Fascículo 23 jornalismo&artes

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FASCÍCULOS DE JORNALISMO - COMPREENDER A PROFISSÃO

Jornalismo & Artes Música, cinema, literatura, pintura, teatro, beleza, estética, crítica, informação, entretenimento... Você aprecia o mundo das artes? Então, entre neste fascículo. Venha conhecer os detalhes da imprensa que cobre esta área: a opinião de importantes profissionais, a história de grandes veículos e as tendências do mercado de trabalho para futuros jornalistas


Apresentação | Caro leitor

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Expediente

Mundo, vasto mundo fascículo Artes apresenta aos estudantes de jornalismo uma abrangente apuração sobre o jornalismo cultural e a produção noticiosa da área artística. Você vai ler reportagens sobre diversos setores do jornalismo voltado à arte. Jornalistas relatam suas rotinas nas redações, estudiosos falam sobre suas pesquisas e alguns profissionais explicam como está o atual mercado de trabalho. Além disso, preparamos dicas sobre quais veículos seguir na internet, meio impresso, rádio e televisão. O jornalismo cultural é conhecido como uma forma de difundir produtos da área artística e de entretenimento nos veículos de comunicação. Com o advento da internet, as tradicionais publicações impressas começam a perder espaço para sites e blogs especializados, algo que interessa aos jovens e interessados em arte. O leitor desenvolverá um olhar crítico ao conhecer o conteúdo do fascículo, que traz uma matéria exclusiva sobre o fim da revista Bravo!. Veja também detalhes de como é a rotina de redação do Caderno 2 do jornal O Estado de S. Paulo.

Seção | Depoimento “Estude antes de começar a cobertura” “Sou Fernanda Emmerick, tenho 25 anos, sou jornalista e atualmente faço pós em jornalismo cultural. Essa área me encanta, pois consigo ler ou escrever sobre conteúdos enriquecedores, que me proporcionam embasamento para argumentar e entender povos e seus países, momentos históricos e suas relações com a pintura, arquitetura, literatura, moda e cinema. A cultura está em tudo e em qualquer lugar, desde sua versão mais simples até a erudita. O fato de a cultura ser a raiz de tantas questões e de ser o que diferencia o homem de outras espécies é um impulso para estudá-la e conhecer melhor seus movimentos na sociedade. Atualmente esse campo é pouco explorado. Infelizmente, o tempo que as pessoas dedicam à leitura é cada vez menor, e as “notinhas” e dicas breves ganham cada vez mais espaço. Algumas revistas, como a Piauí, por exemplo, ainda investem em textos mais densos e informativos, porém isso é raro. Graças à internet, é possível acompanhar edições especiais e projetos, além de blogs nos quais os jornalistas ou especialistas da área escrevem com mais liberdade. Minha primeira sugestão é que o jornalista saiba do que está falando, ou pelos menos estude antes de começar a cobertura. Escrever sobre produtos ou movimentos culturais requer um conhecimento mais amplo sobre o tema abordado e até mesmo seu contexto social e histórico é válido que essas coberturas sejam abrangentes. No meu cotidiano gosto de ler a revista Cult e Livraria Cultura, adorava ler a Bravo!, ela foi uma grande perda para o jornalismo e acredito que não irá existir outro veículo do mesmo nível. Em casos mais específicos, indico as críticas de arte da revista IstoÉ e a editoria de cultura da Harper´s Bazaar Brasil. Pela internet e iPad acompanho a revista Bula, a Amarelo Magazine, B.Coolt, Colherada Cultural e edições estrangeiras de jornais e revistas - como o The Guardian, a Architectural Digest e Vogue, que possuem dicas mais descoladas sobre arte moderna.” Depoimento apurado pela repórter Raíssa Germano

2 | DOIS PONTOS

Chanceler Alzira Altenfelder Silva Mesquita Reitor José Reinaldo Altenfelder Silva Mesquita Pró-reitor de Graduação Luis Antônio Baffile Leoni Pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Alberto Mesquita Filho Pró-reitoria de Extensão Lílian Brando G. Mesquita Diretor da Faculdade de LACCE Rosário Antonio D’Agostino Coordenação do Curso de Jornalismo Anderson Fazoli

