EM 1955 A PRAIA DOS TESOS
Autor JOSÉ GAMEIRO
A PRAIA DOCE EM 2015
( Recordações) ********************** EM 1955 NASCEU A PRAIA DOS TESOS EM 1980 PRAIA DOCE ***********************
Autor: José Gameiro Editor: José Rodrigues Gameiro Edição: Papel A5 Brochado e sistema PDF http:// www.historiadesalvaterra.blogs.sapo.pt e-mail: josergameiro@sapo.pt
******************** O Autor não segue o Acordo Ortográfico de 1990 ****************** Ano: 2018
2
A PRAIA DOS TESOS ( Agora Praia Doce) RECORDAÇÕES
Estávamos em 1955, o antigo porto fluvial da Palhota, que duas décadas atrás sofreu alguns benefícios com uma rampa em pedra e cimento para receber o transito dos barcos fragateiros, enquanto durou as obras no cais da vala real de Salvaterra de Magos. Aproveitando a sombra de uma grande árvore – pinho manso, ali era o local onde alguma população urbana de Salvaterra, ia passar os Domingos e Feriados, na época de Verão.
Toda a zona tinha terrenos de vinha, e em frente existia o da “As Botelhas”, do vitivinicultor; Virgolino Torroaes, exemplificador pelos vinhos ali produzidos.
3
Um outro local, com caminho de acesso junto às pequenas boiças, levava à borda do rio, A Quinta da Saudade, de Francisco Ribeiro, com uma barreira que servia de resguardo às árvores que por ai existiam, era a última limitação do rio para poente. A margem mostrava um extenso areal, fazendo uma bonita praia, que o sol fazia brilhar constantemente. Os mais abastados da vila, naquele tempo de férias, tinham como destino as Praias da Nazaré e Figueira da Foz, não deixando de fazer uma estadia nas Termas do Luso. As gentes de poucos recursos financeiras, passaram a ter ali na margem do Tejo, o seu local de veraneio. Os Domingos e Feriados, grupos de famílias e amigos, debaixo do arvoredo faziam convívios com bons almoços à mistura.
UIM DIA PASSADO NA PRAIA Rapaz que eu era na altura, talvez com os meus treze anos de idade, a entrar na adolescência, e tendo folga do meu trabalho na empresa das carreiras, num daqueles dias de Domingo, dei comigo no sossego da frescura das sombras e, da água que corria de mansinho a registar a
4
minha nova experiência – estava na praia. Depressa ali escrevi um texto contagiado pelo ambiente que vivia - “Manhã cedo ainda sob os primeiros raios de sol, que já brilham naquela areia sílica, que nos leva a recuar no tempo – aos relatos que nos dizem dela se fazer vidro nos fornos da vila, e escondiam aqui e ali algum oiro nos seus regatos, em séculos passados. O dia mostra ser de canícula, chegam as primeiras pessoas junto ao salgueiral, mesmo ali a beijar o Tejo, ainda vazio. Alguns logo se apressam a limpar o terreno, dos paus e demais impurezas, que a água do rio trouxe àquele local, na maré da noite. As suas “coisas” são espalhadas em local escolhido; as cadeiras e mesas portáteis são abertas; o cobertor e talheres são postos em posição de ser servido o pequeno-almoço, para os homens um naco de pão e chouriço assado, com o vinho do garrafão a correr na goela. As mulheres e crianças, comiam alguns pastéis de bacalhau e bolos secos com leite e café. Muito perto, a escassos metros, o gado, que por ali já se movimenta para junto de um pequeno canal pouco cavado, que se aninha nas areias, afim de se dentarem de uma noite passada ao relento. Agora, uns atrás dos outros como em fila indiana, começam a chegar os habituais banhistas, o barulho acaba por incomodar os Milharós – pequenas aves multicolores, que saem dos ninhos – pequenos buracos redondos construídos na barreira ali em frente, juntando-se à outra passarada que mostram grande desassossego. Alguns homens, trouxeram apetrechos da pesca (cana, bornal e sacapeixe), afim de se dedicarem ao seu hoby, pois no local a fataça abunda em quantidade. Muito perto das onze horas da manhã. Com a água do rio
5
já um pouco mais quente algumas crianças pelas mãos dos seus vigilantes. vão para as areais brilhantes do rio, e onde a maré já começa a movimentar-se, a fim de aprenderem a prática da natação, no entanto os mais tímidos choram em altos gritos, não só pela entrada na água como também pelos grandes “tufões” que a rapaziada maior faz com as suas brincadeiras. Quase todos os presentes, escolhem a hora do almoço entre a uma e as duas da tarde, e assim em grupos contam anedotas, entre umas goladas do bom vinho dos campos de Salvaterra, a camaradagem é excelente e já ninguém se lembra da semana que findou. Pela tarde dentro, uns dormem a sesta, outros brincam na areia da praia com jogos de bola; outros ainda vão continuar na pesca, enquanto as moças estendidas nas toalhas, ficam a bronzearem a pele num corpo a despontar para a vida. Depois do lanche e já com a noite a fazer negaças ouvem-se os motores dos automóveis e das muitas motorizadas, a emprestar ao local um ambiente, que até ali era calmo e sereno, como a lembrar o quotidiano, que os espera no dia seguinte. Os últimos a abandonarem o ambiente calmo dos aprazíveis salgueirais, fazem o regresso a pé. No rio, já com a maré em preia-mar, ainda se vêm alguns nadadores, tentando apanhar o tempo que se lhes escapa, fazendo dentro da zona balizada e em segurança, algumas palhaçadas, como que a despedirem-se até ao próximo domingo”. Este escrito, foi depois publicado no Jornal Aurora do Ribatejo, onde já colaborav
