Braganรงa Paulista
Sexta
9 Setembro 2016
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jornal do meio
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Para pensar
Jornal do Meio 865 Sexta 9 • Setembro • 2016
Expediente
A flauta e a lua por LEONARDO GANDOLFI / FOLHAPRESS
É curioso saber que um dos livros de poesia mais vendidos nos Estados Unidos, nos últimos anos, seja o de um poeta místico nascido há mais de 800 anos onde fica hoje o Afeganistão. No Brasil, acaba de ser publicado “A Flauta e a Lua: Poemas de Rûmî”, livro organizado por Marco Lucchesi que é também o tradutor dos textos juntamente com Luciana Persice e Rafî Moussavî. Na verdade, trata-se de duas antologias de Rûmî que se encontravam esgotadas e que agora estão reunidas em um volume único. As traduções dos poemas foram preparadas ora a partir das versões em francês, italiano, alemão, inglês, ora a partir diretamente do texto em persa. Em ambos os conjuntos, os tradutores adaptaram
os versos a ritmos tradicionais em português –como o decassílabo e a redondilha maior– na busca de instantes musicais mais familiares ao idioma: “Vinde, vinde, o jardim está em flor,/ vinde, vinde, o Amado já chegou!” Octavio Paz estabelece a diferença entre a “palavra poética”, que “não precisa da autoridade divina”, e a “palavra religiosa”, calcada num “mistério que, por definição, nos é alheio”. A obra de Rûmî, como a de outros místicos sufis, não cabe bem nessa distinção, sendo ao mesmo tempo poética e religiosa, ao que parece, sem prejuízo a nenhuma das duas inclinações: “Já me lancei para o fogo,/ como a frágil mariposa,/ igual ao Deus de Abraão. / Não sei mais sair da chama”. UNIDADE
Em Rûmî, erotismo, poesia e misticismo se combinam, sobretudo, a partir de um tópico: o da busca pela unidade com o outro. Há uma entrega tão grande ao que lhe é alheio que podem se tornar indistintas as fronteiras entre amante e amado: “O mundo é apenas Um, venci o Dois./ Sigo a cantar e a buscar sempre o Um.” Por falar em unidade, há uma história singular contada na introdução por Lucchesi e completada, no posfácio, por Leonardo Boff. Antes de criar esses poemas, Rûmî conhece o místico Sams de Tabrîz. Tal diálogo entre “almas” é tão radical que eles se isolam, passando a viver em “comunhão espiritual” e em “conversão mística”. Sams, porém, é assassinado e Rûmî fica “enlouquecido de amor”. É a partir daí que
o mestre sufi compõe esses poemas e introduz a dança dos dervixes como forma de alcançar o “Amado”, personagem desdobrado em figura divina. Nessa via, o erotismo místico coloca os versos de Rûmî sob o signo do êxtase: “Sou livre quando estou fora de mim”, diz ele. E tal experiência não indica necessariamente descontrole, mas, sim, desprendimento e mudança. Isso aparece na fluidez das imagens que –nos melhores momentos da tradução– também é fluidez de ritmo: “Os corvos fugiram. Ah! Vem, luz dos meus olhos,/ vamos sair de nós, como o lírio e a rosa,/ como água límpida, passando entre jardins.” Por fim, vale questionar o tratamento gráfico dado aos poemas. O livro usa certa fonte cujas letras
Jornal do Meio Rua Santa Clara, 730 Centro - Bragança Pta. Tel/Fax: (11) 4032-3919 E-mail: jornal@jornaldomeio.com.br Diretor Responsável: Carlos Henrique Picarelli Jornalista Responsável: Carlos Henrique Picarelli (MTB: 61.321/SP)
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têm um tipo adornado de itálico. Isso se torna um incômodo, pois esse itálico foi aplicado integralmente nos poemas. Tamanha poluição gráfica parece ser incompatível com a despojada poesia de Rûmî. A FLAUTA E A LUA AUTOR Rûmî ORGANIZAÇÃO Marco Lucchesi TRADUÇÃO Marco Lucchesi, Luciana Persice e Rafî Moussavî EDITORA Bazar do Tempo QUANTO: R$ 49,90 (208 págs.)
Reflexão e Práxis
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PALAVRAS CRUZADAS DIRETAS
www.coquetel.com.br
(?) Barcellos, jornalista investigativo
Cuidar, em inglês Informação do relógio Cidade da Síria Príncipe de Troia (Mit.)
