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periferia

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Todo o histórico de movimentos da comunidade ao longo do tempo colaborou para a formação de uma identidade coletiva da periferia. A comunidade reconhecendo semelhanças entre si e manifestando a aversão aos sistemas dominantes, produzindo e consumindo seu próprio conteúdo cultural. Ary Pimentel no artigo “Selfie da Periferia” aproxima a literatura periférica do fotógrafo carioca Bira Carvalho (morador do Complexo da Maré), de forma que a produção artística em diferentes linguagens são atos comunicativos que firmam um pertencimento ao campo cultural, do qual foram deixados à margem:

Novos modos de usar a literatura, a fotografia, a pintura e o cinema se projetam nessa poética de uma contraviolência sutil (“terrorismo cultural”, conforme Ferréz) que, quando “a capoeira não vem mais”, apela ao deslocamento das práticas simbólicas de um conjunto de atores que se afastam dos lugares estabelecidos e dos conceitos de arte que mantiveram à margem os que não eram reconhecidos como produtores de cultura. (PIMENTEL, 2014, p. 51)

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35 - Sarau da Cooperifa

A Cooperifa foi a primeira a retomar o termo Sarau para seus eventos. Originalmente, no Séc. XIX, eram salões literários da elite parisiense, com o intuito de declamar poesias românticas e parnasianas (LEITE, 2014). Chegaram ao Brasil junto a família real em 1808, no Rio de Janeiro, frequentado apenas pelos membros da corte. Em São Paulo, só chegou com os fazendeiros de café tentando se aproximar da cultura francesa na Belle Époque. (TAVANTI, 2018) A ressignificação desse termo para um evento descontraído na periferia, frequentado por pessoas às margens da sociedade, é um ato de subversão, assim como afirmar o periférico e a periferia. Sobre as mudanças que o movimento provocou, Sérgio Vaz diz em entrevista ao rapper Emicida, para o podcast AmarElo Prisma:

Uma das mudanças mais profundas que a gente percebeu, que há 19 anos atrás, quando o jovem vinha no sarau, a gente queria que eles fizessem poesia, e eles voltaram a estudar, foram pra universidade, fizeram mestrado, doutorado, por que naquele lugar ele olhou e falou assim: ‘eu posso, eu consigo!’ Então é o lugar, onde as pessoas não ensinam, mas todo mundo aprende, é um lugar onde não se reproduz preconceito, a pessoa pode chegar e falar assim: ‘aqui eu sou gente porque os meus e as minhas estão do meu lado, parceiros e parceiras.’ (...) Jd. Leticia, Chácara Santana, Jd. São Luís, se reconhece também na Cooperifa como se aquilo fizesse parte do mesmo bairro. A gente acabou integrando o bairro inteiro, vários bairros num bairro só, por que as pessoas se sentiram legitimadas pela poesia. (VAZ, 2020)

Em 2007, a Cooperifa promoveu a “Semana de Arte Moderna da Periferia”, uma mostra cultural com as mais diversas linguagens artísticas em referência a Semana de Arte Moderna de 1922. Uma releitura do cartaz original era símbolo do evento, além do manifesto escrito por Sérgio Vaz. Nilton Franco em sua dissertação de mestrado, faz uma comparação entre ambos ressaltando as controvérsias:

Enquanto o primeiro era composto por pessoas da seleta elite paulistana impregnada de valores ainda europeizados, o segundo enfoca uma necessidade popular e comunitária, reunindo em torno de si pessoas que procuram ampliar seu universo cultural e aumentar as possibilidades de inserção social por meio da cultura. (FRANCO, 2006, p.88)

Além da importância do pensamento crítico e das defesas que foram criadas para a valorização da produção cultural, Eleilson (2014) ressalta a mudança das temáticas e diferenças entre as vozes da periferia. Coloca que as novas gerações utilizam da estética criada, sem deixar de ser crítica, mas produzem “sem carregar o peso da responsabilidade de ‘representar’ e ‘dar voz aos excluídos” (LEITE,2014). A transformação da ideia de periferia e o pertencimento a ela, por meio da representatividade dos movimentos sociais e culturais, abriu caminhos e espaços para questões diversas considerando os contextos históricos. Todos os grupos que se unem em busca de direitos, de cultura e de educação são referências para crianças e jovens entenderem seu papel como cidadãos e continuarem nas lutas cotidianas de quem mora na periferia.

36 - Cartaz Semada de Arte Moderna da Periferia, fazendo referência ao de 1922 37 - Cartaz Semana de Arte Moderna de 1922

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