Seleção LAB SSJ - Como pensar como Da Vinci

Ciência Cognitiva Por que ler: Entender os principais desafios do pensamento criativo.

Como pensar como Leonardo Da Vinci | 1

Neste artigo: • Os sete princípios de Leonardo da Vinci • A genialidade e a capacidade de integração entre a ciência e a arte • A atitude criativa no ambiente corporativo

Como pensar como

Leonardo da Vinci Alguns conselhos de Michael Gelb*, o homem que ensinou os líderes da Nike, IBM e Microsoft

Entrevista a Stephen Watt

Você estudou atentamente os processos de grandes pensadores como Leonardo da Vinci. O que podemos aprender com seu exemplo?

Não chega a ser surpreendente que Da Vinci seja o modelo supremo do pensamento criativo. Considerado talvez o maior gênio de todos os tempos, ele foi não apenas um pioneiro em biologia, botânica, geologia e anatomia, mas é reconhecido como um dos maiores artistas da história, em parte por ter integrado as formas científica e artística de pensamento. Existem outros grandes

cientistas com alguma habilidade artística e grandes artistas que se aventuraram na ciência, mas nenhum integrou ambas tão completamente quanto Da Vinci.

Ele foi um dos heróis da minha infância, e quanto mais aprendo a seu respeito mais ele parece personificar a verdadeira essência do potencial humano. O estudo atento de suas anotações, suas palavras e suas ações me permitiu descobrir sete princípios para pensar como ele. O primeiro é ter uma curiosidade interminável e sempre fazer perguntas cativantes. Isso prepara o cenário para o segundo princípio, que é tornar-se um

pensador original. Isso exige o terceiro princípio, o aguçamento dos sentidos.

Se você adotar esse princípio e estiver intensamente sintonizado com seu entorno, frequentemente o resultado é confusão e incerteza, particularmente no ambiente caótico de hoje. Por esse motivo, você precisa do quarto princípio, que é progredir diante da ambiguidade.

O caminho da ambiguidade para a clareza nos leva ao quinto princípio: pensar usando todo o cérebro, integrando arte e ciência, lógica e imaginação, intuição e razão. Usar todo o cérebro requer energia, o que nos traz o sexto princípio:

equilibrar o corpo e a mente, e o sétimo, para conectar tudo a todo o resto sendo um pensador sistemático. No mundo dos negócios, isso significa formular sua visão, sua missão e seus valores e transformálos em uma estratégia atraente, escolher as táticas adequadas, contratar pessoas que compartilhem sua visão e seus valores, treiná-los e desenvolvê-los para manifestar a estratégia e fornecer os incentivos e a remuneração correta para que mantenham este alinhamento. O trabalho de um líder é buscar conexões e desconexões entre as visões e valores da organização e o que ocorre diariamente no local de trabalho, e identificar os pontos de alavancagem mais importantes, fazendo ajustes contínuos.

Qual dos sete princípios é o mais importante no ambiente de hoje?

Todos eles são essenciais, porque formam um sistema. Para mim, o princípio que faz mais falta no mundo dos negócios é o quinto: usar todo o seu cérebro. Em muitas escolas de negócios, os alunos aprendem uma série de estratégias brilhantes com o hemisfério esquerdo, mas sua intuição é praticamente arrancada à força. Já foi dito que, se Thomas Edison tivesse feito um MBA, provavelmente ele teria tentado inventar uma vela maior.

Um estudo conduzido com homens de negócios há cerca de três décadas mostrou que seu maior arrependimento era não ter dado ouvidos à sua intuição.

De fato, esse é o maior arrependimento de muita gente, não apenas das pessoas de negócios. Isso não quer dizer que você deve começar a frequentar sessões espíritas. A intuição é algo que podemos aprender a cultivar acessando o “modo de incubação” do pensamento e integrando-o aos processos analíticos normalmente ensinados nas escolas de negócios.

Conforme envelhecem, as pessoas tendem a se tornar mais acomodadas e a se dedicar a um leque restrito de interesses e atividades. Por que não conseguimos continuar a aprender coisas novas?

Medo, hábito e ignorância. Muitas pessoas simplesmente não estão cientes que fomos projetados para continuar aprendendo durante toda nossa vida. Crescemos com a noção mítica de que a educação termina quando saímos da faculdade e criamos hábitos e autolimitações. O primeiro passo para desenvolver nosso potencial

é entender que fomos projetados para continuar aprendendo durante toda a vida. Definitivamente, saber aprender é uma arte. Meu novo livro focaliza como aprimorar a mente à medida que envelhecemos. Um fato pouco conhecido é que os adultos aprendem idiomas melhor e mais rapidamente do que as crianças. A maioria dos adultos não acredita que isso seja verdade, o que cria uma autossugestão negativa, mas estudos mostram que se aliarmos o desenvolvimento cognitivo adulto, nosso conhecimento de gramática, sintaxe e vocabulário, à mente aberta da criança – se formos divertidos e despreocupados com eventuais erros – aprenderemos melhor e de forma muito mais rápida.

