(Hot Developments)
Com seus beijos ardentes, ele a levava ao paraíso Os homens criticavam Emily Parker por ser forte e independente demais, mas ela não iria mudar por causa de um sujeito qualquer... Então, apareceu Kevin Richardson, que virou seu mundo de cabeça para baixo. O que a surpreendia era o puro prazer de estar com um homem que a compreendia e a desejava tanto quanto ela o desejava! Kevin se orgulhava de seu faro para os negócios, razão do sucesso da Companhia de Empreendimentos Pace. Não tinha escrúpulos de fazer-se passar por turista para avaliar as terras das Parker. Mas foi desviado de sua trilha pela bela e selvagem Emily. Mesmo se abrisse mão do negócio, Emily jamais o perdoaria por ter sido enganada. Kevin teria coragem de arriscar tudo por amor? Digitalização: Tinna Revisão: Claire Allicya Formatação: Raquel
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Robby Hutchinson
Copyright © 1993 by Robby Hutchinson Publicado originalmente em 1993 pela Harlequin Books, Toronto, Canadá. Todos os direitos reservados, inclusive o direito de reprodução total ou parcial, sob qualquer forma. Esta edição é publicada por acordo com a Harlequin Enterprises B.V. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer outra semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência. Título original: HOT DEVELOPMENTS Tradução: Cláudia Santana Martins Copyright para a língua portuguesa: 1994 CÍRCULO DO LIVRO LTDA. EDITORA NOVA CULTURAL uma divisão do Círculo do Livro Ltda. Alameda Ministro Rocha Azevedo, 346 CEP 01410-901 — São Paulo — SP — Brasil Caixa Postal 2372 Fotocomposição: Círculo do Livro Impressão e acabamento: Gráfico Círculo.
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CAPÍTULO I
Dez horas e quarenta e cinco minutos, e ninguém aparecera ainda. Kevin Richardson olhou para o relógio outra vez e praguejou em voz baixa. Diabos, onde estava a sua condução? Detestava perder algo que considerava um bem de valor inestimável: o seu precioso tempo. O avião de uma pequena companhia que o levara àquela região escarpada do sudeste da Colúmbia Britânica, província do Canadá, reabastecera e decolara para Vancouver há mais de uma hora, deixando-o nas mãos de pessoas que obviamente não tinham o menor senso de responsabilidade. A manhã de início de maio ficara nublada de repente, e um vento gelado e forte serpenteava por entre as Montanhas Rochosas, percorrendo o vale do rio Elk. Kevin vestiu a jaqueta com forro de pele de carneiro que trazia na mão, fechou o zíper e desdobrou a gola para cobrir as orelhas. Em breve, nem mesmo o calor da raiva que sentia pela família Parker seria suficiente para impedi-lo de congelar. Maldição era frio ali, em comparação com a região costeira. A altitude era elevada: mais de mil e quinhentos metros. Forçou os olhos para avistar, através da neve, os picos das montanhas, e não pôde evitar um sentimento de assombro diante do cenário espetacular. A relva nos campos vizinhos era Verde, contudo, e as folhas dos alamos já renasciam, mas o ar ainda estava bastante frio. Kevin olhou em torno mais uma vez, pensando se haveria algum outro meio de transporte que o tirasse dali. A acidentada pista de pouso encontrava-se deserta agora. Só três aviões pequenos abandonados desordenadamente sob uma estrutura aberta dos lados e com telhado de zinco. Os dois membros da tripulação do vôo de Kevin haviam subido numa camionete e desaparecido na estrada de cascalho assim que o avião de sua companhia decolara. — Vamos esperá-lo na pista de pouso, Sr. Richardson — prometera Gertrude Parker ao telefone em sua voz grave e áspera. Aquilo fora na semana anterior, quando acertara os detalhes da viagem. Havia, inclusive, telefonado a ela no dia anterior e informado a hora exata da aterrissagem. Como pudera aprontar-lhe aquela? Kevin acreditava em compromissos e era pontual. Nunca deixara ninguém esperando daquele jeito. Olhou de novo para o relógio e balançou a cabeça, aborrecido. Sem dúvida alguma, esses Parkers que dirigiam a Vale do Elk Excursões não tinham a menor idéia do que era um compromisso; o fato de deixá-lo esperando mostrava que, mais do que amadores, eram incompetentes no que se referia a transações. Isso, com toda certeza, lhe aliviava a sensação de culpa pelos planos de sua companhia, que acarretariam o fim do Vale do Elk Excursões.
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Nunca tivera estômago forte para o lado mais desumano dos negócios das companhias de empreendimentos e ficara aborrecido ao saber que a Vale do Elk Excursões seria prejudicada devido à Companhia de Empreendimentos Pace. Três semanas antes, a Pace obtivera o arrendamento das terras governamental anteriormente concedido a Vale do Elk. Lembrou-se das palavras do pai, Barney, e de sua voz ríspida e impaciente: — Negócios são negócios, estas são as regras! Somos uma companhia de empreendimentos. São os ossos do ofício, pelo amor de Deus! Além disso, a região está madura, pronta para ser explorada. Kevin tinha de admitir que Barney costumava ter razão. A Companhia Pace saíra da obscuridade e atingira a sua posição atual como uma das mais promissoras companhias novas no mercado de valores devido ao faro apurado de Barney em relação a terras. Mas Kevin também tinha consciência de que a companhia não teria alcançado o sucesso sem a sua capacidade de planejamento e habilidade de elaborar folhetos capazes de fascinar experientes homens de negócio. Ao contrário do pai, todavia, não gostava de vencer a custa da derrota dos outros. Kevin e Barney eram opostos em muitos aspectos, embora Kevin tivesse resolvido trabalhar para ele com o objetivo expresso de criar algum tipo de vínculo com o pai. Kevin balançou a cabeça, lembrando-se. Aquele sonho fora morrendo lentamente ao longo dos anos. No entanto, tinham um bom relacionamento de trabalho. E um bom relacionamento de trabalho era alguma coisa. Nenhuma maravilha, mas alguma coisa. — Maldição. As mãos de Emily Parker tinham ficado cobertas de graxa e sujeira com a troca do pneu traseiro de seu jipe de tração nas quatro rodas. Tentou limpar o grosso da sujeira com um pano, mas não adiantou. Olhou para o jeans usado, que havia saído da lavanderia naquela manhã, e praguejou baixinho. Ficara imundo, porque ela se ajoelhara no cascalho enlameado do acostamento na luta contra a alavanca, os parafusos e o pneu sobressalente. Arranjara também uma mancha de bom tamanho na frente do suéter de malha amarelo. Um horror, a sua aparência, mas ao menos o pneu sobressalente estava firme no lugar. Bem, talvez houvesse esgotado a sua cota de problemas, e o resto do dia transcorresse em calma. — Não fique sonhando, Parker. — Vamos lá, Matilda, pé na tábua. — Voltando para dentro, Emily encorajava o jipe a andar. O motor ligou de imediato, o quê não deixava de ser uma bênção, e o velho veículo engasgou e tossiu quando ela pisou fundo no acelerador. Voltou para a estrada a toda, fazendo as curvas numa velocidade imprudente, rangendo pneus ao virar na estrada de acesso à pista de pouso. Avistou-o através do pára-brisa empoeirado. Ele era alto, de ombros largos; o vento soprava para trás os espessos cabelos castanhos, deixando à mostra as linhas fortes e angulares do rosto. As duas bagagens achavam-se amontoadas a seu lado. Carregava pouco peso, sem nenhuma dúvida.
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Graças a Deus. Alguns clientes traziam tanta bagagem que eram necessárias duas viagens para levar tudo para casa, e para arrumar as malas para ir para o acampamento, então... Emily acenou amistosamente e parou a seu lado com um floreio, abrindo a porta do jipe e pulando para fora num só movimento. Ele não tinha um ar muito amistoso, mas ela ignorou este fato e abriu-lhe o maior sorriso. — Olá, sr. Richardson! Sou Emily Parker. Desculpe o atraso. Furou um pneu da Matilda. Não lhe estendo a mão porque estou toda suja de graxa. — Rindo, estendeu as mãos sujas e ásperas para a inspeção, mas não houve resposta alguma. Os olhos escuros e fixos de Kevin Richardson encontraram os dela sem revelar nem uma pitada de humor. — Estou esperando aqui há uma hora e vinte minutos, Srta. Parker. Com certeza não levou esse tempo todo para trocar um pneu, levou? —O tom dele era tão frio quanto o vento que agitava as trancas de Emily. Ora, mas que cara chato. Por que os rapazes bonitos sempre tinham mau caráter ou egos tão imensos que não cabiam em nenhum outdoor Era uma lei perversa e que se aplicava a todos os clientes. — Bem, na verdade levei sim. Acho que não sou a melhor mecânica do mundo. — Emily não era rude, mas também não ia levar desaforo para casa. — Entre a bordo. Estendeu a mão para agarrar a mochila e a mala dele, mas Kevin foi rápido e, com movimentos ágeis, apanhou as coisas e jogou-as no banco de trás do jipe. Então, para espanto de Emily, deu a volta e segurou a porta aberta para que entrasse. Por Júpiter! Um cavalheiro gentil e mal-humorado, nem mais nem menos! — Obrigada, Sr. Richardson. Ele meneou a cabeça de leve e fechou a porta. Um segundo depois, esta se abriu de novo. — Precisa bater com força se quer que feche de verdade. Há algo de errado com o trinco — explicou ela. Então bateu a estúpida porta com toda a força. Estava ali para servi-lo, não entendia? Um atendimento pessoal era parte do acordo. Afinal, ele era o cliente; pagara uma alta-soma pelo privilégio de passar duas semanas no mundo selvagem. Vendo-o agir assim, Emily se sentia como se não estivesse cumprindo o seu trabalho. Mas até que estava gostando daquilo. Por alguma razão, não conseguia parar de olhar para ele. O rosto possuía ângulos interessantes e uma expressão de autoridade. A boca em linha reta, rígida, e os ossos da face salientes davam-lhe uma feição severa. Havia uma ruga entre as sobrancelhas espessas e, o nariz era levemente torto, como se já houvesse sido quebrado. Kevin era... Achou que bonito era muito suave, no caso. Observou-o contornando Matilda e entrando pela outra porta, com movimentos precisos e elegantes ao se sentar e amarrar o cinto de segurança. Bastante ágil para um homem tão grande, de um metro e noventa ou um metro e noventa e cinco de altura. E forte. Grandes ombros.
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Nunca havia percebido antes como o banco de passageiros de Matilda ficava perto do banco do motorista. — Tudo pronto? Ele assentiu. Emily engoliu em seco e tentou não olhar para aquelas pernas fortes e compridas dentro de uma calça justa de brim, bem junto a ela. Nenhum sinal da barriguinha típica dos homens de negócio. Sob a jaqueta, cintura estreita e estômago tão liso quanto o dela. Também não usava aqueles trajes da moda, de cowboy de boutique. As botas eram caras, mas usadas, combinando com a camisa xadrez e o jeans Levi's desbotado. Kevin virou a cabeça e a pegou observando-o. Um canto de sua boca se contorceu e as sobrancelhas se ergueram. Ela sentiu-se corar e girou a chave do carro. Nada aconteceu. Emily cruzou os dedos mentalmente e tentou de novo, e desta vez o motor de Matilda roncou. Muito obrigada, Deus. A última coisa de que precisava no momento era que o motor pifasse. Queria levá-lo a salvo para a mãe, e ela que cuidasse dele. Gertrude saberia lidar com ele. Não havia nenhum homem no mundo com quem Gertrude não soubesse lidar. — Então, fez boa viagem, Sr. Richardson? — O tom era amável, vivo, esperançoso. — Boa. — A única palavra era sucinta e definitiva. Depois de uma longa pausa, acrescentou: — Meu nome é Kevin. Ora, viva! Já estavam ficando íntimos? Nada de sobrenomes! Ela tentou outra vez. — Pode me chamar de Emily. Já esteve nesta parte da Colúmbia Britânica, Kevin? — Uma vez, há alguns anos. — Ela esperou, mas ele não ia em frente. Não sorria, também. Ficava ali, sentado no banco de Matilda, olhando para á frente como uma esfinge. — Não pense que mudou muito. Nada por aqui muda muito. Nenhuma resposta. Ela suspirou. A manhã ia de mal a pior, com certeza. Emily conduziu-os de volta à estrada com mais rapidez do que o necessário, fazendo o carro sacolejar ao passar sobre os buracos da estrada de cascalho. Durante os últimos doze anos de seus trinta anos de idade, o trabalho dela consistira em fazer com que os clientes se sentissem confortáveis, escutando pacientemente quando decidissem desabafar. Tomara-se especialista no assunto. Contudo, a cada momento se sentia mais insegura ao lado daquele silencioso estranho, o que não era típico de sua personalidade. Emily gostava das pessoas e costumava se dar bem com elas. Mas havia algo nele que a perturbava. Sentia-se constrangida em sua presença. Decidiu não puxar mais conversa. O que também não era uma característica de sua personalidade.
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Gertrude sempre dizia que Emily tinha talento para a conversa. Mas se ele queria conversar durante os quarenta minutos que levariam para chegarem a casa, de nada lhe serviria aquele belo rosto carrancudo; teria de fazê-lo com palavras. Por enquanto, ficaria de boca fechada ao lado daquele... daquele homem rabugento, insuportável e sensual. Kevin se continha para não virar e olhar diretamente para ela, embora a enxergasse muito bem com a sua visão periférica. Havia uma mancha de sujeira nas faces bronzeadas de Emily que ela nem devia ter percebido, é as mãos de dedos longos sobre o volante eram uma graxa só. Unhas curtas, sem esmalte e sem qualquer trato especial. Não usava maquiagem, vestia roupas gastas e exalava um leve cheiro de graxa... Um aroma que jamais o atraíra. Então o que era o que havia nela para atraí-lo? Porque desde o momento em que pusera os olhos nela, algo profundo, instintivo e viril despertara em seu íntimo, como numa verdadeira reação nuclear. Kevin achou que devia ser a energia que Emily irradiava que o tornava tão consciente da sua presença. Não era bonita no sentido clássico, embora os cabelos negros abundantes e lisos que escapavam da trança, presa com o que parecia ser um cadarço de couro, combinassem com a pele bronzeada. Os grandes olhos verdes, sem dúvida alguma, também impressionavam. E aquela voz, inesperadamente grave e rouca... Falava com rapidez, as palavras jorravam numa torrente, com uma pequena hesitação às vezes, no final das sentenças. Agora, porém, permanecia calada. Ele afundou no assento cheio de caroços e retesou os músculos para manter-se ereto enquanto ela passava por outro buraco. Suspeitava que estivesse fazendo aquilo de propósito, o que o divertia. Não podia culpá-la. Não fora exatamente amistoso com ela. Emily o pegara de surpresa. Saltara daquele jipe em frangalhos como uma amazona, alta, esguia, toda sorrisos e graxa e curvas atraentes e desculpas, e ele sentira como se tivesse levado um soco no estômago. Richardson, que há de errado com você? Controle-se, já. A última coisa que deseja é envolver-se em qualquer tipo de relacionamento com esses Parkers, quanto mais ter pensamentos obscenos a respeito desta aí. Isto é um negócio, lembra-se? Negócio sério, envolvendo muito dinheiro. E logo a coisa vai ficar preta, quando descobrirem por que você veio, na verdade. Emily parou um instante no cruzamento com a estrada principal, olhou com cuidado para os dois lados das duas pistas desertas e então arrancou, com um solavanco que o jogou para trás. Ele conteve a vontade de rir das loucuras dela e virou cabeça em sua direção para observá-la melhor. Tinha belas orelhas, pequenas e coladas à cabeça. Não usava anel, aliança e nem brincos. Que idade teria? Apertou os olhos e refletiu. Aos trinta e oito anos, Kevin chegara ao ponto de achar as mulheres cada vez mais jovens e, à primeira vista, Emily não era exceção. Seu modo de agir era o de uma adolescente. De perto, contudo, pôde ver alguns traços nos cantos da
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boca, e havia lima expressão de maturidade nos olhos. Uns vinte e seis, vinte e sete? O tempo passava, e Emily continuava em silêncio. Kevin começou a quebrar a cabeça para encontrar algo para lhe dizer. Algo impessoal e amistoso ao mesmo tempo, algo que lhe mostrasse que não era um cara arrogante, embora houvesse se comportado como um minutos atrás. Mas, como sempre lhe acontecia, não achou o que dizer. Puxar uma conversa informal nunca lhe fora fácil. O que dizer, afinal, a uma mulher com os joelhos das calças sujos e botas velhas de cowboy precisando de saltos novos? Assim; viajaram por um longo tempo em silêncio, o jipe sacolejando pela estrada acidentada, subindo montanhas e atravessando bosques sem fim. Finalmente, Emily não agüentou mais e anunciou: — À sua esquerda, fica a bela cidade de Elkford, um novo assentamento que se desenvolveu quando as minas de carvão da parte superior do vale foram abertas, há cerca de dez anos. Até então, havia apenas uns poucos colonos vivendo aqui. Meu avô era um deles. — Ele era mineiro? — Kevin tinha sido bom aluno. Sabia um pouco da história do vale, sobre como os depósitos ricos em carvão haviam atraído colonos para a região na virada do século, sobre como as cidadezinhas mineiras de Middletown, Natal e Michel haviam florescido e depois desaparecido nos anos sessenta. Emily balançou a cabeça negativamente. — O pai de mamãe, vovô Luke, era fazendeiro, caçador e pescador. Foi ele que iniciou o nosso negócio: era guia e fornecedor de equipamentos para excursão. Meu pai, Joseph Parker, foi mineiro. Por uns tempos. Pouco tempo, na verdade. Trabalhou durante seis anos nas minas subterrâneas, naquelas montanhas lá atrás. — Ela apontou para trás, para o lado sul do vale, onde se localizavam as primeiras cidades. — Largou as minas porque mamãe as achava muito perigosas. Trabalhou com vovô como guia, mas o negócio não funcionava o ano todo e precisávamos de mais dinheiro, então começou a trabalhar como madeireiro. Caiu numa armadilha e morreu, quando eu tinha doze anos e minha irmã, Laura, tinha dez. Kevin não sabia o que responder a isso, também. A ironia da história era triste e comovente. — Deve ter sido duro para a sua mãe — conseguiu falar, amaldiçoando-se pelo tom pomposo. Emily assentiu. — É, acho que foi. Mas mamãe é batalhadora. Kevin pensou que Emily também era na certa. A pequena comunidade de Elkford ficara para trás agora e a pista se estreitou de repente. Emily não achou necessário diminuir a velocidade e, mais uma vez, Kevin se preparou para enfrentar os buracos cada vez mais freqüentes da estrada. — Estamos chegando — anunciou ela alegremente. Um buraco mais fundo do que os outros quase fez com que ele batesse a cabeça na capota do jipe. — Opa, desculpe o mau jeito! — Kevin notou um ar de diversão perversa na expressão de Emily ao vê-lo segurando-se para resistir ao solavanco.
