Número DOIS FEVEREIRO 2013
LIDERANÇA FEMININA As conquistas do passado e os desafios do presente INFLUÊNCIA E PODER Quando ceder é ganhar QUAL O PAPEL DO PROFESSOR NO SÉCULO 21? As transformações impulsionadas pela tecnologia
DE QUEM é A RESPONSABILIDADE PELA
TRANSFERÊNCIA DO APRENDIZADO? Esta etapa, cheia de oportunidades, continua sendo terra de ninguém. Entenda o que impede a aplicação do conhecimento e conheça as ferramentas para uma abordagem mais efetiva para o negócio.
O desenvolvimento e a performance das pessoas têm impacto direto nos resultados da sua empresa. Atue como um profissional de RH transformador e faça sua estratégia virar vantagem competitiva.
CURSOS ABERTOS Com os cursos abertos do LAB você vai vivenciar uma nova experiência de aprendizagem. Criamos um ambiente propício para a troca de ideias e geração de insights, proporcionando conexões entre a teoria e a realidade. Participe e transforme a sua performance em vantagem competitiva. Em breve, calendário de 2013. Aguarde!
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07 Curtas Saiba como o presente vem mudando o futuro dos profissionais e quais serão as habilidades indispensáveis na próxima década.
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Entrevista Charles Lukower, Diretor de RH da Merial, explica o processo de transformação cultural da empresa que passou a fazer parte da Sanofi, gigante farmacêutica.
O PAPEL DO PROFESSOR
Do professorconteúdo, focado na informação, ao professorinterface, focado na mediação.
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Antônio Barros Jr.
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Ín di CE
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Especial Transferência do aprendizado
ENTREVISTA Andrew Jefferson, CEO da The 6Ds Company: “Melhorar a transferência significa ter maior impacto imediatamente, uma grande oportunidade de alavancar os resultados”.
REPORTAGEM Na Globosat, Mondelez Brasil e Promon, a aplicação do conhecimento é fator estratégico, sem o qual a capacitação faz pouco sentido.
PAPEL DO GESTOR Não tem outro jeito: o apoio do gestor é imprescindível à transferência.
RAIO-X Donald Kirkpatrick, ex-presidente da ASTD e criador de um modelo altamente influente de avaliação de treinamentos.
MOTIVAçÃO Os programas poderiam ser mais eficazes se administrassem melhor as expectativas dos colaboradores.
34 CENA DE FILME As diferenças podem fazer a diferença.
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ONTEM E HOJE Carreira feminina: as mulheres no mercado de trabalho hoje e há 100 anos.
ARTIGO Quando o gap de poder é muito expressivo, todos perdem.
LAB LENDO Gamificação, Mobile e Blended Learning estão entre as nossas sugestões de leitura.
42 APRENDIZAGEM DE RESULTADOS As organizações precisam mais do que aprender, precisam de resultados.
editorial
In Mídia Digital
Terra de ninguém?!
REDAÇÃO
Depois de um programa de treinamento, que percentual de participantes você acredita que usa o que foi aprendido no trabalho? De acordo com a The 6Ds Company, apenas 16%, os outros 84% não têm qualquer aumento de performance. Este dado merece atenção, porque mostra que existe muito tempo, esforço e dinheiro gasto, com pouco retorno em resultado de negócio. A ausência de um plano real, com estrutura de apoio e atribuição de responsabilidades, é apontada como a razão da ineficiência, mas também uma grande oportunidade para alavancar os resultados. Mas, afinal, quem é responsável pelas ações de transferência do aprendizado? Profissionais de RH, gestores e aprendizes são igualmente indispensáveis nesta etapa que hoje é considerada “terra de ninguém”. Neste sentido, precisamos deixar de encarar o processo de aprendizagem como uma fotografia do evento de treinamento e passar a tratá-lo como um filme, que começa na etapa de planejamento e termina apenas quando conseguimos verificar melhoria de performance. Em reportagem desta edição, ouvimos a Globosat, a Mondelez Brasil e a Promon, empresas que tratam a aplicação do conhecimento como fator estratégico, sem o qual a capacitação faz pouco sentido. Fizemos também uma entrevista especial com Andrew Jefferson, CEO da The 6Ds Company e autor de dois livros que tratam o assunto. Para ele, “programas de aprendizagem criam valor somente quando os novos conhecimentos e competências transmitidos são colocados em prática, no dia a dia de trabalho do colaborador na organização”. Para que isso aconteça, entretanto, o participante precisa estar motivado. Não deixe de conferir também o artigo “O Papel do Aprendiz”, de Conrado Schlochauer, que aborda o que as empresas podem fazer para manter seus colaboradores motivados a aprender e, igualmente motivados, a aplicar o conhecimento adquirido. Especialmente, agradecemos à colaboração de Martha Gabriel, pesquisadora e palestrante internacional, que fala sobre o impacto das tecnologias na educação e as transformações essenciais do papel do professor; Charles Lukower, Diretor de RH da Merial, em entrevista ao jornalista Alexandre Carvalho dos Santos, que aborda o processo de transformação cultural que a empresa passou ao multiplicar inúmeras vezes o valor do seu faturamento após ser integrada pela Sanofi; a participação constante e ativa de Luiz Algarra, Paulo Campos e Maria Carolina Matheus. Boa leitura!
Alexandre Santille
LABORATÓRIO | DOIS
Direção geral: Alexandre Santille Supervisão geral: Carolina Correa Editora-chefe: Vanessa Borelli Redatores: Alexandre Carvalho dos Santos Giselle Stazauskas Vanessa Borelli Colaboradores desta edição: Alexandre Santille Conrado Schlochauer Isadora Marques Luiz Algarra Martha Gabriel Maria Carolina Matheus Revisão: Giselle Stazauskas Mariana Pereira ARTE Direção de arte e diagramação: Henrique Marin Roberto Shintate Silvana Tai Projeto gráfico: Daniel Stanczyk Stevan Justo Fotografia: Antônio Barros Jr. Giselle Stazauskas Fotografia Capa: Antônio Barros Jr. Produção gráfica: Luiz Gambim Sugestões e comentários: editoria@labssj.com.br
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MOBILE LEARNING: APRENDIZAGEM EM UM MUNDO CONECTADO Vanessa Borelli
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bilhões de assinantes, esta é a marca que a telefonia móvel alcançou em 2011. Segundo pesquisa da ASTD (American Society for Training and Development), a grandeza desse número é tão surpreendente quanto o impacto desses dispositivos na sociedade, transformando a maneira como as pessoas trabalham e aprendem.
Mais da metade dos entrevistados acredita que as tecnologias móveis vão tornar as iniciativas de aprendizagem mais efetivas nos próximos três anos.
A ASTD e o Institute for Corporate Productivity entrevistaram 567 profissionais de aprendizagem e desenvolvimento em uma pesquisa que buscava informações sobre as perspectivas de aplicação das inúmeras tecnologias móveis em suas estratégias.
As principais barreiras para a adoção da aprendizagem móvel incluem orçamento, integração com sistemas e segurança.
Confira os principais resultados encontrados:
Menos de um terço das organizações oferecem conteúdos de aprendizagem por meio de um dispositivo móvel, apesar de sua alta correlação tanto com a aprendizagem quanto com os índices de desempenho do mercado.
Menos de 10% dos entrevistados que já utilzam a aprendizagem móvel têm métricas formais em vigor para avaliar sua eficácia.
GERAçÃO FLUX
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ão há dúvidas de que estamos em um novo mundo, onde o único padrão encontrado é que não há mais padrão algum. As mudanças frequentes impõem uma nova dinâmica para os indivíduos. Mais do que aprender, todos precisam ser flexíveis o suficiente para se adaptar às diversas alterações com rapidez.
A Geração Flux é uma designação cunhada pelo portal Fast Company para diferenciar o estereótipo das pessoas que vivem neste momento determinado por um contexto instável e caótico. O que caracteriza essa geração é que ela é totalmente moldada pela instabilidade. Eles abraçam o imprevisível, toleram, e até gostam, de mudanças
de carreiras e modelos de negócios. Ser um “fluxer”, de acordo com o portal, não se trata de produzir muito ou mudar de emprego constantemente. Mas de não aceitar o status quo e acreditar que há sempre uma maneira melhor de se fazer algo, há sempre o que melhorar.
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HABILIDADES DO FUTURO
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Apollo Research Institute conduziu uma pesquisa para entender as principais características do mundo com potencial de geração de mudanças no futuro e suas consequências em termos de habilidades requeridas no trabalho. O estudo encontrou seis impulsionadores de mudanças, são eles:
Longevidade extrema: Mundo dos computadores: durante a próxima sensores e processadores podem década, veremos o desafio tornar o mundo programável. do envelhecimento da população Com essa decodificação vir à tona. Novas percepções poderemos nos concentrar sobre o significado da idade, cada vez mais em manipular Aumento dos dispositivos bem como a emergente os dados para alcançar inteligentes e dos sistemas possibilidade de extensão os resultados de automação: de uma vida saudável desejados. a tecnologia movimenta tomarão forma. a força de trabalho e nos deixa cada vez mais distantes das atividades repetitivas.
Novas tecnologias multimídia: Mundo interconectado: elas estão causando uma revolução durante décadas, a maioria das empresas na forma como nos comunicamos. multinacionais tem usado suas subsidiárias Tecnologias para produção de no exterior como canais de vendas e de vídeo, animação digital, realidade suporte técnico. Agora estamos vivendo aumentada, jogos e edição de mídia, Organizações uma transição, assim, empregar pessoas tornam-se cada vez mais superinstruídas: nesses locais significa também integrar sofisticados e generalizados. uma nova geração os colaboradores efetivamente Estamos literalmente de conceitos organizacionais aos processos globais, desenvolvendo e habilidades de trabalho a fim de manter uma nova linguagem. ultrapassam a visão tradicional a competitividade. e buscam inspiração a partir de áreas como design de jogos, neurociência e psicologia da felicidade. Estes campos vão conduzir a criação de novos paradigmas de aprendizagem.
LABORATÓRIO | DOIS
O que essas seis forças significam para os PROFISSIONAIS da próxima década? O estudo identificou 10 habilidades fundamentais para o sucesso no mercado de trabalho. 1 O trabalhador ideal da próxima década é “T-Shaped”, tem compreensão profunda de pelo menos um campo, mas capacidade de entender o significado dos conceitos em diferentes disciplinas. 2 Colaboradores do futuro precisam estar aptos a reconhecer o tipo de raciocínio que as diferentes tarefas e ambientes exigem, fazendo os ajustes necessários para alcançar os resultados desejados. 3 Profissionais também precisam saber utilizar as novas ferramentas de forma a ajudá-los a lidar com a sobrecarga de informações. 4 Capacidade de trabalhar de forma produtiva, promovendo engajamento, motivação e demonstrando presença como membro de uma equipe virtual.
5 Capacidade de se conectar com os outros, identificando e estimulando as reações e interações desejadas. 6 Proficiência em encontrar soluções que vão além do tradicional. 7 Capacidade de operar em diferentes contextos culturais. 8 Habilidade para traduzir grandes quantidades de dados em conceitos abstratos e compreendê-los. 9 Habilidade de determinar o significado mais profundo do que está sendo expresso. Competência esta que as tecnologias não têm. 10 Capacidade de avaliar criticamente, desenvolver conteúdo que utiliza as novas mídias e alavancar a comunicação persuasiva.
