito misteriosa. Quando você “tem uma ideia”, consegue dizer a alguém exatamente como pensou nisso? (LEWIS, 2018, p. 101-102. Grifos do autor) Ainda que Lewis afirme de forma bastante direta que a escrita d’As crônicas de Nárnia tenha partido de imagens às quais nem mesmo ele saberia dizer com precisão de onde veio, a forma de contar a história composta a partir dessas imagens – como um conto de fadas – foi escolhida de forma deliberada, sendo que o próprio crítico nos informa das razões que o levaram a fazer essa escolha, conforme podemos observar na citação abaixo, extraída do ensaio “Sobre três maneiras de escrever para crianças”. Penso que, em parte, essa forma [o conto de fadas] permite que eu deixe de fora – ou até mesmo compele-me a deixar de fora – as coisas que era minha intenção deixar de fora. Isso força o escritor a pôr toda a força do livro no que foi feito e dito. [...] O tipo fantástico de história de
crianças [...] é o tipo que conheço melhor e amo mais. (LEWIS, 2018, p.79) Tendo apresentado alguns aspectos da vida de C. S. Lewis, bem como do processo de criação que levou à composição d’As crônicas de Nárnia, e da forma por ele escolhida para escrever sua obra máxima, podemos partir para o próximo item, no qual verificaremos quais características – segundo os critérios apresentados acima – dos contos de fadas podemos encontrar na obra de Lewis. 3. Um Conto de Fadas Moderno? Seria impossível, dado o espaço limitado de um artigo, que déssemos cota de um estudo aprofundado dos sete livros que compõe “As crônicas de Nárnia”, para verificar em cada um deles a presença de elementos caracterizadores dos contos de fadas. Assim sendo, a fim de desenvolvermos uma análise qualitativa, visando a maior qualidade possível, escolhemos apenas um dos livros para estudarmos no presente artigo: O leão, a feiticeira e o guarda-roupa. Fizemos essa escolha por dois motivos complementares, sendo que o primeiro deles consiste no fato de ser esse o mais conhecido dos livros das Crônicas de Nárnia, tendo sido adaptado para o cinema em 2005, tornando-se um imediato e absoluto sucesso de bilheteria; e o fato de ter sido esse o primeiro dos sete livros narnianos publicados por Lewis – mesmo que no universo cronológico da obra, apareça como a segunda história. Uma vez realizada a escolha, procedermos a análise da obra, procurando em suas páginas³ elementos que se apresentem como as cinco
É importante destacarmos que foram encontradas, em muitos casos, mais de uma passagem da obra de Lewis que poderiam se enquadrar nas características dos contos de fadas propostas por Merege, porém, em decorrência da limitada extensão de um artigo, optamos por apresentar apenas uma passagem por cada item. INEQ - Educação integral
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características fundamentais dos contos de fadas, conforme apresentados por Merege, como vimos acima: A primeira das características apresentadas acima foi a da aspiração ou desígnio, que é a força motivadora do herói para a realização dos seus feitos. No caso de O leão, a feiticeira e o guarda-roupa, o grande motivo que leva as personagens principais – as crianças Pedro, Susana, Edmundo e Lúcia – a explorarem o mundo de Nárnia é o sequestro do fauno Sr. Tumnus, ocasionado pela ajuda que ele prestou à Lúcia em sua primeira visita ao mundo mágico, o que faz com que ela se sinta culpada pelo aprisionamento do fauno, conforme podemos observar na citação abaixo. - Ah, isso é que não! Agora não pode ser! – disse Lúcia de repente. – Não podemos voltar depois do que aconteceu. Foi por minha causa que o fauno se meteu nesta confusão. Foi ele que me escondeu da feiticeira e me ensinou o caminho de casa. É isto que eles querem dizer com o “auxílio aos inimigos da rainha e confraternização com humanos”. Temos de fazer tudo para salvá-lo. [...] - Tem aqui dentro de mim uma coisa horrível dizendo que Lu está certa. – disse Susana. – Mas, por mim, não dava nem mais um passo. Ah, se eu não tivesse vindo! Mas temos de fazer alguma coisa pelo fauno. Seja lá o que for. - Também acho – disse Pedro. (LEWIS, 2009, p.128-129) A segunda das características apresentadas por Merege é a da viagem, que corresponde a algum tipo de peregrinação da parte dos heróis, que devem deixar a sua casa – ou empreender algum tipo de mudança de ambiente dentro da própria casa, como é o caso de O leão, a feiticeira e o guarda-roupa – para que
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possam desempenhar a tarefa. No caso do livro estudado, a viagem ocorre antes mesmo do desígnio, e o momento em que ela se torna mais evidente está nos primeiros capítulos do livro, em um primeiro momento quando a personagem Lúcia chega ao mundo de Nárnia a primeira vez, e depois – e de forma mais definitiva – quando a jovem volta para o reino mágico, agora acompanhada pelos irmãos mais velhos. - Depressa! – disse Pedro. – Não temos outro lugar. – E abriu de repente o guarda-roupa. Amontoaram-se os quatro lá dentro, sentando-se ofegantes no escuro. Pedro segurou a porta encostada, mas não a fechou completamente: como todas as pessoas de juízo, sabia muito bem que nunca devemos nos fechar dentro de um guarda-roupa. - Deus permita que a governanta despache logo aquela gente! – falou Susana. – Estou toda encolhidinha! - Que cheiro horrível de cânfora! – exclamou Edmundo. - Deve ser dos bolsos dos casacos, cheios de naftalina, para espantar traças – disse Susana. - Tem um troço aqui me picando nas costas – disse Pedro. - Não está ficando frio? – perguntou Susana. - E muito – disse Pedro. – E que umidade! Que diabo de lugar é este? Estou sentado em cima de uma coisa molhada. E está cada vez mais úmido. Foi com dificuldade que Pedro conseguiu erguer-se. Edmundo disse: - Vamos sair, eles já foram embora. - Oh! Oh! – gritou Susana de repente. Todos perguntaram o que tinha acontecido. - Estou encostada numa árvore – disse ela. – Olhem! Lá longe está clareando.
- Puxa vida, é mesmo! – disse Pedro. – E olhem pra lá... e pra lá... tudo cheio de árvores! E esta coisa molhada é neve. Agora acredito que estamos no bosque da Lúcia. Já não podia haver a menor dúvida. Ficaram os quatro, imóveis, piscando na luz fria da manhã de inverno. Atrás deles, os casacos dependurados nos cabides, e, na frente, as árvores cobertas de neve. (LEWIS, 2009, p.125-126) A terceira característica que Merege nos traz é a do desafio ou obstáculo, que pode se manifestar de diferentes maneiras, mas que consiste essencialmente em algum tipo de desafio pelo qual os heróis devem passar a fim de provarem o seu valor. No caso de O leão, a feiticeira e o guarda-roupa, além da Feiticeira Branca – que sozinha pode ser considerada como um desafio à parte – há uma profecia que liga o destino da feiticeira ao dos protagonistas e ao da própria Nárnia. Essa profecia versa sobre o fim de uma era sombria nas terras de Nárnia, e o início de um novo período de glória, a partir do retorno de Aslam e da presença dos quatro jovens. Esse é o desafio pelo qual os protagonistas devem passar: cumprir os seus papéis no processo de construção de uma era de ouro para Nárnia. Assim a profecia nos é apresentada por Lewis. - É que existe uma outra profecia. Lá embaixo, em Cair Paravel, no castelo que dá para o mar, junto da foz do rio, e que devia ser a capital se tudo corresse como deveria... Lá, em Cair Paravel, há quatro tronos. Uma velhíssima tradição de Nárnia já anunciava que, quando dois Filhos de Adão e duas Filhas de Eva se sentarem nos quatro tronos, então será o fim, não só do reinado da feiticeira, mas da própria feiticeira. (LEWIS, 2009, p. 139)
A quarta das características dos contos de fadas que Merege nos traz é a presença do mediador, que pode ser uma pessoa, animal, criatura fantástica ou objeto mágico que auxilia o herói na superação do desafio e conquista do objetivo. Em O leão, a feiticeira e o guarda-roupa, ao pensarmos na figura do mediador, naturalmente a primeira coisa que nos vêm à cabeça é a personagem Aslam, que com seus poderes, conselhos e sacrifício auxilia os quatro protagonistas no cumprimento do objetivo – e da profecia. Para o presente artigo, contudo, escolhemos trazer como exemplo de mediador não a figura de Aslam, mas sim os objetos mágicos que são utilizados pelos quatro protagonistas em diferentes momentos da obra. Esses objetos mágicos foram dados às personagens Pedro, Susana e Lúcia por um segundo mediador – depois do próprio Aslam – que pode ser considerado uma figura mágica, que habita a mente e o coração das crianças de todas as épocas. Era um trenó puxado por duas renas, com sinetas tilintando nos arreios. Renas muito maiores que as da feiticeira, mas eram castanhas e não brancas. No trenó estava alguém que todos reconheceram à primeira vista. Era um homem alto, vestido de vermelho vivo com bagas do azevinho, com um capuz forrado de pele, uma barba branca, tão comprida que lhe cobria o peito como uma queda d’água espumante. [...] Alguns dos postais coloridos de Papai Noel que podemos ver em nosso mundo mostram um velho engraçado e bonachão. Não era bem assim para as crianças. Era tão grande, tão alegre e tão real, que ficaram paralisadas de espanto. E, apesar de todo o contentamento, sentiam também que era um momento solene. [...] - Pedro, Filho de Adão – continuou Papai INEQ - Educação integral
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Noel. - Presente! – disse Pedro. - Presentes para você. São ferramentas, e não brinquedos. Talvez não esteja longe o dia em que precisarão usá-las. Com honra! E entregou a Pedro um escudo e uma espada. O escudo era cor de prata, com um leão rubro no centro, lustroso como um morango pronto para ser colhido. A espada tinha punho de ouro, bainha, cinto, tudo, e parecia feita sob medida. Pedro recebeu os presentes em grave silêncio, sentindo que se tratava de uma coisa muito séria. - Susana, Filha de Eva! Isto é para você. – E Papai Noel entregou-lhe um arco, uma aljava cheia de flechas e uma trompazinha de marfim. – Só deve usar o arco em grande risco, pois não quero que você tome parte ativa na luta. Raras vezes falha o alvo. Quanto à trompa, é só levá-la aos lábios e tocar: auxílio lhe virá de alguma parte. - Lúcia, Filha de Eva! – Papai Noel estendeu-lhe uma garrafinha, que parecia de vidro (houve mais tarde quem dissesse que era de diamante) e um punhal muito pequeno. – Esta garrafa contém um tônico feito do suco de uma flor de fogo que cresce nas montanhas do sol. Se um amigo estiver ferido, bastam algumas gotas para curá-lo. O punhal é para a sua defesa, em caso de extrema necessidade. Porque você também não deve entrar na luta. (LEWIS, 2009, p. 150-151) A quinta e última das características fundamentais dos contos de fadas apresentados por Merege é a conquista do objetivo, que é – como se pode facilmente presumir – o momento em que os heróis superam os desafios e obstáculos e alcançam os objetivos buscados. É também o momento do “felizes para sem-
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pre”. Em O leão, a feiticeira, e o guarda-roupa, encontramos dois grandes objetivos colocados para os protagonistas, sendo que o primeiro deles – apresentado acima – consiste na busca pelo fauno Tumnus, a fim de libertá-lo da magia da Feiticeira Branca, que o havia transformado em pedra. Esse primeiro objetivo é alcançado com a ajuda de Aslam, que com seu sopro de vida o libertou, quando – ao lado de Lúcia e Susana – invadiu o castelo da Feiticeira Branca. Mas o melhor de todos os momentos foi quando Lúcia subiu as escadas gritando: - Aslam! Aslam! Achei o Sr. Tumnus! Depressa, por favor! Daí a pouco, Lúcia e o pequeno fauno, de mãos dadas, dançavam de alegria. Apesar daquela temporada triste de estátua, ele ainda era o mesmo, muito interessado nas coisas que a menina tinha a contar. (LEWIS, 2009, p.178) O segundo dos objetivos – e mais importante deles, na verdade – é o cumprimento da profecia, que se dá no momento em que é travada violenta batalha entre os exércitos da Feiticeira Branca e o de Aslam – liderados por Pedro até o momento da chegada do leão, com poderosos e decisivos reforços – ao final da qual a feiticeira é morta sob as garras de Aslam. Assim nos é descrita a batalha, sob o olhar de Lúcia Ao saírem do vale, viu logo do que se tratava. Pedro, Edmundo e todo o resto do exército de Aslam lutavam desesperadamente contra uma imundície de gente, seres hediondos, como os da véspera, À luz do dia, eram ainda mais estranhos, mais malignos e monstruosos, E pareciam mais numerosos. O exército de Pedro – de costas para ela – parecia uma brincadeira. E havia está-
tuas espalhadas por todo o campo de luta: a feiticeira certamente usara sua varinha. Mas agora ela lutava com o grande facão de pedra. E era com Pedro que lutava, os dois com tal fúria, que Lúcia mal conseguia ver o que se passava. Só via o facão e a espada cruzarem-se com grande rapidez como se fossem três facões e três espadas. Os dois estavam no meio exato do campo de batalha. De um lado e outro, as fileiras dos combatentes. Não havia lugar onde os olhos não vissem coisas de arrepiar. [...] Com um rugido que fez tremer a terra de Nárnia, do lampião às praias do Mar Oriental, o gigantesco bicho atirou-se à feiticeira. Lúcia viu, por um instante, a feiticeira fitando o Leão, cheia de medo. E logo a seguir os dois rolaram pelo chão. Ao mesmo tempo, os animais guerreiros (libertados por Aslam) caíram somo loucos sobre o inimigo. Os anões lutavam com machados; os cães, com os dentes; Rumbacatamau, com o seu enorme cajado (sem falar nos pés, que esmagavam dezenas de inimigos); os unicórnios, com os chifres; os centauros, com as espadas e os cascos. O exausto exército de Pedro exultou com o reforço. Os inimigos guincharam. E foi um estrépito no bosque. Alguns minutos depois, a batalha terminava. A maior parte do inimigo fora destroçada por Aslam e seus companheiros. Os outros, vendo a feiticeira morta, renderam-se ou fugiram em debandada. (LEWIS, 2009, p. 180-182) Por fim, já no último capítulo da obra, encontramos ainda uma passagem que pode ser considerada como a versão narniana do “feliz para sempre” referido por Merege: trata-se da coroação dos quatro protagonistas em Cair Paravel, como reis e rainhas de Nárnia.
No dia seguinte, porém, a coisa foi muito mais solene. No grande salão de Cair Paravel – um salão formidável, com teto de marfim, uma parede coberta de penas de pavão e uma porta aberta para o mar –, na presença de todos, Aslam coroou-os com toda a cerimônia. E eles sentaram-se nos tronos, entre aclamações ensurdecedoras de “Viva o rei Pedro! Viva a rainha Sussana! Viva o rei Edmundo! Viva a rainha Lúcia!” - Quem é coroado rei ou rainha em Nárnia será para sempre rei ou rainha. Honrem a sua realeza, Filhos de Adão! Honrem a sua realeza, Filhas de Eva! – disse Aslam. Pela porta aberta para o mar, chegavam as vozes dos tritões e das sereias, que entoavam cânticos em louvor dos novos soberanos, nadando perto da praia. Assim, as crianças ocuparam seus tronos, empunharam seus cetros e concederam recompensas e honrarias a todos os amigos: a Tumnus, ao Sr. E Sra. Castor, ao gigante Rumbacatamau, aos leopardos, aos centauros bons, aos bons anões e ao leão. À noite, houve grande festa em Cair Paravel. O ouro reluzia e o vinho corria. A música do mar era como um eco à música da festa, porém mais doce e penetrante. (LEWIS, 2009, p.183-184) CONSIDERAÇÕES FINAIS Iniciamos o presente artigo nos perguntando se a obra máxima de C. S. Lewis, “As crônicas de Nárnia”, poderia ser considerada algum tipo de conto de fadas moderno, e para verificar essa possibilidade, estabelecemos alguns degraus a serem escalados. Em primeiro lugar, estabelecemos alguns conceitos acerca das características que consideramos – apoiados em diferentes teóricos, mas INEQ - Educação integral
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especialmente em Ana Lúcia Merege – fundamentais em uma narrativa para que ela possa ser classificada como um conto de fadas, sendo que seriam elas a presença de alguns elementos narrativos: Uma aspiração ou desígnio que determine/motive a ação do herói; a viagem do herói, que deve realizar algum tipo de peregrinação a fim de cumprir o objetivo; a presença de um desafio ou obstáculo, que funciona tanto como um impedimento do herói à conclusão do objetivo como um teste para ele provar o seu valor; a existência de um mediador para auxiliar o herói na superação do obstáculo, podendo ser tanto uma pessoa, uma criatura fantástica ou um objeto mágico; e por fim a conquista do objetivo, quando se dá o “felizes para sempre”. Tendo discutido esses conceitos, partimos para a apresentação do criador das terras de Nárnia: Clive Staples Lewis, destacando os diferentes campos da literatura nos quais atuou, bem como a importância que atingiu nessa área, sendo considerado referência em diversos campos da literatura, mesmo tendo se passado quase sessenta anos de seu falecimento, ocorrido em 1963. O passo seguinte foi apresentar “As crônicas de Nárnia” em sua totalidade, ou seja, fizemos uma breve apresentação da obra máxima de Lewis e escolhemos O leão, a feiticeira, e o guarda-roupa como obra de referência para verificar a aplicabilidade de nossa ideia inicial sobre a classificação da obra de Lewis como um conto de fadas moderno. A partir das características dos contos de fadas propostos por Merege, estabelecemos um paralelo com episódios do livro de Lewis, procurando demonstrar que em maior ou menor medida, todos eles estavam presentes em O leão, a feiticeira, e o guarda-roupa, o que comprovaria – ainda que parcialmente, uma vez
que a análise aprofundada se deu apenas em um dos livros narnianos, em decorrência do espaço limitado de um artigo – a nossa hipótese inicial. Por fim, levando em conta as estruturas semelhantes entre todas as crônicas narnianas, e tendo em mente que O leão, a feiticeira, e o guarda-roupa foi a primeira delas a ser publicada, funcionando como referência para as outras seis, acreditamos poder responde positivamente à nossa pergunta inicial, ou seja, acreditamos ser possível afirmar que – dadas suas características narrativas e estruturais – As crônicas de Nárnia podem sim ser consideradas como contos de fadas modernos. REFERÊNCIAS BASSHAM, Gregory; WALLS, Jerry L. As Crônicas de Nárnia e a filosofia. Tradução de Marcos Malvezzi. São Paulo: Madras, 2006. COELHO, Nelly Novaes. O conto de fadas. Símbolos – mitos – arquétipos. São Paulo: Paulinas, 2012. GÓES, Lúcia Pimentel. Introdução à literatura infantil e juvenil. São Paulo: Pioneira, 1991. IMBORNONI, Ann-Marie. C.S. Lewis. In: Narnia Fans. Acesso em 02/10/2020. Disponível em: https://narniafans.com/c-s-lewis/ JACOBS, Alan. As Crônicas de Nárnia. In: MACSWAIN, Robert; WARD, Michael (Org.). C. S. Lewis além do universo mágico de Nárnia. Tradução de Jeferson Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 2015. LEWIS, Clive Staples. As Crônicas de Nárnia. Tradução de Paulo Mendes Campos e Silêda Steuernagel. São Paulo: Martins Fontes, 2009. ______. Sobre três modos de escrever para crianças. In: Sobre histórias. Tradução de Francisco Nunes. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2018. ______. Tudo começou com uma imagem... In: Sobre histórias. Tradução de Francisco Nunes. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2018. MACHADO, Ana Maria. Como e por que ler os clássicos universais desde cedo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002. MAC SWAIN, Robert; WARD, Michael (Org.). C. S. Lewis além do universo mágico de Nárnia. Tradução de Jeferson Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 2015. MC GRATH, Alister. A vida de C. S. Lewis. Do ateísmo às terras de Nárnia. Tradução de Almiro Pisetta. São Paulo: Mundo Cristão, 2013. MEREGE, Ana Lúcia. Os contos de fadas. Origens, história e permanência no mundo moderno. São Paulo: Claridade, 2010. PROPP, Vladimir. Morphology of the Folktale. Tradução de Laurence Scott. Austin: University of Texas Press, 2009. TOLKIEN, John Ronald Reuel. Sobre histórias de fadas. Tradução de Ronald Kyrnse. São Paulo: Conrad, 2006.
FRITJOF CAPRA E ZYGMUNT BAUMAN: REFLEXÕES SOBRE A EDUCAÇÃO MUSICAL CONTEMPORÂNEA. Fabiana Pereira Dutra Vieira¹
RESUMO Neste artigo pretende-se discutir as ideias de Fritjof Capra² referentes à Teoria dos Sistemas e ao novo paradigma educacional emergente assim como suas implicações para a educação musical contemporânea. A seguir apresentam-se ideias de Zigmunt Bauman acerca do mundo líquido contemporâneo³ e uma análise possível de seu impacto sobre a educação musical da atualidade. PALAVRAS- CHAVE: Fritjof Capra; Zygmunt Bauman; Educação Musical Contemporânea; Educação Sistêmica; Mundo Líquido Moderno. ABSTRACT This article aims to discuss Fritjof Capra's ideas regarding Systems Theory and the new emerging educational paradigm as well as its implications for contemporary music education. The following
are Zigmunt Bauman's ideas about the contemporary liquid world and a possible analysis of its impact on today's music education. KEYWORDS: Fritjof Capra; Zygmunt Bauman; Contemporary Musical Education; Systemic Education; Modern Liquid World. 1 Fritjof Capra e a concepção sistêmica da vida (...) - Você, eu, todos nós precisamos de uma nova visão de mundo e de uma ciência mais abrangente para nos apoiar. Há uma teoria surgindo agora que coloca todas as ideias ecológicas de que falamos numa estrutura científica coesa e coerente. Nós a chamamos de teoria dos sistemas, dos sistemas vivos. - Como poderia falar de uma árvore sem falar de suas folhas ou raízes? - Eu conseguiria, sem nem mencionar essas partes: um cartesiano olharia para a árvore
1 - Pós-graduada (FIC- SP/2020) Educação Musical; Licenciada em Letras (UNIVAS- MG/ 2003) e Música (UNINCOR-MG/ 2007); Bacharel em música, instrumento Voz (CBM-RJ/ 2006). Docente em Artes, Ensino Fundamental II e Médio da Rede Municipal da cidade de São Paulo. Criadora do Projeto Musical Canta um Conto, do Programa Mais Educação, desenvolvido nos anos de 2018 e 2019 na EMEF Senador Milton Campos/ Vila Icaraí/ Brasilândia/ SP. Em 2020 o Projeto Musical Canta um Conto passou a ser realizado de forma on-line, ao vivo, por meio de lives, de forma voluntária, devido à situação Pandêmica. Este projeto foi estendido a outras escolas e aberto a todos os interessados. Hoje conta com a participação de 45 estudantes de escolas variadas da rede municipal, estadual e particular de ensino. 2 - Austríaco nascido em Viena, Fritjof Capra é Doutor em Física, cientista, ambientalista, educador e ativista. Conhecido mundialmente como teórico de sistemas é autor de vários best-sellers como O Tao da Física, O Ponto de Mutação, Sabedoria Incomum, Pertencendo ao Universo, A Teia da Vida, e o mais recente, As Conexões Ocultas: Ciência para uma Vida Sustentável. Capra é um dos diretores-fundadores do Center for Ecoliteracy (Centro de Eco-Alfabetização) da Berkeley, Califórnia, que promove a divulgação do pensamento ecológico e sistêmico nas redes de educação primária e secundária. 3 - Expressão muito utilizada por Zygmunt Bauman, um dos grandes pensadores da modernidade. Com esta expressão o autor faz uma crítica à volatilidade e à efemeridade de todos os aspectos da vida humana na contemporaneidade. INEQ - Educação integral
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e a dissecaria, mas aí, ele jamais entenderia a natureza da árvore... um pensador de sistemas veria as trocas sazonais entre a árvore e a terra, entre a terra e o céu. Ele veria o ciclo anual que é como uma grande respiração que a terra realiza com suas florestas, dando-nos o oxigênio. O sopro da vida, ligando a terra ao céu e nós ao universo...4 O Ponto de Mutação (diálogo do filme) A ciência do século XVII baseou-se num método de investigação que envolvia a descrição matemática da natureza e o método analítico de raciocínio concebido por Descartes. Este método de investigação e sua correspondente compreensão da vida foi o marco da Idade da Revolução Científica. Entende-se por paradigma cartesiano o conjunto de métodos de investigação e de compreensão do mundo baseado em tal visão. Vale ressaltar que a visão de mundo cartesiana acredita que o todo pode ser compreendido pela fragmentação de suas partes não levando em consideração o seu contexto (CAPRA, 2014, p. 51). Em oposição ao pensamento cartesiano a ciência dos sistemas acredita que as partes não podem ser compreendidas se forem separadas do todo. Os sistemas podem ser compreendidos como totalidades integradas, cujas propriedades não podem ser reduzidas às estruturas menores; seres humanos e processos também podem ser compreendidos e analisados como sistemas, não deveriam ser isolados do contexto do qual fazem parte. Em vez de se concentrar nos elementos ou substâncias básicas, a abordagem sistêmica enfatiza princípios básicos de organização (CAPRA, 2014, p. 260). Por esta razão o pensamento sistêmico
é também chamado de pensamento contextual, ou pensamento ambientalista, uma vez que procura explicar as coisas considerando seu meio ambiente. Este pensamento consolidou-se na década de 30 (CAPRA, 2013, p. 46). Fritjof Capra, por meio de sua reflexão descreve a mudança do paradigma cartesiano para o paradigma sistêmico e apresenta-nos o seu significado no livro O Ponto de Mutação, escrito em 1982. Esta mudança, antes de tudo, implica na substituição da visão de mundo fragmentadora, mecanicista5 por uma visão pautada na concepção sistêmica e contextualizada da vida (CAPRA, 2015, p. 15). A concepção sistêmica compreende que tudo o que existe está conectado em forma de uma grande teia, a teia da vida. Seres, natureza e sistemas sociais são entendidos como totalidades integradas organizadas e conectadas a partir de inter-relações. Por meio dessas inúmeras conexões sempre ocorrem diversas trocas. Todo sistema se insere num outro sistema maior que é o seu ambiente, como exemplo, o indivíduo se insere na sociedade com a qual troca informação e energia. Essas trocas são essenciais à manutenção e sustentação da vida. Desta forma se queremos ter uma visão sistêmica de determinado assunto ou problema é preciso conhecer seu contexto para se realizar uma análise integrada de todas as suas dimensões para que haja uma compreensão do todo. Ideias centrais do pensamento sistêmico vieram do âmbito das ciências naturais para pouco a pouco atingir a realidade social, inclusive a realidade educacional (PAREJO, 2018, pos. 945).
4 - O Ponto de Mutação (vídeo). Direção Bernt Capra. Cannes Home Video. 5 - Segundo o dicionário Michaelis, Mecanicismo é uma doutrina filosófica que concebe a natureza como máquina, cujo funcionamento se explica pelas propriedades físico-químicas de corpos materiais no espaço.