Dois Pontos é um projeto experimental dos alunos de jornalismo (3ACSNJO e 3MCSNJO), desenvolvido na disciplina Jornalismo Impresso, em 2013. Orientação e Coordenação editorial Profa. Jaqueline Lemos (MTB 657/GO) Revisão Prof. Daniel Paulo de Souza Diagramação Alexandre Ofélio (MTB 62748/SP) Redação Editora assistente Bruna Molina (RA: 201107544) Repórteres Bruna Porto (RA: 201110075) Luana Figueiredo (RA: 201110213) Raíssa Germano (RA: 201102343) Renata Figueiredo (RA: 201008901) Capa Ilustração de Renata Figueiredo

Pingue-Pongue | Luís Roberto Amabile

“Jornalistas têm que ter um olhar reflexivo” Luís Roberto Amabile minimiza poder da indústria cultural e fala sobre como o profissional pode se reinventar na cobertura do mundo das artes

Por Bruna Porto A cobertura no jornalismo cultural se reflete numa necessidade de não se sujeitar completamente à indústria cultural, no sentido de não cobrir apenas o que as assessorias das grandes editoras, distribuidoras de filme e produtoras de teatro divulgam”. Assim pensa o jornalista Luís Roberto Amabile. Ele defende que o profissional da imprensa pode recriar a cobertura jornalística de artes e cultura. Luís Roberto é mestre em Teoria da Literatura / Escrita Criativa pela PUC/RS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul). Atualmente é doutorando na mesma instituição. Foi repórter nos jornais Folha de S.Paulo, Estadão e na Editora Abril. Teve contos publicados em antologias no Brasil e em Portugal. É autor de O amor é um lugar estranho (Grua Livros, 2012).

Dois pontos: Qual é o papel da cobertura jornalística cultural? Luís Roberto Amabile: Cito Claudio Abramo em A regra do Jogo. Logo no início do livro ele diz que a ética do jornalista é a ética do cidadão. Assim como a ética do jornalista é a mesma do cidadão, o papel da cobertura de artes e cultura é o mesmo papel da cobertura de qualquer área do jornalismo: informar de modo rigoroso e honesto, mediar os debates da sociedade, fiscalizar as instituições. A cobertura no jornalismo cultural se reflete numa necessidade de não se sujeitar completamente à indústria cultural, no sentido de não cobrir apenas o que as assessorias das grandes editoras, distribuidoras de filme, produtoras de teatro, por exemplo, divulgam. Os jornalistas não podem aceitar os releases passivamente, têm que ter um olhar reflexivo. Não se pode ficar antenado apenas com o que vem de fora e esquecer o que está no Brasil. Dois pontos: Como os profissionais da área devem atuar diante das tecnologias que o cercam? Luís Roberto: O avanço mais significativo, hoje, é a informação disponível, as manifestações artísticas podem ser divulgadas facilmente. Então, muda o papel do profissional, ele tem de selecionar o que considera relevante entre muito mais fontes. O jornalista atual deve estar preparado para falar de artes, conhecendo o assunto, lendo livros teóricos, mesmo que sejam os mais básicos. Dois pontos: A cobertura jornalística de cultura e artes é elitizada? Qual é o espaço dado para quem não pertence a esse universo? Luís Roberto: Mais do que elitizada, me parece a serviço da indústria cultural. Relem-

Divulgação

bremos Theodor Adorno e Max Horkheimer. Eles diziam que há um grupo dominante, a elite, os que detêm o poder, sobretudo econômico, que impõe padrões para formar uma percepção estética comum voltada ao consumismo e ao controle social. Isso pode ser visto numa redução de pautas a uma agenda de lançamento, que é controlada por quem tem dinheiro para pagar assessoria de imprensa, mandar brindes para os jornalistas ou fazer propagandas nos jornais. A cobertura de artes no jornalismo cultural deve ir além dessa agenda. Dois pontos: Sobre o fechamento de revistas voltadas para artes, por quais motivos isso tem ocorrido? Luís Roberto: As revistas fecharam e tendem a continuar fechando porque a imprensa escrita e publicada em papel está em crise. As grandes editoras são empresas, querem aumentar o lucro, sobretudo não querem ter prejuízo. A lógica é capitalista, se os custos de impressão, distribuição e equipe não compensarem em relação à venda de anúncios e à venda em banca, os empresários fecham as revistas. A crise está instalada na imprensa de todo o mundo. Gregos e troianos dizem

Luís Roberto recomenda que os jornalistas não aceitem releases passivamente que a mídia tradicional precisa se reinventar. Eu também digo. Mas qual o caminho? Seguir investigando e apostando. O mesmo vale para os empresários da comunicação.

