Fascículo 07 fotografia

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FASCÍCULOS DE JORNALISMO - COMPREENDER A PROFISSÃO

De olho nos fatos

Nos primórdios do jornal, a fotografia não acompanhava os textos. Somente em 1842, um alemão registrou a primeira foto jornalística da história. Hoje, você consegue imaginar a imprensa sem imagens? ENTREVISTA

O repórter fotográfico Fernando Santos analisa as transformações da profissão – do analógico ao digital

REPORTAGEM

O clique ou a vida? Dilema cruel que muitos profissionais já enfrentaram


Apresentação | Caro leitor

Expediente

Arte de desenhar com a luz

O

fascículo Fotografia apresenta aos estudantes de jornalismo um conjunto variado de aspectos relevantes do fotojornalismo. Para muitos a facilidade de acesso à fotografia é vista como algo benéfico. Mas algumas pessoas deixam claro que é importante saber como usar a imagem, pois além de um entretenimento, é possível interpretá-la como evidência de qualquer acontecimento. Você será inserido na visão que estudiosos e profissionais, como fotógrafos e repórteres, possuem da arte de desenhar com a luz. Poderá conhecer a imagem de uma maneira diferente da habitual. Nas próximas páginas você vai percorrer o mundo da foto desde o seu surgimento até os dias atuais; as mulheres fotógrafas; a relação de amor da revista Manchete com a imagem e histórias de fotos polêmicas. Por meio da fotografia é possível compreender muitas faces e dimensões da realidade. Profissão, hobby, registro, cultura, arte, informação. Conheça a fotografia!

Seção | Conceito “Em meados da década de cinquenta do século XIX, a fotografia já havia beneficiado dos avanços técnicos, químicos e ópticos que lhe permitiram abandonar os estúdios e avançar para a documentação imagética do mundo com o ‘realismo’ que a pintura não conseguia. A foto beneficiava também das noções de ‘prova’, ‘testemunho’ e ‘verdade’, que à época lhe estavam profundamente associadas e que a credibilizavam como ‘espelho do real’.” Jorge Pedro de Sousa, no artigo Uma história crítica do fotojornalismo ocidental, pág. 26. “O fotojornalismo constitui-se num importante recurso para o trabalho do historiador, o que implica em reconhecer esta documentação enquanto portadora de discursos, que traz em si a necessidade de decodificação. Faz-se necessário a utilização de metodologias específicas que possibilitem um olhar além das representações midiáticas, identificando os desvios e distorções no documento.” Silvia Helena Zanirato, no artigo A documentação fotojornalística na pesquisa histórica, publicado em Trajetos: Revista de História UFC. Fortaleza: UFC, vol. 2, nº 4, 2005, págs 16 e 17. “O momento da perspectiva é o momento da imprensa, o momento do armazenamento e da distribuição de um conhecimento cumulativo, interessado na preservação do passado e na difusão do presente, que busca na forma fiel e rigorosa um novo estilo cognitivo, baseado na ‘demonstração visual’. Mesmo imagens de derivação tecnológica como a fotográfica e a vídeo-eletrônica ainda são elaboradas a partir de uma realidade visível pré-existente, integrando, portanto, o universo da especularidade.” Annateresa Fabris, Fotografia: usos e funções no século XIX, Edusp, pág 35.

2 | DOIS PONTOS

Chanceler Alzira Altenfelder Silva Mesquita Reitor José Reinaldo Altenfelder Silva Mesquita Pró-reitor de Graduação Luis Antônio Baffile Leoni Pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Alberto Mesquita Filho Pró-reitoria de Extensão Lílian Brando G. Mesquita Diretor da Faculdade de LACCE Rosário Antonio D’Agostino Coordenação do Curso de Jornalismo Anderson Fazoli

Dois Pontos é um projeto experimental dos alunos de jornalismo (3ACSNJO e 3MCSNJO), desenvolvido na disciplina Jornalismo Impresso, em 2013. Orientação e Coordenação editorial Profa. Jaqueline Lemos (MTB 657/GO) Revisão Profª. Maria Cristina Barbosa Diagramação Alexandre Ofélio (MTB 62748/SP) Redação Editor assistente Leandro Teciano (RA: 201101999) Repórteres Fernando Silva (RA: 201115270) João Vale (RA: 201114602) Karina Silva (RA: 201114502) Rafael Barbosa (RA: 201105621) Capa Alexandre Ofélio

Pingue-Pongue | Fernando Santos

Percepção, luz e movimento em uma fração de segundos A rotina de um fotógrafo profissional antes dos equipamentos digitais era muito diferente da nossa realidade atual. Entrevistamos um jornalista que acompanhou as principais mudanças do mundo da fotografia

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Por João Vale

enda viva da fotografia brasileira, Fernando Santos é jornalista desde 1964. Começou a vida de fotógrafo quase por acaso. Hoje é um profissional consagrado, que trabalha no jornal Folha de S.Paulo há mais de 40 anos. Do olhar aguçado e atento de Fernando Santos muitas imagens foram eternizadas nas páginas da imprensa brasileira. Ele fotografou Pelé na Copa do Mundo de 1970, fez uma das mais lembradas fotos da Campanha das Diretas Já!. É um repórter fotográfico que sentiu na pele as transformações do fotojornalismo ao longo das últimas décadas. O fascículo Dois Pontos foi conversar com ele.