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INEQ - Educação integral
1.2 Educação musical cartesiana x educação musical sistêmica Ao se pensar a educação musical a partir da compreensão de mundo cartesiana, pode-se dizer que esta privilegia as partes em detrimento do todo e fragmenta a totalidade dos seres e dos processos de ensino aprendizagem. Formações regidas pelo paradigma cartesiano destinam-se quase que exclusivamente ao aspecto racional, intelectual, verbal, um ser humano desincorporado, fragmentado e incapacitado para a compreensão de si como unidade complexa e integrada. O estudante é compreendido como intelecto apenas. Ignora-se o corpo, a sensorialidade, as emoções e os sentimentos. Essa forma de fragmentação encontra-se também no currículo e Morin denuncia e critica o excessivo processo de disciplinarização do conhecimento; esta discussão encontra-se em seu livro Os sete saberes necessários à educação do futuro. O ser humano é a um só tempo físico, biológico, psíquico, cultural, social, histórico. Esta unidade complexa da natureza humana é totalmente desintegrada na educação por meio das disciplinas, tendo-se tornado impossível aprender o que significa ser humano. É preciso restaurá-la, de modo que cada um, onde quer que se encontre, tome conhecimento e consciência, ao mesmo tempo, de sua identidade compIexa e de sua identidade comum a todos os outros humanos. (MORIN, 2002, p.15) Transpondo tal pensamento para a aula de um instrumento musical, para se estudar uma determinada peça, por exemplo, reduz-se sua
totalidade a um conjunto de elementos e partes associadas por contiguidade. Despreza-se a compreensão do todo musical. A Peça torna-se uma junção de fragmentos sucessivos. A pedagogia musical, por sua vez, “ora privilegia a dimensão intelectual (leitura/escrita/ técnica), em detrimento da dimensão sensível; ora deriva para práticas espontaneistas”. Tudo isso porque falta a compreensão orgânica do todo (PAREJO, 2018, pos. 64). O ensino musical pautado no pensamento cartesiano, em muitos casos, reduz a abrangente linguagem expressivo-musical à mera memorização e reprodução de uma infinidade de signos, exclusos de contexto. O ensino da leitura e da escrita musical, por exemplo, torna-se um rito de memorização de signos sem nenhuma conexão com vivências musicais que poderiam lhe conferir maior sentido para a apropriação legítima do seu significado. E como o corpo não faz parte do processo, o aluno passa longos períodos sentado numa mesma posição apenas memorizando e reproduzindo a simbologia musical enquanto poderia experimentar a música em sua totalidade considerando que o ser humano é dotado de multidimensões que devem ser exploradas no processo ensino aprendizagem. A exclusão do corpo do processo ensino-aprendizagem acontece porque o paradigma cartesiano privilegia o intelecto em detrimento das emoções por crer que razão e emoção não tenham nenhuma relação entre si. A partir disso considera o aluno como intelecto apenas. Porém, há estudos recentes que apontam a ligação intrínseca existente entre razão e emoção. De acordo com a tese de Damásio6, as
6- Antônio Rosa Damásio nasceu em Portugal e radicou-se nos Estados Unidos. Ocupa a cadeira David Dornsife de Neurociência, Psicologia e Neurologia na Universidade do Sul da Califórnia, em Los Angeles, nos Estados Unidos, onde também dirige o Instituto do Cérebro e da Criatividade. É autor do livro O Erro de Descartes onde mostra como a ausência de emoção e sentimento pode destruir a racionalidade humana. Essas informações encontram-se na contracapa e na orelha do livro. (DAMÁSIO, 2005). INEQ - Educação integral
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emoções são estados do corpo e não apenas conceitos abstratos e impalpáveis do plano subjetivo. Segundo Damásio, em sua obra O Erro de Descartes, as emoções são indispensáveis para a nossa vida racional. A natureza e a extensão do nosso repertório de respostas emocionais não dependem exclusivamente do nosso cérebro, mas da sua interação com o corpo, e das próprias percepções do corpo. Desta forma a Contribuição de Damásio para este estudo é mostrar a fundamental importância da base emocional para a constituição do processo de racionalidade (PAREJO, 2008, p.39). A inclusão corporal em todo processo de ensino/aprendizagem de música se faz necessária para que o próprio estudante possa se redescobrir enquanto ser complexo e multidimensional, cujas dimensões poderiam ser exploradas e consideradas em todos os aspectos de sua vida. Não é possível que haja apropriação legítima do conhecimento sem que este seja experimentado, vivenciado sensorialmente. Trabalhar a educação musical em sua totalidade significa valorizar o sentir, dar espaço para a experiência intuitiva (que nasce a partir da escuta), dar voz às emoções e sentimentos na busca pela reconstituição da unidade corpo/mente/espírito em todo processo ensino aprendizagem. É necessário a inclusão do corpo que sente e não somente de um intelecto que pensa. O corpo por meio do movimento e da ludicidade media a compreensão dos abstratos conceitos da linguagem musical. Toda experiência sensório-motora do corpo no espaço constitui a nossa racionalidade e nossas formas de expressão por meio da linguagem. Portanto, corpo em fluxo, mente em fluxo (PAREJO, 2010, 131). A experiência corporal não é acessória ou simplesmente lúdica, sabemos que a base de constituição da racionalidade
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INEQ - Educação integral
humana é corporal. Pela via da inclusão do corpo, o educando se torna completamente presente e preparado para reagir às demandas expressivas da música. (PAREJO, 2010, p. 121). É tempo de refletir sobre a prática educacional pautada no pensamento cartesiano visto que esse pensamento já não responde às demandas do conhecimento e da educação contemporânea. Fragmentar as dimensões ou perspectivas diversas que compõem um determinado fenômeno, ser humano, processo, e o próprio universo em que estamos inseridos tornou-se, a tempos, um caminho ineficaz para a busca do conhecimento. Se tal pensamento foi útil para que a ciência avançasse em um determinado momento histórico, atualmente constitui um entrave à evolução e ao equilíbrio da humanidade. É necessário contextualizar os problemas da forma mais abrangente possível, é necessário conceber pessoas, instituições, países e a natureza como organismos onde todas as partes se inter-relacionam e onde o todo é sempre mais do que a soma de suas partes. (PAREJO, 2001, p.17) Quando passamos a compreender o mundo e tudo o que existe a partir do paradigma sistêmico, consequentemente nossa visão a respeito da educação musical torna-se abrangente, pois entende o estudante com um organismo vivo parte estrutural e pulsante da grande teia da vida. Considera seu contexto social, suas especificidades enquanto ser humano dotado de capacidades multidimensionais. Nesta concepção há espaço para o desenvolvimento da criatividade e da expressividade espontânea inerentes à complexidade do ser. O indivíduo participa da construção do
conhecimento não apenas com o uso predominante do raciocínio e da percepção do mundo exterior pelos sentidos, mas também usando as sensações, os sentimentos, as emoções e a intuição para aprender. (MORAES, 1999, p.88) Torna-se pertinente também em nossa reflexão a inclusão do princípio ecológico de redes apresentado por Capra. Este princípio nos permite compreender tudo o que há de forma relacional, dialógica, interligada, apontando que nada existe fora das redes de conexões e de relações. É um pensamento que se estende além da ecologia natural, englobando a cultura, a sociedade, a mente e o indivíduo. O princípio ecológico de redes nos mostra que em todas as escalas da natureza, encontramos sistemas vivos alojados dentro de outros sistemas vivos - redes dentro de redes. Os limites entre esses sistemas não são limites de separação, mas limites de identidade. Todos os sistemas vivos comunicam-se uns com os outros e partilham seus recursos, transpondo seus limites. (CAPRA, 2014, p. 239) Pensar a educação musical a partir do princípio ecológico de redes nos permite contextualizar e conectar os conteúdos antes fragmentados. Nos permite explorar os repertórios musicais trazidos para as aulas de uma forma integral para que estes sejam percebidos e experimentados por todas as dimensões humanas inerentes ao processo. Tal princípio nos permite ainda construir um processo de ensino aprendizagem por meio de trocas de experiências a partir do contexto trazido pelo outro. Pensar a educação musical a partir do princípio de redes implica estender o processo ensino aprendizagem à própria relação professor-alu-
nos-gestão e a partir deste elo de conexões, seguir em busca da redescoberta da própria prática diária considerando a totalidade do ser integrado também à totalidade do seu contexto. Pensando acerca da prática musical, esta precisa ser experimentada por todas as dimensões possíveis. A partir da escuta abrem-se caminhos para que a sensibilidade individual seja desperta, abrangendo emoções e toda corporalidade de forma rica e prazerosa. Resgatando o encantamento necessário para o sucesso do ensino aprendizagem. O ser humano é um ser multidimensional e necessita ser tratado como tal nos ambientes educacionais. Os processos de ensino precisam abordar todas as estratégias possíveis para que a sensibilidade e a criatividade se tornem um processo natural dentro da formação musical dos estudantes. É desta forma que a educação musical passa a ser abrangente. Nasce daí uma prática musical viva e eficaz a fluir da própria vida em fluxo que pulsa em todos os envolvidos neste processo. O reconhecimento da multidimensionalidade de pessoas e processos proporciona o enriquecimento das ações de ensinar/aprender música. Na perspectiva dos agentes humanos do processo (professores e alunos), implica na valorização do sentir, da experiência intuitiva (que tem início com a escuta), de emoções e sentimentos, o que conduz naturalmente à presença do corpo e à reconstituição da unidade corpo/mente/ espírito. Na perspectiva do conhecimento, implica na busca do equilíbrio entre todas as dimensões – sensível, estética, ética, prática, teórica - o que requer uma renovação nas práticas de ensino e a assunção definitiva de uma direção que vai do fazer musical concreto para a teorização. (PAREJO, 2018, pos.1549) Enfim, cada ser humano que se dispõe a esINEQ - Educação integral
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tudar música traz consigo uma cultura, uma
dade em se consumir. Inconsistência define
compreensão de mundo, uma vida familiar,
a vida das pessoas desta geração (BAUMAN,
outra em comunidade, expectativas e desejos
2011, p.8).
que precisam ser considerados, respeitados e minimamente compreendidos pelo educa-
Bauman indica que a imobilidade não existe,
dor para que o processo educacional musical
portanto nada conserva sua forma por muito
seja bem-sucedido. Neste contexto, educador,
tempo. Tudo que existe neste mundo líquido
estudante e até mesmo o próprio entorno con-
moderno está em constante mudança: “as
versam entre si, o que faz com que o ser todo
modas que seguimos e os objetos que desper-
se faça presente no processo todo de ensino
tam nossa atenção”. Os acontecimentos que
aprendizagem.
nos atraíam ontem são diferentes das coisas e acontecimentos que nos instigam hoje. “As
2. Zygmunt Bauman e a modernidade líquida
coisas que sonhamos e que tememos, aquelas que desejamos e odiamos, as que nos enchem
Zygmunt Bauman7 é um grande crítico da liqui-
de esperanças e as que nos enchem de afli-
dez do mundo contemporâneo. O autor utiliza
ção” estão em constante mudança. (BAUMAN,
a expressão “modernidade líquida” justamente
2011, p. 7). “Nosso mundo líquido moderno
para criticar a falta de constância e de profun-
sempre nos surpreende; o que hoje parece
didade de todos os aspectos da vida contem-
correto e apropriado amanhã pode muito bem
porânea. Esta é marcada por um fluxo extremo
se tornar fútil, fantasioso ou lamentavelmente
de informações que mudam e se chocam a
equivocado”. (BAUMAN, 2011, p. 8)
todo instante. Aquilo que se tem por verdade hoje amanhã já não existirá mais amanhã. Até
2.1 Implicações da modernidade líquida sobre
mesmo o conhecimento que se constrói ago-
a educação musical
ra tornar-se-á como vapor de água no futuro. Os relacionamentos são voláteis e as pessoas
(...) caminhar é melhor que sentar, correr
volúveis e inconstantes, o ser humano, desta
é melhor que caminhar, surfar é melhor
forma, precisa se adaptar e se readaptar no-
que correr8.
vamente a cada instante. Neste mundo a fle-
(Bauman)
xibilidade está na moda. A futilidade é a nova ordem, os interesses são supérfluos, há ausên-
Pensar a educação musical no mundo líquido
cia de forma definida, há velocidade e voraci-
de Bauman é pensar num tipo de aprendiza-
7- Zygmunt Bauman (1925-2017) foi um dos grandes pensadores da modernidade. Perspicaz analista de temas contemporâneos, deixou vasta obra- com destaque para o best-seller Amor líquido, fundamental para a compreensão das relações afetivas hoje. Sociólogo e filósofo, soube se comunicar diretamente com seus leitores, levando milhares de pessoas a pensar a sociedade atual através do conceito de liquidez. Professor emérito das universidades de Varsóvia e Leeds, tem cerca de quarenta livros publicados no Brasil pela Zahar, com enorme sucesso de público. Bauman nasceu na Polônia e morreu na Inglaterra, onde vivia desde a década de 1970. Esta biografia sumária foi extraída da orelha do livro: 44 cartas do mundo líquido moderno. (BAUMAN, 2011) 8 - BAUMAN, Zygmunt. 44 Cartas do Mundo Líquido Moderno. Trad. Vera Pereira. 1ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2011, p. 115.
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INEQ - Educação integral
gem que pode ser volátil e sem profundidade,
análise da educação musical e da formação do
na qual aspectos da criatividade e da expres-
professor de música fast food.
sividade humana são tratados de forma superficial. Não há tempo para a construção de
Há inúmeros cursos musicais voláteis no mer-
vivencias musicais substanciais para que a
cado assim como existem muitos professores
apropriação da linguagem musical ocorra de
de música fast food. Um grande problema que
forma legítima e abrangente. Essa urgência de
presenciei durante minha formação superior
se ter e de se fazer acontecer reduz o univer-
em música foi a discrepância da bagagem
so musical àquilo que a grande demanda do
musical entre os estudantes das turmas. Para
senso comum exige: um entretenimento fast
um curso de medicina, por exemplo, pressu-
food, raso, barato, muito aquém daquilo que
põe-se que todos estudaram ciências biológi-
o abrangente universo musical realmente é e
cas e suas disciplinas a fins; para um curso de
realmente nos poderia oferecer. Vê-se, ainda,
engenharia, sabe-se que todos têm ao menos
a educação musical reduzida à recreação em
noções de desenho ou pelo menos dominam
muitas escolas, inclusive em escolas de mú-
o básico das linguagens exigidas; mas para
sica. Sob estas concepções a música perde
os cursos de música, que na verdade exigem
seu foco enquanto linguagem constituída a
um pré-requisito maior que o das demais áreas
ser desenvolvida. Voltando nossos olhos aos
(considerando que, tocar um instrumento ou
estudantes, não existe espaço para a escuta
desenvolver o ouvido musical não acontece
de si nem do outro, não há tempo para a escu-
da noite para o dia), aparecem pessoas mui-
ta do mundo, pois, num movimento contínuo
to despreparadas, que acreditam que sairão
não há possibilidade de concentração, de re-
completamente formadas como professores
laxamento nem de se propiciar a sensação de
de música, de um curso superior, em apenas
bem-estar que são inerentes ao aprendizado
três anos. Minha crítica é para a mentalidade
da linguagem musical. Desta forma, pode-se
das pessoas que acham que o curso superior
afirmar que este tenebroso mundo líquido de-
de música é considerado como outro curso
nunciado por Zygmunt Bauman é inóspito para
qualquer, onde pode-se entrar sem ter conhe-
a educação musical abrangente e sistêmica.
cimento prévio do assunto. E com o aumento das faculdades particulares, isso virou uma
No turbilhão de mudanças, o conhe-
prática comum, há uma grande quantidade de
cimento parece muito mais atraente
profissionais da música formados de forma
quando apto ao uso instantâneo e único,
volátil, acelerada, apenas na superficialidade
aquele tipo de conhecimento oferecido
das questões musicais.
pelos programas de software que entram e saem das prateleiras das lojas cada vez
Forma-se dois tipos de educadores musicais
mais depressa. (BAUMAN, 2011, p. 113)
profissionais: aqueles que tiveram uma formação de nível médio, por tempo considerável e
Refletindo acerca da volubilidade do conhe-
outros que não tiveram as vivencias necessá-
cimento que paira no ar deste mundo líquido
rias para uma formação musical abrangente.
alvo das críticas de Bauman, faço uma breve
Isso reflete negativamente na educação musiINEQ - Educação integral
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cal. Os dois tipos de profissionais são iguais
Considera-se uma forma de desrespeito à tota-
perante as exigências do mercado, porém um
lidade humana e ao próprio entorno ambiental
deles se formou instantaneamente e, conse-
que o pensamento fragmentador ainda pos-
qüentemente, ele irá reproduzir sua própria ex-
sa existir e com tamanha força, no ambiente
periência no processo ensino aprendizagem.
escolar; é um desrespeito à vida que jovens
Este tipo de formação profissional instantânea
e crianças passem longos períodos sentados
é um exemplo da educação volátil no mundo
numa mesma posição sendo reconhecidos
líquido denunciado por Zygmunt Bauman, o lu-
como intelecto apenas. O reconhecimento da
gar onde o conhecimento que é tão valorizado
multidimensionalidade de pessoas e proces-
hoje amanhã não mais o será, pois, neste mun-
sos proporciona o enriquecimento das ações
do amórfico, disforme, não há estabilidade e
enquanto educadores. A partir da realização
nenhum tipo de segurança que possa resistir
desta pesquisa, pude concluir que o pensa-
além deste dia.
mento sistêmico é complexo e valoriza contextos. Isso é fundamental para o processo de
CONSIDERAÇÕES FINAIS
ensino/aprendizagem. Como nos disse Morin, o ser humano é a um só tempo físico, biológi-
Após a análise das ideias de Fritjof Capra so-
co, psíquico, cultural, social, histórico; uma uni-
bre a concepção sistêmica do mundo, conclui-
dade complexa requer intervenções comple-
-se que tudo o que existe ao nosso redor se
xas que possam; atender à variedade humana,
conecta. O universo é formado por uma cadeia
pois, não somos todos iguais com relação a
infinita de relações e conexões. Nada está iso-
formas de aprendizado.
lado. Tudo e todos estão em constante processo de troca, que se efetua de forma concre-
Ao analisar e discutir a reflexão de Bauman so-
ta por meio de um intercâmbio constante de
bre a liquidez do mundo moderno, conclui-se
fótons, entre os diferentes corpos, objetos, e
que a superficialidade do ensino atual é cau-
entre estes e o ambiente. A partir do conheci-
sada pelos princípios mercadológicos que o
mento dessa profunda conexão dos sistemas
neoliberalismo trouxe para o âmbito escolar,
e das redes, onde se inserem outros sistemas
principalmente nas escolas particulares. Com
de redes, e assim por diante, já não faz sentido
a realização desta pesquisa percebe-se ainda
ter a educação pautada no pensamento carte-
que, o ensino volátil se estende para à forma-
siano e fragmentador dos seres e dos proces-
ção profissional dos educadores musicais.
sos. Por meio desta pesquisa, tornou-se possí-
Ressalta-se aqui, uma crítica à volatilidade do
vel comprovar que excluir o corpo do processo,
ensino que forma esses profissionais e tam-
é um dos grandes erros que se pode cometer
bém à mentalidade das pessoas que acham
no processo educacional, pois, como Damásio
que o curso superior de música possa ser con-
nos apresenta, as emoções são estados do
siderado como outro curso qualquer, onde po-
corpo e não apenas conceitos abstratos e im-
de-se entrar sem ter conhecimento prévio do
palpáveis do plano subjetivo. As emoções são
assunto. Isso gera um total movimento redu-
fundamentais para nossa vida racional.
cionista de sua complexidade. Música envolve antes de tudo a expressão e a compreensão
40
INEQ - Educação integral
de uma linguagem. Portanto necessita-se de
processo de formação do professor e sua prá-
um preparo prévio para o sucesso e excelência
tica pedagógica. São Paulo, 2001, 161 f. Dis-
das intervenções profissionais, considerando
sertação (Mestrado em Educação-Currículo) -
a complexidade tanto de educandos, de edu-
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
cadores e também dos processos de ensino
PAREJO, Enny. Escuta musical: uma estratégia
aprendizagem do abrangente universo musi-
transdisciplinar privilegiada para o Sentipen-
cal.
sar. São Paulo, 2008, 268 f. Tese (Doutorado em Educação - Currículo.) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
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A EVOLUÇÃO DO DESENHO INFANTIL
Carolina Chinarelli A. Silva
RESUMO O desenho foi e continua sendo utilizado pelo homem como uma maneira de significar o mundo. Neste artigo pretendo buscar uma melhor compreensão do desenho produzido por crianças, observar os processos espontâneos de utilização do desenho por tais e, confrontar o material gráfico destes sujeitos com sua produção escrita com o intuito de investigar as possíveis relações existentes entre desenho e linguagem escrita. Palavras-chave: Educação infantil; Desenvolvimento infantil; Desenho. ABSTRACT Drawing was and continues to be used by man as a way of meaning the world. In this article I intend to seek a better understanding of the drawing produced by children, to observe the spontaneous processes of use of drawing by such and, to confront the graphic material of these subjects with their written production in order to investigate the possible relations between drawing and written language. Keywords: Early childhood education; Child development; Drawing. INTRODUÇÃO A criatividade é uma das principais ferramentas da criança. Devemos saber como usá-la, como aproveitá-la integralmente, pois é ela que move o trabalho das mesmas. Em algumas pessoas ela está mais aflorada do que em outras. Todos nós
42
INEQ - Educação integral
nascemos com criatividade, a diferença é o que fazemos com ela. Para entender melhor esse processo, precisamos voltar à infância, e estudar como o desenvolvimento da criatividade ocorre nas crianças. O processo se manifesta claramente nos desenhos infantis, primeiro registro concreto da expressão pessoal. Os desenhos infantis contêm uma originalidade e um frescor de concepção que é a própria essência da infância. As crianças menores, principalmente, expressam suas ideias, pensamentos e emoções com uma espontaneidade invejada por muitos artistas. O desenho das crianças é feito de maneira mais inconsciente, sem a preocupação do que os observadores pensarão. A criança desenha por puro prazer. Até certa idade, ela não é limitada pelas barreiras exteriores que nos são impostas às cobranças da família ou da sociedade. O que vale é a pura expressão pessoal. Daí os desenhos serem mais criativos. O que torna a arte expressiva é a manifestação do “eu”, e suas reações subjetivas ao meio. O desenho para Vygotsky, é um estágio preliminar do desenvolvimento para a linguagem escrita. Trata da fala egocêntrica de uma forma mais geral nas atividades da criança, porém ela será compreendida, para nosso caso específico, como relevante na atividade de desenho, à medida que as atividades da criança se tornam mais complexas. Esse processo é desencadeado pelas ações da criança; os objetos com os quais ela lida representam à realidade e dão forma aos seus processos mentais.
É também considerada a questão da fala no momento da produção do desenho; ao observar a criança desenhar e escutar seus comentários enquanto desenha, nos permite penetrar em todo um campo de conexões associativas, semânticas e afetivas, que o simples diálogo raramente dá ocasião de apreender. Embora a criança sofra influências do meio ambiente no qual vive, criando às vezes maiores ou menores divergências entre a idade cronológica e a idade gráfica, as características mais típicas e formais do traçado da criança continuam as mesmas. Assim, encontramos poucas diferenças individuais nos tipos e “técnicas” usados pelas crianças no que diz respeito ao desenho infantil. 1. O Desenho Infantil Mas afinal, o que é desenho? Compreendo que a resposta a essa pergunta é uma tarefa complexa, que têm diferentes respostas conforme a perspectiva teórica na área educacional. A autora Edith Derdyk (1989) mostra que o desenho não pode ser pensado apenas como uma coisa de lápis e papel. Ela diz que as manifestações gráficas se fazem presentes através de múltiplas possibilidades; a pedra que risca a caverna, o chão, a impressão digital sobre os objetos, a forma como estão dispostas as conchas da praia etc. Para Derdyk (1989), enquanto uma elaboração humana o desenho apresenta duas características que se mencionadas de forma superficial, podem parecer contraditórias; trata-se do binômio amplo-específico – mas que na verdade, são elementos que se complementam e contribuem para a compreensão da expressão gráfico-plástico. Quando nos referimos ao caráter específico estamos querendo ressaltar a natureza particular do desenho, que é a de comunicar uma imagem, um pensamento, um signo. Em outras palavras, apesar de não se restringir à utilização do lápis e do papel, o desenho tem
sempre o objetivo de comunicar conhecimentos e sentimentos. Dentre as inúmeras possibilidades de pensar o desenho infantil, destaco um conceito que se inscreve numa abordagem teórica que concebe o processo de construção e apropriação de conhecimento como resultado da interação entre a criança com o objeto. O desenho cultivado na infância expressa a síntese dos esquemas de representação sobre o desenho do sujeito, esquemas estes que são construídos numa busca ativa de conhecimento, o que envolve, além das situações de busca espontânea, situações de interação constante com os sistemas presentes na cultura, ou seja, com os modelos de desenho produzidos socialmente e acumulados historicamente. (IAVELBERG, 1995:10) No desenho infantil estão presentes o individual, social, biológico e o cultural, o eu e o outro, o aspecto interpessoal e intrapessoal, pois, é, no jogo de forças entre esses elementos que o desenho irá sendo produzido. A constituição do desenho, assim como a do próprio homem se dá no plano da intersubjetividade. É através das relações que a criança estabelece com ela mesma, com outras pessoas e com o mundo físico que o seu desenho vai se revelando, não como algo natural ou espontâneo, mas como produção social, que foi obtida em uma sociedade permeada por relações de poder que influenciam os valores, normas e concepções de ser humano e de mundo. O desenho infantil é uma linguagem que a criança utiliza para poder organizar e expressar as experiências que ela vai travando com mundo, dentre as situações que vivenciam, Neusa Gusmão (1999) ao abordar a interação entre linguagem, cultura e alteridade, diz que é necessário estar atento para as linguagens INEQ - Educação integral
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nem sempre visíveis e explícitas, que são produzidas pela cultura da infância através da vida vivida e da imaginada. 1.1 - Etapas Evolutivas do Desenho Não existem divergências profundas entre a maioria dos autores no que diz respeito à expressão gráfica da criança. O desenho infantil é composto por fases, etapas, estágios, movimentos, qualquer que seja a nomenclatura usada para definir que o desenho evolui conforme o próprio crescimento da criança, dentro do seu processo de desenvolvimento como ser humano. Essas etapas do desenvolvimento infantil devem ser vivenciadas pelas crianças, fase a fase, senão pode haver uma lacuna no desenvolvimento que, mais tarde, precisará ser trabalhada. Devemos sempre lembrar que a criança é um ser em desenvolvimento como nós, adultos, também o somos, e viver é estar se transformando. Ao final de seu primeiro ano de vida, a criança já é capaz de manter ritmos regulares e produzir seus primeiros traços gráficos, fase conhecida como dos rabiscos ou garatujas. O desenvolvimento progressivo do desenho implica mudanças significativas que, no início, dizem respeito à passagem dos rabiscos iniciais da garatuja para construções cada vez mais ordenadas, fazendo surgir os primeiros símbolos. Essa passagem é possível graças às interações da criança com o ato de desenhar e com desenhos de outras pessoas. As garatujas ou os rabiscos aparecem na fase sensoriomotora – etapa da teoria do desenvolvimento humano desenvolvida pelo estudioso Jean Piaget, onde a criança explora materiais e movimentos, não na fase pré-operatória, onde a criança começa a construir e a representar. Na garatuja, a criança tem como hipótese que o desenho é simplesmente uma ação sobre
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uma superfície e ela sente prazer ao constatar os efeitos visuais que essa ação produziu. No decorrer do tempo, as garatujas, que refletiam, sobretudo, o prolongamento de movimentos rítmicos de ir e vir, transformam-se em formas definidas que apresentam maior ordenação e podem estar se referindo a objetos naturais, objetos imaginários ou mesmo a outros desenhos. Na evolução da garatuja para o desenho de formas mais estruturadas, a criança desenvolve a intenção de elaborar imagens no fazer artístico. Começando com símbolos muito simples, ela passa a articulá-los no espaço bidimensional do papel, na areia, na parede ou em qualquer outra superfície. Passa também a constatar a regularidade nos desenhos presentes no meio ambiente e nos trabalhos aos quais ela tem acesso, incorporando esse conhecimento em suas próprias produções. No início, a criança trabalha sobre a hipótese de que o desenho serve para imprimir tudo o que ela sabe sobre o mundo. No decorrer da simbolização, a criança incorpora progressivamente regularidades ou códigos de representação das imagens do entorno, passando a considerar a hipótese de que o desenho serve para imprimir o que se vê. É assim que, por meio do desenho, a criança cria e recria, individualmente, formas expressivas, integrando percepção, imaginação, reflexão e sensibilidade que podem então ser apropriadas pelas leituras simbólicas de outras crianças e adultos. O desenho está também intimamente ligado com o desenvolvimento da escrita que exerce uma verdadeira fascinação sobre a criança, e isso bem antes de ela própria poder traçar verdadeiros signos. Muito cedo ela tenta imitar a escrita dos adultos. Porém, mais tarde, quando ingressa na escola verifica-se uma diminuição da produção gráfica, já que a escrita passa a ser concorrente do desenho. Como possibilidade de brincar, de falar, de registrar marca o
desenvolvimento da infância. Porém em cada estágio, o desenho assume um caráter próprio. Estes estágios definem maneiras de desenhar que são bastante similares em todas as crianças, apesar das diferenças individuais de temperamento e sensibilidade, variando, inclusive, muito pouco de cultura para cultura Em uma análise Piagetiana, temos:
A figura humana, torna-se uma procura de um conceito que depende do seu conhecimento ativo, inicia a mudança de símbolos. Quanto à utilização das cores, pode até usar, mas não há relação ainda com a realidade a qual dependerá do interesse emocional. Dentro da expressão, o jogo simbólico aparece como: “nós representamos juntos”.
