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Tradição + Inovação

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Sumário Capítulo 1 Princípios Penais Fundamentais e Garantias Penais, 17 1. Sistematização da Matéria. Princípios Penais Fundamentais Relacionados com o Direito Penal. Princípio da Intervenção Mínima. Princípio da Exclusiva Proteção de Bens Jurídicos, 17 2. Princípios Penais Fundamentais Relacionados com o Fato. Princípio da Materialização ou Exteriorização do Fato. Princípio da Adequação Social, 17 3. Princípio da Ofensividade ou Lesividade. Princípio da Alteridade, 18 4. Princípio da Estrita Legalidade ou Reserva Legal, 19 5. Princípio da Insignificância I, 19 6. Princípio da Insignificância II, 20 7. Princípios Penais Fundamentais Relacionados com o Agente. Princípio da Responsabilidade Subjetiva. Princípio da Responsabilidade Pessoal, 21 8. Princípio da Culpabilidade, 22 9. Princípios Penais Fundamentais Relacionados à Pena. Princípio da Legalidade ou Reserva Legal. Princípio da Humanidade., 23 10. Princípio da Proporcionalidade, 23 Capítulo 2 Teoria da Norma Penal, 25 1. Fontes do Direito Penal, 25 2. Lei Penal x Norma Penal, 26 3. Classificação das Leis Penais, 27 4. Leis Penais em Branco – Normas Penais em Branco ao


Avesso, 27 5. Normas Penais em Branco Homogêneas – Homovitelíneas e Heterovitelíneas, 28 6. Normas Penais em Branco Heterogêneas, 29 7. Mandados Constitucionais de Criminalização, 29 8. Interpretação das Leis Penais, 30 9. Analogia, 31 10. Lei Penal no Tempo – Vigência e Revogação, 32 11. Tempo do Crime, 33 12. Conflito de Leis no Tempo – Lex Mitior – Princípio da Extra-atividade – Novatio Legis in Mellius, 34 13. Abolitio Criminis, 35 14. Princípio da Continuidade Normativo-típica, 36 15. Lex Gravior, 36 16. Lei Processual Penal – Normas Híbridas, 37 17. Lex Tertia – Tráfico Privilegiado, 38 18. Lex Tertia: Estupro de Vulnerável, 39 19. Lei Excepcional e Lei Temporária, 39 20. Norma Penal em Branco Heterogênea e Princípio da Retroatividade, 40 21. Polêmica a Respeito do Cloreto de Etila, 41 22. Lei Penal no Espaço – Princípio da Territorialidade, 42 23. Território Nacional e Mar Territorial, 42 24. Lugar do Crime, 43 25. Extraterritorialidade – Contravenções Penais – Extraterritorialidade Incondicionada, 44 26. Extraterritorialidade Condicionada – Extraterritorialidade Hipercondicionada, 45 27. Lei de Tortura – Princípios Norteadores da Extraterritorialidade, 46 28. Pena Cumprida no Estrangeiro – Eficácia da Sentença Penal Estrangeira, 47


29. Disposições Finais sobre a Aplicação da Lei Penal, 48 30. Eficácia da Lei Penal em Relação a Pessoas que Exercem Determinadas Funções Públicas – Imunidades Diplomáticas, 49 31. Imunidades Parlamentares, 50 32. Conflito Aparente de Normas – Requisitos – Diferenças com Outros Institutos, 51 33. Princípio da Especialidade, 52 34. Princípio da Subsidiariedade, 53 35. Princípio da Consunção: Crime Complexo, Crime Progressivo e Progressão Criminosa, 54 36. Princípio da Consunção: Fato Anterior Impunível e Fato Posterior Impunível, 55 37. Princípio da Alternatividade, 56

Capítulo 3 Teoria do Crime, 58 1. Teoria Geral do Crime, 58 2. Teoria do Crime – Crime, Delito e Contravenção Penal: Teoria Dicotômica, 59 3. Diferença entre Crime e Contravenção Penal: Pena (Qualidade, Quantidade e Sursis), 60 4. Diferença entre Crime e Contravenção Penal: Tentativa e Ação Penal, 61 5. Diferença entre Crime e Contravenção Penal: Extraterritorialidade e Erro de Proibição, 62 6. Polêmica do Art. 28 da Lei de Drogas, 63 7. Objeto do Crime, 64 8. Sujeito Ativo, 65 9. Teoria da Dupla Imputação, 66 10. Sujeito Passivo – Crimes Vagos, 67 11. Autolesão, 68


12. Classificação dos Crimes – Materiais, Formais e de Mera Conduta, 68 13. Classificação dos Crimes: Conduta Mista, Comissivos e Omissivos, 69 14. Classificação dos Crimes: de Dano e de Perigo, 70 15. Classificação dos Crimes: Unissubsistentes e Plurissubsistentes; Unissubjetivos e Plurissubjetivos; Transeuntes e Não Transeuntes, 71 16. Classificação dos Crimes: Comuns, Próprios e de Mão Própria, Instantâneos, Permanentes e a Prazo, 72 17. Outras Classificações, 73 18. Conceitos de Crime, 74 19. Fato Típico, 75 20. Fato Materialmente Típico, 76 21. Conduta – Teorias Clássicas, 77 22. Conduta – Teoria Adotada no Brasil – Causas de Exclusão da Conduta, 77 23. Teorias Pós-finalistas – Teoria Constitucionalista do Delito, 78 24. Teorias Pós-finalistas – Funcionalismo, 79 25. Funcionalismo Moderado de Roxin, 80 26. Funcionalismo Radical de Jakobs, 81 27. Direito Penal do Inimigo, 82 28. Direito Penal do Inimigo no Brasil, 83 29. Velocidades do Direito Penal – Primeira e Segunda Velocidades, 84 30. Velocidades do Direito Penal: Terceira e Quarta Velocidades, 84 31. Funcionalismo Reducionista – A Teoria da Tipicidade Conglobante de Zaffaroni, 86 32. Fato Típico: do Resultado, 86


33. Fato Típico: da Relação de Causalidade, 87 34. Problema do Regresso ao Infinito, 88 35. Concausas Independentes Absolutas, 89 36. Concausas Independentes Relativas, 90 37. Imputação Objetiva – Noções Preliminares, 91 38. Imputação Objetiva – Requisitos e Jurisprudência, 92 39. Teoria da Tipicidade – Evolução do Tipo, 93 40. Adequação Típica, 94 41. Funções do Tipo e Elementos do Tipo, 94 42. Espécies de Tipo, 95 43. Dolo Natural e Dolo Normativo, 96 44. Teorias do Dolo, 97 45. Dolo Direto, 98 46. Dolo Indireto, 99 47. Dolus Generalis – Dolo Genérico e Específico – Dolo de Propósito e de Ímpeto, 99 48. Culpa – Técnica no Brasil e Princípio da Excepcionalidade, 101 49. Elementos do Crime Culposo – Conduta Inicial Voluntária e Violação do Dever de Cuidado Objetivo, 102 50. Elementos do Crime Culposo – Resultado Involuntário e Nexo Causal, 102 51. Elementos do Crime Culposo – Previsibilidade Objetiva, 103 52. Elementos do Crime Culposo – Ausência de Previsão e Tipicidade, 104 53. Espécies de Culpa, 105 54. Culpa Imprópria, 106 55. Exclusão da Culpa, 107 56. Dolo Eventual x Culpa Consciente, 109 57. Compensação e Concorrência de Culpas, 109


58. Crimes Qualificados pelo Resultado, 111 59. Crime Preterdoloso, 112 60. Erro de Tipo Essencial: Conceito e Exemplos, 113 61. Erro de Tipo Essencial: Espécies e Consequências, 113 62. Erro Determinado por Terceiro, 114 63. Descriminantes Putativas – Hipóteses, 115 64. Art. 20, § 1º, do CP – Divergência, 116 65. Erro sobre o Objeto e Erro sobre o Nexo Causal, 117 66. Erro sobre a Pessoa, 118 67. Aberratio Ictus, 118 68. Aberratio Criminis ou Delicti, 119 69. Consumação, 120 70. Iter Criminis, 121 71. Passagem dos Atos Preparatórios para os Atos Executórios, 121 72. Tentativa – Conceito e Natureza Jurídica, 122 73. Tentativa – A Técnica Legislativa no Brasil, 123 74. Teorias sobre a Punibilidade da Tentativa, 124 75. Elementos da Tentativa, 125 76. Infrações Penais que Não Admitem Tentativa, 126 77. Espécies de Tentativa, 126 78. Desistência Voluntária e Arrependimento Eficaz, 127 79. Desistência Voluntária e Arrependimento Eficaz – Natureza Jurídica e Tentativa Qualificada, 128 80. Arrependimento Posterior, 128 81. Teoria do Crime – Dispositivos Específicos a Respeito da Reparação do Dano, 129 82. Teoria do Crime – Crime Impossível – Conceito e Natureza Jurídica, 130 83. Teoria do Crime – Espécies de Crime Impossível, 131 84. Teoria do Crime – Crime Impossível e a Súmula nº 145 do STF, 132


85. Teoria do Crime – Teorias sobre o Crime Impossível, 132 86. Crime Putativo, 133 87. Ilicitude: Conceito e Nomenclatura, 134 88. Ilicitude Formal x Ilicitude Material, 135 89. Ilícito e Injusto, 135 90. Causas Supralegais de Exclusão de Ilicitude, 136 91. Consentimento do Ofendido – Requisitos, 137 92. Consentimento do Ofendido – Exclusão, 137 93. Requisito Subjetivo, 138 94. Causas Legais de Exclusão de Ilicitude, 139 95. Estado de Necessidade: Conceito e Pressuposto, 139 96. Requisitos do Estado de Necessidade, 140 97. Discussão Acerca da Abrangência do Art. 24, § 1º, do CP, 141 98. Inevitabilidade e Proporcionalidade, 141 99. Proporcionalidade e a Situação Correta, 142 100. Teorias do Estado de Necessidade, 142 101. Teoria Adotada no Brasil, 143 102. Espécies de Estado de Necessidade, 144 103. Casos Especiais do Estado de Necessidade, 145 104. Legítima Defesa – Conceito, Natureza Jurídica e Alteração no Rito do Júri, 146 105. Requisitos da Legítima Defesa (Agressão Injusta), 147 106. Legítima Defesa - Hipóteses de Cabimento, 148 107. Requisitos da Legítima Defesa (Direito Próprio ou Alheio Atacado), 149 108. Teoria do Crime – Requisitos da Legítima Defesa (Reação com os Meios Necessários), 149 109. Teoria do Crime – Requisitos da Legítima Defesa (Uso Moderado de Tais Meios), 150 110. Teoria do Crime – Espécies de Legítima Defesa, 150


111. Teoria do Crime – Casos Especiais de Legítima Defesa, 151 112. Teoria do Crime – Legítima Defesa e Aberratio Ictus, 151 113. Exercício Regular de Direito – Conceito e Visão a Partir da Teoria da Tipicidade Conglobante, 152 114. Lesões Graves nos Esportes, 153 115. Ofendículos e Prática da Medicina, 153 116. Estrito Cumprimento do Dever Legal – Conceito e Visão a Partir da Teoria da Tipicidade Conglobante, 154 117. Requisitos do Estrito Cumprimento do Dever Legal, 155 118. Excesso Punível, 156 119. Excesso Impunível, 156 120. Excesso Intensivo e Extensivo – A Quesitação no Novo Rito do Júri, 157 121. Culpabilidade – Conceito, 157 122. Coculpabilidade, 158 123. Teorias Psicológica e Psicológico-normativa, 159 124. Teoria Normativa Pura e Teoria Complexa, 159 125. Diferença entre Teoria Extremada e Teoria Limitada, 160 126. Atual Estrutura da Culpabilidade, 161 127. Imputabilidade – Aspectos Introdutórios, 162 128. Imputabilidade – Conceito e Consequência Jurídica, 163 129. Causas que Excluem a Imputabilidade – Doença Mental, 163 130. Causas que Excluem a Imputabilidade – Desenvolvimento Mental Incompleto e Desenvolvimento Mental Retardado, 164


131. Critérios de Aferição da Inimputabilidade, 164 132. Requisitos do Critério Biopsicológico, 165 133. Imputabilidade – Questões Processuais, 166 134. Embriaguez – Classificação das Substâncias Psicotrópicas, Fases e Conceito, 166 135. Espécies de Embriaguez – Embriaguez Voluntária ou Culposa, 167 136. Teoria da Actio Libera in Causa, 167 137. Embriaguez Acidental, 168 138. Embriaguez Patológica e Embriaguez Preordenada, 168 139. Emoção e Paixão, 169 140. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica, 169 141. Semi-imputabilidade, 170 142. Potencial Consciência da Ilicitude, 171 143. Potencial Consciência da Ilicitude: Efeito nos Crimes e nas Contravenções, 172 144. Causa de Exclusão da Potencial Consciência da Ilicitude, 172 145. Erro de Proibição – Noções Gerais e Diferenças com o Erro de Tipo, 173 146. Erro de Proibição Direto, 174 147. Erro de Proibição Indireto, 175 148. Descriminantes Putativas, 176 149. Erro Mandamental, 177 150. Exigibilidade de Conduta Diversa – Noções Gerais e Art. 128, II, do CP, 177 151. Vis Absoluta x Vis Relativa, 178 152. Coação Moral Irresistível, 179 153. Coação Moral Irresistível Putativa, 180 154. Teoria do Crime – A Coação Moral Resistível, 181 155. Obediência Hierárquica, 182


156. Ordem Legal e Ordem Ilegal, 182 157. Estado de Necessidade, 183 158. Excesso Causal ou Acidental, 184 159. Inexigibilidade de Conduta Diversa em Sentido Estrito, 185

Capítulo 4 Concurso de Pessoas, 187 1. Conceito e Requisitos, 187 2. Das Teorias sobre Concurso de Pessoas, 188 3. Exceções à Teoria Monista, 189 4. Autoria, 190 5. Participação, 191 6. Concurso de Pessoas e Crime Culposo, 192 7. Concurso de Pessoas: Outros Conceitos, 193 8. Concurso de Pessoas: Questões Polêmicas, 194 Capítulo 5 Teoria Geral da Pena, 196 1. Teoria Geral da Pena – Aspectos Introdutórios, 196 2. Limites Constitucionais das Penas, 196 3. Das Penas no Âmbito Constitucional, 197 4. Finalidades da Pena, 198 5. Função Social da Pena, 198 6. Das Penas no Âmbito do Código Penal, 199 7. Regime de Cumprimento de Pena, 200 8. Regime Inicial de Cumprimento de Pena, 201 9. Regras dos Regimes de Cumprimento de Pena, 201 10. Regime Especial, 202 11. Direitos do Preso, Trabalho do Preso e Superveniência de Doença Mental, 203 12. Detração Penal, 204 13. Penas Restritivas de Direito, 204


14. Requisitos Objetivos das Penas Restritivas de Direitos, 205 15. Requisitos Subjetivos das Penas Restritivas de Direitos, 206 16. Penas Restritivas de Direito – Conversão, 207 17. Prestação Pecuniária – Conversão em Crimes Hediondos, 208 18. Prestação Pecuniária, 208 19. Perdas de Bens e Valores, 209 20. Prestação de Serviços à Comunidade, 210 21. Interdição Temporária de Direitos, 211 22. Limitação de Fim de Semana, 212 23. Estudo da Multa, 213 24. Concurso de Crimes, 213 25. Concurso Material e Concurso Formal, 214 26. Concurso Formal, 215 27. Continuação – Concurso de Crimes, 216 28. Crime Continuado, 217 29. Continuação de Crime Continuado, 218 30. Teoria Geral da Pena – Sursis: Sistemas – Conceito – Natureza Jurídica, 219 31. Teoria Geral da Pena – Sursis – Requisitos Objetivos e Subjetivos – Hipóteses de Cabimento, 220 32. Momento Adequado para Concessão do Sursis, 221 33. Sursis – Revogação e Cassação, 222 34. Cassação – Sursis Sucessivo – Sursis Simultâneo – Prorrogação do Período de Prova, 223 35. Sursis e Crimes Hediondos ou Equiparados – Extinção da Pena, 223 36. Livramento Condicional – Introdução, 224 37. Requisitos Objetivos (Espécie da Pena) – Quantidade da Pena – Parcela da Pena, 225


38. Requisitos Objetivos (Reparação do Dano) – Requisitos Subjetivos, 226 39. Livramento Condicional: Condições – Procedimentos, 227 40. Revogação Obrigatória, 228 41. Livramento Condicional: Revogação Facultativa – Suspensão, 229 42. Prorrogação do Período de Prova – Extinção da Pena, 230 43. Efeitos da Condenação – Efeitos Principais e Efeitos Secundários, 230 44. Efeitos da Condenação – Efeitos Secundários, 231 45. Confisco, 232 46. Equivalência de Bens, 232 47. Efeitos Específicos da Condenação – Perda do Cargo, Função Pública ou Mandato Eletivo, 233 48. Efeitos Específicos da Condenação – Incapacidade para o Exercício do Pátrio Poder, da Tutela ou da Curatela, 234 49. Efeitos Específicos da Condenação – Inabilitação para Dirigir Veículo Automotor, 234 50. Reabilitação – Natureza Jurídica e Espécies, 235 51. Reabilitação – Efeitos, 236 52. Requisitos, Legitimidade e Revogação, 237 53. Medidas de Segurança: Pena x Medida de Segurança – Princípios – Periculosidade, 238 54. Medidas de Segurança – Requisitos, 239 55. Espécies e Prazo de Cumprimento, 240 56. Cumprimento, 241 57 Direitos do Internado – Medida de Segurança Provisória ou Preventiva – Reintegração – Desinternação Progressiva, 242


Capítulo 6 Extinção de Punibilidade, 244 1. Causas Extintivas de Punibilidade, 244 2. Anistia – Graça – Indulto – Abolitio Criminis – Decadência, 245 3. Perempção – Renúncia – Perdão do Ofendido – Retratação – Perdão Judicial, 246 4. Prescrição – Introdução, 247 5. Prescrição de Pretensão Punitiva Propriamente Dita, 247 6. PPP – Termo Inicial e Interrupção, 248 7. PPP – Comunicabilidade da Interrupção e Prescrição do Crime Pressuposto, 249 8. PPP – Causas Suspensivas, 250 9. PPP Superveniente, Intercorrente ou Subsequente, 251 10. PPP Retroativa, 252 11. Prescrição da Pretensão Executória, 253 12. PPE – Termo inicial, 254 13. Fuga e Revogação do Livramento Condicional – Causas Interruptivas e Suspensivas da PPE, 254 14. Situações Específicas – Prescrição Virtual, PRD, Multa, Medidas Socioeducativas e Medidas de Segurança, 256 Gabarito, 260



Capítulo 1

Princípios Penais Fundamentais e Garantias Penais

1. Sistematização da Matéria. Princípios Penais Fundamentais Relacionados com o Direito Penal. Princípio da Intervenção Mínima. Princípio da Exclusiva Proteção de Bens Jurídicos Princípios são os valores fundamentais que inspiram a criação e a manutenção do sistema jurídico. Houve uma época em que os princípios eram considerados utopias, ou seja, estavam distantes do Direito. Contudo, após Konrad Hesse escrever o livro chamado “A Força Normativa da Constituição”, os princípios passaram a ter força normativa. O Princípio da Intervenção Mínima tem origem na ideia da necessidade da intervenção penal. O Estado somente utilizará o Direito Penal quando as outras áreas do Direito forem incompetentes ou insuficientes para tutelar a situação. Desta forma, nota-se a ligação do Princípio da Intervenção Mínima com a expressão “ultima ratio”. Vejamos, agora, o Princípio da Exclusiva Proteção de Bens Jurídicos. Cumpre esclarecer que bem jurídico é um bem importante da vida das pessoas, protegido pelo Direito e, quando protegido pelo Direito Penal, denomina-se “bem jurídico penal”. Assim, o Direito Penal somente poderá existir para proteger bens jurídicos previstos na Constituição da República.

2. Princípios Penais Fundamentais Relacionados


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com o Fato. Princípio da Materialização ou Exteriorização do Fato. Princípio da Adequação Social Há dois Princípios Penais Relacionados com o Fato, quais sejam: o Princípio da Materialização ou Exteriorização do Fato e o Princípio da Adequação Social. O Princípio da Materialização ou Exteriorização do Fato dispõe que o Direito Penal não pune o pensamento, ou seja, enquanto o crime está no plano das ideias, não é punível. É importante salientar que na fase da cogitação não há qualquer materialização ou exteriorização e, portanto, não é possível qualquer punição. O Princípio da Adequação Social estabelece que o comportamento humano, embora tipificado na lei, não será considerado criminoso se não afrontar o sentimento social de justiça. Exemplo: Ao lado do Fórum Criminal, na cidade de São Paulo/SP, existe uma banca em que é feito “Jogo do Bicho”. No entanto, não obstante se tratar de infração penal, por conta do Princípio da Adequação Social, nada é feito. Importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o crime de descaminho praticado por camelôs não pode ser entendido como socialmente adequado (HC 45153 STJ).

3. Princípio da Ofensividade ou Lesividade. Princípio da Alteridade O Princípio da Ofensividade ou Lesividade estabelece que não há infração penal quando a conduta não tiver oferecido ao menos perigo de lesão ao bem jurídico. É necessário salientar que, nos crimes de perigo (concretos ou abstratos), o bem jurídico permanece intacto, embora colocado em uma situação de perigo. Exemplo de crime de perigo concreto: artigo 309 do Código de Trânsito Brasileiro (dirigir sem Permissão para Dirigir ou Habilitação, gerando perigo de dano). Exemplo de crime de perigo abstrato: embriaguez ao volante. Aqui, não há necessidade de que o agente gere perigo de dano, basta que dirija embriagado. Conclui-se, portanto, que o Princípio da Ofensividade ou Lesividade permite a tipificação de condutas penais de perigo abstrato. Por sua vez, o Princípio da Alteridade estabelece que ninguém pode ser pu-


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nido por causar mal apenas a si próprio. Por isso, o suicídio ou o uso drogas não constituem crime. Por fim, vale lembrar que o sujeito que corta o próprio braço, com a finalidade de receber determinada quantia pelo seguro, não estará apenas prejudicando a si mesmo, mas também o patrimônio do outro, razão pela qual, sua conduta é criminosa.

4. Princípio da Estrita Legalidade ou Reserva Legal O Princípio da Estrita Legalidade ou Reserva Legal está previsto na Constituição da República, em seu artigo 5º, inciso XXXIX, bem como no artigo 1º do Código Penal e estabelece que ninguém será punido sem lei federal tipificando a conduta. Cumpre esclarecer que é vedada a edição de Medida Provisória sobre matéria relativa à Direito Penal, conforme preceitua o artigo 62, §1º, inciso I, alínea “b”, da Constituição Federal. Em relação à origem história do princípio da estrita legalidade ou reserva legal, cumpre informar que o Rei João Sem-Terra, no ano de 1.215 redigiu a Magna Carta, que continha a previsão de que nenhum homem livre poderia ser submetido a uma pena, sem prévia lei. Ressalte-se que as contravenções penais também se submetem ao Princípio da Estrita Legalidade ou Reserva Legal, conforme disposto no artigo 1º do Decreto-Lei nº 3.688/41 (Lei das Contravenções Penais). Destaca-se, ainda, que o Princípio da Estrita Legalidade ou Reserva Legal possui dois fundamentos, um de ordem jurídica e outro de ordem política. O fundamento jurídico é a taxatividade, ou seja, o tipo penal, ao ser elaborado, precisa ser determinado e certo. Já o fundamento político é a proteção do ser humano contra o arbítrio do Estado.

5. Princípio da Insignificância I O Princípio da Insignificância ou da Criminalidade de Bagatela teve origem no brocardo romano “minimus non curat praetor”, que significa que os juízes não devem se ocupar de assuntos irrelevantes. O grande responsável por introduzir esse princípio no Direito Penal foi o Professor alemão Claus Roxin, em 1970.


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Que de acordo com esse princípio, se um bem jurídico é atingido por uma conduta, mas não é atingido de forma relevante, tem-se a tipicidade formal, mas não a tipicidade material, pois o bem jurídico não foi atingido de forma relevante. Com efeito, pelo Princípio da Insignificância, é feita uma interpretação restritiva da Lei Penal. O Supremo Tribunal Federal entendeu que o Princípio da Insignificância serve para limitar a incidência concreta do Direito Penal. Vale destacar que o princípio ora estudado é uma causa de exclusão da tipicidade e, portanto, o fato se torna atípico. Vejamos agora os quatro requisitos objetivos (e cumulativos) do Princípio da Insignificância (Recurso de habeas corpus 118.972/MG): a) mínima ofensividade da conduta; b) ausência de periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) inexpressividade da lesão jurídica. Já os requisitos subjetivos são: a) condições pessoais do agente; e b) condições pessoais da vítima. Em relação às condições do agente, de acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, é cabível a aplicação do Princípio da Insignificância em caso de reincidência, exceto para reincidência específica. Ainda, para o criminoso habitual, não se admite a insignificância. Quanto às condições da vítima, é preciso analisar a extensão do dano, bem como o valor sentimental do bem.

6. Princípio da Insignificância II O primeiro ponto a ser estudado é quais os crimes não admitem a aplicação do Princípio da Insignificância. São eles: crimes hediondos, racismo, ação de grupos armados contra o Estado Democrático e a Ordem Constitucional, crimes equiparados a hediondos (tráfico, terrorismo e tortura) e genocídio. Quanto aos demais crimes, é necessário analisar o caso concreto, a fim de verificar se é ou não compatível com a aplicação do princípio. Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, em relação ao crime de roubo e demais crimes em que ocorre grave ameaça, não há espaço para a insignificância. Quanto aos crimes contra a Administração Pública, o STF já admitiu ser cabível a aplicação do Princípio da Insignificância, a depender do caso concreto. Em relação à Lei de Drogas, mais precisamente quanto ao porte de drogas para consumo pessoal, o STJ ainda não admitiu a insignificância, porém o STF já


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aplicou este princípio para o artigo 28 da lei. No tocante ao crime de descaminho e crimes tributários, é admitida a aplicação do Princípio da Insignificância. Para o STJ, será insignificante o crime tributário no patamar de até R$10.000,00 (dez mil reais). Para o STF, o limite será de R$20.000,00 (vinte mil reais). Vale destacar que o STF afastou o Princípio da Insignificância do crime de apropriação indébita previdenciária, previsto no artigo 168-A do Código Penal. Dando continuidade à lista de crimes, não se admite a aplicação do Princípio da Insignificância para o crime de contrabando. Em relação aos crimes ambientais, o STF reconheceu a aplicação do princípio em estudo, a depender do caso concreto. Os crimes contra a fé pública, por sua vez, não admitem a aplicação do Princípio. Outrossim, o Princípio da Insignificância também não é aplicado ao crime de tráfico internacional de armas de fogo. Por fim, os atos infracionais (crimes e contravenções praticados por adolescentes), admitem a aplicação deste Princípio, segundo entendimento do STF (HC 112.400). Outro ponto a ser estudado é a diferença entre a bagatela e o furto privilegiado. Isso porque, o privilégio nos crimes contra o patrimônio, de acordo com a jurisprudência, se dá quando o montante é abaixo de R$500,00 (quinhentos reais). Em outras palavras, insignificância retira a tipicidade da conduta (a conduta não é criminosa), já o privilégio é causa de redução de pena (a conduta continua a ser criminosa). A bagatela imprópria não trabalha com a existência do crime, mas sim com a necessidade da pena, sendo uma causa supralegal de extinção da punibilidade.

7. Princípios Penais Fundamentais Relacionados com o Agente. Princípio da Responsabilidade Subjetiva. Princípio da Responsabilidade Pessoal O Princípio da Responsabilidade pelo Fato estabelece que o tipo penal deve definir fatos, sendo proibido punir alguém por seu estereótipo. Não há direito penal do autor, só se admite o direito penal do fato. Um exemplo clássico de direito penal do autor foi a Escola de Kiel (que foi


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sustentada pelo nazismo), em que estava previsto em lei que pelo simples fato de uma pessoa ser da religião judaica, esta poderia ser presa, forçada a trabalhar e, mais adiante, até mesmo morta. O Direito Penal do Inimigo é uma teoria construída pelo jurista alemão Günther Jakobs, através da qual o Estado busca identificar seus inimigos e puni-los, independentemente do que eles possam ter feito ou possam vir a fazer. Trata-se de um sistema penal perseguidor de pessoas, por terem determinadas características e não de fatos praticados. Por sua vez, o Princípio da Responsabilidade Penal Subjetiva estabelece que nenhum resultado penalmente relevante pode ser atribuído a quem não o tenha produzido por dolo ou culpa. É importante destacar que não existe no Brasil a responsabilidade penal objetiva.

8. Princípio da Culpabilidade O Princípio da Culpabilidade também é chamado de Princípio da Imputação Pessoal. Vale destacar que o Direito Penal não pode punir um fato praticado por um agente sem culpabilidade. A previsão, em latim, para o Princípio da Culpabilidade, é “nulla poena sine culpa”, um dos dez axiomas de Luigi Ferrajoli, autor que desenvolveu a Teoria do Garantismo Penal. A culpabilidade pode ser entendida como juízo de reprovação. Contudo, nem sempre um sujeito que praticou o fato típico e ilícito será reprovado, pois existem causas excludentes de culpabilidade. São elementos da culpabilidade: imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa. Na ausência de qualquer dos elementos, não haverá o juízo de reprovação. Quanto à imputabilidade, é necessário salientar que há três categorias de inimputabilidade: os menores de dezoito anos, os doentes mentais e quando ocorrer embriaguez completa e fortuita. Em relação à potencial consciência da ilicitude, existe a questão do erro de proibição, no qual o indivíduo pensa que é lícito o que, na verdade, é ilícito, ou seja, o sujeito não conhece o caráter proibido, ilícito de determinada conduta. Por fim, quanto à exigibilidade de conduta diversa, existe a obediência hierárquica (situação em que o sujeito recebe uma ordem de um agente público, não


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manifestamente ilegal) e a coação moral irresistível.

9. Princípios Penais Fundamentais Relacionados à Pena. Princípio da Legalidade ou Reserva Legal. Princípio da Humanidade. O Princípio da Legalidade da sanção penal se extrai do brocardo “nullum crimen nulla poena sine praevia lege”, que prevêquea pena deve constar expressamente em lei. A pena prevista em abstrato na lei, no momento da condenação do agente, deve ser individualizada pelo Magistrado para que cada pessoa receba uma condenação justa. Assim, para se chegar à pena em concreto, o juiz deve levar em consideração critérios de individualização (critério trifásico, proposto pelo professor Nelson Hungria e previsto no artigo 68 do Código Penal). Vale destacar que o Princípio da Individualização da Pena foi aplicado pelo Supremo Tribunal Federal para acabar com o regime integral fechado dos crimes hediondos, posto que não poderia o Congresso Nacional engessar o trabalho do Juiz de individualizar a pena. O Princípio da Anterioridade das Penas estabelece que não há pena sem lei anterior que a defina. Assim, o sujeito somente poderá receber uma pena criminal se esta já vigorava, no momento da prática do crime. Outro importante princípio é o Princípio da Humanidade das Penas, que possui como pano de fundo a dignidade da pessoa humana, prevista no artigo 1º, inciso III, da Constituição da República. De acordo com esse princípio, as penas devem respeitar a dignidade das pessoas.

10. Princípio da Proporcionalidade O Princípio da Proporcionalidade, também chamado de Princípio da Razoabilidade e de Princípio da Convivência das Liberdades Públicas, estabelece que a criação de tipos penais incriminadores só se justifica se houver vantagem para a sociedade. A origem deste princípio se deu através da Magna Carta do Rei João Sem-Terra, em seus artigos 20 e 21, no ano de 1.215. Este Princípio é uma barreira de limites ao Estado. Vejamos: 1.

Proporcionalidade abstrata: direcionada ao Poder Legislativo (aos legisla-


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dores); 2. Proporcionalidade concreta: direcionada ao Poder Judiciário (aos magistrados); 3. nal.

Proporcionalidade executória: direcionada aos órgãos de execução pe-

Cumpre esclarecer que o legislador, ao criar um tipo penal incriminador, precisa analisar as penas dos demais crimes, bem como as condutas que escolherá tipificar, a fim de que a pena seja proporcional em relação às demais já existentes. A Comissão de Constituição e Justiça fará a análise da proporcionalidade, pois a análise de constitucionalidade é feita no próprio Legislativo. O Presidente da República também analisará a constitucionalidade do dispositivo, no momento da sanção ou veto. O Poder Judiciário, por sua vez, faz a análise tanto no controle difuso, quanto no controle concentrado. Passa-se, agora, ao estudo da dupla face do Princípio da Proporcionalidade. A primeira face é a proibição do excesso, vez que não é possível escolher uma pena para um crime se esta for excessiva em relação à conduta praticada. Salienta-se que a proibição do excesso já foi reconhecida pelo STJ (AI no HC 239.363, de 2015 – Informativo 559). O Superior Tribunal de Justiça entendeu que a pena do crime de falsificação de medicamento (reclusão de dez a quinze anos) é inconstitucional e acabou por utilizar a pena do tráfico de drogas para este crime. Por outro lado, a segunda face é a proibição da insuficiência da proteção aos bens jurídicos.


Capítulo 2

Teoria da Norma Penal

1. Fontes do Direito Penal Existe uma fonte material e uma fonte formal do Direito Penal. A fonte material, também chamada de fonte substancial ou fonte de produção, diz respeito ao órgão responsável pela elaboração da norma penal. Observa-se que o art. 22, I, da Constituição Federal, dispõe que compete privativamente à União legislar sobre Direito Penal, dentre outras matérias. A fonte formal, chamada também de fonte de conhecimento ou de fonte de cognição, diz respeito ao modo pelo qual se exterioriza o Direito Penal. A fonte formal imediata é a lei penal. Outras fontes formais são mediatas, como os costumes, os princípios gerais do Direito e o ato administrativo.

Exercício 1.

(Funcab – Delegado de Polícia – ES/2013) A Presidente da República editou uma Medida Provisória, agravando a pena de um determinado crime. Logo, pode-se afirmar:

I. Trata-se de lei em sentido formal.

II. Pelo princípio da retroatividade benéfica, a Medida Provisória somente poderá ser aplicada a fatos posteriores à sua edição.

III. A agravação da pena somente poderá ocorrer após a aprovação da Medida Provisória pelo Congresso Nacional.

IV. Apresenta vício de origem que não convalesce pela sua eventual aprovação.

Indique a opção que contempla a(s) assertiva(s) correta(s). a) I, II, III e IV. b) I, II e III, apenas.


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c) II, III e IV, apenas. d) I, apenas. e) IV, apenas.

2. Lei Penal x Norma Penal É preciso entender a estrutura da lei penal. Existe o chamado preceito primário, que é a descrição da conduta incriminadora e o denominado preceito secundário, que traz a cominação da pena. Existe uma posição clássica (Binding) no sentido de que lei não é o mesmo que norma. Lei seria regra escrita elaborada pelo legislador, possuindo o objetivo de positivar condutas consideradas nocivas à sociedade. Já a norma seria o mandamento de uma conduta normal, advindo do sentido de justiça que possui determinado segmento social. A lei penal descreve a conduta proibida, ao passo que a norma violada pelo criminoso é alheia ao Direito Penal. A Teoria Clássica de Binding é considerada hoje superada, já que quando o agente infrator incorre em um tipo penal, descumpre tanto a lei quanto a norma.

Exercício 2.

(Vunesp – 2013 – TJ/RJ – Juiz) Tempo e lugar do crime são temas fundamentais para a adequada aplicação da lei penal. Considerando essa afirmação, assinale a alternativa correta: a) Em avião de empresa privada argentina, que fazia o voo Buenos Aires (Argentina) – Lima (Peru), passageiro argentino golpeou um peruano, que desmaiou. O comandante da aeronave, que estava em espaço aéreo internacional, desviou-a e pousou em Campo Grande – MS, para atendimento ao ferido. A lei penal brasileira será aplicada ao caso. b) A lei penal mais grave aplica-se ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da permanência. O mesmo não se pode dizer relativamente ao crime continuado. c) O crime considera-se praticado no lugar em que ocorreu a conduta, no todo ou em parte, bem como onde se produziu o resultado. Se, porém, o resultado não chegar a ser atingido, considerar-se-á o lugar do último ato de execução.


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d) Aplica-se ao fato a lei penal em vigor ao tempo da conduta, exceto se a do tempo do resultado, ou mesmo a posterior a ele, for mais benéfica ao agente.

3. Classificação das Leis Penais É preciso estudar a classificação das leis penais. Primeiramente, têm-se as leis penais incriminadoras, aquelas que criam crimes e cominam penas. Há também as leis penais não incriminadoras que, por sua vez, não criam crimes e nem cominam penas, e se dividem em: permissivas; exculpantes; interpretativas; complementares; e integrativas. As leis penais não incriminadoras permissivas autorizam a prática de condutas típicas. Exemplo: legítima defesa. Já as leis penais exculpantes estabelecem a inculpabilidade do agente ou a impunidade de determinados delitos. Exemplo: prescrição. As leis penais não incriminadoras interpretativas esclarecem o conteúdo de outras leis penais. As leis penais complementares, por sua vez, delimitam o campo de validade das leis incriminadoras. Já as leis penais integrativas são aquelas que complementam a tipicidade de certos fatos. Exemplo: tentativa. As leis penais completas ou perfeitas são as que apresentam todos os elementos da conduta típica. As leis penais incompletas são aquelas que reservam a complementação do tipo para outra lei, para o ato administrativo ou para o juiz.

Exercício 3.

(Cespe – 2012 – TJRO – Técnico Judiciário) A lei temporária, decorrido o período de sua duração, não mais se aplica aos fatos praticados durante sua vigência. Certo ou errado?

4. Leis Penais em Branco – Normas Penais em Branco ao Avesso Na norma penal em branco ao avesso, o que está invertido é o preceito secundário, aquele que contém a pena.


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Cumpre esclarecer que as leis penais em branco são também chamadas de normas cegas. Importante salientar que Karl Binding entendia que se trata se um corpo errante em busca de sua alma. Retornando às normas penais em branco ao avesso, observa-se que o complemento se dará por meio de outra lei (princípio da reserva legal). Exemplo de norma penal em branco ao avesso: “Art. 304. Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302: Pena – a cominada à falsificação ou à alteração.”

Exercício 4.

(Cespe – 2011 – DPE-MA – Defensor Público) Na norma penal em branco ao avesso, o preceito secundário fica a cargo de norma complementar, que, de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, pode ser legal ou infralegal. Certo ou errado?

5. Normas Penais em Branco Homogêneas – Homovitelíneas e Heterovitelíneas Já foi estudada a primeira classificação, qual seja, a norma penal em branco ao avesso. A segunda classificação diz respeito às normas penais em branco homogêneas, as quais se subdividem em homogêneas homovitelíneas e homogêneas heterovitelíneas. Em se tratando de norma penal em branco homogênea, faz-se necessário esclarecer que o complemento advém do mesmo órgão que criou a lei penal. Observa-se que será homovitelínea quando a lei penal for complementada por lei penal. Ademais, será heterovitelínea quando a lei penal for complementada por uma lei extrapenal, como uma norma de Direito Civil, por exemplo.

Exercício 5.

(Cespe – 2011 – DPE-MA – Defensor Público) O complemento da norma penal em branco considerada em sentido estrito provém da mesma fonte


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formal, ao passo que o da norma penal em branco considerada em sentido lato provém de fonte formal diversa. Certo ou errado?

6. Normas Penais em Branco Heterogêneas O sinônimo da norma penal em branco heterogênea é a em norma penal em sentido estrito. O complemento advém de órgão diverso daquele que criou a lei penal. Não há mesma hierarquia, havendo uma hierarquia diversa. Norma penal em branco é considerada um ato administrativo complementando a lei. Na Lei de Drogas (art. 33 da Lei nº 11.343/2006), é preciso ter um instrumento normativo que determine o que é droga e o que não é para que haja segurança jurídica, ou seja, um ato administrativo complementa uma lei, como: a Portaria nº 344/98, a qual diz quais são as drogas de uso proibido no Brasil. Trata-se de um ato administrativo representado pela Portaria que vai complementar a Lei de Drogas. Há necessidade de complementação porque, em caso de normas heterogêneas, são incompletas, portanto, é preciso definir exatamente os termos a serem cumpridos pelas leis, o uso restrito ou proibido, a maneira, os tipos e demais caracteres necessário para que haja segurança jurídica.

Exercício 6.

(Ceperj – 2010 – Sefaz/RJ – Oficial de Fazenda) No Direito Penal, a necessidade de a norma ser complementada por outra de nível diverso denomina-se: a) Norma penal em branco em sentido amplo. b) Norma penal em branco em sentido estrito. c) Norma penal não incriminadora. d) Norma penal regulamentar. e) Normal penal especial.

7. Mandados Constitucionais de Criminalização Não é tarefa para o legislador constituinte definir crimes e cominar penas, pois estaria vinculado a tal obrigação e caso não a cumprisse poderia contra ele ingressar com ADIn por omissão. Porém, isto é tarefa do legislador infraconstitucional e a


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CF nos diz no art. 22, I, que essa função é do Poder Legislativo da União. Algumas constituições modernas trazem mandados de criminalização, ou seja, obrigam que esta tarefa seja imputada ao legislador infraconstitucional. Há um dilema moderno quanto à vinculação ou não do constituinte em relação a esta determinação da Constituição. Alguns dizem sim, pois havendo a obrigação da CF que tal coisa tem que virar crime, o legislador estaria obrigado. Outros dizem que o legislador infraconstitucional não perde a sua autoridade, tendo que analisar se há ou não necessidade de tutela penal para aquele assunto. Mandados constitucionais expressos (obrigações que são imputadas ao legislador infraconstitucional) ocorrem no caso em que a Constituição determina a criação de regulamentação para certos crimes, como o art. 5º, XLIII, que dispõe que a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura. Diante disto, o legislador infraconstitucional após a edição da CF de 1988, editou nos anos de 1990, 1997 e 2006 as respectivas leis dos crimes hediondos, de tortura e lei de drogas, obedecendo então a este mandamento constitucional, enquanto que os mandados constitucionais implícitos, que decorrem do nosso sistema de proteção dos direitos humanos (direito à vida), são mandamentos que servem como premissas éticas para que o legislador infraconstitucional assim proceda.

Exercício 7.

(Cespe – 2013 – BA – Policia Civil) A previsão constitucional da prática de tortura como crime inafiançável e insuscetível de graça ou anistia expressa um dever de proteção identificado pelo constituinte e traduz-se em mandado de criminalização dirigido ao legislador. Certo ou errado?

8. Interpretação das Leis Penais Há várias formas de interpretação da lei penal, sendo a primeira delas, quanto à origem ou quanto ao sujeito, divididas em: a) autêntica: é a realizada pelo próprio legislador que pode fazê-lo no corpo da mesma lei que está sendo interpretada ou até editar uma lei seguinte para esclarecer o conteúdo da que se está interpretando; b) judiciária ou jurisprudencial: é a realizada pelos juízes e tribunais quando analisam a lei ao caso concreto; c) doutrinária: é a realizada pela doutrina, ou seja, realizada pelos estudiosos do direito.


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Quanto aos meios, as interpretações podem ser: a) gramatical ou literal: verifica-se o significado literal das palavras; b) lógica: busca o sentido da lei utilizando raciocínio lógico; c) teleológica: busca a finalidade da lei pelas teorias a respeito do pós-finalismo (teoria constitucionalista do crime, teoria funcionalista, etc.); d) sistemática: investiga a coerência entre a lei interpretada e as demais leis que compõem o sistema (sistema é um todo e perfeito); e) histórica: investiga as condições e os fundamentos de sua origem. Quanto ao resultado: a) declarativa: a letra da lei corresponde ao seu sentido ou significado; b) restritiva: letra da lei diz mais do que o seu real sentido; c) extensiva: a letra da lei diz menos do que o seu real sentido, quer buscar a real acepção daquela norma.

Exercício 8.

(Cespe – 2013 – TRF 2ª Região – Juiz Federal) A interpretação extensiva é admitida em direito penal para estender o sentido e o alcance da norma até que atinja sua real acepção. Certo ou errado?

9. Analogia O art. 4º da LINDB dispõe que quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e princípios gerais de direito, ou seja, são modos de integração e não de interpretação, porque não há lei, devendo buscar outra para fazer a integração. A analogia legal tem por base outra disposição legal que regula caso semelhante. A analogia jurídica tem por base um princípio geral de direito. Portanto, a analogia propriamente dita é aquela que traz uma lei que regulamenta um caso semelhante. Caso a aplicação analógica seja em benefício do réu, denomina-se analogia in bonam partem, a qual não restringe a sua aplicação, mas a amplia. Se a aplicação analógica foi em malefício do réu, será denominada analogia in malam partem, porém, cumpre ressaltar que essa modalidade foi vetada, não podendo ser mais aplicada. Além do mais, em algumas hipóteses, o juiz percebendo que qualquer penalização do agente se mostra desnecessária em face do que ocorreu, poderá deixar


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de aplicar a pena, por meio do perdão judicial – tecnicamente é causa de extinção da punibilidade. Importante não confundir analogia com interpretação analógica, pois o texto de lei abrange uma cláusula casuística seguida de uma cláusula genérica, sendo que esta deve ser interpretada e compreendida segundo os casos análogos descritos (fórmula casuística) – ex.: art. 121, § 2º, IV, do CP. Na analogia, não há lei; na interpretação, há. A analogia é somente a favor do réu, enquanto que a interpretação analógica é a favor ou contra o réu.

Exercício 9.

(Cespe – 2012 – TJ/RO – Técnico Judiciário) A lei penal admite a realização de interpretação analógica pelo legislador, como, por exemplo, ao dispor que os crimes serão qualificados se cometidos com o emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel. Certa ou errada?

10. Lei Penal no Tempo – Vigência e Revogação O início da lei penal ocorre com iniciativa de projeto de lei, sendo comum ou concorrente, cabendo a qualquer membro do Congresso ou Chefe do Executivo. Em tese, é possível à iniciativa popular no que se refere à propositura de projetos de lei penal. Fase de deliberação ocorre com a discussão e votação do projeto de lei em cada uma das casas do Congresso e depois há deliberação executiva (sanção ou o veto) do Presidente da República; após ocorre a promulgação e publicação. Entra em vigor a partir da data da publicação, mas, se houver omissão a respeito, passará a viger nos 45 dias (art. 1º da LINDB). Pelo princípio da continuidade das leis, ela permanece em vigor até que outra a revogue. Revogação total será ab-rogação; parcial será derrogação. Leis que têm uma vigência temporária se autorrevogam.

Exercício 10. (MPE-PR – 2012 – Promotor de Justiça) Sobre a teoria da lei penal, assinale a alternativa correta: a) Nova lei penal altera a modalidade de ação penal a determinado crime, de pública incondicionada para pública condicionada à representação, o princípio da irretroatividade impede que crimes praticados


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anteriormente à vigência da nova lei sejam iniciados por ação penal pública condicionada à representação. b) O CP brasileiro adotou a teoria da ubiquidade para definir o lugar do crime. c) A alteração da redação do art. 109, VI, do CP, pela Lei nº 12.234/10, determinando a elevação do lapso temporal mínimo de prescrição, de 2 para 3 anos, para crimes com pena máxima inferior a 1 ano, aplica-se à prática de crimes anteriores à sua vigência. d) Se nova lei penal descriminaliza conduta anteriormente tipificada como crime, a abolitio criminis atinge as ações penais em curso relativas ao crime abolido, mas não atinge sentenças condenatórias transitadas em julgado sobre o mesmo crime. e) As normas penais em branco dependem de complementação por atos legislativos ou administrativos para perfectibilizar a tipicidade, como ocorre com todos os tipos culposos e de omissão de ação imprópria.

11. Tempo do Crime As teorias que explicam o tempo do crime são três: a Teoria da Atividade que diz que o crime é praticado no momento da atividade, ou seja, o crime é praticado no momento da ação ou da omissão; a Teoria do Resultado nos diz que o crime é praticado no momento da produção do resultado; a Teoria da Ubiquidade é a mista que fala que o crime é praticado tanto na atividade quanto na produção do resultado. O Código Penal vai optar expressamente pela primeira (art. 4º). A diferença entre crime instantâneo e crime permanente é que no primeiro a consumação se verifica no momento determinado (homicídio) e no segundo a consumação se protrai no tempo (cárcere privado). Mesmo o crime sendo instantâneo ou permanente aplica-se a Teoria da Atividade. A Súmula nº 711 do STF diz que a lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a vigência da Lei for anterior à cessação da continuidade do crime ou da permanência.

Exercício 11. (MPE-PR – 2013 – Promotor Substituto) O adolescente Semprônio, um dia antes de completar 18 anos, querendo ainda aproveitar-se de sua inimputa-


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bilidade, desfere tiros contra a vítima Heráclito, que somente vem a falecer uma semana após. Neste caso, graças à adoção da teoria do resultado pelo nosso Código Penal, Semprônio não se verá livre de responder pelo crime de homicídio. Certo ou errado?

12. Conflito de Leis no Tempo – Lex Mitior – Princípio da Extra-atividade – Novatio Legis in Mellius Vamos começar a trabalhar, nesta unidade, os conflitos de lei, ou seja, situações em que há mais de uma lei aparentemente aplicável a um caso concreto (e, aparentemente, porque sempre haverá uma forma de resolver tal “conflito”). A regra é: aplica-se a lei que está vigente ao tempo do fato (tempus regit actum). Mas a exceção ocorre na lex mitior, ou seja, lei posterior que de qualquer forma melhora a situação do réu (mais benéfica) é aplicada. Trata-se de aplicação do art. 5º, XL, da CF: a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu. Assim, a lex mitior é orientada pelo princípio da extra-atividade: a lei penal pode ser aplicada para fatos anteriores à sua vigência (retroatividade) ou poderá ter seus efeitos estendidos para além da sua vigência (ultra-atividade). Veja o exemplo: em 2006, houve uma alteração no tratamento do tráfico de drogas. Até então, o tráfico era previsto na Lei nº 6.368/1976. Atualmente, a lei que regula o tráfico é a Lei nº 11.343/2012. Se, por acaso, falarmos de um fato praticado em 2005, como tratar? A lei de 1976 é aplicada hoje (ultra-atividade) ou a lei atual é aplicada no passado (retroatividade)? A lei aplicada será a mais benéfica, independentemente do ano em que foi editada a norma (veremos posteriormente qual é a mais benéfica no caso acima); mas o exemplo deixa claro o princípio da extra-atividade da lei penal. Importante falarmos ainda da novatio legis in mellius, que é uma espécie de lex mitior. É a lei que, de qualquer forma, melhora a vida do réu. Veja por exemplo a Lei nº 9.714/1998 que traz a regulamentação das penas restritivas de direito. Trata-se de lei melhor para o réu, mas sem abolir o crime.

Exercício 12. (Cespe – TRT 8ª Região – PA e AP – Analista Judiciário – 2013) Lei posterior não se aplica a fatos anteriores já decididos por sentença condenatória transitada em julgado, em respeito absoluto e irrestrito à coisa julgada.


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13. Abolitio Criminis Na abolitio criminis, uma nova lei descriminalizadora é criada posteriormente; sua natureza jurídica é causa de extinção da punibilidade, de acordo com disposição do art. 107, III, do Código Penal. A Lei nº 11.106/2005 configura um exemplo de abolitio criminis, determinando a inexistência de três figuras, até então, típicas: o crime de sedução; o rapto consensual; e o adultério. O Código Penal é taxativo ao dispor no art. 2º que ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Estabelece, ainda, que a lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. Dessa forma, a lei retroage para abarcar fatos que já estão decididos, sempre em favor do réu. Cessando todos os efeitos penais, o réu não será considerado reincidente, seu nome não constará mais no rol dos culpados, podendo receber benefícios penais como a transação. Lembra-se que não cessam os efeitos civis, estando o réu obrigado a reparar o dano. A Súmula nº 611 do STF informa que, transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao Juízo das Execuções a aplicação de lei mais benigna.

Exercício 13. (Esaf – 2012 – Receita Federal – Auditor Fiscal) Considerando a legislação, a doutrina e a jurisprudência a respeito da aplicação da lei penal no tempo, com relação ao instituto da abolitio criminis, analise as assertivas abaixo e assinale a opção correta: a) A abolitio criminis pode ser aplicada para delitos tributários. b) A lei penal pode retroagir para prejudicar o réu já condenado em trânsito em julgado e tal instituto denomina-se abolitio criminis. c) A obrigação de indenizar o dano causado pelo crime, oriunda de efeito da condenação penal, desaparece com a abolitio criminis. d) Instituto da abolitio criminis não é aceito pela jurisprudência do STF.


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14. Princípio da Continuidade Normativo-típica A abolitio criminis representa uma revogação total do tipo penal, compreendendo uma revogação formal e substancial, suprimindo de todo o ordenamento jurídico o comportamento que antes era criminoso. Pelo princípio da continuidade normativo-típica, temos a revogação meramente formal do tipo penal, ou seja, a readequação típica. Um exemplo da readequação típica tem previsão no art. 219 do CP, para o crime de rapto violento ou mediante fraude, revogado pela Lei nº 11.106/2005. Essa foi a mesma lei que adicionou o inciso V ao art. 148, § 1º, do CP, que prevê como crime privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado, prevendo uma qualificadora para a mesma prática, porém, com finalidade libidinosa. Vale frisar que, nessa hipótese, não houve abolitio criminis para a prática da conduta de rapto violente ou mediante fraude. Para que haja a revogação dos efeitos penais, a revogação precisa ser formal e substancial. O mesmo raciocínio deve ser feito para o atentado violento ao pudor descrito no art. 214 do CP que foi revogado pela Lei nº 2015/2009. Porém, essa mesma lei alterou a redação do art. 213, incluindo a conduta que antes era considerada como ato libidinoso (revogação formal sem abolitio criminis).

Exercício 14. (2013 – TJ/SC – Juiz – SC) A revogação do crime de atentado violento ao pudor previsto no art. 214 do Código Penal pela Lei nº 12.015/2009 implica na ocorrência da chamada abolitio criminis. Certo ou errado?

15. Lex Gravior A lex gravior é gênero do qual decorrem duas espécies: a novatio legis incriminadora e a novatio legis in pejus. Na hipótese da novatio legis incriminadora, surge uma lei nova incriminando conduta que antes era atípica, como o art. 154-A do CP, que cria uma previsão a partir da Lei Carolina Dieckmann. Já a novatio legis in pejus surge para piorar a situação do réu. A situação do réu pode ser agravada de diversas formas: por aumento de pena, criando uma qualificadora, impedindo a concessão da fiança ou da anistia, graça e indulto.


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Um exemplo de novatio legis in pejus é a Lei de Crimes Hediondos – nº 8.072/1990. Pode também ocorrer o aumento da prisão temporária de 5 para 30 dias, permitindo a renovação desse prazo, caso haja justificação por parte da autoridade policial. A lex gravior é dotada de não extra-atividade. Este termo genérico representa a irretroatividade e a não ultra-atividade. A Súmula nº 711 do Supremo Tribunal Federal informa que a lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.

Exercício 15. (Cespe – 2013 –TJ/RR – Titular de Serviços de Notas e Registros) De acordo com o STF, nas hipóteses de crime continuado ou de crime permanente, a lei penal mais grave não pode ser aplicada, ainda que vigente antes da cessação da continuidade ou da permanência. Certo ou errado?

16. Lei Processual Penal – Normas Híbridas A lei penal não deve ser confundida com a lei processual penal, já que a regra do tempus regit actum, com exceção da lex mitior, é uma regra que somente se aplica à lei penal. O art. 2º do Código de Processo Penal dispõe que “a lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior”. Neste sentido, a lei processual penal se rege pelo princípio da imediatidade, sendo aplicada desde logo. Observa-se, no entanto, que existem normas que são mistas, denominadas normas híbridas. Trata-se de lei que possui conteúdo tanto de Direito Penal quanto de Direito Processual Penal. O art. 366 do CPC estabelece que “se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312”.


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Nota-se que suspensão de prescrição é matéria penal e não processual penal. Referido artigo também menciona a suspensão do processo, matéria de Direito Processual. Assim, é possível observar que o dispositivo mencionado é uma norma híbrida. Cumpre ressaltar que o entendimento jurisprudencial é de que se a lei é mista, se a parte penal é vantajosa ao réu, toda a norma híbrida retroage.

Exercício 16. (FUJB – 2011 – MPE-RJ – Analista – Processual) No direito penal, o problema da sucessão das leis no tempo é resolvido segundo a garantia constitucional de que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu (CRFB, art. 5º, XL). Já no campo processual penal, a norma geral de direito intertemporal encontra-se prevista no art. 2º do CPP, disciplinando que a lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior. Assim, quanto ao tema “sucessão de leis penais e processuais penais”, é correto afirmar que no campo processual penal adota-se, como regra, o princípio tempus regit actum, que se imiscui com a ideia de retroatividade da lei processual.