CREDIBILIDADE É A BASE DA LIDERANÇA Paulo Campos
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adversidade e dificuldades põem líderes e liderados à prova. Tempos atuais exigem ações ousadas e medidas arriscadas, quase sempre com resultados imprevisíveis. Há momentos que todo líder, seja por uma oportunidade ou ameaça, precisa solicitar aos liderados que se transformem e façam as coisas de forma diferente. A adesão a esse “convite de mudança” é diretamente proporcional à confiança que os colaboradores têm em seu líder.
Agora vem a pergunta: o que um líder precisa fazer para que a equipe acredite nele? Confiança, credibilidade e coerência são a base da liderança. As palavras crédito e credibilidade provêm da mesma raiz, credo, que significa “confio ou acredito”. Quando os liderados percebem que seu líder tem credibilidade são muito mais propensos a: Ter orgulho de dizer aos outros que fazem parte da empresa
Lembre-se: Os líderes são vistos como confiáveis quando se preocupam com os interesses da equipe. Ambos servem a um propósito comum. Compartilhem diariamente seus valores.
Ter um forte sentido de espírito de equipe Ver que seus valores pessoais são coerentes com os da empresa Sentir ligação e compromisso com a organização Ter um sentimento de “dono da empresa”
Paulo Campos é consultor, instrutor do LAB SSJ e editor do Blog Mochileiro Corporativo da Você S/A.
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CHARLES LUKOWER, DIRETOR DE RH DA MERIAL, EXPLICA O pROCESSO DE TRANSFORMAÇÃO CULTURAL DE UMA EMPRESA QUE PASSOU A FAZER PARTE DA REALIDADE DE UM GRANDE GRUPO Alexandre Carvalho dos Santos
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menino acorda, olha-se no espelho e descobre que, como por encanto, cresceu numa velocidade extraordinária ao longo da noite. De repente, está muito maior e mais forte, seus sapatos e roupas não lhe servem mais – ele precisa se adaptar rapidamente a seu novo tamanho. Você já viu essa história no cinema (sim, no filme Quero Ser Grande, com Tom Hanks), mas, excluindo o fator fantasia, existem situações semelhantes também no mundo corporativo. E a Merial é prova disso. Atuando na fabricação de produtos veterinários, a empresa, com sede em Campinas (SP), era uma joint-venture entre a Merck e a Sanofi, com 5 mil empregados e um faturamento anual de 2 bilhões de dólares. Isso até meados de 2011. A partir daí, a Sanofi assumiu o controle total da empresa, integrando-a às dimensões impressionantes do seu grupo. Foi quando a mágica aconteceu: a Merial passou a fazer parte de uma nova realidade, que abrange um total de 120 mil empregados e um faturamento de 45 bilhões de dólares. E agora? Agora a empresa está trabalhando na adaptação à sua nova estrutura, em um processo de transformação cultural que atinge colaboradores e gestores em todos os patamares da organização. Segundo Charles Lukower, diretor de Recursos Humanos da Merial, o objetivo é tirar o máximo proveito de fazer parte de um grupo grande, sem perder as vantagens competitivas que seu perfil mais enxuto lhe garantia. Esse trabalho de reconstrução de estratégias inclui um projeto de EVP (Employment Value Proposition), para sua consolidação como marca empregadora, que vem sendo desenvolvido com o LAB SSJ desde 2012. Nesta entrevista para a LABORATÓRIO, o executivo explica o que toda essa mudança de cultura implica e como enxerga a questão da atração e retenção de talentos no cenário da economia atual – quando a carência de mão de obra especializada é um desafio para diversos setores.
Antônio Barros Jr.
entrevista
TAMANHO GG
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//O que essa integração com a Sanofi exige de transformação cultural? Charles Lukower A transformação é gigantesca, e vai do nível mais baixo ao mais alto da estrutura. Um exemplo simples: como joint-venture, você precisa explicar seus rendimentos uma vez por ano para as empresas que controlam a sua. Desde que não pare de dar dinheiro, a próxima prestação de contas só vai acontecer um ano depois. Mas, como parte do grupo, temos reports diferentes e muito mais constantes. Há um processo mais extenso de aprovação, falamos sobre resultados frequentemente e também discutimos as estratégias num nível muito mais profundo. Outra mudança significativa é que passamos a seguir uma arquitetura matricial, que é como a Sanofi já funcionava. Entre outras coisas, isso significa que agora eu tenho três chefes – e é assim para todo mundo. Isso tem um impacto muito grande no dia a dia do profissional que está acostumado a responder para uma pessoa só. //Gera uma demanda de aprendizagem? CL Exatamente, inclusive dos gestores, e é aí que entra uma postura mais atuante do RH. Nós temos de capacitar esses chefes para que saibam lidar com essa divisão de poder. Se houver muita disputa entre eles para ver quem manda mais, o trabalho para.
Antônio Barros Jr.
//Essas transformações englobam as perspectivas da equipe? CL Esta é justamente a terceira mudança cultural pela qual estamos passando. Além de fazer com que um profissional daqui se destaque a ponto de interessar pelas outras empresas do grupo Sanofi, precisamos ser uma organização que também atraia talentos do resto do grupo. E isso não é tão simples, porque a Merial é menor e fica no interior. Mas também temos vantagens que devemos saber destacar, como uma estrutura mais ágil e dinâmica. //A velocidade das mudanças no mercado tem impacto na forma de atuação do RH? CL Sim, com certeza. Só que no nosso setor é um pouco diferente. O mercado de saúde, de modo geral, costuma ter um ritmo mais lento. Não é como na produção de um iPad, por exemplo, em que você lança uma tecnologia por ano. Na medicina veterinária, as doenças são as mesmas do passado. E, quando surge uma enfermidade nova, o desenvolvimento do remédio pode levar 10 anos. //Como vê a questão da atração e retenção de talentos dentro dessa mudança de cultura? CL O mercado de trabalho é regulado pela lei da oferta e procura. A situação que tínhamos 10 anos atrás está completamente invertida agora. Antes, você tinha excelentes profissionais com dificuldade
de encontrar uma colocação. Para a companhia, não era imprescindível ter uma marca empregadora, porque as pessoas vinham até você. Hoje, o bom profissional é quem seleciona a empresa, já que o cenário é de muitas vagas precisando de qualificação – que vai desde uma habilidade mais básica, como falar inglês, até uma exigência mais técnica. No nosso caso, o setor farmacêutico veterinário é extremamente afunilado. Neste contexto, você tem pouquíssimos profissionais qualificados sendo disputados por alguns players importantes. Há casos em que eu preciso de alguém capacitado para assumir um projeto de pesquisa muito específico, ligado a uma determinada substância que só serve para uma espécie de animal. Quantos profissionais desses existem no mercado? Um ou dois, enquanto há quatro ou cinco empresas precisando. //Qual o papel dos gestores na satisfação dos profissionais da empresa? CL Eu diria que 95% da retenção depende das pessoas que ocupam cargos de chefia. No dia a dia, não é a organização que trata bem ou mal seus colaboradores. É o gestor que faz isso, é a liderança. Claro que a Merial vai disseminar sua cultura, seus valores e apontar comportamentos que ela aceita ou não. Mas é a gestão, em seus diversos níveis, que vai influenciar
diretamente na satisfação e motivação do profissional. Nosso primeiro trabalho, junto com a Sanofi, tem sido justamente um desenvolvimento que vem de cima para baixo, capacitando as lideranças para lidar com a nova realidade da Merial. //E para você, Charles, quais são os atributos que o levam a se decidir por uma empresa para trabalhar? CL De início, um pacote de remuneração e benefícios interessante. Acho hipócrita quem diz que isso não tem importância. Até porque você também trabalha para sustentar a sua família, e não pode pagar a escola das crianças só com a sua felicidade na empresa. Em seguida, vêm os desafios. Ninguém mais quer permanecer num trabalho em que não possa construir algo de valor. Depois vêm as oportunidades. O crescimento na carreira foi um dos atributos que eu busquei quando vim para a Merial, um dos pontos-chave na minha avaliação. Também destaco os valores da companhia, que vão da ética organizacional à visão de mundo da alta gestão. Já desisti de uma boa colocação porque não concordava com a atividade principal de uma empresa que tentou me contratar. E não dá para deixar de lado a responsabilidade social. Trabalhar numa empresa que devolve à comunidade uma parcela de suas conquistas é motivo de muito orgulho para mim – e acho que deveria ser para todo mundo. 10 | 11
ERA DA INTERFACE Martha Gabriel
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s novas tecnologias não afetam apenas o modo como fazemos as coisas, mas principalmente nossos modelos e paradigmas – as regras intrínsecas de como as coisas deveriam ser. Neste contexto, é de se esperar que as expectativas e relacionamentos educacionais sofram as mesmas modificações significativas e perceptíveis que têm ocorrido em nossas vidas cotidianas. O fator tecnologia em si não é definitivo – ele só é diferencial positivo se contar com a participação efetiva do professor e dos planos educativos. O professor deve assim deixar de ser um informador para ser um formador, caso contrário, o uso da tecnologia só terá aparência de modernidade. Alguém já disse que um computador permite que você faça mais erros mais rapidamente que qualquer outra invenção da história da humanidade. A internet amplificou esse potencial computacional, adicionando o ingrediente “rede”- para o bem e para o mal. Desde 2003, ministro cursos relacionados com novas tecnologias em laboratórios com alunos conectados o tempo todo. Não é fácil ministrar cursos cujo conteúdo se modifica constantemente, mas isso se torna muito mais fácil e prazeroso quando se tem a oportunidade de ministrá-los em
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um ambiente onde ele possa ser demonstrado. Acredito mesmo que seria muito chato falar das tecnologias emergentes e assuntos que se transformam rapidamente sem poder mostrar referências e implementações pioneiras durante as aulas. Neste contexto, as aulas conseguem ser muito mais no estilo “por favor, não acreditem em mim – chequem vocês mesmos”, do que “eu presenciei tal coisa e estou contando a vocês – podem confiar”. O “chequem por vocês mesmos” é desafiador, e clama por pesquisa e investigação, desde que o assunto tenha sido introduzido com um grau mínimo necessário
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ARTIGO
O PAPEL DO PROFESSOR NA
para despertar interesse. O “confiem em mim” põe um ponto final nas investigações. Independentemente do ritmo de adoção das tecnologias, os indivíduos estão experimentando uma exposição crescente a elas em suas vidas particulares e virão cada vez mais com essas expectativas para a sala de aula. O BYOD - Bring Your Own Device (Traga seu próprio equipamento) já é um fenômeno mundial. Portanto, é necessário estar preparado e motivado para tanto. Segundo Paulo Freire, “o desenvolvimento de uma consciência crítica que permite ao homem transformar a realidade se faz cada vez mais urgente”. Acredito que fornecendo um ambiente desafiador e criador para os alunos no estilo “chequem vocês mesmos” os professores abrem caminhos e possibilidades para o desenvolvimento. Entramos no século XXI ainda com um modelo predominante de professor focado em conteúdo e currículo, num processo engessado e estático. No entanto, este papel deve ser dinâmico e de superação constante, e portanto precisa se modificar. Acredito que as tecnologias de informação e comunicação atuais provocam uma velocidade vertiginosa de superação constante do saber e devemos buscar novos caminhos de abertura e fluência do conhecimento para encontrarmos pontos de equilíbrio dinâmicos, tanto para alunos como para professores. Poderíamos então aqui definir dois tipos de professores coexistentes na atualidade – o professor-conteúdo (focado em informação), e o professor-interface, focado na mediação, formação. O modelo de professor-conteúdo não se sustenta mais neste novo cenário, onde o conteúdo disponível é praticamente ilimitado, mas o professor não. As interfaces por sua vez são limitadas, mas nos proporcionam acesso ao conteúdo ilimitado. Portanto, sugere-se aqui que um professor-interface na era digital seja mais apropriado que um professor-informação.