Época; era (?) mágicos: elfo, duende e fada Daniella Sarahyba, modelo carioca Reação natural à barata
É interpretado na terapia O Universo
Eleazar de Carvalho, compositor e regente
Recipiente de frutas e verduras na feira
O corpo típico do Homo sapiens Tira; faixa Sentido usado no braile
Glândula situada no centro do peito Irmãos do pai Propagam o som
Estrutura como o "pau de selfie" Recurso estilístico do refrão musical
Cortar relações (com alguém) Vereador
Astro de clássico de Hector Babenco
A estrela do casamento Fração da unidade Leite ordenhado Item do jogo de RPG
O antigo cônjuge (pop.) (?) Lins, cantor de "Lembra de Mim"
A protagonista do processo penal
(?) negra: matou milhões na Idade Média Efeitos do vazamento do gás de bujão
BANCO
20
Solução
P A E P C
P A I S E S D O S B R I C S
C A I X O T E A B U T R E S
F T R I R A L M A B E I O D R E S S ON C A O F S T Ã M A O T E O D E I X P L
C I N H O V I A L P L E C E A O C R H O M H O E E R E T I R T A T O I O R O M P N O I A D A V A N O S Õ E
S R D V E
E O A R
V A L O R E S C O N S
Pedro Marcelo Galasso - cientista político, professor e escritor. E-mail: p.m.galasso@gmail.com
E
des apresentadas em um momento tão delicado do país. O que esperar, portanto, do próximo governo? O que nos propõe o PMDB e seus aliados? Como a bancada do PT vai agir? Os partidos políticos irão pensar no Bem Comum e Público ou no parasitismo que os movem? As respostas são claras e aterradoras. Nada será feito pelo Bem Comum e Público. Afinal ruim com a Dilma, tão ruim sem ela. Fato é que uma mudança na direção do governo e na sua proposta de política econômica, tributária e previdenciária já se coloca. A cartilha a ser seguida nos remete a planos similares aplicados em outros países e todos com o mesmo triste fim. Sob a égide de salvação da coisa pública serão decretados os perniciosos ajustes que, nada mais são, que os termos técnicos para o corte de ações do Estado e do governo federal, como o congelamento dos investimentos públicos por 20 anos. Na prática, uma tentativa de impor, a todos nós, um processo acelerado de venda do patrimônio público, comumente chamada de privatização. A proposta de redução da atuação do Estado nas áreas sociais é a base que sustenta o novo prédio econômico do governo Michel Temer. A crença da melhora e a culpabilização de um partido político, transformado em bode expiatório de uma estrutura política corrupta, nunca foi levada tão longe. O preço a ser pago? Alto. Chances de melhora? Não, somente a crença sem razão e sem sentido. O fim dos problemas brasileiros, como num passe de mágica? Não. Enfim, citando Franz Kafka – “Somente em nome dos desesperançados nos é dada a esperança”.
(?) Arantes do Nascimento: o Pelé
(?) France, companhia de aviação
2/il. 3/air. 4/care — edil — homs. 6/heitor — pixote. 14/países dos brics.
