Direito Penal – Parte Especial OAB
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Direito penal – parte especial OAB / Obra organizada pelo Instituto IOB - São Paulo: Editora IOB, 2013. ISBN 978-85-63625-16-8
Sumário
Capítulo 1 – Crimes contra a Vida, 9 1. Aspectos Constitucionais dos Crimes contra a Vida, 9 2. Homicídio Simples, 10 3. Homicídio privilegiado, 11 4. Homicídio qualificado – Parte I, 12 5. Homicídio Qualificado – Parte II, 14 6. Homicídio Culposo, 15 7. Infanticídio, 16 8. Induzimento, Instigação e Auxílio a Suicídio, 17 9. Aborto, 18 10. Hipóteses Permissivas do Aborto, 19 11. Aborto de Feto Anencéfalo, 20 12. Crimes contra a Vida – Questões Finais, 21 Capítulo 2 – Das Lesões Corporais, 23 1. Lesões Corporais, 23 2. Lesão Corporal Grave, 25 3. Lesão Corporal Grave – Antecipação do Parto, Incapacidade Permanente e Enfermidade Incurável, 26
4. Lesões Corporais Gravíssimas, 28 5. Lesão Corporal Seguida de Aborto I, 29 6. Lesão Corporal Seguida de Aborto II, 31 7. Hipóteses de Diminuição de Pena e Lesão Corporal Privilegiada, 32 8. Lesão Corporal Culposa, 34 9. Lesão Corporal Culposa no Trânsito e Violência Doméstica, 35 10. O Crime de Lesões Corporais Perante a Lei nº 12.720/2012, 37 Capítulo 3 – Da Periclitação da Vida e da Saúde, 39 1. Conceito de Crimes de Perigo, 39 2. Perigo de Contágio de Moléstia Grave, 41 3. Omissão de Socorro, Maus-tratos e Rixa, 43 Capítulo 4 – Crimes contra a Honra, 46 1. Crimes contra a Honra – Introdução, 46 2. Elementos Objetivos e Diferenciações, 47 3. Tipo Objetivo, 48 4. Sujeitos dos Crimes, 49 5. Tipo Subjetivo do Crime e Tentativa de Injúria, 50 6. Exceção da Verdade e Intimidade da Vítima, 51 7. Exceção da Verdade e Exceção de Notoriedade I, 52 8. Exceção da Verdade e Exceção de Notoriedade II, 53 9. Exclusão – Hipóteses, 55 10. Calúnia, Difamação e Injúria – Retratação, Pedido de Explicações e Ação Penal, 56 Capítulo 5 – Dos Crimes contra a Liberdade Individual, 58 1. Dos Crimes contra a Liberdade Individual: Constrangimento Ilegal e Ameaça, 58 2. Sequestro e Cárcere Privado, 60 3. Violação de Domicílio (Arts. 150 a 154 CP e Lei nº 9.099/1995), 63 Capítulo 6 – Crimes contra o Patrimônio, 66 1. Furto – Bem Jurídico Tutelado. Sujeitos, 66 2. Furto – Tipo Objetivo I, 67 3. Furto – Tipo Objetivo II, 68 4. Furto – Tipo Subjetivo I, 69 5. Furto – Tipo Subjetivo II, 71 6. Furto – Consumação. Furto Majorado, 72 7. Furto Privilegiado, 73 8. Furto Qualificado – Rompimento ou Destruição, 74 9. Furto Qualificado – Abuso de Confiança, 75 10. Furto Qualificado – Fraude, 76
11. Furto Qualificado – Escalada, Destreza e Chave Falsa I, 77 12. Furto Qualificado – Escalada, Destreza e Chave Falsa II, 78 13. Furto Qualificado – Veículo Transportado para Outro Estado, 81 14. Roubo – Estrutura do Delito. Bem Jurídico Tutelado, 84 15. Roubo – Sujeitos do Delito. Tipo Objetivo, 86 16. Roubo – Próprio – Impróprio – Tipos Subjetivos, 88 17. Roubo Próprio – Consumação – Tentativa, 90 18. Roubo – Causas de Aumento de Pena – Emprego de Arma, 91 19. Roubo – Armas, 92 20. Roubo Majorado, 94 21. Roubo Qualificado pelo Resultado Lesão Corporal Grave, 95 22. Roubo Qualificado pelo Resultado Morte, 96 23. Extorsão – Bem Jurídico Tutelado – Sujeitos – Elementos – Consumação, 98 24. Extorsão – Definição – Causas de Aumento – Qualificadoras, 99 25. Extorsão Mediante Sequestro, 100 26. Extorsão Mediante Sequestro – Forma Qualificada – Delação Premiada, 102 27. Estelionato – Art. 171, caput, 104 28. Estelionato Privilegiado e Ilícito Civil, 105 29. Estelionato – Outras Fraudes e Súmulas, 106 30. Estelionato – Diferença de outros Tipos Penais, 107 31. Receptação – Forma Qualificada e Culposa, 108 32. Imunidade Penal, 109 Capítulo 7 – Dos Crimes contra a Dignidade Sexual, 111 1. Estupro – Introdução – Elementos, 111 2. Estupro – Forma Omissiva – Tipos, 112 3. Estupro – Conflito de Leis, 114 4. Estupro – Tipo subjetivo – Consumação, 115 5. Estupro – Forma Qualificada, 116 6. Estupro – Causas de Aumento – Ação Penal, 117 7. Estupro de Vulnerável, 119 8. Estupro de Vulnerável – Modalidades, 120 9. Estupro de Vulnerável – Tipo Subjetivo – Consumação – Forma Qualificada – Conflito de Leis, 121 Capítulo 8 – Crimes contra a Paz Pública, 123 1. Art. 286, Código Penal – Incitação ao Crime, 123 2. Apologia ao Crime (Art. 287, CP), 125 3. Quadrilha ou Bando em Face da Lei nº 12.720/2012, 126 Capítulo 9 – Crimes contra a Fé Pública, 128 1. Falsificação de Documento Público e Particular, 128
2. Falsificação de Documento Público e Particular – Espécies de Documento – Condutas Típicas, 129 3. Falsificação de Documento Público e Particular – Tipo Subjetivo – Consumações – Particularidades, 130 4. Falsidade Ideológica, 131 5. Diferença entre Falsidade Ideológica e Falsidade Material, 133 6. Uso de Documento Falso, 134 7. Falsa Identidade, 135 Capítulo 10 – Crimes contra a Administração Pública, 137 1. Peculato, 137 2. Peculato – Elementos Subjetivos – Consumação, 138 3. Peculato Furto e Peculato Culposo, 140 4. Peculato Mediante Erro de Outrem, 141 5. Concussão, 143 6. Excesso de Exação, 144 7. Corrupção Passiva, 145 8. Corrupção Ativa e Corrupção Passiva, 147 9. Corrupção Passiva Privilegiada –Prevaricação, 148 10. Resistência, 150 11. Desobediência, 151 12. Desacato, 153 13. Tráfico de Influência e Exploração de Prestígio, 154 14. Denunciação Caluniosa, Comunicação Falsa de Crime ou de Contravenção, 156 15. Falso Testemunho, 158 Capítulo 11 – Crimes contra a Administração da Justiça, 160 1. Arts. 338 e 339 do CP, 160 2. Arts. 340 e 341 do CP, 161 3. Arts. 342 e 343 do CP, 162 4. Arts. 344 e 345 do CP, 163 5. Arts. 346 e 347 do CP, 165 6. Arts. 348 e 349 do CP, 166 7. Arts. 349-A e 350 do CP, 167 8. Arts. 351 e 352 do CP, 168 9. Arts. 353 e 354 do CP, 169 10. Arts. 355 e 356 do CP, 170 11. Arts. 357 e 358 do CP, 171 12. Art. 359 do CP e Questões, 172 Capítulo 12 – Dos Crimes contra as Finanças Públicas, 175 1. Lei de Responsabilidade Fiscal – Bem Jurídico Tutelado, 175 2. Crimes contra Finanças Públicas I, 177 3. Dos Crimes contra as Finanças Públicas II, 179 4. Crimes contra as Finanças Públicas – Art. 359-D, 181
Capítulo 13 – Crimes contra a Organização do Trabalho, 183 1. Crimes contra a Organização do Trabalho – Introdução, 183 2. Bem Jurídico e Competência, 184 3. Atentado contra a Liberdade de Trabalho (Arts. 197 e 198), 185 4. Atentado contra a Liberdade de Trabalho (Art. 198), 186 5. Atentado contra a Liberdade de Associação (Art. 199), 187 6. Paralisação do Trabalho Seguida de Violência ou Perturbação da Ordem (Art. 200), 188 7. Paralisação do Trabalho de Interesse Coletivo (Art. 201), 188 8. Invasão de Estabelecimento Industrial, Comercial ou Agrícola – Sabotagem, 189 9. Frustração de Direito Assegurado por Lei Trabalhista, 190 10. Frustração de Lei sobre a Nacionalização do Trabalho (Art. 204), 191 11. Exercício de Atividade com Infração por Decisão Administrativa (Art. 205), 192 12. Recrutar Trabalhadores, Mediante Fraude, com o Fim de Levá-los para Território Estrangeiro, 193 13. Art. 207 e Questões de Concurso, 194 Capítulo 14 – Condicionamento de Atendimento e Fraudes em Certames, 196 1. Condicionamento de Atendimento Médico-hospitalar Emergencial e Fraudes em Certames de Interesse Público, 196 Capítulo 15 – Crimes Informáticos, 199 1. Crimes Informáticos – Introdução, 199 2. Art. 154-A do CP, 200 3. Arts. 154-A e 154-B do CP, 201 4. Arts. 266 e 298 do CP, 202 Gabarito, 204
Capítulo 1
Crimes contra a Vida
1. Aspectos Constitucionais dos Crimes contra a Vida 1.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados “crimes contra a vida”, sendo estudados aqui os aspectos constitucionais destes crimes.
1.2 Síntese A vida humana é um bem importante e, portanto, é protegida pelo Direito. O bem jurídico “vida humana” é protegida pelo Direito. A vida humana é representada no plano constitucional, no internacional e no legal.
10 No plano constitucional, tem-se no art. 5º que todos têm direito à vida. Ainda, a Constituição Federal prevê a vedação à pena de morte, como regra, mas excepcionalmente esta pena existe, em caso de guerra declarada. No plano internacional, encontra-se a proteção do direito à vida no Pacto de San José da Costa Rica. Ressalte-se que o Pacto referido, que é a formalização normativa da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, a partir de decisão do STF, ganhou status de norma supralegal, sendo superior ao Código Penal e inferior a Constituição Federal. É possível observar que o legislador selecionou condutas para que se proteja o bem mais importante, qual seja a vida. A vida tem término com a morte encefálica, pois o que prevalece é o previsto na Lei dos Transplantes. Esta é a morte juridicamente estipulada no Brasil. O conceito de vida traz discussão. Faz-se necessário entender que o Direito põe a salvo, desde o momento da concepção, os direitos do nascituro, de acordo com o disposto no Código Civil. Assim, juridicamente, o Direito protege a vida humana desde a concepção, já que criminaliza o aborto, que é a interrupção da gestação antes do nascimento do feto. Para fins penais, é preciso que se observe uma classificação importante: – Vida endouterina: significa a vida humana no interior da mãe. Aqui se trabalha somente com o aborto. – Vida humana extrauterina: há três tipos penais para que se proteja a vida humana: infanticídio, homicídio e induzimento, instigação e auxílio ao suicídio.
Exercício
Direito Penal – Parte Especial
1. A vida humana é considerada juridicamente extinta: a) Com a morte pulmonar. b) Com a morte cardíaca. c) Com a morte encefálica. d) Nenhuma das anteriores.
2. Homicídio Simples 2.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados “crimes contra a vida”, sendo estudado agora o homicídio simples.
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2.2 Síntese O homicídio simples está previsto no caput do art. 121 do Código Penal: “Art. 121. Matar alguém: Pena – reclusão, de seis a vinte anos.” O homicídio é crime contra a vida, porém não necessariamente doloso. O dolo no homicídio pode estar presente, ocorrendo quando a pessoa quer uma finalidade ou assume o risco deste resultado. Ainda, o homicídio pode ser comissivo (ação) ou omissivo. Matar alguém é um crime comum, ou seja, qualquer pessoa pode praticá-lo. Da mesma forma, para ser vítima de um homicídio basta ser uma pessoa humana com vida. Há algumas denominações especiais para o homicídio que devem ser observadas. A primeira é o parricídio, homicídio praticado contra o pai. O homicídio praticado contra a própria mãe é denominado matricídio. O homicídio praticado contra o irmão recebe o nome de fratricídio. O homicídio praticado contra a esposa é denominado uxoricídio. O homicídio contra o feto recebe o nome de feticídio.
Exercício 2. Assinale a alternativa incorreta: a) O homicídio é punido tanto na forma dolosa quanto na forma culposa. b) No homicídio o dolo pode ser direto ou eventual. c) Homicídio sem a localização do corpo não é punível. d) Parricídio é o homicídio do próprio genitor.
3. Homicídio Privilegiado
Nesta unidade, serão abordados os chamados “crimes contra a vida”, sendo estudado agora o homicídio privilegiado.
3.2 Síntese O § 1º do art. 121 do Código Penal traz algumas situações em que o legislador entendeu pela diminuição da pena. Estabelece o dispositivo: “Se o agente
Direito Penal – Parte Especial
3.1 Apresentação
12 comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.”. A pena da pessoa que aqui se enquadra sofre uma redução de um sexto a um terço, ficando a critério do magistrado. A natureza jurídica do homicídio privilegiado é uma causa especial de diminuição de pena. Quanto ao homicídio praticado sob relevante valor moral, tem-se como exemplo a eutanásia. Em relação ao homicídio praticado por relevante valor social, trata-se de um motivo que busca ajudar toda a sociedade. Exemplo: sujeito que mata o traidor da pátria. É preciso entender os requisitos do homicídio privilegiado na questão do domínio de violenta emoção. Faz-se necessário que o sujeito esteja sob o domínio de violenta emoção e que seja logo após injusta provocação. Se o sujeito estiver somente sob influência de uma emoção, por exemplo, haverá apenas uma atenuante genérica, prevista no art. 65, III, “c”, do CP (que serve para qualquer crime). Ressalte-se que os requisitos do homicídio privilegiado passional são cumulativos e não alternativos. Ainda, o homicídio privilegiado nunca será hediondo, porém é possível homicídio privilegiado qualificado.
Exercício
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3. Assinale a alternativa correta: a) O homicídio privilegiado jamais será hediondo. b) Reconhecido o privilégio, a redução da pena é facultativa;. c) Reconhecido o privilégio ocorrerá a extinção da punibilidade. d) A eutanásia qualifica o homicídio.
4. Homicídio Qualificado – Parte I 4.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados “crimes contra a vida”, sendo estudado agora o homicídio qualificado.
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4.2 Síntese Qualificadora é um acréscimo na reprimenda do agente. A pena do homicídio simples vai de seis a vinte anos e do qualificado dobra-se a pena mínima, indo de doze a trinta anos (pena máxima prevista). Cumpre observar que não há previsão na legislação penal brasileira para o homicídio premeditado ser qualificado. Assim, homicídio premeditado não é qualificado, por ausência de previsão legal. O art. 121, § 2º, II, traz o motivo fútil. Futilidade diz respeito a uma desproporção entre a pessoa ter escolhido matar uma pessoa e a razão do crime. Exemplo: sujeito mata o outro porque a vítima é canhota ou porque torce por determinado time. O inciso I apresenta o motivo torpe. Torpeza significa repugnância, o sujeito mata o outro para receber dinheiro ou por qualquer outro motivo que cause repúdio nas pessoas. É preciso ressaltar que sempre que envolver quantia, dinheiro, o motivo é torpe. Um nome frequente na doutrina é o chamado homicídio mercenário, aquele praticado com finalidade lucrativa. Trata-se de motivo torpe e, portanto, qualificado. Faz-se necessário observar que na Lei dos Crimes Hediondos, tem-se o homicídio qualificado, existindo também o homicídio simples quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio. Indaga-se se é possível matar alguém sem motivo algum. A primeira posição se dá no sentido de que matar alguém sem motivo caracteriza o motivo fútil. A segunda posição se dá no sentido de que não é qualificado, pois a legalidade estrita do Direito Penal prevalece.
4. Assinale a alternativa correta: a) Todo homicídio será crime hediondo. b) A promessa de pagamento é motivo fútil. c) A pena do homicídio fútil é menor que a pena do homicídio torpe. d) A futilidade e a torpeza são qualificadoras motivacionais do homicídio.
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Exercício
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5. Homicídio Qualificado – Parte II 5.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados “crimes contra a vida”, sendo estudado ainda o homicídio qualificado e os meios de execução.
5.2 Síntese O inciso III do § 2º do art. 121 traz o emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum. A justificativa deste inciso é que a pessoa mata a vítima com sofrimento intensificado e desnecessário. Na Lei de Tortura, a pena é aumentada quando ocasiona morte de quem está sendo torturado. No Código Penal, a pena do homicídio é aumentada quando a tortura é usada como meio para matar. A diferença entre as situações está no dolo do agente. O inciso IV traz a traição, emboscada, dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido. O inciso V traz a situação em que o homicídio é cometido para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime. É preciso entender que pelo princípio da taxatividade, se o sujeito pratica um homicídio para assegurar a execução de uma contravenção penal e não de um crime, não há incidência da qualificadora. Se a pessoa foi morta vítima de uma tocaia, trata-se de uma situação prevista no inciso IV.
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Exercício 5. Não é meio insidioso ou cruel que qualifica o homicídio: a) Veneno. b) Explosivo. c) Asfixia. d) Premeditação.
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6. Homicídio Culposo 6.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados “crimes contra a vida”, sendo estudado agora o homicídio culposo.
O homicídio culposo está previsto no § 3º do art. 121 do CP, tendo como pena a detenção, de um a três anos. É preciso observar aqui que o homicídio culposo no trânsito está previsto no art. 302 do CTB. A culpa pode ocorrer por negligência, imprudência ou imperícia. A negligência lembra omissão. Imprudência se dá quando a pessoa é descuidada. A imperícia está direcionada à aptidão para desempenho de certas atividades que exigem um conhecimento técnico (ex.: engenheiro, médico). O § 4º traz uma causa de aumento de pena relacionada ao homicídio culposo: “No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos”. Nota-se que a parte final do dispositivo traz hipóteses de aumento de pena em caso de homicídio doloso, quando o crime for praticado contra pessoa menor de 14 ou maior de 60 anos. O § 5º trata do perdão judicial, que tem natureza jurídica de sentença declaratória de extinção da punibilidade do agente (Súmula nº 18 do STJ). Dessa forma, observa-se que o perdão judicial não gera reincidência. Em caso de perdão judicial, o juiz reconhece a existência do crime de homicídio, mas não aplica a pena se as consequências da infração atingirem o agente de forma tão grave que a pena se mostra desnecessária. O § 6º do art. 121 dispõe: “A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio.”.
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6.2 Síntese
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Exercício 6. Sobre o perdão judicial no homicídio: a) Só cabe para o homicídio culposo. b) Cabe para o homicídio privilegiado. c) É exclusivo do homicídio no trânsito. d) Não extingue a punibilidade do agente.
7. Infanticídio 7.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados “crimes contra a vida”, sendo estudado agora o nfanticídio.
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7.2 Síntese O infanticídio está previsto no art. 123 do Código Penal: “Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: Pena – detenção, de 2 (dois) a 6 (seis) anos”. O bem jurídico protegido é a vida humana, mas aqui há algumas peculiaridades. O sujeito ativo do delito é a mãe. O pai, matando o filho logo após o parto, responde por homicídio, já que não está sob a influência do estado puerperal, que é uma elementar típica do crime de infanticídio. A vítima do infanticídio é o próprio filho, durante ou logo após o parto. O momento em que se fala em infanticídio e não aborto é com o rompimento da bolsa e início da primeira contração. Ainda, a mãe pode praticar infanticídio por omissão, não dando o leite à criança, por exemplo. Ressalte-se que se trata de um crime próprio, ou seja, exige uma qualidade especial do agente delitivo, qual seja a mãe sob influência do estado puerperal. É importante entender que se a mãe mata o filho de forma acidental, responde por homicídio culposo, já que não existe infanticídio culposo. Outro ponto importante é que o nascimento com vida do recém-nascido é requisito para o infanticídio. Faz-se necessário observar, ainda, que o estado puerperal não se comunica.
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Exercício 7. Assinale a alternativa correta quanto ao crime de infanticídio: a) O feto em gestação pode ser vítima de infanticídio prematuro. b) O requisito para o crime de infanticídio é o nascimento do recém-nascido com vida. c) O estado puerperal pode acometer o pai da criança. d) O médico obstetra pode ser autor do infanticídio.
8. Induzimento, Instigação e Auxílio a Suicídio 8.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados “crimes contra a vida”, sendo estudado agora o induzimento, a instigação e o auxílio a suicídio.
O art. 122 do CP traz o crime de induzimento, instigação ou auxílio a suicídio. Ressalte-se que o suicídio não é crime; a responsabilidade é daquele que induz, instiga ou auxilia a pessoa a se matar. A pena para este tipo penal é reclusão de dois a seis anos se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave. A pena é duplicada em dois casos: havendo motivo egoístico e vítima sem capacidade de resistência ou com capacidade diminuída. Se a vítima for inimputável por doença mental, não podendo avaliar o suicídio por conta própria, a pessoa que induz, instiga ou auxilia responde por homicídio. Havendo motivo egoístico, este deve estar ligado à pessoa que instigou, induziu ou auxiliou, não podendo ser algo alheio à situação do criminoso. O ato de suicidar-se é um indiferente penal se for feito por contra própria, pois existe um princípio geral do direito que diz que o direito não pune a autolesão. Exceção: quando a pessoa pratica a conduta para fins de recebimento de seguro ou para fraudar a Previdência Social.
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8.2 Síntese
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Exercício 8. Assinale a alternativa incorreta sobre induzimento, instigação ou auxílio a suicídio: a) O suicídio é tipificado pela lei penal. b) A instigação a suicídio acarreta a responsabilidade penal. c) Caso o suicídio não aconteça, nem exista lesão corporal, não há crime. d) Se o crime é praticado por motivo egoístico a pena é duplicada.
9. Aborto 9.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados “crimes contra a vida”, sendo estudado agora o aborto.
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9.2 Síntese O aborto está previsto nos arts. 124 a 128 do Código Penal. Quem responde criminalmente pelo crime de aborto poderá ser a gestante ou um terceiro. A gestante responde quando pratica autoaborto ou aborto consentido. Já o terceiro responde quando pratica com ou sem o consentimento da gestante. Note que existe uma gradação de penas quando se observa os dispositivos acima referidos. Aborto é cessar a vida dentro do útero da mãe, pois tendo sido iniciado o trabalho de parto, os crimes serão de infanticídio ou homicídio, dependendo de quem cometeu o crime. Ressalte-se que para se provar o aborto, é preciso que a perícia prove que há vida intrauterina. Se uma manobra abortiva é praticada durante a gestação, mas a morte do feto ocorre após seu nascimento com vida, ainda assim há o aborto, já que a conduta abortiva ocorreu durante a gestação. No entanto, se o feto é expulso com vida, apesar das manobras abortivas, e o agente pratica uma nova conduta para matar a criança, há concurso material entre o aborto tentado e o homicídio ou infanticídio consumado. Aborto causado por inobservância de um dever objetivo de cuidado, a gestante não responde, já que não existe aborto culposo. Contudo, se um terceiro o pratica de forma culposa, o agente responde por lesão corporal culposa.
19 O art. 127 traz a forma qualificada: “As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.” O art. 126, parágrafo único, cuida do consentimento da gestante. É preciso entender que esta gestante deve ser maior e capaz.
Exercício 9. São de competência do Tribunal do Júri: a) O autoaborto. b) Aborto com o consentimento da gestante. c) Aborto sem o consentimento da gestante. d) Todas as anteriores.
10. Hipóteses Permissivas do Aborto 10.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados “crimes contra a vida”, sendo estudado agora o aborto e as hipóteses permissivas.
Há duas hipóteses permissivas em lei: o aborto necessário e o aborto sentimental. O aborto necessário é aquele praticado pelo médico para salvar a vida da gestante. Ressalte-se que é permitido por lei quando for a única e última hipótese para se salvar a vida da gestante. A segunda hipótese é denominada aborto sentimental, que traz o caso em que a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal. Observe que é desnecessário que haja autorização judicial para que seja feito aborto em caso de estupro. Todavia, o médico pode solicitar a autorização para que confirme a gravidez resultante de estupro. Ainda, não é preciso que o estuprador esteja sendo investigado pela polícia ou haja uma condenação transitada em julgado para que a gravidez seja interrompida.
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10.2 Síntese
20 Note, ademais, que o médico, no caso de aborto necessário, não está vinculado ao consentimento da gestante. O aborto econômico é aquele em que a mãe mata o próprio filho ou consente para que um terceiro o faça, pois não possui condições financeiras para a criação da criança. Tal modalidade não é permitida por lei. O aborto honoris causa é aquele realizado para salvar a honra da gestante, não sendo este permitido pela legislação vigente. O aborto eugênico é aquele praticado quando se descobre, por exames médicos, que o feto tem malformação, sendo este também proibido pela legislação pátria.
Exercício 10. Assinale a alternativa verdadeira: a) Para o aborto necessário, o médico necessita de autorização judicial. b) Para o aborto sentimental, o médico necessita de autorização judicial. c) Hipóteses de aborto legais dispensam autorização judicial por não caracterizarem infração penal. d) Além da autorização judicial, o aborto sentimental requer consentimento da gestante.
11. Aborto de Feto Anencéfalo 11.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados “crimes contra a vida”, sendo estudado agora o aborto de feto anencéfalo.
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11.2 Síntese A questão do feto anencéfalo diz respeito à gestação de um conjunto de células em formato humano, destituído de vida. Durante a vigência da lei anterior a 1988, para a interrupção da gestação nesses casos, utilizava-se a ADPF como último recurso para o controle da constitucionalidade. O STF entendeu que aborto é crime contra a vida e feto anencéfalo não possui cérebro, não possuindo vida. Não tendo vida no feto, não há crime contra a vida e, portanto, interrupção de gestação de feto anencéfalo não é aborto.
21 Faz-se necessário entender que o STF não criou norma permissiva para a realização do aborto. A ementa da ADPF 54 dispõe: ESTADO – LAICIDADE. O Brasil é uma república laica, surgindo absolutamente neutro quanto às religiões. Considerações. FETO ANENCÉFALO – INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ – MULHER – LIBERDADE SEXUAL E REPRODUTIVA – SAÚDE – DIGNIDADE – AUTODETERMINAÇÃO – DIREITOS FUNDAMENTAIS – CRIME – INEXISTÊNCIA. Mostra-se inconstitucional interpretação de a interrupção da gravidez de feto anencéfalo ser conduta tipificada nos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal.
Exercício 11. Na ADPF 54, o STF decidiu que: a) O aborto de feto anencefálico não é crime. b) O aborto de feto anencefálico é inconstitucional. c) Não existe aborto em caso de anencefalia. d) A vida humana começa com a fecundação.
12. Crimes contra a Vida – Questões Finais 12.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados “crimes contra a vida”, sendo analisadas questões finais acerca do tema.
Se o vírus HIV é transmitido a outra pessoa, de acordo com entendimento do STF, não há tentativa de homicídio, ainda que o vírus seja transmitido dolosamente. É possível que uma pessoa responda por tentativa de homicídio e homicídio consumado contra uma mesma pessoa, desde que em contextos diferentes. Se um militar mata um civil, a competência é da Justiça Comum, porém se um militar mata um militar a competência é da Justiça Militar. É preciso, ainda, diferenciar o crime de periclitação da vida e saúde de outrem da tentativa de homicídio. A resposta aqui está no dolo do agente.
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12.2 Síntese
22 Quanto ao crime de latrocínio, este não é crime contra a vida, trata-se de crime contra o patrimônio. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações: I – no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família; II – na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima (art. 948, CC).
Exercício
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12. Não é considerado por lei um crime doloso contra a vida: a) Homicídio privilegiado. b) Infanticídio. c) Aborto. d) Suicídio.
Capítulo 2
Das Lesões Corporais
1. Lesões Corporais 1.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordadas as lesões corporais, crimes previstos no art. 129 do Código Penal. Será vista a figura da lesão corporal simples, também chamada de lesão corporal leve.
1.2 Síntese “Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena – detenção, de três meses a um ano. Lesão corporal seguida de morte V – aborto: Pena – reclusão, de dois a oito anos. § 3º Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo: Pena – reclusão, de quatro a doze anos.
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24 Diminuição de pena § 4º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Substituição da pena § 5º O juiz, não sendo graves as lesões, pode ainda substituir a pena de detenção pela de multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis: I – se ocorre qualquer das hipóteses do parágrafo anterior; II – se as lesões são recíprocas. Lesão corporal culposa § 6º Se a lesão é culposa: Pena – detenção, de dois meses a um ano. Aumento de pena § 7º No caso de lesão culposa, aumenta-se a pena de um terço, se ocorre qualquer das hipóteses do art. 121, § 4º. § 7º Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se ocorrer qualquer das hipóteses dos §§ 4º e 6º do art. 121 deste Código. § 8º Aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º do art. 121 Violência Doméstica § 9º Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. § 10. Nos casos previstos nos §§ 1º a 3º deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9º deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço). § 11. Na hipótese do § 9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência.” A lesão será leve quando não produzir incapacidade para ocupações habituais por mais de 30 dias, perigo de vida, debilidade permanente de membro, sentido ou função, aceleração de parto, incapacidade permanente para o trabalho, enfermidade incurável, perda ou inutilização de membro, sentido ou função, deformidade permanente, aborto e lesão corporal seguida de morte, ou seja, o critério para que reste configurada a lesão leve é o critério da exclusão: há delito de lesão corporal leve sempre que o fato não se enquadra na descrição dos §§ 1º e 2º do art. 129, que definem as lesões graves e gravíssimas. Com o advento da Lei nº 9.099/1995, os crimes de lesões corporais leves e de lesões corporais culposas, continuam sendo de ação penal pública, porém, pública condicionada à representação do ofendido, conforme o art. 88 da Lei nº 9.099/1995.
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Exercício 13. (Técnico Judiciário TJ-MG – 2005) Tício, durante uma discussão com Mévia, sua esposa, desfere-lhe um disparo de arma de fogo, que a atinge na altura do pescoço. Mévia, apesar de ferida, permanece com vida. No momento em que a vê ensanguentada, Tício, arrependido de haver efetuado o disparo, deixa de prosseguir na execução do crime de homicídio e leva a esposa ao hospital mais próximo. O ferimento não afeta qualquer órgão, sentido ou função de Mévia, causando-lhe apenas ferimentos de natureza leve. Considerando-se o caso descrito, é CORRETO afirmar que a conduta de Tício deve ser tipificada como: a) Homicídio simples, na modalidade tentada. b) Lesões corporais graves. c) Lesões corporais graves, na modalidade tentada. d) Lesões corporais leves.
2. Lesão Corporal Grave 2.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordadas as lesões corporais, crimes previstos no art. 129 do Código Penal. Será vista a figura da lesão corporal grave, prevista no § 1º, do art. 129.
A lesão corporal de natureza grave está prevista no § 1º do art. 129 do Código Penal. Vejamos: “Lesão corporal de natureza grave § 1º Se resulta: I – incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias; II – perigo de vida; III – debilidade permanente de membro, sentido ou função; IV – aceleração de parto: Pena – reclusão, de um a cinco anos.” A lesão corporal de natureza gravíssima está prevista no § 2º do art. 129 do Código Penal e resulta da:
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2.2 Síntese
26 “I – incapacidade permanente para o trabalho; II – enfermidade incurável; III – perda ou inutilização do membro, sentido ou função; IV – deformidade permanente.” O crime de lesão corporal grave são aquelas lesões que são as lesões de vulto, grandes, ponderáveis.
Exercícios 14. (Defensor Público da União – 2010) Para a configuração da agravante da lesão corporal de natureza grave em face da incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias, não é necessário que a ocupação habitual seja laborativa, podendo ser assim compreendida qualquer atividade regularmente desempenhada pela vítima. 15. (Agente Federal da Polícia Federal – 2004) Em cada um dos itens seguintes, é apresentada uma situação hipotética, seguida de uma assertiva a ser julgada. Vítor desferiu duas facadas na mão de Joaquim, que, em consequência, passou a ter debilidade permanente do membro. Nessa situação, Vítor praticou crime de lesão corporal de natureza grave, classificado como crime instantâneo.
3. Lesão Corporal Grave – Antecipação do Parto, Incapacidade Permanente e Enfermidade Incurável
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3.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordadas as lesões corporais, crimes previstos no art. 129 do Código Penal. Será vista a figura da lesão corporal gravíssima, prevista no § 2º, do art. 129. A rubrica do artigo não traz a denominação “gravíssima”, porém, é usual na doutrina e na jurisprudência o uso sistemático desta terminologia.
3.2 Síntese De acordo com o inciso IV, § 1º, do art. 129 do Código Penal: “Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: § 1º Se resulta:
27 IV – aceleração de parto: Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos.” É indispensável do ponto de vista médico legal ou jurídico, que o produto da concepção venha à luz com vida. Se o feto morrer, o evento será o aborto, previsto no § 2º. A perícia deverá ser realizada tendo o vista a gestante e o feto. No feto, deverá ser provado que é prematuro e que nasceu vivo. O crime de lesão corporal de natureza gravíssima tem suas hipóteses reunidas no § 2º; são as espécies que pelo maior dano vital merecem retribuição penal mais elevada. São elas: I – incapacidade permanente para o trabalho; II – enfermidade incurável; III – perda ou inutilização do membro, sentido ou função; IV – deformidade permanente; V – aborto. A incapacidade permanente para o trabalho, constante do inciso I, é o estado de quem é ou está incapaz de realizar o trabalho. A impossibilidade deverá ser permanente. Entende-se por trabalho a atividade que o indivíduo exerce conscientemente para fins econômicos. Trabalho que deve ser honesto e lícito. O inciso II traz a enfermidade incurável, que é a doença irremediável, necessita existir séria alteração na saúde. Tem como pressupostos: a) está implícita a incurabilidade, pois é um fato consolidado; b) está explícita que é a falta ou perturbação de uma ou mais funções, isto é, é a alteração ou abolição definitiva de uma ou mais funções, seja de natureza congênita ou não; c) está explícita que apesar do transtorno da função ou das funções, goza a pessoa de relativo grau de saúde.
16. (Magistratura – SP – 2000) Pode-se aceitar como configurada a debilidade permanente de membro se, em decorrência da lesão corporal sofrida, a vítima: a) Sofre paralisia de um braço; b) Perde um dedo da mão; c) Perde uma das mãos; ou d) Perde totalmente um dos braços.
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Exercício
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4. Lesões Corporais Gravíssimas 4.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os crimes de lesões corporais, previstos no § 2º, do art. 129 do Código Penal, sendo especificamente estudadas neste capítulo as hipóteses de lesão corporal gravíssima, nas figuras dos seus incisos III, IV, quais sejam, as figuras da perda ou inutilização do membro, sentido ou função, e o inciso IV traz a hipótese de deformidade permanente.
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4.2 Síntese O presente capítulo teve como objetivo o estudo do crime de lesão corporal de natureza gravíssima. As hipóteses previstas nos incisos III e IV cuidam das figuras da perda ou inutilização do membro, sentido ou função e, ainda, a deformidade permanente. O inciso III do § 2º do art. 129, menciona como resultados a perda ou inutilização do membro, sentido ou função. Essa perda tem o sentido de ablação, ou seja, a mutilação ou amputação de um membro, sentido ou função. A mutilação seria a hipótese causada por uma violência, e a amputação por aquela hipótese causada por uma cirurgia. A simples debilidade de membro, sentido ou função não constitui a lesão gravíssima deste inciso III. Foi vista ainda a hipótese de cirurgia de mudança de sexo no transexual, não sendo considerada pela doutrina, tal perda de membro como uma lesão corporal gravíssima, pela evolução dos costumes e o consentimento do ofendido. Em relação à cirurgia para mudança de sexo, ela é admitida pelo desenvolvimento da medicina. Percebeu-se que essa cirurgia traz grande melhoria na vida da transexual. Por fim, o inciso IV traz a hipótese de deformidade permanente. No aspecto objetivo, é o dano estético visível, duradouro e passível de causar vexame. Deformar significa alterar a forma original e configura-se quando ocorre a modificação duradoura de uma parte do corpo humano da vítima. É posição majoritária ser a lesão visível e irreparável, e as condições da vítima devem ser levadas em consideração. Ex.: cicatrizes de larga extensão, perda de orelha, mutilação de nariz. Em relação ao inciso V, cuida da possibilidade de aborto preterintencional, quando o agente quer apenas causar lesões corporais que causam o aborto. Se o agente deseja o aborto ou assume o risco de produzi-lo, responde pelo crime de aborto em concurso com delito de lesões corporais, com uma pena maior do
29 que a prevista para essa hipótese do inciso V. Portanto, o que está em questão é o dolo do agente. Se o dolo for o de causar o aborto, não há que se falar no inciso V.
Exercício 17. (Assessor Jurídico TJ – PI – 2010) João, com intenção de matar, agrediu José a golpes de faca, ferindo-o no abdome. Atendido por terceiros, José foi levado a um hospital. Quando estava sendo medicado, ocorreu um incêndio no hospital e José morreu queimado. Nesse caso, João responderá por: a) Lesões corporais leves. b) Lesões corporais graves. c) Homicídio doloso. d) Tentativa de homicídio. e) Homicídio culposo.
5. Lesão Corporal Seguida de Aborto I 5.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordadas os crimes de lesões corporais, previstos no § 2º, do art. 129 do Código Penal, sendo especificamente estudadas neste capítulo as hipóteses de lesão corporal gravíssima, nas figuras do seu inciso V, que cuida do aborto.
O crime de aborto qualificado nada mais é que um crime qualificado pelo resultado. O art. 129 do Código Penal prevê os crimes de lesão corporal de natureza gravíssima, na sua figura qualificada pelo aborto (inciso V). Temos neste inciso uma hipótese de crime preterdoloso (com o dolo na conduta antecedente e culpa na conduta consequente). A figura preterdolosa foi criada pelo legislador com o intuito de encontrar uma pena intermediária para esses casos dramáticos. Vejamos o art. 127 do Código Penal: “As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em conseqüência do aborto ou dos
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5.2 Síntese
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meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.” O art. 129 prevê a lesão corporal, propriamente dita, agravada pela figura do § 2º, inciso V, do art. 129, em que está previsto que a pena da lesão corporal será aumentada caso resulte aborto, com pena de reclusão de 2 a 8 anos, ao contrário da figura preterdolosa do art. 127, no qual há dolo na prática do aborto e culpa na eventual lesão corporal ou morte. Vejamos o art. 44 do Código Penal: “As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II – o réu não for reincidente em crime doloso; III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.” O sursis, suspensão condicional da pena, admite a possibilidade de sua aplicação nesses casos e não se refere ao crime ser cometido com violência ou grave ameaça. Vejamos o art. 77 do Código Penal: “A execução da pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos, poderá ser suspensa, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que: I – o condenado não seja reincidente em crime doloso; II – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício; III – não seja indicada ou cabível a substituição prevista no art. 44 deste Código. § 1º A condenação anterior a pena de multa não impede a concessão do benefício. § 2º A execução da pena privativa de liberdade, não superior a quatro anos, poderá ser suspensa, por quatro a seis anos, desde que o condenado seja maior de setenta anos de idade, ou razões de saúde justifiquem a suspensão.”
Exercício 18. (Ministério Público – DF – 2003) Pode o Magistrado conceder sursis num processo, sabedor que já fora concedido sursis ao mesmo sentenciado em outro processo? a) Tudo dependerá de que tipo de delito o réu praticou. b) Não pode, eis que o sursis só é concedido a réus primários.