“Hoje as manifestações artísticas podem ser divulgadas facilmente. Então, muda o papel do profissional, ele tem de selecionar o que considera relevante” DOIS PONTOS | 3


Reportagem | História

Reportagem | Rotina

Bravo! e adeus

Nos bastidores das artes e entretenimento

Por Renata Figueiredo

Por Raíssa Germano

Poucos títulos resistiram tão bem às modificações do jornalismo e mesmo assim certamente estarão perpetuadas na memória dos leitores e interessados em arte

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Reprodução

ão é preciso uma avaliação crítica para chegar à conclusão que 2013 foi um ano de perdas para o jornalismo e mídia em geral. Entre tantas revistas existentes nas bancas do país, em uma só cartada a editora Abril resolveu encerrar a circulação de quatro delas. E nesse meio estava uma das poucas que se arriscava a falar de arte em geral, sempre priorizando a análise em suas pautas. A Bravo! teve o seu fim decretado em agosto de 2013. Ela surgiu a partir da morte da revista República em 1997, criada por Felipe D’Avila, dono da editora D’Avila. A proposta era falar de cultura, mas de uma forma aprofundada. O nome Bravo! foi registrado pelo falecido jornalista Luis Carta, porém foi seu filho Andrea que deu a autorização para o seu uso. A lenda diz que Felipe conseguiu patrocínio para um ano da publicação sem mesmo apresentar um projeto de criação. Apesar do pouco tempo para a sua concepção, ela continha cinco edições detalhadas com uma sofisticada diagramação, tudo organizado pela editora de arte Noris Lima, que junto com o editor de fotografia Edu Simões e o editor Wagner Carelli foram responsáveis pelo que viria a ser a Bravo!. Em 2003, a empresa D’Avila passaria por uma mudança crucial que definiria o destino de sua criação. Depois de problemas financeiros, por meio de um acordo quase secreto, o título, foi vendido para Roberto Civita,

As capas da revista Bravo! eram fortes e impactantes. A derradeira edição que foi às bancas trouxe o escritor José Saramago em destaque (agosto/2013) 4 | DOIS PONTOS

então no comando Editora Abril. Contudo, Felipe continuou a trabalhar na equipe. Três anos depois, a Abril ficou responsável oficialmente pela publicação devido à saída de Felipe. Ao longo dos anos, a revista passou por diversas modificações em sua estrutura. Houve algumas mudanças no corpo de editores e uma reestruturação no modelo, que passou de 144 páginas para 98 páginas. Em 2011, o jornalista Armando Antenore ficou responsável pela edição. Com um grupo cada vez mais enxuto, chegou a ter nos seus últimos dias apenas cinco pessoas na equipe, com uma boa parte das matérias sendo feitas por colaboradores externos. “Na reunião de pauta, todos tinham voz, as matérias nasciam da redação, sempre com uma atenção especial para o tratamento gráfico. Às vezes a reportagem era incrível, mas não rendia uma boa edição visual. Tínhamos que conciliar as duas coisas”, destaca Thiago Bollota, ex- editor de arte da Bravo! A revista focava principalmente a agenda cultural brasileira, concentrando-se nos estado do Rio de Janeiro e de São Paulo, com um processo de produção que durava quatro semanas. Na primeira semana era feita a reunião de pauta, na segunda a produção do conteúdo, na terceira o fechamento do material impresso e na última a adaptação para os tablets. Mas em 2013, a publicação, que era referência no jornalismo cultural, com um prêmio especializado, não suportaria a crise que se instalava nos meios impressos. O falecimento de Roberto Civita serviu apenas como o empurrão final para o encerramento de sua circulação nas bancas. “Ela não rendia muito. Não se via retorno financeiro, mesmo com a ajuda da Lei Rounet. Era um produto de preço elevado, seu formato era diferente, o papel usado era caro e principalmente falava de assuntos que não eram de massa. Por muitos anos ela foi bancada pela Editora Abril. Civita acreditava que a empresa tinha que ter um título como esse, mesmo com todas as dificuldades. Mas apesar disso durou 16 anos, poucas publicações focadas em cultura duraram tanto tempo”, explica Antenore.