Garatuja: faz parte da fase sensório-motora (0 a 2 anos) e parte da fase pré-operacional (2 a 7 anos). A criança demonstra extremo prazer nesta fase. A figura humana é inexistente ou pode aparecer da maneira imaginária. A cor tem um papel secundário, aparecendo o interesse pelo contraste sem intenção consciente. Pode ser dividida em:
Esquematismo: faz parte da fase das operações concretas (7 a 10 anos). Observa- se: esquemas representativos, afirmação de si mediante repetição flexível do esquema; experiências novas são expressas pelo desvio do esquema. É o primeiro conceito definido de espaço. Já tem um conceito definido quanto à figura humana, porém aparecem desvios do esquema como: exagero, negligência, omissão ou mudança de símbolo. Aqui existe a descoberta das relações quanto à cor. Aparece na expressão o jogo simbólico coletivo ou jogo dramático e a regra.
Desordenada: movimentos amplos e desordenados. Com relação à expressão, vemos a imitação “eu imito, porém não represento”. Ainda é um exercício. Ordenada: movimentos longitudinais e circulares. A figura humana pode aparecer de maneira imaginária, pois aqui existe a exploração do traçado, há interesse pelas formas. Aqui a expressão é o jogo simbólico: “eu represento sozinho”. Observa-se: mudança de movimentos; formas irreconhecíveis com significado; atribuição de nomes aos desenhos e contagem de histórias. A figura humana pode aparecer de maneira imaginária. Aparecem sóis, radiais e mandalas. A expressão também é o jogo simbólico. Pré-Esquematismo: dentro da fase pré-operatória, aparece a descoberta da relação entre desenho, pensamento e realidade. Quanto ao espaço, inicialmente, os desenhos são dispersos. Então aparecem as primeiras relações espaciais, surgindo devido a vínculos emocionais.
Realismo: também faz parte da fase das operações concretas, mas no final desta. Existe uma consciência maior do sexo e autocrítica pronunciada. No espaço, é descoberto o plano e a superposição. Na figura humana, aparece o abandono das linhas. As formas geométricas aparecem. Há maior rigidez e formalismo, acentuação das roupas diferenciando os sexos. Aqui acontece o abandono do esquema de cor, e sua acentuação será de enfoque emocional. O jogo simbólico é coletivo, jogo dramático e regras. Pseudo Naturalismo: estamos na fase das operações abstratas (10 anos em diante). É o fim da arte como atividade espontânea. Inicia a investigação de sua própria personalidade. Aparece aqui dois tipos de tendências: visual (realisINEQ - Educação integral
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mo, objetividade) e háptico (expressão subjetividade). No espaço já apresenta a profundidade ou a preocupação com experiências emocionais. Na figura humana, as características sexuais são exageradas e há presença das articulações e proporções. A consciência visual ou acentuação da expressão, também fazem parte deste período. Observa-se uma maior conscientização no uso da cor, podendo ser objetiva ou subjetiva. A expressão aparece como: “eu represento e você vê”. Aqui estão presentes o exercício, símbolo e a regra. E ainda alguns psicólogos e pedagogos, em uma linguagem mais coloquial, utilizam as seguintes referências: De 1 a 3 anos: é a idade das famosas garatujas: simples rabiscos ainda desprovidos de controle motor. A criança ignora os limites do papel e mexe todo o corpo para desenhar, avançando os traçados pelas paredes e chão. As primeiras garatujas são linhas longitudinais que, com o tempo, vão se tornando circulares e, por fim, se fecham em formas independentes, que ficam soltas na página. No final dessa fase, é possível que surjam os primeiros indícios de figuras humanas, como cabeças com olhos. De 3 a 4 anos: já conquistou a forma e seus desenhos têm a intenção de reproduzir algo. Respeita melhor os limites do papel, mas o grande avanço é ser capaz de desenhar um ser humano reconhecível, com pernas, braços, pescoço e tronco. De 4 a 5 anos: é uma fase de temas clássicos do desenho infantil, como paisagens, casinhas, flores, super-heróis, veículos e animais. O uso das cores varia, buscando um certo realismo. As figuras humanas já dispõem de novos detalhes, como cabelos, pés e mãos e a distribuição dos desenhos no papel obedece uma certa lógica (céu no alto da folha). Aparece ainda a tendência à antropomorfização, ou seja, a em-
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prestar características humanas a elementos da natureza, como o famoso sol com olhos e boca. Esta tendência deve se estender até 7 ou 8 anos. De 5 a 6 anos: os desenhos sempre se baseiam em roteiros com começo, meio e fim. As figuras humanas aparecem vestidas e a criança dá grande atenção a detalhes, como as cores. Os temas variam e o fato de não terem nada a ver com a vida da criança são um indício de desprendimento e capacidade de contar histórias sobre o mundo. De 7 a 8 anos: o realismo é a marca desta fase em que surge, também, a noção de perspectiva, ou seja, os desenhos da criança já dão uma impressão de profundidade e distância. As crianças deixam de desenhar, se acham que seus trabalhos não ficam bonitos. Como podemos perceber a linha de evolução é similar mudando com maior ênfase o enfoque em alguns aspectos. O importante é respeitar os ritmos de cada criança e permitir que ela possa desenhar livremente, sem intervenção direta, explorando diversos materiais, suportes e situações. 2. O significado do desenho para a criança O desenho pode ser visto como um modo de expressão próprio da criança, o desenho constitui uma língua que possui vocabulário e sua sintaxe. Percebe-se que a criança faz uma relação próxima do desenho e a percepção pelo adulto. Ao prazer do gesto associa-se o prazer da inscrição, a satisfação de deixar a sua marca. Os primeiros rabiscos são quase sempre efetuados sobre livros e folhas aparentemente estimados pelo adulto, possessão simbólica do universo adulto tão estimado pela criança pequena. Ao desenhar, a criança conta sua história, seus
pensamentos, suas fantasias, seus medos, suas alegrias e suas tristezas. Através do desenho de uma criança é possível analisar seu caráter, personalidade, temperamento e carências. É possível também, através do que a criança desenha descobrir e reconhecer as fases pela qual a criança está a passar, suas dificuldades, bem como seus pontos positivos. No ato de desenhar, a criança age e interage com o meio, seu corpo inteiro se envolve na ação, traduzida em marcas que a mesma produz, se transportando para o desenho, modificando e se modificando. Através do desenho, a criança conta o que lhe aconteceu, demonstrando, relembrando e dominando a situação. Por alguns instantes, tem momentos muito agradáveis e proveitosos, expressando sua percepção de mundo. Cada desenho tem uma história, um significado pessoal que, muitas vezes, o adulto interpreta de modo diferente. Devemos lembrar que a visão da criança é diferente da visão do adulto. O adulto, quando conduz ou interpreta uma produção infantil de forma errônea, a vai inibindo até que perca sua capacidade de criação. O desenho, para a criança, é uma continuidade entre o objeto e a representação gráfica. A criança representa o objeto em si, ou seja, a sua criação é diferente da criação do adulto. Ela liberta- se das aparências e, ao mesmo tempo, pode representar o objeto como ele é realmente, enquanto o adulto só o representa por um único ponto de vista. Segundo Luquet, (apud MERLEAUPONTY,1990, p.130), [...] o desenho é uma íntima ligação do psíquico e do moral. A intenção de desenhar tal objeto não é senão o prolongamento e a manifestação da sua representação mental; o objeto representado é o que, neste momento, ocupará no espírito do desenhador um lugar exclusivo ou preponderante.
Para a criança, o desenho é uma expressão de mundo e nunca uma simples imitação ou cópia fiel porque a criança desenha conforme o modelo interior, a representação mental que possui do objeto a ser desenhado. O desenvolvimento infantil é como um jogo, visto que a criança se desenvolve e se modifica conforme a faixa etária. O mesmo acontece com o desenho: vai evoluindo e se modificando com o desenvolvimento da criança. 3. Relação entre o desenho e a escrita Ambos são meios de expressão e comunicação, determinados por habilidades próximas de motricidade e pensamento simbólico. “O desenho, todavia, possibilita uma leitura que ultrapassa a linguagem individual, ao passo que a escrita é dependente da linguagem.” (REILY, 1990: 66) Podemos observar no desenho que tudo subsiste ao mesmo tempo: “em apenas um olhar você enxerga tudo, já no texto escrito, você tem que ler palavra por palavra para poder entender”. Em suma, há uma simultaneidade na percepção dos elementos do desenho contraposta à linearidade da fala e da escrita, sendo que a evolução do desenho depende da evolução da linguagem e da escrita. Em relação à afirmação de Harste e colaboradores, parece-nos que Azenha vem concordar com eles quando cita que, “desenho e escrita parecem ocupar lugares complementares na produção gráfica e a imagem não aparece paralela à escrita apenas para garantir a evocação dos significados às quais esta se refere. Desenho e escrita “dizem” um em relação ao outro e não são redundantes.” (1995:175) Para completar WIDLÖCHER (1971) assinala que “historicamente a escrita nasceu de um encontro entre a coisa desenhada e a palavra.” (p. 77) Através dos dados teóricos pode-se dizer que, INEQ - Educação integral
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historicamente, o desenho nasceu primeiro que a escrita. Nos primórdios, os homens usavam o desenho como meio de memorização e organização; a escrita cuneiforme surgiu dos signos que representavam determinados elementos. A criança primeira começa a desenhar e, ao longo de seu desenvolvimento, vai aprendendo a linguagem escrita, mas não podemos considerar o desenho como estágio preliminar, pois são linguagens que se complementam e, em muitos casos, se completam. 3.1 - O papel do Professor O conhecimento das etapas evolutivas do desenho infantil fornece ao educador mais um instrumento para compreender as crianças. Somando esse conhecimento à análise constante dos seus trabalhos e considerando sempre o significado mais profundo do ato de desenhar como expressão de ideias e sentimentos, o educador poderá orientar suas ações pedagógicas relacionadas às atividades de desenho elaborando propostas de trabalho que incorporem as atividades artísticas das crianças. O fato de ser escolhida pelo educador não tornará essa atividade expressiva. O desenho infantil poderá ser colocado para a criança através de uma história bem contada, de um passeio, de algo ocorrido em sala, de brincadeira, de faz de conta, de jogos, de cantigas, etc. A relação inusitada olho/cérebro/mão/instrumento/gesto/traço redimensiona o ato de desenhar e o jogo é acrescido de novas regras. O olho conquista novos espaços, tentando, por vezes, dominar os gestos. A criança passa a perceber os limites especiais do papel: o dentro e o fora, o eu e o outro, o campo da representação e o campo da realidade. Desenhar é uma atividade lúdica, reunindo como em todo o jogo, o aspecto operacional e o imaginário. A operacionalidade envolve o
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funcionamento físico, temporal, espacial, as regras; o imaginário envolve o projetar, o pensar, o idealizar, o imaginar situações. O que faz com que a criança se expresse criativamente é a liberdade física e mental. Por esse motivo, é muito importante que o conteúdo seja acessível e significativo, que seja proposto de forma que a criança expresse seus pensamentos livremente, tendo a autonomia necessária para criar. Quando, em um desenho, os braços de uma figura humana saem da cabeça e não do tronco, por exemplo, significa que a criança ainda não tem construído interiormente, em seu pensamento, o esquema corporal de uma figura humana. Isso nada tem a ver com o fato de ela não enxergar direito, de estar com problemas de motricidade fina, ou ainda, de não estar apta a desenhar com destreza. Desenhar figuras humanas possibilita à criança estruturar suas ideias sobre a figura humana. No mesmo sentido, quando as crianças escrevem letras e algarismos espalhados, representa o que têm construído sobre as relações espaciais, se direita/esquerda ou em cima/embaixo. Não existe “o todo” integrado em seu pensamento; o desenho ou a escrita refletirá a forma que ela tem de ver o mundo e não aquela que a maioria dos adultos considera correta. O papel do educador é muito importante nesse processo. Ele não é apenas um facilitador. É alguém que deverá desafiar, incentivar, procurar ampliar as experiências e os conhecimentos da criança. Com a criança pequena, o educador não necessitará de utilizar técnicas muito elaboradas. É importante que a criança tenha oportunidade de desenhar livremente, em papéis e em tamanhos e texturas diferentes, em posições variadas, com materiais diversos. Quando a criança
vai dominando seus movimentos e gestos, as propostas devem ser diferentes: desenhar em vários tempos e ritmos, fazer passeios e expressar o que observou no papel, incentivar o desenho coletivo, desenhar as etapas percorridas após uma brincadeira ou jogo e muitas outras podem ser feitas com a criança para ajudá-la a aprimorar suas capacidades de desenhar. Os educadores que vivem diariamente com essas crianças vão sendo também incentivados por elas a criar, sempre e cada vez mais, novas atividades. O educador deve entender que o desenho da criança dependerá também do meio em que vive, se tem oportunidade de acesso a materiais e atividades que permitam e incentivem a sua expressão artística. Deve, também, respeitar o ritmo de cada criança porque cada criança tem um tempo e uma maneira de internalizar suas experiências e vivências. Devemos, porém, lembrar que a interpretação de um desenho isolada do contexto em que foi elaborado não faz sentido. É aconselhável, ao professor, que ofereça às crianças o contato com diferentes tipos de desenhos e obras de arte, que façam a leitura de suas produções e escutem a de outros e também que sugira à criança desenhar a partir de observações diversas (cenas, objetos e pessoas) para que possamos ajudá-la a enriquecer o seu grafismo. Assim elas poderão reformular suas ideias e construir novos conhecimentos. O papel do professor de Artes é extremamente importante nesse processo. É ele que está sempre presente, observando o desenvolvimento de cada criança, orientando-o e direcionando-o. Segundo Lowenfeld e Brittain, o professor deve ter sempre em mente que não se devem impor padrões e regras a serem seguidos, estabelecer algo supostamente correto, “bonito” ou “feio”. Essas seriam restrições à capacidade criado-
ra e, consequentemente, inibiriam a expressão individual da criança e sua autoafirmação. É preciso ajudar as crianças a desenvolver a confiança na autoafirmação, propiciada pela expressão artística. O desenho infantil deve ser estimulado não com a intenção de ensinar as técnicas para as crianças, mas pelo fato de este ser um importante processo de aprendizagem. É a oportunidade da mesma se expressar, de expor de forma concreta seus pensamentos e sentimentos. À medida que a criança desenha, ela aprende, pois assim ela organiza e concretiza seus pensamentos. Ao mesmo tempo em que lhe dá autoconfiança por construir e se expressando livremente. A criatividade infantil tem origem e reflexo no próprio desenho. A partir dele a criança aumenta sua percepção. Isso desenvolve sua criatividade, que vai refletir no próprio desenho. O desenho infantil encanta e desperta o interesse dos adultos pela sua criatividade e pela inocência da mais pura expressão. É curioso o fato de que em trabalhos de ilustração, adultos resgatam a linguagem do desenho infantil, encantados pela sua inocência e simplicidade que dão expressividade ao desenho. O processo de construção do desenho e da identidade não são regidos por uma ordem harmônica e linear, muito pelo contrário, como são produzidos nos interstícios da prática social carregam em si a marca da tensão, do conflito, da influência e da interação entre a criança e o outro (pais, professores, colegas, irmãos etc.). Enfim, o desenho infantil é um universo cheio de mundos a serem explorados. Alguns significados de alguns desenhos: Árvore: refere-se ao físico, emocional e intelectual da criança. Quando o tronco da árvore é alto e largo, revela que tem força na superação dos problemas. Quando o tronco for pequeno e estreito, revela vulnerabilidade às complicações. Se houver excesso de folhas, a criança INEQ - Educação integral
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tem grandes ocupações talvez em excesso. Se houver poucas folhas e galhos, a criança está triste. Casa: se for grande, demonstra grande emotividade e, se for pequena, demonstra que a criança é retraída. Barco: significa que a criança se adapta facilmente a imprevistos. Barcos grandes, revela que não gosta de mudanças e aprecia ter controle da situação. Se for pequeno, é sensível e tem grande intuição. Flores: é alegre e feliz. O educador deve tornar-se mais sensível e curioso perante uma produção artística infantil, evitando, assim, “diagnosticar” as crianças através de seus desenhos. É primordial para os educadores a compreensão e o conhecimento das fases do desenho infantil e sua relação com a evolução do desenvolvimento humano. Da mesma forma, é importante saber que o desenho é a manifestação de necessidades vitais pelas quais a criança terá que passar, ou seja, conhecer e agir sobre o mundo e comunicar-se com este mundo. CONSIDERAÇÕES FINAIS O desenho infantil é a expressão dos sentimentos ocultos dos alunos, mesmo que inconscientemente o mesmo expressa no papel sua visão de mundo, obtidas através do seu eu e do contato com outras pessoas. Embora exista a fase esperada para cada idade, o desenho para cada criança se desenvolve de forma diferente, dependendo do desenvolvimento de cada criança. Saliento, pois, a necessidade de termos profissionais bem formados e conscientes de seu trabalho. Enquanto desenhamos, deixamos aflorar nosso lado mais sensível, nossa profunda paz de espírito e, sem perceber, fazemos
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uma terapia. Trabalhar com desenho significa trabalhar com o fazer artístico mais consciente dos alunos, propondo que a criança amplie seu universo cultural, e se enxergue como alguém capaz de criar, de atribuir sentidos utilizando-se da linguagem visual e simbólica. O desenho de uma criança vai muito além de rabiscos em papel, é uma forma de expressão da materialização de seus desejos, medos e anseios.
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AULAS EM EAD MUDOU A ROTINA NA ESCOLA PÚBLICA
Claudia de Almeida Barreto¹ RESUMO O estudo apresentado neste artigo relata sobre a rotina que o Ensino à Distância (EAD) interferiu na vida dos estudantes da escola pública e suas famílias com a chegada do Coronavírus (COVID-19). Aqui entra a discussão sobre as atividades a distância a serem desenvolvidas neste período de pandemia. Por um lado, transformar o conteúdo do ensino ministrado em atividades à distância nos leva a um impasse, em virtude daquilo que é efetivamente um dado: há alunos nas escolas públicas e mesmo nas universidades que não têm acesso à internet banda larga, de tal modo que, muitas vezes, parece inviabilizada a própria mobilização dos recursos da internet para dar sequência ao ensino. Os professores com esse novo desafio das aulas remotas têm que se reinventar utilizando a tecnologia para alcançar seus objetivos de compartilhar seu conhecimento com seus alunos. Por esse motivo surgem ferramentas para auxiliá-los e tentar minimizar a evasão escolar. As famílias estão assustadas com essa nova realidade, de ter que se adequar a terem que ajudar seus filhos a terem uma rotina de atividades dentro de casa. Muitos não têm tempo de acompanhar as lições por chegarem tarde do trabalho. Outros não têm paciência para ensinar e devido ao desemprego que vem aumentando tem que
deixar de pagar as operadoras de internet para não pesar no orçamento da família que fica apertado. O momento é o de dar as mãos simbolicamente, testar coisas novas e repensar se a Educação e a dinâmica escolar que estávamos exercendo é a que faz mais sentido ou não para o momento atual. Não existe resposta pronta, mas existe uma grande oportunidade de construir novos caminhos para a escola. Palavra-chave: Escola; Família; Criança; Pandemia. ABSTRACT The study of this article reports on the routine that distance learning (EAD) interfered in the lives of public school students and their families with the arrival of the Coronavirus (COVID-19). Here comes the discussion about the distance activities to be developed in this pandemic period. On the one hand, transforming the content of teaching taught into distance activities leads us to an impasse, due to what is effectively a given: there are students in public schools and even in universities that do not have access to broadband internet, in such a way that, many times, it seems impossible to mobilize the internet resources to continue teaching.
1 - Formação em Pedagogia; Artes Visuais; Psicopedagogia Institucional e Clínica e Educação Especial com ênfase em deficiência intelectual.
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Teachers with this new challenge of remote classes have to reinvent themselves using technology to achieve their goals of sharing their knowledge with their students. For this reason, there are tools to help them and try to minimize school dropout. Families are frightened by this new reality, of having to adapt to having to help their children to have a routine of activities at home. Many do not have time to follow the lessons because they are late from work. Others do not have the patience to teach and due to the rising unemployment they have to stop paying internet operators to avoid weighing on the family budget that is tight. The moment is to hold hands symbolically, to test new things and to rethink whether Education and school dynamics that we were exercising is the one that makes the most sense or not for the current moment. There is no ready answer, but there is a great opportunity to build new paths for the school. keyword: School; Families; Children; Pandemic.
INTRODUÇÃO Este artigo analisa como o tema Educação à Distância (EAD) vem sendo abordado na escola pública com a pandemia do Coronavírus. O presente estudo busca fazer o levantamento das dificuldades que são enfrentadas pela Secretária da Educação, as instituições públicas de ensino, os alunos e suas famílias com o desafio dessa nova realidade. 1. O que é Educação à distância (EAD)? A Educação a Distância é uma forma de ensinar que tem independência do tempo e do local em que o professor e o aluno estão. Outra característica dessa modalidade é a presença
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de vários atores que devem existir para compor o cenário da EAD. Dentre eles, podemos citar o professor mediador, os tutores virtuais e presenciais, o próprio aluno – responsável pela construção do seu conhecimento e do desenvolvimento das competências que o habilitem a essa construção – as equipes de apoio (os técnicos, os designares instrucionais, os gestores e outros). Outro aspecto importante sobre a EAD diz respeito ao uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) como as principais ferramentas utilizadas para a construção do processo de ensino/aprendizagem, além do material didático escrito, utilizado e elaborado especificamente para atender ao ensino virtual. Para Belloni (2001), a educação a distância favorece a expansão e a melhoria do ensino por intermédio da integração das novas tecnologias da informação e comunicação, além de exigir uma abordagem criativa, crítica e interdisciplinar. Entretanto, a autora alerta para o perigo do uso das tecnologias como finalidade educacional e não como um meio de promover a educação. [...] parte de um processo de inovação educacional mais amplo que é a integração das novas tecnologias de informação e comunicação nos processos educacionais. Essa integração como eixo pedagógico central, pode ser uma estratégia de grande valia, desde que se considerem essas técnicas como meios e não como finalidades educacionais, e que elas sejam utilizadas em suas duas dimensões indissociáveis: ao mesmo tempo como ferramentas pedagógicas extremamente ricas e proveitosas para a melhoria e a expansão do ensino e como objeto de estudo complexo e multifacetado, exigindo abordagens criativas, críticas e interdisciplinares, e podendo ser
um “tema transversal” de grande potencial aglutinador e mobilizador. (BELLONI, 2001, p.9) Cabe ainda salientar que ao fazermos considerações sobre “essa modalidade”, é possível supor que a recolhemos como sendo algo diferente da “outra modalidade”, que é a presencial. Sobre tal aspecto, ressaltamos que uma não exclui a outra e defendemos a ideia de complementaridade entre ambas, uma vez que as duas modalidades integram o campo da educação. Nesse sentido, Belloni (2002) prevê uma convergência de paradigmas, capaz de unificar a EAD quanto o ensino presencial “em formas novas e diversificadas”:
distância. Assim, propor-se a estudar a EAD no Brasil atual é uma necessidade e um desafio. Necessidade, já que os números que envolvem essa modalidade são bastante expressivos; ademais, é possível perceber que o ritmo das pesquisas científicas não é compatível com esse crescimento. É prevista ainda a implementação de ações para a melhoria das conexões, além da implantação de bandas largas em todo o território nacional. Com números tão expressivos, é certo que estamos diante de um grande desafio em que todas as pesquisas são muito bem-vindas. De acordo com o atual cenário, o que se percebe é que a EAD, e as pesquisas relacionadas a ela, estão caminhando em ritmos diferentes. 2. Processo de Ensino e Aprendizagem na EAD
Quanto à educação a distância, o conceito tende a se transformar, pois uma das macrotendências que se pode vislumbrar no futuro próximo do campo educacional é uma “convergência de paradigmas” que unificará o ensino presencial e a distância, em formas novas e diversificadas que incluirão um uso muito mais intensificado das TICs. (BELLONI, 2002, p.8)
O Coronavírus impactou a escola porque os estudantes deixaram de ir à mesma. Impactou a escola porque, neste momento, os professores não têm mais a escola como seu território. E as aulas, quiséssemos nós ou não, passaram a ser à distância. Nesse sentido, cabe a pergunta: o que poderemos mobilizar dessa experiência para projetarmos futuras transformações da escola?