31 c) Pode, desde que preenchidos os requisitos previstos no Código Penal. d) Não pode, tendo em vista que só compete ao Juiz das Execuções Criminais a concessão do sursis.
6. Lesão Corporal Seguida de Aborto II 6.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os crimes de lesões corporais, na hipótese prevista no § 3º, do Código Penal, qual seja, a lesão corporal seguida de morte. Também será vista mais profundamente a questão do preterdolo.
O crime de lesão corporal seguida de morte é um típico crime preterdoloso, ou seja, com dolo no antecedente e culpa no consequente. Diz o § 3º o seguinte: Lesão corporal seguida de morte. Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo. Pena – reclusão, de quatro a doze anos. O crime da lesão corporal seguida de morte trata-se, em verdade, de um homicídio preterdoloso ou preterintencional; as duas denominações estão corretas. Então, resumidamente, a lesão inicial é punida a título de dolo, enquanto o resultado que qualifica o comportamento inicial é praticado mediante culpa, no sentido de imprudência, negligência ou imperícia, conforme previsão do art. 19 do Código Penal. Os crimes preterdolosos são os crimes mistos, pois o agente é punido a título de dolo e de culpa. Também é sancionado por culpa por ter causado outro resultado além do que desejava. A lesão corporal seguida de morte é o melhor exemplo, pois o agente é punido pela conduta dolosa, a lesão, e pelo resultado culposo, a morte. No dolo direto, a vontade do agente em busca do resultado criminoso é retilínea. Se o agente quer matar a vítima, ele age para que isso ocorra. Já no dolo eventual, o agente visa um resultado, mas assume o risco de produzir outro resultado, não o quer, mas assume o risco, é indiferente. Ex.: racha. O agente que pratica o homicídio decorrente de racha, é indiferente às pessoas que estão assistindo. Na culpa consciente, o agente não deseja o resultado, embora o vislumbre, esperando ser possível evitá-lo.
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6.2 Síntese
32 Na culpa inconsciente, o agente quer atingir determinado resultado, mas não vislumbra o que pode acontecer. O art. 18 do Código Penal prevê: “Diz-se o crime: Crime doloso (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.07.1984) I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; Crime culposo II – culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. Parágrafo único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.” A ação penal será pública incondicionada, mas de competência do Juiz singular, ou seja, nessa hipótese, apesar do evento morte, o delito não será julgado pelo Tribunal do Júri.
Exercício 19. (Magistratura – SP – 2006) Ao tipificar o crime de “lesão corporal seguida de morte”, o art. 129, § 3º, do Código Penal (Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo) contempla: a) Uma hipótese exclusiva de crime culposo. b) Uma forma exclusiva de dolo direto. c) Uma forma exclusiva de dolo eventual. d) Uma forma autenticamente preterdolosa.
7. Hipóteses de Diminuição de Pena e Lesão Corporal Privilegiada
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7.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os crimes de lesões corporais, nas hipóteses previstas no § 4º, do Código Penal, qual seja, a lesão corporal privilegiada, além das hipóteses de substituição de pena, previstas no § 5º.
7.2 Síntese O crime de lesão corporal privilegiada previsto no § 4º diz que se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob
33 o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. E diz ainda o § 5º: “O juiz, não sendo graves as lesões, pode ainda substituir a pena de detenção pela de multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis: I – se ocorre qualquer das hipóteses do parágrafo anterior; II – se as lesões são recíprocas.” O texto legal é idêntico ao referente ao homicídio privilegiado, previsto no art. 121, § 1º. O relevante valor social leva em consideração o interesse de ordem coletiva. Para o direito, relevante valor é um valor importante para a sociedade, tal como o patriotismo, lealdade, inviolabilidade. O relevante valor moral já é algo mais individual. Vejamos o art. 65 do Código Penal: “São circunstâncias que sempre atenuam a pena: (...) III – ter o agente: a) cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral; (...) c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima; (...) e) cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou, além da violenta emoção, que é chamada na doutrina de “túnel da emoção”, apenas se caracterizando após a injusta provocação da vítima.”
20. (Ministério Público Estadual – PE – 2002) Francisco teve seu carro furtado. Soube, por testemunhas, que o autor da subtração foi Fernando. No dia seguinte, localizou-o numa via pública do bairro, dirigindo o veículo subtraído, e o abordou. Fernando desferiu-lhe vários golpes com uma barra de ferro, causando-lhe ferimentos graves, deixando, a seguir, o local com o automóvel que subtraíra. Diante disso, Fernando cometeu crime de: a) Furto e crime de lesões corporais graves, em concurso material. b) Roubo impróprio. c) Roubo qualificado pelo resultado, em virtude de ter resultado lesões corporais graves. d) Furto tentado e crime de lesões corporais graves, em continuação. e) Roubo simples e crime de lesões corporais graves, em concurso material.
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Exercício
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8. Lesão Corporal Culposa 8.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os crimes de lesões corporais, na hipótese prevista no § 6º, do Código Penal, qual seja, a lesão corporal culposa.
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8.2 Síntese A lesão corporal culposa, prevista no § 6º do art. 129, prevê a pena de detenção, de dois meses a um ano quando a lesão for culposa. A lesão culposa é, em verdade, a figura do caput (ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem), embora com outro elemento subjetivo: a culpa. É um tipo aberto que depende da interpretação do juiz para poder ser aplicado. A culpa, conforme o art. 18, II do Código Penal, é constituída por imprudência, negligência ou imperícia. Portanto, lesionar alguém por imprudência, negligência ou imperícia concretiza esse tipo penal incriminador. O conceito de culpa é o comportamento voluntário desatencioso voltado a um determinado objetivo lícito ou ilícito, embora produza resultado ilícito, não desejado, mas previsível, que podia ter sido evitado. O dolo é a regra, a culpa é exceção e precisa vir delineada no tipo penal. Vejamos o inciso II do art. 33 do Código Penal Militar. “Diz-se o crime: Culpabilidade I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; II – culposo, quando o agente, deixando de empregar a cautela, atenção, ou diligência ordinária, ou especial, a que estava obrigado em face das circunstâncias, não prevê o resultado que podia prever ou, prevendo-o, supõe levianamente que não se realizaria ou que poderia evitá-lo. Excepcionalidade do crime culposo Parágrafo único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente. Imprudência é a forma ativa de culpa, comportamento sem cautela, realizado com precipitação ou insensatez. Ex.: dirigir em alta velocidade, dentro da cidade, onde há pessoas circulando. Negligência é caracterizada como forma passiva de culpa. Assume atitude inerte por puro descuido ou desatenção, quando tem o dever de cuidado objetivo. Ex.: deixar arma de fogo ao alcance de criança.
35 Imperícia é a imprudência no campo técnico, pressupondo um ofício ou uma profissão. Incapacidade ou falta de conhecimento necessário para o exercício. Ex.: do médico que deixa de tomar a cautela em relação à assepsia em cirurgia. Na culpa consciente, o agente quer um determinado resultado, mas apesar de visualizar outro resultado possível, não o deseja. Não quer que o segundo resultado ocorra. Na culpa inconsciente, o agente quer atingir determinado resultado e não imagina outra possibilidade, embora seja previsível.
Exercício 21. (Ministério Público – MG – 2009) Marque a única alternativa CORRETA: No meio de uma briga em uma boate, João bateu, propositadamente, seu copo de uísque no rosto de Zé, vindo a cortar-lhe o rosto por 14 cm, além de perfurar seu olho, diminuindo-lhe a visão. O Ministério Público ofereceu denúncia contra João por crime de lesão grave devido a debilidade permanente da visão. Atuando como advogado do assistente do Ministério Público, qual deveria ser a correta capitulação deste delito? a) Tentativa de homicídio doloso, pois um copo de vidro é um objeto reconhecidamente letal. b) A capitulação está correta, pois existem dois olhos, logo seu cliente não perdeu a visão, tendo-a apenas debilitada. c) Lesão corporal de natureza gravíssima, considerando a deformidade permanente acarretada por um corte de 14 cm no rosto de seu cliente. d) Lesão de natureza grave, mas caracterizada pelo afastamento das ocupações habituais por mais de 30 dias, pois qualquer pessoa que tem um corte deste tamanho no rosto fica sem poder tomar sol por mais de 30 dias.
9.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordadas a hipótese de lesão corporal culposa no trânsito (Lei nº 9.503/1997), as hipóteses que aumentam a pena do delito de lesão corporal (art. 129, § 7º), e ainda, a figura do 129, § 9º, trazida pela Lei Maria da Penha, a qual cuida da violência doméstica.
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9. Lesão Corporal Culposa no Trânsito e Violência Doméstica
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9.2 Síntese A lesão corporal culposa praticada no trânsito, prevista no nosso Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/1997), não mais se aplica, portanto, o tipo penal do art. 129, § 6º, à lesão corporal cometida na direção de veículo automotor, pois o Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/1997), no seu art. 303, estipulou um tipo incriminador específico. A partir de 2001, com a Lei nº 10.259/2001 (Juizados Especiais Federais), a qual ampliou o conceito de crime de menor potencial ofensivo, os delitos de lesão corporal no trânsito e participação em “racha” transformaram-se em infrações de menor potencial ofensivo (pena máxima não superior a 2 anos). A ação penal para o homicídio culposo será pública condicionada, de acordo com a regra do art. 88 da Lei nº 9.099/1995. Para os delitos de embriaguez ao volante, por força do art. 291, parágrafo único do Código de Trânsito Brasileiro, assim, apesar de ser um crime de competência do juízo comum, pena de 3 anos, é possível o instituto da transação penal. Em relação ao delito de lesão corporal culposa, é admitido o instituto da lesão composição civil, art. 74 da Lei nº 9.099. Em relação o § 8º, trata-se de uma causa extintiva de punibilidade, que é o conhecido perdão judicial. O perdão judicial vale tanto para o homicídio, como para a lesão corporal, desde que ambos na forma culposa. O juiz pode conceder o perdão judicial, se as consequências da infração atingir o agente de forma grave, que a sanção penal se torne desnecessária. O § 8º constitui a aplicação legal, dado o princípio de que o homem é punido pelo próprio fato que ele praticou. Deve haver entre o agente e a vítima vínculo afetivo com razoável expressão. Com o advento da Lei nº 9.099/1995, a lesão corporal culposa e a lesão corporal culposa e a dolosa leve passaram a depender de representação. Nos termos do § 9º, em face a Lei Maria da Penha, Lei nº 11.340/1906, a qual cuida da questão da violência doméstica, e altera a questão da ação pública condicionada à representação, quando a agressão se enquadrar nos termos da lei. A violência contra a mulher é sinônimo de violência doméstica. Antes da Lei Maria da Penha, os crimes cometidos pelos maridos contra as mulheres eram julgados pelos Jecrim, como crimes de menor potencial ofensivo. A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) veda que os crimes cometidos contra as mulheres por seus maridos, companheiros e namorados sejam julgados pelos Juizados Especiais Criminais, e tratados como crimes de “menor potencial ofensivo”.
37 A partir dessa lei, o crime de estupro praticado pelo marido em ambiente familiar, será julgado pelo juizado de violência doméstica contra a mulher, enquanto que o mesmo crime praticado por um colega de trabalho num ambiente de trabalho será julgado pela justiça comum. Sexo refere-se à diferença biológica, e gênero compreende a série de significados culturais atribuídos a essas diferenças biológicas. De acordo com o art. 5º, parágrafo único da Lei Maria da Penha, as relações homoafetivas entre mulheres estão amparadas pela lei. As relações entre pessoas do sexo masculino, mas com gênero feminino, também não estão excluídas da Lei Maria da Penha.
Exercício 22. (Delegado de Polícia – DF – 2005) Quando conduzia veículo automotor, sem culpa, Fulano atropela um pedestre, deixando de prestar-lhe socorro, constituindo tal conduta, em tese, a prática de: a) Omissão de socorro, prevista no art. 135 do Código Penal. b) Lesão corporal culposa, com o aumento de pena previsto no art. 129, § 7º, do Código Penal. c) Expor a vida de outrem a perigo, previsto no art. 132, do Código Penal. d) Omissão de socorro, prevista no art. 304, da Lei nº 9.503/1997. e) Lesão corporal culposa na condução de veículo automotor, com o aumento de pena previsto no art. 303, parágrafo único, da Lei nº 9.503/1997.
10. O Crime de Lesões Corporais Perante a Lei nº 12.720/2012
Nesta unidade, estudaremos os crimes de lesões corporais perante nova Lei nº 12.720/2012.
10.2 Síntese Essa lei cuida do extermínio de seres humanos, e alterou apenas 3 artigos do Código Penal, o 121, o 129 e o 288.
Direito Penal – Parte Especial
10.1 Apresentação
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Direito Penal – Parte Especial
Para compreender a alteração, é necessário compreender as alterações trazidas ao homicídio pela mesma lei. A lesão corporal prevista no art. 129 do Código Penal tem no seu caput a sua figura simples. Vejamos: “Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena – detenção, de três meses a um ano.” A nova lei em seu art. 3º alterou o § 7º do art. 129 do Código Penal, que cuida do aumento da pena para esse crime. O texto anterior dizia o seguinte: “§ 7º Aumenta-se a pena de um terço, se ocorrer qualquer das hipóteses do art. 121, § 4º.” A nova redação diz o seguinte: “§ 7º Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se ocorrer qualquer das hipóteses dos §§ 4º e 6º do art. 121 deste Código.” O § 6º do artigo anterior também foi criado pela nova lei, e traz a seguinte redação: “§ 6º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio.” Quando falamos em milícia privada, entende-se um grupo armado de pessoas, civis ou não, tendo como finalidade anunciada, devolver a segurança e a paz retiradas das comunidades mais carentes. Para tanto, mediante coação, os agentes ocupam o espaço territorial e a proteção oferecida nesse espaço, ignoram o monopólio estatal de controle social, valendo-se da violência ou grave ameaça para atingir os seus objetivos. Por grupo de extermínio entende-se a reunião de pessoas, matadores, justiceiros, tendo como finalidade a matança generalizada de pessoas, supostamente etiquetadas como marginais ou perigosas. Nesse sentido, quando esses termos se relacionam com a lesão corporal, esses grupos podem querer impor seu poder paralelo por meio de violência, não de morte, o que majorará a pena. Essa nova lei é incriminadora, sendo, portanto, irretroativa.
Capítulo 3
Da Periclitação da Vida e da Saúde
1. Conceito de Crimes de Perigo 1.1 Apresentação Nesta unidade, será abordada matéria relativa aos crimes de periclitação da vida e da saúde. Além do estudo específico e detalhado dos crimes previstos no Capítulo 3, do Título 1, da Parte Especial do Código Penal, onde estão previstos os delitos que cuidam da periclitação da vida e da saúde; também será abordado o conceito de crime de perigo, bem como aspectos da Lei nº 9.099/1995 relativos à matéria.
1.2 Síntese Os crimes de periclitação da vida e da saúde constituem infrações subsidiárias em face dos delitos de dano. São os chamados crimes de perigo. Periclitar significa justamente colocar em perigo. Em regra, nos casos de crime
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Direito Penal – Parte Especial
de perigo, o agente não deseja a produção do dano, ele apenas quer o perigo, a mera probabilidade de dano. Os crimes de perigo podem ser subdivididos em perigo concreto e perigo abstrato. Quando falamos em crimes de perigo concreto, devemos considerar a probabilidade da ocorrência de um dano que necessita ser devidamente provada pelo órgão acusador, ou seja, o crime de perigo concreto necessita ser provado, pois nele o perigo não se presume. Vejamos o art. 130 do Código Penal, que trata do crime de perigo de contágio venéreo: “Expor alguém, por meio de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso, a contágio de moléstia venérea, de que sabe ou deve saber que está contaminado: Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa. § 1º Se é intenção do agente transmitir a moléstia: Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa. § 2º Somente se procede mediante representação.” A grande maioria da doutrina não considera a Aids uma doença venérea, uma vez que pode ser transmitida por outros meios que não a relação sexual. Entende-se que a segunda parte do caput trata-se de dolo eventual, e não de culpa. O consentimento do ofendido faz com que o fato seja típico, mas não antijurídico. A Lei nº 9.099/1995 criou os Juizados Especiais Criminais. Todos os crimes previstos nesse Capítulo III, do Título II da Parte Especial do nosso Código Penal Brasileiro, são passíveis de eventuais “benefícios” legais previstos na Lei nº 9.099/1995. Em alguns casos, caberá a suspensão condicional do processo, quando a pena mínima não ultrapassar 1 ano, enquanto para outros caberá a transação penal, quando a pena máxima não “ultrapassar” 2 anos. Com o advento da Lei nº 10.259/2001, houve uma ampliação do conceito de crime de menor potencial ofensivo, alcançando os crimes cuja pena máxima não seja superior a dois anos.
Exercício 23. (Magistratura – SP – 2002) Com relação ao delito de tortura, previsto na Lei nº 9.455/1997, assinale a alternativa correta. a) A tortura infligida apenas por sadismo ou vingança tipifica o crime de tortura. b) O crime de tortura distingue-se do delito de maus-tratos pela natureza do dolo que, em tese, neste é sempre de perigo.
41 c) A Lei de Tortura, a exemplo da Lei dos Crimes Hediondos, veda a concessão de indulto e anistia. d) Quando praticado contra velho ou enfermo, constitui causa de aumento de pena prevista na Lei de Tortura.
2. Perigo de Contágio de Moléstia Grave 2.1 Apresentação Nesta unidade, será abordada matéria relativa aos crimes de periclitação da vida e da saúde, com ênfase especial nos delitos de perigo de contágio de moléstia grave (art. 131); perigo para a vida ou saúde de outrem (art. 132); abandono de incapaz (art. 133) e exposição ou abandono de recém-nascido (art. 134).
Os crimes de periclitação da vida e da saúde, sendo o delito previsto no art. 131 do Código Penal, perigo de contágio de moléstia grave, sendo a incolumidade física da pessoa o objeto jurídico protegido por este artigo. Vejamos o mencionado artigo: “Art. 131. Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio: Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.” Aqui não se fala em moléstia venérea, mas sim em moléstia grave. Entretanto, também estão incluídas as doenças venéreas quando a exposição ao perigo de contágio não ocorrer por meio de ato libidinoso ou sexual. Quando a moléstia for venérea, e tiver sido transmitida por contato sexual, caímos no artigo anterior (art. 130), que trata justamente dessas hipóteses. Esse é um tipo penal aberto, ou seja, “moléstia grave” é um conceito médico, podendo o Juiz interpretar o conceito de “moléstia grave” ou “doença grave” como bem entender. Outro delito previsto no art. 132. Vejamos: “Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente: Pena – detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.” Somente se utiliza a figura do art. 132 quando outra, mais grave, deixa de se concretizar. Caso a vítima venha a morrer em razão da exposição descrita neste artigo, o crime será de homicídio culposo (art. 121, § 3º).
Direito Penal – Parte Especial
2.2 Síntese
42 O delito de abandono de incapaz, do art. 133, cuida da conduta de “Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono.” A pena prevista é de detenção de seis meses a três anos. Vejamos o artigo e seus parágrafos: “Art. 133. Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono: Pena – detenção, de seis meses a três anos. § 1º Se do abandono resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – reclusão, de um a cinco anos. § 2º Se resulta a morte: Pena – reclusão, de quatro a doze anos. Aumento de pena § 3º As penas cominadas neste artigo aumentam-se de um terço: I – se o abandono ocorre em lugar ermo; II – se o agente é ascendente ou descendente, cônjuge, irmão, tutor ou curador da vítima. III – se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos.” A diferença entre as expressões cuidado, guarda, vigilância ou autoridade se dá da seguinte forma: O delito de exposição ou abandono de recém-nascido (art. 134), cuida da conduta de “Expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria”. Este delito apenas se configura quando a mãe efetivamente abandona ou expõe o recém-nascido, levando-o a ambiente hostil, colocando-o em perigo ao desgrudar-se dele. Portanto, deverá haver a necessária separação física entre o agente (no caso, a mãe, por se tratar de crime próprio) e a vítima. Se a mãe abandona ou expõe, mas fica vigiando a distância, não haverá crime.
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Exercício 24. (Magistratura – SP – 2000) De acordo com a Lei nº 9.099/1995, nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou superior a um ano, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor uma medida, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime. O texto refere-se a medida de: a) tTrancamento da ação penal. b) Livramento condicional. c) Segurança. d) Suspensão do processo, por 2 a 4 anos.
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3. Omissão de Socorro, Maus-tratos e Rixa 3.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados conceitos sobre os crimes de omissão de socorro, maus-tratos e também crime de rixa, previsto no art. 137 do Código Penal. Desta forma, ela encerrará o estudo do Capítulo 3, que cuida dos crimes de periclitação da vida e da saúde, trazendo ainda, nesta unidade, o delito de rixa, que é o único crime constante no Capítulo 4 da Parte Especial do Código Penal.
O crime de omissão de socorro está previsto no art. 135 do Código Penal. Vejamos: “Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública: Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa. Parágrafo único. A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.” O crime de omissão de socorro, previsto no art. 135 do Código Penal, cuida da conduta de deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo, ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública. A omissão de socorro só é punível quando for possível prestar assistência ou pedir socorro sem risco pessoal. O tipo penal do art. 135 possui dois núcleos: “deixar” e “pedir”. A ordem de utilização dos dois núcleos é bem clara: em primeiro lugar, podendo fazê-lo sem risco pessoal, deve o sujeito prestar socorro à vítima. Não conseguindo prestar a assistência necessária ou estando em risco pessoal, deve chamar a autoridade pública. Nesses casos, a autoridade pública que deve ser acionada é a polícia ou o corpo de bombeiros. O risco pessoal, moral ou patrimonial não afasta a incriminação. Entretanto, caso o sujeito não possa pedir o auxílio da autoridade policial por risco pessoal, poderá alegar o estado de necessidade, previsto no art. 24 do Código Penal.
Direito Penal – Parte Especial
3.2 Síntese
Direito Penal – Parte Especial
44 Vejamos o art. 13 e seu § 2º, do Código Penal: “O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) (...) § 2º A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem: a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.” O crime de maus-tratos (art. 136) traz uma particularidade relacionada ao fato de que o sujeito passivo, ou seja, a pessoa que sofre os maus-tratos, está sob a responsabilidade do agente, quando então lhe foi confiada a sua educação, ensino, tratamento ou custódia. Vejamos o referido artigo: “Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina: Pena – detenção, de dois meses a um ano, ou multa. § 1º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – reclusão, de um a quatro anos. § 2º Se resulta a morte: Pena – reclusão, de quatro a doze anos. § 3º Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (catorze) anos.” Se a conduta não tem outro objetivo senão o de fazer sofrer, pode ser considerado tortura. É, portanto, um crime de perigo concreto. A rixa está prevista no art. 137 do Código Penal. Vejamos: “Participar de rixa, salvo para separar os contendores: Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 2 (dois) meses, ou multa. Parágrafo único. Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza grave, aplica-se, pelo fato da participação na rixa, a pena de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.” Tal artigo cuida da conduta de “participar de rixa, salvo para separar os contendores”. Portanto, pode-se definir o crime de rixa como uma briga, uma desordem ou um motim, caracterizada, neste contexto, pela existência de pelo menos 3 pessoas valendo-se de agressões mútuas de ordem material (e não apenas verbal). É um crime plurissubjetivo, ou seja, que somente pode ser praticado por mais de duas pessoas.
45
Exercício
Direito Penal – Parte Especial
25. (Ministério Público Estadual – PB – 2010) Assinale a alternativa correta: a) Nos crimes contra a honra, se a vítima é maior de sessenta anos ou portadora de deficiência, a pena deve ser aumentada de um terço. b) O Código Penal Brasileiro admite a calúnia e a difamação contra os mortos, já que a ofensa feita à honra objetiva destes atinge, em verdade, sua memória, cuja proteção interessa sobremaneira aos seus parentes. c) A ocorrência de lesão corporal de natureza grave ou morte qualifica o delito de rixa, respondendo por ela, inclusive, a vítima da lesão grave. d) Assim como no sequestro e cárcere privado, no crime de redução à condição análoga à de escravo, o consentimento do ofendido, se válido e anterior ou, no mínimo, concomitante à ação delitiva, atua como causa excludente da ilicitude. e) Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência, a ação penal é pública incondicionada
Capítulo 4
Crimes contra a Honra
1. Crimes contra a Honra – Introdução 1.1 Apresentação Nesta unidade, iniciaremos o estudo dos crimes contra honra.
1.2 Síntese A honra pode ser objetiva: reputação social, atributos morais, intelectuais ou físicos, o que as pessoas pensam a nosso respeito ou subjetiva: autorrespeito, o que nós pensamos de nós mesmos. No crime de calúnia, protege-se a honra objetiva, bem como no crime de difamação. No crime de injúria, protege-se a honra subjetiva. O consentimento do ofendido exclui o crime, por ser a honra bem jurídico disponível. Quando isso ocorre, de acordo com Cesar Bittencourt exclui-se a
47 tipicidade; já conforme Damásio, exclui-se a ilicitude. Já outros doutrinadores adeptos da Teoria Conglobante defendem que se exclui a tipicidade material. Há crimes contra a honra previstos em legislação esparsa, como no Código Eleitoral, na Lei de Segurança Nacional e no Código Penal Militar. O STF entendeu que a Lei de Imprensa não foi recepcionada pela Constituição, portanto, não se aplica mais seus dispositivos, e sim o Código Penal. A Imunidade Parlamentar está prevista no art. 53 da CF. Vejamos: “Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.” Para haver a imunidade parlamentar deve ocorrer a pertinência temática. O STF entende que a ofensa proferida dentro do Congresso é imune, mas, fora, não. Súmula nº 245 do STF está desatualizada, pois hoje há 2 posicionamentos. Segundo o STF, quando ocorre a imunidade parlamentar, se trata de uma hipótese de exclusão da tipicidade. Se o parlamentar não pratica o fato típico, aquele que é partícipe também não responde por nada.
Exercícios 26. (Ministério Público – DF – 2009) Calúnia atinge a honra objetiva, enquanto a difamação e injúria atingem a honra subjetiva. 27. (Magistratura TRT 1ª Região 2012 – Cespe) O objetivo único jurídico da injúria é a honra objetiva da vítima.
2. Elementos Objetivos e Diferenciações 2.1 Apresentação Estudaremos os tipos objetivos dos crimes contra a honra.
A calúnia é a imputação de fato definido como crime a outrem. Fato específico, determinado, considerado crime. Deve haver a elementar falsamente: fato ou autoria falsa. A difamação é a imputação de fato ofensivo à reputação da vítima, que não é considerado crime. Esse fato pode ser verdadeiro ou falso, definido como contravenção penal, com ofensa à honra objetiva. Ocorre quando o difamante quer ofender a honra alheia.
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2.2 Síntese
48 Á injúria não se imputa fato, há a atribuição de qualidade negativa. O fato deve ser vago impreciso, com adjetivos negativos. Falar que outra pessoa é corrupta, não é calúnia e sim injúria. Qualidade negativa são adjetivos. Embora na calúnia exista elementar falsamente, em alguns casos, mesmo se o fato imputado for verdadeiro, haverá a calúnia.
Exercício 28. A calúnia consiste em imputar, falsamente a alguém, fato definido como crime ou contravenção. 29. Para caracterização do delito de difamação, é indiferente que a imputação seja falsa ou verdadeira. 30. A distinção entre injúria e difamação é que nesta o agente atribui fato ofensivo à reputação da vítima.
3. Tipo Objetivo 3.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos as peculiaridades dos crimes contra a honra.
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3.2 Síntese A calúnia, imputação de fato criminoso a alguém, de acordo com o § 1º do art. 138 do Código Penal, também responde pelo crime aquela pessoa que tendo consciência da calúnia, divulga a outros. Formas de calúnia: I – explícita; II – implícita ou equívoca. Não imputa diretamente o fato; III – reflexa: também imputa crime a outra pessoa, envolvendo reflexamente outra pessoa no suposto crime. Na injúria, deve ser imputada uma qualidade negativa a outrem, e o fato pode ser impreciso, genérico. Além de palavras, pode haver outro meio de cometer injúria, pela agressão (tapa na cara com intuito de humilhar). Ofende além da honra, a integridade corporal. Além da injúria, responde pela lesão corporal. Na injúria, pode haver imputação de fato determinado considerado crime, desde que somente na presença da vítima, uma vez que é necessário, que para
49 que ocorra calúnia ou difamação, outras pessoas devam saber. Neste caso, a ofensa é apenas à honra subjetiva, mesmo que o fato seja falso A injúria real ofende a honra e integridade corporal. De acordo com o art. 140, § 2º, a injúria consiste em violência ou vias de fato que por sua natureza ou pelo meio empregado se considera aviltantes. Pena: detenção de 3 meses a 1 ano e multa além da pena correspondente à violência. É um crime de injúria e lesão corporal. Há casos de violências que respondem como injúuria e crime autônomo. Se a injúria for real, há pena bis in idem.
Exercício 26. Uma pessoa, em ambiente reservado, disse a um funcionário público: “Eu sei que você recebeu dinheiro para arquivar um procedimento.” Qual é o crime cometido?
4. Sujeitos dos Crimes 4.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos a injúria preconceituosa e analisaremos quais são os sujeitos dos crimes contra a honra.
A injúria preconceituosa está prevista no art. 140, § 3º, do CP. É a injúria que consiste na utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência. Injúria preconceituosa não é a mesma coisa Racismo. A injúria preconceituosa atinge a honra subjetiva e é prescritível, segundo o STF. O racismo promove a segregação, ofende a dignidade humana e atinge a coletividade. Sujeitos dos crimes contra a honra: I – sujeito ativo: qualquer pessoa; II – sujeito passivo: peculiaridades. A pessoa jurídica pode ser vítima de calúnia, conforme a doutrina majoritária, sim, uma vez que pode cometer crime ambiental. O STF e STJ não admitem.
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4.2 Sintese
50 Em relação à difamação a doutrina admite que a pessoa jurídica seja vítima, O STF admite; porém, o STJ não admite. A pessoa jurídica não pode ser vítima de injúria. Não há como ofender honra subjetiva de pessoa jurídica. Morto pode ser sujeito passivo de calúnia. A calúnia contra morto é punida, contudo, o sujeito passivo é o familiar. Em relação à difamação e injúria, não há dispositivo legal e não se admite. Em relação ao menor de 18 anos ou inimputável, há calúnia, de acordo com a doutrina majoritária. Em relação à difamação, pode ser sujeito passivo. Em relação à injúria, pode ser sujeito passivo, desde que tenha capacidade de entender a ofensa. Desonrados: podem ser sujeitos passivos, pois mesmo desonrados, sempre há um resquício de honra.
Exercício 32. (Ministério Público – SP – 2010) O Prefeito de uma cidade do interior de São Paulo, durante o discurso na cerimônia pública, chamou um funcionário público ali presente, sobre quem recaía suspeita de prática de ilícito penal, de negro sujo. Qual a tipicidade da conduta em face da existência de eventual suspeita de conflito aparente de normas a incidir sobre o fato?
5. Tipo Subjetivo do Crime e Tentativa de Injúria 5.1 Apresentação
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Nesta unidade, estudaremos o tipo subjetivo dos crimes.
5.2 Síntese Os elementos subjetivos do tipo são: I – dolo: consciência e vontade de estar imputando falsamente a prática de um fato definido como um crime ou fato ofensivo à reputação, ou consciência e vontade de estar ofendendo a dignidade e o decoro da vítima. II – especial: o animus, firme propósito de ofender a honra da pessoa.
51 III – animus: caluniandi, difamandi, injuriandi; IV – deve haver a intenção de ofender, se não houver intenção, mesmo ofendendo a honra, não há crime de injúria; V – deve haver o animus jocandi, criticande. De acordo com o art. 138, § 1º, responde também pelo crime de calúnia, aquela pessoa que sabendo da falsa imputação, a propala ou divulga. Para isso, exige-se o dolo direto. O crime praticado quando está com os ânimos exaltados, não comete crime contra a honra, pois não houve o firme propósito de ofender. A consumação dos crimes contra a honra se dá da seguinte forma: I – calúnia: quando um terceiro toma conhecimento; II – difamação: quando um terceiro toma conhecimento; III – injúria: quando a própria vítima toma conhecimento da qualidade negativa atribuída a ela. A tentativa de crimes contra a honra é possível se for na forma escrita. Na forma verbal, não é possível segundo a doutrina dominante. A injúria se consuma quando a própria vítima toma conhecimento. Há o posicionamento de que não há tentativa, pois a vítima tomou conhecimento. Também pode ser o caso de a vítima não tomar conhecimento, quando se configura a tentativa de injúria.
Exercício
6. Exceção da Verdade e Intimidade da Vítima 6.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos a exceção da verdade.
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33. (Magistratura – TRT 9ª Região – 2007) A calúnia é crime formal que se configura independentemente de qualquer resultado lesivo para a vítima. 34. A consumação do crime de calúnia ocorre quando a vítima por qualquer toma conhecimento da falsa imputação do crime que lhe foi feito. 35. O crime de difamação consuma-se no instante em que a própria vítima venha tomar conhecimento da ofensa rogada, não importando se ela se sentiu ofendida ou não.
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6.2 Síntese Exceção da verdade é a prova de que o ofensor disse a verdade. Se o ofensor provar que o fato criminoso é verdadeiro, ele não cometerá o crime de calúnia, uma vez que calúnia é fato falso ou de autoria falsa. De acordo com o art. 138, § 3º: “Admite-se a prova da verdade, salvo: I – se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível; II – se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141; III – se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.” Não cabe a exceção da verdade, porém, nada impede que a pessoa prove o fato criminal. Na calúnia, em regra, admite-se a exceção da verdade, exceto nos casos do § 3º do art. 138. Na difamação, a exceção da verdade só se admite em determinados casos que serão vistos mais à frente. Na injúria, não se admite exceção da verdade.
Exercício 36. Segundo o Código Penal, a chamada exceção da verdade é admitida apenas nas hipóteses de calúnia.
7. Exceção da Verdade e Exceção de Notoriedade I
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7.1 Apresentação Continuaremos analisando a exceção da verdade. A exceção da verdade na difamação está prevista no art. 139 do Código Penal. Vejamos: “A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de sua função.” No crime de difamação, o fato imputado pode ser verdadeiro ou falso.
53 O Estado tem interesse de apurar o fato praticado pelo funcionário público. Hipótese: com a prova da verdade, há absolvição. A segunda hipótese seria do exercício regular do direito. A terceira hipótese seria de atipicidade material. Na injúria, não há exceção da verdade. Não há como provar qualidades negativas, poderia ofender mais ainda a vítima. O posicionamento minoritário da doutrina quanto ao crime de calúnia, é de que não se admite a exceção da verdade, seria inconstitucional, pois estaria vedando o direito de defesa. A calúnia sobre o presidente da República, mesmo se o fato for verdadeiro, cabe exceção de notoriedade: informação generalizada, divulgada a toda população. Na injúria, não há exceção da notoriedade, uma vez que não se imputa fatos. A exceção de notoriedade está ligada ao fato imputado
Exercício 37. É admitida a exceção da verdade no crime de difamação quando o ofendido ao presidente da república e a ofensa for relacionada em razão de sua função.
8. Exceção da Verdade e Exceção de Notoriedade II 8.1 Apresentação
8.2 Síntese De acordo com o art. 140 (importante ênfase ao § 1º): “Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa. § 1º O juiz pode deixar de aplicar a pena: I – quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria; II – no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.
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Nesta unidade, abordaremos o perdão judicial na injúria.
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54 § 2º Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. § 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência. Pena – reclusão de um a três anos e multa.” O juiz pode deixar de aplicar a pena: I – quando o ofendido de forma reprovável provocou diretamente a injúria; II – no caso de retorção imediata que consiste em outra injúria quando houver provocação. Em casos de brincadeira de mau gosto, provocação, o juiz pode deixar de aplicar a pena para injúria. Se houver provocação por meio de injúria e retorção imediata, o juiz pode deixar de aplicar a pena para ambos. Não será hipótese de retorção imediata se a retorção não consistir em outra injúria, e sim a retorção consistir em calúnia ou difamação. As causas de aumento de pena nos crimes de calúnia, difamação e injúria estão no art. 141. Vejamos: “As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido: I – contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro; II – contra funcionário público, em razão de suas funções; III – na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria; IV – contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos ou portadora de deficiência, exceto no caso de injúria. Parágrafo único. Se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa, aplica-se a pena em dobro.” No caso do inciso I, se houver motivação política, aplica-se o Código de Segurança Nacional. No caso do desacato, a ofensa deve ser direta, em horário de trabalho ou não, em razão de sua função. No caso do inciso III, a própria vítima não é computada como número de pessoas que está presenciando a cena. Em relação ao inciso IV, trata-se de injúria preconceituosa. Se o crime é cometido mediante pagamento ou promessa de recompensa, aplica-se a pena em dobro.
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Exercício 38. (Magistratura TRT – MG – 2006) No crime de calúnia ou difamação contra o presidente da república ou contra chefe de governo estrangeiro, tratando-se de crime comum, incide a causa de aumento previsto no art. 141 do Código Penal. 39. As penas combinadas aos delitos contra a honra aplicam-se em dobro caso o crime tenha sido cometido mediante promessa de recompensa
9. Exclusão – Hipóteses 9.1 Apresentação Nesta unidade, abordaremos a exclusão do crime.
O crime é constituído por: – fato típico; – ilicitude; – culpabilidade. Hipóteses de exclusão da tipicidade: – o fato não seria típico pela ausência da vontade de ofender. Não haveria a tipicidade material, uma vez que a pessoa estaria permitida a praticar difamação ou injúria. Hipóteses de exclusão da ilicitude: Hipóteses de isenção de pena: As hipóteses de exclusão do crime se aplicam à injúria ou difamação. Não se aplicam à calúnia. Vejamos o art. 142 do Código Penal: “Não constituem injúria ou difamação punível: I – a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador; II – a opinião desfavorável da crítica literária, artística ou científica, salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar; III – o conceito desfavorável emitido por funcionário público, em apreciação ou informação que preste no cumprimento de dever do ofício. Parágrafo único. Nos casos dos nos I e III, responde pela injúria ou pela difamação quem lhe dá publicidade.”
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9.2 Síntese
56 O inciso I não envolve procedimentos administrativos que o advogado possa estar atuando. Nos procedimentos administrativos, a imunidade do advogado é garantida pelo estatuto da OAB. As imunidades devem ter pertinência temática, pois não são absolutas. De acordo com a doutrina antiga, o promotor tem imunidade quando for parte e não fiscal da lei. De acordo com a Lei Orgânica nº 8.625/1993, art. 41, o promotor é inviolável. O juiz de direito também tem imunidade de acordo com sua lei orgânica.
Exercício 40. Qual natureza da chamada imunidade judiciária e qual a posição dominante na jurisprudência no tocante ao seu cabimento quanto à ofensa e rogada contra o juiz?
10. Calúnia, Difamação e Injúria – Retratação, Pedido de Explicações e Ação Penal 10.1 Apresentação Nesta unidade, abordaremos a retratação e o pedido de explicações e ainda analisaremos a ação penal nos crimes contra a honra.