Para quem viveu o impeachment do ex-presidente Fernando Collor e acompanhou seus desdobramentos, as lembranças do peso e do desgaste de um processo tão penoso e incerto devem ser claras. Inúmeros fatos nos trouxeram a um novo processo, alguns tristemente esperados, outros inesperados, mas, de uma maneira geral, havia a possibilidade de que algo deste tipo acontecesse e para tanto bastava pensar o quanto o PT teve que trair seus valores históricos para eleger, primeiro, Lula e, depois, a presidente Dilma Rousseff. Ao aceitar e tomar o caminho da vitória a qualquer preço, a ex-presidente fez alianças incoerentes com antigos inimigos, termo triste e preciso, do seu partido de origem. Ao tomar o caminho da vitória a qualquer preço, a ex-presidente selou seu destino e perdeu seu cargo político. Uma questão que se apresenta a todo instante é a seguinte – o processo foi legítimo ou foi legal? Para qual não há resposta fácil. Há na decisão tomada pelos nossos nobres senadores, a grade maioria indiciada e processada por crimes parecidos com os que foram citados nos processos contra a ex-presidente Dilma, política ou politicagem? Há alguma relação com o maior chantagista da nossa República, o nobre Eduardo Cunha? Há como um cidadão comum, pessoa que trabalha ou que não se importa com a vida pública, ter um parecer sobre a questão ou ele, como todos nós, é vítima da confusão jurídica e burocrática que envolveu todo o processo? Está confusão é proposital ou não; os tramites burocráticos são ilógicos ou desconhecidos? Não sabemos, pois a mídia que deveria nos informar de forma isenta e clara, se deixou levar pelo sabor e parcialidade das discussões, escolheu lados, nos iludiu, nos entorpeceu. Para tanto, bastava ligar a TV nos canais abertos e ver as futilida-
Curral de ovelhas Saudação telefônica Fundar; instituir
por pedro marcelo galasso
© Revistas COQUETEL
(?) de Ouro, premiação tida como São defendidos pela o "Oscar" dos piores filmes do ano bancada religiosa no parlamento Ele, em Barco de Dificuldade de enxergar de perto (Med.) francês remo
Brasil, Rús- Grandes aves que se sia, Índia, alimentam Taxa refeChina e Á- de animais rencial (sigla) frica do Sul mortos
P
Impeachment
Menina mimada e fútil que vive na moda João (?) de Melo Neto, poeta recifense
Casas em Condomínio
Jd. das Palmeiras..................................................................................................................R$ 650 mil Florestas de São Vicente (nova)..............................................................................................R$ 580 mil Euroville (nova).....................................................................................................................R$ 950 mil Portal de Bragança (nova)................................................................................................R$ 1.3 milhões Village Santa Helena....................................................................................................R$ 1.490 milhões Portal Bragança Horizonte (nova)..........................................................................................R$ 770 mil Villa Real (nova)....................................................................................................................R$ 900 mil Rosário de Fátima ( Ac imóvel – valor)............................................................................R$ consulte-nos
Terrenos em Condomínio
Villa Real 428m²...................................................................................................................R$ 160 mil Colinas de São Francisco 616m²............................................................(parcelamos em 10x) R$ 300 mil Terras de Santa Cruz 600m²...................................................................................................R$ 120 mil Portal Bragança Horizonte 341m²..........................................................................................R$ 200 mil Jd. Nova Bragança 300 m².....................................................................................................R$ 200 mil
Apartamentos
Ed. Piazza de Siena................................................................................................................ R$ 950 mil Apto. Jardim do Lago............................................................................................................. R$ 300 mil Apto. Centro (novo)................................................................................................................R$ 255 mil Apto. Jd nova Bragança ( Alto Padrão 230m² 3vagas)...................................................... R$ Consulte-nos Apto. Ed. Clipper (Centro) Reformado 3dorm. 1gar....................................................................R$ 450mil
Diversos
Casa Jd. Europa.....................................................................................................................R$ 530 mil Terreno Jd do Lago Comercial 600m² com terra planagem feita............................................. R$ 580 mil Imóvel Comercial AV. Norte-Sul.............................................................................................R$ 630 mil
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por REINALDO JOSÉ LOPES/FOLHAPRESS
Na era dos aplicativos de paquera e dos
(com idade média de 27 anos), entrevistados
Marco Antonio Varella.
anticoncepcionais, será que a seleção
em 2014, com os de um grupo de 630 brasileiros
O casal e seus colegas obtiveram dados de
natural ainda afeta a maneira como as
e brasileiras (idade média: 22 anos) ouvidas
1.709 pessoas, de ambos os sexos e de dife-
pessoas escolhem seus parceiros? Ao menos em
em 1984. Os 30 anos que separam um grupo
rentes orientações sexuais. Os participantes
parte sim, revelam dois estudos assinados por
do outro ajudam a inferir possíveis mudanças
viam diagramas mostrando possíveis alturas
pesquisadores brasileiros –embora mudanças
culturais no período.
relativas (suas e de seus parceiros) e tinham
culturais recentes também sejam capazes de
Uma coisa não mudou: homens ainda preferem
de indicar as que preferiam e as que tinham
afetar preferências românticas.
moças mais jovens, enquanto garotas ainda
em seus relacionamentos atuais.
