Braganรงa Paulista
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Para pensar
Jornal do Meio 910 Sexta 21 • Julho • 2017
Artesanato profissional Vendas pela internet estimulam empreendedores do setor a se formalizar e encarar atividade como negócio
por JUSSARA SOARES/FOLHAPRESS
Apenas 17% dos artesãos no país estão formalizados, aponta pesquisa inédita do Clube de Artesanato, maior comunidade on-line do tipo no Brasil. O levantamento ouviu 3.469 pessoas. Ainda segundo o estudo, 45% dos entrevistados não têm interesse em se registrar. Apesar desse cenário de informalidade, as vendas pela internet estão estimulando artesãos a ver suas habilidades manuais como negócio. Para isso, é preciso ter planejamento, investir em produtos diferenciados e estar disposto a se formalizar. “O artesanato é uma manifestação da indústria criativa que tem sido impulsionada pelas vendas na internet. Os mais jovens já percebem isso e têm buscado empreender na área”, afirma Lucas Ferreira, gestor de marketing da PH FIT, idealizadora do Clube de Artesanato. É o caso de Ju Amora, 31, que em 2012 começou a fazer banquetas pintadas à mão. Hoje, ela chega a vender 220 por mês, em sua loja virtual. Os preços variam entre R$ 138 e R$ 1.400. Para ela, o diferencial foi ter encarado o projeto desde o início como um negócio. “Pensei em um conceito para a minha marca e comecei a vender em
lojas virtuais para o Brasil inteiro. Eu nem me considero uma artesã, me considero empreendedora.” Ela mantém um ateliê em Perdizes, na zona oeste de São Paulo. Para atender a demanda, já terceiriza partes da produção e da logística. A empresária também notou que precisava de um produto novo e exclusivo para que seu cliente percebesse o valor das suas peças. “O que acontece muito no artesanato é a reprodução de fórmulas. Muita gente ainda acha que é terapia ocupacional e por isso é tão difícil ter a valorização”, diz.
Por meio da internet, o Armazém Peter Paiva, especializado em venda de matéria-prima para a fabricação de sabonetes e cosméticos artesanais, cresceu 48% em 2016 e fechou o ano com um faturamento superior a R$ 3 milhões. Atualmente, 60% das vendas são on-line. Além do e-commerce, a empresa tem três lojas físicas, 20 pontos de distribuição e 70 funcionários. O próximo passo é aumentar a capacidade produtiva para chegar aos shoppings. Peter Paiva, fundador da companhia, também dá cursos de capacitação para artesãos.
“Além da capacidade técnica e da importância de desenvolver produtos de qualidade, falo da importância de analisar o mercado e buscar conhecimento para a gestão.” valor do produto Para Haroldo Matsumoto, diretor da Prosphera Educação Corporativa, as maiores dificuldade são enxergar o potencial do negócio e calcular o valor exato do produto. “É muito comum o artesão incluir apenas o custo da matéria-prima e não considerar o tempo gasto para fazer e vender, além de gastos que ficam escondidos, como água, luz
e gás”, diz. O empreendedor precisa, ainda, ter capacidade para atender a demanda, após anunciar em uma vitrine como a internet. Isso sem perder a qualidade e a chancela do produto feito à mão. “Muitos não conseguem ganhar em escala porque querem fazer tudo sozinhos e, portanto, não alcançam rentabilidade. É preciso saber delegar funções, terceirizar o que for possível e se dedicar, por exemplo, ao acabamento”, afirma a consultora do Sebrae São Paulo Beatriz Nicheletto.
Foto: Pedro Ladeira/Folhapres
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As opiniões emitidas em colunas e artigos são de responsabilidade dos autores e não, necessariamente, da direção deste orgão. As colunas: Casa & Reforma, Teen, Informática, Antenado e Comportamento são em parceria com a FOLHA PRESS Esta publicação é encartada no Bragança Jornal Diário às SextasFeiras e não pode ser vendida separadamente. Impresso nas gráficas do
Ju Amora, 31, no seu ateliê, em SP
Bragança Jornal Diário.
