Fascículo 24 jornalismo&moda

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FASCÍCULOS DE JORNALISMO - COMPREENDER A PROFISSÃO

Jornalismo & Moda Manequim, boneco, tendência, desfile, croqui, passarela, modelo, estilista, informação, estilo... Você está antenado com a moda? Então, entre neste fascículo. Venha conhecer os detalhes da imprensa que cobre esta área: a opinião de importantes profissionais, a história de grandes veículos e as tendências do mercado de trabalho para futuros jornalistas


Apresentação | Caro leitor

Expediente

O glamour e os detalhes

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fascículo Moda apresenta aos estudantes de jornalismo uma viagem ao mundo das tendências e uma entrevista exclusiva com a jornalista de moda Erika Palomino, que conta sobre sua carreira, inspirações e como tudo começou – o que a levou a atuar em uma área tão disputada no Brasil. É possível conferir uma viagem pela redação da revista Elle, como é a rotina de trabalho e como surgem as pautas. Aqui você pode também conhecer a história da revista Vogue, uma das mais marcantes encontradas hoje no mercado, que traz os mais importantes desfiles e tendências. E não é só de desfile que vive a moda. Você encontrará neste fascículo uma reportagem sobre a crítica, a feminilidade e a arte do jornalismo de moda. Se quiser atuar nesta área do jornalismo, pode saber quais são as tendências de mercado. Por fim, sugerimos publicações para ler, navegar, assistir e ouvir. Existem diversos programas voltados apenas para esse fim, com dicas e novidades. É só escolher e aproveitar. Boa leitura!

Seção | Depoimento “Não é apenas aparência” “Meu nome é Carolina Caprioli, tenho 19 anos, sou estudante de jornalismo. O que me conquista de verdade nas revistas de moda é que elas criam uma relação de amizade com os leitores. O conteúdo das publicações sempre conta com dicas para vestir e sentir-se bem, fotos das famosas para que possamos nos inspirar, o dia a dia das blogueiras e diversos outros fatores que acabam nos inserindo, de alguma forma, nesse universo tão incrível que é a moda. Eu gosto muito das revistas Elle, Glamour e Vogue. Ainda que algumas pessoas cultivem certo preconceito e insistam em achar que esse segmento é uma área fútil, não é. As publicações não apenas exibem ou ostentam os itens dos outros, de pessoas de grande poder aquisitivo. Algumas nos ensinam a montar um look muito parecido com o usado por uma atriz americana, mas com peças mais baratas. A moda não é apenas aparência, ela fala muito sobre a personalidade de cada um. E as revistas do ramo não alienam ou obrigam as leitoras a se vestirem da mesma forma, não é uma ditadura, elas abrem a nossa mente para o novo e nos permitem escolher quem nós queremos ser e o quê gostaríamos de vestir. Muita gente acha que moda é futilidade, mas isso vai depender do interesse de cada um. Para todos terem uma noção do quanto a moda nos influencia, é só notar quando um determinado artigo vira febre. Ou saiu numa revista ou foi na televisão. Como todos querem estar na moda também, então isso aumenta o consumo e, consequentemente, faz girar a economia.” Depoimento apurado pela repórter Marie Raya

Chanceler Alzira Altenfelder Silva Mesquita Reitor José Reinaldo Altenfelder Silva Mesquita Pró-reitor de Graduação Luis Antônio Baffile Leoni Pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Alberto Mesquita Filho Pró-reitoria de Extensão Lílian Brando G. Mesquita Diretor da Faculdade de LACCE Rosário Antonio D’Agostino Coordenação do Curso de Jornalismo Anderson Fazoli