17. Lex Tertia – Tráfico Privilegiado O primeiro ponto a ser indagado aqui é se o juiz pode combinar dispositivos. Destaca-se que somente pode haver referida combinação se esta favorecer o réu. Há duas posições acerca deste assunto. A primeira, defendida por Frederico Marques e Rogério Grego, é favorável à lex tertia, da combinação de leis. Tais autores fundamentam a posição no princípio de hermenêutica de quem pode o mais pode o menos. Contrários à lex tertia, podem ser mencionados os autores Fragoso e Hungria, que entendem que o juiz estaria legislando, ou seja, se o juiz considera um ponto de uma lei e outro ponto de outra, estaria construindo uma terceira lei. A Lei nº 11.343/2006, lei atual de drogas, criou uma causa de diminuição de pena, que não havia na lei anterior. Indaga-se se esta causa pode retroagir e atingir um sujeito que, por exemplo, tenha praticado crime de tráfico em 2005. É necessário lembrar que, na lei anterior, a pena era menor, pois previa somente três anos, enquanto a lei atual prevê uma pena de cinco anos. Assim, indaga-se se poderia haver uma combinação entre os dois dispositivos, de forma a beneficiar o réu.


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Sobre este assunto, o Pleno do STF se manifestou contrário à lex tertia. Ademais, a Súmula nº 501 do STJ dispõe: “É cabível a aplicação retroativa da Lei nº 11.343/06, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei nº 6.368/76, sendo vedada a combinação de leis.”

Exercício 17. (Cespe – 2012 – TJPI – Juiz) Desde que em benefício do réu, a jurisprudência dos tribunais superiores admite a combinação de leis penais, a fim de atender aos princípios da ultratividade e da retroatividade in mellius.

18. Lex Tertia: Estupro de Vulnerável Antes do advento da Lei nº 12.015/2009, o art. 213 do Código Penal trazia como pena mínima seis anos. Ainda, antes do diploma legal acima referido, estava vigente o art. 224. Depois da Lei nº 12.015/2009, dispõe o art. 215-A do Código Penal: “Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.” Se o fato tiver sido praticado antes da alteração da lei, aplica-se o art. 213, combinado com o art. 224, mas também combinado com o art. 9º da Lei dos Crimes Hediondos. Nota-se que esta pena ficará maior do que a pena prevista no atual art. 217-A. Desta forma, é possível observar que a lei atual é mais benéfica neste particular.

Exercício 18. (Cespe – 2013 – TJDF – Técnico Judiciário) De acordo com o Código Penal, considera-se praticado o crime no momento em que ocorreu seu resultado. Certo ou errado?

19. Lei Excepcional e Lei Temporária A lei excepcional é aquela que possui vigência excepcional, durante um prazo excepcional. Exemplo: uma lei que surge durante estado de sítio ou diante de calamidades públicas.


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A lei penal temporária é uma lei que possui vigência previamente determinada. A chamada Lei Geral da Copa, Lei nº 12.663/2012, é exemplo de uma lei temporária. Trata-se de uma lei que inclusive cria crimes e comina penas. Cumpre esclarecer, ainda, que as leis temporárias, bem como as leis excepcionais, são autorrevogáveis, fato que foge à regra estabelecida na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB). Além da autorrevogação, outra característica das leis penais temporárias e excepcionais é a ultra-atividade.

Exercício 19. (Cespe – 2011 – CBM-DF) Considere que, durante a copa do mundo de futebol no ano de 2014, o Congresso Nacional publique lei temporária, com vigência apenas durante o evento desportivo, tipificando como conduta criminosa a venda de ingressos por preços superiores aos comercializados pela Confederação Brasileira de Futebol, no intuito de evitar a ação de cambistas. Considere, ainda, que José seja preso em flagrante vinte dias antes do fim do evento por infringir o mencionado tipo penal. Nessa situação hipotética, as autoridades competentes terão de punir José no prazo máximo de vinte dias, pois, passado esse período, a lei temporária deixa de vigorar, não podendo retroagir para prejudicar o acusado. Certo ou errado?

20. Norma Penal em Branco Heterogênea e Princípio da Retroatividade As normas penais em branco podem ser homogêneas ou heterogêneas. São homogêneas quando o complemento advém de lei e heterogêneas quando o complemento advém de ato administrativo. Dependendo da natureza do complemento, o ato administrativo pode ou não retroagir. Se o complemento tiver natureza de anormalidade, de excepcionalidade, não retroagirá. Se o complemento tiver uma natureza normal, estável, aplica-se a regra geral, ou seja, regra da retroatividade.


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Exercício 20. (Cespe – 2013 – TC-DF – Procurador) De acordo com o CP, com relação à sucessão das leis penais no tempo, não se aplicam as regras gerais da irretroatividade da lei mais severa, tampouco a retroatividade da norma mais benigna, bem como não se aplica o preceito da ultra-atividade à situação caracterizada pela chamada lei penal em branco. Certo ou errado?

21. Polêmica a Respeito do Cloreto de Etila Primeiramente, observa-se que o cloreto de etila é o princípio ativo do “lança-perfume”. A Lei de Drogas é uma norma penal em branco heterogênea, já que seu complemento vem por um ato administrativo. O cloreto de etila sofreu uma nova classificação, tendo sido colocado no rol de insumos químicos. Ocorre que tal fato teria criado uma abolitio criminis. Assim, depois de muita discussão, referida substância foi inserida novamente no rol de substâncias proibidas. Acerca deste assunto, o STF entendeu que o período em que a substância foi retirada da lista de substâncias psicotrópicas de uso proscrito, tornou atípicos o uso e tráfico da substância aqui estudada. No entanto, o STJ entendeu que o ato regulamentar foi inválido, não ocorrendo, portanto, abolitio criminis.

Exercício 21. (Funcab – 2013 – PC-ES – Delegado de Polícia) A Portaria nº 104/2011, do Gabinete do Ministério da Saúde, definiu a relação de doenças de notificação compulsória em todo o território nacional. Joaquim, médico, ao tomar conhecimento de um paciente que estava com uma patologia descrita na referida normativa, por amizade ao mesmo, não comunicou a doença aos órgãos competentes, motivo pelo qual, ao ser descoberto tal fato, foi processado criminalmente. Na hipótese de antes do julgamento, ser editada nova normativa, retirando a referida patologia do rol de doenças de notificação compulsória, pode-se afirmar que deve incidir a retroatividade do abolitio criminis, considerando que se alterou a matéria da proibição.


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22. Lei Penal no Espaço – Princípio da Territorialidade O art. 5º, caput, do Código Penal dispõe: “Art. 5º Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional.” Nota-se que o referido dispositivo traz exceção, pois se houver convenções, tratados e regras de direito internacional em sentido contrário, não será aplicado o princípio da territorialidade. O Decreto nº 4.388, de 2002, promulgou o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. Hoje, como crimes internacionais passíveis de punição, têm-se: genocídio; crimes contra a humanidade; e crimes de guerra. A interterritorialidade é a aplicação de lei estrangeira, por autoridade de outro país, a crime ocorrido no território nacional. O princípio adotado no Brasil é o princípio da territorialidade temperada (ou relativa ou mitigada), pois não é absoluto.

Exercício 22. (Funcab – 2013 – PC-ES – Escrivão de Polícia) O marinheiro Jonas matou seu colega de farda a bordo do navio-escola NE Brasil, da Marinha Brasileira, quando o navio estava em águas sob soberania do Japão. Assim: a) A lei penal brasileira será aplicada ao caso, em razão do princípio da territorialidade. b) A lei penal brasileira será aplicada ao caso, em razão do princípio do pavilhão. c) A lei penal brasileira será aplicada ao caso, em razão do princípio da justiça universal. d) A lei penal brasileira será aplicada ao caso, em razão do princípio da defesa. e) A lei penal japonesa será aplicada ao caso, em razão do crime ter ocorrido em águas sob soberania do Japão.

23. Território Nacional e Mar Territorial Território nacional, em seu sentido jurídico, é o espaço sujeito à soberania do Estado.


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Em sentido material, o território nacional é a superfície terrestre, águas territoriais e espaço aéreo correspondente. Quando se fala em superfície terrestre, fala-se em solo e subsolo. Quando se fala em espaço aéreo correspondente, fala-se na teoria da soberania sobre a coluna atmosférica. O território nacional por extensão ou flutuante são as embarcações e as aeronaves, por ficção legal. Dispõe o § 1º do art. 5º: “§ 1º Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar.” O § 2º, por sua vez, estabelece: “§ 2º É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil.”

Exercício 23. (FCC – 2012 – MPE-PE – Analista Ministerial) NÃO se aplica, em regra, a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de: a) Barco mercante estrangeiro de propriedade privada em águas territoriais brasileiras. b) Navio de cruzeiro de propriedade de empresa estrangeira em águas territoriais brasileiras. c) Aeronave brasileira a serviço do governo brasileiro em espaço aéreo estrangeiro. d) Barco pesqueiro brasileiro de propriedade particular em águas territoriais estrangeiras. e) Aeronave comercial estrangeira em voo no espaço aéreo brasileiro.

24. Lugar do Crime Em relação ao lugar do crime, há três teorias: atividade; resultado; e ubiquidade (ou mista ou unitária).


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De acordo com a teoria da atividade, o crime foi praticado no lugar da ação ou omissão. De acordo com a teoria do resultado, o crime foi praticado no lugar da produção do resultado. De acordo com a teoria da ubiquidade, o crime foi praticado tanto no lugar da conduta quanto no lugar da produção do resultado. No Brasil, das três teorias, adota-se a terceira, nos termos do art. 6º do Código Penal. Ocorre crime a distância quando a conduta é praticada em um país e o resultado ocorre em outro país. Já o crime plurilocal ocorre quando a conduta é praticada em uma comarca e o resultado ocorre em outra, sendo ambas do mesmo país. Sobre este aspecto, é preciso observar o disposto no art. 70, caput, do Código de Processo Penal. Exceção: em caso de homicídio, aplica-se a teoria da atividade (local da conduta).

Exercício 24. (FCC – 2013 – AL-PB – Procurador) No direito brasileiro, o lugar do crime define-se pela teoria: a) Da equidistância. b) Do efeito intermédio. c) Da ubiquidade. d) Monista. e) Vicariante.

25. Extraterritorialidade – Contravenções Penais – Extraterritorialidade Incondicionada A extraterritorialidade é a aplicação da lei brasileira a crimes cometidos em território estrangeiro. É preciso estudar o tema que diz respeito às contravenções penais. O art. 2º da Lei de Contravenções Penais dispõe que a lei brasileira só é aplicável à contravenção praticada no território nacional. Assim, é possível observar que o instituto da extraterritorialidade não se aplica à contravenção penal. Sobre a extraterritorialidade incondicionada, é preciso observar a redação do art. 7º, I, e § 1º, do Código Penal. Nota-se que, como o próprio nome diz, não há condição alguma e, por isso, a denominação de extraterritorialidade incondicionada.


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Exercício 25. (Esaf – 2010 – MTE – Auditor Fiscal do Trabalho) Camargo, terrorista, tenta explodir agência do Banco do Brasil, na França. Considerando o princípio da extraterritorialidade incondicionada, previsto no Código Penal brasileiro, é correto afirmar que: a) Camargo só pode ser processado criminalmente na França. b) O Estado brasileiro não tem interesse em delitos ocorridos fora do Brasil. c) Caso Camargo tenha sido condenado e encarcerado na França, não poderá ser preso no Brasil. d) O fato deve ser julgado no local onde ocorreu o crime: na França. e) Mesmo Camargo tendo sido julgado na França, poderá ser julgado no Brasil.

26. Extraterritorialidade Condicionada – Extraterritorialidade Hipercondicionada O art. 7º, II, do Código Penal, traz hipóteses da extraterritorialidade condicionada. O § 2º do art. 7º dispõe que, nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições: entrar o agente no território nacional; ser o fato punível também no país em que foi praticado; estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena; não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo; e não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável. Faz-se necessário reiterar que as cinco condições devem estar presentes para aplicação da lei brasileira. A extraterritorialidade hipercondicionada está prevista no § 3º do art. 7º: “§ 3º A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior: a) não foi pedida ou foi negada a extradição; b) houve requisição do Ministro da Justiça.”

Exercício 26. (Cespe – 2013 – TRT – 8ª Região (PA e AP) – Analista Judiciário) No que diz respeito à lei penal, assinale a opção correta:


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a) Lei posterior não se aplica a fatos anteriores já decididos por sentença condenatória transitada em julgado, em respeito absoluto e irrestrito à coisa julgada. b) Pela lei brasileira, o território nacional estende-se a aeronaves e embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, onde quer que se encontrem. c) Preenchidos os requisitos legais, é possível que a lei penal brasileira seja aplicada ao estrangeiro que cometa crime fora do território nacional, sendo a vítima brasileira. d) No que se refere ao tempo do crime, adota-se, no Código Penal brasileiro, a teoria do resultado. e) A lei excepcional, cessadas as circunstâncias que a determinaram, deixa de ser aplicável ao fato ocorrido durante sua vigência.

27. Lei de Tortura – Princípios Norteadores da Extraterritorialidade Primeiramente, é preciso lembrar que a regra é a territorialidade temperada e o princípio da extraterritorialidade é a exceção. A Lei de Tortura (Lei nº 9.455/1997) estabelece em seu art. 2º: “Art. 2º O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira.” É preciso estudar também os princípios norteadores da extraterritorialidade. O princípio da nacionalidade ou da personalidade traz que se aplica a lei da nacionalidade do agente. O princípio da proteção ou da defesa traz que se aplica a lei do bem jurídico tutelado. O princípio da justiça penal universal traz que se aplica a lei do lugar em que se encontrar o agente. Por fim, o princípio da representação ou da substituição ou do pavilhão estabelece que se aplique a lei do meio de transporte privado em que ocorrer o crime.

Exercício 27. (Funcab – 2013 – PC-ES – Delegado de Polícia) Quanto à aplicação da lei penal brasileira no espaço, é correto afirmar:


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I. O princípio da universalidade, preconizado no art. 7º, II, “a”, do CP não obsta a concessão da extradição ao Estado no qual ocorreram as práticas delituosas.

II. Em razão do princípio da personalidade passiva, o brasileiro nato não pode ser extraditado, entretanto, é submetido à lei brasileira quando pratica crime no estrangeiro, mesmo que já tenha cumprido pena ou tenha sido absolvido no país onde praticou o crime.

III. A legislação brasileira adota de forma irrestrita o princípio da justiça universal; inclusive nos crimes de tráfico de pessoas esse princípio prevalece em prejuízo do princípio da territorialidade.

IV. O território onde estão instaladas as embaixadas estrangeiras passam a constituir território do Estado da embaixada.

Indique a opção que contempla a(s) assertiva(s) correta(s). a) I, II, III e IV. b) II, III e IV, apenas. c) III e IV, apenas. d) I e IV, apenas. e) I, apenas.

28. Pena Cumprida no Estrangeiro – Eficácia da Sentença Penal Estrangeira Importante lembrar, inicialmente, a diferença entre crimes a distância e crimes plurilocais. Quando uma conduta ocorre no país A e o resultado acontece no país B, temos um crime a distância ou de intervalo máximo. Quando, no entanto, a conduta ocorre em uma comarca e o resultado em outra, ambas no mesmo país, temos um crime plurilocal. Para os crimes a distância, aplica-se a teoria da ubiquidade. Para os crimes plurilocais, aplica-se a teoria do resultado, exceto para o crime de homicídio. Para este, aplica-se a teoria da atividade. Analisemos os crimes a distância. Para a teoria da ubiquidade, é considerado local do crime tanto o local da conduta quanto do resultado. Imagine que o agente efetua disparos no Brasil, mas a vítima é atingida no Uruguai, e ali morre. É possível e provável, neste caso, processo no Brasil e no Uruguai. Consequentemente, esta teoria possibilita o bis in idem.


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Para tentar evitar o bis in idem, temos a regra do art. 8º do CP: “A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas.” O art. 9º do CP determina que a sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil para: I – obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis (deve a parte interessada pedir); II – sujeitá-lo à medida de segurança (deve haver tratado de extradição ou requisição do Ministro da Justiça). Lembra-se que a homologação, que é de competência do STJ, exige prova do trânsito em julgado no país de origem.

Exercício 28. (Cespe – MPU – Analista – 2013) A homologação de sentença estrangeira para obrigar o condenado à reparação de dano requer a existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença.

29. Disposições Finais sobre a Aplicação da Lei Penal Num crime a distância, imagine um caso de aberractio ictus ou tentativa branca ou incruenta. Neste caso, é importante lembrar o art. 6º do CP: “Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Portanto, aplica-se também a teoria da ubiquidade, mesmo que ocorra a tentativa branca.” Analisaremos agora os arts. 10, 11 e 12 do CP, que finalizam a teoria da norma penal. O art. 10 trata da contagem do prazo em direito penal. É aplicado na prescrição, na decadência, no tempo de prisão. Por este artigo, a contagem de prazo em direito penal material inclui o dia do começo e exclui o dia do fim, porque isto é benéfico ao réu. Difere da contagem do prazo de direito processual penal, porque, neste caso, o prazo é contado a partir do primeiro dia útil seguinte, e inclui-se o dia do final.


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Pelo art. 11, temos que são desprezadas as frações de dia na PPL e na PRD, e as frações de “cruzeiro” na pena de multa, ou seja, não se computam as horas e os centavos, respectivamente nas penas corporais e nas penas pecuniárias. Pelo art. 12, aplicam-se as normas do Código Penal aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso.

Exercício 29. (Fepese – DPE/SC – Técnico – 2013) Assinale a alternativa correta: a) A lei penal é irretroativa. b) Na contagem de prazo no direito penal computa-se o dia do início e exclui-se o dia do final. c) Não se admite a ultra-atividade da lei no direito penal. d) O dia de início é excluído no direito penal, devendo-se na contagem do prazo ser considerado o final. e) As frações de dia, e, na pena de multa, as frações de pecúnia, deverão sempre ser consideradas para fins de execução da pena.

30. Eficácia da Lei Penal em Relação a Pessoas que Exercem Determinadas Funções Públicas – Imunidades Diplomáticas No início desta unidade, faremos uma recapitulação dos arts. 1º a 12 do Código Penal, já estudados nas unidades anteriores. Embora tenhamos visto todos os artigos do Código relativos à lei penal, ainda nos falta estudar a aplicação da lei penal em relação a pessoas que exercem determinadas funções públicas. Veremos as chamadas imunidades, a iniciar pelas imunidades dos diplomatas e dos cônsules. Há hipóteses em que a lei penal não é aplicada. Pelo art. 5º, caput, do CP temos que: “Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional.” É o princípio da reciprocidade: o Brasil confere imunidade aos representantes de países que também conferem imunidades aos representantes do Brasil naqueles países. O tratado internacional que confere estas imunidades é a convenção de Viena, incorporado no Brasil pelo Decreto nº 56.435/1965. Ela assegura ao diplomata imunidade de jurisdição penal.


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Se praticar um crime, o diplomata responderá, se for o caso, no seu estado de origem. Nunca aqui no Brasil. É imune, e esta imunidade é irrenunciável. E é irrenunciável porque diz respeito à função, e não à pessoa em si. Com relação aos cônsules, a imunidade deles está restrita aos atos de ofício. As sedes das embaixadas não são extensões de território estrangeiro, mas não admitem busca e apreensão, requisição, embargo, ou qualquer tipo de medida de natureza penal, porque são providas de inviolabilidade.

Exercício 30. (Cespe – 2013 – PC-BA – Delegado de polícia) Somente mediante expressa manifestação pode o agente diplomático renunciar à imunidade diplomática, porquanto o instituto constitui causa pessoal de exclusão da pena.

31. Imunidades Parlamentares Já vimos sobre as imunidades dos diplomatas e dos cônsules, bem como as particularidades sobre as sedes das embaixadas. Veremos agora as imunidades parlamentares. No art. 53, caput, da CF, temos: “Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.” São os chamados crimes de opinião: os parlamentares não podem ser sujeitos ativos de crimes contra a honra. A imunidade é penal (absoluta) e processual (relativa) e, de acordo com o STF, a natureza jurídica desta imunidade é causa de exclusão da tipicidade material. A inviolabilidade dos deputados federais e senadores se estende aos deputados estaduais (art. 27, § 1º). Pelo art. 29, XVIII, os vereadores também não praticam crimes contra a honra no exercício do mandato, mas a inviolabilidade aqui é mais restrita: está limitada à circunscrição do município. Com relação aos advogados, juízes, membros do MP, temos também situações específicas de inviolabilidade nas respectivas leis orgânicas. Juízes e MP são invioláveis nas suas manifestações. O que vemos aqui são casos em que a lei penal não é aplicada. Estas pessoas não podem ser sujeitos ativos de crimes contra a honra. Não há tipicidade, não há fato típico.


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Exercício 31. (Cespe – 2007 – TJ/PI – Juiz) Segundo entendimento do STF, no caso de ofensa à honra de terceiro, só haverá imunidade parlamentar se essa conduta tiver nexo funcional com o cargo que o parlamentar desempenha, ainda quando se trate de ofensa irrogada dentro do parlamento.

32. Conflito Aparente de Normas – Requisitos – Diferenças com Outros Institutos Já analisamos a aplicação da lei penal no tempo, no espaço, em relação a certas autoridades. Trabalharemos agora, para encerrar a teoria da norma penal, os princípios que resolvem o chamado conflito aparente de normas. Por vezes, tem-se um conflito aparente de tipos penais, não se sabendo qual norma deverá ser aplicada no caso concreto. Tem-se um fato; em tese, incide uma pluralidade de normas, e todas estas normas vigem ao tempo do fato. Não se trabalha mais com lei penal no tempo. O que nos interessa são leis vigentes, que aparentemente entram em conflito. A solução não está na lei, mas, sim, em princípios: especialidade; subsidiariedade; alternatividade; e consunção ou absorção. São requisitos para a configuração do conflito ou concurso aparente de normas: – unidade de fato (um único fato); – pluralidade de leis penais (que, em tese, se subsumem ao fato); – vigência simultânea de todas as leis penais. Diferença com outros institutos: – conflito de leis penais no tempo: neste instituto, somente uma norma vige no momento do fato, enquanto que no conflito aparente de normas todas as normas em tese aplicáveis estão vigentes; – concurso de crimes: neste instituto (constante dos arts. 69, 70 e 71 do CP), todas as normas violadas são imputadas ao agente, ao passo em no conflito aparente de normas apenas uma das normas violadas é imputada ao agente. Ademais, o concurso aparente de normas não traz solução legal, enquanto que no concurso de crimes, a lei traz, expressamente, a solução.

Exercício 32. (MPE – MS – 2011 – Promotor de Justiça) Em que consiste o conflito aparente de normas?


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a) Conflito aparente de normas é a situação que ocorre quando ao mesmo fato parecem ser aplicáveis duas ou mais normas, formando um conflito aparente entre elas. b) O conflito aparente de normas consiste na aplicação de duas regras distintas para fatos delituosos diversos. c) O conflito aparente de normas consiste em se aplicar uma só norma para fatos distintos. d) O conflito aparente de normas consiste na aplicação de regras semelhantes no caso de concursos de delitos. e) O conflito aparente de normas consiste na aplicação simultânea de penas para delitos diferentes.

33. Princípio da Especialidade Veremos nesta unidade o princípio da especialidade; o primeiro princípio que resolve o conflito aparente de normas. É o único princípio constante do Código Penal, embora a solução não esteja implícita ali. Está no art. 12. Por este princípio, a lei especial afasta a aplicação da lei geral. Lei especial é a que contém todos os elementos da geral, mas ainda contém outros elementos, chamados, pela doutrina, de elementos especializantes. Em regra, esta análise entre lei geral e especial é feita dentro dos mesmos crimes, mas nas suas formas simples e derivada. Tipo simples é o fundamental, que está no caput. O tipo derivado se origina do simples, com a função de aumentar ou diminuir a pena. Ex.: furto simples é lei geral; furto qualificado é lei especial. Contudo, é possível trabalhar a especialidade em crimes não idênticos, desde que ambos tutelem o mesmo bem jurídico. Ex.: homicídio é lei geral; infanticídio é lei especial. Observar, finalmente, que, na especialidade, não importa o critério da gravidade do crime, e que a comparação é feita em abstrato.

Exercício 33. (Acafe – 2008 – PC/SC – Delegado de Polícia) Os princípios que solucionam o concurso aparente de normas, segundo a doutrina penal, são: o da especialidade, o da subsidiariedade, o da consunção e o da alternatividade. Acerca do princípio da especialidade, todas as alternativas estão corretas, exceto: a) O princípio da especialidade determina que o tipo penal especial prevalece sobre o tipo penal de caráter geral afastando, desta forma, o bis in


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idem, pois a conduta do agente só é enquadrada na norma incriminadora especial, embora também estivesse descrita na geral. b) Para se saber qual norma é geral é qual é especial, é preciso analisar o fato concreto praticado, não bastando que se comparem abstratamente as descrições contidas nos tipos penais. c) A comparação entre as leis não se faz da mais grave para a menos grave, nem da mais completa para a menos completa. A norma especial pode descrever tanto um crime mais leve quanto um mais grave. d) O princípio da especialidade é o único previsto expressamente no Código Penal.

34. Princípio da Subsidiariedade Veremos nesta unidade o princípio da subsidiariedade. Inicialmente, importa saber que a análise aqui é feita no caso concreto, e interessa a gravidade, ao contrário do que ocorria no princípio da especialidade. A lei primária afasta a lei subsidiária. De acordo com Nelson Hungria, a norma subsidiária é o “soldado de reserva”. Sempre se tenta, a princípio, resolver o fato com a norma mais grave. Se ela não é cabível, aplica-se a norma menos grave, isto é, a norma subsidiária. Por isso, “soldado de reserva”: ela só será usada se a norma primária não foi usada. Existem duas espécies de subsidiariedade: – expressa ou explícita: a própria lei determina, expressamente, que só será aplicado se não houver crime mais grave. É o caso do art. 132 do CP: “Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente: Pena – detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.” – tácita ou implícita: é preciso chegar à subsidiariedade por interpretação, pois a norma menos grave funciona como elementar da norma mais grave. Veja o crime do art. 148: “Privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado.” Conjuguemos este crime com o do art. 159: “Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate.” Veja que o art. 148 está dentro do art. 159. Não caracterizando o art. 159 (mais grave), pode o agente responder pelo menos grave (art. 148).


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Exercício 34. (FCC – 2013 – MPE/SE – Analista) Segundo o art. 12, as regras gerais do Código Penal aplicam-se às incriminações constantes de leis especiais, se estas não dispuserem de modo diverso. Consagra-se, com isso, a ideia de: a) Alternatividade imprópria. b) Subsidiariedade. c) Consunção. d) Alternatividade própria. e) Especialidade

35. Princípio da Consunção: Crime Complexo, Crime Progressivo e Progressão Criminosa Analisaremos agora o princípio da consunção ou absorção, que se relaciona com 5 hipóteses, das quais veremos 3 nesta unidade. A lei consuntiva derroga a lei consumida. A primeira hipótese de aplicação deste princípio é o crime complexo. Crime complexo puro ou em sentido estrito é aquele que resulta da fusão de dois ou mais tipos autônomos. Exemplo: latrocínio = roubo + homicídio. O juiz, neste caso, não vai fixar a pena de cada um dos crimes e depois somá-la, mas apenas no crime complexo formado (no caso do exemplo, o crime de latrocínio). Crime complexo em sentido amplo é o que resulta de crime (fato típico) + irrelevante penal (fato atípico). Exemplo: estupro = constrangimento ilegal (fato típico) + conjunção carnal (fato atípico). A segunda hipótese de aplicação deste princípio é o crime progressivo: a prática de um delito pressupõe, necessariamente, a prática de outro crime anterior. Exemplo: para chegar ao homicídio, é preciso passar pela lesão corporal. A lesão é absorvida pelo homicídio. Finalmente, a terceira hipótese é a progressão criminosa: há uma mutação no dolo do agente. Os crimes menos graves são absorvidos pelo mais grave.

Exercício 35. (FGV – 2012 – PC-MA – Delegado de Polícia) Ocorrido um fato criminoso, às vezes duas ou mais normas se apresentam para regulá-lo, surgindo o chamado conflito aparente de normas. A respeito de tal questão, assinale a afirmativa incorreta:


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a) A pluralidade de fatos e a pluralidade de normas são pressupostos do conflito, que aparentemente com eles se identificam. b) O princípio da subsidiariedade atua como “soldado de reserva”, aplicando a norma subsidiária menos grave quando impossível a aplicação da norma principal mais grave. c) A questão da progressão criminosa e do crime progressivo é resolvida pelo princípio da absorção ou consunção. d) Na progressão criminosa, o agente inicialmente pretender praticar um crime menos grave, e, depois, resolve progredir para o mais grave. e) No crime progressivo, o sujeito, para alcançar o crime querido, passa, necessariamente, por outro menos grave que aquele desejado.

36. Princípio da Consunção: Fato Anterior Impunível e Fato Posterior Impunível Veremos, agora, as outras duas hipóteses de aplicação do princípio da consunção ou absorção. Falaremos, primeiramente, do fato anterior impunível ou antefactum impunível. Veja: portar arma é um crime, mas homicídio com uso de arma, também é crime. Neste caso, o crime de homicídio absorve o crime de porte de arma. Num mesmo contexto fático, o crime-meio é absorvido pelo crime-fim. Importante lembrar que o contexto fático deve ser o mesmo, sob pena de se caracterizarem os dois crimes. Lembrar da Súmula nº 17 do STJ: o falso é absorvido pelo estelionato, quando se exaure neste, sem mais potencialidade lesiva. Veja, agora, o crime de petrechos de moeda falsa. Uma pessoa, que tem esses dispositivos, posteriormente, coloca em circulação uma moeda falsa. Trata-se de fato posterior impunível. O agente falsificou a moeda, que já é um crime, e já possuía a máquina para falsificar a moeda, que também já é crime. Se este agente colocar a moeda falsa em circulação, este fato (que autonomamente seria crime) não será punível. O fato posterior impunível é, em verdade, o exaurimento do crime. Servirá de circunstância de aumento de pena, do art. 50, mas nunca como crime autônomo.

Exercício 36. (Cespe – 2012 – Polícia Federal) Conflito aparente de normas penais pode ser solucionado com base no princípio da consunção, ou absorção. De acor-


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do com este princípio, quando um crime constitui meio necessário ou fase normal de preparação ou execução de outro crime, aplica-se norma mais abrangente. Por exemplo, no caso de cometimento do crime de falsificação de documento para a prática do crime de estelionato, sem mais potencialidade lesiva, este absorve aquele.

37. Princípio da Alternatividade Veremos o último princípio que resolve o conflito aparente de normas: o princípio da alternatividade. Serve para resolver conflitos nos chamados tipos mistos alternativos, ou seja, aqueles que têm mais de um verbo, mas, se vários verbos nucleares forem praticados no mesmo contexto fático, o agente praticará um só crime. Diferentemente do que ocorre no tipo misto cumulativo: os verbos descrevem condutas autônomas e se o agente praticar mais de um verbo, praticará mais de um crime. É o exemplo do art. 14 da Lei de Armas (traz 13 verbos nucleares): cada um dos verbos é um crime, mas, se o agente praticar mais de um verbo, no mesmo contexto fático, praticará apenas um crime. Também é o caso do art. 33 da Lei de Drogas, onde constam 18 verbos. E é exatamente para isto que serve o conflito da alternatividade: elege-se um único verbo para fundamentar o crime do agente. Em verdade, não é um princípio que resolve tecnicamente o conflito de normas, porque não temos, aqui, normas em confronto, mas apenas uma única norma, que está em conflito com ela mesma.

Exercício 37. (Cespe – 2013 0 TJ/PR – Titular de Serviços de Notas e Registros) No que concerne ao tempo e ao lugar do crime e ao conflito aparente de normas penais, assinale a opção correta: a) De acordo com o STF, nas hipóteses de crime continuado ou de crime permanente, a lei penal mais grave não pode ser aplicada, ainda que vigente antes da cessação da continuidade ou da permanência. b) Por se ter adotado, no Código Penal a teoria da atividade, considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte.


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c) Aplica-se o princípio da especificidade aos tipos mistos, já que, mesmo havendo várias formas de conduta no mesmo tipo, somente um único delito será consumado, independentemente da quantidade de condutas realizadas no mesmo contexto. d) O princípio da consunção enseja a absorção de um delito por outro, sendo aplicável aos casos que envolvam crime progressivo, crime complexo, progressão criminosa, fato posterior não punível e fato anterior não punível. e) Na definição do tempo do crime, adota-se, no Código Penal, a teoria do resultado, considerando-se praticado o crime no momento do resultado, ainda que outro seja o momento da ação ou omissão.


Capítulo 3

Teoria do Crime

1. Teoria Geral do Crime A Teoria do Crime é compreendida em uma lógica penal, em que, na análise da norma, é possível compreender o crime em etapas. Na análise da tipicidade, será possível avaliar aspectos como: conduta, resultado, nexo e tipicidade, superveniência de causa independente e relevância da omissão, consumação e tentativa, arrependimento posterior, crime impossível, dolo e culpa, agravação pelo resultado, erro sobre tipo. O art. 13 do Código Penal trata sobre a relação de causalidade, com questões englobadas dentro do fato típico (nexo causal). Em seu § 1º serão encontradas as concausas; no § 2º, será possível identificar os crimes omissivos impróprios (impuros, comissivos por omissão), trazendo a situação do garante (quem possui o dever jurídico de agir). No art. 14 do Código Penal, serão estudadas a consumação e a tentativa – crime consumado e crime tentado. O parágrafo único consagra a Teoria Objetiva, com exceção da Teoria Subjetiva. Quanto mais ofensa houver, menor a redução. Esta redução poderá ser de 1 a 2/3 da pena. O art. 15 do Código Penal traz ainda dentro da tentativa os institutos da desistência voluntária e do arrependimento eficaz, ou seja, da tentativa abandonada. Já, no art. 16 do Código Penal, é possível verificar quanto à teoria da pena, onde sempre que houver a reparação do dano ou restituição da coisa até o recebimento da denúncia, será considerada causa de redução da pena. O art. 17 do Código Penal trata sobre o crime impossível, onde o meio de execução é ineficaz ou o objeto é impróprio. O dolo e a culpa serão tratados especificamente no art. 18 do Código Penal, respectivamente nos incisos I e II.


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O art. 19 do Código Penal refere-se ao crime preterdoloso, onde o dolo encontra-se no antecedente e a culpa no resultado consequente. Este dispositivo consagra o princípio da responsabilidade penal subjetiva. A teoria do erro é identificada no art. 20 do Código Penal e é compreendida como erro de tipo incrimador, sendo analisado o elemento do tipo, podendo excluir o próprio tipo (exclui dolo e culpa se o erro é atípico). Deverá ser avaliado se o erro é escusável. No art. 21 do Código Penal, é possível verificar sobre o erro de proibição, que isenta de pena caso seja escusável, incidindo sobre o caráter proibitivo da norma. A culpabilidade será tratada especificamente no art. 22 do Código Penal e, em consequência, o art. 23 trata sobre a ilicitude e o art. 26 quanto à imputabilidade do agente.

Exercício 1.

(Cespe – 2011 – TCU – Auditor Federal) Na doutrina e jurisprudência contemporâneas, predomina o entendimento de que a punibilidade não integra o conceito analítico de delito, que ficaria definido como conduta típica, ilícita e culpável.

2. Teoria do Crime – Crime, Delito e Contravenção Penal: Teoria Dicotômica Em apresentação de uma teoria dicotômica – atualmente adotada no Brasil –, a infração penal é considerada como gênero do qual crime e contravenção penal são determinados como espécies. O delito encontra-se no mesmo patamar do crime: é considerado como tal. As duas expressões são sinônimas. Não há diferença ontológica entre crime e contravenção penal – o que há, em verdade, é opção legislativa, entendida como política criminal.

Exercício 2.

(Vunesp – 2009 – TJMT – Juiz) Assinale a alternativa que aponta contravenção penal recentemente revogada: a) Mendicância. b) Vadiagem. c) Jogo do bicho.


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d) Importunação ofensiva ao pudor. e) Perturbação da tranquilidade.

3. Diferença entre Crime e Contravenção Penal: Pena (Qualidade, Quantidade e Sursis) No Brasil, adota-se a teoria dicotômica, ou seja, duas espécies de infrações penais. O gênero é infração penal, do qual são espécies o crime e a infração penal. No Brasil, delito é sinônimo de crime. A diferença entre as duas espécies é uma opção do legislador, ou seja, política criminal. Entretanto, ainda que não existam diferenças ontológicas entre um e outros, quanto às consequências, existem várias diferenças. Os crimes são apenados, sempre, com reclusão ou detenção. Já as contravenções penais são apenadas com prisão simples. A consequência prática desta diferenciação é seguinte: a pena de reclusão pode ser cumprida inicialmente no regime fechado e a de detenção deve iniciarse no semiaberto ou no aberto, mas pode haver a regressão para o fechado. A prisão simples só pode iniciar-se em regime semiaberto ou aberto, em local separado dos demais presos, mas, aqui, nunca haverá regressão para o regime fechado, ou seja, a prisão simples nunca será cumprida em regime fechado. Outra questão diz respeito ao prazo: depois de unificada a pena, se o sujeito cometeu crime, poderá cumprir, no máximo, 30 anos. Já, para contravenções penais, o tempo máximo de cumprimento de pena é de 5 anos. Finalmente, em relação ao sursis (suspensão condicional da pena, ou seja, presentes os requisitos legais, a condenação definitiva pode ficar suspensa por certo prazo, denominado de período de prova), existe também uma diferença no tempo do período de prova: se a condenação se der por crime, o período de prova variará de 2 a 4 anos (sursis simples ou especial) ou de 4 a 6 anos (sursis etário ou humanitário); já se a condenação tiver se dado por contravenção penal, o período de prova será de 1 a 3 anos.

Exercício 3.

(FCC – TJ/PE – Técnico Judiciário – 2012) Para as contravenções penais, a lei prevê a aplicação isolada ou cumulativa das penas de: a) Prisão simples e detenção. b) Reclusão e detenção.


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c) Multa e prisão simples. d) Detenção e multa. e) Reclusão e prisão simples.

4. Diferença entre Crime e Contravenção Penal: Tentativa e Ação Penal A tentativa tem sua disciplina no art. 14, II, do CP: “Art. 14. Diz-se o crime: II – tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.” A regra, no Brasil, é a admissão da tentativa e, apenas excepcionalmente, não se admite este instituto. No que tange às contravenções penais, embora faticamente possível, a lei (LCP) diz que ela é impunível, por medida de política criminal. Isto porque a contravenção já traz uma ideia de perigo, de modo que a punição da tentativa seria punir o perigo do perigo. Com relação à ação penal, no que se refere aos crimes, pode ser pública incondicionada (que é a regra), pública condicionada à representação, pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça ou, ainda, privada. Observa-se, neste ponto, que está em trâmite o novo CPP (PL nº 156/2009). E, neste projeto, extingue-se a ação privada, que passa a ser condicionada à representação da vítima. As contravenções penais são sempre de ação penal pública incondicionada. Um detalhe importante é a contravenção de vias de fato (art. 21 da LCP): a representação é necessária no crime de lesão leve, que é, em tese, mais grave que a contravenção de vias de fato. Ainda assim, a contravenção de vias de fato não precisa de representação.

Exercício 4.

(Acafe – Delegado de Polícia – 2008) Sobre as contravenções penais, assinale a alternativa correta: a) Considera-se contravenção, a infração penal a que a lei comina isoladamente, pena de detenção ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente. b) A tentativa da contravenção pena é punível com a pena correspondente à contravenção penal consumada, diminuída de um a dois terços.


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c) A ação penal nas contravenções penais será sempre pública condicionada. d) A lei brasileira só é aplicável à contravenção penal praticada no território brasileiro.

5. Diferença entre Crime e Contravenção Penal: Extraterritorialidade e Erro de Proibição Extraterritorialidade é a aplicação da lei penal para fatos que não ocorreram no Brasil. Atualmente, no ordenamento jurídico brasileiro, existem 3 espécies de extraterritorialidade: – incondicionada (art. 7º do CP): não há nenhum requisito para a aplicação da lei brasileira, que sempre será aplicada. Ocorre pela relevância dos bens jurídicos tutelados; – condicionada: para a aplicação da lei brasileira, é preciso o preenchimento de algumas condições (presentes no § 2º do art. 7º do CP). Os bens são menos importantes; – hipercondicionada: é o caso do § 3º do art. 7º. Neste caso, é preciso completar as duas condições deste dispositivo cumulativamente com as 5 condições do dispositivo anteriormente citado. O instituto da extraterritorialidade só se aplica a crimes. Nunca a contravenções penais. É a regra do art. 2º da LCP. A culpabilidade, hoje, é formada por 3 elementos: imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e inexigibilidade de conduta adversa. O erro de proibição exclui o segundo elemento, e, portanto, a própria culpabilidade. Na contravenção penal, o erro de proibição confere ao agente o perdão judicial.

Exercício 5.

(Vunesp – MP/SP – Promotor de Justiça) Considerando as disposições contidas na Parte Geral da Lei das Contravenções Penais, assinale a alternativa incorreta: a) A lei brasileira só é aplicável à contravenção penal praticada no território nacional. b) Não é punível a tentativa de contravenção. c) Nas contravenções, as penas principais são prisão simples e multa.


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d) Verifica-se a reincidência quando o agente pratica uma contravenção depois de passar em julgado a sentença que o tenha condenado, no Brasil ou no estrangeiro, por qualquer crime, ou, no Brasil, por motivo de contravenção. e) Nas contravenções, em caso de ignorância ou de errada compreensão da lei, quando inescusáveis, a pena pode deixar de ser aplicada.

6. Polêmica do Art. 28 da Lei de Drogas A Lei de Drogas quebrou uma sistemática tradicional no Código Penal: o sujeito recebia uma PPL (Pena Privativa de Liberdade) e, se cumpridas as condições da lei, esta PPL era substituída por PRD (Pena Restritiva de Direitos). Assim, as penas alternativas nunca eram fixadas inicialmente, e isto porque descumprida a PRD, esta poderá ser convertida em PPL. Com o surgimento do art. 28 (posse de drogas para consumo próprio) da Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006), alguns doutrinadores começaram a defender uma terceira espécie de infração penal porque o art. 28 prescreve, logo de cara, penas de advertência, prestação de serviços à comunidade ou medida educativa. Não há previsão de reclusão, detenção ou prisão simples. O professor Luiz Flávio Gomes defende que este artigo não é nem crime, nem contravenção, mas, sim, uma infração sui generis, surgindo uma teoria tricotômica. A partir deste posicionamento, começa-se a sustentar a abolitio criminis. O STF, então, foi instado a se manifestar sobre esta questão. A decisão paradigmática é o RE nº 430.105, de 2007, da lavra do Ministro Sepúlveda Pertence. O STF determinou que não houve descriminalização do crime de posse de drogas para consumo próprio. Isto porque este artigo está sob o título dos Crimes da Lei de Drogas e, bem assim, há regramento acerca da prescrição, e só os crimes prescrevem. O que houve, segundo o STF, foi a despenalização do art. 28. Ocorre que a prestação de serviço comunitário é sim uma pena. Em verdade, o que quis dizer o STF foi que não houve a descriminalização do art. 28, mas, sim, a sua descarcerização.

Exercício 6.

(Cespe – TJAC – Juiz – 2012) Configura abolitio criminis o fato de a conduta de portar substância entorpecente para uso próprio ter deixado de ser punida com privação da liberdade e multa.


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7. Objeto do Crime O objeto do crime pode ser objeto jurídico ou objeto material. Objeto jurídico de um crime é o bem ou interesse tutelado pela norma. Já o objeto material é a pessoa ou coisa atingida pela conduta criminosa. No HC nº 107.615, o STF concluiu: discute-se se teria havido o crime de furto do “disco de outro” do cantor Milton Nascimento. Isto porque não é, efetivamente, de ouro, mas o valor afetivo é realmente alto. Por estes motivos, o STF decidiu que bem de valor afetivo também é objeto do crime de furto. Bens jurídicos espiritualizados são os bens jurídicos incorpóreos, imateriais, como os ligados a questões ambientais, a objeto difuso, de interesses coletivos. Alguns crimes não têm objeto material, como os crimes de mera conduta.

Exercício 7.

(TRT 15ª Região – Juiz do Trabalho – 2012) Analise as seguintes assertivas e em seguida responda:

I. Objeto material do crime de extorsão é a pessoa contra a qual recai o constrangimento e qualquer pessoa pode figurar como sujeito ativo deste crime;

II. O crime de extorsão só pode ser praticado dolosamente, não havendo previsão para a modalidade culposa. Além do dolo, a doutrina majoritária aponta outro elemento subjetivo, que lhe transcende, chamado “especial fim de agir”, caracterizado in casu pela finalidade do agente em obter, para si ou para outrem, indevida vantagem econômica;

III. Embora seja um crime formal, a extorsão mediante sequestro também possui a natureza de delito plurissubsistente, ou seja, aquele que pode ser desdobrado em vários atos, fracionando-se, pois, o “iter criminis”, razão pela qual será possível a tentativa;

IV. A fé pública é o bem juridicamente protegido pelo tipo penal que prevê o delito de falsificação de documento público. O objeto material é o documento público falsificado, no todo ou em parte, ou o documento público verdadeiro, que fora alterado pelo agente. Admite-se a tentativa;

V. Segundo posição majoritária do STJ, admite-se a responsabilidade penal da pessoa jurídica em crimes ambientais, desde que haja imputação simultânea do ente moral e da pessoa física que atua em seu nome ou em seu benefício.


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a) Apenas as assertivas I, II e III são corretas. b) Apenas a assertiva V é errada. c) Apenas a assertiva IV é correta. d) Todas as assertivas são corretas. e) Apenas as assertivas II e III são erradas.

8. Sujeito Ativo Sujeito ativo é quem pratica, direta ou indiretamente, a conduta criminosa. Pode ser quem realiza verbo típico (autor executor) ou possui domínio finalista do fato (autor funcional), como também quem de qualquer outra forma concorre para o crime (partícipe). Portanto, qualquer pessoa que, de alguma maneira, concorre para a prática do crime é sujeito ativo do delito. No que diz respeito à pessoa jurídica, contudo, a Constituição traz duas passagens que deixa clara essa possibilidade: – art. 173, § 5º: trata dos crimes contra a ordem econômica e financeira. Neste dispositivo, a CF determina que a lei estabelecerá a responsabilidade da pessoa jurídica, sem prejuízo da responsabilidade da pessoa física nestes crimes. Ocorre que a CF simplesmente deixa entender que existe essa possibilidade, que deveria ser regulamentada por lei infraconstitucional. Não existe, ainda, lei que estabeleça a responsabilidade das pessoas jurídicas por crimes contra a ordem econômica, crimes financeiros ou contra a economia popular. Assim, não cabe a responsabilização nestes casos; – art. 224, § 3º: é possível a responsabilização de pessoas físicas e jurídicas pelas condutas lesivas ao meio ambiente. Neste caso, diferentemente do anterior, existe a Lei dos Crimes Ambientais – Lei nº 9.605/1998. Esta lei traz a regulamentação completa da punição da pessoa jurídica por crimes ambientais, conciliando o brocardo nullum crimen sine actio humana, através da teoria da dupla imputação que será analisada oportunamente. Importante saber que há uma posição minoritária (Cezar Roberto Bittencourt) que não admite essa penalização, porque interpreta este artigo da CF no sentido de que as pessoas jurídicas somente podem ser responsabilizadas administrativamente. Mas, atualmente, a maioria da doutrina como também a jurisprudência aceitam a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Os crimes ambientais são os únicos que podem ser praticados por pessoa jurídica.


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Exercício 8.

(Cespe – PC/RN – Delegado de Polícia – 2009) No crime de autoaborto, a gestante é, ao mesmo tempo e em razão da mesma conduta, autora do crime e sujeito passivo.

9. Teoria da Dupla Imputação STJ (ORIENTAÇÃO ANTERIOR): Para a validade da tramitação de feito criminal em que se apura o cometimento de delito ambiental, na peça exordial devem ser denunciados tanto a pessoa jurídica como a pessoa física (sistema ou teoria da dupla imputação). Isso porque a responsabilização penal da pessoa jurídica não pode ser desassociada da pessoa física (que é quem pratica a conduta com elemento subjetivo próprio). - STJ, 5ª T., RMS 37293/SP, j. 02/05/2013. STF 1. O art. 225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa. A norma constitucional não impõe a necessária dupla imputação. (...) 3. Condicionar a aplicação do art. 225, § 3º, da Carta Política a uma concreta imputação também a pessoa física implica indevida restrição da norma constitucional, expressa a intenção do constituinte originário não apenas de ampliar o alcance das sanções penais, mas também de evitar a impunidade pelos crimes ambientais frente às imensas dificuldades de individualização dos responsáveis internamente às corporações, além de reforçar a tutela do bem jurídico ambiental. (...) Tal esclarecimento, relevante para fins de imputar determinado delito à pessoa jurídica, não se confunde, todavia, com subordinar a responsabilização da pessoa jurídica à responsabilização conjunta e cumulativa das pessoas físicas envolvidas. Em não raras oportunidades, as responsabilidades internas pelo fato estarão diluídas ou parcializadas de tal modo que não permitirão a imputação de responsabilidade penal individual. - 1ª T., RE 548181, julgado em 06/08/2013, publicado em 30/10/2014 STJ (ATUAL ORIENTAÇÃO) A pessoa jurídica também denunciada deve permanecer no polo passivo da ação penal. Alerte-se, em obiter dictum, que a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal reconheceu que a necessidade de dupla imputação nos crimes ambientes viola o disposto no art. 225, § 3.º, da Constituição Federal. - 5ª T., HC 248073, j. 01/04/2014


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Exercício 9.

(UEG – PC/GO – Delegado de Polícia –2008) Segundo a orientação do STJ, pode haver a responsabilização isolada do ente coletivo, sendo desnecessária a demonstração da atuação dos administradores em proveito da pessoa jurídica.

10. Sujeito Passivo – Crimes Vagos Podemos falar de um sujeito passivo material ou eventual, que é o titular do bem jurídico violado ou ameaçado, e um sujeito passivo formal ou constante, que é o Estado. Sempre o Estado é lesado com o descumprimento de uma lei por ser o titular do mandamento proibitivo. Há duas espécies de honra: objetiva (conceito que os outros têm de mim) e subjetiva (conceito que eu tenho de mim próprio, a autoestima). Desde já, podese afirmar que a pessoa jurídica não tem honra subjetiva, portanto, não poderá nunca ser vítima da injúria, que é o crime que ataca a honra subjetiva. Por outro lado, não se pode afirmar que a honra da pessoa jurídica não está protegida. E, por isso, o STJ sumulou que a pessoa jurídica pode ser vítima de dano moral. E, assim sendo, poderá a pessoa jurídica ser vítima de crime contra a honra objetiva. Devemos analisar a questão do morto: pode o morto ser vítima de crime? Não pode o morto ser sujeito passivo de crime, porque morto não é titular de direitos. Temos, no art. 138, § 2º, o crime de calúnia contra os mortos. Neste crime, tutela-se a memória do morto, e as vítimas são, portanto, seus familiares. Em casos de maus-tratos contra animais, a vítima é a coletividade. Isto porque animais não são titulares de direitos, e, portanto, não podem ser vítima. É, sim, o objeto material sobre a qual incide a conduta, mas a vítima é a coletividade. Finalmente, lembra-se que, nos crimes vagos (aqueles em que o sujeito passivo é indeterminado), a vítima é a saúde pública, a sociedade, a família, etc.

Exercício 10. (Cespe – PC/RN – Delegado de Polícia – 2009) É possível que os mortos figurem como sujeito passivo em determinados crimes, como, por exemplo, no delito de vilipêndio de cadáver.


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11. Autolesão Quando são analisados os princípios penais fundamentais, observa-se o princípio da ofensividade ou lesividade; princípio que traz que não há crime sem lesão ou exposição a risco do bem jurídico. Ademais, o princípio da ofensividade hoje deve ser conjugado com o princípio da alteridade. Assim, a leitura que se faz atualmente é que não há crime sem ofensa a bem jurídico alheio. Neste sentido, a autolesão, em regra, é um irrelevante penal no Brasil, é um fato atípico. Há duas exceções que estão previstas no art. 171, § 2º, V, do Código Penal e art. 184 do Código Penal Militar. A primeira hipótese diz respeito ao sujeito que quer fraudar seguro. Exemplo: sujeito corta um membro para receber determinado valor. Já a segunda hipótese traz uma situação em que o sujeito simula uma incapacidade para não servir ao Exército. Nota-se, no entanto, que a segunda hipótese traz como bem tutelado o próprio Estado e não o corpo do sujeito convocado.

Exercício 11. (TJMG – Juiz Estadual – 2007) Pode alguém, simultaneamente, ser sujeito ativo e passivo do mesmo crime? a) Não pode. b) Pode, na lesão do próprio corpo com intuito de receber seguro. c) Pode, no crime de incêndio, quando o agente ateia fogo à própria casa. d) Pode, no crime de rixa.

12. Classificação dos Crimes – Materiais, Formais e de Mera Conduta Nos crimes materiais, o tipo penal aloja conduta e resultado naturalístico, sendo este necessário para a consumação. Exemplos: homicídio, lesão corporal, roubo, dentre outros. A Súmula Vinculante nº 24 estabelece que não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.


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Já, nos crimes formais, o tipo aloja conduta e resultado naturalístico, porém, este não é necessário para que haja consumação. Exemplo: crimes contra a honra. A Súmula nº 96 do STJ dispõe que o crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida. Os crimes de mera conduta ou de simples atividade, por sua vez, são aqueles em que o tipo penal não aloja resultado naturalístico, limitando-se a descrever a conduta. Exemplo: crime de porte de arma de fogo.

Exercício 12. (FCC – 2012 – TRT – 4ª Região (RS) – Juiz do Trabalho) Consumam-se com o resultado os crimes: a) Formais e omissivos próprios. b) Omissivos impróprios e materiais. c) Formais e omissivos impróprios. d) materiais e omissivos próprios. e) Materiais e de mera conduta.

13. Classificação dos Crimes: Conduta Mista, Comissivos e Omissivos Os crimes de conduta mista são compostos de duas fases: a primeira, inicial que é ativa, a segunda, fase final que, por sua vez, ocorre de forma omissiva. O art. 169, II, parágrafo único, do CP, descreve o crime de apropriação indébita: a conduta do agente tem início a partir de uma ação, no momento em que se apropria de algo que não lhe pertence, terminando com sua omissão, pois este deixa de restituir a coisa dentro do prazo legal. Os crimes comissivos ou de ação são aqueles praticados mediante uma conduta positiva, ou seja, um fazer, como o crime de estupro. Os crimes omissivos ou de omissão são aqueles praticados mediante uma conduta negativa. Nos crimes omissivos puros ou próprios, a omissão está contida no próprio texto de lei de forma expressa (deixar de). Os crimes omissivos impuros ou impróprios ou comissivos por omissão são aqueles em que o tipo penal descreve uma ação, a ser praticada por quem tem dever jurídico de agir. Nesta hipótese, o garante, omite-se, gerando a produção do resultado naturalístico.


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Essa hipótese está prescrita no art. 13, § 2º, “a”, do CP, informando que a omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem tenha por lei a obrigação de cuidado, de proteção ou de vigilância. Na alínea “b”, temos a previsão daquele que, de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado. Já a alínea “c” traz a hipótese daquele que, com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.

Exercício 13. (Cespe – 2012 – MPTE – TO – Promotor de Justiça) Crimes omissivos impróprios, comissivos por omissão ou omissivos qualificados são os que objetivamente são descritos como uma conduta negativa, de não fazer o que a lei determina, consistindo a omissão na transgressão da norma jurídica sem que haja necessidade de qualquer resultado naturalístico. Para a existência do crime, basta que o autor se omita quando deva agir. Certo ou errado?

14. Classificação dos Crimes: de Dano e de Perigo Os crimes de dano são aqueles que exigem, para a sua consumação, a efetiva lesão do bem jurídico. Já, nos crimes de perigo, basta a mera exposição a risco do bem jurídico, para sua consumação. Os crimes de perigo classificam-se em crimes de perigo individual e de perigo coletivo. Os crimes de perigo individual atingem uma pessoa ou um número determinado de pessoas. Os crimes de perigo comum ou coletivo atingem um número indeterminado de pessoas. São exemplos de crimes de perigo individual: abandono de incapaz ou a omissão de socorro. Nos dois casos, a vítima pode ser determinada. Crime que envolva explosivos trata-se de crime de perigo comum ou coletivo à medida que expõe em risco a vida de um potencial número de vítimas. O art. 121, § 2º, III, do CP, traz a qualificadora nos casos de crimes de perigo comum ou coletivo. Os crimes de perigo concreto são aqueles que se consumam com a efetiva comprovação da situação de perigo. No caso concreto, podemos citar o crime de embriaguez ao volante.