Reflexão e Práxis
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PALAVRAS CRUZADAS DIRETAS
www.coquetel.com.br
pregadores e empregados? Quem ganha e quem perde? Nosso empresariado é formado por valores que carregam o peso do passado colonial e escravista e não tem uma visão empreendedora, ou seja, ele não vê a melhora na vida de seus empregados como ganho, mas a vê como perda, como gasto e, por isso, utiliza de todas as formas de exploração do trabalho e cria uma ideologia do favor na qual ele, o empregador, surge como uma figura benevolente que faz o favor de criar empregos para quem aceitar suas condições. Casos de abusos no interior de locais de trabalho são comuns e notórios. Neste ponto, alguém sempre proclama – “Mas a Justiça do Trabalho sempre favorece o empregado”; a resposta é sim, pois a relação é, em sua essência, desigual desde o momento que ela se inicia. Um país de pessoas subservientes e acomodadas, que se iludem com mecanismos de compra e venda, que creem em um futuro quase messiânico, pode apostar em tais mudanças? Um modelo tentado em outros países e que não deu certo, dará certo aqui? Enfim, apesar de todo o cenário caótico e irresponsável que se desenha, ele já tem seu quadro opressivo formado - a necessidade de aceitar quaisquer condições e imposições de trabalho. Ainda assim, a luta contra a opressão via trabalho deve continuar, pois a História é uma construção humana e social, nos dando sempre a possibilidade de mudanças, ainda que que a imensa maioria das pessoas creia que nosso destino social e político já esteja definido. Pedro Marcelo Galasso - cientista político, professor e escritor. E-mail: p.m.galasso@gmail.com
Participar como atleta na maratona
Mira Última letra grega Aranha amazônica que não cria teia Significa "Diadema", no ABCD paulista
Enfiava O ingresso de estudantes Período fértil de fêmeas Molho baiano feito com camarões Correção Bomba do Projeto Manhattan (EUA) Ter como desenlace ou resultado "Vai (?)?", pergunta do cliente ao dentista Pão de (?), ingrediente de sanduíches
Contração da pupila Gás essencial à vida (símbolo) Comum; trivial
"Quem (?)", sucesso dos Los Hermanos
Esticado Em (?) de: aproximadamente
"As Crônicas de (?)", filme
Foco da atenção no estande de tiro
Adoçante natural de remédios caseiros (?) Alves, cantor do "The Voice Brasil"
Intenso (fig.) (?) de rir: gargalha
BANCO
Tuca Andrada, ator de "Babilônia"
Construíram Chichén Itzá, no México
Solução I L E T E S T O R R I A A M I D O O S S AB E N T N A R A L VO R Õ N T E I A S
Todo modo de produção carrega consigo elementos institucionais, ideológicos e econômicos, na medida em que estes são constitutivos e constituintes de cada um deles. Há, ainda, um dado grau de exploração, de ordem e de normas que regulam o universo infindável de questões correlatas a vida social. No entanto, as formações sociais e culturais, bem como os ordenamentos políticos devem prezar pela manutenção da vida das pessoas que mantem e sustentam os modos de produção. O Capitalismo, nosso modo de produção, por definição excludente e pautado na exploração do trabalho alheio, possui todos os elementos acima, dentre vários outros, mas tem um caráter perverso específico constrói sonhos, cria vislumbres de possibilidades e de liberdades e se utiliza disso para aumentar seu grau de exploração, fato que parece difícil de ser negado, algo que vai tão longe que o faz vender a própria ideia de sua superação. Talvez seja lícito dizer que isto é possível já que o Capitalismo descobriu uma forma de opressão que é quase impossível de superar - a necessidade de se manter no sistema a qualquer preço e custo. Esta característica cotidiana aumenta o grau de opressão e impor uma subserviência quase absoluta. O que ocorreu ontem, no Brasil, sem discussão aprofundada sobre a forma histórica de nosso Estado, os problemas urgentes de nossa população mais carente, sem as considerações nossos infindáveis e inumeráveis problemas estruturais, é resultado de um processo de opressão econômica e política que foi construído ao longo de toda a nossa História. Quem, nesta lógica, é favorecido? Quem se beneficia nas negociações entre em-
Fenômenos que acompanham tempestades
A
por pedro marcelo galasso
Lavrador Artista como Peninha
M I A M P O N P O S I O N T A R E R T I A A C I N I T E S O E R M I R O M A S E T R A L A M
(Parte 1)
Opção do eremita, quanto Cavalo ao estilo de vida pequeno
T R A L C A C O M P C O R M E M E I O G A A T D O F O R P E N R O
a corrupção como meio
Que não sabem ler nem escrever (?) plana, atrativo das TVs modernas
Prática exagerada no TOC
5/maias — mania — miose. 6/errata — nárnia. 8/lampreia — terminar. 10/ostracismo — penetrante.