Reconhecer que podemos aprender o que quisermos é o conhecimento mais poderoso que existe.

O que é “metapensamento” e como é possível usá-lo para solucionar problemas de forma mais eficiente?

Metapensamento é pensar sobre pensar. Isso envolve compreender que o pensamento tem muitas variações e é uma habilidade que podemos desenvolver.

Infelizmente, a maioria de nós não foi treinada na arte do pensamento.

Digo arte porque existem muitos tipos diferentes: existe o pensamento que envolve apresentar dados e ser tão objetivo quanto possível; há aquele que é ativado para buscar novas ideias, que chamamos de “pensamento divergente” ou “pensamento produtivo”; existe o que inclui a crítica de ideias e a busca de pontos fracos em uma proposta; e há a autorreflexão, similar à inteligência emocional, que nos permite examinar nossos próprios sentimentos e preconceitos a respeito de uma determinada ideia. Os melhores pensadores sabem acessar de forma rápida e apropriada diferentes tipos de pensamento, de acordo com cada situação. Quando treinamos uma equipe para fazer isso, de repente todo mundo parece mais esperto!

O metapensamento faz parte do que se espera ser ensinado em uma universidade. Se não puder apresentar uma versão desafiadora do argumento de seu oponente, você não analisou verdadeiramente sua própria posição. Da Vinci aconselhava que examinássemos tudo de pelo menos três pontos de vista diferentes. Analisar a própria perspectiva, uma perspectiva alternativa, encontrar

uma terceira alternativa e examinar todas elas com a mente aberta. Só então é possível dizer que pensamos efetivamente a respeito de algo. Não é preciso ser um gênio transformacional para praticar o metapensamento: basta usar essas técnicas e agregar um toque de gênio àquilo que se faz todos os dias.

É possível isolar nossas emoções de nossos pensamentos?

A resposta é não. E, na maioria das vezes, quando você pensa que conseguiu fazê-lo é aí que acaba se complicando.

Entretanto, é possível nos conscientizar de como nossas emoções afetam nosso pensamento e, assim, podemos nos tornar mais livres para analisar outras opções e tomar uma decisão mais inteligente. Em minha atividade de consultoria, trabalho com farmacologistas e engenheiros: pessoas brilhantes que, frequentemente, sofrem da ilusão de que, devido a seu treinamento e disciplina, são objetivas.

As pessoas que trabalham em setores que demandam mais tecnicamente tendem a ser menos conscientes da forma como a emoção direciona suas conclusões.

Quais são algumas características comuns do pensamento criativo?

Existe um processo universal de criatividade que é como o fluxo das marés: ele vai e volta. A mente começa em um estado de expansividade, intuição e incubação, mas para experimentar a verdadeira criatividade precisamos passar para a modalidade analítica, lógica e prática. Um dos mitos da criatividade é que ela é função do lado direito do cérebro; na realidade, ela é função de ambos os hemisférios, o esquerdo e o direito, integrados e em harmonia.

O momento “eureca” de pura criatividade chega só depois de um trabalho intensivo e direcionado – e, quando vem, é de forma inesperada. Albert Einstein teve a percepção essencial da Teoria da Relatividade quando estava de olhos fechados, imaginando a experiência de viajar em um raio de luz por todo o universo. Sir Isaac Newton teve sua revelação sobre óptica quando viu a luz refletir em um cristal e formar um arco-íris.

A descoberta da estrutura do anel benzênico surgiu quando o químico alemão Friedrich August Kekulé estava cochilando em frente à lareira (e discutese se ele não recebeu a ajuda de um bom conhaque). Quer a inovação seja na ciência, seja nos negócios, as descobertas

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tendem a ocorrer em momentos de relaxamento – mais provavelmente em um parque ou no sofá do que no laboratório.

O que as pessoas esquecem é que esse momento nunca ocorreria se anteriormente não tivesse existido um trabalho intenso, disciplinado e direcionado por um período considerável.

Além do mais, a criatividade nunca seria concretizada se após o momento da descoberta o gênio não tivesse o preparo, a disciplina e a capacidade para traduzir aquele salto da imaginação em linguagem científica, tecnológica ou de negócios. É essa harmonia entre o modo intuitivo e receptivo e o modo prático e ativo que gera a criatividade: a harmonia e a criatividade são universais, mas a forma como as pessoas as manifestam é extremamente individual.