Um dos trabalhos mostrou que os homens
ficam de olho em rapazes mais velhos. “A pres-
No caso dos heterossexuais, tanto as prefe-
ainda dão mais importância à aparência física
são ‘evolucionista’ é a mesma para ambos os
rências quanto os parceiros reais mostraram
quando buscam uma namorada, enquanto as
sexos: procriar da maneira mais bem-sucedida
um padrão claro: cerca de 80% dos homens
mulheres tendem a preferir sujeitos com me-
possível”, resume Souza.
estavam com mulheres mais baixas, enquanto
lhores perspectivas financeiras –uma assimetria
Por outro lado, nos anos 1980, em média, ambos
cerca de 90% das mulheres se relacionavam
já prevista pelas abordagens evolucionistas do
os sexos viam a intenção de ter filhos como
com homens mais altos. O tamanho maior ti-
comportamento humano. O outro levantamento,
algo quase indispensável. Três décadas depois,
nha uma correlação considerável com o papel
por sua vez, indica que a diferença tradicional
porém, a tendência mudou –o que indica que
dominante do membro do casal –quanto mais
de tamanho entre os sexos ainda é a regra.
as motivações ligadas à seleção natural não
alto em relação ao parceiro, mais ele tendia a
Se os resultados parecem estereótipos do
“controlam a mente” das pessoas, mas apenas
estar no controle da relação.
relacionamento entre homens e mulheres, é
as influenciam de maneira sutil e inconsciente.
No caso de casais de gays e lésbicas, a proporção
importante lembrar que, no caso do primeiro
Pode-se dizer que o segundo estudo é, ele
de quem tinha um parceiro do mesmo tamanho
estudo, os pesquisadores também verificaram
próprio, fruto de uma escolha de parceiros.
ou menor era significativamente maior –mas, de
que ambos os sexos dão muito menos peso à
Dois de seus autores são a tcheca Jaroslava
novo, quanto maior a dominância do parceiro,
virgindade do possível parceiro ou à sua vontade
Varella Valentova, hoje professora do Instituto
em geral, maior seu tamanho relativo.
de ter filhos, diferentemente do que acontecia
de Psicologia da USP, e seu marido, o brasileiro
30 anos atrás. Já o segundo trabalho também avaliou casais homossexuais, verificando que, entre eles, a diferença de tamanho só é importante quando um dos membros do casal domina o relacionamento –por exemplo, quem toma decisões pelo casal, seja a posição sexual ou se o programa da noite vai ser cinema ou Netflix. “Os dados, de certa forma, reforçam estereótipos, mas não necessariamente os justificam”, diz André Souza, brasileiro que trabalha na Universidade do Alabama e é autor de um dos estudos. “Entender as forças que motivam nossos comportamentos deve ser o primeiro passo na tentativa de mudar ou influenciá-los.”
Darwin explica? Ambos os trabalhos adotam os pressupostos da chamada psicologia evolucionista, um ramo de pesquisa que busca usar a teoria da evolução como ferramenta para compreender a mente humana. Assim como todos os outros animais, a espécie humana foi forjada pela seleção natural, num processo que favoreceu os indivíduos com maior capacidade de sobreviver e se reproduzir. E não há nada mais crucial para a reprodução de espécies sexuadas (como a nossa) do que a escolha de parceiros. Ou seja, faz sentido esperar que esse “pedaço” do comportamento humano seja especialmente influenciado pelas pressões da seleção natural. Souza e colegas da Universidade do Texas em Austin, decidiram comparar as preferências de parceiros de 1.186 homens e mulheres do Brasil
Foto: Divulgação
saúde
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Zika
Descoberta da Zika provocou mágoa entre pesquisadores, livro conta a história da doença no país por meio de relatos de mães, médicos e cientistas brasileiros. Autora afirma que pesquisadores da parte sul do país assumiram o papel de ‘porta-vozes’ do conhecimento por CLÁUDIA COLLUCCI/FOLHAPRESS
As descobertas científicas nunca são solitárias. Fazem parte de um amplo jogo de quebra-cabeças em que vários pesquisadores concorrem simultaneamente. Essa regra é recorrente na história da ciência e com a descoberta do vírus da zika no Brasil não foi diferente. Houve muita solidariedade entre os cientistas brasileiros, mas sobraram desavenças. É o que mostra a antropóloga Debora Diniz, professora de bioética da Universidade de Brasília, em seu instigante livro “Zika, do sertão nordestino à ameaça global” (Editora Civilização Brasileira), que será lançado na quarta (31), em Brasília. A primeira “biografia” da zika no Brasil conta a saga da descoberta do vírus e a relação com a microcefalia a partir de relatos de pessoas do front da tragédia: pesquisadores, médicos e mulheres nordestinas infectadas pelo vírus cujos