A Mentira como regra,
© Revistas COQUETEL
Bastão do jogo Comunide sinuca cado (?): Peixe que possui o é deixado formato de enguia no mural de empresas
Lance prolongado, no vôlei
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Jornal do Meio 910 Sexta 21 • Julho • 2017
por Shel Almeida
No próximo dia 29 de julho, das 12h as 16h, acontece o 3º Churras Bode, um almoço com churrasco que tem a intenção de angariar fundos em prol de uma instituição e acontece anualmente no Posto de Monta. Organizado por um grupo de amigos, a ação deste ano reverterá os fundos do evento em Prol da Associação São Lucas, entidade que atende pessoas com necessidades especiais. De acordo com os organizadores, a ideia surgiu depois de se unirem para arrecadar recursos para a cirurgia de uma pessoa conhecida. Como a ação deu certo, se sentiram motivados a fazer disso uma meta e assim surgiu o Churras Bode. No ano seguinte conseguiram criar um banco de cadeiras de rodas, cadeiras de banho e colchões hospitalares, com cerca de 20 unidades desses materiais. Esse banco funciona até hoje e já ajudou diversas pessoas. Esse primeiro evento vendeu 300 convites e foi um sucesso. O segundo foi ampliado e chegou a vender quase 600 convites. Com o dinheiro arrecadado conseguiram atender duas entidades, a APAE e o SAMA. Benfeitoria No entanto, o diferencial das ações do grupo é que a entidade beneficiada não recebe ajuda em dinheiro, mas sim em benfeitoria. Antes mesmo de começarem a se organizar para ir atrás de patrocínios para o almoço com churrasco, o grupo faz uma pesquisa entre entidades da cidade para saber quais são suas necessidades. “Fazemos também uma análise burocrática da entidade, para saber se está tudo de acordo. Daquelas que estão aptas, fazemos uma triagem de acordo com a necessidade. No caso da APAE, doamos cadeiras e também um freezer para armazenar os pães que são produzidos pelos jovens atendidos. Eles tinham essas necessidade pelo risco de estragar esse material sem armazenamento adequado. No caso do SAMA doamos arquivos de escritório, telas para a quadra e sistema de vigilância, tudo já instalado” contam alguns dos organizadores que conversaram com o Jornal do Meio, Sérgio Finelli, Elvis Souza, Fernando Scalabrini e Rodrigo Bogre. Passado o evento, uma nova comissão organizadora do Churras Bode acompanha a entrega e/ou instalação da benfeitoria doada à instituição. No caso da São Lucas, será criado um espaço, dentro da entidade, que funcionará como uma espécie de sala de espera para as mães que acompanham os filhos nos atendimentos. A ideia é que ali, elas possam participar de oficinas de bordados. O que for produzido por elas será vendido no bazar da própria instituição. Interação Para eles, além do auxílio que conseguem oferecer às entidades beneficiadas, é muito importante também o convívio promovido pela ação, antes, durante e depois do evento. Maridos, esposas e filhos participam juntos de toda a produção. São cerca de 15 famílias unidas em prol de um objetivo comum. “Essa interação também é muito importante. Todo mundo se envolve. E a cada evento procuramos oferecer mais atrações para que quem compre o convite não tenha apenas a intenção de ajudar financeiramente, mas também de vir, participar, confraternizar. O evento conta com espaço kids, com brinquedos como piscina de bolinha e cama elástica, e música ao vivo em um ambiente familiar e acontece em um espaço coberto, dentro do Posto de Monta A própria instituição participa do evento também. Fazemos questão de que estejam presente para terem a oportunidade de apresentarem seu trabalho para quem está ajudando comprando o