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Sua casa está PRONTA?

Por Mônica Santos1e Ellen Barros

“Nós saímos todos juntos, no mesmo dia, fugidos da lama de rejeitos da Samarco. Vamos voltar todos juntos.” Essa é uma fala recorrente de José do Nascimento de Jesus (seu Zezinho), sempre que o assunto é reassentamento. O desejo dele é o mesmo de muitas outras pessoas atingidas pelo desastre-crime das mineradoras Samarco, Vale e BHP, mas os sucessivos e injustificáveis atrasos nas obras não permitiram que assim acontecesse. Há dois anos, venceu o último prazo para entrega dos reassentamentos estabelecido pela Justiça: 27 de fevereiro de 2021, sob pena de multa de R$1 milhão por dia de atraso. A multa, até o momento, não foi aplicada e a finalização das obras segue sem prazo para efetivamente acontecer. Em janeiro, algumas famílias foram chamadas pela Fundação Renova para se mudarem para o reassentamento do distrito de Bento Rodrigues, mesmo inacabado.

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Há muita publicidade e pouca informação acerca da finalização das obras dos reassentamentos. Um caso emblemático foi a coletiva de imprensa realizada pela Renova no dia 19 de outubro de 2022. A ocasião celebrava um Termo de Compromisso em que bens públicos do reassentamento de Bento Rodrigues foram passados para a responsabilidade da Prefeitura de Mariana. No entanto, a Comissão de Atingidos pela Barragem de Fundão (CABF) e parte significativa da comunidade sequer foram avisadas sobre o evento. Por acaso, a CABF soube da coletiva, então mobilizou alguns membros da comunidade para irem juntos até lá. A Renova chegou a tentar impedir a entrada dessas pessoas, mas não conseguiu. As pessoas atingidas conversaram com jornalistas e evidenciaram os desmandos da fundação, os atrasos e diversos outros problemas enfrentados pelas famílias para terem de volta o direito à moradia. Indignada, Sandra Quintão questionou: “cadê o Bar da Sandra? Cadê o meu trabalho? Eu quero a minha casa de volta, eu quero a minha dignidade de volta”. Os repórteres então deixaram de lado o show de visibilidade seletiva promovido pela Renova para ouvir o que as pessoas atingidas ali presentes tinham para dizer. Nesse momento, o presidente e os demais funcionários da Renova se retiraram do ambiente sem dar explicações.

A falta de transparência é fator de angústia para as comunidades atingidas. Em 22 de julho de 2022, a CABF enviou um ofício à Fundação Renova com cópia ao Ministério Público em que solicitava acesso ao plano de ocupação e esclarecimentos sobre a ida parcial das famílias para o reassentamento de Bento Rodrigues, um grande canteiro de obras e ainda não obteve retorno.

Diversos problemas são relatados pelas famílias e observados pela Assessoria Técnica Independente (ATI) nas visitas às casas consideradas “prontas” pela Renova, que promete ajustes para depois de assinada a concordância com a finalização dos últimos marcos de obra, usando o direito à garantia como justificativa. No entanto, pessoas que já receberam os imóveis no reassentamento familiar enfrentam problemas no atendimento às solicitações e, embora seja prevista por lei a garantia dos imóveis, a Renova não apresentou informações claras sobre qual a abrangência e as condições para acioná-la. Nesse sentido, a ATI recomenda que as famílias solicitem esses esclarecimentos durante as visitas às obras.

A ATI recomenda também que:

1) Em todas as visitas às obras, a família atingida exija que tudo seja registrado em ata e que as demandas sejam encaminhadas pela Fundação Renova, ainda que a família escolha não assinar o documento;

2) Confiram se os encaminhamentos de visitas e reuniões anteriores foram efetivamente realizados pela Renova;

3) Identifiquem, nas visitas de marcos de obras, se existem problemas ou divergências com relação ao que está no projeto da moradia e, caso identifiquem, exijam que a Renova apresente soluções;

4) Solicitem informações sobre Habite-se tanto da Renova quanto da Prefeitura na Secretaria de Obras;

5) Solicitem à Renova visitas não programadas sempre que julgarem necessário;

6) Sugerimos que seja realizada uma visita em período chuvoso para averiguar se há infiltrações, goteiras, mofo, lodo, instabilidade de barrancos, escoamento inadequado de água de chuva para imóveis vizinhos, e/ou formação de poças d’água no imóvel;

7) Não assinem a validação do marco de obra enquanto existirem problemas a serem resolvidos;

8) Caso vocês se sintam desconfortáveis durante o atendimento, fiquem à vontade para interrompê-lo;

9) Recebam as chaves do imóvel apenas quando TODOS os problemas forem solucionados.

A Cáritas reitera a disponibilidade para acompanhá-los nos atendimentos. Em caso de dúvidas e/ ou denúncias sobre o processo de reparação, entrem em contato com a ATI. O telefone é (31)992180264.

É direito das famílias atingidas ter acesso às informações necessárias para as tomadas de decisão. Portanto, é essencial que tanto a Renova quanto o poder público informem as condições em que o reassentamento estará no momento da mudança, em especial sobre: segurança, escola, posto de saúde, saneamento básico, transporte público, contingente de trabalhadores, trânsito de máquinas pesadas, poeira, barulho, disponibilidade de água, além dos possíveis impactos das obras em curso nas estruturas das casas concluídas.

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