Com relação à finalidade da educação a distância (EAD), ela foi criada com a intenção de promover o ensino e a formação continuada, almejando a democratização e o acesso ao conhecimento para todos, em todos os lugares. Há que se considerar, contudo, que, em um país de dimensões continentais como é o caso do Brasil, ainda há regiões que carecem de estruturas mínimas necessárias, como, por exemplo, luz elétrica, internet banda larga, entre outros suportes necessários à EAD.
Alguns já assinalam a perda de qualidade do ensino ministrado virtualmente, já apontam o risco de se transformar a educação presencial em ensino a distância, demonstrando preocupação quanto à reposição presencial das aulas perdidas. Outros procuram visualizar qual é a potência do que vem acontecendo; ou seja, quais lições poderão tirar desse tempo em que a escola não estava à nossa frente? No início do século XX, essa escolarização que se expandia passa a ser vista como inoperante e ineficaz. O internacionalmente renomado movimento da Escola Nova, irá criticar a obsolescência dos métodos adotados, os limites e o conservadorismo da forma da escola, o engessamento das
Desse modo, as políticas públicas ainda têm um longo caminho a percorrer para garantir a efetivação da proposta veiculada ao ensino a
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práticas de ensino, excessivamente centradas na palavra do professor. Defender-se-á, a partir de então, maior autonomia do aluno, liberdade nos métodos de ensino adotados, inovações nas estratégias didáticas, bem como a necessidade de se situar como ponto de partida do ensino o conhecimento prévio, ou seja, aquilo que o aluno já sabe e traz com ele. A escola aparentemente se abre. Ocorre que o formato da escolarização estava tão atado aos usos e costumes de uma rotina cristalizada que muito do que era defendido não passava dos portões da escola e não chegava, portanto, ao chão da classe. O debate sobre a inovação pedagógica teve lugar durante toda a primeira metade do século XX, embora as práticas de inovação tenham sido ainda um tanto quanto tímidas nesse período. Aqui entra a discussão sobre as atividades a distância a serem desenvolvidas neste período de pandemia. Por um lado, transformar o conteúdo do ensino ministrado em atividades à distância nos leva a um impasse, em virtude daquilo que é efetivamente um dado: há alunos nas escolas públicas e mesmo nas universidades que não têm acesso à internet banda larga, de tal modo que, muitas vezes, parece inviabilizada a própria mobilização dos recursos da internet para dar sequência ao ensino. O que fazer, portanto, com os alunos que não possuem condições objetivas de acompanhar o ensino a distância? Se não olharmos para eles, corremos o risco de favorecer uma segregação social que é, sob todos os aspectos, inadmissível. É preciso, por definição, que tenhamos por princípio a incorporação de todos os nossos alunos ao nosso projeto de educação. É preciso chegar até esses alunos. Esse é um ponto. Por outro lado, vivemos em tempos de exceção. E esses tempos exigem, em alguma medida, a reinvenção da educação e da escola. É
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preciso inventividade. É preciso experimentação. É preciso ter a coragem de criar. E para criar, há de se romper com certezas presumidas e verdades pressupostas. Nesse sentido, valer-se de novas plataformas, utilizar novas estratégias, tudo isso requer ponderação na decisão e urgência na ação. As novas plataformas que abrem flanco para novos métodos de ensino levam a internet efetivamente para dentro da escola. 3. Ferramentas tecnológicas utilizadas pelos professores na Escola pública Ao pensar no fechamento das unidades escolares, é comum imaginar o ensino mediado pela tecnologia como única alternativa possível. Entretanto, essa não é uma opção para muitos que não possuem equipamentos ou mesmo acesso. Os professores com esse novo desafio das aulas remotas tem que se reinventar utilizando a tecnologia para alcançar seus objetivos de compartilhar seu conhecimento com seus alunos. Por esse motivo surgem ferramentas para auxiliá-los e tentar minimizar a evasão escolar. O Google Classroom é um sistema de gerenciamento de conteúdo para escolas que procuram simplificar a criação, a distribuição e a avaliação de trabalhos. Ele é um recurso do Google Apps para a área de educação e foi lançado para o público em agosto de 2014. Em 13 de abril de 2020 quando iniciou o ensino a distância (EAD) a Secretaria Municipal de Educação (SME) informou as escolas que os professores da rede municipal teriam que utilizar o Google Classroom para administrarem a suas aulas. Lançaram o caderno das Trilhas de Aprendizagens que o correio entregaria nas casas das famílias ou responsáveis para que esse aluno tivesse acesso às matérias daquele
semestre. Quanto ao uso da internet na maioria dos casos na periferia de São Paulo muitas famílias tiveram que optar se continuariam a pagar, pois, com a pandemia muitos pais de família ficaram desempregados esses alunos ficaram sem o acesso para acompanhar as aulas seja por celular, tablet ou notebook. O caderno das Trilhas de Aprendizagens chegou nas casas onde o endereço estava correto, a escola tentou entrar em contato com as famílias cujo endereço estava incorreto, mas sem sucesso pois o telefone mudou. Esse aluno não recebeu o caderno e nem tem acesso à plataforma do Google Classroom, ou seja, não terá como estudar. O Google Meet , cria a participação com segurança de vídeo-chamadas de alta qualidade com até 250 pessoas. Assim o professor pode utilizar essa ferramenta para conversar com os alunos, realizar reuniões com os pais, com o grupo docente e seus gestores. Essa ferramenta oferece as seguintes vantagens: • Segurança garantida: as videochamadas do Meet são criptografadas em trânsito, e as diversas medidas de segurança são atualizadas continuamente para reforçar a proteção. • Reuniões com vários participantes: convide até 250 pessoas da mesma equipe ou de fora da sua organização. • Acesso fácil em qualquer dispositivo: compartilhe um link e convide membros de equipes para participar de conversas com um clique em um navegador da Web ou pelo app Google Meet para dispositivos móveis. • Compartilhamento de tela: mostre documentos, apresentações e outros arquivos durante
uma videoconferência. • Transmissão de eventos: equipes, empresas e escolas podem ver e apresentar em eventos transmitidos ao vivo com até 100.000 pessoas no domínio. • Gravação de eventos: gravar reuniões importantes e acessar a gravação no Google Drive. • Exibição de legendas: acompanhe reuniões com legendas em tempo real que usam a tecnologia de conversão de voz em texto do Google. O Google Drive é um serviço de armazenamento e sincronização de arquivos que foi apresentado pela Google em 24 de abril de 2012. Google Drive abriga agora o Google Docs, um leque de aplicações de produtividade, que oferece a edição de documentos, folhas de cálculo, apresentações, e muito mais. Ele baseia-se no conceito de computação em nuvem, pois o internauta poderá armazenar arquivos através deste serviço e acessá-los a partir de qualquer computador ou outros dispositivos compatíveis, desde que ligados à internet. Além disso, o Google Drive disponibiliza vários aplicativos via online, sem que esses programas estejam instalados no computador da pessoa que os utiliza. Com essa ferramenta toda conversa e atividades enviadas para o aluno é armazenada e comprova o material pesquisado e disponibilizado para o aluno de acordo com a data que for definida pelo professor regente da sala. O WhatsApp é um aplicativo multiplataforma de mensagens instantâneas e chamadas de voz para smartphones. Além de mensagens de texto, os usuários podem enviar imagens, vídeos e documentos em PDF, além de fazer ligações grátis por meio de uma conexão com INEQ - Educação integral
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a internet. Essa ferramenta está sendo a mais utilizada pelos professores, devido aos alunos não terem conseguido entrar na plataforma do Google Classroom. Os pais recebem as atividades e compartilham com os filhos e depois de feitas tiram as fotos e encaminham para os professores para que sejam corrigidas. Blog é um site informativo ou jornal que mostra as postagens mais recentes no topo da página principal. Ele também recebe atualizações frequentes e é geralmente gerenciado por apenas uma pessoa. Ou, em alguns casos, por um pequeno grupo de redatores. A escola faz um blog e os professores informam aos alunos e passa a ser um jornal virtual . Facebook é uma rede social que permite conversar com amigos e compartilhar mensagens, links, vídeos e fotografias. A escola também utiliza essa ferramenta para se manter conectada a comunidade escolar com tudo que acontece dentro e fora da escola. 4. Participação das famílias para ajudar os filhos durante a quarentena Da noite para o dia, escolas foram fechadas e passaram a ter que atender seus alunos de maneira remota. Pais e responsáveis passaram a ter que acompanhar a rotina escolar de seus filhos de perto. Mas essa é apenas uma face do problema. Ainda há aqueles que não têm acesso à internet e muitas vezes nem comida, pois não podem trabalhar nesse período. Diante desse cenário, como proceder? Um ponto importante a se levar em consideração é a maneira como a Educação tem sido pensada. “Ao longo dos anos, não tivemos uma Educação que priorizasse a autonomia dos alunos e nem que utilizasse o digital como
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ferramenta permanente de estudo”, explica Luciene Tognetta, pesquisadora do Departamento de Psicologia Educacional da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Do lado dos pais, o cenário não é diferente. Ninguém os preparou para equilibrar o acompanhamento das atividades escolares ao mesmo tempo em que precisam lidar com tarefas e preocupações do trabalho e de casa. Então, a primeira coisa a se fazer é entender que a adaptação não será perfeita e que todos estão dando o seu melhor nessa nova realidade. É o que ressalta a professora Adriana Marcondes, do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP). “Todos estão se esforçando para dar conta de um jeito de fazer Educação que é remoto e cheio de imprevistos”, afirma. Além disso, a professora aponta que esse é o momento de reforçar os vínculos entre professores, pais e alunos. Por isso, é importante entender a sua comunidade escolar para atendê-la bem. As famílias estão assustadas com essa nova realidade, de ter que se adequar a terem que ajudar seus filhos a terem uma rotina de atividades dentro de casa. Muitos não têm tempo de acompanhar as lições por chegarem tarde do trabalho. Outros não têm paciência para ensinar e devido ao desemprego que vem aumentando tem que deixar de pagar as operadoras de internet para não pesar no orçamento da família que fica apertado. 5. O lugar do outro A situação é nova para todo mundo, por isso, tenha em mente que todos estão tentando entender como agir. Agora, mais do que nunca, é essencial fazer o exercício de se colocar no lugar do outro e não depositar cobranças excessivas de produtividade para esse período.
Considere: a) A relação professor-aluno é muito diferente da relação pai-filho. Além disso, os responsáveis não estão preparados para dar conta do conteúdo escolar. Eles também estão angustiados e pressionados pela quarentena em si; b) O tempo que a criança tem disponível para o ensino remoto é diferente do tempo na escola. Não c) Pensar em ações mediadas pela tecnologia que levem ao aprendizado, considerando todas as circunstâncias, é um exercício difícil. Os professores têm se desdobrado para aprender a trabalhar com novas ferramentas. Mas não só eles: estudantes, pais e familiares também estão se adequando às novas dinâmicas. CONSIDERAÇÕES FINAIS O momento é o de dar as mãos simbolicamente, testar coisas novas e repensar se a Educação e a dinâmica escolar que estávamos exercendo é a que faz mais sentido ou não para o momento atual. Não existe resposta pronta. Mas existe uma grande oportunidade de construir novos caminhos para a escola. Com a ajuda da Luciene Tognetta, pesquisadora do Departamento de Psicologia Educacional da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), podemos elencar alguns questionamentos e atitudes que podem colaborar com o dia a dia de cada unidade escolar: 1) Entenda qual é a necessidade real da comunidade escolar hoje. É muito importante estar em contato ativo com os pais e alunos para entender o que eles mais precisam nesse momento. Lembre-se de que as necessidades vão mudando e que é preciso manter sempre o
diálogo aberto para antecipar problemas e um planejamento que faça sentido para a comunidade escolar. 2) Análise como a comunidade pode apoiar a escola. A equipe pedagógica precisa estar ciente do que os alunos precisam aprender e de como eles aprendem para que essa informação chegue de maneira clara aos pais. 3) Procure saber como o governo pode ajudar nesse cenário. Se há alunos e professores sem computador, famílias sem comida e outras questões de infraestrutura, tente uma integração com o governo ou outras redes de apoio locais. Diversas iniciativas estão sendo estruturadas para atender ao momento da Covid-19. 4) Convoque a comunidade para que todos participem. Mantendo as recomendações de distanciamento social, é possível criar uma comissão que pense em estratégias de como chegar nas famílias que têm mais dificuldades. 5) Mantenha um grupo de trabalho escolar. Esse grupo vai pensar em estratégias sobre como chegar a conteúdos e discussões para os alunos e auxiliar outros docentes no processo. REFERÊNCIAS f i l e : /// C : / U s e r s / W a g n e r / D o w n l o a d s / 4176-12196-2-PB.pdf (acesso em 16/06/2020) Estudos científicos sobre a educação a distância no Brasil: um breve panorama; https://jornal.usp.br/artigos/a-educacao-e-a-escola-em-tempos-de-coronavirus/ ( acesso em 16/06/2020); https://play.google.com/store/apps/details?id=com.google.android.apps.meetings&hl=pt_BR(acesso em 16/7/2020); https://novaescola.org.br/conteudo/19087/mudanca-de-rotina-como-se-manter-proximo-das-familias-em-tempos-de-pandemia (acesso em 16/7/2020); INEQ - Educação integral
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EDUCAÇÃO INCLUSIVA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: ACOLHIMENTO E RESPEITO À DIVERSIDADE Daniela Xavier Domingues Cunha¹ RESUMO O presente artigo aborda sobre a inclusão nos espaços de Educação Infantil, trazendo um viés no acolhimento à diversidade por meio de práticas pedagógicas que visem à constituição de sentimentos de pertencimento social diante da visualização da criança que se sente representada no contexto educacional, inferindo na sua formação e na formação do outro. Para isso, inicia explanando sobre o sentido da educação inclusiva apontando para o acolhimento e respeito à diversidade dentro do ambiente escolar. Em continuidade, traz as correlações sobre a importância do desenvolvimento de práticas pedagógicas que envolvam ações inclusivas desde a educação infantil para que a formação das crianças que impactem nas relações de convivência humana sem preconceitos com vistas a promoção de transformações sociais. Em sequência, aponta para a importância do professor na oferta de práticas pedagógicas planejadas e devidamente organizadas, contemplando a diversidade das crianças com bases na Educação Inclusiva. Por fim, conclui evidenciando que uma formação para o respeito ao próximo e as diferenças desde as menores idades se faz necessário para compreensão dos sujeitos sobre igualdades de direitos por todos serem seres humanos, visando a possibilidade de atuação das crianças do presente no futuro, a fim de transfor-
mar a sociedade vigente. Traz por objetivo visualizar as relações existentes entre Educação Inclusiva e formação das crianças na Educação Infantil. Trata-se de uma pesquisa de revisão de literatura Palavras-chave: Educação inclusiva; Educação infantil; Formação cidadã. ABSTRACT This article deals with the inclusion in the spaces of Early Childhood Education, bringing a bias in welcoming diversity through pedagogical practices that aim at the constitution of feelings of social belonging when viewing the child who feels represented in the educational context, inferring in their training and the training of the other. To this end, he begins by explaining the meaning of inclusive education aimed at welcoming and respecting diversity within the school environment. In continuity, it brings correlations about the importance of developing pedagogical practices that involve inclusive actions from early childhood education so that the formation of children that impact on human relations without prejudice with a view to promoting social transformations. In sequence, it points to the importance of the teacher in the provision of planned and properly organized pedagogical practices, contemplating the diversity of children based on Inclusive Education. Finally, it concludes by showing that training for respect for
1 - Licenciada em Pedagogia pelo Centro Universitário Estácio Radial de São Paulo (2010); pós-graduada em Psicomotricidade em ciências Humanas (2012) pelo Centro Universitário Assunção UNIFAI. Leciona na prefeitura Municipal de São Paulo desde 2015, atuando na atualidade na EMEI Neyde Guzzi de Chiacchio Professora.
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others and differences from the earliest ages is necessary to understand the subjects about equal rights for all human beings, aiming at the possibility of the children of the present in the future, in order to transform the current society. It aims to visualize the existing relationships between Inclusive Education and the training of children in Early Childhood Education. This is a literature review research. Keywords: Inclusive education; Child education; Citizen formation.
se encontram em um momento de descobrimento do mundo que a cerca e sua formação se dá nas interações com outro, possibilitando vivências com a diversidade que permeadas por práticas pedagógicas inclusivas propiciam reflexões sobre as diferenças e o respeito a estas. Sendo assim, o artigo traz por objetivo visualizar as relações existentes entre Educação Inclusiva e formação das crianças na Educação Infantil.
INTRODUÇÃO O tema sobre Educação Inclusiva é recorrentemente discutido na atualidade, fazendo parte da pesquisa e discurso de vários teóricos renomados, os quais têm criado visões nos profissionais da educação sobre como essa inclusão deve ocorrer dentro dos espaços educacionais para se efetivar em práticas que realmente acolham e contemplem a diversidade no cotidiano escolar, inferindo na formação dos estudantes no que concerne sobre sua convivência social entre os sujeitos. Porém, as reflexões sobre Educação Inclusiva têm adentrado lentamente as discussões da Educação Infantil. Aparentemente, a demora sobre esse assunto ser tematizado nesta etapa da educação é porque quanto menores as crianças, o contato com preconceitos e atos discriminatórios são poucos. Provavelmente, tenha sido um erro pensar dessa forma, visto que desde o nascimento a criança já pertence a sociedade, dentro de círculos de convivências que são responsáveis pelas primeiras aprendizagens. A grande diferença de um público com faixa etária mais velha é que algumas ações já foram consolidadas e determinadas visões sobre o outro se constituíram. Com as crianças, e isso ocorre de maneira diferente, uma vez que
A metodologia utilizada para essa pesquisa de revisão de literatura com análise de artigos científicos diversos que trazem a temática em sua totalidade ou parcialmente para dar embasamento à proposta de estudo.
1. Inclusão e Diversidade Para dar início a esta pesquisa vale ressaltar a visão de Morin (2015 apud COUTINHO; MELO, 2020), pesquisador que traz novas perspectivas para a educação mundial e dá esperanças diante das desventuras que são visualizadas na atualidade. Segundo este renomado autor, a humanidade só é o que é devido a suas diversidades, são as individualidades que trazem a magia de tentar por inúmeras vezes compreender que é o ser humano e são elas também que traduzem como a capacidade de revisitar conhecimentos para traçar novos panoramas. De acordo com Morin (2015 apud COUTINHO; MELO, 2020): Cabe à educação do futuro cuidar para que a ideia de unidade da espécie humana não apague a ideia de diversidade, e que a da sua diversidade não apague a INEQ - Educação integral
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da unidade. Há uma unidade humana. Há uma diversidade humana. A unidade não está apenas nos traços biológicos da espécie Homo sapiens. A diversidade não está apenas nos traços psicológicos, culturais, sociais do ser humano. Existe também diversidade propriamente biológica no seio da unidade humana; não apenas existe unidade cerebral, mas mental, psíquica, afetiva, intelectual; além disso, as mais diversas culturas e sociedades têm princípios geradores ou organizacionais comuns. É a unidade humana que traz em si os princípios de suas múltiplas diversidades. Compreender o humano é compreender sua unidade na diversidade, sua diversidade na unidade. É preciso conceber a unidade do múltiplo, a multiplicidade do uno. (p. 3) Partindo dessa magnífica visão, se torna essencial aprofundar conhecimentos em relação a Educação Inclusiva, para que o viés a que esta educação retrata não seja deturpado por analogias com poucas verossimilhanças. Dessa forma, Carneiro (2012) evidencia que o ser humano ainda encontra dificuldades para ser realmente um cidadão inclusivo e que respeita todas estas diferenças entre pares seja no seu convívio, seja observando as ações dos outros no mesmo espaço social a que pertencem. O fato ressaltado por Carneiro (2012) é que cada sujeito cresce dentro de uma cultura que traz muitas das consolidações sentimentais e de pensamentos que constituem sua identidade. Nesta perspectiva de manutenção de ideias nem sempre abertas à inclusão, os sujeitos vão mostrando na sua prática cotidiana o que realmente pensam com atitudes discriminatórias. Logicamente que seria injusto generalizar, uma vez que muitos lutam pela inclusão porque entenderam o que significa a diversidade.
