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ODORICO MENDES, O HERÓI DA ENEIDA

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POESIAS

POESIAS

FERNANDO BRAGA in “Toda Prosa”, Tomo III, do livro “Travessia” [Memórias de um aprendiz de poeta e outras mentiras], em fase de organização.

Quem primeiro me falou sobre o poeta João Viana Guará foi o intelectual maranhense José Erasmo Dias de saudosa memória. Dizia-me ele que Viana Guará era um grande poeta, apesar da pouquitude de sua idade e, conseqüentemente vivência. Não sabia Erasmo, de cor, nenhum poema do poeta de “Poeira dourada”, mas não sei por que toda vez que ele falava de Viana Guará associava-o a Edmo Leda, talvez por ser Edmo também um grande poeta e pela contemporaneidade de ambos, fazendo, também, a est’outro os elogios merecidos. Raimundo Guará, irmão do poeta, meu tio por afinidade, pois era casado com uma prima carnal de minha mãe; a ele devotava eu muita ternura e querer bem. Um belo dia presenteou-me o livro de Viana Guará “Poeira Dourada”, com belíssima dedicatória e com uma letra belíssima, parecida com a de meu pai, pois eram ambos calígrafos, afeitos à escrituração mercantil da velha Praia Grande; este livro foi editado como homenagem de família em 1986, pelo SIOGE (MA), cujas orelhas levam a assinatura de Marlene Guará, sobrinha do poeta. O meu querido amigo Antônio de Oliveira e amigão do poeta, sendo um pouco mais velho do que este, diz na apresentação do livro, num laivo de romantismo, aliás, atmosfera muita sua, já que era conhecedor profundo de Camilo Castelo Branco, que conheceu “Viana Guará na Praça João Lisboa, em São Luís, na década de trinta quando batia uma viração do vento, macia vinda da Ponta da Areia e da Bahia de São Marcos, canalizadas pelas ruas do Egito e de Nazaré, suavizava a canícula das claras tardes de verão e refrescava as sedutoras noites estreladas”. Viana Guará morreu aos vinte e quatro anos de idade, na mesma faixa em que morreram os poetas da chamada terceira geração estóica de românticos, como Castro Alves, Fagundes Varela, Casemiro de Abreu e Álvares de Azevedo. Não digo que não seria o romantismo a sua bandeira de sentimentos, o seu marco poemático, caminhos que não arredaram o poeta por um instante dos meandros modernistas, escola já instalada e de muita pujança no Brasil, onde surgira em 22, a qual se atravessou pelo meio existencial do poeta, alcançando-o em plena juventude. O que mais me impressiona, no entanto, em Viana Guará, é o seu senso épico, estética que lhe penetra o espírito nas mais variadas formas em que escreveu, do soneto à prosa. Sintamo-lo neste canto dedicada a sua cidade de Grajaú: “Estradas abertas nos desvãos sombrios”. Entre coivaras, tucurús e caçapavas, Acordando às manhãs Com o matraquear das tropas E o estalejar das taças, Visando, nas quebradas dos lubungos, A grinalda cinzenta de poeira, O rastejador constante dos tropeiros - Eis minha terra!”

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O poeta confessou ao seu amigo Antônio de Oliveira que gostaria de formar-se em Recife, na famosa Faculdade de Direito de Pernambuco para sorver os ensinamentos deixados por Tobias Barreto e que ainda, como hoje, impregnam todo o ambiente daquela velha escola jurídica, e depois voltar formado para Grajaú por onde deveria começar sua profissão como advogado ou simples promotor, caso preferisse o Ministério Público. De volta a São Luís, talvez fizesse concurso para uma Cadeira na velha Faculdade da Rua do Sol. Gostaria também de ganhar algum dinheiro para ressarcir um pouco seus pais e seus irmãos pelo sacrifício que tinham feito e que ainda iriam fazer “. João Viana Guará nasceu em Grajaú, bela cidade do sertão maranhense, em 6 de outubro de 1916. Aproveito aqui o gancho deixado por Antônio de Oliveira, já considerado seu biógrafo, para viajar com ele nas asas daquele tempo: “Passaram-se alguns anos. Já no Rio de Janeiro, em 1940, soube casualmente de sua morte,

por uma breve notícia de um jornal de São Luís. Finou-se como o genial poeta do “Guesa” (Sousândrade), num 21 de abril, consagrado a Tiradentes. Simples como todo homem que carrega consigo a bagagem de muita sensibilidade e de uma cultura feita em contraponto com a honradez do seu caráter, Viana Guará se despediu da vida em sua Fazenda São João, em Grajaú, onde escreveu, por derradeiro este “Meu Testamento:” “Não tenho herança a vos deixar, meus irmãos,/ trago os bolsos vazios, sem dinheiro. / (...) No entanto, ó meus irmãos, se desejardes / algo de humilde que não tenha alardes, / Buscai um dia os meus papéis dispersos.../ Encontrareis de certo uns velhos trapos/ E entre as traças vereis, / desses farrapos./ A poeira dourada de meus versos...”

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