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Os crimes de perigo abstrato ou presumido são os que possuem presunção juris et de jure, ou seja, parte-se do pressuposto absoluto de que da conduta do agente advém situação de perigo, como no caso de crime de associação criminosa. Sobre o crime de porte de arma de fogo desmuniciada, há o entendimento majoritário de que é conduta típica (STF, HC nº 117.206/RJ e STJ, HC nº 194.217/ GO – decisões de 2013).

Exercício 14. (Cesgranrio – 2012 – Caixa Econômica – Advogado) Um comerciante, com exploração de mercearia no município Y, é surpreendido pela fiscalização dos órgãos de proteção ao consumidor, que lograram ao autuá-lo pela exposição de mercadorias com prazo de validade vencido. Consoante a normativa aplicável ao caso trata-se de tipo vinculado a crime: a) Próprio. b) Material. c) Omissivo. d) De dano. e) De perigo.

15. Classificação dos Crimes: Unissubsistentes e Plurissubsistentes; Unissubjetivos e Plurissubjetivos; Transeuntes e Não Transeuntes Os crimes unissubsistentes consumam-se com a prática de um único ato, não se admitindo a tentativa, a ameaça e o desacato que são exemplos deste tipo penal, assim como os crimes omissivos puros ou próprios. Os crimes plurissubsistentes envolvem a prática de dois ou mais atos para sua consumação. A ameaça pode sim ser considerada tentada, desde que na forma plurissubsistente. Desse modo, no crime de ameaça quando unissubsistente, não se admite a tentativa, porém, se este mesmo crime ocorrer de forma plurissubsistente, será admitida a sua tentativa. Crimes unissubjetivos ou de concurso eventual são aqueles praticados por um único agente; já os crimes plurissubjetivos ou de concurso necessário são os crimes praticados por uma pluralidade de agentes em concurso.


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O crime de rixa é exemplo de crime plurissubjetivo, caracterizando-se pela confusão generalizada de três ou mais pessoas. Os crimes transeuntes ou de fato transitório são aqueles que não deixam vestígios materiais, como os crimes contra a honra. Os crimes não transeuntes ou de fato permanente deixam vestígios materiais, como no caso de lesão corporal.

Exercício 15. (FCC – 2012 – TRE/PR – Analista Judiciário) Os crimes que encerram dois ou mais tipos em uma única descrição legal denominam-se crimes: a) De mão própria. b) Complexos. c) Plurissubjetivos. d) Qualificados. e) De ação múltipla.

16. Classificação dos Crimes: Comuns, Próprios e de Mão Própria, Instantâneos, Permanentes e a Prazo Os crimes comuns são aqueles que podem ser praticados por qualquer pessoa, não exigem nenhuma qualidade especial do sujeito ativo. Os crimes próprios são os que o tipo penal exige uma condição ou qualidade especial do sujeito ativo, como o crime de infanticídio que exige que a autora seja a mãe, pois o crime se configura com a prática de matar o filho que acabou de nascer, influenciada pelo estado puerperal. Crimes próprios puros ocorrem quando a ausência da condição especial do sujeito ativo conduz à atipicidade absoluta, ou seja, se retirada a qualidade do autor, não haverá crime. No caso de crimes próprios impuros, mesmo ocorrendo a ausência da condição especial do sujeito ativo, o crime se transformaria em outro, conduzindo à atipicidade relativa. Crime de mão própria ou de atuação pessoal trata-se de crime que somente pode ser praticado pelo sujeito expressamente indicado no tipo penal, como o crime de falso testemunho. Os crimes instantâneos são aqueles cuja consumação se verifica em um momento determinado.


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Os crimes permanentes são aqueles cuja consumação se prolonga no tempo, isso ocorre por vontade do agente. Os crimes instantâneos de efeitos permanentes são aqueles cujos efeitos subsistem mesmo depois da consumação, independentemente da vontade do agente, como o crime de bigamia. Os crimes a prazo são aqueles que, para sua consumação, dependem da fluência de determinado lapso temporal, como o crime de lesão corporal de natureza grave.

Exercício 16. (Cespe – 2012 – MPE/TO – Promotor de Justiça) Crime próprio é aquele que, de acordo com o tipo penal, só pode ser praticado pelo agente pessoalmente, ou seja, sem a utilização de interposta pessoa. Certo ou errado?

17. Outras Classificações Os crimes de forma livre são aqueles que admitem qualquer meio de execução. Os crimes de forma vinculada somente podem ser executados pelos meios indicados no tipo penal. Nos crimes a distância, aplicar-se-á a teoria da ubiquidade ou mista, nos termos do art. 6º, do Código Penal. Segundo essa teoria, o lugar do crime é tanto o lugar da conduta, quanto o lugar da produção do resultado. Já os crimes plurilocais são resolvidos a partir da teoria do resultado, conforme a regra prevista no art. 70, do Código de Processo Penal; a competência será fixada em razão do local da consumação. No crime vago, a vítima figura como um ente desprovido de personalidade jurídica. O sujeito passivo nesse caso será a saúde, a família. Ao crime de atentado ou de empreendimento, a lei prevê a mesma pena para a forma consumada e para a forma tentada, como no exemplo do art. 309 do Código Eleitoral. O crime habitual exige, para sua consumação, a reiteração de atos, que revelam um estilo ou modo de vida do agente. É de suma importância destacar essa classificação recente dos crimes de tendência interna. São aqueles que trazem, como elementar do tipo, uma finalidade especial a ser buscada pelo agente, mas que não é necessária para a consumação.


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Nos crimes de resultado cortado, o resultado visado pelo agente é dispensável e não depende do comportamento dele, mas de terceiros. Já, nos crimes atrofiados ou mutilados de dois atos, o autor pretende alcançar, após a realização do delito, um resultado que fica fora do tipo, e que depende de ato seu.

Exercício 17. (2013 – TJSC – Juiz) Sobre a classificação dos crimes, assinale a alternativa correta: a) Crime de mão própria é aquele cujo tipo penal exige uma qualidade ou condição especial dos sujeitos ativos ou passivos. b) Denomina-se crime progressivo aquele em que o tipo penal exige, para sua configuração, o decurso de certo espaço de tempo. c) São chamados de crimes multitudinários aqueles cometidos por mais de duas pessoas ligadas por um vínculo associativo. d) Entende-se como crime falho aquele em que o iter criminis é interrompido antes mesmo de ser iniciado. e) Diz-se crime de atentado aquele em que a pena da tentativa é a mesma do crime consumado.

18. Conceitos de Crime Observa-se, primeiramente, que existe a possibilidade de definição de crime sob vários aspectos. O primeiro conceito a ser estudado é o conceito legal de crime, previsto no art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal, dispondo que crime é infração penal punida com reclusão ou detenção. Já o conceito formal de crime traz que crime é a mera violação da norma penal. Não se deve confundir o conceito formal com o conceito material que, por sua vez, traz que crime é comportamento humano que ofende ou expõe a perigo bens ou interesses tutelados pela norma penal. Para que se entenda o conceito analítico de crime (conceito doutrinário), é preciso verificar qual é a teoria adotada: de acordo com a teoria causalista, crime é fato típico, ilícito e culpável; já a teoria finalista tripartida estabelece que crime é fato típico, ilícito e culpável; por fim, para a teoria finalista bipartida crime é fato típico e ilícito.


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Exercício 18. (FCC – 2011 – Analista) Em relação ao conceito formal e material do crime, é correto afirmar: a) Somente no conceito material permite-se um desdobramento do tipo penal em ação ou omissão, tipicidade, ilicitude e culpabilidade. b) No conceito formal, o delito constitui uma lesão a um bem jurídico penal. c) O delito, sob a perspectiva material e formal, é punido com pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos. d) O conceito de delito formal é o fato humano proibido pela lei penal, e material há lesão ou perigo de lesão a um bem jurídico-penal. e) O delito é fato típico e antijurídico e a culpabilidade, para o conceito material, o distingue do conceito formal.

19. Fato Típico Conforme já estudado anteriormente, o conceito de crime dependerá da teoria adotada. O crime, para a teoria causalista, é fato típico, ilícito e culpável. Para a teoria finalista tripartida, o crime é um fato típico, ilícito e culpável e, para a teoria finalista bipartida, é fato típico e ilícito. Cumpre ressaltar que a posição majoritária é aquela ligada ao finalismo tripartido. Pensando-se no crime como uma escada, tem-se primeiramente o fato típico. O fato típico é o comportamento humano previsto em lei como crime ou contravenção penal. É necessário lembrar aqui que os crimes podem ser materiais, formais e de mera conduta. Nos crimes materiais, o fato típico é formado por quatro elementos: conduta, resultado naturalístico, relação de causalidade e tipicidade (adequação). Já, nos crimes formais e nos crimes de mera conduta, o fato típico passa a ser formado por somente dois elementos: conduta e tipicidade. Isso porque, nos crimes formais, o resultado é desnecessário para consumação e, nos crimes de mera conduta, o resultado sequer está previsto no tipo.


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Exercício 19. (FCC – 2013 – TJPE – Titular de Serviços de Notas e de Registros) São elementos objetivos da relação de tipicidade: a) A conduta, o resultado e a relação de causalidade. b) A antijuridicidade e a culpabilidade. c) As circunstâncias do fato. d) O dolo e a culpa. e) A imputabilidade e o juízo de reprovação.

20. Fato Materialmente Típico Conforme visto anteriormente, os crimes, quanto ao resultado naturalístico, são materiais, formais ou de mera conduta. Faz-se necessário observar que não basta que seja analisada a tipicidade formal, devendo ser observada também a tipicidade material. Neste sentido, a teoria da tipicidade, a partir desta nova visão, passa a ser concebida como formal e material. Fala-se atualmente no direito penal da ofensividade, pois o delito não pode ser unicamente uma ação ou omissão dolosa ou culposa. A conduta é penalmente relevante quando causa ofensa a um bem jurídico. Ainda, o delito não se fundamenta exclusivamente na ação, mas sobretudo no resultado. Exemplo: um sujeito entra em um supermercado, pega um chocolate e sai sem pagar. Pelo exemplo acima, nota-se que se trabalhando com uma doutrina clássica, que concebe a tipicidade apenas como tipicidade formal, o fato é formalmente típico, já que se encaixa perfeitamente na lei. No entanto, trabalhando-se com uma visão moderna do Direito Penal, que não se satisfaz com a simples tipicidade formal, sendo necessário trabalhar com o princípio da ofensividade, verifica-se se houve lesão ao bem tutelado. Ademais, o princípio da insignificância tem hoje a natureza de causa supralegal de exclusão da tipicidade material.

Exercício 20. (MPE-GO – 2012 – Promotor de Justiça) O princípio da insignificância confunde-se com o princípio da irrelevância penal do fato. O primeiro não afasta a tipicidade material, uma vez que o fato será típico (formal e materialmente), ilícito e culpável. O segundo possibilita o arquivamento ou o


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não recebimento da ação ou a absolvição penal nas imputações de fatos bagatelares próprios, ou seja, os que não possuem tipicidade material.

21. Conduta – Teorias Clássicas O primeiro elemento do fato típico é a conduta, devendo ser analisadas as teorias que dizem respeito a este assunto. A teoria causalista ou naturalística (sistema Liszt-Beling) traz que a conduta é o comportamento humano voluntário, que produz uma modificação no mundo exterior. Observa-se que o dolo e a culpa estão na culpabilidade. Nota-se que, neste primeiro momento de conduta, a ação é mecânica, é um comportamento humano e voluntário que produz modificação no mundo exterior. A teoria finalista, por sua vez, ligada a Hans Welzel, traz que a conduta é o comportamento humano voluntário e consciente, dirigido a uma determinada finalidade, que pode ser lícita ou ilícita. Aqui, o dolo e a culpa são deslocados para dentro do tipo, vindo para a tipicidade. A teoria social (Wessels) traz que a conduta é comportamento humano com transcendência social. O agente deve ter a intenção de produzir um resultado socialmente relevante. A teoria jurídico-penal (Assis Toledo), por seu turno, traz que conduta é o comportamento humano, dominado ou dominável pela vontade, dirigida para a lesão ou para a exposição a perigo de um bem jurídico. É certo que a discussão hoje está entre causalismo e finalismo e é preciso lembrar a principal diferença entre estas teorias: a posição do dolo e da culpa.

Exercício 21. (PC/MG – 2011 – Delegado de Polícia) De acordo com a teoria finalista, a ação é o comportamento humano voluntário, dirigido à atividade final lícita ou ilícita. Certo ou errado?

22. Conduta – Teoria Adotada no Brasil – Causas de Exclusão da Conduta A grande diferença entre a teoria causalista e a teoria finalista é a posição do dolo e da culpa. Isso porque, para a teoria causalista, o dolo e a culpa encontram-se na culpabilidade, enquanto na teoria finalista o dolo e a culpa estão no tipo.


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Embora não haja previsão expressa no Código Penal, a interpretação coerente e lógica é que se analise o artigo referente ao erro de tipo (art. 20, caput). O art. 20, caput, do Código Penal dispõe: “Art. 20. O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.” Nota-se que, se o erro de tipo incide sobre o tipo e exclui o dolo, é porque o dolo está no tipo. Desta forma, é possível afirmar que no Brasil adota-se a teoria finalista. Passa-se a analisar aquilo que exclui a conduta. São quatro as causas que excluem a conduta: caso fortuito e força maior; movimentos reflexos; estados de inconsciência; e coação física irresistível. O movimento reflexo é uma reação automática, seja muscular ou secretora. Ademais, insta observar que ação em curto-circuito não entra em movimento reflexo. Quanto aos estados de inconsciência, tem-se aqui o sonâmbulo, o hipnotizado. Por fim, a coação física irresistível não deve ser confundida com a coação moral irresistível, pois esta exclui a culpabilidade e não a conduta.

Exercício 22. (MPDFT – 2011 – Promotor de Justiça) São hipóteses de ausência de conduta: coação física irresistível, atos reflexos, omissão de ação. Certo ou errado?

23. Teorias Pós-finalistas – Teoria Constitucionalista do Delito Conforme estudado anteriormente, a conduta pode ser conceituada a partir de teorias. A partir de agora, serão abordadas as teorias modernas, as teorias pós-finalistas. Para a teoria constitucionalista do delito, o crime é entendido como ofensa desvaliosa a um bem jurídico relevante. A tipicidade passa a ser concebida como formal e material. Desta forma, trabalha-se com o direito penal da ofensividade. O delito não pode ser unicamente uma ação ou omissão dolosa ou culposa, pois não se trabalha apenas com a desvalia da ação, mas também com o grau de ofensa da conduta.


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A conduta é penalmente relevante quando causa uma ofensa ao bem jurídico. Ademais, o delito não se fundamenta exclusivamente na ação, mas, sobretudo, no resultado. Isso porque é preciso que haja uma ofensa grave a um bem jurídico relevante. Neste sentido, o crime passa a ser concebido não como infração do aspecto imperativo da norma primária, mas, sim, como infração ao aspecto valorativo dessa mesma norma. Igualmente, o juízo de tipicidade passa a constituir um juízo de desvalor fundamentado tanto no desvalor da conduta como no desvalor do resultado jurídico. A teoria constitucionalista do delito deve ser elaborada a partir das finalidades do Direito Penal, protegendo os bens jurídicos, estabelecendo um conjunto de garantias ante o jus puniendi, reduzindo a violência e evitando a vingança privada.

Exercício 23. (Cespe – 2012 – TJAC – Juiz) A teoria constitucionalista do delito, que integra o direito penal à CF, enfoca o delito como ofensa, concreta ou abstrata, a bem jurídico protegido constitucionalmente, havendo crime com ou sem lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico relevante. Certo ou errado?

24. Teorias Pós-finalistas – Funcionalismo A teoria constitucionalista está ligada não apenas ao desvalor da conduta, mas também ao desvalor do resultado. Assim, não basta a exteriorização de uma conduta, é preciso que haja ofensa a um bem jurídico e que este bem seja relevante. Prosseguindo, faz-se necessário analisar as vertentes funcionalistas. No funcionalismo, o Direito funciona como regulador da sociedade. Trata-se de tarefa mais importante do que a aplicação fria da lei. Quando se fala em funcionalismo penal, quer-se referir a uma submissão da dogmática penal aos fins específicos do Direito Penal. Indaga-se: quais seriam os fins do Direito Penal? A resposta é depende. Isso porque há diversas concepções funcionalistas ligadas ao Direito Penal, como o funcionalismo moderado de Roxin; o funcionalismo radical de Jakobs; e o funcionalismo reducionista de Zaffaroni.

Exercício 24. (Promotor de Justiça – RN – 2009 – Cespe) Acerca das teorias que regem o direito penal e os seus institutos, assinale a opção correta.


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a) A teoria final da ação foi elaborada por Von Liszt no final do século XIX, tendo sido desenvolvida também por Beling e Radbruch, resultando na estrutura mundialmente conhecida como sistema Liszt-Beling-Radbruch. b) A teoria causal da ação teve por mérito superar a taxativa separação dos aspectos objetivos e subjetivos da ação e do próprio injusto, transformando, assim, o injusto naturalístico em injusto pessoal. c) Para a teoria constitucional do direito penal, a verificação da ocorrência do fato típico doloso não se resume ao aspecto formal-objetivo, dependendo, ainda, da ocorrência de outros elementos de índole material-normativa e subjetiva. d) Para a teoria social da ação, um fato considerado normal, correto, justo e adequado pela coletividade, ainda que formalmente enquadrável em um tipo incriminador, pode ser considerado típico pelo ordenamento jurídico, devendo, no entanto, ser excluída a culpabilidade do agente. e) A teoria funcional da conduta está estruturada em duas vertentes: para a primeira, que tem Claus Roxin como principal defensor, a função da norma é a reafirmação da autoridade do direito; a segunda, cujo principal representante é Günther Jakobs, sustenta que um moderno direito penal deve estar estruturado teleologicamente, isto é, atendendo a finalidades valorativas.

25. Funcionalismo Moderado de Roxin O funcionalismo está ligado aos fins do Direito Penal. Há três espécies: o funcionalismo moderado de Roxin; o funcionalismo radical de Jakobs; e o funcionalismo reducionista de Zaffaroni. O funcionalismo moderado ou teleológico de Roxin preocupa-se com os fins do Direito Penal, levando em consideração finalidades político-criminais. Trata-se do funcionalismo dualista, que traz que o Direito Penal deve se inserir em uma norma jurídica superior já vigente, à qual deve prestar obediência. Para Roxin, o Direito Penal consiste em um conjunto de regras limitado principalmente pela Carta Magna, servindo como forma de proteção subsidiária de bens juridicamente tutelados. Para referido autor, a função primordial do Direito Penal é a proteção ao bem jurídico, o que o difere de Jakobs. Quando se fala em teoria do crime, há três vertentes principais. Roxin desenvolve a teoria da imputação objetiva. Ainda, tem-se que a ilicitude funciona como uma espécie de elemento negativo do tipo (solução social dos conflitos) e a pena (culpabilidade) assume, predominantemente, sua finalidade preventiva.


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O conceito bipartido do crime, para Roxin, se dá da seguinte forma: – injusto penal (fato típico + ilicitude); – responsabilidade (que incluiu a culpabilidade).

Exercício 25. (Defensor Público – 2011 – DPE/MA – Cespe) Consoante a concepção funcional defendida por Claus Roxin, a função da norma é a reafirmação da autoridade do direito, e sua aplicação constante e rotineira determina os padrões sociais de comportamento considerados normais e os indesejáveis, sendo a finalidade da pena a de exercitar a confiança despertada pela norma. Certo ou errado?

26. Funcionalismo Radical de Jakobs O funcionalismo radical preocupa-se com os fins da pena e leva em consideração necessidades sistêmicas. Trata-se do funcionalismo monista, ou seja, o Direito Penal vive por si só, desvinculado dos demais ramos do Direito, servindo apenas como garantia da vigência da norma. Jakobs defende que a sociedade deve se curvar perante o Direito Penal, e não o contrário. Assim, desta postura, surge a tese radical chamada Direito Penal do Inimigo. A teoria da imputação normativa de Jakobs adaptou o Direito Penal à teoria dos sistemas sociais de Luhmann. Assim, o Direito Penal está determinado pela função que cumpre no sistema social, sendo considerado um sistema autônomo, autorreferente e autopoiético, dentro de um sistema mais amplo da sociedade. De acordo com a teoria de Jakobs, um sujeito não é aquele que pode ocasionar ou impedir um sucesso, senão aquele que pode ser responsável por este. Ademais, quando o sujeito descumpre sua função na sociedade, deve ser eficazmente punido, pois somente assim resgata-se a autoridade da lei. Salienta-se que, como consequência de sua teoria, surge o Direito Penal do Inimigo.

Exercício 26. (PUC-PR – 2012 – TJRS – Juiz) Acerca das teorias funcionalistas do direito penal, marque a alternativa CORRETA:


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a) O funcionalismo monista ou de política criminal, que tem em Claus Roxin seu maior defensor, concebe a reafirmação da valoração da norma penal, por meio da aplicação de um direito penal máximo. b) O funcionalismo monista está ligado diretamente à teoria do direito penal do inimigo. c) O funcionalismo dualista ou radical, que tem em Claus Roxin seu maior defensor, concebe a proteção às garantias individuais do cidadão. d) As teorias funcionais do direito penal têm como função a substituição e a exclusão da teoria finalista da ação. e) Claus Roxin, idealizador da teoria da imputabilidade objetiva na década de 1960, defende um funcionalismo de política criminal ou dualista, em que o direito deve estar estruturado teleologicamente e com função primordial de proteção dos bens jurídicos da sociedade moderna.

27. Direito Penal do Inimigo Para desenvolver a tese do Direito Penal do Inimigo, Jakobs parte dos autores contratualistas, em especial Hobbes, Locke e Rousseau. O Direito Penal do Inimigo não trabalha com o processo penal tal qual é hoje conhecido, com ampla defesa, contraditório, mas, sim, com procedimento de guerra. Jakobs sustenta que há dois tipos de Direito Penal: um Direito Penal do Cidadão e um Direito Penal do Inimigo. No momento em que um crime é praticado, porém, sem objetivo de romper o pacto social, o sujeito é um delinquente cidadão. Assim, para este sujeito, é aplicado o Direito Penal do Cidadão. O Direito Penal do Cidadão é um Direito Penal com regras, com devido processo legal, com garantias penais e processuais penais e com contraditório e ampla defesa. Por outro lado, no Direito Penal do Inimigo, não há um procedimento processual penal, mas, sim, um procedimento de guerra e, na guerra, o inimigo não é preso, mas abatido. Tem-se, portanto, que o Direito Penal do Cidadão é aplicado a pessoas que não delinquem de modo persistente por princípio e o Direito Penal do Inimigo é aplicado contra quem se desvia por princípio. Ademais, o Direito Penal do Cidadão mantém a vigência da norma, enquanto o Direito Penal do Inimigo combate perigos.


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O inimigo não presta uma segurança cognitiva suficiente de um comportamento pessoal. Ainda, segundo esta teoria, o inimigo não só não pode esperar ser tratado como pessoa, mas o Estado não deve tratá-lo como tal, já que, do contrário, vulneraria o direito à segurança das demais pessoas.

28. Direito Penal do Inimigo no Brasil Conforme já estudado, o Direito Penal do Inimigo traz um Direito Penal sem garantias ou com uma grande restrição destas. Antes de chegar à análise do Direito Penal do Inimigo no Brasil, é preciso que se examine esta teoria no mundo. Em relação à base americana de Guantánamo em Cuba, muitos dos presos que lá se encontram, acusados de práticas terroristas, não têm nem mesmo um julgamento formal. Os americanos baixaram o Ato Patriótico depois que ocorreram os ataques terroristas. Uma das menções expressas em lei neste Ato estabeleceu a técnica de waterboarding, uma técnica de simulação de afogamento. Nota-se que os americanos positivaram em lei a tortura, o que decorre de uma ideia de Direito Penal do Inimigo. No Brasil, existe o Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei nº 7.565/1986) que prevê em seu art. 303, §§ 1º e 2º, a possibilidade de destruição de aeronave classificada como hostil, após autorização do Presidente da República ou autoridade por ele delegada. A Lei do Abate foi regulamentada pelo Decreto nº 5.144/2004, que estabeleceu procedimentos a serem seguidos com relação a aeronaves hostis ou suspeitas de tráfico de substâncias entorpecentes e drogas afins. Ocorre que, nos termos do art. 5º, XLVII, “a”, da Constituição Federal, não haverá pena de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX. Cumpre observar que tanto a Lei do Abate quanto o RDD (Regime Disciplinar Diferenciado) não são Direito Penal do Inimigo stricto sensu.

Exercício 27. (Cespe – 2012 – TJAC – Juiz) Idealizado por Günther Jakobs, o direito penal do inimigo é entendido como um direito penal de terceira velocidade, por utilizar a pena privativa de liberdade, mas permitir a flexibilização de garan-


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tias materiais e processuais, podendo ser observado, no direito brasileiro, em alguns institutos da lei que trata dos crimes hediondos e da que trata do crime organizado. Certo ou errado?

29. Velocidades do Direito Penal – Primeira e Segunda Velocidades O Direito Penal do Inimigo está ligado às velocidades do Direito Penal. Foi professor Jesús-María Silva Sánchez que falou pela primeira vez sobre o termo velocidades, citando somente duas. O Direito Penal de primeira velocidade é o Direito Penal tradicional. Ao mesmo tempo em que o Direito Penal de primeira velocidade trabalha com a pena de prisão por excelência, trabalha com respeito às garantias penais e processuais penais. Não se deve confundir o Direito Penal de primeira velocidade com o Direito Penal de segunda velocidade, porque o Direito Penal de segunda velocidade traz a substituição da pena de prisão por penas alternativas, bem como uma flexibilização das garantias penais e processuais penais.

Exercício 28. (MP-MG – 2008 – Promotor de Justiça) Modernamente, o chamado direito penal do inimigo pode ser entendido como um direito penal de: a) Primeira velocidade. b) Garantias. c) Segunda velocidade. d) Terceira velocidade. e) Quarta geração.

30. Velocidades do Direito Penal: Terceira e Quarta Velocidades O precursor do termo Velocidades, no Direito Penal, foi Silva Sanchez, autor do livro A expansão do Direito Penal. Este autor trabalha com a primeira e com a segunda velocidades do Direito Penal, no entanto, deixa em aberto o questionamento sobre uma terceira velocidade.


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Na primeira velocidade, temos a prisão por excelência, todavia, com respeito às garantias penais e processuais penais. A segunda velocidade substitui a pena de prisão por penas restritivas de direito e, ao mesmo tempo, relativiza garantias penais e processuais penais (como ocorre na transação penal – art. 76 da Lei nº 9.099/1995). Na terceira velocidade do Direito Penal, temos o resgate da pena de prisão, por excelência, e a flexibilização das garantias penais e processuais. É, em verdade, uma junção de parte de cada uma das velocidades anteriores. Esta velocidade liga-se ao chamado direito penal de emergência ou direito penal do inimigo. Não há um respeito efetivo ao devido processo legal. Relaciona-se o “inimigo” com o terrorista, para esta tese. Mas é importante ressaltar a perspectiva europeia (e norte-americana), que tratou também o imigrante clandestino como “inimigo”, criando inclusive agravantes da clandestinidade, com sanções até mesmo administrativas. Instituiu-se o crime de clandestinidade. O direito penal do inimigo (que é o direito penal de terceira velocidade) é um direito penal do autor, que pune o autor pelo que ele é, diferentemente do direito penal do fato que pune os fatos praticados. A quarta velocidade, ou neopunitivismo, está relacionada ao direito penal internacional: restringem-se ou suprimem-se garantias penais e processuais penais de réus que, no passado, ostentaram a função de chefes de Estado e, como tal, violaram gravemente tratados internacionais que tutelam direitos humanos.

Exercício 29. (PUC/PR – TJMS – Juiz – 2012): Marque a alternativa correta sobre as teorias das velocidades do direito penal: a) A teoria da primeira velocidade do direito penal é ligada à ideia do direito penal do inimigo, ou seja, tem como proposição a aplicação de um direito penal máximo, com penas privativas de liberdades e de caráter perpétuo. b) A teoria da segunda velocidade do direito penal é ligada à ideia do direito penal do inimigo, ou seja, tem como proposição a aplicação de um direito penal máximo, com penas privativas de liberdades e de caráter perpétuo. c) A teoria da terceira velocidade do direito penal tem como fundamento a aplicação de penas alternativas ou de multa, ou seja, está ligada à ideia de um direito penal de mínima intervenção.


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d) A teoria da quarta velocidade está ligada à ideia do neopunitivismo. e) A terceira velocidade do direito penal, idealizada por Jesús-Maria Silva Sánchez, está ligada à ideia do Tribunal Penal Internacional, ou seja, à proposição de um direito penal para julgar crumes de guerra, de agressão, de genocídio e de lesa humanidade.

31. Funcionalismo Reducionista – A Teoria da Tipicidade Conglobante de Zaffaroni O funcionalismo tem três vertentes: moderado (Roxin); radical (Jacobs); e reducionista, que é o que veremos nesta unidade. Trata-se do funcionalista argentino Eugenio Raúl Zaffaroni. Partimos da ideia de que, para a doutrina clássica, tipicidade penal é a tipicidade formal. Assim, se um fato praticado no mundo do ser se enquadra, no mundo do dever ser, à lei, o fato é típico. Despreza-se a tipicidade material: tipicidade é a mera adequação típica. Então, Zaffaroni surge com a teoria da tipicidade conglobante: prega que, em verdade, o direito é um só. A divisão em “matérias” é apenas didática. Assim sendo, um mesmo fato não pode ser permitido para o direito civil ou administrativo e criminoso. O fato é um só, e o direito é um só: ou o fato contraria o direito ou não. A doutrina de Zaffaroni determina que a tipicidade penal é a tipicidade formal + a tipicidade conglobante. E tipicidade conglobante significa que a conduta do agente é antinormativa e provida de tipicidade material. Conduta antinormativa é aquela que não é imposta e nem fomentada pelo Estado.

Exercício 30. (Cespe – DPE/AL – Defensor Público – 2009) Segundo a teoria da tipicidade conglobante, o ordenamento jurídico deve ser considerado como um bloco monolítico, de forma que, quando algum ramo do direito permitir a prática de uma conduta formalmente típica, o fato pode ser considerado atípico.

32. Fato Típico: do Resultado Há, para o direito penal, há duas espécies de resultado: físico ou naturalístico. Por isso, importante, agora, relembrar o conceito de crime material (o tipo aloja con-


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duta e resultado naturalístico, que é necessário para a consumação); crime formal (o tipo também aloja a conduta e o resultado, mas este não é necessário para a consumação); e crime de mera conduta (o tipo só aloja a conduta, não prevendo resultado naturalístico). Também se deve lembrar da estrutura do fato típico: para crimes formais, fato típico é conduta, resultado, nexo de causalidade e tipicidade. Mas, para os crimes formais e de mera conduta, fato típico é conduta e tipicidade, apenas. Trabalharemos, agora, com a estrutura do fato típico para os crimes formais, com os quatro elementos, analisando, especificamente, o resultado. O resultado pode ser analisado a partir de duas perspectivas. Uma teoria trabalha com o resultado jurídico ou normativo, a outra, com o resultado naturalístico. Para a teoria normativa (ou jurídica), o resultado é a lesão ou a exposição a perigo do bem jurídico protegido pela lei penal. Para esta teoria, todos os crimes têm resultado (jurídico ou normativo). Já, para a teoria naturalística ou material, a preocupação é com a alteração real do mundo. Resultado, portanto, é a efetiva modificação do mundo exterior. Aqui, pode haver crimes sem resultado naturalístico, como os crimes formais (o tipo prevê o resultado naturalístico, contudo, este resultado não é necessário para a consumação) ou os crimes de mera conduta (que não têm nenhum resultado naturalístico). Ainda, são exemplos, os crimes omissivos puros e os crimes de perigo abstrato.

Exercício 31. (FCC – TJPE – Analista Judiciário – 2012): O resultado pode se restringir ao perigo de lesão a um interesse protegido pela norma penal.

33. Fato Típico: da Relação de Causalidade Nexo causal é o vínculo entre a conduta e o resultado. Conduta, resultado e nexo tratam do fato em si e somente a tipicidade é elemento do crime. A relação de causalidade pode ser explicada por duas teorias: – teoria da equivalência dos antecedentes: causa é todo fato humano sem o qual o resultado não teria ocorrido como ocorreu. É a teoria adotada no Brasil, também denominada teoria da conditio sine qua non. O art. 13, caput, do CP, é claro ao dizer que se considera causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido;


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– teoria da causalidade adequada: causa é o antecedente necessário e adequado à produção do resultado. Pelo conceito do CP, devemos fazer uma regressão mental para verificar se cada um dos antecedentes é importante ou não para o resultado. Se um antecedente for indispensável para a produção do resultado, será causa. Desta forma, deve-se ficar atento neste sentido, porque muitos acontecimentos podem ser causas, mas ao mesmo tempo muitos acontecimentos podem também não ser causa. Veja, por exemplo, o caso de uma pessoa que, atingida por um tiro, vai ao hospital, mas é tomada por uma infecção hospitalar, e morre por conta dela. O tiro é causa da morte? A infecção é causa da morte? Não fosse o tiro, a vítima não teria ido ao hospital e não teria morrido, então, o autor do tiro responde por homicídio consumado. Mas é justo? A vítima não morreu do tiro. Por este motivo, vemos que a teoria da conditio sine qua non é muito rigorosa e, por isso, ela sofre alguns limites, que serão vistos na unidade seguinte.

Exercício 32. (FCC – TJPE – Analista Judiciário – 2012) O nexo de causalidade é a ligação entre a vontade do agente e a conduta delituosa.

34. Problema do Regresso ao Infinito É preciso utilizar-se do processo hipotético de eliminação de Thyrén: suprime-se determinado resultado mentalmente, a fim de se analisar se irá ou não desaparecer o resultado naturalístico. Individualizam-se cada um dos antecedentes ao resultado e exclui-se, um a um, perguntando-se: sem este, o resultado teria ocorrido? Se a resposta for sim, o antecedente não será causa; se a resposta for não, o antecedente será causa. O rigor da teoria da conditio sine qua non permite o regresso ao infinito. Num homicídio com arma de fogo, por exemplo, as causas poderiam atingir até a pessoa que produziu a arma. O primeiro limitador diz com as concausas, art. 13, § 1º, do CP. Depois veremos a teoria da imputação objetiva. E, finalmente, analisaremos a teoria da imputação subjetiva.

Exercício 33. (Cespe – MPR/RN – Promotor de Justiça – 2009): Em uma festividade natalina que ocorria em determinado restaurante, o garçom, ao estourar uma


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champagne, afastou-se do dever de cuidado objetivo a todos imposto e lesionou levemente o olho de uma cliente, embora não tivesse a intenção de machucá-la. Levada ao hospital para tratar a lesão, a moça sofreu um acidente automobilístico no trajeto, vindo a falecer em consequência exclusiva dos ferimentos provocados pelo infortúnio de trânsito. Com referência a essa situação hipotética e ao instituto do nexo causal no ordenamento jurídico brasileiro, assinale a opção correta: a) O garçom deverá responder por homicídio culposo. b) O garçom poderá responder apenas pelo delito de lesão corporal culposa. c) O garçom não deverá responder por nenhum delito. d) Em regra, o CP adotou a teoria da causalidade adequada para identificar o nexo causal entre a conduta e o resultado. e) Segundo a teoria da imputação objetiva, o garçom, por ter criado um risco absolutamente proibido pela sociedade, deveria responder pelo delito de homicídio doloso.

35. Concausas Independentes Absolutas Concausa é uma causa que concorre para o resultado. Temos concausas dependentes, que se situam num desdobramento causal que é esperado e natural. Temos ainda as concausas independentes, que são aquelas que não se encontram no plano causal normal, sendo estas as mais importantes para concursos públicos. Sobre estas, temos concausas independentes absolutas e relativas. São absolutas aquelas que não se originam da conduta do agente. Relativas, por outro lado, são as que se originam da conduta do agente. As concausas independentes absolutas podem ser de 3 espécies: – antecedentes ou preexistentes: ocorrem antes da conduta principal; – concomitantes: ocorrem juntamente com a conduta principal; – supervenientes: ocorrem após a conduta principal. Tomemos como exemplo um caso em que A quer matar B. Para tanto, desfere um tiro em B, que fica ferido, mas não morre. A não sabe que B, antes, tinha ingerido veneno, que é o que efetivamente mata B. Pergunta: B iria morrer de qualquer forma (com ou sem o tiro de A)? Sim. Mas A praticou tentativa de homicídio. Portanto, responderá por homicídio tentado. Concausa absolutamente independente antecedente.


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No mesmo exemplo: A atira para matar B no exato instante em que B está sendo assaltado e morto por um outro agente. Pergunta: B iria morrer de qualquer forma (com ou sem o tiro de A)? Sim. Mas A praticou tentativa de homicídio. Portanto, responderá também por homicídio tentado. Concausa absolutamente independente concomitante. Finalmente, A coloca veneno na comida de B. Posteriormente, a vítima, prestes a ingerir a comida, morre por conta de um incêndio na casa. Pergunta: B iria morrer de qualquer forma (com ou sem o veneno de A)? Sim. Mas A praticou tentativa de homicídio. Portanto, responderá por homicídio tentado. Concausa absolutamente independente superveniente. Assim, sempre que houver concausa absolutamente independente, a resposta será tentativa.

Exercício 34. (Cespe – TJPB – Juiz – 2011) Suponha que Jean, pretendendo matar seu desafeto Rui, tenha-lhe desferido dois tiros, que, apesar de atingirem a vítima, não tenha sido a causa da morte de Rui, que faleceu em decorrência do fato de ter ingerido veneno, de forma voluntária, dez minutos antes dos disparos. Nesse caso, Jean não responderá por nenhuma conduta típica.

36. Concausas Independentes Relativas As concausas relativamente independentes também podem ser antecedentes ou preexistentes, concomitantes ou supervenientes. – Concausas relativamente independentes preexistentes: o exemplo clássico é a hemofilia. Importante, antes de qualquer coisa, que o agente saiba da condição de hemofílico da vítima. Suponha que o agente dê uma facada numa vítima hemofílica, sabendo desta condição. A facada não é grave, mas a vítima falece, em razão exatamente da hemofilia. Pergunta: a vítima iria morrer de qualquer forma (independente da facada)? Não. A hemofilia por si só não mataria a vítima. Portanto, o autor da facada responderá por homicídio consumado. – Concausas relativamente independentes concomitantes: A quer matar B, e desfere neste uma facada não letal. B corre. No dia seguinte, é encontrado morto, congelado, porque o tempo estava muito frio. Pergunta: a vítima iria morrer de qualquer forma (somente por causa do frio)? Não. Concomitante à facada temos o frio, mas o frio, por si só, não mataria a vítima. Por isso, o agente responderá por homicídio consumado.


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– Concausas relativamente independentes supervenientes: A quer matar B, que atira. O tiro pega de raspão. B chega ao hospital e morre porque o hospital pegou fogo. Aqui, é preciso analisar a previsibilidade dos atos que ocorrem a partir do tiro. Explosão da ambulância, desabamento do teto do hospital, fogo na enfermaria, esses casos não são previsíveis. É preciso verificar se a concausa, por si só, matou a vítima. Sendo positiva a resposta, o agente responderá por homicídio tentado. É o que determina o § 1º do art. 13 do CP. É preciso avaliar se a concausa se situa num desdobramento causal previsível ou imprevisível.

Exercício 35. (Cespe – TJPB – Juiz – 2011) Considere que Márcia, com intenção homicida, apunhale as costas de Sueli, a qual, conduzida imediatamente ao hospital, falece em consequência de infecção hospitalar, durante o tratamento dos ferimentos provocados com o punhal. Nesse caso, Márcia responderá por tentativa de homicídio.

37. Imputação Objetiva – Noções Preliminares Continuando com as limitações à teoria da conditio sine qua non, veremos agora o segundo aspecto limitador, qual seja, a teoria da imputação objetiva. Antes da ideia de imputação objetiva, trabalhava-se apenas com um limitador: a imputação subjetiva (dolo e culpa). Mas a doutrina alemã se deu conta de que nem sempre a teoria da imputação subjetiva conseguia cuidar de todos os casos. O leading case ocorreu quando, em um bar, um agressor desfere um tapa no rosto da vítima. O agente não sabia, mas a vítima era cardíaca e morre por um ataque fulminante do coração. O resultado agravante, antigamente, era imputado ao agente por responsabilidade objetiva. No Brasil, importante saber que a responsabilidade objetiva cabe apenas em casos determinados, e nunca na esfera penal (art. 19 do CP: o resultado somente pode ser imputado a quem o houver causado ao menos culposamente). Voltando ao caso alemão, a morte era imputada ao agente, de forma injusta. E é, por isso, que, antes da imputação subjetiva, é necessário analisar a imputação objetiva.


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Retomando a teoria causalista: crime é meramente tipo objetivo (dolo e culpa integram a culpabilidade). Com o sistema finalista, a tipicidade divide-se em elementos objetivos e subjetivos. O dolo e a culpa migram para a tipicidade. A teoria da imputação objetiva reestrutura o fato típico, passando a ser visto como conduta + resultado naturalístico + nexo causa físico + critérios de imputação objetiva. Os critérios são: – criação ou incremento de um risco não permitido para o objeto da ação; – o risco se realiza no resultado concreto; – o resultado se encontra dentro do alcance do tipo.

Exercício 36. (Cespe – DPE/MA – Defensor Público – 2011) De acordo com a teoria geral da imputação objetiva, não se pode imputar a agente um resultado decorrente da prática de um risco permitido, ao contrário do que ocorre em face da ação que vise à redução de riscos permitidos.

38. Imputação Objetiva – Requisitos e Jurisprudência Conforme visto na unidade anterior, a imputação objetiva surge porque a imputação subjetiva (dolo e culpa) se mostrou insuficiente para limitar a teoria da equivalência dos antecedentes, especialmente nos crimes qualificados pelo resultado. Veja-se um exemplo: em um edifício em chamas, os bombeiros trabalham. Um dos bombeiros morre. Pela teoria da equivalência dos antecedentes, a pessoa que chamou os bombeiros é responsável por esta morte (sem o chamado, o bombeiro não teria morrido). Para estes casos, surge a teoria da imputação objetiva, que conta com 3 requisitos: a criação ou incremento de um risco não permitido para o objeto da ação; o risco se realiza no resultado concreto; e o resultado se encontra dentro do alcance do tipo. O risco é uma prognose (situação do agente no momento da conduta) póstuma (realizada pelo juiz depois da prática do fato) objetiva (leva em consideração o homem médio).


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Desta forma, há hipóteses que excluem a imputação objetiva: riscos permitidos, riscos tolerados, diminuição dos riscos e resultado jurídico encontrado fora do âmbito de proteção da norma.

39. Teoria da Tipicidade – Evolução do Tipo Conforme já visto, fato típico em crimes materiais é formado por conduta, resultado, nexo causal e tipicidade. Já vimos os três primeiros elementos (observando que a teoria da imputação subjetiva será analisada adiante). Trabalharemos agora com a tipicidade. Nos crimes formais e de mera conduta, o fato típico é conduta mais tipicidade. Assim, a tipicidade está sempre presente no fato típico, para quaisquer dos crimes. A tipicidade é, basicamente, a adequação. Analisaremos, agora, a evolução do tipo. Em uma primeira fase, temos Ernst von Beling, que concebeu a chamada tipicidade neutra: o tipo é totalmente objetivo (não composto por elementos subjetivos). Após, a tipicidade é tida como indício da ilicitude. É a fase de Max Ernst Mayer. A tipicidade é a razão de conhecer da ilicitude (ratio cognoscendi), ou seja, uma vez típico, presume-se (em presunção relativa) que o fato é ilícito. Esta é a fase brasileira. Posteriormente, temos, em Mezger, a terceira fase, em que a tipicidade é tida como parte integrante da ilicitude, a razão de ser desta (ratio essendi). Na quarta fase, temos Weber, concebendo o tipo total do injusto. Liga-se à teoria dos elementos negativos do tipo, ou seja, a tipicidade é um elemento negativo do tipo, juntamente com a ilicitude. A antijuridicidade é um elemento descaracterizador da ilicitude. Finalmente, numa quinta fase, temos Zaffaroni e a tipicidade conglobante. O tipo é global: ou o fato contraria o direito ou não.

Exercício 37. (FCC – DPR/PR – Defensor Público – 2012) Para a teoria indiciária (ratio cognoscendi), a tipicidade é um indício ou presunção juris et de iuris da normatividade da ilicitude.


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40. Adequação Típica Adequação típica é o procedimento pelo qual uma conduta se enquadra na descrição genérica do tipo penal. É a subsunção à norma, que acontece quando o fato se enquadra perfeitamente à norma. A adequação típica direta ou imediata ocorre quando o comportamento enquadra-se perfeitamente na figura penal. Ex.: crime consumado de homicídio – norma: matar alguém. Já a adequação típica indireta ou mediata ocorre quando o fato não se enquadra perfeitamente ao tipo penal, havendo a necessidade de uma norma de ampliação ou extensão da figura típica. Veja o exemplo: a técnica no Brasil é, em regra, descrever o crime na forma consumada (salvo exceções). Assim, não existe, na parte especial do CP, o crime de tentar matar alguém. Portanto, é necessária uma norma de ampliação ou de extensão da figura típica, sob pena de ofensa ao princípio da reserva penal. Isto é válido para a tentativa e também para a coautoria/participação. No que se refere à tentativa, a norma de ampliação é o art. 14, II, do CP. Para a participação, o artigo é o 29 do CP. O mesmo ocorre com os crimes de omissão impura (art. 13, § 2º, do CP).

Exercício 38. (TRT – 15ª Região – Juiz do Trabalho – 2012) Tipicidade diz respeito à subsunção perfeita da conduta praticada pelo agente ao modelo abstrato previsto na lei penal, isto é, a um tipo penal incriminador. A tipicidade penal é formada, ainda, pela conjugação da tipicidade formal (ou legal) com a tipicidade conglobante).

41. Funções do Tipo e Elementos do Tipo Várias são as funções do tipo: – função garantista: o tipo penal é uma garantia individual, porque cada um tem a segurança de saber, antecipadamente, que tal fato é crime; – função fundamentadora: o tipo penal fundamenta o jus puniendi do Estado; – função indiciária da ilicitude: tipicidade é ratio cognoscendi da ilicitude, ou seja, uma vez típico, presume-se que o fato é ilícito;


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– função seletiva: o tipo penal faz a seleção de determinadas condutas transformando-as em crime ou contravenção penal. Além disso, importante verificarmos os elementos do tipo penal. O tipo penal é formado por uma parte objetiva e uma parte subjetiva. Tipo objetivo é formado por elementos objetivos descritivos (aqueles de fácil percepção por qualquer pessoa, puramente descritivos, sem necessidade de qualquer percepção axiológica do magistrado, como matar alguém) e por elementos descritivos normativos (estes exigem do intérprete um juízo de valoração, como o estado puerperal, a palavra ‘idoso’; o juiz vai buscar, no ordenamento, o significado destes elementos). O elemento normativo pode ou não ter cunho jurídico. Com relação ao tipo subjetivo: é formado por dolo e, em alguns crimes, pela finalidade especial do agente. Todos os tipos possuem o dolo, mas alguns crimes dolosos exigem o elemento subjetivo especial (anteriormente denominado pelos causalistas de dolo específico). Veja-se o crime de extorsão: o verbo nuclear é constranger, mas deve ser feito com o intuito de obter indevida vantagem patrimonial. Este é o fim específico.

Exercício 39. (FCC – TJPE – Analista Judiciário – 2012) Tipicidade é a relação entre ação delituosa e o resultado almejado pelo agente.

42. Espécies de Tipo As espécies de tipo podem ser: – normal: prevê apenas elementos de ordem objetiva; – anormal: prevê elementos objetivos e elementos subjetivos e/ou normativos. Esta classificação tinha razão de ser com o causalismo, em que a tipicidade era puramente objetiva. Agora, o tipo anormal é a regra para a teoria finalista. No momento em que o dolo e a culpa migram da culpabilidade para a tipicidade, os tipos penais passam a ficar cheios de elementos objetivos, normativos e subjetivos. Ainda, as espécies de tipo podem ser: – fundamental: descreve a forma mais simples de conduta criminosa. Exemplo: furto simples, homicídio simples;


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– derivado: se origina do tipo fundamental e descreve circunstâncias que aumentam ou diminuem a pena. Exemplo: furto qualificado, homicídio qualificado. Ainda, o tipo derivado por ver um homicídio privilegiado, por exemplo; – fechado: possui todos os elementos do tipo; – aberto: não possui todos os elementos do tipo, devendo ser complementado pelo juiz; – congruente: não exige, além do dolo, qualquer requisito subjetivo especial ou transcendental do agente; – incongruente: além do dolo, exige uma finalidade especial do agente. Exemplo: extorsão, associação criminosa.

Exercício 40. (Cespe – DPE/AL – Defensor Público – 2009) Segundo a teoria dos elementos negativos do tipo, as causas de exclusão de culpabilidade devem ser agregadas ao tipo como requisitos negativos deste, resultando conceito denominado pela doutrina de tipo total de injusto. Certo ou errado?

43. Dolo Natural e Dolo Normativo Para os causalistas, conduta é um comportamento humano e voluntário, que modifica o mundo exterior. Em decorrência deste entendimento, o dolo e a culpa não fazem parte da conduta para os causalistas, pois estes dois elementos estão dentro da culpabilidade. No momento em que surge a teoria finalista, há toda uma mudança na estrutura que começa em tipicidade e se desloca até a culpabilidade. O finalismo faz com que a própria conceituação de conduta se modifique, pois a conduta deixa de ser um simples comportamento humano e voluntário e passa a ser um comportamento humano, voluntário e consciente (conduta dolosa ou culposa), enquanto os causalistas trabalhavam com o crime em duas partes, uma parte objetiva (tipicidade) e uma parte subjetiva (culpabilidade). Porém, na teoria finalista, quando o dolo migra para a tipicidade, modifica-se a culpabilidade. Quando se fala em teoria psicológico-normativa, refere-se a uma das teorias que explica a culpabilidade, no período causalista, dizendo que a culpabilidade é formada por três elementos: imputabilidade, dolo (dolo normativo) ou culpa e exigibilidade de conduta diversa.


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No momento do advento do finalismo, que altera a culpabilidade, a teoria que passa a explicar a culpabilidade, é a teoria normativa pura. Assim, o dolo (dolo natural) passa a integrar o fato típico. Desse modo, vê-se que o dolo natural é formado apenas por consciência e vontade, enquanto o dolo normativo, além de consciência e vontade, exige a consciência da ilicitude.

Exercício 41. (Cespe – Polícia Federal – Delegado de Polícia – 2013) Segundo a teoria causal, o dolo causalista é conhecido como dolo normativo, pelo fato de existir, nesse dolo, juntamente com os elementos volitivos e cognitivos, considerados psicológicos, elemento de natureza normativa (real ou potencial consciência sobre a ilicitude do fato). Certo ou errado?

44. Teorias do Dolo O dolo normativo é formado pela consciência, pela vontade e pela consciência da ilicitude. Com o advento da teoria finalista, o dolo migra para dentro da tipicidade; migra como dolo natural. O dolo previsto no art. 18 do Código Penal é o dolo natural, que prevê apenas a consciência e a vontade. Em síntese, o dolo dos causalistas está na culpabilidade e é chamado de dolo normativo; já o dolo dos finalistas está no fato típico e é chamado de dolo natural. O dolo normativo é formado por três elementos: a consciência, a vontade e a consciência da ilicitude. Já o dolo natural é formado por apenas dois elementos: a consciência e a vontade. Ainda há um resquício de dolo normativo dentro da culpabilidade, que está na potencial consciência da ilicitude. Isso significa que o dolo previsto no art. 18 do Código Penal é o dolo formado por consciência e vontade. Existem três teorias do dolo: – da representação: exige apenas a previsão do resultado. Essa teoria se satisfaz apenas com o aspecto intelectivo, ou seja, basta apenas a consciência em relação à produção do resultado. A teoria da representação não é adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro;


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– da vontade: exige tanto a previsão quanto a vontade de produzir o resultado. Essa teoria exige tanto o aspecto intelectivo como o aspecto volitivo (produzir o resultado); – do consentimento: há dolo quando o agente quer ou assume o risco de produzir o resultado. Essa teoria complementa a teoria da vontade, pois determina que também há dolo quando o agente assume o risco de produzir o resultado. Assim, deve-se observar o disposto no art. 18, I, do CP. “Art. 18. Diz-se o crime: I – doloso, quando o agente quis o resultado (teoria da vontade) ou assumiu o risco de produzi-lo (teoria do consentimento);” (...)

Exercício 42. (Polícia Civil – MG – Delegado de Polícia – 2011) Com relação ao tipo doloso, o Código Penal Brasileiro adotou as teorias da vontade e do assentimento e não da atividade. Certo ou errado?

45. Dolo Direto O dolo está disposto no art. 18, I, do CP: “Art. 18. Diz-se o crime: I – doloso, quando o agente quis o resultado (teoria da vontade) ou assumiu o risco de produzi-lo (teoria do consentimento, assentimento ou anuência);” (...) Dolo direto é a vontade do agente, que se dirige a um determinado resultado. O dolo direito divide-se em dolo direto de primeiro grau e dolo direito de segundo grau. No dolo direito de primeiro grau, o fim é diretamente pretendido pelo agente. Exemplo: determinada pessoa quer matar outra e, munido de uma arma, dirige-se até onde esta pessoa está e a mata. Já, no dolo direito de segundo grau, o resultado é obtido como consequência necessária à produção do fim. Exemplo: para matar determinada pessoa, o agente utiliza uma bomba e acaba matando outras pessoas e a pessoa pretendida.

Exercício 43. (MPE – PR – Promotor de Justiça – 2012) Se o autor explode embarcação própria com o fim de receber o valor do seguro, o resultado de morte dos tri-


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pulantes, representado como efeito colateral certo ou necessário pelo autor, é atribuível a este a título de dolo direito de primeiro grau. Certo ou errado?

46. Dolo Indireto No dolo indireto, o agente não dirige sua vontade a um determinado resultado. O dolo indireto é gênero de duas espécies que são o dolo alternativo e o dolo eventual. No dolo indireto alternativo, o agente deseja, com igual intensidade, a produção de um ou de outro resultado. Como exemplo do dolo indireto alternativo, tem-se a situação onde A dispara contra B para, com a igual intensidade, matá-lo ou feri-lo. Já, no dolo indireto eventual, o agente não quer o resultado, mas prevê e o aceita como possível, assumindo o risco que ele ocorra. Existem alguns tipos penais que são incompatíveis com o dolo eventual, como são os casos previstos nos arts. 138, § 1º, e 180, do CP, ou seja, sempre que o legislador exigir certeza a respeito de elementares ou circunstâncias não caberá o dolo eventual. Desta forma, por exemplo, a receptação simples, prevista no caput do art. 180 do CP, não pode ser praticada com o dolo eventual. Porém, a receptação qualificada, prevista no art. 180, § 1º, do CP, pode ser praticada com dolo eventual.

Exercício 44. (Polícia Civil – MG – Delegado de Polícia – 2011) No dolo direto, o agente quer efetivamente produzir o resultado, ao praticar a conduta típica, e no dolo indireto, o agente não busca com sua conduta resultado certo e determinado, subdividindo-se em dolo alternativo e eventual. Certo ou errado?