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E estes e tantos outros indivíduos com ideias contrárias à inclusão estão se formando como professores ou já se graduaram no magistério. Um dos problemas evidenciados por Carneiro (2012) é que aqueles graduados há um certo tempo não tiveram nem contato com práticas pedagógicas inclusivas, visto que estas não se encontravam como parte obrigatória de um currículo formativo. Por outro lado, algumas, e não poucas graduações atuais, também não ensinaram os professores a atuarem com a diversidade, com teorias que nem sempre se enquadram com a prática real e com falta de espaço para a construção de um conhecimento reflexivo, mostrando que o tema, apesar de obrigatória na formação contemporânea, talvez não esteja sendo tratado com a valia que merece. O foco desta primeira discussão está em entender o que realmente é inclusão e Coutinho e Melo (2020) descrevem com maestria abaixo: A inclusão não se aplica apenas aos alunos com deficiência, pois é necessário conhecer a trajetória da educação inclusiva, porém a formação dos educadores não será para prepará-los para a diversidade, mas para a inclusão. As crianças deficientes que frequentam a Educação Infantil precisam de profissionais capacitados, atentos capazes de promover a integração social e a aprendizagem delas. O provimento desse tipo de formação está garantido em várias legislações que tratam da educação inclusiva, e em geral se voltam para os professores, aos quais se deposita a maior responsabilidade pelo processo de inclusão na escola. (COUTINHO; MELO, 2020, p. 4) Em complemento, Amorim (2018) ressalta que a inclusão é acolher a diversidade e torná-la natural nos ambientes de convívios sociais. Os
sujeitos que compõem uma sociedade são diferentes, principalmente a sociedade brasileira, com miscigenação e interlocução de culturas que se ampliam a cada época e que trazem uma característica especial aos brasileiros. Refletindo sobre esta diversidade e como torná-la natural, uma vez que são naturais, Carneiro (2012) faz suas relevâncias, apontando que a compreensão dessa diversidade deve ser dar durante o processo de formação dos sujeitos e, portanto, deve estar incluída desde os anos iniciais da Educação Básica, ou seja, desde a Educação Infantil, a qual é responsável pelos primeiros contatos com sujeitos que se encontram fora do seu ciclo de convivência com possibilidades grandiosas de se conectarem com a diversidade e entendê-las como parte da identidade destes e não como forma de segregação. Corroborando com este pensamento, Coutinho e Melo (2020) colocam que: A inclusão na Educação Infantil faz romper com o atual paradigma educacional, busca um caminho para que a escola possa fluir, espalhando sua ação formadora por todos os que dela participam. E se o que se pretende é que a escola seja inclusiva, é urgente que seus planos se redefinam para uma educação voltada para a cidadania global, plena, livre de preconceitos e que reconhece e valoriza as diferenças, buscando sempre a participação da família, para um bom desempenho da criança na escola. (COUTINHO; MELO, 2020, p. 2) Ainda na ótica de Coutinho e Melo (2020), a inclusão na Educação Infantil é de fundamental importância para que a formação das crianças ocorra com a compreensão de pertencimento e representatividade no espaço social em que
se encontram inseridas. Se desde esta primeira formação foi possível mostrar às crianças que fazem parte e possuem valor na sociedade, estas terão voz para defender seu espaço nos anos que se seguem, assim como tornarão a diversidade algo humano e propiciarão a transformação social almejada pela educação. Portanto, compreender que a diversidade vai muito além das deficiências, como muitos tem o costume de confundir, é dar visibilidade a todas as crianças nos espaços de Educação Infantil e possibilitar uma sociedade mais justa, mais humana e mais respeitosa. 2. Inclusão e Educação infantil A partir desta primeira reflexão, na qual é evidenciada a inclusão como uma prática de acolhimento e aceitação da diversidade nos espaços de convívios sociais com maior enfoque no contexto educacional e trazendo maior evidências na Educação Infantil, é possível dar andamento na continuidade desta pesquisa. Entender a Educação Infantil e suas especificidades, assim como respeitar as características das faixas etárias que a compõem é fundamental para visualizar a ação inclusiva neste espaço. Segundo Carneiro (2012), com a contemporaneidade e o afinco de pesquisadores da infância em desmistificar esta etapa de desenvolvimento humano, ainda sedentos por mais conhecimentos mas como uma visão bem definida sobre a infância e sua forma de construir conhecimento que ocorre pelas interações que são estabelecidas com o meio e com o outro, é possível visualizar que esta etapa da educação traz uma gama de aprendizagens essenciais para formação humana e como tal não deve medir esforços para ofertar práticas pedagógicas que maximizem a visão de mundo das crianças. INEQ - Educação integral
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Um ponto importante, evidenciado por Carneiro et al (2012), é que por mais que os estudos e pesquisas apontem para a necessidade de abandonar diversos paradigmas que desvalorizam a atuação do professor de Educação Infantil. Vale a pena ressaltar que não basta os estudos estarem escancarados para os professores desta área, pois as visões não se modificam da noite para um dia, mostrando a urgência do desenvolvimento de formações continuadas que permitam a construção de conhecimentos significativos destes profissionais, para que interiorizem este entendimento e reflita em práticas pedagógicas que possibilitem a desenvoltura infantil frente aos desafios ofertados permitindo a atuação das crianças sobre o meio. Com este pensamento, Carneiro (2012) enfatiza que: A prática pedagógica na educação infantil tem sido analisada ultimamente no sentido de superar ações que eram baseadas no cuidar, promovendo reflexões sobre seu papel de educar. No entanto, práticas pedagógicas arraigadas em um modelo educacional assistencialista e excludente não se modificam por decreto. Concepções precisam ser modificadas na busca desse ideal. Além da mudança conceitual sobre o papel da educação infantil no desenvolvimento global e integral da criança, quando falamos de construção de escola inclusiva temos que pensar também em uma mudança conceitual sobre a quem a escola se destina. (CARNEIRO, 2012, p. 86-87) Amorim (2018) compreende a necessidade desta formação continuada e a enfatiza que a escola é um local que funciona como instrumento de aprendizagens dos professores, pois além da prática pedagógica cotidiana, possi-
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bilita a reflexão dos mesmos sobre o seu dia a dia e as aprendizagens adquiridas tanto por eles, quanto pelas crianças. Mesmo ciente do papel da escola de propiciar estas reflexões, Amorim (2018) se apoia na visão de Carneiro (2012) concordando com este ao se referir a necessidade de um trabalho enquanto processo de apropriação de conhecimento e não de crença de que com a imposição das noivas óticas, todos os profissionais modifiquem sua prática pedagógica com um passe de mágica. Exposta esta visão de formação das crianças na Educação Infantil e de espaço para diversas reflexões sociais e de pertencimento dos sujeitos aos espaços sociais, Coutinho e Melo (2020) fazem a interlocução entre inclusão e Educação Infantil, apontando que com as crianças em formação, ainda longe de ter concepções arraigadas que são transpassadas de gerações para gerações em uma cultura que não está tão aberta a diversidade, a inclusão ocorre de uma maneira muito natural, visto que o ser humano não nasce preconceituoso, mas pode se tornar de acordo com os contatos que tiver no seu caminho durante a sua formação. Daí vem a importância de desenvolver um trabalho já na infância, com as crianças diante da diversidade, para que estes aprendizados sobre convivência humana perpassem os muros das escolas e adentrem as famílias, modificando muitas visões sobre o outro e reeducando familiares e comunidades, o que as crianças são muito capazes de fazer pela sua ação curiosa e interrogativa. Diante desta assertiva, Amorim (2018) coloca que: O êxito da proposta de formação nas escolas evidencia o reconhecimento e a valorização das diferenças como elemento primordial do processo de ensino apren-
dizagem; professores atuando de forma que haja promoção da aprendizagem coletiva e enfoques curriculares, metodológicos e estratégias pedagógicas que envolvam a construção coletiva do conhecimento. A partir destas estratégias fato seguinte a ser observado, qual foi o progresso obtido pelos professores e demais componentes da escola, pedagogicamente refletido na maneira de ministrar com novas formas e práticas educacionais, respeitando os educandos em seus progressos de construção de aprendizagem-conhecimento seja coletivo ou individual em sala de aula. Com a parceria dos pais, professores e comunidade nos processos que tiverem a necessidade de participação em futuros projetos, soluções em prol da melhoria no processo da inclusão dos educandos. (AMORIM, p. 10) De acordo com Matos e Sekkel (2014), as ações preconceituosas, assim como a interiorização do sentimento de superioridade diante da diversidade não é algo que nasce com os seres humanos, mas sim é aprendido conforme ocorrem as interações com o outro. Para mudanças no cenário de preconceito e discriminação que ainda é visualizado na atualidade, se faz necessário que a formação que os sujeitos recebem desde a infância retratem esta problemática favorecendo a reflexão destes sobre ações deste tipo na sociedade. Para isso, como colocam Matos e Sekkel (2014), quando se dá abertura para o convívio com a diversidade, comumente visualizado nas escolas por atender e acolher a todas as culturas, raça, enfim a todas as diferenças como um direito dos cidadãos, se possibilita que as crianças tenham experiências capazes de promover esta reflexão sobre o outro e o lugar de ambos na sociedade como indivíduos
iguais. Ainda na perspectiva de Matos e Sekkel (2014), todas as crianças e todos os sujeitos devem se sentir pertencentes à sociedade e isso só ocorre se se sentir representado neste espaço. Assim, colocam que: O sentimento de pertencimento é algo que deve perdurar após a saída da instituição; por isso, o modo como se dá o desligamento da instituição deve ser alvo de discussão em situações de formação inicial e continuada de professores, buscando-se entender a importância do vínculo de pertencimento, o qual não diz respeito somente às crianças, mas também aos profissionais. (MATOS; SEKKEL, 2014, p. 95) Dessa forma, se torna visível que para a efetivação da inclusão no meio educacional partindo da Educação Infantil, todos os profissionais da educação busquem trazer experiências para as crianças sobre a convivência entre pares em uma relação de respeito ao próximo e valorização dos sujeitos. O cotidiano escolar permite que a criança observe e vivencie ações que será refletida fora do ambiente educacional e infira em uma formação que perpetuará pelo resto das suas vidas e se constitua em lutas em prol da transformação social e, em consequência, diminuição das desigualdades de oportunidades sociais. 3. A Inclusão e o Professor da Educação infantil Para que as práticas pedagógicas na Educação Infantil sejam inclusivas é necessário, como aponta Carneiro (2012), que o professor tenha conhecimento sobre a realidade contemporânea que apresenta ainda ações preconceituosas e discriminatórias, questionando-as e INEQ - Educação integral
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propiciando a reflexão das crianças. Uma das formas de contemplar a inclusão no cotidiano escolar, parte da organização metodológica e estruturação de atividades pelo professor que contemple a diversidade e possibilite que as crianças se sintam representadas, podendo ser com brinquedos, imagens, canções, entre outros. Para Amorim (2018), o professor não deve ignorar as diferenças, mas sim utilizar da diversidade para propiciar reflexões e construção de conhecimento das crianças sobre o mundo, um mundo com diferenças, mas que deve ter iguais oportunidades uma vez que todos são seres humanos de direitos. Com práticas que valorizem as individualidades, o professor promoverá o respeito pelo outro. Para isso, é essencial que a formação tanto inicial do professor quanto a continuada traga subsídios para esta prática de forma a reformular seu próprio pensamento sobre a diversidade, um pensamento que pode estar arraigado de preconceitos construídos por suas vivências. Pensando na importância de entendimento dos professores sobre a diversidade, inclusão e práticas pedagógicas, Carneiro (2012) evidencia que: A aprendizagem ocorre quando existem colaboração e interação positiva entre alunos e professor. Assim fica mais fácil o professor oferecer oportunidades para desenvolver as potencialidades de seus alunos, favorecendo uma eficiente adaptação e ação sobre o aprender. Essa interação pode não acontecer por vários fatores como o desconhecimento das condições cognitivas, físicas ou sensoriais dos alunos e as pessoas envolvidas neste processo (aluno, professor e família) experimentam a sensação de frustração e fracasso. Se as estratégias de ensino não forem revistas e modifica-
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das, o aluno acaba sendo rotulado e sua aprendizagem fica comprometida. (CARNEIRO, p. 92) A interação entre as crianças e o professor, também é ressaltada por Amorim (2018) que aponta para a importância de envolvê-las em um processo reflexivo sobre as diferenças e construir em conjunto com elas noções de respeito ao outro como sujeitos diversos mais iguais no que concernem sobre serem seres humanos e como tais possuem direitos iguais. Estas interações pensadas, organizadas e planejadas pelo professor constituem práticas pedagógicas inclusivas que favorecem a visualização sobre a convivência com o próximo e como esta deve ser em sociedade. Porém, como cita Amorim (2018), o professor deve utilizar de sabedoria e criatividade para trabalhar com a diversidade na Educação Infantil, não utilizando de ações que possam excluir as crianças ou evidenciar negativamente suas características. A respeito disso, o autor coloca que: É importante que o professor tenha consciência de sua prática pedagógica, ele precisa ter uma visão crítica de como agir com os alunos de modo que não vá excluí-los, saber como se colocar em determinadas situações, tudo para que o aluno não se sinta discriminado ou rejeitado. Importante fazer com que ele também se envolva nas atividades propostas na aula. Cabe ao professor oferecer sempre mais conhecimento, adquirido na formação continuada, onde os mesmos se aprimorarão mais do saber, buscando aprimorar-se cada vez mais de seus conhecimentos pedagógicos. (AMORIM, 2018, p. 5) Portanto, como enfatizam Matos e Sekkel
(2014), as relações entre o professor e as crianças se tornam inclusivas a partir do momento que este dá ouvidos às necessidades das mesmas, que este permita que façam parte da construção do seu planejamento, ou seja, que este realize a escuta sensível no cotidiano educacional. A valorização da criança e suas qualidades em um ambiente que acolhe a diversidade não precisa de receitas prontas de como atuar, só precisa de um olhar que trate todas as crianças como seres humanos, que não se escondam as diferenças mas que mostre a importância destas e como podem se sentir representadas e pertencentes a sociedade para que sejam questionadoras e esta formação lhes permita transformar o cenário social que ainda aponta para exclusões e desigualdades sociais, frutos da ignorância humana e da intolerância ao diferente como prática de hegemonia e poder de uns sobre os outros.
CONSIDERAÇÕES FINAIS Observando os argumentos que compõem este artigo, se tornou possível evidenciar que existe a necessidade de estruturar práticas pedagógicas que envolvam uma ótica inclusiva de Educação Infantil, primando por uma formação que propicie a visibilidade da diversidade dos sujeitos como aspecto que torna as individualidades potentes na sociedade.
Dessa forma, é imprescindível que as ações desempenhadas na Educação infantil se deem em uma perspectiva de valorização das crianças e de suas individualidades, inferindo em uma formação que terá reflexo não somente no futuro com crescimento destas, mas também no presente, as quais com pequenas ações e o dom da sinceridade possam maximizar esta ótica de respeito à diversidade para além dos muros da escola.
REFERÊNCIAS AMORIM, Amélia Valadares de. Os Desafios da Educação Inclusiva na Educação Infantil. 2018. Disponível em: <https://multivix.edu.br/ wp-conte nt/uploads/2018/12/os-desafios-da-educacao-inclusiva-na-educacao-.pdf>. Acesso em: 18 jan. 2021. CARNEIRO, Relma Urel Carbone. Educação Inclusiva na Educação Infantil. Práxis Educacional, Vitória da Conquista, v. 8, n. 12, p. 81-95, 2012. COUTINHO, Diogenes José Gusmão e MELO, Josefa Gomes dos Santos. Educação Infantil: métodos e estratégias para inclusão. Revista Espacios, v. 41, n. 18, 2020. MATOS, Larissa Prado e SEKKEL, Marie Claire. Educação Inclusiva: formação de atitudes na Educação Infantil. Revista Quadrimestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, São Paulo, v. 18, n. 1, p. 87-96, 2014.
Para isso, professores atuantes da Educação Infantil necessitam entender a importância do acolhimento e representatividade da diversidade no cotidiano educacional, organizando práticas pedagógicas que permitam que todas as crianças se sintam pertencentes a sociedade e como tal tenham participação ativa em sua transformação. INEQ - Educação integral
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A IMPORTÂNCIA DA LEITURA PARA O DESENVOLVIMENTO DA APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL Elizabeth Neves Nogueira¹ RESUMO Este artigo apresenta os benefícios da utilização da leitura como um recurso pedagógico eficiente para a aprendizagem e desenvolvimento dos alunos na educação infantil, objetivando-se o resultado de um aprendizado significativo, de modo a envolver os alunos, fazendo-os identificar e aprender com a leitura. A importância de ler, escrever e brincar são fatores intrínsecos ao cognitivo e à saúde da criança, e estão interligados na vida pessoal e escolar. A aquisição de conhecimento se dá através da leitura, e está, paralelamente à escrita, refletindo satisfatoriamente às brincadeiras. Para o desenvolvimento do trabalho adotar-se-á uma abordagem qualitativa como instrumento de produção de dados, revisão de literatura sobre questões relacionadas à leitura, ao lúdico e às brincadeiras no contexto escolar. Contudo, os dados mostram que a formação de professores está diretamente ligada ao tema, assim como, os benefícios da aprendizagem com o desenvolvimento dos tópicos em questão. Palavra-chave: Leitura; Educação Infantil; Formação de Professores. ABSTRACT This article presents the benefits of using reading as a pedagogical resource efficient to the learning and development of students in early childhood
education, aiming at the result of significant learning, in order to engage students, making them identify and learn from reading. The importance of reading, writing and play are intrinsic factors to the cognitive and health of the child which are interconnected in personal life and school. The acquisition of knowledge through reading, and this, in addition to writing, reflecting satisfactorily the jokes. For the development of the work adopting a qualitative approach as a tool for data production, literature review on issues related to reading, to the playful and the jokes in the school context. However, the data show that teacher training is directly linked to the subject, as well as, the benefits of learning with the development of the topics in question. Keywords: Reading; Early Childhood Education; Teacher Training. INTRODUÇÃO Este artigo pretende ressaltar a importância da leitura como uma estratégia didática no desenvolvimento de crianças na educação infantil. Para desenvolvimento do trabalho foi adotada abordagem qualitativa e como instrumento de produção de dados recorri a revisão de literatura sobre questões relacionadas à educação infantil, leitura e formação de professores.
1 - Graduada em Pedagogia pela Universidade Guarulhos (2009); Professora de Educação Infantil e Ensino Fundamental 1 da Rede Municipal de Educação de São Paulo.
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Atualmente, observa-se certa precariedade na formação do professor, assim como, a utilização de recursos pedagógicos e didáticos quanto ao desenvolvimento junto aos alunos da educação infantil. A falta de frequência ou a ausência de leitura na infância pode causar uma diferença crucial nos efeitos da mesma, em relação ao desenvolvimento cognitivo, como também nos relacionamentos, o que acarreta uma precariedade no desenvolvimento individual de cada criança. A habilidade da leitura e a eficácia do processo cognitivo são bidirecionais, pois se tornam uma via de mão dupla em que um favorece ao outro. Desta forma, é fundamental que o professor, seja um interventor nesse processo, que ele tenha ciência da importância e necessidade de trabalhar a leitura em sala de aula, a fim de desenvolver habilidades e competências que tende a contribuir com o aluno no desenvolvimento educacional. Assim sendo, ocorre uma preocupação premente quanto à utilização de recursos como a leitura, corpus latente neste trabalho. Para seu desenvolvimento foi realizado um breve resgate do contexto atual da Educação Infantil na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Básica (LDB). Na sequência, a importância da formação de professores para a educação infantil e evolução do aluno. Para finalizar, foi apresentado como a Leitura influencia no desenvolvimento cognitivo, físico e emocional do aluno. Para pensar a questão da modalidade da Educação Infantil tomou-se como referência a própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Básica (LDB), os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), autores como Guimarães (2011), Kuhlmann JR (2010), Rossini (2003), Spada (2005). Para compreender conceitos sobre a formação dos professores, tomou-se como referência as pesquisas de Gatti (2006), Dubet (2008), Morais (2012), entre outros. Para identificar a importância dos benefícios da Leitura para o desenvolvimento glo-
bal do educando referenciou-se Freire (2006), Morais (2012), Rubim (2017), entre outros. A partir destas referências foi possível compreender as prerrogativas da aprendizagem utilizando a leitura, também, como reflexo de desenvolvimento cognitivo e um maior aprendizado, na escola. Estudar e compreender esse processo tem relevância pessoal e social. Pessoal, porque auxiliará no desenvolvimento e formação profissional, com a possibilidade de contribuir em quaisquer obstáculos que se fizerem presentes aos possíveis desafios enfrentados para atender às necessidades dos alunos, pois como professora presente e atuante poder-se-á desenvolver melhor a profissão escolhida. Social, na medida em que por meio do trabalho, o conhecimento poderá ser compartilhado com outros professores atuantes na instituição e na formação dos mesmos. 1. O ensino na Educação Infantil Para falarmos de educação infantil é importante lembrar que o início ao atendimento para essa faixa etária surgiu na época da Revolução Industrial, durante o processo da construção da sociedade capitalista e urbana, na qual a mulher começa a participar da economia com seu trabalho. Para Kuhlmann JR. (2010), o surgimento das creches, para atender esse público, justificava-se predominantemente à expansão de uma educação compensatória para equilibrar as carências e defasagens socioculturais da classe trabalhadora, não demonstrando claramente o interesse pela infância brasileira e pelo bem-estar da criança. A princípio, o objetivo era apenas criar um espaço onde as mães que trabalhassem pudessem deixar seus filhos. Contudo, não havia nenhuma orientação pedagógica, nem tampouco, qualquer intuito educacional. Desta forma, a atividade principal INEQ - Educação integral
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dessas instituições era única e exclusivamente cuidar das crianças.
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As primeiras creches construídas tiveram grande influência europeia. Iniciando- se em 1875, no Rio de Janeiro, e em 1877, foi criada a primeira creche em São Paulo, ambas atendendo ao setor privado. Posteriormente, por volta de 1896, foram criadas as creches do setor público.
Neste momento, as creches já passaram a ser vistas como uma necessidade da sociedade, pois sem elas, as mulheres não conseguiriam trabalhar; o aumento do número de vagas, além de ajudar na solução de problemas da pobreza, ainda resolveria os problemas das altas taxas de reprovação no ensino primário. Porém, neste período, as creches ainda permaneciam com um perfil assistencialista, discriminatório. (KUHLMANN JR., 2010, p.166).
Foi entre 1920 e 1930, fase em que o país estava se modernizando, com o aumento da mão de obra feminina no mercado de trabalho e a necessidade cada vez maior de instituições para que as mães trabalhadoras deixassem seus filhos, é que a educação infantil passou a ganhar grande atenção da sociedade. Porém, apenas em 1937-1945, conhecido como o Período do Estado Novo, é que foi criado o Ministério da Educação e Saúde, no qual a educação infantil passou a ser oficialmente responsabilidade do Estado. Com a finalidade de estabelecer normas para o funcionamento das creches, em 1940, criou-se o Departamento Nacional da Criança (DNCs).
Somente na Constituição de 1988, as creches e pré-escolas passariam a compor os sistemas educacionais e todas as crianças poderiam ter seus direitos, conforme Guimarães (2011, p. 30): “[...] direito à vida, saúde, alimentação, educação, lazer, cultura, dignidade, respeito, liberdade, convivência familiar e comunitária”. Assim, observou-se que foi um longo caminho, com diversas lutas, discussões e com muitos avanços até que a educação infantil tivesse atrelado a seu atendimento uma educação formal, explicitado na LDB 9.394/9624, em que a educação infantil passou a ser considerada a primeira etapa da educação básica, conforme segue:
Posteriormente, quase duas décadas depois, constituiu-se a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), Lei 4.024, de 1961, a qual estabelecia que crianças com idade inferior a 7 anos receberiam educação em escolas maternais ou jardins-de-infância. Mas foi somente a partir de 1970, com a carência de creches no Brasil, que houve uma expansão do número de creches devido ao Movimento de Lutas por Creches, cujo objetivo era aumentar o número das mesmas e cujo momento foi marcado por estas reivindicações sociais. O Movimento, segundo Spada (2005, p.4), vigorou no município de São Paulo de 1978 a 1982 desempenhando um importante papel na reivindicação pela expansão das creches por todo país.
Educação Infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade. A Educação Infantil será oferecida em: creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade; e pré-escolas, para crianças de quatro a seis anos de idade. (BRASIL, LDB 9.394/96)
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Nos últimos anos, muitos avanços ocorreram na conceituação da educação de crianças pequenas. Foi publicado pelo Ministério da Educação (MEC), em 1998, o documento Subsídios
para credenciamento e o funcionamento das instituições de Educação Infantil, objetivando oferecer parâmetros para a manutenção e a criação de novas instituições para este nível escolar. Ainda neste mesmo ano, o MEC editou o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil como parte dos Parâmetros Curriculares Nacionais. No ano seguinte, em 1999, o Conselho Nacional de Educação (CNE) publicou as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI). Em 2017, foi homologada a Base Nacional Curricular Comum (BNCC), que ratifica as instruções das DCNEI, e que é, atualmente, o principal documento utilizado para a elaboração de propostas para esse nível educacional. Como se pode notar, muitos desafios ainda estão sendo estudados, buscando-se entendimento dos mesmos, e um deles é a compreensão de o que é ser professor de criança pequena (concepção de infância e concepção de prática educativa). Neste sentido, há uma necessidade de se reconhecer a identidade e o papel dos profissionais da Educação Infantil, que muitas vezes, se misturam com o ato de cuidar. Educar e cuidar é muito diferente de tomar conta. Assim, diante deste panorama, vimos que a Educação infantil tem um importante papel na formação de crianças, em inseri-las neste contexto do mundo letrado, por este motivo, há uma necessidade de que o professor um trabalho estratégico de aprendizagem sempre respeitando as características da infância, por isso a necessidade de uma formação adequada destes profissionais é essencial para o desenvolvimento e garantia dos princípios garantidos por lei na Educação Infantil. 2. A formação dos Professores A necessidade de formação de professores é
um tema constante na literatura sobre Educação Infantil, conforme estabelecido no documento do MEC de 1996, de Política Nacional de Educação Infantil, pelo direito das crianças de zero a seis anos: Essa nova dimensão da Educação Infantil articula-se com a valorização do papel do profissional que atua com a criança de 0 a 6 anos, com exigência de um patamar de habilitação derivado das responsabilidades sociais e educativas que se espera dele. Dessa maneira, a formação de docentes para atuar na Educação Infantil, segundo o Art. 62 da LDB, deverá ser realizada em nível superior, admitindo-se, como formação mínima, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal. As professoras e professores e os outros profissionais que atuam na Educação Infantil exercem um papel socioeducativo, devendo ser qualificados especialmente para o desempenho de suas funções com crianças de 0 a 6 anos. A formação inicial e a continuada das professoras e professores de Educação Infantil são direitos e devem ser assegurados a todos pelos sistemas de ensino com a inclusão nos planos de cargos e salários do magistério. (MEC, 1996) No entanto, são notáveis as inúmeras críticas sobre a qualidade da formação ofertada aos professores, e o discurso de como essa educação pode contribuir para que o sistema educacional, de fato, seja efetivo é de grande relevância. Segundo Gatti (2006), o Conselho Nacional de Educação possui Diretrizes Curriculares Nacionais a serem implementadas, visando uma formação de qualidade para o professor. A questão é que estas diretrizes não costumam ser cumpridas e a burocracia do Estado permite que as leis regulamentadoras sejam, na maioria dos casos, deixadas de lado. INEQ - Educação integral
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A própria formação é o que mais preocupa. Nós não temos tido uma preocupação substantiva com a formação. Ela é bastante aligeirada e nós temos problemas tanto nos cursos de Pedagogia como nos cursos de Licenciatura, que vêm se arrastando há mais de 40 anos e não foram resolvidos. Ao invés de se repensar toda a grade curricular e a formação dos educadores, que é uma questão muito séria, nós ficamos em discussões, do meu ponto de vista, estéreis, do campo de questões ideológicas e de brigas políticas. A questão curricular da formação do professor, uma formação específica, é deixada de lado. (GATTI, 2006, Folha dirigida, p. 2) Conforme afirma Gatti (2006, p. 5-6), há uma área extremamente importante que é a mais descuidada e, também por essa razão, a formação do professor é prejudicada: o estágio. Sabe-se que os estágios não são feitos de acordo com a legislação. De prática de ensino e estágio, a legislação exige muitas horas que, normalmente, não são cumpridas. O aluno, quando muito, vê uma sala de aula durante alguns dias, mas não durante todas as horas exigidas. O estágio, em geral, é um papel assinado. Não se vê o aluno dar aulas, orientado por um professor; não se vê esse estágio sendo realizado com consistência. Poucas instituições realizam, na formação de professores, um estágio que enriqueça essa formação. Para Gatti (2006), o aluno deveria ser inserido na escola, assim como acontece em cursos de Medicina, em que há uma imersão do médico com o aluno no hospital, no pronto-socorro, no campo onde ele trabalhará. O professor deveria ter acesso a essa imersão. A autora, reitera que deveria uma haver rede de relações entre escolas formadoras, escolas de ensino fundamental e médio e educação infan-
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til, para que esses formandos pudessem estar nessas escolas, seja como observadores, como monitores, como auxiliares do professor para aprender a lidar com essas crianças, mas isso não é feito. O grande problema da formação de professores é o estágio não ser realizado como se deve. Ele é deturpado. Baseado nos conceitos explicitados, pode-se verificar a importância e a relação que estabelecem com a qualidade da Educação. É de suma importância para a formação dos profissionais, principalmente os que são ligados à educação infantil, especificamente, referindo-se ao professor das séries iniciais, conhecer as dificuldades que a carreira apresenta e identificar as necessidades de seus alunos, traçar metas e buscar possibilidades de solucionar essas carências, enfrentar os novos desafios demandados desta nova sociedade, a fim de encontrar possibilidades que propiciem resultados eficazes no aprendizado, promotores de igualdade de oportunidades. Para Dubet (2008) é necessário que a educação não continue sendo privilégio de poucos, é necessário que seja possível derrubar o “muro” que separa a educação pública da privada, sendo a primeira para população menos favorecida, que produz o fracasso escolar e a educação privada, está, com qualidade, para a classe mais favorecida, conforme reitera Morais (2012): [...] vivemos, no Brasil um verdadeiro aphartaid (apartheid) educacional, no qual coexistem, sem maiores questionamentos, dois sistemas de ensino: aquele destinado às camadas populares, no qual se passou a aceitar, como natural, que um altíssimo percentual de criança chegue ao final do primeiro ano sem ter compreendido o funcionamento do sis-
tema alfabético. (MORAIS, 2012, p.23) Desta forma, percebe-se a importância do papel do professor, e um dos seus desafios é introduzir a criança em um mundo letrado e orientá-la na apropriação desse conhecimento. Descritos em termos gerais, os professores da educação infantil precisam conhecer a importância das competências da linguagem oral, das primeiras experiências de alfabetização e da alfabetização familiar na aprendizagem da leitura (RUBIM, 2017, p. 2). Para Baptista (2010), os professores precisam ser capazes de promover uma ampla gama de disposições e competências relacionadas a idiomas e letramento, incluindo o amor pela alfabetização e o desenvolvimento de vocabulário, habilidades de linguagem oral, consciência fonológica e conhecimento relacionado à impressão. Eles devem ser capazes de usar uma variedade de métodos instrucionais que sejam adequados à idade e ao desenvolvimento e tenham a capacidade de ajustar esses métodos às necessidades específicas dos indivíduos. Eles devem ter habilidade na capacidade de usar vários métodos de monitorar o desenvolvimento da alfabetização de crianças e interpretar avaliações a fim de tomar decisões instrutivas confiáveis. Para desenvolver as competências dos pontos listados acima é necessária uma formação baseada nos conhecimentos científicos atuais sobre como as crianças aprendem a ler e escrever e as melhores práticas de ensino para ajudá-las a aprender. Obviamente, não é possível oferecer aos futuros professores todo o conhecimento necessário em um curso de graduação. Como outros campos profissionais, a base de conhecimento para o aprendizado e o ensino é fortalecida à medida que novos conhecimentos são adqui-
ridos e mesclados com os antigos. Assim, a formação de professores é vista como um processo contínuo que envolve uma experiência adquirida na prática e oportunidades experimentais, combinado ao desenvolvimento profissional contínuo. Atualmente, o que se pode constatar do atual cenário educacional é uma prática que refuta todos esses princípios garantidos em lei. É muito comum a falta de reconhecimento da prática pedagógica quando tratamos da educação infantil, pois muitas escolas e pais tratam os professores como meros “tomadores de conta” de criança, pois ignoram a prática pedagógica que é elemento essencial na formação e desenvolvimento das crianças. Com esta breve análise é possível identificar que a formação do professor não atende este novo cenário e vem seguido da necessidade de uma nova formação que remete à mudança de postura do professor diante dos novos contextos e problemas apresentados no processo de alfabetização, adequando-o às novas propostas educacionais. 3. A leitura como estratégia pedagógica na Educação Infantil Embora haja tantas incertezas no mundo atual, sempre há tempo para mudar e criar. Certamente a criatividade é um componente crítico para que o indivíduo se permita lidar com a mesma, encontrar prazer e usar seus poderes imaginativos e inovadores. Estes são recursos-chave em uma economia baseada no conhecimento, e como educadores assumir o manto e educar para o amanhã. Toda criança tem necessidade e o direito de brincar e isso é uma característica da infância garantida em Lei. Neste sentido, cabe a nós, professores, a responsabilidade de INEQ - Educação integral
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nutrir e gerir ações que valorizem o lúdico, aliadas às propostas pedagógicas que trabalhem o brincar, desenvolvendo a criatividade dos alunos de forma prazerosa, pois “o aprender tem que ser gostoso... a criança aprende efetivamente quando relaciona o que aprende com seus próprios interesses”( ROSSINI, 2003, p.11). Assim, ao professor, cabe inovar o aprendizado, excluindo o trabalho regido pela didática tradicional usual pela grande maioria dos professores. Desta forma, uma das opções de trabalhar efetivamente a criatividade e imaginação das crianças é trabalhar com a leitura nesta faixa etária, explorá-la de forma lúdica, pois assim se tornará uma ferramenta pedagógica importante e eficaz com grande responsabilidade no desenvolvimento. Segundo Freire (2006), o primeiro mundo se dá na infância e é o mundo das atividades perspectivas, das primeiras leituras. Desde o nascimento, um bebê já entra em contato com o mundo da leitura, é o mundo simbólico, formado a partir do que ele vê e passa a identificar, como placas, embalagens, rótulos, que de acordo com Bamberger (2002): A criança entra em contato com a linguagem das gravuras antes da linguagem das letras. Uma vez que ela já aprendeu a entender o significado das figuras, é necessário que o material de leitura inicial as contenha em grande número. As ilustrações exercem uma atração redobrada sobre os principiantes e os maus leitores: elas ornamentam o texto, estimulam o interesse e dividem o livro de modo que a criança possa virar as páginas com frequência e ter a impressão de estar lendo depressa. As gravuras ajudam a tornar o texto compreensível. (BAMBERGER; RICHARD, 2002, p.50) O aprendizado, o conhecimento adquirido pelo
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ser humano, com o passar do tempo é uma forma de linguagem. A leitura, por sua vez, é um caminho direto de comunicação entre os sujeitos, de um indivíduo interagir com outro. Assim, os diferentes tipos de leitura que envolve diversos tipos de linguagem, como a visual, a oral, a escrita, a olfativa, entre tantas outras, enfim, a linguagem é uma leitura, pois deve haver uma interpretação, um significado, um entendimento, e, portanto, uma leitura (CARVALHO, 1997). Na escola, a leitura deve ser incentivada para que se construa o prazer de ler. Para Zilberman (1988, p.16) é a escola “que conduz ao ato de ler”. Desta forma, segundo a autora, o docente deve saber ler utilizando-se desses diversos instrumentos. O professor tem papel fundamental como mediador entre o aluno leitor e a leitura. Para tanto, deveria ser integrado ao seu curso de formação acadêmica, a imersão à leitura na Educação Infantil. Neste nível educacional é de onde parte a iniciação, o gosto e o prazer pela leitura. Contudo, a formação docente é marcada pelo escasso envolvimento do professor com a leitura. Fato esse corroborado por Silva (1993, p. 38 e 39) quando menciona a efetiva necessidade de mudança ao encaminhamento da leitura às escolas. Segundo o autor, torna-se premente uma reformulação da pedagogia da leitura, pois os professores, muitas vezes, imitam seus pares, por não reconhecerem a real necessidade de sua sala de aula, de seus alunos. Uma reviravolta total na formação acadêmica pedagógica, bem como em sua formação pedagógica continuada deverão ser feitas a partir de uma reflexão, questionamentos pessoais sobre seu papel como professor e na sociedade, o que implicará diretamente no aluno crítico que formará. A formação de um aluno leitor depende da integração da instituição educacional como um todo. A partir da integração de todos os servidores da instituição, não só do professor, e da família é
que obteremos um sujeito leitor. A frequência à biblioteca da escola ou bibliotecas públicas dá significado efetivo aos sujeitos leitores. O ato de ler está ligado diretamente à associação do seu cotidiano ou de sua imaginação à leitura. Na Educação Infantil trabalha-se muito com os diferentes tipos de linguagem, daí a “viagem” com a imaginação, sentimentos, e fundamentalmente a interatividade com a leitura. As diversas técnicas de leitura como o desenho, encenação/dramatização de histórias, rodas de conversa são um incentivo à leitura, por isso também é importante que o professor conheça as preferências literárias correspondentes à faixa etária dos seus alunos. Deste modo, a criança é inserida gradativamente ao universo letrado desenvolvendo as competências linguísticas básicas como: falar, ouvir, escrever e ler. (BRASIL, 1998, v. 3, p. 117). Bamberger (2002), reitera a importância de se conhecer as preferências literárias de acordo com as faixas etárias e a dividiu em 5 fases, sendo que a primeira fase, a seguir, refere-se à educação infantil: 1ª - fase - Idade dos livros de gravura e dos versos infantis (de 2 a 5/6 anos) – a criança faz pouca distinção entre o mundo interior e o exterior, é a idade do pensamento mágico. Os livros de gravuras ajudam quando apresentam objetos simples, sozinhos, retirados do meio em que ela vive; o seu primeiro interesse pelo conhecimento é satisfeito pelo mais simples dos livros de gravuras. A criança se interessa mais pelas cenas isoladas do que pelo enredo da história e gosta dos versos infantis por causa do ritmo. As brincadeiras com os livros de gravuras são importantes para incentivá-la a buscar prazer no contato com o livro e poderão ser observados sinais de independência e desafio em que isso se
constitui. (BAMBERGER, 2002) O contar histórias aos alunos, a interpretação dessas histórias ouvida pelos mesmos, o desenhar como forma de entendimento, todos esses recursos são fundamentais para a apreciação pela leitura. Entretanto, vale ressaltar que o ato da leitura propriamente dita, deve-se também, ao ato de a criança imitar seus pais e familiares, quando estes possuem tal hábito e prática, assim como na escola quando a criança é estimulada. Contudo, acaba-se afastando a criança da leitura quando se é imposto o ato de ler didatizando tal prática (Kramer e Souza, 1996). Na maioria das escolas, e porque não dizer nas universidades, a leitura é obrigatória para a execução de trabalhos e avaliações. Para Bamberger (2002), a motivação é o primeiro passo para despertar o gosto pela leitura. Determinados tipos de leitura exigidos pelas instituições acabam denegrindo com o real propósito da leitura, exterminando assim, conforme Brandão (2011), a leitura por prazer e não práticas preparatórias descontextualizadas e repetitivas, que não parte do conhecimento da criança. Da experiência em sala de aula como docente, não podemos negar que há um tempo mágico entre as idades de 3 a 5 anos quando as crianças se expandem além da comunicação verbal e começam também a desenvolver habilidades de linguagem escrita. É uma transformação incrível. Crianças muito pequenas podem identificar letras e ouvi- las. Aprender a ler e escrever abre oportunidades ilimitadas para as crianças, dando-lhes uma maneira inteiramente nova de se comunicar, expandir sua imaginação e aprender novas informações. Além disso, se as crianças aprenderem a gostar de ler, elas desenvolvem mais habilidades de leitura por conta própria e não a encaram como INEQ - Educação integral
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tarefa árdua e/ou difícil de evitar. A leitura desenvolve e desperta na criança forma de agir, viver, criar, construindo, assim valores éticos, morais, tornando-os cidadãos ativos, críticos e participativos na sociedade. Neste processo de gosto pela leitura, a função dos pais junto a seus filhos é de participação, colaboração e integração. De acordo com Rubim (2015): A Academia Americana de Pediatria recomenda aos médicos que orientem os pais a lerem para os seus filhos. Desde o nascimento, a superestimulação tem se tornado uma constante em casa e invadido o espaço escolar. Livros no banho e e-books são elementos cuja proposta é desencadear o gosto pela leitura logo cedo. (RUBIM, 2015) Segunda a autora, os pais não devem forçar demais os filhos quando estão aprendendo a ler. Contudo, os pais podem reservar certo período para leitura, elaborando tarefas prazerosas que estimulem a leitura, mas com todo cuidado de não tornar estas tarefas onerosas. Cabe aos pais avaliar a receptividade das crianças à leitura e responder apropriadamente. Da experiência docente, sabemos que embora seja bom tentar motivar as crianças a se interessarem por atividades importantes como a leitura, seu entusiasmo por essas atividades precisa ser mantido o mais genuíno e motivado internamente possível. O professor deve orientar o aluno no desenvolvimento de estratégias de leitura Kleiman (2004, p.9), utilizando estratégias pedagógicas adequadas que tenham o intuito de estimular e despertar o interesse dos alunos pela leitura e conscientizando-os da importância do ato de ler para sua vida futura.
