Pedaços da História da Tauromaquia da vila de Salvaterra de Magos - Séc. XVIIII - Séc. XXI

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Salvaterra de Magos Séc. XVIII – Séc. XXI


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Para os meus sobrinhos: * Rogério; (Fernandes Travessa) *Cláudio José, que um dia tiraram a alternativa e foram Cavaleiros Tauromáquicos

* Lembrando com um carinho especial, o meu cunhado, Manuel Fernandes Travessa, um apaixonado, destas “coisas” dos toiros

Foto da Capa: Rotunda na EN 118, frente à Praça de Toiros de Salvaterra, com um motivo alrgórico ao Campino


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Informações para a história daTauromaquia Salvaterra de Magos Séc. XVIII – Séc. XXI *********** Autor: Gameiro, José Editor: Gameiro, José Rodrigues Morada: Bº Pinhal da Vila – Rua Padre Cruz, 64 – 1º Telem.918905704 Tel. 263 505178 *************** Composição: Papel Bruchado – Formato A5 Sistema PDF **************** Blogue: “ www.historiasalvaterra.blogs.sapo.pt”


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O MEU CONTRIBUTO Sou descendente de gente simples do campo, meu avô paterno, foi campino, como foram todos os seus irmãos. A minha passagem pelo mundo da festa brava, cingiu-se apenas na escrita de uma ou outra notícia, ou artigo de alguma efeméride, como: “Os 76 anos sobre a morte do famoso toureiro ribatejano, natural de Salvaterra de Magos; Vicente Roberto”, que foi publicada no “Diário do Ribatejo”, ou a recolha de recordações numa grande entrevista, a José Luis das Neves, o único obreiro vivo, da construção da Praça de Toiros, publicada no Jornal “Aurora do Ribatejo” com o titulo, “Os 50 anos da inauguração da praça de toiros de Salvaterra” e, a entrevista ao antigo forcado, “José Hipólito – Figura Típica da Terra” que saiu também naquele semanário de Benavente. Em 1976, fiz notícia jornalística, de uma jornada reivindicativa de toiros de morte em Portugal, que teve lugar no salão nobre do Clube Desportivo Salvaterrense, e, na sua sequência, meses depois levou à morte de toiros na praça de Salvaterra. Um outro artigo fiz sair no já desaparecido jornal Vale do Tejo, quando do falecimento do aficionado António Cadório. De vez enquanto lá me aparecem pedindo a minha ajuda, entusiastas destas coisas dos toiros, ou estudantes interessados em saber algo sobre a morte do Conde dos Arcos, ocorrida num brinco de toiros, aqui em Salvaterra. Esta morte, para muitos é ainda uma incógnita e motivo de grandes discussões entre aficionados, e não só, também os que gostam de “contos e lendas” ligados à terra, tentam


5 desvendar o que apenas se sabe pelo que está escrito. O meu espólio sobre a temática taurina em Salvaterra, sendo guardado ao longo de muitas décadas, não é coisa que valha, são documentos recolhidos por carolice, que cruzam dados sobre lavradores/ganadeiros que aqui tinham terras, desde o séc. XIX, e faziam criação de toiros. O campino tinha lugar de destaque naquelas importantes casas agrícolas, como guardador das manadas de gado bravo. Os cavaleiros, toureiros e moços de forcados, são outros componentes que enriqueceram a festa brava nos séc. XX e XXI, desta vila ribatejana. Com tais documentos, pensei se não valeria a pena agrupar todo este material e, com ele fazer um livro, para não se perder tanta informação, que muito valerá aos interessados em aprofundar Sendo uma tradição de séculos, não só ribatejana, aqui está esta edição – “Salvaterra de Magos – Pedaços para a História da Tauromaquia nesta Vila séc. XIX, XX e XXI”. É um pequeno trabalho que ficará ao dispor de quem um dia queira fazer um estudo profundo da história da tauromaquia em Salvaterra de Magos. Se isso vier a acontecer, já me sinto contente !! Janeiro de 2011 JOSÉ GAMEIRO


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I A Última corrida de Touros em Salvaterra Nota Prévia

A trágica morte do jovem fidalgo, Manuel José de Noronha e Menezes, 7º Conde dos Arcos, filho do Marquês de Marialva, numa corrida de touros, em Salvaterra de Magos, tem servido para muita transcrição ao longo dos tempos, levou a que Luiz Augusto Rebello da Silva, numa das suas obras marcantes, e um marco de referencia do romantismo português, no séc. XIX. Ao longo dos tempos, em tudo quanto é editado sobre Salvaterra, não deixa de aparecer,” A Morte do Conde dos Arcos”. Conto que sendo romanceado, segundo alguns autores, foi escrito cerca de 70 anos depois do acontecimento. A MORTE DO CONDE DOS ARCOS “O sr. D. José, primeiro do nome, era em Salvaterra um rei em férias. –A verdade é que os maldizentes notavam, em segredo, que


7 Sua Majestade, estava sempre ao torno e o Marquês no trono. O prolóquio fundava-se na habilidade mecânica do monarca como torneiro, e no carácter dominador do marquês como ministro. Vicejavam os campos em plena primavera. A amendoeira cobria-se de flores, os bosques esfolhavam-se, as veigas vestiam-se e matizavam-se, e a brisa doidejava indiscreta arregaçando o lenço à donzela que passava, ou roubando um beijo à rosa perfumada. Tudo eram alegrias e cânticos… os rouxinóis nas moitas, o coração nos amores, e a natureza nos sorrisos ao sol esplêndido que a dourava. O Rei estava em férias em Salvaterra e, uma tourada real chamara a corte a restante fidalguia do país a esta vila. Os fidalgos respiravam nestas ocasiões menos oprimidos. Não os assombrava tão de perto a privança do ministro. Os touros eram bravos, os cavaleiros destros, o anfiteatro pomposo, e o cortejo das damas adorável. O prazer na boca de todos. Por cúmulo de venturas o Marquês de Pombal ficara em Lisboa, retido pelo conflito com o embaixador de Espanha. Contava-se em segredo nos recantos do palácio o diálogo entre o enviado castelhano e o secretário de estado português, louvandoo uns em voz alta, para os ecos daquelas


8 paredes repetirem os elogios, crucificando-o outros sem piedade, para saciarem os ódios. As devotas e os fidalgos puritanos eram pelo espanhol, e pediam a Deus que os rebates da guerra próxima despenhassem o plebeu nobilitado do seu pedestal político. Os magistrados e os homens de capa e volta, defendiam o marquês e respondiam com meios sorrisos às fogosas jaculatórias dos zelosos do trono e do altar. O Marquês de Pombal, tinha-se negado com firmeza às concessões exigidas imperiosamente pelo governo castelhano: – Muito bem, - atalhou o embaixador – um exército de sessenta mil homens entrará em Portugal e fará … - O quê ? – Perguntara o marquês, sorrindose com a tremenda luneta assentada e no tom mais indiferente. - Fará entender a razão e a justiça de el-rei, meu amo, a Sua Majestade, e a vossa excelência! – Redarguiu meia oitava acima o espanhol, supondo o ministro fulminado. Sebastião José de Carvalho franziu as sobrancelhas, carregou a viseira, e cravando a vista e a luneta no diplomata, retorquiu-lhe friamente: - Sessenta mil homens muita gente é para casa tão pequena; mas querendo Deus, el-rei


9 meu amo e senhor, sempre há-de achar onde possa hospedá-la. Mais pequena era Aljubarrota e lá couberam os que D. João de Castela trouxe. Vossa excelência pode responder isto ao seu governo. E, levantando-se para despedir o embaixador, acrescentou: - Bem sabe vossa excelência que pode tanto cada um em sua casa, que mesmo depois de morto é precisos quatro homens para o tirarem! O embaixador saiu jurando por Dyos y la Virgem Santíssima, e o marquês preparou-se para a guerra. O caso é, como dizia o nosso Zeferino na Sobrinha do Marquês, que Sebastião José de Carvalho foi um grande ministro e que fez muito pela nação. Hoje há menos quem responda assim à letra às ameaças dos estrangeiros. Berra-se muito, dorme-se a sono solto ao som dos hinos patrióticos e depois salva o castelo de madrugada e está salva a pátria. O marquês de Pombal prezava as artes e protegia e animava as classes médias. Esse pouco que o reino progrediu deveu-se a ele. Se a indústria nunca acabou de sair da infância, a culpa quase toda foi dos maus


10 governos que sucederam ao seu, e também do povo que não quis trabalhar deveras… Mas vamos aos touros reais. Desses é que o ministro não gostava nada. Queria-os ao arado e não à farpa, e parecia-lhe melhor, que os toureadores, sendo fidalgos, servissem o Estado com a pena ou com a espada, e, sendo mecânicos, que lavrassem, tecessem e ganhassem honradamente a vida, enriquecendo-se a si e à nação. Mas el-rei D. José, cedendo em tudo ao marquês, quanto aos touros não admitia reflexões. Nisto era rei a valer e Bragança legitimo. Os fidalgos sabiam-no e por isso desfrutavam doces prazeres – a satisfação do gosto nacional e a contradição da vontade do ministro. Desatendê-la sem perigo e pela mão do soberano era para eles um deleite e um triunfo. Nestas funções não vigorava a severidade das últimas pragmáticas. Outro motivo de júbilo. Quem queria podia arruinar-se em luxuosos vestidos, enfeites e toucados. As bordaduras e os recamos de ouro, os veludos e sedas de fora, talhados à francesa,


11 resplandeciam constelados de pérolas e diamantes. Por cima dos mais ricos trajos e das mais vistosas cores desenrolavam-se os anéis ondeados das empoadas cabeleiras. As damas ostentavam as graças de seus donaires e tufados, e emoldurando o belo oval dos rostos nos penteados caprichosos, sorriam-se para os gentis campeadores, e seus olhos cheios de luz e de promessas estimulavam até os tímidos. Correram-se as cortinas da tribuna real. Rompem as músicas. Chegou el-rei, e logo depois entra pelos camarotes o vistoso cortejo, e vê-se ondear um oceano de cabeças e de plumas. Na praça ressoam brava alegria as trombetas, as charamelas e os timbales. Aparecem os cavaleiros, fidalgos distintos todos, com o conto das lanças nos estribos e os brasões bordados no veludo das gualdrapas dos cavalos. As plumas dos chapéus debruçam-se em matizados cocares, e as espadas em bainhas lavradas pendem de soberbas talins. Os capinhas e forcados, vestem com garbo à castelhana antiga. No semblante de todos brilha o ardor e o entusiasmo. O Conde de Arcos, entre os cavaleiros, era quem dava mais na vista. O seu trajo, cortado


12 à moda da corte de Luiz XV, de veludo preto, fazia realçar a elegância do corpo. Na gola da capa e no corpete sobressaiam as finas rendas da gravata e dos punhos. Nos joelhos as ligas bordadas deixavam escapar com artificio os tufos de cambraieta alvíssima. O conde não excedia a estatura ordinária; mas, esbelto e proporcionado todos os seus movimentos eram graciosos. As faces eram talvez pálidas de mais, porém animadas de grande expressão, e o fulgor das pupilas negras fuzilava tão vivo e por vezes tão recobrado, que se tornava irresistível. Filho do marquês de Marialva e discípulo querido de seu pai, do melhor cavaleiro de Portugal, e talvez da Europa, a cavalo, a nobreza e a naturalidade do seu porte enlevavam os olhos. Ele, e o corcel, como que ajustados em uma só peça, realizavam a imagem do centauro antigo. A bizarria com que percorreu a praça, domando sem esforço o fogoso corcel, arrancou prolongados e repetidos aplausos. Na terceira volta, obrigando o cavalo quase a ajoelhar-se diante de um camarote, fez que uma dama escondesse turvada no lenço as


13 rosas vivíssimas do rosto, que decerto descobririam o melindroso segredo da sua alma, se em momentos rápidos como o faiscar do relâmpago pudesse alguém adivinhar o que só dois sabiam. El-rei, quando o mancebo o cumprimentou pela última vez, sorriu-se, e disse voltando-se: Porque virá o conde quase de luto à festa ? Principiou o combate. Não é propósito nosso descrever uma corrida de touros. Todos teem assistido a elas e sabem de memória o que o espectáculo oferece de notável. Diremos só que a raça dos bois era apurada, e que os touros se corriam desembolados, à espanhola. Nada diminuía, portanto, as probabilidades do perigo e a poesia da luta. Tinham-se picado alguns bois. Abriu-se de novo a porte do curro, e um touro preto investiu com a praça. Era um verdadeiro boi de circo. Armas compridas e reviradas nas pontas, pernas delgadas e nervosas, indício de grande ligeireza, sinal de força prodigiosa. Apenas tocara o centro da praça, estancou como deslumbrado, sacudiu a fronte e, escavando a terra impaciente, soltou um mugido feroz no meio do silêncio, que sucedera às palmas e gritos dos espectadores.


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Dentro em pouco as capinhas, saltando a pulos as trincheiras, fugiam à velocidade espantosa do animal, e dois ou três cavalos expirantes, denunciavam a sua fúria. Nenhum dos cavaleiros se atreveu a sair contra ele. Fez uma pausa. O touro pisava a arena ameaçador e parecia desafiar em vão um contendor.

De repente viu-se o Conde dos Arcos firme na sela provocar o ímpeto da fera e a haste flexível do rojão ranger e estalar, embebendo o ferro no pescoço musculoso do boi.

Um rugido tremendo, uma aclamação imensa do anfiteatro inteiro, e as vozes triunfais das trombetas a charamelas encerraram esta sorte brilhante. Quando o nobre mancebo passou a galope por baixo do camarote, diante do qual


15 pouco antes fizera ajoelhar o cavalo, a mão alva e breve de uma dama deixou cair uma rosa, e o conde, curvando-se com donaire sobre os arções, apanhou a flor do chão sem afrouxar a carreira, levou-a aoslábios e meteu-a no peito. Investindo depois com o touro, tornado imóvel com a raiva concentrada, rodeouo estreitando em volta dele os círculos até chegar quase a pôr-lhe a mão na nuca. O mancebo desprezava o perigo e pago até da morte pelos sorrisos, que seus olhos furtavam de longe, levou o arrojo a arrepiar a testa do touro com a ponta da lança. Precipitou-se então o animal com fúria cega e irresistível. O cavalo baqueou trespassado e o cavaleiro, ferido na perna, não pôde levantar-se. Voltando sobre ele o boi enraivecido arremessou-o aos ares, esperoulhe a queda nas armas, e não se arredou senão quando, assentando-lhe as patas sobre o peito, conheceu que o seu inimigo era um cadáver. Este doloroso lance ocorreu com a velocidade do raio. Estava já consumada a tragédia e não havia expirado ainda o eco dos últimos aplausos. De repente um silêncio, em que se conglobam milhares de agonias, emudeceu o circo. Rei, vassalos e damas, meio corpo


16 fora dos camarotes, fitavam a praça sem respirar e erguiam logo a vista ao céu como para seguir a alma que para lá voava envolta em sangue. Quando mancebo, dobrado no ar, exalava a vida antes de tocar no chão, um gemido agudo, composto de soluços e choro, caiu sobre o cadáver como uma lágrima de fogo. Uma dama desmaiada nos braços de outras senhoras soltara aquele grito estridente, derradeiro ai do coração ao rebentar do peito. El-Rei D. José com as mãos no rosto, parecia petrificado. A corte desta vez acompanhava-o na sua dor. Mas o drama ainda não tinha concluído. Quem sabe!? O terror e a piedade iam cortar de novas mágoas o peito a todos. O Marquês de Marialva assistira a tudo do seu lugar. Revendo-se na gentileza do filho, seus olhos seguiam-lhe os movimentos brilhando a cada sorte feliz. Logo que entrou o touro preto, carregou-se de uma nuvem o semblante do ancião. Quando o Conde dos Arcos saiu a farpeá-lo, as feições do pai contraíram-se e a sua vista não se despregou mais da arriscada luta. De repente o velho saltou um grito sufocado e cobriu os olhos, apertando depois as mãos na cabeça. Os seus receios haviam-se


17 realizado. Cavalo e cavaleiro rolavam na arena, e a esperança pendia de fio ténue ! Cortou-lhe rapidamente a morte, e o marquês perdido o filho, luz da sua alma e ufania de suas cãs, não preferiu uma palavra, não derramou uma palavra; mas os joelhos fugiam-lhe trémulos, e a elevada estatura elevou-se vergando ao peso da mágoa excruciante. Volveu, porém, em si, decorridos momentos alivia palidez do rosto tingiu-se de vermelhidão febril subitamente. Os cabelos desgrenhados e hirtos revolveram-se-lhe na fronte inundada de suor frio como as sedas da juba de leão irritado. Nos olhos amortecidos faiscou instantâneo, mas terrível, o sombrio clarão de uma cólera, em que todas as ânsias insofridas da vingança se acumulavam. Em um ímpeto a presença reassumiu as proporções majestosas e erectas como se lhe corresse nas veias o sangue do mancebo que perdera. Levando por acto instintivo a mão ao lado, para arrancar da espada, meneou tristemente a cabeça. A sua boa espada, cingira-a ele próprio ao filho neste dia que se


18 convertera para sua casa em dia de eterno luto. Sem querer ouvir nada, desceu os degraus do anfiteatro, seguro e resoluto como se as neves de setenta anos lhe não branqueassem a cabeça. – Sua majestade ordenou ao marquês de Marialva, que aguarde as suas ordens! – disse um camarista, detendo-o pelo braço. O velho estremeceu como se acordasse sobressaltado, e cravou no interlocutor os olhos desvairados, em que reluzia o fulgor concentrado dum pensamento imutável . Desviando depois a mão que o suspendia, baixou mais dois degraus. - Sua majestade entende foi já bastante desgraçado e não quer perder nele dois vassalos… - El-rei manda nos vivos e eu vou morrer! – atalhou o ancião, em voz áspera, mas sumida – Aquele é o corpo do meu filho! – e apontava para o cadáver – Está ali! Sua majestade pode tudo menos desarmar o braço do pai, menos desonrar os cabelos brancos do criado que o serve há tantos anos. Deixe-me passar, e diga isto. D. José vira o marquês levantar-se e percebera a sua resolução. Amava no


19 estribeiro-mor as virtudes e a lealdade nunca desmentidas. Sabia que da sua boca não ouvira senão a verdade, e a ideia de o perder assim era-lhe insuportável. Apenas lhe constou que ele não acedia à sua vontade, fez-se branco, cerrou os dentes convulsos e, debruçado para fora da tribuna, aguardou em ansioso silêncio o desfecho da catástrofe. A esse tempo já o marquês pisava a praça, firme e intrépida como os antigos romanos diante da morte. Dentro do peito o seu coração chorava, mas os olhos áridos queimavam as lágrimas quando subiam a rebentar por eles. Primeiro do que tudo queria a vingança. Por impulso instantâneo, todo o ajuntamento se pôs de pé. Os semblantes consternados e os olhos arrasados água, exprimiam, aquela dolorosa contenção de espírito, em que um sentido parece concentrar todos. - Deixai-o ir ao velho fidalgo! A mágoa, que o trespassa, não tem igual. O fogo, que lhe presta vida e forças, é a desesperação. Deixai-o ir, e de joelhos! Saudai a majestade do infortúnio. O pai angustiado ajoelhou junto do corpo do filho e pousou-lhe depois um ósculo na fonte.


