FASCÍCULOS DE JORNALISMO - COMPREENDER A PROFISSÃO
Opinião e poder
O Editorial é um texto opinativo, mas impessoal. Ele representa a posição formal de um veículo de comunicação sobre os fatos relevantes. São textos enfáticos e argumentativos capazes de nos ajudar a compreender episódios relevantes do presente ENTREVISTA
Kátia Leite, editora-chefe da Folha de Vila Prudente, fala sobre a missão de um jornal com foco na prestação de serviços
REPORTAGEM
As opiniões podem estar explícitas ou implícitas, mas a mídia sempre assume posições
Apresentação | Caro leitor
Expediente
Questionar e argumentar
O
fascículo Editorial apresenta aos estudantes de jornalismo conceitos, histórias, técnicas e análises sobre um dos mais relevantes gêneros do jornalismo opinativo. O editorial é o primeiro texto de uma publicação. Diferente das notíticas, não ocupa apenas a função informativa, pois seu conteúdo expressa a opinião do veículo sobre um tema relevante do momento. Por meio de questionamentos e argumentos, o texto procura conduzir o leitor a compreender as ideias defendidas no editorial. Neste fascículo, lembraremos a visão dos mais importantes veículos diante dos mais importantes acontecimentos do Brasil. Reviveremos casos históricos, suas respectivas repercussões e a forma como influenciaram a sociedade, seja no jornal, rádio, TV ou revista. Embarque na experiência de jornalistas que, mesmo não escrevendo em seu nome, fizeram com que suas obras mudassem a opinião de muita gente. E, não diferente deles, esperamos que este primeiro texto desperte o seu interesse em entender e refletir sobre a importância do estudo do editorial na formação jornalística.
Seção | Conceito “O Editorial é um gênero jornalístico que expressa a opinião diante dos fatos de maior repercussão no momento. Nas sociedades capitalistas, o editorial reflete não exatamente a opinião dos seus proprietários nominais, mas o consenso das opiniões que emanam dos diferentes núcleos que participam da propriedade da organização. [...] O editorial figura como um espaço de contradições. Seu discurso constitui uma teia de articulações políticas e por isso representam um exercício permanente de equilíbrio romântico. Sua vocação é a de aprender e conciliar os diferentes interesses que perpassam sua operação cotidiana.” José Marques de Melo, Jornalismo Opinativo – gêneros opinativos no jornalismo brasileiro, Editora Mantiqueira, págs 103 e 104
Chanceler Alzira Altenfelder Silva Mesquita Reitor José Reinaldo Altenfelder Silva Mesquita Pró-reitor de Graduação Luis Antônio Baffile Leoni Pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Alberto Mesquita Filho Pró-reitoria de Extensão Lílian Brando G. Mesquita Diretor da Faculdade de LACCE Rosário Antonio D’Agostino Coordenação do Curso de Jornalismo Anderson Fazoli
Dois Pontos é um projeto experimental dos alunos de jornalismo (3ACSNJO e 3MCSNJO), desenvolvido na disciplina Jornalismo Impresso, em 2013. Orientação e Coordenação editorial Profa. Jaqueline Lemos (MTB 657/GO) Revisão Profª. Maria Cristina Barbosa Diagramação e Capa Alexandre Ofélio (MTB 62748/SP) Redação
“O editorial tem sempre de tomar partido, pois sua finalidade é aconselhar e dirigir as opiniões dos leitores. Não se pode reservar: tem de decidir-se. O jornal está, por essência, comprometido a dizer em voz alta o que pensa. Eis porque se deve culpá-lo pelo seu silêncio. [...] Está-lhe vedado dar o silêncio por resposta ao interrogatório da atualidade, ou dar uma resposta ambígua. A ambiguidade é excusa de mau pagador. Ou medo à verdade. O cepticismo da acomodação. O jogo bonito de não comprometer-se, de expor os prós e os contras, embora sem desatar o nó da dúvida, pode resultar engenhoso, mas adoece de estéril. [...] Há jornais que pelo seu afã de assepsia no critério permanecem muitas vezes em suspenso, sem saber ao que ater-se. Isto não vale; o jornal não só tem que saber sempre ao que se ater como ainda de manifestá-lo. Os editoriais insignificantes e fora de compasso são uma escamoteação à boa fé dos leitores que os leem com ânimo de encontrar em suas linhas o caminho.” Luiz Beltrão, Jornalismo Opinativo, Editora Sulina, pág. 60
Editor assistente Vinicius Araujo (RA: 201114074) Repórteres André Brandi (RA: 201106378) Jéssica Peixoto (RA: 201114238) Paula Costa (RA: 20111873) Paulus Fogacci (RA: 201115564) Phillip Silva (RA: 201113004) Raquel Fagundes (RA: 201104621)
2 | DOIS PONTOS
Pingue-Pongue | Kátia Leite
O jornalismo ao pé da letra
O trabalho de uma equipe pequena responsável pela publicação que há mais de 20 anos noticia em favor de moradores da Zona Leste de São Paulo
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Por Vinícius Araújo
primeira edição da Folha de Vila Prudente (FVP) foi às ruas em 1991, na época com 14 páginas e tiragem de 20 mil exemplares. Hoje, estima-se que, além do portal online, o jornal atenda aproximadamente 560 mil habitantes, com periodicidade semanal. No escritório da Rua José Zappi, localizado no mesmo bairro que nomeia o periódico, trabalham quatro repórteres, um fotógrafo e uma editora-chefe, a jornalista Kátia Leite. Durante uma conversa com o fascículo Dois Pontos, ela contou um pouco sobre seu trabalho junto a essa equipe.