O modelo professor-conteúdo esgota as possibilidades dos alunos no conhecimento do próprio professor, e no melhor dos casos, nas referências adicionais que ele possa passar. Sabemos o quanto era difícil, há alguns anos, ter acesso por conta própria a mais do que isso. E pronto. Assim era também a sociedade, a estrutura organizacional das empresas, a distribuição do saber. A própria internet e tecnologias de comunicação apresentavam inicialmente um modelo de navegação linear, estática, focando em um conteúdo “tamanho-único”. No entanto, a internet mudou, e continua mudando para um modelo mais complexo e dinâmico na tentativa de acompanhar as necessidades sociais em transformação. Assim também se sugere aqui que deva mudar o papel do professor: de professorconteúdo/tamanho-único para professor-interface/flexível. O professor-conteúdo nunca conseguirá esgotar o potencial da disciplina. O professor-interface também não - o conteúdo hoje é praticamente inesgotável. A diferença, no entanto, está no fato que o professor-conteúdo tende a esgotar a disciplina em si próprio, em suas limitações. E o professor-interface tende a iniciar o conteúdo em si, abrindo a partir de si os possíveis hiperlinks para o mundo ilimitado, não deixando que suas limitações bloqueiem o aluno. O professorconteúdo funciona como uma janela pré-programada pela qual os alunos vêem o mundo limitado. O professor-interface funciona como uma porta, que apesar de estar fixa e limitada no mesmo lugar, abre-se aos alunos para que a atravessem e atinjam o mundo sem limitações. Ser interface, no entanto, não é fácil, nem para professores, nem para computadores. Fornecer a informação certa, na hora certa, e do modo certo, é difícil até mesmo com toda a tecnologia atual. O desafio de ser interface, para
professores ou computadores, é que a interface não tem sentido em si própria – ela é completamente dependente do usuário e do conteúdo que ele acessa-, e ela é tanto melhor quanto mais transparente for, ou seja, quanto mais sinergia conseguir gerar entre os sistemas interfaceados, sem se interpor a eles. No caso do computador, o homem e o sistema/conteúdo; no caso do professor, o aluno e a disciplina/ conteúdo. No entanto, para atingir esse grau de transparência e mínima resistência ao uso, a interface deve ter diversas características, e elas se aplicam também ao professor-interface: adaptabilidade ao usuário, ao contexto, ao ambiente; dinamicidade para se modificar automaticamente em função dos parâmetros de adaptabilidade; disponibilidade; transparência; usabilidade; entre outras. A busca da interface perfeita é a busca da liberdade em si. Por trás do interfaceamento está uma mudança no pólo do poder – tanto na internet, quanto na sociedade, e por conseqüência, também na sala de aula. Na sociedade, o poder tem passado do lado dos geradores e distribuidores de conteúdo (era da informação) para o lado da interface que faz a mediação da informação e permite a escolha para o usuário (era digital). Isso sugere que na sala de aula ocorra o mesmo, que o poder passe de um professorconteúdo para um professor-interface. Desprezar essa mudança de polo de poder talvez seja desprezar os sinais para o caminho de um sistema de ensino equilibrado e adequado na nova estrutura sócio-tecnológica que se impõe. Sabemos que muito temos ainda que aprender e fazer, e que os desafios são grandes. Mas avanços tecnológicos e mudanças sociais são irreversíveis, não podem ser negligenciados, e no final das contas, todos fazemos parte deles.
Martha Gabriel, mestre doutora em artes e especialista em marketing digital.
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ESPECIAL
DE QUEM É A REsPONSABILIDADE PELA
TRANSFERÊNCIA DO APRENDIZADO? EMBORA A APLICAÇÃO DO CONHECIMENTO SEJA FATOR DETERMINANTE DE SUCESSO PARA A EDUCAÇÃO CORPORATIVA, ESTUDOS APONTAM QUE MENOS DE 20% DAS INICIATIVAS DE DESENVOLVIMENTO LEVAM A MELHORIAS DE PERFORMANCE. A AUSÊNCIA DE UM PLANO REAL, COM ESTRUTURA DE APOIO E ATRIBUIÇÃO DE RESPONSABILIDADES, PODE SER A RAZÃO DA INEFICIÊNCIA, MAS TAMBÉM A GRANDE OPORTUNIDADE DE ALAVANCAR OS RESULTADOS. CONFIRA, NESTE ESPECIAL, MATÉRIAS QUE ABRANGEM O PAPEL DE CADA UM DOS ATORES NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM E AS FERRAMENTAS PARA UMA ABORDAGEM MAIS EFETIVA PARA O NEGÓCIO.
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ANDREW JEFFERSON, CEO DA THE 6Ds COMPANY E AUTOR DE DOIS LIVROS FALA DA IMPORTÂNCIA DA TRANSFERÊNCIA DO APRENDIZADO para alcançar melhores resultados de negócio E DE UMA ATUAÇÃO MAIS ESTRATÉGICA DO RH Vanessa Borelli
om um histórico profissional que mistura e equilibra um profundo conhecimento de negócios a uma dedicação de 15 anos na área de Treinamento e Desenvolvimento, Andrew Jefferson acredita que a aprendizagem é a principal vantagem competitiva da atualidade. Por isso, seu foco é auxiliar as organizações a maximizar o valor de seus investimentos em capital humano. Andrew esteve no LAB SSJ, no final de 2012, para um café da manhã e bate-papo exclusivo com clientes. Segundo ele, o principal objetivo de qualquer programa de treinamento é alcançar melhores resultados para o negócio. Historicamente a área de T&D trabalha com a ideia de que precisa melhorar os resultados
LABORATÓRIO | DOIS
Giselle Stazauskas
APRENDIZAGEM DE RESULTADOS
da aprendizagem. Mas, na realidade, os programas de desenvolvimento não são elaborados para que as pessoas aprendam e sim para que façam algo diferente. Em entrevista para a LABORATÓRIO, ele afirma que a transferência do aprendizado é a grande oportunidade para que as iniciativas de T&D resultem em um melhor desempenho no trabalho. //Você afirma que a transferência é o elo mais frágil nas iniciativas de educação corporativa. Você pode explicar o que isso significa? Andrew Jefferson Trabalho com foco na transferência há mais de uma década e o primeiro projeto que desenvolvemos avaliou o impacto do principal programa de desenvolvimento de uma empresa qu í m ica. A proximad am e n t e 6 00 g e r e n t e s participaram deste processo ao longo de um ano. As avaliações dos cursos eram excelentes e o programa havia recebido um prêmio da ASTD – Sociedade Americana de Treinamento e Desenvolvimento. Mesmo assim, os gestores queriam entender o impacto real que ele causava. O que descobrimos foi preocupante: apenas 15% dos participantes foi capaz de dar um exemplo de aplicação do que havia sido aprendido. Eles relataram também que não percebiam nenhuma necessidade específica de apoio, porque não receberam nenhuma exigência para usar o conhecimento adquirido. Depois, perguntamos aos profissionais de T&D: após um programa padrão, que percentual de participantes aplica o que aprendeu bem o bastante e por tempo suficiente para melhorar o seu desempenho? Nossos estudos confirmaram os resultados de outras pesquisas mais antigas que chegaram a dados muito semelhantes, apenas 20% da educação corporativa leva, de fato, a melhorias em performance. Existe uma variedade de razões para estas falhas, mas a principal delas
TREINAMENTO Antiga linha de chegada Final do curso
é que não somos claros sobre a meta que queremos atingir. Os resultados deveriam servir como crucial advertência para todos os que atuam em nossa área. De qualquer forma, melhorar a transferência significa ter maior impacto imediatamente, uma grande oportunidade de alavancar os resultados.
“OS PROGRAMAS DE DESENVOLVIMENTO NÃO SÃO ELABORADOS PARA QUE AS PESSOAS APRENDAM E SIM PARA QUE FAÇAM ALGO DIFERENTE.” //O que pode ser feito para melhorar esses resultados? AJ No Brasil, no Japão, nos Estados Unidos e em qualquer outro lugar do mundo a área de T&D trata a aprendizagem como um evento. Completamente o oposto daquilo que deveria ser, pois a aprendizagem não é algo pontual. Como todos aprendemos a andar de bicicleta? Com muita prática, alguém segurando a bicicleta, correndo do lado para dar apoio e segurança. Agora, imagine se tivéssemos que ensinar alguém a andar de bicicleta com um ótimo instrutor, em uma sala de aula e um belo Power Point. O foco está no evento, mas deveria estar no processo de assimilação das novas habilidades e em melhorar os resultados de negócio. Assim como andar de bicicleta, a área de T&D precisa focar em uma experiência completa de aprendizagem - um processo contínuo que inclui tudo o que acontece antes e depois do curso tradicional. Desenhar uma experiência completa tem a ver com ficar longe da visão instrucional tradicional e começar a pensar sobre todos os elementos que são críticos para garantir que as pessoas venham para os programas motivadas e saiam deles igualmente motivadas para aplicar o conhecimento.
Transferência do aprendizado Aplicação no trabalho
RESULTADOS Nova linha de chegada
Melhora na performance
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“MELHORAR A TRANSFERÊNCIA SIGNIFICA TER MAIOR IMPACTO IMEDIATAMENTE, UMA GRANDE OPORTUNIDADE DE ALAVANCAR OS RESULTADOS.”
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DO APRENDIZADO
COACHING LABORATÓRIO | DOIS
RESP ON S A BI L
AÇÃO OR B LA CO
TRANSFERÊNCIA
O EXÃ FL RE
CO NT EÚ D
LEMBRETES
E AD ID
ESPECIAL | ENTREVISTA
//Quais são os principais elementos para garantir a transferência do aprendizado? AJ O livro chamado “Check list Manifesto: How to Get Things Right”, de Atul Gawande, fala sobre o uso de job aids e de um simples Checklist para a realização de uma cirurgia segura. De acordo com o autor, uma pesquisa detectou que a utilização de um checklist determinou a queda de 30% nas infecções e de 40% nos casos de morte cirúrgica. O apoio à performance pode melhorar o desempenho de pessoas que são incrivelmente treinadas, com ferramentas simples, mas que estão disponíveis exatamente no momento que elas precisam. Por que não tratar a questão dessa forma? O suporte à performance tem a ver com prover job aids, pessoas, processos no pós-treinamento para dar aos colaboradores aquilo que eles precisam para ter sucesso. Por meio de comunidades de prática, coaching, feedback e um ciclo que direciona a transferência, criamos o ambiente propício para a aplicação do conhecimento adquirido.