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Voava cascalho em todas as direções, mas Emily não se importava. Os pinheiros, de ambos os lados do jipe, formavam um túnel verde, separando-se a seguir e revelando uma ampla campina cercada dividida ao meio por um caminho estreito e empoeirado. Enquanto o jipe saltava na estradinha, Kevin avistou um curral com vários cavalos pastando; a seguir, um velho celeiro em ruínas e vários outros galpões. Então Emily freou de repente, diante de um sobrado de madeira assentado numa pequena clareira cercada de pinheiros. Havia uma ampla varanda coberta. Uma coluna de fumaça Fumaça saía de uma chaminé de pedra gasta. Vindo de um canto da varanda, um, cachorro peludo correu em sua direção, latindo furiosamente quando desceram do jipe. — Caleb, acalme-se! — ordenou Emily, sem resultados. — Ele não morde, só gosta do som de seu próprio latido — garantiu Emily a Kevin. Sorriu, piscando um olho. — Mamãe diz que Caleb e eu temos muito em comum nesse aspecto. Venha, depois pegamos sua bagagem. Subiu as escadas de dois em dois degraus, abriu a porta e gritou: — Olá, mamãe! Chegamos! Mãe! A casa cheirava a pão recém-assado, mas a mulher que chegou ao saguão para saudá-los não era do tipo matrona, gorducha. — Esta é minha mãe, Gertrude Parker. Mamãe, este é Kevin Richardson. O aperto de mão de Gertrude era forte, assim como suas feições. Kevin sentiu como se aquele olhar azul penetrante pudesse trespassá-lo. Alta, esguia, cabelos com mechas escuras e brancas misturadas, parecia ter uns quarenta e tantos, talvez cinqüenta anos. Usava jeans e camiseta, e seu corpo poderia pertencer a uma mulher bem mais jovem. Kevin viu de quem Emily herdara a sua notável aparência. Gertrude cumprimentou-o com aquela voz profunda, severa e grave que ele já conhecia das conversas telefônicas anteriores. — Furou um pneu de Matilda, e acabei chegando atrasada ao aeroporto. Kevin teve de esperar um bom tempo até eu chegar — comentou Emily, enviando à mãe um olhar sugestivo. — Preciso me lavar. Estou horrível! Com licença. — Retirou-se, subindo uma escada em caracol de dois em dois degraus. Gertrude lançou-lhe um olhar azul gelado, e Kevin retribuiu-lhe na mesma moeda. Ela desviou os olhos primeiro e ele se sentiu ridiculamente triunfante. — Bem, Kevin, chegou aqui são e salvo, sem nenhum problema, certo? — Era um desafio, mas ela não esperou a resposta. Virou-se e levou-o a uma ampla cozinha, onde um fogão a lenha emitia ondas de calor e onde fervia um enorme bule de cate. — Há um lavabo ali do outro lado da cozinha. Depois, pode se sentar à mesa e vamos almoçar. — Gertrude apontou para uma mesa redonda de madeira no centro da peça, já arrumada e repleta de pratos de carne fria e legumes cortados, bolinhos de milho e fatias de pão quente, saído do forno. O aroma fez o estômago de Kevin roncar e ele se lembrou de que não comia desde manhã. Seguiu para o lavabo e logo estava de volta.
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—Toma café, não toma? — Diante da resposta afirmativa, Gertrude serviulhe uma enorme caneca, apontando vagamente para o creme e o açúcar já sobre a mesa. — Esteja à vontade. O pessoal aqui não costuma fazer cerimônia. Kevin sentou-se numa cadeira de madeira enquanto Gertrude cuidava do fogão, enfiando tocos na fornalha e retirando mais uma fornada de pães dourados com uma calma eficiência que denunciava um hábito de longos anos. — Onde está Laura, mamãe? — Emily entrou saltitante na cozinha, o rosto brilhando do banho recente. Vestira um jeans limpo e uma camiseta branca, — Jackson apareceu de novo para brigar com ela? Kevin captou, mais uma vez, uma alteração na energia do recinto, e uma alteração em seu próprio equilíbrio, como se a entrada de Emily tivesse, de algum modo, dado mais vida ao mundo. Ela tomou seu lugar à mesa, à direita de Kevin. A camiseta branca aderia aos fartos seios, e Kevin evitou olhar para ela, colocando mais açúcar e creme no café do que o necessário. — Jackson desistiu e não posso culpá-lo. Laura está lá no curral. Devia ter voltado há meia hora. — Havia aborrecimento no tom de Gertrude. — Foi ver a égua que está prenha. Não vale a pena esperarmos por ela. Sabe como essa menina se esquece do tempo! — Laura é uma mulher, mãe, não uma menina! — Algo na voz de Emily o intrigava, — E precisa ficar sozinha de vez em quando. Gertrude lançou um olhar penetrante à filha, mas não quis continuar a discussão. — Kevin, experimente o pão da minha mãe. Ela faz o melhor pão aqui de casa. E isto é uma torta de frango, feita por Laura, e picles comum. A mão dela esfregava nele ao passar os pratos, e o contato o perturbava. Mas a comida era deliciosa, e Kevin descobriu que estava mesmo faminto. Gertrude e Emily não puxaram conversa durante a refeição; comiam com tanto apetite quanto ele, e suas observações se limitavam a assuntos cotidianos, como a quantidade de gasolina que restara no jipe e onde Emily havia guardado a caixa grande de isopor. Mas, por trás das frases corriqueiras, havia um clima de profunda afeição entre mãe e filha. Kevin estava repetindo todas as iguarias quando a porta dos fundos se abriu e a irmã de Emily apareceu. Ele se levantou de imediato, acenando a cabeça polidamente para a mulher pequena e loira que, hesitante, se aproximava da mesa. Era bem diferente de Emily. Não só por causa do cabelo cortado rente, que parecia dançar em torno de sua cabeça como sementes de dente-de-leão. Laura era menor, mais frágil do que a irmã e a mãe. Os olhos azuis eram os de Gertrude, mas o rosto triangular, os traços nítidos das feições eram só seus. Evidenciava uma forte timidez no jeito de andar, na postura da cabeça. O olhar de Laura passava de uma pessoa à outra, captando a atmosfera da peça. Trajava jeans e uma bata azul. Laura estava visivelmente grávida.
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Era surda, também, percebeu Kevin, com uma sensação profunda de compaixão, ao ver as mãos de Emily começarem a fazer sinais gráficos. Sinais que provocaram um arquear de sobrancelhas, um sorriso torto e um menear de cabeça da parte de Laura, e depois um olhar rápido dirigido a Kevin. — Esta é minha irmã, Laura. — As mãos de Emily se moviam enquanto falava, traduzindo as palavras. — Laura, este é Kevin Richardson. Kevin vira e entendera parte do "diálogo", com certeza não todo, mas o bastante para ter uma idéia geral. Tivera um amigo no colégio que possuía um irmão surdo e aprendera com eles o vocabulário básico de sinais, fascinado pelo método incomum de comunicação, que, além do mais, se tornara uma linguagem de lábios secreta para os adolescentes: podiam trocar idéias bem na frente dos professores, ou pela janela. Não se sentia à vontade para usar a linguagem de sinais com Laura, contudo. Há muito tempo não a usava e, a julgar pelo diálogo que acabara de testemunhar, seria divertido relembrá-la observando-as por algum tempo. — Kevin pigarreou de modo desajeitado. — Diga... diga olá para ela. — Diga você mesmo. Laura lê nos lábios. — O tom de Emily era áspero e Kevin, contra a vontade, sentiu-se corar. Estendeu a mão para Laura e tentou, sem sucesso, abrir um sorriso. — Tudo bem, Laura? — O seu próprio tom lhe soou cordial demais. — Be-e-e-em, obi-i-i-ga-a-ad-u-u-u. — Sua voz era alta e sem modulação. Soltou a mão dele de pronto, afastando-se para encher um copo de leite. Sentouse do outro lado da mesa e começou a encher o prato de comida. Ela e Emily trocaram mais algumas frases e Kevin observou, sem querer. — Uau, este aí é um gato — comentou Laura. — Um chato — respondeu Emily. — Nunca vi alguém tão mal-humorado. — Comportem-se, garotas — repreendeu Gertrude, com dedos tão rápidos quanto às filhas. Mas o aviso não pôs fim à conversa de Emily e Laura, enérgica e objetiva ao mesmo tempo. Ao final, Kevin mal conseguiu conter uma gargalhada. Resolveu que só mais tarde revelaria que entendia os sinais. Muito mais tarde, talvez. Era sujeira, mas aprenderia muito sobre Emily e a irmã enquanto acreditassem que ele era analfabeto em sinais. E elas falavam coisas tão fascinantes! A maior parte sobre ele próprio. Por fim, pararam, e de repente um silêncio constrangedor se instalou entre as três pessoas capazes de ouvir. Gertrude os salvou. — Kevin, você mencionou ao telefone que estava interessado em fotografar a vida selvagem do vale. Sei que não é caçador, mas gostaria de pescar um dia desses? Os riachos estão cheios nesta época, mas há boa pesca no rio Elk perto do acampamento central. — Adoraria, mas não pesco há anos. Não trouxe equipamento.
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— Não tem problema. Temos um estoque de caniços e anzóis. Botas impermeáveis, também. Emily vai tratar disso. Emily concordou, com um de seus sorrisos amistosos. — Com certeza. E talvez queira saber que partiremos para o acampamento dentro de uma hora. Está quase tudo pronto, só falta enfiar no caminhão. Leva quase duas horas para chegar ao acampamento central. Usamos o caminhão para chegar lá e, nas outras excursões, utilizamos os cavalos. Iremos você, eu e Laura. Ela é a cozinheira do acampamento e eu sou sua guia. Outro grupo deve vir nos próximos dias, e mamãe vai levá-los no jipe quando chegarem. Kevin não pôde evitar uma sensação de alegria diante da notícia de que Emily seria sua guia nas duas semanas seguintes. Sabia, através da pesquisa que realizara sobre a Vale do Elk Excursões, que Gertrude trabalhava com pessoal reduzido, raramente contratando mais do que dois ou três guias extras e um ou dois vaqueiros por estação. Imaginava também que ela e as filhas se encontrassem em sérias dificuldades financeiras. A licença para atuarem como guias no território devia ser renovada ano a ano, e naquele ano Gertrude atrasara em um mês a renovação da licença, dando à Companhia de Empreendimentos Pace à oportunidade tão esperada. Depois de conhecê-la, teve certeza absoluta de que não fora negligência da parte de Gertrude. Parecia uma mulher competente, determinada. Devia ser questão de dinheiro. Um lance de olhos pela casa revelava que aquelas pessoas não eram ricas, de modo algum. Era graciosa e maravilhosamente confortável, mas em todas as partes havia sinais de que o dinheiro andava escasso: o fogão antiquado, o velho refrigerador barulhento, a ausência de um forno de microondas, máquina de lavar pratos, batedeira elétrica. Isso sem falar nos veículos caindo aos pedaços estacionados do lado de fora. As palavras seguintes de Gertrude esclareceram o motivo por que havia tão pouco dinheiro: — E preciso que assine um documento antes de partir para o acampamento, Kevin, dizendo que não vai nos processar se houver um acidente. Sabe, no ano passado... um de nossos... clientes... ficou bêbado e caiu do beliche, quebrando a perna em dois lugares. Foi uma fratura grave, e tentou tirar o nosso couro. Pediu uma indenização altíssima. Agora nossa companhia de seguro insiste na assinatura deste documento. — Gertrude olhava nos olhos de Kevin, de modo franco, enquanto lhe estendia o documento e uma caneta. — Tomamos todas as precauções possíveis, mas ainda há riscos envolvidos, compreende? Leia com cuidado antes de assinar. Kevin assinou, pensando no que Gertrude acabara de lhe dizer. A sorte não andava a favor das Parker e... embora não soubessem ainda, havia outras notícias ruins a caminho. Kevin sabia que as mulheres reunidas em tomo daquela mesa rústica não tinham á menor idéia de que a Companhia de Empreendimentos Pace, naquele instante, em sigilo absoluto, estava a ponto de adquirir os direitos sobre os milhares de quilômetros de campinas e bosques que constituíam o seu território
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de expedições. Aquela terra, com a aprovação do governo que Barney já obtivera em caráter informal, seria transformada num complexo hoteleiro de luxo, com campos de golfe, piscinas, trilhas naturais, enfim, atrações para fisgar turistas abastados de todos os cantos do mundo. Como Barney insistia em dizer, a área estava madura, pronta para ser explorada: rica, intacta, até romântica, com suas histórias de minas de carvão, tribos indígenas e pioneiros. O desenvolvimento que a Pace promoveria beneficiaria toda a região, criando empregos e oportunidades para indústrias secundárias, lembrou Kevin. Os fins justificam os meios. Ergueu os olhos e deu com os grandes olhos azuis de Laura fixos nele. Ela sorriu de modo interrogativo, e o bolo de chocolate que um momento antes Kevin saboreava de repente se transformou em cola dentro de sua garganta.
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CAPÍTULO II
Conforme Emily prometera, partiram em uma hora, seguindo pela estrada através de túneis de pinheiros que, de vez em quando, se interrompiam, descortinando-lhes a vista magnífica do rio Elk. Havia animais de caça por toda a parte; Kevin se surpreendia com a quantidade e variedade. Veados atravessavam a estrada aos saltos, um porcoespinho gordo corria entre a vegetação rasteira, um bando de alces avançava por entre as árvores; quanto aos coelhinhos, segundo Emily, havia tantos naquele trecho da estrada que ela e Laura o chamavam de Caminho dos Coelhos. Se, naquela mesma manhã, Kevin a classificara como uma motorista veloz e imprudente, agora devia estar tendo que alterar os registros, pensava Emily. Dirigia extremamente devagar. A chamada "estrada" não passava de uma picada horrorosa, e ela manobrava o velho caminhão verde de meia tonelada como se a carga fosse tão frágil quanto taças de cristal. E de fato era, na opinião de Emily. Laura ia sentada entre ela e Kevin no banco estreito do caminhão, com o cinto de segurança sobre a barriga volumosa. Embora Emily soubesse que os solavancos na estrada não iriam provocar o parto, não gostava de arriscar nada quando se tratava da saúde da irmã Tanto Emily quanto Gertrude haviam feito de tudo para convencer Laura a ficar em casa, perto do médico, mas não adiantara. Quando Laura decidia fazer alguma coisa, ninguém conseguia fazê-la mudar de idéia. Não que Laura fosse tão frágil quanto parecia. Emily sabia que a irmã era tão saudável e robusta quanto qualquer jovem mãe poderia ser. O doutor confirmara isso, embora não chegasse a aconselhar a viagem, já que o nenê era esperado para dali a seis semanas. Não obstante, Emily tomava cuidado, assim como Gertrude. Na parte de trás do caminhão, ia á única compra extravagante que haviam feito durante meses: um sofisticado aparelho de telefone portátil que conectava o acampamento, central com um serviço de emergência que empregava helicópteros para trazer ajuda médica em uma hora, se necessário. — O rio está cheio mesmo este ano — comentou Emily, soltando uma mão do volante, para sinalizar a Laura o que dissera. Ninguém falara muito desde a partida, desde a conversa maldosa entre Emily e Laura a respeito de Kevin durante o almoço, na frente dele. Kevin recordou a conversa: — Bonito — declarara Laura, mantendo o rosto impassível. — Este é macho, não é fresco como a maioria. Por que chato? Passou uma cantada em você, será que teve essa sorte? — De jeito nenhum — respondera Emily, enfaticamente. — Certinho demais para isso. Belo traseiro, bons dentes, cabelo lindo, voz grave e sensual, coxas magníficas, mas reclama demais. Isso quando fala. Precisa tomar a pílula
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da alegria. — Laura não conseguira conter o riso nesse ponto, e Gertrude as repreendera. Emily notava o braço de Kevin estendido sobre o encosto do banco. Não tocava no ombro de Laura, mas encostava, no seu de vez em quando. Os dedos roçavam em seu pescoço com freqüência e o contato lhe dava arrepios no braço inteiro. Isto a irritava. Por que aquele homem em especial a afetava de modo tão drástico, tão físico? Não era mais uma adolescente, que diabo. Tivera um bom número de amigos do sexo masculino, e com vários chegara quase ao casamento. Algumas vezes chegara até a sentir uma atração sexual instantânea, mas o impulso sempre esmorecera e acabara morrendo assim que conhecera de verdade o objeto de sua atração. Envolvera-se seriamente com dois homens durante os últimos dez anos e ambos haviam declarado, ao final, que ela era forte demais, Forte demais para o quê? Por que deveria ser fraca, só para fazê-los sentirem-se machões? Qual era o problema que havia entre ela e os homens? Aliás, qual era o problema entre Laura e os homens, ou, para ir a fundo à questão, entre Gertrude e os homens? A mãe tivera diversos admiradores em todos aqueles anos, mas nunca se casara de novo. O pobre Sam Lucas era o último, e Emily apostava qualquer soma de dinheiro que não ia demorar muito para a mãe mandá-lo de volta a San Diego e ao seu emprego de veterinário. E Laura, então, decidida a ser mãe solteira, escolhendo deliberadamente aquele caminho e aferrando-se com teimosia a ele, apesar da óbvia devoção do pai do bebê, Jackson Briggs! Mais de uma vez, nos últimos meses, Emily sentira pena do grande e gentil Jackson. A irmã às vezes era intolerante, escondia-se atrás de sua surdez quando lhe era conveniente. Emily começava a acreditar que Gertrude havia transmitido genes exóticos a ambas as filhas. Genes que impediam as Parker de formar relações duradouras e estáveis com o gênero masculino. Será que a engenharia genética poderia fazer alguma coisa numa situação como... — Cuidado! — o aviso brusco de Kevin veio um instante depois de Emily pisar no freio. Sem perceber, fora acelerando muito nos últimos quilômetros. Agora o caminhão fizera uma curva e um enorme alce aparecera de repente à sua frente, bem no centro da estrada. Frearam a poucos centímetros do animal, e este, altivo e destemido, ficou observando o veículo por um longo instante, para depois sair saltando bosque adentro. — Maldição! —praguejou Emily, descontente consigo própria. Kevin protegera Laura com o braço para que não fosse jogada para frente com violência contra o cinto de segurança. Emily lançou-lhe um olhar de gratidão; Laura deu um tímido sorriso na direção dele e fez um sinal de "obrigada". — Desculpem-me, vocês dois. — Emily se repreendia por ficar devaneando em vez de prestar atenção à estrada. — Esses animais são um perigo. Há tantos por aqui nesta época do ano! Houve uma explosão populacional entre os animais 15
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de caça nas duas últimas estações. — Deu partida no motor e prosseguiu, mais devagar do que antes. — Pensei que a caça tivesse o efeito oposto— comentou Kevin. — De modo algum. A caça é monitorada com rigor pela comissão de caça. Tenho certeza de que há tantos animais selvagens agora quanto na época em que éramos crianças, não, é Laura? O punho de Laura se moveu para cima e para baixo em assentimento. . — Vinham aqui quando eram crianças? — o tom de Kevin era de curiosidade. -— Claro. Papai costumava nos trazer quando ia pescar e, depois que ele morreu e mamãe assumiu o controle do território, passamos quase todos os verões aqui, — Que jeito delicioso de crescer! — o tom de Kevin parecia melancólico, e Emily olhou para ele. Mas o olhar dele continuava fixo na estrada à frente, sem nenhuma emoção visível nas feições severas. — Está brincando? Quando éramos adolescentes, Laura e eu queríamos ter amigos da nossa idade em vez de ficar com mamãe e os caçadores, não é Laura? — A mão direita de Emily traduzia o que era dito para a irmã. — Mas aprendemos sobre a vida selvagem, aprendemos a cozinhar, a pescar e a limpar a caça. Depois, a trabalhar como guias. Sobrevivemos. A conversa se arrastava enquanto atravessavam um leve desmoronamento na estrada e começavam a subir um morro íngreme. — Vocês duas escolheram ficar aqui depois que cresceram, apesar de tudo. — As palavras de Kevin eram mais uma afirmação do que uma pergunta, o que surpreendeu Emily. Não pensou que ele se interessasse por sua vida. — Jamais quis ir embora, sair de casa, Emily? — Claro! Na verdade, saí. Freqüentei a faculdade por um ano depois de acabar o colégio. Mamãe insistiu. Mas não era o que eu queria, então voltei e comecei a trabalhar com mamãe. Laura fez o mesmo. Passou um ano em Vancouver. Detestou. Nenhuma de nós se adaptou à vida na cidade. Acho que somos garotas do campo, até o fundo da alma. E há anos somos parceiras da Vale do Elk Excursões, mamãe, Laura e eu. Tanto nossas vidas quanto nossos negócios estão centrados aqui. Mais uma vez, passaram-se vários minutos até vir à próxima pergunta. — O marido de Laura também está ligado a Vale do Elk Excursões? — Laura não é casada. E eu também não. E você, Kevin? — Não. — Ele não falou mais nada, e Emily também não. Não precisava ter declarado o seu estado matrimonial e, pior, por que perguntara o dele? Também não era fácil explicar a opção de sua irmã e, além disso, não era da conta de ninguém. — Em que você trabalha Kevin? — Emily desviou o foco da conversa para ele. — Sou engenheiro, mas estou lidando com negócios. Investimentos.