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Mesmo com o papel da escola e do professor com a responsabilidade de desenvolver a leitura na vida das crianças, os pais não podem se isentar da função que eles têm nesse processo de estímulo da leitura, pois esse processo é despertado em casa, no convívio familiar, nos primeiros contatos da criança. Os pais que têm preocupações sobre as habilidades de leitura ou escrita de seus filhos devem conversar com os respectivos professores em busca de apoio e ideias sobre como ajudar. As crianças que resistem à leitura ou à escrita, mesmo depois de a sua visão e audição terem sido testadas e corrigidas (se necessário), podem ter uma dificuldade de aprendizagem. Testes realizados por um psicólogo adequadamente treinado podem ser necessários para identificar a origem do mau desempenho escolar de uma criança, em particular. Ter uma dificuldade de aprendizagem não significa que uma criança não seja inteligente. O que os torna diferentes é que seus cérebros simplesmente processam informações escritas ou faladas de maneira desigual das outras crianças. Como resultado, essas crianças podem se beneficiar de estratégias de ensino específicas não dominantes e/ou ambientes de sala de aulas especiais que são adaptados especificamente e de maneira exclusiva para ajudá-las nesse processo. É importante que os pais, ao perceberem qualquer dificuldade em seus filhos, conversem com o corpo docente e com o psicólogo da escola para mais informações. CONSIDERAÇÕES FINAIS Durante a realização desta pesquisa, foi possível observar que a Educação Infantil percorreu uma longa trajetória para chegar à modalidade como é apresentada atualmente e esteve muito ligada ao atendimento dos ideais de pro-
gresso do país. No entanto, a modernização e as mudanças da sociedade foram traçando novos perfis para a educação dessa faixa etária. Diante da importância da escolaridade nessa modalidade, várias propostas foram incorporadas para atendimento à especificidade deste atendimento educacional. Porém, atualmente ainda há uma necessidade de alteração nas práticas pedagógicas para atender a essa demanda, o que sugere uma formação mais efetiva dos profissionais de ensino. Se considerarmos que a educação infantil é a base de sustentabilidade da criança na escola, é o primeiro contato que a criança tem com o mundo mágico do aprender, e nessa fase o professor e toda a equipe pedagógica precisa preparar o ambiente de tal modo que a criança se sinta bem, por isso tão relevante a formação de um bom profissional. É possível perceber que, embora tão importante para o desenvolvimento da aprendizagem, muitas escolas ainda não parecem se conscientizar disso. A maior dificuldade, no entanto, é a falta de entendimento sobre esse processo e a necessidade de capacitação profissional, além da infraestrutura adequada para que se tenha um processo realizado de forma correta. Alcançar os objetivos da prática educativa requer mudanças nas concepções, nas atitudes e no envolvimento de todo o quadro docente e, principalmente das instituições governamentais, em âmbito de políticas sociais e econômicas, fazendo com que a realidade do princípio da educação seja, realmente, responsabilidade de todos. Os desafios do professor para trabalhar o contexto dos alunos da educação infantil não é algo complexo, nem impossível. No momento em que esses professores se capacitarem para atuar, ou seja, lecionar para esses alunos e compreenderem como se promove um apren-
dizado efetivo, seus limites serão vencidos pelo novo e novas alternativas didáticas surgirão para que o desempenho do seu alunado venha a ser mais satisfatório, superando com a utilização de novas metodologias de ensino. Cada indivíduo, cada ser humano é um sujeito responsável pelo ato que pratica. Sendo assim, se o professor e a família são exemplos em sala de aula e em casa, consequentemente, com relação ao ato da leitura, seu estímulo e incentivo, o sujeito leitor responderá à altura de forma significativa e particular. O ato de educar é a conscientização pelas suas atitudes, a responsabilidade por suas condutas. A união da criança, quando está na Educação Infantil, à leitura é tornar o aprendizado prazeroso, de forma natural e significativa. Assim como foi dito, ressalta-se a importância do ilustrar, desenhar não só para os olhos, mas com os olhos algo vivido, lido, e consequentemente sentido, pois possui um significado. A dramatização como consequência de algo lido e vivido, tem profundos ensinamentos, pois reaviva toda leitura da criança frente ao significado obtido. É um aprendizado constante de algo sentido. Vale salientar que toda criança já é um sujeito leitor antes mesmo de conhecer as primeiras letras do alfabeto, pois tem contato, sob diversas óticas, com as palavras, com a linguagem, enfim, com a leitura, como foi dito. A ausência de circunstâncias favoráveis em que o docente se encontra atualmente como a falta de infraestrutura, os baixos salários, as péssimas condições em que se deparam os professores, além da falta de preparo, muitas vezes, são um reflexo que vão de encontro ao não leitor, pois este é um resultado de toda essa ineficiência acometida. Outrossim, cada indivíduo necessita estar diante das coisas que lhe interessa, que lhe traga prazer, um significado e não apenas ler por mera obrigação. Quando a escola, o sistema educacional assumir e demonstrar INEQ - Educação integral
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esse papel positivo à criança, indivíduo, aluno leitor, não mais haverá o desafio e a não satisfação à leitura, pois estes encontraram o verdadeiro significado e razão para ler. REFERÊNCIAS BAMBERGER, Richard. Como incentivar o hábito de leitura. 7. Ed. São Paulo: Editora Ática, 2002. BAPTISTA, Monica Correia. A linguagem escrita e o direito à educação na primeira infância. In: Seminário Nacional: currículo e movimento, 1., 2010, Belo Horizonte. Anais...Belo Horizonte, Secretaria de Educação Básica, 2010. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index. php?option=com_docman&view=download&alias=715 9-2-7-linguagem-escrita- direito-educacao-monica-correia&category_slug=dezembro- 2010-pdf&Itemid=30192>. Acesso em: 4 nov. 2020. BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi; LEAL, Telma. F. Alfabetizar e letrar na Educação Infantil: o que isso significa? In. BRANDÃO, A. C. P.; ROSA, E. C. de S. (Org.). Ler e escrever na educação infantil: discutindo práticas pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica, 2011. BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017. Disponível em:<http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_ 20dez_site.pdf>. Acesso em: 02 nov. 2017. ______. LEI N 9394/96. Diretrizes e Bases da Educação Nacional. LDB. Setembro de 1996. Editora do Brasil. Brasília, DF: MEC,1998. ______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (v. 3). Brasília: MEC/ SEF, 1998. CARVALHO, Neuza Ceciliato de. Proleitura. São Paulo: Unesp, Uem, Uel. Agosto/97. Ano 4, n. 15. FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 47. ed. São Paulo: Cortez, 2006.
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SER NEGRO E CRIANÇA: UM OLHAR NEGRO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Jane Francisca Queiroz Almeida¹ RESUMO
Algumas memórias que tenho quando criança nascida na região do nordeste do Brasil, especificamente na cidade de Salvador (Bahia), mas
ido para São Paulo buscar melhorias de vida para meus dois irmãos e pra mim, e o pai vivia em outro bairro e já estavam separados em toda minha infância, era tão pequena que não me recordava dessa partida, mas ainda lembro-me bem das inúmeras ligações nos orelhões de ficha para diminuir um pouco da saudade, e das visitas periódicas do meu pai a casa da minha avó para saber como estávamos e saímos para irmos ao mercado comprar alimentos. Quando pequena lembro bem que estudei a educação infantil, a alfabetização, e o início do ensino fundamental em escolas particulares do bairro em que eu residia, o término do ensino fundamental ocorreu em escolas públicas de salvador com o último ano em São Paulo e o ensino médio todo na rede pública da zona norte de São Paulo, mais precisa na Freguesia do Ó. Recordo-me de momentos na minha educação infantil na escola particular de Salvador, de estar muito próximo ao meu irmão mais velho, sem muito entender o quanto, mesmo criança, me sentia estranha naquela construção gigantesca e com crianças e adultos que não me sentia próxima, sentia carinho por professores e algumas funcionárias da escola, ainda me recordo da professora
preciso no bairro da Boca do Rio. Filha de pais separados e morando com a avó, pois a mãe tinha
Aldalice que muitas vezes me cobrou muito em relações as atividades e propostas da escola.
Apresentar para a sociedade como uma criança se enxerga em meio a esse mundo que trata sua história como inadequada e procura diariamente modificar e extingui-la, deixando ocultos seus saberes e impossibilitando sua representatividade em um contexto social. Palavra-chave: Direitos; Representatividade; Humano; Igualdade. ABSTRACT Presenting to a society like a child sees itself in the midst of this world that treats is history as inadequate and seeks to modify and extinguish it daily, hiding its knowledge and making it impossible to represent it in a social context. Keyword: Rights; Representativeness; Human; Equality. INTRODUÇÃO
1 - Graduada em Pedagogia na Universidade Nove de Julho e Graduada em Artes Visuais pela Faculdade Mozarteum de São Paulo, Pós-Graduada em Psicomotricidade pela Escola Superior de Administração, e Pós Lato Sensu em Práticas Educativas: Criatividade, Ludicidade e Jogos pela Faculdade de Ciências e Tecnologia Paulistana. Atua na educação infantil há mais de 15 anos em São Paulo e a 6 anos na Prefeitura Municipal de São Paulo no cargo de Professora de Educação Infantil e Fundamental I.
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No intervalo não me lembro de unir a grupos, mas curtia muito nos brinquedos, mas a melhor brincadeira era no corredor e no quintal de casa com meus primos e irmãos, meus brinquedos eram bonecas de tonalidade clara, "branca" a maioria com pouco cabelo até ganhar uma Barbie que era a boneca mais desejada por mim e que me inspirava ser assim quando crescesse; nos comerciais de TV da época a Barbie era a boneca mais sensacional, mas, mesmo assim, eu dividia meu tempo com brincadeiras de quintal (futebol, vôlei, comidinha de areia e plantas, cabana com madeira velha, cabana com lençol, subidas no pé de goiaba, brincava baleô). A interação com os outros e com a cultura de cada criança reconstrói para si as qualidades humanas presentes nessas interações, como a percepção, a memória, a fala, o pensamento, a imaginação, os valores, os sentimentos, a autodisciplina e a sua própria identidade, à medida que se relaciona com as pessoas e os hábitos e costumes, com a língua e outras linguagens, com o conhecimento acumulado, isso também se dá na medida em que se relaciona com os objetos. As brincadeiras e interações devem compor o currículo e possibilitar a realização de projetos pedagógicos que envolvam as diversas linguagens presentes nas experiências, sem separá-las, pois não é desse modo que as crianças aprendem, mas enquanto vivenciam uma situação de forma integral. As crianças desde o seu nascimento fazem parte ativa do próprio processo de crescimento, nas suas interações colocam-se em relação com outras pessoas, objetos, linguagens e os modos de funcionamento da sua cultura e vão se constituindo subjetivamente como seres humanos pertencentes a territórios, estejam elas em qual nível e idade na escola precisam
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ter garantido a oferta de tempo para as crianças viverem, realizarem as suas brincadeiras, constituírem seus gestos e suas expressões, desenvolvendo as suas múltiplas linguagens. O exercício constante de se colocar no lugar da criança, compreendendo o seu ponto de vista de forma ética, respeitosa, acolhedora e sem julgamentos é cuidado, educam-se pela força do exemplo, das atitudes respeitosas, éticas e democráticas exercidas pelo adulto na relação às crianças. Cuida-se acolhendo, ouvindo, encorajando, apoiando no sentido de desenvolver o aprendizado de pensar e agir, de cuidar de si, do outro e do ambiente. Em um determinado momento da minha infância numa outra escola particular sentia grande pressão, já estava no início da alfabetização e aumentava cada vez mais esse vazio, éramos poucas crianças na sala de aula, mas eu me via única negra de cabelo crespo com tranças e tinha somente um menino negro, mesmo assim não éramos próximos, pois ele gostava muito de brincadeiras sem graças e que faziam com que a turma da sala o intitulasse como "gaiato" (aquele que brinca a todo o momento e faz gracinhas para chamar a atenção), essas brincadeiras me menosprezavam e me faziam sentir vergonha de algo que pra mim era desconhecido tratando-se de uma criança de 5 anos de idade. Eu, no entanto, brincava no intervalo com os brinquedos da escola, mas em sala era mais retraída por me sentir única. A maior parte de minha infância foi com brincadeiras com primos e irmãos e quase nunca com vizinhos e crianças da redondeza. Ao chegar a São Paulo senti na pele o preconceito pela minha forma de expressão com sotaques nordestino, na escola era muitas vezes motivo de chacotas por eles dizerem não en-
tenderem algumas palavras que pra mim eram comuns; além disso, para melhor crescimento do meu cabelo minha mãe resolveu colocar tranças; adorei, era prático e me ajudava muito, pois não sabia como ter cuidados e nem tinha condições financeiras para ir ao cabeleireiro. Algumas meninas não sentavam próximas a mim, dizia que meu cabelo era de plástico, eu sentia muito com essas ofensas. Consideravam-me uma criança muito inteligente e com isso busquei focar nos estudos e assim tirava as maiores notas da sala. Em nenhum momento senti intervenção de professores ou qualquer funcionário da escola para com aquelas agressões diária. É preciso ter compromisso assumido com a equidade, com a inclusão, e com a integralidade dos sujeitos; isso exige que as políticas escolares para a população que têm tido seus direitos historicamente não atendidos, tenham um olhar atento e comprometido com esses sujeitos e seus grupos sociais, atitude fundamental que deve ser completada com a colaboração e implementação de práticas pedagógica, visando romper com as discriminações, os racismos, os preconceitos e propiciar para todos variados modos de convivência. Por vezes saí do sério e até briguei de sair aos tapas com alguns colegas de sala por não suportar as agressões verbais, muitas vezes grupais e muito fortes, que se repetiam por vezes, a direção da escola não tomava grandes atitudes em relações a essas agressões que eram constantes até o fim do ano letivo. No final do ensino médio minhas concepções de escola não eram as melhores, busquei com toda minha força aprender o máximo possível, fiz pouquíssimas amizades e dentre essas os únicos negros da sala, quando tinham o mesmo objetivo em estudar muito e ser visto não
pelas chacotas e sim pela vontade de aprender. Comecei a trabalhar, fiz alguns estágios até conseguir emprego de carteira assinada e buscar melhorias financeiras e de vida, em um determinado momento senti algumas atitudes de alguns chefes de empresas que eu trabalhei pensando que crescimento para mim seria quase impossível. Quando eu trabalhava na empresa de vestuário conheci uma moça que já trabalhava lá há alguns anos e em uma das conversas ela dizia que queria estudar, que não aguentava mais aquele lugar, aí sugeriu uma faculdade que era próximo ao nosso trabalho e que oferecia valores menores no período da manhã, já que trabalhávamos à tarde até a noite; ela já tinha ido fazer a matrícula e eu fui na semana seguinte, ficamos na mesma sala e começamos a cursar pedagogia. No início foi bem difícil o entendimento das matérias por ter ficado uns cinco anos depois do término do ensino médio sem estudar e por estar longe das tecnologias e informações que um curso de graduação oferece. Cursando alguns semestres o ensino me fascinava, o aprendizado sempre me fez sentir alegria, mas o aumento das mensalidades que eram semestrais muitas vezes me tirava o sono, e também manter as cópias das apostilas, livros, materiais para trabalhos, eventos culturais e alimentação me fizeram por algumas vezes repensar se no próximo semestre se eu estaria ali novamente, mas consegui finalizar a graduação sem nenhuma pendência de matéria e com boas notas. Consegui um acordo com a empresa de vestuário e fui dispensada, então, fiz um estágio na brinquedoteca de um posto de saúde por um ano no final da graduação, fiz também, alguns trabalhos em eventos de recreação de festas infantis, praças de entretenimento, até conseINEQ - Educação integral
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guir ser contratada numa escola de educação infantil com crianças de 0 a 4 anos. Foi o maior aprendizado que tive na vida, muito mais proveitoso do que muita teoria na faculdade, a troca com essa nova companheira de trabalho foi enriquecedora para meu profissional e pessoal, por mais de três anos trabalhando nessa escola o aprendizado era recorrente, mas ainda sentia falta de algo que não conseguia distinguir, nessa empresa utilizava-se do fator “merecimento” (puxar o saco do grupo gestor, e muitas vezes levar assuntos do dia a dia para constranger o funcionário para crescimento, isto quando acontecia), pois era muito difícil ver nas outras instituições da mesma associação um grupo gestor que fosse coerente. Trabalhando conheci uma professora negra que usava tranças e que me fez relembra minha infância, a irmã dela tinha um salão de cabeleireiro que não era especializado em cabelos negros mais seu público maior eram os negros, sua mãe fazia tranças maravilhosas exaltando a beleza negra, e que eu fiz por algumas vezes, até sentir que precisava me libertar dessa prisão que era ter o cabelo perfeito para sociedade, da última vez que tirei as tranças resolvi manter meu cabelo ao natural. Não me senti estranha, me senti leve e natural, era como se aquele cabelo que estava em mim se encaixava perfeitamente comigo, e que as outras maneiras que eu tentava deixá-lo arrumado não era parte de mim, era sofrido, caro e desgastante. Eu professora negra de cabelo natural crespo na educação infantil estava dando um novo rumo e sem perceber o quanto para muitos ao meu redor isso iria incomodar. Observar os olhares de surpresa e estranhamento, os múrmuros dos pais e colegas de trabalho em nenhum momento me faziam mal, até gostava dessa movimentação em ralação ao meu cabelo e minha postura.