Dois Pontos: Como você se tornou fotógrafo? Fernando Santos: Foi uma coincidência. Eu estudei química na faculdade Osvaldo Cruz e, na época, a Unilever pegava os melhores alunos do curso como estagiários e eu fui um dos escolhidos. Lá conheci um engenheiro que estava montando um laboratório de fotografia colorida, um dia ele me trouxe uma câmera Beauty Canter (alemã) e um flash de última geração. Aí eu passei a fotografar os eventos esportivos e festas da empresa.

Fernando Santos: O fotógrafo tinha que ter, numa fração de segundos, percepção, atenção para analisar ângulo, luz, estética, ação e movimento. O filme tinha 36 poses, então tínhamos que ter certeza de tudo antes de clicar. Não é como hoje que você faz a imagem, deleta e depois refaz.

Dois Pontos: Qual foi o seu primeiro equipamento digital? Fernando Santos: A Folha de S.Paulo foi a primeira a trabalhar com foto digital. A câDois Pontos: Como começou sua carreira mera era uma Canon/Kodak, um equipade jornalista? mento de 3MP, que hoje qualquer celular Fernando Santos: Trabalhando como fotó- bate de dez a zero. grafo eu conheci vários colegas de jornal e um deles me convidou para trabalhar no jor- Dois Pontos: Você faz mais fotos hoje em nal Última Hora, que funcionava na Avenida relação ao período do analógico? Prestes Maia. Depois a empresa foi vendida Fernando Santos: No auge, durante um jogo para Folha de S.Paulo onde estou desde 1968. no Pacaembu, eu fazia 72 fotos; hoje eu faço 300 fotos por partida. Dois Pontos: Quais eram as c âmeras na ép o c a? Dois Pontos: Você mexe na foto antes de Fernando Santos: Na época você tinha a op- mandar para o jornal? ção de trabalhar com a Rolleiflex 6x6, a Laica Fernando Santos: Para publicar? Não. Eu 35mm – a melhor de todas –, a Zenit, dentre acho que a foto ao ser mexida perde a reaoutras. lidade e o leitor não merece ser enganado. Quando eu uso uma imagem, quero que Dois Pontos: Nas viagens, como era a re- a pessoa veja e sinta que também esteve lá, velação das fotos e o envio delas para olhando o mesmo que eu. o jornal? Fernando Santos: A primeira coisa que a empresa fazia era nos colocar em um hotel onde o banheiro pudesse ser transformado numa câmara totalmente escura. Não poderia ter janelas, pois se tivesse você tinha que cobrir tudo com um pano preto. Depois da revelação, a gente usava as máquinas de telefoto, uma espécie de fax, que levava cerca de sete minutos para transmitir a imagem para a redação onde depois ela era revelada novamente. Dois Pontos: Como você define a fotografia digital? Dois Pontos: No analógico, sem o processo de Fernando Santos: Ela é uma foto rápida, mas edição, como fazer para não perder a foto? a qualidade dela depende do fotógrafo.

“Quando eu uso uma imagem, quero que a pessoa veja e sinta que também esteve lá”

João Vale

Santos afirma que a popularização da imagem digital prejudica do trabalho do fotógrafo profissional Dois Pontos: A popularização do digital atrapalha o trabalho do fotojornalista? Fernando Santos: Sem dúvida. Hoje, se assaltam uma joalheria, alguém com o celular grava tudo, passa para uma televisão e aí o fotografo profissional, que está atrás de registrar aquilo, já foi para o espaço. Dois Pontos: Qual a importância da fotografia para o jornalismo? Fernando Santos: Uma imagem fala mais que mil palavras. Então, uma pessoa ao olhar uma foto jamais pode pensar que aquilo não é uma realidade. DOIS PONTOS | 3


Reportagem | Profissionais

Reportagem | Revista Manchete

Nada de fragilidade

Um romance com a fotografia

Por Karina Silva

Por João Vale

Com coragem, sensibilidade e vencendo preconceitos as mulheres se fazem presentes e registram suas marcas na fotografia

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Reprodução

Capa da primeira edição da revista Life, publicada em setembro de 1936. A foto é de Margaret Bourke-White e trata da construção de uma represa no rio Missouri, Montana, EUA

fotografia sempre foi e ainda hoje é uma área na qual há predominância do sexo masculino. Não é nada comum encontrar mulheres fotógrafas, seja no fotojornalismo ou atuando na fotografia voltada para outras áreas. A imagem da mulher como uma fotógrafa parece ser constantemente subestimada no meio fotográfico. Ainda paira, mesmo que não assumidamente, a ideia machista de que mulheres tendem a ser mais frágeis e sensíveis para atuar na área. Os equipamentos geralmente pesados -, a agilidade, a flexibilidade, a disponibilidade para trabalhar em horários ingratos e as viagens são alguns dos fatores exigidos para o profissional de foto. “Aos poucos fui ganhando espaço, mas

O cenário atual já possibilita uma inserção maior das mulheres como fotógrafas Reprodução