//Qual a importância de engajar os gestores diretos no processo de aprendizagem? AJ Quando os líderes estão engajados, provendo suporte nas habilidades desenvolvidas, é mais provável que se alcance um impacto tangível no negócio oriundo do treinamento. Em outras palavras, os gestores diretos são o recurso mais importante para que a educação produza resultados. Para envolvê-los, o profissional de T&D precisa fazer com que eles compreendam as vantagens que teriam ao investir tempo e energia oferecendo coaching aos seus colaboradores, além disso, é importante que eles tenham um processo definido para saber como e quando agir. //Pode nos dar um exemplo da importância dos gestores? AJ O Programa de Liderança da Pfizer, indústria farmacêutica multinacional, avaliou a eficácia de seu programa central de desenvolvimento de liderança, porque eles queriam uma análise estatística exata para saber se os líderes estavam ou não mudando os comportamentos que eles precisavam. Foram aplicadas repetidas avaliações 360 graus alguns meses após o curso, as quais foram comparadas com os resultados pré-programa. O estudo solicitou, dentre outras coisas, que os participantes indicassem o quanto seus gestores haviam se envolvido no seu desenvolvimento pós-curso. Os resultados mostraram que o treinamento funcionou desde que os gestores estivessem ativamente envolvidos durante o período pós-curso. Este caso demonstra que os gestores são cruciais no empenho para aplicar o aprendizado e convertê-lo em resultados para o negócio, o que não surpreende, visto que o supervisor direto de uma pessoa pode promover aumentos de salários, promoções e avanços de carreira.
Giselle Stazauskas
“O PROFISSIONAL DE T&D PRECISA FAZER COM QUE OS LÍDERES COMPREENDAM AS VANTAGENS QUE TERIAM AO INVESTIR TEMPO E ENERGIA OFERECENDO COACHING AOS SEUS COLABORADORES.” //O que você apontaria como mais importante para uma atuação mais efetiva e estratégica do profissional de RH? AJ A verdadeira medida de sucesso é o impacto em termos de melhor desempenho no trabalho. Neste sentido, um passo muito importante e indispensável é definir os resultados de negócio que se pretende alcançar com os programas de educação e desenvolvimento. Esse processo precisa ser feito junto com a liderança, o que muitas vezes não é simples. Profissionais de T&D precisam se engajar em um processo de descoberta para chegar ao ponto de que esta questão esteja clara.
As metas de desenvolvimento são levadas a sério na organização? Prevalece uma cultura de execução ou uma cultura de indiferença? Seus colaboradores estão cientes das metas de negócio dos programas que participam? Tudo isso deve ser levado em consideração pelas áreas de T&D e a gestão do negócio, corresponsáveis pelo sucesso ou fracasso do treinamento. Na falta de metas relevantes, perdemos a oportunidade de garantir reconhecimento e, principalmente, recursos.
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ESPECIAL | REPORTAGEM
NA PRÁTICA GLOBOSAT, MONDELEZ E PROMON VÃO DO COMEÇO AO FIM – ESTRUTURAM PROCESSOS DE DESENVOLVIMENTO EM QUE A TRANSFERÊNCIA DE APRENDIZADO TEM PAPEL FUNDAMENTAL Alexandre Carvalho dos Santos
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Mas não é para todo mundo. Muitos programas de educação corporativa ainda são elaborados para terminar no dia em que o instrutor agradece a participação de todos, os aprendizes aplaudem, e cada profissional se levanta e deixa o ambiente escolhido para a capacitação – levando o material didático com aquela sensação de “talvez, um dia, isso me sirva”. Neste caso, além de cadeiras e lousas, o que fica para trás é o próprio conhecimento adquirido. Para que a informação se torne uma prática do dia a dia, o desenvolvimento tem de existir como uma experiência completa de aprendizagem: um processo contínuo, que começa bem antes do momento da instrução formal – e se estende para além do tchau aos colegas de treinamento. Essa experiência plena passa por quatro fases distintas: preparação, aprendizado, transferência e realização. Prestou atenção no terceiro item dessa sequência? Ele merece um olhar especial. A transferência é um momento-chave desse processo, quando há a aplicação dos conhecimentos adquiridos, fazendo com que a educação corporativa efetivamente leve a um aprimoramento de comportamento e performance. Exatamente o objetivo pelo qual sua empresa tanto investiu em programas de desenvolvimento. Uma transferência de aprendizado bem construída implica estrutura de apoio, participação dos gestores e atribuição de responsabilidades aos aprendizes. Se a maioria das empresas ainda não agrega esses fatores a seus processos, a boa notícia é que a consciência dessa importância tem crescido no universo corporativo. Prova disso são as três organizações que ouvimos nesta reportagem: Globosat, Mondelez Brasil e Promon. Para elas, a aprendizagem é um componente do dia a dia, não de um período determinado. E a aplicação do conhecimento fator estratégico, sem o qual a capacitação faz pouco sentido.
Antônio Barros Jr.
A
aprendizagem como um processo – não como um objetivo plenamente realizado e concluído na sala de aula. Isso é claro para você?
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Primeira programadora de TV por assinatura a atuar no Brasil, a Globosat tem necessidades bem específicas de capacitação, já que lida com uma atividade relativamente nova no país. Por isso, a empresa busca profissionais que possa formar internamente. “Temos um número considerável de estagiários que são muito aproveitados aqui, porque é onde formamos nossa massa crítica: profissionais que vão entender o nosso negócio, terão know-how
em novas mídias e conteúdos específicos de televisão”, explica Fabile Migon, gerente de RH. Segundo ela, as duas prioridades da área de desenvolvimento envolvem consolidar as lideranças e capacitar os jovens talentos da empresa. E esses dois objetivos estão muito ligados na Globosat. Na Academia de Liderança, programa desenvolvido com o LAB SSJ, os gestores têm discussões sobre como lidar com a transferência de aprendizado Antônio Barros Jr.
ESPECIAL | reportagem
IBOPE EM ALTA de suas equipes – o que cada um precisa para transformar conhecimento em prática. “De nada adianta eu elaborar o programa de capacitação mais eficaz do mundo, se isso não tiver conexão direta com o que acontece lá na mesa de trabalho do profissional”, afirma Fabile. Na Globosat, o processo de aprendizagem começa bem antes da instrução formal. Quando os participantes são preparados e têm um primeiro contato com os objetivos do treinamento, a companhia utiliza estúdios para gravações que circulam em uma TV interna, com os gestores falando sobre as metas dos projetos de desenvolvimento e estimulando a participação de todos. "Cada vez mais, o RH acredita que esse marketing é importante para que as pessoas se sintam engajadas e percebam o sentido de estar ali", aponta a gerente da Globosat.
"Hoje, há uma consciência de que treinamento é um tema de gestão, e que o RH é um facilitador. Quem tem de comunicar, motivar e cobrar são os gestores da empresa." Fabile Migon, da Globosat
NA TROCA COM O MENTOR Na Promon Engenharia, a transferência do aprendizado é utilizada para disseminar a cultura da empresa, o que acontece ao longo do Programa de Mentoração – projeto que já existe há muitos anos e passou por uma reformulação entre 2009 e 2010, contando com o apoio do LAB SSJ. É o que explica Roberta Bonamigo, coordenadora de T&D: “Procuramos reunir os seniores da empresa que tinham uma vivência a ser dividida com os mais jovens. Esse mentor acabou descobrindo
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no treinamento a importância da transferência de aprendizado dos seus mentorados e como estimular para que isso aconteça de fato”, revela. Os mentorados também são capacitados, para que saibam seu papel na organização – é quando a empresa lhes atribui responsabilidades, fator extremamente importante para que a transferência se dê em sua plenitude. Mas dá para saber ao certo se o conhecimento está sendo aplicado? A Promon faz dois tipos de avaliação.
Uma é mais qualitativa e acontece nas Praças de Aprendizagem, entre conversas com os mentores sobre a performance de seus mentorados. A outra é mais formal: uma pesquisa anual em que mentores e mentorados respondem sobre suas dificuldades e possibilidades.
Antônio Barros Jr.
"Todos os programas comportamentais, principalmente os mais robustos, como o de mentoração, contam com a análise e o apoio da diretoria de gestão do conhecimento." Roberta Bonamigo, da Promon
Antônio Barros Jr.
É ESTRATÉGICO Também na Mondelez International – nova denominação da divisão global de snacks, chocolates, bebidas em pó e doces da Kraft Foods – há a consciência de que a continuidade da aprendizagem é vital para a melhoria do desempenho. Exemplo disso é seu programa de trainees, que começou no início do ano. Ele se baseia na metodologia 70/20/10, em que 70% da aprendizagem vêm das práticas do dia a dia, 20% vêm da troca de experiências (feedback, coaching e mentoring) e só 10% vêm da instrução formal. Resta dúvida sobre a importância da transferência? “Quando desenhamos o programa, já levamos em consideração que todas as ações e estímulos deveriam possibilitar a transferênciade aprendizado”, aponta Andrea Chung, coordenadora da área de HR – Talent & Organization Effectiveness.
"No ano passado, treinamos mais de 9 mil colegas sobre conceitos relacionados à estratégia da organização. Se fosse só uma iniciativa do RH, isso jamais teria tanto alcance. Havia uma ligação direta com o presidente, para se ter uma ideia." Andrea Chung, da Mondelez
Ela acrescenta que há um acompanhamento da empresa sobre a transferência. Três meses após os treinamentos presenciais, tanto o trainee quanto seu gestor recebem perguntas sobre como o conhecimento adquirido tem sido colocado em prática, se ainda existem gaps e como o gestor pode contribuir para que a transferência seja aperfeiçoada. E, no job rotation, há uma avaliação feita pelo gestor sobre a entrega do trainee durante esse período. “Essa avaliação vai além da aplicação de conhecimento na prática, estendendo-se à forma como o jovem talento absorveu a cultura da empresa, se já está com o nível de maturidade pretendido e se tem um bom relacionamento com as pessoas”, esclarece a executiva. No entanto, nada é forçado. Andrea faz questão de enfatizar que a Mondelez é uma empresa que valoriza a diversidade – e por isso entende que cada um tem uma forma de aprender e também de aplicar conhecimento. “Não há uma receita de bolo que sirva para todos. Cada um absorve conhecimento de uma maneira diferente, reagindo a estímulos diferentes, e isso tem consequência na maneira como essa pessoa vai aplicar a informação que recebeu na capacitação”. 22 | 23
ESPECIAL | MATÉRIA
DEPENDE DELE Thinkstock
N LABORATÓRIO | DOIS
POR MAIS MOTIVADO QUE SEJA O COLABORADOR, A TRANSFERÊNCIA DE APRENDIZADO RARAMENTE SE PROVA EFICAZ SEM O APOIO FUNDAMENTAL DE SEU GESTOR – ANTES, DURANTE E DEPOIS DO TREINAMENTO Alexandre Carvalho dos Santos e Vanessa Borelli
ão é difícil entender por que o gestor tem importância vital na transferência de aprendizado do colaborador que passa por um programa de desenvolvimento. Ele é a primeira referência na negociação de um aumento de salário, nos avanços de carreira e nos estímulos do dia a dia – além de ser um modelo de atuação no qual o profissional pode se espelhar. Quando você pensa no ambiente de trabalho, a figura do “chefe” é das primeiras a surgir na mente – seja para o bem ou para o mal. A maior parte da motivação e da satisfação passa por esse filtro.
