837 Edição 26.02.2016

Page 1

Braganรงa Paulista

Sexta

26 Fevereiro 2016

Nยบ 837 - ano XIV jornal@jornaldomeio.com.br

jornal do meio

11 4032-3919


2

Para pensar

Jornal do Meio 837 Sexta 26 • Fevereiro • 2016

Expediente

Jesus:

Alguém para seguir e não para admirar!

Jornal do Meio Rua Santa Clara, 730 Centro - Bragança Pta. Tel/Fax: (11) 4032-3919 E-mail: jornal@jornaldomeio.com.br Diretor Responsável: Carlos Henrique Picarelli

por Mons. Giovanni Baresse

Jornalista Responsável: Carlos Henrique Picarelli (MTB: 61.321/SP)

Não estranhe quem lê estas

quando mergulha no belo infinito

consciência da conversão para

respostas e atitudes de Jesus e

linhas. Como é possível

que é Deus. Lembrará, contudo,

a vivência dos valores propostos

chegássemos à conclusão que ele

afirmar que Jesus não

à luz do pensamento platônico,

por Jesus de Nazaré. O texto nos

venceu “porque era Deus”, essa

deve ser admirado? Parece um

que o homem é inclinado ao Mal,

fala das tentações que Jesus vi-

lição do Evangelho seria página

contrassenso. Como seguir a

embora suspire pelo Bem. Este

veu ao iniciar a sua vida pública,

inócua. “Não podemos fazer como

quem não se admira? A afirma-

arrazoado quer indicar a pessoa

logo depois de ter se submetido

Deus faz!” Nossa admiração deve

ção vai à direção de concretizar

de Jesus Cristo como modelo

ao batismo de João. Afirma o

fixar-se no mistério da Encarna-

a realidade de que nem sempre

de postura que podemos ter e

evangelista que Jesus ficou sem

ção: Deus que se faz, realmente,

se segue a quem se admira. Por

imitar. Consequência do segui-

comer durante quarenta dias e

um de nós. Passa por tudo o que

muitas razões. A maior delas se

mento de Jesus, de sua imita-

“depois teve fome”. Aí surge o

passamos. Com isso nos mostra

baseia no pensar que não é pos-

ção, a admiração adquirirá seu

diabo com as três propostas: que

como enfrentar as vicissitudes.

vez por todas. Quando Lucas

sível dar os mesmos passos de

dinamismo. A admiração não é

usasse seu poder para resolver

Se Jesus de Nazaré não fosse

lembra o “tempo oportuno” ele

quem se admira. Às vezes quem

categoria estática. Ela deve levar

sua fome: “Muda esta pedra em

pessoa humana ele só serviria

quer marcar que, ao longo da

se admira parece inatingível e,

à atitude. Em termos práticos,

pão!”; aceitasse ser o domina-

para ser lembrado como alguém

vida, Jesus foi sempre tentado

por isso mesmo, se considera

já o disse em outras ocasiões,

dor: “tudo será teu!” e ditasse

diferenciado. Seria aquele que

a desviar-se da sua missão. As

inimitável. Quando dos meus

há uma tendência dentro do

normas a Deus: “Pode arriscar

olharíamos e, diante de quem,

tentações eram conduzidas para

estudos de Filosofia, o profes-

cristianismo em olhar o Jesus

que Deus cuida!”. As três tenta-

só nos restaria a sensação de

que assumisse o messianismo

sor que abordava Platão dizia

glorioso em detrimento do Je-

ções mostram a possibilidade da

alguém inalcançável. Jesus é,

real, fosse o novo rei. E porque

que, para este, uma das maiores

sus que passa pela cruz. Muitas

perversão da missão do Senhor.

para os cristãos, verdadeiro Deus

Jesus não se deixou levar por essa

capacidades humanas era a da

tendências da explicitação da fé

Na parte final do texto Lucas

e verdadeiro Homem. Pela sua

contaminação ele não foi aceito. A

admiração. Esta envolvia o im-

cristã fixam seu olhar na Glória

escreve que o diabo se afastou

encarnação tornou possível a

coroação de sua missão redentora

pulso para seguir o admirado. E,

e não na Paixão. Sem perceber

“para voltar no tempo oportuno”.

