*21 agosto/setembro 2011
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4 6 1. CURTIU A FOTO DE CAPA? FOI ESSA TURMA QUE FEZ. 2. BASTIDORES DO MOVIMENTAR – BOM NO IOIÔ, SÓ O ENTREVISTADO! 3. NA BELA ESTAÇÃO DA LUZ, O PESSOAL DO CLIQUE QUE ABRE A SEÇÃO AMAR. 4. O ESTAGIÁRIO RICARDO E OS QUEBRA-CABEÇAS QUE ELE FEZ PARA A SEÇÃO BRINCAR. 5. CADÊ O PASSARINHO QUE VOOU DA GAIOLA DA CAPA? NAS FOTOS4DA SEÇÃO CRESCER! 6. A NOVA EQUIPE DA SORRIA: LUANA, MARIANA E RITA. BOA SORTE, MENINAS!
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O encurvamento na mão do arqueiro NA PAREDE DA CASA onde fui criado, num papel fibroso imitando pergaminho, havia um poema que eu e meus irmãos brincávamos de decorar: “Teus filhos não são teus filhos, são os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesmo...”. Só muitos anos depois eu entendi aqueles versos. O poeta libanês Khalil Gibran põe o dedo na ferida dos pais que, como os meus, veem seus filhos sair de casa: “[Teus filhos] não te pertencem (...) Suas almas moram na mansão do amanhã, que tu não podes visitar nem mesmo em sonhos”. Lembrei desse rico texto enquanto preparávamos a matéria de capa desta edição, em que uma das personagens é justamente uma mãe que conta sobre a dor de ver o ninho vazio. E aí percebi que os versos são ainda mais universais: falam sobre todas as perdas inevitáveis. Mas nem por isso é um poema triste. Porque, como você vai ver lá na página 34, deixar ir é o que há de mais natural nessa vida. E pode ser fonte de reflexão, satisfação, renovação. Não é à toa que o gênio Khalil Gibran encerra assim: “Tu és o
arco do qual teus filhos são arremessados como flechas vivas. Que teu encurvamento na mão do arqueiro seja tua alegria”. Um dos méritos das despedidas é o fato de elas permitirem os reencontros. Esse é o tema da seção Amar (pág. 40), mais uma vez organizada pela dedicadíssima Ana Luísa Vieira. Outros destaques são a seção Cuidar (pág. 30), em que a Jéssica Martineli relata como foi tentar passar uma semana sem usar plástico, e a Educar (pág. 44), na qual a Karina Sérgio Gomes mostra o valor da persistência para o aprendizado. Para mim, o tema despedida não poderia ser mais apropriado. Esta é minha última edição na Sorria. Saio para embarcar no mais novo projeto da Editora MOL, uma revista nos mesmos moldes, que também vai ajudar muita gente – logo vocês vão saber mais! Agradeço do fundo do meu coração por poder ter feito parte desse projeto incrível, onde aprendi muito. E também me emocionei demais. Como ontem: tra-
balhando em pleno domingo, eu recebi a ligação de um leitor de Guarulhos (SP), que decidiu gastar preciosos minutos da sua vida telefonando para a redação só para dizer quanto gosta da Sorria. No meu lugar fica a Rita Loiola, que vocês já conhecem bem. Na arte, saem o Fabio Otubo e o Ricardo Sukys e entram a Mariana Bolzani e a Luana de Almeida. Tenho certeza de que vocês vão adorar o trabalho delas. Obrigado! Boa leitura! E até logo!
Dilson Branco EDITOR
educar
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dentro e fora da escola
Não tem
mágica As palavras “aprender” e “fácil” não combinam. Tornar-se bom em qualquer coisa é duro. A recompensa está na evolução: sentir-se melhor, mais capaz e feliz texto K a r i n a S é r g i o G o m e s ilustração R o m o l o
AOS 10 ANOS, MILTON FILHO se apaixonou. Ela se chamava Zodie: uma bola de metal com a extraordinária capacidade de pairar no ar, como se voasse. Controlar esse poder não era moleza. Aprendiz de mágico, o garoto passava todas as tardes em frente ao espelho, tentando dominar a esfera. “Sentia vontade de desistir, porque não conseguia fazer a Zodie flutuar”, conta. Um dia, finalmente, ela cedeu. Foi uma explosão de alegria. Aos pulos, saiu correndo para mostrar o passe para a mãe. E, assim, Milton tornou-se o mágico oficial das festas de família. Os truques entraram em sua vida quando o pai, radialista em Belém do Pará, se encantou com a habilidade de um mágico e lhe pediu que ensinasse os segredos a dois de seus oito filhos. Seu irmão logo desistiu, mas Milton seguiu firme. E foi com a bola prateada que ele descobriu que aprender não se parece em nada com um passe de mágica. Pede dedicação, treino, repetição, cansaço. Até hoje, Milton, agora um médico de 61 anos, usa o tempo livre para praticar. “Gosto de fazer as pessoas sonhar a cada truque”, explica. Recentemente, comprou cinco jogos de mágica. E
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AINDA NÃO CONSEGUIU TIRAR O COELHO DA CARTOLA? PERSISTA. QUANDO ELE SURGIR, VOCÊ TERÁ MOTIVAÇÃO PARA FAZER MÁGICAS AINDA MAIS INCRÍVEIS
continua treinando em frente ao espelho para encantar amigos e familiares. É que aprender é um processo de esforço contínuo. Estudar algo novo é sempre um desafio. Desestabiliza o pensamento acomodado e força a buscar novas soluções. Por isso, é preciso persistência, paciência, tempo. Principalmente até chegar aos primeiros resultados, que nos enchem de força para prosseguir. “Quem gosta persiste”, diz Marisa Elias, professora de pedagogia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. “Alguns processos exigem técnicas. E é preciso muito treino para, por exemplo, adquirir habilidade com as mãos.”