Dois Pontos é um projeto experimental dos alunos de jornalismo (3ACSNJO e 3MCSNJO), desenvolvido na disciplina Jornalismo Impresso, em 2013. Orientação e Coordenação editorial Profa. Jaqueline Lemos (MTB 657/GO) Revisão Prof. Daniel Paulo de Souza Diagramação Alexandre Ofélio (MTB 62748/SP) Redação Editora assistente Fabiana Barbante (RA: 201113824) Repórteres Danillo Holanda (RA: 201101785) Marie Raya (RA: 201108266) Raquel Stocovick (RA: 201114922) Sarah Andrade (RA: 201114350) Capa Croqui de Gabriela Couth

2 | DOIS PONTOS

Pingue-Pongue | Erika Palomino

“A moda me escolheu” Um dos maiores nomes do jornalismo de moda no Brasil, Erika Palomino critica a geração “like” e fala da necessidade de uma boa formação para atuar na área

Por Marie Raya

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arioca e filha de pai finlandês, Erika Palomino foi uma criança tímida. Aos três anos mudou-se para Santos, depois para São Paulo e, por volta dos 11 anos, voltou para o Rio de Janeiro, onde passou a adolescência. Nas férias, visitava os avós em Colina, cidade do interior paulista. Dona de um currículo extenso e de inspirar qualquer iniciante, a jornalista conta ao fascículo Dois Pontos um pouco sobre os sonhos, as escolhas e as experiências profissionais que a trouxeram até aqui.

Dois pontos: Qual fator da sua infância ou adolescência refletiu na escolha da sua profissão? Erika Palomino: Desde sempre escrevi e sabia que iria mexer com a palavra. Meus pais me proporcionaram viagens, cursos livres e bons colégios, além de uma sólida formação cultural em casa, por meio da minha mãe. Meu pai me proporcionou uma mentalidade global, de olhar o mundo. Passei para vestibulares de Letras e de Jornalismo. Mas como eu já estava grávida de meu primeiro filho, Pedro, achei mais sensato escolher algo que me fizesse ganhar dinheiro mais em curto prazo (risos). Eu tinha 18 anos quando ele nasceu. Dois pontos: Qual foi o seu primeiro trabalho no jornalismo? E como foram suas experiências profissionais? Erika Palomino: Em 1986 eu tinha uma coluna sobre São Paulo, chamada Alguma Coisa Acontece, em um jornal alternativo do Rio de Janeiro, de uma grande amiga do colégio. Já trabalhei na Ilustrada, da Folha de S.Paulo, e na revista Moda. Fui editora de moda do portal FFW, diretora de redação da minha revista, a KEY, que durou 4 anos, e palestrante Brasil afora. Escrevi dois livros: Babado Forte e A Moda. Tive um programa de rádio aos domingos e tive um espaço de criação de conteúdo e eventos. Atualmente sou Diretora de Redação e Publisher da revista L’Officiel Brasil e da L’Officiel Hommes Brasil.

Artur Lucchi

do eu parar de trabalhar feito uma louca como agora, o que adoro, terei bastante tempo. Espero que minha cabeça ainda esteja funcionando. Dois pontos: Quais as maiores dificuldades que o profissional que escolhe esse caminho encontrará? E o que é preciso para seguir nele? Erika Palomino: As maiores dificuldades são entrar no mercado, cercar-se das pessoas “certas”, burlar as “panelas”, manter-se atualizado, viajado, magro e bem-vestido (risos).

Dois pontos: Você é um dos maiores nomes no circuito da moda. Como vê a influência que você tem? Erika Palomino: Fico muito lisonjeada, até porque tudo o que conquistei foi com trabalho duro, com muito esforço, dedicação, disciplina e foco. Nunca me relacionei com pessoas por interesse. Fui corajosa quando precisei ser e creio que contribuí com algumas mudanças nesse processo todo. Se posso Erika Palomino afirma que há espaço para servir de inspiração para alguém, de alguma o desenvolvimento de novas linguagens maneira, isso já me faz uma pessoa mais feliz. no jornalismo de moda