todos seguir suas palavras, suas

foi a Ressurreição. Mas ele quis

indo mais a fundo, admirando

que ambas se iluminam, não se

O Evangelho quer nos recordar

atitudes. Aderir à sua pessoa é

ir até o fim, até a entrega de sua

o Belo, a Perfeição o Humano

excluem e são necessárias entre

que o caminho feito por Jesus é

fundamental para a plena rea-

vida, para mostrar que o emba-

tendia para ele. Santo Agostinho,

si. Reflito isto à luz do texto do

caminho possível para nós. Se

lização do projeto divino sobre

te contra o Mal traz provações

fortemente influenciado pelo

Evangelho de Lucas (4,1-13)

admiramos sua vitória sobre o

todos nós: a participação à vida

e cruzes. Que nunca serão fim

platonismo, assumirá esta ideia

proposto no primeiro domingo

diabo é para ter claro que nós

de Deus na plenitude da filiação

em si mesmas. Mas serão

para mostrar que a realização

da quaresma, esse tempo sim-

também poderemos vencê-lo. Se

divina. Convém ainda lembrar

vencidas pela Páscoa!

do ser humano só é completa

bólico que deseja despertar a

ficássemos na admiração pelas

que Jesus não foi tentado uma

As opiniões emitidas em colunas e artigos são de responsabilidade dos autores e não, necessariamente, da direção deste orgão. As colunas: Casa & Reforma, Teen, Informática, Antenado e Comportamento são em parceria com a FOLHA PRESS Esta publicação é encartada no Bragança Jornal Diário às Sextas-Feiras e não pode ser vendida separadamente. Impresso nas gráficas do Bragança Jornal Diário.


Reflexão e Práxis

3

Jornal do Meio 837 Sexta 26 • Fevereiro • 2016

PALAVRAS CRUZADAS DIRETAS

www.coquetel.com.br

O mosquito e a

saúde pública

Livro de anotações oficiais Apresentadora gaúcha de eventos da Fifa Extremamente notável Sucesso de Beyoncé Item configurável no Facebook

© Revistas COQUETEL

"Metade", em (?) Jerusalém, "semianalfabeto" cidade- Substância produzida cenário em excesso na gripe

Vasco da (?): o Time da Virada (fut.)

Reto, agudo e obtuso (Geom.)

Lama, em inglês Exemplifica

Tapeados; enganados Unidade policial montada em ocasiões especiais

por pedro marcelo galasso Ivan Lessa, jornalista e cronista

Letra do símbolo do euro Louco Urânio (?), material atômico

"Cada um (?) o trigo alheio por seu alqueire" (dito) "Casa", em "ecologia"

Letra do medicamento genérico

(?) Fernandes, ministro do STJ Pão de (?): bolo Cosmético dos cílios Passado Líquido fixador de perfumes

Parte de PCs que exibe vídeos

Desenvolve a internet espacial (sigla) Tribunal Superior do Trabalho (sigla) Novamente, em inglês

(?) del Río, viúva de José Saramago "A Vida de (?)", filme vencedor do Oscar

Reduz A França antiga a pó Forma profissionais do comércio (sigla)

Sintoma da ressaca em alcoólatras

Baralho (?) Araújo, consultado atriz de pela "Geração cigana Brasil" Tronco de árvore cortado na transversal

Utiliza; emprega Festa para comemorar a formatura Naipe simbolizado pelo coração País-sede da Copa do Mundo de 2010

BANCO

Tortura (?) Mais, grupo político

(?)-8: o motor com oito cilindros Animal comum na culinária japonesa

48

Solução S E N A C

S O M E N U M A C I D E N O G M U EC ID O L O N S O T S C A R G A I A I U N C E S P A D O

G I A L M U D A D E I L E D E O G A S A T C P I L I A L M T AR O A V I X E S U L

Marcelo Galasso - cientista político, professor e escritor. E-mail: p.m.galasso@gmail.com