Destrava-língua O prazer aliado ao trabalho duro é o que move o empresário paulistano José Peres a falar oito línguas. Filho de espanhóis, ele nasceu em meio ao dialeto catalão que os pais falavam entre si. Na escola, aprendeu francês e latim. Assim que se formou em engenharia química, notou que precisaria também do inglês. Estudou a língua por dois anos, e não demorou veio o convite para trabalhar nos Estados Unidos. Adquiriu fluência. De volta ao Brasil, a empresa onde trabalhava começou a negociar com alemães. Entendiam-se em inglês, mas José ficava intrigado ao ouvir os novos parceiros cochichar entre si. Curioso, aprendeu o suficiente para entender e responder em alemão. Alguns anos depois, começaram negociações com o Japão. E lá foi José conhecer os três alfabetos desses orientais. Para ele, aprender línguas aumenta as chances nos negócios – e rejuvenesce. Hoje, com 72 anos, sentar-se na carteira para José é voltar a ser jovem. “Quando eu estou na sala de aula, viro um menino. Dá até vontade de jogar bolinha de papel na cabeça do professor”, diz. Foi por causa desse prazer que, quando completou 60 anos, voltou a estudar o francês da infância e aprendeu italiano. Agora, dedica uma hora por dia – e duas aulas semanais – a descobrir o mandarim dos chineses. E que não se imagine nisso um talento para ser poliglota: para José,
aprender novas línguas nunca foi tarefa fácil. “Não sou autodidata. Estudar, para mim, exige sacrifício. Detesto fazer lição de casa, mas faço. Não perco nenhuma aula porque sei que, se faltar, terei de estudar sozinho duas horas a mais.” José sabe que todo aprendizado exige disciplina. O hábito de estudar também precisa ser ensinado. “Ninguém nasce autodisciplinado”, afirma Maria Silva Bacila, professora de pedagogia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. “Isso vem da família e da escola, que impõem hábitos de estudos.” Por isso, apesar de cada um desenvolver seu jeito de aprender, a maior parte das pessoas precisa de um mestre. É ele que aponta caminhos e convida a ir adiante. “Cada avanço traz motivação para um grau mais elevado”, explica a professora “E, quando chegamos lá, temos estímulo para aprender algo mais difícil.”
Professor tempo É como se aprender fosse uma luta contínua, que, quando menos se espera, traz a vitória. Tanto esforço, de repente, termina em amadurecimento e ganha novos significados. Quando a paulistana Susete Morimo começou a praticar caratê, só queria ser faixa preta. Aos 13 anos, treinava uma hora por dia. Quatro anos depois, começou a competir, e a prática se intensificou para seis horas. Nessa época, lutava para vencer – e acabou mesmo campeã paulista de caratê. Mas o passar dos anos mostrou a Susete que o objetivo do caratê ia além das vitórias. “O tempo me ensinou que meu grande rival sou eu mesma. Preciso treinar para melhorar todos os dias”, diz. Hoje, aos 49 anos, além de ser faixa preta, Susete acumulou graduações suficientes para virar mestre e passou a formar atletas. Mas ainda não chegou aonde deseja. Descobriu que sempre há algo novo para aprender – até porque, quanto mais longe vai, mais capaz se sente para avançar. “Meu objetivo agora é me aprimorar na filosofia do caratê”, conta. Sem pressa. É a luta de todo dia que lhe ensina, diz. “O aprendizado não tem fim.”
trabalhar
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para viver melhor
Ah, minhas férias...