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10.2 Síntese Retratação é retirar o que foi dito. Ex.: ofensa com vontade de ofender: em um processo, o réu retira o que disse. É possível nos crimes de calúnia e difamação, desde que antes da sentença. A consequência da retratação é extinção da punibilidade. Trata-se de ato unilateral. Não precisa da aprovação do ofendido. Não se aplica a injúria. Só pode ocorrer em ações penais privadas. De acordo com o art. 143 do Código Penal: “O querelado que antes da sentença se retrata cabalmente da calúnia ou da difamação fica isento de pena.” O pedido de explicações está previsto no art. 144 do Código Penal, que traz a seguinte redação: “Se de referências, alusões ou frases se inferem calúnia,
57 difamação ou injúria, quem se julga ofendido pode pedir explicações em juízo; aquele que se recusa a dá-las ou a critério do juiz não as dá satisfatórias, responde pela ofensa.” Isso pode ocorrer em casos de imputar fatos de maneira difusa. Trata-se de uma medida cautelar. Existe para verificar se há provas para ingressar com ação penal, e é facultativo. O juiz não fará julgamento. Há necessidade quando houver frases obscuras, ambíguas. A ação penal nos crimes contra a honra está prevista no art. 145 do Código Penal, e traz a seguinte redação: “Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal. Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141 deste Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como no caso do § 3º do art. 140 deste Código.” A regra é a ação penal privada. Exceção: ação penal pública e incondicionada. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça no caso do inciso I do art. 141 desse Código Penal, ou seja, injúria real. A ação penal pública condicionada a representação a requisição do Ministro da Justiça, nos crimes praticados contra o presidente da República ou chefe de estado estrangeiro. Ação penal pública condicionada mediante representação do ofendido no caso do inciso II do mesmo artigo: – crime praticado contra funcionário público em razão de sua função. Ação penal pública condicionada à representação. No caso do art. 140, § 3º do Código Pena, ocorre no caso do crime de injúria preconceituosa. A injúria real com lesão corporal leve, segundo o Código Penal, trata-se de ação penal pública incondicionada.
41. Um servidor público, no exercício em razão de suas funções, teve sua honra violada, ao ser chamado por um particular de venal, corrupto e ladrão. Nessa situação, de acordo com os entendimentos do STF e STJ, o servidor público ofendido tem legitimação concorrente para a propositura da ação penal, no caso, privada.
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Exercício
Capítulo 5
Dos Crimes contra a Liberdade Individual
1. Dos Crimes contra a Liberdade Individual: Constrangimento Ilegal e Ameaça 1.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados crimes contra a liberdade individual, mais especificamente os delitos de constrangimento ilegal, previstos no art. 146 do Código Penal, e o delito de ameaça, previsto no art. 147 do mesmo Código. Também será estudado o conceito de “liberdade”.
1.2 Síntese O conceito de liberdade é filosófico que não se restringe ao direito constitucional. Segundo Cecília Meireles: “liberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém quem explique, e ninguém que não entenda.”
O art. 5º em seu caput traz a seguinte redação: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.” De suma importância também o inciso II da Carta da República, que reza que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Esse é, de fato, o pressuposto inicial para o estudo dos crimes contra a liberdade individual. Vejamos o delito de constrangimento ilegal: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda: Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa. (...) § 3º Não se compreendem na disposição deste artigo: I – a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida; II – a coação exercida para impedir suicídio.” Tal crime não se configura quando a conduta do agente estiver agasalhada por uma excludente de antijuridicidade. Nesse crime, ocorre a absorção pelos delidos mais graves. Para que ocorra o constrangimento ilegal, é preciso que a pretensão seja ilegítima. Se foi feita forçada, mas, legalmente, não é crime. É preciso que o agente exija que a vítima faça algo que legalmente não está obrigada. Em relação ao crime de ameaça (art. 147), o objeto jurídico desse crime é a paz de espírito do indivíduo, a sua tranquilidade psíquica. Essa paz de espírito pode ser perturbada de forma oral, mas também em linguagem escrita, gestos, ou quaisquer outros meios simbólicos, inclusive por e-mail. A pessoa deve compreender a ameaça, e o crime se consuma quando a pessoa toma conhecimento da ameaça. Vejamos o referido artigo: “Art. 147. Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave: Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.” Por fim, não existe ameaça na forma culposa, apenas se configura o crime quando existe o dolo. Nesse caso, o dolo seria a vontade livre e consciente de intimidar.
Exercício 42. (Agente de Investigação e Agente de Polícia – PB – 2009) Quanto aos crimes contra a pessoa e contra o patrimônio, assinale a opção correta.
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60 a) O crime de constrangimento ilegal é caracterizado pela ausência de violência ou grave ameaça por parte de quem o comete. b) Bens imóveis podem ser objetos de crime de apropriação indébita. c) O indivíduo que introduz animais em propriedade alheia, sem consentimento de quem de direito e fora das situações que excluem a ilicitude, não comete fato criminoso, ainda que resulte prejuízo econômico significativo para o dono do imóvel. d) Aquele que acha coisa alheia perdida e dela se apropria, deixando de restituí-la ao dono ou de entregá-la à autoridade competente no prazo de 15 dias não comete infração penal, mas, tão somente, ilícito civil. e) O delito de ameaça pode ser praticado de forma verbal, escrita ou gestual.
2. Sequestro e Cárcere Privado 2.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados crimes contra a liberdade individual, mais especificamente os delitos de sequestro e cárcere privado (art. 148) e redução a condição análoga à de escravo (art. 149).
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2.2 Síntese O constrangimento ilegal, sequestro e cárcere privado e o delito de extorsão mediante sequestro, sendo que, na prática, o que define cada um desses delitos é justamente a intenção do agente. O sequestro consiste na privação da liberdade. O cárcere privado consiste no confinamento em um cômodo isolado. A privação da liberdade aqui diz apenas respeito ao direito de ir e vir. Trata-se de um crime permanente, cuja consumação se prolonga no tempo. Por alguns minutos, não se tipifica o delito. A consumação do sequestro se dá no momento que o indivíduo é privado de sua liberdade. Vejamos o art. 148 do Código Penal: “Privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado: Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.
§ 1º A pena é de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos: I – se a vítima é ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente ou maior de 60 (sessenta) anos; II – se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital; III – se a privação da liberdade dura mais de 15 (quinze) dias; IV – se o crime é praticado contra menor de 18 (dezoito) anos; V – se o crime é praticado com fins libidinosos. § 2º Se resulta à vítima, em razão de maus-tratos ou da natureza da detenção, grave sofrimento físico ou moral: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos.” Vejamos o art. 157 do Código Penal, com especial atenção a seu § 2º, que trata do crime de roubo qualificado: “Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa. § 1º Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro. § 2º A pena aumenta-se de um terço até metade: I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma; II – se há o concurso de duas ou mais pessoas; III – se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância; IV – se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior; V – se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. § 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de 7 (sete) a 15 (quinze) anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, sem prejuízo da multa.” Vejamos o art. 149 do Código Penal, que trata do crime de redução à condição análoga de escravo: “Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto: Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência. § 1º Nas mesmas penas incorre quem: I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho;
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62 II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho. § 2º A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido: I – contra criança ou adolescente; II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.” Normalmente, a vítima desse trabalho é o trabalhador rural, pois deve ao patrão por ter como única alternativa de compra o estabelecimento do patrão. A pena para extorsão mediante sequestro é de 8 a 15 anos, fato este que denuncia uma política criminal deficiente e tendenciosa no nosso país, uma vez que a redução análoga a trabalho escravo possui um pena menor, verificando uma desproporção.
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Exercício 43. (TRT – 1ª Região – RJ/2008) No que se refere aos crimes contra a liberdade pessoal, assinale a proposição correta: I – Por ausência dos requisitos necessários à tipificação, não constitui crime, mas possível ofensa moral, ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave. II – A pena cominada para o crime por privar alguém de sua liberdade, mediante cárcere privado, pode ser fixada entre dois e cinco anos, se o ato é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital ou se a privação da liberdade dura mais de 15 (quinze) dias. III – A pena de reclusão pode ser aumentada entre três e nove anos, se o crime resulta à vítima, em razão de maus-tratos ou da natureza da detenção, grave dano moral ou à sua imagem, observada a condição social da mesma. IV – Constitui crime o fato de reduzir alguém à condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou à jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto. V – A pena pela restrição de liberdade, em razão de trabalho escravo, é aumentada de metade, se o crime for cometido contra criança ou adolescente ou por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem. a) Todas as proposições estão corretas. b) Somente as proposições I e III estão corretas. c) Somente as proposições II, IV e V estão corretas. d) Somente as proposições III, IV e V estão erradas. e) Todas as proposições estão erradas.
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3. Violação de Domicílio (Arts. 150 a 154 CP e Lei nº 9.099/1995) 3.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados os chamados crimes contra a liberdade individual, mais especificamente os delitos de violação de domicílio (art. 150), violação de correspondência (art. 151), correspondência comercial (art. 152), divulgação de segredo (art. 153) e violação de segredo profissional (art. 154).
O art. 5º, inciso XI da Constituição traz a seguinte disposição: “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.” A preocupação do legislador é com a proteção da tranquilidade doméstica. Para o direito penal, basta o uso como morada, mesmo que seja provisória. Vejamos o art. 150 do Código Penal: “Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências: Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) meses, ou multa. § 1º Se o crime é cometido durante a noite, ou em lugar ermo, ou com o emprego de violência ou de arma, ou por duas ou mais pessoas: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, além da pena correspondente à violência. § 2º Aumenta-se a pena de um terço, se o fato é cometido por funcionário público, fora dos casos legais, ou com inobservância das formalidades estabelecidas em lei, ou com abuso do poder. § 3º Não constitui crime a entrada ou permanência em casa alheia ou em suas dependências: I – durante o dia, com observância das formalidades legais, para efetuar prisão ou outra diligência; II – a qualquer hora do dia ou da noite, quando algum crime está sendo ali praticado ou na iminência de o ser. § 4º A expressão “casa” compreende: I – qualquer compartimento habitado;
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3.2 Síntese
Direito Penal – Parte Especial
64 II – aposento ocupado de habitação coletiva; III – compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade. § 5º Não se compreendem na expressão “casa”: I – hospedaria, estalagem ou qualquer outra habitação coletiva, enquanto aberta, salvo a restrição do nº II do parágrafo anterior; II – taverna, casa de jogo e outras do mesmo gênero.” O crime de violação de correspondência está previsto no art. 151 do Código Penal. Vejamos: “Devassar indevidamente o conteúdo de correspondência fechada, dirigida a outrem: Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa. § 1º Na mesma pena incorre: I – quem se apossa indevidamente de correspondência alheia, embora não fechada e, no todo ou em parte, a sonega ou destrói; II – quem indevidamente divulga, transmite a outrem ou utiliza abusivamente comunicação telegráfica ou radioelétrica dirigida a terceiro, ou conversação telefônica entre outras pessoas; III – quem impede a comunicação ou a conversação referidas no número anterior; IV – quem instala ou utiliza estação ou aparelho radioelétrico, sem observância de disposição legal. § 2º As penas aumentam-se de metade, se há dano para outrem. § 3º Se o agente comete o crime, com abuso de função em serviço postal, telegráfico, radioelétrico ou telefônico: Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. § 4º Somente se procede mediante representação, salvo nos casos do § 1º, IV, e do § 3º.” Se a violação se der durante o transporte pelos correios, a competência será da Justiça Federal. O crime de violação de correspondência comercial está previsto no art. 152 do Código Penal. Vejamos: “Abusar da condição de sócio ou empregado de estabelecimento comercial ou industrial para, no todo ou em parte, desviar, sonegar, subtrair ou suprimir correspondência, ou revelar a estranho seu conteúdo: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos. Parágrafo único. Somente se procede mediante representação.” O crime de divulgação de segredo está previsto no art. 153 do Código Penal. Vejamos: “Divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cuja divulgação possa produzir dano a outrem: Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa.
65 § 1º-A. Divulgar, sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas, assim definidas em lei, contidas ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública: Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. § 1º Somente se procede mediante representação. § 2º Quando resultar prejuízo para a Administração Pública, a ação penal será incondicionada.” Vejamos também o crime de violação de segredo profissional previsto no art. 154 do Código Penal: “Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. Parágrafo único. Somente se procede mediante representação.” A Lei nº 9.099/1995 prevê para os crimes estudados neste capítulo, cuja pena máxima não ultrapassar 2 anos, a possibilidade de eventuais benefícios legais previstos na Lei nº 9.099/1995. Em alguns casos, caberá a suspensão condicional do processo, quando a pena mínima não ultrapassar 1 ano, enquanto para outros caberá a transação penal, quando a pena máxima não ultrapassar 2 anos.
44. (Agente de Polícia – DF/2009) A Constituição Federal de 1988 assegurou como direito fundamental a inviolabilidade do sigilo de comunicação como regra (art. 5º, XII) e, excepcionalmente, a interceptação da comunicação telefônica, regulamentada pela Lei nº 9.296, de 1996. Nesse contexto, assinale a alternativa correta. a) O juiz poderá ordenar a interceptação telefônica quando sua destinação for para instruir o processual penal e o civil. b) A interceptação telefônica somente poderá ser determinada pelo juiz ex officio. c) A interceptação telefônica será autorizada ainda que seja possível colher a prova por outros meios disponíveis. d) A gravação de uma conversa entre dois interlocutores, feita por um deles sem conhecimento do outro, é ilícita. e) O juiz de direito pode, excepcionalmente, admitir que o pedido de interceptação telefônica seja feito verbalmente.
Direito Penal – Parte Especial
Exercício
Capítulo 6
Crimes contra o Patrimônio
1. Furto – Bem Jurídico Tutelado. Sujeitos 1.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos os crimes contra o patrimônio, iniciando pelo crime de furto.
1.2 Síntese O bem jurídico tutelado no crime de furto é o patrimônio relacionado à propriedade, posse e detenção legítima da coisa. Ladrão que furta ladrão tem cem anos de perdão? Mentira. – A furtou carro de B. – C furta o carro de B que estava com A. – A = Sujeito ativo. – B = Vítima. – C = Sujeito ativo.
67 O bem ofendido continuava sendo da vítima do crime anterior. Não se protege a posse ilegítima. Em relação à lesão a bem jurídico tutelado no crime de furto, pode ocorrer. Em caso de lesão ínfima, pode-se acionar o princípio da insignificância por falta de relevância no ataque ao bem jurídico tutelado. Insignificância. Exemplo: Roubo do pincel do IOB. Não havendo lesão ofensiva, acaba incidindo o princípio da insignificância. Sujeito ativo do crime comum: qualquer pessoa pode praticar crime de furto, pois não exige qualidade do sujeito ativo. Sujeito passivo: Proprietário, possuidor ou detentor da coisa. Proprietário que subtrai coisa própria em poder de outro não pode cometer furto. O proprietário pode praticar exercício arbitrário das próprias razões, caso furte coisa própria de terceiro. Funcionário público que subtrai valor ou dinheiro que esteja em poder da administração pública comete peculato furto: art. 312, § 1º, CP. Funcionário que subtrai coisa da administração publica utilizando-se da facilidade inerente ao cargo, comete crime de peculato furto. Sem utilizar-se de facilidade inerente ao cargo, o funcionário público responde somente por furto, ou seja, a diferença entre furto e peculato furto, depende da utilização da facilidade inerente ao cargo para a caracterização. Terceiro que juntamente com funcionário público (sem saber que se trata de um funcionário público) concorre para subtração de objeto da administração pública responde por crime de furto qualificado.
Exercício 45. Proprietário pode furtar coisa própria?
2. Furto – Tipo Objetivo I
Nesta unidade, estudaremos o tipo objetivo do furto.
2.2 Síntese O furto é um tipo objetivo. Subtrair coisa alheia móvel: tipo objetivo.
Direito Penal – Parte Especial
2.1 Apresentação
68 Para si ou para outrem: tipo subjetivo. Subtrair significa apoderar-se de coisa que não tem a posse. Esse apoderamento pode ser direto ou indireto. Apoderamento pode ser direto, pelas próprias mãos, ou indireto, por meio de animal treinado para subtrair a coisa. Coisa é qualquer bem corpóreo que tenha valor econômico ou de uso para o proprietário, ou algo de valor sentimental. Subtração do umbigo em formol, sem qualquer valor econômico, apenas sentimental. Outro entendimento, minoritário, diz que coisa é tão somente aquilo que possui valor econômico. Pessoa viva não pode ser objeto de furto, pode ser objeto de sequestro. Em relação a cadáver no cemitério, o crime é de subtração de cadáver, não de furto, art. 211 do Código Penal. Cadáver alocado em uma universidade, museu, ou qualquer outro lugar em que esteja integrado ao patrimônio de alguém, tem-se crime de furto caso este seja subtraído. Cheque não é passível de furto por não possuir em si valor econômico. Fotos feitas de um satélite foram consideradas objeto de furto pelo STJ. Coisa alheia é aquela que faz parte do patrimônio de outro. Não faz parte de objeto de furto coisa sem dono. Coisa abandonada: relógio jogado fora. É diferente de coisa perdida. Quem acha coisa perdida e não devolve para o proprietário ou para autoridade em 15 dias comete crime de apropriação de coisa achada. Coisa esquecida é diferente de coisa perdida. Subtração de coisa esquecida caracteriza furto. Coisa de uso comum não é passível de furto. Retirar um litro de água de um rio ou fonte.
Exercício Direito Penal – Parte Especial
46. Podem ser objeto do delito de furto as coisas abandonadas?
3. Furto – Tipo Objetivo II 3.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o furto de energia.
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3.2 Síntese O furto de energia está previsto § 3º do art. 155 do Código Penal. Vejamos: “Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.” Considerado furto permanente, ou seja, pode ser presa em flagrante. Adulteração do medidor para contabilizar menos energia é furto ou estelionato? Entendimento predominante: estelionato e não de furto. Entendimento minoritário: furto mediante fraude. É estelionato, pois há um contrato com uma prestadora. Na hipótese de ligação direta do poste até a casa, a prestadora não sabe que está existindo utilização de energia e não há adulteração do medidor, se entender que é furto mediante fraude: pena de 2 a 8 anos. Se for entendido como estelionato, pena de 1 a 5 anos. TV a cabo pode ser objeto de furto? Sim, segundo o posicionamento do STJ. Um segundo posicionamento diz que não, uma vez que para ser furto tem de ser algo que se esgota. Um terceiro posicionamento diz que não é furto, é estelionato. De acordo com a Lei nº 8.977/1995, em seu art. 35, constitui ilícito penal a interceptação ou a recepção não autorizada dos sinais de TV a Cabo. Para o STJ, é furto a interceptação de sinal de TV a cabo sem autorização.
Exercício
4. Furto – Tipo Subjetivo I 4.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o tipo subjetivo do furto.
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47. Comete algum crime o sujeito que, tendo em seu pasto várias vacas e nenhum touro, retira do pasto de um vizinho um reprodutor de raça pura, permanecendo com ele em seu poder durante alguns dias, suficiente para cruzar com algumas das fêmeas, emprenhando-as, após o que é devolvido? Em caso afirmativo qual o objeto material?
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4.2 Síntese Subtrair coisa alheia móvel é o tipo objetivo do crime de furto. Para si ou para outrem, é o tipo subjetivo do crime de furto. O dolo incide sobre o tipo objetivo. É o agente querer a realização do elemento subjetivo do tipo ou querer assumir o risco de realizar os elementos objetivos do tipo. O art. 121 do Código Penal traz “matar alguém”. O dolo está implícito. Quer matar alguém ou assume o risco de matar alguém. O crime de furto possui um elemento subjetivo especial expresso no tipo penal, “para si ou para outros”. Faltando o elemento subjetivo especial, não há furto por ausência de elementos do crime. O crime só se consuma quando há todos os elementos de sua definição legal. No crime de furto, não havendo elemento subjetivo especial do tipo, o fato é atípico. O furto de uso possui os seguintes requisitos: – não há elemento subjetivo especial. Não há vontade de se tornar dono; – o agente não pode ter intenção de se apropriar da coisa, apenas de utilizá-la; – a coisa deve ser não consumível; – devolução integral da coisa após o uso; – a questão da unidade anterior tipifica essa questão. Não há furto do touro utilizado pelo vizinho para a inseminação de suas vacas. Furto de uso não caracteriza crime por ser fato atípico.
Direito Penal – Parte Especial
Exercício 48. Considere a seguintes situaçõe hipotética: Ana subtraiu maliciosamente determinada peça de roupa de alto valor de uma amiga, com a intenção tão só de utilizá-la em uma festa de casamento. Após o evento, Ana, tendo atingido seu objetivo, devolveu a vestimenta. Nessa situação, Ana não responderá pelo delito de furto, uma vez que o CP não tipifica a figura do furto de uso. 49. Considere a seguintes situaçõe hipotética: O furto de uso, que se caracteriza pela subtração da coisa fungível apenas para usufruí-la momentaneamente, é fato atípico, havendo a necessidade que o agente efetue a devolução da coisa.
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5. Furto – Tipo Subjetivo II 5.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos quando se dá a consumação do crime de furto.
Quatro teorias acerca da consumação do crime de furto (momento da subtração): Amotio/apreensio: consumação quando se apodera da coisa. Ablacio: consumação quando apreender a coisa e transporta-a de um local ao outro. Iláciu – consumação quando a coisa é apreendida e transportada para um local seguro, para ter a coisa a salvo. Contrectatio – consumação quando do contato com a coisa. A doutrina e jurisprudência brasileiras levam em consideração a teoria da Amotio/Apreensio para caracterizar a consumação do furto. Para o STF e STJ, o furto é consumado mediante a posse da coisa, cessada a clandestinidade, mesmo que por curto espaço de tempo. O ladrão é surpreendido pela vítima o lado de fora da casa de posse de sua televisão. O ladrão deixa a TV no chão e foge. O crime está consumado, pois já ele possuía a posse da coisa. Posicionamento majoritário: o furto é consumado quando a coisa sai da esfera de vigilância da vítima. Ladrão é surpreendido na garagem pela vítima. Ele abandona o objeto e foge. O fato não foi consumado, pois o objeto não saiu da esfera de vigilância da vítima. Professor rouba computador da produtora. É surpreendido pelo segurança, consegue fugir com o objeto, mas é capturado na esquina. Pelo entendimento majoritário, o crime não foi consumado pois não saiu da esfera de vigilância da vítima. Em concurso de defensoria pública, adotem o posicionamento majoritário – fazendo a ressalva quanto ao posicionamento do STF/STJ – pois é muito melhor para a defesa. O posicionamento do STF/STJ consuma o crime mais facilmente.
Exercício 50. Segundo a teoria da Contrectatio, o momento consumativo do delito de furto ocorre quando o agente consegue levar o objeto ao lugar a que era destinado.
Direito Penal – Parte Especial
5.2 Síntese
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6. Furto – Consumação. Furto Majorado 6.1 Apresentação Nesta unidade, finalizaremos o estudo da consumação do crime de furto e analisaremos o furto majorado.
Direito Penal – Parte Especial
6.2 Síntese Em uma loja com sistema eletrônico de vigilância, uma pessoa pega um produto e sai sem pagar. As câmeras captam a ação. Isso constitui crime de furto? Por si só, não configura crime impossível. Vítima sem a carteira: o sujeito coloca sucessivas vezes a mão no bolso de uma possível vítima, mas não acha nada. A pessoa estava sem carteira. Essa situação constitui crime impossível? Pelo posicionamento majoritário, a ausência do objeto material faz da situação descrita um crime impossível. Pelo entendimento de Nelson Hungria, se a vítima nunca anda com carteira, seria crime impossível. Se somente naquela ocasião a vítima não portava o objeto material, seria uma hipótese de tentativa de furto. O furto majorado está previsto no art. 155, 1º: “A pena aumenta-se de um terço se o crime é praticado durante o repouso noturno.” Causa de aumento é diferente de qualificadora. Na causa de aumento, um montante incide sobre outra pena. No crime qualificado, a pena é autônoma. Período de repouso noturno é o período em que as pessoas já estão dormindo. Pode depender da localidade onde crime foi praticado, uma vez que em certos lugares as pessoas se recolhem mais cedo. A pena aumenta durante o repouso noturno pela maior vulnerabilidade que a vítima, ou terceiros, tem durante este período. Existe uma interpretação bastante restrita que diz que esse preceito só vale quando a vítima está dentro de um imóvel e dormindo. O STJ entende a vulnerabilidade num sentido mais amplo. Pode ser aplicado em um crime ocorrido contra um estabelecimento comercial, por exemplo. Causa de aumento não se aplica quando o furto for qualificado, só se aplicando ao furto simples. No crime de furto simples, é possível a suspensão condicional do processo. Quando ocorre um furto majorado, a pena mínima sobe para 1 ano e 4 meses, impedindo a suspensão condicional do processo.
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Exercício 51. No furto, a causa especial de aumento de pena, decorrente do fato do crime ter sido praticado durante o repouso noturno, incide sobre as formas qualificadas? 52. A majorante do repouso noturno incide sobre o delito de crime praticado na sua forma qualificado. 53. O crime de furto, art. 155 do CP, praticado em concurso de pessoas e durante a madrugada em residência com moradores repousando, sofrerá incidência da qualificadora do concurso de pessoas e da causa especial de aumento de pena do repouso noturno.
7. Furto Privilegiado 7.1 Apresentação Nesta unidade, veremos o furto privilegiado.
O furto privilegiado está previsto no art. 155, § 2º do Código Penal. Vejamos: “Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.” Requisitos cumulativos: I – agente primário. II – coisa de pequeno valor. O juiz deverá substituir a pena de reclusão pela de detenção, ou pena privativa de liberdade por multa. Ainda, diminuir a pena de 1/3 a 2/3. Furto privilegiado não é sinônimo do Princípio da Insignificância. No furto privilegiado, ocorre a condenação e depois a substituição da pena. No Princípio da Insignificância, não há condenação, por não haver tipicidade; assim, não há que se falar em crime. Para o STF, para que se configure o Princípio da Insignificância, deve haver: I – mínima ofensividade da conduta; II – ausência de periculosidade da ação; III – reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; IV – inexpressividade da lesão provocada. Os três primeiros itens se referem ao desvalor da conduta e o último, ao desvalor do resultado.
Direito Penal – Parte Especial
7.2 Síntese
74 Furto famélico: a doutrina entende configurar estado de necessidade. Furto híbrido: ao mesmo tempo em que é privilegiado, é qualificado.
Exercício 54. (Ministério Público/SP – 2008) Furto privilegiado constitui crime de bagatela?
8. Furto Qualificado – Rompimento ou Destruição 8.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o furto qualificado por rompimento ou destruição.
Direito Penal – Parte Especial
8.2 Síntese Qualificadoras do furto: I – furto quando ocorre destruição ou rompimento de obstáculo para a subtração da coisa. Exemplo: arrombamento, romper a porta, o obstáculo para furtar algo. No furto de objeto dentro de carro, um primeiro posicionamento diz que há a qualificadora, pois quebrar o vidro do carro para subtrair algo, configura-se rompimento de obstáculo. Na segunda corrente minoritária, não há proporcionalidade para qualificar o furto, e trata-se de furto simples, mesmo com destruição de obstáculo, pois furtou o próprio objeto. Se a pessoa quebra o vidro do carro para subtrair o próprio carro, também qualifica. O STJ ficou pacífico durante muitos anos, de que a quebra do vidro para furtar objeto dentro do carro qualificaria o furto, mas, a partir de 2009, o posicionamento é de que se trataria de furto simples.
Exercício 55. O agente subiu no telhado, removeu algumas telhas, ingressou no imóvel, subtraiu a coisa, voltou pelo telhado, colocou as telhas no local e foi embora. Incide a qualificadora do art. 155, § 4º, inciso I? 56. Em relação à qualificadora do inciso I, exige-se ou não exame pericial?
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9. Furto Qualificado – Abuso de Confiança 9.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o furto qualificado por abuso de confiança.
O furto com abuso de confiança está previsto no inciso II do art. 155 do Código Penal. Vejamos: Qualificadora: qualifica o crime o abuso de confiança, que em razão da confiança depositada da vítima em relação ao agente, este aproveita e tendo uma facilidade ele subtrai algo. Geralmente, ocorre entre empregados e empregadores, mas não necessariamente. Famulato: furtos praticados por empregados tendo como vítima os empregadores. Não necessariamente quando o empregado furta o empregador, haverá abuso de confiança. Em regra, ocorre essa qualificadora quando a pessoa já foi contratada e, sendo empregada, furta seu empregador, pelo abuso de confiança. Nem sempre haverá abuso de confiança quando o sujeito ativo do delito é o empregado em relação ao empregador. Há hipóteses de o empregador não confiar e não havendo essa confiança não podemos falar dessa qualificadora. Exemplo: uma senhora que há trinta anos tem uma empregada doméstica e todas as vezes que ela sai, leva todas as joias junto dela, por não confiar na empregada. Nessa situação, não haveria abuso de confiança. A diferença entre furto com abuso de confiança e o crime de apropriação indébita: I – no crime de furto: o agente não tem a posse de algo ou tem a posse vigiada (dolo antes de efetuar a subtração); II – apropriação indébita: art. 168, o agente tem a posse ou a detenção de algo (dolo surge após o agente entrar na posse de algo). Exemplo de apropriação indébita: o sujeito começa a trabalhar em uma empresa. Ele recebe um notebook para trabalhar; determinado dia o sujeito pensa: vou vender o notebook. O sujeito de possuidor passou a se comportar como proprietário e vendeu o notebook. O sujeito cometeu apropriação indébita. Em relação ao abuso de confiança no furto praticado mediante fraude, nessa qualificadora, o agente utiliza uma fraude visando diminuir a vigilância que a vítima exerce sobre algo.
Direito Penal – Parte Especial
9.2 Síntese
76 No furto com abuso de confiança, a vítima está em casa e toca campainha, um sujeito está com uniforme da vigilância sanitária, a vítima o deixa entrar. Em um descuido da vítima, o agente furta alguns objetos da casa. Furto mediante fraude. O agente utilizou de uma técnica para enganar a vítima. Uma pessoa furta o dinheiro de sua conta bancária, por meio da Internet sem a sua autorização, o STJ classificou como furto mediante fraude. Exemplo do caixa eletrônico: a vítima vai sacar dinheiro, digita todos os dados, chega o agente com crachá do banco, e diz que o caixa eletrônico está quebrado, pede para que a vítima use outro caixa, mas deixa lá os dados fornecidos. O agente furta dinheiro da conta corrente. Furto mediante fraude.
Exercício 57. O saque fraudulento em conta bancária via internet configura o crime de estelionato.
10. Furto Qualificado – Fraude 10.1 Apresentação Nesta unidade, abordaremos o furto mediante fraude.
10.2 Síntese
Direito Penal – Parte Especial
Vejamos a diferença entre estelionato e furto mediante fraude. Furto mediante fraude – Art. 155
Estelionato – Art. 171
No crime de furto, agente SUBTRAI a coisa, ou seja, a vítima não entrega, mas sim o agente subtrai. Ex.: alguém que entra em sua casa e subtrai algo.
No estelionato, a vítima ENTREGA a coisa. A vítima é ludibriada e entrega. Ex.: alguém que se passa por um funcionário de uma determinada empresa, vai até sua casa e pega os equipamentos pertencentes a esta empresa.
Para quem pretende fazer concurso para Defensoria Pública, é importante ter a noção de que ser estelionato é melhor do que ser furto mediante fraude, para a defesa.
77 Razão: a pena para furto mediante fraude é de 2 a 8 anos; já a pena para estelionato é de 1 a 5 anos. Exemplo: a vítima entregou a chave do carro (estelionato?) e esperava o carro de volta. Neste caso, o professor entende que é um caso de furto, mesmo sabendo que para outros se qualificaria como estelionato. Exemplo: em um test drive, houve uma entrega da chave. A vítima entregou a posse, mas a esperava de volta. Se a vítima esperava de volta, não se qualifica como estelionato. Exemplo: uma pessoa guardou uma sacola no guarda-volumes. Alguém falsificou o número para entrega da bolsa, se passou por dono da bolsa e, nessa bolsa, havia uma máquina fotográfica. A funcionária entregou sem esperar a coisa de volta. Neste caso sim, qualifica-se como estelionato. Exemplo: compra de produto no supermercado que vem em uma caixa lacrada que é aberta e é colocado um produto muito mais caro que o daquela caixa. O caixa do supermercado foi enganado. Neste caso, houve furto mediante fraude, pois não houve entrega daquele produto que agente estava levando.
Exercício 58. (Promotor de Justiça de São Paulo – 2010) O furto de estelionato diferencia-se do crime furto qualificado pela fraude, porque neste, o furto qualificado pela fraude, a vítima entrega o bem após ser ludibriado pelo agente.
11. Furto Qualificado – Escalada, Destreza e Chave Falsa I
Nesta unidade, analisaremos o furto qualificado por escalada, destreza e chave falsa.
11.2 Síntese Escalada é o ingresso ao local utilizando meio anormal de acesso e esforço incomum. Exemplo: para furtar TV, pula o muro da casa ou, para ingresso em residência, utiliza-se de tubulação de esgoto.
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11.1 Apresentação
78 Atenção: Se o agente cava o buraco para acessar, é fraude. Se o buraco já existia, é escalada. No caso de furto de lâmpada em poste, na qual o agente sobe no poste, por ser o único meio de acesso, não configura escalada. Para a configuração da escalada, é necessário laudo pericial. Destreza é especial habilidade do agente em subtrair coisa da vítima. Exemplo: batedor de carteira. Chave falsa é qualquer instrumento com ou sem forma de chave, destinada a abrir fechadura. Exemplo: clips, micha, chave de fenda. Se a chave for verdadeira e a pessoa não autorizada, a doutrina majoritária entende que não qualifica.
Exercício 59. Cláudio, com intenção de furtar, entrou no carro de Vagner cuja porta estava destravada e acionou o motor por meio de chave falsa na ignição do veículo. Assim, logrando êxito em subtrair o veículo. Nessa situação e de acordo com a Jurisprudência do STJ, Cláudio responde por furto simples.
12. Furto Qualificado – Escalada, Destreza e Chave Falsa II 12.1 Apresentação Nesta unidade, abordaremos o furto qualificado pelo concurso de pessoas.
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12.2 Síntese O furto qualificado pelo concurso de pessoa está previsto no art. 155, § 4º, inciso IV, e se configura quando o crime é praticado mediante o concurso de duas ou mais pessoas. Muito embora se fale concurso de pessoa, parte da doutrina entende que só qualifica se as pessoas estiverem no local da execução do delito, caso contrário não. Exemplo: se existe um concurso, e duas pessoas, uma é partícipe e o outro é o autor executor, não qualificaria por esse posicionamento porque só haverá uma pessoa executando o delito e o outro é partícipe.
Partícipe é aquele que induz, instiga ou presta um auxílio. A pessoa induziu A e induziu B a praticar o furto. A é partícipe e B é o autor executor do delito. Não se diria qualificadora porque as duas pessoas não estão no local do delito. STF e STJ têm decisões neste sentido. Nelson Hungria e Bitencourt adotam este posicionamento, ou seja, para que ocorra a qualificadora as pessoas devem estar no local da execução. Para o posicionamento contrário: basta ter concurso de pessoas que qualifica. Não importa se tem um partícipe e um executor, mesmo assim o crime estaria qualificado. Esse é o posicionamento de Damásio, Fragoso, Capez. Pessoa de 19 anos vai praticar um furto com outro de 17. Os dois no local da execução, dois coautores. O menor de 17 anos estará cometendo um ato infracional considerado furto. O inimputável não tem responsabilidade penal. Se ele não tem responsabilidade penal, a nossa legislação penal não pode abrangê-lo Ele não pode fazer parte da conta para o concurso de pessoal. Importante ressalvar na prova que embora o posicionamento majoritário seja outro. De acordo com a Súmula nº 442 do STJ, não se admite usar causa de aumento do roubo no de furto qualificado com concurso de duas ou mais pessoas. Razões: I – no furto simples a pena é de 1 a 4 anos, mais 1; II – no furto qualificado a pena é de 2 a 8 anos, mais 1; III – no roubo simples a pena seria de 4 a 10 anos; IV – no roubo majorado a pena é aumentada de 1/3 à metade. Hipótese de causa para o aumento no caso do roubo majorado é quando ocorre o concurso de duas ou mais pessoas. Na hipótese de roubo com concurso de duas ou mais pessoas, a pena não dobra igual dobra no furto. A pena na realidade aumenta de 1/3 até a metade. Ao passo que no furto qualificado com concurso de duas ou mais pessoas a pena dobra. Se uma só pessoa comete o furto simples, pena de 1 a 4. Se duas pessoas cometem um furto, o crime passa a ser qualificado, a pena deixou de ser de 1 a 4 e passou a se de 2 a 8, dobrou. Por que no furto qualificado a pena dobra quando ocorre o concurso de duas ou mais pessoas sendo que no roubo quando é concurso de duas ou mais pessoas a pena não dobra? A pena apenas aumenta de 1/3 à metade. Seria desproporcional este aumento para o dobro. No caso de crime qualificado pelo concurso de duas ou mais pessoas, ao invés de se aplicar a pena de 2 a 8 anos de multa, aplica-se a pena de capto, que é de 1 a 4 mais o aumento de 1/3 até a metade, o aumento de roubo majorado.
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80 A Súmula do STJ não permitiu este posicionamento. O STJ não adotou esta tese e editou uma súmula sobre isso, que menciona que não é possível se aplicar causa de aumento roubo majorado na hipótese de concurso de duas ou mais pessoas. Em relação ao furto com envolvimento de duas ou mais pessoas, vejamos as seguintes hipóteses: Hipótese 1: Suponha que eu combine com alguém de praticar um furto. I – Detalhes combinados. II – Um subtraiu o carro e outro guardou. II – O furto foi consumado. III – Ambos concorremos para o delito de furto qualificado por concurso de duas ou mais pessoas. A hipótese mencionada é adotando a tese de que uma das duas pessoas não precisaria estar lá no momento da execução. Hipótese 2: O Alemão acabou de furtar o carro e bate na minha porta dizendo do roubo cometido e que precisa esconder o carro, pedindo para guardar na minha garagem e concedi permissão. I – Participei do furto? Não. II – Eu não planejei. III – Eu não induzi. IV – Eu não instiguei. V – Eu não prestei nenhum auxílio antes do crime. VI – O crime já estava consumado. VII – Fui procurado após a consumação do crime. VIII – O agente buscou ajuda para ocultar o carro. IX – Eu ocultei. Eu respondo por favorecimento real e ele por furto. Hipótese 3: Suponhamos que o alemão chegue para mim e diga: Marcelo, preciso furtar um carro, mas eu só vou furtar se eu puder guardar o carro na sua garagem, porque se eu não tiver onde guardar este carro não adianta, então eu não vou furtar. I – Eu permito que ele guarde. II – Só vou prestar uma ajuda, pois não quero dinheiro. III – O alemão então vai, furta e guarda o carro na minha garagem conforme combinado. Que crime eu cometi? Nesta hipótese, o crime de furto só se realizou porque eu prometi um auxílio para ele, que foi posterior à consumação do furto, porém, houve um ajuste prévio, eu concorri para este crime, que se não existisse o auxílio, não haveria o furto. Fui o partícipe deste delito. Não haverá o furto com favorecimento real, somente o furto qualificado pelo concurso de pessoa porque eu fui partícipe do crime anterior que foi furto. Muito embora tenha sido posterior, houve um ajuste prévio.
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Exercício 60. (Promotor de Justiça – MG – 2010) Istélius ficou sabendo que seu companheiro de crimes, o Famigerado Larápius, iria executar o furto de 8 veículos na cidade de Belo Horizonte, mas pensava em desistir do plano porque não dispunha de local para guardar os bens furtados. Istélius ofereceu a Larápius o quintal e a garagem da casa de sua propriedade, localizada em ponto estratégico da cidade de BH onde poderiam ser recebidos e guardados os veículos furtados sem chamar a atenção até efetivação da venda. Stélius se dispôs a guardar os veículos furtados e não exigiu receber nenhum centavo em troca, pois devia favores ao amigo Larápius. Tendo local seguro para guardar os veículos furtados Larápius colocou em execução o plano de crime. Deixou bem claro, ladrão com Larápius só começou a executar o crime porque já havia combinado de o amigo emprestar a casa para guardar os carros, então ele iniciou a execução do crime. Efetivada a subtração de 3 veículos, os bens foram efetivamente guardados na propriedade de Stélius sendo vendidos em data posterior entre as ações efetivadas por Larápius, para receptadores que atuam na região.
13. Furto Qualificado – Veículo Transportado para Outro Estado 13.1 Apresentação Nesta unidade, abordaremos o furto qualificado pelo transporte de veículo para outro Estado.