R F E N E G O P R I V I N S A A T E N R IQ I D O A R A L M I I O M A M N E B A I L T C O P A F R I

habitual que a população tenha ações parecidas com as do Estado, ou seja, a população se mobiliza tão tardiamente quanto o Estado. As inspeções domiciliares devem ocorrer ao longo de todo o ano e em todos os bairros, dos mais carentes aos mais privilegiados, pois a ideia, equivocada e perigosa, de que os focos do mosquito se encontram nas regiões mais carentes é falsa e discriminatória já que responsabiliza estas áreas como as principais responsáveis pelos criadouros do mosquito. Curioso é ler que o Estado tem um programa especial de combate ao mosquito Aedes composto por dez ações complementares – vigilância epidemiológica, combate ao vetor, assistência aos pacientes, integração com a ação básica, ações de saneamento ambiental, ações integradas de educação em saúde, comunicação e mobilização, capacitação de recursos humanos, legislação de apoio ao programa, acompanhamento e avaliação. Isto posto, fica a frequente pergunta – se o Estado tem este extenso programa de ações, que parecem indicar o conhecimento do problema, além de apresentar um programa de ações, por que assistimos o mesmo surto todos os anos? Alguns dirão – este problema toma toda a América do Sul e nossos vizinhos sofrem com o mesmo problema. Sim, mas esta colocação não diminui em nada a irresponsabilidade e a ineficiência do Estado brasileiro. E para tornar a situação mais desesperadora a falta de informações corretas a relação aviltada entre o zika e a microcefalia mostra uma face triste de algo que poderia ser minimizado.

2/og. 3/mud. 4/cepo — nasa. 5/again — gália — pilar. 8/almíscar.

Assistimos uma série quase infinita de casos que mostram de forma recorrente o descaso e a falta de planejamento nas ações da saúde pública, tanto no que diz respeito a falta de infra-estrutura, ao desperdício e desvio de recursos ou os profissionais que não cumprem seus horários e, portanto, não atendem a população que demanda por seus serviços até os recentes e notórios casos de transmissão de doenças pelo mosquito Aedes. Por mais estranho que pareça, estas práticas reforçam o caráter irresponsável e imediatista do Estado no que diz respeito a transmissão de doenças pelos mosquitos do gênero Aedes já que nos últimos anos os surtos são repetidos e só há a consideração da questão nos períodos de maior proliferação dos mosquitos, vetores de doenças como a dengue, chicungunha e zika. A reflexão aqui pode ser a seguinte – se a persistência destas doenças tem relação com o ciclo homem – aedes aegypti – homem, por que as ações preventivas não ocorrem antes do período dos meses mais quentes? Não seria melhor e mais apropriado começar as ações preventivas antes deste período? As ações preventivas não são mais eficientes e as únicas viáveis para o controle do mosquito e da provável transmissão de doenças? Não haveria uma economia do dinheiro público com estas ações? E aqui se tornam explícitas as ações imediatistas e irresponsáveis do Estado que conta com a sorte para evitar questões de saúde pública já anunciadas e que deveriam ser vistas com mais atenção. Cabe ao Estado promover ações de combate ao mosquito antes do surto da doença se tornar uma epidemia. Cabe ao Estado oferecer elementos para que a população tenha a consciência da gravidade da situação, pois é

Ofertas da Semana Apto Ed. Clipper - Reformado ( Praça Central) 3dorm, 3WC, Sala Jantar e Estar, Cozinha Planejada, 1 vaga

R$ 530 mil

Terreno Terras de Santa Cruz 600m2 Plano

R$ 120 mil

Apto Piazza de Ravena Rico em moveis planejados Aceito 50% em imóveis

Consulte-nos


4

Jornal do Meio 837 Sexta 26 • Fevereiro • 2016

por Shel Almeida

Em outubro de 2014 o Jornal do Meio

da atividades do Casulo desde o começo,

contou a história de Rita Leme, que

além de frequentar a APAE e fazer Eco-

há mais de 25 anos dedica a vida

terapia. O maior medo que sente é que

às crianças especiais. Na ocasião ela havia

ela ou o marido, Rodrigo Aparecido Rosa,

recebido a medalha Zilda Arns de Honra ao

venham a faltar. Por isso, o casal cria os

Mérito, graças ao trabalho dentro da APAE.

filhos para que ajudem a irmã. “O que nós

O reconhecimento é oferecido pela Câmara

procuramos fazer é tratar ela da mesma

Municipal de Bragança Paulista às cidadãs

forma que os irmãos. E eles aprenderam,

que desenvolvem trabalhos nas áreas de

desde cedo, ajudar nos cuidados com ela.

saúde, educação e assistência social.