Arte do estúdio Rizzo – Photographia Central, onde pai e filha (Michelle e Gioconda) trabalharam juntos 4 | DOIS PONTOS

sempre precisei me afirmar. Ao mesmo tempo, alguns colegas de profissão, grandes amigos, não precisavam se esforçar tanto. Eu, uma estudante menina, aos olhos dos grandes editores, poderia ser frágil demais para algumas pautas. A dificuldade está exatamente no mito do sexo frágil”, diz Daniela Bratti, fotógrafa profissional formada em jornalismo pela Universidade São Judas Tadeu e graduada em designer de fotografia pela Escola Panamericana de Artes e Design. Ela atualmente trabalha como freelancer em fotojornalismo. Esse conceito vem se transformando ao longo do tempo e o cenário atual já possibilita uma inserção maior do sexo feminino na profissão. Para a fotógrafa Silmara Ciuffao o preconceito não foi um problema. “Nunca tive problema algum em relação a isso. Pelo contrário, sempre tive muito apoio e conselho dos fotógrafos, dos homens! No começo da minha carreira e a até agora”, comenta. Pioneiras A história mostra que muitas mulheres ao redor do mundo conseguiram driblar os preconceitos e as dificuldades da profissão. Elas se tornaram fotógrafas aclamadas e reconhecidas por seus trabalhos até hoje. Dentre uma das pioneiras a atuar como fotógrafa profissional está a parisiense Antonieta DeCorrevont que abriu um estúdio de retrato em Munique, em meados dos anos 1843. Outra fotógrafa que também foi pioneira e que não poderia deixar de ser citada, pois seria um sacrilégio, é a norte americana Margaret Bourke-White (1904-1971). Margaret foi uma precursora no campo emergente do fotojornalismo, sendo a primeira mulher a ser contratada para a função na revista Fortune, em 1929. Seu pioneirismo não para aí: ela foi a primeira ocidental a fotografar o território soviético, além de ser primeira a trabalhar em áreas de conflito militar em plena Segunda Guerra mundial. No Brasil, a filha do fotógrafo italiano Michelle Rizzo, Gioconda Rizzo (1897-2004) montou aos 17 anos de idade seu próprio estúdio de fotografia, denominado de Photo Femina. Gioconda foi a primeira mulher fotógrafa profissional brasileira, faleceu aos 107 anos de deixou um legado em imagens que mostram as personagens que ela registou em estúdio. A partir do olhar delas, e de muitas outras mulheres, a fotografia conquistou imagens sensíveis, detalhadas e criativas para ilustrar o mundo, suas realidades e fantasias.

Conheça a primeira publicação semanal brasileira a dar ênfase à beleza priorizando as fotos em seu conteúdo

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ma revista semanal, a Manchete, criada por Adolpho Bloch, nasceu em 1952 no Rio de Janeiro e marcou o estilo das publicações brasileiras nas décadas seguintes, durante quase meio século. “Muitos perguntam a razão do sucesso da Manchete. Pode-se citar a beleza de sua impressão, realizada em rotativas alemãs, ou a qualidade das fotos das reportagens [...], podemos reservar à orientação jornalística um espaço considerável no êxito da empresa. Era uma revista alegre comunicativa, reportando as belezas de um país”, escreveu Arnaldo Niskier no prefácio de seu livro Memórias de um sobrevivente – a verdadeira história da ascensão e queda da Manchete. No início, a publicação chamava a atenção por anúncios coloridos que faziam um forte contraponto às reportagens publicadas em preto e branco. Com isso, a revista chamava mais atenção por seu projeto gráfico do que pela sua relevância jornalística, mesmo tendo empregado nas suas editorias alguns dos maiores jornalistas brasileiros. Ao longo da sua história, a revista destacou em suas capas dezenas de personalidades nacionais e internacionais. Artistas do cinema brasileiro dos anos 1950, os presidentes Getúlio Vargas, Juscelino Kubitscheck e Jânio Quadros, o cubano Fidel Castro, a rainha Elizabeth, o pintor Pablo Picasso e figuras religiosas mundialmente conhecidas como o Papa João Paulo II. As capas da Manchete trouxeram também modelos e celebridades. “As pessoas corriam às bancas para comprar uma revista sendo que muitos deles não sabiam ler, mas estavam interessados na vida das celebridades. Além disso, por ter sofrido com inúmeras mudanças de editores, a revista estava sempre se reinventado e atraindo mais leitores”, afirma Ricardo Moreno, fotógrafo da revista O2. Os anúncios publicados nas páginas da revista, pelo menos em seus primeiros anos de vida, eram extensos, ocupando páginas inteiras com cores fortes e chamativas. A publicação acabou ajudando na inovação do padrão das reportagens que até então eram sempre impressas em preto e branco. Por muito tempo considerada a segunda maior revista do Brasil, a Manchete só ficava atrás da revista O Cruzeiro. O estilo de diagramação foi inspirado na ilustrada parisiense Paris Match utilizando como principal forma de conteúdo o fotojornalismo. Por sua popularidade, a revista atingia todas as classes sociais, que iam semanalmente

buscar uma nova edição, fazendo a Manchete alcançar números de circulação até hoje difíceis de alcançar. Talvez pelo fato do Brasil possuir na época um grande índice de analfabetismo, a revista com foco na fotografia fez tanto sucesso. A última edição da revista circulou em 29 de junho de 2000. Foi o número 2.519, vendido nas bancas por R$ 3,90 com o ator Reynaldo Gianecchini na capa. Na semana seguinte não haveria mais Manchete nas bancas. No capítulo inicial do livro, Niskier narra o fim: “31 de julho de 2000. Segundafeira, dia tradicional de fechamento da edição semanal da Manchete. O número 2.520 estava pronto para ser rodado e na quartafeira chegar às bancas. [...] As máquinas já estavam paradas. Pela primeira vez, em quase meio século, deixava de circular a revista [...]. Ponto final de um capítulo glorioso do jornalismo brasileiro”. A falência da empresa deu início a diversas disputas judiciais, incluindo os processos trabalhistas movidos pelos milhares de funcionários. Em novembro de 2012, o prédio da Editora Bloch no Rio de Janeiro onde funcionava a redação da revista foi implodido. Porém, o legado da Manchete influencia as publicações atuais. Apesar das críticas, a publicação criada por Adolpho Bloch é um marco

na imprensa brasileira e sempre será lembrada como um sucesso editorial e de mercado por ter retratado em suas páginas o auge da fotografia jornalística nacional. Reprodução