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Ela supôs que se referisse à bolsa de valores. Haviam tido alguns corretores como clientes nos últimos anos. Ela e Laura brincavam que esse tipo de homem só sentia atração por suas calculadoras de bolso. Aquela idéia nem lhe passara pela cabeça em relação a Kevin Richardson, contudo. Ele irradiava uma sexualidade forte e natural. — Gosta do que faz? — Depois de responder a tantas perguntas sobre sua vida, chegara a sua vez de perguntar, e Emily não ia deixá-lo escapar com tanta facilidade. — Ah, gosto sim. Viajo bastante e há certo grau de desafio envolvido. Ela não falou, mas pensou que dificilmente poderia existir algo mais entediante do que as altas finanças. — É horrível ter de trabalhar em algo de que a gente não gosta. Eu me considero uma pessoa de sorte quanto a isto. Adoro o que faço. Mal posso esperar para me levantar de manha e sair em excursão. O silêncio baixou entre eles. A estrada subia e descia colinas no sopé das íngremes Montanhas Rochosas que cercavam o vale. Atravessaram uma ponte de madeira sobre o rio Elk e, muito tempo depois outra. Depois de uma hora e meia de viagem, pararam ao lado de uma sólida construção de madeira. — Acampamento central, enfim — anunciou Emily. Sentia como se estivesse dirigindo há séculos. O pavilhão principal contava com uma ampla varanda coberta, que abrigava diversas pilhas de lenha. Havia também seis cabanas pequenas espalhadas entre as árvores, um barracão com equipamentos, diversos banheiros e uma choupana onde funcionava uma sauna. As construções, todas de madeira, eram cobertas com ripas de cedro. Estacionaram numa pradaria ao lado do rio. Em todas as direções, uma vista deslumbrante dos picos cobertos de neve e dos altos pinheiros. — Ei, Laura, Phoebe está esperando por você. É a égua de Laura — Emily explicou a Kevin. — Phoebe acha que Laura é mãe dela. A pequena égua cinzenta, assim como os outros cavalos no curral, chegaram trotando junto à cerca ao verem Laura correr em sua direção entoando uma saudação sem palavras. Kevin circulou devagar, olhando em todas as direções. — É impressionante! — murmurou ele, e Emily sorriu ridiculamente feliz porque ele reconhecera e apreciara a beleza do vale. Emily começou a retirar os suprimentos da parte de trás do caminhão e Kevin logo se juntou a ela, apanhando malas, sacos e caixas de comida, sacos de dormir, equipamento de pesca e diversas selas. — Não precisa fazer isso, sabe. Você é hóspede aqui. Pode dar um passeio ou explorar o acampamento, se quiser. Laura e eu somos capazes... — Sei que são capazes. Agora poupe o fôlego e vamos tirar este material todo para fora. — Kevin riu para ela, um riso torto, brincalhão, que a fez pensar por que chegara á julgá-lo mal-humorado.
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Laura se juntou a eles e trabalharam de modo solidário, carregando coisas para o pavilhão da cozinha e armazenando-as numa peça cheia de prateleiras nos fundos. O pavilhão consistia numa peça ampla com teto de madeira podre, uma comprida mesa de madeira sobre a qual estava pendurada a maior cabeça de alce que Kevin jamais vira e várias poltronas e sofás confortáveis. No lado oposto à porta de entrada ficava a cozinha, separada do resto da peça por um balcão. Apoiado contra a parede dos fundos, um fogão a lenha de ferro. Atrás da cozinha havia uma despensa, bem equipada com prateleiras e armários para guardar mantimentos secos e enlatados. Estava repleta; parecia haver comida para todo o inverno, e com sobras, pensou Kevin enquanto levava outra caixa de legumes enlatados. Na parte da frente, janelas se sucediam ao longo de uma extensa parede, com vista para o curral dos cavalos e para o rio. Do outro lado, o pavilhão era dividido em peças. Uma peça possuía um chuveiro improvisado e uma pia, sem privada. A outra era, obviamente, o quarto da cozinheira, com um beliche, lindas cortinas amarelas e uma cômoda, e Laura jogara ali a sua mochila. Assim que todos os mantimentos foram descarregados, Laura seguiu ansiosa, para a cozinha. Logo acendeu o gigantesco fogão e colocou um avental sobre a barriga volumosa! Absorta em descascar batatas e preparar biscoitos, ignorava totalmente Kevin e Emily, deslocando-se com energia do fogão ao armário e daí até o balcão. — Laura é uma tirana na cozinha. Não quer que ninguém interfira nem tente ajudar. Gostaria de fazer uma excursão e ver o resto do lugar enquanto ela prepara o jantar? Pode escolher a cabana em que deseja ficar, também. Emily conduziu-o, sentindo-b muito próximo a seu lado. Ele passou a mão pela parede áspera da cabana, seus longos dedos quase acariciando as toras de madeira. — Quem construiu isso tudo? O acabamento é excelente! — Vô Luke construiu aquelas cabanas ali, mas estão em ruínas. Depois que papai morreu, mamãe trabalhou para vovô como guia e cozinheira e, quando ele ficou velho demais, ela assumiu o controle e alterou algumas coisas. Contratou dois carpinteiros que também eram lenhadores e reconstruiu todas as cabanas, fazendo muitas melhorias. — Emily deu uma risadinha. — Vovô era muito conservador. Quase teve um ataque quando descobriu sobre a sauna e os chuveiros que mamãe mandou instalar. Para ele, "selvagem" queria dizer o menor contato possível com a água. — Ele morreu? — Há dois anos, apenas. Com noventa e sete anos. E permaneceu ativo até o fim, mandando em todos e dando ordens a torto e a direito. Emily levou-o a uma fileira de cabanas pequenas, com telhado de palha, aninhadas entre os pinheiros, e abriu a primeira porta. O aroma dos pinheiros penetrou em suas narinas. A cabana era fresca e limpa, mas sem nenhum luxo. Um beliche de ferro e um aquecedor pequeno de madeira, em forma de barril, com uma chaminé serpenteando até o teto. Uma janela com tela, uma pilha de
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lenha e um machado para cortar aparas do lado de fora, na minúscula varanda. Uma fileira de pregos servia de guarda-roupa e as instalações de limpeza consistiam numa bacia de ferro esmaltado sobre uma caixa, com um balde ao lado. — São todas iguais. Qual delas prefere? Kevin escolheu a mais isolada, com vista para o rio. — Há ratoeiras no pavilhão da cozinha. Vou lhe armar uma com manteiga de amendoim esta noite. Provavelmente receberá algumas visitas até os pestinhas descobrirem que não é seguro viver aqui com você. Juntos, foram buscar a mochila e a maleta com a máquina fotográfica de Kevin, e Emily pegou um lençol limpo, um travesseiro e várias toalhas. Kevin levara seu próprio saco de dormir. — Nas seis cabanas há lugar para vinte e quatro caçadores, mas é raro termos tantos ao mesmo tempo. Aquelas casinhas ali são os banheiros. O da esquerda é o dos homens. — Emily conduziu-o e abriu a porta, revelando várias prateleiras, todas repletas de selas, arreios, equipamentos de pesca, botas impermeáveis, pelegos, serrotes, enxadas e grande variedade de outras ferramentas. — Esta outra choupana é a sauna. É self service. — Emily abriu a porta. Dentro havia um fogão a lenha compacto, uma lanterna à prova d’água, um tanque de zinco ladeado por grandes pedras brancas, vários baldes e bancos para se sentar em dois níveis. — Depois de um dia cavalgando, escalando montanhas e entrando de nesses riachos frios como gelo, é maravilhoso acender o fogo, respirar um pouco de vapor, tirar a roupa e relaxar. Kevin sentiu seu corpo enrijecer e inchar desconfortavelmente diante da imagem que as palavras de Emily evocavam. Imaginava nitidamente o corpo bronzeado de Emily nu, úmido e brilhando sob a luz esfumaçada da lanterna; as longas pernas estendidas naquela peça quente e envolta em vapor... Forçou-se a abandonar a fantasia, lembrando-se com violência do motivo de sua presença ali, do objetivo oculto de sua viagem. Tinha de se controlar. Não podia deixar que aquela mulher o afetasse daquele modo. Acima de tudo, precisava sufocar aquela sensação desagradável no estômago que o assaltava todas as vezes que se lembrava do verdadeiro motivo da viagem. Muitas pessoas dependiam dele; altas somas de dinheiro estavam envolvidas; o potencial de lucros era imenso. E o cenário era ainda mais deslumbrante do que imaginara, mesmo tendo visto diversas fotografias da região. Era preciso estar ali, respirar aquele ar, sentir a grandeza majestosa das montanhas a fim de apreciar integralmente o esplendor do vale. Não havia dúvida: um empreendimento como o que Barney planejava alcançaria um sucesso além de todos os seus sonhos. Pela vigésima vez naquela tarde, disse a si próprio que não iriam se aproveitar de Emily e de sua família; elas seriam muito bem pagas por todos os investimentos que haviam feito no acampamento e no resto do território. Além 19
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disso, cuidaria pessoalmente para que recebessem um generoso bônus pela boa qualidade e reputação de seus negócios. Que diabo, elas iam ficar bem em termos financeiros, teriam dinheiro suficiente para se estabelecerem em qualquer outro negócio que escolhessem. Afinal, trabalhavam duro ali e mereciam receber por seus esforços. Logo que chegara, concluíra apressadamente que a Vale do Elk Excursões era uma empresa desleixada, mal organizada. Depois de poucas horas, mudara de idéia. Era bem dirigida. Ficara surpreso e impressionado com a eficiência e imaginação empregadas para montar um acampamento como aquele e para mantê-lo. O problema era que uma parte dele queria que as primeiras impressões fossem corretas. A outra parte muito maior, e que sem dúvida envolvia partes incômodas de sua anatomia, queria que Emily não fosse tão atraente. Kevin quase desejava ser o que fingia ser: um negociante de Vancouver que estava ali para descansar e desfrutar da natureza por duas semanas. Não era bom em trapaças. De jeito nenhum. — Vamos ao curral ver os cavalos, depois já será hora de jantar. — A voz de Emily interrompeu-lhe os pensamentos. Caminhavam no chão áspero em pleno crepúsculo. Os quadris de Emily, à sua frente, moviam-se com um balanço irresistível, Kevin não conseguia deixar de observar. Respirou fundo, frustrado, e soltou o ar devagar. Seriam duas semanas difíceis... Por uma série dê razões que não previra ao deixar Vancouver naquela manhã. A canção de um pássaro despertou-o na manhã seguinte. Ainda era cedo, quinze para as seis, conforme o relógio de pulso que pendurara num prego junto ao beliche. Abrira a janela ao máximo na noite anterior, e o som do rio embalaralhe o sono. Agora o sol entrava pela janela. Estava na hora da sua corrida. Kevin se acostumara a levantar àquela hora todas as manhãs. Ainda zonzo, saiu do saco de dormir e pisou no chão áspero de madeira. Maldição, que piso gelado! Tremendo, vestiu às pressas o short e, procurava uma camiseta quando uma alegre voz feminina gritou: — Está vestido? Trouxe um balde de água quente. — Entre. — Kevin passou a mão pelo cabelo desgrenhado e a barba por fazer enquanto lhe abria a porta, apertando os olhos devido à luz do sol que entrou junto com ela. — Bom dia! Dormiu bem? — Emily parecia ter acabado de sair do banho. O rosto brilhava e o cabelo ainda estava molhado, com mechas caindo na testa, mas presos atrás numa trança. Usava um abrigo azul com gola em V e uma camiseta listrada por baixo, e o mesmo jeans do dia anterior.
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Emily recendia a sabão e a xampu de maçã, e desviou os olhos rapidamente da semi nudez de Kevin, largando o balde ao lado da bacia e virando-se em direção à porta, tudo num só movimento contínuo. — Sempre dou uma corrida antes do café da manhã. Quer vir comigo? — convidou ele. Ela lançou-lhe um olhar de esguelha, um tanto zombeteiro. — Obrigada, mas não costumo praticar jogging. Tenho mil coisas a fazer. Fique na estrada e cuidado com os ursos. Há um monte deles por aí. Se vir algum seguindo você, encontre um morro para descer. Não são bons em descidas; as pernas traseiras batem nas orelhas e acabam caindo. Pelo menos era o que vovô dizia. Boa sorte, em todo o caso. O café estará pronto quando voltar. Isto é, se voltar. — Em provocação, Emily acenou e sorriu para ele por sobre o ombro, batendo a porta atrás de si. Kevin ficou observando-a por um momento e então começou a rir. Ursos, essa era boa! Calçou o tênis e partiu para a estrada áspera e empoeirada, ainda sorrindo. — Já levantou? Está mal-humorado esta manhã? Usa pijama? — As perguntas de Laura bombardearam Emily assim que entrou no pavilhão da cozinha. O fogão expelia ondas de calor bem-vindas, e Laura estava ocupada misturando a massa das panquecas e preparando o bacon. O aroma de café recém-feito e de biscoitos quentes se espalhava pelos ares. Emily contou sobre o jogging e fez a irmã rir com a história dos avisos sobre os ursos. No entanto, durante todo o tempo em que mexia os dedos para se comunicar com a irmã, não conseguia tirar da cabeça a imagem de Kevin Richardson usando short e nada mais. O que estava acontecendo? Estava mesmo babando por um cliente, com todos os demônios? Não brincou com Laura a respeito disso como costumava fazer. Não achava graça nenhuma, Na verdade, tivera de se conter para não passar os dedos nos pelos negros daquele tórax másculo. Como ele arranjara um bronzeado tão perfeito naquela época do ano? Não chovia quase o tempo todo em Vancouver? — Os ombros eram notavelmente largos, os braços mais musculosos do que suspeitara no dia anterior. E aquele maldito short negro acentuava... bem... acentuava tudo, em vez de esconder. Que mais? Tudo! Os quadris estreitos, o traseiro firme. As pernas longas, fortes e bem proporcionadas, Até a forma dos pés, ela apreciara... Pés? Sentia atração pelos pés de um homem, santo Deus? Controle-se, mulher. Esta vida selvagem está te deixando louca. Menos de uma hora mais tarde, Kevin chegou para o café da manhã. Barbeara-se e o cabelo molhado indicava que fizera bom uso do balde d'água fornecido por Emily. Agora, pelo menos, pensou Emily, estava decentemente vestido, com um jeans e uma camiseta em padrão escocês, com botas marrons gastas. Teve de reconhecer, no entanto, que essa vestimenta não era tão atraente quanto o short negro.