20 Desabrochou-lhe o talim e cingiu-o, levantoulhe do chão a espada e correu-lhe a vista pelo fio e pela ponta de dois gumes. Passou depois a capa no braço e cobriu-se. Decorridos instantes estava no meio da praça e devorava o touro com a vista chamejante, provocando-o para o combate. Cortado de comoções tão cruéis, não lhe tremia o braço e os pés arreigavam-se na arena como se um puder oculto e superior lhos tivesse ligado repentinamente à terra. Fez no circo um silêncio gélido, tremendo e tão profundo, que poderiam ouvir-se até as pulsações do coração do marquês, se naquela alma de bronze o coração valesse mais do que a vontade. O touro arremete contra ele. Uma e muitas vezes o investe ego e irado, mas a destreza do marquês esquiva sempre a pancada. Os ilhais da fera urfam de fadiga, a espuma franja-lhe a boca, as pernas vergam e resvalam, e os olhos amortecem de cansaço. O ancião zomba da sua fúria. Calculando as distâncias, frustra-lhe todos os golpes sem recuar um passo. O combate demora-se. A vida dos espectadores resume-se nos olhos. Nenhum usa desviar a vista de cima da praça. A imensidade da catástrofe imobiliza


21 todos. De súbito solta el-rei um grito e recolhese para dentro da tribuna. O velho aparava a peito descoberto a marrada do touro, e quase todos ajoelharam para rezarem por alma do último marquês de Marialva. A aflitiva pausa apenas durou momentos. Por entre as névoas, de que a pupila trémula se embaciava, viu-se o homem crescer para a fera, a espada fuzilar nos ares e logo após sumir-se até aos copos entre a nuca do animal. Um bramido, que atroou o circo, e o baque do corpo agigantado na arena, encerraram o estremo acto do funesto drama. Clamores uníssonos saudaram a vitória. O marquês, que tinha dobrado o joelho com a força do golpe, levantava-se mais branco do que um cadáver. Sem fazer caso dos que o rodeavam, tornou a abraçar-se com o corpo do filho, banhando-o de lágrimas e cobrindo-o de beijos. O touro ergueu-se, e, cambaleando com a sezão da morte, veio apalpar o sítio onde queria expirar. Ajuntou ali os membros e deixou-se cair sem vida ao lado do cavalo do conde dos Arcos.


22 Nesse momento os espectadores olhando para a tribuna real estremeceram. El-rei, de pé e muito pálido, tinha junto de si o marquês de Pombal, coberto de pó e com sinais de ter viajado depressa. Sebastião José de Carvalho voltava de propósito as costas à praça falando com o monarca. punia assim a barbaridade do circo. – Temos guerra com a Espanha, senhor. E inevitável. Vossa majestade não pode consentir que os touros lhe matem o tempo e os vassalos. Se continuássemos nesse caminho … cedo iria Portugal à vela. - Foi a última corrida marquês. A morte do conde dos Arcos acabou os touros reais enquanto eu reinar – Assim o espero da sabedoria de vossa majestade. Não há tanta gente nos seus reinos, que possa dar-se um homem por um touro. - El-rei consente que vá em seu nome consolar o marquês de Marialva ? - Vá ! É pai. Sabe o que há-de dizer-lhe…! - O mesmo que ele me diria a mim, se Henrique estivesse como está o conde. El-rei saiu da tribuna, e o marquês de Pombal, entrando na praça em toda a majestade da sua elevada estatura, levantou nos braços o


23 velho fidalgo, dizendo-lhe com voz meiga e triste: - Sr. Marquês! Os portugueses, como V. exª., são para darem exemplos de grandeza de alma e não para os receberem. Tinha um filho e Deus levou-lho. Altos juízos seus! A Espanha declara-nos a guerra e el-rei, meu amo e senhor, precisa do conselho e da espada de v.exª. e travando-lhe da mão, levou-o quase nos braços até o meterem na carruagem. D. José I, cumpriu a palavra dada ao seu ministro. No seu reinado não mais se picaram touros reais em Salvaterra.”

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II O CONDE DOS ARCOS – A SUA ORIGEM E MORTE NOTA PREVIA

É pela carta real de 2 de Fevereiro de 1620 que, pela primeira vez se fala deste título; Conde dos Arcos. É um título atribuído com conotação à povoação de Arcos de Valdevez. Segundo alguns historiadores, o nascimento do 7º Conde dos Arcos; D. Manuel José de Noronha e Menezes, terá acontecido em Marvila, no ano de 1740. Em 1989, quando pesquisava o local onde teria existido o “Teatro Régio de Salvaterra”, pessoas que agora teriam 115 anos de idade, disseram-me que na meninice deles, o povo falava que o sítio onde teria acontecido a

corrida, era num terreno aberto, por detrás do Paço das Damas. Lembravamse, que no primeiro quartel do séc. XX,


25 aquela zona foi urbanizado com algumas casas. E que alguns lhe chamavam “Canto da Ferrugenta”, outros o “Páteo do Pardalada”. Quanto ao registo da morte sabe-se foi feito nos serviços da secretaria do paço real de Salvaterra e, do mesmo, fez notícia a “ Gazeta de Lisboa”, jornal da época. A POLÉMICA A curiosidade em conhecer melhor o que foi escrito por Rebello da Silva, sobre a “Última corrida de toiros em Salvaterra e a morte do Conde dos Arcos” tem levada à realização de vários colóquios, onde as inúmeras intervenções, causam sempre alguma polémica. Também em 2003, Vitor Escudero, considerado um investigador no mundo dos toiros, em Portugal, Arraigadamente disse numa reunião de aficionados, realizada em Salvaterra, “É uma das maiores mentiras da nossa História”, o Conde dos Arcos morreu, na Murteira (Samora Correia). ********** De acordo com o registo cronológico dos titulares “Conde dos Arcos”, regista-se a sua morte em 1779, mas em documentos usados posteriormente, como: “certidão de óbito”, a sua morte ocorreu em 10 de Fevereiro de 1778. ***********


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Já antes, Pizarro Monteiro, falecido em 1991, deixou escrito em 1982, que a morte do Conde dos Arcos, nunca aconteceu de maneira trágica em Salvaterra, mas sim de morte natural, conforme uma oração fúnebre deixada escrita em 1778. Também quando das obras, realizadas na Igreja Matriz da vila, em 1958, o padre José Rodrigues Diogo, pároco da freguesia, em


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presença de três pedras tumulares em frente ao altar daquele templo, disse: Uma delas é do Bispo João Soalhães, fundador da Igreja, em 1296, cujo orago é S. Paulo. Uma outra é, do Conde dos Arcos, veio do convento de Jericó, quando do sismo de 1858.


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III A CONSTRUÇÃO DA PRAÇA DE TOIROS Corria o ano de 1919, os mais idosos, ainda falavam da existência de uma praça de toiros, uma construção em madeira, que existiu na vila, que era explorava pela Misericórdia de Portalegre. Na vila de Benavente andava no ar, o entusiasmo para a construção de uma praça de toiros. Na taberna do José Luis das Neves, ali na esquina da Trav do Martins, com a rua Direita, um grupo de aficionados, juntava-se todas as noites, e um deles não tirava da cabeça a vontade das gentes da terra vizinha, de virem a construir uma praça de toiros. Que inveja aquela, de não terem também uma aqui em Salvaterra de Magos. A ideia amadureceu e foi avante, um grupo se formou mesmo ali Francisco Maria Gonçalves, Augusto da Silva,Manuel Lopes Gonçalves, Luiz Gonçalves da Luz, António Henriques Alexandre, Augusto


30 Gonçalves da Luz, Carlos Alberto Rebelo, Pedro de Sousa Marques, e o taberneiro, José Luis das Neves, depressa fizeram uma “circular” com várias cópias, que circulou por tudo quanto era sitito da vila. José Luis das Neves, contou-me isto e muito mais, quando o entrevistei, no aniversário dos 50 anos da inauguração da Praça de Toiros, efeméride que fiz publicar no Jornal Aurora do Ribatejo. Nessa época trabalhava José das Neves, no Grémio da Lavoura. De início, tiveram alguns contratempos, mesmo de lavradores que não aceitaram o entusiasmo do grupo, um deles chegou mesmo a oferecer uma quantia em dinheiro, para desistirem da ideia, pois não acreditava. A circular, distribuída à população dizia assim: “De há muito que os Salvaterrenses, e outros mais, cuja longa permanência aqui os leva a considerar esta também sua terra Natal, vêm mostrando desejos de voltarem a possuir novamente uma Praça de Toiros nesta localidade. E, para que essa ideia se torne um facto, combinaram os abaixo assinados reunirem-se quanto antes, o que fizeram ontem, em casa dum dos signatários, deliberando o seguinte; Procurar levara a efeito a construção desse dito edifício e, uma vez concluído, oferecê-lo ao Hospital da Misericórdia desta vila; Diligenciar falar e escrever a todos, sem execepção, a fim de angariar os donativos precisos para a construção imediata do referido edifício,


31 ficando todo e qualquer desses donativos à responsabilidade dos mesmos signatários, que prestarão contas a seu devido tempo, se assim lhes for exigido. Inútil seria dizer que a construção de tal edifício de espectaculos representará mais um engradecimento para a nossa terra e uma dávida, cremos, de importante valor para o nosso Hospital, Casa de Caridade esta que tão digne e merecedora é que a ajudem. Assim, pois, espera a Comissão que todos a coadjuvem, por toda e qualquer forma, peocurando vencer sempre dificuldades que apareçam, a fim de se conseguir principiar e chegar à conclusão de tão útil e desejado edifício. Nesta esperança e agradecendo antecipadamente, se subcreve com toda a consideração e respeito. Salvaterra de Magos, 18 de Setembro de 1919. A Comissão”. Este e mais alguns documentos, me ofereceu José Das Neves, quando da referida entrevista, dizendo-me: Estão aqui nesta gaveta há umas boas dezenas de anos. Replicando disse-me - iguais a estes, apenas tinha o Fernando de Sousa Marques, filho do meu amigo Pedro Marques, que de vez enquando a emprestava e parece que veiram a desaparecer. Estes, o Dr. José Cardador, fez usos deles, num livro que escreveu sobre a Misericórdia, mas depois me devolve-os Dos documentos oferecidos por José das Neves, faça aqui uso de alguns.


32 Uma carta foi enviada à Câmara Municipal, na pessoa do seu presidente, pedindo a oferta de um pedaço de terreno, com sessenta metros de diâmetro à entrada da vila, onde estava um resto de pinhal, e três velhos Moínhos já sem uso. Um ofício, com data de 18 de Setembro de 1919, foi dirigido ao Ministério das Finanças, pedindo a decência de pinheiros do Pinhal do Escaroupim, próximo desta vila. A construção da praça iniciou-se, que levou vários meses, já que as bancadas, foram em madeira. A decoração interior, tinha parecenças com a do Campo Pequeno. Terminada a obra, uma Comissão encarregou-se dos festejos da inauguração – António Sousa Vinagre, Dr. Armando Santos Calado, Dr. Roberto Ferreira da Fonseca, José Rebelo de Andrade e Henrique da Costa Freire.

O dia da inauguração, foi marcado para 1 de Agosto de 1920, e no programa constava,


33 que às 5 horas, seria lançado uma salva de 21 morteiros. Às 8 horas, entrada de toiros a pé. Às 13 horas, a embolação dos que seriam corridos. Às 16 horas, sessão solene no Club, em homenagem ao falecido bandarilheiro, Vicente Roberto da Fonseca, e seu irmão Roberto Jacob da Fonseca, sendo descerrado os retratos dos dois grandes artistas, executando por essa ocasião a Banda Euterpe Alhandrense o “hino Irmãos Robertos”, escrito expressamente para este fim pelo seu inteligente,maestro Serra e Moura. Às 17, 30 horas começará a corrida de toiros em que tomam parte os laureados artistas; José Casimiro e Adolfo Macedo, a pé Teodoro Gonçalves, Ribeiro Tomé, Vital Mendes, Francisco Rocha, Mateus Falcão e Manuel dos Santos, da Golegã, Os forcados do valente grupo de que é capataz, Manuel Burrico, o director da corrida, Roberto Jacob. Os touros desta corrida são generosamente oferecidos pela firma Roberto & Roberto. No segundo dia dos festejos, haverá uma uma segunda corrida, em que tomam, José Casimiro e Adolfo Macedo, e os laureados bandarilheiros amadores, D. Carlos Macarenhas, D. Pedro de Bragança, Patrício Cecílio, Francisco D`Oliveira, João malhou da Costa e Rafael Gonçalves. Campinos António Eugénio de Menezes (abegão), Joaquim Coimbra, Manuel Coimbra, Francisco Souto Barreiros. carecas; António José Rebelo de Andrade, papagaio; D. Baltazar de Freitas


34 Lino. Os touros para esta corrida foram gentilmente oferecidos pelo novo ganadero Francisco Ferreira Lino, orindos da antiga ganadaria António Ferreira Roquette. Os jornais, ABC e “A Manhã”, entre outros envaram a Salvaterra de Magos, os seus jornalistas, das suas páginas sobre tauromaquia, para fazerem a reporgem. O Jornal A Manhã, diário republicano, fez sair no dia 6 de Agosto, edição que se esgotou. em Salvaterra de Magos, mesmo sendo dobrado os exemplares à venda. Algum tempo ainda levou a entregar a praça à Misericórdia, foi necessário mais algumas ofertas em dinheiro, dos lavradores e do povo, que acorria aos bailes, já sem encargos, foi a chave entregue à Misericórdia. A Associação de Beneficência – Misericórdia de Salvaterra de Magos, faz chegar à Comissão Construtora da Praça de Touros, o ofício nº 9 “À execlentíssima Comissão Construtora da Praça de Touros desta vila” * Tendo chegado às minhas mãos, o ofício de V. Exªs., que acompanhava a chave da praça de touros, eu, em nome da Comissão Administrativa tenho a honra de lhes agradecer a sua benemérita intenção, e bem assim a todos os senhores que concorreram para a construção daquela propriedade, e de lhes notitificar que na acta da sessão de hoje, lhes fica exarado um voto de louvor pela sua bela intenção. Saúde e Fraternidade.


35 Salvaterra de Magos, 16 de Março de 1924 (a) – José Eugénio de Menezes O CICLONE Cerca de uma vintena de anos depois, ventos ciclónicos fizeram-se sentir por todo o país. Em Salvaterra de Magos, os estragos foram imensos, a Praça de touros, sofreu muitos estragos. Jorge de Melo e Faro (Conde de Monte Real) e sua esposa, exmª Snrª D. Maria Teresa Castro Pereira Guimarães de Melo e faro, tomaram a iniciativa da sua reconstrução e organizaram duas corridas, entegando as receitas ao Hospital, Da primeira corrida 13.851$50 e da segunda corrida 115.176$65 ( À primeira corrida dignou-se assistir Sua Excelência o Senhor Presidente da República, General António Oscar de Fragoso Carmona). Para reparar os estragos, também contribuiu com avultada quantia, o benemérito de Salvaterra, o lavrador; Gaspara da Costa Ramalho Nota: O Dr. José Asseiceira Cardador, no seu livro “Subsídio para o Estudo da Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos, - 1970, faz refrências à Praça de Toiros

*********************** ***************


36

IV TOIROS DE MORTE EM SALVATERRA Depois do acontecido em 1762, com a morte do Conde dos Arcos, vários abusos com mortes de toiros aconteceram em praças portuguesas. Em 1921, Joaquim Mella, na praça de toiros das Caldas da Rainha, estoqueou um toiro e, logo de seguia em Salvaterra de Magos, o toureiro “Faculdades”, que muitas vezes fez


37 parelha com os irmãos Roberto(s), abateu toiros o que deu origem à publicação de uma nova

lei

que

revogava

as

anteriores

proibições, que vinham de 1837 e 1838. Novamente e apesar das proibições, em 1927, foram mortos toiros em praças de Portugal. Novo decreto-lei, foi publicado no Diário do Governo, de 11 de Abril de 1928, estabelecendo pesadas sanções para os prevaricadores, bem como aos proprietários das praças. Em 1952, Manuel dos Santos, estoqueou um toiro no Campo Pequeno e, mais tarde coube a vez ao matador António dos Santos. Os anos decorriam e os aficionados, toureiros e ganadeiros pugnavam, mesmo em surdina, pela morte dos toiros na arena, das praças portuguesas, Aproveitando as incertezas políticas que pairavam em Portugal, depois da revolução dos cravos, em 1974, novamente o “mundo” ligado a festa tauromáquica, realiza em


38 Salvaterra de Magos, no dia 18 de Dezembro de 1976, no salão do Clube Desportivo local, um colóquio, Da reunião, fiz noticia que foi publicada no jornal “Diário do Ribatejo” em 18

de

Dezembro

de

1976,

que

aqui

transcrevo: “Sim, toiros de morte em Salvaterra de Magos foi a palavra de ordem, no colóquio realizado no passado dia 18, no Salão do Clube Desportivo Salvaterrense. Promovido pela Comissão Pró-Toiros de Morte em Portugal e apoiada pela Comissão da Praça de Toiros de Salvaterra, e na sequência de outras sessões sobre o mesmo tema, foi levada a efeito uma sessão e esclarecimento sobre a situação da tauromaquia em Portugal e dar a conhecer o ponto da situação sobre o movimento que se está a desenvolver para as corridas na próxima temporada, sejam integrais. Compunham a mesa do colóquio: Dr. Queirós (advogado), José Júlio, Parrreirita

Cigano,

António

Portugal,

Ludovino

Bacatume Mestre Batista (toureiros). Rogério Amaro (critico e pegador de toiros), João Ramalho(ganadeiro) João

Mascarenhas,

Chony,

Francisco

Rocha

(aficionados), e ainda as senhoras; Isabel Cadencio e


39 Carolina Bacatum. Foram ainda convidado e, estiveram presentes; forcados, campinos e alguns elementos da Comissão que tinham em seu poder a gerência da praça de toiros da misericórdia local. Abriu o colóquio, o sr, Chony que fez algumas considerações sobre as perspectivas e a sua viabilidade dos toiros de morte em Portugal.