O art. 155, § 5º do Código Penal traz a seguinte redação: “A pena é de reclusão de 3 (três) a 8 (oito) anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. Pena – reclusão de 3 a 8 anos.” Não tem combinação de pena de multa. O § 4º traz a seguinte redação “A pena é de reclusão de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa, se o crime é cometido: I – com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;
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13.2 Síntese
Direito Penal – Parte Especial
82 II – com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza; III – com emprego de chave falsa; IV – mediante concurso de duas ou mais pessoas.” É importante observar que aqui o legislador postou uma nova qualificadora e não incluiu a pena de multa. Acerca desta qualificadora, é importante o que o legislador quis evitar: furtos de carros que vai de um estado para o outro, quadrilhas, organizações criminosas. Para que ocorra a qualificadora, é preciso que o veículo que seja efetivamente transportado para outro estado ou país atravesse a fronteira. Carro furtado no estado de SP e levado para o estado de MG. Efetivamente, foi levado de um estado para outro, logo, trata-se de furto qualificado. É possível uma tentativa deste furto qualificado? Se o agente não conseguir levar o veículo para outro estado, será que admitiria qualificar este crime como tentativa de furto qualificado? Posicionamento predominante: não, porque o crime de furto estará consumado quando houver a posse da coisa. Se o agente estava tentando levar o carro para outro estado, ele é interceptado pela polícia ainda dentro do estado; não ocorre a qualificadora. Há um furto consumado, porém, provavelmente, com outra qualificadora. Posicionamento 2: É de lícita tentativa de furto qualificado pelo § 5º. Tentou levar o veículo para outro estado, mas foi interceptado. O agente furtou o carro; após o furto, contrata-se outra pessoa para levar o carro para outro estado. O contratado sabia que iria conduzir um veículo furtado para um outro estado. A que tipo de crime responde esta pessoa que vai transportar o carro para outro estado? Esta outra pessoa responde por receptação. Esta pessoa é um receptador. Importante: foi contratado após o furto, para conduzir o carro para outro estado. E o agente que furtou o carro? Este responde por crime qualificado, porque ele furtou com a intenção de levar o carro para outro estado, mesmo que não tenha sido ele o condutor do carro para outro estado. Supondo que ocorra a qualificadora do § 5º, mas supondo também que ocorram outras qualificadoras do § 4º, o que juiz fará? Ele simplesmente vai desprezar a qualificadora do § 4º? Ocorrendo o § 5º, o juiz para afixar a pena-base terá que observar a pena mínima de 3 e a pena máxima de 8 anos.
Supondo que houve uma qualificadora do inciso IV, concurso de pessoas, onde o juiz levará em consideração esta qualificadora do concurso de pessoas? Detalhe, ela não será levada em consideração como qualificadora. O juiz levará em consideração, mas não como qualificadora, e sim como circunstância judicial a ser apreciada na primeira fase. Lembrando: quando o juiz aplica a pena, ele passa por 3 fases. Fase 1: as circunstâncias judiciais, fixação da pena-base. Vejamos particularidades sobre o crime de furto. Qualificadora e insignificância. Será possível haver uma compatibilidade? É possível aplicar o princípio da insignificância mesmo nas hipóteses de furto qualificado nos §§ 4º e 5º? Segundo o posicionamento do STJ, é possível sim o furto ser ao mesmo tempo qualificado e aplicar o princípio da insignificância, tornando o fato atípico. Numa hipótese de duas pessoas praticarem o furto, então seria qualificado, porém, pode ser que essas duas pessoas tenham subtraído um bem de ínfimo valor, inexpressivo ao valor da conduta, reduzidíssimo grau de reprobabilidade do comportamento, então se aplicaria o princípio da insignificância numa hipótese de furto qualificado; o fato seria atípico, mesmo em tese o fato estar moldando formalmente uma hipótese de furto qualificado. Posicionamento contrário: quando o furto é qualificado já há um desvalor muito alto, então não haveria de se falar no princípio da insignificância. Em relação ao furto qualificado e privilegiado, é possível ter ou não o furto qualificado e privilegiado? Sim, o chamado híbrido, ou seja, ao mesmo tempo qualificado e privilegiado. Duas ou mais pessoas furtaram. Ocorre a qualificadora, porém, se ambas são primárias e a coisa é de pequeno valor, seria qualificado e privilegiado. É possível ou não? A doutrina entende que sim, o STF entende que sim, o STJ, 6ª Turma, também entende que sim. O STJ na 5ª Turma pensa o contrário. Diz que não é possível o crime ser ao mesmo tempo qualificado e privilegiado. Em relação ao concurso de crime, imagine que estamos dentro do estúdio gravando a aula e numa sala anexa estão as carteiras, mochilas. Entra um ladrão, pega tudo e leva embora. Imagine que havia 5 carteiras sobre a mesa, ele sabia que eram de pessoas distintas e pegou tudo e levou embora. Quantos crimes ele cometeu? O que tivemos aqui foi uma conduta com várias vítimas lesadas. Predomina que se trata de um concurso formal de crime.
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84 Numa única conduta, o agente produziu mais que um crime. Seria um concurso formal perfeito ou imperfeito? No concurso formal, art. 70 do Código Penal, ele pode ser próprio (perfeito), ou ele pode se impróprio (imperfeito). No próprio, haverá a aplicação de uma pena mais o aumento de 1/6 à metade. No imperfeito, somam-se as penas. Em relação ao concurso formal imperfeito, quando seria imperfeito? Quando fosse um crime doloso, mais desígnio autônomo (estudado na parte geral). Sabia que pertencia a 5 pessoas distintas. Com uma única conduta, ele cometeu 5 crimes de furto. Concurso formal é o que predomina. Divergência: há quem entenda que é concurso formal perfeito, ou seja, ele seria condenado, o juiz aplicaria uma única pena mais o aumento de 1/6 até a metade em relação aos outros 4 crimes. Isto é o sistema da exasperação. Seria no máximo a pena de 1 crime mais metade. Em relação ao concurso formal imperfeito, para os que entendem como concurso formal imperfeito os crimes dolosos em que o agente sabia que lesaria 5 pessoas diferentes. Somariam as penas apesar de apenas uma conduta. Regra do cúmulo material (um posicionamento muito mais rigoroso). Quando cai em prova objetiva, consideram como correto uma hipótese de concurso formal, não especificando se é perfeito ou imperfeito.
Exercícios
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61. (Magistratura/TRT 1ª – 2010) Conforme ter ativa a jurisprudência do STJ, o fato de se tratar de furto qualificado, constitui motivação suficiente para impedir a aplicação o princípio da insignificância. 62. (Magistratura Federal/TRF 1ª – 2009) O delito de furto, por ser incompatíveis é vedada a aplicação simultânea da qualificadora de concurso de pessoas com privilégio decorrente do fato de o criminoso ser primário e ser de pequeno valor a coisa furtada.
14. Roubo – Estrutura do Delito. Bem Jurídico Tutelado 14.1 Apresentação Nesta unidade, iniciaremos o estudo do delito de roubo.
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Vejamos o art. 157 do Código Penal, para analisarmos a estrutura do delito de roubo: “Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa. § 1º Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro. § 2º A pena aumenta-se de um terço até metade: I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma; II – se há o concurso de duas ou mais pessoas; III – se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância; IV – se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior; (Acrescentado pela Lei nº 9.426/1996) V – se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. § 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de 7 (sete) a 15 (quinze) anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, sem prejuízo da multa.” O caput diz respeito ao roubo próprio. O § 1º diz respeito ao roubo impróprio (roubo por equiparação). O § 2º diz respeito ao roubo majorado (circunstanciado). O § 3º diz respeito ao roubo qualificado, com lesão corporal grave ou morte (latrocínio: crime hediondo). Os bens jurídicos tutelados no caso de roubo são: I – patrimônio; II – liberdade individual; III – incolumidade pessoal. Predominantemente, não cabe o princípio da insignificância no crime de roubo. Exemplo: roubo do chaveiro do alemão. Neste exemplo, no aspecto patrimonial, pode-se dizer que o roubo foi insignificante, mas houve constrangimento da pessoa, por isso, não se pode aplicar o princípio da insignificância. Algumas teses importantes: 1) Não se aplica o princípio da insignificância no exemplo citado, mas pode-se aplicar uma desclassificação. Se retirarmos o aspecto patrimonial, sobrará o constrangimento legal (art. 146 do Código Penal). Desclassificação de roubo para constrangimento legal.
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14.2 Síntese
86 2) Não se aplica o princípio da insignificância, mas cabe a infração bagatelar imprópria, ou cabe aplicar o princípio da irrelevância penal do fato. Não há necessidade concreta de aplicação de pena.
Exercício 63. É possível a aplicação do princípio da insignificância nos crimes de roubo?
15. Roubo – Sujeitos do Delito. Tipo Objetivo 15.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos os sujeitos do delito e o tipo objetivo.
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15.2 Síntese O sujeito ativo de delito pode ser qualquer pessoa. Obviamente que não pode ser o proprietário. De acordo com o art. 345 do Código Penal, o proprietário pode praticar exercício arbitrário das próprias razões. Se emprestei meu notebook e a pessoa não quer devolver, quando vejo a pessoa na rua com o notebook, parto para a agressão e o pego de volta. Não houve prática de roubo. Fiz justiça pelas próprias mãos. Responderei pelo art. 345 do Código Penal. O sujeito passivo do delito é aquele que sofreu a lesão ao patrimônio, mas também pode ser sujeito passivo do delito a pessoa que sofreu violência ou grave ameaça. O câmera está trabalhando e durante o intervalo é surpreendido por um ladrão que o ameaça com uma arma sendo colocada em sua boca e leva a câmera. Vítima 1: o dono do estúdio que teve sua câmera furtada – lesão ao patrimônio. Vítima 2: o câmera. Não é o dono da câmera, mas foi vítima da grave ameaça e da violência. Há dois sujeitos passivos no delito. Vejamos agora o concurso formal de crimes. Há 5 pessoas trabalhando no estúdio e são surpreendidos por um ladrão que pega sua arma e aponta na direção de todos pedindo que passem suas carteiras.
Todos entregam suas carteiras e o ladrão vai embora. O que predomina é o que esperam como resposta em uma prova objetiva. A pessoa com uma única conduta praticou, conforme exemplo dado, 5 crimes. Que se aplique a regra do concurso formal. Há quem entenda que se aplica a regra do concurso formal perfeito, mas há quem entenda que se aplica a regra do formal imperfeito. Regra do formal perfeito: aplica-se uma só das penas, mais um aumento de 1/6 até a metade. Regra do formal imperfeito: somam-se as penas. Será condenado por 5 crimes de roubo e somam-se as penas. Muito grave se considerada com concurso formal imperfeito. Em um concurso numa prova objetiva, eles entram em detalhes se é um concurso formal perfeito ou concurso formal imperfeito. Exige-se que o candidato saiba que se trata de concurso formal. Será concurso formal quando houver: diversidade de patrimônios, lesões a vários patrimônios. Como resultado, vários crimes. Elemento subjetivo do crime de roubo é a grave ameaça e a violência física que pode ser vias de fato, lesão corporal, ou até mesmo a morte, latrocínio. Entra um ladrão na sala de aula e pede ao professor que passe a carteira. O professor resiste, mas o ladrão parte para cima, o joga contra a parede, pega a carteira e vai embora. Houve vias de fato, houve uma violência, mas não houve lesão. Se o ladrão tivesse dado um soco no professor, seria considerado também como lesão corporal. Além do ato de violência, o ato de agressão física. Grave ameaça é uma intimidação. O ladrão chega, pede a carteira e ameaça matar com uma faca caso não a entregue. Pega a carteira e vai embora. Houve roubo (subtração), houve grave ameaça e houve uma intimidação. O Alemão chega numa boate, um cidadão gostou dele e o aborda dizendo ter comprado uma câmera nova, convidando-o para ir para casa dele tirar umas fotos. Chegando lá apaga o alemão usando o boa noite cinderela. Sua intenção não eram as fotos, mas sim furtá-lo. Depois colocou o Alemão no carro e deixou-o na praça. É uma forma de violência chamada de violência imprópria. A violência imprópria ocorre quando a vítima não tinha como reagir àquela violência. Quando há uma impossibilidade de resistir. No crime de roubo, quando o agente subtrai, ele subtrai por uma ação, que é a ação de subtrair. Ele toca na coisa e vai embora, porém, este crime de roubo pode ocorrer por omissão.
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88 O crime de roubo por omissão ocorre quando uma pessoa tem o dever jurídico de evitar o resultado e não evita. Ele vai responder por aquele resultado. Exemplo: policial que presencia assalto e negligencia. Viu e nada fez. O policial subtraiu alguém? Não. Praticou violência ou grave ameaça contra alguém? Não. Apesar disto, ele responderá pelo roubo. O policial tinha o dever jurídico de evitar o resultado, conforme o art. 13, § 2º, letra “a” do Código Penal.
Exercício 64. (Promotor de Justiça – MG – 2008) Em um parque de exposição, um policial, do interior de sua guarita onde se encontrava de plantão, presencia o início da prática de um crime de roubo. Ao perceber que a vítima era um antigo desafeto, mesmo tendo plenas condições de evitar a prática do delito, dolosamente, omite-se, permitindo a consumação da infração penal, com a subtração dos bens pertencentes àquela. Nesse caso, qual o delito praticado pelo policial?
16. Roubo – Próprio – Impróprio – Tipos Subjetivos 16.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o roubo próprio, impróprio e os tipos subjetivos.
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16.2 Síntese No roubo próprio, presentes no caput do art. 157 do Código Penal, o agente em primeiro lugar pratica uma violência ou grave ameaça ou uma conduta retirando a possibilidade da vítima de resistir e posteriormente vem a praticar a subtração de algo. Um cidadão andando pela rua tranquilamente, de repente surge um sujeito com uma arma e intimida o cidadão furtando sua carteira. No primeiro momento, o sujeito pratica a grave ameaça e, no segundo momento, uma subtração. No roubo impróprio, previsto no § 1º do Código Penal, o agente entra em uma casa onde não há ninguém e rouba a televisão. A vítima chega a casa e vê
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Exercício 65. Pode ser um dia cobrada em concurso uma questão desse tipo. É possível ou não o roubo de uso, fato atípico? 66. Imagine um agente que pratica a violência e grave ameaça, rouba seu carro por alguns minutos e depois o entrega. Ele teve a intenção de ter o carro para ele?
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o agente levando embora; há uma discussão e o agente intimida a vítima com arma em punho. Em um primeiro momento, há a subtração e, em segundo momento, uma grave ameaça para assegurar a detenção de algo. O § 1º do art. 157 diz que a mesma pena de reclusão de quatro a oito anos, incorre que logo depois de subtrair algo, emprega a violência contra a pessoa ou grave ameaça a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção de algo para si ou para terceiros. Violência imprópria: No roubo, caput, a violência, grave ameaça ou o agente de qualquer modo reduz a impossibilidade da vítima resistir. Roubo impróprio: o legislador só utilizou as expressões violências ou grave ameaça, não utilizou expressamente a violência imprópria, como elemento do delito; a vítima chega a casa e se depara com o agente saindo com a televisão. O agente olha para a vítima, deixa a televisão no chão e sai correndo. A vítima indignada corre atrás do agente. A vítima segura o agente e este parte para a violência. Qual o crime que temos nesta história? Furto consumado em concurso com lesão corporal (no exemplo dado, o agente praticou o furto, a violência não esta relacionada ao bem patrimonial). Um cidadão está no aeroporto e cochila por alguns instantes; um sujeito senta do seu lado e vê sua mochila; todavia, a hora que ele chegou próximo à mochila a vítima acorda. A vítima segura o sujeito e chama a polícia, mas ele foge depois de praticar a violência. Qual crime tivemos? Resposta: No exemplo dado, o sujeito sequer tinha tocado a mochila, não houve subtração, a violência foi para fugir. Uma tentativa de furto em concurso material com crime de lesão corporal. Vejamos agora os tipos subjetivos no crime de roubo. Dolo: consciência e vontade de subtrair algo alheio móvel. Em um crime de roubo prórpio há um elemento subjetivo especial, para si ou para outrem. No crime de roubo impróprio, temos o dolo e o elemento subjetivo especial, que é distinto. O agente tem a finalidade de assegurar sua impunidade ou a detenção de algo para si ou para terceiros.
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17. Roubo Próprio – Consumação – Tentativa 17.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos a consumação e a tentativa no crime de roubo.
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17.2 Síntese Vejamos agora a consumação e a tentativa no crime de roubo próprio. Segundo o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, o crime de roubo se consuma quando, após o agente empregar a violência ou grave ameaça, ele tiver a posse de algo mesmo que essa posse seja em um curto espaço de tempo. Exemplo: o agente aponta arma para o cobrador e ordena que tire o dinheiro do caixa. É abordado pela polícia. O agente já tinha a posse da coisa, então, o crime foi consumado, mesmo a posse tendo se dado por um curto período de tempo. Um segundo posicionamento diz que o crime de roubo se consuma quando o agente retira algo da esfera de vigilância da vítima e tem a posse tranquila. Roubo frustrado: no entendimento do STF, o roubo se consuma quando o agente mesmo com a prisão em flagrante, não levou nenhum objeto, houve a consumação, mas o objeto subtraído ele não teve a salvo. No roubo impróprio, em um primeiro momento, o agente pratica a subtração. No segundo momento, o agente pratica a violência ou a grave ameaça. Quando há a consumação de roubo impróprio? Quando o agente pratica a subtração e depois a violência ou grave ameaça. Ocorre a tentativa do roubo impróprio quando o agente pratica a violência ou grave ameaça e não consegue ter a posse de algo por circunstâncias alheias à sua vontade. Quando a vítima não entrega os pertences à qual o agente quis subtraí-la, houve uma tentativa de roubo próprio. Um primeiro posicionamento admite que é possível a tentativa. O agente subtrai os pertences da vítima, ela o impede, há grave ameaça ou violência e mesmo que o agente tenha tido a posse dos pertences, isso não foi tranquilo e o agente não consegue subtraí-la. Tentativa de roubo impróprio. Para um segundo posicionamento, não se admite a tentativa. Se o agente já tem a posse de algo, já se caracteriza um furto. Quando a vítima chega e impede o roubo, e o agente pratica violência ou grave ameaça, há a tentativa de roubo impróprio.
91 Tentativa de roubo próprio: não há discussão, admite-se a tentativa. Tentativa de roubo impróprio: existem divergências. O 1º posicionamento admite tentativa. No 2º posicionamento, não se admite a tentativa. O STJ entende que não se admite a tentativa.
Exercício 67. O agente aborda a vítima, tentando furtá-la. Mas a vítima não possuía nada para entregar ao Agente.
18. Roubo – Causas de Aumento de Pena – Emprego de Arma 18.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos as causas de aumento de pena por emprego de arma de fogo.
De acordo com o art. 157, § 2º, a pena aumenta de 1\3 até metade se a violência ou ameaça é exercida com o emprego de armas. Vejamos a classificação de armas: Arma própria: fabricada com a finalidade específica para ataque e defesa. Exemplos: faca, revólver. Arma imprópria: não foi fabricada para ataque e defesa, mas passa a ser utilizada para esta finalidade. Exemplo: caco de vidro. De acordo com o posicionamento minoritário divergente, que se refere ao inciso I, é tão somente a arma própria; arma imprópria não incide a causa de aumento. Porque o legislador aumenta a pena quando o agente pratica o roubo com arma própria? A razão que incide essa causa de aumento de pena é que a arma tem um poder ofensivo, a questão da vulnerabilidade; o agente pode até matar a vítima. Em caso de simulacro de arma de fogo, há certa intimidação à vítima. Não houve utilização de armas, mas houve intimação. Nesse caso, não pode incidir a causa de aumento, uma vez que há poder vulnerante. Sujeito chega com uma arma de fogo desmuniciada ou 100% estragada. Aponta para a vítima e consegue praticar o roubo. Incide a causa de aumento?
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18.2 Síntese
92 Não, porque uma arma que não tenha aptidão para efetuar o disparo não tem poder vulnerante, não tem ofensividade. Não incide a causa de aumento.
Exercícios 68. A intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento da pena do crime de roubo consoante de entendimento simulado do STJ. 69. (Magistratura MG – 2009) Caracteriza a hipótese de roubo, art. 157 do Código Penal, em que o agente simulando prestar arma de fogo, ameaça a vítima de morte para subtrair a carteira.
19. Roubo – Armas 19.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos as armas de fogo, seus tipos, apreensão, quadrilha armada e porte.
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19.2 Síntese Arma branca consiste em uma arma que não seja arma de fogo. Exemplo: lança, faca, espada. Para incidir a causa de aumento, o porte da arma precisa ser ostensivo. Não basta o agente estar carregando a arma de fogo e sim de ostentar a arma de fogo. É necessário ou não a apreensão da arma para se fazer perícia? É indispensável a apreensão da arma, para que seja feita a perícia e seja constatada a ofensividade daquela arma. Um primeiro posicionamento do STJ, da 6ª Turma, diz que é indispensável a apreensão da arma. Um segundo posicionamento, do plenário do STF e da 5ª Turma do STJ, entende que é dispensável a apreensão e perícia da arma desde que existam outros modos para provar a ofensividade. STF e STJ passaram a entender que só se justifica o aumento de pena quando a arma tiver potencial ofensivo; será necessário então a prova desse poder ofensivo ou por meio de perícia ou por outras provas. No art. 157, temos o crime de roubo, e no § 2º, inciso I, roubo com emprego de arma, que é uma causa de aumento.
93 No art. 288, temos o crime de quadrilha ou bando. Nesse crime, três ou mais pessoas se associam para fins de cometer crimes. No crime de quadrilha ou bando, existe uma causa de aumento se a quadrilha for armada. Caracteriza-se bis in idem: no direito penal, seria a não observância desse princípio, apenando um indivíduo pelo mesmo “crime” mais de uma vez. Não poderia o agente responder por quadrilha armada e por roubo com o aumento de pena à arma, não se pode utilizar a arma duas vezes: arma para majorar a quadrilha e arma para majorar o crime de roubo. Para o STF, não há o bis in idem, nada impede que ele responda por quadrilha armada e roubo com emprego de arma, porque são bens jurídicos distintos. A quadrilha ou bando afetam os bens jurídicos paz pública. Já o crime de roubo afeta o bem jurídico patrimônio e liberdade pessoal. O agente portando a arma de fogo municiada no primeiro momento. No segundo momento, ele pratica o roubo com o emprego da arma. Dois crimes: 1º crime: porte ilegal de armas de fogo; 2º crime: roubo por emprego de arma de fogo. Este crime de porte será absorvido pelo crime de roubo? 1º posicionamento: o crime de porte de arma de fogo ele é meio para o crime-fim (roubo para o emprego de arma) – crime de perigo; 2º posicionamento: não ocorre a absorção, o agente responderá por dois crimes, somam-se as penas; 3º posicionamento: poderá ou não ser absorvido contra o crime de roubo armado. Há algumas hipóteses a serem estudadas para a absorção. Crime-meio seria absorvido pelo crime-fim.
70. Consoante entendimento majoritário de tribunais superiores, pode-se afirmar que foi considerado falso no crime previsto no art. 157, § 2º do Código Penal aplica-se a causa do aumento somente na hipótese da apreensão da arma de fogo com a prova da potencialidade lesiva. 71. No crime de roubo, se a arma não é apreendida e, consequentemente não pode ser submetido à perícia o autor do crime responde por roubo simples, pois tratando de crime transeunte a prova testemunhal não supre a ausência da perícia mesmo que tenha havido disparo da arma de fogo. 72. Caracteriza bis in idem a condenação dos mesmos agentes pelo crime de quadrilha armada e roubo qualificado pelo uso de armas e concurso de pessoas.
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Exercício
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20. Roubo Majorado 20.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos as demais hipóteses de roubo majorado.
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20.2 Síntese Uma das causas de aumento do § 2º do art. 157, é o seu inciso II: concurso de duas ou mais pessoas. Uma divergência sobre isso: parte da doutrina entende que as pessoas devem estar no momento da execução do roubo para que incida a causa de aumento. Outra parte da doutrina diz não ser necessário estar no local do roubo pode haver um autor e um partícipe. O menor de 18 anos ou o doente mental, que concorreu para um crime de roubo, ele é computado para fins de incidir causas de aumento. Bis in idem: o crime de quadrilha ou bando e ou crime de roubo. Predomina o posicionamento do STF, crime de quadrilha é um crime autônomo. Crime de roubo é outro delito. Vejamos a causa de aumento inciso III: a vítima está em serviço de transportes de valores e o agente conhece tal circunstância. Essa qualificadora (causa de aumento majorante) foi criada para tentar inibir o roubo de transportes de valores. A causa do aumento inciso IV é a seguinte: a subtração foi de veículo automotor que venha a ser transportado para outros estados ou para o exterior. Vejamos a causa do aumento inciso V: o agente mantém a vítima em seu poder restringindo a sua liberdade. Ocorre um roubo com restrição da liberdade da vítima. 1ª situação: ocorre um roubo e a restrição da liberdade poucos segundos. 2ª situação: ocorre um roubo mais a restrição da liberdade por um tempo juridicamente relevante, possui a finalidade de assegurar a execução ou para assegurar a fuga e evitar a ação da polícia. 3ª situação: ocorre um roubo mais a restrição da liberdade também por tempo juridicamente relevante, e essa restrição da liberdade não tem relação com a execução nem com a fuga. 1ª situação: roubo com restrição da liberdade: não se aplica a causa de aumento, pois o tempo não foi juridicamente relevante. 2ª situação: roubo com restrição de liberdade com tempo juridicamente relevante para assegurar a fuga: causa de aumento, aplica-se o inciso V.
95 Vejamos situações de sequestro relâmpago. 1ª situação: roubo mais a restrição da liberdade por tempo juridicamente relevante, não tem relação com a fuga. O agente responderá pelo art. 157 sem a causa de aumento em concurso com o crime do art. 148 sequestro com cárcere privado.
Exercício 73. Se o agente abordar a vítima na rua, e o levar a vários caixas eletrônicos para realizar saques, houve restrição da liberdade?
21. Roubo Qualificado pelo Resultado Lesão Corporal Grave 21.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o roubo qualificado pelo resultado lesão corporal grave.
Qualificadora: pena própria tem o mínimo e o máximo, distinta da pena do caput. Preceito secundário distinto. No § 3º, a pena do roubo passa a ser de sete a quinze anos de multa ou passa a ser de vinte a trinta anos de multa. Vejamos: “Tendo sida a violência resultar em lesão corporal grave, ou se da violência resultar em morte.” Se da violência resultar lesão corporal grave, a pena passará a ser de sete a quinze anos mais a multa. Se resultar em morte, a pena será de vinte a trinta anos mais a multa. No caso de morte nós temos o chamado latrocínio. Latrocínio é um crime hediondo. Cidadão aborda a vítima e pede para a vítima entregar a carteira. A vítima confronta o agente. Houve um roubo com violência. Supondo ainda que a violência fosse tanta que a vítima perdeu a visão. Qual a pena? Lesão corporal grave. A pena é de sete a quinze anos mais multa. Roubo qualificado. Latrocínio é um crime hediondo. Pena de vinte a trinta anos mais a multa. Essa morte pode ser tanto a título de dolo como a título de culpa. Existem autores que falam que o latrocínio é tão somente a título de culpa.
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21.2 Síntese
96 Latrocínio é um crime preterdoloso? Latrocínio é um crime preterdoloso: dolo em relação ao roubo e culpa em relação ao resultado morte. Se o agente mata dolosamente a vítima, para assegurar o roubo, entrou em luta corporal com a vítima, dolosamente o agente mata a vítima e subtrai algo. Houve dolo? Se houve, há um homicídio doloso. No caso de latrocínio, mesmo causado a título de dolo, não é da competência do Tribunal do Júri, Súmula nº 603 do STF, e sim do juízo comum. Se da grave ameaça e não da violência resultar em morte, não se resulta em latrocínio. Cidadão entra na casa da vítima que é uma pessoa muito idosa; o agente agride verbalmente, intimidando a vítima. Essa senhora idosa enfarta e morre. Foi da violência que resultou a morte? Não. Foi da grave ameaça que resultou a morte. Para que ocorra o latrocínio é preciso que a violência resulte em morte e não a grave ameaça. Se excluirmos latrocínio e o agente levar algo: roubo. Se fosse ao agente previsível que a vítima morreria daquela intimidação: homicídio culposo. Dolo eventual: homicídio doloso. No art. 157, § 3º, muito embora esteja escrito violência e não grave ameaça, entende-se que onde está escrito violência lê-se violência física, moral ou até mesmo violência imprópria. A palavra violência nesse artigo é ampla.
Exercício 74. Será que essa violência que resulta em morte pode ocorrer sem qualquer conexão néscia temporal do crime de roubo? Supondo que o agente entre em um banco para roubar. Ele encontra um desafeto na fila, aproveita que estava furtando o banco e mata o
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desafeto. Houve latrocínio?
22. Roubo Qualificado pelo Resultado Morte 22.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o roubo qualificado pelo resultado morte.
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A consumação do crime de latrocínio ocorre com a morte Quando ocorre a consumação do crime de latrocínio? Quando ocorre a morte, segundo posicionamento do Supremo Tribunal Federal, na Súmula nº 610, ainda que o agente não consiga subtrair algo da vítima. Crime consumado: se imaginarmos que o latrocínio é um crime, deveria então haver uma subtração mediante violência, e dessa violência ocorresse a morte. Não há como ter um latrocínio consumado sem ter ocorrido subtração. É possível ou não a tentativa de latrocínio? 1º posicionamento: sim. Exemplo: subtração tentada ou consumada e morte tentada. A vítima não morreu. Roubo e o crime de homicídio tentado, art. 121, § 2º, inciso V. 2ª posicionamento: não. Exemplo: houve uma subtração tentada ou consumada e não morte. Roubo qualificado pela lesão corporal grave, art. 157, § 3º, primeira parte. O agente entra em uma agência bancária com três ou quatro comparsas, mira o segurança, há troca de tiros, o agente acerta e erra na execução acertando um dos parceiros. Erro na execução, mas responde por latrocínio consumado. Se na ação o agente entra em discussão com o seu parceiro e mata-o, foi desvinculada a morte do roubo, não há crime de latrocínio e sim uma morte autônoma, art. 73 do Código Penal, erro na execução. Dolo distinto: o agente combina uma prática de roubo, mas o combinado é executar o roubo sem o emprego de armas, para que não haja mortes. Quando a ação está sendo executada, chega a segurança e o alarme começa a soar. No desespero, um dos agentes saca o revólver e mata uma funcionária. Qual crime ocorreu? Latrocínio consumado, Súmula nº 610, pena mínima de 20 anos. Apenas o agente que fez o disparo é penalizado pelo latrocínio, o outro agente é penalizado por cooperação dolosamente distinta (roubo). No crime de latrocínio, ocorrem três mortes: 1º posicionamento: ocorreu o chamado crime único, as mortes serão consideradas na dosagem da pena. 2º posicionamento: ocorre um concurso formal de crimes, o agente com uma conduta gera mais de um resultado. Responde o agente por um único latrocínio ainda que do seu roubo resulte a morte de mais de uma vítima, sendo a pluralidade de vítimas circunstâncias avaliadas apenas na dosimetria das penas (posicionamento do STF, 5ª Turma do STJ).
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22.2 Síntese
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Exercício 75. A e B agindo de comum acordo apontaram revólveres para C exigindo a entrega de seus bens, quando o B encostou a sua arma no corpo de C esse reagindo entrou em luta corporal com A e B recusando a entrega da ressurtiva. Nesse entreveiro, a arma portada por B disparou e o projétil acertou C que veio a falecer, seguindo-se a fuga de A e B, todavia sem levar coisa alguma de C.
23. Extorsão – Bem Jurídico Tutelado – Sujeitos – Elementos – Consumação 23.1 Apresentação Nesta unidade, iniciaremos o estudo da extorsão.
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23.2 Síntese De acordo com o art. 158 do Código Penal, no crime de extorsão, os bens jurídicos tutelados são o patrimônio, liberdade e incolumidade pessoal. Os sujeitos do mencionado crime são: Sujeito Ativo: qualquer pessoa. Sujeito Passivo: qualquer pessoa. O sujeito passivo da violência ou grave ameaça pode ser distinto do sujeito passivo que sofre a lesão patrimonial. No crime de extorsão, o agente irá praticar uma conduta: constranger alguém mediante violência ou grave ameaça, para obter uma finalidade que é obter o resultado. Para o Agente obter a indevida vantagem econômica, é necessário o comportamento indispensável da vítima. A vítima deve “fazer”, “não fazer” ou “tolerar que se faça algo”. A vítima vai ao caixa eletrônico para realizar um saque. O agente intimida a vítima na tentativa de executar o roubo, supondo que a vítima não entregasse a senha nem o dinheiro. Se a vítima não der a senha ao agente, ele nunca terá o dinheiro, não tem como ter a indevida vantagem econômica. O comportamento da vítima foi indispensável; assim, o crime é de extorsão. O agente pratica uma conduta visando obter indevida vantagem econômica O professor encontra com Juliano em um caixa eletrônico. O professor diz que o Juliano está lhe devendo e pede para sacá-lo do caixa. Há violência
99 intimidando Juliano, este saca e entrega o dinheiro. Não houve extorsão. Porque para haver extorsão é preciso que haja vantagem indevida econômica. Foi realizado exercício arbitrário das próprias razões, conforme art. 345 do Código Penal. De acordo com a Súmula nº 96 do STJ: “O crime de extorsão se consuma independentemente do agente obter indevida vantagem econômica.” A vítima entra em um caixa eletrônico e o agente aborda-a pedindo a senha e o dinheiro. A vítima digita a senha e tenta sacar o dinheiro, no entanto, a máquina quebra. Mesmo não tendo o agente conseguido obter a indevida vantagem econômica, o crime já estaria consumado. Vejamos a diferença entre roubo e extorsão: 1º posicionamento: I – no crime de extorsão o comportamento da vítima é indispensável; II – no crime de roubo o comportamento da vítima é dispensável. 2º posicionamento: I – no crime de extorsão: o agente quer obter uma vantagem futura; II – no crime de roubo: o agente obtém a vantagem momentânea. 3º posicionamento: I – no crime de roubo, a vítima é subtraída; II – no crime de extorsão, a vítima entrega e a agente subtrai.
24. Extorsão – Definição – Causas de Aumento – Qualificadoras 24.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos a extorsão em sua definição, as causas de aumento e qualificadoras.
O crime de extorsão é um crime formal; basta o agente praticar a conduta independentemente de conseguir o resultado que é a indevida vantagem econômica. Vejamos as causas de aumento de pena: Extorsão majorada: “§ 1º Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas ou com o emprego de armas aumenta-se a pena de um terço até metade.” No roubo, fala-se em concurso de duas ou mais pessoas.
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24.2 Síntese
100 Na extorsão, fala-se que o crime foi cometido por duas ou mais pessoas. Na extorsão, de acordo com o § 1º, necessariamente o crime tem que ser executado por duas ou mais pessoas, não existe o partícipe. No roubo, computa-se o partícipe. No § 2º aplica-se a extorsão praticada mediante violência ou disposto no § 3º do artigo anterior (crime de roubo). A extorsão não é um crime hediondo, porém, com o resultado morte é um crime hediondo. Foi acrescentado em 2009 no § 3º: “Se o crime é cometido mediante a rescisão da liberdade da vítima, e essa condição é necessária para obtenção da vantagem econômica, a pena de reclusão é de seis a doze anos além da multa.” Sequestro relâmpago: a vítima e o agente do crime vão ao caixa eletrônico para sacar o dinheiro, depois se dirigem até outros caixas eletrônicos para sacar mais dinheiro. Houve então uma extorsão e restrição da liberdade como condição necessária para obtenção da vantagem. 1º posicionamento: antes da alteração da lei: crime de extorsão, art. 158, a restrição da liberdade era uma circunstância judicial; 2º posicionamento: ocorre a extorsão, art. 148, crime de sequestro e cárcere privado; 3º posicionamento: crime previsto no art. 159, extorsão mediante sequestro e crime hediondo. De acordo com o art. 158, § 3º do Código Penal, “uma extorsão com restrição da liberdade”, mas criou-se um problema porque há diferença entre extorsão do § 3º e a extorsão mediante sequestro. Hoje: a restrição da liberdade passou a ser uma qualificadora do crime de extorsão. Se ocorrer uma restrição de liberdade da vítima como condição necessária para obter a devida vantagem, teremos o crime de extorsão qualificada.
Exercício Direito Penal – Parte Especial
76. Qual a diferença do crime de extorsão qualificada pela restrição da liberdade e o crime de extorsão mediante sequestro?
25. Extorsão Mediante Sequestro 25.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos a extorsão mediante sequestro.
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De acordo com o art. 159 do Código Penal: “Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate: Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.” Elemento do tipo: sequestrar pessoa com o fim de obter qualquer vantagem. Bem jurídico tutelado: Patrimônio: faz parte dos crimes contra o patrimônio; liberdade; incolumidade pessoal. Sujeitos: Ativo: pode ser qualquer pessoa. Passivo: pode ser qualquer pessoa, inclusive pessoa jurídica. O ser humano pode ser sequestrado, privado de sua liberdade de ir e vir. A pessoa jurídica irá sofrer a exigência, o prejuízo patrimonial. Para que ocorra o sequestro, não é necessário o deslocamento da pessoa, basta privar a pessoa de ir, vir ou permanecer. Sequestro: violência, grave ameaça, qualquer outro meio. Elemento subjetivo especial do tipo: qualquer vantagem. Vantagem: 1º posicionamento: natureza econômica e indevida. A exigência do sequestrador pode não ter natureza econômica. Pedir para a esposa do sequestrado vantagem sexual: Não seria crime de extorsão mediante sequestro para esse primeiro posicionamento. Pedir para a esposa do sequestrado vantagem sexual: Nesse caso, teria ocorrido o sequestro e um constrangimento ilegal perante a vantagem sexual. Um credor que sequestra o devedor, a exigência é devida. De acordo com esse posicionamento, o credor teria praticado o crime de sequestro e exercício arbitrário das próprias razões. 2º posicionamento: a vantagem pode ser qualquer uma, com ou sem caráter econômico, devido ou não. Consumação: se consuma quando a vítima é sequestrada, independentemente da vantagem recebida pelo agente. Existe outro posicionamento que acredita que a consumação se dá com a exigência da vantagem após o sequestro. Crime formal: não exige o resultado, ou seja, o recebimento da vantagem. Crime permanente: enquanto a vítima estiver sequestrada, o crime está se realizando; é um crime que se protrai no tempo.
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25.2 Síntese
102 Prazo prescricional: no dia que cessa a atividade ilícita (quando a vítima for liberada), começa a correr o prazo prescricional. Súmula nº 711, STF: A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.
Exercício 77. (Analista Judiciário – AC – 2010) Sobre o crime de extorsão mediante sequestro, incorreto afirmar que: a) Seu objetivo jurídico é o patrimônio e, indiretamente, a liberdade individual e a incolumidade pessoal. b) Se trata de crime permanente. c) Aquele que participou do delito, caso preste informações que facilitem a libertação do sequestro, terá sua pena reduzida. d) Se trata de crime material, que se consuma quando o agente obtém a vantagem econômica exigida. e) Ele se trata de crime formal que admite tentativa.
26. Extorsão Mediante Sequestro – Forma Qualificada – Delação Premiada 26.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos extorsão mediante sequestro na sua forma qualificada e delação premiada.
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26.2 Síntese O art. 159, § 1º contém as seguintes qualificadoras: “Se o sequestro dura mais de 24 (vinte e quatro) horas, se o sequestrado é menor de 18 (dezoito) ou maior de 60 (sessenta) anos, ou se o crime é cometido por bando ou quadrilha: Pena – reclusão, de 12 (doze) a 20 (vinte) anos.” A idade da vítima será levada em consideração quando o crime for praticado no momento de sua consumação. Mesmo que durante o sequestro a vítima se torne maior de idade, o agente responde na forma qualificada, porque o tempo do crime é o início do sequestro. Em relação à maior de 60 anos, a qualificadora será aplicada em qualquer momento do sequestro.