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— Foi boa a corrida? — Emily entregou-lhe um copo dê suco de laranja. Depois pegou o bule de café do fogão e serviu-lhe uma xícara. — Ótima. E não vi nenhum urso. Não estava zombando de mim estava? Ela sacudiu a cabeça, estendendo-lhe o café e tentando não rir. — Não! Você só teve sorte. Há ursos atrás de todos os arbustos por aqui. Sente-se, Laura está trazendo o seu desjejum. — Já comeram? — Ainda não. Estávamos esperando você, caso conseguisse chegar vivo. Ele se sentou e Emily, prudente, escolheu a outra extremidade do banco. Laura serviu uma boa dose de mingau em suas tigelas e colocou pratos de panquecas, ovos com bacon e biscoitos na comprida mesa antes de se sentar. — Sempre fazemos mingau até o creme fresco que trazemos azedar — explicou Emily, despejando uma dose generosa sobre o cereal quente e alcançando-lhe o jarro e o açúcar mascavo. — Não como mingau desde o internato. — Encheu a boca de mingau, depois acrescentou. —Mas este não se parece em nada com o «que eles chamavam de mingau. O deles era grudento e frio, em geral. Este aqui é ótimo. — Por que foi para o internato? — Emily estava faminta. Apanhou uma fatia de pão torrado feito em casa e passou geléia de morango em cima. — Minha mãe adoeceu. Era mais prático ir para o internato. — Cresceu em Vancouver? — Emily usava uma linguagem taquigráfica de uma mão só para dar a Laura pistas sobre a conversa. — Sim. — Mais uma vez, ele não facilitava a comunicação. — Tem um zíper na boca, este cara. É preciso arrancar as informações a fórceps — sinalizou Emily a Laura. Kevin olhou para elas e, curioso, ergueu uma sobrancelha. Emily falava para distraí-lo dos gestos dos dedos. — Acho que vamos subir o rio hoje. Existem cachoeiras que você vai querer fotografar. E podemos levar o equipamento de pesca, caso queira arriscar... Os olhos dele cintilaram. — Parece ótimo. — Vou pedir a Laura que prepare lanches para nós e partiremos logo após o café. Sabe andar a cavalo, não? — Com perfeição. Desde criança! — Tão bom assim, é? Kevin fitou-a com um olhar de desafio. soubesse, diria?
— Não diria que sei se não
— Cavalga ou não? — interrogava Laura, em gestos rápidos. — Ele diz que é especialista no assunto. Vamos dar Fantasma para ele montar e ver como se sai — respondeu Emily.
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Laura sorriu aquele amplo sorriso inocente que enganava as pessoas que não a conheciam e achavam que era fraca e sem malícia. — Ele assinou o documento. Não vai nos processar, isto é certo. É melhor levar anti-sépticos. — Laura levantou da mesa e começou a cortar pão para os sanduíches. — anti-sépticos, que nada! — Emily comia com uma mão e continuava a conversa com a outra. — Maleta de primeiros socorros completa, se ele é tão novato quanto imagino! — Quero assistir ao espetáculo! — Entre duas frases, Laura enfiou brownies e maçãs em dois grandes sacos de papel. — Fantasma é um cavalo doido. -— Devíamos cobrar ingresso... — Emily sorriu para Kevin com um ar de santa, terminou sua última panqueca e levantou-se. — Kevin, vou encilhar os cavalos. Descanse e tome outra xícara de café. — Última ceia, pobre rapaz — transmitiu Laura a Emily enquanto enchia de novo a xícara de Kevin e lançava-lhe um dos seus sorrisos de santa. — Que pena. Ele é tão bonito — Mais sensual do que bonito, acho. Esta boca foi feita para beijar. Em todo o caso, ele a usa bastante para se gabar. — Vejo-o daqui a pouco, Kevin. — Assobiando alegremente, Emily seguiu para o curral.
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CAPÍTULO III
Dentro do curral, Kevin enfiou o pé no estribo, segurando firme as rédeas. O cavalo cinza - malhado recuou para a esquerda e Kevin pôde ver-lhe a órbita dos olhos. — Ô-ô-ô, rapaz. Calma! As jovens não lhe haviam dito o nome do cavalo, mas ele o aprendera através da linguagem de sinais: Fantasma. Soubera também de outros detalhes fascinantes. Aquele cavalo de aparência dócil não era muito bom da cabeça, se Kevin entendera direito os sinais das mãos rápidas. E, pela expressão zombeteira de Emily, intensificada por um brilho satânico em seus olhos verdes de longos cílios, com certeza entendera tudo muito bem. Kevin jogou a perna para cima com rapidez, certificando-se de ter as botas bem presas nos estribos antes de dar alguma folga ao animal. Foi um movimento esperto, porque, no instante em que o soltou, Fantasma ficou alucinado. O animal corcoveava, pinoteava e disparava de um lado para o outro, fazendo todo o possível para derrubar Kevin. Mas os anos de lições de montaria e um verão trabalhando numa fazenda tinham servido para alguma coisa, e ele se manteve lá em cima, não com facilidade, mas com segurança. E finalmente Fantasma começou a ceder. Pouco a pouco, o animal cansou, até que, com uma ou duas convulsões finais, esmoreceu, amando os flancos, baixando a cabeça, embaraçado e exausto. Kevin assumiu o comando, impelindo Fantasma até o outro lado do curral, onde Emily, empoleirada em cima da cerca, amarrara a sua própria montaria. — Acabou o rodeio, podemos ir agora? — Kevin saboreou a cara de espanto de Emily. Com os olhos verdes arregalados e desconfiados, Emily esperava ouvir uma acusação pelo que havia feito. Em vez disso, Kevin lançou-lhe um olhar inocente e amistoso. Com o canto do olho, ele viu Laura sair da varanda, de onde assistira ao espetáculo, e entrar no pavilhão. — Claro claro. — Enrubesceu enquanto ele a fitava, e gaguejou: — Olhe Kevin, desculpe. Foi só uma brincadeira. Disse que sabia cavalgar e nós pensamos... Bem, eu só... Quero dizer, o solo é macio; e achei que você não ia... — A voz dela foi sumindo. — Quebrar nada quando caísse? E mesmo se caísse, assinei aquele maldito papel, não foi? — Ele saltou fora da sela e amarrou Fantasma à cerca. Emily desceu da Cerca e encarou-o, agora com o rosto totalmente vermelho. — Tem todo o direito de ficar furioso. Como falei, peço desculpas. Ei, você é bom cavaleiro! Se quiser, vou selar outro cavalo para você. Este aqui é... bem, é um tanto imprevisível.
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— Não é preciso. O velho Fantasma e eu já nos entendemos. Vamos formar uma ótima dupla! — Deu umas pancadinhas no pescoço do animal. — Certo Fantasma? Não precisamos de nenhuma maleta de primeiros socorros. — O tom de Kevin era falsamente brando. Agora o rosto dela empalidecia à medida que ele falava. — Como... como soube? — Este cara com zíper na boca não fala muito, mas observa. Emily parecia prestes a desmaiar. — Oh, meu Deus! Santo Deus. Você... você fala... Você entende... linguagem de sinais? — Acertou, mais uma vez! Ando meio enferrujado nisso, mas estou entrando em forma de novo, à medida que observo Laura e você. Os olhos dela se esbugalharam, o queixo caiu e uma expressão de horror absoluto se apossou de suas feições ao lembrar mentalmente de todas as coisas que Laura e ela haviam comentado na frente dele. Fechou os olhos e gemeu quando se lembrou de tudo aquilo. Então os abriu de novo e tomou à ofensiva. — Isto foi sujeira sua. Não acredito que possa ser assim tão baixo! São raras as pessoas que sabem a linguagem. Devia nos ter contado de imediato — falou Emily, em tom zangado. — Mas você não perguntou, não é? Na verdade, não me deu oportunidade de falar muito. Já nos primeiros minutos teria sido embaraçoso para vocês duas se eu confessasse, então achei melhor bancar o mudo. — Kevin se divertia. — Além disso, foi muito educativo, Emily. Todos aqueles comentários elogiosos sobre o meu físico... e os nada elogiosos sobre a minha personalidade... As faces de Emily se tingiam de escarlate, os olhos chispavam, os lábios se enrijeciam. Kevin sabia que ela queria matá-lo, e não pôde conter o riso. Ela era sempre tão convencida e confiante, com ar de dona da bola. Fora maldade dele, mas ela merecia. A raiva se apossava de Emily. A cor que afluía à pele bronzeada, o queixo redondo saltado, a expressão provocante daqueles lábios cheios... — É bom saber que uma mulher atraente me acha sensual — sussurrou. Num impulso, segurou-lhe os ombros, puxando-a para perto. Ela resistiu, mas Kevin foi rápido. — E aqueles comentários sobre os meus lábios... — O que pensa que está... A boca de Kevin tapou a de Emily antes que pudesse terminar a frase. Ele havia planejado um beijo leve, de brincadeira, um jeito de se vingar de todos aqueles comentários espirituosos a seu respeito. O problema é que as coisas não saíram como planejara. Os lábios de Emily eram incrivelmente macios e doces sob os seus, e a pele exalava o aroma silvestre das montanhas. Sentia o calor sedutor do corpo de Emily, a pressão dos seios contra seu peito... Um tipo de loucura se apossou de Kevin, e o beijo saiu de seu controle. Emily sentiu-se paralisada. Recuara diante do primeiro toque, tentando escapar, mas ele era incrivelmente forte, muito mais forte do que imaginara. Sem 25
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forças, cedera ao abraço e, antes que pudesse entender o que acontecia, ele a estava beijando. A boca de Kevin capturara a sua, os lábios cobriam os seus rijos e insistentes. O coração de Emily começou a bater loucamente. Sabia que precisava se afastar, virar a cabeça, dar-lhe uma joelhada na virilha. Sabia o que fazer e como fazer. O desejo a traiu. Alguma parte dela quisera aquele beijo, criara fantasias sobre como seria sentir a língua dele pressionando-a para abrir passagem. Emily tremia. Os lábios se abriram. Os braços dele deslizaram por seus ombros, pelas costas, contornaram-na, apertaram-na com uma insistência sedutora. Suas próprias mãos, hesitantes, se ergueram, tocando nos braços dele, envolvendo o corpo másculo, deixando-o puxá-la mais para perto, estremecendo a sensação dos músculos rijos sob a camisa xadrez. As línguas se encontraram e Emily sentiu-se em chamas. Uma explosão de desejo a percorreu, fazendo-a querer comprimir-se a ele ainda mais. Quando o beijo se aprofundou, gemeu suavemente. A respiração de Kevin era pesada, como a dela. Ao sentir o membro ereto pressionando suas coxas, no entanto, Emily voltou à realidade. O que estava fazendo? O que estava fazendo, ali, em pé, em plena luz do dia, beijando um cliente como se fosse uma ninfomaníaca? Desvencilhou-se dos braços dele, recuando aos tropeções e quase caindo quando a bota bateu numa pedra. Cambaleou, abrindo os braços numa tentativa desesperada de recuperar o equilíbrio. Num segundo, ele estava a seu lado, estendendo a mão para ampará-la. Parecia tão assustado quanto ela, mas Emily não notava. Desviou-se dele e, por um horrível instante, achou que ia irromper em lágrimas. — O que... o que pensa que está fazendo? — A voz tremia, embora lutasse para controlá-la. — Quem pensa que é? O que o faz pensar que... Ficaria grata se... se tirasse as mãos de mim, Sr. Kevin Richardson! — Engasgou o que estragou todo o efeito, do protesto. — A taxa que pagou não lhe da o direito de... de colocar as mãos em mim. E se fizer isso de novo, vai se arrepender. Posso cuidar de mim mesma fique sabendo. Já lidei com muitos caras da cidade grande que vieram para cima de mim. Maldição, os olhos dela se encheram de lágrimas. Foi andando às cegas, até dar com o seu cavalo, Conde, que aguardava pacientemente. Mas Kevin a alcançou em duas passadas, interpondo-se entre ela e o cavalo. — Emily, escute-me. — A voz dele era baixa e insistente. — O que aconteceu agora me surpreendeu tanto quanto a você. Só queria brincar com você, me vingar de alguns comentários que fez sobre mim. Emily engoliu em seco e falou, quase sem fôlego: — Ótimo! Isto, com certeza, você conseguiu.
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O pior era que não era exatamente com ele que estava zangada, e sim consigo mesma. Derretera em seus braços, retribuíra-lhe o beijo. Sua honestidade inata a forçou a admitir: — Foi minha culpa, tanto quanto sua. Eu podia ter chutado e gritado um pouco — acrescentou, com relutância. — Estou feliz que não tenha feito isso. — Sentindo que Emily estava a ponto de explodir de novo, Kevin levantou a mão para contê-la. — Olhe Emily, foi só um beijo, pelo amor de Deus. Não somos adolescentes. Não podemos esquecer isto tudo e sermos amigos? Vamos passar as próximas duas semanas juntos e, se ficar me fuzilando com os olhos deste jeito, não vai ser muito divertido. Richardson estava sendo razoável, apesar do descaramento. E Emily se esquecera completamente de que ele era um cliente. Tinha pago bastante dinheiro pela excursão, um dinheiro de que as Parker precisavam desesperadamente. Mesmo assim, precisou realizar um esforço sobre-humano para concordar: — Tem toda a razão. Você me pegou desprevenida, só isso. Então... este... pequeno incidente... já está esquecido, no que me diz respeito. — Esta era a maior mentira que dissera nos últimos tempos. Estranhou que o nariz não tivesse crescido. — Bem, se quer mesmo ir com Fantasma, vamos embora. Vou dar uma corrida até a cozinha e pegar os lanches com Laura, então partiremos. Pegar os lanches com Laura não era tão simples assim. A irmã assistira à cena toda e não deixou Emily sair até obter uma explicação detalhada. O rosto de Laura ficou branco ao saber que Richardson conhecia os sinais. — Não é possível! Mesmo? — Bateu com a mão na testa e girou os olhos. — Falamos coisas não muito boas. Emily concordou pesarosa. — Pode apostar nisso. — Ficou zangado com a gente? — Não exatamente zangado. Achou divertido. Mas eu morri de vergonha. Laura assumiu um ar pensativo. — Então por que ele beijou você? Emily deu de ombros de um jeito estranho. — Machismo. Quem sabe? Falou que estava tentando me dar uma lição, você acredita? Agora, por favor, Laura, onde estão os lanches? Precisamos ir. Mas Laura não tinha pressa. — Então por que retribuiu o beijo dele? Emily perdia a paciência. — Como diabos vou saber? Quem nomeou você guarda, pra ficar cuidando dos beijos? Vamos, Laura, por favor. Os lanches! Conversamos sobre isso mais tarde. — Franziu o cenho, lembrando-se. — Não na frente dele, é claro. Laura entregou os generosos pacotes de comida e bebida. — Pareceu-me um beijo apaixonado... Lembre-se quando chegar a hora pratique sexo seguro — Laura advertiu Emily, com uma piscadela.
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— Você é insuportável. Justo quem me dando conselhos a respeito de sexo... — Deu uma batidinha na barriga da irmã. — Sei por experiência própria — declarou Laura com um olhar tão sensato que Emily teve de rir. A atmosfera entre eles era de constrangimento ao partirem, seguindo a direção do rio. Durante alguns quilômetros, ninguém falou nada. Aos poucos, entretanto, a beleza da manhã e o esplendor selvagem do ambiente aliviaram as tensões. Kevin fora buscar a maleta com a câmera antes de partirem e parou várias vezes para fotografar o rio e as montanhas, sempre com Emily em primeiro plano. — Paisagens são entediantes se não houver alguma presença humana — declarou Kevin diante da objeção de Emily em ser fotografada com tanta freqüência. — Já vendeu as suas fotos? Havia espaço para os dois cavalos andarem lado a lado no caminho, e Kevin segurara o seu até ficar junto a Emily e Conde. Fantasma estava se comportando muito bem, respondendo a todas as solicitações de Kevin. A pergunta era difícil de responder. Suas fotos eram usadas nos folhetos da companhia, feitos para despertar o interesse nos novos projetos da Companhia de Empreendimentos Pace. — Não trabalho como free-lance, não. — Kevin contornou a questão, e uma sensação de inquietude apossou-se dele, a mesma sensação que o incomodava desde o encontro com as três Parker no dia anterior. Por alguns momentos, a abóbada azul do céu lhe pareceu um pouco mais sombria e o sol menos quente e amigo. Além disso, sentia-se estranho desde o beijo. Não conseguia olhar para ela sem lembrar-se de como era suave, quente e macia a pele de Emily contra o seu rosto, da intensidade com que o corpo dela respondera ao seu. — Já tentou fotografar, Emily? Ela sacudiu a cabeça. — Nem tenho máquina. Quando era mais jovem, certa vez, tanto insisti que ganhei uma aquarela de Natal. Estava decidida a capturar tudo isto. — Estendeu o braço, indicando às montanhas, o rio, as árvores. — Pratiquei muito, muito, durante um verão inteiro, mas jamais consegui. Eu sabia como queria que ficasse, mas não conseguia chegar lá. Meu trabalho era certinho e amadorístico, e fiquei frustrada porque não era o que pretendia. Então dei todo o material para Laura. Essa minha irmã! Ela nem tentou pintar paisagens. Só se divertiu, cobrindo o papel com misturas loucas de cor e criando flores diferentes de todas as que já vi. Não tinha idéias preconcebidas, só se divertia. Laura é assim. — Ela nasceu surda? — Nasceu. Foi duro para os meus pais. Fantasma e Conde seguiam lado a lado pela trilha. Depois de um momento de reflexão, Kevin comentou: — Duro para você, também, imagino.. Emily lançou-lhe um olhar surpreso. — Por que diz isto? Ele deu de ombros.
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— Tive um amigo na escola que possuía um irmão surdo. As atenções dos pais sempre se voltaram para Billy, e Jason se sentia abandonado. — Ah, então foi assim que aprendeu os sinais. Bem, não foi assim entre Laura e eu. Sempre fomos íntimas. Aprendi a linguagem de sinais junto com ela, quando era pequena. Acho que sempre nos entendemos perfeitamente. — Ela freqüentou escola para surdos? Billy foi para Jericho Hills, um externato, mas muitos meninos surdos iam para internatos. — Freqüentou aos dezesseis anos, por um ano, mas quando éramos pequenas, mamãe não queria deixá-la ir. Achava que seria como punir Laura por ser surda. Lembro-me de que ela e papai brigavam muito a respeito disso. Ele achava que ela devia ir para uma escola especial, mas mamãe venceu a briga e Laura foi para a escola comum junto comigo. Foi difícil para ela, mas havia uma professora que sabia a linguagem dos sinais e ajudou Laura a superar as dificuldades. — Os coleguinhas não zombavam dela? Emily empinou o nariz e encarou-o. — Não ousariam. Se fizessem isso, eu ia bater neles até virarem mingau. Kevin não pôde deixar de rir da expressão que ela usara e de sua veemência. — Você era durona, então, hein, Emily! — Ainda tinha aparência de durona, mas só aparência. — Precisava ser. Só tínhamos uma à outra, Laura e eu. Algo naquela resposta franca o comoveu. — Você a protegia. — Cuidávamos uma da outra, sabe como é. Não teve irmãs? Ou um irmão, talvez? — Nada. Sou filho único. — A trilha estreitou-se e ele puxou as rédeas, deixando Emily tomar à dianteira, aliviado porque ela teria de parar com aquelas perguntas sobre a infância. Kevin acertara. Houve poucas oportunidades para conversarem durante o trecho seguinte da viagem. Subiram num penhasco, depois desceram a uma bacia e, a seguir, escalaram o íngreme lado da montanha até saírem num platô, com vista para o vale lá em baixo. Era deslumbrante, mas Kevin começava a perceber que quase todos os lugares daquela região eram sensacionais. — Vamos parar aqui para o lanche, se quiser. — Emily puxara Conde para a sombra de uma árvore junto a um riacho. Apeou e deixou o cavalo beber água. — Parece ótimo. — Kevin sentia calor e fome. O café da manhã havia sido há muito tempo e os músculos de seus braços e pernas começavam a ficar tensos em razão do rodeio matinal com Fantasma. Apeou, levando Fantasma para beber ao lado de Conde. Deixaram os cavalos pastando. Emily tirou os lanches dos alforjes. Pegando a garrafa térmica, serviu um copo de limonada a Kevin, que o esvaziou num só gole. Emily encheu-lhe outro copo e desembrulhou os lanches. Ele sentou-se de pernas cruzadas sobre a relva, devorando os sanduíches de salada de ovo que Laura preparara.