Seguidamente foi

dada a palavra ao ganadeiro João Ramalho, que fez uma síntese dos toiros de lide e as dificuldades na sua criação. O dr. José Queiró, começou a sua intervenção, por fazer algumas considerações ao processo judicial, onde estão envolvidos os matadores e cavaleiros, que intervieram na já célebre corrida de 31 de Outubro do corrente ano, em Vila Franca de Xira. Depois fez algumas análises ao Decreto-Lei, que proíbe os toiros de morte em Portugal e que data de 1836,e que foi confirmado pelo Decreto de 1919, que prevê para as infracções nalguns pontos multas de 2$00 e 15$00, mais tarde em 1921 saiu a Portaria que vem de igual modo regulamentar as corridas de toiros e suas implicações, ainda em 1928, saiu outro Decreto-Lei sobre igual matéria e que na opinião jurista, tal matéria publicada, está desde há muito ultrapassada, e que urge


40 modificar. Pela sua intervenção recebeu grandes aplausos. O crítico de toiros do “jornal de noticias” e forcado, Rogério Amaro, iniciou a sua intervenção sobre o papel dos moços de forcados e a necessidade de os agrupamentos serem reduzidos, se os toiros de morte for uma realidade, foi muito aplaudido. José Júlio, António Portugal e Parreirita Cigano descreveram cada uma à sua maneira o papel do matador de toiros, em Portugal e em Espanha, Por todos foi condenado o obsoleto Decreto, que ainda regula as corridas com toiros de morte em Portugal. As senhoras, Isabel Cadencio e Carolina Bacatum, referiram-se ao papel das senhoras no ambiente tauromáquico, aplaudiram e incentivaram os elementos da Comissão Pró-Toiros de Morte a prosseguir a sua luta, que era aliás a luta de todos os aficionados. O sr. João Mascarenhas, que na sua intervenção, empregou grande entusiasmo e bastante aficion, começou por exortar os presentes a apoiar a Comissão, que está a trabalhar no projecto, que se espera dentro de algum tempo venha a ser entregue ao governo. Fez uma crítica, às ausências dos aficionados, que servem nos meios da comunicação social, e manifestou a sua


41 grande alegria, por naquela sala encontrar grande número de jovens e que se estava em presença de novos aficionados. Loduvino Bacatum, também deu uma achega, focando os aspectos dos toureiros, que sendo reconhecidos como trabalhadores na sua profissão, nalguns Ministérios, inclusive o do Trabalho, não podiam ser matadores de toiros, em Portugal, também deu a conhecer pormenores ao público presente de como tem sido o “mister”de empresário neste país, e que num futuro muito próximo, tal condição, terá que ser mais humana. Ao entrar-se no período de perguntas aos elementos que compunham a mesa, assistiu-se a um dialogo, muito vivo e entusiasta, com perguntas que

pelo

conteúdo,verificava-se

aficionados

que

os

seu

Salvaterrianos, estavam deveras preocupados com o futuro das corridas de toiros, muito especialmente com as de toiros de morte, sendo muito frequente ouvir-se “a petição para a frente”, começar com os toiros de morte em Portugal, ela se efective, mas terminaram, com a morte do Conde de Arcos, na Primavera de 1762. Por último foram exibidos filmes, dando conta à assistência de como são frias e sem motivação, as corridas de toiros em Portugal, em paralelo com as realizadas em


42 Espanha, onde o público vê o espectáculo, cheio de vibração quando o matador remata a faena, com o estoque final.

A assistência, cerca de três centenas e

meia de pessoas, saiu deveras entusiasmada, assinando por fim as listas, para a respectiva petição de toiros de morte em Portugal.

18-12-76 * JOSE GAMEIRO **************

Uns meses depois, num ambiente, então descrito de provocar a lei, na praça de toiros de Salvaterra, em 15 de Maio de 1977, os toureiros Armando Soares e o espanhol “El Macareño”, estoquearam 4 toiros. Do acontecido, o jornal “Aurora do Ribatejo”, publicou notícia, em 25 de Maio de 1977.


43


44

V CRIADORES DE TOIROS EM SALVATERRA Nota Prévia No séc. XIX, existem registos de lavradores de Salvaterra de Magos, para além de terem, a sua actividade agrícola, desenvolviam a criação de gado bravo. Havia as pequenas e grandes

ganadarias.

Nas

pequenas,

trabalhavam um restrito grupo que não passavam Campinos.

do

Moiral,

Contra

Moral

e


45 Nos meses da Primavera e Verão, o gado pastava nas terras frescas da bacia do rio Tejo. Como no campo de Salvaterra e Lezíria Grande (Vila Franca de Xira). No tempo de Outono e Inverno, alimentavam-se do pasto da charneca, lá para os lados do Chaparral e Coelhos, pastando algumas vezes nas terras frescas, que viriam a pertencer anos depois à Barragem de Magos. RODRIGO FERREIRA DA COSTA (Dr.)

Natural de Salvaterra de Magos, foi médico e criador de gado bravo, por volta de 1873, forneceu vários curros de toiros para a praça do Campo de Sant`Ana. Falecer em 1878, na sua terra-natal. ANTONIO FERREIRA ROQUETTE

Natural de Salvaterra de Magos, teve casa agrícola nesta vila, foi criador de toiros, com divisa: turquesa e branco. Os seus toiros gozavam de grande fama. Enviou alguns curros para a praça de Sant`Ana, em Lisboa


46 e chegou a fornecer curros para Madrid. O lavrador de Alpiarça, João Ignácio da Costa, comprou-lhe alguns toiros, para apurar as suas rezes. Tal como seu irmão, José Ferreira Roquette, foi toureiro e cavaleiro amador, conseguindo grande popularidade.

JOSE LUIZ DE BRITO SEABRA

Nasceu em Salvaterra de Magos, em 30 de Agosto de 1845, foi dono com sua mãe do palacete construído nesta vila, que mais tarde passou a propriedade da família Monte Real. Foi lavrador e ganadeiro, presidente da câmara municipal de Salvaterra de Magos, membro da Junta Geral do Distrito de Santarém. Foi sócio fundador do Real Club Tauromachico Portuguez, fundado em 23 de Fevereiro de 1892. Faleceu em Valada, no dia 27 de Julho de 1893.


47

ANTONIO JOSE FERREIRA DA SILVA

Nasceu a 19 de Setembro de 1889, filho do ganadeiro com o mesmo nome, forneceu toiros para serem corridos em várias praças dos pais, a sua divisão era Azul, e as manadas pastavam nos campos de Salvaterra.

ROBERTO DA FONSECA JUNIOR

Nasceu em Salvaterra de Magos, filho reconhecido do antigo bandarilheiro, Roberto da Fonseca, quando da abertura do seu testamento *

Nos últimos anos do séc. XIX,

pretendeu ser toureiro, convencido de que não tinha aptidões artísticas, dedicou-se à criação de toiros de lide.

JOSE FERREIRA ROQUETTE

JFR


48 Nasceu em Salvaterra de Magos, era irmão de António Roquette, teve uma manada de toiros bravos, com a divisa verde.

JOÃO ANTÓNIO FERNANDES

Pequeno lavrador, natural de Salvaterra de Magos, tinha uma vacada e, alguns toiros de selecção, que pastavam nos campos da vila, junto ao Tejo. Forneceu curros para várias praças dos pais.

ROBERTO & ROBERTO (Vicente Roberto e Roberto da Fonseca),

RR

Nasceram em Salvaterra de Magos, como bandarilheiros ganharam fama e proveito, dedicaram-se à agricultura e tiveram uma ganadaria de toiros de lide, que pastavam nos seus campos de Salvaterra. Um curro de


49 toiros desta ganadaria, foi corrido na arena do Campo de Sant`Ana, em Dezembro de 1987, onde teve lugar a última corrida nesta praça.

Actuaram

os

cavaleiros

Casimiro

Monteiro, Alfredo Tinoco, José Bento de Araújo e D. Luiz do Rego. Estes ganadeiros integraram em Portugal, o primeiro lote, que construíram “Tentaderos” para testarem as suas vacas e, para tal construíram um, na sua Herdade dos Coelhos.

FRANCISCO FERREIRA LINO

FFL Nasceu em Salvaterra de Magos, filho de João Francisco Lino, iniciou a actividade agrícola, aos 18 anos, depois de passar pelo comércio em Lisboa. De pequeno lavrador, foi comprando propriedades e, por volta de 1915, acabou de construir o seu Palacete, cujo começo vinha antes do terramoto de 1909, na sua Quinta da Ómnia.

A sua


50 ganadaria, teve início naquela época, sendo os seus animais oriundos de António Ferreira Roquette. JOSE VICENTE DA COSTA RAMALHO

Filho do lavrador e benemérito, Gaspar da Costa Ramalho, em 1936, era detentor de casa agrícola, com criação de toiros, que pela fama adquirida nas praças portuguesas, começaram a ser solicitados para as arenas de Espanha.

IRMÃOS ROBERTO (Vicente Roberto Ferreira da Fonseca, Roberto Ferreira da Fonseca (Dr.) e, João Roberto Ferreira da Fonseca)

IR Receberam por herança casa agrícola e ganadaria, de seu pai João Roberto, que por


51 sua vez recebeu da firma Roberto & Roberto. A Ganadaria, na primeira metade do séc. XX, muita fama lhes deu. JOÃO RAMALHO (JOÃO JOSE DE MORAES SARMENTO COSTA RAMALHO)

Nasceu em Salvaterra de Magos, filho do lavrador e ganadeiro; José Vicente da Costa Ramalho

*

Sede:

Quinta

da

Gatinheira

(Salvaterra de Magos) * Divisa: Lilás e Branco * Historial: Em 1961 compra 30 vacas Toiros a José Pedrosa e 1 toiro e 4 vacas “Chamaco”, vindas de Pinto Barreiros, com ferro de irmãos Roberto (Salvaterra de Magos) * Em 1963, compra 8 vacas Urquijo x Alves do Rio, a Dr. José Manuel Andrade (linha toda dada ás filhas: Thereza e Helena Ramalho)


52 JOSE LUIS PEREIRA DIAS

Natural da Malveira (Oeste), na década de 70 do séc. XX, veio para Salvaterra de Magos, onde tem morada * Divisa: Azul e Preto * Toiros oriundos: José Manuel Andrade, Engº Ruy Gonçalves e Cabral de Ascensão * Antiguidade: 1976

FELICIDADE DIAS (Felicidade da Conceição Filipe Pereira Dias)

* Nos anos 70 do séc. XX, fixou residência em Salvaterra de Magos * esposa do ganadeiro José Dias e, mãe dos Irmãos Dias * Divisa: Encarnado e

Amarelo * Toiros oriundos:

Andrade Salgueiro e Manuel César Rodrigues * Ganadaria conhecida desde 1984.


53

IRMÃOS DIAS José Luís Pereira Dias e Felicidade da Conceição Filipe Pereira Dias Filhos de José Dias e Felicidade Dias,

* Ganadaria desde 1976 * Tem sede em Salvaterra

de

Magos

(Ribatejo)

*

Toiros

oriundos de Norberto Pedroso, que iniciou uma

ganadaria

em

1910,

com

vacas

portuguesas de Manuel Duarte Oliveira e Condessa da Junqueira. De Emílio Infante da Câmara, também adquiriu algumas vacas e sementais. THEREZA E HELENA RAMALHO (Thereza Margarida e Helena Rita Bastos de Moraes Sarmento Ramalho)


54

*Morada na Quinta da Gatinheira (Salvaterra de Magos) * Divisa: Laranja e Verde Musgo * A sua ganadaria é oriunda de seu pai João Ramalho. Antiguidade já conhecida em 1976, nos últimos anos deixaram de ter registo, passando os seus

animais

a integrar

a

ganadaria de seu pai, com o fim de serem corridos em Espanha.

*************** ************** *****


55

VI CRIADORES DE CAVALOS EM SALVATERRA Nota Prévia As terras de Salvaterra de Magos, junto ao rio Tejo, férteis em aluvião, onde a erva fresca era muito convidativa param a criação de gado

cavalar,

dando

origem

ao

aparecimento de algumas Coudelarias. Nas Estatísticas de Portugal, dos últimos anos do séc. XIX, constam que a produção animal, de gado bovino, cavalar e asno, criada neste concelho,

tinha

grande

peso na economia do pais, quer em quantidade e qualidade. O burro,


56 era aproveitado em grande quantidade para os cruzamentos com (égua/cavalo), dando origem ao Macho/Mula, para os trabalhos mais exigentes da lavoura. Entre os vários criadores do gado da raça cavalar, constava a casa agrícola, Cadaval, de Muge. PORFIRIO NEVES DA SILVA

Natural de Salvaterra de Magos, foi grande lavrador nasceu

com e,

terras

nos

no

concelho

concelhos

onde

vizinhos.

Era

respeitado por todo o Ribatejo (anteriormente Estremadura), pela dedicação a que se entregou à criação do gado cavalar. Nos registos antigos do Ministério do Exército, verifica-se que foi muito pretendido, pela qualidade do seu gado, que apresentava na remonta, todos os anos. Em

1907,

foi

Administrador-Interino

da

Câmara Municipal da sua terra-natal, o que


57 lhe valeu o seu toponímico à rua que mais tarde passou a Gen. Humberto Delgado.

JOÃO OLIVEIRA E SOUSA

Oliveira

e

Sousa,

sendo

engenheiro,

pertenceu aos quadros do exército, com o posto de Capitão. Era abastado lavrador, com residência em Salvaterra de Magos, contava em 1935, com propriedade nos concelhos de Salvaterra de Magos, Coruche, Benavente, Vila Franca e Azambuja. Também possuía propriedades no norte do pais, pois era oriundo da zona da Guarda. Na

sua

pecuária,

actividade dedicava

agrogrande

apreço pela criação do gado cavalar, onde incluía bons exemplares nascidos de uma éguada da raça lusitana, que pastava por vezes na Lezíria Grande (Vila Franca de Xira).


58 A sua coudelaria, proveio de António José da Silva, que em 1893, já cuidava de criar bons exemplares

de

cavalos,

destinados

à

remonta, realizada pelo exercito português. Com a sua morte, os filhos, continuaram a casa agrícola (Oliveira e Sousa, Herdeiros), tendo os netos o cuidado de continuarem a administram a Casa Agrícola. As instalações da Coudelaria, são na Quinta do Massapez, em Salvaterra de Magos

IRMÃOS ROBERTO

João Roberto da Fonseca, em 1939, com 78 anos de idade, pai de Vicente Roberto da Fonseca; de Roberto da Fonseca (Dr.) e de João Roberto Ferreira da Fonseca, tendo a sua

casa

agrícola,

dedicava

especial

atenção à criação do gado bravo e do gado cavalar.

Teve

exemplares

em

várias

exposições em Salvaterra. Em 1928 recebeu um diploma, pela presença de 10 poldros,


59 considerados de grande qualidade, numa exposição do então Ministério da Guerra.

ANTONIO DA SILVA LAPA

Natural de Salvaterra de Magos, desde jovem, como agricultor interessou-se pela criação

de

gado

cavalar.

Depressa,

escolheu e veio a manter uma raça de cavalos que destinava à cavalaria militar e desportiva. Para esse tipo de exemplares, usava o cruzamento

do

Português

“Alter”

com

“Zapota”, animal das terras da Andaluzia (Espanha). Aos 76 anos de idade, ainda era um credenciado criador de cavalos. MENEZES & IRMÃO, LDª

Os irmãos José Eugénio de Menezes e António Eugénio de Menezes, fundaram uma Sociedade Agrícola. Por falecimento deste


60 último, passou a pertencer à firma, seu filho, António de Menezes. Foram criadores de cavalos raça Lusitano, em terras de Salvaterra e do Pombalinho (Santarém).

JOSE LOPES FERREIRA LINO

Nasceu

em

Salvaterra

de

Magos, em 1914, na década de 60,

sendo

funcionário

da

câmara municipal de Salvaterra de Magos, fazia uma pequena agricultura e, tinha gosto pela criação de cavalos e éguas, que pastavam nas

terras

de

Alcamé

(Vila

Franca),

apresentando-os depois à venda na Remonta Anual, que o exército fazia em Salvaterra de Magos. Sendo um grande aficionado da festa brava, possuía um jogo de cabrestos, que fazia exibir nas Festas da terra.


61

****************** **************


62

VII A DINASTIA ROBERTO Nota Prévia Desde menino de escola, ouvia falar dos Roberto(s). Diziam que foram toureiros. Nesse tempo, talvez em 1955, passando eu, na rua Cândido dos Reis (Antiga Rua S. António), dei comigo envolvido entre uma multidão, que em grande alegria descerravam uma placa de homenagem aos irmãos toureiros. Esse grande número de pessoas, estavam ali com os representantes da Casa do Ribatejo, deixando uma lápide na parede, por cima da porta de um prédio da família, o seu preito de gratidão, aos homens que um dia honraram Salvaterra e o Ribatejo, com as suas belas


63 actuações em praças de toiros de Portugal e Espanha. O tempo passou…! Nunca mais, os seus conterrâneos se lembraram deles, nem uma rua com o seu topónimo. Foram simplesmente esquecidos.

Os

autarcas,

aqueles

que

decidem, nunca tiveram em conta, o seu valor artístico que levou a todos os cantos, o nome de Salvaterra, nem a lembrança da sua benemerência. A ORIGEM

O nome Roberto referenciado em Salvaterra de Magos, nos meados do séc. XVIII, segundo alguns estudos genealógicos, estará ligado aos falcoeiros, vindos da Holanda, como mestres daquela arte. Henrique Jacob (17441829), um deles, casou com Ana Josefa de Vasconcellos, desta vila, e daí o início da dinastia – Os Jacob (s). António Roberto da Fonseca, tal como os seus irmãos Luís Roberto da Fonseca, Tito da Fonseca e Antão José da Fonseca, nasceram em Angra do Heroísmo (Açores), vindo ainda crianças para Lisboa, instalando-se depois em Salvaterra de Magos. Segundo algumas


64 crónicas da época, um batalhão da última invasão francesa estava aquartelado no lado norte do Tejo, num palacete de Valada. Aqui em Salvaterra de Magos, houve forte confronto com o exército português, tendo o povo local muito ajudado nesse combate militar, fazendo desbaratar os invasores. Muitos residentes da vila foram foragidos. António Roberto da Fonseca, recebeu a protecção dos Conde de Almada, que tinham á época um palacete na vila. Aos 12 anos de idade, mostrou algumas aptidões para enfrentar toiros de lide. Seus irmãos, Tito, Luís e, o Antão, também exprimiam este gosto e, tourearam alguns anos.