47. Dolus Generalis – Dolo Genérico e Específico – Dolo de Propósito e de Ímpeto O dolus generalis, erro sucessivo ou aberratio causae, ocorre quando, depois de produzir o resultado desejado, o agente pratica nova conduta, com finalidade diversa, sendo esta a que causa o evento pretendido na origem. Por exemplo: um agente desfere um golpe na cabeça da vítima com a intenção de matá-la. Após


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a vítima cair, o agente acredita ter atingido o resultado. Em seguida, acreditando que havia matado a vítima, o agente oculta o cadáver e o joga em um rio. Alguns dias depois, o corpo é encontrado e, feito o exame necroscópico, constata-se que a causa da morte foi afogamento. Assim, observa-se no exemplo que, quando o agente desfere o golpe na cabeça da vítima (primeira conduta) acredita que a matou, porém, na prática de ocultar o cadáver (segunda conduta), atinge o resultado. Desta forma, mesmo praticando duas condutas, o agente responderá por homicídio e não por ocultação de cadáver, por não existir cadáver. Analisando apenas a conduta do agente no exemplo, nota-se que este praticaria em tese o crime de homicídio qualificado, em decorrência do afogamento, todavia, a vontade do agente não era praticar sofrimento violento e desnecessário à vítima, mas ocultar o cadáver. Sendo assim, o agente responderá pela prática de homicídio simples e não qualificado. O dolo específico, chamado pela teoria finalista de elemento subjetivo especial do tipo, ocorre, por exemplo, nos casos de extorsão, pois há o dolo geral (constranger) e o dolo específico (obter a indevida vantagem patrimonial). Existe ainda o dolo de propósito, que emana da reflexão do agente (premeditação). É importante destacar que a premeditação, no ordenamento jurídico brasileiro, não é circunstância qualificadora e nem agravante de um crime, mas será sopesada na pena-base, como circunstância negativa. O dolo ímpeto ocorre quando o agente pratica o crime motivado por paixão violenta ou excessiva perturbação de ânimo (violenta emoção). Essa violenta emoção poderá beneficiar o agente, por exemplo, no caso em que o marido ao chegar a sua casa encontra sua mulher com outro homem.

Exercício 45. (TJ – DFT – Juiz – 2011) Diz-se o crime: I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo. Daí: a) Quando o agente pratica a conduta típica, sem qualquer finalidade especial, denomina-se dolo específico. b) Quando o agente pratica a conduta típica, destinada a uma finalidade especial denomina-se dolo genérico. c) Quando a vontade do agente é dirigida a um resultado determinado, porém, vislumbrando a possibilidade de um segundo resultado não desejado, denomina-se dolo eventual. d) Quando o agente pratica a conduta dirigida especificamente a produzir um resultado típico, denomina-se dolo direto de segundo grau.


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48. Culpa – Técnica no Brasil e Princípio da Excepcionalidade A culpa está prevista no art. 18, II, do Código Penal. “Art. 18. Diz-se o crime: II – culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.” Para o ordenamento jurídico brasileiro, a regra é de que os crimes sejam dolosos, mas, em alguns casos (exceção), admite-se o crime em sua forma culposa. Em regra, os crimes culposos são tipos penais abertos (incompletos), ou seja, estão abertos à interpretação do magistrado. Excepcionalmente, existem crimes culposos fechados, como ocorre na Lei de Drogas. Outro exemplo é a receptação culposa, prevista no art. 180, § 3º, do CP: “Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso: Pena – detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas.” É importante destacar que, no ordenamento jurídico brasileiro, não há a figura do partícipe nos casos de crimes culposos. O princípio da excepcionalidade do crime culposo está disposto no art. 18, parágrafo único, do CP: “Art. 18, parágrafo único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.”

Exercício 46. (MPE – MS – Promotor de Justiça – 2011) Admite-se a participação em crime culposo? a) O crime culposo admite a participação, desde que comprovada a colaboração. b) O crime culposo admite a participação em caso de negligência. c) O crime culposo admite a participação em caso de imprudência. d) O crime culposo admite a participação em caso de imperícia. e) O crime culposo não admite a participação.


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49. Elementos do Crime Culposo – Conduta Inicial Voluntária e Violação do Dever de Cuidado Objetivo Quando se fala em conduta inicial voluntária, quer-se referir à vontade do agente, que se dirige à realização da conduta, e não à produção do resultado. O segundo elemento do crime culposo é o dever de cuidado objetivo, que é o comportamento imposto pelo ordenamento jurídico a todas as pessoas. No momento que alguém descumpre o dever de cuidado objetivo pratica uma conduta perigosa, esse alguém está, em tese, infringindo o direito e incorrendo em crime culposo. Essa violação pode se dar a partir de modalidades de culpa, conforme o disposto no art. 18, inciso II, do CP. As três modalidades de culpa são: – imprudência: agir culposamente. Exemplo: limpar uma arma perto de várias pessoas; – negligência: omitir-se culposamente. Exemplo: motorista de ônibus que carrega crianças, sabendo que o pneu do ônibus está careca; – imperícia: culpa profissional. Exemplo: engenheiro que utiliza materiais impróprios em determinada obra.

Exercício 47. (UEG – Polícia Civil – GO – 2013) João, que nunca usou uma arma de fogo, manuseia uma e acaba por dispará-la, matando José, que a tudo assistia ao seu lado. Ao fazer isso, pratica uma conduta culposa: a) Imprudente. b) Negligente. c) Imperita. d) Inconsciente.

50. Elementos do Crime Culposo – Resultado Involuntário e Nexo Causal O primeiro elemento do crime culposo é a conduta inicial voluntária do agente, mas o resultado é inesperado, pois se o resultado fosse esperado, não haveria diferença entre dolo e culpa.


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O crime culposo, como já mencionado, está disposto no art. 18, II, do CP. “Art. 18. Diz-se o crime: II – culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.” Os crimes quanto ao resultado naturalístico podem ser: – materiais: o tipo penal aloja conduta e resultado naturalístico, que é necessário para a consumação. Exemplo: homicídio; – formais: o tipo penal também aloja conduta e resultado naturalístico, mas este resultado não é necessário para a consumação. Exemplo: extorsão; – de mera conduta: são aqueles que o tipo penal só aloja a conduta, não havendo sequer a previsão do resultado naturalístico. Como o art. 18, II, do CP, prevê a necessidade de um resultado nos crimes culposos, se está diante de delitos materiais. Sendo assim, se não houver resultado naturalístico, em tese, não haverá crime culposo. É importante destacar que, se a conduta não gerar um resultado naturalístico, poderá o agente enquadrar-se na prática do crime de perigo ou em alguma contravenção penal. Na análise da culpa, também se deve trabalhar com a ligação entre conduta e resultado. Precisa-se comprovar que determinado resultado foi produzido pela conduta inicial voluntária.

Exercício 48. (Cespe – CNJ – Analista Judiciário – 2013) Nos crimes culposos, é dispensável a produção do resultado naturalístico involuntário. Certo ou errado?

51. Elementos do Crime Culposo – Previsibilidade Objetiva Em se falando de crime culposo, a culpa é um elemento objetivo normativo do tipo penal, havendo a necessidade de um especial juízo de valoração. Dentre os elementos do crime culposo, há a previsibilidade objetiva, que é a possibilidade de o homo medius (homem médio) prever o resultado, ou seja, analisa-se a conduta do homem mediano, como agiria a maioria das pessoas no caso concreto.


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Se o homem médio tivesse previsto o resultado, encaminhar-se-ia para a condenação do agente e, caso o homem médio não tivesse previsto o resultado, caminhar-se-ia para uma absolvição. Não se deve confundir previsibilidade objetiva com previsibilidade subjetiva. A previsibilidade objetiva relaciona-se com a culpa (fato típico) e a previsibilidade subjetiva relaciona-se com a culpabilidade.

Exercício 49. (Polícia Civil – MG – Delegado de Polícia – 2011) A previsibilidade objetiva é elemento integrante do tipo culposo, podendo a previsibilidade subjetiva ser analisada por ocasião da culpabilidade. Certo ou errado?

52. Elementos do Crime Culposo – Ausência de Previsão e Tipicidade Se fosse possível definir os elementos do crime em uma só palavra, tipicidade seria adequação; ilicitude seria contrariedade; e culpabilidade seria censura. Qualquer aspecto subjetivo deve ser feito em relação à culpabilidade. Previsibilidade objetiva: analisar se o homem médio teria condições de prevê-la – tipicidade. Previsibilidade subjetiva: circunstâncias pessoais daquele réu – culpabilidade. A potencial consciência da ilicitude é o momento de ver se há a previsibilidade subjetiva. Ausência de previsão: em regra, o agente não prevê o resultado previsível objetivamente. Excepcionalmente, haverá previsão do resultado (culpa consciente). Há uma espécie de culpa com previsão, que é a culpa consciente. Com exceção desta, há o elemento no crime culposo de ausência de previsão. No caso concreto, não houve previsão, isto é culpa. Crimes culposos – são tipos penais abertos. Tipicidade – tipo aberto. Como visto, na teoria da norma penal, a lei penal incompleta pode ser complementada por outra lei, ato administrativo ou, ainda, pelo juiz. Isso é o tipo penal aberto. Os crimes culposos são tipos penais abertos por excelência. Se forem tipos penais abertos, terão que ser complementados, fechados.


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O magistrado deposita um juízo axiológico para completar o tipo que está incompleto. Elementos do fato típico culposo: – conduta inicial voluntária; – violação do dever de cuidado objetivo por negligência, imperícia ou imprudência; – resultado involuntário; – nexo de causalidade entre conduta e resultado; – previsibilidade objetiva do resultado; – ausência da previsão; – tipicidade.

Exercício 50. (FUJB – 2012 – MPE/RJ – Promotor de Justiça) Sobre culpa em sentido estrito, é incorreto afirmar que: a) A responsabilização por crime culposo se fundamenta na inobservância do dever de asseguramento de tráfego. b) O grau da culpa influi na quantificação da pena em abstrato. c) A quase totalidade dos crimes culposos é composta de delitos materiais e de tipo penal aberto, mas há exceções. d) A culpa consciente se caracteriza pela não tolerância do resultado. e) Nos termos da concepção finalista, a culpa configura elemento normativo do tipo.

53. Espécies de Culpa São sete os elementos do crime culposo: conduta inicial voluntária; violação do dever de cuidado objetivo por imprudência, imperícia ou negligência; resultado involuntário; nexo causal entre conduta e resultado; previsibilidade objetiva do resultado; ausência de previsão; e tipicidade. Culpa e concurso de pessoas – são duas as modalidades de concurso de pessoas: coautoria e participação em sentido estrito, abrangendo a forma moral e material de participação. A forma moral se dá pelo induzimento ou instigação, induzir é fazer nascer a ideia na cabeça do agente; instigar é reforçar uma ideia que já existe.


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A forma material se dá pelo auxílio que, em regra, ocorre com o fornecimento de meios materiais; por exemplo, uma arma emprestada que será utilizada em um homicídio. Se o crime culposo for um tipo penal aberto, não haverá conduta nuclear, elementos do tipo, e se não há como chegar à conduta principal, muito menos se chegará à conduta acessória. Isso significa que não há participação em crime culposo no Brasil, pois esse é um crime penal aberto. O crime culposo aceita o instituto da coautoria, divisão de atos executórios. Culpa inconsciente ou ex ignorantia: o agente não prevê o resultado previsível objetivamente. É a culpa propriamente dita. Não prever o resultado previsível. Culpa consciente ou ex lascivia: depois de prever o resultado, o agente, mesmo assim, realiza a conduta, acreditando sinceramente que ele não ocorrerá. A culpa consciente é com previsão. O agente prevê o resultado, mas acredita que ele não ocorrerá. Exemplo: o agente anda de carro em alta velocidade em um dia de chuva, pode atropelar alguém, mas confia nas suas habilidades. Culpa própria: o agente não quer o resultado e nem assume o risco de produzi-lo. Não age nem com dolo direto e nem eventual. Culpa imprópria ou por extensão: após prever o resultado, o agente realiza a conduta incorrendo em erro inescusável quanto à ilicitude do fato.

Exercício 51. (Vunesp – 2012 – DPE/MS – Defensor Público) Com relação ao crime culposo, assinale a alternativa correta: a) Imprudência é uma omissão, uma ausência de precaução em relação ao ato realizado. b) Na culpa consciente, o resultado não é previsto pelo agente, embora previsível. c) O resultado involuntário trata de elemento do fato típico culposo. d) Na culpa imprópria, o resultado não é previsto, embora seja previsível.

54. Culpa Imprópria Culpa inconsciente é a sem previsão. Na culpa consciente, há a previsão, mas, mesmo assim, o agente pratica a conduta, pois acredita que não produzirá o resultado.


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Culpa própria é onde o agente não quer o resultado e nem assume o risco de produzi-la. Culpa imprópria ou por extensão: erro inescusável é o erro evitável. Após prever o resultado, o agente realiza a conduta incorrendo em erro inescusável quanto à ilicitude do fato. Putativo significa imaginário. Na primeira parte do artigo, há uma grande divergência doutrinária. No erro de tipo permissivo, os doutrinadores se filiam à teoria limitada da culpabilidade. Já, no erro de proibição, os doutrinadores se filiam à teoria extremada da culpabilidade. Se ficar entendido que um homem médio teria agido como o pai agiu, ficará ele isento de pena. Se, ao contrário, ficar entendido que o pai incorreu em erro, de forma irresponsável, responderá ele por crime culposo. Punir o pai por dolo seria injusto, mas deixá-lo impune também não seria possível. Tentativa nos crimes culposos – incabível, com exceção da culpa imprópria. A culpa imprópria, em verdade, é dolo, mas tratado culposamente por política penal. Essa é uma opção legislativa. Cabe tentativa nos crimes culposos? Não. Só caberá se estiver expressamente como culpa imprópria.

Exercício 52. (PC-MG –2011 – Delegado de Polícia) A culpa imprópria está presente na discriminante putativa, nela, o agente dá causa dolosa ao resultado, mas responde como se tivesse praticado crime culposo, em razão de erro evitável pelas circunstâncias. Certo ou errado?

55. Exclusão da Culpa São elementos do crime culposo: – conduta inicial voluntária; – violação do dever de cuidado objetivo por imprudência, imperícia ou negligência; – resultado involuntário;


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– nexo causal entre conduta e resultado; – previsibilidade objetiva do resultado; – ausência de previsão e a tipicidade. São espécies de culpa: – culpa inconsciente ou sem previsão; – culpa consciente ou com previsão; – culpa própria; – culpa imprópria. Descriminante putativa: erro justificável cabe isenção de pena, se o erro não for justificável, responderá por culpa. A culpa imprópria é dolo, cabe tentativa. Não se aceita tentativa nos crimes culposos, com exceção da culpa imprópria. Casos de exclusão da culpa: a) caso fortuito e força maior (infelicitas facti): se o resultado for imprevisível, haverá exclusão da culpa. A culpa está dentro do tipo; nessas hipóteses, o fato é atípico; b) erro profissional: a culpa profissional é imperícia, o que mantém o crime. O erro profissional exclui o crime. Não significa que o profissional foi imperito; c) princípio da confiança: no trânsito, no momento em que o semáforo fica verde, o agente sai com seu carro, mas, nessa hora, vem um motoqueiro que fura o sinal, o agente do carro bate nele e ele morre. O agente do carro confiou, pois achou que quem estivesse com o semáforo vermelho, pararia, mas o motoqueiro não fez isso e furou o sinal. Nesse caso, pode ser excluída a culpa, e, portanto, o fato típico.

Exercício 53. (FCC – 2011 – TRT 1ª Região (RJ) – Juiz do Trabalho) Em matéria de dolo e culpa, é correto afirmar que: a) É indispensável a previsibilidade do resultado pelo agente nos crimes culposos. b) É prescindível o nexo causal entre a conduta e o resultado nos crimes culposos. c) Há culpa consciente quando o agente não prevê o resultado, embora este seja previsível. d) Excluem a culpabilidade, se ausentes. e) O agente só responderá pelo resultado que agrava especialmente a pena quando o houver causado dolosamente.


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56. Dolo Eventual x Culpa Consciente O crime culposo não admite participação, mas é possível coautoria. Há três modalidades de culpa: negligência, imperícia e imprudência e quatro espécies de culpa: inconsciente, consciente, própria e imprópria. O dolo direto é aquele que o agente diretamente quer o resultado. No dolo direto de primeiro grau, o fim é diretamente pretendido pelo agente. No dolo direto de segundo grau, o fim é obtido como consequência necessária para a produção do resultado. No dolo indireto, a vontade do agente não se dirige em um só sentido, é gênero. O dolo alternativo é aquele em que o agente, com igual intensidade, deseja produzir um ou outro resultado. No dolo eventual, o agente não quer o resultado, mas o prevê e o aceita como possível, assumindo o risco. Culpa consciente: confiança nas próprias habilidades pessoais. Dolo eventual: descaso em relação ao bem jurídico. É preciso trabalhar com os elementos objetivos de prova à disposição no processo. Descaso em relação ao bem jurídico é dolo eventual. Confiança nas próprias habilidades é culpa consciente. No caso do sujeito que mata alguém no trânsito e estava embriagado, não se pode concluir tudo como dolo eventual. Dolo eventual no trânsito precisa, além da embriaguez, da condução anormal.

Exercício 54. (MPDFT – 2011 – Promotor de Justiça) A culpa inconsciente diferencia-se do dolo eventual na medida em que o agente, embora represente a possível produção do resultado típico lesivo, acredita na sua não ocorrência. Certo ou errado?

57. Compensação e Concorrência de Culpas Culpa consciente x culpa inconsciente – o CP dispensa igual tratamento às duas modalidades de culpa.


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No CP italiano, a culpa consciente é punida de maneira mais severa, diferente do Brasil. Caso o juiz entenda que a culpa com previsão deva ser sancionada de maneira mais grave, deverá fundamentar. Em abstrato, é temerário dizer que uma delas mereça sanção mais severa. Muitas vezes, alguns institutos são vedados porque o crime é praticado com violência à pessoa. Essa violência é a dolosa. Se o fato em questão for lesão corporal no trânsito, a violência será culposa. O art. 16 dispõe que o benefício não cabe quando há violência à pessoa, não diz se é culposa ou dolosa. A doutrina estabelece que, embora fale da violência à pessoa, ela está se referindo à violência dolosa. Há possibilidade de substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Requisitos objetivos: – o crime não pode ser praticado com violência à pessoa; – a condenação não pode ser superior a 4 anos. A violência à pessoa é a dolosa. Os crimes culposos aceitam a substituição, não importa o tempo da condenação. Compensação de culpas – inadmissível do Direito Penal. É possível no civil, mas não no penal. O fato de a vítima estar sem capacete e o agente bater na sua moto e ela morrer, não há compensação de culpa por ela estar sem capacete, mas a concorrência de culpas é admissível.

Exercício 55. (FAURGS – 2012 – TJRS – Analista Judiciário) Sobre a classificação dos delitos como dolosos ou culposos, considere as afirmações abaixo: I. Diz-se que o crime é doloso quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; II. O elemento diferenciador entre o dolo eventual e a culpa consciente é a previsão concreta e subjetiva do resultado; III. As penas abstratamente previstas para os delitos praticados com dolo direto são mais gravosas do que as previstas para os delitos praticados com dolo eventual, porquanto no primeiro caso o agente tem a intenção de produzir o resultado, enquanto que, no segundo, o agente apenas assume o risco da sua ocorrência;


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IV. O elemento diferenciador entre a culpa consciente e a culpa inconsciente é a previsibilidade objetiva do resultado;

V. O ordenamento jurídico brasileiro adota o princípio da excepcionalidade do crime culposo.

Estão corretas: a) Apenas I e II. b) Apenas I e V. c) Apenas III e V. d) Apenas I, II e IV. e) Apenas I, IV e V.

58. Crimes Qualificados pelo Resultado No tema dos crimes qualificados pelo resultado, lembra-se a Lei nº 7.209/1984, que reformou toda a parte geral do Código Penal. Antes desta lei, o resultado agravado causado pelo autor poderia (ao menos em tese) ser imputado ao agente a título de responsabilidade objetiva. Com a reforma, contudo, uma conduta só pode ser imputada ao agente se ele a tiver causado ao menos culposamente. A responsabilidade objetiva foi banida do sistema penal. Portanto, nos crimes qualificados pelo resultado, o resultado agravador só poderá ser imputado ao agente que o houver causado ao menos culposamente. Temos quatro tipos de crimes qualificados pelo resultado: Fato antecedente

Resultado consequente

Dolo

Dolo

Culpa

Culpa

Culpa

Dolo

Dolo

Culpa

No primeiro caso (dolo + dolo), temos o exemplo da lesão gravíssima que provoca deformidades permanentes na vítima: há dolo na agressão e na qualificadora. No segundo caso, temos o exemplo do incêndio causado culposamente e, deste incêndio, resulta a morte de uma pessoa. É exemplo do segundo caso um acidente de trânsito causado culposamente, mas o agente comete o crime de omissão de socorro. Finalmente, temos o caso de dolo mais culpa: agente agride a vítima, que cai, bate a cabeça e morre. Esta última hipótese é chamada de crime preterdoloso ou preterintencional.


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Exercício 56. (TRT – 15ª Região – 2012 – Juiz do Trabalho) Quando o agente atua com dolo na conduta e dolo quanto ao resultado qualificador, diz-se crime preterdoloso; quando o agente atua com dolo na conduta e culpa com relação ao resultado diz-se crime qualificado pelo resultado.

59. Crime Preterdoloso Vimos na unidade anterior que o crime preterdoloso ou preterintencional é o crime agravado pelo resultado, mas no qual o agente tem dolo no antecedente e culpa no consequente. Importante sempre lembrar que neste tipo de crime nunca é cabível a tentativa. Tentativa e crime culposo são institutos que não se conciliam. A Súmula nº 610 do STF fala do latrocínio. O latrocínio poderá ser um crime preterdoloso, e o será se, e somente se, a morte ocorrer por culpa do agente. Assim, o latrocínio é sempre um crime qualificado pelo resultado, mas nem sempre será um crime preterdoloso. Pela súmula citada, o latrocínio estará consumado mesmo que a subtração não se consuma. A lesão seguida de morte é chamada, doutrinariamente, de homicídio preterdoloso ou preterintencional.

Exercício 57. (MPE-SC – 2012 – Promotor de Justiça)

I – Ao contrário do que ocorre no processo penal, na contagem dos prazos previstos no Código Penal, computa-se o dia do começo e exclui-se o do vencimento. Esta droga deve ser observada para os prazos prescricionais, de decadência e os de duração das penas.

II – O crime preterdoloso é um misto de dolo e culpa, com culpa na conduta antecedente e dolo no resultado consequente.

III – O princípio da consunção é uma forma de solução do conflito aparente de normas a ser aplicado quando um fato definido por uma norma incriminadora constitui meio necessário ou fase normal de preparação ou execução de outro crime.

IV – A identificação do dolo ou da culpa na conduta do agente é uma maneira de limitar o alcance da teoria da equivalência dos antecedentes causais (conditio sine qua non).


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V – Para a configuração do crime impossível exige-se a impropriedade absoluta do objeto e também a ineficácia absoluta do meio. a) Apenas as assertivas I, III, IV e V estão corretas. b) Apenas as assertivas II, IV e V estão corretas. c) Apenas as assertivas I, III e IV estão corretas. d) Apenas as assertivas I e II estão corretas. e) Todas as assertivas estão corretas.

60. Erro de Tipo Essencial: Conceito e Exemplos Com a reforma penal, o erro de tipo veio previsto no art. 20, caput, do CP. O erro que incide sobre elemento do tipo excluindo o dolo. Para os causalistas, o dolo e a culpa estavam na culpabilidade, mas, para os finalistas, o dolo desloca da culpabilidade para dentro do tipo. O erro de tipo é dividido em essencial e acidental. O primeiro incide sobre elemento constitutivo do tipo e o acidental incide sobre elemento acessório do tipo (objeto, pessoa, nexo causal). Erro de tipo essencial está no art. 20, caput, do CP, e tem como consequência a exclusão do dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.

Exercício 58. (TJSC – 2013 – Juiz) Ocorre erro de tipo quando o equívoco do agente recai sobre conteúdo proibitivo de uma norma penal. Certo ou errado?

61. Erro de Tipo Essencial: Espécies e Consequências Erro de tipo essencial incide sobre elemento constitutivo do tipo, enquanto erro de proibição (art. 21 do CP) incide sobre o caráter proibitivo da norma. A realidade fática que circunda o agente está equivocada no erro de tipo, enquanto que, no erro de proibição, a realidade está perfeita, só que o agente acha que a conduta não é crime. O erro de tipo essencial pode ser: escusável e inescusável. O primeiro é o desculpável para o direito e não se origina da culpa do agente; o segundo é o que se origina da culpa do agente, pois não é desculpável para o direito. O


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escusável exclui dolo e culpa. O inescusável só exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo se estiver previsto em lei.

Exercício 59. (FMP-RS – 2013 – MPE/AC – Analista) Assinale a alternativa correta. a) No conceito analítico de crime a imputabilidade penal constitui elemento autônomo do crime. b) A adequação social constitui, segundo doutrina majoritária, excludente de ilicitude. c) Para a doutrina finalista, o princípio da insignificância constitui causa exculpante. d) De acordo com a doutrina finalista, a consciência da ilicitude é elemento do dolo. e) O erro de tipo sempre exclui o dolo.

62. Erro Determinado por Terceiro O erro de tipo essencial pode ser de duas espécies: escusável (desculpável ou inevitável), que exclui o dolo e a culpa, e, portanto, o próprio crime; ou inescusável (indesculpável ou evitável), que exclui apenas o dolo, e permite a punição pelo crime culposo quando existente tal figura (princípio da excepcionalidade do crime culposo). Assim, o erro de tipo essencial sempre exclui o dolo. Analisaremos agora o chamado erro determinado por terceiro. Aqui, há um agente provocador (o terceiro), que pode agir com dolo ou com culpa, e há ainda um agente provocado, que foi induzido em erro. O fundamento jurídico para esta figura é o art. 20, § 2º, do CP: responde pelo crime o terceiro que determina o erro. Assim, o agente provocador responde pelo crime. Veja o exemplo: A (agente provocador), querendo a desde o início a morte de C, empresta uma arma para B (agente provocado), dizendo para ele atirar em C, alegando que o revólver está desmuniciado. Neste caso, A responderá pelo homicídio, como autor mediato ou indireto. Ele não executa o verbo do tipo, mas se utiliza de B para cometer o crime.


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Assim, B incorreu em erro. Se B tiver agido como o homem médio, praticando erro escusável, não haverá dolo, não haverá culpa e, portanto, não haverá crime. Mas, se o erro for inescusável, responderá pelo crime culposo. É possível, ainda, uma provocação a título de culpa. E, neste caso, o provocador responderá nesta modalidade (culposa), se existir o crime culposo.

Exercício 60. (Cespe – PC/BA – Delegado de Polícia – 2013) Tanto a conduta do agente que age imprudentemente, por desconhecimento invencível de algum elemento do tipo quanto a conduta do agente que age acreditando estar autorizado a fazê-lo ensejam como consequência a exclusão do dolo, e, por conseguinte, a do próprio crime.

63. Descriminantes Putativas – Hipóteses As descriminantes putativas podem ser de 3 hipóteses. Putativo, do latim, vem de imaginário. Daí, inclusive, o nome da figura da legítima putativa. Assim, temos, como primeira hipótese, o erro relativo à existência de uma causa de exclusão da ilicitude. Ex.: agente vê, no noticiário, uma reportagem que informa que a eutanásia foi aprovada. Por ter um parente em estado de sofrimento, corre para o hospital e pratica a eutanásia. Mas não se dá conta de que a notícia referia-se a outro país. A segunda hipótese é a do erro relativo aos limites de uma causa de exclusão da ilicitude. Ex.: homem que, por ignorância, mata a esposa achando estar agindo em legítima defesa da honra. Estas duas hipóteses não estão na lei, mas são amplamente aceitas pela doutrina. E, finalmente, a terceira hipótese é o erro relativo aos pressupostos fáticos de uma causa de exclusão da ilicitude. É a única hipótese presente em lei. Está no art. 20, § 1º, do CP: “É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.” É o caso, por exemplo, do pai que atira em um suposto ladrão, mas, em verdade, a vítima é o próprio filho. Na próxima unidade, veremos as explicações destas hipóteses de acordo com as teorias do Direito Penal.


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Exercício 61. (FCC – DP/SP – Defensor Público – 2012) Em Direito Penal, o erro recai sobre a existência de uma situação de fato que justificaria a ação, tornando-a legítima, é tratado pelo Código Penal como erro de proibição, excluindo-se, pois, a tipicidade da conduta.

64. Art. 20, § 1º, do CP – Divergência Vimos na unidade anterior as hipóteses de descriminantes putativas, e notamos que, embora sejam 3 as hipóteses, apenas uma está no Código Penal (art. 20, § 1º, do CP). Precisamos analisar, primeiramente, qual a teoria da culpabilidade adotada no Brasil. Veremos, posteriormente, a fundo, as teorias, mas desde já é importante saber que, dentro da teoria normativa pura, temos duas subdivisões: extremada e limitada. Na exposição de motivo da nova parte do CP, nos itens 17 e 19, há menção à adoção, no Brasil, da teoria limitada da culpabilidade. Esta teoria identifica no art. 20, § 1º, do CP, um erro de tipo, que exclui o dolo (enquanto a teoria extremada identifica erro de proibição). Ocorre que a redação do art. 20, § 1º, determina que “é isento de pena”, e quando há isenção de pena temos exclusão da culpabilidade, e não do dolo, como quer a teoria limitada. Aí reside a divergência doutrinária acerca deste dispositivo: autores ligados à teoria extremada da culpabilidade entendem que todas as hipóteses de descriminantes putativas são erro de proibição, inclusive a deste dispositivo que estamos estudando. Todas as hipóteses, portanto, excluem a culpabilidade. Seria a teoria unitária do erro. Os autores adeptos desta teoria defendem, inclusive, que a exposição de motivos da nova parte geral do CP está errada ao afirmar que adotamos a teoria limitada. Contudo, para a teoria limitada, somente as duas primeiras hipóteses de descriminantes putativas são erro de proibição. No art. 20, § 1º, o erro que incide sobre pressupostos fáticos, é erro de tipo (o chamado erro permissivo), que exclui a tipicidade. Justificam os adeptos desta teoria, no sentido de que, ainda que o dispositivo determine que há isenção de pena, devemos levar em consideração o caput do artigo, e interpretar tal dispositivo como se fosse “é isento de dolo e culpa”.


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Exercício 62. (Cespe – TJRR – Titular de Serviços de Notas e Registros – 2013) Conforme a teoria limitada da culpabilidade, adotada no CP, o erro sobre os pressupostos fáticos de uma causa de exclusão da ilicitude constitui modalidade de erro de proibição.

65. Erro sobre o Objeto e Erro sobre o Nexo Causal Veremos, a partir desta unidade, o erro de tipo acidental, espécie do gênero erro de tipo. Ele incide sobre elementos acessórios do tipo penal, e, lembre-se: este tipo de erro nunca isenta de pena. O agente sempre será responsabilizado, a não ser que o seja por outro fundamento. Veremos, nesta unidade, duas hipóteses: a) erro sobre o objeto (error in objecto): o agente supõe que a sua conduta recai sobre um determinado objeto, mas, em verdade, a conduta recai sobre objeto distinto. Exemplo: agente quer furtar 1 kg de açúcar, mas furta 1 kg de sal. Não há aqui isenção de pena pela tese do erro; b) erro sobre o nexo causal (aberractio causae): é também chamada de dolus generalis, erro sucessivo ou desvio do plano. O agente consegue alcançar o resultado pretendido, mas de modo diferente daquele que tinha planejado. Exemplo: agente quer matar a vítima. Atira. Após, com a intenção de ocultar o corpo, joga o corpo num rio. Ele pensa que matou a vítima pelos tiros, mas, em verdade, descobre, depois pela perícia, que a vítima morreu afogada. O resultado pretendido é alcançado, porém, de outro modo. Aqui também não há exclusão da pena.

Exercício 63. (Cespe – TJRR – Titular de Serviços de Notas e Registros – 2013) É isento de pena, em razão da ausência de dolo ou culpa, o agente que age mediante erro de tipo acidental, ou seja, o agente desconhece os dados acessórios ou secundários do crime.


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66. Erro sobre a Pessoa Continuando a análise do erro de tipo acidental, veremos, agora, o chamado erro sobre a pessoa, ou error in personae. O agente confunde a sua vítima com outra. Ao contrário das hipóteses estudadas na unidade anterior (erro sobre o objeto ou erro sobre o nexo causal), aqui, temos um dispositivo expresso no CP. É o art. 20, § 3º: “O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime.” Como todas as espécies de tipo acidental, este erro também não isenta o agente de pena. Deve-se, contudo, levar em consideração as condições ou qualidade especial da pessoa visada, não da pessoa atingida. Exemplo: agente quer matar o irmão (este é o dolo), mas, por erro, atira em uma pessoa que não era seu irmão. O agente vai responder pelo homicídio, e mais: vai responder por homicídio agravado, porque o homicídio contra irmão é agravado. Isto porque, conforme disposição legal, deve-se levar em consideração a vítima pretendida pelo agente. Importante lembrar também que aqui não há erro de pontaria. O que há é um erro sobre a vítima: o agente não erra o tiro, mas atira em pessoa diversa daquela que imaginou ser.

Exercício 64. (MP/SP – Promotor de Justiça – 2012) Configura erro sobre a pessoa, a hipótese em que o agente, por erro de pontaria, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa.

67. Aberratio Ictus O Código Penal em seu art. 73 dispõe sobre aberratio ictus, o erro na execução. Ocorre quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa. Ele responderá como se tivesse praticado o crime contra a pessoa desejada (art. 20, § 3º, do CP). No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 do Código Penal.


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O instituto do aberratio ictus pode ser analisado em duas partes: a primeira quando o agente atinge pessoa diversa da pretendida e a segunda quando o agente atinge pessoa pretendida e mais uma pessoa diversa da pretendida, portanto, pode ter o resultado duplo. A aberratio ictus com resultado único é a da Unidade Simples (art. 73, 1ª parte). Neste caso, aplica-se a regra do art. 20, § 3º, do CP, ou seja, responde como se tivesse acertado a pessoa pretendida. Na aberratio ictus, com resultado duplo, conhecida como Unidade Complexa (art. 73, 2ª parte), o agente, além de atingir a pessoa inicialmente pretendida, ofende também pessoa diversa, portanto, aplica-se a regra do Concurso Formal Próprio ou Perfeito (art. 70, caput, 1ª parte, do CP), em que há dolo em relação ao alvo e culpa em relação a terceiro atingido acidentalmente. Nesse caso, é preciso existir um elemento subjetivo resultando em dolo e culpa, porque se não houver o elemento subjetivo, mas, apenas, dolo eventual aplicar-se-á o Concurso Formal de Crimes, e não Concurso Formal Próprio ou Perfeito.

Exercício 65. (Cespe – 2013 – TJMA – Juiz de Direito) Erro de pessoa e aberratio ictus são espécies de erro na execução do crime, não tendo nenhuma relação com a representação que o agente faz da realidade. Certo ou errado?

68. Aberratio Criminis ou Delicti O agente desejava cometer um crime, mas, por erro na execução, acaba por praticar um delito diverso. O art. 74 do Código Penal dispõe que quando, por acidente ou erro na execução do crime, sobrevier resultado diverso do pretendido, o agente responderá por culpa, se o fato for previsto como crime culposo; se ocorrrer também o resultado pretendido, aplicar-se-á a regra de Concurso Formal Próprio de Crimes. O instituto da aberratio criminis pode ser dividido em dois tipos: o primeiro é aquele com resultado único ou Unidade Simples, em que o agente atinge somente o bem jurídico diverso do pretendido e responde por culpa se houver crime culposo previsto em lei (art. 74, 1ª parte, do CP); o segundo pode ser com resultado duplo ou Unidade Complexa, em que o agente atinge o bem jurídico desejado e também bem jurídico diverso, portanto, aplica-se a regra do Concurso Formal Próprio de Crimes (art. 70, caput, 1ª parte, do CP), em que a pena mais grave é aumentada de 1/6 até 1/2 a partir do número de crimes.


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Se o resultado previsto como crime culposo for menos grave ou se o delito não tiver modalidade culposa, não haverá aplicação do art. 74 do Código Penal.

Exercício 66. (Officium – 2012 – TJRS – Juiz) Resultado diverso do pretendido: o agente, visando um determinado objetivo, termina atingindo outro fim. Certo ou errado?

69. Consumação A consumação (Summatum opus) está prevista no art. 14, I, do CP, também denominada crime completo ou perfeito, em que a conduta criminosa se realiza integralmente. Diferente de crime exaurido, que não faz parte mais do iter criminis e só tem consequência na pena; portanto, crime consumado não é a mesma coisa que crime exaurido. Nos crimes materiais, a consumação ocorre com a produção do resultado naturalístico, pois o tipo aloja conduta e resultado naturalístico. Nos crimes formais, ocorre a consumação com a simples prática da conduta, pois o resultado está previsto em lei. Nos crimes de mera conduta (violação de domicílio), a consumação ocorre com a simples prática da conduta. Nos crimes permanentes, a consumação se protrai no tempo, então, admite flagrante a qualquer tempo. Nos crimes habituais, a consumação ocorre com a reiteração de atos que revelem estilo ou modo de vida do agente, é, por isso, que o habitual não admite, em tese, a tentativa nem o flagrante. Nos crimes de perigo concreto, a consumação ocorre com a exposição a perigo do bem jurídico tutelado, enquanto que, nos crimes de perigo abstrato, a consumação ocorre com a simples prática da conduta definida como perigosa (associação criminosa). O termo inicial da prescrição (art. 111, I, do CP) começa a correr no dia em que o crime se consumou até antes de transitar em julgado sentença final, adotando a Teoria do Resultado.


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Exercício 67. (TRT 2ª Região/SP – 2011 – Juiz do Trabalho) Pode-se dizer que a consumação de crime, segundo a definição dada pelo art. 14, I, do Código Penal Brasileiro, é o mesmo que o seu exaurimento e com este se confunde. Certo ou errado?

70. Iter Criminis Diz respeito às fases percorridas pelo agente para a prática do crime. Há quatro fases percorridas pelo agente para a prática do crime. São elas: a fase de cogitação é a fase interna do crime em que há intenção de praticar o delito e não é punida, pois não há ofensa ao bem jurídico (no Brasil, não se pune intenção); a fase de preparação que são atos necessários para o agente iniciar a execução do crime e, em regra, é impunível, salvo quando configurar delito autônomo (ex.: ser punido pelo crime de arma); a fase de execução em que se inicia a agressão ao bem jurídico, portanto, há incidência da punição; e a fase de consumação ocorre quando se reúnem todos os elementos de sua definição legal (art. 14, I, do CP). Quanto ao exaurimento, prevalece o entendimento da que não faz parte do iter criminis, pode, portanto, influir na fixação da pena-base (art. 59 do CP). Em alguns casos, funciona como qualificadora ou majorante (ex.: crime de resistência – art. 329, § 1º).

Exercício 68. (PC-SP – 2011 – Delegado de Polícia) Na tentativa branca ou incruenta: a) O agente sequer inicia os atos executórios. b) O agente impede voluntariamente a consumação do delito. c) O agente limpa o local do crime após a consumação. d) O corpo da vítima não derrama sangue. e) O agente não atinge o objeto material do delito.

71. Passagem dos Atos Preparatórios para os Atos Executórios A Teoria Subjetiva traz a explicação de quando cessam os atos preparatórios e começam os atos executórios, pois o que importa é o plano interno do agente,


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não havendo transição dos atos preparatórios para os atos executórios, ou seja, não há diferença entre a preparação e a execução porque o dolo é o mesmo. Assim, há punição tanto na fase preparatória quanto na fase executória, porém, o Código Penal não adota a Teoria Subjetiva. As Teorias Objetivas se preocupam com a ofensa ao bem jurídico, pois o agente não pode ser punido pela sua vontade, sendo necessário o início da realização do tipo penal, com a exteriorização de atos idôneos e inequívocos para a produção do resultado lesivo. Estas Teorias Objetivas podem ser as seguintes: – Teoria da Hostilidade ao bem jurídico que é defendida por Nelson Hungria e dispõe que os atos executórios se iniciam com o ataque ao bem jurídico; – Teoria Objetivo-formal ou Lógico-formal criada por Von Liszt que dispõe que haverá ato executório quando o autor iniciar a prática do verbo nuclear do tipo, portanto, não há tentativa; – Teoria Objetivo-material criada por Reinhart Frank que dispõe que haverá ato executório com a prática do núcleo do tipo e também com atos imediatamente anteriores a ele, de acordo com a visão de uma terceira pessoa, alheia aos fatos; – Teoria Objetiva-individual defendida por Zaffaroni que dispõe que haverá ato executório com a prática do núcleo do tipo e também com atos imediatamente anteriores a ele, de acordo com o plano concreto do agente, portanto, há tentativa; – Teoria Majoritária é a Objetivo-formal porque é mais segura para o réu.

Exercício 69. (MPE-PR – 2012 – Promotor de Justiça) Para a Teoria Objetiva-individual, a tentativa se caracteriza pela realização de ação imediatamente anterior ao tipo legal, produtora de perigo direto para o bem jurídico protegido, independente da representação do fato pelo autor. Certo ou errado?

72. Tentativa – Conceito e Natureza Jurídica A expressão em latim conatus é sinônimo de tentativa (pode surgir dessa forma na prova). Segundo Zaffaroni, a tentativa também pode ser definida como crime incompleto. O art. 14, II, do CP, dispõe que o crime será tentado quando, iniciada a execução, não se consumir por circunstâncias alheias à vontade do agente.


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Quanto à natureza jurídica da tentativa, trata-se de uma norma de extensão ou ampliação temporal da figura típica, isto é, o momento da consumação do crime é antecipado. Adequação típica por subordinação direta ou imediata ocorre no momento em que o fato se enquadra perfeitamente na lei, como no caso da consumação e autoria. Contrariamente ao exemplo anterior, na adequação típica por subordinação indireta ou mediata, o fato não se enquadra na lei, como nas hipóteses da tentativa, da participação e da omissão imprópria. Nos crimes tentados, como no homicídio, mesmo que não previsto de forma expressa na lei, há um pressuposto de extensão da figura típica. Dessa forma, não há ofensa ao princípio da reserva legal. Nesse caso, se o crime for tentado, a norma integradora será o art. 14, II, do CP; se houver participação, a norma de extensão será o art. 29, do CP ou no caso de omissão imprópria, sua previsão estará no art. 13, § 2º, do CP.

Exercício 70. (FCC – 2013 – Assembleia Legislativa – Procurador – PB) O parágrafo único do art. 14 do Código Penal pune a tentativa, caracterizando-se como norma de extensão da: a) Tipicidade. b) Desistência voluntária. c) Culpabilidade formal. d) Culpabilidade material. e) Reprovação social.

73. Tentativa – A Técnica Legislativa no Brasil O art. 121 do Código Penal traz a pena de reclusão, de seis a vinte anos, no caso do crime de homicídio. No Brasil, para o crime tentado, utiliza-se a adequação típica por subordinação indireta. Pela norma de extensão da figura típica, o crime de homicídio tentado é punido mediante a combinação do art. 121, caput, e art. 14, II, do CP. Esta técnica permite a integração do tipo consumado e da norma de extensão da figura típica, no caso da tentativa de homicídio (CP, art. 121, c/c. art. 14, III).


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Existem exceções para aplicação da referida técnica, como no crime de evasão mediante violência contra a pessoa, previsto no art. 352 do Código Penal, porque a lei já descreve a forma consumada e tentada, trazendo a mesma previsão da pena para ambas as formas. São conhecidos como crimes de atentado ou de empreendimento aqueles que possuem a mesma pena abstratamente cominada, tanto para a modalidade consumada, quanto para a modalidade tentada. O art. 309 do Código Eleitoral é outro exemplo que pode ser demonstrado; prevê a pena de reclusão de até três anos para aquele que votar ou tentar votar mais de uma vez, ou em lugar de outrem. Ainda, a Lei nº 7.170/1983 dispõe sobre os Crimes contra a Segurança Nacional, estabelecendo no art. 11 a pena de 4 (quatro) a 12 (doze) anos para aquele que tentar desmembrar parte do território nacional para construir país independente.

Exercício 71. (Cespe – 2013 – Polícia Civil – Delegado – BA) A tentativa de contravenção, mesmo que factível, não é punida. Certo ou errado?

74. Teorias sobre a Punibilidade da Tentativa A teoria subjetiva, voluntarista ou monista preocupa-se exclusivamente com a vontade do agente. Nesse caso, o dolo de quem pratica o crime é idêntico ao daquele que tenta cometer o crime. Assim, a tipicidade subjetiva se completou no momento em que o agente tentou praticar o crime, razão pela qual a teoria subjetiva prevê a mesma pena para tentativa e consumação. A teoria objetiva, realista ou dualista concentra-se no perigo proporcionado ao bem jurídico tutelado pela norma penal. O art. 14, parágrafo único, do CP, estabelece que, salvo disposição em contrário, a tentativa será punida com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de 1 (um) a 2/3 (dois terços). Nesse sentido, a tentativa é uma minorante, ou seja, causa geral de diminuição de pena, aplicada pelo critério trifásico, nos termos do art. 68 do CP. A punição da tentativa no Brasil observa a regra da teoria objetiva, tratando como exceção a aplicação da teoria subjetiva.


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A análise do iter criminis percorrido tem importância para adoção do critério de diminuição da pena; quanto mais próximo da consumação, menor a redução da pena e, no sentido inverso, na hipótese da tentativa se distanciar da consumação.

Exercício 72. (2011 – TRT 2ª Região – Juiz do Trabalho – SP) Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de metade até dois terços. Certo ou errado?

75. Elementos da Tentativa A tentativa é composta por elementos objetivos, isto é o início da execução de um crime, a sua não consumação, a incidência de circunstâncias alheias à vontade do agente e o último elemento subjetivo que é o dolo. Vale lembrar que, se as circunstâncias para a não ocorrência do crime não forem alheias à vontade do agente, estaremos diante de desistência voluntária ou arrependimento eficaz. Se o dolo disser respeito à vontade do agente, previsto como um dos elementos da tentativa, para a culpa, não se admitirá a tentativa, exceto, na hipótese de culpa imprópria, aquela praticada por erro inescusável. Segundo Nelson Hungria, embora muito difícil de demonstrar por meio de prova, a tentativa no dolo eventual é cabível e não pode influir na conceituação da tentativa. Já Rogério Greco adota a teoria da vontade (CP, art. 14, II), limitando o instituto ao dolo direto. O STJ já se posicionou pela compatibilidade entre o dolo eventual e o crime tentado (AgRg no REsp nº 1.199.947/DF, julgado em 11/12/2012).

Exercício 73. (Vunesp – 2011 – Tribunal de Justiça – Juiz – RJ) Assinale, dentre os crimes mencionados, qual deles admite a tentativa: a) Lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3º, do Código Penal). b) Omissão de socorro (art. 135 do Código Penal). c) Falsificação de documento público (art. 297 do Código Penal). d) Rufianismo (art. 230 do Código Penal).


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76. Infrações Penais que Não Admitem Tentativa Nos crimes culposos, não caberá a tentativa, salvo, no caso de culpa imprópria. Lembrando que nos crimes preterdolosos também não será admitida a culpa, visto o dolo presente na conduta antecedente do agente com resultado culposo. Não será punida a tentativa de contravenção, conforme a Lei de Contravenções Penais estabelece em seu art. 4º, embora essa possibilidade seja factível (possível no mundo dos fatos). Nos crimes unissubsistentes, aqueles que se consumam a partir de um único ato, como o crime de ameaça, não se admite a tentativa. Outra modalidade de crime que não admite a tentativa são os omissivos puros ou próprios e os crimes de perigo abstrato, por serem considerados unissubsistentes. Esses crimes não possuem desdobramento de atos. Os crimes condicionados também não admitem a tentativa, como no caso do art. 122, do CP – crime de induzimento de suicídio. Por fim, os crimes de atentado ou de empreendimento e os crimes habituais, também, não admitem tentativa.

Exercício 74. (2013 – Tribunal de Justiça – Juiz – SC) Os crimes habituais, os preterdolosos, os culposos, os unissubsistentes e os omissivos próprios não admitem a tentativa. Certo ou errado?

77. Espécies de Tentativa As espécies de tentativa são: – perfeita, acabada ou crime falho: a situação em que o agente esgota todos os meios executórios, porém, não consuma o crime por circunstâncias alheias à sua vontade; – imperfeita ou inacabada: o agente inicia a execução, mas não encerra o processo executório, e o crime não se consuma por circunstâncias alheias à sua vontade; – branca: ocorre quando o objeto material não é atingido pela conduta criminosa; – vermelha ou cruenta: ocorre quando o objeto material é atingido pela conduta criminosa. Uma só conduta pode abranger várias formas de tentativa ao mesmo tempo.


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Exercício 75. (Cespe – 2012 – TJRO – Analista) A respeito do iter criminis e do momento de consumação do delito, assinale a opção correta: a) A tentativa, uma norma de extensão temporal, não se enquadra diretamente no tipo incriminador; faz-se necessária uma norma que amplie a figura típica até alcançar o fato material. b) A tentativa perfeita ou crime falho é aquela na qual o agente interrompe a atividade executória e não consuma o crime por circunstâncias alheias à sua vontade. c) O crime de extorsão se consuma com a obtenção da indevida vantagem econômica por parte do agente. d) O crime tentado é punido da mesma forma que o crime consumado, pois o que vale é a intenção do agente.

78. Desistência Voluntária e Arrependimento Eficaz No art. 15 do Código Penal, há três institutos: a desistência voluntária, o arrependimento eficaz e a tentativa qualificada. A desistência voluntária pressupõe o “não fazer”, o abandono da prática dos atos que conduzam à consumação do crime, e voluntariedade do agente (mas não necessariamente espontaneidade, pois não interessam os motivos), independentemente do motivo. Importante frisar que a desistência voluntária não é admitida nos crimes unissubsistentes (crimes cuja consumação se dá com a prática de um único ato), já que a conduta não pode ser fracionada. O arrependimento eficaz, ou resipiscência, pressupõe eficácia e um “fazer”, ocorrendo quando o agente age para evitar que o resultado se produza, após o esgotamento dos atos executórios. A consumação dos crimes materiais se dá pela produção do resultado naturalístico, enquanto a dos crimes formais se dá pela mera conduta do agente. Assim, só se pode evitar a produção do resultado e, portanto, ocorrer o arrependimento eficaz nos crimes materiais.

Exercício 76. (Cespe – 2012 – TJBA – Juiz) Suponha que Vicente, estudante de vinte e quatro anos de idade, com animus necandi, portando arma de fogo municiada com seis projéteis, alveje Pereira com dois e, ao tentar efetuar outros


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disparos, fuja do local ante a falha da arma. Nessa situação hipotética, aplica-se a Vicente, consoante determinação do CP, o instituto da desistência voluntária. Certo ou errado?

79. Desistência Voluntária e Arrependimento Eficaz – Natureza Jurídica e Tentativa Qualificada A desistência voluntária pressupõe o não prosseguimento na execução e a voluntariedade. Frise-se que para caracterizar a voluntariedade não se analisa o sentimento do agente, mas apenas a atitude voluntária ou não. O arrependimento eficaz reclama um fazer, porém, com uma providência para impedimento da produção do resultado. Existem divergências no que se refere à natureza jurídica dos dois institutos: a) causa de exclusão da culpabilidade (Welzel e Roxin) – a posição da doutrina alemã não é adotada no Brasil; b) causa pessoal de extinção da punibilidade (Hungria, Noronha e Zaffaroni); c) causa de exclusão da tipicidade (Frederico Marques, Fragoso, Damásio). A natureza jurídica repercutirá no concurso de pessoas, pois, se for causa pessoal, extinguirá a punibilidade de um dos agentes, enquanto se for causa de exclusão da tipicidade, o ato deixará de ser típico para todos os agentes. Pelo instituto da tentativa qualificada, o agente responderá, nos termos do art. 15 do CP, pelos atos executórios já praticados, ou mesmo pelos atos preparatórios, ou seja, pelo crime remanescente.

Exercício 77. (Cespe – 2012 – DPE-ES – Defensor Público) Os efeitos da desistência voluntária e do arrependimento eficaz ficam condicionados à presença dos requisitos objetivos e subjetivos, aliados à espontaneidade do comportamento do agente, evitando-se a consumação do delito. Certo ou errado?

80. Arrependimento Posterior A natureza jurídica do arrependimento posterior, exposto no art. 16 do CP, é de causa obrigatória de redução da pena, portanto, trabalhado no critério trifásico (art. 68 do CP) de aplicação da pena.


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São requisitos para que se caracterize o arrependimento posterior: a) crime cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa; b) reparação do dano ou restituição da coisa; c) ato voluntário do agente; d) até o recebimento da denúncia. Terá cabimento a tese de arrependimento posterior em crime com violência à coisa. Também pode ser aplicado o arrependimento posterior em caso de violência à pessoa que seja culposa (por exemplo, lesão culposa no trânsito). Se a reparação do dano for parcial, caberá o arrependimento posterior desde que haja concordância da vítima. Quanto ao ato voluntário, ressalta-se que não precisa ser espontâneo, independendo a vontade, o sentimento do agente. Diferentemente da atenuante (art. 65, III, “b”, CP), a qual será aplicada desde que haja a reparação do dano até o julgamento; na minorante do art. 16 do CP, deve ocorrer o ato até o recebimento da queixa.

Exercício 78. (FCC – 2013 – TJPE – Juiz) O arrependimento posterior: a) Não influi no cálculo da prescrição penal. b) Prescinde de voluntariedade do agente. c) Deve ocorrer até o oferecimento da denúncia ou da queixa. d) Constitui circunstância atenuante, a ser considerada na segunda etapa do cálculo da pena. e) Pode reduzir a pena abaixo do mínimo previsto para o crime.

81. Teoria do Crime – Dispositivos Específicos a Respeito da Reparação do Dano O Código Penal, em seu art. 16 sobre os crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, determina que reparado o dano ou restituída a coisa, há a possibilidade de redução da pena. Em seu inciso III, é identificada uma atenuante: a reparação do dano poderá ser até o julgamento. Outros institutos estão ligados à reparação do dano, como o art. 312, § 3º, do CP - Peculato Culposo: O peculato poderá ser praticado de forma dolosa ou culposa. Somente na modalidade culposa é que haverá o benefício trazido pelo § 3º do referido artigo.


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Este benefício é muito importante para o agente, pois extinguirá a punibilidade. Porém, ele dirá respeito somente à modalidade culposa – para a dolosa não será admitido. A apropriação indébita previdenciária encontra-se no art. 168-A, § 2º, do CP. Trará novamente a extinção de punibilidade em razão de arrependimento posterior. Nas infrações de menor potencial ofensivo (Lei nº 9.099, art. 61), todas as contravenções penais e os crimes com pena máxima de até 2 anos. O art. 74, em seu parágrafo único, tratará quanto à reparação do dano. A Súmula nº 554 do STF nos traz que o pagamento do cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta o prosseguimento da ação penal. Cumpre observar que o STJ define que este disposto na Súmula do STF restringe-se ao estelionato na modalidade de emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos.

Exercício 79. (Cespe – 2012 – TJAC – Juiz) No caso de crime de peculato culposo, a reparação do dano, desde que anterior à denúncia, extingue a punibilidade. Certo ou errado?

82. Teoria do Crime – Crime Impossível – Conceito e Natureza Jurídica O crime impossível ocorre quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível a sua consumação. O crime impossível também poderá ser entendido e definido como “crime oco”, “quase crime”, “tentativa inidônea”, “tentativa inadequada”, “tentativa inútil” ou “tentativa impossível” – são sinônimos. Será considerada a ocorrência de crime impossível para as hipóteses de falsificação grosseira, utilização de arma de brinquedo para obter o resultado morte, substância inócua para envenenamento, dentre outras. A natureza jurídica do crime impossível está conceituada no art. 17 do Código Penal, onde a tentativa não será punida quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, for impossível ser o crime consumar-se. Cumpre consignar que este dispositivo não se trata de uma causa de extinção da punibilidade e sim de uma causa de exclusão da tipicidade.


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Exercício 80. (FCC – 2013 – DPE-AM – Defensor Público) No que se refere aos elementos do crime, é correto afirmar que: a) O estrito cumprimento do dever legal exclui a imputabilidade. b) O dolo e a culpa integram a tipicidade e a culpabilidade, respectivamente. c) O arrependimento eficaz afasta a ilicitude. d) A exigibilidade de conduta diversa é pressuposto da culpabilidade. e) O crime impossível extingue a punibilidade.

83. Teoria do Crime – Espécies de Crime Impossível As hipóteses de crime impossível poderão assim ser entendidas: por ineficácia absoluta do meio (meio de execução), como uma arma desmuniciada ou defeituosa; falsificação grosseira; e uso de substância inócua no lugar de veneno. Quanto ao sistema eletrônico de vigilância, as Cortes Superiores concluem que os sistemas de vigilância existentes em estabelecimentos comerciais não impedem, mas apenas dificultam a consumação do crime de furto. Assim, como regra, não há crime impossível. A Súmula nº 73 do STJ afirma que poderá haver crime de estelionato para os casos de falsificação grosseira (utilização de papel moeda grosseiramente falsificado). Outra hipótese de crime impossível é a por impropriedade absoluta do objeto: o objeto material é inexistente antes do início da execução do delito. O crime impossível também será considerado para a hipótese de preparação do flagrante, com referência à Súmula nº 145 do STF, onde não haverá crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação.