E há outro fator a justificar o papel central dele nesse processo: o líder tem (ou deveria ter) interesse direto nisso, pois é dos primeiros a ter benefícios quando a eficácia da equipe aumenta. Afinal, o gestor de um time de alta performance é sempre bem visto e valorizado dentro da organização. Olhando assim, é até um paradoxo que a realidade não reflita essas necessidades e oportunidades. A atuação do líder na concretização da transferência ocorre, de maneira geral, num nível muito inferior à sua importância – e quando ocorre. A participação deve começar
ainda antes do programa de desenvolvimento. É quando a equipe precisa do estímulo de seu líder, que deve explicar as razões desse treinamento, como ele vai contribuir para a carreira do colaborador e quais as expectativas da empresa com os resultados advindos daí. Esse envolvimento se estende ao longo do programa, com acompanhamento, e também depois do término. É exatamente no pós-treinamento que começa a fase de transferência de aprendizado, na qual o apoio do líder é fundamental. É aí que ele deve conferir a prática de fato das novas habilidades, avaliar os indicadores de performance, atuar como coach junto ao colaborador, valorizar – e recompensar – a aplicação do conhecimento e também dar feedback aos responsáveis pelo programa de desenvolvimento, apontando até que ponto a teoria virou realidade concreta e eficaz. Só que é sempre assim? Infelizmente, não. Primeiro porque nem todo gestor aceita bem a ideia de ter uma nova responsabilidade.
Desculpas como “não me sobra tempo para fazer coaching” são comuns – e revelam como esse envolvimento não é prioridade para a maioria dos chefes. Comportamentos negativos em relação à transferência de aprendizado de seus colaboradores incluem: • Relutância em liberar o colaborador para fazer o treinamento – o gestor considera que está perdendo mão de obra para uma atividade que não vai dar em nada. • Intervenção durante a participação do colaborador na capacitação – às vezes, até tirando o profissional da sala de aula “por um motivo mais importante”. • Impaciência para que o colaborador volte logo ao trabalho. • Insistência nas práticas de sempre, evitando que o profissional aplique seus novos conhecimentos. • Falta de noção quanto ao seu papel no reforço das novas habilidades da equipe.
• Acreditar que há valor nesse apoio. • Sentir-se confiante de que consegue fazê-lo. • Entender o programa de capacitação e por que seus liderados estão participando. • Ter responsabilidade efetiva pelo apoio a ser dado – componente previsto na descrição de seu cargo.
Fé no resultado
GESTOR
TRANSFERÊNCIA DO APRENDIZADO
APRENDIZ
Mas dá para reverter esses comportamentos negativos? É quando vem a boa notícia. Segundo o livro "6Ds – As Seis Disciplinas que Transformam Educação em Resultados para o Negócio", de Calhoun Wick, Roy Pollock e Andrew Jefferson, melhorar o envolvimento do gestor é possível, sim. E existem quatro condições que precisam ser satisfeitas para que ele se sinta motivado a dar apoio na aplicação do aprendizado:
INSTRUTOR
“Por que raios vou perder meu tempo com isso? Tenho muito trabalho a fazer, treinamento é função do RH”. É bem possível que você já tenha ouvido uma frase parecida saindo da boca de algum gestor, quando se fala sobre o papel dele no estímulo e apoio à capacitação de sua equipe. Se ele pensa assim, é porque ainda não foi convencido de que há valor na transferência de aprendizado – e que ele também vai ganhar com isso. Uma boa opção é apresentar ao gestor pesquisas e cases de mercado que comprovem o aumento da eficácia em equipes que passam a aplicar na prática o conhecimento adquirido nos programas de capacitação. Vale também conscientizar a alta gestão sobre essa importância. E mostrar que o investimento em treinamento pode se tornar um desperdício caso não venha acompanhado pela transferência de aprendizado apoiada por cada gestor. Se a diretoria comprar a ideia, fica muito mais fácil ter uma resposta positiva dos demais líderes.
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ESPECIAL | MATÉRIA
Saber que pode
Mas será que o gestor está preparado para dar apoio ao treinamento de seus liderados? Será que sente segurança quanto a essa responsabilidade? A insegurança pode ser o motivo por trás da falta de envolvimento. O líder precisa saber que tem as habilidades necessárias para o coaching, deve entender muito bem o que foi exposto no programa e ter uma linha de atuação definida para essa prestação de apoio. É improvável que o gestor se comunique com a área de T&D pedindo orientação sobre isso; mas, se o caminho for o inverso, há uma grande chance do líder aproveitar as informações de como maximizar a transferência. Empresas que já são conscientes sobre a importância da aplicação do conhecimento (leia sobre cases em reportagem desta edição) incluem treinamento sobre coaching e mentoring em seus programas para líderes. Esse tipo de capacitação tem foco em como o gestor pode e deve usar sua influência para garantir a transferência e prolongar o aprendizado.
Conhecer o programa
Para que o envolvimento do gestor com a transferência seja pleno, é imprescindível que ele conheça bem a estrutura e as metas do programa de capacitação. O ideal mesmo seria que o líder até participasse do treinamento antes de seus liderados – ou junto com eles –, mas isso quase sempre se mostra inviável nas empresas, devido às demais responsabilidades do chefe. O que fazer, então? Munir o gestor de todas as informações possíveis assim que seu liderado for inscrito em um treinamento: o tema, a duração do curso, os tópicos abordados e, claro, os resultados esperados. Para que o líder possa conferir se as metas estão sendo transformadas em realidade com a aplicação na prática do que foi transmitido no programa. E tenha todas as ferramentas para apoiar essa transferência e cobrar resultados.
Assumir a responsabilidade
Isso é fundamental. Em primeiríssimo lugar, a empresa deve comunicar de forma clara que tem expectativas em relação ao papel de cada gestor como coach de seus liderados. O que isso significa? Que o líder vai saber que coaching e feedback fazem parte de suas responsabilidades. Não são tarefas opcionais. A empresa pode expressar formalmente essas expectativas incorporando-as à descrição das funções e competências do gestor, à sua análise de desempenho e a outros documentos administrativos. Se o gestor preencher esses requisitos, a consequência direta é ter um líder engajado na transferência de aprendizado de sua equipe – alguém realmente participante do processo, não apenas um expectador VIP de uma evolução atribuída ao RH. Gestores conscientes de suas responsabilidades – e dos benefícios que terão com os novos conhecimentos sendo postos em prática – são aliados estratégicos, executivos que a organização precisa ter ao lado em sua contínua implementação de uma cultura da aprendizagem nos mais diversos níveis. Vale muito a pena que esse fato seja uma evidência aos olhos de todos. LABORATÓRIO | DOIS
O sim e o não
do envolvimento do gestor Confira o que o líder deve e não deve fazer em sua atuação e apoio na transferência de aprendizado dos colaboradores.
Ele deve...
• Antes do curso, falar da oportunidade ao liderado e estimular sua participação. • Conhecer os materiais didáticos, o cronograma do programa e os objetivos da aprendizagem. • Durante o programa de desenvolvimento, informar-se com os instrutores sobre como está sendo a participação do liderado e sobre possíveis atividades de reforço pós-treinamento. • Dar tempo ao liderado para que se encontre com instrutores, outros participantes e mentores – todos os que possam contribuir com a absorção e a transferência do aprendizado. • Após o término do programa, reunir-se com o liderado para falar sobre como foi a experiência e sobre expectativas de melhora da performance via aplicação na prática do conhecimento obtido. • Passar tarefas ao liderado que incluam usar as novas habilidades obtidas com o treinamento. • Encorajar o liderado nessa transferência do aprendizado. • Recompensá-lo pela aplicação prática do conhecimento.
Ele NÃO deve...
• Demonstrar relutância em liberar o profissional para o programa. • Interromper o programa, consultando o aprendiz sobre questões do dia a dia. • Retirar o aprendiz da sala de aula, por precisar dele “para coisas mais importantes”. • Mostrar indiferença quanto ao programa de desenvolvimento. • Desvincular o conteúdo aprendido da prática, com frases do tipo “aquilo que você aprendeu só funciona na teoria”.
REFERÊNCIAS: POLLOCK, R.; WICK, C. W. & JEFFERSON, A. 6Ds: As seis disciplinas que transformam educação em resultados para o negócio. Évora, 2011. DENNIS E. COATES. Enhance the Transfer of Training. ASTD Press, Issue 0710, 2007.
Falta uma “nova competência gerencial” *Por Helio Gianotti Programas de aprendizagem e desenvolvimento criam valor somente quando os novos conhecimentos e competências que eles transmitem são transferidos para fora do ambiente de aprendizagem e colocados em prática. E isso depende muito do apoio genuíno do gestor. Em relação a esse ponto, dois problemas ficam no caminho de uma transferência eficaz. O primeiro é a falta de responsabilidade compartilhada, po i s o gestor acred i t a q u e treinamento é responsabilidade do RH ou do departamento de treinamento. O segundo problema é a falta de sistemas e processos que possam ser aplicados com eficácia em programas de educação corporativa. De modo geral, os gestores não apoiam a transferência de aprendizado porque estão “ocupados demais” com seus próprios objetivos, com prioridades conflitantes. Não oferecem as ferramentas para a implementação nem acompanham as mudanças
sugeridas pelos treinamentos. Não reconhecem nem recompensam as mudanças obtidas pelos colaboradores após o treinamento. Outro problema: muitas vezes, o gestor escolhe o colaborador errado para o treinamento – alguém desmotivado, com baixa expectativa, resultados ruins, sem metas claras e com um potencial incapaz de resultar em melhorias. Essa pessoa ainda pode contaminar negativamente colegas que participarão de treinamentos futuros. Há ainda a questão do gestor que envia seus colaboradores para treinamentos pasteurizados, s ome n t e com a in t en ç ã o de cumprir com sua responsabilidade de desenvolver pessoas. Nesse caso, ele não se preocupa com o conteúdo do programa, como o conhecimento vai melhorar o ambiente de trabalho, de que forma vai modificar o comportamento do seu colaborador e quais resultados serão otimizados. Veja a quantidade de pessoas
indicadas para cursos genéricos de negociação. O que elas realmente aprendem e vão aplicar no seu trabalho diário? A garantia de melhoria individual é duvidosa, pois precisamos ter, cada vez mais, treinamentos voltados para necessidades específicas de cada negócio. Há muitos exemplos de falta de apoio do gestor na transferência de aprendizado, mas espero que possamos criar uma nova competência gerencial que exija um profundo conhecimento do gestor, seja para a identificação dos resultados de negócios, no desenho de uma experiência conjunta ou no direcionamento da aplicação da aprendizagem. Tais ações garantem uma melhoria contínua e uma gestão eficaz do conhecimento. *Helio Gianotti, head of sales training da Novartis América e Canadá.
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Professor emérito da University of Wisconsin, presidente honorário da Kirkpatrick Partners e ex-presidente da ASTD (American Society for Training and Development). Divulgação
ESPECIAL | RAIO-X
DONALD KIRKPATRICK
LABORATÓRIO | DOIS
Giselle Stazauskas
ÁREAS DE ESTUDO Avaliação de treinamentos, coaching, comunicação, gestão do tempo, gestão da mudança, construção de times e liderança. É REFERÊNCIA ... ... pela criação, na década de 50, de um modelo altamente influente para a avaliação de treinamentos. OBRAS É autor dos livros "Evaluating Training Programs: The Four Levels" - já em sua terceira edição e que se tornou a base para a avaliação de programas em todo o mundo; "Transferring Learning to Behavior; Improving Employee Performance Through Appraisal and Coaching"; "How to Conduct Productive Meetings"; e "Managing Change Effectively", entre outros. Em português, há as traduções "Como Implementar os Quatro Níveis de Avaliação de Treinamento de Equipes" e "Como Avaliar Programas de Treinamento de Equipes", ambas publicadas pela Editora Senac RJ, em 2010. ELE DISSE “Precisamos avaliar a reação dos participantes de um programa da mesma maneira que analisamos a satisfação dos clientes. Para que o treinamento seja realmente efetivo, é importante que os participantes reajam favoravelmente.” DESTAQUE Seu modelo possui quatro níveis de avaliação de treinamento, que devem ser aplicados em sequência, como forma eficaz de avaliação dos resultados. A cada passagem, o processo fica mais complexo e demanda mais tempo, porém resulta na obtenção de informações precisas e valiosas.