ANTÓNIO ROBERTO DA FONSECA, Nele foi encontrada muita aficion, foi bandarilheiro profissional, a sua apresentação pública, foi na então pequena povoação da Glória (Glória do Ribatejo), depois de receber lições de: Manuel Faria, António Cordeiro e Vicente Tinoco, afamados lidadores da época. Toureou na antiga praça de toiros existente no Salitre (Lisboa), com seus irmãos; Antão e Luís Roberto, que faleceu em 1862.


65 * Retirou-se da profissão de picar toiros, em 1859, bastante velho e arruinado de saúde. Veio a falecer em Salvaterra de Magos, a 21 de Março de 1882. Os seus três filhos; Vicente Roberto, Roberto Jacob da Fonseca e João Roberto, também enveredaram pela arte do toureio. Algumas crónicas da época, da especialidade taurina, conservam textos, das actuações destes “monstros” da tauromaquia portuguesa, que foram Vicente e Roberto da Fonseca. A tourear, ganharam fama e proveito, mas foram humildes na vida cívica. Depois de retirados das arenas, recolheram-se à vida da agricultura, na sua terra natal, Salvaterra de Magos. A agricultura, e a criação de gado bravo, foram caminhos bem aproveitados, que deixaram a seus descendentes. Em relação ao filho, João Roberto da Fonseca, atingiu um plano pouco lisonjeiro nesta arte dos toiros. VICENTE ROBERTO

Nasceu na vila de Salvaterra de Magos, em 1836. Foram seus pais, António Roberto da Fonseca e D. Maria Gertrudes da Fonseca. Seu pai, foi também um toureiro distinto. Vicente Roberto, chegou a aprender o ofício


66 de alfaiate; manifestando, porém decidida vocação para o toureio, principiou a aplicarse à arte tauromáquica, toureando em Almada com 13 anos de idade.

O Conde de Vimioso, que assistia à corrida ao ver a maneira como Vicente Roberto acabava de evidenciar a sua aptidão para as lides taurinas, depois da corrida desceu à arena, abraçou-o, incentivando-o ao estudo, e ofereceu-lhe um trajo de “luces” de bandarilheiro. Fato de azul e oiro, que seria o primeiro, que vestiu de uma brilhante carreira. Quando aprendia o ofício de alfaiate, em Vila Franca de Xira, fez parte da filarmónica da terra, no intuito de aproveitar o denominado “BOI PARA A MUSICA”, o que se costumava tocar nas corridas no Ribatejo. Aos 18 anos, começou a apresentar-se como toureiro

de

profissão,

juntamente

com

seu pai e seu irmão João Roberto, que era


67 igualmente um excelente executante, entre outros artistas. Em 1858, estreou-se na praça de toiros do Campo de Sant`Ana, e estão bem vivas na memória de todos as ovações que ali alcançou. A sua reputação firmou-se cada vez mais, e em 1861, entrou para o quadro de artistas

contratados

pelo

empresário

Domingos Alegria. Os críticos da época, não se

fartavam

actuava,

os

de o elogiar, sempre que jornais

chegavam

a

fazer

segunda edição, só para venda em Lisboa. O seu primeiro benefício realizou-se em 1862, apresentando-se nele também seu irmão, Roberto da Fonseca, que

sendo

convidado a tomar parte se recusara, dizia: não ter grande habilidade, grande era a sua grande modéstia. A insistência foi muita, actuou e brilhou na arena de tal sorte que depois veio a tornar-se dos mais notáveis mestres do toureio nacional. dar

É impossível

nota de todos os triunfos, ovações e


68 festas artísticas de Vicente Roberto; o público correia

sempre

pressuroso

a

saudá-lo

freneticamente e os bilhetes atingiam um preço elevadíssimo, com

praças

sempre

cheias. Toureou em todas as praças de Portugal, e pela primeira vez, em 1865, na de Badajoz, correndo touros desembolados e com sorte inovadoras, como a “Cadeira”, alcançando um legítimo sucesso. Em 1892, foi convidado pela nova sociedade “Empresa Tauromáquica Lisbonense”, para actuar com seu irmão Roberto da Fonseca, no dia 18 de Agosto,

na

corrida

à

portuguesa,

na

inauguração da praça de touros do Campo Pequeno, em Lisboa. Na Figueira da Foz, toureou a 10 de Setembro de 1888, numa sorte de cadeira, ficou gravemente ferido e teve de recorrer a uma enfermaria da misericórdia local. Debatendo-se entre a vida simpatia

e

provedor e

dedicação, a

tanto

do

digno

morte, recebeu inúmeras

provas de simpatia e dedicação, tanto

do


69 digno provedor comendador Afonso Ernesto de Barros, que havia pouco tempo tinha sido agraciado com o titulo de visconde da Marinha

Grande,

como

de

Frederico

Nogueira de Carvalho, Fernando de Mello, José Jardim, que pertenciam ao pessoal médico e enfermagem do hospital. Apenas se restabeleceu do lamentável desastre, contemplou aquela instituição, com um importante donativo, e no seu testamento deixou-lhe mais um legado. Com tal colhida, a sua saúde agravou-se, ficou débil cada vez mais, e a medicina usando todos os recursos declarou-se impotente, e após um doloroso e prolongado martírio, faleceu às 11 horas da manhã, do dia 1de Junho de 1896, rodeado de toda a família que durante tanto tempo disputou à morte aquela preciosa existência. Pessoa dedicada ao bem e ao útil, e que mais uma vez deu eloquentes provas de grande amizade e solidariedade que havia entre os irmãos Roberto. Deixou no seu


70 sobrinho, o nosso prezadíssimo amigo e distinto

bandarilheiro,

João

Roberto,

um

digno representante dessa raça de artistas(1), ************ (1)

**************

- Foi testamenteiro do tio; Roberto Jacob da Fonseca e continuou com a casa agrícola, deixando depois a seus filhos, que passaram a usar o ferro Irmãos Roberto

***********

************

PRIMEIRO ANO APÓS A SUA MORTE

O jornal semanário “ PRETO E BRANCO” publicado em 1867, faz o elogio fúnebre a Vicente Roberto, quando da passagem do primeiro aniversário após a sua morte. “Vimos hoje, com a alma alanceada por uma profunda saudade, registar o primeiro aniversário do falecimento dessa simpática individualidade que se chamou Vicente, prestando a devida homenagem a esse incomparável amigo que soube conquistar um nome imorredoiro no toureiro português, onde é contado entre os seus grandes mestres, nobilitar-se por actos de filantropia em que reflectiu a bondade da sua alma. Na mais grato para nós do que evocar esse vulto saudoso, que sempre nos distinguiu com uma imerecida simpatia; o que sentimos é não podermos dizer com profundos traços de verdade o que Vicente Roberto valeu como homem e como


71 artista; mas a palidez da nossa linguagem será animada pela afectuosa lembrança que das brilhantes qualidades deste ilustre morto, todos conservam arreigadas na alma. Graças à extrema lhaneza e afabilidade do seu trato, à honradez imaculada do seu carácter e ao seu coração sempre aberto às emoções do bem, Vicente Roberto viu criar-se e desenvolver-se em volta de si uma enorme simpatia e consideração, o que sem dúvida devia contribuir para suavizar a vida, límpida como o cristal, mas torturada pela doença que se agravara enormemente nos últimos anos. Amigo delicado, galgava por cima das maiores dificuldades e sacrifícios para servir os seus amigos, fazendo um perfeito contraste com a sociedade actual, tão degenerada; filantropo benemérito, via na felicidade dos outros a sua própria felicidade; era assim que despendia uma grande parte da sua fortuna, adquirida já nos trabalhos da arena, já na agricultura e criação de gado bravo, em proteger hospitais, montepios e outras casas de beneficência, socorria muita pobreza ignorada, enxugando muitas lágrimas, fazendo renascer a esperança no peito dos desgraçados. Como bandarilheiro, Vicente Roberto, ocupou desde muito novo um dos primeiros lugares entre os mais ilustres artistas tauromáquicos de Portugal. Ágil, audacioso e infatigável, a sua vida de toureiro foi uma série ininterrupta de calorosos triunfos; só seu irmão Roberto Jacob da Fonseca, o podia igualar no trabalho de bandarilhas, nos


72 recortes à cabeça do toiro sem o auxílio da capa e em outras sortes que executava com graça e arte inexcedíveis e que faziam bramir de entusiasmo os aficionados. A sua fama de lidador exímio estendeu-se até à própria Espanha, chegando a tourear em Badajoz, com seu irmão Roberto da Fonseca, touros desembolado. Ali, as espanholas que se deliciavam com essas lutas titânicas entre o homem e o animal, e que aplaudem com frenesim o pouco edificante espectáculo do toiro que ajoelha agonizante aos pés do matador, as espanholas, delirantes de entusiasmo ao ver o grande artista endoidecer, subjugar e dominar o toiro com voltas e mais voltas garbosas da sua capa vermelha, prorromperem na mais veemente manifestação, cobrindo o distintíssimo artista com uma nuvem de flores e palmas. Dessas ovações delirantes que lhe embriagaram a alma, conservava Vicente Roberto as mais saudosas recordações. E nos últimos anos de sua vida como não lhe seria doloroso ver-se impossibilitado para o toureio que tanto amava por causa da cruciante doença que dia a dia lhe vinha minando a existência! De vez em quando, a pedido dos amigos, lá descia à arena para colocar um magistral par de ferros em que se revelava sempre o primoroso e distinto artista de outros tempos. Nessas ocasiões que bem raras eram, divisavase-lhe na fisionomia, cheia de bondade, uma passageira alegria, e Vicente Roberto saia sempre da praça coberto das mais ruidosas ovações de apreço e simpatia. O nosso semanário, não


73 comporta longas biografias, razão porque nos limitamos a condensar uns traços biográficos que resumem em síntese luminosa, o alto valor desse homem que a par dum grande artista foi um honrado e infatigável trabalhador, chegando a adquirir uma opulenta fortuna, e um coração de oiro que espalhou tantos benefícios pelos pobrezinhos da sua terra natal, e por diversos estabelecimentos de caridade do nosso país; uns e outros ainda pranteiam a perda irreparável que sofreram e delas sobram as bênçãos e flores, o mármore frio do seu túmulo. Hoje, dia do primeiro aniversário da sua morte, depomos sobre o túmulo do nosso querido amigo um “BUQUET” de sinceras saudades, ate porque recordamos o povo da sua terra, desfilando reverente e comovido perante o féretro e espargindo mil bênções sobre aquele que foi um dos seus filhos mais dilectos e um dos seus mais devotados protectores. Assim, Vicente Roberto, que durante a vida se viu rodeado dos maiores afectos e admirações, depois de morto teve todas as honrarias a que tinha direito, sendo conduzido à sua última morada por entre alas compactas dos amigos. Vicente Roberto, evidenciando mais uma vez os seus sentimentos piedosos, deixou em testamento vários legados às Misericórdias; de Salvaterra de Magos, Figueira da Foz, Coruche, Santarém e ao Montepio de Salvaterra. O grande artista reviverá na memória da família amantíssima, no coração da qual deixou um imenso vácuo, e na lembrança dos que tiveram a


74 felicidade de privar com ele, e conhecer as qualidades do seu belíssimo carácter. (Coimbra, 1 de Junho de 1897 – António Júlio (Vale de Sousa)

ROBERTO JACOB DA FONSECA

“ Um amigo aficionado de Salvaterra, pedeme duas linhas sobre o ex-bandarilheiro, que foi Roberto Jacob da Fonseca. Artista de um valor tão extraordinário, que é das tarefas mais difíceis falar dessa glória da tauromachia portugueza, que foi a maior figura do toureio antigo, e a nossa maior relíquia, que hoje possuímos, vivendo na sua linda

Salvaterra,

grandes

e

de

tão

históricas

tradições taurinas. Inaugura-se hoje ali, a sua nova praça de touros, que a aficion do Ribatejo, aguardava com impaciência, e a ela vae assistir, dirigindo a sua primeira corrida


75 de touros o bom velhinho, Roberto da Fonseca,

que

foi

um

toureiro

tão

extraordinário, que a sua grande fama não só foi conhecida em Portugal, chegando até às praças de Hespanha, onde tanto se exige dos seus artistas, e ali Roberto da Fonseca, fez a mais brilhante das figuras, honrando a arte portugueza, de lidar rezes bravas. Recordame ainda com saudade, a tarde que o vi pela primeira vez, em uma festa artística, dos Irmãos Robertos, na extinta praça do Campo de Sant`Ana, onde o querido bandarilheiro, tantas tardes de glória teve em companhia do seu irmão Vicente, outro grande artista já falecido, e do seu sobrinho o nosso amigo João

Roberto

da

Fonseca,

actualmente

retirado das lides taurinas, mas ainda um verdadeiro

aficionado,

e

um

dos

mais

reputados ganaderos portuguezes. Roberto da Fonseca, que ainda hoje não teve quem o egualasse,

reuniu

à

sua

esbelta

figura,

grandes conhecimentos, grande hagilidade,


76 de que era possuidor, tornando-se o primeiro bandarilheiro portuguez, saindo das sortes com elegância e frescura, pisando sempre os verdadeiros terrenos, e assim cravava no morilho

dos

touros

excelentes

pares

de

bandarilhas, que os velhos aficionados ainda hoje recordam com grande saudade. Com a moleta, foi dos artistas portuguezes o primeiro, que se dedicou a este toureio do vizinho

reino,

para

o

que

tinha

muita

habilidade, tendo tardes em que estava primoroso. Ainda inaugurou a praça do Campo Pequeno a 18 de Agosto de 1892, em companhia

dos

seus

colegas;

ALFREDO

TINOCO, MINUTO, FERNANDO OLIVEIRA, VICENTE ROBERTO, JOSÉ PEIXINHO, JOÃO CALABAÇA e RIO SANCHO, todos eles já falecidos. Dos onze

artistas, que há 28 anos inauguraram a nova praça de Lisboa, apenas existem ROBERTO JACOB DA FONSECA, JOÃO ROBERTO, RAFAEL PEIXINHO e

PESCADEIRO,

este ausente em

Hespanha, e hoje retirado do toureio.


77

Depois

da

inauguração

do

Campo

Pequeno, em poucas corrido Roberto da Fonseca tomou parte, despediu-se ao público aficionado,

na

festa

artística

que

seu

sobrinho, João Roberto ali realizou, estando magistral. Dedicou-se depois à sua lavoura em Salvaterra,

encontrando-se

ainda hoje à

frente da sua casa agrícola, o que foi um dos melhores

ornamentos

das

touradas

em

Portugal. Um grupo de amigos de Coruche, pediu-lhe a sua presença na praça da terra e, em 18 de Agosto de 1899, toureou pela última vez. Já muito velhinho, apareceu em 17 de Novembro de 1921, a presidir a corrida organizada pela Associação dos Toureiros Portugueses, no campo pequeno, amparado por José Bento Araújo, desceu à arena e aí recebeu do público que esgotava a praça, a maior ovação da sua vida, pois a aficion não o havia esquecido.


78 Hoje, dia 1 de Agosto de 1920, vae inaugurar como director da corrida, a nova praça, onde estará presente o distinto e apreciado

cavaleiro

tauromáquico

JOSE

CASIMIRO, outra glória da nova geração, e estamos certos que a sua primeira sorte, será oferecida ao respeitável toureiro, que com a sua presença, ali se vão iniciar de novo as corridas de touros em Salvaterra.”