Exercício 81. (Cespe – 2012 – PC-AL – Delegado de Polícia) Considere que Pedro, penalmente imputável, pretendendo matar Rafael, seu desafeto, aponta em sua direção uma arma de fogo e aperta o gatilho por diversas vezes, não ocorrendo nenhum disparo em razão de defeito estrutural da arma que, de forma absoluta, impede o seu funcionamento. Nessa situação, Pedro será punido pela tentativa delituosa, porquanto agiu com manifesta vontade de matar José. Certo ou errado?


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84. Teoria do Crime – Crime Impossível e a Súmula nº 145 do STF O crime impossível também será considerado para a hipótese de preparação do flagrante, ou seja, quando esta, feita pela polícia, torna impossível a sua consumação. Esta conclusão é encontrada na Súmula nº 145 do STF. Nomenclaturas sinônimas poderão definir o mesmo conceito, quais sejam: “flagrante preparado”, “flagrante provocado”, “crime de ensaio”, “delito de laboratório” e “crime putativo por obra do agente provocador”. Quanto ao tráfico de drogas (Lei nº 11.343/2006, art. 33, caput), no momento em que há a troca da droga pelo dinheiro, não será considerado crime impossível. O crime de tráfico de drogas é crime permanente, logo, ele ocorre, consuma-se, antes da venda do entorpecente – remete-se ao seu preparo, bem como armazenamento.

Exercício 82. (MPE-SC – 2013 – Promotor de Justiça) No caso do dono de estabelecimento, desconfiado da honestidade de um de seus funcionários, manda-o selecionar determinado produto, deixando-o sozinho num cômodo, ao mesmo tempo que coloca policiais de atalaia, previamente solicitados, que o surpreendem no ato de furtar, conduta que corresponde a crime de ensaio. Certo ou errado?

85. Teoria do Crime – Teorias sobre o Crime Impossível A análise da Teoria do Crime quanto ao crime impossível subdivide-se em outras 3 teorias conceituais. Inicialmente, a Teoria Subjetiva é compreendida como a intenção e vontade do agente em praticar o delito. Assim, haverá sempre tentativa, seja por idoneidade do meio ou objeto, absoluta ou relativa. Quanto à Teoria Sintomática, o que interessa é a periculosidade do agente, que será punido com aplicação de medida de segurança. Já, para a Teoria Objetiva, atualmente, aceita em nosso país, o que interessa é a lesão do bem jurídico. Divide-se em objetiva pura (inidoneidade do meio é


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relativa – não é admitida no Brasil) e objetiva temperada ou intermediária (inidoneidade do meio é absoluta. Se for relativa, será considerada tentativa) – é a teoria adotada pelo art. 17 do Código Penal, que nos traz: não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.

Exercício 83. (MPE – PR – 2013 – Promotor Substituto) Assinale a alternativa incorreta: a) Diz-se “tentativa imperfeita” ou “propriamente dita”, quando o processo executório do crime é interrompido por circunstâncias alheias à vontade do agente. b) No dito “crime falho” ou “tentativa perfeita”, apesar do agente realizar toda a fase de execução do crime, o resultado não ocorre por circunstâncias independentes de sua vontade. c) Os crimes culposos, os omissivos próprios, omissivos impróprios, e os preterdolosos não admitem tentativa. d) O dolo no crime tentado é o mesmo do crime consumado. e) A denominada “tentativa inidônea” ocorre quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.

86. Crime Putativo Primeiramente, esclarece-se que a palavra “putativo” tem como origem a ideia de falso, de imaginário. Assim, delito putativo seria um crime que não é crime, ou seja, a pessoa pensa que está agindo de forma equivocada, mas não está. O delito putativo é o chamado crime imaginário, pois o agente pensa estar cometendo um crime, mas, em verdade, não está. Insta ressaltar que não se deve confundir o delito putativo com o crime impossível. Cumpre destacar que o crime imaginário só existe na imaginação do sujeito, somente existe em sua mente. Exemplo: agente destrói seu próprio patrimônio ao ter acesso de raiva e fica com medo de ter praticado um crime de dano. Observa-se, no entanto, no que se refere ao exemplo acima, que, se o sujeito destruir seu próprio carro para obter dinheiro do seguro, terá cometido crime de fraude contra seguro.


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Retornando ao exemplo, o sujeito que destrói o próprio patrimônio pensando estar cometendo crime, comete delito putativo por erro de proibição. Outro exemplo seria o pai que mantém relação sexual com a própria filha, maior de 18 anos. Ressalta-se que, além do delito putativo por erro de proibição, existem outras formas, como o delito putativo por força de terceiro agente provocador. Há também o delito putativo por erro de tipo. O erro de tipo esclarece que erra o sujeito quanto às elementares do fato típico quando pratica uma conduta achando estar praticando outra. Exemplo: sujeito está no aeroporto, na esteira das malas, quando vê uma mala vermelha, acreditando ser sua. Chegando a sua casa, percebe que não se trata de sua mala. O delito imaginário por erro de tipo ocorre quando, por exemplo, o sujeito está no aeroporto e quer pegar a mala de outra pessoa, pois na dele tem somente roupas sujas. No entanto, ao chegar a sua residência, percebe que pegou sua própria mala.

87. Ilicitude: Conceito e Nomenclatura O segundo elemento que compõe o conceito analítico de crime é a ilicitude. É preciso lembrar que ilicitude traz um universo de causas excludentes que devem ser estudadas. Ilicitude é a contrariedade entre o fato típico praticado por alguém e o ordenamento jurídico, capaz de lesionar ou expor a perigo de lesão bens jurídicos penalmente tutelados. A partir do momento em que um bem da vida passa a ser protegido pelo Direito, se torna um bem jurídico. Assim, para acontecer crime, é preciso lesionar o bem jurídico ou expor este bem jurídico a perigo que, por sua vez, por ser concreto ou abstrato. Ressalta-se que ilicitude é a contrariedade do fato praticado com o direito que está protegendo os bens jurídicos. Diante do conceito analítico de crime, trata-se da segunda análise sobre a existência do delito, após o juízo dos elementos do fato típico. Sabe-se que o crime é fato típico, ilícito e culpável. Todo fato típico será ilícito se não estiver acobertado por uma excludente de ilicitude. As causas que excluem a ilicitude podem ser tanto legais quanto supralegais. Se o sujeito estiver acobertado por uma excludente de ilicitude, como legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal, exercício regular de direito ou com consentimento do ofendido, não terá cometido crime.


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Por fim, observa-se que parte da doutrina denomina a ilicitude como antijuridicidade, porém, não se faz correta esta assertiva. Isso porque, na Teoria Geral do Direito, a infração penal constitui um fato jurídico, já que sua ocorrência provoca modificações no mundo exterior e no âmbito jurídico. Neste sentido, não pode um fato ser jurídico e ao mesmo tempo antijurídico.

88. Ilicitude Formal x Ilicitude Material Primeiramente, é necessário lembrar que um fato será ilícito se for contrário às disposições do Direito Penal. Ressalta-se que todo fato típico é ilícito se não estiver acobertado por uma excludente de ilicitude. Fernando Capez conceitua a ilicitude formal e a ilicitude material da seguinte forma: Ilicitude formal é a mera contrariedade do fato ao ordenamento legal, sem qualquer preocupação quanto à efetiva perniciosidade social da conduta. O fato é considerado ilícito porque não estão presentes as causas de justificação, pouco importando se a coletividade reputa-o reprovável. Já ilicitude material é a contrariedade do fato em relação ao sentimento comum de justiça (injusto). O comportamento afronta o que o homem médio tem por justo, correto. Indiscutivelmente, há uma lesividade social inserida na conduta do agente, a qual não se limita apenas a afrontar o texto legal, mas provoca um efetivo evento danoso à coletividade. É possível perceber que esta análise de ilicitude material e de ilicitude formal é mais doutrinária do que positivada.

89. Ilícito e Injusto O injusto pode ter dois conceitos: um conceito formal e outro material. Existem diferenças entre ilícito e injusto, devendo ser tratados de forma diferente. Observa-se primeiramente a diferença formal entre ilícito e injusto. Fato meramente ilícito é aquele contrário à lei. Injusto é o fato típico já valorado pela ilicitude. Injusto é um fato típico e ilícito. Ilicitude é a contrariedade do fato com a norma. É necessário fazer também uma análise material entre injusto e ilícito. Injusto é o fato típico que colide com o sentimento social de justiça. Não é a lei que diz o


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que é ou não injusto, mas considera-se como tal aquilo que é socialmente inadequado. Exemplo: o jogo do bicho é ilícito, no entanto, muitos não o consideram injusto. Retornando à análise formal, o injusto é fato típico e ilícito, não se preocupando apenas com a letra da lei, mas sim com a valoração que o juiz dá àquela conduta. O conceito material de injusto é essa adequação social, mas no plano da ilicitude. É importante o exemplo do jogo do bicho, pois se a sociedade entender que aquela contravenção penal não merece ser aplicada, por não ser injusta socialmente, o juiz terá espaço para afastar a aplicação do artigo e absolver o sujeito.

90. Causas Supralegais de Exclusão de Ilicitude Causa supralegal é algo que pode ser aplicado na sentença pelo juiz, mas que não está escrito na lei, pois é um trabalho doutrinário. Existem causas supralegais que excluem a tipicidade (adequação social de Wetzel), a ilicitude (consentimento do ofendido) e a culpabilidade (inexigibilidade de conduta diversa). As causas supralegais excludentes de antijuridicidade encontram nascedouro no Direito Penal Alemão. Não havia previsão legal para o estrito cumprimento do dever legal nem para o exercício regular de direito. Para suprir essa lacuna, o Estado admitia a aplicação de causas supralegais de ilicitude. No entanto, em relação à aplicação da causa supralegal no ordenamento jurídico brasileiro, existem duas posições: 1ª posição: não existe a possibilidade das causas supralegais excludentes de antijuridicidade; fundamentos: a) nosso Código Penal já admite o estrito cumprimento do dever legal assim como ao exercício regular de direito no art. 23, III; b) caso não possamos utilizar o art. 23, III, o intérprete deverá utilizar as regras da LINDB; c) o consentimento do ofendido, quando admitido, já se verifica nos tipos penais correspondentes; por exemplo, art. 150; 2ª posição: existe a possibilidade das causas supralegais excludentes de ilicitude: a) embora existam no art. 23, II, algumas situações não se encaixam no citado dispositivo;


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b) as causas supralegais excludentes de antijuridicidade suprem a situação omissa da lei, com fundamentos sociológicos; c) nem todas as situações de consentimento do ofendido se enquadram na própria figura típica, exigindo a análise em sede de ilicitude.

91. Consentimento do Ofendido – Requisitos O consentimento do ofendido não é ilimitado. Possui requisitos que a própria doutrina apresentou e passou a ser aceita pelos aplicadores do direito. Por exemplo, uma pessoa autorizar outra a matá-la não exclui a conduta criminal do agente. O consentimento do ofendido só pode ser reconhecido validamente se presentes os seguintes requisitos, em caráter cumulativo: bem jurídico disponível, ofendido capaz (maior de 18 anos), consentimento livre, indubitável e anterior ou, no máximo, contemporâneo à conduta, bem como que o autor do consentimento seja titular exclusivo ou expressamente autorizado a dispor sobre o bem jurídico. O consentimento do ofendido precisa ser dado de forma prévia ou durante o fato, não sendo aceito, de acordo com a doutrina majoritária, o consentimento posterior. Antes de entender o que é bem jurídico disponível, deve-se entender o que é bem jurídico. Bens jurídicos são os bens da vida protegidos pelo direito. Identificado o bem jurídico, deve-se atentar se este é disponível, devendo-se levar em consideração para identificação a amplitude social do bem jurídico. Se o problema social é apenas de uma pessoa, este bem é disponível. No entanto, se a pessoa consente, por exemplo, com a destruição de algo para receber um seguro, este bem não é disponível, pois há mais pessoas envolvidas, no caso, a seguradora.

92. Consentimento do Ofendido – Exclusão O consentimento do ofendido é uma causa supralegal, de exclusão de ilicitude, se não for uma causa de, excluirá a tipicidade, pois a primeira análise que é feita é do fato típico, ou seja, se o consentimento do ofendido for uma elementar típica, seu acontecimento excluirá a tipicidade.


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Consentimento do ofendido significa o ato da vítima em anuir ou concordar com a lesão ou perigo de lesão a bem jurídico do qual é titular. O consentimento do ofendido significa o ato livre e consciente da vítima capaz em anuir ou concordar de modo inquestionável com a lesão ou perigo de lesão a bem jurídico disponível do qual é o único titular (não pode ser bem difuso) ou agente expressamente autorizou a dispor sobre ele. Um exemplo de agente expressamente autorizado seria o caseiro que recebe autorização do proprietário do imóvel para deixar que outras pessoas derrubem os muros. Dependendo da construção do tipo penal incriminador, o consentimento do ofendido pode funcionar ou como excludente de tipicidade ou como excludente de ilicitude. O consentimento do ofendido, a depender da construção do tipo incriminador diante do qual é analisado, pode apresentar-se como: – causa de exclusão de tipicidade: se o tipo penal exige o dissenso da vítima enquanto um dos requisitos objetivos formais necessários à completude da figura incriminadora, é claro que o válido consentimento do ofendido exclui a tipicidade. Exemplo: crime de violação de domicílio, art. 150 do CP (se alguém permitir ou tolerar que terceiro ingresse em sua casa, estará ausente a tipicidade); estupro, art. 213 do CP (se a mulher consentir na relação sexual, inexiste tipicidade). Alguns doutrinadores mencionam a possibilidade de o consentimento do ofendido constituir causa especial de diminuição de pena, como poderia ocorrer no caso da prática de eutanásia.

93. Requisito Subjetivo É evidente que os requisitos gerais aplicáveis a todas as excludentes de ilicitude também devem estar presentes no consentimento do ofendido. Diz-se, portanto, do (contestado e controvertido) requisito subjetivo de justificação e da proibição do excesso. O primeiro requisito subjetivo das excludentes diz respeito à necessidade de o agente saber que atua em e por causa de situação justificante. Assim, para que a lesão a bem jurídico disponível seja considerado lícita, é necessário que o agente tenha consciência de que atua amparado por consentimento do ofendido. Destaca-se, no entanto, que alguns doutrinadores sustentam a desnecessidade de requisito subjetivo nas excludentes de ilicitude; para estes, bastaria a comprovação dos pressupostos objetivos.


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No que toca à proibição do excesso, tem-se que a conduta do sujeito deve sempre respeitar os limites impostos pela causa justificada. Se o agente ultrapassar a seara do consentimento pelo ofendido, desvaliosa será a sua conduta, uma vez que violadora da finalidade protetiva do sistema legal e, portanto, passível de censura quanto ao excesso, ou seja, sujeito à responsabilização pela conduta que extrapola o limite do justificado.

94. Causas Legais de Exclusão de Ilicitude O art. 23 do Código Penal trata das causas legais de exclusão de ilicitude. “Art. 23. Não há crime quando o agente pratica o fato: I – em estado de necessidade; II – em legítima defesa; III – em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.” O crime, para a maioria da doutrina, possui um conceito tripartido (fato típico, antijurídico e culpabilidade). O crime pode ser formal, ou seja, aquilo que está escrito na lei penal e, crime material, ou seja, conduta que atinge bem jurídico relevante. O crime também pode ter seu conceito analítico, que engloba o fato típico, antijurídico e culpabilidade. Dentre as causas legais de exclusão de ilicitude, não se pode esquecer de que isso só é possível, porque já existe um fato típico.

95. Estado de Necessidade: Conceito e Pressuposto O estado de necessidade está previsto no art. 24 do Código Penal. “Art. 24. Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.” Para se tratar um fato jurídico como estado necessidade, ele deve ser, antes de ilícito, típico. O estado de necessidade deve ser alegado no momento da ilicitude. O objetivo de alegar o estado de necessidade é a exclusão da ilicitude da conduta do agente e, excluindo-a, não haverá crime.


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Estado de necessidade é a causa de exclusão de ilicitude da conduta de quem, não tendo o dever legal de enfrentar uma situação de perigo atual, a qual não provou por sua vontade, sacrifica um bem jurídico ameaçado por esse perigo para salvar outro, próprio ou alheio, cuja perda não era razoável exigir. No estado de necessidade, existem dois ou mais bens jurídicos postos em perigo, de modo que a preservação de um depende da destruição dos demais. Como o agente não criou a situação de ameaça, pode escolher, dentre um critério de razoabilidade ditado pelo senso comum, qual deve ser salvo.

96. Requisitos do Estado de Necessidade Estado de necessidade é uma causa excludente de ilicitude prevista expressamente em lei. É preciso que haja uma situação de perigo, que não tenha sido provocada pelo agente e que haja confronto de bens jurídicos. Observa-se que o perigo deve ser atual, deve ameaçar direito próprio ou alheio, não pode ter sido causado voluntariamente pelo agente e não pode existir o dever legal de impedir o perigo. O perigo atual significa instantâneo, é o presente, aquilo que está acontecendo. Ainda, conforme acima mencionado, o perigo deve ameaçar direito próprio ou alheio. Também não pode o agente criar a situação de perigo e depois alegar estado de necessidade. Quanto à inexistência do dever legal de impedir o perigo, seria o exemplo de um bombeiro que, após uma análise acerca da razoabilidade da situação, percebe que possui condições de salvar o morador de um apartamento em chamas e não o faz. O segundo bloco de requisitos do estado de necessidade traz a conduta lesiva. Tem-se aqui a inevitabilidade do comportamento, a razoabilidade do sacrifício e, por fim, o conhecimento da situação justificante. É preciso fazer uma análise acerca da causa de diminuição de pena. Se a destruição do bem jurídico não era razoável, faltou um dos requisitos do estado de necessidade. Embora afastada a excludente em face da desproporção entre o que foi salvo e o que foi sacrificado, a lei permite que a pena seja diminuída de 1/3 a 2/3. Assim, ante a falta de razoabilidade, não se excluem a ilicitude e nem a culpabilidade, respondendo o agente pelo crime, com a pena diminuída.


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97. Discussão Acerca da Abrangência do Art. 24, § 1º, do CP O estado de necessidade não se resume ao art. 24, caput, do CP, devendo-se atentar ao disposto no § 1º do referido artigo, que diz: “Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo.” O § 1º do art. 24 refere-se a pessoas que, em razão da função ou ofício, têm o dever legal de enfrentar o perigo, não lhe sendo lícito sacrificar o bem de terceiro para a defesa de seu próprio; por exemplo, bombeiros, agentes penitenciários, militares. Deve-se atentar que o dever legal de enfrentar o perigo não é absoluto, pois se leva em consideração o princípio da razoabilidade. Indaga-se que a lei fala em dever legal. Dessa forma, estaria impossibilitado de alegar o estado de necessidade quem se acha sob dever jurídico? A resposta correta e majoritária é que o dever jurídico está englobado pelo dever legal. Em suma, o dever de enfrentar o perigo se refere tanto ao bombeiro (dever legal) como ao guarda particular (dever jurídico). Se há um dever legal, é diferente de direito, pois enquanto o direito é uma faculdade de exercer ou não seu direito, no dever legal, a pessoa é obrigada a cumprir e, caso não cumpra, poderá ser punida.

98. Inevitabilidade e Proporcionalidade Inevitabilidade do comportamento significa que somente se admite o sacrifício do bem quando não existe qualquer outro meio de se efetuar o salvamento. O chamado commodus discessuss, que é a saída mais cômoda, no caso, a destruição, deve ser evitado; sempre que possível salvar o bem de outra forma. Antes da destruição, é preciso verificar se o perigo pode ser afastado por qualquer outro meio menos lesivo. Se a fuga for possível, será preferível ao sacrifício do bem, pois aqui, ao contrário da legítima defesa, o agente não está sofrendo uma agressão injusta, mas tentando afastar uma ameaça ao bem jurídico. A prática de um ilícito extrapenal, quando possível, deve ter preferência sobre a realização do fato típico, assim como o delito menor grave em relação a um de maior lesividade. Por exemplo, o homicídio não é amparado pelo estado de necessidade quando possível a lesão corporal. Configura-se neste caso o excesso doloso.


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Em relação à inevitabilidade e ao dever legal, para aqueles a quem se impõe o dever legal de enfrentar o perigo, a inevitabilidade tem um significado mais abrangente. O sacrifício somente será inevitável quando, mesmo correndo risco pessoal, for impossível a preservação do bem.

99. Proporcionalidade e a Situação Correta Em se tratando de razoabilidade do sacrifício, a lei não falou, em momento algum, em bem de valor maior, igual ou menor, mas apenas em razoabilidade do sacrifício. Ninguém é obrigado a andar com uma tabela de valores no bolso, bastando o senso comum daquilo que é certo porque se mostra como razoável. Por exemplo, para uma pessoa no âmbito do chamado senso comum, a vida humana deve valer mais do que um veículo ou um imóvel. Para melhor entendimento da razoabilidade, observam-se os seguintes exemplos: Exemplo 01: arrombar o portão e a porta para entrar em uma propriedade e apagar um incêndio. Isso é permitido, pois se têm um confronto de bens jurídicos e um estado de necessidade de terceiro. Vale mais salvar o imóvel do que destruir o portão e a porta. Exemplo 02: determinada pessoa adentra a um supermercado, furta uma maçã, pois estava à beira da morte por falta de alimentos. Embora a pessoa tenha praticado um crime, é razoável seu comportamento. Exemplo 03: aborto para salvar a vida da gestante. Neste caso, se está diante de uma exclusão de ilicitude positivada em lei, ou seja, permitida em lei.

100. Teorias do Estado de Necessidade O estudo teórico em matéria penal é de suma importância para a compreensão dos institutos jurídicos posteriormente positivados pelo legislador. Estudaremos a seguir as teorias do crime: a teoria unitária, a teoria diferenciadora e a teoria da equidade. No ordenamento jurídico brasileiro, a teoria adotada é a teoria unitária (CP, art. 24, § 2º). Essa teoria constitui causa de excludente de ilicitude ou causa de diminuição de pena. Pela teoria unitária. o estado de necessidade importa numa excludente de ilicitude se for razoável; se não for razoável, o ato cometido será causa de redução de pena.


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A teoria diferenciadora ou da diferenciação é aquela em que se faz a ponderação entre os valores dos bens e deveres em conflito, de modo que o estado de necessidade será considerado causa de exclusão de ilicitude somente quando o bem sacrificado for reputado de menor valor. É conhecida como teoria de estado de necessidade exculpante, quando o bem destruído for de valor igual ou maior que o preservado, hipótese em que o estado de necessidade continuará existindo, porém, como circunstância de exclusão de culpabilidade. O que prevalece na teoria diferenciadora é o bem jurídico preservado diante do bem jurídico atingido, como na teoria unitária. Ocorre que, em alguns casos, o bem jurídico atingido pode ser de igual ou maior valor que o bem jurídico preservado; estaremos, então, diante da prática de conduta ilícita, sendo necessário analisar a culpabilidade. No caso da teoria diferenciadora, o fato será ilícito, ou seja, reprovado pelo Direito, porém, essa conduta não será culpável, acarretando a migração do processo para uma excludente de culpabilidade. Dessa forma, o fato não será classificado como crime mesmo que tenha acontecido, não havendo reprovação pelo evento ocorrido. Além das teorias apresentadas, temos a teoria desenvolvida por Immanuel Kant afirmando que o estado de necessidade não exclui nem a antijuricidade, nem a culpabilidade. O fato deixa de ser punido, apenas por razões de equidade. Para referido filósofo, nem todo problema é passível de solução por meio do Direito, sendo assim, o dogmatismo jurídico abriria espaço para o bom-senso (equidade). De acordo com essa teoria, não importa a análise do fato como típico, ilícito ou culpável, restando o fato isento de punição, diante do uso da equidade. As teorias ora estudadas nesta unidade são aquelas que justificam o estado de necessidade como excludentes de ilicitude.

101. Teoria Adotada no Brasil Adotada pelo Código Penal, o estado de necessidade sempre importará em causa de excludente de ilicitude. Nesse sentido, para o Código Penal brasileiro, ou a situação reveste-se de razoabilidade, ou não há estado de necessidade. Não há comparação de valores, pois ninguém é obrigado a ficar calculando o valor de cada interesse em conflito, bastando que atue de acordo com o senso comum daquilo que é razoável.


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Assim, ou o sacrifício é aceitável, e o estado de necessidade atua como causa justificadora, ou não é razoável, e o fato passa a ser ilícito. Importante destacar que a construção da teoria unitária foi inserida na parte especial do Código Penal, pela Lei nº 7.209/1984, sendo reconhecida pelo legislador como uma opção mais adequada ao Brasil. No caso concreto, existem situações como furto famélico, aborto para salvar a vida da gestante; aqui a análise é mais simplificada do que seria no caso da teoria da diferenciação, que exige uma gradação de valores, como decidir entre a moralidade pública e a moralidade administrativa. O estado de necessidade jamais atuará como causa supralegal de exclusão de culpabilidade. Conforme previsão no CP, art. 24, § 2º, quando o sacrifício não for razoável, o agente responderá pelo crime, restando-lhe o direito a uma redução de pena de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços). Essa redução prevista no parágrafo mencionado só terá cabimento diante da presença da culpabilidade. A coação moral irresistível pode ser utilizada para demonstrar um exemplo de excludente de ilicitude, porque, nessa hipótese, não há reprovação social, eliminando-se a culpabilidade. Portanto, presentes os requisitos do estado de necessidade, sendo razoável o sacrifício exigido, estaremos diante de causa de excludente de ilicitude.

102. Espécies de Estado de Necessidade O estado de necessidade divide-se em seis espécies que serão estudadas nesta unidade. Quanto à titularidade do interesse protegido, podendo ser próprio ou de terceiro, lembrando que será levado em consideração o sacrifício do bem jurídico agredido. Se o indivíduo comete um homicídio para salvar a própria vida, estaremos diante de interesse próprio ou, ainda, quando o indivíduo agredir um bem jurídico externo, visando à preservação de um bem jurídico de uma terceira pessoa, estaremos perante o estado de necessidade de terceiro. A preservação do patrimônio alheio autoriza a prática do estado de necessidade de terceiro, mas a razoabilidade deverá prevalecer como baliza nessa situação, lembrando que essa ação é autorizada em nome do interesse social. Quanto ao aspecto subjetivo do agente, pode ser real ou putativo. Nessa espécie de estado de necessidade, são avaliadas as primeiras impressões que o agente teve sobre aquela situação de perigo.


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É chamado de estado real quando a situação de perigo de fato está acontecendo; no estado de perigo putativo, o agente vislumbra situação de risco inexistente. Quanto ao terceiro que sofre a ofensa, pode ser defensivo, quando a agressão dirige-se contra o provocador dos fatos ou agressivo, quando o agente destrói bem de terceiro inocente. Na legítima defesa, a agressão atual e injusta é dirigida contra a própria pessoa, diferente do estado de necessidade defensiva, em que a situação de perigo, embora vincule o indivíduo ao risco, não quer dizer, necessariamente, que o provocador dos fatos teve a intenção de praticar aquela agressão injusta de forma direta. Para se caracterizar as espécies de estado de necessidade como excludentes de ilicitude, elas precisam preencher todos os requisitos do estado de necessidade, como situação de perigo, conduta lesiva.

103. Casos Especiais do Estado de Necessidade O primeiro caso é o do aborto necessário, previsto no art. 128, I, do Código Penal, em que a interrupção dolosa da gestação ocorre em nome da preservação da vida da mãe. O legislador prevê uma situação drástica em que está presente um conflito de vida entre a mãe e o filho que está em gestação, por conclusão médica, é diagnosticado o risco de morte da mãe. A escolha de quem deve morrer nesse caso advém de uma política criminal, levado em consideração um ser humano que já está vivo, possui um histórico social. Se o médico optar por salvar a vida da criança, será analisado a partir do senso comum coletivo, pois não é razoável que a vida da mãe seja a escolhida para ser sacrificada; diante dessa situação hipotética, o profissional provavelmente seria condenado com uma redução de pena. Outra hipótese prevista como casos especiais do estado de necessidade é o ingresso autorizado por flagrante delito. Segundo Magalhães Noronha, trata-se de disposição do art. 150 do Código Penal. Dispõe sobre a violação de domicílio, no § 3º, II: a inocorrência de qualquer delito se a entrada em casa alheia se der quando algum crime estiver acontecendo naquelas dependências, ou então, na iminência de acontecer. Importante destacar que essa interferência, essa entrada, pode ser realizada tanto para fins de legítima defesa como para estado de necessidade.


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Quanto ao porte de arma e estado de necessidade, vale lembrar que não pode o agente portar arma de fogo ilegalmente, alegando que transita por locais perigosos, pois bastaria justificar sua necessidade e providenciar autorização à autoridade competente. Ao Estado cabe assegurar ao cidadão a segurança, não podendo o indivíduo utilizar de meios escusos para sua própria proteção. Dessa forma, em hipótese alguma caberá alegação de estado de necessidade. A maioria da jurisprudência não admite a mera alegação de miserabilidade do agente como causa excludente da criminalidade. Então, dificuldades financeiras, desemprego, situação de penúria, por si sós, não caracterizam essa descriminante. Desse modo, a prática do ato ilícito deve ser um recurso inevitável; se o agente tinha plenas condições de exercer trabalho honesto, a excludente não se opera. O estado de necessidade em casos concretos não deverá ser analisado individualmente, considerando as particularidades do indivíduo e suas alegações, além da comprovação de que aquela situação foi excepcional e visou unicamente seu alimento ou de um filho.

Exercício 84. Age em estado de necessidade somente aquele que sacrifica um bem jurídico de igual ou menos valor do que o bem em situação de risco.

104. Legítima Defesa – Conceito, Natureza Jurídica e Alteração no Rito do Júri A excludente de ilicitude mais conhecida é a legítima defesa, mas é preciso trabalhar seu conceito evitando enganos acerca de sua previsibilidade. A natureza jurídica da legítima defesa é de causa de exclusão da ilicitude, consiste em repelir injusta agressão, atual ou iminente, a direito próprio ou alheio, usando moderadamente dos meios necessários. Não há uma situação de perigo pondo em conflito dois ou mais bens, na qual um deles deverá ser sacrificado. Agressão, legitimidade, tempo, moderação e intensidade do ato praticado são apenas alguns dos requisitos caracterizadores dessa excludente. A agressão pode ser justa ou injusta, sendo valorada pelo juiz ou jurados no caso concreto.


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Ainda, essa agressão precisa ser atual ou iminente, sempre no calor dos acontecimentos, sob pena de tornar-se uma vingança, respondendo o agente neste caso, normalmente, pelos atos praticados. Essa agressão deve ser direcionada a direito próprio ou de terceiro, visando repelir a violência injusta. A repulsa com meios necessários são os únicos meios que o agente dispõe naquele momento, para cessar a ameaça diante da agressão injusta. Quanto ao uso moderado de tais meios, é imprescindível que haja a proporcionalidade. O conhecimento da situação justificante é o requisito subjetivo da legítima defesa. A doutrina exige que esse requisito esteja presente, ou seja, a sensação do sujeito de que naquele momento figurava como vítima. O Tribunal do Júri possui competência constitucional para apurar os crimes dolosos contra a vida, aborto, infanticídio, homicídio, induzimento, instigação e auxílio ao suicídio. Esses crimes contra a vida não são processados na justiça comum, sendo apurados pelos jurados. A Lei nº 11.689/2008, alteradora do procedimento do júri, modificou sensivelmente a parte da quesitação, ou seja, respondidos afirmativamente por mais de três jurados os quesitos relativos aos incisos I e II do caput do art. 483 do Código de Processo Penal, não será preciso nem que o jurado responda se absolve o acusado por reconhecer que houve legítima defesa.

105. Requisitos da Legítima Defesa (Agressão Injusta) Para o Direito Penal, agressão é toda conduta humana que ataca um bem jurídico, ameaça ao patrimônio ou à vida por exemplo. Só as pessoas humanas, portanto, praticam agressões. Ataque de animal não a configura; logo, não autoriza a legítima defesa. No caso em tela, se a pessoa se defende de um animal, ela está em estado de necessidade. Convém notar que, se uma pessoa provoca um animal para que ele avance em outra, nesse caso, existe agressão autorizadora da legítima defesa (animal utilizado como arma). A agressão injusta é aquela contrária ao ordenamento jurídico. Trata-se, portanto, de agressão ilícita, não se exigindo que a agressão injusta seja necessariamente um crime. A legítima defesa pode ser exercida para a proteção da posse. Essa previsão está catalogada no art. 1.210, § 1º, do Código Civil.


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Já, na agressão de inimputáveis, a injustiça da agressão deve ser aferida de forma objetiva, independentemente da capacidade do agente. A provocação do agente, segundo a sua intensidade e conforme as circunstâncias, pode ou não ser considerada uma agressão. Deve-se avaliar o contexto, se foi uma brincadeira de mau gosto, de certa forma, tolerável no meio social, não autorizando, portanto, a legítima defesa. Não poderá invocar legítima defesa aquele que mata ou agride fisicamente alguém que lhe provocou com palavras. Aqui, prevalece o critério da moderação e a aferição competirá ao juiz. Com relação ao provocador, em regra, também não pode invocar legítima defesa, já que esta não ampara nem protege quem dá causa aos acontecimentos.

106. Legítima Defesa - Hipóteses de Cabimento Nesta unidade, estudaremos as hipóteses de cabimento da legítima defesa e as hipóteses em que não se configurará a excludente de ilicitude. A legítima defesa contra agressão injusta de inimputável se opera normalmente, mas deve-se atentar quanto ao uso da moderação, lembrando que essa hipótese é analisada de forma objetiva. A legítima defesa também pode ser contra agressão acobertada por qualquer outra causa de exclusão da culpabilidade. Neste caso, não importa se o agressor não está em condições de conhecer o caráter criminoso do fato praticado, pois, com ou sem esse conhecimento, a pessoa está suportando um ataque injustificável e tem o direito de se defender. Caberá legítima defesa real contra legítima defesa putativa, pois o agente está autorizado a repelir o ataque de forma objetiva, ainda mais por não ter ciência de que tal ameaça não era real. A legítima defesa real contra legítima defesa subjetiva é permitida, ocorrendo a partir do excesso por erro de tipo escusável, ou seja, após se defender de agressão inicial, o agente começa a se exceder, pensando ainda que a ameaça não cessou. Para este indivíduo, embora ainda imagine que a ameaça permaneça, de forma objetiva, já deixou a posição de defesa e passou ao ataque, legitimando daí a repulsa por parte de seu agressor. A legítima defesa putativa contra legítima defesa real poderá, dependendo do erro que levou à equivocada suposição, a exclusão do dolo ou culpa, tal hipótese somente é possível na legítima defesa putativa de terceiro. Na legítima defesa real contra legítima defesa culposa, não importa a postura


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subjetiva do agente em relação ao fato, mas tão somente a injustiça objetiva da agressão. Se a agressão for injusta por dolo ou por culpa, caberá legítima defesa. As hipóteses de não cabimento da legítima defesa são a legítima defesa real contra legítima defesa real, a legítima defesa real contra estado de necessidade real, a legítima defesa real contra exercício regular de direito e a legítima defesa real contra estrito cumprimento do dever legal (sem agressão injusta).

107. Requisitos da Legítima Defesa (Direito Próprio ou Alheio Atacado) Nesta unidade, o assunto tratado será o direito próprio ou alheio atacado e a análise da titularidade deste direito. Cabendo legítima defesa de terceiro, a lei autoriza o agente a ingressar, diante do contexto de ameaça injusta, visando defender a pessoa atacada. Na prática, pode ser difícil identificar quem deu causa à agressão, o que gera, em caso de erro, o direito da outra parte a ser voltar com a mesma excludente. A legítima defesa própria ocorre quando o agente repele injusta agressão para defender o seu direito. No caso da legítima defesa de terceiro, o direito preservado é alheio. Qualquer direito, isto é, bem tutelado pelo ordenamento jurídico, admite a legítima defesa, desde que haja proporcionalidade entre a lesão e a repulsa. Na legítima defesa de terceiro, a conduta pode dirigir-se contra o próprio terceiro defendido. Nesse caso, o agredido é, ao mesmo tempo, o defendido, como a agressão contra suicida, impedindo-lhe que atente contra sua vida. Importante destacar que, na legítima defesa da honra, o que se discute não é a possibilidade da defesa da honra, mas, sim a proporcionalidade entre a ofensa a intensidade da repulsa. Todos os direitos são suscetíveis de proteção por meio da legítima defesa, tais como a vida, a liberdade, a integridade física, o patrimônio, a honra, etc.

108. Teoria do Crime – Requisitos da Legítima Defesa (Reação com os Meios Necessários) O meio é sempre algo utilizado para atingir um objetivo. Quando necessário, indica que, em determinada situação, demandará utilizar um meio específico para repelir injusta agressão.


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Cumpre lembrar o binômio: meio necessário x uso moderado. Este é vinculado com a menor lesividade possível. Ainda assim, a necessidade do meio não guarda relação com a forma com que é empregado. A utilização da arma/instrumento refere-se à moderação e não à necessidade do meio. Será feito o que for possível diante da ocorrência concreta. A desnecessidade do meio caracteriza o excesso doloso, culposo e até mesmo uma exculpante (indicativo de: sem dolo ou culpa).

109. Teoria do Crime – Requisitos da Legítima Defesa (Uso Moderado de Tais Meios) A moderação traduz-se essencialmente no emprego dos meios necessários para conter a injusta agressão, no limite da razoabilidade. Já a imoderação implica no afastamento da moderação, onde será questionada a ocorrência do excesso. O conhecimento da situação justificante indica que, mesmo com a existência da agressão injusta, atual ou iminente, haverá o descarte da legítima defesa, uma vez que o agente desconhecia essa situação. A inevitabilidade da agressão é trazida por alguns doutrinadores como caracterizadora da legítima defesa, porém, esta não é uma corrente majoritária. Em contraposição, há o commodus discessus, que, quando da injusta agressão houver a opção em fugir ou agredir de volta, só será considerada legítima defesa quando escolhida a primeira. Ainda assim, a lei brasileira não exige a obrigatoriedade de se evitar a agressão, uma vez que a legítima defesa não traz este requisito em seu dispositivo.

110. Teoria do Crime – Espécies de Legítima Defesa As espécies de legítima defesa podem ser elencadas a iniciar pela legítima defesa real, onde a própria vítima produz sua defesa de maneira moderada em vista da injusta agressão sofrida, seja ela atual ou iminente. Já a legítima defesa sucessiva implica na repulsa contra o excesso. Cumpre lembrar que quem dá causa à ocorrência não pode arguir legítima defesa em seu favor.


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A legítima defesa própria é aquela defesa em direito próprio, onde há a defesa de um bem de titularidade da vítima. Quanto à legítima defesa de terceiro, condiz à defesa de um direito alheio – aquele que executa não é o destinatário de injusta agressão. A legítima defesa recíproca só será considerada quando um dos agressores agir em erro, pois a defesa, quando legítima, implica na origem de uma injusta ação. Quando recíproca, denomina-se “legítima defesa putativa”.

Exercício 85. A legítima defesa real ocorre quando a própria vítima defende-se de agressão injusta, mesmo que de forma imoderada.

111. Teoria do Crime – Casos Especiais de Legítima Defesa Dentre os casos especiais de legítima defesa, há a legítima defesa putativa, que ocorre quando é suposto por equívoco falsa análise da realidade em estar em legítima defesa. As descriminantes putativas são causas excludentes de ilicitude. De fato não existem, porém, o agente possui a certeza quanto a isso. Já a legítima defesa subjetiva exclui o dolo e a culpa, sendo considerada como o excesso derivado de erro de tipo escusável. Neste caso, serão encontradas diversas correntes doutrinárias, das quais prevalecerá o entendimento de que sem a existência de dolo e/ou de culpa, a conduta será considerada penalmente irrelevante (inexigibilidade de conduta diversa). Não terá como consequência a excludente de ilicitude.

Exercício 86. Tanto a legítima defesa putativa quanto a legítima defesa subjetiva são causas de excludentes de ilicitude.

112. Teoria do Crime – Legítima Defesa e Aberratio Ictus Na reflexão sobre a legítima defesa com erro na execução, é possível concluir quanto à ocorrência de erro durante o procedimento dos atos necessários de defesa.


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O art. 73 do Código Penal traz que do erro ou acidente no uso dos meios de execução contra a vítima, caso o agente atinja terceiro daquele que pretendia, responderá como se o intencionado tivesse sido atingido, que acabou por não sofrer a agressão/violência.

Exercício 87. Quem tenta matar de forma imotivada o próprio pai e, por erro na execução, acerta uma pessoa que, depois da perícia, descobre-se ser um criminoso procurado pela polícia, fica isento de pena.

113. Exercício Regular de Direito – Conceito e Visão a Partir da Teoria da Tipicidade Conglobante A terceira causa legal de exclusão de ilicitude é o exercício regular de direito. É preciso observar que o Direito deve ser coerente e, partindo deste pressuposto, nota-se que o exercício de um direito nunca é antijurídico. Quando se fala em exercício regular de direito, é excluída a ilicitude da conduta. Como conceito, tem-se que é uma causa de exclusão da ilicitude, que consiste no exercício de uma prerrogativa conferida pelo ordenamento jurídico, mas caracterizada como fato típico. A Constituição da República Federativa do Brasil dispõe que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei. Neste sentido, se exclui a ilicitude nas hipóteses em que o sujeito está autorizado a esse comportamento. O Código Penal prevê casos específicos de exercício de direito, quais sejam imunidade judiciária e a coação para evitar suicídio ou para a prática de intervenção cirúrgica.

Exercício 88. O exercício de um direito exclui a ilicitude do fato.


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114. Lesões Graves nos Esportes A palavra direito engloba todo o regramento feito com base na Constituição da República Federativa do Brasil, princípios e lei. Assim, as regras de determinado esporte passam a funcionar como direito deste esporte. Ocorre que claramente alguns esportes envolvem certa violência. São também fontes de direito subjetivo os regulamentos e as provisões internas de associações autorizadas legalmente a funcionar, cujo exercício regular torna lícito o fato típico, como ocorre com as lesões praticadas nas competições esportivas. A violência desportiva tradicionalmente configura fato típico, porém, não ilícito. A ilicitude é excluída pela descriminante do exercício regular de direito. Outra corrente doutrinária segue a atipicidade do fato pela imputação objetiva – praticar o esporte nos limites de suas regras não é um fato proibido pela norma. Sabe-se que a violência é inerente a algumas práticas esportivas, como no boxe, e eventual em outras, como ocorre no futebol. Insta esclarecer que tanto a lesão prevista pelas regras do desporto, quanto a praticada fora do regulamento, mas como um desdobramento natural e previsível do jogo, não constituem fato típico.

Exercício 89. Assinale verdadeiro ou falso:

Em octógono de luta de MMA (vale-tudo), um dos lutadores mata o outro com um chute no pescoço. Ele praticou crime de homicídio com dolo eventual.

115. Ofendículos e Prática da Medicina Etimologicamente, a palavra “ofendículo” significa obstáculo, obstrução, empecilho. São instalados para defender não somente a propriedade, mas qualquer outro bem jurídico, como a vida das pessoas que se encontram no local. Cumpre observar que os ofendículos devem ser facilmente perceptíveis, como cacos de vidro ou pontas de lança em muros, por exemplo.


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Trata-se do exercício regular do direito de propriedade, uma vez que a lei permite desforço físico imediato para preservação da posse e, por conseguinte, de quem estiver no imóvel. Ainda, qualquer que seja a posição adotada, os ofendículos excluem a ilicitude. Em relação às intervenções médicas, é necessário entender que para a doutrina tradicional há exclusão de ilicitude em razão do exercício regular de direito. Ressalta-se que é indispensável o consentimento do paciente ou de seu representante legal. Assim, antes de o médico praticar qualquer ato invasivo ao bem jurídico integridade física da pessoa, é necessária uma autorização por escrito. Ausente o consentimento, poderá caracterizar estado de necessidade em favor de terceiro. As lesões provocadas no paciente durante o procedimento cirúrgico como meio necessário ao seu tratamento não configuram o crime de constrangimento ilegal, já que é um fato permitido pelo ordenamento jurídico.

Exercício 90. Assinale verdadeiro ou falso:

O médico, no exercício regular de um direito, pode não prorrogar o tratamento de paciente irrecuperável, deixando de ministrar medicamentos, viabilizando a morte natural da vítima.

116. Estrito Cumprimento do Dever Legal – Conceito e Visão a Partir da Teoria da Tipicidade Conglobante O estrito cumprimento do dever legal é o instituto jurídico que compreende as normas e princípios relativos à atuação de quem, sob comando legal (ditado por relevante interesse público e legitimado pela observância dos limites impostos pela lei e pelos direitos fundamentais consagrados na Constituição), pratica conduta descrita em um tipo legal de crime. O cumprimento do dever legal somente será estrito se corresponder à real vontade da ordem jurídica, o que pressupõe a observância dos direitos fundamentais, tanto pelo legislador quanto por quem executa o dever imposto em lei. Desta forma, por estrito cumprimento do dever legal tem-se de entender a qualidade do comportamento que corresponde não ao mero sentido formal


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ou literal da lei, mas à sua interpretação conformada aos princípios e fundamentos do sistema constitucional. Faz-se necessário observar que, de acordo com entendimento do STF, a norma mais favorável à dignidade humana é a que será aplicada ao caso concreto, não importando a hierarquia. Insta salientar que quem cumpre um dever legal dentro dos limites impostos pela lei não pode estar praticando ao mesmo tempo um ilícito penal, a não ser que atue fora dos limites. A consequência da tipicidade conglobante é a migração do estrito cumprimento do dever legal e do exercício regular de direito para o fato típico, servindo como causa de atipicidade.

Exercício 91. Assinale verdadeiro ou falso:

A análise da tipicidade conglobante deve ser restrita ao plano da legalidade.

117. Requisitos do Estrito Cumprimento do Dever Legal No que tange ao estrito cumprimento do dever legal, exige-se que o agente se contenha dentro dos limites do seu dever. Exemplo: prisão legal efetuada pelos agentes policiais, que deve ser efetuada sem caráter infamante. Quanto ao alcance da excludente, observa-se que se dirige aos funcionários ou agentes públicos, que agem por ordem da lei. Não fica excluído, contudo, o particular que exerce função pública, como um mesário da Justiça Eleitoral, por exemplo. Cumpre ressaltar que se reconhecendo a excludente em relação a um autor, o coautor ou partícipe do fato, em regra, também não podem ser punidos. O fato não pode ser objetivamente lícito para uns e ilícito para outros. Outro ponto a ser observado é que o sujeito deve ter conhecimento de que está praticando um fato em face de um dever imposto por lei.

Exercício 92. Assinale verdadeiro ou falso:

Empregado não registrado de empresa particular não pode se valer da excludente do estrito cumprimento de dever legal.


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118. Excesso Punível O excesso compreende-se na conduta ou parcela de conduta do agente que utiliza de meios superiores aos necessários ou faz uso dos meios necessários imoderadamente. Assim, se o ofendido de agressões físicas revida e seu agressor se rende, qualquer outra lesão causada por aquele a este a partir deste instante será considerado desnecessária e, portanto, configura-se o excesso. Ainda, é importante observar que o excesso pode ser culposo ou doloso. Quando o agente intencional e conscientemente utiliza-se de meio desproporcional ou age de forma imoderada dando continuidade à agressão outrora acobertada pela exculpante, age dolosamente, respondendo penalmente pelo excesso na modalidade dolosa. O excesso culposo é derivado da imponderação, desatenção e demasiada precipitação do agente. Só a desnecessidade dos meios não basta para afirmar o excesso punível, desde que eles hajam sido usados moderadamente. Por fim, ressalta-se que é preciso que seja feita uma análise conjunta dos meios necessários com a moderação na reação.

119. Excesso Impunível Primeiramente, é preciso observar que existe o denominado excesso impunível ou inevitável, em que se exclui a culpabilidade e não a ilicitude. Constitui-se como a conduta que ultrapassa os limites adequados da legítima defesa derivada de causas, como a alteração brusca de ânimo, temor ou surpresa. Em 1969, houve uma tentativa de reforma do Código Penal. Em seu art. 30, § 1º, previa expressamente o excesso exculpante. Posteriormente, em 1984, com a modificação da parte geral do referido diploma legal, tal dispositivo foi retirado do bojo normativo. Não obstante, parte da doutrina entende para subsistência do instituto contendo natureza jurídica de causa supralegal de inexigibilidade de conduta diversa. Ainda, conforme entendimento do STF, o excesso exculpante não deve ser confundido com o excesso doloso ou culposo, por ter como causas a alteração do ânimo, o medo e a surpresa. Ocorre quando é oposta à agressão injusta, atual ou iminente, reação intensiva, que ultrapassa os limites adequados a fazer cessar a injusta agressão.


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A reação com os meios necessários, de forma moderada, exclui a ilicitude. Se o sujeito exagerar na reação, haverá o excesso, que poderá ou não ser punível. O excesso será punível quando for doloso ou culposo. Quando o excesso for justificante, inevitável por força do temor, medo, surpresa ou alteração excessiva de ânimo, não será punível. O excesso não sendo punível tem como fundamento doutrinário não uma causa excludente de ilicitude, mas uma causa excludente de culpabilidade.

120. Excesso Intensivo e Extensivo – A Quesitação no Novo Rito do Júri Excesso intensivo se dá no momento em que o agente que repele agressão injusta passa a agir de forma intensificada e até mesmo desproporcional à ação agressora inicial. A situação necessária para que haja a excludente de ilicitude persiste, porque a reação exagerada do agente vítima não se sobrepõe a ela. Já o excesso extensivo ocorre quando o agente age para se defender e sem que cometa excesso consiga faz cessar uma agressão, porém, mesmo depois de cessada, ele continua a agir. Cumpre ressalvar que o excesso extensivo pode ser tanto doloso quanto culposo. Com a nova quesitação do Tribunal do Júri – o jurado absolve o acusado – elimina-se a necessidade de quesitar sobre o excesso, se presente e, em seguida, se doloso ou culposo. Isso porque a absolvição do acusado não precisa estar vinculada à motivação jurídica. Entretanto, alguns autores continuam a defender a necessidade da quesitação específica.

121. Culpabilidade – Conceito Há diversas culpabilidades. Quando se observa a Constituição, nota-se que se trata do princípio da culpabilidade. Salienta-se que, como princípio, este irá vetorizar a aplicação da lei penal. Outra culpabilidade está prevista no art. 59 do Código Penal pátrio. Ainda, existe outra culpabilidade, que diz respeito à Teoria do Delito.


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De acordo com o Código Penal, crime é fato típico e ilícito, sendo a culpabilidade um pressuposto de aplicação de pena. Assim, quando não tem culpabilidade, não se pode afirmar que não há crime. No entanto, para a maioria da doutrina e jurisprudência, crime é fato típico, ilícito e culpável. Culpabilidade é o juízo de censura ou reprovabilidade que incide sobre a formação e exteriorização da vontade do responsável por um fato típico e ilícito, com o propósito de aferir a necessidade de imposição de pena. Trata-se de pressuposto para aplicação da pena, de acordo com a corrente bipartida; ou constitui elemento do conceito analítico de crime, conforme e corrente tripartida. No Estado Democrático de Direito, deve imperar um Direito Penal do fato. Sabe-se que o Direito Penal deve se preocupar com a punição de autores de fatos típicos e ilícitos, jamais montar sua estrutura de aplicação levando em consideração determinadas categorias de pessoas, como mendigos, vadios, pobres, dentre outros. O juízo de culpabilidade recai sobre o autor, apenas, para analisar se ele deve ou não suportar uma pena em razão do fato cometido.

122. Coculpabilidade Quando se fala em coculpabilidade, nota-se que há mais de uma pessoa culpável. A Teoria da Coculpabilidade diz que, estudando a situação dos criminosos na criminologia, a maioria das pessoas que são condenadas são pobres e excluídas socialmente. Sendo levado esse dado ao Direito, o juiz pode, no momento de aplicar a pena, diminuir a pena dos criminosos que foram excluídos socialmente durante sua vida. Assim, o sujeito é culpado pelo fato junto com toda sociedade que o empurrou para a exclusão social. A teoria aqui estudada encontra espaço na lei brasileira para sua aplicação. Para Zaffaroni e Pierangeli, define-se coculpabilidade como uma carga de valores sociais negativos que deve ser considerada como elemento excludente ou atenuante da culpabilidade. Esta teoria aponta responsabilidade social do Estado pela não inserção social e, portanto, devendo também este (o Estado) suportar o ônus do comportamento desviante do padrão normativo por parte dos atores sociais sem cida-


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dania plena que possuem uma menor autodeterminação diante das concausas socioeconômicas da criminalidade urbana e rural. Conforme dito anteriormente, há espaço para aplicação desta teoria no Direito pátrio. Isso porque existe uma circunstância atenuante inominada no art. 66 do Código Penal: “Art. 66. A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei.” Cumpre observar que esta possibilidade é válida, pois melhora a situação do réu.

123. Teorias Psicológica e Psicológico-normativa Antes de iniciar o estudo das teorias da culpabilidade, é importante o conhecimento do conceito de culpabilidade e bem assim dos elementos que a compões. Culpabilidade é o juízo de reprovação que recai sobre o autor culpado por um fato típico ilícito. São elementos que compõem a culpabilidade a imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa. A primeira teoria da culpabilidade a ser estudada é a psicológica, que evoluiu para a psicológica normativa. A Teoria Psicológica foi idealizada por Franz von Liszt e Ernest Beling. A culpabilidade é entendida como o mero vínculo psicológico entre o sujeito e o fato típico ilícito por ele praticado. Evoluindo para o sistema neoclássico, agrega-se a essa visão psicológica a noção de reprovabilidade: a culpabilidade somente é reconhecida quando o agente for imputável, agir dolosa ou culposamente e se pudesse dele exigir comportamento diferente. O dolo, por sua vez, é normativo à medida que guarda em seu interior a consciência da ilicitude.

Exercício 93. O dolo e a culpa já fizeram parte dos elementos que integram a culpabilidade penal.

124. Teoria Normativa Pura e Teoria Complexa No sistema finalista, a culpabilidade continua sendo a reprovabilidade do ato. Este, inclusive, o sistema adotado pelo Código Penal.


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A prática de uma infração penal, em regra, dirige a conduta para uma finalidade. Este é, em resumo, o finalismo penal: a intensificação da conduta humana, dolosa ou culposa, comissiva ou omissiva, dirigida para uma finalidade. Assim, o finalismo identificou a natureza puramente normativa da culpabilidade, afastando-se a parte psicológica, ou seja, o dolo e a culpa. Restou, na culpabilidade, o que passa a ser puramente normativa. São elementos que a compõem a potencial consciência da ilicitude, exigibilidade de conduta diversa e imputabilidade. O dolo e a culpa migraram para o fato típico, mais especificamente, no elemento conduta.

Exercício 94. Como o finalismo penal exige a vontade livre e consciente dirigir a conduta para uma finalidade, deslocou-se o dolo e a culpa para o fato típico.

125. Diferença entre Teoria Extremada e Teoria Limitada A teoria estrita ou extremada da culpabilidade e teoria limitada da culpabilidade são derivações da teoria normativa pura da culpabilidade e divergem apenas quanto ao tratamento das descriminantes putativas. Descriminantes putativas são aquelas em que existe uma situação imaginária na cabeça da pessoa, ou por erro de tipo, ou erro de proibição. As descriminantes putativas ocorrem nas hipóteses, em que o agente acredita estar amparado por uma causa legal de exclusão da antijuridicidade (descriminante) que não existe (putativa). Sendo assim, ele acredita estar amparado pelo estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal ou exercício regular de direito. Porém, não há tais situações no caso concreto. Para a teoria limitada, o erro é de tipo. O erro sobre ser proibido ou não é erro de proibição. Para a teoria extremada, tudo é erro de proibição. Para a teoria extremada, representada pelos finalistas Welzel e Maurach, e, no Brasil, por Alcides Munhoz Neto e Mayrink da Costa, toda espécie de descriminante putativa, seja sobre os limites autorizadores da norma (por erro de proibição), seja incidente sobre situação fática pressuposto de uma causa de justi-


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ficação (por erro de tipo), é sempre tratada como erro de proibição. Com isso, segundo Munhoz Neto, evita-se desigualdade no tratamento de situações análogas. Para a teoria limitada da culpabilidade, o erro que recai sobre uma situação de fato (descriminante putativa fática) é erro de tipo, enquanto o que incide sobre a existência ou limites de uma causa de justificação é erro de proibição. Defendem-na, no Brasil, Assis Toledo e Damásio Evangelista de Jesus. A teoria adotada pelo Código Penal brasileiro é a teoria ilimitada da culpabilidade. As descriminantes putativas fáticas são tratadas como erro de tipo (art. 20, § 1º), enquanto as descriminantes putativas por erro de proibição, ou erro de proibição indireto, são consideradas erro de proibição (art. 21). Quando se fala em erro de tipo, o fato praticado passa a ser atípico. Já no erro de proibição, o fato é típico, ilícito, mas não é culpável. O agente não sabia que era proibido.