Dois Pontos: Qual o foco da FVP e qual a linha editorial utilizada para alcançá-lo? Kátia Leite: O nosso objetivo é, basicamente, a prestação de serviço à população que vive nas redondezas do bairro de Vila Prudente, Vila Ema, Mooca, Vila Zelina entre outras. Seja por meio de denúncia, anunciando bem-feitorias, correndo atrás de direitos ou simplesmente mostrando nos classificados serviços que facilitem a vida dos leitores. Para isso, adotamos uma linha editorial simples na qual somos claros e objetivos em tudo o que informamos.
Dois Pontos: O fato do jornal circular semanalmente melhora a qualidade da apuração das notícias e edição das matérias? Kátia Leite: Além do impresso, nós abastecemos o conteúdo do portal na internet. Captamos todas as informações possíveis, depois de editadas, publicamos primeiro no site e, depois, fazemos uma reunião para escolher o que de mais importante aconteceu para que possamos incluir na edição impressa. O grande número de acontecimentos, publicidade e anunciantes dificulta o trabalho de finalização, mas temos que ter calma para nos preocupar com os anúncios e aconteciDois Pontos: Com base nessas necessidades mentos cotidianos, que são importantes para que você citou, quais os critérios para a es- a vida da população, como greves, transporte colha da pauta? público etc. Kátia Leite: A nossa principal fonte é o “Painel do leitor”, no site da FVP. Através dele, analisamos os interesses do povo, mas na maioria dos casos, o que se tem mesmo são problemas. Um exemplo são as obras do Monotrilho na Avenida Anhaia Mello. Elas resultam em alterações no trânsito, linhas de ônibus etc. A partir do problema, vamos atrás da prefeitura, da CET e demais órgãos ou pessoas responsáveis para passarmos a informação ao leitor. Tudo baseado na prestação de serviço através da notícia e cobertura dos principais acontecimentos nos bairros.
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Dois Pontos: Como funcionam as relações com os anunciantes? Kátia Leite: Os bairros nos quais a FVP circula possuem uma ampla infraestrutura que permite que os moradores realizem muitas atividades próximas de suas casas, fazendo com que a população não tenha que se deslocar para longe a fim de realizar suas atividades. Por isso, damos prioridade aos anúncios de utilidade e que se adequam a esse perfil. O interesse dos anunciantes em expor seus produtos coincide com nossa ideia e é onde todo o trabalho se encaixa.
Nosso objetivo é, basicamente, a prestação de serviço à população que vive nas redondezas do bairro
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Alexandre Novaes
Kátia Leite fala sobre a rotina de um jornal de bairro
Dois Pontos: Como é para a FVP expressar opinião em seus editoriais sobre assuntos que, na maioria dos casos, atingem diretamente a vida dos moradores? Kátia Leite: O editorial tem a função de expor a opinião do veículo e o objetivo da FVP é enfatizar os assuntos para benefício da população. Não há segredo quanto aos editoriais. Esclarecemos, argumentamos e realçamos os assuntos e discussões que envolvam desde o crescimento da estrutura da região até a defesa da população, sempre com base no direito de ambas as partes. DOIS PONTOS | 3
Reportagem | Holofote
Reportagem | Ideologia
O máximo destaque
Guerra de palavras e de ideias
O editorial é um texto nobre e geralmente diagramado em espaço fixo no jornal. O mais comum é ele ser encontrado nas páginas 2 ou 3 de um diário. No entanto, às vezes, ele ganha mais visibilidade
Por Phillip Ferreira
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editorial, a principal ferramenta na hora de colocar pontos de vista, é muito usado na mídia impressa, em especial nos jornais diários. É difícil encontrar pela frente um editorial nos telejornais ou nos rádios. Uma das explicações para reduzida presença desse gênero na mídia eletrônica é que a opinião densa e mais aprofundada não tem espaço em ambientes que têm como marca a alta agilidade da divulgação da informação. De acordo com o pesquisador José Marques de Melo, no livro Jornalismo Opinativo (Editora Mantiqueira), “cada editorial numa
empresa jornalística, passa por um sofisticado processo de depuração dos fatos, de conferência dos dados, de checagem das fontes. A decisão é tomada pela diretoria, funcionando o editorialista, que se imagina alguém integrado na linha da instituição, como intérprete dos pontos de vista que se convenciona deva ser divulgados”. O editorial não é um texto dirigido para a massa de leitores, porque geralmente trata de temas mais áridos como política e economia. Entretanto, o seu conteúdo é um dos que mais auxiliam os leitores detalhistas que buscam compreender a dinâmica da opinião institucional da empresa jornalística. No jornalismo contemporâneo, geralmente esse pequeno texto é encontrado na segunda ou terceira página dos jornais, nas seções de opinião no caderno principal. Mas já ocorreram casos, extremamente raros, de acontecimentos que “obrigaram” os editoriais migrarem para um local de maior destaque, como a capa. É difícil algo do tipo acontecer, só é possível quando o impresso deseja realmente dar uma visibilidade singular para a sua opinião, se posicionar com mais destaque. Foi o caso da Folha de S. Paulo, em 2010, no dia 26 de setembro, com o editorial intitulado, “Todo poder tem limite”, uma resposta duríssima aos comentários feitos pelo então Presidente Lula criticando o posicionamenReprodução Reprodução to da imprensa no período eleitoral. A Folha respondeu as críticas dizendo que as melhorias proporcionadas durante o governo Lula não o deixavam “acima de críticas” e que “o direito de inquirir, duvidar e divergir da autoridade pública é o cerne da democracia, que não se resume apenas à preponderância da vontade da maioria”. A jornalista Alice Cardoso, formada pela Universidade São Judas em 93 e exerceu o cargo de editorialista em três jornais do bairro de Itaquera. Ela afirma: “poucas vezes vi um editorial na capa, o que torna todos eles bem raros e que nunca vi algo tão importante que me proporcionasse escrever para ser publicado em uma capa nos jornais para os quais trabalhei!”