Participar das atividades aqui no Casulo

Naquele momento, Rita falava sobre o

tem sido muito bom. Além de tudo o que a

sonho de criar um abrigo para receber

Rita faz, porque eu não conheço ninguém

crianças especiais. “O projeto é a criação

que seja como ela, que faça o que ela faz,

de um lar que receba crianças, jovens e

ainda temos aprendido muito sobre direi-

idosos com necessidades especiais, que

tos, sobre lei. Porque, ou a gente luta pelos

não têm mais família, que são órfãos ou

nossos filhos, ou eles não terão nada”, fala.

que foram rejeitados, enfim, que estejam

Roselina de Fátima Dorta é mãe de Jor-

em situação de vulnerabilidade. A criança

dana, de 25 anos, diagnosticada com en-

não adotada que vive em abrigo, quando

cefalite. A filha também estuda na APAE

atinge a idade adulta passa a se virar so-

e trabalha dentro da instituição. Assim

zinha. Não é fácil, Agora imagine se ela é

como Andresa, ela tem dois filhos mais

uma criança especial, que será dependente

novos, de 19 e 13 anos e espera que eles

a vida toda. Essa criança precisa de um lar

cuidem da irmã quando for preciso. “Eu

digno para voltar, ela precisa do seu canto,

penso muito sobre o futuro dela, e, eu sei,

da sua cama, da sua família. No Lar Casulo

que aqui ela sempre vai receber o acolhi-

ela será bem tratada e amada, viverá feliz

mento que precisar. De todos os projetos

e todos ali serão sua família”.

que ela participou, este é o que a deixa

Hoje, pouco mais de um ano depois, o pro-

mais animada, ela fica contanto os dias

jeto adaptou-se e o Centro de Convivência

para vir. A Rita tem um jeito diferente, é

Casulo já é uma realidade que, neste 27 de

amor mesmo pelo que faz, não é apenas

fevereiro, comemora o primeiro aniversário.

um trabalho. O diferencial aqui no Casu-

“O Centro de Convivência Casulo é um local

lo é essa atenção que todos recebem. O

onde jovens e adultos com necessidades espe-

único problema, por enquanto, tem sido

ciais se reúnem para participar de atividades

em relação ao transporte que não é mais

diversas, como artesanato, música, dança,

disponibilizado para ela. Eu sei que tem

relaxamento, passeios. O objetivo é que,

muita gente que não está vindo para as

por meio da convivência social, esses jovens

reuniões por causa disso, porque não têm

possam adquirir autoestima e qualidade de

como chegar. É uma pena que um projeto

vida. Esse é um projeto cuja a perspectiva

como esse ainda nã`o tenha todo o apoio

de futuro é muito grande e de muito valor,

que precisa e merece”, fala.

devido à necessidade e a quantidade de pessoas que precisam desse apoio. Estamos

Apoio

completando um ano de funcionamento, mas

Michele Arante é mãe de Emanuelly Aran-

com muita cautela, dando passos pequenos.

tes de Oliveira, de sete anos. A garota foi

Agora estamos dando início ao processo de

diagnosticada com miastemia grave, uma

legalização e formalização, enquanto isso,

doença neuromuscular, aos nove meses.

graças às doações espontâneas de alguns

Como não recebeu encaminhamento para

solidários, estamos funcionando com muito

um tratamento específico e ainda sua faixa

empenho e trabalho.

etária não é o principal do Casulo, que atende

Continua fazendo parte do nosso sonho

crianças a partir dos 18 anos, ela participa

para o futuro, o projeto de residência in-

das atividades como voluntária, ajudando

clusiva destinada à especiais em situação

as demais crianças do projeto durante as

de risco”, conta.

atividade. “Ela sente prazer de vir aqui, vem

As atividades do Centro de Convivência

porque gosta de ajudar, de participar. Para

Casulo acontecem todos os sábados, a

mim também tem sido muito importante, o

partir das 14h, na Rua da Glória, 135, no

projeto foi um divisor na minha vida, aqui é

bairro do Cruzeiro, ao lado da Igreja de

realmente um lugar muito acolhedor, é uma

Santa Maria. O espaço foi cedido pelo

casa para todo mundo, de fato. Agora eu sinto

Pe. José Roberto mas, como Rita explica,

que acabaram todos os porquês. Vir aqui e

funciona de forma independente e atende

encontrar outras mães me fez muito bem.

crianças de todas as religiões. Atualmente

Uma dá força para a outra e isso é muito

cerca de 30 jovens participam ativamente.

importante.

Acolhimento

Andresa e a filha Evelyn. “temos aprendido muito sobre Direitos, sobre lei. Porque, ou a gente luta pelos nossos filhos, ou não eles não terão nada”

Michelle e Emanuelly. “Agora eu sinto que acabaram todos os porquês. Vir aqui e encontrar outras mães me fez muito bem. Uma dá força para a outra e isso é muito importante”.

