Um celeiro para o futuro

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UM CELEIRO PARA O FUTURO A transição para a primeira gestão é o momento mais propício para o aprendizado de futuros líderes. Planejar soluções de desenvolvimento sob medida para gestores de primeira viagem pode ser o fator de sucesso no plano de sucessão

A CÍNTIA MARTINS

LABORATÓRIO | UM

Antônio Barros Jr.

o longo de nossa experiência em consultoria, temos visto que, muitas vezes, o RH perde a chance de contribuir de modo verdadeiramente estratégico para o planejamento sucessório nas organizações – especialmente quando considera que seu trabalho termina com a promoção (ou contratação) de um gerente. A promoção é apenas o início do trabalho. Promover alguém a gerente significa apenas contabilizar um ativo de capital que, para ser convertido em um recurso funcional, exige ainda muita atenção ao processo de adaptação. É preciso garantir que o profissional tenha acesso aos recursos para que possa se encaixar, ampliar sua eficiência e entregar valor ao negócio.

A situação não é diferente no primeiro nível gerencial, mas com um agravante: aqui é onde fica o berço dos talentos que podem vir a preencher todo o pipeline de liderança da organização. Quando ignora as peculiaridades da transição para a primeira gestão, a empresa perde a oportunidade de desenvolver um celeiro de líderes – e é justamente o que acontece com a maioria. Essa transição é um período em que o indivíduo é mais receptivo ao aprendizado, ao desenvolvimento e à socialização. Durante a passagem para a carreira gerencial, ele se mostra mais motivado e pronto para a mudança. E esta motivação é fundamental para a aquisição de novas habilidades interpessoais.


O APRENDIZADO NECESSÁRIO A transição normalmente é tratada a partir de uma única dimensão: a aprendizagem das competências necessárias para se atender às prerrogativas de um gestor e para o estabelecimento de relacionamentos-chave. O desafio de se tornar gestor é apresentado como um desafio meramente intelectual. Entretanto, nossa experiência comprova o que Linda A. Hill descobriu ao acompanhar um grupo de novos gestores em seu primeiro ano no cargo, definindo que “a transição para gerente não está limitada a adquirir competências ou a formar relacionamentos. Em vez disso, constitui uma profunda transformação, ao mesmo tempo em que os indivíduos aprendem a pensar, sentir e avaliar como gerentes.”

O QUE ELES QUEREM

O fato é que temos, inevitavelmente, de tratar do desenvolvimento de uma nova identidade profissional. Esse processo está relacionado diretamente ao nível de expectativa desses profissionais quanto à carreira gerencial. Conhecer o que eles esperam e desejam, antes de planejar ações de desenvolvimento, é fator crítico de sucesso para o desenho das soluções para novos gerentes. Essas expectativas podem ser as seguintes: Amplitude de atuação – Uma das expectativas mais motivadoras, para aqueles que vislumbram assumir seu primeiro cargo de gestão, é a possibilidade de ampliar seu âmbito de atuação e, estando no comando de uma equipe, poder realizar algo mais significativo. Controle – Costuma aparecer de maneira mais velada entre as expectativas e normalmente vem disfarçada pela “amplitude de atuação”. Isso porque parece politicamente incorreto afirmar categoricamente “quero me tornar gestor para poder controlar fulano e beltrano”. Contudo, o controle é o aspecto central da atuação de um gerente, e aprender sobre si mesmo é um fator crítico nesse desenvolvimento.

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Conhecer as expectativas dos futuros gestores é fator-chave para uma solução eficiente de aprendizagem Trabalhar com pessoas – Fator de maior nível de ansiedade entre os que se preparam para a gestão. Mas é fato inescapável: ser gerente é sinônimo de trabalhar com pessoas; gerenciar é obter resultados por meio de outros. Há os que acreditam que seja apenas outro degrau na escada das competências técnicas. Mas, enquanto o escopo do trabalho fica maior, há também uma mudança nas habilidades necessárias. Gerenciar pessoas e investir tempo para que se desenvolvam é a essência da gestão.

DETETIVES E EXECUTIVOS

Perguntados sobre as experiências mais marcantes para o desenvolvimento de sua carreira gerencial, a maioria

dos executivos relata sobre aquelas vividas em seu primeiro cargo como gestor. Foi quando estavam mais abertos à experiência e à assimilação de como as coisas funcionam e como lidar com as pessoas. Em treinamentos e eventos para gestores de primeira viagem, é muito comum encontrarmos aqueles que mais parecem detetives do que participantes. Sua postura é a de um pesquisador etnográfico, ávido por informações que contribuam para sua compreensão sobre os padrões da cultura da empresa. O que isso significa: a transição para a primeira gestão marca um período de tensão e emoção intensas ligadas ao novo cargo.