**********


79

O SEU TESTAMENTO

Roberto Jacob da Fonseca, que na sua juventude foi bandarilheiro, tal como seu irmão Vicente, granjeou fama e fortuna, nas arenas de Portugal e Espanha. No seu último testamento, deixou expresso toda a sua vontade, várias vezes modificada, antes de falecer. Este último desejo, foi fechado no dia 24 Agosto de 1920, tendo o seu falecimento ocorrido no dia 8 de Maio de 1923, com 79 anos de idade. . Uma certidão foi passada, por António Emiliano Garrido da Silva, há época secretário da administração do concelho de Salvaterra de Magos, a pedido do seu testamenteiro, o sobrinho João Roberto da Fonseca. “Eu, Roberto Jacob da Fonseca, solteiro, de setenta e nove anos de edade, natural da


80 freguesia da vila e concelho de Salvaterra de Magos, onde resido, filho legitimo de António Roberto da Fonseca e de Maria Gertrudes Roberto, já falecidos, faço o meu testamento pela forma seguinte: Seguinte: - Em primeiro lugar declaro que de mulher ser livre, com quem podia casar: houve um filho que é Roberto da Fonseca Júnior, casado, natural e morador em Salvaterra de Magos e a quem pelo presente testamento eu reconheço e perfilho, para que ele tenha e gose todos os direitos, que a lei concede aos filhos perfilhados. – Pelas forças da metade livre aliás, da metade, cuja livre desposição a lei me permite, deixo: - A Dona Vitalina Pasehoa (da Fonseca), solteira, de Salvaterra de Magos, o seu uso fructo, de todas as minhas terras, para que o gose enquanto viva for, ficando a propriedade das mesmas terras a seus filhos, se, casando, e do matrimónio os vier a ter; e os não tendo, ficará do, aliás, ficará por sua morte a propriedade


81 dita a meu sobrinho João Roberto da Fonseca; no caso de este ser falecido, ficará tal propriedade a seus filhos, dele meu sobrinho. Ao dicto meu sobrinho João Roberto da Fonseca deixo em plena propriedade todos os meus celeiros, abegoarias e palheiros, incluindo o terreno das cavalariças, que está por vedar, bem como a chamada casa da capela e da machina. Com o ónus de ser meu primeiro testamenteiro. Como especial demoustração da minha amizade, deixou-lhe todos os meus brindes e objectos artísticos, que passarão para a sua posse nas trez victrines

que estão encerrados com os que pertenceram a meu irmão Vicente Roberto, e a meu sobrinho já


82 pertencem, segundo disposição testamentaria do dito meu irmão. Se á data da minha morte meu sobrinho fôr falecido ficarão estes legados a seus filhos. – A cada um dos filhos de meu sobrinho João Roberto da Fonseca, deixo a minha corrente e relógio de ouro. – Aos filhos de Roberto Anica, deixo duzentos escudos. – A Vicente Anica deixo cento e cincoenta escudos. – Deixo mais: - cento e cincoenta escudos a cada um dos seguintes: António Anica- A João Carvalho Anica duzentos e cincoenta escudos, aos filhos do falecido Doutor Gregorio Fernandes, um conto de reis para todos, e á Excelentíssima Senhora Dona Sofia Rodrigues Fernandes trezentos escudos, pedindo desculpa a todos da singela lembrança, que lhes

deixo,

signal

apenas da

muito

veneração em que tenho a memoria do Doutor Gregorio Fernandes; a cada um dos meus afilhados: Dona Amélia Garcia de Carvalho, Vicente Roberto Garcia de Carvalho, e Roberto Isaac da Nazareth, cento e cincoenta escudos; -


83 A Vitalina Isaac, duzentos escudos; ao meu amigo Joaquim Paulino Duarte, ou caso seja falecido, a sua esposa, duzentos escudos, ao meu afilhado Armando Santos ficará pertencendo o meu anel de brilhantes, que está em uma caixinha de metal dentro da montra. A Manuel Aleixo

de Carvalho, se á data do meu

falecimento estiver ao serviço da Sociedade Roberto & Roberto, cento e cincoenta escudos; aos meus velhos creados Manoel Bernardino, Francisco Feijão, Miguel Galricho, Roberto Gil e Francisco Morcego, se á data do meu falecimento estiverem ao serviço da Sociedade Roberto & Roberto, cem escudos a cada um; se alguns

deles tiver falecido no dito serviço,

revertará a importância do seu legado para seus legítimos herdeiros; - A cada creado que na minha casa, ou na sociedade Roberto & Roberto, tiver mais de cinco anos de serviço, cincoenta escudos; - ao abegão Lino da Silva duzentos escudos, se estiver de Roberto & Roberto, e, caso tenha falecido nesse serviço, fica


84 a mesma importância cabendo a seus filhos; aos meus servidores Manoel Ribeiro e Joaquim Almeida, se ainda o forem á data da minha morte, cem escudos a cada; a Justa Pereira Lérias, duzentos escudos, e a sua filha mais velha cincoenta escudos, a Maria das Dores

Carcereira, cem escudos; a Urbina Conceição e Rosa Pirralha, se estiverem ao meu serviço, cem escudos a cada uma; deixo ainda ao Hospital da Santa casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos, mil e quinhentos escudos; ao Hospital da Santa Casa da Misericórdia de Coruche, mil escudos, ao Hospital de Jesus Christo da Santa casa da Misericórdia de Santarém, Santarém, quinhentos escudos, ao Hospital da Misericórdia da Figueira da Foz quinhentos escudos; Quero


85 que aos pobres de Salvaterra sejam distribuídos cento e cincoenta escudos em esmolas; e que por alma de meus paes e irmãos, se apliquem trinta missas, e por minha alma vinte, todas de esmola não inferior a um escudo; Se á data da morte existir Instituição que destribua habitualmente sopa aos pobres de Salvaterra, quero lhe sejam entregues duzentos escudos. Se por enfelecidade dos que precisam, tal instituição não existir, será esta quantia devidida por quinze jornaes, sendo nove de Lisboa, á escolha do meu testamenteiro, e seis do Porto á escolha do meu amigo velho amigo Júlio Gama, Redactor das Gasetas das Aldeias, a esses jornaes espero dever a fineza da distribuição pelos seus pobres, das quantias que lhes forem entregues, deixando eu aqui á Imprensa do meu paiz o meu agradecimento, pelo carinho, com que sempre se referiu á minha família, apreciando-nos como artistas. As contribuições a pagar pelo usofructo das propriedades que fica a Dona Vitalina Paschoa da Fonseca, e a devida pelos legados em dinheiro


86 a particulares, ficam a cargo da minha testamentaria.

Todos os legados em dinheiro

serão pagos em moeda corrente no paiz e cumpridos dentro do ano posterior á minha morte. Quero que por sua morte sejam depositados no meu jazigo a já referida Dona Vitalina Paschoa da Fonseca e meu sobrinho João Roberto da Fonseca, sua mulher e filhos, a não ser que, por sua vontade ou de seus herdeiros hajam de o ser em outro local. Nomeio meus testamenteiros: em primeiro lugar meu sobrinho João Roberto da Fonseca, e em segundo lugar o meu amigo Joaquim Ferreira Pedroza, a quem peço aceite este encargo e a lembrança de trezentos escudos. Quero que dos benefícios deste testamento seja excluído quem, sob qualquer protesto, ou com qualquer intuito que não seja o de fazer cumprir extremamente as suas, suas cláusulas. Tomar a iniciativa de sobre ele levantar, aliás levantar letigio ou pleito. E, no caso por mim não esperado, que tal se dê, se considedará como não excripto tudo o


87 que a esse referi. Quero que o meu funeral, modesto, mas decente seja ordenado pelo meu testamenteiro. E assim tenho feito o meu testamento, que quero revogue qualquer outro que em data anterior, tenha feito. E declaro que o mandei escrever, e que depois de o ter bem lido e conferido e achado em tudo, conforme com a minha última vontade, rubriquei as folhas e assigno no final, conscientemente e livre de qualquer coacção ou imposição. Em tempo declaro que os legados a Urbina Conceição e Rosa Piralho serão de duzentos escudos, e não de cem, como por lapso se escreveu. E tendo novamente lido todo o meu testamento, achei em tudo conforme com a minha ultima vontade e conscientemente e livremente o vou assignar depois de ter rubricado as folhas, tendo tudo sido encripto a meu rogo. Salvaterra de Magos, vinte e quatro de agosto de mil novecentos e vinte. ainda em tempo uma declaração: a meu sobrinho João Roberto da Fonseca, e na sua falta a seus filhos, deixo como atrás digo todos os


88 objectos artísticos e brindes, com as vitrines em que estão guardados, tanto os meus, como os que foram de meu irmão Vicente, quer sobre este haja ou não disposição testamentária em favor do dito meu sobrinho; porem quero que, comquanto se faça arrolamento e avaliação desses objectos em qualquer tempo, para efeitos convenientes, nunca a sua entrega possa ser exigida sem que passe um ano sobre a minha morte. Uma vez mais li todo o meu testamento, e parecendo-me nele deixar bem expresso o meu pensamento o declaro a expressão da minha última

vontade,

pelo

que

muito

livre

e

espontaneamente o vou assignar, depois de rubricar as folhas. Salvaterra de Magos, vinte e quatro de Agosto de mil novecentos e vinte aliás Salvaterra de Magos, vinte e quatro de Agosto de mil novecentos e vinte (assignado) Roberto Jacob da Fonseca” - Saibam quantos virem este auto de aprovação de testamento cerrado, que aos vinte e quatro dias do mez de agosto do ano de mil novecentos e vinte, nesta vila de


89 Salvaterra de Magos e escriptório da Firma Comercial

Roberto

denominada

&

Roberto,

na

rua

do almirante candido dos reis,

onde vim eu Notário Francisco César Gonçalves. O

chamado

pessoalmente

do

testador;

presente

aqui

Roberto

estava

Jacob

da

Fonseca, solteiro, proprietário, de maior edade; Sui guris, anarador nesta mesma vila de Salvaterra, e as trez testemunhas edoneas, adeante nomeadas e no fim assignadas; e tanto eu

notario

como

as

ditas

testemunhas

conhecemos aquele testador Roberto Jacob da Fonseca pelo próprio e nos certificamos de que ele está em seu perfeito juízo e de livre de toda e qualquer coação. E por ele testador Roberto Jacob da Fonseca me foi apresentado neste acto, em presença das mesmas testemunhas, este testamento e disposição, declarando como ela é a sua ultima vontade, o qual testamento, que eu vi, sem o ler está escripto por pessoa diversa do testador, está rubricado e assignado pelo mesmo testador, contem cinco laudas e mais trez linhas


90 de

outra lauda e não tem borrão algum,

entrelinhas, emenda, ou nota marginal. E por verdade lavrei este auto, que principiei em logo em seguida á assignatura do testamento e o continuei sem interrupção, sendo testemunhas a tudo presentes desde o principio até ao fim. Carlos de Novaes Barreiros, Chefe da Secretaria da Câmara Municipal deste concelho – Manoel da Silva Robeiro, Chefe da Repartição de Finanças deste mesmo concelho – e José de Vasconcelos, Thesoureiro da Fazenda Publica deste concelho. Todos trez casados, de maior edade,

cidadãos

portuguezes,

hábeis

para

testemunhas, residentes nesta vila de Salvaterra de Magos, os quaes todos assignam, com os seus nomes a dita primeira testemunha Carlos de Novaes Barreiros, o qual efectivamente o leu neste acto, em voz alta pelo testador em lugar deste e vão agora todos assignar, como fica dito. E

eu

referido

Notário

Francisco

César

Gonçalves o escrevi e assigno em raso depois de egualmente lida em voz alta esta declaração por


91 mim Notário e pela dita primeira testemunha para esse fim indicado pelo testador. Declaro que li este auto de aprovação do meu testamenteiro e o reconheci conforme a minha vontade – (ass) Roberto Jacob da Fonseca. (assignados sobre duas estampilhas fiscaes no valor total de um escudo e cincoenta centavos, e devidamente inutilizadas) Roberto Jacob da Fonseca

- Carda Silva Ribeiro – José de

Vasconcelos – O Notário Francisco César Gonçalves.

Emolumentos

seis

escudos

e

cincoenta centavos. Tem mais coladas duas estampilhas de contribuição industrial no valor total de oitenta e dois centavos e uma estampilha fiscal de um centavo e meio todas devidamente inutilisadas e assignadas pelo Notário Francisco César Gonçalves . (Na capa do testamento) Testamento de Roberto Jacob da Fonseca, aprovado nesta vila de Salvaterra de Magos aos vinte e quatro de Agosto de mil novecentos e vinte perante mim Notário (ass) Francisco César Gonçalves. E nada mais constava do dito


92 testamento cerrado que bem e fielmente para aqui fiz copiar em mão e poder do apresentante a quem o entreguei do que dou fé. Foi lavrado nesta Administração o respectivo auto de abertura

apresentação

e

publicação

deste

mesmo testamento, como consta do livro numero dois de autos de abertura ou publicação de testamentos cerrados de folhas um a folhas dois

sob

numero

um.

Administração

do

Concelho de Salvaterra de Magos, oito de Maio de mil novecentos e vinte e trez. António Emiliano Garrido da Silva. E por ser verdade fiz passar a presente cópia de certidão que assigno e vae autenticada com o selo branco desta secretaria”

**************** ************


93

JOÃO ROBERTO DA FONSECA Nasceu em Salvaterra de Magos, no dia 19 de Março de 1860, sendo neto, de António Roberto da Fonseca, foi-lhe dado o nome do pai. Por ter ficado órfão muito cedo, foram seus tios; Vicente e Roberto, que o protegeram e foram seus mestres na vida artística. Toureou pela primeira vez em Alcácer do Sal, a pedido do avô de João Núncio. A partir daí os convites não mais pararam. Toureou depois em Vila Franca de Xira, Santarém e Coruche. Em 1878, apresentou-se no Campo Sant`Ana, num espectáculo taurino, em benefício de uma creche. Um ano depois, esteve na Barquinha, alternou com seus tios e Marcel Botas, os toiros eram do dr. Máximo da Silva Falcão. Esteve brilhante a tourear, nas sortes de saída do curro e junto às trincheiras. Os cartazes de algumas praças de Portugal anunciavam-no em destaque e, em 1982, actuou em Lisboa, com João Costa, afamado


94 bandarilheiro. João Roberto, nesta corrida esteve de tal sorte que deu um brilharete a bandarilhar. Com a doença de seu tio Vicente, começou a ser mais solicitado em Lisboa, fazendo um contrato de seis épocas. Demolida a praça de Sant`Ana, João Roberto passou a ser visto, na arena do Campo Pequeno. Pelos êxitos alcançados, a sua presença era muito solicitada em vários pontos do país, pois deliciava os espectadores no capear na sorte de “cadeira”, e na sorte de bandarilhar. Em Portalegre, no ano de 1895, fez a sua despedida das arenas.. Um tempo depois, ainda pisou o recinto da praça da sua terra Salvaterra de Magos, num festival de beneficência. Com a morte de João Roberto, terminou a mais notável geração de toureiros, da mesma família, em Portugal. Foram seus filhos: Vicente Roberto da Fonseca, nasceu em 2 de Dezembro de 1891, Dr. Roberto Ferreira da Fonseca e João Roberto Fonseca


95


96

VIII BANDARILHEIROS Nota Prévia Muitos nomes dos salvatorianos ilustres que pelo seu destemido valor, actuaram em praças do país, quer como cavaleiros, quer como bandarilheiros, não tiveram grande espaço nas crónicas taurinas, dos jornais da época. Da nobre família Costa Freire, sabe-se Joaquim Pedro da Costa Freire, foi um grande equitador, com fama em todo o Ribatejo toureiro. Outros dos seus membros, ainda no séc. XIX, foram amadores tauromáquicos,


97 disso atesta as recordações de ramalhetes de flores,

bem

guardados

no

palacete

da

família. ROGÉRIO AMARO

Rogério Amaro, nasceu em Salvaterra de Magos, em 1923, conseguiu a alternativa de bandarilheiro. Durante muitos anos foi peão de brega, dos cavaleiros; Simão da Veiga Júnior e João Branco Núncio e, dos matadores de toiros; Manuel dos Santos e Diamantino Viseu, entres outros. Terminou a sua longa carreira ligada aos toiros, como director de corridas.

JOAQUIM DA CONCEIÇÃO

Em 10 de Maio de 1953, numa corrida realizada,

em

Salvaterra de Magos, sua terra natal, fez prova de alternativa de Aspirante a Bandarilheiro. Na comissão de


98 apreciação esteve presente o matador de toiros Diamantino Viseu.

FRANCISCO DA SILVA FAZ-CORDAS

“El-Palhota”,

nasceu

em

Salvaterra

de

Magos, foi viver para Vila Franca de Xira, onde esperava encontrar, espaço para a sua aficion, pois os toiros eram a sua paixão. Entrou no mundo da tauromaquia, como Bandarilheiro.

A sorte não

lhe sorriu, para sobreviver, com

um

pouco

de

habilidade, lá foi vivendo, fazendo os seus pequenos trabalhos artísticos, em ferro e arame, com motivos taurinos. ANTÓNIO CADÓRIO

Nasceu em 27 de Dezembro de 1921, ainda jovem,

na

sapateiro,

aprendizagem ficou

a

ser

da

arte

conhecido

de pelo

“Mestiço” . Foi aprendiz do mestre daquela


99 arte, João Ferreira, conhecido por João Coxinho, por ter uma perna amputada. Como as muitas tertúlias que existiam dos 52 sapateiros existentes na vila de Salvaterra de Magos, a do mestre João Coxinho, torcia pelo matador de toiros; Diamantino Viseu. Cadório, grande aficionado, sempre viveu para a tauromaquia, queria ser bandarilheiro. Desejando ter lugar e brilhar nas arenas, sonhando abalou até Vila Franca de Xira. Ali, viveu toda a sua vida com a profissão de sapateiro. Dos seus sonhos, mais não fez que ensinar a arte de tourear, numa escola que montou. De lá saíram toureiros de fama, como José Júlio e José Falcão, pois queria que eles brilhassem mais nas arenas, que os seus conterrâneos; Irmãos Vicente e Roberto da Fonseca. Já entrado na idade, António Cadório, regressou à sua Salvaterra. Comigo falou algumas vezes das suas frustrações e, até da maneira como era ignorado pelas gentes da


100 sua geração, pois dos novos já o esperava. Ia fazendo os seus “biscates” de sapateiro. Viajava muitas vezes na carreira, pois ia levar/buscar

calçado,

aos

seus

antigos

fregueses (Vila Franca, Alhandra e arredores). Era na estação das carreiras, que me falava da bela arte de tourear a pé, como que tentando convencer-me:

“há muitos

anos que não se toureia com sortes de “gaiola” e de “navalha”, como ouvia dizer na nossa terra, quando era miúdo, que aqueles brilharam e tiveram glória, fama e proveito. ”António Cadório, faleceu no dia 20 de Outubro de 1979. Um dia a sua prima Conceição, que lhe dera albergue, deu-me o seu BI, para aproveitar a fotografia, afim de ilustrar um artigo que mais tarde publiquei no já extinto jornal Vale do Tejo. Maurício do Vale, tendo por Cadório, grande respeito e afeição,

escreveu

no

jornal

“Vida

Ribatejana”, um artigo que aqui registamos.


101 ANTÓNIO CADÓRIO, MUITO COLHIDO PELA VIDA, MORREU NOS CORNOS DA DOENÇA!

“Estou arrumado”, dizia-me há tempos no Campo Pequeno, quando à hora do sorteio por ali apareceu, conforme combinara com Mário Coelho. António Cadório, toda uma face abalada, era a imagem da amargura pelo que o destino lhe guardara. O bilhete que o toureiro lhe ofereceu, apertou-o ele, Cadório com a força de quem se agarra a algo querido pela última vez. E quase o foi!... Morreu António Cadório! Morreu um Ribatejano! Morreu um coração aficionado! Morreu um simplesgrande Homem dos Toiros!!! Um Homem do Ribatejo!

Desde o sonho que teve em ser toureiro ao não consegui-lo, a vida pregou-lhe várias colhidas. A incompreensão dos homens condena muitos Homens!...Mas essa condenação é uma medalha com outra face – a da nobreza de carácter e sentimento que, tarde ou cedo (e, quase sempre, mais tarde…), lhes é


102 reconhecida e devidamente cantada! Muitos foram os toureiros que passaram pelas suas mãos, pelos seus olhos! Uns lograram voar para o êxito (José Falcão, Vítor Mendes, Palhota, Boleiro e outros); uns conseguiram sair da penumbra, mas não puderam ir além: outros, nem uma coisa nem outra. Com uma vida repartida por Vila Franca de Xira, Alhandra e Salvaterra de Magos, António Cadório nunca soube fechar as portas para quem quer que fosse! Moços pobres, sem “padrinhos”, batiam-lhe à porta, e ele aí estava com as suas ganas e o seu saber.