6
O AVIÃO NA PRAIA DOS TESOS Naquele Verão de 1954, o rapazio da zona da vala real, andava descalço jogando a bola ( bola de borracha) no cais, quando de repente soou nos ares um barulho de motor de avião, este por ali deu algumas voltas e desapareceu, lá para os lados do Tejo. com a jogo retomado, e as acrobacias da avioneta esquecidas, foi dado o alerta, dois homens apareceram no cimo da ponte e, o rapazio logo deixou a bola e foram ao seu encontro, pois estavam ali a poucos metros. vestidos de fato de macaco de tecido azul, um emblema no peito, no lado esquerdo junto à lapela. Nos ombros, uns suportes para mostrarem umas fitas amarelas. Na cabeça tinham capacetes de couro (como aqueles que eram usados pelos pilotos de automóveis), e uns óculos escuros levantados apoiados na cabeça. O calçado era tipo botim Os aviadores, perguntaram ao nosso grupo, onde podiam encontrar um telefone, pois precisavam contactar com Alverca, o avião estava avariado e tinham aterrado num areal junto às águas do Tejo. Encaminhados à taberna do senhor Camilo Martinez (Galego, fugido da guerra civil de Espanha), mesmo ali junto à Capela da Misericórdia, lá esperamos à porta com alguns barqueiros, que já se tinham aproximado. Lá seguimos a pé aqueles militares de regresso, ao pequeno avião de duas asas, que se avistava do cimo da estrada para o Escaroupim. Um dos seus tripulantes, já nas areias, ali junto às pequenas boiças (hortas), começou com voz meiga, dizendo ao magote de rapazes que os seguiam; cuidado que com os ninhos, não lhes mexam!
7
O aviĂŁo foi visto e revisto por nĂłs, todos os seus pormenores estavam agora ao nosso alcance, pois estĂĄvamos habituados a ver no ar a avioneta do Conde Monte Real, este fazia muitas vezes as suas viagens de e para Lisboa, naquele tipo de aparelho, aterrando no terreno da Peteja.
8
Os dois militares, enquanto esperavam os mecânicos, iam perguntando àquela dúzia de rapazes já refeitos da sua curiosidade de meninos, como se chamavam e, em que classe da escola frequentavam, recomendando que estudassem muito. Uma boa hora depois, ao longe na estrada um jipe com dois homens fardados, eram acenados várias vezes com as mãos pelos pilotos. Depois de uma breve conversa entre eles, lá saiu do carro uma mala de madeira, com muita ferramenta, e começaram a reparação. UMA VERGONHA Num repente, eu, e os meus colegas víamos lá no cima da estrada um grupo de homens que vinham ver o avião. Um pouco depois já não era um grupo, mas sim uma fila indiana, que não mais parava de crescer, vinham uns a pé, outros de bicicleta. A tarde já ia alto, refrescava ali junto às águas do rio, quando vejo meu pai, que me procurava entre a multidão, e me chamou! Lá respondi, e quando me cheguei junto me perguntou, com um olhar severo e, com um grande raspanete, me ia dizendo; olha lá, por causa do avião esqueceste-te de ir buscar o petróleo à loja, a tua mãe quer fazer o jantar, viemos agora do trabalho! Nem olhou para a multidão, tão zangado estava, amarrou-me à cintura, uma corda que tinha na bicicleta e, lá veio pedalando entre as pessoas que ainda iam ver o avião, vindo eu a correr atrás da bicicleta até chegar ao Botaréu da Capela, onde morávamos. Já no cima da estrada, ainda
9
tive tempo de ver o avião voltear várias vezes até desaparecer no horizonte, rumo a Alverca. Chegados a casa, me entregou a pequena lata para a compra de dois litros de petróleo, e que fosse a correr, pois a loja estava a fechar, com a recomendação: Diz lá ao senhor, Francisco Henriques, para por no Role do pai ! Fui num pé até junto da Igreja Matriz, local onde ficava o loja e, num outro pé, voltei a casa, não foi preciso minha mãe pedir, não faças mal ao rapaz. Não faço, não ! Ele, teve o seu castigo, foi uma vergonha, vir a correr atrás da bicicleta, com aquela gente toda a rir-se dele. Nunca mais se falou no assunto, meu pai não batia nos filhos, castigava-os com estas pequenas (grandes) coisas!