Capa da primeira edição da revista Manchete que circulou em abril de 1952 Reprodução

Capa da última edição da revista Manchete que circulou em julho 2000

Para conhecer mais

Em 2008 a editora Desiderata lançou o livro Aconteceu na Manchete, as histórias que ninguém contou, de vários autores, com depoimentos de pessoas que trabalharam na revista.

Pela editora Nova Fronteira foi publicado, em 2012, o livro Memórias de um sobrevivente – a verdadeira história da ascensão e queda da Manchete. O autor é Arnaldo Niskier, um jornalista que trabalhou por 37 anos no grupo Bloch. DOIS PONTOS | 5


Reportagem | Capa

O registro da imagem no tempo

Você sabia? A primeira fotografia feita no Brasil foi em 1840 pelo francês Louis Compte, mostrando o Paço Imperial no Rio de Janeiro.

A arte de desenhar com a luz já tem quase dois séculos de vida e hoje é praticamente impossível pensar o mundo sem a fotografia Por Leandro Teciano

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esde 1826, quando a primeira fotografia foi oficialmente produzida por Joseph Nicéphore Niepce, os métodos, equipamentos e finalidades da imagem em forma de retrato tiveram um incrível avanço. Naquela época, o francês utilizou um processo para captação da imagem chamado heliografia, uma gravura com a luz do sol, que demorou cerca de oito horas para registrar a foto. Outras técnicas e equipamentos foram utilizados para que a fotografia se aprimorasse, mas duas delas se destacaram. O daguerreotipo, desenvolvido por Louis-Jacques Mandé Daguerre em 1837, era utilizado para produção de retratos sem negativo. Com esta técnica, as fotos não podiam ser reproduzidas, cada original era único. A invenção de Daguerre chegou ao Brasil somente três anos depois e iniciou a trajetória da fotografia no país através de Dom

Pedro II. “O nosso Imperador, um entusiasta da modernidade e da tecnologia, ficou fascinado pelo aparato e tornou-se nosso primeiro fotógrafo. Ele apoiou vários profissionais, inclusive criando um título honorífico, ‘Fotógrafo da Casa Imperial’, que foi dado a cerca de 20 profissionais até o final de seu reinado. Ele e a família real foram muito fotografados, Isso resultou em uma maravilhosa documentação fotográfica de muitos lugares e personagens do Brasil da segunda metade do século XIX”, diz Juca Rodrigues, editor de núcleo de fotografia da revista IstoÉ Gente e professor da Universidade São Judas. Outra técnica foi o calótipo. Criada pelo escritor e cientista britânico William Fox Talbot, em 1840, foi o primeiro equipamento em que o processo negativo-positivo foi utilizado nas fotos, o que permitia a reprodução das imagens em escala. No início, apenas as pessoas que tinham um alto poder aquisitivo eram capazes de ter acesso a

este recurso. Com a Carte-de-Visite (cartão de visita) lançada por André Adolphe-Eugène Disdéri, em 1851, a foto se popularizou. Contendo imagens de cerca de 9,5 x 6 cm, ele atingiu um grande número de pessoas na década de 1860 e se tornou moda. Foi produzido no Brasil e no mundo inteiro. A primeira câmera fotográfica foi lançada em 1888 pela Kodak, líder no ramo por várias décadas. Ela tinha o mesmo nome da empresa, custava apenas US$ 25,00 e era précarregada com filme para 100 poses. Passado alguns anos, a empresa lançou a Brownie, que custava ainda mais barato: US$1,00. Com o preço baixo das câmeras e a popularização por meio do cartão de visita e da capacidade de reprodutibilidade, a arte de fotografar deixou de ser privilégio de poucos. No início do século XX, as fotografias funcionavam basicamente como ilustrações e eram mais valorizadas pela nitidez e pela reprodutibilidade do que pelo valor informa-

tivo. Fotógrafos como Henri Cartier-Bresson e Erich Salomon mudariam essa história logo depois. A partir de então, a emoção e a característica noticiosa da imagem foram os aspectos que passaram a ser prestigiados. Com o passar do tempo e a adaptação da imagem para publicação nos veículos impressos, a familiaridade do leitor com a imagem cresceu. A fotografia desenvolveu para marcar momentos históricos e denunciar fatos. Seja por hobby ou profissionalmente, a foto está presente cotianamente na vida de todos os cidadãos. Isso foi possível pois o avanço da tecnologia e a propagação da internet tornaram o produto mais acessível à todos. As câmeras evoluem a cada dia e diversas opções podem ser controladas apenas com o toque em alguns botões. É fácil registrar momentos relevantes para a sociedade. Também é corriqueiro clicar cenas do cotidiano e postar a imagem em uma rede social. “Sabemos que a geração atual faz um nú-

mero excessivo de imagens sem objetivo e informação jornalística, sem se preocupar com o que o grande mestre do fotojornalismo Cartier-Bresson chamou de ‘momento decisivo’. Ainda assim, imagino que o dos fotógrafos está no campo das matérias especiais, nas quais a elaboração e apuração da notícia deverá terão um olhar crítico e apurado, com certo grau de qualidade”, esclarece Erivam de Oliveira, vice-diretor do Fórum Nacional de Professores de Jornalismo e professor de fotojornalismo na ESPM em São Paulo. As pessoas preferem que a imagem esteja sempre presente nos textos jornalísticos. Em alguns veículos impressos é comum que a foto ocupe maior espaço que o texto da notícia ou da reportagem. De acordo com Heitor Feitosa, fotógrafo da Editora Abril, é a imagem que dá vida ao meio de comunicação. “Os veículos, principalmente os impressos, dificilmente sobreviveriam sem as imagens. Aliás, os jornais têm reduzido bastante os

