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Há 40 anos, Joâo Candido Portinari se dedica a estudar e catalogar a obra do pai. Valores sociais e humanos ficaram como legado na vida e nas telas pintadas por Portinari
ARTES PLÁSTICAS. Portinari visita Portinari Cultura Filho único de um dos maiores artistas plásticos brasileiros, João Cândido Portinari reencontrou as obras do pai em exposição em Fortaleza. O POVO acompanhouu a visita Jáder Santana jader.santana@opovo.com.br
J
oão Candido se refere ao pai como Portinari. “Na obra do Portinari, você pode pensar num lado trágico e num lado lírico”. Fala com voz de especialista, como fundador do projeto que há quase 40 anos se dedica a resgatar e difundir um conjunto de obras produzidas nas quase quatro décadas de trajetória de um dos artistas mais respeitados do País. “Portinari desde o início tomou o partido dos excluídos, dos despossuídos, das pessoas mais humildes”. Mas é quando fala como filho que aparecem os detalhes que especialista nenhum poderia saber. O método de pintura - “ele interagia, gostava de pintar conversando” - a importância de sua arte - “para ele, aquilo era como o ar que respirava” - e a participação da família e dos amigos - “ele punha a família toda pra posar, era um costume”. Quando fala como filho, é o Portinari homem que conhecemos. O artista que pintava as dores da mãe preta e as agonias do sertão era o mesmo que emprestava lirismo para o retrato de Denise, sua primeira neta, filha de João Candido. “Ela foi a única pessoa que teve permissão de pintar em cima de uma tela dele. E ele sentia essa iluminação no fim da vida, por ser avô de uma garotinha”, comenta. Portinari e Denise conviveram por dois anos, até que o ar-
tista - suprema ironia - morreu intoxicado pelas tintas que usava para dar vida as suas telas. “Nesses dois anos, ele fez 16 retratos da Denise. Foi uma paixão absoluta”. A pintura da neta é uma das dez obras de Portinari que integram a exposição da coleção Airton Queiroz, em cartaz no Centro Cultural da Universidade de Fortaleza (Unifor) desde 15 de junho. “É uma emoção estar diante de um painel como esse, porque representa uma diversidade de dramas e de poesia”, comenta João Candido, enquanto acompanha com o olhar a evolução dos estilos e temáticas do pai nas obras expostas - “você tem uma representação de diferentes tempos, desde 1940 e até o retrato da minha filha, que já é o finalzinho de sua vida”. Ao lado da pintura de Denise e de um autorretrato, chama atenção um quadro de grandes dimensões com uma criança de olhos luminosos e calças coloridas. Atrás dela, um cavalinho em posição de marcha. É o próprio João Candido o retratado, aos dois anos. “O cavalinho e a roupa são abstrações, imaginação, mas eu tenho um filme no qual eu estava posando exatamente para esse retrato, no chão, brincando com cubinhos. Ele olhava pra mim e pincelava. É emocionante”. João Candido revela que o pai tratava de incluir familiares e amigos em sua produção, sobretudo quando estava trabalhando em pinturas de temática sacra. “Os irmãos dele faziam os santos e eu posava muito como o menino Jesus. A gente nem se impressionava com isso. Era tão natural”. Enquanto trabalhava, Portinari gostava de interagir com seus modelos e conversava com os que estavam a sua volta “ele tinha esse costume, não precisava de toda essa concentração”. Também fugia de qualquer ideia de pompa que pudesse ser ligada à sua arte. “Ele não precisava de grandes ambientes - pintava em casa, em qualquer lugar - e nem de grandes momentos. Dizia que era como um operário, um sapateiro, que não tinha esse negócio de inspiração. Acordava e permanecia diante do cavalete até escurecer. Todos os dias. Durante 40 anos”. De sua labuta diária foram criadas mais de 5100 obras que permanecem, em sua maioria, conservadas em acervos privados. João Candido estima que mais de 95% da produção do pai esteja protegida em coleções particulares ao redor do mundo. E foi para trazer aos olhos do público esse legado artístico que fundou, em 1979, o Projeto Portinari. “Vejo essas obras como uma grande carta que ele escreveu ao povo brasileiro, mas a carta não tinha chega-
Denise em rosa com o cachorrinho, obra de 1960
do ao seu destino, e não havia como fazê-la chegar, porque estava em coleções fechadas”. Catalogando essa extensa produção, João Candido ganhou a oportunidade de mergulhar no universo imaginado pelo pai. Percorreu suas fases e estilos, estudou suas influências e, com quase 40 anos de pesquisa, acredita ter encontrado a linha que norteava o trabalho de Portinari. “Ele passou uma grande mensagem de ética dos valores sociais e humanos, da não violência, da fraternidade, do espírito comunitário, do respeito à vida. Você sente essa ternura em todas as suas obras, com crianças, velhos e animaizinhos. Com o recuo de todos esses anos, posso dizer que seu grande tema foi o amor”.
Serviço EXPOSIÇÃO COLEÇÃO AIRTON QUEIROZ Quando: até dezembro (de terça a sexta, das 9 às 19 horas, ao sábados, das 10 às 18 horas, e aos domingos, das 12 às 18 horas) Onde: Espaço Cultural Airton Queiroz, na Unifor (av. Washington Soares, 1321 Edson Queiroz) Gratuito
Multimídia Veja vídeo da entrevista com João Candido Portinari em www.opovo.com.br/videos