Dois pontos: Como você vê o cenário da moda no jornalismo para o profissional daqui alguns anos? Erika Palomino: Acho que as pessoas estão muito mal-formadas. Não sabem escrever direito, não sabem interpretar a moda, são preconceituosas, acham que sabem tudo, não têm humildade, escondem-se por trás de Dois pontos: Qual era a sua visão no iní- roupinhas “da moda” e de olhares de tédio ou cio da carreira? Quais das suas expectativas em ambientes de fofoca. Não se preocupam se concretizaram e quais delas não? Erika Palomino: Nunca pensei que fosse trabalhar com moda. A moda me escolheu. Porém, sou apaixonada pelo novo, onde quer que ele esteja. Eu sempre quis escrever, ser escritora. Ainda há tempo para isso. Quan-

em estudar arte, em ler sobre o que já aconteceu na moda, nas revistas, não sabem de design gráfico, não sabem operar um computador, só sabem futucar nas redes sociais. A geração “like” não tem muito a acrescentar para o jornalismo de moda, sem falar que se lê cada vez menos. Porém, há esperança e espaço para o desenvolvimento de novas linguagens. É preciso estudo, não apenas ver figuras e fotos.

“Sou apaixonada pelo novo, onde quer que ele esteja” DOIS PONTOS | 3


Reportagem | História

Reportagem | Rotina

Requinte, moda e transformação

Como costuram as palavras?

As edições da Vogue narram, há mais de um século, o glamour das passarelas do mundo fashion, fazendo com que a moda vire um estilo de vida

Unindo requinte e informação, as revistas de moda buscam atingir seus leitores com abordagens ousadas e muita agilidade. O cotidiano dos jornalistas da área é sempre uma correria

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Por Raquel Stocovick

o final do século XIX, em 1892, nascia em Nova York a revista Vogue, que se tornou a publicação mais importante do mundo da moda. No início, a revista era apenas um modesto boletim, com menos de 50 páginas. Aos poucos, foi se transformando e se tornando desejo de muitas mulheres poderosas e da elite. O primeiro objetivo dos fundadores, Arthur Baldwin Turnure e Harry McVickar, foi mostrar como as madames se vestiam. Eles tinham o sonho de revelar a moda e o design que as celebridades usavam no cotidiano. Com o aumento de leitores, a periodicidade passou a ser quinzenal. “Eles causaram impacto nas socialites, que começaram a cobiçar a revista e ver a moda como estilo de vida”, afirma Márcia Caetano, redatora da Vogue Brasil. Na primeira década do século XX, o grupo Condé Nast Publications adquiriu a publicação e a consagrou por meio de estratégia de marketing, como a mais influente no ramo de moda. Ainda em 1916 foi lançada a primeira edição fora dos EUA. Na metade da década de 1970, com reconhecimento da Vogue na França, Reino Unido, Itália, Austrália, o Brasil é escolhido como o primeiro país da América Lati-