. Outra situação especial de destaque foi publicada n’O Estado de S. Paulo. No dia 22 de maio de 2012 o veículo optou por publicar no espaço do seu principal editorial, na página 3, seção “Notas & Informações”, apenas o logo Ex-Libris no centro, sem nenhum Capa da Folha com editorial em destaque, Página 3 do Estadão, em 22 de maio de 2012, texto. Silêncio pleno em homenagem ao fapublicada em 26 de setembro de 2010 com uma homenagem à Ruy Mesquita. lecimento do jornalista Ruy Mesquita, que foi diretor do jornal desde 1996.
O editorial não é um texto dirigido para a massa de leitores, porque geralmente trata de temas mais áridos como política e economia
4 | DOIS PONTOS
É possível identificar um jornal de esquerda ou de direita?
Q
Por Paula Costa
uando comecei escrever esta matéria me perguntei “existem jornais de esquerda ou de direita?”. Confesso que realmente não sabia responder esta pergunta, inclusive quando apresentei a pauta para a professora falei de forma receosa. As dúvidas pairavam sobre a minha cabeça. Vamos tomar como exemplo dois dos mais importantes jornais do Brasil, cujas sedes são em São Paulo: a Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo, nos quais podemos ver na prática os posicionamentos de cada um sobre as discussões que permeiam nossa sociedade, sendo mostrados através de seus editoriais. No editorial, os posicionamentos são colocados de forma clara, com tomada de posição do veículo de comunicação. “Os jornais maiores têm a necessidade de se posicionar, afinal são veículos formadores de opinião. É necessário que se entenda, que o veículo nem sempre se posicionará de forma esquerda ou direita, mas em alguns temas podemos perceber uma tendência maior para o conservadorismo, ou para uma inovação ou modernização do pensamento”, afirma Cloves Reis da Costa, mestre em Comunicação Social pela Universidade Metodista. Segundo Cloves, O Estado de S. Paulo é conhecido como um jornal mais conservador do que a Folha de S.Paulo, mas em determinados assuntos não podemos isentar a possibilidade de verificar uma opinião mais moderna do jornal. E o posicionamento do veículo pode atrair ou afastar leitores? Sim, é o que acredita o jornalista Alexandre Carneiro. “Os jornais são elementos importantes para a formação de opinião, mas são produtos. E, para que vendam, necessitam atender uma parcela dos leitores, ou seja, os leitores que tenham um pensamento mais voltado para as ideologias de esquerda dificilmente se interessarão por um jornal que defenda uma ideia de direita conservadora, por exemplo. O que deixa claro que tudo deve ser levado em consideração para que o jornal venda”, comenta Alexandre, que é também professor de história da Escola Estadual Dona Zulmira Cavalheiro Faustino, em São Paulo. Um exemplo recente Durante a sequência de protestos que ocorreram pelo Brasil em junho de 2013, um episódio pode ilustrar o tema desta breve reportagem, No dia 13 de junho, Folha e Estadão se posicionaram de forma muito pare-
cida. No Estadão o editorial Chegou a hora do basta começava com a seguinte frase: “No terceiro dia de protesto contra o aumento da tarifa dos transportes coletivos, os baderneiros que o promovem ultrapassaram, ontem, todos os limites e, daqui para a frente, ou as autoridades determinam que a polícia aja com maior rigor do que vem fazendo ou a capital paulista ficará entregue à desordem, o que é inaceitável.” A Folha destacou no editorial Retomar a Paulista que: “É hora de pôr um ponto final nisso. Prefeitura e Polícia Militar precisam fazer valer as restrições já existentes para protestos na avenida Paulista, em cujas imediações estão sete grandes hospitais.” E concluía: “No que toca ao vandalismo, só há um meio de combatê-lo: a força da lei. Cumpre investigar, identificar e processar os responsáveis. Como em toda forma de criminalidade,
aqui também a impunidade é o maior incentivo à reincidência.” No quarto dia de protestos em São Paulo, a polícia literalmente “desceu o cacete”. O jornalista Lino Bocchini, escreveu a seguinte análise no Blog do Lino, na revista CartaCapital: “As prisões, muitas com indícios de arbitrariedade, contam-se às dezenas. Poucas horas antes, pela manhã, os dois maiores jornais do Estado chegavam às bancas e às casas dos assinantes com editoriais defendendo uma ação mais dura da PM. O Estadão incitou a violência dos policiais claramente. A Folha, por sua vez, colocou a desocupação da avenida Paulista como ponto de honra, desde o título. Ambos foram atendidos”. O jornalista publicou o post no dia 13 de junho, às 23:08. O jornalista iniciou sua reflexão escrevendo que “de forma irresponsável, Estadão e Folha incitaram a violência da PM em editorial”.