Em 1842, o alemão Carl Friedrich Stelzener tirou a primeira fotografia jornalística da história, mostrando um incêndio na cidade de Hamburgo, na Alemanha, que depois foi publicada em uma das primeiras revistas ilustradas, a Illustrated London News. Durante anos de 1855 até 1856 ocorreu a Guerra da Criméia. Foi neste acontecimento que a primeira cobertura fotojornalista da história foi feita. O responsável foi Roger Fenton, fotógrafo oficial do Museu Britânico na época. textos e inserido mais fotografias, sem contar que muitos deles têm migrado para edições online, nas quais a imagem é mais atrativa que o texto. Por outro lado, é preciso cuidar para que a imagem não caia na banalidade por conta do excesso, o que seria a mesma coisa que ver tudo e não compreender nada,” comenta Heitor.

As transformações das câmeras

Giroux

Giroux é o primeiro daguerreotipo que foi fabricado em série. Em 1839. Foto: Agência Efe/Reprodução

6 | DOIS PONTOS

Rolleiflex

Leica

Rolleiflex Original, criada em 1929. Uma marca de câmera fotográfica que se transformou em um ícone da fotografia profissional.

Leica, modelo IIIf, de 1950. A empresa alemã nasceu em 1913 e começou fabricando microscópios e binóculos. Em 2011, a imprensa mundial noticiou que uma Leica fabricada em 1923 havia sido leiloada por US$ 1,9 milhão, em uma galeria de Viena, na Áustria.

Foto: Eugene Ilchenko/Wikipédia

Foto: Rei Shinozuka (Rshino)/Wikipédia

Nikon

Nikon uma das câmeras mais populares e conceituadas entre os jornalistas profissionais. Foto: Reprodução

Canon

Canon 5D Mark III, de 2012, é um dos modelos mais modernos de câmeras, que pode inclusive filmar em full-HD. Foto: Reprodução

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Reportagem | Ética

Reportagem | Paparazzi

Princípios e escolhas

Odiados ou amados. Polêmicos!

Alguns profissionais de comunicação têm que optar entre um furo jornalístico e a preservação da vida humana

Por Fernando Santos

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m 1993 no Sudão, Kevin Carter, um fotógrafo que nasceu em Joanesburgo, fez uma imagem que mudou a sua vida. O retrato em questão trata-se de uma criança famélica no chão e, ao seu lado, um urubu espreita, esperando a morte do pequeno para poder devorá-lo. A foto foi vendida para o jornal The New York Times e publicada em 26 de março de 1993. Posteriormente, circulou o mundo nas páginas de outras publicações. Em abril de 1994, foi vencedora do Prêmio Pulitzer de Fotografia. A imagem feita no Sudão teve grande repercussão e muitas críticas. Sempre que questionado sobre o assunto, o profissional contaReprodução/New York Post

Jornal publica foto de homem minutos antes de um atropelamento e gera questionamentos éticos mundo afora

A

Por Fernando Santos va uma versão diferente dos fatos e dizia que não precisava fazer nada porque havia um centro de alimentos próximo dali. Outra vez, contou que afugentou o animal e a criança se levantou sozinha. Fato é que meses depois, o fotógrafo acabou se matando em julho de 1994. Kevin Carter era um dos membros do Bang Bang Club. O grupo recebeu este apelido porque cobriu o período mais violento da África do Sul, entre a libertação de Nelson Mandela (1990) e a sua eleição como presidente (1994). Quase 20 anos mais tarde do episódio no Sudão, em 4 de dezembro de 2012, outro profissional passou por um episódio parecido. Foi Umar Abassi, um freelancer do New York Post. Ele estava em uma plataforma de uma estação do metrô, em New York, esperando um trem para cobrir uma pauta. Neste local havia dois homens discutindo, um deles era morador de rua e acabou empurrando o outro, Ki- Suck Han, nos trilhos. O correspondente fez as fotos e não ajudou o senhor, que acabou sendo atropelado pela composição. A imagem que antecede o momento do atropelamento foi publicada nas páginas do jornal. As duas histórias levantam dúvidas sobre do valor de uma notícia e da vida humana. Quando as duas são colocadas na balança qual prevalece? O próprio Código de Ética dos Jornalistas trata do tema. O artigo 4°, por exemplo, diz que o compromisso fundamental do jornalista é com a verdade no Kevin Carter/Reprodução

Imagem feita em 1993 por Carter no Sudão rodou o mundo, ganhou o Pulitzer e provocou polêmicas sobre os limites da atuação do fotojornalista 8 | DOIS PONTOS