ingresso”, contam. Dessa forma é possível trazer ainda mais um benefício à instituição, que é o de poder ter contato direto com o público a fim de poder estabelecer uma relação com novos possíveis benfeitores; Para o público é importante constatar que a doação será empregada de forma idônea para quem realmente precisa. Compra antecipada Como o evento tem um número limitado de convites, a compra só pode ser feita antecipadamente. Não serão disponibilizados convites na porta, no dia do evento. “É sempre uma satisfação conseguirmos vender esses convites com boa antecipação. A própria instituição fica responsável de vender uma quantidade desses convites, como contrapartida. Tem dado muito certo e nossa intenção é que possamos ampliar um pouco mais a cada ano. Para o próximo quem sabe conseguimos chegar a mil convites vendidos!”, desejam.
Cerca de 15 famílias organizam o Churras Bode: amigos unidos em prol de uma benfeitoria
Interação entre famílias durante o evento é uma das prioridades do Churras Bode
Convite é vendido antecipadamente por R$ 40,00 e dá direto à entrada, churrasco e sobremesa
No evento anterior as entidades APAE e SAMA foram beneficiadas com cadeiras, freezer, tela para quadra e sistema de segurança.
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A base ideal
Mulheres negras afirmam que ainda têm dificuldades para encontrar tons de base que sejam adequados à sua pele; veja dicas Por KARINA MATIAS/FOLHAPRESS
Encontrar a base ideal não é tarefa fácil. Maquiadoras e blogueiras afirmam que a busca é ainda mais complicada para as mulheres negras, que reclamam ainda não encontrar tantas opções no mercado para atender às diversas nuances de sua pele. “A gama de tonalidades é muito limitada e faltam produtos com preços acessíveis”, diz a blogueira Gisella Francisca, do blog que leva o seu nome (www.gisellafrancisca.com). A maquiadora Gisele Santos(www. giselesantosmaquiadora.com) concorda e acrescenta que recebe muitas mensagens de jovens negras que se sentem discriminadas por não conseguirem encontrar a cor adequada ao seu tom de pele.”Essa escassez é absurda, pois estamos em um país com 54% de pessoas negras”,diz. Já Maraisa Fidelis, do blog “Beleza Interior” (www.blzinterior.com.br), tem opinião diferente. Segundo ela, nos últimos anos, marcas mais populares, como Natura, Avon e Vult, têm investido em maior variedade de maquiagens para atender à diversidade das brasileiras. “Há oito anos, eu não conseguia achar base para a minha pele. Mas, recentemente, desde que o acesso a marcas internacionais ficou mais fácil, as empresas brasileiras abriram os olhos e perceberam que precisavam ampliar a gama de produtos oferecidos às mulheres negras. Hoje,eu, a minha irmã e a minha mãe, que tem os diferentes tons de pele, conseguimos achar boas bases nacionais”, destaca. A Natura afirma que possui diversos tons para todos os tipos de pele. “Não à toa, as bases Radiance e Matific, de Natura Una, possuem 18 tipos diferentes de cores”, informa, por meio de nota. No portfólio da Avon, há a opção da Base Líquida Matte, disponível em 18 tons. Já a Vult tem 16 opções de cor da Base Líquida HD alta cobertura. Mas, afinal, como escolher a base ideal