DOIS PONTOS | 5
Reportagem | Capa
Um dossiê de opiniões relevantes para a história A postura dos principais veículos de comunicação, por meio de seus editoriais, é capaz de iluminar eventos relevantes e controversos do passado recente no Brasil Por Jéssica Peixoto e André Brandi
A
ck rSto utte : Sh Foto
opinião de um veículo é, em sua maior parte, expressa na forma como seus jornalistas organizam os assuntos publicados, na prioridade que dão a eles e no enfoque escolhido ao tratá-los. Porém, é na prática do editorial que o jornal explicita sua posição. “O editorial por se tratar de um gênero opinativo, deve conter elementos que deixem claro a posição do veículo. Além de registrar os fatos, o jornal forma e é formado pela opinião dos leitores”, esclarece Cesar Camasão, chefe de reportagem do jornal Agora. É natural que nos editoriais exista uma grande carga do que era a consciência geral daquela nação durante o período em que eles foram escritos. Os textos apócrifos criaram e foram criados pelo debate público da época e ajudam a justificar e esclarecer acontecimentos antes deles pararem nos livros de história. Isso fica muito claro e serve de exemplo e estudo durante a história moderna do Brasil, no século XX. No período da II Guerra Mundial, o Brasil se declarou aos aliados e
O gosto amargo do apoio ao golpe militar O Correio da Manhã, um dos maiores jornais do País nos anos 1960, nunca foi conservador e, em 1961, apoiou a posse de João Goulart (Jango) Foto: Reprodução para a presidência do País. Após a instauração da Ditadura Militar, sofreu fortes represálias. Porém, a ironia é que o jornal fez história com dois editoriais de campanha agressiva contra Jango nos momentos finais do seu governo. O primeiro texto foi publicado às vésperas do golpe, no dia 31 de março de 1964, intitulado “Basta!” e outro no dia seguinte, chamado “Fora!”. A Folha da Tarde, também de São Paulo, defendeu o golpe em seu texto do dia 31, nomeado “A grande ameaça”. Outros textos mostram que havia forte apoio ao regime militar em seu início, mesmo dias após ser estabelecido. Os editoriais d’O Globo dos dias 2 e 4 de abril e os do Jornal do Brasil, do dia 9, 10 e 16 do mesmo mês são ótimos exemplos disso. “Ressurge a democracia!”, editorial do O Correio da Manhã traz Povo, de Fortaleza, em três de abril e “Os bravos editorial “Basta!” para criticar militares” d’O Estado de Minas, dia 2 de abril, duramente o governo Goulart também evidenciam o apoio dos veículos de comunicação ao golpe militar. Quatro anos mais tarde, todos amargariam a censura nas redações. 6 | DOIS PONTOS
em 1942 cruzou o atlântico para combater o eixo de Hitler e Mussolini. Apesar disso, avaliando os editoriais daquele período sobre a guerra, tanto a população brasileira quanto a mídia que a cobria estavam divididos e não sabiam ao certo quem apoiar. Os jornais de direita, controlados pelo Estado Novo de Getúlio Vargas, constantemente defendiam as medidas fascistas e nazistas mesmo quando o regime foi ficando cada vez mais inclinado a ajudar o lado de centro-esquerda do conflito. Em 1939, boa parte da esquerda brasileira ficou encantada com o pacto de paz entre Hitler e Stálin e seus jornais passaram a elogiar os dois ditadores. O jornal baiano Meio-Dia, cujo editor na época era Jorge Amado, autoproclamado comunista, chegou a ser considerado pró-nazismo. A conduta dos jornais perante o golpe militar de 1964 no Brasil também é interessante, visto que muitos deles eram favoráveis à queda do presidente Jango sem perceber que estavam promovendo algo que os prejudicariam no futuro. “O editorial é uma pancada que o jornal dá sobre determinado assunto, sem medo de represálias e com força opinativa. Muitos jornais fizeram isso em 1964 e acabaram dando força à Ditadura”, explica Alexandre Haubrich, editor do jornal alternativo Jornalismo B. O jornal Correio da Manhã demonstra isso de forma bem clara em dois editoriais. Os textos mostram que até os nada conservadores chegaram a pensar que a Ditadura Militar poderia ser uma boa ideia [ver o texto “O gosto amargo do apoio ao golpe militar” aqui nesta página]. Aldo Gama, editor do Brasil de Fato vai além. “Os veículos de comunicação devem sempre ajudar a marcar a história não só do país, como do mundo. As palavras que ajudaram a construir uma posição de determinado assunto, hoje refletem em nossa vida. E esse é o dever de um editorial.” Com consciência disso, o jornalismo de hoje em dia, com suas diferentes ideologias e opiniões, sabe que será responsável pela repercussão do que está registrado como a posição oficial de cada veículo de comunicação. No futuro, quando olharmos para os jornais de hoje, poderemos ter um painel de como a imprensa se posicionava diante dos fatos mais relevantes. Os textos com maior autoridade para mostrar isso são, certamente, os editoriais.