10
A LIMPESA DA PRAIA A Revolução de Abril de 1974, teve também o condão de motivar as populações de Portugal, para as iniciativas mais prementes das suas terras. Aqui em Salvaterra, já tinha terminado o obra do Parque Infantil, um grupo tomou a iniciativa de limpar a Praia dos Tesos, foi junto dos autarcas e apoiados levaram a cabo o embelezamento daquele vasto espaço, que era o aí-jesus da povo, no dia de verão. Em madeira foram construídas umas casas de banho, uma casota para venda de bebidas e alguns bidons cortados a serviram de assadores.
Não deixei de ser convidado já que tinha escrito alguma coisa sobre aquele espaço tão aprazível da terra, e contavam comigo para sua divulgação. A sua conservação era iniciada todos os anos logo que o tempo o permitia, com o verão à espreita. O povo das terras das redondezas e mesmo distantes acabavam frequentar aquele espaço, vindo mesmo em alguns autocarros alugados.
11
Depressa a Praia com as suas sombras, foram invadidas por gente para longos períodos de campismo, fazendo companhia a tendas e carros de famílias de etnia cigana, que de longe vieram ocupar aquele espaço provocando o afastamento daqueles que procuram o lazer nos dias quentes de verão. A PRAIA DOCE Com António Moreira, como presidente de câmara de Salvaterra de Magos, por volta de 1980, o vereador da cultura; Joaquim Mário Antão, sendo homem de grandes iniciativas, tomou a cargo de apoiar os bombeiros voluntários da terra, na vigilância do local, onde estes tinham uma equipa de socorros e exploravam um pequeno bar, especialmente aos Domingos e Feriados. Ali, o município construiu algumas estruturas em madeira – bancos e sanitários, além de fogareiros - assadores. O areal, foi limpo e nivelado, a praia fluvial passou a ter o nome – Praça Doce, e constava já nos roteiros turísticos. A sua procura foi retomada, as águas límpidas do Tejo e as sombras das árvores eram acolhedoras, foi construído um acesso por um caminho de “terra batida”, os visitantes já transitavam em segurança.
12
Depressa a família Monte Real, que se intitulava proprietária da terra junto ao leito do rio, mandou cortar o Salgueiral, o que levou a litígio jurídico entre o município e aqueles pretensos donos. Com a situação esclarecida, o tempo passou e o povo continuou a usar todos os anos aquela praia fluvial, mas a situação foi-se degradando para seu desgosto, o vandalismo passou a passar por ali, e as infraesturas mesmo que provisórias ficavam destruídas. O executivo municipal, do Dr. José Gameiro dos Santos, continuava a empenhar-se na sua conservação, e pela exploração do bar passaram alguns vendedores. Em 1979, já com Cristina Ribeiro, no executivo camarário, candidatou-se a um Programa que tinha um vasto alcance na recuperação da zona ribeirinha do lado sul do rio Tejo. O PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO DO TEJO Com as verbas recebidas, a câmara de Salvaterra, fez algumas obras, quer no Escaroupim, quer na Praia Doce. Foi reaberto o Museu daquele local piscatório – tinha sido uma iniciativa do vereador Antão, que para tal tinha sido adquirida uma antiga e original casa em madeira, que tinha sido residência de pescadores avieiros. No vasto largo, ali voltado para o rio, foram construídas umas “barracas” em madeira, que descaractizaram o local, sendo alvo de criticas dos visitantes e residentes. Essas construções em madeira, também foram instaladas na Praia Doce, onde se podia ver zonas de estacionamento de carros, e espaço de com assadores em alvenaria. O Cais da vala real, em Salvaterra também
13
foi provida das mesmas construçþes que nada têm em comum com as originais dos pescadores do rio.
14
15
Bibliografia: *Textos escritos e publicados nos Jornais Aurora do Ribatejo – 9.6.1978 e Jornal Vale do Tejo, em 2000 *Cadernos / Colecção “Recordar, Também é Reconstruir ******** Fotos do Autor: *Página 11, Os membros do grupo que em 1975, iniciou a limpeza, renovando o uso da Praia dos Tesos, na reportagem da Televisão SIC em 2013,
********************* ************
16
17