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— Bolinho de trigo? Biscoito de aveia? Kevin pegou um de cada. — Esta comida é deliciosa. Comida feita em casa tem sabor muito diferente da comprada pronta. — Com certeza existem mulheres habilidosas em Vancouver para preparar comida caseira para você, não? — Assim que a pergunta saiu de sua boca, Emily teve vontade de se socar por havê-la formulado. Lá estava ela, mais uma vez, xeretando em busca de detalhes da vida dele. Por que, com mil demônios, isso lhe interessaria? Mas a verdade é que lhe interessava, sim. Era desconcertante, mas aquilo lhe interessava muito mais do que queria admitir. Kevin mastigou um pedaço gigante de bolo e engoliu antes de responder. — De vez em quando. Mas em geral é pato à laranja ou alguma outra frescura. Jamais conheci alguém que fizesse pão caseiro e biscoitos como estes. — Ora, é óbvio que anda transitando nos círculos errados. Ele a fitou longamente, sem sorrir, o que a deixou constrangida. — Talvez esteja certa. E você, Emily? Que círculos freqüenta? Há algum homem em sua vida, algum caso sério? Ela desviou os olhos, mirando o riacho azul. — Não. Nada sério. — Nenhum caso, na verdade, há um ano ou mais, mas não ia confessar isto. — Nunca se casou? — Kevin jogou a pergunta de modo casual, e Emily se esforçou para responder no mesmo tom. — Nunca. Parece que as Parker não foram feitas para o casamento... E você? — Casei-me uma vez, com vinte e poucos anos. Durou só oito meses. Esta informação a surpreendeu. Por alguma razão, presumira que sempre fora solteiro. — Há quanto tempo foi isso? — Era um jeito disfarçado de descobrir a idade dele. — Há quatorze anos. Tenho trinta e oito agora, tinha vinte e quatro na época. Quantos anos você tem, Emily? Kevin não dava nada sem exigir uma compensação. Não que Emily se importasse em revelar aquilo, sempre achara estúpidas as mulheres que tentam ocultar a idade. — Tenho trinta anos. Faço trinta e um em agosto. Ele sorriu para ela, brincalhão. — Uma criança ainda! — E que criança! Rugas, celulite, cabelos brancos, vista fraca, falta de fôlego... — Apertou os olhos e fez um som com a garganta como se o pulmão estivesse nas últimas.
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Kevin riu como Emily esperava. Era um riso profundo e sincero, e seus olhos ganharam rugas simpáticas, que davam personalidade ao rosto. Ela ficou pensando por que ele não ria mais vezes. — Que engraçado, não notei que você estava assim, nas últimas! — Disfarço muito bem! Mamãe diz que, depois dos trinta, o importante é se cuidar. — Ela entende disso. Ainda é uma mulher muito atraente, a sua mãe. Emily sorriu, satisfeita com o elogio como se houvesse sido dirigido a ela própria. — É não é? Não que ela passe o tempo se tratando. Está sempre ocupada demais, mesmo para ir a Cabeleireira. Laura e eu temos de enfiá-la no jipe e levála à cidade quando começa a ficar com cara de Medusa. Mamãe sempre diz que não importa a aparência de seus cabelos, porque ela é do tipo camponesa. Vendo que, sem que esperasse, haviam alcançado certo grau de intimidade, Emily ousou acrescentar: — E a sua mãe, Kevin? Como é? É do tipo camponesa, também? Sua expressão tornou-se severa, e Emily achou que uma porta havia-se fechado repentinamente entre eles. — Ela morreu — declarou ele, de modo abrupto. Levantou-se, pondo fim à conversa. — Vou andar por este penhasco um pouco e ver se tiro algumas fotos do mundo selvagem lá embaixo. Sentindo-se mal por ter reavivado lembranças (dolorosas, Emily o viu se afastar. A morte da mãe devia ter ocorrido recentemente, caso contrário não reagiria daquela forma. Mas como ela poderia saber? Arrumou as coisas e limpou o local, sempre pensando em Kevin Richardson. Era um homem estranho, amigável e caloroso num minuto, frio e distante no outro. Aquele beijo não fora nada frio, contudo. Uma onda de calor a percorreu ao lembrar-se daqueles momentos nos braços de Kevin. Além do mais, ele era interessante sob outros aspectos. Até possuía senso de humor por trás daquela severidade exterior. Desejava que ele não fosse um cliente, que iria passar só duas semanas ali e ir embora. Não haveria tempo suficiente para se conhecerem de verdade. Mesmo que houvesse tempo, Emily dizia para si própria de modo sarcástico, o que iria sair dali? Ela era uma caipira, por escolha. Ele era um homem de negócios da cidade grande. O abismo entre eles iria ficar cada vez maior quanto mais se conhecessem e, um belo dia, quando estivesse totalmente apaixonada, ele lhe diria que ela era forte demais para um homem se sentir confortável a seu lado. Era uma pena, mas aquela verdade Emily aprendera do modo mais difícil. A vida que escolhera para si não era uma vida que os homens da cidade desejassem por mais de duas semanas, e esta não era o tipo de mulher que os
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homens elegeriam para um compromisso durável. E, com certeza, ela também não queria o tipo de vida que eles levavam. A vida implicava em escolhas, e era preciso desistir de algumas coisas desejáveis. Pior: em geral, não era fácil desistir dessas coisas. Desistir, por exemplo, de fazer sexo com alguém que se ama, numa relação de base sólida e cotidiana. Emily imaginava que iria gostar muito disso. E os risos, o amor, os bebês, um ombro forte para se apoiar quando necessário alguém a seu lado durante a noite. Viver com um homem que a compreendesse que a desejasse do jeito que ela era.
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CAPÍTULO IV
Kevin percebia que ela o observava. Lutava, envergonhado, contra as poderosas emoções que a menção à mãe lhe haviam despertado: prolongava o ritual de focalizar a câmera num esforço deliberado para recuperar o controle antes de falar com Emily novamente. Era um homem adulto. Por que diabos a sombra de uma mãe que jamais conhecera o perseguia daquela forma? Por que justo naquele dia se passara meses, quase anos inteiros, sem pensar nela? Sem prestar muita atenção à vista, gastava filme, tirando uma foto atrás da outra. Às vezes ficava de costas e se afastava ainda mais de Emily para não ter de fingir que estava fotografando. As emoções que tentava suprimir o dominavam: raiva, saudade e uma carência de afeto que julgara extinta com o fim da infância, há muito tempo. Arriscou olhar para Emily por entre as árvores. Ela estava sentada sobre um tronco, o queixo entre as mãos, fitando o vale sonhadoramente. O modo como se sentira tinha algo a ver com ela, com a forte ligação existente entre Emily, a irmã e a mãe. Era como se laços invisíveis unissem aquela família, e isso contrastava de modo chocante com as suas próprias relações familiares. Jamais tivera a oportunidade de conhecer a mãe, e o que havia entre ele e o pai não era nem uma pálida imitação daquela relação existente entre as Parker. E isso o incomodava. Emily o viu entrando no bosque e deu-lhe um bom tempo antes de chamálo. Ali, afinal, certas necessidades vitais precisavam ser cumpridas da maneira primitiva. Por fim, quando o sol já ultrapassara em muito a metade de seu ciclo diário, Emily impacientou-se. — Kevin? Ei, Kevin, está pronto? — A tarde estava passando e ainda tinham alguns quilômetros de cavalgada antes de chegarem ao rio onde ele poderia pescar. Também não sabia a que ponto ele seria capaz de se localizar se entrasse muito no bosque. Não seria a primeira vez que um desses almofadinhas da cidade se perderia num simples passeio. Se bem que, depois daquela cena da manhã entre Kevin e Fantasma, Emily não ousaria chamá-lo de almofadinha. Parecia bem capaz de se cuidar sozinho em situações difíceis. — Estou indo! — O grito ecoou nas encostas das montanhas e logo Kevin apareceu, aproximando-se com o seu jeito de andar solto e elegante, sem dizer nada. Seguiu direto rumo aos cavalos e montou.. — Achei que, se quer pescar alguma coisa ainda hoje, seria melhor seguirmos em frente logo — explicou Emily, montando em Conde e conduzindo-o para uma trilha quase invisível. — Ainda temos meia hora de cavalgada até o rio. Kevin não replicou, e continuaram a viagem em silêncio, descendo até o fundo de uma bacia escavada há séculos pelo rio.
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Captando o estado de espírito dele, Emily desembrulhou o equipamento de pesca em silêncio, ajeitando tudo no local adequado e deixando-o mais ou menos a sós. Ele agradeceu polidamente, mas não tentou puxar conversa. Voltara ao que ela rotulava como estado de espírito sombrio. Emily se perguntou se a mãe jamais o prevenira de que seu rosto poderia congelar se não sorrisse logo, como Gertrude fazia sempre que ela ou Laura ficavam carrancudas. A primeira fisgada mudou tudo, porém. Ela levara seu próprio caniço alguns metros rio acima e se entregara ao ritmo e à graça de jogar a linha na água e deixá-la seguir a correnteza, depois recolhê-la e jogá-la outra vez. Ouviu o grito entusiasmado de Kevin e recolheu a linha, correndo a tempo de vê-lo puxar para a terra uma truta de tamanho considerável. — Puxa, é uma beleza, não é? — Kevin estava excitado como qualquer pescador ao segurara truta para ela admirar. — Se conseguir pegar mais umas duas dessas, Laura prepara para o jantar. — Emily deu um suspiro. — Mas é claro que é pura sorte de iniciante, então acho que eu é que vou ter de pescar o resto da cota se quisermos comer. — Está me desafiando a uma competição, Srta. Emily? — Seus olhos brilhavam de prazer, voltara a sorrir. — Vamos ver quem pega mais peixe em uma hora! — Eu aceito o desafio. Mas esse primeiro não conta. Você pegou antes de fazermos a aposta. Foi só treino. — Tudo bem. Mas se eu ganhar a despeito das suas regras exijo um prêmio extra. Emily ficou desconfiada. — Que tipo de prêmio? Havia um brilho travesso nos olhos dele. — Não decidi ainda. Está com tanto medo de perder que não aceita uma aposta no escuro? Ela empinou o nariz e lançou-lhe um olhar superior. — Como tenho os mesmos direitos, é claro que aceito. Boa sorte, Sr. Richardson. Vai precisar. Detesto contar vantagem, mas sou uma campeã. Vejo-o daqui à uma hora. Ele olhou para o relógio. — As três e vinte, então. — Certo. — Com um riso que julgou confiante, Emily se afastou andando devagar. Quando teve certeza de que ele não poderia mais vê-la, contudo, saiu em disparada rumo a um ponto onde o rio formava uma lagoa e onde a pesca era abundante. Não restara muito daquela confiança anterior quando jogou a linha na água verde. — Venham, filhinhos, venham aqui com a mamãe — cantarolou. — Você trapaceou! Não é possível pegar três trutas grandes em uma hora! — Emily franziu o cenho diante do que via. Ela pescara dois, e se sentira triunfante, certa de que o venceria.
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— Onde está aquele primeiro peixe? Aposto que... Kevin sacudiu a cabeça e indicou-lhe o outro peixe, a alguns metros dali. — Está bem ali. Está me acusando de fraude? Ousa insultar a minha honra? Kevin sorria sem parar, e ela teve de retribuir o sorriso. — Além disso, como que um cara vai trapacear numa situação destas? — O jeans de Kevin estava ensopado até acima das botas; mãos e braços imundos. As covinhas que apareciam quando ele sorria surgiram em suas bochechas. — Tudo bem, você venceu. — Ela cedeu sem nenhuma boa vontade, mas de repente teve uma idéia. — Ah, esqueci de lhe dizer que o vencedor sempre limpa o peixe. É uma velha tradição do vale. — Limpar peixe não era o esporte favorito de Emily, muito pelo contrário. Entregou-lhe o canivete que sempre levava consigo. Desta vez ele caiu na gargalhada, mas aceitou o canivete. — Já que diz que é a tradição, vou cumpri-la. Mas não se esqueça de que me deve o prêmio extra. — Kevin olhou bem nos olhos dela e agora havia um brilho interrogativo em seu exame. Percorreu com os olhos todo o rosto de Emily, concentrando-se, por fim, nos lábios. Emily sentiu um calor subindo pelo pescoço e tingindo suas faces. Deus! O que é que ele tinha em mente? Fora muito idiota em concordar com algo antes de saber o que era. Sentiu como se todo o seu corpo estivesse ficando vermelho, quente e febril sob a camiseta e o jeans. A lembrança do beijo daquela manhã veio-lhe nitidamente à memória: o jeito como os lábios dele haviam encontrado os seus, a habilidade e segurança absolutas. Teria de passar por tudo aquilo uma segunda vez? Emily quebrou o encanto que parecia envolvê-los virando de repente e seguindo para o local onde os cavalos pastavam. — Sabe limpar um peixe, não sabe? — gritou, voltando-se. Ele riu de novo, um riso leve, deliciado. — Eu devia pagar para ver e dizer que não tinha a menor idéia. Aí você é que teria de limpar. — Kevin levou os peixes para a água e se agachou, segurando primeiro peixe, e destripou-o com a habilidade de quem conhece o trabalho. Emily observou, com um suspiro de alívio. Quando o último peixe, limpo por fora e por dentro, foi depositado sobre o leito de folhas verdes na cesta, Kevin esfregou as mãos sujas com o um sabão que Emily retirara do alforje. Estava ajoelhado no cascalho e ela se aproximou para entregar-lhe uma toalhinha para se secar, mas em vez de apanhar a toalha, agarrou a mão dela e puxou-a para a margem do rio, a seu lado. Emily se sentou, erguendo os joelhos à altura do queixo e passando os braços em tomo deles. E agora? Seu coração batia forte e ela dizia a si própria que só precisava lembrar-lhe de que tudo aquilo era só uma questão profissional, de negócios.
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Mas ele não fez nenhum gesto para agarrá-la. Em vez disso, ficou um pouco a distância, com os braços descansando sobre os joelhos. — Agora, quanto ao prêmio... — falou, com brandura, observando a reação dela. — Olhe Kevin, não sei o que tem em mente, mas acho que é melhor tomarmos cuidado... — desabafou Emily antes de sua garganta ficar seca e ela ter de engolir para recuperar o fôlego. Queria que ele não ficasse ali, fitando-a daquele jeito. Deixava-a terrivelmente nervosa. — O que quero dizer é que... Kevin continuou observando-a com um olhar polido e intrigado que fazia com que Emily tivesse vontade de lhe dar um soco na cara. Mas ela própria não sabia o que queria dizer. Ficava ali gaguejando como uma idiota e sabia que seu rosto estava pegando fogo.. — Só acho que não é uma boa idéia... nós... bem... nós... nos... envolvermos um com o outro — conseguiu despejar, enfim. — De certo modo. Ele não esboçou nenhuma reação. Sua expressão permaneceu a mesma, e continuou a encará-la enquanto ela sentia o calor aumentar dentro de si. Emily se indagava se ele não ia agarrá-la de repente. Estava tão quente que gostaria de levantar e entrar no rio gelado. Era horrível. Tão constrangedor! E ele não a ajudava a sair daquela situação. — Foi isso o que pensou que eu ia sugerir como prêmio? — Ergueu as sobrancelhas fingindo-se chocado e balançou a cabeça. — Ora, Emily, estou surpreso com você. Nunca pensei em usar um expediente desses para chegar a uma mulher. — O tom era franco e confidencial, e se inclinou um pouco na direção dela como se não quisesse que nem os peixes mortos ouvissem o que dizia. — Nunca precisei, entende? Emily ficava cada vez mais furiosa. Para um homem incapaz de travar a conversa mais banal, Kevin estava se saindo bem demais em fazê-la de boba. — Então... que prêmio ia sugerir? — A voz tremia, embora lutasse para controlada, consolando-se com o pensamento de que seu rifle estava à mão. Se aquilo ficasse pior, sempre podia dar-lhe um tiro. — Bem... — Kevin se apoiou nos cotovelos, parecendo indiferente ao cascalho áspero que fazia o traseiro dela doer. — Bem, na verdade... — Arrastava as palavras e continuava fitando-a com aquele olhar inocente. — Pensei em pedir que me ensinasse em detalhes à linguagem dos sinais. Entende, faz tanto tempo que não a uso, estou meio enferrujado e, embora possa entender bem. acho que não tenho tanta facilidade em "falar". Emily ficou sem fala. Seu queixo caiu, ficou possessa de raiva. Deliberadamente ele a fizera acreditar que... Ele a fizera acreditar que queria... E então ele... — Então, qual é a resposta, Emily? Ganhei a aposta, não se esqueça.