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MÃO NA MASSA

Assim como em qualquer capacitação, é fundamental planejar como se dará a transferência da aprendizagem para a prática do gestor de primeira viagem. O treinamento formal proporcionará conhecimento, conceitos e, quando bem elaborado, até uma dose de experimentação sobre os desafios reais. Entretanto, a expertise em gestão é eminentemente fruto da prática – aprende-se gerenciando. Em seu primeiro ano como gestor, o indivíduo se apoia muito nas experiências que permitem o desenvolvimento de suas competências humanas e conceituais. Estas incluem designações e responsabilidades que possibilitam “experimentar” o cotidiano gerencial, tais como: participação em reuniões, liderança de projetos, acompanhamento de seus líderes em forças-tarefa, treinamento de equipes... Alguns gestores afirmam que essas experiências levam à descoberta da satisfação pessoal implícita no trabalho gerencial.

CAMINHOS TORTOS

Quando se trata de primeira gestão, os programas devem

Antônio Barros Jr.

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A transição para o primeiro cargo de gestor marca um período de tensão e emoção intensas ligadas ao novo papel possibilitar que o indivíduo construa uma estrutura para pensar sobre como lidar com dilemas comuns. Mas nem sempre é assim. As reclamações mais comuns de quem participa de um programa voltado para o desenvolvimento em primeira gestão incluem: muita teoria, pouca prática; falta de explicação sobre práticas da empresa; falta de desenvolvimento de atitudes; pouca exploração de cases, simulações e role plays; fragilidade e inconsistência no feedback dos instrutores.

O MELHOR INVESTIMENTO

Reflita sobre o seguinte dilema: a verba que você possui permite fazer uma única intervenção para melhorar o desenvolvimento de seus novos gestores. Que opção fazer? Pode não ser tão óbvio, mas você deve providenciar treinamentos para seus executivos sobre como desenvolver melhor esses novos gestores.

Está comprovado que a qualidade das práticas e habilidades de um gestor está diretamente relacionada à orientação que recebe de seus superiores. Feedback e delegação estão no topo da lista das habilidades que são mais bem desenvolvidas quando se recebe orientação direta e se conta com o gestor como modelo.

LÍDERES QUE DESENVOLVEM LÍDERES

O que a capacitação dos executivos que desenvolvem novos gestores deve destacar: - Como compartilhar desafios da transição de contribuidor individual para gestor. - Como estabelecer expectativas apropriadas e como elaborar avaliações efetivas, já que os indivíduos aprendem melhor pela prática combinada com uma avaliação sistemática. - Como responder adequadamente aos erros inevitáveis que os gestores cometerão.


MELHORES PRÁTICAS

As ações formais de desenvolvimento para novos gestores devem levar em consideração os seguintes pontos:

Os novos gestores precisam saber “o que”, “como” e “por que” deveriam estar fazendo o que fazem. Somente se souberem as razões estarão aptos a aplicar as lições no dia a dia. A abordagem deve possibilitar que eles reconheçam as pressões e angústias emocionais da transição para gestor, até mesmo para os high potentials. Eles devem ser alertados da ligação entre essa emoção e o seu baixo desempenho inicial – estarão desaprendendo a velha função e identidade, e aprendendo novas. Os novos gestores necessitam de um quadro exato do trabalho gerencial, para que percebam que, a partir daquele momento, seu trabalho é conduzir pessoas para o alcance de resultados – algo muito diferente de ser um contribuidor individual.

A soluções devem levar em consideração que o processo de aprendizado gerencial e o desenvolvimento do julgamento interpessoal se dão pelo método indutivo: observação de uma situação desestruturada e ambígua, reunião e síntese de informações para proposição de soluções. Novos gestores precisam de conselhos e orientações práticas sobre como alocar seu tempo da melhor forma, para que gerenciem o curto e o longo prazo, priorizando suas atividades no dia a dia. Devem ser expostos a assuntos estratégicos para que possam ampliar sua visão da relação entre os negócios e o ambiente. Quando deixados por sua própria conta, os novos gestores tendem a negligenciar esse aprendizado. Devem ser orientados sobre sua responsabilidade na formação de redes, entendendo como podem influenciar outros em prol do trabalho (subordinados, pares e superiores) e como construir uma rede de relacionamentos mutuamente benéficos.

SOLUÇÃO COMPLETA DE APRENDIZAGEM

O desenvolvimento dos indivíduos em transição para a primeira gestão exige planejamento deliberado e cuidadoso da carreira destes talentos. Mas o que mais se vê são abordagens fragmentadas, reativas ou intuitivas. De um lado, aposta-se muito na tática do “afogar ou nadar” ou da “sobrevivência do mais adaptado”. Por outro, persistese na visão míope de um desenvolvimento desconectado da realidade – e sem ações de transferência de aprendizado. No planejamento de soluções de aprendizagem para o novo gestor, deve-se dedicar ao desenho de uma experiência completa de aprendizagem – entremeada por ações formais e informais – que tenha seu início antes mesmo da promoção. Essa solução deve servir de alicerce para o novo gestor por, no mínimo, seis meses após a promoção. Catalisar o desenvolvimento desses talentos é agregar valor para o negócio.

Cíntia Martins é consultora em Alinhamento Estratégico para Processos de Gestão de Pessoas, e professora no Departamento de Pós-Graduação da FAAP. REFERÊNCIAS I Linda A. Hill , Novos Gerentes: Assumindo uma Nova Identidade, Makron Books, 1993. II Scott Erker, Ph.D. and Bradford Thomas, Finding the First Rung, DDI (Development Dimensions International), Agosto, 2010.

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