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Jáder Santana jader.santana@opovo.com.br
ugh Glass quer vingança. É esse o sentimento que o move e que o faz se arrastar, literalmente, pela região montanhosa do centro dos EUA, atravessando mais de 5 mil quilômetros entre índios inimigos, escassez de comida e um inverno rigoroso. Seu propósito: assassinar os homens que o abandonaram, gravemente ferido, e que fugiram com suas armas e suprimentos. Hugh Glass é salvo e condenado por seu desejo de vingança. Em O Regresso, livro de Michael Punke, a camaradagem e cooperação de um grupo de caçadores é substituída pela obsessão e ira do protagonista deixado para trás. Atacado por um ursocinzento enquanto fazia o reconhecimento de um território, Hugh Glass teve seu corpo dilacerado. Como reconhecimento aos seus serviços e amizade, o chefe da expedição designou dois homens para permanecerem ao seu lado em seus últimos dias, protegendo-o de ameaças e garantindo um enterro digno. Punke constrói seus personagens de modo cuidadoso, abrindo espaço para se aprofundar em suas histórias, passados e motivações. Quando o acidente acontece, o leitor, familiarizado ao caráter dos caçadores, consegue projetar acontecimentos e reações. Abandonado pelos que deveriam cuidá-lo, privado de suas armas e equipamento de sobrevivência, Glass decide resistir para levar a cabo sua revanche. A cólera que move o personagem é magistralmente desenhada pelo autor. Jamais latente ou dissimulada, parece escapar de cada poro seu, consumandose em ações, confirmando-se em palavras. Um rancor que perturba e enerva, que chega ao leitor como um estímulo desagradável: quando percebemos, já estamos compartilhando de sua ira, virando páginas ávidos pela consumação de uma vingança que também é nossa. O Regresso é também importante por jogar luz sobre um momento histórico tão pouco conhecido e falado pelos que habitam a metade sul do continente. Quantos de nós podemos falar com clareza sobre o período das explorações rumo ao oeste no início do século XIX, sobre o comércio de peles, os conflitos e alianças entre homens brancos e índios? Ao final do romance, o autor apresenta valiosas notas históricas e fontes de consulta que ajudam a compreender aquele contexto de viagens e disputas. Se o autor desliza em algum ponto, é na já habitual tendência reducionista norte-americana a opor a opulência do conquistador e a selvageria do nativo. A literatura de Punke é ufanista, louva um estilo de vida que deixou de existir e ficou no passado, com todos os prós e contras que isso possa simbolizar. Em um dos capítulos mais chocantes, um caçador baixa guarda diante de duas crianças indígenas, seduzido pela pureza de suas figuras. Como resposta, é assassinado por uma delas. É na crueza de O Regresso o está seu valor.
H VIDA & ARTE LEU. O REGRESSO
UMA JORNADA DE OBSESSÃO E VINGANÇA Livro que inspirou filme com Leonardo DiCaprio mergulha na cólera e desespero como estratégias de sobrevivência
O Regresso De Michael Punke 272 páginas Intrínseca Quanto: R$ 39
O FILME Realizado pelo premiado diretor mexicano Alejandro González Iñárritu (Birdman, Biutiful e Babel), O Regresso foi o grande vencedor da edição 2016 do Globo de Ouro. Além do prêmio de melhor filme dramático, Inárritu levou para casa o título de melhor diretor e Leonardo DiCaprio foi escolhido como melhor ator do ano. Para o Oscar, que vai revelar seus vencedores no final de fevereiro, o filme coleciona o maior número de indicações no ano, doze no total, incluindo ator, diretor e filme. No Brasil, o filme estreia no dia 4 do próximo mês.
Com Leonardo DiCaprio no papel principal, O Regresso se passa nos EUA do século XIX