Deco Curi

Daniela Falcão diretora Vogue Brasil desde 2005 4 | DOIS PONTOS

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Por Sarah Andrade

Reprodução

Capa da Vogue Brasil, edição de julho 2011, com Gisele Bündchen

na para publicar a revista. Um dos fatos que marcou sua história foi em 2007, quando ela circulou com mais de 800 páginas e 3/4 dela apenas com publicidade. “Olha, em 38 anos de Vogue Brasil, é difícil eleger um marco só. Houve muitos nos 30 anos antes de eu ter chegado aqui”, afirma Daniela Falcão, diretora da revista no Brasil desde 2005. Quando a publicação chegou ao Brasil, a primeira editora foi o Grupo Carta e o comando da revista ficou sob o domínio da família. Neste período eles lançaram algumas revistas segmentadas da Vogue. “Na última década, destacaria o fato de a Vogue ter deixado de ser uma revista editada por licença (até outubro de 2010 éramos uma concessão da Condé Nast para a Carta Editorial) para sermos uma joint venture entre Globo e Condé Nast”, assegura Daniela. O Grupo Carta permaneceu até 2010, depois a Editora Globo assumiu a revista, sendo assim a atual representante do grupo Condé no Brasil. “Mais que uma mudança burocrática, isso fez com que a revista tivesse a estrutura que precisava para de fato virar a publicação mais relevante de moda do Brasil, com uma circulação maior”, diz Daniela. Em 1988, o grupo norte-americano precisou inovar a revista, pois as concorrentes estavam ganhando espaço. Foi então que contrataram Ana Wintour como diretora da revista. A reformulação incluiu repensar a forma de fazer as capas, exibindo uma cara mais jovem e colocando luz natural e sofisticação. Wintour descobriu novos estilistas e todos que saiam na capa ganhavam destaque no mundo da moda. Inclusive a top model Gisele Bündchen em 1990. Quando Daniela Falcão assumiu a direção da revista nas terras brasileiras, ela arriscou algumas mudanças para que a revista também fosse uma referência importante no País. “Deixamos o amadorismo de pequenas editoras, para ter uma equipe mais robusta, o que se refletiu muito na melhora da qualidade do produto a partir de novembro de 2010, com a participação de grandes fotógrafos (Patrick Demarchelier, Mario Testino, Tom Munroe, Giampaolo Sgura) e tops (Naomi Campbell Gisele Bündchen, Alessandra Ambrósio, Kate Upton, entre outras)”, assegura Daniela. Hoje a revista esta presente em 21 países. A marca Vogue vai além de uma publicação de moda fashion. Ela descobre modelos, estilistas, idealiza tendências e traz o glamour das passarelas para seus leitores.

correria é intensa em uma redação com um pouco mais 20 pessoas. Na redação é possível ver alguns computadores, muitos papéis e poucas pessoas. O trabalho dos jornalistas começa cedo, mas nem sempre dentro da redação. Dias de casa cheia são atípicos, os repórteres estão quase sempre nas ruas, nos grandes eventos, em estúdios de fotografia para apurar novidades e, sobretudo, para encontrar novas pautas porque é a originalidade que move as reportagens da revista Elle. Publicada mensalmente há 25 anos no Brasil, a Elle é uma das revistas mais conceituadas no segmento moda e comportamento no país. Com pré-pautas definidas para os próximos seis meses, as edições podem ser surpreendidas com novidades dias antes de ir para as bancas. Renata Piza, redatora-chefe da revista recomenda disciplina para os profissionais da área. “O mundo da moda tem muitas cobranças, os profissionais são exigentes e o público também. Então, no início da carreira é preciso muito estudo para conseguir credibilidade e se estabelecer neste segmento”, afirma a jornalista. Ao longo dos meses são feitas reuniões constantes, sempre que algum novo assunto entra na pauta. A ideia é estar sempre atento ao que está acontecendo no mundo da moda.

Os redatores se apropriam de uma linguagem simples, porém requintada “Não estamos atrás daquele luxo tradicional, o que nos encanta é a novidade, é isso que as leitoras esperam. A moda na atualidade não requer tanta ostentação, o que chama atenção é ser diferente, usar a peça coringa do guarda-roupa ou a maior tendência da estação de maneira que possa se destacar. O público já conhece o que é moda, o que querem saber é como ousá-la”, afirma Eliana Sanches, redatora-chefe da Elle. No texto, os redatores se apropriam de uma linguagem simples, porém requintada. Afirmam que o leitor da revista de moda é preocupado com a aparência, portanto até as palavras devem ter em sua essência uma delicada preocupação com a estética. “A moda está presente no cotidiano das pessoas, ela chega a se impor sobre as pessoas. Mas ela traz confiança e ajuda na autoestima. Então o mais importante no momento de pautar é trazer as maiores curiosidades e novidades para os profissionais e fazer com que os leigos se enxerguem nas passarelas”, destaca Eliana Sanches. Para quem deseja estar dentro de uma redação de moda, a Renata recomenda a leitura