Shows, eventos, peças de teatro e exposições. Correria, fechamento, informação e análise. Assim é a rotina dos jornalistas do Caderno 2 do jornal O Estado de S. Paulo

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mbiente descontraído, mesas desorganizadas e profissionais inquietos. Alguns deles com os olhos fixos na tela do computador, outros caminham de um lado para o outro com celulares e agendas nas mãos, pois o tempo é curto e o jornal precisa chegar para o leitor no dia seguinte. É assim a rotina do Caderno 2, criado há 25 anos, para atrair o público jovem com um jornalismo moderno e inquieto voltado para assuntos de arte, cultura e lazer. Mas antes de o jornal ser impresso ou as matérias serem lançadas nas diversas plataformas, existe um longo caminho a ser percorrido, que começa às 9h30 em uma pequena sala de reuniões, onde os editores de todas as editorias do jornal debatem as principais pautas do dia. Depois de aprovado o que sairá no Caderno 2, os repórteres chegam à redação entre 11h30 e 12h, recebem seus roteiros, conforme sua seção e seu setor, que são divididos entre três grandes áreas: teatro, cinema e música. Um espaço que já abrigou um time maior de jornalistas agora pode acomodar todos eles em duas baias, cheias de livros e materiais para estudos. “Ao todo, o núcleo de cultura conta com cerca de vinte profissionais, sendo eles oito repórteres, cinco colaboradores e pauteiros, o subeditor João Sampaio e o editor Ubiratan Brasil”, descreve Julio Maria, repórter do Caderno 2.

Ao longo do dia, os repórteres entram em contato com diversas fontes. Ou eles vão para a rua colher informações, ou ligam e conversam pelo telefone para sanar dúvidas e fazer questionamentos. Ao longo do dia, estão alertas e em comunicação constante para manter a equipe atualizada de tudo o que acontece. É uma rotina estressante com hora marcada para terminar: 19h. Nesse horário, todas as matérias devem estar prontas para serem impressas, ao passo que as demais editorias do jornal têm deadline por volta das 21h. Mas, eventualmente, podem surgir pautas fora do horário do expediente. Assim, a longa jornada tem horário apenas para começar, mas nunca para acabar, pois em um jornal diário basta alguma coisa acontecer fora do previsto para tudo ser mudado e atualizado. Além das notícias cotidianas sobre artes, é preciso cobrir novas peças de teatro, exposições e shows que, em sua maioria, acontecem aos fins de semana. “Nos dividimos confor-

me a disponibilidade de cada um, e isso não quer dizer que a pessoa que escreve sobre música não possa colaborar com teatro. Nos adequamos de acordo com a necessidade”, relata Julio. Aos fins de semana, o Caderno 2 é editado pelo subeditor João Sampaio e é composto pela agenda cultural. Aos domingos, as edições têm reportagens especiais com layout mais refinado. O Estado de S. Paulo não disponibiliza nenhum curso especializado na área de cultura, porém oferece cursos de ortografia, língua portuguesa e outros. Julio conta que não é possível conciliar uma rotina de trabalho maçante com uma especialização. “Conheço poucos da editoria que fizeram pós-graduação na área. Não é uma exigência do Estadão”, declara o jornalista. Apesar de toda pressão imposta aos profissionais e o pouco tempo para apuração e finalização da matéria, típico da profissão, os jornalistas que trabalham no núcleo afirmam que gostam da área, pelo prestígio dentro do meio cultural e pela oportunidade de ir a diversos eventos e exposições. “O Caderno 2 possui enorme alcance e respeito de quem gosta de cultura. Ele é quase um veículo próprio e, além disso, preza pela experiência. Entrei com apenas 21 anos e lembro-me de ter sido bem estimulada, afinal, não se faz crítica ou cobertura sem ter o conhecimento prévio sobre o que se escreve”, afirma Flávia Guerra, há 14 anos no Caderno 2.

Raíssa Germano

Reprodução

É uma rotina estressante com hora marcada para terminar

Equipe da redação do Caderno 2 d’O Estado de S. Paulo

Capa do Caderno 2 d’O Estado de S. Paulo, uma das edições de novembro/2012 DOIS PONTOS | 5


Reportagem | Olhar Crítico

Reportagem | Mercado de Trabalho

Vazio insubstituível

Momento de transformação

A pesquisadora Elizabeth Lorenzotti conta em livro a história de uma das maiores referências do jornalismo cultural

Jornalistas falam sobre as tendências da área e mostram como as mudanças da sociedade influenciaram a profissão