Exercício 95. Nosso Código Penal adota a teoria limitada da culpabilidade.

126. Atual Estrutura da Culpabilidade Os elementos da culpabilidade, segundo a teoria utilizada pelo Código Penal, são três: a) imputabilidade; b) potencial consciência da ilicitude; c) exigibilidade de conduta diversa. Causas dirimentes: são aquelas que excluem a culpabilidade. Diferem das excludentes, que excluem a ilicitude e podem ser legais e supralegais. Sempre que se deparar com uma hipótese de imputabilidade, que elimina a potencial consciência da ilicitude ou não exija da pessoa conduta diversa, se estará diante de dirimentes, nome técnico de situações que excluem a culpabilidade. Imputabilidade é a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de se determinar de acordo com esse entendimento. São quatro as causas que excluem a imputabilidade: – doença mental;


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– desenvolvimento mental incompleto; – desenvolvimento mental retardado; – embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior. A embriaguez tem que ser completa e por caso fortuito ou força maior: a pessoa não quis beber ou se drogar. Exemplo: colocam uma droga na bebida da pessoa sem que essa saiba, ela bebe e fica sem capacidade de entender o que está acontecendo e acaba cometendo um crime. Nesse caso, ela será inimputável. Potencial consciência da ilicitude é o erro de proibição, ou seja, a errada compreensão de uma determinada regra legal pode levar o agente a supor que certa conduta injusta seja justa. Exemplo: um estrangeiro que utiliza entorpecente, vindo da Holanda e faz seu uso no Rio de Janeiro. Para o país dele, é normal. Nesse caso, ele será processado criminalmente no Brasil, porém, seu advogado deverá alegar erro de proibição, pois ele não tinha potencial consciência da ilicitude. Exigibilidade de conduta diversa consiste na expectativa social de um comportamento diferente daquele que foi adotado pelo agente. Somente haverá exigibilidade de conduta diversa quando a coletividade podia esperar do sujeito que tivesse atuado de outra forma. – Obediência hierárquica: a pessoa recebe uma ordem do seu chefe, no âmbito dos agentes públicos, e essa ordem não é manifestamente ilegal. – Coação moral irresistível: No caso do gerente de banco que é coagido psicologicamente e não é exigido dele conduta diversa.

Exercício 96. O dolo e a culpa, indispensáveis para a caracterização do crime, localizam-se na potencial consciência da ilicitude.

127. Imputabilidade – Aspectos Introdutórios De acordo com o conceito tripartite, crime é fato típico, ilícito e culpável. No fato típico, tem-se a conduta humana dolosa ou culposa, resultado jurídico, nexo causal e tipicidade. Todos os fatos típicos serão ilícitos, exceto se estiverem acobertados por uma excludente de ilicitude (legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito). Dentro da culpabilidade, há imputabilidade, potencial consciência da ilicitude


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e exigibilidade de conduta diversa.

128. Imputabilidade – Conceito e Consequência Jurídica Imputabilidade é a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de se determinar de acordo com este entendimento. Faz-se necessário observar que o inimputável não recebe pena. Como regra geral, todo ser humano maior de dezoito anos é imputável; pode receber uma pena se praticar um crime. É necessário entender que o menor de dezesseis anos que foi emancipado não leva esta capacidade civil plena para o âmbito do Direito Penal. O art. 26 do CP dispõe que é isento de pena o agente que, por doença mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de se determinar de acordo com este entendimento. Do conceito de imputabilidade, extrai-se que o agente, para ser imputável, precisa ter condições físicas, psicológicas, morais e mentais de saber que está realizando um ilícito penal. A imputabilidade será reconhecida juridicamente se estiverem presentes o aspecto intelectivo e o aspecto volitivo. O aspecto intelectivo é saber que é errado e o aspecto volitivo (vontade) é conseguir se controlar para não praticar aquela conduta. Faltando um destes aspectos, o sujeito será inimputável e, portanto, isento de pena.

129. Causas que Excluem a Imputabilidade – Doença Mental Em regra, todo agente é imputável, salvo se presente uma dirimente, uma causa que exclua a imputabilidade. Assim, dirimente é uma causa excludente de imputabilidade. As dirimentes hoje presentes em lei são quatro: doença mental; desenvolvimento mental incompleto; desenvolvimento mental retardado; e embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior. Doença mental é a perturbação mental ou psíquica de qualquer ordem, capaz de eliminar ou afetar a capacidade de entender o caráter criminoso do fato ou a


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capacidade de comandar a vontade de acordo com este entendimento. É necessário entender que, se a patologia decorrente do uso de entorpecentes for suficiente para retirar do sujeito a capacidade de entender ou se controlar, será possível que o juiz reconheça esta patologia como dirimente, isentando o agente de receber uma pena. Contudo, é preciso que, no momento da prática da infração, o agente não tenha o aspecto volitivo ou aspecto intelectivo.

130. Causas que Excluem a Imputabilidade – Desenvolvimento Mental Incompleto e Desenvolvimento Mental Retardado Desenvolvimento mental incompleto é o desenvolvimento mental que ainda não se concluiu. Estão aqui os menores de idade e os índios não integrados à sociedade. Este desenvolvimento ainda não se concluiu por causa da recente idade cronológica do sujeito ou em razão da falta de convivência em sociedade. Para o legislador, a presunção de que quem tem menos de dezoito anos não sabe o que faz ou não consegue se comportar de acordo com este entendimento é absoluta. Assim, basta não ter dezoito anos completos para conseguir esta dirimente. O art. 27 do Código Penal estabelece que os menores de dezoito anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial. Faz-se necessário entender que o menor de dezoito anos sofre esta tutela da criança e do adolescente por ser um adolescente em situação de risco. Quando se fala em desenvolvimento mental retardado, observam-se aquelas pessoas cuja aptidão mental é desproporcional, incompatível com sua idade cronológica. Esta pessoa, com este estágio de vida intelectual, é considerada inimputável. Aqui, a plena capacidade do sujeito jamais será atingida, pois existe um descompasso entre os anos de vida e os anos de idade mental.

131. Critérios de Aferição da Inimputabilidade Há três sistemas para medir o grau de inimputabilidade de uma pessoa. O primeiro é o critério biológico, o segundo é o critério psicológico e o terceiro é o critério biopsicológico. Para o sistema biológico, só interessa identificar se a pessoa tem ou não uma doença mental ou um desenvolvimento mental incompleto ou retardado. Já o sistema psicológico não se preocupa com uma doença mental do agente, com uma patologia, só se preocupa se no momento da ação ou omissão o agente


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tinha capacidade de entender que era errado e de se comportar de outra maneira. No sistema biopsicológico, é preciso combinar os dois sistemas e extrair ao mesmo tempo a conclusão. Assim, soma-se a presença de uma causa excludente da imputabilidade com a análise do agente, se este no momento da ação ou da omissão tinha capacidade de entender que aquilo era errado e se controlar para não praticar a conduta. Dispõe o art. 26 do Código Penal: “Art. 26. É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.” Em regra, o Brasil adotou o critério biopsicológico, porém, no caso do menor de dezoito anos, basta a idade, ou seja, nesta hipótese, o Brasil adotou o critério biológico. Duas correntes regem a questão da maioridade penal. A primeira, que trata a maioridade como cláusula pétrea, traz que não pode haver alteração nem mesmo por Emenda Constitucional. A segunda corrente diz que a maioridade penal não é cláusula pétrea por não estar no art. 5º da Constituição Federal e, portanto, uma simples Emenda Constitucional poderia diminuir a idade.

132. Requisitos do Critério Biopsicológico O primeiro critério a ser observado é o critério causal, que analisa se a pessoa é portadora de doença mental ou de desenvolvimento mental incompleto ou retardado. O segundo é o requisito cronológico, em que se analisa a atuação do agente no momento da ação ou da omissão. O terceiro requisito é denominado requisito consequencial, que é a perda total da capacidade de entender ou querer. Faz-se necessário entender que os três requisitos precisam estar presentes para que se fale em critério biopsicológico. É preciso lembrar que, por opção de política criminal, o critério que vai aferir a inimputabilidade do menor de dezoito anos é apenas o critério biológico. Em resumo, os requisitos são três: requisito causal, requisito cronológico e requisito consequencial. No caso do menor de dezoito anos, há somente o requisito causal, pois o critério biológico afere apenas a idade do sujeito.


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133. Imputabilidade – Questões Processuais A imputabilidade localiza-se na parte geral do Código Penal, porém, para que seja aplicada, é preciso que haja processo penal. A primeira questão a ser observada é a prova da inimputabilidade, devendo ser realizado exame pericial para que se analise se o sujeito é doente mental, se seu desenvolvimento mental é retardado, dentre outros aspectos. No tocante à questão da doença mental, o legislador criou um incidente para isso, denominado incidente de insanidade mental. Quanto à legitimidade, o juiz pode fazê-lo de ofício, podendo também suscitar o Ministério Público, o advogado, o defensor, o curador, os ascendentes, os descendentes, os irmãos, e até mesmo o cônjuge. A segunda informação diz respeito à resposta à acusação. Na resposta à acusação, tudo pode ser alegado, exceto a inimputabilidade. O juiz, na sentença, deve analisar se há prova da materialidade e da autoria. É preciso observar que quando for reconhecida pericialmente a inimputabilidade, o sujeito receberá absolvição imprópria (medida de segurança). Em relação à absolvição sumária no júri, esta não se aplica ao caso de inimputabilidade, salvo se esta for a única tese de defesa. O art. 319 do CPP arrola medidas cautelares processuais penais de natureza pessoal diversas da prisão. Quando o sujeito responde solto ao processo com algumas condições, está se falando em liberdade provisória com medidas cautelares e tal dispositivo traz hoje a possibilidade de internação provisória.

134. Embriaguez – Classificação das Substâncias Psicotrópicas, Fases e Conceito Embriaguez é a causa capaz de levar a exclusão da capacidade de entendimento e de vontade do agente, em virtude de uma intoxicação aguda e transitória, causada por álcool ou qualquer substância de efeitos psicotrópicos. As substâncias de efeitos psicotrópicos podem ser de natureza entorpecente, estimulante ou alucinógeno. É preciso observar a classificação das substâncias psicotrópicas: substâncias psicolépticas (tranquilizantes); psicoanalépticas (estimulantes); e psicodislépticas (alucinógenas). Faz-se necessário perceber que a embriaguez considerada dirimente é somente a embriaguez completa decorrente de uma situação inesperada, um caso for-


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tuito ou uma força maior. Quanto às fases da embriaguez, são três: excitação (estado eufórico), depressão e sono. Depois de passada a fase da euforia, ocorrem confusão mental e irritabilidade, seguida da fase do sono, em que o agente fica em estado de dormência profunda.

135. Espécies de Embriaguez – Embriaguez Voluntária ou Culposa As espécies são: embriaguez não acidental; embriaguez acidental; embriaguez patológica; e embriaguez preordenada. A embriaguez não acidental pode ser voluntária ou culposa. Na embriaguez voluntária, o agente ingere substância alcoólica ou de efeitos análogos com a intenção de embriagar-se (o dolo do sujeito é ficar embriagado). Na embriaguez culposa, o agente quer ingerir a substância, mas não tem a intenção de embriagar-se, porém, isso ocorre em decorrência de sua imprudência. Embriaguez completa é a retirada total da capacidade de entendimento e vontade do agente, pois o sujeito perde a noção do que está acontecendo. Embriaguez incompleta ocorre quando o sujeito perde parcialmente a capacidade de autodeterminação e intelecção da pessoa. Dispõe o art. 28, II, do Código Penal: “Art. 28. Não excluem a imputabilidade penal: (...) II – a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos.” Faz-se necessário entender, portanto, que a embriaguez voluntária intencional ou culposa nunca poderá servir como dirimente.

136. Teoria da Actio Libera in Causa Actio libera in causa é uma teoria desenvolvida para viabilizar a punição de uma pessoa que pratica um crime em um momento em que está embriagada. Há uma exceção para a existência de responsabilidade penal objetiva, a actio libera in causa, que significa que a ação era livre na causa e não era livre na consequência. Indaga-se se esta teoria é constitucional, havendo duas correntes acerca do assunto.


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A primeira entende ser constitucional, pois o Direito Penal não pode ficar refém da retirada voluntária de consciência do sujeito para prática de crimes, uma vez que isso deixaria expostos os bens jurídicos protegidos pela norma. A segunda corrente entende ser o dispositivo inconstitucional, pois não existe responsabilidade penal objetiva. Em resumo, não existe responsabilidade penal objetiva, salvo na actio libera in causa.

137. Embriaguez Acidental Na embriaguez acidental, a ingestão de álcool ou de substâncias psicotrópicas acontece sem que o agente queira. Exemplo: sujeito ingere uma bebida alcoólica pensando que é um suco e, assim, por caso fortuito acaba ficando em situação de embriaguez. Há, ainda, outra hipótese, em que a pessoa está tomando antibiótico e ingere bebida alcoólica, ficando em situação de descontrole. Além do caso fortuito, existe a força maior, em que há uma movimentação externa que vai contra a vontade do agente. A embriaguez acidental pode se dar por caso fortuito ou força maior. Pode, ainda, ser completa ou incompleta. É preciso observar que, sendo a embriaguez completa, o sujeito fica isento de pena. Quando a embriaguez é acidental, mas incompleta, haverá pena, mas haverá uma redução de 1/3 a 2/3 (dependendo do grau de perturbação).

138. Embriaguez Patológica e Embriaguez Preordenada As dirimentes são situações que excluem a imputabilidade, situações que tornam a pessoa inimputável. Há quatro causas excludentes da imputabilidade: doença mental; desenvolvimento mental incompleto; desenvolvimento retardado; e embriaguez acidental completa. Faz-se necessário entender que a embriaguez patológica é considerada doença mental. Trata-se do caso dos alcoólatras ou dependentes químicos (toxicômanos), ou seja, pessoas que se colocam na situação de embriaguez por sua inaptidão fisiológica de resistir a este tipo de situação. No caso da embriaguez preordenada, o agente embriaga-se já se preparando para a prática de um crime.


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Nota-se que tanto na embriaguez dolosa quanto na embriaguez preordenada, o sujeito quer ficar embriagado, mas, na voluntária, o sujeito somente quer ficar embriagado e, na preordenada, o sujeito quer se embriagar e cometer crime. É preciso observar que, no caso de embriaguez preordenada, se está na fase de preparação e sabe-se que os atos preparatórios já constituem o início do crime. O art. 61 do Código Penal traz as agravantes genéricas, que aumentam a pena-base fixada pelo juiz. Cumpre ressaltar aqui que uma das agravantes é justamente a embriaguez, ou seja, a embriaguez preordenada, além de não excluir a imputabilidade, ainda permite uma agravante genérica.

139. Emoção e Paixão Dispõe o art. 28 do Código Penal: “Art. 28. Não excluem a imputabilidade penal: I – a emoção ou a paixão; II – a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos.” É preciso que se diferencie emoção da paixão. Para o Direito Penal, a emoção é um sentimento abrupto, repentino. Já a paixão possui outro ritmo, é um sentimento lento, que se cristaliza aos poucos no âmbito de valores da pessoa humana. Ressalta-se que nem a emoção e nem a paixão excluem a imputabilidade penal. Faz-se necessário entender que o legislador positivou em alguns locais do Código Penal situações em que a pessoa tem seu sentimento de emoção e paixão respeitada. Exemplo: homicídio privilegiado. Existe na parte geral do CP uma regra que vale para todos os crimes, qual seja, a atenuante genérica. É necessário observar os requisitos do homicídio privilegiado. O primeiro requisito é que a emoção seja violenta. O segundo é o fato de o agente estar dominado pela emoção violenta. O terceiro é que a emoção tenha sido provocada por ato injusto da vítima. Por fim, a reação deve se dar de forma imediata. Outro ponto a ser ressalvado é que a paixão não funciona sequer como diminuição de pena.

140. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica A responsabilidade penal da pessoa jurídica é um tema polêmico. Inicialmente,


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é preciso relembrar dos conceitos de meio ambiente (art. 3.º, I, Lei 6.938-81). No art. 225 da CF, temos também as disposições sobre o meio ambiente. Ainda, importa observar as disposições da Lei 9.605/98, que trata dos crimes ambientais. O art. 225, § 3º da Constituição Federal existe a expressa disposição de que a pessoa jurídica pratica crime ambiental. Também, na Lei dos Crimes Ambientais, art. 3º, está contida a responsabilidade das pessoas jurídicas. Portanto, é uma realidade normativa de que pessoa jurídica pode praticar crimes ambientais. A jurisprudência atual também admite essa responsabilização. A doutrina, contudo, está dividia. Até pouco tempo, prevalecia a teoria da dupla imputação, ou seja, era necessário que uma pessoa física fosse também responsabilizada para que se pudesse punir a pessoa jurídica. Em 2013, contudo, o STF (RE 548.181) afastou essa teoria, imputando responsabilidade somente à pessoa jurídica em caso de crime ambiental. Recentemente, em 2015 confirmou este entendimento (HC 42.923).

Exercício 97. Julgue o item

A responsabilidade penal da pessoa jurídica é viável no sistema brasileiro por força da dupla imputação feita ao ente moral e à pessoa física

141. Semi-imputabilidade O parágrafo único do art. 26 do Código Penal dispõe: “Parágrafo único. A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.” Há diferenças entre o inimputável e o semi-imputável. A primeira é a consequência jurídica, pois o inimputável fica isento de pena e o semi-imputável recebe uma pena diminuída de 1/3 a 2/3. Ainda, entre as dirimentes que classificam os inimputáveis, há doença mental e para o semi-imputável fala-se em perturbação da saúde mental. O inimputável não tem a menor condição de entender o caráter ilícito do fato. Já o semi-imputável não é nem plenamente capaz de entender e nem plenamente incapaz de entender. O conceito da semi-imputabilidade é a perda de parte da capacidade de en-


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tendimento e autodeterminação, em razão de perturbação mental ou de desenvolvimento incompleto ou retardado. É preciso entender que a natureza jurídica da decisão que impõe uma pena ou uma medida de segurança ao semi-imputável é condenatória. São atingidos pela semi-imputabilidade todos os indivíduos cujas perturbações psíquicas tornam menor a capacidade de autodeterminação e autocontrole. É necessário observar os requisitos da semi-imputabilidade. O primeiro é o requisito causal, havendo a perturbação da saúde mental e o desenvolvimento mental incompleto e retardado. O requisito cronológico traz que estas situações precisam estar presentes no momento da ação ou da omissão delituosa. O requisito consequencial traz a perda de parte da capacidade de entender e querer.

Exercício 98. Considera-se dirimente: a) Embriaguez voluntária. b) Emoção. c) Embriaguez patológica. d) Embriaguez preordenada.

142. Potencial Consciência da Ilicitude O Código Penal trata da potencial consciência da ilicitude em seu art. 21. Trata-se da possibilidade de conhecer a ilicitude do fato. Salienta-se que a potencial consciência da ilicitude somente é passível de análise se o sujeito for imputável. Ademais, se trata de um exame que se desdobra em duas partes. Num primeiro momento, indaga-se se há consciência da ilicitude, se o sujeito sabia que estava fazendo coisa errada. Sendo a resposta positiva, significa que há potencial consciência da ilicitude e parte-se para o terceiro elemento da culpabilidade. Sendo a resposta negativa, o sujeito age em erro. Faz-se necessário lembrar que o erro de proibição, para a teoria brasileira, exclui a culpabilidade. É preciso observar se o réu tinha possibilidade de conhecer a ilicitude do ato.


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Exercício 99. Julgue verdadeiro ou falso:

A potencial consciência da ilicitude leva em consideração a análise do tipo penal, descartando informações pessoais do agente delitivo, por força do Direito Penal do fato, princípio basilar do Direito Penal brasileiro.

143. Potencial Consciência da Ilicitude: Efeito nos Crimes e nas Contravenções Primeiramente, sabe-se que o desconhecimento da lei é inescusável. No entanto, o art. 3º da LINDB não é absoluto, admitindo relativização e uma das hipóteses que excepciona esta regra é o erro de proibição. Faz-se necessário esclarecer que o erro de proibição possui efeitos diversos em se tratando de crimes e contravenções penais. Nos crimes, se o desconhecimento da lei for inescusável, o erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isentará de pena e, se evitável, poderá diminuir a pena de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço). Em relação às contravenções penais, dispõe o art. 8º da lei que aborda o tema que, no caso de ignorância ou de errada compreensão da lei, quando escusável, a pena poderá deixar de ser aplicada. Nota-se que aqui há hipótese de perdão judicial. Cumpre salientar que o erro do direito ou o erro de proibição pode ser alegado no âmbito da culpabilidade e isenta o réu de pena. Contudo, o erro sobre a proibição, quando poderia ser evitado, submete o réu a uma pena, mas o juiz poderá reduzi-la de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço). No âmbito das contravenções penais, quando o erro é justificado pelo caso concreto, existe uma hipótese de perdão judicial.

Exercício 100. Julgue verdadeiro ou falso:

A proibição de alegar ignorância da lei mostra-se em perfeita harmonia com o erro de proibição.

144. Causa de Exclusão da Potencial Consciência


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da Ilicitude A potencial consciência da ilicitude, portanto, só é eliminada quando o sujeito, além de não conhecer o caráter ilícito do fato, não tinha nenhuma possibilidade de fazê-lo. Sendo assim, não é uma análise concreta do potencial conhecimento da ilicitude, mas sim uma análise potencial. O erro de proibição sempre exclui a atual consciência da ilicitude. No entanto, somente aquele que não podia ter sido evitado eliminará a potencial consciência. Se a potencial é a possibilidade de conhecer o caráter injusto do fato e se o erro de proibição inevitável é aquele que o agente não tinha como evitar, somente essa modalidade de erro leva à exclusão da culpabilidade. Para melhor compreensão, vejamos os seguintes exemplos: – estrangeiro e maconha: usar drogas não é crime, mas portar drogas para uso pessoal é crime. Se um estrangeiro, oriundo de um país que permite o uso de maconha, vier para o Brasil e portar certa quantidade de maconha para uso próprio pode ser preso em flagrante. No momento da audiência, o juiz fará perguntas ao estrangeiro, para analisar se ele sabia ou não que no Brasil portar maconha era crime. Caso não saiba, aplicar-se-á a causa de exclusão da potencial consciência da ilicitude, mas se souber, não será aplicada a excludente; – silvícolas com sacrifício humano: uma tribo de índios brasileira mata crianças que nascem com deficiência física. Sob o ponto de vista jurídico penal, há crime. Mas, na análise do caso concreto, observa-se que, culturalmente, para os índicos, essa prática é correta e estes não conhecem a lei penal. Sendo assim, não respondem pelo crime, pois são amparados pela exclusão da potencial consciência da ilicitude.

Exercício 101. A diversidade cultural pode ser alegada como motivo para a ausência de potencial consciência da ilicitude.

145. Erro de Proibição – Noções Gerais e Diferenças com o Erro de Tipo O erro de proibição é a errada compreensão de uma determinada regra legal. Esse erro pode levar o agente a supor que certa conduta injusta seja justa, a


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tomar uma errada por certa, a encarar uma anormal como normal, e assim por diante. Nesse caso, surge o que a doutrina convencionou chamar de erro de proibição. Há muita confusão entre o erro de tipo e o erro de proibição. No erro de tipo, o agente tem uma visão distorcida da realidade, não vislumbrando na situação que se lhe apresenta a existência de fatos descritos no tipo como elementares ou circunstâncias. É o caso do sujeito que pensa que a carteira de outrem lhe pertence, ante a semelhança entre as ambas, desconhecendo estar subtraindo coisa alheia. É o do caçador que acerta as costas de um homem gordo, imaginando tratar-se de um tronco, ou o do ladrão que subtrai uma corrente dourada, supondo-a de ouro. Em todos esses casos. o equívoco incidiu sobre a realidade e não sobre a interpretação que o agente fazia da norma, impedindo o autor de saber que estava cometendo um crime. No erro de proibição, ao contrário, há uma perfeita noção acerca de tudo o que se está passando. O sujeito conhece toda a situação fática, sem que haja distorção da realidade. Ele sabe que a carteira pertence a outrem, que está atirando contra as costas de um homem, que certo objeto é de ouro e assim por diante. Seu equívoco incide sobre o que lhe é permitido fazer diante daquela situação, ou seja, se é lícito retirar a carteira pertencente a outra pessoa, atirar nas costas de um homem. Há, por conseguinte, uma perfeita compreensão da situação de fato e uma errada apreciação sobre a injustiça do que faz. Nesse aspecto, reside sua principal distinção com o erro de tipo. O erro de proibição exclui a consciência da ilicitude, pois impede o agente de saber que faz algo injusto, enquanto o erro de tipo impede-o de saber que realiza um fato típico. O erro de tipo exclui o dolo e, quando inescusável, a culpa.

Exercício 102. Pegar um carro de outra pessoa pensando ser o seu veículo é erro de tipo. Ignorar que pegar o carro de outra pessoa é proibido é erro de proibição.

146. Erro de Proibição Direto O erro sobre a ilicitude do fato está disposto no art. 21 do Código Penal: “Art. 21. O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço. Parágrafo único. Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite


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sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência.” O cartão de visitas do art. 21 é a compatibilidade normativa dele próprio com a lei de introdução às normas do direito brasileiro, ou seja, o desconhecimento da lei é inescusável, não pode ser alegado como tese de defesa. O erro que prevê o art. 21 é sobre a ilicitude do fato e não sobre o que prevê a lei. É importante destacar que não existe erro de proibição em perspectiva, pois o erro de proibição precisa de uma análise da circunstância do fato que já aconteceu, para que possa ser utilizado como tese de defesa. As espécies de erro de proibição são: – inevitável ou escusável: o agente não tinha como conhecer a ilicitude do fato, em face das circunstâncias do caso concreto. Se o agente não tinha como saber que o fato era ilícito, inexistia a potencial consciência da ilicitude, logo, esse erro exclui a culpabilidade. O agente fica isento de pena; – evitável ou inescusável: embora o agente desconhecesse que o fato era ilícito, tinha condições de saber, dentro das circunstâncias, que contrariava o ordenamento jurídico. Se o agente tinha possibilidade, isto é, potencial para conhecer a ilicitude do fato, possuía a potencial consciência da ilicitude. Logo, a culpabilidade não será excluída. O agente não ficará isento de pena, mas, em face da inconsciência atual da ilicitude, terá direito a uma redução de pena de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço).

Exercício 103. O erro de proibição só é aplicável a estrangeiros, fato esse compatível com o erro sobre a conduta praticada ser proibida pelo ordenamento jurídico.

147. Erro de Proibição Indireto Descriminante putativa por erro de proibição ou erro de proibição indireto é a causa de exclusão da ilicitude imaginada pelo agente, em razão de uma equivocada consideração dos limites autorizadores da justificadora. Não se confunde com a descriminante putativa por erro de tipo, uma vez que nesta há uma equivocada apreciação da realidade (por exemplo, o sujeito pensa que a vítima vai sacar uma arma, quando, em verdade, tira um lenço). Na descriminante putativa por erro de proibição, há uma perfeita noção da


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realidade, mas o agente avalia equivocadamente os limites da norma autorizadora. Por exemplo, uma pessoa é agredida com um tapa no rosto. Acredita nesse caso ser permitido matar seu agressor em legítima defesa da honra. Sabe que a agressão cessou, mas supõe que, por ter sido humilhado, pode atirar por trás, matando o sujeito. O erro está em imaginar a existência de uma causa de exclusão de ilicitude, que, na realidade, não existe. Esse erro acontece quanto aos limites da norma excludente. A consequência da descriminante putativa por erro de proibição é a mesma do erro de proibição. O agente responderá pelo resultado com pena reduzida, se o erro for evitável, ou ficará isento de pena, se inevitável. Não devem ser confundidas as consequências do erro de tipo com as do erro de proibição.

Exercício 104. O erro quanto às elementares típicas do crime de furto simples não acarreta em erro de proibição indireto.

148. Descriminantes Putativas Na descriminante putativa por erro de proibição, o agente tem perfeita noção de tudo o que está ocorrendo. Não há qualquer engano acerca da realidade. Não há erro sobre a situação de fato. O agente supõe que está diante da causa que exclui o crime, porque avalia equivocadamente a norma, ou seja, o agente pensa que esta permite, quando, em verdade, ela proíbe. O agente imagina que está agindo de forma correta, quando, na realidade, está errada, supondo que o injusto é justo. O efeito minorante do erro de direito é o desconhecimento da lei que, embora não exclua a culpabilidade, é circunstância atenuante genérica (art. 65, II, do CP). Outras descriminantes putativas são a ignorância e a errada compreensão da lei. A ignorância é o completo desconhecimento da existência da regra legal, ao passo que a errada compreensão consiste no conhecimento equivocado acerca de tal regra. Na primeira, o agente nem sequer cogita de sua existência e, na segunda, o agente possui tal conhecimento, mas interpreta o dispositivo de forma distorcida. O erro é, portanto, o conhecimento parcial, falso, equivocado, enquanto a ignorância é o desconhecimento total.


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Exercício 105. A descriminante putativa por erro de proibição tem como fundamento fático a análise, por parte do agente, da justiça ou injustiça da situação justificante.

149. Erro Mandamental O erro mandamental ocorre nos crimes omissivos. O erro do agente recai sobre uma norma impositiva, que manda fazer, que está implícita nos tipos omissivos. Por exemplo, se alguém deixa de prestar socorro porque acredita, por erro, que esta assistência lhe trará risco pessoal (em verdade, o risco não existe). Neste caso, o agente comete erro de tipo. Porém, se este mesmo agente, consciente da ausência de risco pessoal, da situação de perigo e da necessidade de prestar socorro não o faz, porque acredita que não está obrigado a fazê-lo pela ausência de qualquer vínculo com a vítima, incide em erro de proibição mandamental. O erro mandamental também pode estar presente nos crimes comissivos por omissão, ou seja, se alguém se engana sobre a existência de perigo e sobre a identidade da pessoa que tem responsabilidade de proteger, esse erro é de tipo. Se a pessoa erra sobre a existência do dever de agir, conhecendo o perigo, sabendo que a pessoa é a aquela que está obrigada a proteger, mas acha que não precisa, porque há risco pessoal, incide em erro de proibição mandamental. Para melhor compreensão, vejamos o seguinte exemplo: a pessoa está de plantão. Chega o horário de saída e ela acredita que isso a isenta de responsabilidade e se omite sobre um fato que venha a acontecer. A pessoa errou sobre os limites do dever, errou sobre a norma mandamental.

Exercício 106. O erro mandamental acontece quando há uma falta compreensão da proibição e isso acarreta a omissão do agente que deveria agir.

150. Exigibilidade de Conduta Diversa – Noções Gerais e Art. 128, II, do CP A culpabilidade é requisito para a punibilidade do agente. Todos os atos praticados são valorados pelas pessoas. A culpabilidade trata-se da reprovação social que incide sobre o fato praticado pelo agente e é composta por imputabilidade,


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potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa. Quando não se puder exigir conduta diversa do agente em determinada situação, o Código Penal prevê, em seu art. 22, hipóteses que levam à exclusão da exigibilidade de conduta diversa: – coação moral irresistível; e – obediência hierárquica A obediência hierárquica exclui a culpabilidade do agente que por ordem de superior hierárquico da administração pública, pratica ato que não seja manifestamente ilegal. Em ambos os casos, de coação irresistível ou obediência hierárquica, somente será punível o autor da coação ou da ordem que gerou o ato. Também pode haver outras causas de exclusão da exigibilidade de conduta diversa, são as chamadas causas supralegais de exclusão da exigibilidade da conduta diversa. Uma dessas causas supralegais é a coação. Coação é o emprego da força física ou de grave ameaça para que alguém faça ou deixe de fazer alguma coisa. A coação pode ser física (com emprego de força física, movimentação corpórea) ou moral (com emprego de grave ameaça).

Exercício 107. A exigibilidade de conduta diversa, por eliminar a reprovação que a sociedade faz daquele ato praticado, isenta o réu de pena.

151. Vis Absoluta x Vis Relativa Coação é a grave ameaça ou violência física contra uma pessoa. Com a coação física irresistível (vis absoluta), ou seja, o emprego de violência física, inexiste a conduta, isto é, não há sequer a ação, porque não é voluntária e consciente. Por exemplo: pessoa mais forte que força fisicamente alguém a atirar. A conduta é uma ação livre e consciente em busca de um resultado e, por isso, é excluído o fato típico. A coação moral (vis relativa) consiste no emprego de grave ameaça no sujeito ou em terceiros. Dito de outra maneira, é a promessa de mal grave e injusto para si ou para terceiros, mantendo a vítima psiquicamente vinculada ao coator. No caso da coação moral, é excluída a culpabilidade, pois não se pode exigir


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conduta diversa de quem atua na situação. Se a situação for resistível, haverá o crime e o agente será culpável, porém, haverá em seu favor o reconhecimento de uma atenuante genérica (art. 65 do Código Penal).

Exercício 108. A coação física exclui a culpabilidade, mas a coação moral exclui apenas a tipicidade do fato.

152. Coação Moral Irresistível Coação moral irresistível: há crime, pois, mesmo sendo grave a ameaça, ainda subsiste um resquício de vontade que mantém o fato como típico. No entanto, o agente não será considerado culpado. Quando o assaltante, apontando uma arma de fogo, diz para a vítima “a bolsa ou a vida”, não está excluindo-lhe totalmente a vontade, embora a tenha pressionado de modo a inviabilizar qualquer resistência. Assim, na coação moral irresistível, há fato típico e ilícito, mas o agente não é considerado culpado, em face da exclusão da exigibilidade de conduta diversa. A coação física exclui a tipicidade porque não há voluntariedade. Na coação moral, existe voluntariedade. Exemplo: o sujeito que vai para o banco ao invés de ir à polícia. Essa voluntariedade mesmo contaminada permite a caracterização da conduta juridicamente relevante. O nosso Código Penal, com a reforma de 1984, traz o conceito de crime bipartido. Crime é um fato típico e ilícito. Culpabilidade é pressuposto de aplicação de pena. Para a teoria que rege o Código Penal, o crime é fato típico e ilícito. Excluída a culpabilidade, fica isento de pena, mas tem crime. Exemplo: art. 23 do CP: não é crime se tem legítima defesa. Não existe reprovação moral sobre a conduta praticada pela pessoa sob coação moral irresistível. No exemplo da bolsa, a entrega poderia não acontecer, por isso, a situação tem voluntariedade.


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O ato voluntário não implica necessariamente que a vontade seja livre, pois, quando um assaltante deixa a vítima com a angustiante opção de entregar-lhe o dinheiro ou perder a vida, ao preferir continuar viva, ela realiza um ato voluntário, porém, não livre, já que certamente gostaria de também permanecer com sua carteira. Essa voluntariedade, mesmo viciada, não permite a exclusão da conduta humana. Só a coação física (vis absoluta), que consiste no emprego de força física, exclui a conduta pela absoluta falta de vontade. Nesse caso, o coacto não pratica crime e o fato será atípico. A coação moral irresistível (vis compulsiva) não exclui a conduta, uma vez que ainda resta um resíduo de vontade. A vontade é viciada, mas não eliminada. Por essa razão, na vis compulsiva, o coacto pratica um fato criminoso, embora não responda por ele, ante a ausência de culpabilidade. Outro nome da coação moral irresistível é vis compulsiva. Não há uma resposta penal de que não há culpabilidade, ele não recebe a pena, porém, é crime, em razão de o Código Penal ser orientado pela teoria bipartida.

Exercício 109. Gerente de banco que tem a família sequestrada, vai até a agência e saca o dinheiro para levar aos criminosos, comete crime.

153. Coação Moral Irresistível Putativa Coação moral irresistível putativa: a pessoa que sofre a coação moral, por erro, achava estar sofrendo coação, mas, em verdade, não estava. Exemplo: a filha liga para o pai e diz que foi sequestrada, pede que o pai vá até o banco, pegue o dinheiro já que é gerente e traga até o local para liberar a família. O pai está sob coação moral irresistível e quando chega em casa, com o dinheiro, a filha diz que passou um trote. Não tinha coação, mas ele achou que tivesse. Está no campo da putatividade. É preciso de um mínimo de veracidade. “TJDF – Apelação Criminal: ACrim nº 20010110134709 – O pressuposto básico para a existência da excludente da coação irresistível putativa é a existência de erro por parte do agente que imagina ou supõe a ocorrência de situação fática insuperável que o submeta a um receio invencível de que algum mal maior possa lhe ser feito, ocorrendo assim uma verdadeira supressão de sua vontade, levando-o a fazer ou a não fazer algo que na situação de normalidade estaria sob


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seu crivo de responsabilidade, a alegação feita pelo réu, de causa de exclusão de culpabilidade, deve encontrar esteio em provas e lhe transfere o ônus respectivo.” Simples alegação não ajudará a conseguir a exclusão. Se, diante do contexto probatório, inexiste prova de coação moral irresistível, mesmo na forma putativa, não há que se considerar ocorrente a excludente.

Exercício 110. A putatividade, na coação moral irresistível, tem a mesma consequência penal da coação moral irresistível não putativa.

154. Teoria do Crime – A Coação Moral Resistível Não se pode nivelar de forma homogênea todas as pessoas que estão sujeitas a sofrer uma coação moral resistível, pois cada um pode reagir de uma maneira. A primeira informação que podemos identificar é de que há crime, pois a vontade restou intangida, e o agente é culpável, uma vez que, sendo resistível a ameaça, era exigível conduta diversa. Entretanto, a coação moral resistível atua como uma circunstância atenuante genérica (CP, art. 65, III, “c”, 1ª parte). Para dosar a pena, o juiz utilizará o critério trifásico de dosimetria da pena. A 1ª fase determinará a pena-base (art. 59 do CP), analisando as circunstâncias da infração, conduta, personalidade, antecedentes do agente, bem como o comportamento da vítima. Na 2ª fase da dosimetria de pena, serão avaliadas as atenuantes. O reconhecimento pelo juiz da coação moral resistível não permite a redução da pena para baixo do mínimo legal. A 3ª e última fase traz a análise das causas de aumento e/ou diminuição da pena. Estas causas encontram-se espalhadas pelo Código Penal. Será conciliada a pena-base com o aumento ou diminuição das circunstâncias para a sua finalização. Somente nesta fase será possível a redução da pena para baixo do mínimo legal.

Exercício 111. A lei separa as hipóteses e as consequências da coação moral resistível e da coação moral irresistível, não cabendo ao magistrado qualquer valoração subjetiva da situação concreta.


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155. Obediência Hierárquica A culpabilidade é formada pelos seguintes elementos: imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa. A lei traz dois nortes para a configuração da exigibilidade de conduta diversa: coação moral irresistível e obediência hierárquica. Obediência hierárquica é a obediência à ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico, tornando viciada a vontade do subordinado e afastando a exigência de conduta diversa. Natureza jurídica: causa excludente da culpabilidade (ou dirimente). As dirimentes excluem a aplicação da pena. É necessário estarmos diante de uma ordem relacionada ao serviço público (função pública), o que significa que não podemos falar em obediência hierárquica nas relações familiares ou iniciativa privada. A ordem não pode ser manifestamente ilegal. Nesse sentido, a ilegalidade do comando deve estar oculta na própria mensagem, que possui uma aparência externa de legalidade. O inferior hierárquico deve agir estritamente dentro dos limites da ordem recebida de seu superior hierárquico. Requisitos: – um superior; – um subordinado; – relação de direito público (relação laboral de direito privado não serve para o Código Penal admitir a situação como obediência hierárquica); – ordem do superior hierárquico que seja ilegal (se a ordem for legal, excluirá a ilicitude, por estrito cumprimento do dever legal), mas aparentemente legal.

Exercício 112. A causa ilegal de exclusão da culpabilidade por obediência hierárquica pode ser defendida quando o diretor de uma autarquia dá ordem não manifestamente ilegal para seu funcionário.

156. Ordem Legal e Ordem Ilegal


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Ordem do superior hierárquico é a manifestação de vontade do titular de uma função pública a um funcionário que lhe é subordinado. Existem casos em que há vinculação funcional, mas subordinação em virtude da situação. É a hipótese do policial militar encarregado de manter a ordem na sala de audiências, devendo seguir as determinações administrativas que o magistrado lhe der, enquanto estiver na função. Embora sem vínculo administrativo funcional, existe subordinação hierárquica para fins penais. Ainda que não exista relação direta de natureza administrativa e funcional, a obediência hierárquica pode estar configurada, conforme visto no exemplo acima. É exemplo de situação em que existe subordinação hierárquica para fins penais: o juiz manda o policial algemar um advogado que o desacatou. O subordinado estará cumprindo uma ordem ilegal, ignorando a imunidade profissional do advogado, mas, diante de seus conhecimentos jurídicos reduzidos, a ordem tem aparência de legalidade. As ordens podem ser legais ou ilegais. Se a ordem for legal, e o subordinado cumpri-la, estará no estrito cumprimento do dever legal. Não pratica crime, uma vez que está acobertado por causa de exclusão da ilicitude. Se a ordem for manifestamente ilegal, o subordinado responderá pelo crime praticado, pois não tinha como desconhecer a sua ilegalidade. Poderá ser beneficiado com circunstância atenuante prevista no art. 65, III, “c”: a hipótese é de concurso de pessoas entre o superior hierárquico e o subordinado. Se a ordem for aparentemente legal, ou seja, o subordinado não tinha como perceber a sua ilegalidade, haverá a exclusão da exigibilidade de conduta diversa, e ele ficará isento de pena. O superior hierárquico deverá responder pelo crime cometido em virtude de sua ordem. Trata-se de hipótese de autoria mediata, pois o autor da ordem sabe que esta é ilegal, mas se aproveita do desconhecimento de seu subordinado.

Exercício 113. (Cespe – 2011 – STM – Analista Judiciário) As causas legais de exclusão da culpabilidade por inexigibilidade de uma conduta diversa incluem a estrita obediência à ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico. Caso o agente cumpra ordem ilegal ou extrapole os limites que lhe foram determinados, a conduta é culpável.

157. Estado de Necessidade


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Existem algumas situações que, mesmo não expressamente previstas em lei, excluem a culpabilidade, isentando o réu de pena. É o caso de estado de necessidade exculpante. O estado de necessidade, a depender da qualidade do bem sacrificado e do bem protegido, pode excluir a culpabilidade, mas não a ilicitude. Quando o bem sacrificado for de valor igual ou maior que o bem preservado na situação de perigo, o estado de necessidade continuará existindo, mas como circunstância de exclusão da culpabilidade, como modalidade supralegal de exigibilidade de conduta diversa. É o chamado estado de necessidade exculpante. Observe, no entanto, que só teremos uma causa de excludente da ilicitude quando o bem salvo for de valor maior que o bem jurídico sacrificado. A teoria diferenciadora da culpabilidade foi adotada pelo Código Penal Militar, mas desprezada pelo Código Penal comum. Entretanto, pode ser aplicada valendo-se do caminho da inexigibilidade de conduta diversa. No Código Penal de 1969 – que nunca entrou em vigor –, esta teoria era prevista e tida como causa excludente da culpabilidade. O legislador não fez a inclusão expressa na reforma de 1984. Optou por deixar como inexigibilidade de conduta diversa expressa na lei apenas a coação moral irresistível e a obediência hierárquica. É, portanto, causa supralegal de inexigibilidade de conduta diversa.

Exercício 114. (Cespe – 2013) Na teoria penal, o estado de necessidade se diferencia do estado de necessidade supralegal. No primeiro, o bem sacrificado é de menor valor que o do bem salvaguardado e, no segundo, o bem sacrificado ser de valor igual ou superior ao do bem salvaguardado. Na segunda hipótese, não estaria excluída a ilicitude da conduta, mas a culpabilidade.

158. Excesso Causal ou Acidental Veremos nesta unidade mais uma hipótese de inexigibilidade de conduta diversa: é o excesso causal ou excesso acidental. O agente, ao praticar a conduta com causa excludente da ilicitude, não pratica crime, mas responderá pelo excesso. Contudo, não é punível o excesso quando resulta de escusável medo, surpresa ou perturbação de ânimo em face de situação de perigo para o bem jurídico.


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A reação está no excesso, mas, por conta da alteração psicológica que o caso concreto gerou, o agente pode ficar isento de pena. O excesso exculpante, considerado pela doutrina e jurisprudência como causa supralegal de exclusão da culpabilidade, é o estado de confusão mental, em virtude do qual se alteram a percepção e o discernimento transformando o excesso punível em justificável. Excesso exculpante seria o comportamento desnecessário e desproporcional decorrente de medo, surpresa ou perturbação de ânimo fundamentados na inexigibilidade de conduta diversa. Cabe ao juiz, no caso concreto, todas as circunstâncias presentes no momento da agressão ou do perigo para avaliar se naquela situação específica não era razoável exigir da vítima conduta diversa, incluindo o excesso. “O agente, ao se defender de um ataque inesperado e violento, apavora-se e dispara seu revólver mais vezes do que seria necessário para repelir o ataque, matando o agressor. Pode constituir-se uma hipótese de flagrante imprudência, embora justificada pela situação especial por que passava.” (NUCCI, 2006, p. 215)

Exercício 115. A situação concreta, se justificar o excesso do agente no momento de sua defesa, poderá excluir a culpabilidade.

159. Inexigibilidade de Conduta Diversa em Sentido Estrito A inexigibilidade de conduta diversa é causa de excludente da culpabilidade não prevista em lei. São situações em que não era exigível do agente conduta que não aquela praticada, que, em tese, constituiria crime, e que não está contemplada na coação moral irresistível nem na obediência hierárquica. Trata-se de uma cláusula aberta, dada ao juiz para que, no caso concreto, analise a possibilidade de não reprovar socialmente o agente. O direito deve regular a conduta da sociedade, entretanto, a sociedade, a dinâmica e as leis são estáveis, sendo impossível aos legisladores acompanhar e prever todas as situações possíveis. Surgem então as causas supralegais como forma de permitir a aplicação da


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justiça ao caso concreto, não previsto em lei. Aplica-se a inexigibilidade de conduta diversa aos casos em que o agente pratica fato típico e ilícito, porém, em razão das circunstâncias não previstas em lei, o fato deixa de ser reprovado socialmente, o que exclui a culpabilidade do crime. Sabendo que o legislador não pode prever todos os casos em que a inexigibilidade de outra conduta deve excluir a culpabilidade, a jurisprudência admite a existência de um fato, não previsto em lei, como causa de exclusão da culpabilidade, desde que apresente todos os requisitos da não exigibilidade de comportamento lícito, devendo o juiz analisar o caso concreto. A análise é feita pelo juiz e, no caso concreto, levando-se em conta as peculiaridades tanto do fato quanto do agente que comete o ilícito. Vejamos algumas peculiaridades acerca do tema: – crimes culposos: sim, se na situação praticada pelo agente não era exigível que o agente agisse de outra forma; – causas de aumento de pena: sim, da mesma maneira, se na situação praticada pelo agente não era exigível que o agente agisse de outra forma.

Exercício 116. (FCC – MPE – CE – 2009) Ainda que não encontre tipificação em excludente prevista em lei, a doutrina tem aceito a inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de exclusão da: a) Antijuridicidade. b) Culpabilidade. c) Tipicidade. d) Ilicitude. e) Punibilidade.


Capítulo 4

Concurso de Pessoas

1. Conceito e Requisitos As teorias referentes ao concurso de pessoas são muito diversificadas e divergem entre os países. Poderão surgir questões a respeito da teoria pluralística e sobre a teoria do domínio do fato, no que consiste a teoria objetivo-formal e apesar de essas teorias não existirem na legislação brasileira, é importante conhecer o seu conteúdo. No concurso de pessoas, o autor e o partícipe recebem a mesma reprimenda, pois todos concorrem para a realização do delito. Diferente do que ocorre com o partícipe de menor importância, o qual receberá pena menor que a do autor. Consiste no concurso de pessoas o alcance da realização de condutas para um resultado, significa praticar qualquer ato com relevância causal que acarrete a consumação do delito ou a tentativa, não necessariamente os verbos previstos no tipo penal.

Exercício 1.

(MPE/GO – 2012 – Promotor de Justiça) Com relação ao concurso de pessoas, analise os seguintes itens:

I – Coautoria sucessiva é aquela que se daria quando, consumada a infração, ingressaria o coautor, por adesão à conduta criminosa, antes do exaurimento;

II – Nos crimes de mão própria (falso testemunho, v. g.) em regra não se se pode falar em coautoria porque o verbo núcleo do tipo exige atuação pessoal do agente;

III – A coautoria exige que todos os coautores tenham o mesmo comportamento;


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IV – Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, inclusive quando elementares do crime;

V – Por força do art. 30 do Código Penal, o particular pode ser coautor nos crimes próprios (que exigem uma qualidade especial do agente – peculato, v. g.), desde que tenha ciência dessa elementar.

Está correto apenas o que se afirma em: a) I, II e V. b) I, II e III. c) II, III e IV. d) II, III e V.

2. Das Teorias sobre Concurso de Pessoas Para que haja o concurso de pessoas, há quatro requisitos e, na ausência de qualquer um deles, não irá se configurar o concurso de pessoas: – pluralidade de agentes, ou seja, duas ou mais pessoas. Neste primeiro requisito, surge a figura do concurso multitudinário que vem a ser um aglomerado grande de pessoas direcionadas à prática de um delito. Exemplo: grande quantidade de pessoas, 100, 200 pessoas direcionadas à prática de esbulho possessório, invasão de terras; – todos os agentes pratiquem atos de relevância causal para o acontecimento do delito; – unidade de desígnios: é o elemento subjetivo do agente e está atrelado à prática da infração. A vontade dos agentes está unida para a prática da infração penal, imprescindível para o concurso de pessoas; sem esse elemento, não existirá o concurso de pessoas; – unidade de crime: várias pessoas unidas praticando um mesmo crime.

Exercício 2.

(Cespe – Polícia Federal – 2012) Julgue o item a seguir com base no direito penal:

No que diz respeito ao concurso de pessoas, o sistema penal brasileiro adota a teoria monista, ou igualitária, mas de forma temperada, pois estabelece graus de participação do agente de acordo com a sua culpabilidade, inclusive em relação à autoria colateral ou acessória, configurada quando duas ou mais pessoas produzem um evento típico de modo independente uma das outras.


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3. Exceções à Teoria Monista Até o momento, já se sabe que, em regra, a teoria monista é a adotada pelo Brasil e que esta define que todas as pessoas que praticam uma conduta com relevância causal respondem pelo mesmo crime, incidindo nas penas a ele cominadas. Por sua vez, o agente que praticou conduta de relevância causal para o crime, porém, conduta esta não descrita no tipo penal, será considerado partícipe, incidindo a norma de extensão do art. 29 do Código Penal. Apesar de a teoria monista ser a regra no direito brasileiro, há exceções e a primeira delas é a teoria pluralista, segundo a qual sobre um só fato haverá pessoas respondendo por crimes diferentes, ou seja, um fato com mais de um delito. Exemplo no delito de aborto, são duas condutas muito semelhantes originárias do mesmo fato: a mulher interrompe a gestação de forma voluntária, entretanto, é outra pessoa quem faz o aborto com o consentimento da gestante, mesmo crime (aborto), mas a mãe responde por um crime (art. 124 do Código Penal) e o terceiro responde por outro crime (art. 126 do Código Penal).

Exercício 3.

(Cespe – TJPI – 2012 – Juiz) Em relação ao concurso de pessoas, assinale a opção correta: a) Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não se admite, em crime culposo, a possibilidade de concurso de pessoas, que se caracteriza como o vínculo psicológico na cooperação consciente de alguém na conduta culposa de outrem. b) A lei brasileira não admite a participação por omissão e a participação em crime omissivo, uma vez que, para se distinguir o coautor do partícipe, a conduta principal e a acessória devem ocorrer de forma ativa, o que é incompatível com uma inação. c) É desnecessária a descrição pormenorizada da conduta de cada um dos envolvidos em crimes de autoria coletiva, bem como do vínculo entre os réus e dos delitos a eles imputados, cabendo à instrução processual o detalhamento da participação de cada um dos agentes na empreitada delituosa. d) De acordo com a teoria restritiva, autor distingue-se de partícipe e, consoante o critério objetivo-subjetivo, não importa a prática do núcleo do tipo de delito, considerando-se autor aquele que detém o controle final do fato, o que domina toda a realização delituosa.


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e) Consoante a teoria da acessoriedade limitada, adotada do Código Penal, o partícipe somente responderá pelo crime se o fato principal for típico, ilícito e culpável, incidindo ainda sobre o partícipe todas as agravantes e atenuantes de caráter pessoal relativas ao autor principal.

4. Autoria Autor é aquele que realiza o núcleo do tipo penal, é o agente que pratica o verbo previsto no crime. Existe uma subdivisão teórica sobre o conceito de autor: a teoria extensiva e a teoria restritiva. A teoria restritiva é a adotada pelo Direito Penal brasileiro e esta se subdivide em: teoria objetivo-formal, teoria objetivo-material e teoria do domínio do fato. A teoria extensiva amplia o seu alcance para estender o conceito de autor para mais situações. Já a teoria restritiva restringe o conceito de autor. Segundo esta teoria, autor será apenas aquele que pratica o verbo do tipo penal, ou aquele que pratica a ação mais importante ou aquele que domina a situação fática. Na ótica da teoria objetivo-material, quem pratica as ações mais graves, mais relevantes é o autor e quem pratica as ações menos relevantes é partícipe. Entretanto, a lei não definiu o que é conduta mais grave e menos grave, quem é autor e quem é partícipe, deslocando para o Judiciário a tarefa de rotular o autor ou partícipe. Este critério, em razão de sua subjetividade, é frágil e causa insegurança jurídica, por isso, esta teoria não é adotada. Por último, na visão da teoria do domínio do fato, teoria mais moderna que vem sendo utilizada no Brasil, o mandante será considerado o autor do crime, por ter o domínio do fato.

Exercício 4.

(FCC – TCE-AP – 2012 – Analista de Controle Externo) A respeito do concurso de pessoas é correto afirmar: a) Para fins de aplicação da pena no concurso de pessoas é irrelevante que a participação tenha sido de menor importância. b) Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena do crime mais grave. c) É possível a participação em crime comissivo puro. d) As condições e circunstâncias pessoais comunicam-se entre os coautores e partícipes quando não forem elementares do crime.


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e) Pode ocorrer participação culposa em crime doloso ou participação dolosa em crime culposo.

5. Participação O conceito de participação doutrinariamente é dividido em quatro teorias: acessoriedade mínima; acessoriedade limitada; acessoriedade extrema; e hiperacessoriedade. Das teorias apresentadas, é a acessoriedade limitada a vigente no Direito Penal brasileiro. Conceito analítico de delito: fato típico, ilícito e culpável. Participação dolosamente distinta é a participação em que um dos agentes quer praticar uma conduta menos grave, enquanto o outro pratica um crime mais grave por sua conta e risco, sem haver a identidade de desígnios entre eles. A participação é dolosamente distinta, cada um responderá na medida da culpabilidade de sua conduta. Nesta hipótese, não há concurso de agentes porque falta o elemento subjetivo da unidade de desígnios, portanto, cada um responderá na medida de sua culpabilidade. Na participação de menor importância, o partícipe tem relevância causal, sua conduta contribuiu para o resultado criminoso, mas sua colaboração foi de menor importância. Nesta situação, o juiz está autorizado a reduzir a pena desse partícipe de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço) da pena fixada para o autor. Na teoria monista, todos respondem pelo mesmo crime, mas o partícipe recebe uma pena reduzida.

Exercício 5.

(FCC – TCE/SP – 2011 – Procurador) Em matéria de concurso de pessoa, é correto afirmar que: a) Coautores são aqueles que, atuando de forma idêntica executam o comportamento que a lei define como crime. b) Partícipe é aquele que, também praticando a conduta que a lei define como crime, contribui, de qualquer modo, para a sua realização. c) É possível a coautoria nos crimes de mão própria. d) É admissível a coautoria nos crimes próprios, desde que o terceiro conheça a especial condição do autor. e) É inadmissível a participação nos crimes omissivos próprios.


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6. Concurso de Pessoas e Crime Culposo É perfeitamente possível a coautoria em crime culposo; por outro lado, não é possível a participação em crime culposo. A coautoria no crime culposo é discutida por duas correntes doutrinárias. A corrente minoritária afirma não caber coautoria em crime culposo; já a corrente majoritária admite a possibilidade de coautoria em crime culposo. A admissibilidade de coautoria em crime culposo é baseada nos requisitos constitutivos do concurso de pessoas que são a pluralidade de agentes, a relevância causal da conduta, a unidade de desígnios e a infração. A participação no crime culposo é inadmissível do ponto de vista lógico pelo seguinte: o sujeito colabora para a prática do crime sem praticar o verbo do tipo penal, ele é partícipe, como seria possível o partícipe contribuir para um crime em que não há dolo? Um crime de natureza culposa, um crime que surge sem querer. Do ponto de vista técnico, não se admite a possibilidade de participação no crime culposo porque o crime culposo, por ser um tipo penal aberto, admite qualquer conduta, o sujeito então passa a ser autor e não partícipe.