Uma vida que valia a pena historiar e que, só por si, seria um romance, um drama. Vivendo pobremente, arranjava sempre aquele tempo e aquele mínimo de cifrões para andar com os seus “maletillas”, de tenta em tenta, daqui para ali.


103

A “Palha Blanco” viu-o muitas vezes encostado à trincheira a ver seus pupilos treinar. E pedia aos toureiros que aconselhassem os seus rapazes, dizendo a estes que ouvissem aqueles. Tinha bom sentido toureiro, pelo que também opinava quando observava treinos de “maestro”, como acontecia, às vezes, com Mário Coelho. Este, aliás confessou sensibilizado que era de Cadório a primeira muleta com que citou um bezerro (numa ferra, já lá vai um bom par de anos!), bem como o escutava quando trocavam impressões sobre toureio. Morreu António Cadório! Muito colhido pela vida, morreu nos cornos da doença! Morreu um dos poucos poetas do toureio! Sonhador que era diante dos seus “maletillas”, sonhando neles os êxitos que em si não viveram, António Cadório merece o respeito de todos nós, da Festa! Porque viveu, sonhando! Porque amou a Festa, sonhando! Porque, talvez morresse nos cornos da doença, sonhando que um toiro o matara na mais imponente Monumental ou… na sua linda “Palha Blanco” Sepultado, no cemitério de Salvaterra de Magos, sua terra-natal, o “Mestiço” como era conhecido, tem na sua pedra tumular, umas poucas palavras; “uma lembrança dos


104 aficionados de Vila Franca de Xira�. Os aficionados da sua terra, continuaram a tê-lo no esquecimento

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105

IX CAVALEIROS TAUROMÁQUICOS

FERNANDES TRAVESSA

(Rogério Manuel Silva Fernandes Travessa),tal como seu irmão Cláudio José, entrou como cavaleiro tauromáquico, depois de actuar em praças de Portugal, Espanha e, nos EUA (Califórnia). Fez a sua prova de cavaleiro praticante, em Santarém, conforme noticiou o Jornal o Ribatejo, na sua edição de 15 de Março de 1990. Recebeu a alternativa, na monumental de Cascais, no dia 24 de


106 Julho de 1994, apadrinhado por José Manuel Cortes. Daqui em diante, foram poucas as corridas em que esteve presente. Com seu irmão, associou-se na exploração de uma escola de ensino de cavalos e cavaleiros. CLAUDIO JOSÉ (Cláudio

José

Silva

Fernandes Travessa). Tal como seu irmão Rogério, desde muito novo teve o sonho

ser

cavaleiro

tauromáquico e chegar à alternativa! Depois de actuar, em Espanha, durante alguns anos como Rojenedor, foi até aos EUA, onde toureou na Califórnia. Em Salvaterra, no dia 30 de Agosto de 1998, aos 23 anos de idade,

obteve

padrinho

a

Joaquim

alternativa, Bastinhas.

sendo Nos

seu anos

seguinte, ainda esteve presente nos cartazes de corridas em Portugal e Espanha. Um Acidente,

levou-o

a

ficar

ausente

dos


107 redondéis. Com seu irmão Rogério montou, uma escola de ensinamento de cavalos e cavaleiros.

ANA BATISTA

(Ana Cristina Marramaque Batista), natural de Salvaterra de Magos, nasceu no dia 16 de Junho de 1978. Ana Batista, desde muito nova quis ser cavaleira tauromáquica. A sua apresentação pública, vestindo de fato curto, foi na praça de toiros da sua terranatal, em 1988, onde lhe foi destinado um novilho, toureando com o Praticante Cláudio José. A sua alternativa, ocorreu dois anos depois, na praça de toiros de Coruche, em 8 de Julho de 2000, sendo seu padrinho; Joaquim Bastinhas. A sua carreira tem sido de grandes êxitos, tem estado presente em todas as arenas de Portugal, como figura do toureio a cavalo, também é muito apreciada em Espanha, onde se desloca todas as temporadas taurinas.


108

*************************** ***********************

OUTROS CAVALEIROS AMADORES

Depois da praça de toiros de Salvaterra, ser inaugurada, em 1920, alguns amadores, pelo gosto de tourear a cavalo, não deixaram de ser solicitados a actuar em arena, pois tinham angariado alguma experiência. Passaram a constar em cartazes de festivais taurinos em várias localidades do Ribatejo, MÁRIO MARQUES

Mário Monteiro Marques, nascido a 17 de Maio de 1925, desde muito novo mostrou aptidões para a arte equestre, era um artista na forma de ensinar os animais. Um acidente de viação, ocorrido em 25 de Março de 1858, tirou-lhe a vida e com ele foi o seu grande sonho.


109

MONICA MONTEIRO Ainda

menina,

manifestava andar depois

a

o

gosto

cavalo,

de

pouco

mostrava

grande

tendência para a aficion, o toureio equestre era a sua paixão. O Jornal o Ribatejo, na sua edição de 18 de Outubro de 1990, dava a noticia que ela actuava, com Cláudio Travessa, entre outros

amadores,

num

espectáculo

em

Santarém. A sua apresentação pública, em Salvaterra de Magos, sua terra-natal, foi em 1992. Os empresários depressa viram nela uma cavaleira tauromáquica com arte, que podia empolgar o público aficionado, nas praças

de

toiros

afincadamente,

portuguesas. esperando

Treinava a

sua

oportunidade, foi convidada num programa especial da Rádio Ribatejo, coordenado pelo crítico, Paulo Beja, esteve ao lado de Ana


110 Batista e Sónia Matias. Em 1993, na Nazaré, num festival taurino, em dia de carnaval, Mónica caiu do cavalo e, foi internada de urgência em Leiria, tinha fractura de crâneo. O estado de coma durou alguns dias, já estava internada no hospital de Santa Maria. Recuperada, na época seguinte, foi a Lagos tourear

fazendo

praticante,

a

apareceu

prova

de

vestida

cavaleira com

uma

casaca de cor bordeaux filada a oiro. O sonho de ser cavaleira tauromáquica, era uma meta, treinava diariamente. Um dia quando regressava a casa pela estrada, o movimento de carros era imenso, um pesado, apitou por detrás, o animal teve medo, a Mónica caiu, ficou paraplégica. Não ficou esquecida, em 1997, o grande aficionado salvaterrense; Manuel Fernandes Travessa, em conjunto com um grupo de amigos, onde a família

Telles

esteve

presente,

homenageado em Salvaterra de Magos

foi


111

X CRITICOS TAUROMÁQUICOS (ROBERTO FERNANDES)

Num dia de Agosto de 1959, com a tarde a despedir-se do calor, a brisa já se sentia, convidando os clientes do Café Ribatejano, a aproveitarem as sombras daquelas frente,

árvores

iguais

a

em tantas

outras tílias em todo o jardim

do

Largo

dos

Combatentes. Na esplanada, debaixo de uma dessas sombras, sentado numa cadeira de ferro, um homem já entrado na idade,


112 refrescava-se

com

uma

água

fresca,

daquelas engarrafadas. Andava eu, por ali pois esperava a chegada da carreira das 17,00 horas, que tinha paragem em frente ao edifício da escola. O homem, viu-me vestido a preceito, fardado com boné (era a farda de empregado da camionagem), dirigiu-me a palavra: Então moço, esperas alguma coisa! Lá respondi ao que estava e, porque estava, enfim a conversa foi ao ponto de saber de quem eu era filho. Enfim, todos aqueles pormenores de quem tem alguma curiosidade. Lá respondi, chamome: José Rodrigues Gameiro !! Convidou-me para me sentar, e beber uma água, fazer-lhe companhia. De chofre, disseme; eu conheço o teu pai, é o “Zé Pataco” (1), é jardineiro na câmara, somo velhos amigos de juventude. Quando cá venho, conversamos muito sobre a nossa terra.


113 Também ouvi falar e conhecia grande parte da tua família, o teu bisavô, o teu avô e os irmãos dele, foram grandes campinos.

********

*********

(1) – A alcunha de Pataco, vinha de meu bisavô que a deixou a alguns descendentes.

******

******

Naqueles meus 14 anos de idade, fiquei algo confuso. Agora o curioso era eu! Então o senhor é de cá de Salvaterra! Sou, venho cá passar uma semana de férias todos os anos. Um ano de ausência, as saudades é muitas da família, da minha terra e dos amigos. Olha, já perguntei ao meu amigo Zé Pataco, que me confirmasse quem era aquele

José Gameiro, que escreve no jornal “Aurora do

Ribatejo”,

jornal

que

leio

todas

as

continuar

a

semanas. Afinal és tu!... Estava

eu,

pronto

para

conversa, mas com a chegada da carreira, lá me despedi, com um aperto de mão.


114 O homem, ainda me disse, volto cá para o ano e, temos muito que conversar.

À noite,

em casa, lá fiz a conversa sobre tal encontro, meu

pai

informou-me: É

o Roberto da

Ferradora, é neto do Roberto que foi toureiro. Olha, ele é muito apaixonado por toiros, julgo que faz criticas das corridas, não tenha a certeza?!... Um ano se tinha passado ! Um dia estava eu, na Central das Carreiras, na rua Heróis de Chaves, a preparar os volumes das encomendas, para seguirem para Marinhais e Glória do Ribatejo, quando do lado do Jardim do Lopes, vinha um homem vestido a preceito, com chapéu preto

na

cabeça,

acercou-se

de

mim,

cumprimentou-me e num instante: “Já não se lembra de mim!...” Apresentou-se, recordou o nosso encontro, no ano anterior. Olhe, tragolhe aqui um livro que lhe quero oferecer, são os “Anais de Salvaterra de Magos”. O ano


115 passado, ainda soube pelo seu pai e, por outras pessoas amigas, que tem gosto em saber coisas da nossa terra! De imediato, abriu o livro e nele fez uma pequena dedicatória. Nessa noite e nas seguintes, o livro foi todo lido página por página e agora faz parte do meu espólio. Um tal RUI DE SALVATERRA, que em 1935, fazia crónicas

tauromáquicas,

era

da

família

“Ferreira Estudante”

Assinatura de Roberto Fernandes, extraída do livro “Anais de Salvaterra de Magos” com a sua dedicatória

********************** ****************


116

XI MOÇOS DE FORCADO Nota Prévia O rei D. José, determinou em 1762, que no seu reinado não haveria mais corridas reais, em Salvaterra foi a última.

Mais tarde, em

1836, a rainha D. Maria II, assinou o decreto que seríamos proibidos os toiros de morte, em praças de Portugal. O palácio real de Salvaterra, há muito tinha desaparecido após alguns incêndios e, da derrocada provinda do sismo, de 1858. O espaço onde tinha ocorrido, a morte do Conde dos Arcos, estava agora

rodeado

de

construções,

conhecido pelo Canto da Ferrugenta (1).

era


117 ******* (1)

- Joaquina Mendes, José Caleiro, Rosa Mendonça e Francisco Costa(pessoas que viveram em dois séculos) – Foram por mim entrevistados em 1989, para um trabalho “Em busca do Teatro Real da Ópera de Salvaterra de Magos”.

Os toiros passaram a ser pegados. Os monteiros da choça, foram convertidos em moços de forcados. O povo fornecia os seus elementos, aqueles mais destemidos, estavam sempre

na

primeira

fila.

Quando

da

inauguração da praça de toiros de Salvaterra de Magos, em 1 de Agosto de 1920, o grupo de forcados, foi chefiado pelo capataz; Manuel Burrico, de Vila Franca de Xira. Bastava haver um festival tauromáquico em Salvaterra

de

Magos,

ou

em

vilas

dos

arredores, logo se formava um grupo de forcados, como foi o caso de um que foi actuar a Leiria, em 1966, num festival a favor do União de Leiria, entre outros figurou António Santos Paulo, conhecido por António Béu. ***********


118

1942 - Grupo de Forcados de Salvaterra numa corrida após o ciclone

Manuel (Manuel

Fróis

Marques

Lazão);

morreu,

em 1948, num acidente, num circo, na Feira de Setembro de Benavente, quando público

agradecia depois

de

ao ter

pegado um bezerro, uma


119 marrada, pelas costas, fracturou-lhe a coluna

grupo de forcados profissional de Manuel Faia, Manuel dos Reis (Manuel Ferrador), primeiro lado direito

1956 - Grupo de Forcados de Salvaterra


120 1969 – Um Grupo de Forcados de Salvaterra

ANTÓNIO LAPA

Nasceu em Salvaterra de Magos, desde jovem manifestou o gosto pela pega dos toiros. Seu pai, também já tinha pegado toiros nas arenas. Um dia veio ter às minhas mãos uma página do já desaparecido jornal “O Diabo”, era do dia 22 de Outubro de 1985 e, tinha

um

artigo

assinado

por

Miguel

Alvarenga, que pela sua importância e significado aqui o transcrevemos: O ADEUS A ANTÓNIO LAPA “ Dizem-me que te fostes embora, António Lapa. Que jaqueta

entregaste ao

a

Francisco

Costa e te despediste das arenas em Alcácer. Não pude lá estar.


121 Mas não quis deixar passar o momento de aqui te prestar a minha homenagem. Ao teu valor, António Lapa. Ao forcado completo que tu foste. A mais que isso, António: à amizade que se fez forte no México e se foi prolongando por estes tempos fora. Lembro-me desse mês inesquecível . Dessa camaradagem sem fim

que fui

encontrar entre vocês todos, nesse México que não esquecemos mais. Comigo, com todos os outros. O Hilário, o Costa, o Silvino, o Fazé, o António Santos. Todos. Agora; dizemme que te foste embora. Que disseste adeus a uma carreira que abraçaras de alma e coração, durante o qual nunca, mas nunca, esqueceste tudo o que devias ao mestre Nuno Salvação Barreto. Dizia-lo com respeito. Com admiração. Com a firmeza e a justiça que

caracterizam

os

homens

de

bom

carácter. Como tu, António Lapa. Recordarte, daqui te enviar o maior dos abraços que houver na terra, é a minha homenagem na


122 hora da tua partida. Simples, António Lapa. Mas sentida. Adeus António Lapa! “ JOSE CARLOS HIPOLITO Conhecia-o

das

carnavalescas

brincadeiras

e,

da

fama

das que

épocas espalhava

enquanto moço de forcado Um dia pedi-lhe uma entrevista para eu publicar no jornal “Aurora do Ribatejo”. Os dados que me concedeu, foram publicados assim: JOSÉ CARLOS HIPÓLITO (O Timpanas) - FIGURA TIPICA DA NOSSA TERRA – Homem pequeno, com 53 anos de idade, dotado de uma traquinice que o faz estar constantemente sempre bem disposto. Pelo Carnaval, desde há muitos anos, é o grande animador das festas do nosso burgo, sendo tal a imaginação e o talento nas figuras por si encarnadas , que deixam sempre saudades. No entanto o seu semelhante pode contar com ele nas horas difíceis, estando sempre atento e vigilante no seu posto de bombeiro voluntário, pois dá o seu contributo à Associação de Bombeiros desta vila. Mas o seu grande “martírio”, onde as


123 saudades o vão corroendo, é a festa brava. Quando fala de tauromaquia todo o seu pequeno corpo se modifica, as contracções notam-se na sua face, os seus nervos de aço com que ainda há poucos anos empolgava multidões nas Praças de Toiros, ficam fluidos – É um homem vencido, cheio de

saudades!...

Na

esperança

que

nos

identificasse uma fotografia de foi publicada, em 1957, na

edição

especial do

Jornal

Vila

Ribatejana. Logo que poisou os olhos no retrato mostrou-se nervoso, a sua calma desapareceu e nos seus olhos algo bulia, o que não evitou que mesmo disfarçadamente tentasse limpar uma lágrima rebelde

que

já o incomodava. E

enquanto me ia informando dos nomes dos componentes do Grupo, Disse-nos; “Olhe, foi neste grupo que peguei toiros pela primeira vez e, foi em Coruche, já lá vão cerca de 30 anos”. Uma das suas salas está repleta de quadros,

onde

se

podem

apreciar várias sequências de pegas de caras, por si efectuadas em centenas


124 de actuações nas Praças de Toiros, tanto no País como no Estrangeiro. Hoje, exercendo a profissão de metalúrgico, foi na sua vida do campo que começou os seus primeiros contactos com os toiros.

Naquele tempo, ainda havia a grade –

uma forma de trabalhar a terra – onde os bois, alguns bravos, depois de “bruxados”, tornavam-se dóceis. Voltando à tauromaquia, vai-nos dizendo: “ Tenho muita estima pelo Sebastião Nabiço e, também pelo Manuel Faia. Olhe! já me ia esquecendo do Albino Fróis Marques e do seu irmão, o Manuel Lazão. A eles devo muito do que sei da difícil arte de pegar toiros”. “ No entanto não me posso esquecer do Manuel dos Reis, o Manuel Ferrador, pois com ele tive tardes inesquecíveis. Bom companheiro!... Ao ver-mos uma foto, num daqueles imensos quadros pregados na parede, onde José C. Hipólito esteve na cabeça de um possante toiro (510 Kgs), diz-nos que esta pega foi na Nazaré. Apontando para umas outras, informa-nos “Aqui foi no Campo Pequeno, a critica da época, por esta pega me chamou o Pegador de Toiros mais pequeno de Portugal – O Pigmeu com braços de


125 aço. Esta aqui, foi em Salvaterra com um “bicho” dos Robertos, também com cerca de 600 Kgs. Foi tão

grande

o

delírio

do

público

que

um

espectador, nas barreiras me levantou em peso, tal era o seu entusiasmo. A um canto, num pequeno móvel, está a sua jaqueta, o barrete, calção e os sapatos. Mostranos um álbum com características orientais e, diznos: “ Aqui guardo imensas recordações de algumas

celebridades

do

nosso

mundo

tauromáquico”, e mostra-nos actuações com o mestre João Branco Núncio, mestre David Ribeiro Telles, Manuel dos Santos, Diamantino Viseu, Ricardo Chibanga, José Rosa Rodrigues e outros. “Olhe, aqui nesta foto, foi quando o Manuel dos Santos fez a sua festa de despedida, no Campo Pequeno. Neste grupo (o de Adelino de Carvalho) estou eu e o Manuel Ferrador. Esta fotografia, tem uma dedicatória do Manuel dos santos, a mim” “Numa digressão que fiz à China, onde o Manuel dos Santos, nos levou – éramos três forcados – pois ele organizou várias corridas em Hong-Kong, a praça foi construída em canas de


126 Bambu

e,

comportava

cerce

de

8

mil

espectadores. O Chibanga também foi. “Olhe, em cerca de 5 meses que lá estivemos, peguei 36 toiros e, numa das corridas actuei com uma costela partida, como pode ver por esta fotografia”.