Por Luana Figueiredo

Por Bruna Molina

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o dia 6 de outubro de 1956, era veiculado pela primeira vez o Suplemento Literário, do jornal O Estado de S. Paulo. O caderno foi um verdadeiro marco na história da imprensa cultural do Brasil, era exaltado e almejado por críticos e artistas da época. Lá, eram divulgadas obras dos melhores artistas e textos inéditos de Lygia Fagundes Telles e Carlos Drummond de Andrade. No Suplemento não havia prioridade para o velho ou para o novo, ambos tinham espaços cativos nas páginas do periódico. Em 2003, quarenta e sete anos após o lançamento do Suplemento, que deixou de exis-

O Suplemento Literário é um marco na história da imprensa cultural no Brasil

tir em 1967, era concluído o livro Suplemento Literário – Que falta ele faz!, escrito por Elizabeth Lorenzotti e publicado, quatro anos mais tarde, pela editora Imprensa Oficial. A obra era, inicialmente, uma dissertação de mestrado em Ciências da Comunicação (na Escola de Comunicação e Artes da USP), orientada pelo professor Dr. Jair Borin, que faleceu antes da defesa da dissertação que Elizabeth elaborou. A sugestão de produzir uma dissertação sobre o Suplemento Literário partiu de Borin. Elizabeth, por sua vez, abraçou a ideia e optou por levantar dados que consolidassem a importância histórica do Suplemento Literário para a imprensa brasileira. “Imaginei que havia muitas pesquisas sobre, mas não havia. Apenas uma ótima monografia de Marilene Weinhardt, subsídios para a história à crítica literária no Brasil, de 1987”, conta Elizabeth. “A fonte principal foi o arquivo do Estadão, onde eu trabalhava, o que facilitou minha análise. Primeiro, consultei durante meses todo o acervo do Suplemento Literário desde sua fundação até 1974, período que encerro a pesquisa.”, esclarece a autora do livro. Durante o processo de apuração e captação de informações sobre a publicação, a jornalista se deparou com surpresas. “Entrevistei o professor Antonio Candido, o idealizador do Suplemento Literário, que, por sorte, tinha acabado de achar na sua biblioteca o projeto original, que havia se extraviado. Esse é um documento funda-

Reprodução

Reprodução

mental do livro, porque não existem projetos originais de jornais. Só mesmo um intelectual que sabe a importância das fontes primárias guardaria”, comenta Elizabeth. Em um dos capítulos do livro, a autora defende que a arte nunca mais seria a mesma após o fim do Suplemento Literário, que até então representara o parâmetro de qualidade da cultura na época. Ela diz que a fragmentação do jornalismo tornava-se cada vez mais veloz e segmentado, o que acabava por diminuir gradualmente o espaço para um longo projeto ou estudo intelectual como o Suplemento Literário, que tinha intervenção direta na cultura. Para Elizabeth, arte e cultura fazem parte de uma só indústria, e a mídia tem a obrigação de abrir mentes para novas experiências e, mesmo com a erupção tecnológica, ela não acredita que as facilidades virtuais contribuam para uma tendência superficial no gênero. No livro Suplemento Literário – Que falta ele faz!, Elizabeth escreve o seguinte: “O complemento literário existiu na época histórica certa, no local certo e sob as diretrizes de criadores certos. As velozes transformações do mundo e do jornalismo, entretanto, não comportariam mais a existência de uma publicação dessa natureza, com a tradição da reflexão e da lentidão, dentro do turbilhão permanente de desintegração dos tempos pós-modernos. (Página 72, capítulo ‘O melhor já passou?’).” SUGESTÃO DE LEITURA

Fotos: Google Imagens

Suplemento Literário – Que falta ele faz!, de Elizabeth Lorenzotti, publicado pela Imprensa Oficial do Estado/SP, 2007.