Eles são um tipo específico na profissão: fotógrafos que ganham a vida perseguindo pessoas que estão em evidência na mídia, invadindo a privacidade de celebridades para conseguir imagens exclusivas

relato dos fatos. O profissional deve pautar seu trabalho na precisa apuração dos acontecimentos e na sua correta divulgação. Já o capítulo 3°, item 11, fala que o repórter não pode noticiar informações de caráter mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos especialmente em cobertura de crimes e acidentes. Questionado sobre o assunto, o fotógrafo da revista 02, Ricardo Moreno, deu sua opinião. “É claro que a vida humana vale mais que a notícia, mas a decisão é tomada em segundos, é difícil julgar. O ideal seria fazer as duas coisas. A regra geral do jornalismo diz que nunca se deve interferir nos acontecimentos, mas preceitos existem para serem quebrados”, conclui. Para Monica Aguiar, advogada e professora de ética e legislação na área de comunicação da Universidade São Judas, “o maior bem que existe é a vida humana, logo ela deve sempre ser preservada. As pessoas não podem deturpar isso. O dever do jornalista é relatar a verdade de forma isenta, mas ele também necessita ser um profissional compromissado com a sociedade.” Assuntos como esse sempre são debatidos em simpósios, palestras e em aulas. A ação dos meios de comunicação e dos profissionais nesses casos é sempre colocada em questão. Diversas opiniões surgem a respeito do tema. Mas a pergunta que fica no ar é: “se fosse você, o que você faria?”

Filme narra os dilemas da guerra

A história de Kevin Carter e do grupo denominado The Bang Bang Club foi contada pelo cineasta Steven Silver, em uma coprodução do Canadá e da África do Sul. O filme chegou ao Brasil com o título Repórteres de Guerra.

palavra paparazzo é de origem italiana e se refere ao mosquito que fica em volta da pessoa, provocando aborrecimentos. Esse termo hoje em dia se refere aos repórteres que ficam no encalço das celebridades. A expressão surgiu em 1960, depois do lançamento do filme La Dolce Vita, de Federico Fellini. Na obra, o ator Marcello Mastroianni interpreta um jornalista, Marcello Rubini, que andava sempre com um jovem, chamado Paparazzo, para tirar fotos. O fotógrafo foi interpretado pelo ator Walter Santesso. Os dois cobriram a visita da atriz Sylvia Rank (Anita Ekberg). Paparazzi é o plural de paparazzo. Esses profissionais vivem uma relação de amor e ódio com os seus fotografados. Muitos fazem questão e até facilitam para serem “clicados”, enquanto outros evitam o contato com eles. Muitos desses fotógrafos acabam extrapolando e passam a caçar os artistas, fazendo verdadeiras perseguições. O caso mais famoso, que simboliza bem o abuso, aconteceu no dia 31 de agosto de 1997, em Paris. A princesa Diana sofreu um acidente de carro junto com seu namorado Dodi Al-Fayed e ambos morreram na colisão. Os dois tentavam fugir de um grupo de paparazzi que estava seguindo o casal. O episódio provocou grande indignação da sociedade. O professor de fotografia e editor da revista Istoé Gente Juca Rodrigues fala um pouco sobre o trabalho desses fotógrafos. “Olha, não é nada fácil ser um paparazzi. Necessita-se de muita paciência e os contatos certos. Muitos famosos reclamam quando são clicados em situações amorosas ou inusitadas em lugares públicos. Mas existe o outro lado: se o assunto é particular, que seja feito então em local privado. Muitas vezes, esses profissionais são tratados como marginais por boa parte da sociedade, mas na verdade eles apenas fazem o seu trabalho, se não tivesse demanda, esse tipo de correspondente nem existiria”, afirma. No Brasil, a maior fatia desses fotógrafos está no Rio de Janeiro. Muitos são contratados de sites, agências, revistas e televisão, outros são freelas. Na “cidade maravilhosa” o principal o foco deles, é o Projac (Central Globo de Produção) e as praias de Ipanema e Leblon. Na hora do almoço e jantar, o melhor lugar é a Rua Dias Ferreira, que é repleta de restaurantes e bares da moda. Lá é o recanto das celebridades. Outro caso de grande repercussão envol-

vendo paparazzi foi o da apresentadora Daniela Cicarelli, que foi fotografada e filmada, enquanto mantinha um momento íntimo com seu namorado em uma praia. O casal processou os veículos que divulgaram as imagens. O fotógrafo da revista Veja, Heitor Feitosa, também comentou o assunto: “Onde eu trabalho as notícias mais lidas geralmente são sobre celebridades e suas extravagâncias, ou sobre algo banal como fulana toma sol na praia de Copacabana com novo affair.

Os paparazzi não são bem remunerados e estão sujeitos a processos e agressões físicas. Porém é um trabalho como qualquer outro e merece ser respeitado”, conclui. A demanda por esse tipo de foto não diminuiu apesar de qualquer pessoa fazer imagens e divulgar na internet, vender para algum site, revista, jornal ou agência especializada. Com a popularização das mídias digitais, esses profissionais da imprensa têm cada vez mais espaço. Divulgação

Cenas do filme La Dolce Vita nas quais o personagem Paparazzo está em ação

Nas telas do cinema Sem dúvida, o filme de Frederico Fellini, La Dolce Vita, é uma obra clássica que aborda o jornalismo de celebridades. Mas o cineasta italiano não foi o único a tratar do tema. O diretor estadunidense Woody Allen fez, em 1998, a comédia Celebrity.

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Resenha | Destaque

Reportagem | Perfil

“Tira a foto, Chico!”