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Tornei-me ou nasci formadora um pouco por acaso. Esses acasos que com o tempo, e sem a gente perceber, ganham espaço, despertam o desejo, provocam mudanças e se transformam em casos definitivos. Com o tempo, descobri que ser formador não é uma tarefa fácil. O ato de formar é complexo, nem sempre linear ou totalmente prescritivo. Constituir-se formador é processual, o que significa, entre outras coisas, tempo, investimento pessoal e disponibilidade para rever-se. Aprender novas formas de ensinar pressupõe tempo para testá-las, avaliar seus efeitos, realizar ajustes, reavaliá-las. É preciso ter a oportunidade de trabalhar com seus pares, dentro e fora da escola, partilhar e compartilhar, além de ideias e conhecimentos, os sucessos e as dificuldades desse ofício especializado em transformar vidas. Minha angustia maior era permanecer nesse contexto profissional, assim quando fui dispensada da escola que trabalhava passei a me contestar se gostaria de passar por essa situação novamente em outras instituições, mesmo não estando de acordo, fui trabalhar numa outra escola, com algumas características parecidas com a gestão anterior, tive a informação que se iniciava um curso preparatório para o concurso público na vaga de professor, busquei empréstimo de valores para custear e assim fui buscar essa aprendizagem. O curso muito produtivo e também muito cansativo, pois tomava toda boa parte da minha noite, sendo que no dia seguinte acordaria muito cedo para trabalhar. Com todos os contratempos e percalços terminei o curso e fiz a prova, passei entres os primeiros quatrocentos na lista de cotas. Logo na sequência a publicação dos resultados o grande chamado aconteceu, me trazendo um misto de sentimentos, e pensamentos futuros. Porem com uma inquietude tamanha e cheia de esperança para esse outro
cenário da minha vida, que antes seria impossibilitado sem as políticas de cotas. Direito Constitucional a reserva de vagas para negros em concursos públicos. Constitucionalidade da Lei n. 12.990/2014. “É constitucional a Lei n.12.990/2014, que reserva a pessoas negras 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal direta e indireta, por três fundamentos. Primeiro lugar, a “desequiparação” promovida pela política de ação afirmativa em questão está em consonância com o princípio da isonomia, ela se funda na necessidade de superar o racismo estrutural e institucional ainda existente na sociedade brasileira, e garantir a igualdade material entre os cidadãos, por meio da distribuição mais equitativa de bens sociais e da promoção do reconhecimento da população afrodescendente. Segundo lugar, não há violação aos princípios do concurso público e da eficiência, a reserva de vagas para negros não os isenta da aprovação no concurso público. Como qualquer outro candidato, o beneficiário da política deve alcançar a nota necessária para que seja considerado apto a exercer, de forma adequada e eficiente, o cargo em questão. Além disso, a incorporação do fator “raça” como critério de seleção, em vez de afetar o princípio da eficiência, contribui para sua realização em maior extensão, criando uma burocracia representativa, capaz de garantir que os pontos de vista e interesses de toda a população sejam considerados na tomada de decisões estatais. Terceiro lugar, a medida observa o princípio da proporcionalidade em sua tríplice dimensão, a existência de uma política de cotas para o acesso de negros à educação superior não torna a reserva de vagas nos quadros da administração pública desnecessária ou desproporcional em sen-
tido estrito. Isso porque: nem todos os cargos e empregos públicos exigem curso superior; ainda quando haja essa exigência, os beneficiários da ação afirmativa no serviço público podem não ter sido beneficiários das cotas nas universidades públicas; e mesmo que o concorrente tenha ingressado em curso de ensino superior por meio de cotas, há outros fatores que impedem os negros de competir em pé de igualdade nos concursos públicos, justificando a política de ação afirmativa instituída pela Lei n° 12.990/2014.2”. Sai desta escola e fui para outra com mesma postura e convicção que as crianças da região seriam as principais afetadas na sua representatividade. No ano de 2015 que iniciei meu trabalho como professora da rede municipal de São Paulo na educação infantil, mas certo numa emei (escola municipal d educação infantil) volta e meia sentia que ainda não tinha me entendido por completo, até que após alguns meses de aula uma criança, minha aluna, fez a seguinte pergunta: - Por que você vem pra escola com seu cabelo bagunçado? Faz prancha para ficar bonito. Respondi: - Meu cabelo não é bagunçado, ele nasce assim, o seu nasce de forma diferente do meu, usar prancha deixa o cabelo bonito, mas gosto meu natural. Mesmo com essa resposta fiquei por dias a pensar nesta pergunta e como muitas crianças e pessoas tinham esse mesmo questionamento só não tinham coragem de perguntar, e o quanto era importante essa valorização. A lei que declara extinta a escravidão de pessoas negras e afro descentes não foi o suficiente para libertar das amarras impostas por séculos que impedem que uma ideia antiga e arcaiINEQ - Educação integral
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ca possa transpassar por muito tempo. Lei número 3.353, de 13 de maio de 1888, declara extinta a escravidão no Brasil. A Imperial Regente em nome de sua mãe da majestade o imperador, o senhor D. Pedro II, faz saber a todos os súditos do império que a assembleia geral decretou e ela sancionou a lei. Neste mesmo ano busquei trazer para toda turma que eu lecionava um pouco da história da chegada dos negros da África ao Brasil, com aspectos importantes como seu trajeto, o quanto a nossa vida tem influência diária, e o principal, apresentação dessa miscigenação que pra muitos é desconhecida e para muitos ignorada, a turma apresentou bastante interessada em ouvir sua própria história. Fui apresentando essa história em forma de projeto, desde brincadeiras infantis, culinárias, histórias infantis, produção de boneca abayome, identidade entre outros temas, as histórias infantis eram apresentadas também para as crianças de outra sala possibilitando essa disseminação de conhecimento, pois o que eu mais queria naquele momento era provocar essas crianças e famílias. O grupo escolar em horários de projetos relatava o quanto era produtivo essa troca e também a necessidade de aprendizagem da cultura não estudada nos livros didáticos e que só com a lei que começaram a se pensar na inserção do tema mesmo sem apropriação do assunto. Lei 10.639 de 9 de janeiro de 2003. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir
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no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências. Quando percebi que o meu conhecimento, mesmo com busca incessante não seria por completo, continuei em busca de aprendizado da minha história, buscando meu fortalecimento e esclarecimento, para assim poder contagiar as crianças que são as maiores disseminadoras dessas informações. Hoje mais forte e buscando o fortalecimento das crianças vejo o quanto é importante às conversas nos corredores, na escola que estou atualmente não percebo muito o espanto por esse modelo tão comum na comunidade, nos tempos de hoje se vê nas ruas o empoderamento negro que aos poucos está chegando às escolas públicas de educação infantil. Trabalhar na educação infantil com material que levante a autoestima das crianças, produções de livros que ressaltem histórias da cultura afro, brinquedos e brincadeiras que tragam pra elas representatividade e a valorização de suas formas diferenciadas ainda está muito escassa; encontrar pelos meios midiáticos se torna uma busca cansativa, pois o mercado e a mídia ainda não entendem como isso precisa ser produzido, alguns pequenos empresários buscam incansavelmente trazer produtos e materiais nesse tema, mas se encontram sozinhos em meio a uma grande massa que ainda busca esconder e destruir uma nação. CONSIDERAÇÕES FINAIS Conclui se que por um olhar somente meu ainda existe racismo e preconceito de fato em várias vertentes da vida de qualquer ser humano negro e que se ainda for periférico, de sexo fe-
minino e não aceitar os padrões da sociedade essa carga apresenta-se ainda maior pra sua vida e sobrevivência no Brasil, dificultando e também impossibilitando em ter os mesmos direitos e condições de qualquer outra pessoa com características opostas a minha. Entendo que não existe programa nem fórmula para aumentar a oferta de formação continuada nessa temática e não se pode limitar tão somente a cursos esporádicos, deve-se investir na qualidade dos conteúdos, em busca de uma consciência, e principalmente troca de conhecimentos e experiências, para conseguir o fortalecimento e apropria mento do que é seu por matriz. A educação confunde-se com o processo de vida em sociedade, portanto é um método fundamental do progresso e reformas sociais, a instituição educacional como instituição social devendo apresentar a vida presente, uma vida real para o ser humano que socializa com outros ao seu redor. Uma educação progressiva e construtiva, e na sua defesa veemente da escola, encontram-se argumentos para se pensar na contemporaneidade, a educação que se deseja transformadora e emancipadora. É preciso pensar e planejar situações que propiciem a colaboração mútua e a corresponsabilidade, o que remete à importância de se ter clareza dos propósitos educativos e da intencionalidade das ações por parte de todos os sujeitos implicados com o ato educativo, direta e indiretamente. Ainda estamos em um processo lento de consciência mercadológica para nossa apresentação como valoroso e de fato com grandes contribuições ao mercado financeiro, ainda hoje alguns micros empreendedores de diversos ramos buscam incessantemente permanecer a este meio e trazer representatividade aos
seus, as diversas ramificações da cultura afro, trazendo valor e contato direto à cultura possibilitando acesso a esse conhecimento. Ainda estou em busca de aprendizado para saber lidar de maneira mais eficaz na busca de uma sociedade igualitária, novas políticas de pertencimento e fortalecimento, que tragam para essa nova geração representatividade e dignidade, podendo ser atuante e pensante em todas as vertentes de sua história.
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A SAÚDE ALIMENTAR DE ESTUDANTES DA REDE PÚBLICA
Jorge Henrique Silva Bueno¹ RESUMO
ABSTRACT
Este estudo bibliográfico visa abordar a Base Comum Curricular Nacional, assim como os resultados obtidos de pesquisas de análise de populações que abrangem estudantes e docentes das redes de ensino nacional. Com maior foco nessa análise preferiu-se abordarem temas relacionados a saúde dos indivíduos em especial do estado nutricional que pode ser usado como forte preditor do estado de saúde nutricional dos indivíduos. Obesidade, diabetes, hipertensão arterial sistêmica e hipercolesterolemia vem sendo cada vez mais frequentes em populações mais jovens. Os hábitos nutricionais de jovens mostraram-se como precursores do estado de saúde em adultos. Por fim este artigo analisa alguns estudos realizados averiguando o estado nutricional de estudantes de uma escola da rede pública estadual como amostra representativa afim de averiguar seu consumo nutricional e as predisposições para o desenvolvimento de doenças relacionadas aos hábitos nutricionais. Ressaltamos ao final a necessidade da formação continuada dos professores para atualização e reapropriação dos temas de necessidade, especialmente aos que permeiam a saúde dos discentes. Palavras-chave: Estudantes; Escolas públicas; Estado nutricional; Base comum curricular nacional
This bibliographic study aims to address the National Common Curricular Base, as well as the results obtained from population analysis surveys that include students and teachers from national education networks. With a greater focus on this analysis, it was preferred to address issues related to the health of individuals, especially nutritional status, which can be used as a strong predictor of the nutritional health status of individuals. Obesity, diabetes, systemic arterial hypertension and hypercholesterolemia are increasingly common in younger populations. The nutritional habits of young people proved to be precursors of health status in adults. Finally, this article analyzes some studies carried out to investigate the nutritional status of students at a public school in the state as a representative sample in order to ascertain their nutritional consumption and the predispositions for the development of diseases related to nutritional habits. At the end, we emphasize the need for continuing teacher education to update and reappropriate themes of need, especially those that permeate students' health. Key-words: Students; Public schools, Nutritional status; Common national curriculum base
1 - Graduado em Nutrição pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2011). Graduado em Biologia pelas Faculdades Integradas Ariquemes (2018). Graduado em Pedagogia pela Faculdade Paulista São José (2013). Professor de Ensino Fundamental II e Médio na Rede Municipal de Ensino de São Paulo. E-mail: buenojhs@gmail.com
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INTRODUÇAO Tem se tornado rotineiro ouvir relatos de mães e pais preocupados com a saúde de seus filhos em reuniões e encontros do cotidiano escolar. Em muitos casos, esses relatos ficam a margem dos hábitos alimentares dos estudantes. Embora a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e os currículos anteriores abordem temas como alimentação, notam-se dificuldades em se aprofundar no tema por falta de formação específica ou mais aprofundada dos docentes. A profissão do nutricionista está baseada na relação dos seres humanos com os alimentos, deste modo, um dos papeis mais importantes do nutricionista é ser capaz de avaliar o consumo alimentar, tanto em indivíduos como em populações. Existem métodos padronizados para isso, os quais podem ser diversos, questionando hábitos alimentares atuais ou passados. O Questionário Quantitativo de Frequência Alimentar (QQFA) é um instrumento para avaliar o consumo alimentar retrospectivo, sendo na maioria das vezes dos últimos 12 meses. Este método prevê a coleta da frequência de consumo dos alimentos, assim como a quantidade consumida, a partir de uma lista fechada. Tem sido muito utilizado em estudos epidemiológicos que avaliam a relação entre dieta e doença, principalmente em estudos do tipo caso-controle. Sabendo que esses questionários são autoaplicáveis, este trabalho vem propor um acompanhamento mais próximo do consumo de alimentos por partes dos jovens a fim de evitar o surgimento ou agravo de doenças relacionadas a uma má alimentação. 1. REFERENCIAL TEÓRICO A preocupação com a alimentação vem sendo um dos temas mais abordados atualmente pela sociedade cientifica (LIMA, 2007). E diver-
sos pesquisadores vêm mostrando sua importância nas diferentes etapas da vida. Mesmo antes de o indivíduo nascer, precauções devem ser tomadas para que o mesmo aconteça de maneira saudável. O estado nutricional é o ponto de partida, o que inclui o consumo de alimentos. Por isso é necessário observar e acompanhar atentamente a gestante, adequando sua alimentação para que essa possa ter o aporte adequado de todos os nutrientes e ter uma gravidez saudável. Desta forma, podemos apontar como temas a serem abordados em eventos culturais e reuniões de pais e mestres aqueles que permeiam hábitos saudáveis de alimentação, pois a própria legislação brasileira é rica em materiais a serem abordados. Um é a obrigatoriedade de adição de ácido fólico e ferro em farinhas de trigo e de milho descrita na RDC 344/02 obrigando aos fabricantes adicionarem tal elemento em seu produto final, pois a gestante tem a necessidade destes dois minerais aumentada para formação correta do sistema nervoso do feto. A suplementação de ácido fólico é recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e comprovada por diversos pesquisadores, como Santos e Pereira (2007), como principal forma de prevenção para boa formação do tubo neural do feto durante sua gestação. Uma revisão realizada por Scholl e Hediger (1994), mostrou riscos que a anemia traz para a gestante. Complicações como aborto, nascimento precoce, baixo peso do recém-nascido e complicações ao nascer foram relacionadas à prevalência de anemia nessas gestantes, riscos que poderiam ser minimizados com uma escolha alimentar adequada. Todos esses temas que podem ser levados a frente em pautas de reuniões, uma vez que são de interesse da comunidade escolar e mais tarde, essas crianças possuem grandes chances de serem atenINEQ - Educação integral
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didos pela rede de ensino e saúde, além disso, trazem benefícios de prevenção e redução da mortalidade infantil (JOMORI et al., 2008). Ao nascer, programas de incentivo ao aleitamento materno exclusivo até os seis meses, preconizado pela OMS e o Ministério da Saúde (MS) evitam alergias alimentares e complicações com o trato gástrico (SILVA, 2009). O Ministério da Saúde (2002) publicou um Guia Alimentar para crianças menores de 2 anos, que relaciona os alimentos aos nutrientes necessários nessa fase da vida e trazem benefícios quando inseridos em momentos oportunos ou trazendo complicações se utilizados de forma inadequada. A adequação do consumo de alimentos para crianças fazendo uso desses materiais poderiam também ser abordados e discutidos com os pais, nas unidades de educação infantil reduzindo a ocorrência de moléstias (MONTE; GIUGLIAN, 2004). Pesquisas realizadas nas últimas décadas vêm demonstrando um decréscimo na prevalência da desnutrição entre crianças e adolescentes e aumento da obesidade, demonstrando um período de transição nutricional, caracterizado por alterações na alimentação, principalmente pelo aumento do consumo de gorduras e redução na ingestão de carboidratos complexos e fibras. Observações como essa, demonstram a necessidade de novas políticas de ensino, que não acompanharam a desenvolvimento socio-industrial. Pois a disponibilidade de alimentos industrializado, marketing de alimentos apresentaram um grande salto nas últimas décadas e vimos que o ensino ou as políticas públicas não conseguiram acompanhar com a educação nutricional das comunidades brasileiras (WHO, 1997). Autores descrevem ainda que a influência alimentar dos jovens ocorre por influências da mídia, convívio social com amigos e familia-
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res além da herança de hábitos observados da família (TORAL et al., 2007). Demais estudos esclarecem ainda que os fatores interferem no consumo alimentar neste período da vida, como os socioeconômicos, situação financeira familiar, quantidade de refeições que realizam fora de casa que acarretam no aumento do consumo de alimentos semi preparados (GARCIA et al., 2003). Assim, muitos desses costumem são mantidos na vida adulta, observando ainda que nossa sociedade tem demonstrado que a constituição de família, casamento e filhos, vem ocorrendo com idades cada vez mais avançadas, jovens adultos acabam por manter por maior tempo e os transmitir aos seus descendentes (TORAL et al, 2007). A problemática decorrente do envelhecimento, no que diz respeito à saúde, tende a ser a mesma que se verifica nos países desenvolvidos (doenças crônicas requerendo cuidados continuados e custosos), agravada pelo fato de persistirem ao mesmo tempo de outros problemas, como desnutrição e doenças infecciosas (RAMOS; VERAS; KALACHE, 1987). A substituição das causas de morte por doenças transmissíveis, como as infecciosas e parasitárias, pelas não transmissíveis, como hipertensão, diabetes, câncer, cardiovasculares e osteoporose, tem ocasionado uma mudança no quadro etário brasileiro, deslocando a maior taxa de morbidade e mortalidade dos jovens para os idosos (RIBEIRO, 1993). Apesar de ser um processo natural, o envelhecimento submete o organismo a diversas alterações anatômicas e funcionais, com repercussões nas condições de saúde e no estado nutricional do idoso. Sabe-se que o processo de envelhecimento coincide com uma redução progressiva dos tecidos ativos do organismo, perda da sua capacidade funcional e modificação das funções metabólicas (MACHADO et al., 2006). O envelhecimento é acompanhado
por uma variedade de mudanças psicológicas, econômicas, sociais e que também podem afetar desfavoravelmente o estado nutricional, interferindo no apetite, consumo e absorção de nutrientes, principalmente de proteínas e micronutrientes (MAGNONI; CASTILHO, 2003). A avaliação denominada estado nutricional expressa o grau no qual as necessidades fisiológicas por nutrientes estão sendo alcançadas, para manter a composição e funções adequadas do organismo, resultando do equilíbrio entre ingestão e necessidade de nutrientes. As alterações do estado nutricional contribuem para o aumento da morbimortalidade. Assim sendo, a desnutrição de algum ou vários nutrientes específicos predispõe a uma série de complicações graves que comprometem as funções fisiológicas do organismo (ACUNA; CRUZ, 2004). Para todo o desenvolvimento humano, as Dietary Reference Intakes (DRI) trazem recomendações de energia, macro e micro nutrientes baseados em estudos populacionais realizados ao longo dos anos e possuem recomendações específicas para todas as idades, recém nascidos, crianças, jovens e adultos. Slater e colaboradores (2004) salientam a importância de se identificar o consumo de nutrientes estabelecidos pelas recomendações das DRIs para o desenvolvimento humano, evitando o surgimento de doenças e aprimorando a saúde dos indivíduos. No contexto nutricional, estimar a ingestão diária de nutrientes em indivíduos é uma tarefa essencial, pois este dado pode relatar riscos epidemiológicos que podem ser utilizados para propor intervenções a curto, médio ou longo prazo, em esfera populacional e individual (VOCI, 2008). A Base Comum Curricular Nacional prevê em seu currículo de ciências o desenvolvimento de habilidades que possibilitem os estudantes a análise e compreensão do consumo desses
nutrientes. Baseando-se especialmente nos estudos das tabelas nutricionais e rótulos presentes nas embalagens de produtos alimentícios. Trata-se ainda de habilidades multidisciplinares, uma vez que envolvem a leitura e interpretação de receitas, rótulos, tabelas, gráficos além dos cálculos que refletem o consumo feito pelo indivíduo. Também vale ressaltar que o estudo da sazonalidade e os locais de produção que envolvem ainda mais disciplinas do currículo, auxiliam nas escolhas alimentares além de administrar melhor os custos no momento de aquisição (VIEBIG, 2004). Os métodos que os nutricionistas utilizam para avaliar o consumo alimentar em atendimentos são denominados inquéritos alimentares. São questionários ou instrumentos que auxiliam a identificar e quantificar alimentos e suas quantidades ingeridas em determinados períodos. O Questionário Quantitativo de Frequência Alimentar (QQFA) é um método de inquérito alimentar bastante utilizado que tem por objetivo avaliar períodos mais longos de consumo, através de uma lista de alimentos e porções pré-estabelecidos a partir de estudos e metodologias específicas para seu desenvolvimento. Nele são listados os alimentos e porções mais frequentes na alimentação das pessoas. É em geral uma ferramenta de autopreenchimento. Pode ser utilizado em estudos epidemiológicos para avaliação do consumo alimentar de populações, pois tem baixo custo e facilidade de aplicação. Ele estima a ingestão habitual de um sujeito, sendo que esse questionário possui versões adaptadas para as mais diversas populações e idades, sendo possível estimar o consumo de diversos grupos de alimentos, o que auxilia no planejamento de uma intervenção nutricional, que podem por exemplo, virem através de projetos socioeducativos interdisciplinares no contexto escolar, com desenvolvimento de grupos de estudo, rodas de conversa, desenvolvimento de horticultura escolar, a INEQ - Educação integral
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afim de trazerem aos alunos contato e prazer em lidar com alimentos in natura, sendo que todas essas intervenções e estudos podem transcender o limites escolares e darem origem a projetos e intervenções de toda comunidade escolar (VIEBIG, 2004). O uso da tecnologia pode ajudar a encurtar distâncias, pois os novos jovens já nascem em meio à informatização e estão habituados a lidar com a tecnologia habilmente, como explica Delaunay, 2008. A maneira como tudo se difunde pela internet é impressionantemente rápida, sendo que o número de usuários que buscam por diversão, estudos e entretenimento cresce a cada dia, tornando propício abordá-los em seu “habitat”. O trabalho abaixo apresentado como panorama de nossa discussão final, ocorreu por meio presencial e através da internet, de forma a verificar a participação e fidedignidade dos dados, assim como uma nova ferramenta que pode reduzir custos e encurtar distâncias.
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2. DISCUSSÃO Em trabalho realizado pelo por Bueno, 2010 o pesquisador visitou duas escolas e averiguou a situação alimentar de estudantes de escolas sendo uma da rede pública estadual de São Paulo e outra da rede particular de ensino regular. A escola estadual fazia parte do local de maior distância do centro de São Paulo – SP distrito de Cipó, e a unidade escolar particular escolhida foi a mais próxima localizada do centro da cidade, distrito de Higienópolis/Sé. Foram visitadas oito salas, sendo quatro da escola pública e quatro da escola particular. Em sua coleta de dados ainda o pesquisador observou que a adesão da escola particular foi baixa durante a devolutiva da pesquisa, sendo assim, eles foram excluídos da pesquisa e os dados abaixo apresentados de acordo com seu artigo, abordam apenas estudantes da rede pública de ensino. Foram selecionados estudantes do ensino fundamental II e médio, entre 11 e 17 anos.
O pesquisador ressalta a alta ingestão de carboidratos, que em suas ressalvas, ele aponta que mantido tais comportamentos, eles tornam-se do grupo de risco de desenvolvimento de diabetes e obesidade. O pesquisador também apontou que o consumo de todos os micronutrientes, as vitaminas, apenas a vitamina C obteve média adequada de consumo. Valores como de sódio, muito preocupantes em nossa atual sociedade já que a hipertensão arterial sistêmica, relacionada a doenças cardiovasculares já são as que mais ceifam vidas no Brasil. Por fim, dos dados mais relevantes, existe um baixo consumo apontado na pesquisa do microelemento cálcio, dados corroborados por outros pesquisadores que acabam por acarretar problemas como osteoporose na vida adulta especialmente para aqueles que já são predispostos CONSIDERAÇÕES FINAIS O estado nutricional e o baixo aproveitamento das propostas curriculares nacionais apresentam-se deficientes no que tange manter um estado nutricional adequado dos estudantes. Demonstra-se então a necessidade de maior atenção ao currículo proposto pela Base Comum Nacional Curricular e verificar se ela trará a adequação necessária do estado nutricional dos estudantes da rede pública. Valendo sempre ressaltar a necessidade de formação contínua dos docentes em relação ao currículo, tendo em vista a constante atualização de pesquisas e recomendação da Organização Mundial da Saúde assim como o Ministério da Saúde. REFERÊNCIAS BUENO, JHS. O uso da internet para aplicação de um questionário de frequencia alimentar. Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2010. CADE, J; THOMPSON, R; BURLEY, V; WARM D. Development, validation and utilization of food-frequency-questionnaires.
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A RELEVÂNCIA DA AVALIAÇÃO FORMATIVA NA EDUCAÇÃO DO SÉCULO XXI
Marcos Alves da Silva¹ INTRODUÇÃO “Uma avaliação também tem que ser avaliada” (Ocimar Alavarse²) Não há dúvidas que estamos a passar por inúmeras mudanças nesse iniciar-se de século, sejam essas mudanças no âmbito da vida social, do trabalho ou dos relacionamentos. Assim sendo, tais mudanças, as quais são impulsionadas por novas demandas da sociedade, também chegaram à escola, ou seja, ao universo formal do ensino-aprendizagem. Mudanças que têm por solicitação novos olhares acerca do que é ensinar e aprender, do que é uma avaliação ou porque avaliar. Essas novas demandas estão reconhecidas na Lei de Diretrizes e bases da Educação Nacional, por exemplo, no Art. 24, Parágrafo V, pois: A verificação do rendimento escolar observará os seguintes critérios: a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais³; e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos ao período letivo, a serem disciplinados pela instituição de ensino em seus
regimentos. (BRASIL, 1996) Partindo do pressuposto acima, a atual demanda social é que a qualidade é vista como essencial, isso vale também para o processo de avaliação da relação ensino e aprendizagem. É nesse contexto de mudanças e novas necessidades (de ampliar a qualidade) que a avaliação escolar está sendo revista e (re)pensada, tornando-se objeto de estudos e/ou instrumento de diagnósticos/formação das novas gerações de estudantes. Esse artigo, portanto, tem por objetivo trazer algumas das principais características que cercam a concepção de Avaliação Formativa como um processo essencial à educação de qualidade para as novas gerações. INTRODUCTION “An assessment must also be assessed” (Ocimar Alavarse) There is no doubt that we are going through countless changes in the beginning of this century, whether these are changes in the sphere of social life, work or relationships. Therefore, such changes, which are driven by new demands from society, also reached school, that is, the formal universe of teaching and learning. Changes that require
1 - Geógrafo e Educador (USP). Especialista em “Fundamentos de uma Educação para o Pensar” (PUC-SP). Especialista em “Ética, Valores e Cidadania na Escola” (USP). MBA em Gestão Escolar (FMU). Mais de 20 anos de atuação nas redes pública e privada de Ensino de São Paulo. 2 - Professor da Faculdade de Educação da USP – Entrevista para UNIVEST/TV Cultura. 3 - Grifo nosso.