das revistas mais importantes. Conhecer os grandes nomes da moda e também as pequenas percepções do comportamento repentino da população diante das novas tendências chamam a atenção das redatoras. “É preciso ser jornalista sempre. E o curioso é observar como a moda é volátil tanto ruas quanto nas passarelas”, acrescenta Renata. Preparados para imprevistos, na gaveta da redação há algumas maquiagens e acessórios, pois quem escreve sobre moda deve ousar em si mesmo, porque está em contato com grandes estilistas e modelos. “Talvez o tempo seja a maior preciosidade dentro da redação. Costumamos ser objetivos nos e-mails, no telefone e tem dias que não sobra tempo para lanchinhos, comemos de tudo aqui na redação, na rua. Onde e quando dá”, conta Renata. Os jornalistas estão sempre atentos às redes sociais, a novos blogs do segmento de moda, e principalmente ao Twitter porque traz informações rápidas e eles podem atualizar o seu perfil com pequenos assuntos que podem os levar para grandes reportagens conforme a repercussão dos seguidores.

Sarah Andrade

Reprodução

Jornalista trabalha na atualização do site da revista Elle

Capa da revista Elle edição de fevereiro/2013 DOIS PONTOS | 5


Reportagem | Olhar Crítico

Reportagem | Mercado de Trabalho

Narrativas da cultura do corpo

Jornalismo It!

Editora de texto da revista ELLE, Renata Piza fala do sucesso dos blogs e diz que escrever sobre moda não é tão simples quanto parece

Renata Pitombo Cidreira discute as funções do jornalismo de moda e fala sobre “a emergência de uma cultura da feminilidade”

Por Fabiana Barbante

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jornalismo de moda tem traços muito específicos. Para analisar o significado dessa área, a jornalista e pesquisadora Renata Pitombo Cidreira escreveu o artigo Jornalismo de moda: crítica, feminilidade e arte. O trabalho está publicado na revista acadêmica Recôncavos (2007). De acordo com o texto da pesquisadora, o jornalismo de moda desempenha três funções principais: “coloca em evidência uma cultura diferente do corpo; descreve o dispositivo e os meios de um sistema de consumo essencialmente vestimentar que serve ao entretenimento; exibe um discurso de moral social alocado sobre a égide da moda triunfante”. Ainda segundo a autora, “através de uma linguagem crítica, que associa envolvimento estético e avaliação, o jornalismo de moda propicia a emergência de uma cultura da feminilidade, provocando uma transformação eficaz das relações sociais.” Renata Pitombo Cidreira tem mestrado e doutorado em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela Universidade Federal da Bahia. O fascículo Dois Pontos entrevistou a pesquisadora para compreender melhor esse segmento do jornalismo. Com seu espaço privilegiado na mídia de massa, esse formato de fazer notícia representa hoje, no Brasil, uma grande conquista para os estudiosos do assunto, que tem um destaque maior com eventos de grande porte no ramo, como o São Paulo Fashion Week, por exemplo. O salto é grande desde as primeiras manifestações impressas na Europa, es-

pecialmente na França, onde ocorreu o início da valorização do assunto, contribuindo para remodelar o hábito, o comportamento e a cultura das elites. “Para quem quer ingressar nessa carreira, é fundamental saber como tudo começou, de onde surgiu e como veio para o Brasil. Transmitir informação de qualidade. Depende do conhecimento pleno do assunto, em primeiro lugar”, esclarece Renata. “O conhecimento de causa dá ao jornalista de moda discernimento e segurança na hora de escrever uma matéria, um artigo ou até cobrir um evento. É preciso entender do assunto”, comenta a especialista. De acordo com o artigo da pesquisadora, a partir de 1960 o jornalismo de moda chega ao Brasil, assumindo seu papel e trazendo uma sensibilidade e estimulação à leitura através da arte e temas relacionados ao universo feminino, tomando o lugar do que então se entendia como moda no país: fotos de agências internacionais, croquis de ilustradores etc. “A primeira iniciativa partiu do jornal Diário de Notícias em 61, tendo a jornalista Ondina Dantas à frente da Revista Feminina. [...] Paralelamente, no Jornal do Brasil, surgia no Caderno B um novo estilo e um novo conceito de jornalismo feminino, misturando de forma arrojada moda com o universo da mulher,” escreve a pesquisadora. São muitas as revistas voltadas para o universo feminino, mas como funciona o trabalho lá? Será que só mulheres podem e conseguem falar sobre moda? Parece que a tendência é essa, mas isso não é uma regra.