Nível 1 - Reação Aborda o que os participantes pensaram e sentiram sobre o treinamento. Uma reação positiva é importante para assegurar a continuidade do programa e auxiliar no aprendizado e motivação dos participantes - insatisfação reduz as possibilidades de aprender.
Nível 2 – Aprendizagem Para Kirkpatrick, a aprendizagem pode ser medida pela alteração na forma de perceber a realidade, pelo aumento de conhecimentos e/ou pela melhoria de habilidades.
Nível 3 – Comportamento Envolve a transferência de conhecimento, habilidades e/ou atitudes da sala de aula para o ambiente de trabalho. Essa observação se dá de três a seis meses após o treinamento. Para que uma mudança de comportamento aconteça, há quatro condições. É necessário que a pessoa: • queira mudar; • saiba o quê e como mudar; • trabalhe num ambiente com o clima apropriado; • seja premiada pela mudança.
Nível 4 – Resultados Englobam redução de custos, acidentes e/ou rotatividade; aumento de vendas, produção, lucro e/ou retorno do investimento.
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ESPECIAL | ARTIGO
O papel do aprendiz A questão da transferência do aprendizado do ponto de vista do indivíduo Conrado Schlochauer
Quinta-feira de manhã, Lúcia chegou no escritório. Era o primeiro dia da semana que ela aparecia, após ter participado de um workshop de liderança. O treinamento tinha sido excelente. Conteúdo atual, dinâmicas relevantes, bons debriefings. A última tarde foi dedicada ao desenho de um plano de ação com as principais mudanças a serem incorporadas ao seu comportamento e assim melhorar a peformance como gestora. Ao sentar na mesa, percebeu que, ao longo dos próximos dias, a sua vida não seria mais sua. Seu tempo estava consumido por reuniões reajustadas na sua semana curta e pelas dezenas de e-mails acumulados nos últimos dias - embora os mais importantes já tivessem sido respondidos no seu celular, embaixo da mesa do treinamento. Esse ambiente se juntou a uma semana cheia, pela visita de um VP da matriz. A próxima foi curta, por causa de um feriado. Na seguinte, Lúcia acha que o pessoal do treinamento mandou um e-mail com um artigo em PDF, mas apagou sem querer. Seu gestor nunca fez qualquer pergunta sobre o treinamento ou como as mudanças de comportamento poderiam ajudar na performance da área. LABORATÓRIO | DOIS
Antônio Barros Jr.
Um mês depois do treinamento, o plano de ação já é uma das páginas de um caderno que atualmente está sendo utilizado para as reuniões de dia a dia. Transferência? Que transferência?” Essa história fictícia provavelmente é semelhante ao que ocorre com grande parte dos treinamentos. Todos os profissionais de aprendizagem corporativa a quem apresentei o conceito de transferência o consideram perfeito, coerente, óbvio. Mas o fato é que ele ocorre com baixa frequência. De acordo com a consultoria The 6Ds Company, 84% dos programas geram “sucata de aprendizagem” (learning scrap), que é a estimativa das pessoas que não têm qualquer aumento de performance após um treinamento. Os demais artigos dessa edição da LABORATÓRIO apresentam diversas soluções, do ponto de vista da empresa. Sabemos que a percepção organizacional do impacto da transferência no resultado é relevante; que o ambiente de transferência é influenciado por inúmeras variáveis, e que o gestor é a peça mais fundamental dessa equação.
Mas e do ponto de vista do indivíduo? O que fazer para aumentar a chance da transferência ocorrer? Acredito que parte desta resposta esteja em três aspectos: conhecimento do processo, responsabilização e motivação. Em relação ao conhecimento do processo, estou me referindo ao básico: o participante precisa entender o seu papel na aplicação do que foi aprendido, o que deve ser feito e o impacto esperado. O segundo ponto está vinculado à responsabilização (ou accountability). Visto que a etapa de transferência é parte integrante do programa de desenvolvimento, ela é obrigatória para quem faz parte do grupo de participantes. Da mesma maneira que não se espera que alguém convidado para um treinamento falte, não é aceitável que a ação de transferência seja ignorada. O apoio é essencial nesse processo, por isso, tanto gestor como área responsável pela aprendizagem corporativa devem acompanhar, apoiar, oferecer feedback e reconhecer o ganho de performance de cada participante. O aumento do controle nessa etapa aumentará um pouco a complexidade do programa, mas o investimento com certeza gerará impacto significativo na redução da sucata de aprendizagem. 30 | 31
LABORATÓRIO | DOIS
Id en tifi ca çã o
In te gr aç ão hi Sín da erá te s rq se m ui et ca as
Sem intencionalidade
Lócus de causalidade percebido
Impessoal
Interesse
Prazer
Satisfação inerente
Externo
Quando o participante se sente como corresponsável pelo processo de aprendizagem (o que os autores chamam na tabela de lócus de causalidade interno), ele atua com a mesma intensidade que teria aprendendo por vontade própria. Finalmente, o principal obstáculo para a realização de uma boa ação de transferência do aprendizado é o tempo. Pozo (2005) lembra que o esforço para a aprendizagem neste século repleto de alternativas de ocupacão do tempo, não é fazer com que indivíduos se movam, mas sim que se movam para atividades vinculadas à aprendizagem e ao desenvolvimento, mudando prioridades existentes. O dia a dia de trabalho está re p l e to d e o p o r t u n id a d es de aprendizagem. Cabe a nós, responsáveis pela aprendizagem corporativa, aproveitá-las.
Um pouco externo
Um pouco interno
Interno
Interno
REFERÊNCIAS BANDURA, A. (1997). Self-efficacy: the exercise of control. New York, WH Freemanand Company. DECI, E. L.; RYAN, R. M. (1985). Intrinsic motivation and selfdetermination in human behavior. New York, Plenum. MERRIAM, S.; CAFFARELLA, R.; BAUMGARTNER, L. (2007). Learning in adulthood - a comprehensive guide. 3rd ed. San Francisco, Jossey-Bass. POZO, J. (2002). Aprendizes e Mestres: a nova cultura da aprendizagem. Porto Alegre, Artmed.
Fonte: Ryan e Deci (2000)
Não relevante
Motivação intrínseca
C on gr uê nc ia
Processos associados
Va c lo da on riz at scie açã iv n o id te ad e
Baixa competência percebida
A u da to-e s nd m o et ss as o
Amotivação
In tr oj eç ão
Motivação extrínseca
ap Foc pr ro o n de óp vaç a ou ria o ão tro u s
Estilos regulatórios
Re ex gula te çã rn o a
O aspecto final, e talvez o mais importante, é o da motivação. Como a etapa de transferência requer mais independência, é nela que o aprendiz adulto deverá atuar de maneira mais autodirigida. As teorias mais recentes de aprendizagem de adultos demonstram que a maioria do aprendizado adulto é autodirigido. Fora do ambiente corporativo, quando buscamos aprender algo - cozinhar um prato novo, pesquisar sobre um país que vamos viajar, aprender um idioma - o fazemos por iniciativa própria porque temos algo maior para realizar. Algumas pessoas se apressariam em dizer que isso ocorre porque, fora do ambiente corporativo, a motivação é intrínseca e que isso é muito difícil de ocorrer dentro da empresa. Entretanto, como lembra Pozo (2002), a vontade de aprender é algo da espécie humana, da nossa evolução. Não precisamos pedir para que um bebê saudável aprenda a andar e falar. Portanto, se o programa tiver sentido para o participante e ele perceber que a performance que está sendo aumentada é relevante, é esperado que ele se motive intrinsecamente pela realização da ação de transferência. Além disso, de acordo com Deci e Ryan (1985), dois dos principais pesquisadores na área, a motivação extrínseca não é única. Eles descrevem, na chamada Teoria da Autodeterminação, um processo de internalização da motivação, como apresentado na tabela ao lado.
Re ou co ex p mp tr un en ín iç sa se ã s ca o s En vo l v do im eg en o to
Muitos já devem ter escutado a seguinte frase: “nem adianta mandar pós-trabalho para eles porque ninguém lê, vai morrer no e-mail deles”. Existem alguns pontos nessa frase que merecem ser comentados. Em primeiro lugar, chamar de pré-trabalho. Ao utilizarmos essa nomenclatura, estamos reforçando o paradigma do treinamento como um evento. O que parece mais importante: o pré-trabalho, o pós-trabalho ou o trabalho (treinamento) propriamente dito?
O segundo ponto é que, na maioria dos casos, as ações pós-treinamento estão relacionadas a leituras. Artigos e livros são excelentes para aprofundar conceitos e aumentar o repertório dos participantes, mas não ajudam os participantes a praticar o conhecimento adquirido. O último ponto da frase é o fato do participante receber o “pós-trabalho” por email. Idealmente, a atividade de transferência ocorre totalmente on the job. Se o participante compareceu a um workshop de negociação, ele deveria ser capaz de exercer as habilidades reais em um caso real, que gere impacto para o negócio.
Su bm iss ão
ESPECIAL | ARTIGO
PÓS-TRABALHO, LIÇÃO DE CASA OU TRANSFERÊNCIA?
INFO
Em busca do ambiente propício QUAIS VARIÁVEIS DEVEM SER CONSIDERADAS NA HORA DE AVALIAR O AMBIENTE DE TRANSFERÊNCIA? Vanessa Borelli
A NOVA FUNÇÃO DA EDUCAÇÃO CORPORATIVA
Foram identificadas 40 práticas que definem uma forte cultura de aprendizagem, enquadradas nas seguintes categorias: 1. Construção de confiança 2. Estímulo à reflexão 3. Demonstração do valor da aprendizagem 4. Encorajamento à colaboração de conhecimentos 5. Capacitação dos colaboradores 6. Formalização da aprendizagem como um processo
Principais responsáveis pelas 40 práticas que definem uma forte cultura de aprendizagem
Foca na construção de um ambiente que inclui a aprendizagem informal, colaboração e muitas outras atividades (coaching, mentoring e action learning), propiciando a aprendizagem contínua.
RH e T&D: 18% Alta liderança:20%
Promove a aprendizagem como um processo contínuo Disponibiliza diferentes oportunidades de aprendizagem, permitindo que os colaboradores e gerentes sejam auto dirigidos O treinamento é o “lugar onde ocorre a aprendizagem” Foco nos programas de treinamento, entrega e análise de resultados Aprendizagem como um evento Aprendizagem dirigida pelo treinamento
Gestores: 62%
Le ac Precisamos otimizar isso
Modelo de treinamento tradicional
Aprendizagem de alto impacto
Facilita e viabiliza a aprendizagem
A organização está focada nestas seis ações?
Treinamento formal: 10% Informações de suporte no trabalho: 20% Coaching on the job: 70%
Não somente isto
A
cultura de aprendizagem das empresas afeta consideravelmente a possibilidade de o aprendizado gerar ou não uma melhoria significativa no desempenho. Isso quer dizer que as políticas e sistemas adotados podem encorajar ou frustrar a motivação e o esforço dos aprendizes na aplicação do conhecimento adquirido. Mas, como avaliar a cultura? As metas de desenvolvimento são levadas a sério na organização? A consultoria americana Bersin & Associates pesquisou milhares de empresas para identificar quais as práticas determinantes para um ambiente propício à aprendizagem e, por isso, com maiores chances de produzir melhores resultados para o negócio. Confira os dados da pesquisa.