Como podemos aplicar suas percepções em nossa vida pessoal e profissional?

Todos conhecemos a máxima de “dormir sobre um problema”. Os líderes com os quais trabalho afirmam que são muito mais produtivos quando se afastam de um problema complexo após estudá-lo atentamente. Nos encontros que conduzo, sempre programo um período de reflexão noturna, mas, antes disso, normalmente levo os participantes a fazer algo fora do comum, como escrever poesia tomando uma taça de vinho. Geralmente, eles voltam no dia seguinte e se surpreendem ao constatar que estão muito mais eficientes e produtivos do que estariam de outra forma. Em vez de ter seu momento de descoberta na viagem de volta, quando já é muito tarde, eles têm a oportunidade de compartilhar sua percepção com as pessoas que mais podem se beneficiar dela. Incluir essa “paralisação” no processo exige visão, principalmente no mundo dos negócios, já que o senso comum afirma que “intervalos são para mariquinhas”, e que é preciso ser sério e deprimido para conseguir executar algum trabalho.

Obviamente, essas ideias são absurdas, mas elas ainda prevalecem.

Você descreve alguns dos maiores gênios da história como seres humanos reais, com fraquezas reais.

Qual é a lição para o resto de nós?

A maioria de nós está excessivamente consciente de nossas próprias deficiências; felizmente, não é preciso ser perfeito para ser altamente criativo.

Um bom primeiro passo é cercar-se de pessoas inspiradoras. Vemos modelos em todos os estágios da vida. Veja como um patinho imita a mãe; em seguida, olhe para uma família em um shopping center: a postura dos pais é imitada pelas crianças. O que distingue o ser humano dos outros animais é que, à medida que envelhecemos, podemos escolher quem desejamos imitar conscientemente. Se você estiver interessado em criatividade e alta performance, ou em expressar todo o seu potencial, faz sentido escolher alguém que seja um modelo mais brilhante e inspirador. Ao mesmo tempo, é reconfortante perceber que todos cometemos erros e temos pontos fracos e que não é preciso ser perfeito para seguir um bom exemplo e exercer sua própria criatividade.

*Michael Gelb é escritor e instrutor de treinamento, especializado em pensamento criativo, aprendizagem acelerada e liderança inovadora. Tem 30 anos de experiência prestando consultoria a organizações como Nike, Merck, IBM e Microsoft. É autor dos best-sellers “Descubra sua genialidade: como pensar como as 10 mentes mais revolucionárias da história” (Editora Agir, 2003) e “Como pensar como Leonardo da Vinci” (Editora Ática, 2000).

Este artigo foi traduzido e reproduzido pelo LAB SSJ com a permissão da Rotman magazine This article originally appeared in Rotman magazine, published by the University of Toronto´s Rotman School of Management.

Tradução: Isadora Marques

Criatividade é puro esforço e gozo, esforço e gozo...UAU!!!

Esforço!

Embora tenha ganhado espaço nos últimos anos, marcando presença nas listas de competências e valores das organizações, o comportamento criativo ainda é pouco valorizado e estimulado no dia a dia corporativo. Aliás, isso não é novidade, pois na história da nossa sociedade a criatividade sempre foi para poucos.

Crescemos pensando que há sentimentos de um lado e razão de outro, e que podemos confiar apenas no intelecto. Afinal, o hemisfério esquerdo do cérebro está relacionado à lógica e à razão, assim provido da verdade, e o lado direito, irracional, é o culpado pela distorção dos fatos. O filósofo Hume dizia que era preciso erradicar os sentimentos do processo lógico, porque eles distorcem a verdade... que verdade?

Toda essa história dificulta o olhar e o pensamento criativo.

Esforço! O processo criativo não ocorre de maneira natural como imaginamos.

Para acontecer também é preciso, por um lado, muito esforço do cérebro, sinapses, energia e, por outro, repertório, matéria-prima para facilitar e reforçar as sinapses.

Crescemos em um contexto de punição, medo e pouco risco, e a criatividade tem relação com arriscar e aprender. Quando arriscamos também ampliamos nosso repertório e, com isso, geramos matériaprima para o processo criativo e isso é ralação!

Gozo! A questão não está baseada apenas nas melhores ideias, mas na percepção geral do que move as pessoas, do que as motiva a ter prazer pelo que fazem, prazer em colaborar e a ser quem são na medida em que reconhecem seu potencial criativo.

Gozo! Pela descoberta de uma nova forma de pensar e gerar resultados.

Acessamos, dessa forma, mais recursos internos para “tornar o estranho conhecido, e o conhecido estranho” (Amabile). E isso não tem preço!

Bianca Nesi é instrutora do LAB SSJ.

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