Exercício 6.

(Copeve – Prefeitura Penedo/AL – 2010 – Procurador Municipal) Augusto, menor de 18 anos, e Bolívar, inimigos de Carlos, emboscaram este último em um matagal nas proximidades da cidade de Penedo, por volta da meia noite. Augusto e Bolívar atiraram várias vezes e em consequência do tiro deflagrado por Augusto, Carlos veio a falecer. Augusto e Bolívar não se conheciam, por coincidência dispararam suas armas no mesmo momento, sem, no entanto, estarem ajustados. No caso, é correto afirmar: a) Não é possível o concurso de pessoas em razão da participação de um inimputável. Na hipótese, Augusto sujeita-se às regras do Estatuto da Criança e do Adolescente e Bolívar deve responder pelo delito de homicídio. b) Houve na espécie concurso de pessoas. A participação de um inimputável não desfigura o instituto. Augusto e Bolívar respondem por homicídio. c) A hipótese, pela participação de um inimputável, configura caso de autoria incerta e os autores do crime devem responder apenas por tentativa de homicídio.


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d) A ausência do liame subjetivo faz desaparecer a figura do concurso de pessoas, revelando a chamada autoria colateral. Augusto deve responder pelo ato infracional de homicídio, enquanto Bolívar responde por tentativa. e) A hipótese configura caso de autoria mediata. Somente Bolívar, por ser imputável, deve responder pelo crime existente.

7. Concurso de Pessoas: Outros Conceitos Outros conceitos dentro do tema concurso de pessoas: Primeira situação: “A” e “B” disparam suas armas contra “C”. “A” e “B” possuem ajuste prévio, ou seja, “A” unido com “B” praticam o disparo contra “C” por haver unidade de desígnios, pluralidade de pessoas, relevância causal da conduta e um único crime, caracteriza o concurso de pessoas. Sempre que preencher os quatro requisitos, estará diante do concurso de pessoas. Na primeira situação, “A” e “B” são autores, ambos praticaram a conduta descrita no tipo, ambos praticaram conduta igualmente relevante. Pela teoria objetivo-formal, ambos são coautores. Segunda situação: “A” dispara em “C” e “B” fica de vigia na região do crime para assegurar a prática da conduta de “A”. Nesta situação, há o concurso de pessoas. “A” é autor e “B” é partícipe porque ele, apesar de não ter praticado a conduta descrita no tipo penal, colaborou para a prática delituosa. Conforme já se sabe, o concurso de pessoas engloba a autoria e a participação. Ainda, segundo a teoria monista, quem, de qualquer modo, contribui para a prática do crime, incide nas penas a ele cominadas (art. 29 do Código Penal). A terceira situação traz: “A” e “B” disparam contra “C”. “A” não conhece “B” e não houve acordo prévio, não há unidade de desígnios entre eles. Nesta hipótese, falta um dos quatro requisitos e, na ausência de qualquer um deles, não se configura o concurso de pessoas. Quando os agentes não se conhecem, mas o crime acontece ao mesmo tempo, estamos diante da autoria colateral. Ainda, nesta situação, o perito não identifica o autor do disparo fatal contra “C”. Neste caso, ocorre a autoria incerta e ambos responderão por tentativa de homicídio. Quarta situação exemplificativa: “A” e “B” não se conhecem, mas ambos querem matar “C”. “A” começa efetuando disparo contra a perna de “C”. Após iniciada a execução, “B” surge e adere ao desígnio de “A”, e também efetua disparo contra a perna de “C”. A doutrina denomina este tipo de concurso de pessoas de: coautoria sucessiva, o concurso de pessoas existe, mas é de forma diferida, após o início da execução é que surge o concurso de pessoas. Por esse


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conceito, a unidade de desígnios pode surgir depois, ou seja, o ajuste prévio nem sempre é o único elemento que justifica a unidade de desígnios. A última espécie de autoria é a mediata: ocorre quando alguém utiliza um inimputável para praticar o crime. Exemplo: “A” é maior de 18 anos e “B” é menor de 18 anos. “A” dá ordem para “B” efetuar os disparos e matar “C”, esta seria uma hipótese de autoria mediata, quando o mandante não executa, mas direciona um inimputável para efetuar a execução do crime.

Exercício 7.

(Instituto Cidades – DPE/AM – 2011 – Defensor Público) Sobre o concurso de pessoas, marque a alternativa correta: a) Para a teoria pluralista ou da autonomia da participação, cada qual realiza uma ação, havendo um vínculo psicológico próprio, sendo que cada partícipe é considerado de forma autônoma como autor. b) Para a teoria monística ou unitária (igualitária), cada partícipe é considerado de forma autônoma e única, havendo distinção entre autor e partícipe. c) A teoria pluralística é adotada pelo Código Penal Brasileiro, a partir da reforma ocorrida em 1984. d) Para a teoria dualística, cada partícipe é tratado de igual forma, não havendo distinção entre participação primária e a participação secundária. e) Nenhuma das anteriores.

8. Concurso de Pessoas: Questões Polêmicas Primeiramente, é preciso que seja observada a habitualidade em relação ao crime de associação, por exemplo. Existindo habitualidade na reunião, é possível haver o crime de associação criminosa. A associação eventual de pessoas que nem mesmo se conhecem para praticar delito de forma esporádica será concurso de agentes. Para que haja organização criminosa, é preciso que haja quatro ou mais agentes; já para que haja associação criminosa, o número é de três ou mais agentes. Faz-se necessário observar que não mais existem os termos quadrilha ou bando, o que existe hoje é associação criminosa. Quanto à contribuição dos coautores no fato criminoso, indaga-se se precisa ser materialmente a mesma e a resposta é negativa. Exemplo: em um crime de roubo em que um agente emprega a violência e outro subtrai o patrimônio da vítima.


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Ainda, todos os agentes respondem pela qualificadora ou pela agravante se esta for de natureza objetiva. Se for de natureza subjetiva, somente a pessoa que possui a característica responderá. Outro questionamento é se cabe coautoria em crime omissivo próprio ou puro e a resposta é positiva. A pessoa que pratica o crime é aquela que pratica o verbo previsto no tipo. Há também os partícipes, que não praticam o verbo descrito no tipo, mas respondem. Assim, a responsabilidade do partícipe se dá pela norma de extensão do art. 29 do Código Penal.

Exercício 8.

Pela teoria do domínio do fato, podemos afirmar: a) Quem controla a ação é coautor. b) Quem controla a ação é partícipe. c) Quem controla a ação não pratica crime. d) Nenhuma das anteriores.


Capítulo 5

Teoria Geral da Pena

1. Teoria Geral da Pena – Aspectos Introdutórios Primeiramente, é necessário que seja apresentado um histórico sobre o binômio ação/punição, sendo estudada a evolução das penas, dos castigos. Ao se falar em violência humana, é possível dissociar estas palavras, percebendo-se que a violência, em todos os sentidos, é algo inerente ao ser humano. Hoje, aparentemente, as pessoas não usam a violência como estratégia de resolução de conflitos, porém, algumas ainda usam-na como método de resolução de conflitos de interesses. No Brasil, há penas catalogadas na Constituição Federal, bem como penas previstas no Código Penal. Neste sentido, o sujeito pode perder sua liberdade, pode perder seus direitos por algum momento, ou pode perder seu patrimônio. Ressalta-se que no país há uma exceção em que é possível matar alguém (pena de morte), prevista no ordenamento jurídico. A exceção se dá em caso de guerra externa declarada. Conclui-se que a violência sempre existiu, faz parte da natureza humana, tem diferentes níveis de intensidade e os níveis mais intensos de violência foram selecionados pelo legislador para tipificar condutas e estipular penas.

2. Limites Constitucionais das Penas A Constituição Federal trabalha de forma objetiva, estabelecendo aquilo que pode e o que não pode ser considerado pena. As regras sobre as penas estão no art. 5º da Constituição da República e é preciso lembrar que tudo o que está neste artigo é cláusula pétrea (não podendo ser suprimida nem mesmo por emenda constitucional).


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Observa-se que os limites constitucionais podem ser apresentados em forma de princípios. O Princípio da Reserva Legal está previsto no art. 5º, XXXIX, da Constituição Federal, e art. 1º do Código Penal, estabelecendo que não há crime e nem pena sem lei anterior que o defina. Cumpre salientar que este princípio vem acompanhado do Princípio da Anterioridade. O segundo princípio é o Princípio da Intranscendência ou Princípio da Personalidade, que estabelece que se o sujeito praticar uma infração penal, somente este pode ser punido. Assim, a pena não passará da pessoa do condenado. O Princípio da Inevitabilidade traz que se estiverem presentes prova da materialidade e indícios de autoria, o Estado tem obrigação de perseguir e punir o sujeito. O Princípio da Intervenção Mínima dispõe que o Estado somente irá agir em último caso. Ainda, é necessário entender que as penas devem ser proporcionais ao atingimento do bem jurídico. Por fim, o Princípio da Individualização da Pena deve ser analisado no momento legislativo, no momento judicial e no momento executivo.

3. Das Penas no Âmbito Constitucional O art. 5º, XLII, da Constituição Federal, dispõe que a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei. O inciso XLIII estabelece que a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem. O inciso XLIV dispõe que constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. O inciso XLV traz o Princípio da Intranscendência: nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido. O inciso XLVI do mesmo artigo traz a individualização da pena: “XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:


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a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos;” (...) O inciso seguinte estabelece que não haverá penas de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; de caráter perpétuo; de trabalhos forçados; de banimento; e cruéis.

4. Finalidades da Pena Suponhamos que haja três grupos diferentes: criminologia, política criminal e direito penal. O direito penal é uma ciência deôntica, pois analisa como as coisas deveriam ser. A criminologia é uma ciência empírica, já que analisa dados de como as coisas são. A política criminal, por sua vez, traça estratégias para que seja diminuída a criminalidade. Há algumas teorias que tratam das finalidades das penas: teoria retributiva ou absoluta; teoria preventiva ou relativa; teoria mista, que é a adotada pelo Código Penal brasileiro. A teoria absoluta não se importa com a eficácia do sistema de punição, estabelecendo que quem faz algo errado deve receber um castigo. Já a teoria preventiva pode ser de prevenção geral ou de prevenção especial. Quando se fala em geral, refere-se a todos e quando se fala em especial, fala-se apenas no condenado. A teoria mista é uma fusão da retributiva e da preventiva. O art. 59 do CP é claro no sentido de afirmar: “Art. 59. O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime.”

5. Função Social da Pena Conforme estudado anteriormente, a pena tem a função retributiva, bem como a função preventiva. Discute-se, ainda, se a pena teria uma função social.


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É possível observar que, se a Lei de Execução Penal fosse cumprida à risca, seria possível se falar em função social da pena. Outro ponto a ser tratado é o abolicionismo penal. Trata-se de uma teoria desenvolvida por autores da Holanda, Noruega e Argentina no sentido de desacreditar o Direito Penal como uma opção funcional para diminuir a criminalidade. Assim, estes doutrinadores entendem que o Direito Penal deveria ser abolido do ordenamento jurídico. Estes autores defendem que o Direito Penal não funciona e, portanto, serve apenas para desgastar a sociedade. A maioria da doutrina entende que o abolicionismo penal é uma utopia, um sonho distante. A teoria das janelas quebradas é um estudo feito na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. A pesquisa demonstrou que, se um prédio estiver com suas janelas intactas, será preservado pelas pessoas da sociedade, porém, se uma janela for quebrada e não for consertada, este prédio passará a ser alvo de vândalos. Neste sentido, o abandono de um edifício acaba estimulando a prática de crimes e isso serve para o abandono social, que também causa a prática de crimes. Outra observação a ser feita é sobre a justiça restaurativa, uma tendência de política criminal em que se privilegia a conciliação das partes em detrimento da aplicação de uma pena de prisão. O art. 1º do Código Penal dispõe que não há pena sem prévia cominação legal. Já o art. 2º determina que ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Seu parágrafo único estabelece que a lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplicar-se-á aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.

6. Das Penas no Âmbito do Código Penal O art. 32 do Código Penal estabelece que as penas são: privativas de liberdade; restritivas de direitos; e de multa. É possível identificar que o Código Penal é de 1940, mas a parte geral data de 1984. Assim, as penas são positivadas trabalhando também com penas alternativas, que não retiram do condenado sua liberdade. É preciso observar que não há categorias de criminosos em nosso ordenamento jurídico.


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Sobre a pena privativa de liberdade, há duas observações que devem ser feitas. Primeiramente, é necessário lembrar que não há prisão perpétua no Brasil. Ainda, penas privativas de liberdade são cumpridas em presídios que, por sua vez, são de natureza pública. Neste sentido, a pena privativa de liberdade é cumprida em órgão público, gerido pelo Administrador Público. Faz-se necessário ressaltar que não há previsão legal acerca da privatização dos presídios brasileiros e, no atual contexto, existiria o risco de presos, condenados das organizações criminosas de grande capital, comprarem ações de uma empresa de capital aberto, tornarem-se sócios majoritários de uma empresa que administra um presídio. A pena de multa consiste no pagamento de um valor em reais para o Fundo Penitenciário.

7. Regime de Cumprimento de Pena O art. 33 do Código Penal é um dos artigos mais utilizados por advogados, promotores e juízes para que se trabalhe o momento de fixação da pena. Isso porque é neste artigo que se descobre a questão do regime de cumprimento de pena. Primeiramente, é preciso que se diferencie a reclusão da detenção. Contudo, observa-se que na prática não há um presídio só de detenção ou só de reclusão. Dispõe o art. 33 do Código Penal: “Art. 33. A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de detenção, em regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado.” Considera-se regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média. Considera-se regime semiaberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar. Por fim, considera-se regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado. O § 2º do art. 33 do CP estabelece que as penas serão cumpridas de forma progressiva, ou seja, não é possível “pular” do regime fechado para o regime aberto, por exemplo. Todavia, cumpre observar que existe regressão por salto. Assim, um sujeito que esteja cumprindo a pena em regime aberto, por exemplo, e pratica um novo crime, é regredido diretamente ao regime fechado. Finalmente, é preciso entender que o juiz, quando condena o sujeito, deve escolher o regime inicial de cumprimento de pena.


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8. Regime Inicial de Cumprimento de Pena Após a condenação do sujeito, o juiz analisará a materialidade e autoria do crime. Depois desta comprovação, o Direito permite ao magistrado condenar o réu a uma pena previamente estipulada pelo legislador na Lei Penal. Neste momento, o juiz irá dosar a pena, passando pelas três fases. A partir do momento em que já existe uma pena definitiva, é possível escolher o regime inicial de cumprimento de pena. Se o sujeito for reincidente ou se foi condenado por crime hediondo ou equiparado, necessariamente iniciará o cumprimento de sua pena em regime fechado. O § 2º do art. 33 do Código Penal traz os outros critérios: “§ 2º As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado; b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto; c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.” A primeira observação a ser feita é que o regime que o sujeito recebe em sua sentença pode ser alterado. Ainda, o regime integralmente fechado já não existe mais desde fevereiro de 2006. Para determinar o regime inicial de cumprimento de pena, o juiz irá analisar também os critérios do art. 59 do Código Penal. Nota-se que tal dispositivo não serve somente para individualizar a pena, mas também para individualizar o regime inicial de cumprimento de pena. O § 4º dispõe que o condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais.

9. Regras dos Regimes de Cumprimento de Pena Primeiramente, cumpre observar que o regime fechado é cumprido com rigor penitenciário.


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O art. 34 do Código Penal traz a seguinte informação: “Art. 34. O condenado será submetido, no início do cumprimento da pena, a exame criminológico de classificação para individualização da execução.” Exemplo: o sujeito da facção criminosa A não pode cumprir pena em um presídio dominado pela facção criminosa rival, pois será morto. Individualizada sua execução, o condenado fica sujeito a trabalho no período diurno e a isolamento durante o repouso noturno. Ainda, o trabalho será em comum dentro do estabelecimento, na conformidade das aptidões ou ocupações anteriores do condenado, desde que compatíveis com a execução da pena. O § 3º do art. 34 estabelece que o trabalho externo é admissível, no regime fechado, em serviços ou obras públicas. Quanto ao regime semiaberto, o art. 35 dispõe que aplica-se a norma do art. 34 deste Código, caput, ao condenado que inicie o cumprimento da pena em regime semiaberto. O § 1º traz que o condenado ficará sujeito a trabalho em comum durante o período diurno, em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar. Já o § 2º estabelece que o trabalho externo é admissível, bem como a frequência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior. O art. 36 traz as regras referentes ao regime aberto: “Art. 36. O regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado.” O § 1º dispõe que o condenado deverá, fora do estabelecimento e sem vigilância, trabalhar, frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga. O § 2º traz que o condenado será transferido do regime aberto, se praticar fato definido como crime doloso, se frustrar os fins da execução ou se, podendo, não pagar a multa cumulativamente aplicada. É preciso observar que, hoje, não tendo sido paga pena de multa, esta será dívida fiscal, não sendo o sujeito preso.

10. Regime Especial A Constituição Federal logo em seu art. 5º dispõe acerca da igualdade de gêneros. O inciso L, do art. 5º, da Constituição, traz os seguintes dizeres: “às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação;” (...)


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Há um local no estabelecimento prisional feminino em que a presa vai para amamentar seu filho(a) e, em seguida, a presa e a criança são separados. Quanto à presa que está cumprindo pena, há duas situações possíveis: situação em que a mulher já estava grávida quando praticou o crime e foi presa ou situação em que ocorreu visita íntima no interior do estabelecimento prisional. O Código Penal, em seu art. 37, traz uma regra de maior amplitude: “Art. 37. As mulheres cumprem pena em estabelecimento próprio, observando-se os deveres e direitos inerentes à sua condição pessoal, bem como, no que couber, o disposto neste Capítulo.” Assim, não é possível que em um mesmo prédio haja celas com homens e celas com mulheres. Outra questão a ser observada diz respeito aos homossexuais e transexuais condenados criminalmente. Irá nortear o deslocamento deste condenado criminalmente para um presídio masculino ou feminino, ou seja, o gênero que estiver presente em sua documentação civil.

11. Direitos do Preso, Trabalho do Preso e Superveniência de Doença Mental Os arts. 38, 39, 40 e 41 do Código Penal devem ser estudados em conjunto com a Lei de Execução Penal. O art. 38 trata dos direitos do preso, trazendo a seguinte redação: “Art. 38. O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral.” Ressalta-se que o preso condenado de forma definitiva tem seu sufrágio universal mitigado, não podendo votar e nem ser votado. Ainda, é possível que efeitos da condenação repercutam em sua natureza profissional, mas não se deve confundir efeitos da condenação com pena. O art. 39 do Código Penal trata do trabalho do preso: “Art. 39. O trabalho do preso será sempre remunerado, sendo-lhe garantidos os benefícios da Previdência Social.” O art. 40 dispõe que a legislação especial regulará a matéria prevista nos arts. 38 e 39 deste Código, bem como especificará os deveres e direitos do preso, os critérios para revogação e transferência dos regimes e estabelecerá as infrações disciplinares e correspondentes sanções.


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Por fim, o art. 41 do Código Penal trata da superveniência de doença mental: “Art. 41. O condenado a quem sobrevém doença mental deve ser recolhido a hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, a outro estabelecimento adequado.”

12. Detração Penal A detração penal é o desconto do tempo de prisão processual na pena definitiva. A prisão pode ser uma prisão processual e, depois de sentença condenatória irrecorrível, a prisão-pena. Neste sentido: a detração penal = prisão – pena – prisão cautelar. Antes da alteração legislativa, a detração penal era reconhecida pelo juiz da execução. Entretanto, em 2012, a Lei nº 12.736 trouxe que não cabe mais ao juiz da execução reconhecer a detração; quem reconhece hoje é o próprio juiz da vara comum. Desta forma, o próprio juiz, no momento de sentenciar, já está autorizado a fazer a conta da detração, descobrir a nova pena e, com isso, modificar o regime inicial de cumprimento de pena.

Exercício 1.

Não haverá penas de morte, salvo em caso de guerra declarada; de caráter perpétuo; de trabalhos forçados; de banimento.

13. Penas Restritivas de Direito Ao juiz é facultado impor ao condenado sanções diversas desde que cumpridos alguns requisitos relacionados com a pessoa do delinquente e com o ilícito por ele praticado. A pena é considerada como prevenção geral negativa, ou seja, serve como exemplo para os demais não incorrerem no mesmo erro. Além disso, ao próprio indivíduo que perpetrou o ilícito, a pena serve de prevenção especial negativa. Ainda, sobre os aspectos da pena, o castigo equivaleria à função pedagógica da pena, bem como a ressocialização do preso. Restou demonstrado que, em decorrência da precariedade da estrutura penitenciária no Brasil, a prisão não cumpria a finalidade pretendida e, sem as condições básicas de higiene e segurança, os indivíduos expostos ao crime organizado, apresentavam altos índices de reincidência.


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São alguns exemplos de penas substitutivas de liberdade: a entrega de cestas básicas em creches, a manutenção de escolas ou até mesmo o pagamento de indenização à vítima. Nesse sentido, haveria a sanção, mas sem a carcerização, o art. 43, do CP, estabelece, ainda, as penas restritivas de direitos com a perda de bens e valores, a interdição temporária de direitos e a limitação do fim de semana. Tais penas foram estabelecidas em respeito ao princípio da legalidade. O inciso III, do art. 43, do CP, por sua vez, foi vetado, ou seja, houve a não aceitação pelo Poder Executivo daquilo que foi aprovado pelo Legislativo. O referido veto ocorreu para a previsão do recolhimento domiciliar, por não conter, na essência, o mínimo necessário de força punitiva, configurando-se totalmente desprovido da capacidade de prevenção nova prática delituosa.

Exercício 2.

Acerca das penas alternativas, assinale a opção correta: a) A relação de penas alternativas deve ser interpretada de maneira ampliativa pelo juiz. b) A prestação pecuniária e a multa são institutos equivalentes, pois, nas duas, o montante adquirido pelo Estado é dirigido em favor de pessoas, como à vítima e a seus dependentes ou entidades particulares com destinação social. c) A prestação pecuniária se confunde com o valor indenizatório deduzido no juízo cível, pois os dois institutos têm caráter reparatório, sendo considerados indenização ou compensação pelos danos ocorridos com o delito. d) São propósitos das penas alternativas a diminuição da superlotação dos presídios com a manutenção da eficácia preventiva e geral e especial da pena, a redução dos custos do sistema penitenciário, o favorecimento de ressocialização do autor do fato e a redução da reincidência.

14. Requisitos Objetivos das Penas Restritivas de Direitos Os requisitos de aplicação de substituição da pena dividem-se em requisitos de natureza objetiva e de natureza subjetiva e estão previstos no art. 44 do Código Penal.


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Tais requisitos, devidamente observados, permitem que o juiz substitua uma pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direitos. As penas restritivas de direitos possuem caráter autônomo e substituem as privativas de liberdade, nas hipóteses de aplicação da pena privativa de liberdade não superior a quatro anos, além disso, é preciso que o crime cometido não seja mediante violência ou grave ameaça. No crime de roubo, por exemplo, nunca haveria essa possibilidade, visto que a elementar típica neste crime é a violência ou grave ameaça. Insta consignar que, em relação aos requisitos objetivos, não haverá valoração do sujeito, como antecedente, conduta social ou personalidade, trata-se de uma análise fria do rol. Quem faz a análise da possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade para restritiva de direitos é o magistrado, podendo ser o juiz substituto, desembargador, ministro do STJ ou STF.

Exercício 3.

No plano dos requisitos objetivos, as penas privativas de liberdade não superiores a 4 anos podem ser substituídas por penas restritivas de direitos se o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo.

15. Requisitos Subjetivos das Penas Restritivas de Direitos Quanto aos requisitos subjetivos para aplicação das penas restritivas de direitos, o magistrado levará em consideração algumas características relativas ao agente delitivo. É preciso destacar que a análise valorativa sobre os requisitos subjetivos, além dos requisitos objetivos, é de competência do juiz. Ao verificar o magistrado que a prática delituosa esbarra em motivo de alta reprobabilidade social (requisito subjetivo), não será concedida a conversão da pena, mantendo a pena restritiva de liberdade. O juiz possui permissão legal para negar a conversão da pena, ao verificar que não estão presentes todos os requisitos necessários. Nesse caso, caberá recurso da decisão.


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O art. 59, do CP, traz ao magistrado o cuidado de analisar os requisitos subjetivos do art. 44, III, no mesmo sentido, visto que estabelece a observância de aspectos pessoais do agente, ou seja, se a pena-base foi fixada no mínimo legal, essas circunstâncias (art. 59) não poderão impedir a conversão em restritiva. Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime. Na hipótese supracitada, houve a preocupação do legislador com a chamada reincidência em crimes culposos, autorizando a conversão da pena privativa em restritiva, desde que essa medida se mostre socialmente útil, conforme previsão do art. 44, § 3º, do CP.

Exercício 4.

Se o condenado for reincidente específico em razão da prática do mesmo crime, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face da condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável.

16. Penas Restritivas de Direito – Conversão Conversão consiste na substituição das penas privativas de liberdade em restritivas de direitos. Entretanto, é possível (mas não obrigatória) que a conversão seja anulada e reconvertida a pena em privativa de liberdade, deduzido o período já cumprido, nas seguintes hipóteses: se sobrevier condenação à pena privativa de liberdade durante o cumprimento da pena alternativa; se a nova condenação tornar impossível o cumprimento da pena alternativa; se o condenado não for encontrado para ser intimado do início do cumprimento da pena; se houver o descumprimento injustificado da restrição imposta; se o condenado praticar falta grave. Quando ocorrer a conversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade, deverá ser respeitado o saldo mínimo final de trinta dias de detenção ou reclusão; por exemplo, caso o condenado tenha sua pena convertida a menos de trinta dias do término de seu cumprimento, ainda assim deverá cumprir os trinta dias legalmente determinados. No caso de nova condenação, a competência para a conversão da restritiva de direitos em privativa de liberdade é do juiz da execução penal. Para as hipóteses de condenação inferior ou igual a um ano, a substituição da pena privativa de liberdade pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direito. E, quanto às condenações superiores a um ano, a substituição se dará por


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uma pena restritiva de direito e multa ou duas restritivas de direitos.

Exercício 5.

A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorre o descumprimento injustificado na restrição imposta e, no cálculo da pena privativa de liberdade a executar, será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de sessenta dias da detenção ou reclusão.

17. Prestação Pecuniária – Conversão em Crimes Hediondos Em 2006, o STF, ao julgar o Habeas Corpus nº 82959-7, declarou a inconstitucionalidade do regime integral fechado. Portanto, é possível converter a pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, no âmbito dos crimes hediondos e equiparados. Contudo, a aplicação desta regra é pequena, já que, em regra, os crimes hediondos e equiparados são praticados com violência ou grave ameaça, o que impossibilita a aplicação da conversão da pena. Os crimes hediondos estão relacionados na Lei nº 8.072/1990 e, entre eles, o estupro e o tráfico de drogas. O STJ já admitiu a conversão para pena restritiva de direitos em caso de estupro, pois o crime seria de violência presumida e não real. Em que pese a proibição do art. 44 da Lei nº 11.343/2006, no crime de tráfico de drogas, a conversão é possível (já que praticado sem violência ou grave ameaça), haja vista o STF ter declarado tal proibição ser inconstitucional, com fundamento no princípio da individualização da pena.

Exercício 6.

A hediondez dos crimes selecionados pelo legislador na Lei nº 8.072/1990 impede a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos.

18. Prestação Pecuniária


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Prestação pecuniária não é sinônimo de multa. A multa é uma pena própria e a prestação pecuniária é uma pena restritiva de direitos, que consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou à entidade pública ou privada com destinação social. A importância a ser paga será definida livremente pelo juiz (não inferior a um salário mínimo nem superior a 360 salários mínimos), levando em conta os fatores de capacidade econômica do condenado, a extensão do prejuízo e os limites fixados em lei. A grande diferença da prestação pecuniária e da pena de multa é a destinação do dinheiro. Na primeira, o valor pago se destina à vítima e, na segunda, ao Estado. O valor pago a título de prestação pecuniária será descontado do prejuízo total apurado em eventual condenação por reparação civil, caso os beneficiários sejam os mesmos. A prestação pode ser, ainda, inominada, quando, havendo concordância do beneficiário, possua outra natureza. Como exemplo da prestação inominada, observa-se a entrega de cestas básicas a entidades públicas ou privadas. Ressalta-se que, em caso de crime com vítima determinada, é imprescindível o consenso do beneficiário.

Exercício 7.

A prestação pecuniária e a multa são institutos equivalentes, pois, nas duas, o montante adquirido pelo Estado é dirigido em favor de pessoas, como à vítima e a seus dependentes ou a entidades particulares com destinação social.

19. Perdas de Bens e Valores Trata-se da decretação judicial da perda de bens móveis, imóveis ou valores representados em ações e títulos de crédito. Importante salientar que essa perda não pode alcançar bens de terceiros, mas apenas os bens do condenado, já que a pena não pode passar de sua pessoa (Princípio da Intranscendência – art. 5º, LVI, da CF). Mister não confundir Perda de Bens e Valores que é pena restritiva de direitos com o Confisco que é efeito penal da condenação. O Estado tem que provar a origem ilícita do bem para poder confiscá-lo. A pena de Perda de Bens e Valores consiste na apreensão do patrimônio licito ou ilícito do condenado, imposto como pena substitutiva da privativa da liberda-


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de, em que permite a constrição dos bens do infrator sem o ônus de demonstrar sua origem ilícita (art. 91, II, “a” e “b”, do CP). Enquanto a Perda de Bens e Valores é pena principal, o Confisco configura mero efeito secundário extrapenal da condenação. Se o juiz condena o réu pela prática de um crime, só que não estão presentes os requisitos para converter a pena de prisão em restritiva de direito, essa prisão por si só não retira os bens do acusado. Para decretar a perda de bens e valores, é preciso permitir a conversão da prisão em restritiva de direitos e escolher essa pena de perdas de bens e valores para que somente, após a escolha, possa decretar a Perda de Bens do Condenado. Os valores decorrentes da pena dar-se-ão em favor do Fundo Penitenciário Nacional (conjunto de valores de bens que tem a sua receita destinada ao funcionamento do sistema penitenciário).

Exercício 8.

Perda de Bens e Valores é a transferência ao Fundo Penitenciário Nacional de bens e valores lícitos do condenado, como forma de puni-lo, evitando-se o cárcere, tendo por limite o prejuízo gerado pelo crime ou o lucro auferido.

20. Prestação de Serviços à Comunidade Consiste na atribuição de tarefas ao condenado junto a Entidades Assistenciais, Hospitais, Orfanatos e outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais, ou em benefício de entidades públicas. A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas é aplicável às condenações superiores a seis meses de detenção ou reclusão. Sempre que houver uma prisão superior a seis meses e for revertida em pena restritiva de direito, o Juiz deverá escolher, dentre estas penas, a prestação de serviços à comunidade. As tarefas não serão remuneradas, uma vez que se trata do cumprimento da pena principal (LEP, art. 30). Na pena privativa de liberdade, o trabalho serve para ajudar o condenado em sua ressocialização e para custear sua manutenção na prisão, enquanto que, na prestação de serviços à comunidade, a própria pena é o desempenho de atividades com finalidade social, por isso, não há remuneração. A natureza jurídica da prestação é pena autônoma que substitui pena privativa de liberdade sempre que for superior a seis meses. As tarefas que serão determinadas ao réu precisam manter correlação com as aptidões dele. A carga horária de trabalho consiste em uma hora de trabalho por


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dia de condenação, sendo fixada de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho do condenado. Cabe ao Juiz da Vara da Execução designar qual entidade credenciada junto a qual o condenado deverá trabalhar. A entidade que receber a prestação de serviços do condenado fará mensalmente um relatório especificando o trabalho dele. Esse controle mensal é necessário; caso haja descumprimento injustificado da prestação de serviços, ele perderá esse benefício da pena alternativa e voltará a cumprir pena privativa de liberdade pelo saldo restante. Se a pena substituída for superior a um ano, será facultado ao condenado cumprir a pena substitutiva em tempo inferior ao da pena privativa substituída, nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada.

Exercício 9.

A Constituição da República veda expressamente, em seu inciso, XLVII, “c”, a pena de trabalhos forçados. Essa regra constitucional impede a aplicação da pena de prestação de serviços à comunidade.

21. Interdição Temporária de Direitos A interdição temporária de direitos, uma das espécies de pena restritiva de direito, nos dá, de plano, a noção de que a interdição é feita por prazo determinado. Veremos, nesta unidade, quais são os diereitos que podem ser temporariamente interditados. I - proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo: só pode ser aplicada ao crime cometido no exercício do cargo ou função, com violação de deveres a estes inerente. Importante não confundir esta pena com a cautelar do art. 319. II - proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público: só pode ser aplicada aos crimes cometidos no exercício da profissão ou atividade, e se houver violação de deveres a estas relativos. Também são requisitos, aqui, o vínculo com o desempenho da atividade e a pertinência temática. III - suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo: a interdição temporária de direitos deste inciso não alcança a proibição de obter permissão ou habilitação para dirigir veículo, limitando-se à suspensão da licença já concedida. Portanto, esta pena só pode ser aplicada a quem já tiver habilitação válida. Observe, ainda, que no CTB esta pena não é substitutiva, podendo ser cumulada com a pena privativa de liberdade. IV - proibição de freqüentar determinados lugares: os lugares proibidos devem


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ter pertinência temática com o crime cometido. V - proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos: esta pena será aplicada quando da prática do crime do art. 311-A do Código PEnal (fraude em certames de interesse público).

Exercício 10. Analise a seguinte afirmativa:

Pessoa proibida de fazer a inscrição em concurso público omite esta informação, faz a prova e entra na lista de aprovados. Ela tem direito público subjetivo à nomeação por força do interesse p~ublico do certame e da função pública a ser exercida.

22. Limitação de Fim de Semana A pena de limitação de fim de semana consiste na obrigação do condenado de permanecer aos sábados e domingos, por 5 horas diárias, em Casa do Albergado (LEP, art. 93) ou em outro estabelecimento adequado. A Casa do Albergado é um estabelecimento sem rigor penitenciário. Trata-se de local que trabalha com pessoas presas em regime aberto. Serão ministradas palestras e cursos durante este tempo. Mas é importante lembrar que esta pena não se confunde com a pena privativa de liberdade cumprida em regime aberto. Este estabelecimento encaminhará, mensalmente, ao juiz da execução o relatório sobre o aproveitamento do condenado. Descumprida a pena, não comparecendo nos locais especificados ou permanecendo por tempo inferior ao feterminado, esta será convertida em pena privativa de liberdade. O caráter reeducativo desta pena reside, como vimos, no oferecimento de cursos e palestras, bem como no envolvimento do apenado em atividades educativas, sem os quais não se pode afirmar que esta pena pretende alguma ressocialização ou algum reajuste na condduta do condenado.

Exercício 11. Analise a afirmativa a seguir:

A limitação de fim de semana pode ser cumprida em colônia industrial ou agrícola.


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23. Estudo da Multa A pena de multa consiste no recolhimento de um valor para o fundo penitenciário de um Estado, que é uma entidade que recebe essas receitas para ajudar nas despesas penitenciárias. Importante lembrar, inicialmente, que as penas podem ser privativa de liberdade, restritiva de direito ou multa. Nos crimes, não há pena de multa aplicada de forma isolada. O Código Penal adotou o critério do dia-multa. O cálculo é feito por 3 etapas: a) encontrar o número de dias-multa: o lei fiza um liminte mínimo de 10 e máximo de 360 dias-multa. Na sentença, o juiz deverá fixar o valor, levando em contra a capacidade econômica de cada condenado b) encontrar o valor de cada dia-multa: o valor de cada dia-multa é fixado com base no maior salário mínimo vigente ao tempo da infração penal, variando entre o limite mínimo de 1/30 até 5 salários mínimos. O juiz fixará este valor levando em conta a capacidade econômica do réu, podendo aumentar o valor até o triplo se entendê-lo insuficiente e ineficaz em face da situação financeira do acusado: c) multiplicar o número de dias-multa pelo valor de cada um deles: O não pagamento da multa não gera prisão, mas terá como consequÊncia uma execução fiscal. É o que determina o art. 51 do Código Penal: “Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição.” A multa, portanto, será executada pela Procuradoria da Fazenda, e não pelo Ministério Público.

Exercício 12. Analise a seguinte frase:

O não pagamento da pena de multa acarreta a imediata prisão do condenado, para assegurar a vigência da norma penal.

24. Concurso de Crimes


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No concurso de crimes, há ocorrência de dois ou mais delitos por meio da prática de duas ou mais ações. Já, no concurso de pessoas, há pluralidade de agentes e uma unidade fática. Quanto ao concurso aparente de normas, trata-se de uma explicação doutrinária em relação a uma possível confusão decorrente de uma provável aplicação de mais de uma lei para o mesmo caso, o que não pode ocorrer. Havendo uma conduta e duas ou mais infrações, estar-se-á diante do concurso formal e, havendo duas ou mais condutas e duas ou mais infrações penais, estar-se-á diante do concurso material. Exemplo de concurso formal: sujeito arremessa uma pedra na vidraça de uma casa e acaba acertando também a cabeça do morador. Exemplo de concurso material: o atirador entra no cinema e, com uma metralhadora, escolhe vítimas aleatoriamente e mata uma por uma. No caso de concurso material, somam-se as penas, nos termos do art. 69 do CP. Já, no concurso formal, existe o sistema de exasperação e não de acumulação. A exasperação da pena significa que se escolhe a pena do crime mais grave, somada de uma fração. A terceira espécie de concurso se crimes é o crime continuado, previsto no art. 71 do Código Penal.

Exercício 13. Sobre o concurso de crimes, assinale a alternativa CORRETA: a) Há concurso formal quando o agente, com mais de uma ação, pratica dois ou mais crimes; já o concurso material ocorre quando há unidade de ação e pluralidade de infrações penais. b) No concurso de crimes, é desprezada a pena de multa do delito menos grave, devendo ser paga apenas a multa relacionada ao delito mais grave. c) Não poderá a pena fixada em concurso formal exceder a que seria cabível em caso de concurso material. d) No crime continuado, são irrelevantes as condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes.

25. Concurso Material e Concurso Formal O concurso material é a prática de duas ou mais condutas, sendo obtidos dois ou mais resultados.


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É preciso entender que os resultados podem ser idênticos ou diversos. Se os resultados forem idênticos, estar-se-á diante de um concurso material homogêneo e, se forem diversos, estar-se-á diante de um concurso material heterogêneo. Indaga-se se é possível a somatória de uma pena restritiva de direitos com uma pena privativa de liberdade. A resposta é negativa, sendo a somatória possível no caso em que o juiz concedeu à pena privativa de liberdade uma suspensão condicional da pena. O art. 70 trabalha com o concurso formal ou ideal: “Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior.”

Exercício 14. Tício foi condenado por dois crimes de furto, em concurso material. A pena de cada um dos crimes foi de dois anos de reclusão, totalizando quatro anos de reclusão. No caso, é correto afirmar: a) Não existe concurso material quando dois delitos praticados são idênticos. b) Os delitos, quando idênticos, permitem apenas o reconhecimento da continuidade delitiva. c) A prescrição verifica-se apenas com relação a um dos delitos, devendo o segundo ser desprezado em virtude de ser igual ao primeiro. d) A prescrição opera-se isoladamente para cada um dos crimes.

26. Concurso Formal O concurso formal ou ideal é um concurso de crimes decorrentes de uma única conduta, o que o diferencia do concurso material. A primeira espécie de concurso formal é o concurso formal perfeito, havendo dois ou mais crimes, respondendo o agente pelo crime mais grave, com acréscimo. Já, no concurso formal imperfeito, somam-se as penas. Havendo concurso formal homogêneo, ocorrerão resultados idênticos, conforme já estudado. Em caso de concurso formal heterogêneo, os resultados serão diversos. No concurso formal perfeito, é preciso observar que há um único desígnio. Já,


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no concurso formal imperfeito, existe multiplicidade de vontades. Há teorias relacionadas à unidade de desígnio. O Código adotou a teoria objetiva para o concurso formal imperfeito. Assim, basta que o sujeito tenha pensado em dois crimes antes de praticar uma conduta. O concurso formal imperfeito também é conhecido como concurso material benéfico. O concurso material benéfico nada mais é do que a utilização do concurso material para os casos em que o concurso formal for pior. Se a pena, com o concurso material ficar menor, este será utilizado. É preciso observar aqui o acréscimo do art. 70, qual seja, um sexto até a metade.

Exercício 15. Analise a seguinte frase:

“É possível que o agente através de uma única ação cometa um crime doloso e um crime culposo caracterizando a figura do concurso formal de crimes.” a) Está equivocada já que a figura do concurso formal de crimes exige delitos idênticos e dolosos. b) Está correta. c) Está equivocada já que somente poderá ocorrer concurso formal de crimes entre delitos culposos. d) Está equivocada em seu início já que a figura do concurso formal de crimes exige mais de uma ação ou omissão.

27. Continuação – Concurso de Crimes É preciso estudar agora a pena de multa. Estando-se diante de crimes em concurso material ou concurso formal imperfeito, as penas de multa são somadas. Estando-se diante do concurso formal próprio ou da continuidade delitiva, funciona o sistema da exasperação. O art. 72 do Código Penal dispõe: “No concurso de crimes, as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente.” O problema se dá em relação ao crime continuado, uma vez que o enfoque dado para este crime pode ser na vertente de que se trata de concurso de crimes ou de que se trata de um só crime. A teoria adotada pelo Código é a


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da ficção legal, sendo um único crime e, assim, trabalha-se com o sistema do art. 72. Hoje prevalece que o sistema de exasperação para as penas de multa não é aplicado. Por fim, é preciso dar ênfase à diferenciação do concurso de crimes. No concurso material, há duas ou mais ações e dois ou mais resultados. Já, no concurso formal, há uma só ação e dois ou mais resultados. Na continuidade delitiva, há duas ou mais condutas, duas ou mais infrações, mas esta ganha uma vestimenta diferente, pois aconteceu no mesmo espaço, tempo e havendo mesmo modo de execução. O concurso material benéfico é aquele concurso em que, se a exasperação da pena com as frações colocar a pena final mais alta do que a simples soma das penas, sai a exasperação, entra a somatória, e fica-se com o concurso material benéfico.

Exercício 16. Com relação ao concurso de crimes, é correto que: a) Reconhecido o crime continuado, as penas de multa serão aplicadas distinta e integralmente, não se obedecendo ao sistema de exasperação, destinado somente às penas privativas de liberdade. b) No concurso formal heterogêneo, o agente com duas ou mais ações provoca dois ou mais resultados, hipótese em que será aplicada a pena do crime mais grave, aumentada de um terço até dois terços. c) Concorrendo no concurso material e no formal, uma contravenção e um crime punido com detenção ou reclusão, a pena de prisão simples imposta será primeiramente cumprida, e sucessivamente as demais. d) Havendo continuação em crimes praticados com violência, não bastando a grave ameaça, ainda que contra uma única pessoa, o juiz deverá aumentar a pena do crime-base até o triplo, observado o limite máximo de trinta anos. e) quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, em vez de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responderá por culpa, se o fato for previsto como crime culposo.

28. Crime Continuado


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Não importa a quantidade de crimes praticados por uma pessoa, se estes crimes forem praticados no mesmo tempo, mesmo modo de execução e mesmo lugar, por uma ficção jurídica, o CP diz que esta pessoa cometeu somente um crime. Há duas espécies de crime continuado: crime continuado comum (praticado sem violência e grave ameaça) e crime continuado específico (crime doloso, praticado com violência ou grave ameaça, com vítimas diferentes). As espécies são diferenciadas, pois a consequência jurídica de cada um deles é diversa. Para o crime continuado comum, tem-se a pena do crime mais grave aumentada de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços). Para o crime continuado específico, aplica-se a pena do crime mais grave, que será aumentada até o triplo. É preciso observar que o concurso material benéfico também é valido aqui, já que se a soma das penas for inferior ao triplo da pena mais grave, será considerada a pena menor. Ainda, por ser uma ficção jurídica, a prescrição irá incidir individualmente em cada crime. Quanto aos requisitos para caracterização do crime continuado, há pluralidade de crimes da mesma espécie, condições subjetivas semelhantes (tempo, espaço e modo de execução) e unidade de desígnios. Quanto a crimes da mesma espécie, prevalece que sejam crimes idênticos (mesmo tipo penal). Em relação ao espaço, é admitido que o crime tenha sido cometido em bairros próximos (a jurisprudência já aceitou até mesmo cidades vizinhas). Sobre o fator tempo, há características interessantes: o máximo de tempo já reconhecido foi de trinta dias.

Exercício 17. O percentual do acréscimo de pena em razão do crime continuado é fixado tendo-se em vista: a) O iter criminis percorrido. b) O número de infrações cometidas. c) A capacidade econômica das vítimas. d) O montante do prejuízo.

29. Continuação de Crime Continuado Em matéria de crime continuado, ainda não foi editada pelo STF súmula vinculante. A Súmula nº 605 do STF dispunha: “Não se admite continuidade delitiva nos crimes contra a vida.”


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Contudo, após a reforma de 1984, tal súmula foi tacitamente revogada. A Súmula nº 497 do STF dispõe: “Quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação.” A Súmula nº 711 do STF estabelece: “A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.” A Súmula nº 243 do STJ diz: “O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano.”

Exercício 18. No crime continuado ou permanente, praticado em território de duas ou mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela: a) Prevenção. b) Conexão. c) Residência do réu. d) Continência.

30. Teoria Geral da Pena – Sursis: Sistemas – Conceito – Natureza Jurídica A suspensão condicional da pena implica no não cumprimento desta. Sua previsão encontra-se no art. 77 do Código Penal. Este benefício será concedido para aquele que não for reincidente em crime doloso, quando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício, do mesmo modo para a hipótese em que não seja indicada ou cabível a substituição por pena restritiva de direitos, assim como a condenação da pena não seja superior a dois anos. O sursis será aplicado em 3 situações: em crimes dolosos cometidos mediante violência ou grave ameaça, em que a pena imposta seja igual ou inferior a dois anos; condenado reincidente em crime doloso, cuja pena anterior tenha sido a


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pena de multa (poderá obter sursis, pois a lei faz uma ressalva expressa para essa hipótese – art. 77, § 1º, do CP); e se o condenado for reincidente específico em crime culposo. Os sistemas internacionais que originaram a suspensão condicional do processo podem ser identificados como: “anglo-americano”, onde o juiz declara o réu culpado, mas não o condena, suspendendo o processo, independente da gravidade do delito, desde que as circunstâncias indiquem que o réu não tornará a delinquir. Já o sistema “belga-francês” é o aplicado pelo Brasil, onde o juiz condena o réu, mas suspende a execução da pena imposta, desde que aquele seja primário, não reincidente e a pena não ultrapasse 2 anos. Quanto à natureza jurídica do sursis, se considerada como um direito público subjetivo do acusado, o juiz estará obrigado a conceder o sursis, preenchidos os requisitos. Se for considerada como uma forma de execução de pena, será uma medida penal de natureza restritiva da liberdade, e não um benefício. O STJ já afirmou que o sursis é uma forma de execução de pena, porém, uma maioria possui entendimento como um direito público subjetivo do acusado.

Exercício 19. O cabimento da conversão da pena privativa de liberdade em pena restritiva de direitos impede a concessão da suspensão condicional da pena.

31. Teoria Geral da Pena – Sursis – Requisitos Objetivos e Subjetivos – Hipóteses de Cabimento Os requisitos objetivos do sursis são identificados quanto à qualidade da pena (privativa de liberdade – art. 80 do CP), quanto à quantidade da pena (até 2 anos) e quanto ao não cabimento de pena restritiva. Já os requisitos subjetivos serão aqueles que implicarem quanto ao fato do condenado não ser reincidente em crime doloso, as circunstâncias judiciais serem favoráveis a ele, bem como também o não cabimento da pena restritiva. O condenado irrecorrivelmente pela prática de crime doloso, que cometeu novo crime doloso após o trânsito em julgado, não pode obter o sursis, no entanto, da relação entre crime culposo e crime doloso, será possível o sursis, bem como da relação entre o crime doloso e culposo. Será também possível para a hipótese da relação entre contravenção penal e crime doloso, bem como quanto à conde-


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nação anterior à pena de multa relacionada a crime doloso (art. 77, § 1º, do CP). Se entre os crimes dolosos tiver operado a prescrição da reincidência, também caberá o sursis (art. 64, I, do CP). Das relações entre crime militar próprio e crime doloso, será possível o seu cabimento (art. 64, II, do CP), bem como da relação entre crime político e crime doloso (art. 64, III, do CP). Haverá possibilidade da aplicação do sursis também para a relação entre anterior concessão de perdão judicial e crime doloso (Súmula nº 18 do STJ), bem como da relação entre abolitio criminis e novo crime doloso (art. 2º, caput). Da hipótese de anistia e novo crime doloso (art. 107, II, do CP), também caberá sursis, bem como da relação de causa extintiva da punibilidade anterior à condenação definitiva e novo crime doloso, e também para réu anteriormente beneficiado com a suspensão do processo prevista no art. 89 da Lei nº 9.099/1995.

Exercício 20. Os requisitos subjetivos para a concessão do sursis dependem da valoração judicial sobre as circunstâncias da infração.

32. Momento Adequado para Concessão do Sursis O sursis será concedido na sentença condenatória, após a fixação da pena privativa de liberdade e da manifestação judicial sobre o não cabimento da conversão em pena restritiva de direitos. As condições serão fixadas em audiência admonitória, feita pelo juiz sentenciante, realizada após o trânsito em julgado. O sursis poderá ser fixado no Acórdão e não na sentença; caso o Tribunal diminua a pena de condenação atingindo o patamar de 2 anos e as demais condições estejam preenchidas, poderá o Tribunal decidir pela suspensão da pena privativa de liberdade de acordo com o art. 77 do CP. Há dois posicionamentos relacionados à questão de omissão do juízo da condenação quanto às condições para o cabimento do sursis, sendo a primeira corrente a seguinte: se o juiz da execução pode modificar as condições impostas pelo juiz da condenação e se o Tribunal, ao conceder o sursis, pode delegar ao juízo da execução a fixação dessas condições, nada impede que esse juízo da execução fixe as condições não determinadas pela sentença. Uma segunda corrente diz que não pode o juízo da execução rescindir a coisa julgada, impondo novas condições ao condenado. Não existe sursis incondicionado, ou seja, aquele sursis sem condições para ser


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determinado. Para essa segunda corrente, se o juiz que sentenciou esqueceu-se de fixar as condições, caberá ao MP opor embargos de declaração. Se o MP não realizar tal procedimento e ocorrer o trânsito em julgado, teremos um sursis sem condições a serem cumpridas no período de prova.

Exercício 21. A competência para a fixação das condições do sursis é do juiz sentenciante, e não do juiz da execução.

33. Sursis – Revogação e Cassação A revogação do sursis pode ser obrigatória ou facultativa. A obrigatória ocorre com a superveniência da condenação irrecorrível pela prática de crime doloso, pouco importando se a infração penal foi praticada antes ou depois do início do período de prova, pois o que provoca a revogação do benefício é a sobrevinda da condenação definitiva. Ocorre também quando receber uma pena definitiva de crime doloso, a pena perde o sursis e passa a cumprir outra pena. Poderá ser obrigatória no caso de frustração da execução da pena de multa sendo condenado solvente, mas, com a nova redação do art. 51 do CP, não existe mais essa hipótese de revogação. A não reparação do dano, sem motivo justificado também poderá ser objeto de revogação do sursis, como o descumprimento de qualquer das condições legais do sursis simples (art. 78, § 1º, do CP). O caso de revogação facultativa se dá quando o juiz não está obrigado a revogar o benefício, podendo optar por advertir novamente o sentenciado, prorrogar o período de prova até o máximo ou exacerbar as condições impostas. São elas: a superveniência de condenação irrecorrível pela prática de contravenção penal ou crime culposo, descumprimento das condições legais do sursis especial (art. 78, § 2º), descumprimento de qualquer outra condição não elencada em lei, imposta pelo juiz (art. 79), as quais são chamadas de condições judiciais; se houver descumprimento de condição especial é faculdade revogar, mas, se descumprir uma condição legal, a revogação será obrigatória. A cassação do sursis ocorre pelo não comparecimento do sentenciado à audiência admonitória (art. 161 do CP) e pelo aumento de pena que exclua o benefício em decorrência do provimento do recurso da acusação (saia do teto de 2 anos).

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22. A cassação do sursis e a revogação do sursis possuem consequências penais similares.

34. Cassação – Sursis Sucessivo – Sursis Simultâneo – Prorrogação do Período de Prova Suspensão condicional da pena está no art. 77 do CP e será decidida pelo Juiz no momento que o Magistrado fixar uma condenação, podendo suspender a execução dessa pena, com o preenchimento de todos os requisitos descritos no art. 77 do CP. Dessa forma, essa execução da pena fica suspensa e, em troca dessa suspensão, existem várias condições legais e judiciais que o condenado precisa cumprir durante o período de prova. Ao final desse período, o sujeito que teve sua pena suspensa terá direito à extinção de sua punibilidade. Esse tempo determinado em lei para que cumpra a sua suspensão, o chamado período de prova, poderá ser prorrogado, durante mais 4 anos, no caso: se o beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção, considera-se prorrogado o prazo da suspensão até o julgamento definitivo. Se for condenado, o sursis será revogado. No momento em que o agente passa a ser processado pela prática de qualquer infração penal, a pena, que estava suspensa condicionalmente, não poderá mais ser extinta sem que se aguarde o desfecho do processo; essa prorrogação é automática. O que acarreta a revogação do benefício é a condenação do agente. O sursis simultâneo e sucessivo ocorre com um sursis na sequência do outro. Quanto à possibilidade desse sursis é correto afirmar pela sua admissibilidade quando durante o período de prova que cumpre as condições ou depois de cumprir o benefício, o beneficiado será condenado por crime culposo ou contravenção penal não gerando a revogação do benefício anterior. Sim pode haver sursis simultâneo ou sucessivo.

Exercício 23. É impossível o réu ser beneficiado com suspensão condicional da pena mediante sursis simultâneo, isto é, dois sursis cumpridos ao mesmo tempo.

35. Sursis e Crimes Hediondos ou Equiparados –


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Extinção da Pena Preenchidos os requisitos do art. 77 do CP, cabe sursis para crimes hediondos e equiparados. O regime integral fechado dos crimes hediondos não existe mais desde fevereiro de 2006, por isso, o sursis pode ser compatível com crime hediondo. O período de prova normal traz a preocupação de como funciona o procedimento para quem foi condenado por crime hediondo, trazendo a conclusão de que, nesse caso, não aumenta o período de prova no sursis. O cumprimento das condições ocorre quando expirado o prazo do sursis sem que tenha havido revogação considera-se extinta a pena privativa de liberdade. A extinção é automática, mas condicionada ao fato de o condenado não estar sendo processado por outro crime. Aguarda dois anos e pede a reabilitação criminal (apagam-se os registros criminais e volta a viver livre pela sociedade, sem antecedentes criminais). As condições podem ser: – legais: devem estar previstas em lei e são as do sursis simples (art. 78, § 1º, do CP) e as do especial (art. 78, § 2º, do CP); – judiciais: são impostas livremente pelo juiz, não estando previstas em lei (art. 79 do CP). Devem, porém, adequar-se ao fato e às condições pessoais do condenado. Cite-se como exemplo a obrigatoriedade de frequentar curso de habilitação profissional. Só se pode aplicar o sursis para alguém se não for cabível pena restritiva de direitos (art. 77, III, do CP).

Exercício 24. O sursis é incompatível com a hediondez dos crimes previstos na Lei nº 8.072/1990.

36. Livramento Condicional – Introdução É um benefício aplicado durante a execução da pena privativa de liberdade superior a 2 anos, para o condenado que preenche os requisitos da lei e cumpre determinadas condições e, assim, consegue antecipar sua saída, obtendo provisoriamente a sua liberdade, antes mesmo de cumprir integralmente a sua pena.