“ No entanto por causa dos toiros,

estive duas vezes em Roma, uma no México e outra na Venezuela”. Enquanto decorria a nossa conversa e nos mostrava centenas e centenas de fotografias, vainos dizendo que, no entanto depois destes anos todos a pegar toiros e de muita “porrada” ter levado, não pode esquecer tardes memoráveis que, viveu ! Um pequeno desgosto o acompanha e, diznos “Ainda não fiz a minha festa de despedida !” “À cerca de 5 anos, tentei organizar uma corrida. A então Comissão da nossa Praça, depois de concordar, vai criando dificuldades, e eu, já tinha a oferta de toiros, cavaleiros e forcados e, se fosse necessário,

alguns

toureiros

também

se

me

ofereceram. Tive de desistir, pois a Comissão por ter começado a arrepiar caminho, dificultou, dizendo que não poderia emprestar a Praça.


127 Olhe, que eu oferecia a receita para o Hospital. Não chego a compreender como me puderam fazer aquilo. E num tom magoado diz-nos, actuei em

tantos

festivais

graciosamente

para

a

Misericórdia. No entanto não perdi ainda a esperança de fazer a minha festa de despedida e na minha terra, vou começar os meus contactos novamente e espero que a actual Comissão da Praça de Toiros me ajude, emprestando-me a praça, pois em contrapartida, a receita será para o Hospital”. E assim deixamos o José Carlos Hipólito – O Timpanas de Salvaterra – entregue às suas recordações e tristezas. O Pigmeu, com braços de aço, com alguém um dia lhe chamou. Que a sua ambição se realize, é o nosso grande desejo. Muitos

outros

envergaram

a

nomes jaqueta,

enveredando por outros grupos, como: João Ramalho,

que

pertrnceu

aos

durante

anos

Amadores de Santarém, Tózé Martinho,

que

vivendo

em

Salvaterra, e tendo laços de família com João Ramalho, ainda jovemvestiu a jaqueta, e António


128 Rogério Amaro, desde criança viveu em casa o ambiente taurino, através de seu pai – Rogério Amaro, pegou toiros vestindo várias jaquetas, mas envergando a do grupo Salvação Barreto, deulhe mais notoriedade.

EMBOLADORES /FARPEADORES José Caçador/ ou José Venscelau, já no início do século XX, esmerava-se na feitura, de farpas/ ou bandarilhas, embolando também os toiros em dias de corria.

As embolas,

construídas à base de couro e que servem para cobrir os cornos dos toiros, pois as pegas, aconselham artesanal,

o

seu

transmitiu

uso. a

seu

Este filho

trabalho António

Aleluia, com quem trabalhou durante muitas dezenas

de

anos

a

difícil

maneira

de

ornamentar os ferros (farpas), que são acessórios nos espectáculos


129 taurinos. Tal artesanato, foi continuado na família, por João Aleluia (João Venscelau), neto e filho daqueles, sendo as farpas, muito procuradas especialmente por emigrantes, para decoração das suas tertúlias.

**************** *****************

AS TERTULIAS TAUROMÁQUICAS

No primeiro quartel do séc. XX, era nas barbearias e oficinas de sapateiros que as gentes do povo se juntava para discutir, as alegrias e tristezas do que se passava nas arenas do mundo taurino. Ali,existiam tertúlias, cujo confronto verbal era intenso defendendo arraigadamente os seus ídolos. No Clube do Lavradores, cujos sócios eram a gente fina da terra, mais recatados, não deixavam também


130 de fazer ouvir os seus comentários, em relação aos artistas taurinos da época, O espírito aguerrido das gentes de Salvaterra, nunca perdeu este sentido de manter viva a sua ligação ao mundo taurino, e por vezes já na segunda metade do séc. XX, lá arranjava um “cantinho” onde se convivia e falava de toiros. Nascendo amiúdas vezes, grupos de forcados, que tinham uma duração efémera. Já no séc. XXI, novamente um grupo destes amigos da Festa Brava, se juntou e fundou o Clube Taurino Salvaterrense. Legalizado com estatutos, entre outras actividades culturais, o seu lema é a “divulgação e o apoio de tudo o que respeito ao espectáculo tauromáquico e, em particular, às actividades taurinas que ocorram em Salvaterra de Magos” UMA ESCOLA DE TOUREIO Os aficionados de Salvaterra, tinham em mente a criação de uma Escola de Toureiro, para isso tinham em Francisco Palhota, antigo


131 praticante, que vestiu o traje de luces, o seu monitor. Por volta do ano 2000, foi-lhes feita a promessa, por João Nunes, numa campanha eleitoral, para a Junta de Freguesia de Salvaterra, que os seus anseios seriam uma realidade,

se

fosse

eleito,

pois

tinha

a

intenção de apoiar aquela lacuna, já que havia uma praça de toiros na terra, que precisava de mais actividade. O tempo passou,

fartos

de

esperar,

um

dia

“assobiaram”, João Nunes, já presidente da Junta

de

Freguesia,

pois

segundo

os

aficionados não cumpriu o seu compromisso, conforme se pode ler numa reportagem que saiu no jornal JVT Nº 392, pág. 11, de 31 de Julho de 2003. ************* *********


132

XII CAMPINOS

Nota Prévia Moço Nogeiro, Roupeiro Novo, Roupeiro Velho, Contra-Moiral, Moiral e Campino-Mor, era a hierarquia do homem que guardava toiros no Ribatejo, vinda de séculos passados, ainda conhecida por volta de 1930. O Campino, era uma figura de grande respeito entre os seus pares e, muito estimados pelos patrões. No trabalhar os cabrestos para a recolha dos toiros em praça. Na condução do gado nas pastagens e, a caminho das localidades onde os curros de toiros iam ser corridos, o povo respeitava-os por “grandes varas”. No dobrar do séc. XX, os terrenos de pastagem encurtaram. As ganadarias, passaram por uma lenta mudança, notava-se


133 mais naquelas alicerçadas em hábitos que vinham de séculos anteriores. O Feitor, Campino e Moiral, as três grandes figuras da Lezíria ribatejana, estavam em desaparecimento. UMA FAMILIA DE CAMPINOS António da Silva Cantante, avô paterno do autor, tinha uma irmandade de cinco irmãos, quatro rapazes e uma rapariga; João, José, Luiz, Manuel e Maria Joana. Uns tinham no apelido; Silva e outros, Galricho. A alcunha de “Pataco”, veio do pai; Luiz Galricho, por ter recebido a oferta de mais um pataco, para trabalhar na Casa do Barão de Salvaterra. A notícia do pagamento de mais dois vinténs, correu em toda a Lezíria, o que reconhecia no meio da campinagem, o seu valor de grande vara. A inveja foi tal, que não o livrou da alcunha de “Pataco” que deixou à descendência. Um meu outro avoengo, foi um respeitável Campino-Mor, nas vacadas do rei D. Miguel, que pastavam em terras de Salvaterra e Pancas. O antigo bandarilheiro Roberto Jacob da Fonseca, mais tarde lavrador e ganadeiro, contemplou o meu bisavô Luiz, no seu Testamento, entre os muitos trabalhadores da sua casa agrícola.


134

ALGUMAS HISTÓRIAS Andava eu, pelos 16 anos de idade já escrevia para os jornais. Através dos correspondentes da terra; José Teodoro Amaro e Filipe Ramalho – diziam que tinha jeito! Do meu avô paterno, António Cantante (Pataco), ouvi relatos da sua antiga vida de campino. Dessas recordações, guardei alguns apontamentos. Agora para este trabalho, lá fui “rebuscar” aquelas informações. Como campino viveu a sua maior parte da vida, no campo junto das manadas de toiros. Os anos tinham passado, a idade e as forças, já não o deixavam “dar conta do recado”, como ele um dia me disse: “Os toiros bravos que conhecia como a palma das suas mãos, já não lhe obedeciam, aos gritos é toiro lindo. Já não era aquela “vara” de outros tempo!. Entrado na idade, deixou a campinagem e foi guardar uma éguada afilhada, com 50 cabeças, da casa agrícola Menezes & Irmão, Ldª. No mês de S. Tiago, de 1944, deixou de todo aquela actividade. mas os seus dois irmãos, o João e o José, continuaram na ganadaria Irmãos Roberto. Ele, “Estava farto de tanta canseira”, tantos foram os frios dos invernos, e os calores de muitos verões, anos a


135 fio, em que esteve sentado na sela, com a manta aos ombros - a manta lombeira, quer cai-se geada, quer chovesse, guardando tantas cabeças de gado, que lhe perdeu o conto. A “velhice” tinha chegado. Deixou na vila, a casa onde vivia, na rua d` água e, recolheu-se, com minha avó Emília e, meus tios; Manuel e Luís, numa pequena barraca de caniço, que construiu, nos terrenos do Rego, que alugou ao Dr. José de Menezes, seu antigo patrão. Ali vivia, do sustento de algumas vacas leiteiras, com a venda de leite, a tirar da vaca, pois criava vitelos. Nos valados, perto dos poços onde as mulheres lavavam roupa (1), eram o local onde apascentava o gado, a erva fresca abundava. Um dia sentado num pequeno banco, com fundo de “sumaúma” por ele entrançada, como bem sabiam fazer os campinos, além de esteiras e, fechar garrafões de vidro com cordel - disse-me: “Quando fores grande nunca queiras ser campino, aquilo é um trabalho dos Diabos; ama-se mais os animais do que a família. Teu pai, não quis ser campino, também não quis aprender a endireitar a “Espinhela” (2) e fez bem! ******* (1)

********* – Pequenos tanques de cerca de um metro de fundo, onde a água era constante, as mulheres esgotavam-no, na lavagem da roupa. No fundo tinham pedra para assento dos pés, em cima no terreno, uma laje para a lavagem da roupa. Estendiam a roupa branca pela erva, para corar.


136 *********

***********

************ (2)

************

– Endireitar a Espinhela; era endireitar a coluna vertebral, que ele aprendeu com os campinos mais antigos – Os bezerros ficavam com as costas tortas porque o parto, algumas vezes acontecida com as vacas em pé e, os bezerros nestas condições tinham dificuldade em começar a andar. Depois da mãe, comer a placenta e limpar o animal com a língua, os campinos tapavam o pequeno animal e puxavam-no com uma corda (para evitar as marradas da vaca). O mais dextro, punha a cabeça do vitelo entre as pernas e, com as mãos fazia massagens ao longo das suas costas. Minutos depois o pequeno animal já andava para junto da mãe. Cheguei a ver avô fazer isto a alguns homens que o procuravam com dores nas costas.

**************

*************

Dizia-me; “comecei aos 10 anos a guardar os bois da tralhoada, depois passei para as manadas de toiros bravos. Ao entrar nos 25 anos de idade, um dia cheguei a campinomor, numa casa agrícola da vila, de Salvaterra de Magos. Ainda, trabalhei com meu pai e, os meus irmãos João e o José, nos Roberto & Roberto. Aqueles irmãos toureiros que, ganharam uma fortuna a tourearem em Espanha. As suas lembranças, eram sempre uma “lengalenga” do seu tempo de campinagem. Aquela dos toiros que iam ser corridos em Santarém! Saíram da Herdade dos Coelhos, atravessaram a vila, ao cair da tarde de sexta-feira, foram toda a noite pela estrada do meio, pelos campos de Muge e Benfica, saíram para lá de Almeirim, quando o sol dava os primeiros sinais de vida, estavam a


137 atravessar a ponte do Tejo. Um mar de gente, estava na ponte, viam-se os barretes, os chapéus, coletes e casacos, voavam no ar, a querer tirarem os toiros que a gente mantinha entre os cabrestos. Aquela malandragem, não nos dava descanso e, éramos para aí uns 30 campinos. O curro, tinha de estar em Santarém, na tarde de sábado para a corrida de domingo à tarde. Eram dias de grande trabalheira, mas também a gente se vingava, era cá cada varada naqueles costados. Também me contou, uma outra de um curro de toiros, que tinha de ser corrido em Vila Franca, e como era costume, saiam dos Coelhos, ao inicio da

1936 – Luiz Pataco e os filhos; Campinos dos Roberto & Roberto


138 tarde, para aproveitar a maré do Tejo, e atravessar para Valada, através dos mouchões, ia-mos pelos campos da Azambuja, e a chegada a Vila Franca, a meio da tarde de sábado, para serem corridos no domingo. “A trabalheira começava logo aqui, depois do Maçapez, ia-mos por Trás-Monturos, a rapaziada não deixava os toiros descansados, alguém tinha passado o segredo, queriam tirar os bois do meio dos cabrestos, ao passar a ponte da vala. A gente percebia daquilo, já estávamos habituados e, a vara trabalhava logo nos “costados” deles. Depois em Valada e na Azambuja, era de ver gente a escorrer sangue, aqueles diabos não deixavam os animais sossegados e, davam-nos muito trabalho, para manter o gado no meio dos cabrestos. Varada neles!.. Era a ordem do campinomor. Lino Garoto. Os nossos cavalos, os toiros e cabrestos, babavam-se por todo o lado. Meu avô, gostava de beber o seu copito e, quando ficava um pouco “enxergado” como ele dizia, lá se lembrava de tocar um vira do campo ou o fandango, numa pequena gaita-de-beiços, já muito velhinha e desafinada.


139 Com a música do fandango, ficava empolgado de tal maneira, que não resistia a tentar fazer o jogo de pernas. Era de ver e ouvir…! Nunca se esquecia dos campinos, seus camaradas de outros tempos. Hó, que grande gente. Grandes varas. Os seus dois irmãos; João da Silva Galricho, José da Silva Galricho, o seu primo João Vitorino, Joaquim Quartilho, Francisco Almeida, Fernando Nobre, e o Lino da Silva, alcunhado por Lino Garoto, eram grandes varas! O Lino Garoto, sendo pequeno e atarrecado, era um Homem muito falado, sabia como ninguém levar um toiro bem pegdo na vara, quando a cavalo e em correria, apartava toiros nessas terras da Leziria. Era muito respeitado entre a campinagem, das casas agrícolas do Ribatejo. Muitos outros que vieram mais tarde como: Manuel Luís, José Duarte Cantador, conhecido por “José da Moira” e, o Manuel Bernardo, estes últimos dois acabaram a vida de campinos. no lavrador José Lino. O TRAJE DO CAMPINO MUDOU!


140 No dobrar do século XX, os campinos, aquela gente que lidava com o gado bravo em plena Lezíria ribatejana, ainda mostrava a pele curtida por mil sóis. Os mais novos, já usavam o boné na cabeça, colete e calça de ganga ou cotim, em dias de trabalho e, lá se via, muito poucos, com a cara ornamentada com uma pequena e larga patilha na cara, um pouco abaixo da orelha. As grandes suíças que por vezes “beijavam” os bigodes, com duas pontas bem finas e enroladas, foram caindo em desuso por volta dos anos 30, época da última geração de antigos campinos, muitos deles conhecidos e respeitados por grandes “Varas”. O Campino, homem de têmpera rija, hábitos muito antigos, ainda tinha e tem vaidade em mostrar o seu vestuário. A jaqueta brincheta, barrete preto e cinta da mesma cor, era vestuário em tempo de trabalho. Em dias de festa, era substituído por um outro mais sobranceiro e luzidio, como: Barrete verde, com cercadura vermelha. Colete vermelho, ou azul, atado com cordões na frente enfeitados com botões metálicos,


141 mostrando nas costas, desenhos genuínos, feitos muitas vezes por familiares. O ferro da casa agrícola (de que era trabalhador) é usado, no peito (lado esquerdo), em ferragem latão/cobre, em forma de brasão ou emblema. A cinta vermelha, de lã com franjas, tem a função de apertar o corpo do campino. A camisa branca justa de colarinho redondo, pode ter efeitos desenhados, de uma fina linha. O calção, de fazenda rapada azul-escuro, ou preto, enfeitado com botões metálicos do lado de fora da perna. A meia branca é usada por cima do joelho, arrendada, feita à mão. Os sapatos de salto de prateleira, usados com fivelas e espora. OS RANCHOS FOLCLÓRICOS E A CONSERVAÇÃO DOS USOS E COSTUMES

Quando do aparecimento do rancho da Casa do Povo de Salvaterra de Magos, em 1980, sendo o garante da preservação e divulgação desta forma de vestir do nosso povo, usa nas suas actuações, o vestuário de campino e camponesa em dia de festa. Para a confecção das roupas,


142 recorreu-se a uma das últimas costureira, que ainda sabia confeccionar este tipo de roupa, na vila, a artesã, Elvira Santana. Do vestuário do início do século XX e, muito usado ainda em 1920, a saia da mulher tinha uma roda (4 panos), franzida na cintura por um cós. A saia de castor, de cor vermelha, era usada por debaixo, na segunda posição. Nos anos seguintes já no início da década de 50 passou a usar-se nos dias festivos a saia de castor (hoje, conhecido como feltro de 15) e, foi reduzido para três panos, como foi mostrado pelo Rancho dos Trabalhadores do Núncio Costa. No rodado da saia, mais tarde, já em 1960, era usual ver-se o tecido de nome “riscado”, na confecção das blusas (camisas), das mulheres e camisas dos homens, entrava a “populine”. sendo o garante da preservação e divulgação desta forma de vestir do nosso povo, usa nas suas actuações, o vestuário de campino e camponesa em dia de festa. Agora por tudo quanto é recinto de feira, exposições e corridas de toiros, o campino


143 deixou o copo de vinho, adaptou-se ao seu tempo, bebendo cerveja e outras bebidas finas.

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144

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145 Uma Folha de Férias de uma semana de trabalho na construção da Praça de Touros


146

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Inauguração da Paça de Touros - 1920


147

Reportagem / Entrevista de - José António Teodoro Amaro (Tamaro) *José Gameiro “Jornal Aurora do Ribatejo” edição 1972

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148


149

XIII UMA VIAGEM DE VILA FRANCA DE XIRA, ATÉ SALVATERRA

Foi um dia para não esquecer pelos seus participantes. Realizava-se a segunda corrida da inauguração da praça de toiros de Salvaterra de Magos. Uma comitiva de Vila Franca de Xira, foi convidada. Cerca de 50 rapazes, que vieram a Salvaterra. O grupo visitante, à chegada no cais da vala real de Salvaterra, deram o nome Vila Clube Taurino ao agrupamento. Os simpáticos rapazes alugaram duas grandes fragatas, que navegaram através do rio Tejo e, da vala real da vila.