De acordo com o artigo, a imprensa feita por mulheres “propõe leituras dominadas pelas belas letras, a poesia, o teatro, o romance e a novela, enfim, um divertimento das horas vagas. Encontra-se aqui a tradução de um modo de vida mais artístico e a vontade de promover as expressões onde triunfam as mulheres”. Mais adiante ela esclarece que “a imprensa de moda funciona, então, como o maior canal de transmissão da funcionalidade ritual do corpo e da vestimenta dominada pelo ornamento, do decor, da teatralização e do tempo da libertação das aparências. O corpo não é mais manequim da vestimenta, mas a referência secreta dentro de um conjunto de signos de moda à sua realidade nova. O ser deve se submeter às aparências”. De acordo com a pesquisadora, com sua importância reconhecida, a dinâmica específica que a imprensa impõe, geralmente, altera as concepções do gênero, do corpo e da aparência do próprio consumo. São atores dessa dinâmica não apenas jornalistas, como também oriundos de outras profissões, uma vez que escrever sobre especialidades não é prerrogativa apenas de quem tem o conhecimento técnico sobre as técnicas de entrevista, reportagem e redação. “Dessa forma, encontramos também estilistas, colunistas sociais, professores e universitários escrevendo sobre moda no Brasil. Vale lembrar ainda uma categoria ampla, recente, e teoricamente não especializada, que são as blogueiras de moda. Muitas sem formação específica, acabam fazendo sucesso e ditando tendências em função da audiência

SUGESTÕES DE LEITURA Reprodução

Reprodução

Reprodução

Renata Pitombo Cidreira é autora dos livros Os sentidos da moda (Annablume, 2005), A sagração da aparência: o jornalismo de moda na Bahia (EdUFBA, 2011) e As formas da moda (Annablume, 2013). São obras importantes para quem quer compreender as relações da moda com o jornalismo no mundo contemporâneo. 6 | DOIS PONTOS

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Por Danillo Holanda internet foi um dos veículos de comunicação que mais cresceu na última década. Com acesso facilitado, surgiram dentro da grande rede espaço para ‘novos jornalistas’. Um dos espaços mais democráticos é blog, no qual a pessoa que tem o domínio sobre a página pode escrever com plena liberdade sobre determinado assunto. Acontece que, na maioria das vezes, esses autores não publicam o próprio conteúdo. Muitos blogs podem ser colagens de informações variadas, sem qualquer checagem. Renata Piza, editora de texto da revista ELLE, fala sobre essa situação. Segundo ela, a ideia de ‘posso fazer, posso ser jornalista’ se tornou um simulacro. “Alguns anos atrás, criou-se uma espécie de febre de escrever sobre moda. De repente, virou a coisa mais fácil do universo. ‘Gosto ou não gosto’, qualquer um faz, é claro que a discussão não se restringe à moda, mas, como a ela é um terreno em que muita gente acredita que é fácil pisar, a coisa tem ainda mais importância. Pessoalmente, leio textos interessantes em vários blogs. Mas muita besteira também. E você pode até me dizer que em revistas, jornais e TV também há espaço para bobagem”, ressalta. A editora faz sua síntese com base na frase do jornalista Gay Talese: “um prédio jornalístico ainda é o prédio com a maior quantidade de verdades por metro quadrado. E com menor índice de furto, acrescentaria. Afinal, todos sabemos que a maioria dos blogs rouba material alheio, especialmente fotos”, conclui Renata. Escrever sobre moda exige mais do que bom gosto e bons relacionamentos. A editora de texto dá dicas e sugere quais os caminhos que o futuro candidato deve tomar para se precaver. Segundo Renata, o jornalismo de moda exige percepção aguda, conhecimento técnico, domínio da história da moda e da arte, e do português, bem antes do inglês. “Exige ainda a capacidade de escrever sobre paradoxos – sim, a indústria da moda movimenta bilhões e o jeito certo de usar uma roupa ajuda muita gente a se sentir melhor, a moda é o reflexo do tempo e da cultura”, enfatiza. Fazer crítica de moda exige mais. O primeiro é deixar de lado o seu gosto pessoal. Segundo Renata, o crítico deve-se ater ao leitor e ressalta: “O estilo também vai para o modo stand by nessa hora, sou contra o clichê ‘I´m so sexy’, mas se uma marca vive de fazer isso e tem público para isso, não