“Branda” e explosiva Um neologismo que fez referência ao passado do período ditatorial mostra que a Folha de S.Paulo resvalou feio para o conservadorismo. No dia 17 de fevereiro de 2009, no editorial com o título “Limites a Chávez”, publicado na página 2, o jornal de maior circulação no País usou a palavra “ditabranda” para se referir que teríamos vivido aqui uma ditadura menos violenta, mais branda. O editorial abordava o endurecimento do governo venezuelano, mas a linha de raciocínio utilizada fez uma referência direta ao período ditatorial brasileiro. “A comparação entre o período ditatorial no Brasil com o sistema venezuelano foi muito infeliz. O editorialista não usou lógica nenhuma na hora de escrever a opinião do jornal e acabou deixando uma imagem negativa para muitos leitores”, analisa a jornalista Aline Scarso. Após a publicação do editorial, a reação foi imediata. Muitos leitores escreveram à Folha de S.Paulo, entre eles dois professores da USP: Maria Victoria Benevides e Fábio Konder Comparato. O professor foi o mais contundente, mas os dois foram duramente respondidos na forma de uma “Nota da Redação”, via Painel do Leitor. As reações tornaram-se ainda mais fortes por parte dos leitores e foram organizadas manifestações de protesto na sede do jornal no centro de São Paulo. No domingo, 22 de fevereiro de 2009, o Ombusdman da Folha, Carlos Eduardo Lins da Silva, criticou: “Um editorial com referência ao regime militar brasileiro provocou cartas publicadas no Painel do Leitor. Resposta da Redação a duas delas na sexta foge do padrão de cordialidade que julgo essencial o jornal manter com seus leitores.” Quase um mês depois, no dia 8 de março, é publicada no jornal a seguinte manchete: “Folha avalia que errou, mas reitera críticas”. O texto dizia: “O diretor de Redação da Folha, Otavio Frias Filho, divulgou ontem as seguintes declarações: ‘O uso da expressão `ditabranda´ em editorial de 17 de fevereiro passado foi um erro. O termo tem uma conotação leviana que não se presta à gravidade do assunto. Todas as ditaduras são igualmente abomináveis.” Entretanto, Frias manteve as críticas aos professores Comparato e Benevides. Esse foi um episódio recente que mostra a força e contundência da opinião expressa no editorial. Uma análise interessante sobre o caso pode ser lida no texto “A briga em que todos perdem”, de Eugênio Bucci, no dia 3 de março 2009, no Observatório da Imprensa.
Foto: Reprodução
Trecho do polêmico editorial publicado na Folha
DOIS PONTOS | 7
Reportagem | Televisão
Reportagem | Rádio
A opinião na telinha
Opinião sonora
Na TV os editoriais aparecem raramente, mas também representam de forma contundente a posição formal do veículo de comunicação sobre temas relevantes
Por Vinicius Araújo
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Por Paulus Fogacci
ellington Menezes, em abril de 2011, invadiu armado uma escola na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Ele disparou contra os alunos e matou 14 deles. O episódio ficou conhecido como a “Tragédia de Realengo”. O caso gerou inúmeras discussões sobre segurança e criminalidade no Brasil, alavancou a postura de governantes. O então presidente do Senado, José Sarney, aproveitou o ensejo da exaustiva cobertura da mídia, para propor um novo plebiscito sobre o desarmamento no Brasil. Entre acalorados debates na imprensa, no dia 5 de maio, o jornalista Joelmir Bet-
ting, falecido em 2012, expressou a opinião do Grupo Bandeirantes de Comunicação em relação à proposta do Senador. O texto lido no Jornal da Band denunciou a intenção do governo de mascarar os principais motivos que fomentam a criminalidade em um país no qual o Estado não é capaz de proteger o cidadão. “É chocante como a força da demagogia tapa os olhos de quem deveria ver com mais clareza este cenário, assim tão simples, porém tão trágico. Ao empunhar a bandeira da mentira, o ministro e sua campanha de convencimento agridem, não só a realidade brasileira, mas também a vontade da maioria da popu-
Cid Moreira, apresentador do Jornal Nacional, em março de 1994 , lê o direito de resposta de Leonel Brizola Reprodução YouTube
Joelmir Betting lê editorial do Grupo Bandeirantes durante o Jornal da Band