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Só o extremo autocontrole a impediu de fazer-lhe aquele sinal com um dedo só que todo mundo é capaz de entender. Desviou os olhos, fitando cegamente o rio por alguns instantes, respirando fundo e dizendo a si mesma para relaxar. — Sei que você e Laura usam um tipo de linguagem simplificada quando conversam. Gostaria de aprendê-la. — Pela primeira vez, todos os traços de zombaria desapareceram de sua voz. — Gostaria de conhecer melhor você e sua irmã, e isso não será possível sem melhorar a minha técnica. — Tocou suavemente no ombro dela com os dedos. — Desculpe a brincadeira. Era uma oportunidade boa demais para perder, depois do que aconteceu essa manhã. Perdoa-me? Emily tentou permanecer furiosa, mas seu senso esportivo venceu. Continuava achando que não fora leal da parte dele, mas, sua consciência não a deixava esquecer, o que ela e Laura haviam feito também não era. — Eu não devia ter tirado conclusões precipitadas. — Admitir aquilo era como arrancar os próprios dentes, mas ela agüentou firme. — Então estou perdoado? — Seus dedos ainda se apoiavam no ombro dela, e o apertaram com mais força, como que para enfatizar o que dizia. — Vou lhe ensinar os sinais. — De propósito, Emily evitou absolvê-lo. Ele ia ter de se cuidar, porque, quando tivesse oportunidade, ela iria retribuir. O sol se aproximava do horizonte. — Está na hora de voltarmos. Kevin se levantou num impulso ágil, estendendo as mãos para ajudá-la a erguer-se. Ela hesitou, mas acabou aceitando. Recolheram os peixes e o equipamento e iniciaram o processo de recarregar os cavalos. Quando montaram novamente, chamou-a: — Emily? Ela já estava chegando à trilha. — O que é? — Quero que saiba que há muito tempo não me divertia tanto. — A voz dele era pausada, como se tivesse de moldar as palavras e soltá-las numa certa ordem. — Obrigado. Surpresa, e mais contente do que demonstrou, virou-se na sela e sorriu para ele. — É o meu trabalho, senhor: Nosso objetivo na Vale do Elk Excursões é diverti-lo e satisfazê-lo á tal ponto que deseje voltar. Não houve resposta. Emily cavalgou por algum tempo sem se virar para olhar para ele. Quando o fez, encontrou-o de cabeça baixa, perdido em pensamentos.. — Você é muito otimista, garota. O que a fez pensar que pegaríamos alguma coisa? — Haviam chegado ao pôr-do-sol e encontrado Laura aquecendo uma enorme frigideira preta ao fogão, com um monte de batatas cortadas prontas
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para a fritura. Emily brincou com ela um pouco, fingindo que não haviam tido sorte. — Passa o peixe aqui — ordenou Laura, movendo seus dedos com impaciência. — Querem jantar, não querem? Estou sentindo o cheiro do peixe. — E... se... não... tivéssemos... pescado... nada? O que... íamos... comer? — Os sinais de Kevin vinham com dificuldade, mas Laura encantava-se com o esforço dele. — Sanduíche com salsichão. — Laura voltou ao trabalho enquanto Kevin e Emily se revezavam no lavabo, tirando a lama do corpo.. Kevin nunca riu tanto na vida quanto no jantar que se seguiu. Esforçava-se para se comunicar por sinais, e algumas de suas tentativas provocavam risadinhas nas mulheres. Laura achou engraçada a história da competição de pesca, embora Emily não houvesse contado da peça que Kevin lhe pregara. — É bom para Emily, perder de vez em quando — declarou Laura. — Ela sempre ganha: nos jogos e nos esportes. — Que esportes você pratica? — perguntou Kevin. — Basquete e várias modalidades de atletismo — respondeu Emily. — E você? — Rúgbi, futebol, natação. E você, Laura? Piscou para ele com uma expressão lasciva no rosto e apontou para a barriga dilatada. — Esportes domésticos. — Na escola, ela era tímida de dar dó, mas deixa mamãe completamente louca quando diz coisas como essa. Aliás, por isso mesmo que ela diz essas coisas, não é, Laura? — O tom de Emily era de censura. Laura concordou: — Assim ela não fica entediada. Kevin ficou pensando como seu pai reagiria diante das Parker. Não faria mal a Barney uma pitada de bom humor daquele tipo. Nunca houvera gozações ou brincadeiras entre pai e filho, isso era indiscutível. Discussões de negócios, sim. Conversas descontraídas como aquela, definitivamente não. No decorrer do jantar, as duas irmãs chegaram a parecer levianas, contando mil travessuras que haviam aprontado fazendo Kevin rir ao usarem mímica para representarem as cenas, interpretando para ele os sinais que não entendia. Sentiam-se totalmente relaxados e desinibidos, e Kevin se viu falando muito mais do que o habitual. Conversar por sinais era de certa forma, mais fácil do que através de palavras, porque era mais direto. O esforço de traduzir para o visual o impedia de controlar mentalmente tudo o que ia dizer. Naquela noite, para ele, a conversa deixou de ser um sacrifício e passou a ser um prazer. Lá fora a noite chegava, e as irmãs acenderam vários lampiões em vez de ligarem a energia elétrica. A luz suave não chegava aos cantos mais distantes da ampla peça, e as sombras se projetavam nas paredes de pedra. O brilho dourado parecia lançar um encanto mágico sobre a mesa, e Kevin sentiu seu olhar ser atraído pelas feições de Emily, intrigado pela forma como aqueles olhos verdes,
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grandes e luminosos, refletiam a luz dos lampiões. O rosto dela, sem maquiagem, era muito bonito. — A sobremesa é bolo de chocolate — anunciou Laura. Serviu xícaras de café e cortou fatias grossas de um bolo de duas camadas coberto com glacê. — Conhece o velho ditado, "o caminho para o coração do homem passa pelo estômago"? — perguntou Kevin. Quando Laura fez que sim. ele gemeu e colocou a mão na barriga. — Bem, meu estômago está a ponto de explodir, e só Deus sabe como está meu coração. — E as mulheres? — indagou Laura alguns minutos depois. — Por onde passa o caminho para se conquistar uma mulher! Kevin deu de ombros de modo exagerado, indicando que não tinha a menor idéia. — Nenhum homem sabe. Emily pensou por um longo tempo, saboreando um pedaço de bolo, sorvendo um gole de café antes de responder. — É fácil. O caminho para o coração da mulher passa pela cabeça e pela alma, Laura concordou. — Certo! Todas as mulheres querem um romance perfeito. Amor, compreensão, companheirismo, inteligência... Mas o amor pode ter significados diferentes para o homem e para a mulher, não acham? — É — Emily meneou a cabeça, assentindo, evitando o olhar de Kevin, nitidamente constrangida com o rumo que a conversa tomava, mas decidida a declarar sua opinião. — Os homens tendem a confundir sexo com amor, eu acho. — Mas as mulheres também querem o amor físico — insistiu Laura. — Acho que ambos são parte da mesma emoção. — Não é o sexo que é o grande problema entre os homens e as mulheres, de qualquer modo — desabafou Emily. — É querer mudar a outra pessoa, decidir usar o relacionamento para transformar o outro no que se considera um padrão de perfeição. Isso é uma loucura, porque não se pode mudar ninguém. E mesmo que fosse possível, aí não seria mais a pessoa pela qual a gente se apaixonou. É insano! — Nisso você tem razão. — O tom de Kevin indicava que ele possuía experiência pessoal naquilo que Emily descrevia, mas antes que uma delas pudesse interrogá-lo a esse respeito, mudou de assunto abruptamente. — Vamos lavar esta louça, senhoritas? Emily se levantou e começou a limpar a mesa. — Você cozinhou Laura — então eu lavo a louça. Laura não objetou. Espreguiçou-se e bocejou. — Grande idéia. Vou ler na cama. Boa noite para vocês dois. — Pegou um lampião e seguiu para o quarto. — Você lava e eu seco — sugeriu Kevin. esperava que ela recusasse, estava sem sorte. — Para mim está ótimo. Nem vamos lhe cobrar uma taxa extra pelo privilégio — brincou Emily. esvaziando uma chaleira imensa de água quente numa bacia de plástico e acrescentando um pouco de sabão.
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Trabalharam num silêncio amistoso na peça palidamente iluminada. Depois de guardar a louça, Emily baixou o pavio do lampião até a chama se extinguir e a peça ficar em total escuridão. Gritando boa noite a Laura, ligou uma lanterna e saiu do pavilhão à frente de Kevin. Lá fora, a lua cheia banhava tudo com seu brilho prateado. Iluminava tanto que ela desligou a lanterna; podiam enxergar o caminho só com o luar. Kevin caminhava a seu lado, bem perto, e segurou-lhe a mão. Os dedos fortes se fecharam sobre os dela, e o prazer que Emily sentiu foi algo completamente desproporcional à simplicidade do gesto. — Foi um dia ótimo. Emily. Agradeço-lhe por isso. — A voz era suave, quase terna. Apertou a mão dela, enfatizando as palavras. — No começo não foi nenhuma maravilha! — Ela relembrou a cena com Fantasma e não pôde deixar de sorrir. — Onde aprendeu a montar tão bem? — Meu pai me mandou passar alguns verões numa fazenda no Caribe, da qual é sócio. Pratiquei muito com potros xucros, mas isso faz muito tempo. O velho Fantasma me fez passar maus momentos, essa manhã. Emily ficou cm silêncio, depois comentou: — Sua família deve ser bem rica, hein? Escola particular, sócio de uma fazenda... — Quando terminou de falar, lamentou ter voltado a um campo perigoso, retomando as perguntas sobre a família. — Não somos ricos, mas não temos problemas de dinheiro. — Que felizardo! Para a nossa família, dinheiro sempre foi um grande problema. — Dinheiro não é tudo! — Havia uma veemência, talvez até amargura, em sua voz. — É engraçado que são sempre os ricos que dizem isso. — O tom de Emily era desafiador, além de aborrecido. Haviam chegado perto da sua cabana, e Kevin parou de modo abrupto, pôs as mãos nos ombros dela e a puxou para perto. — Escute, eu daria uma fortuna para ter tido uma irmã como Laura. Ou... — Engoliu o que quer que fosse dizer e fitou-a, estudando seu rosto sob o luar. As mãos pararam de apertar-lhe os ombros e começaram a acariciar-lhe os cabelos. — Você é muito bonita, Emily. Em outro momento, ele a beijaria. Ela ficou imóvel por um instante, desejando aquele beijo, e então se lembrou da trapaça que Kevin lhe armara naquela tarde. Estaria brincando de novo? Emily não ia bancar a boba duas vezes, ficando ali à espera de um beijo para vê-lo rir depois. Desvencilhou-se rudemente dele, ligando a lanterna e iluminando o caminho que levava à sua própria cabana. Não precisava da lanterna; encontraria o caminho de olhos vendados, mas a luz fazia de barreira entre eles. — Boa noite, Richardson — gritou, virando a cabeça. — Vejo-o de manhã. Ele só respondeu ao vê-la chegar perto da porta da cabana.
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— Boa noite, Emily. Durma bem. Emily pensou se aquilo seria ou não sarcasmo; o fato é que, apesar do cansaço de um dia agitado, a lua já havia se posto quando, enfim, conseguiu adormecer. Os próximos três dias foram repletos de atividades. Kevin e Emily passaram a maior parte dos dias longos e ensolarados juntos e a sós; Laura providenciava um desjejum fenomenal e os lanches para o almoço, e os dois saíam a cavalo, passavam o dia explorando lagos e rios cm busca dos melhores locais para pescar, ou de cenas para Kevin fotografar. Depois daquele primeiro dia, - Kevin trocou o imprevisível Fantasma por um garanhão fogoso chamado Lúcifer, e as expedições se transformaram em puro prazer. — Exatamente que tipo de fotos de vida selvagem você quer? — perguntou Emily na segunda manhã, enquanto subiam por uma áspera trilha rochosa a fim de chegarem a uma cachoeira que Emily queria que ele visse. — Não garanto que vá lhe mostrar todas as espécies de animais selvagens do vale, mas sei onde encontrar ursos, por exemplo, e carneiros e bodes. — Qualquer coisa que encontrarmos serve. Não tenho exigências específicas. — Sentiu de novo aquela dor na consciência que já lhe era familiar, por causa daquela mentira de ser fotógrafo. Conseguira esquecer o verdadeiro objetivo da viagem durante quase todo o dia anterior. Precisaria tirar aquilo da cabeça nós próximos dias, porque não havia possibilidade de contar a Emily ou a Laura quem ele era de verdade. Não ainda. O café da manhã tinha sido agradável, com muita camaradagem entre os três, devido à conversa descontraída da noite anterior. Emily lhe ensinara toda a linguagem abreviada de sinais, e ele agora se sentia mais um amigo do que um visitante. Amigo de Laura, pelo menos. Com Emily, havia aquela sensação desconfortável de estar na presença de uma mulher a quem beijara de modo intenso e... planejava beijar de novo. Cavalgava ao lado dela numa trilha estreita com uma densa floresta de ambos os lados. O sol é a sombra tingiam-na ao passarem pelas árvores. Emily usava um chapéu de feltro marrom naquela manhã, e a trança negra brilhava sobre seu ombro. Trajava uma camisa xadrez de algodão e aquele velho jeans desbotado. Kevin observou a cintura estreita, a curva fascinante do traseiro arredondado ressaltada de modo provocante pelo brim fino, e as linhas esguias e compridas de suas pernas. Ela assobiava, imitando os pássaros a seu redor, e ele achou, ao menos uma vez, que um pássaro lhe havia respondido. Era bonita. Uma pessoa perfeitamente adaptada a seu meio ambiente, pensava Kevin. Era diferente de todas as outras mulheres que conhecera, não usava maquiagem, roupas da moda, não empregava os ardis e jogos complexos que ele acabara acreditando serem parte do mundo feminino. Não podia ver seu rosto, mas sabia que possuía um brilho natural. De vez em quando passava um brilho nos lábios; nunca a vira usar outro tipo de cosmético. Cheirava a xampu de maçã e a um perfume diferente dos que ele conhecia, semelhante ao do limão; fora isso, o seu cheiro era de mulher, pura e simplesmente.
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Emily retirara um par de binóculos da maleta de couro e observava as encostas da montanha. — Há um ninho de águia naquele penhasco. — Virou-se e apontou-lhe uma rocha à esquerda, no alto. — Talvez consiga uma foto da mãe com suas lentes teleobjetivas, se pararmos naquela clareira ali em frente. —-Emily entusiasmava-se com aquela possibilidade, e transmitia animação com todo o seu corpo ao impelir Conde para frente. Parte do seu encanto vinha desse entusiasmo, pensou Kevin. Seguiu-a e apeou a seu lado, aceitando o binóculo para poder localizar o ninho. 'Tirou a câmera da maleta e focou, esperando o momento em que a mamãe águia resolvesse dar comida aos filhotes. Vendo Emily a seu lado, segurando firme o binóculo junto aos olhos, Kevin maravilhava-se com o prazer simples e sem complicações que ela sentia na aventura. — Lá está, Kevin! Ali, ao lado do ninho! Como é grande! Puxa, você viu isso? Tem um rato nas garras dela, está dando para um dos filhotes... A voz grave e rouca, com um traço de hesitação ao final de cada sentença rápida, era marca registrada de Emily, Enquanto Kevin tirava uma foto atrás de outra, ela acrescentava uma torrente de comentários, legendando as fotos. Kevin sempre fora atraído por mulheres que falavam muito. Com elas, era mais fácil permanecer calado. Sentira-se atraído sexualmente por algumas delas, ou melhor, por várias. Mas não se lembrava de ter gostado de nenhuma delas como companheira. Gostava de Emily. Como poderia não gostar? Enfim, baixou a câmera e retribuiu ao sorriso exultante que ele lhe dirigia. Os olhos de Emily eram verdes como os pinheiros em redor, e os lábios macios eram cheios e convidativos. Um desejo repentino e avassalador de tomá-la nos braços- imediatamente e de fazer amor com ela invadiu-o, e tudo o que pôde fazer foi afastar-se e guardar a câmera na maleta, consciente do tremor que se apossara de suas mãos. Gostava de Emily, tudo bem. Muito mais do que devia, para o bem dele ou dela. — Grandes fotos, hein, Kevin? Vai ter de me contar para que revista vai vender essas. Vai ser fantástico, vê-las impressas. Quer um café agora ou vamos andar mais um pouco e parar para o lanche? Ele tentava recuperar o controle. — Vamos andar. Quero ver essa tal cachoeira sobre a qual você fica buzinando nos meus ouvidos o tempo todo. — Não fico buzinando, apenas descrevo vivamente. Vai ficar impressionado. Vai ver só. Kevin olhou para o belo rosto de Emily e quis dizer-lhe que já estava impressionado.