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Al ép
Ou pa se ou
Ma ac –q do co
"O QUE PÕE O MUNDO EM MOVIMENTO É A INTERAÇÃO DAS DIFERENÇAS, SUAS ATRAÇÕES E REPULSÕES; A VIDA É PLURALIDADE, A MORTE É UNIFORMIDADE." OCTAVIO PAZ, ESCRITOR MEXICANO, PRÊMIO NOBEL DE LITERATURA Maria Carolina Mateus e Alexandre Carvalho dos Santos
O
que você faria se lhe aparecesse pela frente um estrangeiro perdido e sem dinheiro? E se, só para piorar, ele não falasse uma palavra de qualquer idioma que você entendesse? Você o ajudaria ou tentaria passar o problema para outra pessoa? É este o dilema de Roberto (Ricardo Darín), o emburrado dono de uma loja de ferragens no filme argentino "Um Conto Chinês" (2011). Metódico, agressivo e fechado em seu próprio mundo, o comerciante vê sua rotina quebrada quando abriga em sua casa – bem a contragosto – um chinês perdido em Buenos Aires, à procura do tio. A incomunicabilidade aqui vai além das diferenças culturais e sociais dos dois: Jun, o chinês do título, só sabe falar sua língua natal – o que deixa o argentino ainda mais ansioso para se ver livre do hóspede incômodo. Leva-o à embaixada, à polícia e até à comunidade chinesa local, na tentativa de descobrir alguém que conheça o parente de Jun – ou possa ficar com ele. Mas a pressa de voltar ao cotidiano solitário que tanto conhece esbarra no dever ético, que Roberto não consegue deixar em segundo plano. Configurase, assim, uma fábula moral que trata de contrastes, amizade, solidariedade e, sobretudo, revisão de valores. Obra do diretor Sebastián Borensztein, Um "Conto Chinês" é mais um filme da ótima produção recente da Argentina – a melhor da América do Sul nos dias de hoje – e ainda conta com o grande Ricardo Darín, ator emblemático do bom cinema feito atualmente por nossos vizinhos de continente.
LABORATÓRIO | DOIS
debriefing-CENA 1:
Em uma das cenas, Roberto explica para Jun que está no limite de sua paciência: Roberto: Vamos colocar um prazo; do contrário, eu vou explodir! Ele desenha números de 1 a 7 numa folha de papel e explica, combinando fala e gestos: Roberto: Hoje é 1, amanhã é 2, depois 3, e assim por diante até 7. Se chegar até o 7 e o seu tio não aparecer, você vai embora.
Na sala de aula
Após uma breve apresentação do contexto do filme e de expor esta cena, faça questionamentos entre os participantes do treinamento:
1. 2. 3.
Como podemos relacionar o conceito de Inteligência Emocional ao que acontece com Roberto nesta cena? Roberto estabelece um limite para a convivência dos dois. Qual a importância de explicitarmos nossas expectativas e nossos limites? Como você costuma fazer isso? Que resultados tem obtido com essa atitude?
Divulgação
Cena de filme
O INFERNO SÃO OS OUTROS
debriefing-CENA 2: Em outro momento do filme, Roberto e Jun vão jantar na casa dos vizinhos. Nesta cena, a curiosidade e o estranhamento provocados pelo choque cultural ficam evidentes ao longo do diálogo entre os conhecidos do protagonista: Rosa (notando o modo como o chinês lida com a refeição): Devia ter feito macarrão. Mari:
Não o olhe assim, Rosa, você vai deixá-lo sem jeito.
Outro vizinho: Parece que ele está gostando. Rosa:
Como não vai gostar?... São milhões e milhões, comem o que têm e não perguntam o que é, como você. Eles são sábios, comem escorpiões, serpentes, formigas...
Rosa:
Veja que cabelo liso. Isso é milenar. Como eu gostaria de ter um cabelo assim.
Na sala de aula
Com a apresentação da cena descrita agora, é possível levantar as seguintes questões com os participantes:
1. 2. 3. 4.
Quais são os impactos da diversidade cultural que aparecem na cena? Que dificuldades e benefícios podem resultar do convívio entre pessoas tão diferentes? Que situações similares a esta podem ser encontradas dentro das empresas? Como você lida com pessoas de culturas, perfis e hábitos diferentes dos seus no ambiente de trabalho?
FICHA TÉCNICA Um Conto Chinês Argentina, 2011 Direção: Sebastián Borensztein Com: Ricardo Darín (Roberto) e Ignacio Huang (Jun). Distribuição: Paris Filmes
Maria Carolina Mateus, gerente de relacionamento com parceiros do LAB SSJ, é coach, especialista em Psicodrama e certificada em ferramentas de análise comportamental, como DISC e-Talent, MBTI, TKI, Insights Discovery e Eneagrama.
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PERSPECTIVA
Elas chegaram ao topo. E agora? A PRESENÇA FEMININA NA LIDERANÇA É CADA VEZ MAIS MARCANTE. MAS A HISTÓRIA E OS DESAFIOS ATUAIS MOSTRAM QUE AINDA HÁ MUITO A SER CONQUISTADO Vanessa Borelli e Giselle Stazauskas
As conquistas do passado
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as últimas décadas, as mulheres alcançaram visibilidade no mercado ao participar, cada vez mais, dos altos degraus do pipeline de grandes corporações: são executivas, gerentes, CEOs, empreendedoras de sucesso, ocupam cargos políticos. Se elas não fizessem parte da força de trabalho dos Estados Unidos, o PIB atual do país seria 25% menor. Já no Brasil, a participação feminina na economia é de 43,6%. Mas todo o brilho dessas conquistas é relativamente recente e, por isso, ainda ofuscado por alguns empecilhos. Mesmo com toda essa evolução e mais anos de estudo no currículo, os salários das mulheres não acompanharam esse crescimento. Elas ainda ganham cerca de 30% menos que seus companheiros que possuem cargos equivalentes. E quanto mais a remuneração cresce, menor é a presença feminina: entre aqueles que recebem mais de 20 salários, apenas 19,3% são mulheres. E é justamente essa diversidade de gênero no topo do pipeline que promove instituições mais fortes e bem estruturadas. Ou seja, é um bom negócio tanto para o colaborador quanto para a empresa. Confira a seguir alguns pontos que LABORATÓRIO levantou sobre a história da mulher em diversos aspectos e os desafios atuais no mercado de trabalho. LABORATÓRIO | DOIS
• As convenções do início do século ditavam que o marido era o provedor do lar. A mulher não precisava e não deveria ganhar dinheiro, somente cuidar da casa e da família. • Mulheres precisavam conquistar seu espaço por direitos que hoje são básicos, como estudar, votar e trabalhar. • No século XIX,com a consolidação do capitalismo, o desenvolvimento tecnológico e o intenso crescimento da maquinaria, a mão de obra feminina ficou concentrada em fábricas. • A década de 90 foi marcada pelo fortalecimento da participação feminina no mercado de trabalho e o aumento da responsabilidade no comando das famílias.
1879
Mulheres podem cursar o ensino superior nas universidades brasileiras.
1932
Voto feminino é permitido no Brasil
1945
Carta das Nações Unidas assegura igualdade de direitos entre homens e mulheres.
1951
Organização Internacional do Trabalho aprova igualdade de remuneração para homens e mulheres que exercem as mesmas funções.
Sim, homens e mulheres desejam avançar na carreira, mas poucas mulheres almejam alcançar cargos de CEO. Mulheres
36 18 Eu gostaria de avançar para cargos de alta liderança
Homens
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As conquistas e desafios do presente • Elas dão ordens, comandam tropas, pilotam jatos, perfuram poços de petróleo.
Eu desejo avançar para o próximo nível dentro da minha organização
• As novas configurações familiares e o aumento no nível de instrução das mulheres são dois aspectos que vêm marcando a história feminina nos últimos anos. • Há uma visível valorização de características femininas nas organizações, como a capacidade do trabalho em equipe em oposição ao individualismo, a persuasão no lugar do autoritarismo e a cooperação ao invés da competição.
REFERÊNCIAS Empowering the third billion women and the world of work in 2012. Booz and Company, 2012. Unlocking the full potencial of women at work. McKinsey&Company, 2012.
• Atualmente, os grandes desafios estão relacionados à reversão da desigualdade salarial entre homens e mulheres e à ampliação da presença feminina na alta liderança.
1988
Avanços na Constituição Federal garantem igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres perante a lei.
2000
Nos últimos 50 anos, a taxa de atividade feminina cresceu 30% no Brasil. No mesmo período, a masculina ficou praticamente estável.
Catalyst Census: Financial Post 500 Women Board. Catalyst Org, 2012.
2009
Desde 2009, o IBGE constata que o salário das mulheres continua inferior ao masculino. Em contrapartida, a jornada de trabalho delas é menor.
2011
Segundo dados do PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de domicílios), 34,9% das brasileiras têm mais de 10 anos de estudo. Entre o público masculino esse número é de 31%.
2020
Expectativas apontam a entrada de mais de 1 bilhão de mulheres no mercado de trabalho mundial.
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QUANDO CEDER É GANHAR Influência ameniza diferenças de poder Alexandre Santille e Isadora Marques
Antônio Barros Jr.
ARTIGO
POWER GAP:
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avid McClelland, teórico que analisou a necessidade de poder, dizia que “o poder não socializado é um poder desperdiçado”. Hoje, em plena era da colaboração, uma afirmação como essa faz bastante sentido. Afinal, compartilhar informação relevante com os outros, interagindo em relações horizontais de trabalho, para estimular a interdependência entre líderes e liderados, é algo que vemos cada dia mais valorizado no ambiente das organizações. Mas, apesar das relações estarem mais horizontais, ainda existem diferenças de poder na estrutura das empresas. Os cargos têm variados níveis de autoridade formal e diversos tipos de acesso a recursos, apoio e informação. E essas diferenciações são necessárias para que a organização funcione. Elas ajudam a preservar a ordem, garantindo uma divisão de trabalho apropriada e funções claras para as pessoas exercerem seus papéis. Sem este poder legítimo estabelecido, seria mais
LABORATÓRIO | DOIS
difícil para qualquer empresa tomar decisões e avançar. Ainda assim, Allan Cohen e David Bradford, nossos parceiros no tema “Influência sem Autoridade”, trazem uma discussão interessante no seu livro mais recente “Influencing Up”, lançado nos EUA, que nos chama a atenção. Por mais que a diferença de poder seja uma realidade incontestável e, muitas vezes, necessária para a transformação, crescimento ou sobrevivência organizacional,
há um aspecto importante a ser considerado. Para eles, quando o gap de poder entre os mais poderosos e outros colaboradores é muito grande, há um risco maior de todo mundo sair perdendo. Quando a diferença de poder é significativa, isso acaba afetando não só quem tem menos poder, como também aqueles que estão em posições mais altas na hierarquia. Primeiro, porque líderes com grande poder precisam de uma equipe à altura, que possa se conectar com os outros, proporcionando conhecimento, orientação e direção em busca de oportunidades e resultados. Segundo, porque líderes com muito poder necessitam de um contraponto para suas ideias e ações. O que não significa deslealdade ou insubordinação dos liderados, já que alguma oposição é sempre saudável no exercício do poder. Abraham Lincoln, por exemplo, ficou famoso por selecionar para seu gabinete três rivais declarados para trabalhar de perto com ele, transformandoos em aliados valiosos pela sinceridade de seus conselhos e pontos de vista divergentes. Mas, quantas vezes sentimos vontade de falar, só que nos calamos por medo de retaliação? Quando colaboradores sentem medo de oferecer, de forma direta, informação relevante ou seu ponto de vista sobre uma determinada situação, a organização quase nunca se beneficia. De algum jeito, esse medo precisa ser superado, porque um dos motivos de líderes se sentirem solitários é que muitos colaboradores não enxergam que chefes são pessoas que também precisam aprender e se aprimorar. Evitar essa aproximação maior com líderes se deve um pouco ao que Jeffrey Pfeffer, especialista no tema, chama de “nossa ambivalência” quanto ao poder – sentimentos opostos que a maioria de nós tem em relação ao poder. Ou seja, em geral reconhecemos o poder como uma força essencial para o sucesso, mas, ao mesmo tempo, temos receio de usar o poder e sermos mal interpretados como manipuladores ou maquiavélicos.