lação”, argumentou Betting em nome da Bandeirantes. Apesar do ocorrido, os editoriais na TV acontecem quase que em edições extraordinárias. Na maioria dos casos, são motivados por assuntos de âmbito nacional, relacionando os interesses da sociedade com os assuntos tratados pela mídia. São ocasiões nas quais o posicionamento do grupo rende à população uma nova forma de pensar sobre os acontecimentos. Uma das exceções na TV brasileira é justamente o Jornal da Band, que dá espaço para editoriais com frequência. Momento histórico Em 1992, o grupo Globo se referiu ao então governador do Rio de Janeiro Leonel Brizola de maneira pejorativa, chamando-o publicamente, em um editorial do jornal O Globo e no noticiário do Jornal Nacional, de um ser de mente “senil”. Dois anos depois, em cumprimento à sentença do Juiz de direito da 18° Vara Criminal do Rio de Janeiro, e por intermédio do advogado Arthur Lavigne, a acusação rendeu um direito de resposta a Brizola. Foi durante o Jornal Nacional, no dia 15 de Março de 1994 que o episódio aconteceu. Durante pouco mais de três minutos, Cid Moreira, na época apresentador do noticiário, leu ao vivo e visivelmente constrangido as 440 palavras contidas na carta escrita por Brizola, que fez duras críticas à emissora. O direito de resposta não é um editorial, mas vale relembrar esse episódio porque a briga na justiça foi motivada justamente por uma afirmação publicada originalmente em editorial. “Todos sabem que eu, Leonel Brizola, só posso ocupar espaço na Globo quando amparado pela Justiça. Aqui, citam o meu nome para ser intrigado, desmerecido e achincalhado perante o povo brasileiro. Ontem, neste mesmo Jornal Nacional, a pretexto de citar o editorial de O Globo, fui acusado na minha honra e, pior, chamado de senil.” “Todos sabem que critico há muito tempo a TV Globo, seu poder imperial e suas manipulações. Mas a ira da Globo [...] não tem nenhuma relação com posições éticas ou de princípios. É apenas o temor de perder o negócio bilionário que para ela representa a transmissão do carnaval. Dinheiro, acima de tudo”, são trechos do texto de Brizola no direito de resposta. O acontecimento foi inédito. Em 2013 fez 15 anos desse célebre direito de reposta do jornalismo brasileiro.
rádio firmou-se como um dos principais meios de comunicação de massa, e um dos mais acessíveis ao grande público. O papel como interlocutor e o seu auge entre as décadas de 1940 e 1950 revelam uma relação mais próxima com a população, principalmente devido à forte persuasão por meio do áudio e da imaginação. Assim, o rádio se consolidou como um dos mais importantes veículos de transmissão de mensagens do mundo. Sabe-se que os produtos impressos têm um peso muito forte sobre a mídia. Por isso, é possível estabelecer uma relação entre as linhas editoriais de um jornal e de uma emissora de rádio. Ocorre que, no jornal, o editorial é um gênero de texto obrigatório. Os leitores já estão habituados a encontrá-lo todos os dias ali, naquele espaço fixo. Já no rádio, a prática é menos usual. Porém, o rádio conta com alguns recursos particulares, como o uso do som, e da interpretação do emissor, elementos que contribuem em convencer o ouvinte. Recorrer a essas ferramentas, entretanto, não garante o objetivo principal, que é o de trazer o ouvinte para o seu lado. O radialista José Paulo de Andrade, formado em Direito pela FMU e atual apresentador do programa O Pulo do Gato, da Rádio Bandeirantes, explica mais detalhes. “O rádio conta com recursos mais intimistas do que os do impresso. É possível inserir uma trilha (BG) e a interpretação do locutor faz toda a diferença. As pausas que ele faz, o seu tom de voz torna bem mais fácil a aproximação com o público e a abordagem sobre o assunto,” completa. O objetivo é o mesmo. Trata-se de defender a opinião da emissora de rádio e o seu posicionamento sobre o assunto abordado, mas com uma diferença primordial: inevitavelmente, um editorial de rádio terá um porta-voz, ou seja, o ouvinte tem uma pessoa concreta expressando aquela opinião. O leitor do jornal, por exemplo, lê um editorial “sem face”, “sem assinatura”. Nos meios eletrônicos, parte da mensagem dependerá deste fator, que é de se simpatizar ou não com quem está emitindo a mensagem. Nesse quesito é possível comparar a situação com um editorial de TV. As pessoas que expressam o editorial no rádio e na TV estreitam (ou afastam) a relação entre o veículo e o ouvinte/telespectador. As emissoras de rádio costumam seguir a linha editorial do grupo detentor da marca, caracterizando as suas opiniões nos demais
veículos do grupo de comunicação. A Rádio Bandeirantes possui vários programas de diferentes segmentações dentro do radiojornalismo e destaca bem os seus editoriais. Na programação, o locutor identifica que o texto a seguir será um editorial. Há uma linha mais contundente e argumentativa no texto, terminando com a frase: “Esta é a opinião do Grupo Bandeirantes de Comunicação”. Para o professor e jornalista Celso dos Santos Filho, formado em Comunicação Social pela Universidade Anhembi Morumbi, emissoras recorrem aos editoriais para, além de criticar, criar uma guerra de interesses entre diferentes programações e público alvo. O professor alerta que são comuns so casos de ataques motivados por interesses das empresas. “É como uma luta por Ibope. Por trás disso existem muitos fatores, como patrocínio e opinião popular”, comenta.