O estilo e a estética

Conheça a história do fotógrafo da Igreja Mundial, Eduardo Pinto, o “Chico”. Um profissional que já passou pela Folha de S.Paulo, Estadão, Notícias Populares e hoje trabalha ao lado do Apóstolo Valdemiro Santiago fotografando tudo que acontece com o religioso

Por Rafael Barbosa

Por Rafael Barbosa

Trabalho de jornalismo? Que legal! O que eu puder ajudar é só falar! Estamos aí!”, disparou o fotógrafo ao ouvir o meu pedido para entrevista. A Igreja Mundial do Poder de Deus é o local de trabalho de um homem de 49 anos que já fez fotos sangrentas no jornal Notícias Populares. Durante anos foi freela para jornais paulistas e cariocas. Sua relação com o mundo da fotografia começou de forma inusitada: ele segurava placas convidando transeuntes a tirar foto 3x4. “Chico”, que na verdade se chama Eduardo Pinto, é paulista, formado em jornalismo pela faculdade de Mogi das Cruzes, mas prefere “escrever com as fotos”. Gosta de animais, anda de skate no Parque do Ibirapuera e se considera um piloto frustrado de helicóptero. Edu, como gosta de ser chamado, começou sua carreira cobrindo festas e eventos para o jornal Diário de Guarulhos. Anos depois, começou a fazer fotojornalismo policial no impresso Folha Metropolitana. “Eu não tinha um segmento específico, meu chefe falava: Edu, caiu um prédio, vai! Edu, incêndio em tal lugar, vai! Até que abriram uma editoria de jornalismo policial e eu comecei a fazer matérias”. Enquanto conversávamos, com um notebook no colo, Edu entrava e saía de suas pastas de imagens para me mostrar o seu trabalho. “Calma, quando eu acabar de te passar as fotos, a entrevista vai fluir!”, fala o fotógrafo num tom humorado. Lugares diversos Edu, que já chegou a fotografar a lua todas as noites de sua janela, por um período trabalhou no jornal Notícias Populares, um veículo que seguia uma linha sensacionalista. “A minha entrada para o NP foi quando um amigo me acordou durante a madrugada para cobrir um caso com ele. Dirigindo pela marginal com muita pressa, ele foi me contando que um avião tinha caído e a bordo estava o grupo Mamonas Assassinas. Todas as fotos que eu tirei, uma mais forte que a outra, foram parar no NP”, relembra Edu. Após o acidente, Edu continuou trabalhando para a Folha Metropolitana, em Guarulhos, mas o vínculo com o jornal popularesco aumentou. “Eu fazia dois tipos de fotos, com sangue e sem sangue, imagens que a Folha Metropolitana jamais iria publicar eu passava para o NP”, comenta o profissional. 10 | DOIS PONTOS

Depois de algumas experiências com o jornalismo convencional, Edu começou a fazer freelas nos cultos da Igreja Mundial em 2004. Em quase dez anos, ele já passou por vários países do mundo com o seu patrão, Valdemiro Santiago, cobrindo as viagens missionárias do sacerdote. Enquanto o religioso ministra suas reuniões, Edu circula pelo altar sempre procurando a melhor foto, ouvindo a famosa frase de Santiago: “Cadê o Chico? Tira aí a foto Chico!”, já que os fiéis

insistem em levar a recordação fotográfica para casa com o fundador da Igreja Mundial. “Foi o Apóstolo que me colocou o apelido de Chico, ele acha que eu sou parecido com o Chico Buarque de Hollanda”, comentou rindo. “Estou lá não porque eu sou o melhor, é porque realmente a gente se deu bem, surgiu uma intimidade. Hoje eu já sei pelos olhares dele quando é ou não para fotografar. Conheço a ‘peça’, né! E, sinceramente, não pretendo sair daqui tão cedo!”.

Eduardo Pinto

Uma multidão de fiéis ouve Valdomiro Santigo e Edu registra todos os momentos

Arquivo pessoal

O

livro Sobre Fotografia não é de uma autora apaixonada por fotografia que resolveu expor suas experiências. Susan Sontag, além de escritora, foi filósofa, ativista, cineasta e intelectual americana. Sua trajetória é marcada por influência em causas políticas e feministas e suas obras foram traduzidas em mais de 30 línguas. Vítima de leucemia, Sontag faleceu em 2004. A obra retrata seis ensaios escritos na década de 1970 na intenção de analisar a fotografia como fenômeno da civilização desde o momento em que surge o daguerreotipo, no século XIX. Dentre os seis capítulos, aquele que merece um destaque é o capítulo dois, intitulado “Estados Unidos, visto em fotos, de um ângulo sombrio”. Susan levanta a discussão sobre as fotos belas, aquelas que se preocupam em mostrar uma humanidade feliz e tranquila com tons de hipocrisia. Enquanto no século XX nos Estados Unidos surgem as imagens bizarras, grotescas, feias que

mostram a verdadeira realidade da civilização e começam a ser o campo de trabalho de inúmeros fotógrafos. De uma forma argumentativa, a escritora sugere a comparação entre o feio e o belo utilizando como exemplo os estilos fotográficos de alguns profissionais como Alfred Stielglitz, Edward Steichen e principalmente de Diane Arbus, a profissional que viajou pelos EUA em busca do bizarro, explicitando que a sociedade não é feliz. A obra é interessante do início ao fim e para os amantes do fotojornalismo, ler Sobre Fotografia é quase uma obrigação. Susan Sontag desenvolve todo o seu conhecimento e paixão por fotografia nesta obra exemplar. Ela escreveu capítulos geniais como esse que aborda o estilo de Diane Arbus. Susan Sontag destaca a determinação e a coragem de Diane que sempre evitou o convencional. Viajou pelos EUA fotografando o horror, o feio e o grotesco. Imagens que ninguém desejava apreciar na época e que revolucionaram o modo de tirar fotografias em plenos anos 1960.