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new perspectives on what it is to teach and learn, what is an assessment or why to assess. These new demands are recognized in the National Education Guidelines and Bases Law, for example, in Art. 24, Paragraph V, because: The verification of school performance will observe the following criteria: a) continuous and cumulative evaluation of the student's performance, with the prevalence of qualitative aspects over quantitative ones and the results over the period over those of eventual final exams [emphasis added]; e) mandatory recovery studies, preferably parallel to the school term, to be disciplined by the educational institution in its regulations. (BRASIL, 1996) Based on the above assumption, the current social demand is that quality is seen as essential, this also applies to the process of evaluating the teaching and learning relationship. It is in this context of changes and new needs (to increase quality) that school evaluation is being revised and (re) thought, becoming the object of studies and / or an instrument for diagnosing / training new generations of students. This article, therefore, aims to bring some of the main characteristics that surround the concept of Formative Assessment as an essential process for quality education for new generations. 2. A Avaliação Formativa Primeiro, é importante esclarecer que a Avaliação Formativa é uma função da Educação, ou seja, Avaliação Formativa não abole, não elimina, as formas tradições de avaliação (provas para “tirar nota”), mas permite utilizar as atividades escolares (trabalhos, apresentações, provas etc.) de uma forma que seja possível pensar e repensar as práticas pedagógicas que estão sendo realizadas em sala de aula. Para facilitar a compreensão acerca da Avaliação Formativa podemos considerar que a mesma está assentada no seguinte tripé:
1. Transparência. Os critérios da avaliação a ser aplicada aos estudantes precisam ser evidente tanto para o avaliador (professor/escola/instituição) como para o avaliado (estudante), pois sem isso os discentes não terão clareza do processo educacional do qual estão fazendo parte e, lamentavelmente, assim não deixarão ter uma postura protagonista, ativa, nesse processo. 2. Retorno (Feedback). É essencial que haja troca e diálogo entre o professor e o aluno para que ambos estejam cientes dos rumos e dificuldades encontradas ao longo do processo de ensino e aprendizagem. O feedback é essencial para que ocorra a autoavaliação tanto do estudante como do professor, elemento essencial para construção de uma relação de ensino-aprendizagem voltada à busca da qualidade, da excelência. 3. Autoavaliação de ambas as partes – professor e aluno. Temos aqui um ponto essencial do processo de ensino aprendizagem construído por meio Avaliação Formativa: a conscientização do estudante em relação ao seu processo de ensino-aprendizagem. Sem essa conscientização é impossível a participação ativa e protagonista por parte dos estudantes, o que dificulta o trabalho do professor, sua interação com os alunos e a construção de um verdadeiro processo ensino-aprendizagem. Dessa maneira, a Deliberação do Conselho Estadual de Educação do Estado de São Paulo – CEE n°11/96 reconhece que: […] a avaliação escolar assume um papel muito amplo; sua função deve ser essencialmente formativa, na medida em que lhe cabe o papel de subsidiar o trabalho pedagógico, redirecionando o processo ensino-aprendizagem para sanar as dificuldades encontradas na aquisição de conhecimentos, aperfeiçoando a prática INEQ - Educação integral
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escolar. A avaliação assim vista, como um diagnóstico contínuo e dinâmico, torna-se um instrumento fundamental para repensar e reformular os métodos, os procedimentos e as estratégias de ensino para que realmente o aluno aprenda. Tendo a tríade acima por pressuposto e os apontamentos do Conselho Estadual, podemos dizer que a função diagnóstica também está presente no escopo da avaliação formativa, pois sondar as dificuldades dos estudantes para que possa ser planejada a melhor estratégia pedagógica é, sem dúvida, essencial para que haja sucesso no processo de ensino-aprendizagem dos estudantes. Assim, a avaliação diagnóstica potencializa a avaliação formativa, pois dá a essa avaliação, sempre que possível, melhores parâmetros para traçar o plano pedagógico ao longo do bimestre, trimestre, semestre, permitindo que cada uma das atividades esteja assentada em objetivos claro e direcionados. CONSIDERAÇÕES FINAIS A avaliação formativa, portanto, permite que os estudantes sejam parte do processo de ensino e aprendizagem de forma ativa, pois ao participar e discutir junto com o professor como os trabalhos e atividades serão realizados, os estudantes estão ativamente inseridos e cientes dos critérios cobrados, como a avaliação está sendo pensada e por que será da forma como será realizada. Assim, todas as etapas da realização de uma atividade são objetos de diálogo e participação dos alunos, segundo, Erisevelton S. Lima4 (Doutor em Avaliação e Professor EAPE) dessa […] forma a avaliação formativa é também informativa, pois ela vai informando o professor e o estudante como é que as
aprendizagens vão acontecendo […] sem que os estudantes saibam os critérios adotados, sem que eles sejam orientados de como produzir os seus trabalhos, sejam trabalhos manuais ou trabalhos de exposição oral, o processo avaliativo vai ficar comprometido, porque só quando ele [o estudante] entende todo o processo de produção e passa a fazer parte é que começa a se processar mentalmente esse processo formativo5. É nesse contexto que podemos afirmar que a Avaliação Formativa tem enorme relevância educação na construção de uma educação efetivamente preocupada com a educação de qualidade, algo imprescindível para que as novas gerações tenham reais oportunidades de inserção no século XXI, seja no mundo do trabalho, na vida social (agora em escala global) ou na construção da identidade pessoal com vistas no equilíbrio emocional e na compreensão de que todos fazemos parte de algo maior: a sociedade em que vivemos estamos inseridos. REFERÊNCIAS BARBIER, Jean-Marie. A avaliação em Formação. Porto, Portugal: Edições Afrontamento, 1990. BRASIL. Lei n.9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 23 dez. 1996. Seção 1, p. 27833 GREGO, Sonia Maria Duarte. Reformas educacionais e avaliação: Mecanismos de regulação na escola. Revista Estudos em Avaliação Educacional, v.23, n.53, p. 60-81, set./dez., 2012. SILVA, Janssen Felipe. Avaliação formativa: pressupostos teóricos e práticos. Editora Mediação; Edição: 5 (2010).
4 - http://gepa-avaliacaoeducacional.com.br/mas-o-que-e-mesmo-essa-tal-de-avaliacao-formativa/#more-462 5 - https://www.youtube.com/watch?v=L1183lPlg4g
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LITERATURA INFANTIL E FORMAÇÃO DO LEITOR
Silvia Cavanha Buratinne¹ RESUMO Este estudo versa a respeito do uso da Literatura Infantil como instrumento capaz de auxiliar de forma eficiente na formação do leitor crítico, autônomo e competente para mudar sua realidade, exercendo, assim, sua cidadania. Defende a utilização da Literatura Infantil como recurso divertido e prazeroso que possibilita o aumento do conhecimento cognitivo; o estímulo da imaginação e criatividade, e o conhecimento e questionamento dos valores, comportamentos da sociedade em que a criança se insere, bem como de outras culturas situadas em outros tempos e lugares diversos dos seus, transformando o indivíduo num leitor capaz de interpretar textos e situações. O leitor encontrará, neste artigo, uma breve abordagem histórica da Literatura Infantil e da evolução da concepção de infância ao longo do tempo, itens de muita importância para a compreensão das transformações ocorridas na Literatura Infantil, antes utilizada pedagogicamente com o intuito de educar comportamental e moralmente, agora, entretanto, com o objetivo do desenvolvimento da imaginação, da criatividade, da coordenação motora, favorecendo a aprendizagem de conteúdos, de valores morais, propiciando o autoconhecimento do educando, o entendimento da sociedade e de outras culturas, sempre enfatizando os momentos de diversão e prazer que o texto literário proporciona ao ouvinte ou ao leitor.
Palavra-chave: Literatura Infantil; História; Formação; Leitor autônomo. ABSTRACT This study deals with the use of Children's Literature as an instrument capable of efficiently assisting in the formation of critical, autonomous and competent readers to change their reality, thus exercising their citizenship. It defends the use of Children's Literature as a fun and pleasurable resource that enables the increase of cognitive knowledge; the stimulation of imagination and creativity, and the knowledge and questioning of the values, behaviors of the society in which the child is inserted, as well as of other cultures located in other times and places different from their own, transforming the individual into a reader capable of interpreting texts and situations. The reader will find, in this article, a brief historical approach to Children's Literature and the evolution of childhood conception over time, items of great importance for understanding the transformations that occurred in Children's Literature, previously used pedagogically in order to educating behaviorally and morally, now, however, with the objective of developing imagination, creativity, motor coordination, favoring the learning of contents, moral values, providing the self-knowledge of the student, the understanding of society and other cultures, always emphasizing the moments
1 -Professora de Educação Básica do Fundamental II e Ensino Médio. Contato: sicavanha@gmail.com INEQ - Educação integral
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of fun and pleasure that the literary text provides to the listener or reader. Keyword: Children's Literature; History; Education; Autonomous reader.
ricos da Literatura Infantil, sendo mostrados os avanços e contribuições dos autores mais importantes do século XVII até a contemporaneidade.
INTRODUÇÃO
No segundo capítulo, discorreremos a respeito do uso da Literatura Infantil como meio de despertar na criança, antes mesmo da fase de alfabetização, a curiosidade e a necessidade de ser um leitor crítico, autônomo, garantindo ao indivíduo condições para que ele represente o mundo e a vida através das palavras, com domínio da cultura escrita, unindo criatividade, prazer e aprendizagem.
O presente artigo, realizado por meio do método de pesquisa teórico, tem por objetivo apontar a Literatura Infantil como um recurso potencializador da formação do leitor, com observância de seu desenvolvimento integral como sujeito. Este estudo pretende ressaltar a relevância pedagógica da Literatura Infantil na formação do leitor de mundo ao abordar, por meio das afirmações de estudiosos do tema, a capacidade da literatura em propiciar ao indivíduo, desde a infância, momentos de diversão e prazer, ao mesmo instante em que este passa a conhecer e questionar os valores, comportamentos, costumes, a forma de viver, de pensar, de agir da sociedade em que está inserido, bem como de outras culturas situadas em outros tempos e lugares diversos dos seus. A Literatura Infantil, segundo os teóricos estudados, surge como instrumento aliado à Pedagogia como um recurso de ajuste do bom comportamento e de valores morais da criança, mas acaba por promover a esse pequeno indivíduo o conhecimento de si e do mundo, corroborando para a sua formação de leitor crítico e autônomo. Para alcançar os objetivos propostos, será feita, no primeiro capítulo, uma breve incursão a respeito da concepção de infância pela sociedade ao longo do tempo, verificando-se, deste modo, as mudanças de visão sobre a criança e como isso influenciou e afetou a literatura. Serão ainda mencionados os aspectos histó-
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1. Considerações sobre a infância e o surgimento da Literatura infantil Antes do século XVI a existência da infância era concebida de forma bastante diferente da que se vê hoje; a existência social da infância era apresentada como uma categoria diferenciada do gênero humano. A criança era considerada um adulto em miniatura, e logo que superava a fase de dependência de necessidades físicas, passava a participar das atividades cotidianas dos adultos e era integrada a esse meio social como um adulto. (OLIVEIRA, 2002) Segundo esclarece ARIÈS (1986), na Idade Média, a criança participava junto com o adulto de tradições populares tais como escutar narrativas dos contadores de histórias. A criança da nobreza ouvia trechos de clássicos; a criança da aldeia ouvia lendas. Nesse período, crianças e adultos compartilhavam os mesmos lugares em diferentes situações, inclusive na educação escolar. Assim, bem antes da produção de algum material escrito, a literatura para criança fazia parte da tradição falada em exposições que
relataram e explicavam sua maneira de ver a realidade (TORTELLA et al, 2016). Sempre foi uma necessidade do homem ter histórias e memórias narradas com o propósito de marcar, passar preceitos. As histórias eram narradas em programas de família, diversas vezes perto da fogueira junto com cantos e danças, numa condição que tinha importância social e cultural (TORTELLA et al, 2016). Mas, no século XVIII, conforme explica ARIÈS (1986), a revolução social imposta pelas guerras que modificaram os costumes entre a Idade Média e os tempos modernos criou uma compreensão da particularidade da infância e sua importância tanto moral como social. Com a ascensão da burguesia, há um investimento na educação, na qual a infância passou a ser o centro das atenções. A infância passa a ser definida como um período de fragilidade do ser humano e que deve receber todos os incentivos necessários e proteção das doenças e mazelas sociais, devido à sua fragilidade e dependência. Desse modo, a institucionalização da infância, fruto da modernidade, em meados do século XVIII, se configurou por uma separação das crianças com relação à rotina dos adultos e teve, na escola, um espaço educativo reservado a receber as crianças, num modelo disciplinador, comportamental e normatizador, que atendesse às expectativas da sociedade da época. Então, a partir desse novo cenário europeu, no século XVIII, a criança finalmente começou a ser vista como tal, e passou a desfrutar de uma literatura especialmente voltada para ela. Foi em meio a esse contexto que surgiu na Europa a Literatura Infantil como forma de adequação da criança ao novo quadro social; controle de seu desenvolvimento intelectual; manipulação de suas emoções e inserção dos valores burgueses. O burguês observa a criança como classe consumidora desse novo produto in-
dustrial: o livro infantil, agora também um novo instrumento pedagógico a ser utilizado pela escola. A esse respeito, Regina Zilberman assevera: A nova valorização da infância gerou maior união familiar, mas igualmente meios de controle do desenvolvimento intelectual da criança e manipulação de suas emoções. Literatura e escola, inventada a primeira e reformada a segunda, são convocadas a cumprir essa missão. Numa sociedade em que o processo de modernização ficou evidente devido à industrialização, cabe à escola adequar o jovem a esse novo quadro social, através da alfabetização habilita-se a criança ao consumo das obras impressas. Esse processo aperfeiçoa a tipografia e a expansão da produção de livros, o que inicia o estreito laço entre a literatura e a escola. Produto da industrialização, o livro surge visando um mercado específico cujas características respeitam posturas pedagógicas e afirma valores burgueses a fim de assegurar sua utilidade. E a literatura surge, a partir dessas grandes transformações, na ordem sócio-política e econômica. (ZILBERMAN, 1987, p.15) Entre as primeiras impressões de livros estão as narrativas da Idade Média, histórias que agradavam tanto a adultos quanto a crianças, e que com o passar do tempo, conforme os símbolos, os temas únicos dando destaque à essência humana e seus valores, acabariam por se transformar em Literatura Infantil, adaptando-se ao gosto infantil e deixando os adultos menos preocupados quanto às histórias destinadas aos adultos (TORTELLA et al, 2016). No século XVII, foram escritas histórias que, posteriormente, foram englobadas como liteINEQ - Educação integral
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ratura também apropriada à infância: as fábulas de La Fontaine; as fábulas de Fénelon; os Contos de Fadas de Charles Perrault, uma variação do conto popular ou fábula, transmitida oralmente, que surgiu para transmitir conhecimento e valores culturais de geração para geração, onde o herói ou heroína tem de enfrentar grandes obstáculos antes de vencer o mal. Perrault retratava a sociedade da sua época em suas histórias, influenciado pelo folclore, considerado o principal elemento da Literatura Infantil daquele tempo. O autor se tornou, assim, o responsável em estabelecer embasamento para um novo modelo literário, além de ter sido o primeiro a dar aperfeiçoamento a esse tipo de Literatura. Destacam-se em sua obra: Chapeuzinho Vermelho, a Bela Adormecida, o Gato de Botas, Cinderela, e o Pequeno Polegar. (FARIAS, 2012) No século XIX, surge Hans Christian Andersen, autor dinamarquês conhecido por demonstrar a ideia de que todos os homens deveriam ter direitos iguais, evidenciando em seus textos padrões de comportamento que deveriam ser adotados pela nova sociedade que se organizava, e apontando, inclusive, confrontos entre “poderosos” e “desprotegidos”, “fortes” e “fracos”, “exploradores” e “explorados”. No começo, escrevia contos baseados na tradição popular, especialmente no que ele ouvia durante a infância, mas depois desenvolveu histórias no mundo das fadas ou que traziam elementos da natureza. Entre suas obras, destacam-se “O Patinho Feio”, “O Soldadinho de Chumbo”, “A Pequena Sereia”, “A Roupa Nova do Rei”, “A Pequena Vendedora de Fósforos”, e “A Rainha da Neve”. Nesse mesmo período, os irmãos Grimm editam uma literatura romântica capaz de encantar o público infantil de todo o mundo através de lendas e do folclore, utilizando a singeleza e personagens populares, como alfaiates, cam-
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poneses, entre outros, com a frequente presença de personagens mágicas. Esses autores se dedicaram à criação de várias fábulas infantis, e em 1812, edita a coleção de contos de fadas, entre eles “A Gata Borralheira”, “Branca de Neve”, “João e Maria”, que se transformaram, de certo modo, em sinônimo de literatura para crianças. Nesse momento, percebeu-se que o público infantil tinha predileção por histórias fantásticas e com aventuras empolgantes, como Peter Pan (1911) de James Barrie. De acordo com LAJOLO (2002), é no início do século XIX que a criança assume maior visibilidade. Tem início o respeito e a preocupação com as necessidades e o desenvolvimento da criança e ela passa a ser objeto de atenção das ciências, dentre elas a psicologia, a sociologia e a educação. Desse modo, também a Literatura Infantil passa a se desenvolver de forma mais evidente. A Literatura Infantil, com caráter pedagógico, transmite valores e normas da sociedade com a finalidade de instruir e de formar o caráter da criança, uma formação humanística, cívica, espiritual, ética e intelectual. A esse respeito, explica que “Os laços entre a literatura e a escola começam desde este ponto: a habilitação da criança para o consumo de obras impressas. Muitas produções infantis foram escritas durante os séculos, através de pedagogos e professores clássicos, os livros sempre com sua função determinada”. LAJOLO (2002, p.17). No Brasil, segundo ZILBERMAN (1987), no final do século XIX, com o aceleramento da urbanização, emergiu um grande contingente de consumidores de bens culturais e o conhecimento passou a ser importante para o novo modelo social. Com isso, começava a se firmar o desenvolvimento das traduções e adaptações de obras literárias para o público infantil e juvenil, e surgia, então, à compreensão da necessidade de uma literatura nacional própria para a
criança brasileira que precisava se instruir, um público ávido por consumir os produtos culturais dos novos tempos. No tocante à produção literária infantil da época no Brasil, Laura Sandroni afirma: Até os fins do século XIX, a literatura voltada para crianças e jovens era importada e vendida no mercado disponível apenas para a elite brasileira, constituindo-se principalmente de traduções feitas em Portugal, pois, no Brasil ainda não havia editoras e os autores brasileiros tinham seus textos impressos na Europa. (SANDRONI, 1998, p. 11) De acordo com SANDRONI (1998), entre o final do século XIX e o início do século XX, brotou na sociedade a valorização do saber, e apareceram as primeiras manifestações de reforma pedagógica e literária que visavam à formação de um novo modelo de geração brasileira. A estudiosa aponta o autor Monteiro Lobato como um “divisor de águas na Literatura Infantil brasileira”, se destacando com a publicação de sua grande obra “A menina do narizinho arrebitado (1921). Ressalta ainda que sua narrativa infantil se utiliza de temas do folclore nacional e se vale da realidade comum e familiar da criança, introduzindo a oralidade tanto na fala das personagens como no discurso do narrador, com uma linguagem mais próxima a das crianças, o que possibilitou mais emoção durante a leitura e a escuta dessas histórias. A autora explica que Lobato acreditava na capacidade dos pequenos leitores em adquirir consciência crítica baseada na simplicidade das palavras que eram compreendidas com facilidade pelas crianças. Para muitos estudiosos, Monteiro Lobato deve ser apontado como o autor precursor da Literatura Infantil no Brasil. Abriu caminho para autores contemporâneos premiados como Ruth
Rocha, Ziraldo, Ana Maria Machado e muitos outros cuja produção literária infantil não nasce apenas da necessidade de um recurso pedagógico, mas tem como funções o lúdico e a libertação, visando preparar o indivíduo para uma vida repleta de diversidade. Trata-se, hoje, de uma Literatura Infantil apreciada como gênero, formadora de consciência da vida social e cultural, abordando temas contemporâneos e mantendo a representação de histórias clássicas como os contos de fadas.
2. Contribuições da Literatura infantil na formação do leitor Pode-se verificar que, notadamente, tanto o conceito de infância quanto o de literatura infantil sofreram e continuam sofrendo alterações ao longo do tempo. A literatura, inicialmente, segundo SANDRONI (1998), foi utilizada no campo escolar com o objetivo de ensinar conteúdos da língua portuguesa, ou seja, como um recurso especificamente didático, entretanto, a partir de 1980, os textos passaram a apresentar conflitos e questionamentos entre a criança e o mundo, e as ilustrações adquiriram um lugar de destaque no material. O universo infantil teve, assim, uma representação atrativa e convidativa, motivando o senso crítico dos pequenos leitores. Os livros para crianças, por essa época, tiveram uma valorização crescente, e uma série de cuidados com o conteúdo, e também com os aspectos materiais e ilustrativos, tiveram de serem tomados durante sua elaboração, detalhes importantes que tiveram como objetivo facilitar o manuseio e o entendimento das crianças. Diante de tais mudanças e de um novo entendimento em relação à Literatura Infantil, foi possível tornar o livro infantil um veículo de várias linguagens que possibilita à criança leitora a busca e o encontro de novas descoINEQ - Educação integral
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bertas. De acordo com CORSINO (2010), o livro infantil passa a ser um recurso extremamente importante para o desenvolvimento de capacidades e habilidades cognitivas e socioafetivas, como a coordenação motora, a criatividade, a percepção visual, e noções de cores e de espaço, além de garantir o acesso a processos de apropriação, renovação e articulação de conhecimentos e aprendizagens de diferentes linguagens. Desse modo, com características que atendem às metas do Ensino Infantil, a Literatura Infantil passa a ser considerada uma auxiliar importantíssima no desenvolvimento da imaginação, da criatividade, nos processos de alfabetização e letramento, despertando no indivíduo o prazer pela leitura. Segundo as Diretrizes Curriculares de Língua Portuguesa para a Educação Básica, “O leitor constrói e não apenas recebe um significado global para o texto: ele procura pistas formais, formula e reformula hipóteses, aceita ou rejeita conclusões, usa estratégias baseadas no seu conhecimento linguístico e na sua vivência sociocultural, seu conhecimento de mundo” (BRASIL, 1997, p.26). Compreende-se que aprender a ler através da literatura, ler o texto literário, é um passo fundamental no processo de formação do indivíduo como sujeito e como leitor. Para MATHEUS (2014), colocar a literatura infantil no processo de alfabetização e aprendizado das letras tem por significado incluir a criança em um mundo de aprendizado lúdico e com prazer, onde há um maior estímulo ao aprender a ler e escrever, ela permite que a criança vivencie situações, que no cotidiano não é possível. A criança, segundo MALLMANN (2011), precisa habituar-se com a variedade de textos e
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estilos desde o começo da vida escolar, isso acontece porque nessa fase da escola, a criança se encontra em processo de aprendizado e de desenvolvimento de suas capacidades. Assim, mesmo que não tenha domínio da língua, ela necessita dessa relação com a literatura para no futuro ser um leitor crítico. Este é o instante de incentivar a habilidade de compreender e de pensar da criança. A autora considera, então, a Literatura Infantil como um recurso fundamental e significativo para a formação do leitor crítico, além de desenvolver nele os valores morais, o respeito ao próximo, a solidariedade, o respeito à natureza e a autonomia, tendo uma contribuição importante para a criação de cidadãos mais solidários. Segundo afirma COELHO (2000), os leitores constroem significados sobre o que ouvem ou leem usando seus conhecimentos prévios, criando imagens que estão ligadas às suas próprias experiências e interações humanas, e construindo significados na medida em que interagem com outras crianças e adultos, comentando as histórias. Porém, sabe-se que a leitura é capaz de nos apresentar contextos totalmente diferentes daqueles em estamos inseridos, assim: “A leitura de histórias é um momento em que a criança pode conhecer a forma de viver, pensar e agir e o universo de valores, costumes e comportamentos de outras culturas situadas em outros tempos e lugares que não são seus”. (BRASIL, 1998, p. 143). A literatura, incluindo-se a Literatura Infantil, aparece como um instrumento facilitador da percepção de mundo e da realidade que cerca o indivíduo, e é capaz de possibilitar a formação de cidadãos passíveis de entender a realidade social, de atuar sobre ela e transformá-la. Desde as origens, a literatura aparece ligada a essa função essencial: atuar sobre as mentes, nas quais se decidem as vontades ou as
ações; e sobre os espíritos, nos quais se expandem as emoções, paixões, desejos, sentimentos de toda ordem […]. No encontro com a literatura (ou com a arte em geral) os homens têm a oportunidade de ampliar, transformar ou enriquecer sua própria experiência de vida, em um grau de intensidade não igualada por nenhuma outra atividade. (COELHO, 2000, p. 29) Para SILVA (2012), o ato de aprender a ler, ou seja, o aprendizado da leitura é uma das mais importantes conquistas que o indivíduo pode atingir. Tal ato pode ser experimentado e desfrutado no âmbito escolar ou fora dele, sendo que, poderá fazer uso dessa leitura em quaisquer experiências sociais que viver. Todas as considerações a respeito da literatura, em especial da Literatura Infantil, sobre a qual demos o enfoque, nos faz perceber a sua importância para com a equidade social, visto que a literatura, desde a infância, deve ser tomada como recurso facilitador da formação do leitor de mundo, aquele com domínio da cultura escrita e capacidade de indagar sobre a realidade para compreendê-la e, por fim, modificá-la, assumindo assim, uma postura cidadã.
CONSIDERAÇÕES FINAIS A intensa necessidade que o homem tem de narrar aos seus descendentes suas histórias carregadas de memórias, com o objetivo maior de ensinar preceitos, dada a sua importância social e cultural, teve como consequência a geração do que mais tarde viria a se transformar em literatura e, mais tarde, em um gênero literário especial: a Literatura Infantil. A Literatura Infantil surgiu, no século XVIII, na Europa, após a revolução social imposta pelas guerras que promoveram a transição dos costumes da Idade Média para a modernidade,
quando a criança deixou de ser vista como um adulto em miniatura e passou a ser vista como um sujeito repleto de particularidades, com necessidades morais e sociais diferenciadas. Esse gênero literário esteve, desde o princípio, ligado a objetivos do ensino moral, comportamental e pedagógico. Com a ascensão da burguesia e do Capitalismo houve a institucionalização da infância, assim, a criança passou a receber incentivos e proteção contra as mazelas sociais e ganhou um espaço reservado à sua educação. Nesse contexto, surgiu na Europa a Literatura Infantil como recurso capaz de adequar a criança a esse novo quadro social, proporcionando-lhe desenvolvimento intelectual e introduzindo nela os valores burgueses, passando a ser vista como classe consumidora do livro infantil, agora utilizado nas escolas. No século XIX, o respeito e a preocupação com a criança se tornaram mais evidentes e a Literatura Infantil, com caráter pedagógico, passou a se preocupar com normas da sociedade e formação do caráter da criança, além dos aspectos espiritual, ético e intelectual. No Brasil, surge, segundo os autores estudados, o que viria a ser a primeira literatura nacional voltada ao público infantil: as obras de Monteiro Lobato, repletas de folclore e linguagem coloquial. Verificou-se, então, que os conceitos de infância e de Literatura Infantil sofreram alterações constantes ao longo do tempo e a literatura, inicialmente utilizada com objetivos pedagógicos de ajustar comportamentos e depois com objetivos especificamente didáticos no aprendizado da língua, passou a ser usada para apresentar conflitos e questionamentos entre a criança e o mundo, com evoluções no que diz respeito à função das ilustrações e uso de materiais visualmente atrativos ou palpáveis, incentivando novas descobertas. INEQ - Educação integral
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Desse modo, o livro de Literatura Infantil passou a ser utilizado dentro e fora da escola de maneira a desenvolver na criança, de um jeito divertido e prazeroso, habilidades cognitivas e socioafetivas, a criatividade, a imaginação, processos de apropriação, renovação e articulação de diferentes linguagens e culturas, despertando na criança o senso crítico, motivando-a para os questionamentos tangentes à realidade que a cerca, enriquecendo e transformando sua própria experiência de vida. A Literatura Infantil tornou-se um instrumento auxiliar na aquisição do domínio da cultura escrita, capaz de contribuir para a formação do indivíduo na sua integralidade e de leitores competentes.
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