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Exercício 78. O crime de extorsão mediante sequestro trata-se de um crime de consumação antecipada, não se exigindo que o agente obtenha vantagem econômica, o que, se ocorrer, será o exaurimento do crime.
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Acúmulo de qualificadoras: De acordo com um primeiro posicionamento, basta uma das qualificadoras para a pena ser exasperada para 12 a 20 anos. As demais qualificadoras serão consideradas circunstâncias judiciais. De acordo com um segundo posicionamento, basta uma qualificadora, mas a outra qualificadora se for considerada agravante, será contada como agravante. Caso contrário, serão circunstâncias judiciais. Vejamos o § 2º do art. 159 do Código Penal: “Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – reclusão, de 16 (dezesseis) a 24 (vinte e quatro) anos.” Lesão corporal grave: Título de culpa: não quis causar a lesão corporal grave. Título de dolo: quis causar a lesão corporal grave. Vejamos o art. 159, § 3º do Código Penal: “Se resulta a morte: Pena – reclusão, de 24 (vinte e quatro) a 30 (trinta) anos.” É a pena mais alta do Código Penal. Essa morte pode ser causada a título de culpa ou dolo. O crime de extorsão mediante sequestro é crime hediondo independentemente do resultado morte. A delação premiada no crime de sequestro está prevista no art. 159, § 4º do CP. Vejamos: “Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços.” Delação eficaz: para que ocorra essa diminuição de pessoa, deve ocorrer concurso de pessoas (2 ou mais pessoas). Um dos concorrentes denuncia o sequestro à autoridade e essa denúncia facilita a liberação da vítima. Se não facilitar a liberação da vítima, não ocorrerá a delação eficaz. Atenuante: pode ocorrer a circunstância atenuante futuramente, mas não diminuição de pena. Diminuição é mais favorável que atenuante. O Estado está usando um meio imoral, ou seja, induz o criminoso a trair seus parceiros para ter causa de diminuição de pena.
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27. Estelionato – Art. 171, caput 27.1 Apresentação Nesta unidade, iniciaremos o estudo do crime de estelionato.
27.2 Síntese Dispõe o art. 171 do CP: “Art. 171. Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.” É possível observar que o patrimônio é o bem jurídico protegido. Ainda, faz-se necessário observar que o momento consumativo do crime é a obtenção da vantagem ilícita, sendo possível que haja a tentativa neste crime. A pena mínima em abstrato de um ano remete à suspensão condicional do processo. Torpeza bilateral (fraude bilateral): nessa hipótese, a vítima da fraude também age de má-fé, pois há a intenção de obter proveito mediante um negócio ilícito ou imoral. Indaga-se se a má-fé da vítima tem o condão de excluir o crime de estelionato praticado pelo agente: • Não existe crime de estelionato. É o entendimento de Nélson Hungria, Comentários, cit., v. VII, p. 192. • Existe estelionato, não importando a má-fé do ofendido. Nesse sentido: E. Magalhães Noronha, Direito penal, cit., v. 2, p. 375, e Julio Fabbrini Mirabete, Manual, cit., v. 2, p. 303.
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Exercício 79. O objeto jurídico protegido no delito de estelionato é: a) A moral. b) A boa-fé objetiva. c) A torpeza bilateral. d) O patrimônio.
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28. Estelionato Privilegiado e Ilícito Civil 28.1 Apresentação Nesta unidade, serão estudados o estelionato privilegiado e o ilícito civil.
28.2 Síntese
Exercício 80. O estelionato privilegiado tem como principais características: a) O criminoso reincidente e pequeno valor do prejuízo. b) O criminoso primário e pequeno valor da coisa. c) O criminoso reincidente e pequeno valor da coisa. d) O criminoso primário e pequeno valor do prejuízo.
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Primeiro, é preciso entender que o privilégio não significa que não haverá crime. O § 1º do art. 171 do CP dispõe: “Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a pena conforme o disposto no art. 155, § 2º”. Ao contrário do crime de furto privilegiado, exige-se, agora, que seja pequeno o valor do prejuízo e não o do objeto material do crime. Esse valor deve ser aferido no momento da consumação. Prevalece o entendimento no sentido de que pequeno prejuízo é aquele que não ultrapassa um salário-mínimo. Se o prejuízo for de valor pequeno, ínfimo, insignificante, haverá incidência do princípio da insignificância, não havendo crime (fato atípico). Quanto à reparação do dano, há três situações: • No crime de estelionato, com exceção da hipótese prevista no § 2º, VI, do art. 171, a reparação do dano antes do recebimento da denúncia configura arrependimento posterior (CP, art. 16), causa geral de diminuição de pena. • No crime de estelionato, na forma do § 2º, VI, do art. 171, a reparação do dano antes do recebimento da denúncia acarreta a extinção da punibilidade (Súmula nº 554 do STF). • No estelionato, em qualquer de suas modalidades, depois do recebimento da denúncia e antes da sentença, a reparação do dano autoriza a incidência de circunstância atenuante genérica (CP, art. 65, III, “d”).
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29. Estelionato – Outras Fraudes e Súmulas 29.1 Apresentação Nesta unidade, será estudado o crime de estelionato, sendo abordadas também outras fraudes.
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29.2 Síntese O § 2º do art. 171 traz modalidades específicas de estelionato, fraudes que possuem características que a individualizam. “§ 2º Nas mesmas penas incorre quem: Disposição de coisa alheia como própria I – vende, permuta, dá em pagamento, em locação ou em garantia coisa alheia como própria;” A pena aqui é a mesma do estelionato. A segunda figura é a alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria. Exemplo: venda de bem gravado com hipoteca ou que é objeto de reivindicação judicial. A terceira é a defraudação de penhor. O inciso III incrimina a defraudação da garantia pignoratícia mediante alienação (venda, doação etc.) ou por outro modo (destruição, abandono, ocultação etc.). A quarta figura é a fraude na entrega de coisa. A pessoa recebe uma vantagem, mas não paga, não faz a contraprestação. A ação incriminada consiste em defraudar (espoliar, adulterar, privar fraudulentamente) substância, qualidade ou quantidade de coisa que deve entregar a alguém. Existe ainda a fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro. Pune-se aqui a conduta daquele que destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria, ou lesa o próprio corpo ou a saúde, ou agrava as consequências da lesão ou doença, com o intuito de haver indenização ou valor de seguro. O Direito como um todo não pune a autolesão, havendo como exceção a fraude no recebimento de seguro. Por fim, havendo fraude no pagamento por meio de cheque há duas condutas: emitir cheque sem provisão de fundos e a frustrar o pagamento.
Exercício 81. Amputar dolosamente a própria mão para receber um seguro previamente contratado caracteriza-se:
107 a) Fato atípico. b) Fraude para recebimento de indenização. c) Caso de perdão judicial. d) Estelionato simples.
30. Estelionato – Diferença de outros Tipos Penais 30.1 Apresentação Nesta unidade, será estudado o crime de estelionato, sendo abordada a diferença entre este crime e outros tipos penais.
Se um documento é falsificado e utilizado para o sujeito cometer o crime de estelionato, prevalece o entendimento de que se o falso se exaure no estelionato, tem-se apenas estelionato. A Súmula nº 17 do STJ dispõe: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido”. Quanto ao estelionato e furto mediante fraude, no estelionato há entrega da coisa pela própria vítima e no furto mediante fraude o sujeito distrai a atenção da vítima e pega a coisa. Na apropriação indébita o sujeito já está com a coisa e, depois que está na posse lícita da coisa, há inversão do animus e este decide que quer ser dono desta coisa. A Súmula nº 73 do STJ estabelece: “A utilização de papel-moeda grosseiramente falsificado configura, em tese, o crime de estelionato, da competência da Justiça Estadual”. A Súmula nº 107 do STJ estabelece: “Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime de estelionato praticado mediante falsificação de guias de recolhimento das contribuições previdenciárias, quando não ocorrente lesão à autarquia federal”. Por fim, dispõe o § 3º do art. 171: “A pena aumenta-se de 1/3 (um terço), se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência”.
Exercício 82. Usar artifício ou ardil para subtrair bem de terceiro deve ser capitulado como:
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30.2 Síntese
108 a) Furto mediante fraude. b) Estelionato simples. c) Estelionato privilegiado. d) Estelionato majorado.
31. Receptação – Forma Qualificada e Culposa 31.1 Apresentação Nesta unidade, continuaremos a análise da receptação.
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31.2 Síntese O crime de receptação na forma qualificada e culposa está previsto no art. 180, § 1º do Código Penal. Vejamos: “Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime.” Na receptação qualificada, a situação do crime deve ter sido praticada no exercício da atividade comercial ou industrial. Sujeito ativo: quem trabalha nessa área comercial ou industrial. O legislador tentou evitar o roubo, furto e desmanche de carros. Sujeito ativo: deve saber que é produto de crime, indicativo de dolo eventual. No caput, temos que o sujeito sabe ser produto de crime, indicativo de dolo direito. Para o § 1º do art. 180 do Código Penal, seria inconstitucional porque prevê um dolo eventual mais grave que o dolo direto. Um crime por dolo eventual não poderia ter uma pena maior que o crime por dolo direto. Porém, o STF entende que muito embora esteja escrito “deve saber”, está implícito o “sabe”. O legislador expressou “deve saber” para abranger que “sabe”, estando implícito o dolo direto. Em relação à forma qualificada, o STF fala que o que qualifica é praticar o crime em atividade comercial ou industrial e não se sabe ou deve saber ser fruto de crime (STF, 2ª Turma, Recurso Extraordinário nº 3.388). A 6ª Turma do STJ entende que a pena é desproporcional no HC nº 90.235, e entende pela inconstitucionalidade da pena. O art. 180, no seu § 2º, CP traz a seguinte redação: “Equipara-se à atividade comercial, para efeito do parágrafo anterior, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercício em residência.”
109 Art. 180, § 3º, CP: “Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso.” A receptação culposa atende pelo detalhe, pela natureza da coisa, pela desproporção entre o preço e o valor ou pela condição de quem a oferece. Uma pessoa procura “A”, oferecendo um quadro raro para vender. Natureza da coisa – “A” deve desconfiar. Não é comum vender quadros raros em casa. Desproporção do preço e valor: o preço da coisa vendida muito inferior ao preço de mercado. Condição de quem a oferece: deve presumir que a pessoa que está vendendo teria condições financeiras para vender aquilo. Uma pessoa com condições financeiras baixas dificilmente venderia uma coisa cara.
Exercício 83. (Promotor – SP – 2010) O ato de ter em depósito no interior produto fruto de crime não é considerado receptação.
32. Imunidade Penal 32.1 Apresentação Nesta unidade, abordaremos a imunidade penal.
O art. 181 do Código Penal nos traz as escusas absolutórias com a isenção da pena. Vejamos: “É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo: I – do cônjuge, na constância da sociedade conjugal”; Um cônjuge que furta o outro cônjuge está isento de pena. É aplicável essa imunidade aos conviventes? Não, pois o casamento é específico a título de abranger a união estável. “II – de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural.” Imunidade relativa: não temos isenção de pena, temos uma ação penal.
Direito Penal – Parte Especial
32.2 Síntese
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Essa imunidade passa a ser condicionada à representação. Vejamos o art. 182: somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é cometido em prejuízo. Em uma separação, o marido furta a ex-esposa. O MP só vai poder ter legitimidade se a ex-esposa for representada: “I – do cônjuge desquitado ou judicialmente separado; II – de irmão, legítimo ou ilegítimo; III – de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita.” Tios e sobrinhos só se houver coabitação. Exclusão de imunidade. Vejamos o art. 183: “não se aplica o disposto nos dois artigos anteriores: I – se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em geral, quando haja emprego de grave ameaça ou violência à pessoa; II – ao estranho que participa do crime.” Exemplo: O pai com um amigo furtam o filho. “III – se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.”
Capítulo 7
Dos Crimes contra a Dignidade Sexual
1. Estupro – Introdução – Elementos 1.1 Apresentação Nesta unidade, iniciaremos a abordagem do crime de estupro.
1.2 Síntese Antes da Lei nº 12.015/2009, tínhamos o arts. 213 e 214 do Código Penal para o estupro. Após a lei, temos somente o art. 213, pois o art. 214 foi revogado de uma maneira formal. O art. 214 do Código Penal estabelece: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal.”
112 Ocorre que o legislador deixou de considerar o crime desse artigo. O que era crime no art. 214, CP, passou a ser crime de estupro. O art. 213, CP trata de bem jurídico tutelado do estupro. Ele mostra a dignidade e a liberdade sexual. Sujeito ativo e passivo: pode ser qualquer pessoa. Sujeito passivo: antes o sujeito passivo era somente a mulher, atualmente, no estupro, é possível constranger alguém, sendo mulher ou homem. Para muitos doutrinadores, é um crime bicomum. Crime de estupro continua sendo um crime próprio. O estupro pode ser praticado com a conjunção carnal ou com ato libidinoso. Conjunção carnal é a introdução do pênis na vagina. Ato libidinoso é a moralidade da pessoa, é a moralidade da sociedade. Conjunção carnal: nessa modalidade, é necessária uma qualidade especial do sujeito ativo. E continua sendo um crime próprio. Elementos do tipo: – Constranger alguém mediante violência ou grave ameaça. Para que exista o estupro, a vítima não pode querer o ato. A violência é física. Ameaça é a intimidação. Constranger alguém à prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso. Ato libidinoso: a vítima é constrangida a praticar ou permitir que com ela se pratique o ato libidinoso. É aquele que atenta contra a moral e tem um critério objetivo.
Exercício
Direito Penal – Parte Especial
84. É necessário ou não o contato do agente com a vítima?
2. Estupro – Forma Omissiva – Tipos 2.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o crime de estupro na sua forma omissiva.
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Estupro: Forma omissiva e tipo misto. O policial militar é uma pessoa que tem obrigação legal de proteção. Em horário de serviço, ele se depara com alguém apontando uma arma para outra. O policial militar vendo a cena nada faz e o cidadão é vítima de estupro. Quem praticou o crime? Pena – O indivíduo é penalizado por crime de estupro art. 213, CP. Situação do policial militar: embora não tenha consumado o estupro, o policial militar também é penalizado por estupro, uma vez que o policial militar tinha o dever legal para não ter deixado acontecer aquele crime. De acordo com o art. 13, § 2º, do Código Penal, a omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem: a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância. Natureza jurídica O policial irá ser partícipe ou autor do crime? 1ª posição: o policial militar é partícipe por omissão, pois ele auxiliou por omissão. 2ª posição: o policial militar seria autor de um crime de omissivo impróprio, pois ele tinha a obrigação de proteger o cidadão. O crime de estupro é um crime que contém elementos de condutas. Tipo misto alternativo é chamado também de ação múltipla alternativa ou conteúdo variado alternativo. Tipo misto cumulativo é denominado ação múltipla cumulativa ou conteúdo variado cumulativo. 1ª posição: O estupro é um tipo misto alternativo. Se o agente praticar ato libidinoso e conjunção carnal com a mesma vítima, ele pratica o mesmo crime. 2 ª posição: Cada modalidade configura um crime autônomo. Se o agente pratica conjunção carnal e, na segunda, um ato libidinoso, o autor prática dois crimes. É possível um crime continuado com o mesmo contexto e a mesma vítima? 1ª posição: Sim, o STF, em sua 1ª e 2ª Turmas, acredita que sim, pois são crimes da mesma espécie. 2ª posição: Não, o STJ, em sua 5ª Turma, acredita que não há, porque são crimes de espécies distintas.
Exercício 85. (Ministério Público – MG) Durante a realização de um show de rock, em um estágio de futebol, Tício e Mévio querem praticar crime de
Direito Penal – Parte Especial
2.2 Síntese
114 estupro contra uma mulher que está sozinha em um dos corredores do estádio. Os dois, em cooperação, realizam processo violento de submissão da vítima, mas são presos quando Tício já tinha mantido conjunção carnal com a mesma e Mévio ainda não. Na ocasião, também é preso um policial civil que estava de serviço no local e, com interesse lascivo, desde o início observava a ação dos dois homens, sem intervir.
3. Estupro – Conflito de Leis 3.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o conflito de leis no crime de estupro.
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3.2 Síntese A pessoa que praticou o crime antes da edição da Lei nº 12.015/2009 incidia nos art. 213, CP (estupro) e no art. 214, CP (atentado violento ao pudor), contra a mesma vítima no mesmo contexto fático. Antes da vigência dessa lei, havia a condenação pelos dois crimes, mais a pena. Quando há um ato libidinoso e uma condição carnal, é possível, para o STF, que se trate de crime continuado, pois seriam crimes da mesma espécie. Para o STJ, não. Uma vez que este entende que são crimes diversos. Seria a lei nova mais benéfica? 1ª hipótese: Sim, pois o crime seria de tipo misto alternativo, o agente teria cometido apenas um crime. A lei penal é mais favorável, sendo aplicada mesmo após a sentença penal transitada em julgada. 2ª hipótese: O estupro é um crime do tipo misto cumulativo. O agente teria praticado dois crimes. Esse tipo de hipótese tem duas opções. I – Sim, é aplicada a regra do art. 71 do CP. Dois ou mais crimes da mesma espécie. Aplica-se a pena de um só dos crimes. II – Não pode se aplicar o art. 71, pois não são crimes da mesma espécie. Crimes dolosos contra vítimas diferentes. Juiz poderá aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo. Essa lei penal não pode agravar a situação anterior, ou ela é igual ou mais benéfica. O legislador queria agravar a situação, mas acabou beneficiando o agente.
115 Ato libidinoso: às vezes, o agente quer praticar uma conjunção carnal, porém antes dessa prática, ele já praticou o ato libidinoso. O ato libidinoso já está preparado, porém, a doutrina aceita a absorção. Nunca serão absorvidos o sexo oral e coito anal.
Exercício 86. (Defensor Público – BA – 2010 – Cespe – adaptada) Geraldo, maior, capaz, constrangeu Suzana, de dezessete anos de idade mediante violência e grave ameaça, a manter com ele relações sexuais, em mais de uma ocasião e de igual modo. Na terceira investida do agente contra a vítima, em idênticas circunstâncias e forma de execução, constrangeu-a à prática de múltiplos atos libidinosos, diversos da conjunção carnal. Todos os fatos ocorreram no decurso do mês de setembro de 2010. Nessa situação, admite-se o benefício do crime continuado.
4. Estupro – Tipo subjetivo – Consumação 4.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o tipo subjetivo e a consumação do crime de estupro.
Nos elementos subjetivos do crime do estupro, não se discute dolo, é uma consciência e vontade. Além do dolo, é necessário o elemento subjetivo especial do tipo? 1ª hipótese: Sim, na finalidade da satisfação da sua libido. 2ª hipótese: Não, basta o dolo. O cidadão está com raiva de uma pessoa, querendo humilhá-lo, pratica um ato libidinoso contra ela, mas não para satisfazer a sua libido. Esta pessoa pratica um estupro? 1ª hipótese: não haveria o crime de estupro, pois o cidadão não tinha intenção de satisfazer sua libido. 2ª hipótese: Não necessitaria dos elementos, basta o ato libidinoso. Conjunção carnal: o agente constrange a vítima, conseguindo praticar a conjunção carnal. Elemento subjetivo. No ato libidinoso, a vítima sofre ameaça e, num segundo momento, pratica o ato libidinoso.
Direito Penal – Parte Especial
4.2 Síntese
116 A intenção do agente é praticar a conjunção carnal. Ele pratica a ameaça em direção à vítima e toca nos seios dela e no momento antes da introdução, alguém o interrompe contra sua vontade. Seria esse um estupro tentado ou consumado? 1ª hipótese: tentado, porque não houve conjunção carnal, alheio a sua vontade. Uma vez que foi alheio a sua vontade o agente responderia por tentativa de estupro. 2ª hipótese: consumado na modalidade libidinoso. Ele praticou o ato libidinoso sem a conjunção carnal, mas nessa hipótese houve. A desistência voluntária é possível de acordo com o art. 15 do Código Penal. Vejamos: “O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados.” Mesmo o agente desistindo dos atos, ele responde pelo ato que já foi praticado.
Exercício 87. (Procurador do Estado/CE – 2008 – Cespe) Thales deu início à execução de crime de estupro, empregando grave ameaça à vítima e com ela mantendo contato físico. Todavia, em virtude de momentânea falha fisiológica, a conjunção carnal não se consumou. Nessa situação, deve ser reconhecida a desistência voluntária em favor de Thales, que só responderá pelos atos já praticados?
5. Estupro – Forma Qualificada 5.1 Apresentação
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Nesta unidade, estudaremos o estupro em sua forma qualificada.
5.2 Síntese As penas qualificadoras são as seguintes: I – a reclusão é de 8 a 12 anos se houver lesão corporal grave; II – a reclusão é de 12 a 30 anos em caso de morte da vítima. Se da conduta resultar lesão corporal grave, já gerará uma qualificadora, mas a posição majoritária é de que seria a de lesão causada a título de culpa.
117 Segunda posição, que é a minoritária, pode ser causado tanto pela culpa como pelo dolo. O agente pratica violência, dando um soco na vítima, não pretendia e não assumiu o risco de lesão grave. Sendo, então, estupro qualificado. Mesmo se a lesão for dolosa, será qualificada. Vejamos o art. 128, II do Código Penal: “Não se pune o aborto praticado por médico: II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.” Vejamos a segunda qualificadora: Se a vítima for menor de 18 e maior de 14. Na redação da lei diz “menor de 18 ou maior de 14anos”, o correto seria “e” maior de 14 anos. A forma correta é “menor de 18 anos e menor de 14 anos”. Se a vítima tiver exatamente 14 anos, qualificará o crime da mesma forma. Segundo não qualifica, seria subsequente ao dia do aniversário de 14 anos. Um estupro praticado em vítima maior 14 e menor de 18, não será estupro qualificado. Vejamos o art. 213, do Código Penal: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.” Vejamos o art. 217-A, do Código Penal: “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos.” A pena deixa de ser 6 a 19 anos e passa de 8 a 12 anos. Se da conduta resultar a morte da vítima. O agente aborda a vítima, agride a vítima, efetuando o estupro com a morte do agente. Houve a conduta, com o uso da violência. O agente não quis e nem assumiu risco de matar, mas a vítima morreu, em decorrência da culpa. Qualifica-se pelo resultado morte.
Exercício
6. Estupro – Causas de Aumento – Ação Penal 6.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos as causas de aumento de pena no estupro e a ação penal.
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88. A vítima reage, mas mesmo assim ocorre estupro, mas depois do estupro, o agente mata a vítima.
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6.2 Síntese Vejamos a diferença entre qualificadora e causas de aumento: I – qualificadora tem pena autônoma; II – causa de aumento não possui pena autônoma; III – causa de aumento ocorre na aplicação de pena do juiz. Vejamos o art. 226, inciso I do Código Penal: “A pena é aumentada: I – de quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais pessoas.” Concurso de duas ou mais pessoas no crime de estupro: Agente 1 segura a vítima e agente 2 pratica estupro. O concurso de pessoas tem como consequência a causa de aumento. O coito anal é considerado ato libidinoso. Estupro mais ato libidinoso. Dois crimes de estupro com concurso de pessoas. Aplica-se o inciso II do art. 226, do Código Penal. Vejamos: “A pena é aumentada da metade: II – se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela.” Vejamos o art. 234 do Código Penal: “Fazer, importar, exportar, adquirir ou ter sob sua guarda, para fim de comércio, de distribuição ou de exposição pública, escrito, desenho, pintura, estampa ou qualquer objeto obsceno.” Vejamos o art. 128, inciso II, do Código Penal: “Não se pune o aborto praticado por médico: II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal”. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação. O crime de estupro é de ação penal pública condicionada à representação. Trata-se de ação penal pública incondicionada quando a vítima for menor de 18 anos ou vulnerável. Segunda exceção é a Súmula nº 608 do STF: “No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada.” Quando envolver violência ou lesão corporal grave, é ação penal incondicionada. Não existe ação penal privada no crime de estupro. A lei nova é mais severa e não deve retroagir.
Exercício 89. Agente feminino aborda vítima masculina obtendo a conjunção carnal por ameaça, e a agente fica grávida, terá aumento de pena?
119 90. Após a Lei nº 12.015/2009, a regra geral para as ações penais em crimes contra a liberdade sexual, passou a ser a de ação penal pública incondicionada?
7. Estupro de Vulnerável 7.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o estupro de vulnerável.
Vejamos: art. 227-A, do Código Penal: “Induzir alguém a satisfazer a lascívia de outrem: (...) § 1º Se a vítima é maior de 14 (catorze) e menor de 18 (dezoito) anos, ou se o agente é seu ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro, irmão, tutor ou curador ou pessoa a quem esteja confiada para fins de educação, de tratamento ou de guarda.” Ter a conjunção carnal ou outro ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos.” Protege-se o desenvolvimento sexual do menor independentemente de violência ou grave ameaça, teremos o delito, basta a conjunção carnal. Exemplo: vítima com 12 anos, abordada por agente mediante grave ameaça. Se o agente tem 18 anos e a vítima de 12 anos e ocorre a conjunção carnal, praticou o mesmo crime do art. 217-A do Código Penal. O fato típico é o mesmo, com ou sem permissão da vítima. O juiz tem que levar em consideração como circunstância judicial desfavorável no momento da fixação da pena. Hipóteses de erro: o agente conhece vítima de 13 anos, mas a vítima mente dizendo ter 15 e pratica sexo com vítima supondo que tem 15. Fato atípico, logo, não responde pelo crime. Vejamos hipótese de erro de proibição. Exemplo: agente tem 18 anos e vítima tem 13 anos e sabe dessa condição e tem a autorização dos pais da menor para a prática de conjunção carnal. Não houve erro de tipo, e sim um erro de proibição inevitável. De acordo com o art. 21 do Código Penal: “O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena, se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço.”
Direito Penal – Parte Especial
7.2 Síntese
120 Por último, vejamos o art. 213 do Código Penal: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.” Quem praticar violência e conjunção com menor de 14 anos sem saber dessa condição, responde com o enquadramento do art. 213 do Código Penal.
8. Estupro de Vulnerável – Modalidades 8.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos as modalidades de estupro de vulnerável.
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8.2 Síntese Na lei anterior, havia a chamada presunção de violência, uma vez que o art. 213, do Código Penal estabelece: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.” Para ocorrer o 213 ou 214, deveria necessariamente ocorrer violência ou grave ameaça. Exemplo: vítima de 10 anos de idade deixa ser estuprado. O legislador criou no art. 224 a violência presumida nas seguintes hipóteses: I – vítima menor de 14 anos, onde o STF sinaliza com presunção de violência. O tipo penal seria o do art. 213 ou do art. 214 combinado com o art. 224-A. Hoje o que chamamos de estupro de vulnerável era chamado de estupro com violência presumida. Discutia-se se a violência era absoluta ou relativa. Presunção relativa: O STF entendia que a presunção era absoluta. Um segundo posicionamento dizia que a presunção era relativa, se a vítima tivesse capacidade de consentimento. Um terceiro posicionamento entendia que quando a vítima fosse maior de 12 e menor de 14, a presunção era relativa. Menos de 12 anos, a presunção era absoluta. Com a alteração da lei, no art. 217-A do CP, predominou a presunção absoluta em relação a menor de 14 anos. A vítima tem enfermidade ou deficiência mental e, por isso, não tem discernimento para o ato ou por qualquer outra causa não pode oferecer resistência. Coma alcoólico na rua: o agente olha para a vítima praticando o coito anal, ele não tinha a menor possibilidade de oferecer resistência.
121 Em relação a médico que se aproveita de um paciente que está dopado, pós-operação, também se trata de vulnerável. Vejamos o art. 215 do Código Penal: “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima.” Boa noite cinderela, se não anula por completo, e a vítima continua oferecendo certa resistência, seria hipótese do art. 215 do Código Penal.
Exercício 91. Antônio convidou Bruna de 25 anos, e ele colocou uma substância no copo de Bruna. Não podendo oferecer resistência, onde depois teve conjunção carnal. Passado o efeito, ela não se lembrava de nada. Qual o crime?
9. Estupro de Vulnerável – Tipo Subjetivo – Consumação – Forma Qualificada – Conflito de Leis 9.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o tipo subjetivo, consumação, forma qualificada e conflito de leis.
Tipo subjetivo: Dolo. Alguns autores entendem que é necessário o elemento subjetivo especial para a finalidade de satisfazer a lascívia. Já um segundo posicionamento entende que não, que basta o dolo. A consumação ocorre quando o agente pratica conjunção carnal ou ato libidinoso. Forma qualificada se dá se ocorre lesão corporal grave com pena de 6 a 10 anos de reclusão; com morte da vítima, a pena é de 12 a 30 anos de reclusão. Conduta culposa: se da conduta ocorre lesão corporal grave ou morte, a pena é de 10 a 20 anos de reclusão na modalidade culposa. Na modalidade dolosa, a pena é de 12 a 30 anos de reclusão.
Direito Penal – Parte Especial
9.2 Síntese
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Direito Penal – Parte Especial
Forma qualificadora: em concurso com homicídio ou lesão corporal grave. Conflito de leis: Fato 1 – conjunção sem violência grave ameaça, mas vítima menor de 14 anos (art. 213 combinado com art. 224-A). É indiciado por estupro sem violência com a vítima que tem idade igual ou menor a 14 anos. A pena é de reclusão de 6 a 10 anos, do art. 213. Lei de crimes hediondos previa uma pena de metade, sendo a vítima menor de 14 anos. O STF aumenta de 9 a 15 anos de reclusão. Pela nova lei, a pena é de 8 a 15 anos de reclusão. Crime com violência ou grave ameaça à vítima menor de 14 anos. Em certos crimes, não se utiliza o art. 224-A do Código Penal. Isso ocorre quando há uso da violência. Aumenta a pena de metade, 9 a 15 anos. Nessa situação, a lei nova é mais benéfica, já que a pena é de 8 a 15 anos. Vítima menor de 14 anos, com lesão grave: antes a pena estaria no art. 223 do Código Penal: 8 a 12 anos, aumentando metade pela vítima ter menos de 14 anos, se tornando de 12 a 18. A pena atual do art. 217-A do Código Penal, qualificado, é de 10 a 20 anos de reclusão. Conjunção carnal, vítima menos de 14 anos e resulta em morte: antes a pena era de 12 a 25 anos de reclusão. De acordo com o art. 217 do Código Penal, a pena é de 12 a 30 de reclusão se ocorrer a morte.
Capítulo 8
Crimes contra a Paz Pública
1. Art. 286, Código Penal – Incitação ao Crime 1.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos a incitação ao crime.
1.2 Síntese Crimes contra a fé pública são crimes que atentam contra a sensação de segurança e tranquilidade da população. Não basta a tutela legal oferecida com a incriminação de certas condutas. É indispensável que se evitem fatos causadores de alarme e insegurança social. A prevenção deve abranger situações que embora não atinjam direitos individuais ou sociais, constituam atos preparatórios da prática de crime.
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124 A paz pública tem aspecto objetivo e aspeto subjetivo. O aspecto subjetivo consiste em o indivíduo se sentir seguro em sua região de habitação. O aspecto objetivo é todo o arcabouço jurídico que o conjunto de indivíduos tem e que lhes dará proteção quando precisarem. Em outros países, os crimes assemelhados a eles são chamados de crimes contra a ordem pública. O legislador brasileiro entendeu que o termo seria muito vago. Ordem pública seria gênero, e paz pública a sua consequência. São três os crimes que compõem o Título IX do Código Penal. São eles: I – incitação ao crime; II – apologia ao crime; III – quadrilha ou bando. Os dois primeiros exigem a questão da publicidade. A incitação ao crime, prevista no art. 286 do Código Penal. Vejamos: “Incitar publicamente a prática de crime: Pena: detenção de 3 a 6 meses ou multa.” O verbo incitar tem o significado de provocar entre outro. Pune-se o comportamento de quem incita a prática de fato expressamente previsto em lei, não se englobando a contravenção ou qualquer ato imoral. A incitação deve ser feita publicamente. Para a consumação do crime, não se exige um resultado naturalístico, por se tratar de um crime de perigo abstrato, sem a necessidade de se comprovar um perigo concreto para a coletividade. Se a incitação não for absorvida, caso o agente tenha feito em público, responderá pelo crime. O crime de perigo concreto necessita ser provado, pois nele o perigo não se presume. No crime de perigo abstrato, existe uma probabilidade de dano presumida pela lei que independe de prova. A lei nesse caso não requer que o perigo seja percebido. A mera constatação da ocorrência do fato previsto na lei supõe a subsunção e passa a exigir a responsabilidade do sujeito ativo. Para o crime de incitação ao crime, basta a incitação. O professor Bottini realça a questão que limita a concretização desse crime. Segundo ele, não se exige lesão e nem perigo concreto, mas requer-se, para a tipicidade da conduta, ao menos uma demonstração da sua capacidade potencial de causar dano, da sua periculosidade abstrata. Afasta do Código Penal condutas inócuas, irrelevantes. Outro autor, Luiz Régis Prado, entende que o escopo que se tem com a realização dessas condutas é a prevenção da realização dos crimes. Quando pensamos em crimes de perigo concreto, a ideia central é a prevenção.
125 A incitação à prática de crime por se tratar de crime formal, admite tentativa? Sim, como quando um indivíduo é preso em que fixava cartazes. A incitação à prática de greve não se enquadra no delito do art. 286 do Código Penal. O sujeito passivo é a coletividade. Em relação ao dolo, é necessária a vontade de incitar a prática de crime, tendo o agente ciência de que está se dirigindo a um grande número de pessoas. Como a pena PE de detenção de 3 a 6 meses, caberá a transação penal bem como a suspensão condicional do processo. A ação penal nesses casos será sempre pública incondicionada.
2. Apologia ao Crime (Art. 287, CP) 2.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos a apologia ao crime.
Esse crime consiste em fazer publicamente apologia de fato criminoso ou de autor de crime. Pena: detenção de 3 a seis meses, ou multa. Tutela-se a paz pública quando colocada presumidamente em perigo com apologia que não passa de incitação indireta ao crime. Esse delito seria a propaganda com o efeito de incitar uma imitação. Apologia é defender, exaltar, enaltecer. Não constitui apologia criminosa descrever ou justificar um fato, ou de ressaltar qualidades reais e imaginárias do criminoso, desde que não implique o elogio pelo crime praticado. Nada impede que qualquer pessoa enalteça eventuais virtudes do autor de um crime de forma solidária. Esse crime se consuma com o ato de louvação pública independentemente do resultado. É um crime formal. O delito aqui estudado só pode ser praticado na sua forma dolosa. A conduta deve ser praticada publicamente, uma vez que a publicidade é requisito do tipo. A apologia deve ser dirigida ou presenciada por um número indeterminado de pessoas. O crime de bigamia não foi revogado.
Direito Penal – Parte Especial
2.2 Síntese
126 Apesar da Lei de Imprensa ter sido revogada, não houve abolitio criminis em relação ao jornalista que pratique apologia ao crime. Ele se enquadrará no art. 287 do Código Penal. A referência à lei e a fato criminoso implica na exclusão da apologia de contravenção ou ato imoral, ainda que seja uma infração disciplinar. Em relação à expressão autor de crime a que se refere o artigo, não importa se já foi condenado ou apenas denunciado pelo crime. A apologia ao fato é passado, não se podem enaltecer condutas futuras. O STF entendeu que a marcha da maconha não se trata de apologia. Segundo o ministro Celso de Mello, a mera proposta de descriminalização de ilícito penal não deve ser confundida com ato de incitação ou apologia de fato criminoso. A marcha é espaço para reflexão e debate para o tema, por meio de palestras e seminários.
3. Quadrilha ou Bando em Face da Lei nº 12.720/2012 3.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o crime de quadrilha ou bando.
Direito Penal – Parte Especial
3.2 Síntese O crime de quadrilha ou bando consiste em associarem-se mais de três pessoas em quadrilha ou bando para o fim de cometer crimes. Pena: reclusão de 1 a 3 anos. Parágrafo único. A pena aplica-se em dobro se a quadrilha ou bando é armado. Quadrilha e bando são termos sinônimos e significam a reunião de no mínimo 4 pessoas, em caráter estável e permanente, visando a prática de delitos, ainda que não os tenha efetivamente cometido. O próprio código não faz essa distinção. Caso sejam apenas 3 pessoas, é coautoria ou participação. Cumpre ressaltar que é necessário um vínculo associativo permanente, e não ocasional. Não preenche o tipo reunião ocasional. O dolo genérico é o elemento subjetivo do bando. É a vontade livre e consciente de querer se associar a outras pessoas para cometer crimes. A jurisprudência tem entendido que a prática do crime em continuidade delitiva também caracteriza o delito.
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Direito Penal – Parte Especial
É um delito permanente e formal, independente de um resultado fático, naturalístico, para que se consume o resultado. Ele se consuma no momento em que o agente se associa, mesmo sem ocorrer crime. Eventual abandono do crime é indiferente, pois já está consumado. A tentativa é impossível porque o crime é punido no momento dos atos preparatórios. Em relação ao parágrafo único, a doutrina é pacífica de que pode se tratar tanto de arma própria, para defesa ou para o ataque, ou arma imprópria. Qualquer objeto sendo usado para ataque. Para que haja essa qualificadora, pelo menos uma arma deve ser encontrada em poder do bando. A Lei dos Crimes Hediondos também abrange esse tema no seu art. 8º dizendo que a pena prevista no art. 288 do Código Penal será de reclusão de 3 a 6 anos, quando se tratar de crimes hediondos, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou terrorismo. É cabível também o parágrafo único. A delação premiada é cabível desde que preenchidos os seus requisitos legais. Crime de constituição de milícia privada no art. 288-A do Código Penal, traz a seguinte redação: “Constituir, organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos neste Código: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos.” Assim, a nova Lei nº 12.720/2012 criou uma nova associação.
Capítulo 9
Crimes contra a Fé Pública
1. Falsificação de Documento Público e Particular 1.1 Apresentação Nesta unidade, iniciaremos o estudo dos crimes contra a fé pública.
1.2 Síntese Vejamos o art. 297 do Código Penal: “Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro.” Vejamos também o art. 298 do Código Penal: “Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro.” Bens jurídicos tutelados: I – fé pública; II – autenticidade dos documentos;
129 III – principal requisito: imitação da verdade; IV – caso contrário, não há como ofender a fé pública. Só a imitação tem a possibilidade de causar dano. Que aquele documento falso interfira nas relações jurídicas. São crimes dolosos, não é possível a modalidade culposa. A falsificação grosseira não é crime de falso Sujeito Passivo é o Estado. Sujeito Ativo pode ser qualquer pessoa. De acordo com o art. 297, § 1º do Código Penal: “Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.” Requisitos de documentos devem ter 4 elementos: – forma escrita; – autor determinado; – conteúdo; – capacidade de ser utilizado como meio de prova. Pinturas, gravuras, composições musicais não são considerados documentos, podem ser objeto, material de crime, mas não documento. O conteúdo consiste na declaração de vontade ou expressão de fato.
Exercício
2. Falsificação de Documento Público e Particular – Espécies de Documento – Condutas Típicas 2.1 Apresentação do capítulo Nesta unidade, estudaremos a falsificação de documento público e particular, espécies de documentos e condutas típicas.
Direito Penal – Parte Especial
92. Avalie as questões a seguir: De acordo com o STJ, a falsificação grosseira afasta o delito de documento falso. 93. Na falsificação, o sujeito ativo sendo funcionário público em consideração pelo cargo pode ser um diferencial penal.