Paulus Fogacci
Reprodução YouTube
8 | DOIS PONTOS
Profissionais contam histórias e curiosidades sobre a utilização de editoriais em grandes emissoras do Brasil
Paula Nunes
O radialista José Paulo de Andrade, apresentador do programa O Pulo do Gato, comenta os detalhes do editorial no formato sonoro DOIS PONTOS | 9
Reportagem | Como fazer
Resenha | Destaque
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As múltiplas facetas da opinião
Por Raquel Fagundes
m Jornalismo Opinativo – gêneros opinativos no jornalismo brasileiro José Marques de Melo define os gêneros jornalísticos mais comuns na imprensa brasileira. O autor também traça paralelos com as práticas dos veículos de comunicação nos EUA e Europa. O autor abre espaço mostrando as classificações dos gêneros de acordo com as matizes europeias, norte-americanas, hispano-americanas e, com maior destaque, as brasileiras. Marques de Melo toma como parâmetro a classificação do estudioso Luiz Beltrão que, de forma clara, nos apresenta a três categorias: o jornalismo informativo, o jornalismo interpretativo e o jornalismo opinativo. Dentre os gêneros apresentados no campo do jornalismo opinativo, o primeiro é o editorial. O autor esclarece que é um gênero que expressa a opinião sobre os fatos através de um “porta-voz” que representa o veículo de comunicação. O editorial é a ótica pela qual determinada empresa de comunicação compreende temas de relevância nacional, em especial relacionados à política e economia.
Jornalistas e pesquisadores mostram as principais características e o estilo do editorial. Para escrever este gênero opinativo é preciso muita habilidade com o jogo de palavras e capacidade argumentativa
S
abe-se que no jornalismo contemporâneo, não é mais o dono do jornal que escreve os editoriais. Certamente o texto final vai passar pelo crivo do Diretor de Redação, mas o texto pode ser escrito por pessoas diferentes. É o grupo de editorialistas, geralmente composto por jornalistas de confiança do veículo de comunicação, responsável por se dividir na tarefa de redigir um editorial. “O jornal é um catalizador de opiniões, um agente da consciência pública. Não é o ‘eu’ penso o que exprimo no editorial, mas o somatório do que pensa uma expressiva parcela da opinião pública, representada pelo grupo que fundou, orienta e mantém o jornal”, define o pesquisador Luiz Beltrão, no livro Jornalismo Opinativo (Editora Sulina). As regras para redigir um editorial são as mesmas que regem alguns gêneros opinativos: deve ser claro e simples, incisivo, vigoroso e assertivo. O conteúdo inicial é exposto
10 | DOIS PONTOS
como uma espécie de apresentação didática que explica o tema sem rodeios, situando o leitor já com um posicionamento forte e concreto a respeito. Luiz Beltrão escreve que o editorial é “como um porta-voz, um alto-falante, que há de ampliar o tom das palavras e o sentimento das ideias do editor para que atinjam e firam a comunidade, levando-a manifestar-se e agir.” No corpo do texto, o editorialista une as palavras para argumentar coerentemente a fim de não deixar dúvidas quanto à posição na qual a empresa se coloca sobre determinado assunto. Esta parte exige dados factuais, estatísticos, exemplos, pesquisas feitas por instituições renomadas e, principalmente, citações de fontes bem intencionadas. A conclusão precisa ser lógica e, ao justificá-la, o editorialista deve se posicionar de forma explícita. Então, é necessário “tomar partido” para se expressar bem. A clareza é essencial para que o leitor entenda seu real posicionamento diante dos fatos. O texto deve ser curto, repleto de um vocabulário variado e amplo, rico em ritmo e vivacidade. Dessa forma, os leitores não perderão o interesse em lê-lo até o fim. Moacir Assunção, jornalista e professor dos cursos de Comunicação Social da Universidade São Judas, fala que o editorial nunca pode ser entediante ou tratar assuntos óbvios. “É preciso evitar frases longas, fugir de informações comuns que o público leitor já está cansado de saber”, completa. O estilo também é de relevante importância. Por exemplo, um editorial intelectualizado convida o leitor a uma viagem que incentiva o raciocínio. O texto emocional tem apelo direto à sensibilidade de cada um e vai ao encontro dos instintos e crenças. O editorial é um gênero que também informa e faz com que o leitor tire suas próprias conclusões, concordando ou não com a argumentação apresentada. “A ideia é levar a pessoa à reflexão, esclarecendo uma opinião sensata sobre os acontecimentos que são comentados”, comenta Moacir. Por isso, é tão importante evitar editoriais dogmáticos, radicais e até mesmo arrogantes que ofendam as concepções de moral e vida dos leitores. Assuntos como religião devem ser abordados cuidadosamente, pois costumam envolver uma diversidade de opiniões divergentes. O editorial pode contradizer um pensamento já formado e intervir com lucidez e inteligência para expressar uma posição, em algums casos, nada hegemônica na sociedade.
E
Por Raquel Fagundes
Apesar de apresentar a opinião, segundo o autor, o editorial pode ser considerado um “espaço de contradições”, pois há uma teia de diferentes interesses no cotidiano de um veículo de comunicação. O gênero em questão não é assinado e deve ter uma integração entre as políticas do local e os interesses corporativos. Para o autor, o editorialista é alguém que possui conhecimento sobre a linha de pensamento do veículo e age como um intérprete de pontos de vista que, por sua vez, devem ser devidamente apurados. Melo comenta também sobre os atributos do editorial impresso. São eles: a impessoalidade, a topicalidade, a condensalidade e, por fim, a plasticidade. No rádio e na TV, os editoriais são vistos raramente, apenas em temais mais relevantes, nos quais as emissoras precisam mostrar seu posicionamento sobre o assunto repercutido. Vale ressaltar que o autor explica, ao londo da obra, cada gênero opinativo (o comentário, o artigo, a resenha ou crítica, a coluna, a crônica, a caricatura e a carta do leitor), aprofundando-se nas características e conceito de cada um.