150 Numa fragata, foi organizada uma casa de jantar, com um grande toldo e, ali nada faltava; mesas cadeiras; casa de banho ao fundo; relógio de parede – tudo decorado com muito gosto. Um guarda-vento, servia de guichet para a entrada das comidas, pois durante o desfile dos visitantes – Largo dos Combatentes viagem de ida foi servido o almoço e lanche. As refeições eram feitas numa cozinha e entravam para a casa de jantar, pelo dito guichet.

A despensa era um encanto..! Estava guarnecida, de cestos de verga com galinhas e coelhos, além de um carneiro vivo, também para matar e comer a bordo. O peixe para se conservar fresco, estava metido


151 em canastras, forradas a erva de espadanas. A fruta era em grande quantidade. Algumas caixas de cerveja estavam juntas a barris de vinho (branco e preto). Para refrescar estes

líquidos também se preveniram de caixas com gelo. Uma cozinheira e duas ajudantes, confeccionaram

seis

pratos

em

cada

refeição. Tendo a cozinha começado a laborar

pelas

5

da manhã.

A primeira

refeição, foi servida pelas 10,00 horas e chegou até às 13,00 horas. A outra um pouco mais frugal, começou pelas 15,00 horas e, havia quem estivesse

acabar pelas 17,00

horas, quando o cais da vala de Salvaterra estava à vista e, uma multidão acenava e gritava, sons ainda não percebíveis, pelos


152 visitantes. A outra fragata, foi destinada a camarata, com

uma cama para cada

passageiro, pois estava destinado passar a noite na vila vizinha. Havia lavatório, espaço de WC e guarda fato. Chegados a Salvaterra e, com as embarcações já atracadas, delas saiu o som da estudantina, sob a direcção de Sabino Gomes, tocando a pandeireta, com alegria e salero o dr. Genso. Iniciaram a caminhada

pela

rua

Misericórdia,

rodeados

da de

Capela muita

da

gente,

passaram pela Igreja Matriz e do jardim do edifício municipal. A multidão acompanhante fez crescer o cortejo, até à praça de toiros. Um tempo depois, com a praça esgotada e em delírio, decorreu a corrida.

A noite já

chegava, foram levantados muitos brindes pelos nossos amigos de Vila Franca, não esquecendo o jornal “A Manhã”, a quem todos os visitados dedicaram uma estima. Endoidecido de alegria, perguntava Sabino Gomes, com muita graça: - Gostaram do


153 nosso lugre de recreio?!... A noite foi passada em diversas casas agrícolas, cujas famílias se empenharam em bem receber. Pela meia manhã

de

convidar

terça-feira,

com

regresso,

Carlos

o

a

maré

a

Gonçalves,

lavrador de Vila Franca e presidente do grupo e

o

“maitre

recebiam

d`hotel”,

ordens,

de

com

quem

grande

todos prazer,

elogiando até os seus apetitosos menús. Despediu-se das entidades e do povo de Salvaterra, com comovidos abraços, dizendo: Até nisto foi à portuguesa antiga, a festa de Salvaterra de Magos.” * B. Duarte * Os periódicos da época, deram destaque ao acontecimento, especialmente o jornal “A Época” que ilustrou as suas páginas, com fotografias, dos barcos a navegarem na vala real de Salvaterra e, o grupo de visitantes no cais e em frente ao edifício da escola, no Largo dos Combatentes, a caminho da praça de toiros.”


154

XIV TOIROS EM DIA DE FEIRA, NO DOBRAR DO SÉC. XX

No dobrar do século XX, o espectáculo taurino, tinha na sua raiz emoções que vinham de tempos imemoriais. Leis e mais leis, vieram condicioná-lo, a última foi com o Decreto-Lei

306/91

de

7

de

Agosto,

completado com o Decreto Regulamentar Nº 62/91 de 29 de Novembro, que queria harmonizar o espectáculo taurino aos tempos que corriam.

Um novo “espartilho”, para a

festa taurina, pois tudo mudou e nada passaria a ser como dantes!


155 O povo vinha deixando de ver aquele aparato, de uma corrida de toiros, fora da praça, mas os aficionados, ainda viviam aquela festa com todo aquele encanto, dentro da praça de toiros. Em 1950, a feira franca de Salvaterra, ocorria como todos os anos em Maio e, nesse dia, realizava-se uma das

muitas

corridas

que

tinham

lugar

anualmente na praça de toiros da vila. No mês de Setembro, realizava-se a feira da vizinha vila de Benavente e, uma semana depois, a de Salvaterra. A feira de Maio, já em plena Primavera, contava sempre com uma corrida de toiros. Havia já algum tempo, o cartaz estava na rua onde anunciava que vinham actuar os mestres cavaleiros; João Branco espadas,

Núncio eram

e

Simão

da

os matadores

Veiga. de

Os

toiros;

Diamantino Viseu e Manuel dos Santos. Abrilhantava a corrida a banda de música dos bombeiros da vila. Os toiros eram da ganadaria Irmãos Roberto e, os forcados,


156 eram do grupo de Manuel Faia, onde pegavam O Timpanas e Manuel Ferrador, homens queridos da terra. As “claques de aficionados” que aqui existiam, tinham agora mais uma vez oportunidade de ver actuar os seus ídolos, pois ao longo do ano, dividiam-se em acérrimas discussões. Um grupo; apoiava João Núncio, um outro Simão da Veiga. Quanto aos matadores de toiros; era de ouvir qual o grupo, que sobrepunha o seu toureiro, em relação aos outros. As discussões tinham lugar, nas oficinas dos mestres sapateiros, nas oficinas dos barbeiros e, continuava na sede do Clube Desportivo local, pois aí à noite nos jogos das cartas, lá vinha à baila a aficion. Naquele domingo de Maio, os aficionados visitantes que enchiam por completo as “tascas” da feira e, as tabernas na procura dos bons “petiscos” da terra, na hora da entrada param a corrida perdiam-se entre a multidão. O muro da Horta do Sopas, estava


157 repleto de curiosos vendo os cavaleiros “passeando” os cavalos.. Nas janelas da praça, os espectadores, empoleirados no gradeamento, tinham os olhos postos no mar de

gente

que

enchia

a

avenida,

na

esperança de verem chegar os toureiros. De repente, gritam, lá vêm eles !.... Eram os matadores, entre o seu stafe, vinham à “paisana”, com os trajes de luces por baixo. Avenida abaixo, vinham da Pensão do Café Ribatejano, onde estavam alojados. De imediato foram rodeados por aquele multidão de aficionados, até entrarem na praça.

A

corrida,

estava

esgotada

de

espectadores e, durou cerca de três horas. No final o matador, Manuel dos Santos, que foi o triunfador, saiu pela porta grande, levado

em

ombros,

entre

o

delírio

da

multidão, que percorreu a avenida, a rua Marquês de Pombal, a rua Heróis de Chaves


158 e, por fim chegou Ă PensĂŁo.

De imediato,

numa das janelas, agradeceu os aplausos daqueles aficionados que delirantemente lhe batiam palmas.

*************


159

XV A ORIGEM DO TOIRO DE LIDE – UMA OPINIÃO

Da pena de António Relvado, colaborador que foi do extinto Jornal Vale do Tejo, JVT, transcrevemos com a devida vénia, o seu artigo. “O toiro de lide constitui a maior inovação Espanhola na criação de animais. Antes que os Ingleses começassem a formar importantes raças Vacuns e Porcinas, durante os séculos XVII e XVIII, inclusive antes de 1791, criou-se o LIVRO GENEALOGICO DO CAVALO,

de puro

sangue Inglês, ia-se seleccionar em Espanha o toiro de lide, pois os primeiros ganadeiros espanhóis controlavam e anotavam a sua genealogia, comportamento e características nos primeiros livros de ganadarias.


160 Das civilizações do passado chegou-nos alguns enigmas difíceis de decifrar. Em torno do

toiro

existem

pinturas

rupestres

e

representando o toiro desde o V ao III milénio antes

de

Cristo.

Segundo

numerosos

arqueólogos, estas figuras foram realizadas com a finalidade de indicar a existência de caça abundante. A

fauna

predominante

ma

Península

Ibérica, durante o Paleolítico era composta por cavalos, toiros, veados, javalis e outras espécies de menor porte. O toiro selvagem da

Pré-História

tinha

como

finalidade

alimentar o homem, caçá-lo, e usá-lo como elemento

de

trabalho.

O

uro

ou

toiro

selvagem, estava domesticado no oriente desde épocas mais remotas. Assim, chegou à Europa Central e Nórdica formaram-se muitas raças alpinas e centro europeias actuais. As

sucessivas

variações

climatéricas

determinaram as trocas de flora e fauna, eliminando numerosas espécies.


161 Na Península Ibérica o clima nunca foi demasiado rigoroso não alterando a flora e a fauna originando migrações de gado vacum da Europa Central e Norte de África, pois a Península estava unida ao Norte de África. A ERA DO TAURO A era do Tauro corresponde aos anos 4513 a 2353 antes de Cristo, caracteriza-se pelas diversas civilizações históricas por culto a divindades taurinas. Em todas as culturas Mediterrâneas e no mundo Celta a crença mágica das virtudes genéticas do toiro e a sua transmissão ao homem fizeram dele figura sacra e objecto de culto e de numerosos ritos religiosos e celebrações festivas. Assim, na Mitologia Grega aparece em forma de Minitauro. No Egipto, o Boi Ápis e o deus da fecundação e da abundância, os Hebreus adoravam o bezerro de ouro, na Babilónia são os toiros alados e ainda temos o Celta Tamos e o toiro Irlandês Cualungé. O mundo


162 romano adoptou o culto de origem Persa Mitra, o jovem deus que sacrifica o toiro primordial para fazer surgir o mundo. Há 2000 anos Júlio César descrevia o Uro que habitava na selva Hercínia na Alemanha, junto ao rio Danúbio

de

carácter

indómito,

enorme

bravura e ligeireza assim como o divertimento que constitua a sua caça pelos jovens. Era um

animal

enorme

e

perigosíssimo que

povoava os bosques da Europa Central Nórdica.

Os

Alemães

e

chamavam-lhe

Auerochs ou toiro selvagem. Foi Júlio César que introduziu o vocábulo uros na língua latina. O uro foi extinto na Europa na Idade Média, é o antepassado selvagem de todas as raças bovinas existentes.O toiro de lide


163 actual é de todos os descendentes directos o que melhor conserva as suas características.

O TOIRO NA HISPÃNIA O toiro bravo descendente do uro ou toiro selvagem da idade média, que abundava em toda a Europa, trazido pelos Celtas. Situou-se no Norte de Espanha e Portugal, tendo-se juntado com o gado procedente do Norte de África durante o período glaciar. Como na cultura Greco-Romana, o toiro está

muito

ligado

às

raízes

culturais

Hispânicas. É o animal mais emblemático, ao ponto de simbolizar a festa popular, e a sua figura traduz todas as artes, desde as pinturas rupestres aos toscos verracos ibéricos, as tendências modernas da cultura Espanhola e Portuguesa,

representado

gravados,

pinturas,

pressuposto

na

nossa

em

esculturas literatura.

desenhos, e

por

O

toiro


164 representa

um

papel

fundamental

na

economia da península ibérica, pois modifica a paisagem

devido à

necessidade das

grandes vacadas, e propicia à criação de feiras de gado que tanta importância tem para o desenvolvimento dos povos e cidades. O toiro de lide teve como, origem e solar em Espanha, e desde aqui se estendeu e exportou a Portugal, a França e numerosos países

do

Continente

Americano,

principalmente durante o no séc. XX. Graças à concorrência de interesses de uma cultura popular com profunda raiz taurina, as práticas equestres dos nobres e cavaleiros da Idade Média. A destreza para o jogo com toiros do pessoal encarregado do seu manejo nas herdades e nos matadouros, assim como a inteligente arte de criar e seleccionar dos ganaderos, criou-se um belo animal, uma das maiores jóias da zootécnica mundial.”

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165

INDICE: CAPITULOS Pág. 4 Preambulo Pág. 6 * I

Última Corrida de Toiros em Salvaterra

Pág. 24 * II Conde dos Arcos – Sua Origem e Morte Pág. 29 * III A Construção da Praça de Touros de Salvaterra de Magos Pág. 36 * IV Toiros de Morte em Salvaterra Pág 44.* V Criadores de Toiros de Salvaterra Pág. 55 * VI Criadores de Cavalos em Salvaterra Pág. 62 * VII A Dinastia Roberto Pág. 96 * VIII Bandarilheiros Pág. 105 * IX Cavaleiros Tauromáquicos Pág. 111 * X Críticos Tauromáquicos Pág 116 * XI Moços de Forcados Pág.132 * XII Campinos Pág 149 * XIII *Uma Viagem de Vila Franca, até Salvaterra Pág.154 * XIV Toiros em dia feira, no dobrar do séc. XX Pág.159* XV A Origem do Toiro de Lide – Uma Opinião


166 *****************

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA: - Revista” Branco e Negro” ………………….. 1897 - Jornal “A Elite” ……………. 1 de Agosto de 1920 - Jornal “A Manhã” ………

6 de Agosto de 1920

- Revista ”Touros e Toureiros” ………………. 1932 - Revista “A HORA” …………………………… 1939 - Jornal “Aurora do Ribatejo” ………………… 1970 * Reportagem dos 50 anos da inauguração da Praça de Toiros~ Jornal “Aurora do Ribatejo” - Livro Contos e Lendas - Última Corrida de Touros em Salvaterra * Rebello da Silva – edição “Colecção Civilização” - Livro “A Misericórdia de Salvaterra” – Dr. José Asseiceira Cardador * Edição: 1968 * Livro “Associação Portuguesa de Criadores de Toiros de Lide – Edições: 1986 e 1990 * A Origem do Toiro de Lide *Jornal Vale do Tejo, 1999 * Jornal Vale do Tejo (António Cadorio) Ano 1999 * Artigo de José Gameiro ***************


167

7 – Escritor Rebello da Silva – Foto a/d 9 v/s – Morte Conde dos Arcos (Aguarela Roque Gameiro) Pág. 11 – Quadro em Azulejo – Morte do Conde dos Arcos * Foto do Autor Pág. 23 – Pintura, embalagem da caixa de bolos “Marialvas” Produto fabricado por Francisco Henriques da Fonseca – Vendido p/ Rest. Ribatejano 1950 Pág. 24 - Pintura de Martin Maqueda Pág. 25 – Certidão de Óbito Conde dos Arcos Pág. 32 - Noticia da Morte de Toiros em Salvaterra, com bilhete de entrada na corrida Pág. 48 – Jogo de Cabrestos, da Casa Agrícola José Lino, na Avenida da vila, pelas “Festas dos Toiros e do Fandango” – 1966, onde se vê o Lavrador, José Lino que acompanha o desenrolar do trabalho dos campinos José Duarte (José da Moira) e Manuel Bernardo * Foto Autor- 1988 Pág. 51 – António Roberto da Fonseca * a/d Pág. 53 – Vicente Roberto * a/d Pág. 62 – Roberto da Fonseca * a/d Pág. 69 – Jarras de Porcelana, com Baquetes de Flores, Troféus conquistados pelos toureiros Irmãos Roberto * Foto do Autor Pág.71 – Um dos três Armários de Troféus dos Bandarilheiros – Irmãos Roberto (s) – Autor Pág 78 – João Roberto da Fonseca (Lavrador) – a/d Pág 80 - Irmãos; Vicente Roberto da Fonseca, Roberto Ferreira da Fonseca (Dr.) e João Roberto da Pág. Pág.


168 Fonseca ª a/d Pág 80 v/s – Quadros da Vida Agricola “Irmãos Roberto Pág 82 - Joaquim da Conceição, Bandarilheiro ª a/d Pág 83 – António Cadório “Mestiço” * a/d Pág. 87 – António Cadório e seus alunos; José Julio e José Falcão * Foto Jornal Vida Ribatejana Pág. 89 - Rogério Travessa, Cavaleiro Tauromáquico, no dia da sua alternativa, em Cascais ª a/d Pág. 90 - Cláudio José, no dia da sua alternativa, em Salvaterra de Magos * a/d Pág. 91 – Ana Batista, Cavaleira Tauromáquica, no dia da sua alternativa, em Coruche * a/d Pág. 93 - Mónica Monteiro, Aprendiz de Cavaleira Tauromáquica * a/d Pág. 95 - Roberto Fernandes (D. Paco), Critico Tauromáquico – a/d Pág 99 – Assinatura Roberto Fernandes - 1960 Pág. 102/103 – Grupos de Forcados de Salvaterra Pág. 104 - António Lapa, Pegador de Toiros * a/d Pág. 107– José Carlos Hipólito, Pegador de Toiros - Grupo Adelino Carvalho, Lisboa Pág. 118 – Campinos (Irmãos Galricho/ Pataco) a/d Pág. 120 – Campino Moderno, com Traje de Trabalho Pág. 122 – Meia feita em lã, p/ uso do Campino em Dia de festa - confecção artesanal e Campino em Dia de Festa Feira de Santarém (Campino* “A Tradição já não é o que era”?) *mgomes,blogspot.com/…/campino doribatejohtml

Pág. 124 – Rancho Folclórico da Casa do Povo de Salvaterra de Magos, e mostra de vestuário (Campino e Camponeza) Pág. 125 – José Luiz das Neves – Membro da Comissão que construiu a Praça de Toiros em Salvaterra de Magos Pág. 136 - Entrada de Toiros para a Corrida Inaugural


169 da Praça de Toiros de Salvaterra * a/d

Pág. 139 - Página de Salvaterra, no Jornal “Aurora do Ribatejo –Benavente, a reportagem dos 50 anos da inauguração – 1970 da Praça de Toiros de Salvaterra * José Amaro e José Gameiro Pág. 142 – Manuel Burrico, Forcado que chefiou o grupo na inauguração da Praça de Toiros de Salvaterra de Magos Pág.159 – Grupo de Visitantes, no Cais da Vala Pág.160 – Desfile dos Visitantes no Largo dos Combatentes Pág.170 – Novo Toiro de Lide Pág.124 - Campino* “A Tradição já não é o que era”? *mgomes,blogspot.com/…/campino doribatejohtml

*************


170


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