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2.2 Síntese Documento público é aquele que foi elaborado por funcionário público no exercício de suas funções, observando as formalidades legais. Pode ser formalmente público e substancialmente particular, com conteúdo de interesse público, atos dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Exemplo de conteúdo preponderantemente particular é a escritura de compra e venda. Objeto material é o documento público. O documento equiparado público está previsto no § 2º do art. 297 do Código Penal, e é o emanado por entidade paraestatal por equiparação para efeitos penais. O cheque é um documento público. Quando não por transmitido por endosso não é mais público, passa a ser particular. Documento particular é aquele que não é público, nem equiparado. Alterar ou falsificar são elementos de conduta, e a falsificação pode ser total ou parcial. Falsificação total: contratação total do documento; elaboração de um documento que não existe. Na falsificação parcial, o documento existe, o agente modifica, mas acrescenta conteúdo. Alteração do documento: o documento também existe, mas o agente substitui o conteúdo. O que foi substituído não tem autonomia jurídica. Exemplo: alteração do valor do cheque.
Exercício
Direito Penal – Parte Especial
94. (Procurador de Contas – TCE – 2010) Constituem objeto material do delito de falsificação de documento público: a) o cheque e o testamento particular.
3. Falsificação de Documento Público e Particular – Tipo Subjetivo – Consumações – Particularidades 3.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos a falsificação de documento público e particular, seu tipo subjetivo, consumação e particularidades.
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3.2 Síntese Elemento subjetivo do crime é o dolo. Não se exige dolo específico, basta a vontade de falsificar ou alterar. Não precisa de elemento subjetivo especial. Não precisa ser utilizado o documento. Não exista na modalidade culposa. A consumação é feita a partir do término da falsificação, pois já gera uma possibilidade de perigo. Tentativa é admitida sim. Fotocópia autenticada com alteração de conteúdo, sim, é crime, pois há a autenticação. Se for particular a fotocópia, será falsificação particular. Fotocópia não pode, pois não tem potencialidade ofensiva. Clonagem de cartão de crédito configura o crime do art. 298 do Código Penal. Substituição de foto em RG trata-se de falsificação de documento público. Trata-se de falsa identidade, crime previsto no art. 307 do Código Penal. Documento escrito a lápis, não predomina crime de falso. STJ e parte doutrina entendem que se o falso se exaurir, será absorvido pelo estelionato. Se o falso não se exaurir, responderá pelos dois crimes de acordo com a Súmula nº 17 do STJ. Para o STF, não haverá absorção em nenhuma hipótese, pois ofende bens jurídicos distintos. Aplica-se a regra do concurso formal. No concurso material, somam-se as penas dos crimes distintos. O crime de estelionato é um pos factum imponível.
Exercícios
96. (Analista Judiciário – TRE/MA – 2009) A substituição de fotografia no documento de identidade verdadeiro, caracteriza, em tese, o delito de falsa identidade.
4. Falsidade Ideológica 4.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos a falsidade ideológica.
Direito Penal – Parte Especial
95. (Magistratura TRT 1ª Região – 2010) A substituição de fotografia em documento público de identidade verdadeiro, pertencente a outrem, com a intenção de falsificá-lo, configura o crime de falsificação de documento público.
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4.2 Síntese
Direito Penal – Parte Especial
Na falsidade ideológica, temos como verbos: omitir, inserir ou fazer inserir. Omitir: omissão de documento público ou particular, declaração que devia constar, com fim de alterar relação jurídica. O agente omite em documento público ou particular declaração que deveria constar. Inserir: inserir ou fazer inserir informação falsa. Inserir: supomos que o agente queira fazer um financiamento, mas para tanto é necessário que o agente perceba a quantia de R$ 5.000,00. A fim de obter esse financiamento, o agente insere na declaração que percebe mensalmente R$ 7.000,00, quando em verdade só percebe R$ 2.000,00, ou seja, a declaração, o papel, a escrita não possuem vício algum. Falsa é somente a informação inserida. Não basta o agente inserir ou fazer inserir informação falsa. No crime de falsidade ideológica, é necessário que o agente tenha a finalidade de prejudicar alguém. O crime se consuma mesmo que o agente não consiga obter o que ele pretendia, basta somente a intenção. O crime de falsidade ideológica trata-se de um crime formal. Elemento subjetivo do tipo: dolo. Causas de aumento de pena: parágrafo único do art. 299 do CP. Não basta ser funcionário público, tem que prevalecer-se da profissão. Vejamos o art. 299 do Código Penal: “Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante: Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa, se o documento é particular. Parágrafo único. Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.”
Exercícios 97. (Ministério Público de São Paulo – 2003) O funcionário público que ao informar seus dados pessoais para a elaboração de um compromisso de compra e venda de um apartamento, fornece declaração falsa de estado civil, com intenção de prejudicar o cônjuge, de quem pretendia se separar, responde pelo crime de:
133 98. (Magistratura TRT 1ª Região – 2010) Para a aplicação da pena pela prática do crime de falsidade ideológica, é irrelevante o documento ser público ou particular.
5. Diferença entre Falsidade Ideológica e Falsidade Material 5.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos a diferença entre falsidade ideológica e falsidade material.
Vejamos a diferença entre falsidade ideológica e falsidade material. Na falsidade ideológica, o documento é formalmente perfeito, ou seja, ele não possui vício em sua forma. O documento é falso no seu conteúdo. Em regra, não há necessidade de perícia, porque a ideia e conteúdo são falsos. Na falsidade ideológica, o falsificador possui legitimidade para elaborar o documento. Não há vício externo; o documento não possui rasuras e vícios em sua aparência. Na falsidade material, vejamos o art. 297 do Código Penal: “Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. § 1º Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.” Vejamos ainda o art. 298 do Código Penal: “Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro: Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.” Na falsidade material, o falsificador não possui legitimidade para elaborar o documento. Exemplo: criar uma carteira de identidade (falsidade material). Em regra, é necessária a perícia. A própria forma do documento é falsa.
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5.2 Síntese
134 Há vício no documento. No crime de falsidade ideológica, o conteúdo que é falso tem que ter aptidão por si só que é falso. Potencialidade lesiva, aquele conteúdo não tem como provar o fato narrado. O advogado que protocoliza petição inicial narrando fatos falsos, não configura falsidade material por ele estar apenas requerendo, e terá que provar os fatos narrados.
Exercícios 99. (Analista Judiciário – 2009) No delito de falsidade ideológica o documento PE formalmente perfeito, sendo falsa a ideia nele contida. 100. (Magistratura MG – 2005) A inserção de declaração falsa em petição inicial, na qual se expõe ao juiz determinada pretensão, não configura o crime de falsidade ideológica (art. 299, CP).
6. Uso de Documento Falso 1.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o crime de uso de documento falso.
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1.2 Síntese O crime de uso de documento falso está previsto no art. 304 do Código Penal. Vejamos: “Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302: Pena – a cominada à falsificação ou à alteração.” Como pressuposto desse crime, temos um crime de falsidade material e ideológica. O agente comete o crime quando ele tem consciência, ou seja, quando faz uso do documento com uma finalidade específica. O uso pode ser espontâneo, ou porque houve exigência da autoridade. Atenção: fazer uso é diferente de portar, pois portar documento falso não é mesma coisa que usar. Exemplo: andando na rua portando um documento falso, o policial aborda, tira do bolso uma identidade e diz a ele que é falsa, e a pessoa confirma que é falsa.
135 Ele cometeu o uso de documento falso? Não, pois não fez uso do documento e sim o porte dele. Pode ser preso em flagrante pelo documento? Não, pois não estava em uso. Não haverá flagrante se o agente tiver portando um documento falso. Crime será se ele tiver falsificado. O agente falsifica o documento e, em um segundo momento, faz o uso. Responderá somente pelo falso, e não pelo uso, segundo o posicionamento predominante. Um segundo posicionamento minoritário: a pessoa responde tão somente pelo uso e não pelo falso. O crime de falso é absorvido pelo de uso. A pessoa tem uma carteira de identidade falsa, e faz uso para omitir antecedentes criminais, na presença de uma autoridade policial. Ele responde pelo crime de falso? Segundo o STJ, se a pessoa usou carteira de identidade para esconder antecedentes criminais, está exercendo seu direito constitucional de defesa, de se manter em silêncio. Portanto, não seria crime. Num segundo posicionamento, ele responde sim pelo crime, pois o documento falso possui potencialidade para ofender a fé pública.
Exercício 101. (Magistratura TRT 1ª Região – 2010) Ante a ausência de espontaneidade, não há crime de uso de documento falso, quando o agente o exibe para sua identificação em virtude da exigência por parte da autoridade policial.
7. Falsa Identidade
Nesta unidade, analisaremos o crime de falsa identidade.
7.2 Síntese Vejamos o art. 307 do Código Penal: “Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem:
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7.1 Apresentação
136 Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.” Tipo penal: atribuir-se para si ou atribuir à terceira pessoa falsa identidade, para obter vantagem ou em proveito próprio. Identidade são dados referentes ao indivíduo que o identifica e o distingue dos demais, como: nome, sexo, identidade civil. A identidade seria tão somente a identidade física da pessoa, porém, essa identidade não predomina, e sim num sentido amplo. O agente só vai responder se ele não tiver cometido um crime mais grave, é um crime subsidiário. O agente troca a foto do seu RG. Qual crime ele pratica? Ele responde por crime por falsificação de documento público. Crime de falso: preenchimento de papel assinado em branco. Se a pessoa que estava autorizada a preencher e preencheu de maneira diferente, ocorre a falsidade ideológica. Se não tinha autorização para preencher, ocorre o crime de falsidade material. Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido. O crime de falso prevalece sobre o crime de estelionato, pois ofende o bem jurídico.
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Exercícios 102. (Defensor Público – ES – 2009) Ao ser abordado por policiais militares em procedimento rotineiro no centro da cidade aonde mora, o indivíduo se identifica com outro nome a fim de prover antecedentes penais. Esse indivíduo praticará o delito de falsa identidade. 103. (Magistratura – MG – 2004) José Maria recebeu de Mário de Souza, seu amigo, que precisava viajar, um cheque assinado em branco, para que fosse preenchido com o valor da prestação de um financiamento em atraso, acrescido de juros e mora, cujo montante ele desconhecia. Traindo a confiança do amigo José Maria, preencheu o cheque com valor muito superior ao débito, e foi ao banco para descontá-lo. O caixa do banco, porém, desconfiado de alguma coisa ligou para Mário, de quem também era amigo. Acabando com os planos de José Maria, chamou a polícia na hora, que efetuou a prisão em flagrante. Qual o crime praticado:
Capítulo 10
Crimes contra a Administração Pública
1. Peculato 1.1 Apresentação Nesta unidade, iniciaremos a análise dos crimes contra a Administração Pública.
1.2 Síntese O peculato está na Parte Especial do Código Penal, no Título XI, dos Crimes contra a Administração Pública. Peculato: crime praticado por funcionários públicos. Vejamos o art. 312 do Código Penal: “Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio: Pena – reclusão, de dois a doze anos, e multa.”
138 Bem jurídico tutelado: moralidade administrativa, probidade e o patrimônio. Elementos: no crime de peculato, existe várias modalidades; o art. 312 prevê o chamado peculato apropriação e também peculato desvio. Vejamos o § 1º do art. 312 do Código Penal: “Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.” Esse parágrafo prevê o peculato furto, também chamado de impróprio. E o § 2º prevê o peculato culposo. Vejamos: “Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem: Pena – detenção, de três meses a um ano.” O funcionário público apropria-se do objeto material descrito no título, em razão da sua função se tem a posse, ou detenção. Esse objeto pode ser público ou particular.
Exercício 104. Se “A” tem posse da coisa, mas essa pessoa não é funcionário público que crime ela comete?
2. Peculato – Elementos Subjetivos – Consumação 2.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos os elementos subjetivos e a consumação do crime de peculato.
Direito Penal – Parte Especial
2.2 Síntese Peculato: trata-se do caput de um crime doloso e não temos o elemento subjetivo especial do tipo em proveito próprio ou alheio. Não configura o crime de peculato o chamado peculato uso. Um funcionário público que está utilizando um imóvel. Na doutrina, ele não comete crime, porque ele não quer se apropriar do bem. Utilizar o carro, que é bem infungível, não responde por peculato, mas responde pela gasolina que consumiu, arcada com o dinheiro público, por ser uma coisa consumível.
139 É o que predomina, pois ele não quer apropriar-se. Se for de coisa consumível, ou seja, fungível, configurará peculato. “Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio: Pena – reclusão, de dois a doze anos, e multa”. Se a pessoa que está usando o bem, for prefeito, cometerá crime, de acordo com o Decreto-lei nº 201/1967. A CLT no art. 552 dispõe o seguinte: “Os atos que importem em malversação ou dilapidação do patrimônio das associações ou entidades sindicais ficam equiparados ao crime de peculato julgado e punido na conformidade da legislação penal.” Não houve recepção desse dispositivo da CLT. O STJ entende que foi recepcionado. Consumação do Peculato se dá: I – quando o agente passa a se comportar como dono. Exemplo: ele venda a coisa; II – quando o agente dá destinação diversa à prevista em lei (peculato desvio). Se o agente der uma destinação diversa da lei, em proveito da própria administração pública, ele não pratica peculato, mas sim o art. 315 do Código Penal. Vejamos: “Dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei: Pena – detenção, de um a três meses, ou multa.”
105. (Procurador do Ministério Público – GO – 2007) Para a configuração do crime de peculato desvio, é necessário a presença de dolo genérico e dolo específico? 106. (Procurador do Estado – PA – 2009) No peculato apropriação o delito consuma-se quando o agente se investe na posse de um bem móvel, agindo como se fosse dono, que detinha em razão do cargo. A previsão legal do peculato de uso quando o agente utiliza um bem público sem autorização de seu superior hierárquico. 107. (Ministério Público Federal – Procurador da República – 2006) X, valendo-se das facilidades que lhe são proporcionadas em razão do cargo de diretor da carteira de habilitação da Caixa Econômica Federal, que exerce há dois anos e dois meses, apropriou-se indevidamente em proveito próprio, de parte do dinheiro sob a sua posse, que deveria destinar a construção de casas populares. “X” cometeu delito como:
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Exercícios
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3. Peculato Furto e Peculato Culposo 3.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o peculato furto e o peculato culposo.
Direito Penal – Parte Especial
3.2 Síntese Vejamos o art. 312, § 1º do Código Penal: “Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.” Peculato furto, também denominado peculato impróprio, nesse crime o agente (funcionário público) não tem a posse do valor do bem. Como ele não tem a posse, ele subtrai ou concorre para a subtração da coisa. É necessário que ele aproveite da facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário. Vejamos agora o art. 312, § 2º: “Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem: Pena – detenção, de três meses a um ano.” No peculato culposo, consta que o agente (funcionário público) concorre culposamente para o crime de outrem. Qual o crime de outrem? 1ª posição: o crime de outrem deve ser peculato doloso, apropriação, desvio ou peculato furto. Exemplo: o funcionário público que tenha a obrigação de vigiar determinada coisa, ele sai do local de trabalho numa situação que não poderia, e nisso, um outro funcionário público subtrai a coisa. 2ª posição: o outro crime não precisa ser peculato, uma vez que, pode ser um furto, por exemplo. Reparação de dano no peculato culposo: se for antes do trânsito em julgado, ocorrerá a extinção da punibilidade, se for após, causará diminuição (da vontade). Vejamos o art. 312, § 3º: “No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta.” Se o funcionário público cometeu peculato doloso (peculato de apropriação, desvio ou furto) e reparou o dano, essa ação terá repercussão na
141 pena, podendo haver a diminuição da pena aplicando o art. 16 do Código Penal. Vejamos o mencionado artigo: “Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços.”
Exercício 108. (Ministério Público – SP – 2003) O funcionário público que, ao informar seus dados pessoais para elaboração de compromisso de compra e venda de um apartamento, fornece falsa declaração de estado civil com a intenção de prejudicar o cônjuge, de quem pretendia se separar, responde pelo crime de:
4. Peculato Mediante Erro de Outrem 4.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o peculato mediante erro de outrem.
Vejamos o art. 313 do Código Penal: “Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem: Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.” É chamado de peculato mediante erro de outrem, onde o funcionário público tem a posse da coisa. Ele tem a posse porque ele recebeu a coisa por erro de outrem. Consumação: esse delito se consuma quando o agente se apropria, e não no momento que ele recebe. Ocorre, porém, quando o agente passa a se comportar como dono. Exemplo: venda. Supondo que uma pessoa que não seja funcionário público receba uma coisa por erro de outrem e se aproprie. De acordo com o art. 169 do Código Penal, a pessoa responde por crime contra o patrimônio. Vejamos: “Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela.
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4.2 Síntese
142
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§ 1º Na hipótese deste artigo, quando ao agente tiver sido aplicada pena privativa de liberdade, não suspensa, por um dos crimes, para os demais será incabível a substituição de que trata o art. 44 deste Código. § 2º Quando forem aplicadas penas restritivas de direitos, o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais.” Se o agente induz a vítima em erro para que a vítima entregue a coisa, predomina que ele responda por estelionato e não peculato mediante erro de outrem. Só ocorre o art. 313 nesse caso, ou seja, se a pessoa que entregou a coisa ao funcionário errou espontaneamente. Vejamos o art. 313-A: “Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.” Quem faz o previsto no caput é um funcionário público autorizado. Trata-se de um crime formal para ter um fim de cometer vantagem ou causa dano. Se ele conseguir alcançar seu objetivo, teremos um crime exaurido. Vejamos o art. 313-B: “Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de informações ou programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente. Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou para o administrado”. Diferença entre “A” e “B”: “A”: o agente altera ou exclui o dado correto, com um fim de obter vantagem ou causa dano; “B”: modifica ou altera o sistema, mas não querendo causar dano.
Exercício 109. (Promotor de Justiça – MG – 2010) O Procurador-Geral do estado de Minas Gerais, conclui processo legal e regular de compra de microcomputadores, destinados a superintendência judiciária da instituição. Recebidos os equipamentos, o diretor geral determinou a entrega dos microcomputadores aos destinatários. Malandrus, funcionário público concursado, lotado na superintendência de finanças do órgão,
143 recebeu em sua sala, equivocadamente, o aparelho que seria destinado aos servidores da superintendência judiciária. Ocorre que o servidor responsável pela entrega do microcomputador, enganou-se quanto a pessoa a quem deveria encaminhar o bem, vindo entregá-la a Malandrus que a recebeu sem fazer qualquer questionamento ou consideração, plenamente consciente do descuido havido na entrega equivocada do microcomputador. Na realidade, o bem deveria ter sido entregue para homônimo do Malandrus, que trabalhava na superintendência judiciária da procuradoria da justiça. Depois de receber o bem, Malandrus levou o microcomputador para sua residência. Pouco tempo depois, cerca de trinta dias, vendeu o bem móvel pela quantia de R$ 200,00, cerca de 10% do seu valor real de mercado. Malandrus efetuou conduta que se insere na modalidade de crimes contra: a) O patrimônio. b) O patrimônio público. c) A administração pública. d) A administração da justiça. e) A fé pública.
5. Concussão 5.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos a concussão.
Vejamos o art. 316 do Código Penal: “Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida: Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa.” Na concussão, temos como verbo tipo exigido, onde o agente vai exigir uma vantagem indevida. Vale lembrar que esse exigir é para si ou para outrem, direta ou indiretamente. Elementos do tipo penal: – para si ou para outrem; – direta ou indiretamente.
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5.2 Síntese
144 Ainda que fora da função ou mesmo antes de assumir a função, mas em razão dela vantagem indevida. Exigência: há uma forma de coação em relação à vítima. O funcionário público em regra exige uma vantagem indevida. Segundo a doutrina, pode a exigência, porém, sem a violência, mas sim com intimidação. A vantagem indevida predomina e pode ser de qualquer natureza, ou seja, econômica ou não econômica. No crime de concussão, o funcionário público exige com uma competência relacionada com o ato da sua função. Consumação do crime: esse crime é um crime formal, com a prática de conduta de exigir. Bastou o agente exigir, que o crime estará concluído.
Exercício 110. (Promotor de Justiça – RO – 2005) Fiscal fazendário solicitou do dono de uma loja de eletrodomésticos R$ 10.000,00 para não lavrar auto de infração e imposição de multa vultuosa, ante a existência de situação fiscal irregular. O dono da loja, fingindo concordar em pagar a importância pedida, comunicou o fato a polícia, que prendeu o fiscal enquanto era simulada a entrega da quantia da entrega mencionada. Configurou ou não o fato típico? Justifique.
6. Excesso de Exação 6.1 Apresentação
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Nesta unidade, analisaremos as modalidades de concussão e o excesso de exação.
6.2 Síntese Na concussão, o agente exige uma vantagem indevida. O art. 316, § 1º do Código Penal, traz o crime de excesso de exação. Se um funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber ser indevido. No excesso de exação, o funcionário não exige nada para ele. Exige um tributo ou contribuição social.
145 Emprega na cobrança de um tributo devido meio vexatório ou gravoso. Está cobrando um tributo que é devido, mas, na forma que o faz, é vexatória ou gravosa, ou seja, forma que a lei não autoriza. Vejamos o § 1º do art. 316: “Se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza: Pena – reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa.” O excesso de exação não pode ser confundido com a concussão. Na concussão, o agente exige vantagem indevida. No excesso de exação, exige tributo indevido, ou se devido, de forma vexatória. O art. 3º da Lei nº 8.137/1990: exigir vantagem indevida específica para que o agente deixe de cobrar um tributo que era devido. Excesso de exação: Primeira modalidade: exige tributo indevido. Segunda modalidade: exige tributo indevido; quanto à legislação específica, ele exige vantagem para deixar de cobrar tributo. O art. 316, § 2º do Código Penal diz que não se trata de qualificadora do caput, mas sim do excesso de exação. “§ 2º Se o funcionário desvia, em proveito próprio ou de outrem, o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.” Para que incida a qualificadora, é necessário que tenha havido o delito do excesso de exação. Ele deve desviar em proveito próprio ou de outrem.
Exercício
7. Corrupção Passiva 7.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos a corrupção ativa e a corrupção passiva.
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111. (Técnico Judiciário – RR) Em nenhuma hipótese restará configurado o crime de excesso de exação quando ficar constatado que o tributo ou contribuição social exigido pelo funcionário era devidamente devido.
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7.2 Síntese A corrupção passiva está prevista no art. 317 do Código Penal. Vejamos: “Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena – reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa.” Os verbos típicos são solicitar, receber, aceitar. A corrupção ativa está prevista no art. 333 do Código Penal. Vejamos: “Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: Pena – reclusão, de 1 (um) ano a 8 (oito) anos, e multa.” No crime de corrupção passiva, temos como verbos típicos os verbos: solicitar, receber ou aceitar promessa indevida. Na corrupção ativa, temos os verbos típicos: oferecer e prometer. Sujeito ativo na corrupção passiva: funcionário público. Sujeito ativo na corrupção ativa: particular. Na corrupção passiva, o funcionário público por iniciativa própria solicita vantagem indevida para o particular. A iniciativa parte do funcionário público. Se o funcionário público exige, e o particular dá o dinheiro a ele, o particular não irá cometer corrupção ativa. Isso porque o verbo “dar” não é um verbo típico do crime da corrupção ativa. O funcionário público só vai receber uma vantagem indevida se alguém oferecer a ele tal vantagem. Oferecer vantagem para funcionário público: particular comete infração, iniciativa dele. Pode ocorrer a corrupção ativa sem a corrupção passiva, desde que o funcionário público não receba a vantagem. Se o funcionário público recebe tal vantagem, terá a ocorrência de dois crimes: corrupção ativa, por parte do particular e corrupção passiva, por parte do funcionário público. De acordo com a teoria monista do concurso de pessoas, cada pessoa responde por um crime distinto. Cada um pelo crime que cometeu. Quando o particular promete a vantagem indevida, a iniciativa é dele, portanto, caracteriza corrupção ativa. Se o funcionário não aceitar, não comete crime algum. Porém, basta o funcionário aceitar tal promessa para cometer crime de corrupção passiva. O funcionário está negociando um ato que é de sua atribuição; ele negocia seu ato de ofício.
147 Se um juiz de direito solicita do réu dinheiro para absolvê-lo, estará cometendo corrupção passiva. A corrupção passiva pode ser própria, quando o funcionário público está negociando um ato de ofício, mas pratica um ato ilegal, ou imprópria, quando o ato praticado pelo funcionário público é legal e já dizia respeito à sua função. A corrupção passiva pode ser antecedente, quando o funcionário público solicita a vantagem antes da prática do ato. Pode ser subsequente, quando o funcionário público deixa de praticar o ato para depois solicitar a vantagem indevida.
Exercício 112. O funcionário público que solicitar para si diretamente vantagem indevida, comete corrupção passiva. 113. A promessa pelo agente de dádiva e dinheiro a policiais incentivando de forma inequívoca a investigação de furto de que foi vítima e a recuperação do veículo furtado responde por qual delito?
8. Corrupção Ativa e Corrupção Passiva 8.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos a consumação e as causas de aumento de pena na corrupção ativa e corrupção passiva.
Verbos típicos: solicitar, receber, aceitar promessa. A corrupção passiva não depende da corrupção ativa e vice-versa. Se um particular oferecer o dinheiro e o funcionário público não receber, só teremos a corrupção ativa, por exemplo. Na corrupção passiva, basta a solicitação para que ocorra o delito. Da mesma forma, aceitar a promessa ou receber a promessa, consumado estará o crime. Imagine que “A” cometa uma infração de trânsito e é parado por um fiscal de trânsito. “A” pede para que ele não multe seu carro e o fiscal o manda embora. Neste caso, não houve promessa de vantagem indevida, por isso, não ocorrerá o crime de corrupção ativa.
Direito Penal – Parte Especial
8.2 Síntese
148 No entanto, o policial ao deixar de aplicar a multa estará cometendo corrupção passiva privilegiada. A atipicidade do verbo “dar” só é aplicada para o delito de corrupção ativa do art. 333 do Código Penal. Isso porque existem algumas modalidades específicas de corrupção que trarão em seu tipo penal o verbo “dar”. Desta forma, não será atípico. Na corrupção ativa internacional, temos como verbo típico: prometer, receber ou dar. Vejamos o art. 333 do Código Penal: “Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: Pena – reclusão, de 1 (um) ano a 8 (oito) anos, e multa. § 1º A pena é aumentada de um terço, se, em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.” O exaurimento do delito servirá como forma de aumento de pena. A causa de aumento de pena só se aplica à corrupção passiva própria, explicada anteriormente. Isso porque ele deixa de praticar ato que era de seu ofício. Na corrupção ativa, exaurimento do crime é também causa de aumento de pena. Isso porque o crime já estava consumado quando ele ofereceu. Só há corrupção ativa antecedente, tendo em vista que primeiro ele ofereça o dinheiro. Quando a pessoa aceita alguma gratificação pelo serviço acordado, não será caracterizada a corrupção ativa. Na corrupção ativa, ele pratica o crime para que o funcionário deixe de fazer algo, ou faça por ele. Se o funcionário deixou de fazer algo e o particular dá dinheiro para ele, deve ser condenado à multa.
Exercício
Direito Penal – Parte Especial
114. A corrupção passiva terá a pena aumentada se em consequência da vantagem recebida o funcionário retardar ou deixar de cumprir seu dever de ofício.
9. Corrupção Passiva Privilegiada –Prevaricação 9.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o crime de prevaricação.
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Na corrupção passiva privilegiada, temos como verbos: praticar, deixar de praticar, retardar. O funcionário público não recebe nenhuma vantagem indevida. Não recebe, nem solicita. É uma modalidade de corrupção específica. Ele aceita pedido de outrem. Como ele não aceita nenhuma vantagem indevida, é um crime de menor potencial ofensivo. Exemplo: quando o policial cede ao pedido de um particular para que não tenha seu carro multado. O particular não responde por crime algum. O crime pode ser cometido para ceder à influência de outrem. Exemplo: um fiscal deixar de multar o governador. Na prevaricação, o sujeito deixa de praticar ou retarda um ato para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Vejamos o art. 319 do Código Penal: “Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.” Na corrupção passiva privilegiada, existe a interferência da pessoa corruptora: terceiro corruptor. Na prevaricação, o funcionário espontaneamente retarda o ato, é espontâneo, não há interferência de um terceiro. Crime de prevaricação deve ter o fim de satisfazer interesse pessoal. O Ministério Público deve especificar qual o interesse pessoal do agente. Prevaricação imprópria consiste em: “Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo: Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.” Para cometer esse crime, deve ser funcionário específico. Aquelas pessoas que têm a obrigação de evitar que o aparelho celular chegue ao preso. O preso que está na posse do celular não comete crime, mas sim falta grave. Particular ou funcionário público que não tem o dever de vedar o acesso do aparelho celular ao preso, se facilitar sua entrada responde pelo art. 349-A, “Ingressar, promover, intermediar, auxiliar ou facilitar a entrada de aparelho telefônico de comunicação móvel, de rádio ou similar, sem autorização legal, em estabelecimento prisional. Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.”
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9.2 Síntese
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Exercício 115. Determinado diretor de um presídio, deixando de cumprir com os deveres de seu ofício, acabou por permitir que um preso tivesse um aparelho de celular, comunicando-se com outros presos do ambiente externo. Foi apurado que o diretor não agiu para satisfazer interesse pessoal.
10. Resistência 10.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o crime de resistência.
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10.2 Síntese Vejamos o art. 329 do Código Penal: “Opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio: Pena – detenção, de 2 (dois) meses a 2 (dois) anos.” No crime de resistência, o agente se opõe à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça. Atenção: a lei não fala em grave ameaça, apenas ameaça. Sujeito ativo do delito: qualquer pessoa. Sujeito passivo do delito: o Estado e secundariamente o funcionário público que estava cumprindo o ato legal ou particular que estavam prestando auxílio. No crime de resistência, o agente se opõe a um ato legal. Basta que ele seja legal, independente de ser justo ou injusto. Só comete resistência quando o agente comete a oposição mediante violência ou ameaça. Se o agente se opõe, a prática do ato legal sem violência não caracteriza o crime. A violência ou a ameaça deve ser dirigida a outro funcionário público ou um terceiro que esteja auxiliando o funcionário público. Às vezes, quem pratica o ato de resistência não é a mesma pessoa que irá sofrer o constrangimento. O ato não precisa estar sendo executado com relação àquela pessoa, mas sim um terceiro, como a mãe, por exemplo.
151 Pode acontecer, em razão da resistência, que o ato não seja executado. Nesta hipótese, ocorre a qualificadora do § 1º. Vejamos: “§ 1º Se o ato, em razão da resistência, não se executa: Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.” No art. 329, caput, a pessoa se interpõe à execução ato, mas ele é realizado. Já no § 1º ocorre a oposição, todavia, o ato deixa de ser realizado. Além do crime de resistência, a pessoa irá responder pela violência empregada. Se da resistência também existiu lesão corporal, por exemplo, as penas serão somadas, pois será considerada a prática de 2 crimes. Segundo predomina na doutrina, as vias de fato estariam absorvidas pela resistência, entretanto, quanto aos outros crimes ocorreria concurso de crimes. A discussão da doutrina é se seria concurso material ou formal impróprio, contudo, a consequência é a mesma: a soma das penas. O crime de resistência pode estar relacionado com o crime de roubo. Uma primeira doutrina acredita que só responderá por roubo porque a violência é resultado do crime de roubo. Um segundo posicionamento acredita serem crimes autônomos que defendem bens jurídicos autônomos e, por isso, seriam dois crimes isolados. O STJ adota o primeiro posicionamento.
Exercício 116. Não caracteriza o crime de resistência o ato de permanecer parado sem colaborar para execução do ato legal.
11. Desobediência 11.1 Apresentação
11.2 Síntese A desobediência está prevista no art. 330 do Código Penal. Vejamos: “Desobedecer a ordem legal de funcionário público: Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 6 (seis) meses, e multa.” Sujeito Ativo: qualquer pessoa, já que é um crime cometido por particular. Sujeito Passivo: primariamente, o Estado e, secundariamente, o funcionário público.
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Nesta unidade, analisaremos o crime de desobediência.
152 O funcionário público pode ser sujeito ativo de crime de desobediência? O primeiro posicionamento diz que sim. Funcionário público que descumpre uma ordem independentemente de hierarquia responde pela desobediência. Às vezes, o funcionário público descumpriu uma ordem para agradar interesse pessoal. Nesse caso, seria prevaricação. O segundo posicionamento é que funcionário público não pode responder pelo crime de desobediência, porque este seria um crime cometido por particular contra a Administração Pública. Terceiro posicionamento diz que vai depender. Se a ordem estiver relacionada com exercício de sua função, ele não responderá por desobediência; caso contrário, responderá. A ordem para ser desobedecida deve ser legal. O funcionário público deve ser competente e a ordem deve ser dirigida expressamente a um indivíduo que tenha o dever de cumprir a ordem. Crime praticado por uma ação ou omissão (ordem de fazer ou não fazer). Ordem de fazer: a pessoa deve fazer algo. Se ela não faz, comete o crime. A conduta é omissiva. Ordem de não fazer: a conduta típica de desobedecer é uma ação. A conduta é comissiva. Na hipótese da ordem de fazer praticada por omissão, não cabe tentativa, porque se o agente teria que fazer e não fez, o crime estará consumado. É crime unissubsistente. Entendem a doutrina e a jurisprudência, se a pessoa cumular a desobediência com uma hipótese prevista em lei como sanção para descumprimento do ato, que não haverá que se falar em desobediência. O crime é subsidiário porque se já existir uma sanção não penal para descumprimento daquela ordem, o agente não irá responder pelo crime de desobediência.
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Exercício 117. O crime de desobediência: a) Só pode ser praticado por uma ação. b) Será punido apenas com multa se for culposo. c) Ocorre independentemente da legalidade da ordem. d) Exige violência ou grave ameaça. e) Não prescinde de dolo, ainda que eventual.
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12. Desacato 1.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o crime de desacato.
O crime de desacato está previsto no art. 330. Vejamos: “Desobedecer a ordem legal de funcionário público: Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 6 (seis) meses, e multa.” Sujeito ativo: qualquer pessoa, já que é um crime praticado por particular. Sujeito Passivo: Administração Pública e o desacatado. Funcionário Público pode ser sujeito ativo de desacato? Um primeiro posicionamento diz que sim. O funcionário público pode cometer desacato independentemente de estar no exercício de suas funções ou não. Um segundo posicionamento diz que vai depender da sua inferioridade e hierarquia. Um terceiro posicionamento diz que um funcionário público não pode cometer crime de desacato, pois seria um crime praticado somente por particular. Hoje, o primeiro posicionamento é o que predomina na Jurisprudência Brasileira. Desacatar funcionário público no exercício de sua função ou em razão da função. Desacatar: ofender o funcionário público. O funcionário público deve estar no exercício de sua função ou em razão de sua função. Imaginemos um promotor que está trabalhando e uma pessoa o ofende. Estará cometendo desacato. Quando o funcionário estiver no exercício de sua função, não poderá ser desacatado. Às vezes, o funcionário não está no exercício de sua função, mas o desacato é em razão dela. Ainda que o funcionário não esteja exercendo sua função, mas se a humilhação for em razão da função, ocorrerá o desacato. Detalhe: para ter desacato, a humilhação precisa ser na presença do funcionário público. O funcionário deve perceber a ofensa no momento em que ela é proferida. Supondo que o funcionário público fique sabendo que tem alguém o ofendendo fora de sua presença, estará esta pessoa cometendo crime contra honra, mesmo que seja em razão da função, mas longe de sua presença.
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1.2 Síntese
154 A consumação se dará quando o funcionário público tomar ciência da ofensa. O ato de desacato deve ter aptidão para ofender, independentemente se ele se sinta ofendido ou não. Predomina que não é possível a tentativa. Crime unissubsistente: não é possível fracionar a execução. Um posicionamento minoritário traz que existe tentativa de desacato. Traz hipóteses de ofensa por escrito, e que não dê tempo de o funcionário ler, por circunstâncias alheias à sua vontade. Será que seria possível a pessoa responder por mais de um crime de desacato se a pessoa ofender mais de uma pessoa? Não responderá por todos os desacatos, apenas por um, mas o juiz irá considerar no momento da dosagem da pena.
Exercício 118. (Promotor de Justiça – SP – 2006) Questão de Concurso adaptada. No crime de desacato exige-se a presença do dolo de ofender, humilhar ou desprestigiar, com o fim de atingir a dignidade da função do sujeito passivo.
13. Tráfico de Influência e Exploração de Prestígio 13.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o crime de tráfico de influência e exploração de prestígio.
Direito Penal – Parte Especial
13.2 Síntese O tráfico de influência está previsto no art. 332 do Código Penal. Vejamos: “Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função: Pena de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.” O sujeito ativo solicita vantagem de alguma pessoa para interferir em um ato praticado por um funcionário público no exercício de sua função. O ato que o funcionário público vai praticar está relacionado com a vontade do particular.
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Exercícios 119. (Analista do Ministério Público – SE – 2009) Aquele que solicita dinheiro a pretexto de influir em órgão do Ministério Público pratica o crime de: a) Tráfico de influência. b) Patrocínio infiel.
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Sujeito ativo não influencia funcionário público. O sujeito ativo não interfere na prática do ato do funcionário público. O funcionário público não estará sendo influenciado de nada, porque o sujeito ativo vai pedir vantagem indevida a pretexto de interferir na ação do funcionário público. Mais grave será quando o sujeito ativo diz que parte da vantagem será destinada ao funcionário público. O sujeito do delito irá responder por tráfico de influência. O particular não irá responder por nada, porque não houve interferência para o funcionário público. A exploração de prestígio está prevista no art. 357 do Código Penal. Vejamos: “Solicitar ou receber dinheiro ou qualquer outra utilidade, a pretexto de influir em juiz, jurado, órgão do Ministério Público, funcionário de justiça, perito, tradutor, intérprete ou testemunha: Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.” A diferença é o funcionário público. Tráfico de influência envolve funcionário público. Na exploração de prestígio, são os funcionários específicos elencados: I – Jurado; II – Juiz; IV – Órgãos do Ministério Público; V – Funcionários da justiça; VI – Perito; VII – Tradutor; VIII – Testemunha; IX – Intérprete. Vejamos o art. 337-C do Código Penal: “Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, vantagem ou promessa de vantagem a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público estrangeiro no exercício de suas funções, relacionado a transação comercial internacional: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. A pena é aumentada da metade, se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada a funcionário estrangeiro.”
156 c) Exploração de prestígio. d) Condescendência criminosa. e) Advocacia administrativa. 120. Luiz foi visitado por um fiscal que encontrou irregularidades na escrituração de sua empresa. Pedro, pessoa de grande prestígio na cidade, solicitou a quantia de R$ 5.000,00 a pretexto de influir o fiscal e deixar de multá-lo pelas irregularidades constadas. O fiscal, no entanto, autuou a empresa e aplicou as multas cabíveis. Nesse caso, Pedro praticou crime de: a) Não cometeu nenhum delito, pois não evitou a autuação. b) Responderá pelo crime de tráfico de influência. c) Responderá pelo crime de exploração de prestígio. d) Responderá pelo crime de corrupção ativa. e) Responderá pelo crime de corrupção passiva.
14. Denunciação Caluniosa, Comunicação Falsa de Crime ou de Contravenção 14.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos os crimes de denunciação caluniosa, comunicação falsa de crime ou de contravenção.
Direito Penal – Parte Especial
14.2 Síntese A denunciação caluniosa está prevista no art. 339 do Código Penal. Vejamos: “Dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente: (Redação dada pela Lei nº 10.028, de 19.10.2000) Pena – reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa.” Existe uma imputação de crime cujo agente sabe da inocência. Sujeito ativo – qualquer pessoa. Sujeito passivo – administração da justiça e, secundariamente, o ofendido. Inicia-se uma investigação policial porque o sujeito ativo denunciou de um fato no qual ele sabia que o acusado seria inocente. No crime de calúnia, o agente tão somente imputa um crime que ele sabe que o sujeito não praticou. Na denunciação caluniosa, instaura-se procedimento contra o acusado.