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CAPÍTULO V
Sozinhos há quatro dias, os três se sentiam no paraíso. Então Gertrude chegou com os outros clientes. O sol se punha e Kevin e Emily cortavam lenha para o fogão, discutindo em voz alta sobre quem era mais hábil no corte, quando ouviram o caminhão chegando. — É minha mãe! — Emily largou o machado, quase acertando o pé de Kevin. Correu até a porta do pavilhão para avisar Laura. Quando o caminhão entrou na clareira, Emily e Laura esperavam no pátio para saudar os recém-chegados. Kevin ficou na retaguarda, surpreso com a intensidade do ressentimento que o assaltava pela chegada dos outros. Queria que a camaradagem que se formara entre ele, Emily e Laura continuasse exatamente igual. — Mamãe, que bom te ver! — Emily deu um abraço de urso na mãe. Gertrude usava jeans e camiseta como as filhas, e mais uma vez Kevin notou como era atraente. Os cabelos desgrenhados, o rosto sem maquiagem, mas a mesma beleza selvagem que Emily irradiava. — Oi, Sam!— Era óbvio que Emily conhecia o homem alto e careca que viera no banco de passageiros. — Como vão as coisas em San Diego? — Numa seca braba — falou Sam em voz arrastada, abraçando Emily. — Está com uma aparência ótima, Em. Então se voltou para Laura e a abraçou de modo desajeitado, mantendo-se afastado da barriga volumosa da jovem e fazendo um sinal de positivo com o polegar. Dois outros homens saltaram do banco traseiro e foram apresentados por Gertrude. — Melvin Skinner e Frank Livetti, minhas filhas Laura e Emily e... Ei, Kevin, venha cá... Este é Kevin Richardson, de Vancouver. Kevin está aqui para tirar fotos de animais e pássaros, e pescando um pouco, também. Melvin era de meia idade e barrigudo, mas Frank era da idade de Kevin, não tão alto, mas moreno e bonito, com traços latinos e cabelos negros encaracolados. O sorriso franco revelava belos dentes. Apertou as mãos de Laura, mas quando Gertrude apresentou Emily, olhou-a demoradamente e levou os dedos aos lábios, inclinando a cabeça em cumprimento. — Uma rosa selvagem — murmurou. Emily riu daquele galanteio ridículo, mas Kevin achou que ela havia gostado: Ficou pensando o que Frank acharia de montar em Fantasma na manhã seguinte. Como se só então houvesse se lembrado de tomar a iniciativa, Gertrude apresentou Sam Lucas a Kevin. Não havia nenhum entusiasmo em seu tom ao
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pronunciar o nome dele; ao contrário, parecia haver certa tensão entre Sam e Gertrude, e Kevin captou as piscadelas entre Emily e Laura pelas costas da mãe. Sam parecia indiferente à frieza de Gertrude. Jovial e prestativo era evidente que já estivera ali muitas vezes. Ajudou a descarregar o caminhão, colocou a mochila no ombro e rumou para uma cabana que, aparentemente, conhecia e apreciava. Desviou-se do caminho para ajudar Melvin e Frank, levando-os a uma pequena excursão como a que Emily proporcionara a Kevin em sua chegada. — Sam parece conhecer bem o local — observou Kevin a Emily quando, por acaso, chegaram juntos à despensa com caixas de suprimentos do caminhão. Emily assentiu, soprando uma mecha de cabelo que lhe caíra nos olhos. — Sam freqüenta o local há uns cinco anos. E veterinário, de San Diego. Deus sabe como consegue se manter na profissão, como todas as viagens que faz para cá. Quer namorar mamãe, mas ela não quer saber. — Emily bufou, erguendo as caixas de cereal para as prateleiras superiores, às quais os ratos tinham menos acesso. — Sam nunca desiste, contudo. Laura e eu já cansamos de apostar se ele vai dobrá-la ou não. Achamos que é um caso perdido. Mamãe é teimosa para valer, quando quer. — Parece que Sam também é. - Kevin tirou-lhe uma caixa de latas das mãos e levantou-as para ela. — Posso fazer isso sozinha. — Franziu as sobrancelhas para ele. — Já fiz milhões de vezes. — Sei que fez. — Kevin colocou a última caixa no lugar e viro-se para encará-la. — Mas tem uma coisa: você precisa treinar para deixar os homens serem cavalheiros com você, Emily Parker. — Ainda estava aborrecido com aquela cena ridícula com Frank. — Tipo: "oh, ooooh, Kevin, você é tãããão forte!" — Emily ergueu o nariz e estendeu a mão para tocar em seus bíceps, com uma expressão idiota de adoradora.. A reação dele foi instintiva. Agarrou-a e beijou-a, rápida, forte e arrebatadoramente. Soltou-a antes que pudesse começar a lutar. — Tipo: "Mim, Tarzã; você, Jane!" — Kevin grunhiu e arreganhou os dentes, afastando-se no exato instante em que Gertrude aparecia à porta com uma caixa de isopor. — Laura continua louca por sorvete de nozes? Comprei um pouco e coloquei no gelo. Mas está derretendo, acho que era melhor ela comer depressa. — Ao soltar a caixa e endireitar-se, deu com o rosto de Emily, muito corado. — Há algo errado, querida? — Não! — A resposta de Emily veio com vigor demais. — Não, nada, mamãe — repetiu mais calma. — Tudo vai muito bem. — Desviou os olhos de Kevin, e a cor que tingia suas faces subiu até o couro cabeludo.. Gertrude observou a filha por um longo instante e depois lançou a Kevin um olhar indagativo. Ele enfrentou aqueles penetrantes olhos azuis com um olhar de desafio. Gertrude ergueu as sobrancelhas, depois se virou e foi embora. Ouviram-na conversando na cozinha com os pescadores, contando uma história
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que fez todos rirem, sobre a caçada onde fora apanhado o alce cuja cabeça estava pendurada junto à mesa. — Por que fez isso? — Emily ralhou com ele. Parecia mais aturdida do que zangada, no entanto. Cruzou os braços e recuou um passo, como se previsse que ele fosse fazê-lo de novo. — Porque quis — declarou, em voz baixa e intensa. — Porque queria beijála de novo desde aquela primeira vez no curral. Sinto atração por você, Emily. Há um magnetismo entre nós, o tempo todo! Precisa entender isso! Kevin sentiu um frio no estômago porque ela não respondeu de imediato. Talvez houvesse se precipitado; talvez a atração que sentia não fosse correspondida. Encarou-o, com um ar severo, durante várias batidas de coração. Por fim, suspirou. — É, é isso aí — foi tudo o que disse indo atrás da mãe e deixando-o a sós. Por um instante, Kevin sentiu um grande alívio. Ela admitira que sentia atração por ele, admitira a força do magnetismo entre eles. Seu coração batia acelerado, mas a boca secou de repente quando percebeu que fora errado beijá-la, e pior ainda fazê-la admitir que sentia atração por ele. Conseguira evitar isso até aquele momento, mas ver Frank beijar-lhe a mão o deixara louco. Muito louco. Afinal, ele era um impostor. Estava ali para arruinar o mundo de Emily e, quanto mais ficava com ela, mais compreendia quão profundos eram os laços existentes entre ela e aquele mundo. Se ela soubesse de toda a verdade a seu respeito, consideraria seus beijos um insulto e uma ofensa, certo? Estava certo de que sim, e saber disso lhe doía até as entranhas. Fechou o punho e bateu com força na parede de madeira. Doeu, e ele praguejou. Depois se recompôs, tentando assumir uma expressão indiferente, e saiu para encontrar os outros. Emily e Laura preparavam a janta para os novos hóspedes, trabalhando em perfeita harmonia na cozinha. Os outros, inclusive Gertrude, descansavam em sofás e cadeiras espalhadas do outro lado do pavilhão. Os homens tomavam cerveja e a atmosfera era alegre e tranqüila. Kevin notou que, mesmo sem erguer os olhos, Emily o vira entrar. Atravessou até o sofá e sentou-se ao lado de Sam. — Aí o cara levou o cachorro para dentro, e o pobre animal não era muito esperto... — Sam entretinha o grupo com uma história, mas Kevin não prestava atenção. — Quer uma cerveja, Kevin? Estão ali no isopor, em cima da mesa. — Gertrude também não escutava a história de Sam, embora o veterinário ficasse olhando para ela para ver se tinha a sua atenção. — Anda pescando muito? Está conseguindo boas fotos? — indagou Gertrude. Kevin lhe contou sobre as pescarias e as expedições fotográficas.
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— Vou levar Frank e Melvin ao lago Cadoma amanhã. Pode vir conosco, se quiser. A pesca lá é boa nesta época do ano. O que acha? Quer juntar-se ao grupo? Kevin não ouviu a pergunta. Com o canto do olho, vira Frank levantar-se e andar até o outro lado do pavilhão, onde Emily e Laura trabalhavam. Frank disse algo que Kevin não conseguiu escutar, e Emily riu e lhe estendeu uma pilha de pratos. Ela pegou os talheres e, juntos, começaram a arrumar a mesa, lado a lado, tagarelando amigavelmente. Aquilo incomodou Kevin. Não que fosse ciumento, falou consigo mesmo, ouvindo Emily rir de novo com algo que Livetti falara. Diabos, o cara era um comediante de primeira. O ciúme não tinha nada a ver com isso. Emily conhecia o caráter daquele tal de Frank, ele podia ser procurado em todo o território nacional por estupro e homicídio. Emily devia ter mais cuidado e não dar tanta confiança a qualquer um. Ficou surpreso por Gertrude não se preocupar com aquilo. — Desculpe-me, o que disse? — De repente, percebeu que Gertrude vinha falando com ele e que agora se calara. Voltou-se e viu que ela o observava com o mesmo olhar penetrante que lhe dirigira na despensa. — Falei que vou levar os outros a uma pescaria num lago amanhã e perguntei se queria ir junto. Não queria. Teve uma idéia. — Na verdade, Emily mencionou um lugar onde eu poderia tirar fotos de carneiros selvagens. Ofereceu-se para levar-me lá, e até agora não fomos. Gertrude fitou-o demoradamente, depois assentiu: — No espinhaço do monte Abby, provavelmente, e no Acampamento do Urso Pardo. Não o levaria lá antes que eu chegasse, porque implicaria em deixar Laura sozinha à noite. As montanhas onde os carneiros vivem ficam muito distantes. Vão ter de acampar, talvez levem uns dois dias para chegarem lá, dependendo do tempo. Oba, que maravilha! — Vamos fazer excursões diurnas, somente, então ficaremos com Laura à noite. Vou conversar com Emily depois do jantar, se quer mesmo fazer esta viagem. É um percurso difícil, ainda há neve lá em cima, e nenhuma comodidade. Há uma velha cabana, e só. Vida selvagem mesmo. Além disso, não sei se Emily lhe contou, aquilo é território dos ursos pardos. É por isso que chamamos a cabana de Acampamento do Urso Pardo. É época de saírem da hibernação, junto com os filhotes. Vão ter de levar um rifle, por segurança. Sabe usar um rifle? Além disso, terão de atravessar o rio avau, lá em cima. Emily dera mais uma gargalhada. Livetti vestira um dos aventais enormes de Laura e ajudava a tirar a água de uma panela de espaguete. Emily segurava a tigela onde o espaguete deveria ser colocado. Quase se encostava ao ombro de Livetti, de tão perto que estavam. Ursos pardos. Rifles. Rios. Neve. Era o paraíso. — Para mim, está ótimo, Gertrude.
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— Richards não está lhe criando problemas, está, Emily? Parece agir estranho quando você está perto — comentou Gertrude. O resto do acampamento fora dormir a muito tempo, mas as três mulheres tinham muito a conversar; fizeram um bule novo de café e sentaram à mesa. — Kevin? Problema? Claro que não, mãe. É um bom rapaz. — Emily ficou feliz que seu rosto estivesse na sombra, longe do lampião. Sabia que se a mãe o visse, entenderia exatamente que "problemas" Kevin lhe criava. O problema era que ela gostava. — Coitado dele se quiser criar problemas a Emily — disse Laura através de sinais. — Lembra-se de Williams? As três riram. Brett Williams assinara contrato há muitos anos com a Vale do Elk Excursões. Com trinta e tantos anos e certo de ser o sonho de toda mulher, decidiu fazer a Emily um favor e seduzi-la. Emily o escutou contando aos outros três homens do grupo que ela precisava daquilo e queria muito, e que era exatamente o que ele lhe daria. A princípio, Emily levara na esportiva, não querendo ofender o homem, mas um dia, quando se encontravam sozinhos no acampamento, ele se tomou agressivo, perseguiu-a e recusou-se a acreditar em suas negativas, mesmo quando ela se mostrou zangada. Riu e foi em frente, convencido de que ela sucumbiria ao seu charme. Emily começou, a acreditar que Williams era mesmo capaz de estuprá-la. Pálida, agarrou o rifle e apontou-o em sua direção. Ainda convicto de que tudo não passava de brincadeira, Williams se aproximou de novo. Ela atirou, mandando uma bala que passou raspando pela cabeça dele, perto o bastante para que visse que era sério. Williams recuou, enfim, xingando a de prostituta, louca e caipira. Emily perdeu a cabeça e passou à agressora. Apontando a arma para ele, forçou-o a ir até a margem do rio e a tirar toda a roupa, exceto a cueca vermelha. Mandou-o entrar na água gelada e ficar nadando em círculos por um bom tempo, dando um ou dois tiros quando tentava sair. De vez em quando, perguntava delicadamente se ele já havia esfriado a cabeça. Para azar de Williams, o resto do grupo chegou naquele momento. Gertrude e Laura entenderam de imediato o que acontecera. Sem dizer palavra, Laura recolheu a roupa de Brett e socou-a no pavilhão, de forma que, quando Emily o deixou sair do rio, ele teve de se arrastar até a cabana, descalço, seminu e congelado, sendo alvo da chacota dos outros homens. Depois do jantar, na frente dos outros, Gertrude lhe fez uma conferência sádica sobre o que aconteceria com as partes vulneráveis de sua anatomia se tentasse aquilo de novo com qualquer de suas filhas. Depois daquilo, tinham certeza de que Williams partiria, mas subestimaram a sua baixeza. Como não quisessem reembolsar-lhe o dinheiro, decidiu ficar até o fim do contrato, mal-humorado e reclamando de tudo. Recusou-se categoricamente em ir a qualquer excursão chefiada por Emily, e Gertrude fez de tudo para que as excursões em que ele tomava parte fossem difíceis e exaustivas. 47
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— Então acha que dá para levar Kevin ao monte Abbey? — Gertrude perguntou a Emily. — Vai ficar sozinha com ele, e sabe como é longe. Se tiver alguma objeção, posso ir em seu lugar, e você faz as excursões diurnas, leva os outros clientes aos lagos. Emily viu Laura sacudir a cabeça diante da sugestão da mãe. A irmã de Emily sabia muito bem da atração entre Emily e Kevin e fazia p possível para encorajá-la. — E o pobre do Sam? — brincou Laura. — Vai se sentir miserável se o deixar aqui, mamãe. — Quem falando em fazer um homem se sentir miserável! O pobre Jackson me telefonou pelo menos sete vezes nos últimos dias, preocupado com você — Gertrude repreendeu a filha mais jovem. — Acho que está sendo cabeça dura com Jackson, Laura. Não é fácil criar um bebê sozinha, e esse rapaz a adora e quer se casar com você. Emily ergueu os olhos para o teto. Sabia exatamente o que a irmã e a mãe diriam a seguir, há meses tinham a mesma conversa. — Casamento entre surdo e não-surdo não funciona — declarava Laura. — Como vai saber se não tentar? — replicava Gertrude. — Mas Jackson mal sabe assinar o próprio nome — era a declaração seguinte de Laura. — A comunicação é muito importante num casamento. A propósito, e você? Sam Lucas passa todas as folgas aqui... — Deixe Sam fora disso. Não estou grávida. — Ufa! — Laura batia na testa. — Que alívio! Tudo se passava como Emily previa, sinal a sinal. Então vinha a grande citação final da mãe, que fazia Laura rir e Gertrude ficar amuada. — De qualquer forma, parece-me que você e Jackson já se comunicaram bem até demais — observava Gertrude, apontando a barriga dilatada de Laura. Com efeito, Laura começou a rir. Então Gertrude mordeu o lábio e suas narinas se dilataram. Só Havia um jeito de distrair a mãe, e Emily o colocou em ação. — Temos dinheiro bastante no banco para pagar o empréstimo e para renovar o arrendamento, mamãe? O pagamento do arrendamento dó território de excursões estava atrasado um mês. O novo gerente do banco relutava em emprestar-lhes mais dinheiro; já ampliara a sua linha de crédito em vários milhares. — Quando depositei os cheques, já possuíamos o bastante para pagar a ambos, se não houver nada de errado nesta excursão — relatou Gertrude. — Emiti o cheque do arrendamento antes de sair e enviei pelo correio. Emily e Laura suspiraram de alívio. Os problemas de dinheiro tinham sido fonte de preocupação durante todo o ano, que passara, mas pareciam, enfim, se resolver. — Com esta boa notícia, proponho que a gente vá dormir. O bule de café esvaziou de novo e Laura tem de levantar as cinco, não c, maninha? Laura gemeu e bocejou. 48
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— Café demais! Acho que vou dormir no banheiro. Você também precisa levantar cedo. se vai para as montanhas. Como sempre, Gertrude deu a cada uma um grande abraço de boa noite. Às sete horas da manhã seguinte. Emily terminou de carregar os cavalos. Além Se Conde e Lúcifer, o cavalo favorito de Kevin, levavam um cavalo de carga chamado Teimoso para carregar os mantimentos que precisariam para acampar por alguns dias. Teimoso justificou seu nome, inchando tanto a barriga quando ela tentava colocar a carga em cima dele que ainda ficava frouxa, pisando nos pés de Emily e ameaçando morder. Já perdera a paciência com o animal estúpido quando ela e Kevin montaram e saíram do acampamento, e aquilo acabara com o seu bom humor. Colocou a rédea em torno do pescoço de Conde com uma mão e, com a outra, segurou a longa corda que controlava Teimoso. Kevin, por outro lado. exibia o melhor dos humores. Assobiava uma canção enquanto cavalgavam, e logo Emily começou a ficar mais alegre. Gostava muito daquela região para onde se dirigiam. Sempre fora um de seus locais favoritos: uma montanha com uma campina e um lago, um lugar tão isolado que Emily fantasiava que só ela conhecia e ninguém mais. Ficava excitada diante da possibilidade de mostrá-lo a Kevin. Iam ficar a sós lá em cima por algum tempo, e isso aumentava ainda mais a sua excitação. Olhou para Kevin, admirando-o. A maioria dos clientes parava de se barbear depois do primeiro dia, e não tomavam muitos banhos. Mas Kevin se barbeara naquela manhã e continuava fazendo bom uso do balde d'água que ela lhe fornecia ao amanhecer. Parecia à vontade, vestindo jeans, colete acolchoado, e um chapéu Stetson marrom: controlava Lúcifer com facilidade. Gertrude lhe dera um rifle e alguns alvos para praticar enquanto Emily arrumava as bagagens de manhã, e contara a Emily que Richardson não precisava de lições: acertara o alvo em cheio todas às vezes. O homem da cidade adaptava-se ao mundo selvagem como um camaleão. O único sinal remanescente de sua imagem urbana era um caro relógio digital no pulso. — Espero que esteja preparado para uma longa e árdua jornada hoje — gritou Emily enquanto seguiam para a trilha. Havia ali uma estrada de origem sísmica, mas. depois de um trecho, desviariam para um lugar chamado Bacia do Hoffman. Além daquele ponto, confiariam no conhecimento de Emily da região. Primeiro, contudo, precisavam atravessar o rio Elk. — Mal posso esperar. Sua mãe disse que vamos ter de passar a noite por aí, em algum lugar. — É num lago chamado Wolverinc. — Fica a que distância? — A umas quatro horas de cavalgada depois que atravessarmos o rio, mas isso não vai demorar. Não conversavam muito, contentavam-se em cavalgar juntos em silêncio. Emily esperava ter problemas com Teimoso, mas, para a sua surpresa, o animal
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decidira comportar-se como um cavalheiro e marchava atrás de Conde sem objetar. Os pássaros cantavam em coro, a brisa refrescava os viajantes, apesar do sol cada vez mais intenso, e um profundo contentamento invadia Emily à medida que o tempo passava sem incidentes. — É aqui que atravessamos o rio — anunciou Emily no meio da manhã. — Uau, parece violento, não parece? Está na cheia, mas acho que dá pé. Está rápido, no entanto. Há apenas um lugar, bem no meio, onde os cavalos têm de nadar. À medida que chegavam à margem escarpada e paravam, o rumor das águas ligeiras dificultava a conversa. Emily verificou a carga de Teimoso cuidadosamente, feliz por haver gasto tanto tempo e energia enrolando tudo em plástico e oleado e amarrando o mais firme possível no lombo do animal. O rio se encontrava bem mais cheio do que esperara. Ao sinal dela, Kevin entrou primeiro, e Emily seguiu com a corda do animal de carga amarrada em torno da mão, Lúcifer empacou, mas Kevin impeliu-o a avançar, e logo ambos seguiram através do rio. Conde tinha prática naquilo, e Emily deixou que abrisse caminho entre as pedras escorregadias do leito das águas. Teimoso, ainda surpreendentemente dócil, seguiu-os sem muita pressa. Dividindo a atenção entre Teimoso, na retaguarda, e Kevin, à frente, Emily observou com certa ansiedade a água chegar aos flancos de Lúcifer, que, sem conseguir mais tocar o leito do rio, foi forçado a nadar. Pouco depois, contudo, cavalo e cavaleiro chegavam a salvo em águas rasas e, em seguida, novamente em terra firme. Emily ficou aliviada. Kevin se virou e lhe fez sinal de positivo, levantando o polegar, assim que Conde começou a nadar, e foi neste exato instante que Teimoso resolveu rebelarse. O animal de carga, com a célere correnteza já batendo nos flancos, investiu e recuou, puxando a corda, tirando o equilíbrio de Emily e virando Conde de tal maneira que, em vez de se manter na transversal, passou a ser levado pela forte correnteza do rio, carregando Emily consigo. Inclinando-se perigosamente, Emily foi forçada a tirar o pé do estribo e apear. Mas a corda do animal de carga agora se amarrara em torno de seu braço, e não havia jeito de soltá-la. A esta altura, Teimoso perdera o pé e a compostura, e se debatia como louco, tentando chegar à terra firme. A corda pulava e dançava, e a correnteza empurrava Emily, jogando-a para baixo e para cima da água, fazendo-a gritar de dor no braço, já cm carne viva devido às mordidas da corda. A água entrava pelo nariz, chegando aos pulmões, e ela sufocava incapaz de enxergar. Sentiu o leito rochoso sob os pés durante segundos internais, mas, lutando para recuperar o equilíbrio, tropeçou outra vez e afundou. Bateu os quadris uma vez com força, e as rochas arranharam seu braço ao tentar, em desespero, agarrar-se a alguma coisa.