Estante fundamental O Instante Contínuo, de Geoff Dyer (Companhia das Letras) “Com uma linguagem simples e acessível, fala sobre fotógrafos famosos da história. Há espaço para abordagem de casos amorosos e picuinhas entre os fotógrafos que ajudaram na formação profissional de várias pessoas.” Juca Rodrigues, jornalista formado pela Cásper Líbero, professor na Universidade São Judas e Editor de núcleo de fotografia da revista IstoÉ.

Edu em um dos seus cliques pela Igreja Mundial

Serviço Sobre fotografia, de Susan Sontag (2004) Companhia das Letras

Fotografia e jornalismo: a informação pela imagem, de Dulcilia Buitoni (Saraiva) “Para quem deseja começar a estudar o fotojornalismo, esse livro é essencial. A autora faz uma precisa reflexão sobre os caminhos da fotografia no mundo jornalístico, dos tradicionais veículos impressos ao vasto mundo da internet.” Alexandre Ofélio, jornalista formado pela São Judas e repórter do Blog Mural.

A câmara clara, de Roland Barthes (Nova Fronteira)

Fotografia e História, de Bóris Kossoy (Ateliê Editorial)

“Barthes discorre sobre a criação da foto até as suas representações contemporâneas. Ele escreve: ‘A fotografia é um certificado de presença e um testemunho seguro’. Necessidades básicas para um jornalismo com credibilidade.”

“Kossoy é um grande pesquisador da fotografia e esse livro é o retrato da competência e do amor que ele tem pela profissão. Tenho um respeito enorme pelo seu trabalho e é uma obra de total apoio intelectual para os futuros jornalistas.”

Rogério Ota, professor de Publicidade/ Propaganda e RTV na Universidade São Judas.

Erivam de Oliveira, Mestre em Ciências da Comunicação pela USP e professor na ESPM/SP. DOIS PONTOS | 11


Crônica | Relato poético

O fotógrafo justiceiro Por Karina Silva

O

“Doutor” Alexandre Cavalcante controlava o Jornal Gazeta da Cachoeira Grande com mãos de aço. Todos os textos e, principalmente, as imagens tinham que passar por ele antes do fechamento oficial do jornal, para não ter o risco de ir para a gráfica com alguma matéria que ele não tivesse previamente autorizado, como alguma denúncia de uma das inúmeras falcatruas que ocorriam na gestão de seu pai na Prefeitura de Cachoeira Grande. Todos na redação seguiam suas vontades e suas ordens, com uma exceção, havia uma pessoa no jornal que evitava a todo o custo se subordinar completamente ao filho do prefeito, seu nome era André Furtado, o fotógrafo. André havia se mudado há menos de seis meses para a cidadezinha do in-

O jovem tinha um espírito revolucionário e indomável

12 | DOIS PONTOS

terior trazendo consigo um amor pela fotografia, que mal cabia no peito e no restante do corpo. Sentimento herdado do falecido pai. O jovem, que tinha um espírito revolucionário e indomável, já

havia prometido a si mesmo que não aceitaria mais as censuras descabidas movidas a interesses políticos do filhinho do Prefeito, pois sentia que estava compactuando com todas e mais que escancaradas sujeiras que o Prefeito encobria porcamente, por controlar o principal meio de comunicação da cidade, o jornal. Com mais de trinta e cinco imagens censuradas, em menos de dois meses, André batia o recorde na redação. Desde sua entrada no jornal, o “Doutor” Alexandre já o olhava com olhos tortos e famintos para devorá-lo com uma abocanhada só. Mas se segurava deixando a saliva se esvair pela boca, por André ser o único fotógrafo da cidadezinha. Isso não o impediu de colocar na cabeça a ideia fixa de fazer André se dobrar aos seus caprichos. Tanto que passou da conta, não bastava censurar o rapaz, ele tinha que o humilhar e mandou o jovem cobrir a festa de debutante de sua filha. André e sua câmera eram como unha e carne, arroz e feijão, ou seja, parceiros inseparáveis. Ele a levava até mesmo para o banheiro, não a privava de nenhum momento de sua vida, até na hora H a câmera estava presente, ele acreditava que a máquina de fotografia era sua inspiração e excitação literalmente, para viver. Na festa de debutantes o fotógrafo observava tudo para encontrar algo que comprometesse o Prefeito, mas não tinha sucesso. André já estava desistindo de encontrar uma imagem que pudesse comprometer o Prefeito e sua corja, que superava os 40 ladrões de Ali Babá, quando ouviu gargalhadas vindas de uma sala que parecia ser uma biblioteca. Ele aproximou-se lentamente, flagrou o Prefeito em êxtase com duas malas abarrotadas de dinheiro. André rapidamente fotografou a cena e escapuliu do local sem ser visto. No dia seguinte, uma manchete “Senhor Prefeito, que grana é essa??” com a imagem da cena comprometora circulou o país. Alexandre postou a foto no seu blog e no instagram, já que o jornal jamais revelaria o episódio. Foi a consagração do fotógrafo!


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