para cada tipo de pele? A dica das maquiadoras e blogueiras é testar a cor no rosto, perto do maxilar e descendo para o pescoço. “Aplique e espere cinco minutos. Nesse teste, a base que uniformizar sem destoar da cor da pele é a correta”, ensina Gisele. “A base tem que cobrir as manchas, mas precisa parecer que a mulher não está usando nada”, acrescenta Maraisa. Para driblar a falta de opções, a blogueira Gisella indica fazer misturas de produtos.”Muitas bases deixam nossa pele acinzentada. Para combater isso, eu uso algum produto de base alaranjada ou vermelha. Pode ser um batom, um bronzer ou um blush cremoso. Só é necessário ter textura líquida ou cremosa para que seja possível misturar”, orienta. Uma opção, segundo ela, é criar o seu próprio produto, misturando protetor solar, a base que preferir e umas gotas ou um pouco do item de fundo alaranjado. “O pó compacto também ajuda a chegar ao tom ideal”, diz A maquiadora Gisele diz que muitos rostos possuem áreas mais escuras, como olheiras, e outras claras, como o queixo. Um corretivo alaranjado no local mais escuro ajuda a não acinzentar. “Ele também serve para cobrir espinhas e cicatrizes”, diz. Ela destaca que a base deve ser aplicada com um pincel de fibra dupla e em movimentos circulares, o que promove um resultado mais natural. Antes de iniciar a maquiagem, Gisele indica também o uso de um “primer” específico para a pele negra. “Se usar um produto com pigmento azulado ou violeta, pode acinzentar a pele também.” Outra dica é cuidar da higiene da pele. “O segredo da maquiagem não é a maquiagem em si, mas uma pele nutrida e cuidada. Retire sempre a maquiagem, hidrate seu rosto e use filtro solar”, conclui Gisella.
Foto: Robson Ventura/Folhapress
A blogueira Maraisa Fidelis diz que as marcas nacionais investiram, nos últimos anos, em novas opções.
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Uma vida positiva
Conhecido como o paciente com HIV mais longevo do HC da USP, Tomás Alexander descobriu que tinha o vírus em 1989 e, desde então, espera pela sua cura
Por CHICO FELITTI/FOLHAPRESS
Faz mais da metade da minha vida que sou soropositivo. Fui diagnosticado em 3 de junho de 1989, um sábado. Eu não estava sentindo nada. Só fui fazer o exame de HIV por pressão do meu primo, que é meu médico homeopata, porque queria fazer uma cirurgia e corrigir minha mandíbula. Recebi um resultado positivo quando estava absolutamente certo de que seria negativo. Três anos antes eu tinha feito um exame que tinha dado negativo, e durante esse período tive um só companheiro. Fui fazer o primeiro exame porque tive mononucleose, toxoplasmose, fiquei com gânglios em volta do pescoço. Começaram a me investigar de cima a baixo. Não fui diagnosticado, e os sintomas passaram completamente. Em 1989 fiz o exame de novo. Abri o envelope com o resultado na praça do Pôr do Sol, em Alto de Pinheiros. Ia tomar cerveja saindo de lá, para comemorar. Mas, com o resultado, fomos direto para a casa de uma amiga minha, que é médica, a Cassia Buchala. Ela me acalmou, disse que era como ser diabético. Essa mesma amiga me levou ao HC. Disse que conhecia um pessoal que estava estudando isso. Cheguei em 6 de junho de 1989, três dias depois do diagnóstico. Nessa época não havia remédio. Eu ia ao médico, me pesavam, tiravam a pressão, checavam se eu tinha algum sintoma. Não tinha o que fazer. Eu achava que ia morrer logo, que não ia sobreviver à inauguração da linha verde do Metrô, que ia acontecer em 1991. Sobrevivi a essa, à amarela, à rubi [risos]. Um ano depois, em 1990, vi um anúncio do Hospital das Clínicas na Folha, procurando pessoas que tivessem o HIV, idade acima de 18 anos, peso mínimo de 50 kg, sem histórico de doença oportunista. Fui até lá pegar as informações e fui trabalhar. No dia seguinte, a assistente social que trabalha até hoje no HC me ligou no trabalho, dizendo que estavam desesperados atrás de voluntários. Em troca, eu ganharia um excelente plano médico. Eu tinha parado de pagar o plano de saúde porque a tecelagem da minha família não estava num bom momento. Eu sempre perguntava para o médico: quanto tempo você acha que vai demorar para descobrir a cura? Eles falavam de cinco a dez anos, e eu pensava “Nossa, tanto assim?”. Já se passaram 30. Topei participar do estudo. Era o teste de um novo remédio, o MK-639. O esquema era duplo-cego, ou seja, nem o examinado nem o examinador sabem se o que está sendo