bebês tiveram danos cerebrais. Debora também não abriu mão do método científico: fez uma revisão da literatura acadêmica, 31 entrevistas e participou de dezenas de reuniões nacionais e internacionais de saúde pública e bioética sobre a epidemia do zika. A autora, que foi infectada pelo vírus durante a pesquisa do seu trabalho anterior, o documentário “Zika”, transporta o leitor para dezembro de 2014, quando uma doença misteriosa começou a circular no sertão nordestino. Os pacientes a definiam como uma “alergia medonha”. Os sintomas eram febre baixa, coceira e vermelhidão pelo corpo, que sumiam em poucos dias. Médicos começaram a compartilhar imagens e queixas dos pacientes. Nas fotos, manchas vermelhas apareciam em pedaços de pernas, solas dos pés, bochechas. Resultados de exames de sangue eram inconclusivos. Poucos acusavam dengue, mas os sintomas não batiam. Em meio a bíblias da medicina tropical e da infectologia, o zika passou despercebido. Até que, em 13 de março, Kléber Luz, médico de Natal (RN) escreveu a um colega: “Veja a descrição do vírus da zika, acho que é ele”. Enquanto o grupo esperava resultados de testes mais específicos, feitos na Fiocruz do Paraná, outros pesquisadores, da Bahia, anunciavam a descoberta do vírus, em 29 de abril, em entrevista à imprensa em Salvador. Ao mesmo tempo que houve reconhecimento na primazia da descoberta, sobrou dor de cabeça ao grupo baiano. Foi submetido a sabatinas, as amostras de sangue foram remetidas a uma segunda investigação, além da acusação de importação ilegal do material usado na pesquisa.
com microcefalia e calcificações cerebrais. Querendo dar uma resposta às pacientes, a médica Adriana Melo decidiu, com a autorização das gestantes Géssica e Conceição, extrair o líquido amniótico e investigar a presença do zika. O material foi enviado para análise na Fiocruz do Rio de Janeiro. Em 16 de novembro houve a confirmação de que o zika havia sido identificado no líquido amniótico. Na mesma noite, Adriana deu pistas da pesquisa a um programa de TV da Paraíba. Em 18 de novembro, a Fiocruz se pronunciou oficialmente, porém, não fez referência alguma à médica. O anúncio do Ministério da Saúde confirmando a relação entre o zika e os casos de microcefalia viria dez dias depois, com exames feitos pelo Instituto Evandro Chagas, em Belém (PA), a partir de bebê nascido no Ceará e que morreu logo depois do parto. Para Debora, houve um jeito brasileiro de fazer ciência e anunciar descobertas. “Os resultados foram primeiro divulgados na imprensa antes de serem publicados pela comunicação científica. Médicos de beira de leito e cientistas nordestinos foram os que desbravaram a epidemia, tinham urgência em falar, em serem reconhecidos, mas queriam se proteger.” A autora diz que, ao mesmo tempo que os nordestinos protagonizaram da descoberta do zika à hipótese da transmissão vertical, foram as autoridades tradicionais da ciência brasileira, da parte sul do país, que assumiram os postos “de porta-vozes do conhecimento” nas publicações internacionais. “Essa estratificação social da ciência não teve surpresa, pois não se subvertem padrões de distribuição desigual de recursos com um único conhecimento.” No lançamento, haverá um bate-papo
com o casal Maria Carolina Flor e Joselito Alves, pais de Maria Gabriela, cuja história aparece no livro. A família vive em Esperança (PB) e alimenta um blog sobre o dia a dia da filha e compartilha outras notícias sobre casos de microcefalia e zika. Zika - Do sertão nordestino à ameaça global Autora Debora Diniz Editora Civilização Brasileira Preço R$ 29,90 (192 págs.)
1º bebê com vírus da zika
Italiana é a mãe de 1º bebê com vírus da zika no cérebro Debora Diniz revelou a identidade da “mulher eslovena” cujo bebê, morto na 32ª semana de gestação, entrou para a história da medicina como o primeiro a ter identificado o material genético do vírus zika no cérebro. O caso foi publicado na revista “The New England Journal of Medicine”, em fevereiro de 2016. Na realidade, Sofia Tezza é uma italiana de 25 anos que casou com um brasileiro. Contudo, o casamento acabou e ela voltou para a Itália aos seis meses de gestação, três meses depois de ter sido infectada pelo zika em Natal (RN), onde morava. No Brasil, os ultrassons do feto pareciam normais. Na Itália, porém, ouviu de vários médicos que o cérebro do bebê estava comprometido e que o filho seria “um vegetal”. A suspeita era de que um vírus havia causado a má-formação, mas ninguém ainda a relacionava com o vírus da zika. Sofia passou então a investigar por conta própria a relação entre o vírus que assolava o Nordeste e a má-formação de Pietro, o seu bebê.