Capas do Suplemento Literário 6 | DOIS PONTOS

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mercado de jornalismo pede atualmente um profissional flexível, que possa trabalhar em diversas as editorias e que consiga falar sobre qualquer assunto com a mesma desenvoltura. Em contrapartida, um jornalista com especialização em alguma área também pode se dar bem, já que ele terá mais capacidade de fazer textos mais elaborados. Com a transição das mídias tradicionais e o encolhimento dos locais de trabalho por conta da crise das editoras, as empresas não conseguem equacionar a mudança que ocorre no setor de comunicação. Hoje em dia, blogs e sites abrem caminho no jornalismo. “As pessoas conseguem trabalhar de qualquer lugar, sem estarem vinculadas a um veículo para serem escutadas”, comenta Umberto Peron, editor da revista Monet. Para o editor, o mercado abre espaço também para quem tem conhecimento específico em alguma área. Os profissionais de comunicação podem fazer o papel de críticos, mas é necessário ter um diferencial. Com a agilização da informação, os textos ficaram uniformes, mais parecidos um com os outros. “Tudo está muito igual atualmente, a gente entra nos sites vê a mesma notícia. Parece que foi a mesma pessoa que escreveu. Então o que faz a diferença para as pessoas é a analise dos jornalistas”, reflete Umberto. Há 20 anos aproximadamente, o acesso às informações era limitado. Isso mudou com advento da internet e nos dias de hoje é possível saber o que acontece ao redor do planeta em segundos. Entretanto, quem escreve precisa se atentar para uma questão: rapidez é diferente de pressa, e isso é fundamental para ganhar credibilidade. Ubiratan Brasil, editor do jornal O Estado de S. Paulo, explica que “o ideal é você informar rapidamente quem ganhou o Nobel da Literatura deste ano, por exemplo, de preferência com detalhes do vencedor, e no jornal ou revista, noticiar com uma análise mais aprofundada, com citações de obras disponíveis e trechos de algum romance importante”. O jornalismo de um modo geral, não somente na cobertura de artes, passa por um momento de transformação, pois a sociedade ainda está com um pé na mídia impressa e outro na digital. “São processos que exigem tempos distintos de maturação e publicação das matérias”, declara Ubiratan Brasil. Umberto fala que as áreas de esporte e cultura eram malvistas, porém hoje estão no

Apesar da unifomização das matérias jornalísticas, os textos opinativos ganham força mesmo nível de todos os outros temas dentro da área jornalística. “Estamos numa era em que as pessoas migram de uma editoria para outra e se dão bem”, declara. “Sobrevive melhor aquele jornalista que tanto tem agilidade para noticiar rapidamente um fato na internet como discernimento para construir um texto mais elaborado para o papel”, esclarece o editor do Estadão. No caso do jornalismo voltado à arte, essa premissa se aplica da mesma maneira. Apesar da uniformização das matérias jornalísticas, algo que toma espaço e ganha força são os textos opinativos. De acordo com o editor da Monet, quem faz uma especialização tem mais base para falar sobre determinado assunto, isso é um diferencial. No caso de cultura e arte, tem a área de cinema, que – embora esteja em crise de roteiros, com diversos remakes sendo feitos ultimamente – precisa de profissionais capacitados e especializados no assunto para poder falar sobre isso. Umberto diz que “além da especialização na área, a pessoa tem que ver muitos filmes, ler sobre eles e pesquisar para poder ter embasamento”.

Jota Martins

DOIS PONTOS | 7


Seção | Sugestões & Dicas

Para ler Zupi

Cult

Revista bimestral de arte contemporânea. Compreende desde artes plásticas até o graffiti. Pode ser encontrada na Livraria Cultura e em galerias de artes.

Revista mensal. É um dos maiores magazines de literatura e filosofia do Brasil. É distribuída pela Editora Bregantini.

Ilustrada – Folha de S. Paulo Circula diariamente e traz vasta cobertura de artes, cultura e espetáculos, abrange inclusive o entretenimento.

Para navegar

Colherada Cultural colheradacultural.com.br

Obvious obviousmag.org

Canal Urbano canalurbano.com.br

Canal de opinião sobre a cultura, na visão das mulheres. São feitas críticas, comentários e textos independentes.

Fala sobre arte, arquitetura, música, fotografia, cinema, design e qualquer outro assunto que seja de interesse do seu público.

Portal que fala sobre cultura e entretenimento, ambos voltados para o público urbano jovem.

Para assistir

Programa Arte 1 em Movimento – Canal Arte 1

Programa Bis Docs – Canal Bis

É uma revista eletrônica semanal que fala de manifestações artísticas deste artes visuais até música e literatura.

É um programa com documentários sobre a história de artistas da música brasileira.

Metrópolis – TV Cultura É um programa dedicado especialmente a discussão de tudo o que acontece no mundo da arte e cultura.

Para ouvir Alpha Ilustrada – Alpha FM É uma boa dica para quem gosta de ouvir canções que marcaram época. Seu setlist mescla clássicos com músicas atuais. 8 | DOIS PONTOS

Radar – Nova Brasil FM É uma rádio moderna que valoriza a Música Popular Brasileira (MPB). O veículo promove e consagra novos e velhos artistas.

Rádio Metrópolis – Cultura FM Apresenta o melhor da cultura erudita. A música clássica, como a ópera e o jazz, estão presentes na programação.


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