ministrado é a combinação de AZT com o novo remédio, de AZT com placebo ou de placebo com o remédio novo. Comecei a tomar e logo no primeiro dia me senti muito mal, extremamente fraco. O primeiro exame indicava que minhas hemoglobinas estavam muito baixas. Fui direto ao hospital fazer transfusão. Tomei AZT por meses, mas tive de parar por causa da minha intolerância. Fiquei só com o outro remédio, que não sabia o que era. Passei bem. Dois anos depois, em 1996, descobri que estava no grupo que tomava AZT com placebo. Ou seja, passei dois anos tomando nada. Fiquei um pouco cabreiro. Imediatamente comecei a tomar o coquetel. Minha carga viral sempre foi indetectável. Eu morro de vontade de me desintoxicar. No dia que descobrirem a cura, vou para uma praia deserta tomar água de coco, comer peixe e ver como sou sem essas drogas. Não sabem se é por causa da idade ou dos remédios, mas fiquei hipertenso. Eu acredito que a saúde pública pode ser ruim em muitos casos, mas eu sempre fui
atendido pelos melhores médicos, nunca nada faltou. PRECONCEITO Só sofri preconceito uma vez. A primeira pessoa com quem eu fui falar, duas ou três semanas depois de descobrir o resultado, era o meu melhor amigo, tinha sido meu companheiro, tínhamos dado a volta ao mundo juntos. Fui para a casa dele no interior de São Paulo. Contei para ele e ele se evaporou. A minha tendência natural seria dividir isso com outras pessoas. Tudo depende muito do jeito que você conta. E eu tentava contar do jeito mais indolor possível. Depois disso nunca mais tive rejeição. Minha família, que eu achava que era um bando de caretas, foi bárbara. O meu melhor amigo nesse período foi o Negão, um cachorro de rua que me adotou no dia do meu aniversário, quando eu estava na praia. Sempre fui saudável. Sempre trabalhei. Já tive problemas, mas provavelmente não ligados a ser soropositivo. Os efeitos colaterais dos remédios que mais me incomodam
são de pele, pruridos, dermatites. Mas às vezes passo o ano sem nada. As neuras vão sumindo. Hoje isso é o que menos me preocupa na vida. Quando a gente está no hospital, começa a conversar com as pessoas na fila. Geralmente a primeira pergunta é: “Desde quando você tem?”. Eu digo e as pessoas apontam, contam para as outras “Olha, ele tem faz 30 anos!”. Às vezes me pego pensando por que as pessoas não perguntam como eu estou, mas daí me dou conta que não preciso disso. As pessoas acabam esquecendo que você é soropositivo, e têm que esquecer mesmo. Resumo Faz 28 anos que o designer, ator, professor de inglês, artesão e cantor Tomás Alexander, 61, foi diagnosticado com o HIV. Durante essas quase três décadas, ele frequenta o Hospital das Clínicas da USP, onde é conhecido como o paciente mais longevo a se tratar da infecção. Alexander acompanhou a evolução do tratamento da doença e diz que espera a cura para poder ir à praia e saber como se sentiria sem tomar nenhum remédio. Foto: Karime Xavier/Folhapress
O ator e cantor Tomás Alexander, 61
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Brincando de vacinar
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Óculos de realidade virtual com desenhos e distrações são a nova arma de laboratórios para que crianças sintam menos medo de injeções por PHILLIPPE WATANABE/FOLHAPRESS