A italiana chegou a enviar uma mensagem com a questão a um médico brasileiro em setembro de 2015, dois meses antes de o Ministério da Saúde confirmar a relação. À autora, Sofia sustenta que Pietro morreu no útero. O artigo científico, porém, informa que, por causa da doença severa no cérebro e da microcefalia, a mãe solicitou que a gravidez fosse interrompida, o que ocorreu em um hospital na Eslovênia. “Foi o único lugar onde fui tratada como ser humano, e meu bebê também. Lá eles organizaram uma celebração junto com outros bebês que voaram para o céu porque os bebês têm que ficar juntos.” paciente zero O paciente número zero afetado pelo vírus da zika no primeiro mês de gestação é gêmeo com outro menino, que aparentemente não foi afetado. A família mora no município de Custódia (340 km de Recife). Ele foi nomeado paciente zero pela neurologista pernambucana Vanessa Van der Linden não por ser o primeiro afetado pelo zika, mas por despertar a medicina para a tragédia em curso. O pai, Paulo, é professor de geografia e comerciante. Ele não quer saber de lamúria sobre o filho e se recusa a expor a família na imprensa. Ele insiste numa pergunta: “Por que estamos isolados? Só em Custódia, há crianças com microcefalia meses mais velhas que meu filho”, indaga na obra de Debora Diniz. Os gêmeos completaram um ano em julho. O isolamento não é geográfico. A família sabe por que o filho foi o paciente zero. Porque faz parte do topo da estratificação social. Tem acesso a médicos e serviços privados de saúde, possui carro próprio, viaja 160 km várias vezes na semana para que o filho receba estímulo em um centro especializado no município vizinho. Foto: Ricardo Borges/Folhapress
Microcefalia
Houve mágoas também no capítulo seguinte da epidemia, os primeiros casos de microcefalia. Era setembro de 2015, quando neurologistas e obstetras de Pernambuco e da Paraíba começaram a perceber um aumento de casos de bebês
Joselito, Maria e Maria Gabriela, que tem microcefalia
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Saúde
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Baixas temperaturas Baixas temperaturas podem levar ao aumento da pressão, com o frio, sangue tem mais dificuldade de passar pelos vasos do corpo porque eles se contraem mais
por FOLHAPRESS
Quem tem pressão alta deve ficar
derrame, um AVC ou infarto”, diz o médico.
mais atento no inverno. Com o frio,
O bom é que a doença pode ser controlada.
os vasos sanguíneos ficam mais
A maior parte dos pacientes toma remédio
contraídos, dificultando a passagem do
a vida toda e mantém uma rotina saudável.
sangue. Além disso, em dias com maior
“Ingerir menos sal, fazer atividade física
variação de temperatura, o corpo não tem
regular e perder peso são algumas das
tempo de se adaptar a essas mudanças,
medidas principais”, diz Camiz.
e a pressão pode ir às alturas.
Bortolotto avisa que os remédios nem
“Há uma contração normal dos vasos no
sempre causam impotência sexual.
frio, e eles ficam mais resistentes à passa-
“No começo, quando a pressão normali-
gem do sangue, o que faz a pressão subir”,
za, o corpo entende isso como queda de
explica o cardiologista Luiz Bortolotto,
pressão, então tudo o que funciona bem
da Sociedade Brasileira de Hipertensão.
e em alta pressão não funciona bem mais,
Manter o corpo quente, com agasalhos,
incluindo a parte sexual. Leva um tempo
ajuda, mas a principal dica é ter o trata-
para se adaptar, mas depois tudo fica
mento da doença em dia (veja o quadro
normal”, afirma o médico.
ao lado).