Para os jovens o Casulo é uma segunda casa. Para as mães é o lugar onde os filhos são acolhidos, sem distinção.

Olga Picarelli Capazzoli, mãe de Gabriel, de 18, concorda com Michelle. “Para o meu filho,

O Jornal do Meio esteve presente em uma

que tem autismo, essa socialização é muito

das reuniões do Casulo e conversou com

proveitosa. E aqui a maioria já é mais velho,

algumas mães para saber quais são os be-

como ele. O espaço aqui tem a configuração de

nefícios que o projeto trazem a seus filhos. O

uma casa e isso faz com se sintam realmente

que descobrimos é que, além das crianças,

em casa, como uma família, sabem que o

as próprias mães se sentem acolhidas, umas

espaço é deles. O que eles querem é amor e

pelas outras e, principalmente, por Rita.

carinho e aqui eles recebem muito. As mães

Andresa Gomes Silva Lopes é mãe de

participam dando suporte nas atividades,

Evelyn Monique, de 18 anos, além de

mas sempre em uma sala diferente do filho,

Felipe Gabriel de oito anos e Lucca Davi

para que todos interajam. E a troca entre

de dois anos.

as mães também é muito valiosa, todas se

A filha, que têm paralisia cerebral, participa

acolhem”, fala.

A comemoração do primeiro ano do Casulo será em um buffet infantil. Jovens estão ansiosos pelo passeio.


Jornal do Meio 837 Sexta 26 • Fevereiro • 2016

5


6

Antenado

Jornal do Meio 837 Sexta 26 • Fevereiro • 2016

Berlim vira válvula de escape a refugiados Mostra dá ingressos a imigrantes, que se emocionam com trama sobre 2ª Guerra e discordam de retrato de jovem islâmico. Voluntária, que levou 3 sírios para assistir a um filme sobre o hip-hop na Nova Zelândia, temeu as cenas com ‘danças sexy’ por GUILHERME GENESTRETI/FOLHAPRESS

Próximo à Potsdamer Platz, uma das principais praças da capital alemã, onde são exibidos os filmes do Festival de Berlim, uma outra multidão se aglomera. É o LAGeSo, o departamento berlinense de amparo social que, só em 2015, recebeu 80 mil refugiados. Nas tendas do pátio, palco de confrontos com a polícia que puseram em xeque a vocação anfitriã da cidade, dezenas de pessoas falando árabe –as mulheres usando hijab (o véu islâmico que cobre o cabelo)– aguardam para dar entrada no processo para pedir asilo político. Vêm em sua maioria da Síria, do Iraque e do Afeganistão, diz à Folha o porta-voz do órgão, Alexander Busche. Na sexta (19), 200 pessoas haviam passado pela triagem e esperavam residir na capital do país mais rico da Europa. A crise humanitária que se vê nas ruas migrou para dentro dos filmes desta edição da Berlinale: é o tema do favorito ao Urso de Ouro, o contundente documentário “Fuocoammare”, de Gianfranco Rosi, que aborda o assunto sob a perspectiva dos habitantes de Lampedusa, ilha italiana que é rota para os que migram a partir da África. Nas entrevistas coletivas, o ator e produtor George Clooney foi colocado contra a parede para dizer o que tem feito pelos refugiados, o ator Daniel Brühl viu paralelos entre o nazismo e a forma como os governos europeus lidam com o assunto, e o diretor Thomas Vinterberg se disse envergonhado por ser dinamarquês. “Como alemã me sinto responsável por ajudar e proteger aqueles que, assim como meus pais, tiveram de fugir de uma guerra horrível”, diz Nicole Zeisig, relações-públicas na embaixada malaia em Berlim. Ela se voluntariou num programa idealizado pelo festival e aceitou levar três jovens irmãos sírios –Rand, Yamen e Haya– a sessões de cinema. O filme escolhido foi o neozelandês “Born to Dance”, sobre a cena do hip-hop na Nova Zelândia. “Fiquei preocupada com a escolha porque Rand e Haya usam hijab e todas as danças eram muito sexy”, conta ela. Eles gostaram.

fugiu de um conflito para ver um filme sobre a Segunda Guerra.” No final da trama, as duas choraram: “Ela viu semelhanças com a Síria”. A primeira escolha de filme da voluntária Anna Hartmann, 34, foi um “desastre”, conta. A documentarista levou o sírio Kheir, 25, para ver o longa tunisiano “Hedi”, sobre um jovem árabe em conflito com suas tradições. O jovem achou a trama irreal: “Um muçulmano nunca trataria sua mãe desta forma”, disse após uma cena em que o protagonista grita com a progenitora. Ele também ficou incomodado com as cenas de sexo: “Sei que vocês alemães são bem abertos, mas nunca assistiríamos a algo assim”.