Enzo Fraga, 9, chega no laboratório e veste um óculos com celular acoplado. Com a ajuda dele, mergulha em uma história sobre vírus e bactérias que querem atacar um reino. Para ajudar a defender o lugar, a criança recebe dois poderes: o gelo e o fogo. O poder gelado, no mundo real, é um algodão com álcool. O poder do fogo, que a protege dos vilões com superpoderes. é a picada da vacina. “Foi legal. Não doeu”, diz ele, enquanto gira um spinner entre os dedos, logo após ser vacinado na VacinVille, um dos laboratórios de São Paulo que têm usado óculos de realidade virtual para facilitar a aplicação de vacinas e injeções em crianças. Sua mãe, Marjorie Fraga, 43, diz que o medo é familiar. “Sempre sou eu que trago o Enzo. Meu marido não gosta de agulha, então deixa isso para mim”, conta ela. Inicialmente em dúvida sobre a utilidade da realidade virtual, ela considera que o processo de vaci-
nação se tornou menos estressante. “O choro nem sempre é por causa da dor. É pelo medo da vacina, da agulha e do ambiente. Às vezes ela teve uma experiência ruim e só de ouvir que vai tomar vacina começa a chorar”, diz Mayra Ardito, 30, enfermeira do laboratório. Segundo ela, as crianças choram com ou sem realidade virtual –afinal, não deixam de sentir a picada da agulha–, mas os óculos facilitam o trabalho e viram um atrativo para as crianças a partir dos quatro anos. “A criança não consegue entender que, mesmo existindo a dor da picada, existe um benefício”, diz Melissa Palmieri, coordenadora do setor de vacinas do laboratório Hermes Pardini, que também usa histórias com realidade virtual para distrair as crianças. Já o Delboni Auriemo não faz uma correlação entre a história da animação –um filme do Scooby Doo– e a aplicação da vacina, mas diz que o efeito de distração do disposi-
tivo é o mesmo e as crianças são informadas do que irá acontecer para não se assustarem. “Há uma preocupação de tornar o processo menos doloroso e traumático e menos associado a um hospital”, diz Ana Karolina Marinho, coordenadora do departamento científico de imunização da Asbai (Associação Brasileira de Alergia e Imunologia). A Organização Mundial da Saúde, inclusive, afirma que não levar em conta a questão da dor durante a vacinação pode ser um dos fatores que impacta negativamente as atitudes relacionadas à saúde e pode levar ao atraso ou a evitar vacinações futuras. Segundo Marinho, além das próprias crianças, é importante tranquilizar também os pais para que eles passem segurança para os filhos, já que é impossível tornar o processo totalmente indolor. “A realidade virtual será o futuro, mas a ideia é a mesma de quando fazemos um teatrinho para distrair
as crianças ou quando enfermeiros usam roupas coloridas”, afirma ela. O custo da tecnologia, porém, é uma das barreiras para a ampliação do uso da realidade virtual, segundo Miriam Moura, membro da comissão de ética da Sociedade Brasileira de Imunizações. Na clínica VacinVille, por exemplo, foram gastos cerca de R$ 150 mil com desenvolvimento da animação e aquisição de seis óculos e seis celulares para três estabelecimentos do laboratório. Moura alerta também para a necessidade de uma discussão franca com as crianças sobre vacinas e a utilidade delas. “Acho complicado que não falem de vacina em momento algum na animação. Parece que estão enganando a criança.” Marinho destaca que a honestidade quanto ao que vai acontecer é essencial. “Não diga que não vai doer, porque isso seria uma traição. É melhor falar que vai doer um pouquinho, passa rápido e que você estará por perto.” Foto: Karime Xavier/Folhapress
O ator e cantor Tomás Alexander, 61
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