(Gislaine Gutierre)
A pressão alta é uma doença comum, mas
Vasos de idosos são mais rígidos
perigosa. Segundo a Sociedade Brasileira
Para ser alta, a pressão tem de ser igual
de Hipertensão, ela atinge mais da metade
ou maior que 14 por 9, mas, segundo o
da população idosa e é responsável por
clínico- geral e geriatra Paulo Camiz, do
40% dos infartos, 80% dos casos de AVC
Hospital das Clínicas de São Paulo, para
(acidentes vascular cerebral) e 25% dos
idosos acima de 80 anos, esse índice po-
casos de insuficiência renal terminal.
de ser a partir de 15 por 9 -porque essas
O clínico-geral e geriatra Paulo Camiz,
pessoas têm artérias ainda mais rígidas.
do Hospital das Clínicas de São Paulo,
Luiz Bortolotto, cardiologista da Socie-
lembra que a pressão alta é uma doença
dade Brasileira de Hipertensão, diz que a
silenciosa. “A pessoa não sente nada, mas
pressão deve ser medida preventivamente
um dia, de uma hora para outra, tem um
todo ano. (GG)
Arte: Folhapress
Antenado
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CRÍTICA/TELEVISÃO
Sem brilharem, Adnet e Porchat se valem de personalidade de palco. Humor anárquico de comediantes encontra travas das emissoras em ‘game show’ e ‘talk show’ noturnos por NELSON DE SÁ/FOLHAPRESS Foto: Edu Moraes/Divulgação
O programa diário de Fabio Porchat
Porchat, em comédias e “stand-up”, ofusca
e o semanal de Marcelo Adnet, à
quase todos à sua volta, mas ao mesmo
primeira vista, são muito diversos
tempo interage naturalmente com quem
na forma.
quer que seja. Não provoca constrangimento
O de Adnet é mais próximo de um “game
nem quando evidencia divergência política
show”, ainda que escrachado e sem rigor
–o que já fez com Tiririca.
nos supostos jogos. O de Porchat é o “talk
Adnet, não. Ele traz conflito, carregado de
show” noturno conhecido, dos primórdios da
sarcasmo, com quem quer que seja. Seus
TV americana e popularizado no Brasil por
bons momentos, na estreia, foram aqueles
Jô Soares, mas também avacalha a fórmula.
em que deixou o narrador Galvão Bueno
Nas primeiras apresentações, nenhum dos
à vontade, dizendo amá-lo, mas ao mesmo
dois programas foi particularmente feliz.
tempo lembrou a rejeição que o cerca.
Percebe-se um excesso de edição, seja para
Está sufocado pela obsessão da emissora
cobrir os evidentes buracos de roteiro na
com autodivulgação, tornando o “Adnight”
Record, seja para controlar artificialmente
quase um “Vídeo Show” noturno, mas nem
o ritmo de humor e a mensagem na Globo.
assim é comediante fácil. É como se estivesse
Também se nota uma tensão própria de
prestes a ferir alguém com veneno.
estreia, atrapalhando a improvisação, um
Sejam quais forem as diferenças, estão am-
forte de ambos os comediantes no teatro.
bos em cenários inóspitos. Sabe-se a que foi
No caso de Porchat, a tensão já se reduziu
reduzido o humor originalmente anárquico
no segundo dia, quinta (25).
e inteligente de Fausto Silva, por exemplo,
Na verdade, pouco importam os formatos
e o que espera Adnet se a emissora não se
nem sequer as piadas escritas para eles,
dispuser a mudar.
ainda sem maior qualidade neste princípio.
Da mesma maneira, por mais que Porchat
O que define e diferencia os programas é a
defenda o respeito à diversidade sexual, o
personalidade de palco que carregam para
fato é que está no canal de um líder religioso
a televisão.
que se bate pelo direito à homofobia, entre
Como foi possível acompanhar em uma
outras bandeiras.
década de apresentações ao vivo, eles são
NA TV
muito diversos. Porchat tem empatia maior.
PROGRAMA DO PORCHAT
Adnet é mais radical, exagerado.
QUANDO seg. a sex., depois da meia-noite,
Quando é engraçado, Adnet é de derrubar
na Record
da cadeira, mas se adapta com dificuldade
AVALIAÇÃO muito bom **
ao humor inofensivo da TV aberta no Brasil.
NA TV
Não é difícil compreender por que foi trocado
ADNIGHT
por Pedro Bial –que não tem graça, mas é
QUANDO qui., às 23h, na Globo
agradável– na hora de substituir Jô.
AVALIAÇÃO bom *
Fabio Porchat ao lado de Sasha, filha da apresentadora Xuxa, no “Programa do Porchat”. Foto: Estevam Avellar/Globo/Divulgação
Galvão Bueno com Marcelo Adnet na estreia de “Adnight”.
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