Na segunda tentativa, os dois foram ver “Fuocoammare”. Assim como os retratados no documentário, o sírio Kheir também quase morreu na travessia por mar: sua família desembolsou US$ 2.000 por um lugar num barco que virou durante uma tempestade. Eles foram salvos por uma patrulha grega. Anna olhou de soslaio para o sírio quando o barco do filme sacode nas ondas. “Ele estava segurando firme na poltrona. Senti um ligeiro tremor.” Segundo o festival, o programa envolveu 953 pessoas, incluindo voluntários e refugiados. A mostra, que termina neste domingo (21), anunciará os vencedores dos prêmios na noite de sábado (20). Foto: Divulgação

Semelhanças

Para “Alone in Berlin”, drama em competição sobre um casal que desafia o regime nazista, levou Diana, arquiteta oriunda de Damasco. A refugiada de 45 anos chorou na primeira cena, diz Nicole. “Achei que tinha errado em levar alguém que

“Fuocoammare”, documentário de Gianfranco Rosi, sobre ilha que serve de rota a refugiados.


Jornal do Meio 837 Sexta 26 • Fevereiro • 2016

Momento Pet

7

Nossos queridos clientes por Dr. André Alessandri

Comportamento

Suspiros por SUZANA HERCULANO-HOUZEL /FOLHAPRESS

O suspiro surge como uma ‘respiração dupla’, cortesia de alguns milhares de neurônios no bulbo cerebral Momento de tensão: qual é o risco de você parar de respirar se não pensar a respeito? Felizmente, nenhum. Respirar é algo que fazemos sem precisar de monitoração consciente. Não porque respirar seja um reflexo, uma ação que ocorre inevitavelmente em resposta a um estímulo sensorial – embora, quando acontece de o sangue ficar saturado demais com gás carbônico, isso sirva de fato como um sinal que inicia uma inspiração reflexa, o que, embaixo d’água, é o que causa o afogamento. Respirar, em condições normais, é um

ciclo de contrações motoras organizado por um grupo de milhares de neurônios no bulbo cerebral, quase chegando na medula espinhal, chamado Complexo preBötzinger (CpreB). Cada surto de atividade dos neurônios do CpreB causa a contração do diafragma e, assim, uma inspiração. Como os surtos são cíclicos, controlados interna e espontaneamente pela rede formada pelos neurônios do CpreB, a respiração também é cíclica –sem que o resto do cérebro precise pensar a respeito. A respiração, contudo, pode ser modulada por vários fatores. A alteração dela quando se ri, chora, corre, fica tenso ou preso em um ambiente com pouco oxigênio mostra que os neurônios do CpreB são afetados

por fatores cognitivos e fisiológicos. Suspirar é um desses casos. Seja o suspiro “fisiológico” que ocorre algumas vezes por hora em nós, humanos (e que mantém a capacidade respiratória ao inflar alvéolos pulmonares que tendem espontaneamente a colapsar), ou associado a tristeza, expectativa, exaustão, alívio ou simples sugestão, o suspiro é uma “inspiração dupla”. No CpreB, um suspiro surge como um surto duplo de ativação, que faz uma segunda inspiração começar assim que a primeira se completa. Um novo estudo do grupo de Jack Feldman, o descobridor do CpreB, na Universidade da Califórnia em Los Angeles, acaba de mostrar que suspiros são iniciados pelo CpreB sob a ação de dois variantes

do neuropeptídeo bombesina, vindos de duas estruturas vizinhas. Talvez uma dessas estruturas funcione como mediadora dos suspiros emocionais e a outra, dos suspiros fisiológicos. Mais pesquisa dirá. Enquanto isso, fica a garantia de que respirar, ou suspirar quando necessário, continuará acontecendo sem que você precise se preocupar com isso – cortesia de alguns milhares de neurônios no seu CpreB. SUZANA HERCULANO-HOUZEL é neurocientista, professora da UFRJ, autora do livro “Fique de Bem com seu Cérebro” (ed. Sextante) suzanahh@gmail.com


8

Jornal do Meio 837 Sexta 26 • Fevereiro • 2016


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.