Todo mundo sonha com o período do ano em que não é preciso trabalhar. Mas qual será a melhor maneira de aproveitar essa folga tão desejada?
texto K a r i n a S é r g i o G o m e s ilustração E s t ú d i o P i n g a d o
QUANDO AS FÉRIAS CHEGAM, Joana Flores só quer sossego. No ano passado, a analista de câmbio de 26 anos não quis fazer esforço nem para programar uma viagem. Resolveu ficar os 30 dias em seu prédio, à beira da piscina, curtindo o verão de São Paulo. “Nessas férias, não tinha hora nem para acordar. O máximo que fazia era sair com meus amigos à noite quando era convidada”, conta. É assim, desligada de qualquer compromisso, que Joana consegue carregar as baterias gastas nos meses de trabalho. Quando pode, escolhe lugares onde seja obrigada a não fazer nada. Neste ano, foi para Boipeba, na Bahia, uma praia que convida à sombra, água fresca e pregui-
ça. “Não gosto de me estressar quando estou de folga. Procuro ir para lugares em que eu possa só descansar”, diz. Joana é daquelas que seguem ao pé da letra a origem da palavra férias, que em latim quer dizer dia de descanso. Ou seja, livrar-se de qualquer atividade. O que os romanos já sabiam quando inventaram a pausa no trabalho é que fazer nada significa fazer muita coisa para si. “A pessoa está acumulando energia para o próximo período de trabalho”, diz José Clerton Martins, professor de psicologia da Universidade de Fortaleza e coordenador de um grupo de estudos sobre ócio, lazer e tempo livre. “Esse é um tempo seu, em que você controla as horas.
Então, por que não fazer uma coisa pra si?” Para Joana, o máximo que pode fazer para aproveitar o tempo é deixá-lo livre.
Descanso obrigatório No Brasil, o período de trinta dias de lazer é um direito regulamentado por lei desde 1943. Mas nem todos os países acham que descanso é algo obrigatório. Nos Estados Unidos, por exemplo, não há lei que assegure esse direito. O que as leis trabalhistas brasileiras colocaram no papel é a necessidade de pausa mesmo para aqueles que amam o que fazem – o que ajuda na produtividade e na saúde. “O ócio faz parte da vida e é importante para a própria manutenção dos trabalha-
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Um tempo só para você
dores”, explica Aiznaque Grimaldi, vice-presidente regional da Associação Nacional de Medicina do Trabalho. “Nosso organismo precisa de descanso, tanto físico quanto emocional.” Há quem, no entanto, utilize esse período para se ocupar – só que de outro jeito. A artista plástica Nicole Candian, 22 anos, sempre começa as férias com uma grande faxina nos armários. E as quatro semanas de liberdade servem para cursos que aprimoram suas habilidades. “Limpo as prateleiras, faço cursos e reflito sobre meu trabalho pessoal”, conta. “Isso alimenta a minha criatividade. As férias são o momento em que consigo estudar e conhecer coisas novas”, diz.
Para as próximas, ela já planeja um curso fora do país, de fotografia. “É muito prazeroso poder usar esse tempo estudando e trabalhando.” Ops, ela disse “trabalhando”? É que, para Nicole, o trabalho das férias passa longe do que faz de segunda a sexta-feira. E, sem a obrigação de estar produzindo para outros, ela pode criar e repensar seus caminhos. É assim que consegue equilibrar a profissão e seus desejos pessoais. “Esse é o momento de você abandonar a perspectiva profissional e se conectar a suas ambições”, diz o psicanalista Viktor di Salis. “Usar esse tempo para o trabalho de todos os dias seria um pouco vazio.”
Para algumas pessoas, 30 dias não são suficientes para repensar a própria trajetória. O ideal seria um ano sem metas nem horários. Chamado de ano sabático, o período de doze meses de intervalo na vida profissional é comum entre professores de universidades europeias – após sete anos se dedicando à vida acadêmica, eles tiram um para viajar. Inspirada nesse exemplo, a publicitária Clarice Tavares, 33 anos, de São Paulo, passou um ano de folga. Após seis anos na mesma agência, seu corpo começou a reclamar com dores, estresse e gripes constantes das quase 11 horas por dia de trabalho. Foi aí que Clarice decidiu parar tudo. Primeiro, a ideia eram férias convencionais. Pediu demissão, pegou o passaporte e foi para a Califórnia, nos Estados Unidos, em fevereiro do ano passado. Vinte dias depois, de volta ao Brasil, percebeu que precisava de mais tempo. “Tinha vontade de refrescar a cabeça e conhecer outras coisas”, conta. Então, ela raspou a poupança e atravessou o oceano. Chegou em Barcelona, foi para Berlim e, de lá, viajou por toda a Europa. Para não gastar muito, contava com a ajuda de amigos para achar um local para ficar – fosse um sofá ou dividindo o aluguel. Em dez meses, Clarice visitou galerias, empresas, engajou-se em trabalhos temporários, conheceu gente nova e participou de encontros para apresentar seu trabalho e trocar ideias. “Queria absorver tudo o que podia. Aos poucos, comecei a ter um novo olhar sobre o que fazia”, conta. “Entendi que não tinha problemas com minha profissão, mas com a área em que trabalhava. Jamais teria essa visão se não tivesse tirado um período sabático.” Quando voltou, Clarice resolveu aliar a profissão com a área que sonhava. Hoje, trabalha com marketing cultural. Como ela descobriu, seja de papo para o ar, estudando ou imerso em lugares diferentes, as férias abrem os horizontes – e são a melhor das pausas para refletir sobre os rumos do cotidiano.