cabe ao jornalista dizer que ela é cafona. Ser coerente é uma das principais coisas que um bom jornalista de moda tem que ter em mente”, conclui. De acordo com a editora, o jornalista de moda precisa analisar comportamentos, sua principal fonte de pesquisa, antes das passarelas, deve ser a rua, pois lá é onde o seu público está – lembrando, claro, que vai depender muito de qual veículo o profissional trabalha. Moda é um produto, mas isso não é o mais importante. Afinal, ela não existiria se não existissem pessoas. Um jornalista de moda não será bom se olhar só para o produto, tem que se olhar para o mundo e todos os fatores nele presente: guerras, conflitos, revoluções artísticas. Escrever requer informação, sempre. E estilo, algo que pode parecer sutil, mas que não se ensina, não se copia. Você pode aprimorá-lo com o tempo.

Jota Martins

DOIS PONTOS | 7


Seção | Sugestões & Dicas

Para ler A Arte de Editar Revistas, de Fatima Ali Se você é um jornalista apaixonado por revistas, este livro é essencial.

In Vogue: The Illustrated History of the World’s Most Famous Fashion Magazine, de Alberto Oliva O livro conta a história da revista Vogue.

Fashion Blogs, de Kirstin Hanssen Entrevistas com blogueiros, divididos nas seguintes categorias: jornalismo de moda, street style, fotografia de festas e estilo pessoal.

Para navegar

Chic chic.ig.com.br Da consultora de moda Glória Kalil. Traz novidades do mundo da moda, também sugestões de looks e beleza masculina.

Moda it modait.com.br O mundo da moda, tendências, vídeos com sugestões de looks, bastidores dos desfiles. São vários blogs de moda em um só lugar.

Garotas Estúpidas garotasestupidas.com É um dos blogs mais populares do Brasil, surgiu em 2006, e a principio era um lugar para se dividir assuntos de moda e beleza com as amigas.

GNT Fashion – GNT

Vamos combinar seu estilo – GNT Oferece consultoria de moda. Cada episódio tem uma peça “tema”. Durante a exibição a apresentadora conta um pouco sobre a história da peça.

Para assistir

Esquadrão da Moda – SBT Além de dicas de como se vestir, sua missão é transformar o guarda-roupa das mulheres.

Fala sobre o estilo e atitude, e também cobre os principais acontecimentos de moda ao redor do mundo.

Para ouvir Ateliê – Band News FM As consultoras de moda Chris Francini e Paula Martins contam as novidades das passarelas brasileiras e mundo afora.

8 | DOIS PONTOS

Dentro do Espelho – Band News FM Inês de Castro fala sobre bem-estar, qualidade de vida e estética, levando o ouvinte refletir esses assuntos.

Viver bem – Nova Brasil FM A jornalista Claudia Matarazzo, autora de 15 livros sobre comportamento, moda e inclusão social, dá dicas de moda e comportamento.


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