157 Se ocorrerem os dois, predominará a doutrina de que a calúnia fica absorvida pela denunciação caluniosa. No delito de denunciação caluniosa, a pena será diminuída se a imputação for de contravenção penal. A imputação deve ser contra alguém determinado. Deve indicar o nome de quem praticou tal crime. Se o agente não determinar o nome, não caracterizará denunciação caluniosa. “Agente sabe inocente” é uma expressão indicativa de dolo direto. Se o agente se serve de anonimato ou nome errado, será aplicada a ele causa de aumento de pena. Vejamos o art. 340: “Provocar a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado: Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa.” Neste caso, o sujeito provoca ação de autoridade para comunicar um crime ou uma contravenção que sabe que não ocorreu. Vejamos o art. 341: “Acusar-se, perante a autoridade, de crime inexistente ou praticado por outrem: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, ou multa.” Neste caso, não há que se falar em contravenção, mas apenas e tão somente em crime. Ela está imputando para si crime que não cometeu, ou porque o crime não existiu ou porque assumiu crime que alguém cometeu. Mesmo que a mãe assuma um crime no lugar do filho por um gesto nobre, ela incidirá no crime do art. 341 do CP.
121. (Analista Judiciário TRE/AL – 2010) Sobre a denunciação caluniosa é correto afirmar: a) A pena é diminuída de metade se a imputação for de crime de menor potencial ofensivo. b) Consiste em provocar ação de autoridade comunicando crime ou contravenção no qual se sabe não ter ocorrido. c) As penas aumentam em 1/6 a 1/3 se em razão da denunciação falsa se em razão denunciação caluniosa a pessoa venha ser condenada por sentença transitada em julgado. d) O fato deixa de ser punível se antes da sentença do processo o agente se retrata ou declara a verdade. e) A pena é aumentada de sexta parte se o agente se utiliza de anonimato.
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Exercícios
158 122. (Analista Judiciário TRT – 3ª Região – 2009) Quem dá causa a instauração de inquérito policial ou processo judicial, imputando-lhe crime, sem ter a certeza de ser ele é o autor do delito: a) Comete crime de denunciação caluniosa, na forma dolosa. 123. (Magistratura – PR) O sujeito que atribui a si mesmo a prática de crime inexistente ou que foi cometido por terceiro, pratica comunicação falsa de crime.
15. Falso Testemunho 15.1 Apresentação Nesta unidade, analisaremos o crime de falso testemunho.
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15.2 Síntese O crime de falso testemunho está previsto no art. 342 do Código Penal. Vejamos: “Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade, como testemunha, perito, tradutor ou intérprete em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral: Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.” Quem pode ser sujeito ativo do delito não é só a testemunha, mas todos aqueles elencados no artigo. O sujeito passivo deste crime é a administração da Justiça. É possível concurso de pessoas no crime de falso testemunho: 1ª posição: é possível a participação e não a coautoria, isso porque é crime de mão própria; 2ª posição: é possível a coautoria. O STF admite a coautoria em crime de falso testemunho. Coautor é a pessoa que induz a pessoa a mentir; é um coautor intelectual. O STF ao admitir a coautoria no falso testemunho adota a teoria do domínio do fato. Autor é aquele que executa ou aquele que promove e que organiza o crime. O STJ não admite a coautoria no crime de falso testemunho. O STJ só admite a participação, por ser um crime de mão própria. Mesmo que ela não preste compromisso, poderá cometer crime de falso testemunho.
Fazer informação falsa: é declaração diversa do que sabia. Negar a verdade: a pessoa presenciou o fato, mas negou o que sabia. Calar a verdade: quando a pessoa se recusa a falar. O Código Penal adotou a teoria subjetiva do crime de falso testemunho. Às vezes, a testemunha narra um fato que não corresponde à realidade. Nesta hipótese, não está cometendo falso testemunho. Exemplo: uma testemunha ouviu 3 tiros, enquanto as outras testemunhas ouviram 8 tiros. Não responderá por falso testemunho porque, na realidade, foi um erro. O crime de falso testemunho é quando uma pessoa realmente queria enganar o juízo. A consumação se dá com o encerramento do depoimento. Demais modalidades: I – falsa perícia; II – erro nos cálculos; III – tradução de maneira errada; IV – intérprete com interpretação errada. A mentira narrada pelo falso testemunho tem que ter aptidão para interferir na apreciação da causa, senão, não há lesividade. “§ 1º Se o crime é cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. § 2º As penas aumentam-se de um terço, se o crime é praticado mediante suborno. § 3º O fato deixa de ser punível, se, antes da sentença, o agente se retrata ou declara a verdade.” Se a pessoa se retrata antes da sentença, o fato deixa de ser punível. Estará extinta a punibilidade. Vejamos o art. 343: “Dar, oferecer ou prometer dinheiro ou qualquer outra vantagem a testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete, para fazer afirmação falsa, negar ou calar a verdade em depoimento, perícia, cálculos, tradução ou interpretação: Pena – reclusão, de três a quatro anos, e multa.”
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Capítulo 11
Crimes contra a Administração da Justiça
1. Arts. 338 e 339 do CP 1.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os art. 338 e 339 do Código Penal.
1.2 Síntese Se falo dos crimes contra a administração da justiça, falo de condutas que agridem a administração da justiça. Justiça num plano macro, função jurisdicional. A busca da verdade pelo devido processo legal. Vejamos o art. 338 do Código Penal: “Reingressar no território nacional o estrangeiro que dele foi expulso: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, sem prejuízo de nova expulsão após o cumprimento da pena.” Verbo: reingressar.
161 A maioria da doutrina segue o sentido geográfico, quando há uma expulsão do estrangeiro. A consumação se dá no momento do reingresso. Essa expulsão é legal, formal ou real? A expulsão é um ato administrativo do presidente da República feita por decreto com base em conveniência política. Para fins de direito penal, é preciso que se consiga a expulsão real, para que haja a consumação do art. 338 do Código Penal. Trata-se de competência da justiça federal. Se o estrangeiro considerar que sua expulsão foi injusta, continuará praticando o crime se voltar, uma vez que a mera opinião subjetiva a respeito do mérito da decisão administrativa, não elide o crime. Vejamos agora o art. 339 do Código Penal, que trata da denunciação caluniosa: “Dar causa a instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa. § 1º A pena é aumentada de sexta parte, se o agente se serve de anonimato ou de nome suposto. § 2º A pena é diminuída de metade, se a imputação é de prática de contravenção.” Aqui há uma calúnia especial, porque além da calúnia, há o dolo de dar causa à instauração de procedimento ou processo. O crime de denunciação caluniosa é um crime progressivo, pois há só a calúnia. Há um crime só, mas precisa necessariamente passar por esse, para chegar ao outro. Está prejudicando alguém, mas o sujeito passivo é o Estado.
2. Arts. 340 e 341 do CP
Nesta unidade, estudaremos os arts. 340 e 341 do Código Penal.
2.2 Síntese Vejamos o art. 340 do Código Penal: “Provocar a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado: Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa.”
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2.1 Apresentação
162 Assim como a denunciação caluniosa, existirá o delito em tela se estiver imputando crime ou contravenção. A pena será a mesma, tanto no caso do crime, quanto na contravenção. Neste crime, a ação não é dirigida contra uma vítima determinada. O agente simplesmente provoca a ação de uma autoridade. É dar causa à instalação de inquérito policial? Não, se ocorrer qualquer diligência do delegado após a comunicação, já configurará o crime. É um crime comissivo, está comunicando falsamente, pratica uma ação. O crime somente estará consumado se a autoridade praticar alguma ação. Vejamos agora o crime de autoacusação falsa, do art. 341 do Código Penal: “Acusar-se, perante a autoridade, de crime inexistente ou praticado por outrem: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, ou multa.” A pessoa que pratica o art. 341, vai até a autoridade e se acusa de crime que não existiu, ou de crime que existiu, mas que foi praticado por outra pessoa. Mesmo sendo uma atitude altruísta, pratica-se o crime. A pessoa vai até a autoridade policial, formalmente se acusa, e o faz por determinação do chefe de ação criminosa, pratica crime? Dependendo do concurso que você vai prestar, atenha-se à legalidade. Ex.: Ministério Público, delegado. A inexigibilidade de conduta diversa deve ser alegada em questões discursivas. Essa causa existe se comprovada a ameaça de morte. A ideologia envolvendo essas carreiras é legalista. Não se trabalha com essa excludente, pois há outras previstas na lei. Não se pode buscar algo que não está na lei para absorver o sujeito. Em outro concurso, pode-se escapar pela coação moral irresistível.
3. Arts. 342 e 343 do CP Direito Penal – Parte Especial
3.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os art. 342 e 343 do Código Penal.
3.2 Síntese O falso testemunho ou falsa perícia protegem a verdade que deve ser apresentada no processo pela testemunha ou pelo perito.
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4. Arts. 344 e 345 do CP 4.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os arts. 344 e 345 do Código Penal.
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É considerado crime fazer afirmação falsa ou negar a verdade, calar a verdade, ficar quieto sabendo da verdade. Está como figura a testemunha o perito, contador, tradutor e intérprete. Isso deve ocorrer em processo judicial, administrativo, inquérito policial, ou em juízo. Fazer afirmação falsa a testemunha em inquérito policial, é suficiente para falar de crime de falso testemunho e a reclusão é de um a três anos. É um crime de mão própria, ou seja, somente essas pessoas do caput podem praticar o delito. Aquelas testemunhas que não prestam o compromisso de dizer a verdade não podem praticar o crime, se não têm a obrigação de dizer a verdade, não praticam o crime, embora haja doutrina que diga que é possível. Vítima que mente em juízo para prejudicar o réu não comete o crime de falso testemunho. Falso testemunho admite concurso de agentes na modalidade participação. O advogado que instrui a testemunha a mentir é partícipe no crime de falso testemunho. É possível a coautoria em crime de mão própria, na falsa perícia. Verdade para fins desse dispositivo é a relação que existe entre o que as pessoas acham que aconteceu e o que elas falam no processo. Se há falso testemunho em CPI, não se pratica o crime do art. 342 do Código Penal, e sim o previsto na lei da CPI, art. 4º inciso II, da Lei nº 1.579/1972. Se a testemunha cala a verdade porque se falar a verdade será incriminada, há o princípio constitucional de que ninguém é obrigado a se autoincriminar; portanto, não será crime. Se praticar mentira no processo, poderá se retratar até a sentença do processo em que mentiu, e não no processo para apuração de falso testemunho, pois aí, a punibilidade não será extinta. As mesmas pessoas do falso testemunho, caso eu ofereça ou prometa dinheiro ou qualquer outra vantagem a esses profissionais para que mintam em processo, eu pratico o crime do art. 343 do Código Penal. A pena do art. 343 é de 3 a 4 anos; um dos menores intervalos de pena do Código Penal.
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Direito Penal – Parte Especial
4.2 Síntese Veremos agora o art. 344 que trata de coação no curso do processo. “Art. 344. Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, além da pena correspondente à violência.” O verbo é usar de violência ou grave ameaça. A expressão com o fim significa dolo específico ou elemento subjetivo do injusto. O bem jurídico tutelado é a administração da justiça, e o sujeito passivo é o Estado. A pena é de reclusão de um a quatro anos, além da pena correspondente à violência. A coação no curso do processo é um crime comum, qualquer pessoa pode fazê-lo, embora o sujeito passivo da agressão seja específico. Se eu pratiquei várias coações no curso do mesmo processo, com a mesma finalidade, o que prevalece na doutrina e na jurisprudência é que se for no mesmo contexto fático a pessoa ameaça mais de um sujeito processual, e crime único. Situações fatias diversas, há mais de um crime. É preciso um processo em curso para poder praticar o crime. Concurso material há duas ou mais ações, dois ou mais crimes. Concurso formal: uma ação só eu consigo vários crimes. O concurso formal próprio é o clássico; para quebrar uma telha, arremesso dolosamente uma pedra que quebra a janela e mata o morador. Com uma ação, praticou dois ou mais crimes. O desígnio era só o crime de dano. O homicídio culposo foi decorrência. Se há vontade de praticar crimes diferentes com uma só ação, são desígnios autônomos. A lei chama de concurso formal impróprio. As penas serão somadas. Valendo de uma ameaça dentro do processo e no curso, num único contexto fático, ameaça o juiz, o promotor e a vítima. Ameaça mais de uma pessoa com uma única ação. As penas serão somadas. Vejamos agora o art. 345: “Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite: Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 1 (um) mês, ou multa, além da pena correspondente à violência.
165 Parágrafo único. Se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.” Exercício arbitrário das próprias razões é fazer justiça com as próprias mãos. Há um dolo específico para desfazer pretensão. O monopólio da resolução dos conflitos é do Judiciário. Essa pretensão deve ser legítima. A lei, no final da redação do artigo, diz que salvo quando a lei o permitir. Há excludentes de autotutela. Exemplo: legítima defesa. Sem violência é uma ação penal privada. Depende de queixa-crime. A pena é uma detenção de quinze dias a um mês.
5. Arts. 346 e 347 do CP 5.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os arts. 346 e 347 do Código Penal.
“Art. 346. Tirar, suprimir, destruir ou danificar coisa própria, que se acha em poder de terceiro por determinação judicial ou convenção: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.” Verbo: tirar, suprimir, destruir ou danificar. Objeto: coisa própria que se acha em poder de terceiro por determinação judicial ou convenção das partes. Pena de detenção de 6 meses a dois anos e multa. Ocorre quando o que é meu está na mão de terceiros por determinação judicial. A pessoa não pode buscar o que é seu. O juiz, ou a convenção entre as partes, estipulou que apesar de ser sua está nas mãos de terceiros. Destruir é por completo. Danificar é causar dano parcial. A elementar típica coisa própria faz toda a diferença. Se o terceiro que está com a coisa, licitamente concorda em entregá-la para o proprietário, há um indiferente penal. Vejamos agora o crime de fraude processual previsto no art. 347 do Código Penal: “Inovar artificiosamente, na pendência de processo civil ou administrativo, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de induzir a erro o juiz ou o perito: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. Parágrafo único. Se a inovação se destina a produzir efeito em processo penal, ainda que não iniciado, as penas aplicam-se em dobro”.
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5.2 Síntese
166 O parágrafo único é causa de aumento de pena, e não qualificadora. Acidente de trânsito com vítima: a motocicleta está destruída em sua parte traseira, pois a pessoa o abalroou por trás. A pessoa esconde a bicicleta embaixo de um ônibus. A pessoa inovou artificialmente o estado de lugar e de coisa, com o fim de induzir a erro o perito, para fazer prova em processo penal. Embora todas as elementares do tipo estejam preenchidas, o Código de Trânsito Brasileiro em seu art. 312 traz essa previsão, pois envolve trânsito. Quando modifica as características da arma de fogo para fins de dificultar ou de induzir a erro autoridade policial, perito ou juiz, aí você pratica o crime do artigo XVI, art. 2º do Estatuto do Desarmamento.
6. Arts. 348 e 349 do CP 6.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os art. 348 e 349 do Código Penal.
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6.2 Síntese “Art. 348. Auxiliar a subtrair-se à ação de autoridade pública autor de crime a que é cominada pena de reclusão: Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, e multa. § 1º Se ao crime não é cominada pena de reclusão: Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, e multa. § 2º Se quem presta o auxílio é ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso, fica isento de pena.” Ficar isento de pena se chama escusa absolutória. O companheiro em união estável estaria incluso no § 2º do referido artigo? De acordo com a interpretação constitucionalista, se faz a leitura do direito penal com base na Constituição. Se o princípio da igualdade diz que há uma ampliação do conceito de entidade familiar, e que a lei valorizará a união estável e facilitará sua conversão em casamento, presume-se que além do cônjuge, deve ser incluído, nessa situação, o companheiro da união estável. O STF reconheceu a união homoafetiva, ou seja, um companheiro de união homoafetiva, se enquadra no § 2º do dispositivo. “Art. 349. Prestar a criminoso, fora dos casos de coautoria ou de receptação, auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime: Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, e multa.”
167 Há um favorecimento real. Tenta-se favorecer o proveito do crime. Exemplo: guardar dinheiro proveniente de crime para esconder, a pedido do criminoso, e depois divide com ele. A letra da lei só fala em crime. Portanto, não se aplica a contravenção. Pessoa ascendente, descendente, cônjuge ou irmão respondem pelo favorecimento real.
7. Arts. 349-A e 350 do CP 7.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os crimes previstos nos arts. 349-A e 350 do Código Penal.
7.2 Síntese Veremos uma alteração legislativa do ano de 2009. “Art. 349-A. Ingressar, promover, intermediar, auxiliar ou facilitar a entrada de aparelho telefônico de comunicação móvel, de rádio ou similar, sem autorização legal, em estabelecimento prisional. Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.” Vejamos os novos artigos na tabela abaixo: Art. 349-A
Diretor do presídio ou Qualquer pessoa agente público
Art. 50, inciso VII, da Lei de Execução Penal O preso provisório ou definitivo
De forma omissiva, vio- Facilitar o ingresso do Sofre falta disciplinar de lam o seu dever de vedar aparelho no estabeleci- natureza grave: ter em sua posse o aparelho o acesso dos aparelhos mento prisional Perde até 1/3 dos dias Pena: detenção de 3 me- Pena: Detenção de 3 remidos e o período acumulado para fins de proses a 1 ano meses a 1 ano gressão Houve uma revogação tácita do art. 350, e todas as condutas nele previstas, estão na lei de abuso de autoridade (4.898/1965).
Direito Penal – Parte Especial
Art. 319-A
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8. Arts. 351 e 352 do CP 8.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os arts. 351 e 352 do Código Penal.
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8.2 Síntese “Art. 351. Promover ou facilitar a fuga de pessoa legalmente presa ou submetida a medida de segurança detentiva: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. § 1º Se o crime é praticado a mão armada, ou por mais de uma pessoa, ou mediante arrombamento, a pena é de reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. § 2º Se há emprego de violência contra pessoa, aplica-se também a pena correspondente à violência. § 3º A pena é de reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, se o crime é praticado por pessoa sob cuja custódia ou guarda está o preso ou o internado. § 4º No caso de culpa do funcionário incumbido da custódia ou guarda, aplica-se a pena de detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.” Pelos verbos do artigo, se percebe a referência a terceiro. Medida de segurança é uma sanção que tem por base a periculosidade do agente, atestada por perícia, nos casos em que se provou a autoria e materialidade de crime, e a pessoa é inimputável. A pessoa não receberá pena, e sim tratamento. Se a pessoa fica trancada no manicômio, medida de segurança detentiva. Se ela fica internada e depois volta para casa, é medida de segurança ambulatorial. O § 1º apresenta uma qualificadora. Qualquer tipo de arma que facilite a fuga deve ser considerada como qualificadora. “Art. 352. Evadir-se ou tentar evadir-se o preso ou o indivíduo submetido a medida de segurança detentiva, usando de violência contra a pessoa: Pena – detenção, de 3 (três) meses a (um) ano, além da pena correspondente à violência.” É crime fugir da cadeia? Depende. Prevalece na doutrina que tentar fugir é natural do ser humano. Só será crime se praticar a fuga de acordo com o mencionado artigo. A conduta tentada e consumada terá a mesma pena. Tanto faz se está fugindo ou tentado fugir, recebe a mesma pena. É o chamado de crime de atentado.
169 A violência é contra a pessoa, e não contra a coisa. Se machucar o carcereiro tentando fugir, há dois crimes, o do art. 352 do Código Penal, e a lesão corporal. Configura-se um concurso formal impróprio, no qual há uma ação, dois ou mais resultados, e as penas são somadas.
9. Arts. 353 e 354 do CP 9.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os arts. 353 e 354 do Código Penal.
“Art. 353. Arrebatar preso, a fim de maltratá-lo, do poder de quem o tenha sob custódia ou guarda: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, além da pena correspondente à violência.” O agente também responderá pela violência. Se não houve ainda violência e o réu é primário, é possível a pena mínima, que garante a suspensão condicional do processo. Não se aplica para o arrebatamento de internado por medida de segurança detentiva. Se com a conduta “A” arrebata o preso com o fim de maltratá-lo, com a conduta “B” efetivamente maltrata o sujeito. Praticou duas ou mais condutas, produzindo dois ou mais crimes, em concurso material do art. 353 com a violência. Somam-se as penas. Devolver o preso recém arrebatado, como arrependimento, não deixa de cometer o crime. É um crime formal. Basta arrebatar o preso com fim de maltratá-lo, ainda que não maltrate e não devolva. O simples fato de arrebatar já configura o crime “Art. 354. Amotinarem-se presos, perturbando a ordem ou disciplina da prisão: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, além da pena correspondente à violência.” Motim era um agrupamento de pessoas inconformadas com postura de outras dentro do ambiente militar. Diante disso, surgiu o crime do art. 354. Não se incluem aqui as pessoas sob medida de segurança. A amotinação para subversão da situação também se enquadra no art. 354.
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9.2 Síntese
170 Rebelião é o nome fático. É uma revolta generalizada de um conjunto de pessoas. Rebelião dentro de presídio pode ser chamada de motim. Se os presos se revoltarem por celas superlotadas, corte de banho de sol, maus-tratos, prevalecerá que não importa o que buscam, se é justo, o crime continuaria acontecendo por ser um crime contra a administração da justiça, e as reclamações devem ocorrer de maneira formal. Protesto pacífico não se enquadra como motim, pois não perturba a ordem e a disciplina da prisão.
10. Arts. 355 e 356 do CP 10.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os crimes dos arts. 355 e 356 do Código Penal.
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10.2 Síntese Nos crimes próprios, é preciso ser advogado ou procurador legalmente habilitado. O art. 355 do Código Penal traz o crime de patrocínio infiel e o patrocínio simultâneo no parágrafo único. Vejamos: “Trair, na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional, prejudicando interesse, cujo patrocínio, em juízo, lhe é confiado: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa. Parágrafo único. Incorre na pena deste artigo o advogado ou procurador judicial que defende na mesma causa, simultânea ou sucessivamente, partes contrárias.” Patrocínio é trair, como advogado e procurador, o interesse do cliente. Trair um dever profissional. Patrocínio simultâneo ou tergiversação tem a mesma pena, e está previsto no parágrafo único. O advogado patrocina ou defende partes contrárias no mesmo processo. Trata-se de um crime contra a administração da justiça, tutela-se a verdade do processo. “Art. 356. Inutilizar, total ou parcialmente, ou deixar de restituir autos, documento ou objeto de valor probatório, que recebeu na qualidade de advogado ou procurador: Pena – detenção, de 6 (seis) a 3 (três) anos, e multa.”
171 O crime do art. 356 também é um crime próprio que só pode ser praticado por advogado ou procurador. Trata-se do crime de sonegação de papel ou objeto de valor probatório. Necessariamente, os autos, os documentos e os objetos precisam ter valor probatório? Sim.
11. Arts. 357 e 358 do CP 11.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os crimes dos arts. 357 e 358 do Código Penal.
Exploração de prestígio. Algumas pessoas por serem muito populares, percebem que exercem certa influência na opinião e na vontade das pessoas, e usam isso para o âmbito do Poder Judiciário. Algumas pessoas podem alegar que conseguem com a sua oratória, influenciar a decisão judicial para um dos lados. E diz que explorará o prestígio em troca de quantia em dinheiro. Vejamos o art. 357 do Código Penal: “Solicitar ou receber dinheiro ou qualquer outra utilidade, a pretexto de influir em juiz, jurado, órgão do Ministério Público, funcionário de justiça, perito, tradutor, intérprete ou testemunha: Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. As penas aumentam-se de um terço, se o agente alega ou insinua que o dinheiro ou utilidade também se destina a qualquer das pessoas referidas neste artigo.” Tutela-se a verdade do processo, e a lisura desses cargos, e a administração da justiça. Vejamos agora o crime de violência ou fraude em arrematação judicial. Geralmente, a violência vem acompanhada da grave ameaça, aqui não. Trata-se de violência acompanhada da fraude. Vejamos o art. 358 do Código Penal: “Impedir, perturbar ou fraudar arrematação judicial; afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante, por meio de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem: Pena – detenção, de 2 (dois) meses a 1 (um) ano, ou multa, além da pena correspondente à violência.”
Direito Penal – Parte Especial
11.2 Síntese
172 Quando o tipo penal diz “mais a pena da violência”, sempre que tratar de contravenção de vias do fato, em que não fique nenhuma lesão corporal crime, junto com outro crime ela é absorvida, e terá somente o art. 358 do Código Penal. Existem máfias de hasta pública envolvendo veículos recuperados. Há uma rede de pessoas que trabalha para afastar possíveis licitantes e concorrentes. O art. 93 da Lei nº 8.666/1993 repete o art. 358. Sempre que um dispositivo constitucional é repetido em lei posterior, aplica-se a lei posterior, ocorrendo o esvaziamento do tipo penal.
12. Art. 359 do CP e Questões 12.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os arts. 359 e 360 do Código Penal.
12.2 Síntese Em uma decisão judicial, o juiz determina o afastamento de funções, determinando que não possa mais exercer determinado direito. A pessoa desobedece a seu conteúdo. Exerce direito que por via judicial estava suspenso ou havia sido perdido. Passa por cima e continua exercendo o direito normalmente. Essa decisão judicial para produzir esses efeitos precisa ser transitada em julgado? É desnecessário o trânsito em julgado, uma vez que a lei silenciou, segundo Nelson Hungria, no livro Comentários ao Código Penal, vol. 9º, página 526. “Art. 359. Exercer função, atividade, direito, autoridade ou múnus, de que foi suspenso ou privado por decisão judicial: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, ou multa.”
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Exercícios 124. (Magistratura – SP) Paulo, movido por um sentimento altruísta, assume a autoria de um crime de atropelamento de pedestre, cometido por sua namorada Lúcia, dando origem a abertura de inquérito policial sobre o fato. Qual o crime praticado, em tese, por Paulo? a) favorecimento pessoal privilegiado. b) comunicação falsa de crime. c) autoacusação falsa. d) denunciação caluniosa.
173 125. (TJ Militar – SP) O crime de desobediência a decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito nos termos do quanto determina o 359: a) Comina cumulativamente pena de reclusão e multa. b) Comina cumulativamente pena de detenção e multa. c) tem pena aumentada se o agente pratica o fato com o intuito de lucro. d) Tem pena aumentada se do fato resulta prejuízo à administração pública. e) Não exige, em sua descrição típica, que a decisão tenha transitado em julgado.
127. (OAB – 2011 – FGV) Ao tomar conhecimento de um roubo ocorrido nas adjacências de sua residência, Caio compareceu à delegacia de polícia e noticiou o crime, alegando que vira Tício, seu inimigo capital, praticando o delito, mesmo sabendo que seu desafeto se encontrava na Europa na data do fato. Em decorrência do exposto, foi instaurado inquérito policial para apurar as circunstâncias do ocorrido. A esse respeito, é correto afirmar que caio cometeu: 128. Quanto aos crimes da administração da justiça, é correto afirmar que: a) Não configura o crime de coação no curso do processo o uso de violência ou grave ameaça contra testemunha em processo administrativo, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio. b) As penas são aumentadas de um terço no delito de exploração de prestígio, se o agente insinua que o dinheiro solicitado, a pretexto de influir em testemunha, a esta também se destina.
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126. (TRT 15ª Região – 2011 – Juiz do Trabalho) Assinale a alternativa incorreta: a) Reingresso de estrangeiro banido do território nacional é crime punido, somente, com expulsão do país. b) Reingresso do estrangeiro expulso do território nacional é crime cometido contra a administração da justiça. c) Comete fraude processual o empregador que modifica as condições do local do trabalho em momento anterior ao da diligência do perito, com o objetivo de que o profissional não verifique as condições perigosas às quais o reclamante estava submetido. d) O reclamado que oferece dinheiro ao perito para modificar o resultado de seu laudo, indicando a inexistência de condição perigosa de trabalho, submete-se à pena de reclusão de 3 (três) a 4 (quatro) anos e multa. e) O perito que presta declarações falsas no corpo do laudo, indicando a inexistência de condição perigosa de trabalho, submete-se à pena de reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos e multa.
174 129. (TRT 23ª Região – MT – Juiz do Trabalho) A respeito do crime de falso testemunho, assinale a alternativa correta: a) O fato deixa de ser punível se, mesmo depois da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou declara a verdade. b) fato deixa de ser punível se, mesmo depois da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, mas antes da sentença, na ação penal, o agente se retrata ou declara a verdade. c) O fato jamais deixa de ser punível. d) O fato só deixa de ser punível se ocorrer a prescrição; e) O crime é apenado com reclusão de um a três anos e multa, podendo a pena ser aumentada de um sexto a um terço, se for praticado mediante suborno. 130. A retratação do agente ou a decisão de falar a verdade terá o efeito penal de impossibilitar a punição, se realizada a qualquer tempo antes da sentença condenatória no processo penal por falso testemunho ao qual o agente responderá em razão do(s) seu(s) testemunho(s) falso(s). 131. Há crime de falso testemunho, ainda que não faça o agente qualquer declaração falsa, se acaso omitir-se em dizer a verdade sobre fato que conhece, juridicamente relevante para o caso, e sobre o qual seja perguntado. 132. (Analista judiciário – TER/GO) Arrebatamento de preso é classificado como crime: a) De abuso de autoridade. b) Praticado por particular contra a administração em geral. c) Praticado por funcionário público contra a administração em geral. d) Contra a fé pública. e) Contra a administração da justiça.
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133. Nos crimes de favorecimento pessoal e real, caso o sujeito ativo seja ascendente ou descendente do criminoso, fica isento de pena.
Capítulo 12
Dos Crimes contra as Finanças Públicas
1. Lei de Responsabilidade Fiscal – Bem Jurídico Tutelado 1.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados aspectos relevantes sobre os chamados crimes contra as finanças públicas. A lei que introduziu este tema no nosso ordenamento jurídico é a Lei nº 10.028/2000, considerada a face penal da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000).
1.2 Síntese Os crimes contra as finanças públicas estão previstos no último capítulo do Código Penal, no art. 359.
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176 A Lei nº 10.028/2000 introduziu todo este novo capítulo no nosso ordenamento jurídico penal (o Capítulo IV, ao Título XI do Código Penal), sendo considerada uma espécie de face penal da Lei de Responsabilidade Fiscal, que é a Lei Complementar nº 101/2000. Foram criados oito novos tipos penais, sendo eles o art. 359 e suas alíneas “a”, “b”, “c”, “d”, “e”, “f”, “g”, “h”. Os objetivos da Lei nº 10.028/2000, primeiramente, é o de mostrar que é proibido ao administrador público gastar mais do que se arrecada e, em segundo lugar, que é proibido comprometer o orçamento mais do que está permitido pelo Poder Legislativo. Do art. 359, alínea “a” até a alínea “h”, são normas penais em branco, que necessitam de complementação das normas de conceito do direito financeiro. Vale lembrar que a nossa Constituição Federal cuida das finanças públicas nos seus arts. 163 a 169. Esses certos artigos fornecem as diretrizes para proteção, regulação, objetivos e funcionamento das finanças públicas. O art. 165, § 9º da Constituição diz o seguinte: “Cabe à lei complementar: I – dispor sobre o exercício financeiro, a vigência, os prazos, a elaboração e a organização do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e da lei orçamentária anual; II – estabelecer normas de gestão financeira e patrimonial da administração direta e indireta, bem como condições para a instituição e funcionamento de fundos.” Foi esse o espírito da LC nº 101/2000, que em seu art. 1º, § 1º traz a seguinte redação: “A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar.” Segundo o Ministro Carlos Velloso, graças ao disposto na lei, o serviço da justiça deficiente de apoio administrativo aos juízes de primeiro grau tende a piorar, pois os tribunais não poderão aperfeiçoá-los.
Exercício 134. (Auditor TCE/RO – 2010) Constitui crime contra as finanças públicas: a) Ordenar operação de crédito, interno ou externo, sem prévia autorização judiciária.
177 b) Autorizar operação de crédito, interno ou externo, com inobservância de limite, condição ou montante estabelecido em lei ou em resolução da Câmara Federal. c) Executar ato que acarrete aumento de despesa total com pessoal, nos 360 (trezentos e sessenta) dias anteriores ao final do mandato ou da legislatura. d) Realizar operação de crédito, interno ou externo, quando o montante da dívida consolidada ultrapassa o limite máximo autorizado por lei. e) Autorizar a assunção de obrigação cuja despesa não possa ser paga no exercício financeiro nos três últimos trimestres do último ano do mandato
2. Crimes contra Finanças Públicas I 2.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados aspectos relevantes sobre os chamados crimes contra as finanças públicas, os quais foram inseridos no nosso ordenamento jurídico pela Lei nº 10.028/2000. Serão tratados mais especificamente, os delitos previstos nos arts. 359-A, 359-B do Código Penal.
Vejamos o delito previsto no art. 359-A e seu parágrafo único: “Ordenar, autorizar ou realizar operação de crédito, interno ou externo, sem prévia autorização legislativa: Pena – reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos. Parágrafo único. Incide na mesma pena quem ordena, autoriza ou realiza operação de crédito, interno ou externo: I – com inobservância de limite, condição ou montante estabelecido em lei ou em resolução do Senado Federal; II – quando o montante da dívida consolidada ultrapassa o limite máximo autorizado por lei.” E um delito próprio, como todos os outros, inclusive, podendo apenas ser praticado por funcionário público. A definição de funcionário público para efeitos penais está no art. 327 do Código Penal. Vejamos:
Direito Penal – Parte Especial
2.2 Síntese
178 “Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. § 1º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.” O que não for funcionário público pode ser coautor ou partícipe, desde que ele tenha consciência da qualidade de funcionário público do autor. Trata-se de um delito formal; assim, não se exige um resultado naturalístico, bastando que gere desequilíbrio nas contas públicas. O art. 359-B traz o crime de inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar. Vejamos: “Ordenar ou autorizar a inscrição em restos a pagar, de despesa que não tenha sido previamente empenhada ou que exceda limite estabelecido em lei: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.” Empenhar significa comprometer o orçamento. O conceito de restos a pagar, está previsto no art. 36 da Lei nº 4.320/1964. Vejamos: “Consideram-se Restos a Pagar as despesas empenhadas mas não pagas até o dia 31 de dezembro distinguindo-se as processadas das não processadas. Parágrafo único. Os empenhos que sorvem a conta de créditos com vigência plurienal, que não tenham sido liquidados, só serão computados como Restos a Pagar no último ano de vigência do crédito.”
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Exercício 135. (Analista Judiciário – TRE/MA – 2009) Com respeito aos crimes de abuso de autoridade e contra as finanças públicas, assinale a opção correta. a) Constitui abuso de autoridade qualquer atentado ao sigilo de correspondência, ao livre exercício de culto religioso e à liberdade de associação. b) Compete à justiça militar processar e julgar militar por crime de abuso de autoridade, quando praticado em serviço. c) Constitui conduta típica autorizar a assunção de obrigação, nos dois últimos quadrimestres do último ano do mandato ou legislatura, ainda que a despesa possa ser paga no mesmo exercício financeiro. d) No delito de prestação de garantia graciosa, o sujeito passivo é apenas a União, uma vez que, no âmbito das demais unidades da Federação, inexiste possibilidade de prestar essa garantia.
179 e) Ordenar a colocação, no mercado financeiro, de títulos da dívida pública, devidamente criados por lei, mas sem registro no sistema centralizado de liquidação e de custódia, não constitui crime, mas mera infração administrativa.
3. Dos Crimes contra as Finanças Públicas II 3.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados aspectos relevantes sobre os chamados crimes contra as finanças públicas, os quais foram inseridos no nosso ordenamento jurídico pela Lei nº 10.028/2000. Será tratado mais especificamente, o delito previsto no art. 359-C do Código Penal.
Vejamos o delito de assunção de obrigação no último ano de mandato ou legislatura, previsto no art. 359-C: “Ordenar ou autorizar a assunção de obrigação, nos dois últimos quadrimestres do último ano do mandato ou legislatura, cuja despesa não possa ser paga no mesmo exercício financeiro ou, caso reste parcela a ser paga no exercício seguinte, que não tenha contrapartida suficiente de disponibilidade de caixa: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.” É um delito próprio, como todos os outros, inclusive, podendo apenas ser praticado por funcionário público. Tutela-se o equilíbrio das contas públicas, dos atos levianos dos governantes que, estando prestes a deixar o governo, comprometem o orçamento do próximo exercício. A definição de funcionário público está no art. 357 do Código Penal conforme já visto. Trata-se do funcionário público chefe do poder, ou integrante do legislativo. Inclui-se também o chefe do Ministério Público, quando tem autonomia para controlar os gastos. Deve o gestor público agir ao menos dolosamente, com o intuito de prejudicar o seu sucessor, ou seja, ele deve ter o conhecimento de que a despesa não poderá ser paga no mesmo exercício financeiro. Vejamos hipóteses de exclusão de ilicitude ou de culpabilidade em relação ao art. 359-C.
Direito Penal – Parte Especial
3.2 Síntese
180 O art. 65 da Lei de Responsabilidade Fiscal diz que não há crime quando as despesas contraídas no final do exercício, objetivarem calamidade pública ou extraordinárias, para atender urgências necessárias.
Exercício 136. (Assistente Jurídico – DF – 2001) Acerca dos crimes contra as finanças públicas, julgue os itens que se seguem (colocar “C” para Certo e “E” para Errado). a) ( ) Pratica crime contra as finanças públicas o funcionário público responsável pela ordenação de despesa que a ordena quando não estava autorizada por lei. b) ( ) Considere a seguinte situação hipotética. Um governador de estado, sete meses antes do término do seu mandato, autorizou administrativamente o pagamento de uma gratificação extraordinária a ocupantes de cargos comissionados na administração direta, aumentando consideravelmente a despesa total com pessoal prevista na lei orçamentária. Nessa situação, o governador responderá por crime contra as finanças públicas, consistente no aumento de despesa total com pessoal no último ano do mandato ou legislatura.
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c) ( ) Considere a seguinte situação hipotética. Um prefeito municipal, onze meses antes do término do mandato, autorizou o secretário de saúde a assumir obrigação cuja despesa não poderia ser paga no mesmo exercício financeiro. Nessa situação, o prefeito praticou crime contra as finanças públicas, consistente na assunção de obrigação no último ano do mandato. d) ( ) Autorizar a inscrição em restos a pagar de despesa que não tenha sido previamente empenhada tipifica crime contras as finanças públicas, na modalidade inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar. e) ( ) O funcionário público que deixa de expedir ato de sua responsabilidade determinando limitação de empenho e movimentação financeira, nos casos e condições estabelecidos em lei, pratica crime contra as finanças públicas.
181
4. Crimes contra as Finanças Públicas – Art. 359-D 4.1 Apresentação Nesta unidade, serão abordados aspectos relevantes sobre os chamados crimes contra as finanças públicas, os quais foram inseridos no nosso ordenamento jurídico pela Lei nº 10.028/2000. Serão tratados mais especificamente, os delitos previstos nos arts. 359-D, 359-E, 359-F, 359-G e 359-H do Código Penal.
Vejamos o art. 359-D, que trata do crime de ordenação de despesa não autorizada: “Ordenar despesa não autorizada por lei: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.” Quando devidamente justificada a despesa, deslegitimada encontra-se a possibilidade de punir a conduta, ao menos penalmente. A Universidade Federal do Rio Grande do Sul recebeu recursos para a aquisição de computadores, com tempo que impossibilitava a concorrência na modalidade técnica e preço. Os dirigentes da unidade fizeram, então, ampla pesquisa de preço e promoveram a compra mais vantajosa, com base no dispositivo que autoriza a compra emergencial, sem licitação. Em auditoria, observou-se a irregularidade do ato, visto que o instituto da emergência somente é cabido quando se caracteriza risco à segurança de pessoas ou bens, ou situação de imprevisibilidade. Baseando-se no fato de que não houvera qualquer prejuízo para o erário, o ministro relator, resolveu em caráter excepcional, relevar a multa, e recomendou que o órgão repassador liberasse os recursos em tempo mais dilatado. Vejamos agora o art. 359-E que trata da prestação de garantia ociosa: “Prestar garantia em operação de crédito sem que tenha sido constituída contragarantia em valor igual ou superior ao valor da garantia prestada, na forma da lei: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.” Exige-se a comprovação do perigo concreto de lesão às finanças públicas ou ao equilíbrio das contas públicas. Trata-se, portanto, de crime de perigo concreto a um bem jurídico de natureza supraindividual.