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Essa liberdade pode ser dividida em: – antecipada: ocorre antes do final do cumprimento da pena; – precária: pode ser revogada nos casos previstos em lei (arts. 86 e 87 do CP); – condicional: sujeita o beneficiário ao cumprimento de condições fixadas pelo juiz que concedeu o benefício. A competência para decidir sobre o livramento condicional é do Juiz da Execução do local onde o sujeito cumpre sua pena e não do Juiz sentenciante (art. 66, III, “e”, do CP). Tem um período de prova (tempo que o condenado ficará sob os cuidados do Estado, mesmo estando livre), em que o sujeito será denominado egresso. O período de prova é o tempo restante de pena que o sujeito tem para cumprir. Não existe livramento condicional para quem cumpre pena restritiva de direito ou multa. Preenchidos os requisitos legais, o condenado terá direito público subjetivo à concessão do livramento condicional. Feita a valoração dos requisitos e sendo todos favoráveis o sujeito, terá direito ao livramento.

Exercício 25. A posse de telefone celular como falta grave acarreta ao condenado diversas consequências, dentre elas, a perda de até 1/3 do tempo remido, a impossibilidade da concessão do livramento condicional, a impossibilidade da progressão de regime, bem como a regressão de regime.

37. Requisitos Objetivos (Espécie da Pena) – Quantidade da Pena – Parcela da Pena A concessão do livramento condicional pressupõe o preenchimento de requisitos objetivos e subjetivos. Os requisitos objetivos têm relação com a pena privativa de liberdade aplicada na decisão condenatória e com a reparação do dano. Os requisitos subjetivos dizem respeito à pessoa do condenado. Os requisitos objetivos estão elencados da seguinte forma: – vinculados à pena em razão da natureza da pena imposta: somente podem fazer jus ao LC os condenados à pena privativa de liberdade, ou seja, detenção e prisão simples. Não importando o regime de cumprimento da


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pena (fechado, semiaberto ou aberto); – quantidade da pena imposta (art. 83 do CP): somente podem fazer jus ao LC os condenados à pena privativa de liberdade superior ou igual a 2 anos. As penas de infrações diversas devem ser somadas para fins de concessão de LC (art. 84 do CP). – cumprimento de tempo mínimo da pena privativa de liberdade imposta (art. 83 do CP): dispõe que o condenado que for reincidente em crime doloso terá que cumprir 1/3 (um terço) para ter direito ao LC; o reincidente em crime doloso terá que cumprir ½ (metade), se praticou crime hediondo; ou o equiparado terá que cumprir 2/3 (dois terços); e se é reincidente específico em crime hediondo não fará jus ao livramento condicional. Se for reincidente em crime culposo, cumprirá 1/3 (um terço) e, se for reincidente em contravenção penal, cumprirá 1/3 (um terço). A Súmula nº 715 do STF diz que a pena unificada para atender ao limite de 30 anos não é considerada como livramento condicional. Para fins de livramento, leva em consideração a detração penal (tempo que ficou preso durante o processo) e também o tempo de remissão de pena.

Exercício 26. O condenado por tráfico de drogas não tem direito ao livramento condicional por força de sua equiparação com os crimes hediondos previstos na Lei nº 8.072/1990.

38. Requisitos Objetivos (Reparação do Dano) – Requisitos Subjetivos A condenação criminal tem como um dos efeitos automáticos a obrigação do condenado em reparar o dano causado pela infração praticada por ele (art. 91, I, do CP). Tal obrigação será fixada pelo Juiz criminal, viabilizando futura ação civil ex delicto na esfera cível. O Juiz criminal na própria sentença criminal fixará um valor mínimo de indenização, o qual será executado na esfera cível. Por essa razão, de reparar o dano, o legislador atrelou como um dos requisitos objetivos para a obtenção do livramento condicional o dever de previamente reparar o dano gerado pela prática da infração (quarto e último requisito objeti-


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vo). Porém, o Juiz poderá conceder livramento ao preso, mesmo que não tenha reparado o dano, no caso de impossibilidade de fazê-lo, ou seja, quando a vítima não for encontrada ou quando haja carência de recursos financeiros do preso. Quem avalia se é ou não caso de reparação do dano é o Juiz da Execução, pois é permitido a este Juiz investigar efetivamente se o preso não tem condições de reparar o dano. Os requisitos subjetivos são: a) bom comportamento carcerário; b) bom desempenho no trabalho; c) aptidão para se sustentar fora do presídio; d) não ser reincidente específico em crime hediondo ou equiparado; e e) condições pessoais favoráveis de que não voltará a delinquir.

Exercício 27. Sem a apresentação prévia de proposta de emprego, o condenado não fará jus ao livramento condicional por não cumprimento de um dos requisitos subjetivos do art. 83 do Código Penal.

39. Livramento Condicional: Condições – Procedimentos A partir do momento que adquire o direito de livramento condicional, o preso terá que cumprir algumas condições: Condições Legais: a) obter ocupação lícita em prazo razoável; b) comunicar periodicamente sua ocupação ao Juiz; e c) não mudar de Comarca sem autorização do Juiz (art. 132, § 1º, da LEP). Condições Judiciais: a) não mudar de residência sem comunicar; b) recolhimento compulsório para ficar em casa; e c) não frequentar determinados lugares (art. 132, § 2º, LEP). Condições Legais Indiretas: a) se o liberado vem a ser condenado novamente à pena privativa de liberdade, em sentença irrecorrível, seu livramento será revogado;


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b) se o liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes da sentença, ou for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção, à pena que não seja privativa de liberdade, a revogação será facultativa. O procedimento ocorre quando o Juiz da execução concede o benefício se presentes os requisitos, não podendo pedir diretamente ao Tribunal, para não haver supressão de instâncias. Caberá agravo em execução da decisão que conceder ou negar o pedido de livramento condicional. Não caberá Habeas Corpus para forçar um pedido de livramento, porque é necessário analisar requisitos subjetivos (provas). Os requerentes do livramento estão presentes no art. 195 da LEP. Finalizando o procedimento, após a análise dos requisitos, o Juiz concede o livramento, em que expede a carta de livramento para marcar uma audiência admonitória, a qual serve para que o Presidente do Conselho Penitenciário diga para o preso quais as condições a que ele estará sujeito. Em seguida, o preso sai do presídio e recebe seus pertences, o pecúlio e um documento que prova que ele está sob livramento.

Exercício 28. Compete ao Juiz da execução penal presidir a audiência admonitória no Fórum da Comarca em que se localiza o estabelecimento prisional.

40. Revogação Obrigatória A revogação do livramento condicional dar-se-á nas hipóteses previstas dos arts. 86 e 87 do Código Penal. A revogação obrigatória deverá ser decretada pelo Juiz da execução, de ofício, por requerimento do Ministério Público ou por representação do Conselho Penitenciário. A oitiva prévia do condenado é imprescindível antes de revogar o livramento. Então, revoga-se o livramento se o liberado vem a ser condenado à pena privativa de liberdade em sentença irrecorrível por: a) crime cometido durante a vigência do benefício; e b) por crime anterior (certidão de antecedentes criminais). Se for condenado irrecorrivelmente à pena de multa ou à pena restritiva de direitos, a revogação será facultativa, pois só será possível revogar o livramento condicional após o trânsito em julgado da nova decisão condenatória por crime irrecorrível, sendo o Juiz da execução obrigado a revogar. Caso o juiz não revogue


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o livramento, poderá interpor Agravo em Execução, cabendo retratação.

Exercício 29. Por força do princípio da independência funcional, o magistrado pode deixar de revogar o livramento condicional se o egresso for definitivamente condenado à pena privativa de liberdade por crime praticado durante a vigência do período de prova.

41. Livramento Condicional: Revogação Facultativa – Suspensão O Juiz poderá revogar o livramento se o liberado deixar de cumprir qualquer das condições fixadas em sentença ou for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção penal, à pena que não seja privativa de liberdade, tendo o Juiz que ouvir o condenado antes de revogar seu benefício. Se o livramento for justificado, o Juiz, em juízo de razoabilidade, poderá manter o benefício, mas, caso não tenha o liberado justificativa pelo descumprimento das condições, o Juiz poderá revogar o benefício. Caso seja novamente condenado por crime ou contravenção penal à pena que não seja privativa de liberdade, também será faculdade do Juiz revogar o livramento. Mantido o livramento condicional, na revogação facultativa, o Juiz deverá advertir o liberado ou agravar as condições (art. 140 da LEP). Se a revogação for motivada por infração penal anterior à vigência do livramento computar-se-á como tempo de cumprimento de pena o período de prova, sendo permitida, para a concessão de novo livramento, a soma do tempo das duas penas (art. 141 da LEP). Porém, se a revogação se der por outro motivo, não poderá computar o tempo que cumpriu no período de prova, como tempo de pena efetivamente cumprido (art. 142 da LEP). Praticada pelo liberado outra infração penal, poderá o Juiz ordenar a prisão do egresso, ouvidos o conselho e o Ministério Público, suspendendo o curso do livramento cuja revogação, entretanto, ficará dependendo da decisão final, sendo esse caso de suspensão do livramento condicional.

Exercício


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30. A suspensão do livramento condicional possibilita ao Juiz da execução prender o egresso e, caso depois venha a ser absolvido, será novamente colocado em liberdade condicional.

42. Prorrogação do Período de Prova – Extinção da Pena Admite-se a prorrogação do período de prova quando o liberado vem responder a processo criminal em razão de crime cometido na vigência do livramento condicional. O Juiz não poderá declarar extinta a pena quanto não passar em julgado a sentença em processo a que responde o liberado, por crime cometido na vigência do livramento (art. 89 do CP), devendo o Juiz aguardar que esse novo processo-crime termine. Se a decisão for condenatória, revogar-se-á o livramento e não se computará como cumprimento de pena o tempo que permaneceu solto. Se a decisão for absolutória, não revogará o livramento condicional e será computado como cumprimento de pena o tempo que o liberado permaneceu solto. A prorrogação do período de prova precisa de decisão judicial, ou seja, quando for processado criminalmente por um fato praticado durante o período de prova, o Juiz poderá suspender o livramento ou não, mas simplesmente prorrogará o período de prova até terminar o processo. Se esgotar o período de prova inicial, não precisará cumprir as condições na prorrogação. Se até o seu término o livramento não for revogado, considerar-se-á extinta a pena privativa de liberdade (art. 90 do CP). A consequência jurídica do livramento cumprido e não revogado é a extinção da pena privativa de liberdade e não a extinção da punibilidade.

Exercício 31. O término do período de prova sem revogação acarreta a absolvição do réu.

43. Efeitos da Condenação – Efeitos Principais e Efeitos Secundários Os efeitos da condenação são encontrados nos arts. 91 e 92 do Código Penal. No âmbito do Poder Judiciário, há uma distribuição de competências entre órgãos jurisdicionais.


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As varas criminais são responsáveis pela apuração da materialidade e da autoria. Se tudo for devidamente comprovado, o Estado-Juiz estará autorizado a sentenciar e condenar o sujeito. Quando alguém é condenado no Brasil, surgem alguns efeitos que devem ser observados, denominados efeitos da condenação. Os efeitos da condenação podem ser principais ou secundários. O principal efeito da condenação é a aplicação de uma pena criminal, que pode ser privativa de liberdade, restritiva de direitos ou multa. Pode ser aplicada, ainda, uma medida de segurança para um semi-imputável. O totalmente inimputável recebe uma medida de segurança, sendo esta uma sentença absolutória imprópria. É preciso entender que o semi-imputável recebe uma condenação criminal. Além dos efeitos principais, há efeitos secundários, os quais estão positivados nos arts. 91 e 92 do Código Penal. A natureza jurídica dos efeitos secundários pode ser penal ou extrapenal, como a suspensão dos direitos políticos, por exemplo. Quando alguém é condenado criminalmente de forma definitiva, ou seja, havendo trânsito em julgado, este fato induz à reincidência. Outro efeito é o impedimento de concessão de suspensão condicional da pena, nos termos do art. 77, I, do CP. Ainda, se a condenação for por crime doloso, esta decisão determinará a revogação obrigatória do sursis. O prazo da prescrição da pretensão executória para quem é reincidente é aumentado em 1/3 (um terço), sendo este outro efeito a ser observado.

44. Efeitos da Condenação – Efeitos Secundários Conforme já estudado, além da pena, há efeitos secundários de natureza penal, como a reincidência, o regime fechado, a revogação obrigatória do sursis, a revogação obrigatória do livramento condicional, a impossibilidade de concessão de sursis e os maus antecedentes. No entanto, é preciso considerar também os efeitos extrapenais, efeitos que impactam a vida do sujeito condenado criminalmente, mas que não têm natureza criminal. Há dois grupos: os efeitos genéricos e os efeitos específicos. O primeiro efeito genérico é a reparação do dano. O art. 91 do Código Penal dispõe: “Art. 91. São efeitos da condenação:


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I – tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;” (...) Ressalta-se que quem pratica um crime contra determinada vítima, causa a esta uma situação passível de ser indenizada. A ação civil ex delicto é o ajuizamento de ação na esfera cível, que tenha como origem o sujeito ser vítima de um crime. Faz-se necessário observar que uma sentença condenatória gera dever de indenizar no cível, não importando se o juiz especificou na sentença, já que os efeitos são automáticos. Caso haja perdão judicial, é preciso lembrar-se do disposto na Súmula nº 18 do STJ, que estabelece: “A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório.”

45. Confisco O art. 91, II, do Código Penal trata do confisco. O confisco penal significa um efeito da condenação, mas deve ser analisado em três situações distintas. Instrumentos do crime são os meios utilizados pelo agente para praticar o crime. Exemplo: arma de fogo utilizada pelo agente para roubar a vítima. Os instrumentos do crime sempre serão perdidos em favor da União. Observa-se que se a arma de fogo estiver registrada em nome de alguém e acompanhada da posse e do porte, será uma arma regularizada e, portanto, não será ilícita. Assim, não haverá aqui perda em favor da União. A Lei de Drogas, em seus arts. 62 e 63, dispõe que veículos, embarcações, aeronaves e quaisquer outros meios de transporte utilizados para transportar drogas serão confiscados. O art. 243 da Constituição Federal estabelece que sejam confiscadas as glebas de terra utilizadas para cultura ilegal de plantas psicotrópicas, sem autorização do Governo. Além dos instrumentos do crime, existem, também, o produto da infração (vantagem direta) e o proveito da infração (vantagem indireta). Exemplo: relógio roubado é produto da infração. Se o relógio for derretido, o dinheiro que se conseguirá vendendo o produto será proveito da infração.

46. Equivalência de Bens Conforme estudado anteriormente, podem ser confiscados os instrumentos do


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crime, os produtos do crime e os proveitos do crime. Em 2012, foi aprovada a Lei nº 12.694 para regulamentar a situação de não se encontrar instrumentos, produtos ou proveitos do crime. Assim, hoje o art. 91, § 1º, do Código Penal dispõe: “§ 1º Poderá ser decretada a perda de bens ou valores equivalentes ao produto ou proveito do crime quando estes não forem encontrados ou quando se localizarem no exterior.” Nota-se que se permite o ingresso do Estado no patrimônio lícito do criminoso para compensar o desconhecimento do paradeiro do patrimônio ilícito (exterior ou local incerto e não sabido). Tal situação é denominada equivalência de bens, uma vez que o juiz irá usar bens equivalentes para compensar o fato dos bens estarem em local ignorado ou se estes bens estiverem no exterior. O § 2º traz a seguinte redação: “§ 2º Na hipótese do § 1º, as medidas assecuratórias previstas na legislação processual poderão abranger bens ou valores equivalentes do investigado ou acusado para posterior decretação de perda.” O § 2º trata das medidas assecuratórias, medidas de natureza cautelar, de natureza real, que servem para garantir que, no futuro, aquele patrimônio estará à disposição do Judiciário.

47. Efeitos Específicos da Condenação – Perda do Cargo, Função Pública ou Mandato Eletivo Os efeitos genéricos da condenação servem para todo e qualquer crime. Já os efeitos específicos são muito bem catalogados pelo legislador. Ainda, os efeitos genéricos são automáticos e os efeitos específicos não são automáticos, devendo ser motivados pelo juiz. Dispõe o art. 92 do Código Penal: “Art. 92. São também efeitos da condenação: I – a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo: a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública; b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos.”


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Faz-se necessário observar que os efeitos da condenação são permanentes, ou seja, o político perde o mandato e só poderá voltar se for legitimamente eleito novamente. É possível observar que há diferença entre efeitos da condenação e a pena restritiva de direitos.

48. Efeitos Específicos da Condenação – Incapacidade para o Exercício do Pátrio Poder, da Tutela ou da Curatela Dispõe o art. 92, II, do Código Penal: “Art. 92. São também efeitos da condenação: (...) II – a incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela, nos crimes dolosos, sujeitos à pena de reclusão, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado;” (...) Nota-se aqui a necessidade de três requisitos: somente crimes dolosos; crimes punidos com pena de reclusão; e a vítima deste crime deve ser o filho, o tutelado ou o curatelado. É preciso entender que o juiz não é obrigado a reconhecer este efeito específico da condenação, já que os efeitos específicos não são automáticos e nem obrigatórios, ainda que estejam preenchidos os requisitos. Quanto à extensão dos efeitos aos demais filhos, cumpre observar que os efeitos da decisão podem ser estendidos aos demais. A curatela trabalha com pessoas portadoras de deficiência mental ou de necessidades especiais no plano mental. O curador é a pessoa indicada para cuidar do curatelado e, assim como o pai, a mãe e o tutor, se praticarem um crime doloso, punido com reclusão contra o curatelado, poderão vir a sofrer a perda, a incapacidade para o exercício de sua curatela.

49. Efeitos Específicos da Condenação – Inabilitação para Dirigir Veículo Automotor O inciso III do art. 92 do Código Penal traz a seguinte redação: “Art. 92. São também efeitos da condenação: (...)


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III – a inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso.” É preciso observar que o homicídio trazido no Código de Trânsito Brasileiro é o homicídio culposo. Há previsões legais que retiram do sujeito a autorização para dirigir, ou seja, a habilitação para dirigir. O art. 47, III, do CP, trata de uma pena restritiva de direitos e uma das penas é a suspensão da habilitação. Ainda, os arts. 292 e 293 do CTB trazem a suspensão ou proibição de se obter autorização ou habilitação para dirigir (pena alternativa ou autônoma). Existem crimes dolosos no CTB em que há utilização veículo como meio. Neste sentido, há dois exemplos em que o veículo é um meio para prática de crimes dolosos. O primeiro é competição esportiva de veículo automotor não autorizada (racha) e o segundo é embriaguez ao volante.

Exercício 32. Considera-se efeito automático da condenação: a) Confisco. b) Perda de função pública. c) Perda do pátrio poder. d) Suspensão do direito de dirigir.

50. Reabilitação – Natureza Jurídica e Espécies A condenação criminal carrega alguns efeitos e alguns deles podem ser resgatados via reabilitação criminal. A reabilitação é um benefício que tem por finalidade restituir ao condenado à situação anterior à condenação, retirando as anotações de sua ficha de antecedentes criminais. A natureza jurídica da reabilitação é causa suspensiva de alguns efeitos secundários da condenação e dos registros criminais, porém, não é uma causa extintiva de punibilidade, mas causa suspensiva de efeitos da condenação. Cabe a reabilitação existindo sentença condenatória com trânsito em julgado, cuja pena tenha sido executada ou esteja extinta. Cabe a reabilitação na hipótese de se ter operado a prescrição da pretensão executória (extingue a pena). A reincidência não é apagada pela reabilitação, pois só desaparece após o decurso de mais de 5 anos entre a extinção da pena e a prática de novo crime. Negada a reabilitação, poderá ser requerida a qualquer tempo, desde que com


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novos elementos (art. 94, parágrafo único, do CP). A postulação só pode ser feita por quem tenha capacidade postulatória em Juízo, ou seja, por meio de advogado.

Exercício 33. Negada a reabilitação pelo juiz poderá ser novamente requerida a qualquer tempo desde que tenha novos elementos.

51. Reabilitação – Efeitos A reabilitação é um instituto criminal cujo objetivo é limpar os registros criminais de uma pessoa que tenha sido condenada, por sentença definitiva. A reabilitação assegura ao condenado o sigilo dos registros sobre seu processo, sua condenação, qualquer que seja a pena aplicada (pena privativa de liberdade, pena restritiva de direitos ou pena de multa) e, ainda, os efeitos da condenação. Assegurado o sigilo dos registros criminais, estes não serão mais objeto de folhas de antecedentes ou certidões de cartórios. Contudo, o art. 202 da Lei de Execução Penal também garante esse sigilo para quando for cumprida ou extinta a pena, salvo para instruir nova persecução penal. Portanto, na prática, o sigilo da LEP apenas não permitirá que conste de certidões ou atestados, enquanto que, se efetuada a reabilitação, não haverá indício de registro de forma alguma, salvo para o Poder Judiciário, para fins de reincidência. A reabilitação não exclui a reincidência. Apenas após 05 anos da condenação, o agente será tecnicamente primário e não terá qualquer pena elevada em razão de reincidência na prática de outro crime. O sigilo não é absoluto, pois as condenações anteriores deverão ser mencionadas caso sejam requisitadas informações pelo juiz criminal, polícia e Ministério Público. Além da pena, existem efeitos da condenação, como perda ou suspensão de cargo em função pública, incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou curatela, e inabilitação para dirigir veículo, ou seja, há a suspensão de efeitos extrapenais específicos. Com a reabilitação, apenas poderá ser retomada a habilitação para dirigir veículo. A reabilitação não devolve o poder familiar ou o cargo em função pública.

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34. Dentre os efeitos da reabilitação, temos o sigilo das informações e a revogação da reincidência reconhecida pelo juiz criminal.

52. Requisitos, Legitimidade e Revogação Os requisitos para o pedido de reabilitação são: pelo critério temporal, mediante o decurso de dois anos da extinção da pena, ou da audiência admonitória, no caso de sursis ou livramento condicional. A audiência admonitória ocorre durante a suspensão da pena pelo sursis ou antes do livramento condicional. No caso de extinção da pena pela ocorrência de sua prescrição (da pretensão executória), o prazo para requerimento de reabilitação há que ser contado do dia em que, efetivamente, ocorreu a prescrição da pena, e não do ato de sua formal declaração. Ressalta-se que o prazo de 2 anos conta-se da efetiva data da prescrição, e não da data em que foi declarada a prescrição pelo juiz ou tribunal. Na hipótese de condenação a pagamento de multa, o prazo de 2 anos conta-se da data do pagamento da multa. Em situação de pluralidade de condenações, o pedido de reabilitação não pode ser feito com relação a uma só das penas se ainda não foram todas cumpridas. Observa-se que a multa vai para o Fundo Penitenciário, que administra o sistema penitenciário. Supondo que haja várias condenações em diversos processos para o mesmo agente, a reabilitação somente poderá ser requisitada quando cumprida a última das penas. – bom comportamento público e privado durante os 2 anos; – domicílio no país durante esses 2 anos; – reparação do dano, salvo absoluta impossibilidade de fazê-lo ou renúncia comprovada da vítima. A reabilitação será revogada se o sujeito praticar um novo crime depois de ter sido extinta sua pena. A competência da reabilitação é do juiz de primeira instância que condenou o réu e, para que seja feito o pedido, é necessário capacidade de postulação, ou seja, somente pode ser realizado por advogado.

Exercício


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35. A competência para declarar a reabilitação é do juiz da vara das execuções criminais.

53. Medidas de Segurança: Pena x Medida de Segurança – Princípios – Periculosidade As pessoas inimputáveis, quando praticam injustos penais, de acordo com o Código, ficam isentas de pena (reclusão ou detenção). Entretanto, existe uma sanção aplicável, a medida de segurança. Apesar do nome absolvição imprópria, a medida de segurança restringe a liberdade da pessoa. Medida de segurança não é pena e possui caráter essencialmente preventivo. As penas no Brasil são: privativa de liberdade, restritiva de direitos e multa. Nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente, não se aplica medida de segurança ao menor de idade. Assim, a medida de segurança é uma sanção aplicada pelo Estado, na execução de uma sentença, cuja finalidade é exclusivamente preventiva, no sentido de evitar que o autor de uma infração penal que tenha demonstrado periculosidade (comprovada por perícia) volte a delinquir. Sua finalidade preventiva visa tratar o inimputável e o semi-imputável que demonstraram, pela prática delitiva, potencialidade para novas ações danosas. A medida de segurança pode ser internação ou tratamento ambulatorial. Periculosidade é a potencialidade para praticar ações lesivas. Revela-se pelo fato de o agente ser portador de doença mental. O agente, em si, já é um perigo, um risco à sociedade. Para a teoria tripartida, o fato é típico, ilícito, porém, não é culpável, já que não são atendidos seus requisitos: imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa. Para que seja imposta a medida de segurança, é necessário que, ao invés de culpabilidade (que é pressuposto para aplicação de pena criminal), constate-se a periculosidade. Portanto, o inimputável não é culpável, mas perigoso. Os princípios vetores da aplicação da medida de segurança são: – legalidade – se o agente não praticou um injusto penal, não há que se falar em medida de segurança. No máximo, poderá sofrer internação de natureza cível; – anterioridade – lei penal não retroagirá, salvo se for para beneficiar o réu;


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– responsabilidade criminal – a ideia da culpabilidade esvaziada pela inimputabilidade, mas a periculosidade surge permitindo a aplicação da sanção; – reformatio in pejus – não constitui reformatio in pejus o fato de o juiz substituir a pena de prisão por medida de segurança com base em laudo psiquiátrico. Os arts. 171 e 179 da Lei de Execução Penal preconizam a necessidade de guia a ser expedida para a execução da medida de segurança.

Exercício 36. A medida de segurança, pela necessidade de perícia, trabalha com a ideia de retribuição pelo mal causado.

54. Medidas de Segurança – Requisitos Há dois sistemas que trabalham com a noção de pena e medida de segurança: a) vicariante: aplica-se a pena ou a medida de segurança; e b) duplo binário: aplica-se pena e medida de segurança. O Código Penal brasileiro adotou o sistema vicariante, sendo impossível a aplicação cumulativa de pena e medida de segurança. Aos imputáveis, aplica-se a pena e aos inimputáveis, medida de segurança. Aos semi-imputáveis aplica-se uma pena reduzida ou uma medida de segurança, conforme recomendação do perito. Importante ressaltar que a última palavra será do juiz, já que laudo pericial não vincula decisão judicial. Para que se possa aplicar medida de segurança, é preciso que um crime tenha sido praticado, bem como que haja potencialidade para novas ações danosas. Não se aplica medida de segurança: a) se não houver prova da autoria; b) se não houver prova do fato; c) se estiver presente causa de exclusão de ilicitude; d) se o crime for impossível; e) se ocorreu a prescrição ou outra causa extintiva da punibilidade. Reitera-se que, para a aplicação da medida de segurança, é necessário que o agente inimputável tenha realizado um injusto penal (fato típico + ilícito).


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Na inimputabilidade, a periculosidade é presumida, bastando o laudo apontar a perturbação mental para que a medida de segurança seja obrigatoriamente imposta. Já, na semi-imputabilidade, a periculosidade é real, necessitando ser constatada pelo juiz. Ainda que o laudo aponte falta de higidez mental, deverá ainda ser investigado, no caso concreto, se é caso de pena ou de medida de segurança.

Exercício 37. Se o réu for perigoso e isso for constatado pericialmente, deverá ser submetido à medida de segurança, independentemente de provada a autoria do delito.

55. Espécies e Prazo de Cumprimento Existem duas espécies de medida de segurança: a detentiva e a restritiva. A detentiva consiste em internação em hospital de custódia e tratamentos – nela existe a perda de liberdade. A restritiva consiste na sujeição do agente a tratamento ambulatorial – não há perda da liberdade de ir e vir – consiste em tratamento médico cuja frequência será aferida pelo médico. A medida detentiva é obrigatória quando pena em abstrato, prevista para o fato praticado, for de reclusão. Tempo indeterminado de duração, perdurando enquanto não for constatada mediante perícia médica a cessação da periculosidade. Não caracteriza pena de caráter perpétuo, por não se tratar de pena, mas de medida preventiva. A jurisprudência trabalha no sentido de que o tempo máximo da medida é de 30 anos, por analogia ao art. 75 do CP. Outra corrente entende que o tempo máximo da medida equivale ao tempo da pena máxima prevista em abstrato para o fato praticado. Após o fim da medida, o agente passa para o cível podendo ocorrer internação compulsória. De tempo em tempo, o perito deve reavaliar o interno para verificar se a periculosidade cessou. O tempo mínimo de cumprimento da medida é de 1 a 3 anos, findos os quais o interno é reavaliado. A averiguação pode ser realizada a qualquer tempo, mesmo antes de decorrido o prazo mínimo, se houver determinação do juiz. A medida restritiva é aplicada quando o fato cometido for punido com detenção – trata-se de tratamento ambulatorial por prazo indeterminado, até a constatação da cessação da periculosidade por perícia, após o prazo mínimo de um e três anos, ou constatada a qualquer tempo.


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O prazo mínimo de um a três anos é estabelecido de acordo com o grau de perturbação do agente, bem como pela gravidade do ato praticado, conforme valoração do juiz.

Exercício 38. O portador de periculosidade deverá permanecer recolhido até a data em que for declarado cessado seu transtorno mental, podendo ultrapassar o teto de 30 anos do art. 75 do Código Penal.

56. Cumprimento Tanto a internação em hospital de custódia (manicômio judiciário) quanto o tratamento ambulatorial pressupõem a existência de fato típico e periculosidade do agente. Diante da certeza da prática do fato típico e a aferição, por médico, da inimputabilidade do agente, verifica-se se há probabilidade de cometimento de novos fatos típicos. Passa-se à verificação de aspecto objetivo: a natureza da pena prevista para o fato, se detenção ou reclusão. Em crime apenado com reclusão, a internação em hospital de custódia é obrigatória. Nesse caso, não há discricionariedade do juiz, ele deve aplicar a medida detentiva. Em crime apenado com detenção, a regra é a medida restritiva, como tratamento ambulatorial, porém, é facultado ao juiz, conforme o caso, aplicar medida detentiva. Não existe medida de segurança restritiva para crimes apenados com reclusão, mas pode haver medida de detenção pela prática de fato apenado com detenção, excepcionalmente. Internação provisória é a possibilidade de internação cautelar durante a investigação ou processo penal, desde que haja perícia atestando a periculosidade e que a infração tenha sido cometida com grave ameaça. É medida de natureza cautelar com os efeitos da medida de segurança, mesmo antes do trânsito em julgado da ação, não como sanção, mas como medida preventiva, nos termos do art. 319, VII, do Código de Processo Penal: “VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração.”


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Se, no curso do cumprimento da pena privativa de liberdade, houver acometimento de doença mental que torne o agente inimputável, será possível converter a pena privativa de liberdade em medida de segurança pelo juiz da execução. A pena perde a função punitiva e executa-se a medida em manicômio judiciário, até acabar o tempo que faltava para cumprimento da pena. Se permanecer a periculosidade, será o juiz cível que poderá realizar internação.

Exercício 39. A internação provisória de natureza cautelar é proibida pelo ordenamento jurídico pela ausência de periculosidade, somente aferida por sentença.

57 Direitos do Internado – Medida de Segurança Provisória ou Preventiva – Reintegração – Desinternação Progressiva O internado mantém todos ou direitos constitucionais, legais e convencionais, perdendo apenas a liberdade de forma parcial, em tratamento ambulatorial, e plena, em medida detentiva. São direitos do internado: 1. internação cautelar, somente por determinação do juiz natural da causa, e somente quando a infração for praticada com violência ou grave ameaça; 2. avaliação pericial antes da decisão judicial. Em caso de laudo impreciso ou desfundamentado, não poderá produzir efeito contra o internado; 3. detração, consistente no desconto do período de medida de segurança, do tempo que ficar internado cautelarmente. Juiz fixa prazo mínimo da medida de segurança entre 1 e 3 anos, computando-se nesse prazo, pela detração, o tempo de prisão provisória, abatido do prazo mínimo para reavaliação; 4. prescrição – a medida de segurança está sujeita à prescrição, calculada com base no mínimo abstrato cominado ao delito. Operada a prescrição, não mais se impõe medida de segurança. Observa-se a regra geral do art. 109 do CP e os marcos interruptivos da prescrição. Desinternação progressiva ou liberação será sempre condicional, devendo ser restabelecida a situação anterior se, dentro do período de um ano, o agente praticar ato indicativo de periculosidade. Assim, após a perícia que reconhece a cura, haverá liberação da medida de segurança, de forma condicional. Em um ano, a liberação se torna definitiva. Se dentro desse ano, no entanto, houver prática de outro fato que leve a crer ser o agente perigoso, o ato será revogado e ele voltará


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para internação ou tratamento ambulatorial.

Exercício 40. O juiz deve fixar na sentença um prazo mínimo de duração de medida de segurança de 1 a 3 anos. Computa-se nesse prazo mínimo pela detração o tempo de prisão provisória.


Capítulo 6

Extinção de Punibilidade

1. Causas Extintivas de Punibilidade No momento em que há a prática de um crime ou de uma contravenção penal, nasce para o Estado a possibilidade de este impor uma sanção penal ao responsável. Existindo a punibilidade de um lado, existe a extinção da punibilidade de outro. Neste sentido, a extinção da punibilidade faz desaparecer o poder punitivo estatal. Faz-se necessário observar que uma das causas de extinção da punibilidade é a abolitio criminis, sendo eliminado o próprio crime. O art. 107 do Código Penal dispõe acerca da extinção da punibilidade: “Art. 107. Extingue-se a punibilidade: I – pela morte do agente; II – pela anistia, graça ou indulto; III – pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso; IV – pela prescrição, decadência ou perempção; V – pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada; VI – pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite; IX – pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei.” Insta esclarecer que este rol não é taxativo, mas sim exemplificativo.” A primeira causa de extinção da punibilidade é a morte do agente. Trata-se de uma causa personalíssima, que não se comunica aos demais coautores e partícipes. A morte do agente somente pode ser comprovada com a certidão de óbito. Caso seja juntada uma certidão falsa, haverá duas posições. A primeira enten-


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dendo que não há revogação da decisão judicial que extinguiu a punibilidade, pois não se admite revisão criminal pro societate; a segunda posição (majoritária) trazendo que pode haver a revogação da decisão judicial, pois esta teve como fundamento um fato jurídico inexistente.

Exercício 1.

(Cespe – 2013 – TRF – 2ª Região – Juiz Federal) A morte do agente dá ensejo à extinção da punibilidade desse agente e, ainda que posteriormente à sentença declaratória da extinção se comprove a falsidade da certidão de óbito, a sentença será mantida, uma vez que não cabe revisão criminal em prejuízo do réu.

2. Anistia – Graça – Indulto – Abolitio Criminis – Decadência Outra causa de extinção da punibilidade é a anistia. Trata-se da exclusão, por lei ordinária com efeitos retroativos, de certos fatos criminosos. Observa-se que, em regra, a anistia está ligada a fatos políticos, a presos políticos. Ademais, é necessário esclarecer que a anistia não pode ser aplicada a crimes hediondos e equiparados. A graça, por sua vez, é o chamado indulto individual. É concedida pelo Presidente da República, sendo permitida a delegação. Depende de provocação da parte interessada e também não pode ser aplicada a crimes hediondos e equiparados. Em relação à abolitio criminis, trata-se de uma lei nova que descriminaliza fato até então considerado criminoso. Acerca deste assunto, dispõe a Súmula nº 611 do STF: “Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna.” Já a decadência é a perda do direito de queixa ou de representação em face da inércia de seu titular.

Exercício 2.

(FCC – 2013 – TJPE – Juiz) Em relação às causas de extinção da punibilidade, correto afirmar que:


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a) Não a configuram a concessão de indulto parcial ou comutação, de competência privativa do Presidente da República. b) Cabível o perdão judicial no caso de qualquer infração penal. c) A concessão de anistia é de competência privativa do Presidente da República, excluindo o crime e fazendo desaparecer suas consequências penais. d) A concessão de indulto faz com que o beneficiado retorne à condição de primário. e) Não são previstas, em qualquer situação, para casos de reparação do dano pelo agente.

3. Perempção – Renúncia – Perdão do Ofendido – Retratação – Perdão Judicial A perempção é a sanção processual imposta ao querelante omisso na ação penal exclusivamente privada (art. 60 do CPP). Já a renúncia é um ato unilateral pelo qual se efetua a desistência do direito de ação por parte da vítima (art. 104 do CP). O perdão do ofendido é um ato voluntário que visa a obstar o prosseguimento da ação penal privada (art. 105 do CP). Trata-se de um ato bilateral, já que o que extingue a punibilidade é o perdão aceito. A retratação ocorre quando se retira o que foi dito. A retratação cabe à calúnia e difamação, porém, não cabe em se tratando de injúria. O perdão judicial é a possibilidade de o juiz deixar de aplicar a sanção penal ao autor de crime, desde que evidenciadas certas circunstâncias. Por fim, a Súmula nº 18 do STJ dispõe: “A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório.”

Exercício 3.

(TRT – 2013 – TRT – 3ª Região (MG) – Juiz do Trabalho) Na sistemática do Código Penal, são causas de extinção de punibilidade, exceto: a) Morte do agente; b) Retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso; c) Perdão aceito nos crimes de ação penal privada e ação penal pública condicionada;


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d) Anistia, graça ou indulto; e) Prescrição, decadência ou perempção.

4. Prescrição – Introdução A prescrição está prevista no art. 107, IV, do Código Penal. Trata-se da perda da pretensão punitiva (antes do trânsito em julgado) ou da pretensão executória (depois do trânsito em julgado) em face da inércia do Estado. É necessário lembrar que apenas dois crimes no Brasil são imprescritíveis: o racismo (art. 5º, XLII, da CF) e a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático (art. 5º, XLIV, da CF). A Prescrição da Pretensão Punitiva (PPP) obsta o exercício da ação penal, enquanto a Prescrição da Pretensão Executória (PPE) extingue somente a pena. Ainda, a PPP apaga todos os efeitos de eventual condenação já proferida e na PPE todos os demais efeitos da condenação restam intactos. Ademais, a PPP não serve como pressuposto para reincidência e na PPE não se rescinde a sentença penal, que funciona como pressuposto da reincidência.

Exercício 4.

(Cespe – 2012 – PC-AL – Delegado de Polícia) Com relação às causas extintivas da punibilidade, julgue o item a seguir:

Excepcionando a regra constitucional da prescritibilidade, duas hipóteses em que a pretensão punitiva ou executória do Estado não são atingidas são os crimes de racismo e de tortura.

5. Prescrição de Pretensão Punitiva Propriamente Dita Em se tratando da prescrição da pretensão punitiva propriamente dita, não há trânsito em julgado para ninguém. Ainda, regula-se pela pena máxima cominada ao delito. Quanto à contagem do prazo prescricional, esta se dá conforme disposto no art. 10 do Código Penal. O art. 109 do Código Penal dispõe: “Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:


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I – em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze; II – em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze; III – em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito; IV – em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro; V – em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois; VI – em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.” Algumas regras devem ser levadas em consideração para a contagem do prazo prescricional. São consideradas qualificadoras, majorantes e minorantes, bem como a tentativa. De forma diversa, não são consideradas agravantes e atenuantes. Insta salientar que a Súmula nº 220 do STJ traz que a reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva.

Exercício 5.

(MP/PR – 2012) As causas de aumento ou de diminuição de pena, quando concretamente aplicadas na sentença, influem no cálculo da prescrição da pretensão punitiva pela pena em concreto, mas quando abstratamente consideradas, são insuficientes para produzir reflexos no cálculo da prescrição da pretensão punitiva pela pena em abstrato.

6. PPP – Termo Inicial e Interrupção O art. 111 do Código Penal traz o termo inicial antes do trânsito em julgado: “Art. 111. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr: I – do dia em que o crime se consumou; II – no caso de tentativa, do dia em que cessou a atividade criminosa; III – nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência; IV – nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil, da data em que o fato se tornou conhecido. V – nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes, previstos neste Código ou em legislação especial, da data em que a vítima completar 18 (dezoito) anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal.”


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Há quatro causas de interrupção da PPP, previstas no art. 117 do Código Penal: “Art. 117. O curso da prescrição interrompe-se: I – pelo recebimento da denúncia ou da queixa; II – pela pronúncia; III – pela decisão confirmatória da pronúncia; IV – pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis.” Observa-se que a Súmula nº 191 do STJ estabelece que a pronúncia é causa interruptiva da prescrição, ainda que o Tribunal do Júri venha a desclassificar o crime. Sobre o inciso IV, é preciso observar que a sentença anulada não interrompe a prescrição. Ainda, existe decisão no sentido de que somente interromperá a prescrição o acórdão que confirme a condenação e aumente a pena.

Exercício 6.

(Cespe – 2013 – Polícia Federal – Delegado de Polícia) Suponha que determinada sentença condenatória, com pena de dez anos de reclusão, imposta ao réu, tenha sido recebida em termo próprio, em cartório, pelo escrivão, em 13/08/2011 e publicada no órgão oficial em 17/08/2011, e que tenha sido o réu intimado, pessoalmente, em 20/08/2011, e a defensoria pública e o MP intimados, pessoalmente, em 19/08/2011. Nessa situação hipotética, a interrupção do curso da prescrição ocorreu em 17/08/2011.

7. PPP – Comunicabilidade da Interrupção e Prescrição do Crime Pressuposto Sobre a comunicabilidade da interrupção, dispõe o art. 117, § 1º, do Código Penal: “§ 1º Excetuados os casos dos incisos V e VI deste artigo, a interrupção da prescrição produz efeitos relativamente a todos os autores do crime. Nos crimes conexos, que sejam objeto do mesmo processo, estende-se aos demais a interrupção relativa a qualquer deles.” Nota-se que a palavra “autores” foi utilizada como gênero no dispositivo acima referido. O art. 108 do Código Penal dispõe acerca da prescrição do crime pressuposto: “Art. 108. A extinção da punibilidade de crime que é pressuposto, elemento constitutivo ou circunstância agravante de outro não se estende a este. Nos cri-


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mes conexos, a extinção da punibilidade de um deles não impede, quanto aos outros, a agravação da pena resultante da conexão.”

Exercício 7.

(FCC – 2012 – TJGO – Juiz) No tocante à prescrição, é correto afirmar que: a) O dia do começo não se inclui no cômputo do prazo. b) O prazo é sempre de dois anos no caso de penas restritivas de direitos. c) Não constitui matéria prejudicial da análise do mérito da ação penal. d) Incidirá sobre o total da pena, se reconhecido o concurso material de infrações, e sobre a pena de cada um, isoladamente, se identificado o formal. e) Se regula, em abstrato, pelo máximo da pena cominada, menos um terço, no caso de imputação de crime tentado.

8. PPP – Causas Suspensivas É preciso diferenciar a interrupção da suspensão. Nas causas interruptivas, o prazo volta ao seu início e, em se tratando de causas suspensivas, o prazo volta a ser contado de onde parou, computando-se o período anterior. O art. 116 do Código Penal traz as causas impeditivas ou suspensivas da prescrição: “Art. 116. Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre: I – enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime; II – enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro.” Observa-se que a primeira hipótese trata da chamada questão prejudicial. Existe uma causa suspensiva prevista na Constituição Federal, em seu art. 53. Dispõem os §§ 3º e 5º: “§ 3º Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação. (...) § 5º A sustação do processo suspende a prescrição, enquanto durar o mandato.”


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Ademais, ressalta-se que há causas suspensivas também previstas no Código de Processo Penal, em seus arts. 366 e 368. É necessário observar, ainda, a redação da Súmula nº 415 do STJ: “O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada.”

Exercício 8.

(FCC – 2013 – DPE-AM – Defensor Público) Segundo entendimento sumulado do Superior Tribunal de Justiça, o período de suspensão do prazo prescricional é: a) Regulado pelo máximo da pena cominada. b) Sempre o máximo previsto de vinte anos. c) Regulado pela pena aplicada. d) Regulado pelo mínimo da pena cominada. e) Sempre o mínimo previsto de três anos.

9. PPP Superveniente, Intercorrente ou Subsequente O fundamento da prescrição da pretensão punitiva superveniente está no art. 110, § 1º, do Código Penal, que dispõe: “§ 1º A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa.” A PPP superveniente regula-se pela pena aplicada. Ainda, pressupõe o trânsito em julgado para acusação. O marco inicial para contagem é a publicação da sentença condenatória com trânsito para a acusação e o marco final é o trânsito em julgado para as duas partes.

Exercício 9.

(MPE-MG – 2012 – MPE-MG – Promotor de Justiça) Considerando a atual disciplina legal da prescrição, analise as seguintes proposições e assinale com V as Verdadeiras e com F as Falsas.


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( ) Em relação à infração do art. 28 da Lei nº 11.343/06 (posse, para consumo pessoal, de droga proibida), para a qual não se comina pena privativa de liberdade, o prazo prescricional é de 2 (dois) anos.

( ) É impossível requerer o arquivamento de inquérito policial com base na prescrição da pretensão punitiva pela pena em perspectiva.

( ) Diversamente do que ocorre com as circunstâncias que reduzem o prazo prescricional, a hipótese de aumento se aplica apenas à prescrição que ocorre depois de sentença condenatória definitiva.

( ) Nos crimes conexos, a extinção da punibilidade pela prescrição de um deles impede, quanto aos outros, a agravação da pena resultante da conexão.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência de letras CORRETA: a) V, V, V, F. b) F, F, F, V. c) F, V, V, F. d) V, F, F, V.

10. PPP Retroativa A PPP retroativa tem como fundamento o art. 110, § 1º, do Código Penal. Regula-se pela pena aplicada e, assim como ocorre com a PPP superveniente, pressupõe o trânsito em julgado para a acusação. O marco inicial, também como ocorre na PPP superveniente, é a publicação da sentença condenatória para a acusação. Já o marco final é o recebimento da denúncia ou da queixa.

Exercício 10. (MPE-GO – 2012 – MPE-GO – Promotor de Justiça) Analise as seguintes assertivas a propósito da prescrição da pretensão punitiva:

I. A prescrição é interrompida na data do oferecimento da denúncia ou da queixa;

II. prescrição retroativa é a perda do direito de punir do Estado, considerando-se a pena concreta estabelecida pelo juiz, com trânsito em julgado para a acusação, bem como levando-se em conta a própria sentença;

III. prescrição intercorrente (subsequente ou superveniente) é a perda do direito de punir do Estado, levando-se em consideração pena concreta, com


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trânsito em julgado para a acusação, ou improvido seu recurso, cujo lapso temporal para a contagem tem início na data da sentença e segue até o trânsito em julgado desta para a defesa;

IV. A suspensão condicional do processo, previsto na Lei dos Juizados Especiais, é causa interruptiva da prescrição da pretensão punitiva;

V. os prazos para efeito de cálculo da prescrição em relação às penas restritivas de direitos são reduzidos à metade em relação aos previstos para as penas privativas de liberdade.

Está correto apenas o que se afirma em: a) I e III. b) II e III. c) II e IV. d) III e IV.

11. Prescrição da Pretensão Executória A Prescrição da Pretensão Executória (PPE) encontra fundamento no art. 110, caput, do Código Penal: “Art. 110. A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente.” A PPE ocorre depois de transitar em julgado a sentença condenatória para a acusação e defesa. Ainda, regula-se pela pena aplicada, já que existe condenação. É necessário ressaltar que a prescrição aumenta-se de um terço se o condenado for reincidente. Ademais, a PPE exclui apenas o efeito principal da sentença condenatória (pena), restando intactos todos os demais efeitos da condenação. Faz-se necessário esclarecer que não se rescinde a sentença penal, que funciona como pressuposto de reincidência.

Exercício 11. (UFPR – 2012 – TJPR – Juiz) A prescrição, depois de transitar em julgado a decisão condenatória para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa.


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12. PPE – Termo inicial O termo inicial da Prescrição da Pretensão Executória (PPE) vem previsto no art. 112 do Código Penal: “Art. 112. No caso do art. 110 deste Código, a prescrição começa a correr: I – do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional; II – do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção deva computar-se na pena.” Sobre fuga e revogação do livramento condicional, disciplina o art. 113 do Código Penal: “Art. 113. No caso de evadir-se o condenado ou de revogar-se o livramento condicional, a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena.”

Exercício 12. (Vunesp – 2012 – TJRJ – Juiz) A pena privativa de liberdade fixada em 3 (três) meses; a pena de multa quando é cumulativamente aplicada com uma privativa de liberdade e a pena de prestação pecuniária prescrevem, respectivamente: a) Em 3 (três) anos; no mesmo prazo da pena privativa de liberdade com a qual foi cumulativamente aplicada; no mesmo prazo da pena privativa de liberdade que substituiu. b) Em 2 (dois) anos; no mesmo prazo da pena privativa de liberdade com a qual foi cumulativamente aplicada; em 4 (quatro) anos. c) Em 3 (três) anos; em 2 (dois) anos; no mesmo prazo da pena privativa de liberdade que substituiu. d) Em 2 (dois) anos; em 2 (dois) anos; em 2 (dois) anos.

13. Fuga e Revogação do Livramento Condicional – Causas Interruptivas e Suspensivas da PPE Na prescrição da pretensão executória, já vimos os marcos iniciais, que estão no art. 112 do CP; no caso do art. 110 deste Código, a prescrição começa a correr:


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I – do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional; II – do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção deva computar-se na pena. Pelo art. 113, temos que, no caso de evadir-se o condenado ou de revogar-se o livramento condicional, a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena. Pena cumprida é pena extinta: então, se houve fuga ou revogação do livramento condicional, conta-se a prescrição pelo tempo que falta para cumprir a pena. São causas interruptivas da prescrição da pretensão executória (art. 117): V – pelo início ou continuação do cumprimento da pena; VI – pela reincidência. Sobre a reincidência, há divergência sobre o marco inicial: – da data da prática do novo crime (esta é a posição do STJ); – da data da prática do novo crime, mas deve-se aguardar o trânsito em julgado do novo crime; – da data do trânsito em julgado do novo crime. No art. 116, parágrafo único, temos que, depois de passada em julgado a sentença condenatória, a prescrição não corre durante o tempo em que o condenado estiver preso por outro motivo.

Exercício 13. (Cespe – 2013 – TJMA – Juiz) Em relação à prescrição, assinale a opção correta. a) A prescrição da pretensão executória tem início no dia em que a sentença condenatória transita em julgado para a defesa, desde que já tenha passado em julgado também para a acusação. b) O tempo de internação do condenado a quem sobrevém doença mental é computado para efeito da prescrição da pretensão executória. c) A agravação da pena pela reincidência não alcança a prescrição da pretensão punitiva nem o prazo de prescrição da pena de multa. d) No caso de fuga do sentenciado, a prescrição é regulada pelo tempo da pena aplicada na sentença condenatória, considerando-se o dia da fuga como o termo inicial da contagem do prazo prescricional.


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14. Situações Específicas – Prescrição Virtual, PRD, Multa, Medidas Socioeducativas e Medidas de Segurança Prescrição virtual, antecipada, projetada ou pela pena em perspectiva é aquela decretada com fundamento na perspectiva de que, ainda que o réu venha a ser condenado, ocorrerá a PPP retroativa. Não haveria, portanto, interesse do Estado em continuar com aquele processo. A Súmula nº 438 do STJ determina, contudo, que é inadmissível a aplicação da prescrição virtual. As penas restritivas de direito prescrevem no mesmo prazo que as penas privativas de liberdade. A multa prescreve no prazo de 2 anos, se for aplicada isoladamente. Se for aplicada cumulativamente com pena mais grave, prescreverá no prazo da mais grave. A prescrição penal é aplicável às medidas socioeducativas, conforme a Súmula nº 338 do STJ. Também prescrevem as medidas de segurança, pela pena máxima abstratamente prevista para o crime. É este o entendimento mais recente dos tribunais superiores.

Exercício 14. (TJSC – Juiz – 213) Sobre o instituto da prescrição, assinale a alternativa correta: a) É cabível a decretação da extinção da punibilidade do agente quando o juiz verificar, ainda no curso da instrução processual, que a provável pena a ser aplicada estará fulminada pelo advento da prescrição da pretensão punitiva. b) A sentença condenatória recorrível, posteriormente anulada por decisão do Tribunal de Justiça, conserva o efeito jurídico de interromper a fluência do prazo prescricional. c) A prescrição da pretensão executória é regulada pela pena aplicada na sentença condenatória transitada em julgado, não influindo, a reincidência do agente, no cômputo de seu prazo. d) Aos crimes eleitorais são aplicáveis os prazos prescricionais previstos no Código Penal.


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e) Não é possível o reconhecimento da prescrição em crime em que houve a imposição de medida de segurança, uma vez que nessa hipótese não ocorre a aplicação de pena privativa de liberdade.

Anotações


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Gabarito

CapĂ­tulo 2 1. Letra E. 2. Letra D. 3. Errado. 4. Errado. 5. Errado. 6. Letra B. 7. Correto. 8. Correto. 9. Correta. 10. Letra B. 11. Errado. 12. Errada. 13. Letra A. 14. Incorreta. 15. Incorreta. 16. Errada. 17. Errada. 18. Errado. 19. Errado. 20. Errado. 21. Correto. 22. Letra A. 23. Letra D. 24. Letra C. 25. Letra E. 26. Letra C. 27. Letra E. 28. Errada. 29. Letra B. 30. Errada. 31. Errada. 32. Letra A.

33. 34. 35. 36. 37.

Letra B. Letra E. Letra A. Certa. Letra D.

CapĂ­tulo 3 1. Certo. 2. Letra A. 3. Letra C. 4. Letra D. 5. Letra E. 6. Errada. 7. Letra D. 8. Errada. 9. Errada. 10. Errada. 11. Letra A. 12. Letra B. 13. Incorreta. 14. Letra E. 15. Letra B. 16. Incorreta. 17. Letra E. 18. Letra D. 19. Letra A. 20. Errado. 21. Certo. 22. Errado. 23. Errado. 24. Letra C. 25. Errado. 26. Letra B.


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27. 28. 29. 30. 31. 32. 33. 34. 35. 36. 37. 38. 39. 40. 41. 42. 43. 44. 45. 46. 47. 48. 49. 50. 51. 52. 53. 54. 55. 56. 57. 58. 59. 60. 61. 62. 63. 64. 65. 66. 67.

Certo. Letra D. Letra D. Correta. Correta. Errado. Letra B. Errada. Errada. Errada. Errada. Correta. Errada. Errado. Certo. Certo. Errado. Certo. Letra C. Letra E. Letra A. Errado. Certo. Letra B. Letra C. Certo. Letra A. Errado. Letra B. Errada. Letra C. Errado. Letra E. Errada. Errada. Errada. Errada. Errada. Errado. Correto. Errado.

68. 69. 70. 71. 72. 73. 74. 75. 76. 77. 78. 79. 80. 81. 82. 83. 84. 85. 86.

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Letra E. Errado. Letra A. Correta. Incorreta. Letra C. Correta. Letra A. Errado. Errado. Letra E. Errado. Letra D. Errado. Certo. Letra C. Falso. Falso. Não pode ser imoderada. Falso. A subjetiva exclui a culpa¬263 87. Falso. Responderá como se o próprio pai tivesse sido atingido. 88. Falso. 89. Falso. 90. Verdadeiro. 91. Falso. 92. Verdadeiro. 93. Verdadeiro. 94. Verdadeiro. 95. Verdadeiro. 96. Falso. 97. Falso. 98. Letra C. 99. Falso. 100. Verdadeiro. 101. Verdadeiro. 102. Verdadeiro. 103. Falso. 104. Verdadeiro. 105. Verdadeiro. 106. Verdadeiro.


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107. Verdadeiro. 108. Falso. 109. Verdadeiro. 110. Verdadeiro. 111. Verdadeiro. 112. Certa. 113. Certa. 114. Certa. 115. Certa. 116. Letra B. CapĂ­tulo 4 1. Letra A. 2. Errado. 3. Letra D. 4. Letra C. 5. Letra D. 6. Letra D. 7. Letra A. 8. Letra A. CapĂ­tulo 5 1. Correta. 2. Letra D. 3. Verdadeiro. 4. Falso. 5. Falso. 6. Falso. 7. Falso. 8. Verdadeiro. 9. Verdadeiro. 10. Letra C. 11. Falso. 12. Falso. 13. Falso. 14. Letra D. 15. Letra B. 16. Letra A. 17. Letra B. 18. Letra A. 19. Verdadeiro.

20. 21. 22. 23. 24. 25. 26. 27. 28. 29. 30. 31. 32. 33. 34. 35. 36. 37. 38. 39. 40.

Falso. Verdadeiro. Verdadeiro. Errado. Falso. Verdadeiro. Falso. Falso. Falso. Falso. Verdadeiro. Falso. Letra A. Verdadeiro. Falso. Errado. Falso. Falso. Falso. Falso. Verdadeiro.

CapĂ­tulo 6 1. Errada. 2. Letra A. 3. Letra C 4. Errado. 5. Errado. 6. Errado. 7. Letra E. 8. Letra A. 9. Letra A. 10. Letra B. 11. Certo. 12. Letra A. 13. Letra C. 14. Letra D.


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