Estante fundamental Jornalismo Opinativo, de Luiz Beltrão (Sulina)
“Explica os gêneros opinativos que são usados em muitos momentos na nossa profissão, por isso são de suma importância. Um bom jornalista deve despertar o interesse pela leitura e, para isso, é preciso aprender sobre os diferentes gêneros de opinião, desde a elaboração de um editorial, até crônicas.” Luciana Albuquerque, jornalista formada pela Unicid e repórter da Editora On Line.
Serviço Jornalismo Opinativo – gêneros opinativos no jornalismo brasileiro, de José Marques de Melo (2003) Editora Mantiqueira
Linguagem e persuasão, de Adilson Citelli (Ática) “Esse livro é fundamental para o
estudante de jornalismo porque discute exatamente aquilo que ele vai ter que dominar em sua carreira. Mostra a linguagem correta para persuadir, convencer e encantar os leitores com os textos e reportagens.”
Moacir Assunção, jornalista formado pela Universidade Brás Cubas e professor da Universidade São Judas.
Teorias do jornalismo – Por que as notícias são como são, de Nelson Traquina (Insular)
Deu no jornal - O jornalismo impresso na era da Internet, Álvaro Caldas (PUC/RJ e Loyola)
“Considero relevante a leitura da obra para o estudante de jornalismo, pois reforça a importância de sermos formadores de opinião, além de conter respostas para certas questões consideradas indispensáveis durante a compreensão do que de fato é o jornalismo.”
“A obra mostra os desafios do jornalismo impresso e como é possível adaptá-lo de acordo com os novos conceitos da era da internet. É um livro importante, pois discute as transformações até os dias de hoje através de textos excelentes que nos levam à reflexão.”
Aline Ribeiro, jornalista formada pela Unesp e editora da revista UMA.
José Vieira Camelo Filho, cientista social pela PUC/SP e professor da mesma instituição. DOIS PONTOS | 11
Crônica | Relato poético
Um tabuleiro de palavras Por Phillip Silva
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12 | DOIS PONTOS
magine que você vive em plena Ditadura Militar no Brasil. Imagine que estamos nos anos de 1970. Imagine que você precisa elaborar um editorial tendo plena consciência de que aquelas palavras podem te levar à prisão ou coisa pior, à tortura ou ao exílio... Situações assim foram vivenciadas por inúmeros jornalistas, editorialistas. As palavras e as ideias são poderosas. E quando elas revelam críticas, explicitam um posicionamento, podem despertar a ira de quem se sente criticado. Ditaduras sempre caçam os contrários ao regime. Quando um país está sob uma ditadura, a liberdade de expressão e de pensamento vai para o ralo. Desaparece. Agora, imagine ter que escrever todo dia um texto no qual é preciso assumir um posicionamento, quando você está condenado ao silêncio. O medo pode tomar conta da gente. Imagine escrever a verdade vivida ali naquele momento não só por você, mas por toda uma população, continuar a formar opiniões mesmo tendo de lidar com os seus próprios demônios: o medo de não poder mais ver sua família, seus amigos ou trabalhar livremente no lugar onde nasceu ou escolheu para viver. Imagine trabalhar todos os dias suando frio ou com aquela tremedeira incontrolável toda vez que o telefone toca, ou a todo o momento em que batem à sua porta, temendo que acontecesse algo a seus entes queridos. Esse é o medo que cada jornalista tem de trabalhar em meio às tempestades políticas dia após dia. Esse é o terror constante que habita o coração de um editorialista consciente da sua responsabilidade. O principal foco dos editoriais sempre foi e sempre será a formação de opinião, seja ele para o bem ou para o mal, sempre foi um instrumento para esclarecer ou manipular. Mas quando para o bem, é sempre para servir o público. Manifestando o pensamento de um veículo de comunicação, o editorial é uma conversa direta com seu leitor, um
olho no olho com quem mais interessa. O editorial, ao longo dos séculos, foi sofrendo transformações. Se no passado remoto era a “voz” do dono da empresa jornalística; hoje é uma teia de interesses mais amplos. É preciso astúcia do leitor para compreendê-lo nas entrelinhas. O editorialista é o cérebro daquele jornal. É o pensamento dos que detêm o poder no veículo de comunicação. É ele que exerce a função de timoneiro da publicação. Ele sabe de tudo e, além disso, acima de tudo, toma cuidado com o que pensa. O editorial é um tabuleiro de palavras. É naquele espaço que o poder se enfrenta: o poder político, o poder econômico... É naquele espaço que batalhas são travadas, às vezes com inimigos invisíveis. Às vezes, com inimigos explícitos. E, nessas batalhas, as palavras e a opinião são cuidadosamente pensadas!
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É naquele espaço que batalhas são travadas
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