Direito Penal – Parte Especial
4.2 Síntese
Direito Penal – Parte Especial
182 As instituições financeiras exigem aval da União para os empréstimos aos estados e municípios. Em razão da inadimplência, parte da dívida desses entes passou a ser transferida para a União. Para evitar esse ato irresponsável, o tipo penal proíbe a prestação de garantia graciosa. Vejamos agora o art. 359-F, que traz o crime de não cancelamento de restos a pagar: “Deixar de ordenar, de autorizar ou de promover o cancelamento do montante de restos a pagar inscrito em valor superior ao permitido em lei: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.” Trata-se do único crime omissivo do capítulo. A consumação desse delito se dá no momento em que se escoa o prazo para que o agente ordene, autorize ou promova o cancelamento. Para que se possa punir a conduta, há a necessidade de que o agente não tenha qualquer responsabilidade, a título de dolo, em relação à inscrição, pois aí se enquadraria no art. 359-B. Por ser um crime omissivo próprio, não admite tentativa ao contrário dos demais crimes previstos no capítulo. Vejamos agora o art. 359-B: Proibi o administrador de aumentar despesa com pessoal, a fim de angariar votos futuros.” A norma busca tutelar o caráter ético. Tal atitude desequilibra o jogo democrático, que pode deixar o que está no poder em mais vantagem em relação a outro. “Art. 359-G. Ordenar, autorizar ou executar ato que acarrete aumento de despesa total com pessoal, nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato ou da legislatura: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.” “Art. 359-H. Ordenar, autorizar ou promover a oferta pública ou a colocação no mercado financeiro de títulos da dívida pública sem que tenham sido criados por lei ou sem que estejam registrados em sistema centralizado de liquidação e de custódia: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.” É importante frisar a exceção prevista no art. 359-F, do delito de não cancelamento de restos a pagar, o qual configura um delito omissivo, ao contrário de todos os outros crimes previstos neste capítulo. Portanto, em relação à conduta, este delito é o praticado por uma conduta omissiva, facilmente identificável pela expressão “deixar de”, conforme constante logo no começo do tipo penal.
Capítulo 13
Crimes contra a Organização do Trabalho
1. Crimes contra a Organização do Trabalho – Introdução 1.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os crimes contra a organização do trabalho.
1.2 Síntese Os crimes contra a administração do trabalho têm fundamento legal e constitucional. Todo crime tipificado no Brasil protege um bem previsto na Constituição. Se tiver crime protegendo bem que não está na Constituição, ele será inconstitucional. Bem da vida: liberdade, patrimônio, organização do trabalho. Alguns dos bens da vida são protegidos pelo direito e passam a ser um bem jurídico. No direito penal, é chamado bem jurídico penal.
184 Fundamentos da República: os principais fundamentos são a dignidade da pessoa humana e os valores sociais no trabalho e na livre-iniciativa. No art. 6º da Constituição, está como direito social o trabalho; a dignidade da pessoa humana é o fundamento constitucional e de todos os outros ramos do direito. O art. 6º da Constituição traz um rol exemplificativo de direitos sociais, e tem o trabalho expressamente previsto e tutelado. Nos §§ 1º e 2º do art. 9º, está previsto o direito de greve. O excesso implicará em responsabilização civil, penal e administrativa do agente. Os crimes contra a organização do trabalho têm fundamento nos arts. 197 a 207 do Código Penal. Esses crimes tutelam o bem da vida, trabalho, constitucionalmente previsto. Existe um direito penal tutelando o bem jurídico da atividade laboral.
2. Bem Jurídico e Competência 2.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o bem jurídico e competência.
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2.2 Síntese A competência está prevista no art. 109, IX, da Constituição, que determina que a competência para julgar os crimes contra a organização do trabalho é da justiça federal. Há dois tipos de crime contra a organização do trabalho no que diz respeito à competência. O STF subdivide os crimes contra a organização do trabalho de acordo com o bem jurídico atingido, o trabalhador, ou o órgão coletivo atingido pela conduta, que são de competência da Justiça Federal, de acordo com ao art. 109, inciso VI. Num outro plano, crimes que ofendem o trabalhador individualmente. Individualmente são interesses individualizados. Quando há um fato que irradia apenas para um dos trabalhadores, a competência é da Justiça Estadual. A Súmula nº 115 do extinto Tribunal Federal de Recursos, diz que compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes contra a organização do trabalho, quando tenha por objeto a organização geral do trabalho ou direitos dos trabalhadores considerados coletivamente.
185 Segundo o Recurso Extraordinário nº 469.632, PA, Marco Aurélio: Crime de organização do trabalho versus inobservância de direitos trabalhistas: Deve-se sopesar o quadro fático delineado soberanamente pela corte de origem, e o julgamento do recurso extraordinário, cujas razões vinculam a caracterização de crime contra a organização do trabalho. O simples fato de haver o descumprimento de normas trabalhistas, prevendo direitos dos trabalhadores, não configura o crime a ponto de deslocar a competência para a Justiça Federal. Outro Recurso Extraordinário de importante leitura e o nº 555.530, bem como os informativos nos 33 e 258.
3. Atentado contra a Liberdade de Trabalho (Arts. 197 e 198) 3.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o crime de atentado contra a liberdade de trabalho previsto nos art. 197 do Código Penal.
Vejamos a redação do art. 197 do Código Penal: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça: I – a exercer ou não exercer arte, ofício, profissão ou indústria, ou a trabalhar ou não trabalhar durante certo período ou em determinados dias: Pena – detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência; II – a abrir ou fechar o seu estabelecimento de trabalho, ou a participar de parede ou paralisação de atividade econômica: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência.” Sem violência ou grave ameaça, não há o art. 197 do CLT. Aqui a pessoa quer desempenhar sua atividade, mas a liberdade de escolha é atingida. O “além da pena pela violência” remete ao art. 70 do Código Penal, no qual se prevê a cumulação de resultados mediante uma única ação chamada concurso formal. Pega-se a pena do crime mais grave e acrescenta a pena de 1/6 até a metade. Na soma das penas, se o resultado ultrapassar dois anos, perde-se a competência para o Juizado Especial Criminal.
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3.2 Síntese
186 Pena mínima em abstrato até um ano, cabe suspensão condicional do processo, mesmo que a pena máxima saia do juizado. A greve é lícita, mas não quando há violência ou grave ameaça. Estatuto da igualdade racial traz o art. 4º que diz que a pessoa tem o emprego negado por conta de descriminação. Lei nº 7.853/1989, art. 8º, determina que, negado o emprego por força de deficiência mental em atividades que lhe são compatíveis, aplica-se a Lei nº 7.853. Se compelir trabalhadores a fechar o estabelecimento de forma violenta, haverá crime; senão, não haverá crime. O art. 6º da lei de greve, permite que a greve seja feita de forma pacífica.
4. Atentado contra a Liberdade de Trabalho (Art. 198) 4.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o art. 198 do Código Penal.
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4.2 Síntese Vejamos o crime de atentado contra a liberdade de trabalho, e boicotagem violenta, do art. 198 do Código Penal: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a celebrar contrato de trabalho, ou a não fornecer a outrem ou não adquirir de outrem matéria-prima ou produto industrial ou agrícola: Pena – detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência.” É um crime de competência do Juizado Especial Criminal e também tem suspensão condicional do processo. Existe algum crime em que a pena máxima em abstrato é até dois anos e não caiba Jecrim? Sim, o crime previsto no art. 41 da Lei Maria da Penha, Lei nº 11.340. Para os crimes de violência contra a mulher, não se aplica a Lei nº 9.099. Não se aplica o rito sumarissimo e nem a suspensão condicional do processo. Esse crime tutela o bem jurídico da liberdade do trabalho. Se existir impedimento no fornecimento de dinheiro mediante grave ameaça, sem permitir que o banco realize um financiamento a um empresário, não há que se falar no crime do art. 198 do Código Penal, uma vez que este é taxativo.
187 Delito de boicote é o ato de, mediante violência ou grave ameaça, impedir o desenvolvimento de alguma atividade.
5. Atentado contra a Liberdade de Associação (Art. 199) 5.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o atentado contra a liberdade de associação, do art. 199 do Código Penal.
5.2 Síntese Vejamos agora o art. 199 do Código Penal: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a participar ou deixar de participar de determinado sindicato ou associação profissional: Pena – detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência.” A regra do art. 146 do Código Penal vale para quando não há algo mais específico. Quando há, desloca do art. 146 para o art. 199. A detenção é aplicada nos regimes aberto e semiaberto. Há multa e pena por violência. A lesão corporal não absorve o delito do art. 197, porque a lei é expressa no além. Soma-se o resultado típico. Acrescenta-se de 1/6 até a metade, por se tratar de concurso formal, onde não se somam as penas. Outros exemplos, arts. 129 e 121.
Na suspensão condicional da pena, há todo um processo e uma sentença com fixação da pena. Cabe ainda a Lei nº 9.099 com todos os seus benefícios, inclusive transação penal, que consiste em um acordo feito entre acusação e a defesa que vai oferecer uma pena restritiva de direitos, e se a defesa aceitar, será cumprida, e nem haverá processo. Participação quer dizer ingresso, contribuição. É filiado por vontade própria e não pode ser compelido.
Direito Penal – Parte Especial
Cabe suspensão condicional do processo, pois a pena mínima em abstrato é de até um ano.
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6. Paralisação do Trabalho Seguida de Violência ou Perturbação da Ordem (Art. 200) 6.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o art. 200 do Código Penal.
6.2 Síntese
Direito Penal – Parte Especial
Vejamos agora o art. 200 do Código Penal: “Participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho, praticando violência contra pessoa ou contra coisa: Pena – detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. Parágrafo único. Para que se considere coletivo o abandono de trabalho é indispensável o concurso de, pelo menos, três empregados.” Paralisar a atividade laboral deve ser observado do lado dos empregadores, patrões, chefes, que teriam motivo para parar atividade. Na lei trabalhista, os fatos são amplos e permitidos. Do lado dos empregados, se as reivindicações não forem atendidas, haverá paralisação. Enquanto a lei de greve para os agentes públicos não for criada, os agentes públicos poderão, sim, fazer greve com base na Lei de Greve. Coloca-se fogo na única máquina que dá rendimento ao patrão, com o dolo de paralisação, pratica-se o art. 200 do Código Penal. O art. 6º da Lei de Greve permite que, de forma pacífica, você convença os colegas a participar da greve, o uso de violência impede o exercício do direito. Preceito primário é nome para redação legal da infração penal, e o preceito secundário é a pena, sanção. A pena serve para tutelar a relação de trabalho. A pena de violência pode ser aplicada mesmo na violência contra a coisa.
7. Paralisação do Trabalho de Interesse Coletivo (Art. 201) 7.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos a paralisação do trabalho de interesse coletivo, prevista no art. 201 do Código Penal.
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7.2 Síntese “Art. 201. Participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho, provocando a interrupção de obra pública ou serviço de interesse coletivo: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.” Discute-se se o art. 201 estaria ou não revogado. No art. 201, não há violência, a simples paralisação da atividade já ocasiona o crime. Este dispositivo é de 1940, a Lei de Greve é de 1989 e o direito constitucional da greve é de 1988. Se há a construção de um hospital e os funcionários fazem greve de forma pacífica. Se acompanhar a literalidade do dispositivo e entender que está em vigor, sim, é crime. Enquanto há a Lei de Greve, há o art. 201 do Código Penal, que são antagônicos. O que é permitido não pode ser proibido. E há um conflito aparente de normas. Não se pode fazer greve em obras públicas e serviços coletivos em razão de sua importância. Exemplo: funcionários de controle à dengue. A amplitude da Lei de Greve não é absoluta. Se fizer nessa situação, receberá pena do art. 201 do Código Penal. Segundo Júlio Fabbrini Mirabette, não houve revogação, e deve ser feita uma interpretação sistemática entre a Lei de Greve e o Código Penal, ou seja, a greve nesses casos não deve ser feita. Há a corrente que defende que pode haver greve nesses casos, desde que não paralise totalmente, e haja o mínimo de porcentagem do funcionamento. A pessoa que recebe a prestação do serviço é a parte hipossuficiente.
8. Invasão de Estabelecimento Industrial, Comercial ou Agrícola – Sabotagem
Nesta unidade, estudaremos a invasão de estabelecimento industrial, comercial ou agrícola e a sabotagem.
8.2 Síntese Para começar a sabotagem, há a invasão de estabelecimento industrial, comercial e agrícola.
Direito Penal – Parte Especial
8.1 Apresentação
190 Vejamos o art. 202 do Código Penal: “Invadir ou ocupar estabelecimento industrial, comercial ou agrícola, com o intuito de impedir ou embaraçar o curso normal do trabalho, ou com o mesmo fim danificar o estabelecimento ou as coisas nele existentes ou delas dispor: Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.” Aqui há o elemento subjetivo do injusto, ou dolo específico, que é identificado com a expressão “com o intuito de”, “com o fim de”. Deve haver um dolo mais específico do que invadir. A destruição do tipo penal em estudo foi feita para sabotagem. A mera invasão, despreocupada com o encerramento da atividade, configura invasão de domicílio. Havendo a apropriação de bens para venda, ocorre o crime de furto. A especificidade do dolo é que vai caracterizar a tipificação da conduta. Pelo fato de a pena ser superior a dois anos, não poderá ser seguindo o rito procedimental da Lei nº 9.099. Pela pena mínima ser de um ano, cabe suspensão condicional do processo. Estabelecimento empresarial é gênero de industrial, comercial, ou agrícola. É uma questão de terminologia. O legislador usou o curso normal de trabalhar e não colocou curso excepcional de trabalho, que seria um trabalho diferente do realizado pela empresa. Há entendimento de que a literalidade do dispositivo não pode inibir o enquadramento.
9. Frustração de Direito Assegurado por Lei Trabalhista 9.1 Apresentação
Direito Penal – Parte Especial
Nesta unidade, estudaremos a frustração de direito assegurado por lei trabalhista.
9.2 Síntese O art. 203 do Código Penal tutela condutas em que se pode vislumbrar efetiva prejudicialidade do trabalhador em condutas como retenção de documento, criação de dívida, etc. Vejamos o referido artigo: “Art. 203. Frustrar, mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação do trabalho:
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10. Frustração de Lei sobre a Nacionalização do Trabalho (Art. 204) 10.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos a frustração de lei sobre a nacionalização do trabalho.
Direito Penal – Parte Especial
Pena – detenção de um ano a dois anos, e multa, além da pena correspondente à violência. § 1º Na mesma pena incorre quem: I – obriga ou coage alguém a usar mercadorias de determinado estabelecimento, para impossibilitar o desligamento do serviço em virtude de dívida; II – impede alguém de se desligar de serviços de qualquer natureza, mediante coação ou por meio da detenção de seus documentos pessoais ou contratuais.” Há um acréscimo de sanção por frustração com violência, e praticar com violência seria outra pena. Não há bis in idem pois há dois bens jurídicos diferentes. Há a organização do trabalho sendo atingida, enquanto a agressão fere a integridade física. Está penalizando a tutela do bem jurídico de organização do trabalho. É sabido que, em alguns lugares, fazendeiros selecionam uma série de trabalhadores para trabalharem em lugar muito afastado e que o único local para compra de mantimentos é o mercado do dono da fazenda, com preços absurdos. Logo, o trabalhador não consegue arcar com a dívida, e os juros ampliam a dívida. Isso é ilegal, e se encaixa no inciso I. O empregador diz que a pessoa só pode ir embora se pagar o que deve, o que é impossível. Entende-se que a pena desse delito é irrisória. Causa de aumento de pena é fração. Parte da pena do caput e aumenta-se a pena. Qualificadora é um novo preceito secundário. Não há fração, há uma outra pena. Se o crime for praticado contra vítima menor de 14 anos, idoso, gestante, indígena ou portador de deficiência, incide causa de aumento. A gestante é a partir do momento em que está grávida. Ao índio não incide a causa de aumento se for civilizado.
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10.2 Síntese “Art. 204. Frustrar, mediante fraude ou violência, obrigação legal relativa à nacionalização do trabalho: Pena – detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência.” Esse crime pode ser visto como uma continuação do art. 203. A Constituição em seu art. 12 trata da nacionalidade, e diz que não pode haver distinção entre brasileiros e estrangeiros, salvo as hipóteses expressamente previstas na Constituição. Só poderá tratar de forma diferente, se a Constituição permitir. Os arts. 352 a 371 da CLT são regras que garantem aos brasileiros alguns brasileiros em detrimento de estrangeiros. Essa regra da CLT é utilizada pelo Código Penal por ser uma norma penal em branco. Não se pode afirmar que o art. 204 é inconstitucional. A inconstitucionalidade de um dispositivo é a incompatibilidade com o texto constitucional se ele é anterior à Constituição. Não há a modalidade culposa. Pode haver um concurso entre os arts. 203 e 204. A ação penal é pública incondicionada, e não precisa nem de inquérito policial. Cabe tentativa. O sujeito passivo primário é o Estado, indiretamente o estrangeiro que foi atingido.
11. Exercício de Atividade com Infração por Decisão Administrativa (Art. 205) 11.1 Apresentação
Direito Penal – Parte Especial
Nesta unidade, estudaremos o exercício de atividade com infração por decisão administra previsto no art. 205 do Código Penal.
11.2 Síntese “Art. 205. Exercer atividade, de que está impedido por decisão administrativa: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, ou multa.” A Administração Pública e o Ministério do Trabalho é que decidem pelo impedimento da decisão administrativa.
193 Há um tipo penal para o desrespeito da decisão administrativa, pratica-se crime. Não é uma sanção administrativa. O juiz pode entender que a simples sanção pecuniária é suficiente para reprimir e prevenir a infração. A multa é alternativa. Ou é a reclusão, ou a multa. O juiz vai analisar para aplicar a pena-base: circunstância da infração, comportamento da vítima (ex.: pessoa que anda em lugar perigoso com itens caros), culpabilidade e personalidade, antecedentes do agente, e motivos da infração. Cabe tentativa. Em algumas situações, essa desobediência não acarreta esse crime. Por exemplo, a desobediência de decisão judicial. Responde pelo crime do art. 330 do Código Penal. Exerce de forma ilegal uma função pública, sendo que já foi exonerado ou aposentado responde pelo art. 324. O exercício ilegal da medicina responde pelo art. 282 do Código Penal. O agente que exerce uma profissão ou atividade econômica sem preencher as condições que a lei exige, pratica a contravenção penal do art. 47 da Lei de Contravenções Penais. Exercício ilegal do comércio de coisas antigas ou obra de arte é contravenção do art. 48.
12. Recrutar Trabalhadores, Mediante Fraude, com o Fim de Levá-los para Território Estrangeiro 12.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o crime do art. 206 com o caput do art. 207 do Código Penal.
“Art. 206. Recrutar trabalhadores, mediante fraude, com o fim de levá-los para território estrangeiro. Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos e multa.” “Art. 207. Aliciar trabalhadores, com o fim de levá-los de uma para outra localidade do território nacional: Pena – detenção de um a três anos e multa.” A previsão de fraude no caput do art. 206 e a ausência de fraude no caput do art. 207 levam à consequência de que sem fraude não há responsabilização penal do agente pelo recrutamento para o estrangeiro.
Direito Penal – Parte Especial
12.2 Síntese
194 O art. 206 trabalha com o território estrangeiro, fora dos limites geopolíticos do Brasil. No art. 207, é a região geopolítica interna do nosso país. O verbo aliciar tem em seu âmago uma conduta que tem uma atividade prejudicial para esses trabalhadores. Se os direitos trabalhistas são assegurados, não tem fato típico. No art. 206, basta a finalidade de levá-los para território estrangeiro. Vale para qualquer país. Cabe suspensão condicional do processo, uma vez que a pena mínima é de até um ano. Em relação ao art. 207, também cabe juizado especial criminal, e não cabe Jecrim. A multa entre os dispositivos é cumulativa. Recrutar é reunir um grupo de trabalhadores. O crime está na palavra fraude no art. 206. É possível que na fraude, além da fraude, haja um recrutamento de trabalhadores a fim de levá-los para território estrangeiro. Nos dois artigos há dolo específico.
13. Art. 207 e Questões de Concurso 1.1 Apresentação Nesta unidade, daremos continuidade ao estudo do art. 207 do Código Penal e analisaremos questões de concursos.
Direito Penal – Parte Especial
1.2 Síntese “Art. 207. Aliciar trabalhadores, com o fim de levá-los de uma para outra localidade do território nacional: Pena – detenção de um a três anos e multa. § 1º Incorre na mesma pena quem recrutar trabalhadores fora da localidade de execução do trabalho, dentro do território nacional, mediante fraude ou cobrança de qualquer quantia do trabalhador, ou, ainda, não assegurar condições do seu retorno ao local de origem. § 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental.” No § 1º, verifica-se a fraude. Na prática, os indígenas recrutados para longe de sua tribo, são pessoas alheias à civilização. Ação penal pública incondicionada.
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137. (TRT 9ª Região) Assinale a proposição correta: a) A extorsão para o exercício do direito de greve configura crime de atentado contra a liberdade de trabalho. b) Contratar trabalhadores e não promover o pagamento de seu trabalho configura crime de estelionato. c) O recrutamento de trabalhadores para trabalhar em território estrangeiro configura delito penal. d) Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a participar ou deixar de participar de determinado sindicato ou associação profissional configura crime. 138. (TRT 21ª Região) Assinale a alternativa correta: a) Não constitui crime, mas motivo ensejador de justa causa, para rescisão indireta do contrato de trabalho, a condita do empregador que se apodera de objetos pessoais do trabalhador, apenas com o objetivo de deter o trabalhador no local de trabalho. b) Restrição imposta ao trabalhador quanto à sua locomoção em razão de dívida contraída com o preposto do empregador, não tipifica o crime de condição análoga a de escravo. c) Não configura crime contra a organização do trabalho, mas ilícitos de natureza tipicamente contratual, o ato de simplesmente frustrar mediante fraude direitos assegurados pela legislação laboral. d) Submeter o trabalhador a uma jornada de trabalho exaustiva caracteriza o crime de redução à condição análoga de escravo. 139. (Magistratura TRT 8ª Região) Fiscais do ministério do trabalho, em diligência a fazenda Eldorado, constataram a existência de trabalhadores em condição análoga a de escravo. Confirmaram também que esses trabalhadores foram aliciados pelo capataz da fazenda de outro estado da federação. Pergunta-se: a conduta do capataz pode ser enquadrada em qual tipo penal? Qual? a) Não, pois a conduta do capataz não é considerada crime. b) Sim, enquadrada no art. 206 que dispõe sobre o aliciamento de trabalhadores mediante fraude com o fim de recrutá-los para trabalhar em outro local. c) Sim, enquadrada no art. 207 do CP, que dispõe sobre o aliciamento de trabalhadores com o fim de recrutá-los para trabalharem em outra localidade do território nacional.
Direito Penal – Parte Especial
Exercícios
Capítulo 14
Condicionamento de Atendimento e Fraudes em Certames
1. Condicionamento de Atendimento Médico-hospitalar Emergencial e Fraudes em Certames de Interesse Público 1.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o condicionamento de atendimento médico-hospitalar emergencial e fraudes em certames de interesse público.
1.2 Síntese O condicionamento de atendimento médico-hospitalar foi tipificado como crime no Código Penal pela Lei nº 12.653, de 28 de maio de 2012, que introduzindo no CP o art. 135-A, que expressa: “Exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários
administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial.” Esta conduta típica e ilícita foi inserida logo após o crime de omissão de socorro. Sobre o tipo penal, pode-se afirmar que o bem jurídico tutelado é a vida humana e a saúde do ser humano. O elemento do tipo penal é: exigir, impondo à vítima condição para receber atendimento médico emergencial. Surge a questão se o art. 135-A restringe-se ao atendimento médico-hospitalar emergencial ou se contempla também os casos de urgência? Segundo o art. 1º da Resolução nº 1.425/1995, define que: “os estabelecimentos de Prontos Socorros Públicos e Privados deverão ser estruturados para prestar atendimento a situações de urgência-emergência (...).” O § 1º do art. 1º da resolução define por urgência a ocorrência imprevista de agravo à saúde com ou sem risco potencial de vida, enquanto o § 2º define por emergência a constatação médica de condições de agravo à saúde que impliquem em risco iminente de vida ou sofrimento intenso, exigindo portanto, tratamento médico imediato. Sendo assim, emergência também envolve urgência? Embora o tipo penal seja emergencial, o autor entende que envolva o tratamento de urgência também, numa interpretação em sentido mais amplo. Quanto ao sujeito ativo do delito é a pessoa que tem o comando de permitir ou não a entrada, exigindo indevidamente garantia do necessitado de atendimento médico-hospitalar emergencial, podendo ser funcionário do hospital, servidor, secretária, diretor, gerente que deu a ordem. É possível haver o concurso de pessoas; neste caso, respondem todos pelo mesmo delito. Esta lei visa proteger a vida e a saúde humana e está impondo aqui o atendimento rápido sem qualquer tipo de garantia. O crime é doloso e não há previsão culposa, nem há elemento subjetivo especial. A consumação deste crime ocorre no ato da exigência, basta exigir, independente da entrega do cheque ou da nota promissória, ou seja, trata-se de um crime formal. O parágrafo único traz a qualificadora, crime preterdoloso, conforme dispõe: “a pena é aumentada até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão corporal de natureza grave, e até o triplo se resulta a morte.” A pessoa que precisando de atendimento médico hospitalar de emergência sofre a imposição ilícita de prestar garantia e emite o cheque sem fundo sabendo que não possui fundo, não responderá pelo crime define no art. 171, § 2º, VI, CP, em razão do cheque caução para atendimento médico perder a característica de cheque; sendo assim, não configura crime. Entretanto, o médico que sabendo da emergência de tratamento à vítima e exige o cheque ou nota promissória estará incorrendo no crime previsto no art. 121, c/ art. 13, § 2º, do Código Penal.
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Direito Penal – Parte Especial
Outra novidade legislativa incorporada ao Código Penal foi o art. 311-A, incluído pela Lei nº 12.550, de 15 de dezembro de 2011 que trata das fraudes em certames de interesse público. “Art. 311-A. Utilizar ou divulgar, indevidamente, com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame, conteúdo sigiloso de: I – concurso público; II – avaliação ou exame públicos; III – processo seletivo para ingresso no ensino superior; ou IV – exame ou processo seletivo previstos em lei. Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. § 1º Nas mesmas penas incorre quem permite ou facilita, por qualquer meio, o acesso de pessoas não autorizadas às informações mencionadas no caput. § 2º Se da ação ou omissão resulta dano à administração pública: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. § 3º Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o fato é cometido por funcionário público.” Sobre o tipo penal, pode-se afirmar que o bem jurídico tutelado é a credibilidade do certame, a fé pública. O elemento objetivo do tipo penal é: utilizar ou divulgar, dar conhecimento a outras pessoas de conteúdo sigiloso. O elemento subjetivo é o dolo com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou comprometer a credibilidade do certame. Por se tratar de crime formal, não é necessário atingir o fim. O agente ativo pode ser qualquer pessoa e nas mesmas penas incorre a pessoa que permite ou facilita o acesso de pessoas não autorizadas às informações de conteúdo sigiloso, conforme dispõe o § 1º do art. 311-A. Os §§ 2º e 3º são as qualificadoras do crime. A dúvida é se a cola eletrônica estaria abrangida pelo 311-A. A primeira posição entende que não, porque o gabarito particular não tem conteúdo sigiloso. A segunda posição entende que sim, porque é conteúdo sigiloso enquanto a prova está sendo realizada, portanto, todos os dados referentes àquela prova não podem ser divulgados.
Capítulo 15
Crimes Informáticos
1. Crimes Informáticos – Introdução 1.1 Apresentação Nesta unidade, daremos início ao estudo dos crimes informáticos.
1.2 Síntese Crimes informáticos, o que proteger? Prevalece na doutrina a chamada segurança das informações telemáticas, ou segurança dos dados digitais que circulam na rede mundial de computadores, e dos dados digitais presentes no seu computador pessoal. Por que o direito penal e não sanção administrativa? Vislumbrou-se a gravidade das possíveis condutas praticadas, o tamanho da consequência seria tão grave, que haveria a necessidade da força coercitiva e repressiva do direito penal.
200 Para investigar uma pessoa, é preciso ter o seu mesmo grau de especificidade. Para preparar a polícia, seria necessário muito dinheiro para o combate desse tipo de crime. Se não houver aparato tecnológico de primeira linha, não haverá resultado. É necessário uma vacatio legis elástica o suficiente para que tudo seja adequado; derrubar trâmite burocrático internacional. A primeira lei que foi aprovada sobre crimes informáticos é a Lei nº 12.735/2012, que teve toda sua parte penal vetada pela presidente. Esta lei possui um vacatio legis de 120 dias. Os arts. 4º e 5º dessa lei são importantes. Vejamos o art. 4º: “Os órgãos da polícia judiciária estruturarão, nos termos de regulamento, setores e equipes especializadas no combate à ação delituosa em rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado.” É uma norma de cunho programático. O art. 5º alterou a lei de preconceito de raça e cor. Vejamos o inciso II: “a cessação das respectivas transmissões radiofônicas, televisivas, eletrônicas ou da publicação por qualquer meio.” O juiz pode cessar as transmissões eletrônicas se praticadas com a finalidade racial.
2. Art. 154-A do CP 2.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos o crime previsto no arts. 154-A do Código Penal.
Direito Penal – Parte Especial
2.2 Síntese Vejamos a Lei nº 12.737/2012. É uma lei de vacatio legis de 120 dias. Essa lei dispõe sobre a tipificação criminal de delitos informáticos; altera o Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal; e dá outras providências. Essa lei trouxe os arts. 154-A e 154-B. Vejamos o art. 154-A: “Invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim
201 de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa. § 1º Na mesma pena incorre quem produz, oferece, distribui, vende ou difunde dispositivo ou programa de computador com o intuito de permitir a prática da conduta definida no caput. § 2º Aumenta-se a pena de um sexto a um terço se da invasão resulta prejuízo econômico. § 3º Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido: Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, se a conduta não constitui crime mais grave. § 4º Na hipótese do § 3º, aumenta-se a pena de um a dois terços se houver divulgação, comercialização ou transmissão a terceiro, a qualquer título, dos dados ou informações obtidos. § 5º Aumenta-se a pena de um terço à metade se o crime for praticado contra: I – Presidente da República, governadores e prefeitos; II – Presidente do Supremo Tribunal Federal; III – Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Assembleia Legislativa de Estado, da Câmara Legislativa do Distrito Federal ou de Câmara Municipal; ou IV – dirigente máximo da administração direta e indireta federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal.”
3. Arts. 154-A e 154-B do CP
Nesta unidade, daremos continuidade ao estudo dos arts. 154-A e 154-B do Código Penal.
3.2 Síntese Vejamos do § 2º em diante do art. 154-A: “§ 2º Aumenta-se a pena de um sexto a um terço se da invasão resulta prejuízo econômico.
Direito Penal – Parte Especial
3.1 Apresentação
202 § 3º Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido: Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, se a conduta não constitui crime mais grave. § 4º Na hipótese do § 3º, aumenta-se a pena de um a dois terços se houver divulgação, comercialização ou transmissão a terceiro, a qualquer título, dos dados ou informações obtidos. § 5º Aumenta-se a pena de um terço à metade se o crime for praticado contra: I – Presidente da República, governadores e prefeitos; II – Presidente do Supremo Tribunal Federal; III – Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Assembleia Legislativa de Estado, da Câmara Legislativa do Distrito Federal ou de Câmara Municipal; ou IV – dirigente máximo da administração direta e indireta federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal.” Vejamos agora o art. 154-B: “Nos crimes definidos no art. 154-A, somente se procede mediante representação, salvo se o crime é cometido contra a administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal ou Municípios ou contra empresas concessionárias de serviços públicos.”
4. Arts. 266 e 298 do CP 4.1 Apresentação Nesta unidade, estudaremos os arts. 266 e 298 do Código Penal.
Direito Penal – Parte Especial
4.2 Síntese Vejamos o art. 266 do Código Penal, após recente alteração: “Interromper ou perturbar serviço telegráfico, radiotelegráfico ou telefônico, impedir ou dificultar-lhe o restabelecimento: Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. § 1º Incorre na mesma pena quem interrompe serviço telemático ou de informação de utilidade pública, ou impede ou dificulta-lhe o restabelecimento. § 2º Aplicam-se as penas em dobro se o crime é cometido por ocasião de calamidade pública.”
203
Direito Penal – Parte Especial
Vejamos agora o art. 298 do Código Penal: “Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro: Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. Para fins do disposto no caput, equipara-se a documento particular o cartão de crédito ou débito.”
204
Direito Penal – Parte Especial
Gabarito
1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18.
Letra C. Letra C. Letra A. Letra D. Letra D. Letra A. Letra B. Letra A. Letra D. Letra C. Letra C. Letra D. Letra D. Correta. Correta. Letra B. Letra D. Letra C.
19. 20. 21. 22. 23. 24. 25. 26. 27. 28. 29. 30. 31.
Letra D. Letra A. Letra C. Letra D. Letra B. Letra D. Letra C. Errada. Errada. Errada. Errada. Correta. O crime é injúria, pois ele imputou o fato tão somente perante a vítima. 32. Negro Sujo configura injúria preconceituosa, mas temos de analisar se ele estava no exercício da função, assim, pode ser desacato.
33. 34. 35. 36. 37.
38. 39. 40.
41. 42. 43. 44. 45.
46.
Correta. Errada. Errada. Errada. A disposição de motivos preceitua que não será possível a exceção da verdade na difamação envolvendo o Presidente da República, entretanto existe o posicionamento no sentido que poderia, tendo em vista que não há vedação legal. Correta. Correta. 1º ponto de vista: Segundo o STJ, o advogado possui imunidade mesmo que seja contra o juiz, porém deve haver pertinência temática. 2º ponto de vista: A imunidade judiciária se aplica quanto à ofensa contra a outra parte, nesse caso o advogado responderia por crime de injúria ou difamação. Verdadeiro. Letra E. Letra C. Letra E. Não. Furto é a subtração para si ou para outrem de coisa alheia. O proprietário pode praticar outros crimes ao subtrair coisa própria: Arts. 345 e 346 do Código Penal. Subtração de coisa própria que está em posse de terceiro por determinação judicial. Coisa abandonada não faz parte do patrimônio de ninguém, portanto não pode ser furtada.
47. Em relação ao boi não há furto, pois não há a intenção de se tornar dono do boi. Foi subtraída energia genética, o sêmen do boi. O touro era raça pura, ou seja, há aproveitamento econômico. A utilização do touro se dá por alguns dias, é crime permanente, portanto. Ainda é possível desenvolver a teoria de crime continuado, constituindo um crime cada uma das inseminações do touro. 48. Correta. 49. Errada. 50. Errado. Essa descrição corresponde a Ilácio. 51. Só incide sobre o caput. 52. Errada. 53. Errada. 54. Não, porque no furto privilegiado há condenação e no crime de bagatela não. 55. Não incide a qualificadora, pois não houve rompimento nem destruição. 56. Sim, pois deixa vestígios, é necessário exame para constatação de rompimento ou destruição de obstáculo para a subtração da coisa. 57. Errada. 58. Errada. No crime de furto mediante fraude a vítima não entrega nada. O agente subtrai. 59. Errado. 60. Correta. Diante do exposto pode admitir-se que: Stélius, aquele que emprestou a casa sem nada
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querer concorreu na prática de crime de furto qualificado, porque ele deu a segurança para que o crime fosse cometido, houve auxílio, uma vez que houve acerto prévio. Errada. O STJ entende que é possível em alguns casos aplicar o princípio da insignificância mesmo na hipótese de furto qualificado. Errada. O que está predominando tanto na doutrina quanto nos Tribunais Superiores é a possibilidade de o furto ser qualificado e privilegiado ao mesmo tempo – hipótese do furto híbrido. Não. Roubo por omissão. Não é possível roubo de uso. O crime é de roubo. Não, a jurisprudência não admite nesse caso o roubo de uso. Nesse caso, art. 146, constrangimento ilegal. Predomina-se a tentativa de roubo, mesmo a vítima não entregando nada ao agente. Trata-se de constrangimento legal, por não haver aspecto patrimonial. O agente deve responder por constrangimento legal e não por roubo. Errada. Não autoriza. Errada. Errada. Errada. Errada. Crime de extorsão qualificada pela restrição da liberdade. No
art. 158, § 3º, primeira parte, do Código Penal. No crime de extorsão o comportamento da vítima é indispensável, nesse exemplo, ela foi obrigada a digitar a senha do banco. 74. Não. Porque não foi em razão da violência do roubo que ocorreu a morte; foi uma violência distinta. 75. De acordo com a Súmula nº 610 do STF, trata-se de um latrocínio consumado. 76. 1º posicionamento: em um crime de extorsão (art. 158, § 3º), o comportamento da vítima é indispensável, liberdade restrita da vítima, ao passo que no delito de extorsão mediante sequestro (art. 159), o comportamento da vítima é dispensável. Exemplo: sequestram a vítima e os agentes ligam dizendo que só irão soltá-la quando o resgate exigido for pago. O comportamento da vítima é dispensável. O comportamento do terceiro é indispensável. 2º posicionamento: incide o art. 158, § 3º quando ocorrer a restrição da liberdade, e vai incidir o art. 159 quando ocorrer a privação da liberdade por extorsão qualificada pela restrição da liberdade, mas dessa qualificadora específica ainda podem ocorrer lesão corporal e morte (§ 3º). Seria uma forma mais grave, quando ocorre o resultado morte.
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Letra D. Correta. Letra D. Letra D. Letra B. Letra A. Errada. De acordo com o art. 180, § 1º, exercício da atividade comercial, mesmo que seja no interior da própria residência. 84. 1ª posição: Sim, é necessário contato com o agente ou com o terceiro. 2ª posição: Não, não é necessário bastando que haja um contato; ato libidinoso com ela mesma. 3ª posição: Não, é necessário que haja ato libidinoso. 85. Todos os três envolvidos cometem um único crime de estupro consumado. 86. Correto. 87. Errado. 88. Responde por estupro mais homicídio. 89. Não, pois a agente é quem engravida, não aplicando a causa de aumento. 90. Não. 91. Estupro de vulnerável. 92. Correta. 93. Falso. 94. Correta. 95. Correta. 96. Errada. 97. Falsidade ideológica. 98. Falsa. 99. Correta. 100. Correta. 101. Errada.
102. Errada. 103. Crime de falsidade ideológica. 104. “A” comete apropriação indébita. 105. Sim. 106. Errada. 107. Responde pelo art. 5º da Lei nº 7.492/1986. Não se configura como peculato. 108. Falsidade ideológica. 109. Letra C. 110. Sim. Art. 3º, II, da Lei nº 8.137/1990. 111. Errada. Quando ele emprega meio vexatório que a lei não autoriza, é uma modalidade de cobrança de tributo devido. 112. Correta. 113. Corrupção ativa. 114. Correta. 115. Este elemento não é requisito para o crime 319-A, bastou ele facilitar o acesso do aparelho celular. Ele responde como uma espécie de crime de prevaricação. 116. Correta. 117. Letra E. 118. Correta. 119. Letra C. 120. Letra B. 121. Letra E. 122. Verdadeira. 123. Errada. 124. Letra C. 125. Letra E. 126. Letra A. 127. Denunciação caluniosa. 128. Letra B. 129. Letra E. 130. Errada.
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131. Correta. 132. Letra E. 133. Errada. 134. Letra D. 135. Letra A.
136. C, E, E, C, E. 137. Letra D. 138. Letra D. 139. Letra C.