Além dessas questões, quando pessoas poderosas forçam os outros a fazer coisas que eles não desejam ou concordam, eventualmente seu poder acaba diminuindo. Por outro lado, quando o poder é bem investido e vai além das ambições pessoais traz retorno positivo. Líderes que usam de forma positiva o poder são aqueles que levam as pessoas a agir de acordo com valores e motivações comuns a todos na organização. Afinal, líderes precisam envolver os colaboradores em um empreendimento comum. Então, sem conexão com propósitos compartilhados e necessidades coletivas, a liderança perde sentido. Por exemplo, se um líder precisa do comprometimento da equipe, mas sempre vai logo dizendo como tudo deve ser feito, sem pedir sugestões ou dar espaço para contribuições, ninguém se sente motivado a colaborar direito. Por isso, privar o poder de gestores e colaboradores pode gerar uma apatia coletiva que impede o andamento das coisas. A solução é criar um poder combinado, que incentive as pessoas a terem iniciativa, a ganharem liberdade de ação, a serem confiáveis para tomar decisões e prevenir problemas para a empresa, a atuarem em atividades importantes, entre outros. O curioso nesse processo é que, ao abrir mão do poder, os mais poderosos acabam ganhando mais reconhecimento por parte da equipe, pelo simples fato de que essas pessoas passam a ter a sensação de que também são influentes. E quanto, em nosso dia a dia, subestimamos o poder que temos, aumentando o gap de poder com aqueles que estão acima de nós? Um número surpreendente de pessoas não utiliza todo o poder ou influência à sua disposição. O certo é que o poder é sempre relativo. Quase ninguém tem poder “zero” em uma situação. Pensar no poder relativo ajuda a entender de que forma liderados podem ser mais influentes. Mas, é sempre bom lembrar que algumas coisas são essenciais para exercer poder: ter
acesso a informação, recursos e relacionamentos. Para dimensionar o poder de alguém, vale saber com quem essa pessoa se conecta e qual sua influência com cada um; os recursos que ela controla ou pode acessar, e a informação que possui ou que pode obter rapidamente. Assim, mesmo quando há grandes gaps de poder, é possível amenizar as diferenças pela influência, um processo que sempre envolve algum tipo de troca. Nesse sentido, colaboradores com menor poder têm que saber quais são as suas fontes de poder. Precisam perceber tudo o que está ao seu alcance e que pode ser oferecido em troca de algo que é desejado pelas pessoas em cargos mais altos. Considerar aquilo que os mais poderosos valorizam produz um interessante poder de obter apoio mútuo, construindo relações positivas de trabalho. Entender as dinâmicas do poder e atuar por meio delas pode ajudar a ver que muito do comportamento, às vezes incompreensível, daqueles que estão acima, incluindo as reações às atitudes dos colaboradores, deve-se à situação em que se encontram. Quanto mais conseguirmos entender as preocupações, os objetivos e interesses dos mais poderosos, maior será nossa chance de obter sua cooperação. Reconhecer isso já é meio caminho andado para se tornar um protagonista no seu trabalho.
Alexandre Santille, sócio-diretor do LAB SSJ, Ph.D. em Psicologia pela USP, é responsável pelo desenvolvimento de programas de educação corporativa de grandes organizações. Formado pelos professores Allan Cohen e David Bradford como especialista no tema “Influência sem Autoridade”, desde 1994 aplica no Brasil e América Latina este modelo de influência. Isadora Marques, especializada em pesquisa de tendências e inovação, é responsável pela área de Pesquisa do LAB SSJ, identificando novos temas e conteúdos em Educação & Negócios que fundamentam nossas soluções de aprendizagem.
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Tendências de aprendizagem: Gamificação, Mobile e Blended Learning estão entre as nossas sugestões de leitura Giselle Stazauskas
DA MEDICINA PARA O SEU DIA A DIA O cirurgião americano Atul Gawande é conhecido por sua experiência em reduzir erros e melhorar a segurança em procedimentos médicos. Segundo ele, há dois tipos de erros: os de ignorância, que ocorrem por falta de conhecimento, e os de inépcia, que acontecem por não fazermos um bom uso do conhecimento. As falhas evitáveis do mundo atual são desse segundo tipo. Realizar um checklist é um recurso valioso para evitar desperdícios, erros e até mesmo catástrofes, ao mesmo tempo em que gera produtividade, eficiência e segurança. Gawande comprova isso em seu livro por meio de pesquisas e conversas com profissionais que fazem uso dessa técnica na medicina e nas mais variadas áreas como teatro, futebol, música, entre outras. Em “Checklist – Como Fazer as Coisas Benfeitas”, você verá como tirar proveito desse método, a partir da análise da complexidade que nos cerca e dos benefícios que esse simples procedimento pode proporcionar. Checklist - Como Fazer as Coisas Benfeitas Autor: Atul Gawande Sextante (2011) 224 páginas
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lab lendo
DICAS DE LEITURA
A GAMIFICAçÃO DA APRENDIZAGEM
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Jogos criam engajamento – o pilar de qualquer experiência de aprendizagem positiva. Com a crescente popularidade dos jogos digitais, a técnica conhecida como gamificação – ou gamification – passa a integrar o repertório do profissional de ensino. Nesta obra, o especialista em aprendizagem Karl M. Kapp revela o valor de uma mecânica baseada em jogos na criação de experiências significativas.
The Gamification of Learning and Instruction: Game-Based Methods and Strategies for Training and Education Autor: Karl M. Kapp ASTD Press & Pfeiffer (2012) 336 páginas
COMO ESTÁ A SUA AUDIÊNCIA EM SALA DE AULA?
Aula Nota 10 - 49 Técnicas para ser um Professor Campeão de Audiência Autor: Doug Lemov Editora Da Boa Prosa (2011) 331 páginas
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Doug Lemov, expert em efetividade do aprendizado, reuniu técnicas que podem ajudar professores e instrutores a ministrar aulas mais eficazes. Suas dicas abrangem desde a fase de estruturação e planejamento das aulas - de forma a garantir um bom desempenho acadêmico -, passam pela motivação dos estudantes, criação de uma cultura escolar e também explicam como construir valores e autoconfiança. O autor aborda, ainda, aspectos da relação professor-aluno: como criar um clima positivo e estimular os estudantes a pensar criticamente.
NOVAS APLICAÇÕES EM MOBILE E BLENDED LEARNING
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Com o crescente uso e desenvolvimento das tecnologias mobile, é natural que educadores e pesquisadores passem a investigar o uso desses dispositivos para o compartilhamento de conhecimentos e como ferramentas de ensino. David Parsons traz novas perspectivas e abordagens para a aprendizagem em ambientes cada vez mais móveis e imersivos. Situado na intersecção entre teoria e prática, o livro traz, ainda, pesquisas sobre o desenvolvimento e a implementação de mobile games, mobile e blended learning e bases filosóficas desse novo contexto. Refining Current Practices in Mobile and Blended Learning: New Applications Autor: David Parsons IGI Global (2012) 543 páginas
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Boas dicas sobre padrões bem sucedidos de aprendizagem social vem de Jay Cross e incluem:
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ARTIGO
Os resultados do negócio como métrica da aprendizagem
As organizações precisam mais do que aprender, precisam de resultados. Aprendizagem não é suficiente, o que conta é a ação. Luiz Algarra “É melhor aprender enquanto estamos caminhando, não caminhar depois que aprendemos.” Leslie Jeanne Sahler
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um certo momento do passado, as pessoas eram pagas para seguir instruções. Hoje em dia, o trabalho é mais como um teatro de improvisos. Os trabalhadores têm que resolver novos problemas constantemente. Eles enfrentam situações nunca antes encontradas. Não se dão ao luxo de poder esperar para serem treinados, tem que resolver tudo aqui e agora. E então a única maneira de manter-se à frente é aprendendo por si mesmo. A aprendizagem tornou-se o próprio trabalho. Enquanto o aprendizado é ascendente, o treinamento está em declínio. Os trabalhadores estão abraçando uma forma autodidata de aprendizagem; eles aprendem no contexto de trabalho, não em algum curso de treinamento divorciado do trabalho. Hoje podemos encontrar corporações onde todo mundo é um professor, o local de trabalho é a sala de aula, o desempenho no trabalho é a medida do sucesso e aprender é o caminho para a melhoria contínua. Os trabalhadores do conhecimento precisam de líderes e não de gerentes. Eles precisam de desafios, e não instruções detalhadas. De fato, trabalhadores intelectuais se ressentem ao receberem ordens, pois eles preferem que lhes digam o que precisa ser feito. Por estarem lidando com condições imprevisíveis, seu trabalho é melhor orientado por valores do que por regras. O design instrucional moderno precisa se concentrar na criação de ambientes flexíveis que alimentem a aprendizagem, ao invés de programas rígidos que forçam as lições na cabeça dos alunos. Aprendizagem incorporada ao trabalho reduz a despesa global, melhorando o desempenho. O abandono de práticas obsoletas economiza tempo e reduz custos. Basear-se na aprendizagem natural e compartilhada melhora os resultados dos negócios.
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· Uso de aprendizagem informal em torno de cursos existentes e workshops para melhorar os resultados. Use o modelo de início-meio-fim, tratando a aprendizagem formal como o elemento do meio. · Conhecimento incorporado ao trabalho por meio de suporte ao desempenho, eliminando a aprendizagem formal, exceto no caso de aprender onde encontrar as coisas. Muitas vezes isso envolve substituição de memorização pela busca em wikis, FAQs, e repositórios de informações. · Compartilhe notícias e descobertas com os outros, filtre resultados, e corte o esforço inútil de pesquisa não dirigida. · Mobilize os olhos e ouvidos da comunidade para os resultados do negócio, para que possam perceber a relevância da aprendizagem em seus diversos níveis e contextos.
Estas são boas iniciativas para otimizar os resultados da aprendizagem. Otimização pela remoção de obstáculos sociais, semeando as comunidades, aumentando a largura da banda, as conversas encorajadoras, e por aí vamos! Luiz Algarra é designer de fluxos de conversação para grupos humanos, com foco em inteligência colaborativa. luizalgarra.blog.br
O melhor lugar para aprender
é onde você estiver.
Nos canais do LAB nas mídias sociais, você tem acesso a conteúdos exclusivos sobre educação e negócios, a qualquer hora e em qualquer lugar. Descubra um ambiente virtual de informação para você compartilhar, interagir e ficar por dentro das principais tendências do mercado.
Conexão que gera aprendizagem. www.labssj.com.br
FEVEREIRO 2013
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