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Por um momento, perguntou-se se Emily Parker, guia experiente, ia mesmo afogar-se no rio Elk, tudo por causa de uma corda estúpida e de um cavalo de carga imbecil.
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CAPÍTULO VI
Emily! Agüente aí, estou indo! Kevin impeliu Lúcifer de volta ao rio. Num instante, vira a corda esticada entre ela e Teimoso e entendera por que ela estava sendo jogada de um lado para o outro em meio à correnteza. Entender e ajudar eram duas coisas diferentes, todavia. Lúcifer atravessara o rio uma vez; não tinha muita vontade de fazê-lo de novo, e Kevin teve de lutar com ele para que voltasse ao local onde o animal de carga se debatia. Quando, por fim, chegou a um ponto de onde podia agarrar a corda, não houve jeito de soltá-la. Teimoso rodopiava como um possesso, e Kevin não conseguia chegar perto o suficiente para controlá-lo, ou ter ação sobre a corda para enrolá-la no arco da sela e afrouxar a tensão do outro lado. Lutou desesperadamente pelo que lhe pareceu uma eternidade até que, sem mais nem menos, Teimoso parou de se debater, baixou a cabeça, arquejou e soprou água pelas narinas. Kevin esticou-se para pegar a corda, quase caindo do lombo de Lúcifer, deu duas voltas com ela no arcão e fez Lúcifer andar de modo que a ponta amarrada a Emily afrouxasse. Pela primeira vez, conseguiu se virar e olhar para ela. Emily fora arrastada das águas profundas do meio do rio e chegara perto da costa rochosa de onde haviam partido. Debatia-se, lutando para recuperar o equilíbrio Impotente, Kevin observou-a tentando encontrar apoio para os pés, tropeçando e caindo de novo na acua rasa. A correnteza era forte e voltou a arrastá-la. — Emily!— Agoniado por não poder deixar os cavalos e irem a sua ajuda, não podia fazer nada além de ficar onde estava e gritar-lhe instruções frenéticas: — Emily solte a corda! Por fim, Emily conseguiu tirar a corda do pulso e livrar-se dela. Ficou em pé e, cambaleando, seguiu em direção à margem. Kevin a viu subir à margem de quatro, baixar a cabeça e vomitar toda a água que engolira. Depois de algum tempo, levantou-se e caminhou trôpega, até uma colina, tombando sobre a relva quando suas pernas talharam. Estava a salvo. Pelo menos isso. Até aquele momento, Kevin não se dera conta invadira, do medo hediondo de que ela se afogasse. tremer, o estômago se contraiu e, por um momento, cair. Esforçou-se para pensar de modo coerente, para dali com os cavalos.
do terror absoluto que o Suas mãos começaram a achou que também fosse imaginar um jeito de sair
Não viu nenhum sinal de Conde, mas presumiu que houvesse chegado à outra margem; havia uma curva no rio mais adiante que tornava esta conclusão lógica. Não seria sábio tentar encontrá-lo de imediato. Usando a corda, Kevin forçou Teimoso a subir à margem. Por algum milagre, e devido à arrumação cuidadosa de Emily, o cavalo não conseguira livrar-se totalmente da carga. Estava tudo encharcado e descentrado, e Teimoso
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mancava de um lado ao tentar andar, mas ao menos os mantimentos não tinham caído no rio. Kevin apeou e acorrentou os dois animais às árvores, amaldiçoando Teimoso. Então correu para Emily, que se encontrava caída, com a cabeça entre os joelhos, os ombros tremendo. — Emily, você está bem? Meu Deus, Emily... Sem pensar, ajoelhou-se a seu lado e a puxou rudemente para si, abraçando-a com força, sentindo os tremores que lhe agitavam todo o corpo. Por um longo tempo, Kevin só a segurou, encharcada e trêmula. Batia em suas costas desajeitadamente e afastava o cabelo molhado do rosto, falando palavras de consolo para acalmá-la. Enfim, Emily afastou um pouco o rosto e olhou para Kevin. As pestanas grudavam uma na outra, longas e pretas contra a palidez incomum que se apossara da pele bronzeada, e o cabelo parecia colado ao crânio. Um arranhão profundo cortava uma face. Estremeceu ao mover o ombro. O pulso onde a corda estava amarrada apresentava uma séria contusão e, em carne viva, sangrava um pouco. — Obrigada, Kevin! Aquela maldita corda... Foi minha culpa, sabe. Não devia ter amarrado aquele animal idiota a mim! Ele balançou a cabeça, assustado com a aparência dela. — É não devia mesmo! Mas acidentes acontecem com qualquer um.. Como se sente? Tem certeza de que não quebrou nada? — Kevin tocou de leve no arranhão do rosto dela com um dedo. Ela sacudiu a cabeça e estendeu as pernas, testando os músculos. Embora estremecesse um pouco, não parecia haver nenhum dano grave. — Juro que vou dar um tiro naquele estúpido do Teimoso — declarou com uma fúria que fez Kevin sorrir e ficar mais tranqüilo quanto ao seu estado de saúde. — É tudo culpa dele. Kevin ergueu a sobrancelha ao ver como ela transferira rapidamente a culpa de si mesma para o cavalo. — Vai ter um pouco de dificuldade para achar seu rifle para fazer isso. A última vez que vi Conde, ele ia rio abaixo com uma velocidade incrível. Emily gemeu e tentou ficar em pé. Kevin levantou e auxiliou-a, notando pela primeira vez um corte no braço e outro na coxa, onde o jeans se rasgara, acima do joelho direito. Ela olhou para si própria e balançou a cabeça, jogando uma cascata de pingos d'água em cima dele. — Droga! Este jeans era quase novo! — O jeans que vá para o inferno! Tem uma maleta de primeiros socorros em algum lugar? — Kevin tocou de leve no braço dela. — Precisamos desinfetar estes cortes. E é melhor você descansar um pouco, levou um belo tombo naquele rio. Acha que eu consigo encontrar roupas secas para você?
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Ela olhou para o animal de carga, pastando como se nada houvesse acontecido. — A carga de Teimoso não caiu? — Não. — Aleluia! Pelo menos nisso tivemos sorte. Nossas roupas e o resto devem estar secos. Enrolei tudo em oleado e depois coloquei em sacos plásticos. — Garota esperta! — Indo em direção a Teimoso, Kevin se voltou para Emily, que o seguia, e notou que ela mancava muito. Parou e passou o braço em volta de sua cintura, amparando-a o resto do caminho. — Machucou a perna! Ela sacudiu a cabeça e praguejou baixinho. — Os quadris, não a perna. Acho que bati numa rocha. Vou ficar bem depois de me mexer. — Bateu em mais de uma rocha, pela sua aparência! Seguindo as instruções de Emily, Kevin soltou a carga de Teimoso, espalhou-a no chão e localizou os pacotes de roupa. Havia uma maleta completa de primeiros socorros. Depois de removidos os plásticos e os oleados úmidos, encontrou o conteúdo totalmente seco. Desencavou uma camisa e um jeans para ela, alem de uma toalha. — E quanto à roupa íntima e as meias? — Deixe que eu mesma pego. Passe-me aquela bolsa menor, de malha. — Descalçara as botas e tirava a água de dentro delas. — Deve haver um par de entre as minhas coisas, também. Estas aqui estão molhadas demais para usar. — Virou as botas para baixo e tirou as meias. — Vou até aqueles arbustos trocar de roupa. — Não vai fazer nada disso! viro de costas e você troca de roupa aqui mesmo. Emily lançou-lhe um sorriso agradecido. — Obrigada! — E antes de vestir o jeans seco. passe um pouco deste creme anti-séptico naquela corte em sua perna. — Certo doutor! Kevin se virou e ficou olhando para os cavalos enquanto ela tentava se livrar das roupas molhadas secava-se com a toalha e vestia a roupa seca. Os dois tinham plena consciência de que a distância entre eles era só de alguns metros e de que Emily se encontrava completamente nua. Kevin ouvia os sons que ela fazia ao se despir e amaldiçoava-se pela intensa reação que a imagem mental de Emily nua provocava em seu corpo. A garota quase se afogara, estava toda machucada, e ele só conseguia pensar naquelas curvas delicadas, na maciez torturante da pele pálida nos locais onde o sol não tocava... Com mil demônios, devia ser um pervertido para se sentir assim numa ocasião conto aquela! 54
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— Estou vestida, pode se virar agora. Recuperando o autocontrole, passou creme anti-séptico no rosto e no braço dela. Juntos, embrulharam tudo de novo e entregaram-se à tarefa de recarregar Teimoso. Dividiram um lanche que Laura enrolara em plástico: sanduíches de queijo com pão integral, com um sabor fantástico. Dividiram também o café da garrafa térmica, ainda momo. Kevin ficou aliviado ao ver a cor voltar às faces de Emily. Também os quadris, como ela previra, melhoraram com o movimento. — Vou deixá-lo aqui e usar Lúcifer para atravessar e encontrar Conde — anunciou ela ao terminarem- de comer. — Trago os dois cavalos de volta e depois tentamos atravessar de novo. Antes que Emily terminasse de falar, Kevin já sacudia a cabeça em discordância. — Vai nada! Não vai atrás de Conde, eu é que vou. Vai ficar sentada aqui e descansar um pouco. E não discuta comigo, Emily, porque não vai ter jeito! Claro que ela ia discutir. — Não seja ridículo! Eu sou a guia, isso é tarefa minha Além disso. Conde não o conhece. Não vai saber onde procurar por ele... — Emily ia andando em direção a Lúcifer, e Kevin se postou à sua frente, barrando-lhe o caminho, com as mãos na cintura. — Falei para não discutir comigo — lembrou em tom baixo, ameaçador. — Você me diz onde é provável que o cavalo esteja, e eu vou lá buscá-lo. — Mas... — Sem, mas, nem meio mas, Eu vou. e ponto final. — Kevin já desamarrava Lúcifer montava. Com relutância. Emily cedeu, dizendo-lhe onde achava que o animal poderia estar. — Há uma campina rio abaixo. Deve estar pastando lá. A esta altura. Lúcifer convencera-se de que cruzar o rio para lá e para cá era o seu destino, e entrou nas águas revoltas sem objetar. A travessia foi calma e, embora Kevin tivesse levado algum tempo para encontrar a campina. Conde estava mesmo lá, pastando tranqüilamente. Kevin atravessou de volta com os dois cavalos sem nenhum outro percalço. Desta vez colocaram Teimoso entre ambos. Kevin segurava a rédea e Emily ia preparada para bater nele por trás se começasse a criar confusão. Mas Teimoso já se divertira o suficiente naquele dia; atravessou como um veterano, sem criar nenhum tipo de problema. Kevin ficou aliviado, e Emily sorriu para ele e fez sinal de positivo quando finalmente saíram das águas. O sol, que já passara a muito do ponto médio de sua trajetória, ofuscava. A travessia roubara-lhes um tempo precioso. — Vamos ter de correr para chegar ao acampamento antes de escurecer — Emily avisou a Kevin. — Para mim, tudo bem, se você se sente disposta. Vá em frente. A cavalgada não era fácil. Desceram uma encosta, depois desviaram para uma trilha invisível na região que Emily chamava de Bacia do Hoffman. Kevin
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maravilhava-se com o conhecimento que ela possuía do território. Ele não via sinais que lhe dissessem para onde ir, mas ela ia em frente, cheia de confiança. Rumaram para o sul em meio a um bosque cerrado de arbustos, chegando a um vale estreito. Rochas imensas erguiam-se de todos os lados, e os cavalos tinham de ser estimulados a seguirem com cuidado. Às vezes era necessário apear e conduzir os animais a pé. O sol da tarde aproximava-se do pico das montanhas, e Emily apressava o passo sempre que possível. — Em frente, o lago Wolverinc — anunciou, enfim, e, depois de ultrapassarem um último morro. Kevin avistou um lago azul entre as árvores, com uma margem escarpada de xisto. O sol se punha. — Onde vamos acampar? — Ali em frente, naquele arvoredo. A barraca fica longe do lago porque os animais selvagens tomam água nele e não queremos perturbá-los ou alterar os seus hábitos — explicou Emily. Chegaram ao acampamento e apearam, cansados. Trabalharam num silêncio solidário: descarregaram Teimoso; prenderam a lona que haviam levado sobre a estrutura de madeira, para servir de cobertura da barraca; escovaram os cavalos e soltaram-nos para pastar. Emily acendeu uma fogueira e colocou o guisado que Laura lhes preparara numa panela para esquentar sobre as chamas. Armou um varal improvisado com urna corda e pendurou a roupa molhada para secar. Depois começou a limpar o rifle; não se molhara como ela temera, mas sempre era bom mantê-lo em ordem. Mais tarde, Kevin, sem comentar nada, observou-a desembrulhando os sacos de dormir e colocando-os, um de cada lado, sobre colchões de ar, dentro da barraca. Notando o olhar intrigado de Kevin, Emily corou. — Aqui é território dos ursos pardos. Vai ter de compartilhar a barraca comigo esta noite. Ele lançou-lhe um amplo sorriso inocente. — Para mim está ótimo. Só espero que você não ronque muito alto. " Kevin desviou da toalha que ela lhe atirou e, ainda sorrindo, agarrou o balde de plástico e foi até o lago apanhar água. Emily encheu a cafeteira quando ele voltou e colocou-a no fogo para ferver. Já era noite quando comeram. Limparam a panela do guisado com pedaços de pão, beberam canecas de café forte e encerraram com biscoitos de aveia e compotas de frutas. A fogueira criava um agradável círculo de luz na pequena clareira, mas em volta deles só havia trevas e solidão, e certo clima de perigo. Kevin tinha consciência de que se achavam sozinhos em meio a quilômetros e quilômetros de mundo selvagem. Emily não parecia se importar. Sentara com as pernas cruzadas, tranqüila, os cotovelos descansando sobre os joelhos, a caneca aninhada entre as duas mãos, fitando a fogueira. Kevin percebeu, no entanto, que mantinha o rifle sempre ao alcance da mão.
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— Sempre traz clientes aqui sozinha? — Aquela questão o perturbara a tarde inteira, e quanto mais avançavam naquele território selvagem mais curioso ficava. Não sabia bem por que, mas aquilo o preocupava. Tentara usar um tom despreocupado ao perguntar. — De vez em quando. Depende do que eles querem. Uma vez vim com alguém que queria tirar fotos. E vim com um grupo de pescadores, no ano passado. — Alguma vez você...? — Ele se interrompeu, sem saber como formular a pergunta. — Alguma vez você... bem... teve problemas com os caras que traz aqui? Não tentaram nada com você? Você... você é uma mulher atraente, Emily. Seria natural que um homem-- Foi perdendo a voz e, mais uma vez, amaldiçoouse por não saber lidar com as palavras. — Não me parece seguro, trazer homens aqui, sozinha — acrescentou de modo abrupto. Sabia que estava parecendo um bobo intrometido, mas não se importava. Durante toda à tarde, fora assombrado por imagens... Ela se virou e encarou-o de frente. — O cliente que veio tirar fotos era uma cliente, uma fotógrafa de sessenta anos. Os pescadores tinham todos mais de cinqüenta, e dois deles vieram com as mulheres. Você é o primeiro homem que trago até aqui sozinha. Acho que posso confiar em você. — Ela pôs outro pedaço de lenha no fogo e lançou-lhe um olhar travesso. — E se estiver errada, sempre há o rifle. Uma sensação incrível de alívio tomou conta dele, mesclada a uma incerteza sobre até que ponto podia confiar em si mesmo quando estava perto dela. — Esta sua arma é um poderoso obstáculo, não há dúvida! — As vezes em que tive problemas, foi muito útil tê-la comigo — acrescentou, em tom corriqueiro. — Os homens se acalmam bem rápido quando vêem o cano do rifle apontado para eles. Kevin engoliu em seco. — Acredito. Teve de usar essa técnica muitas vezes? — Uma ou duas vezes. Kevin sabia que estava abusando, mas não ligava. Queria saber tudo sobre ela. — Bem, e os outros homens de sua vida, Emily? Deve ter existido homens de quem você gostava para quem não apontaria uma arma. Desta vez, Emily levou um bom tempo para responder. A fogueira estalava e emitia faíscas, e um coiote começou a uivar. Ela se ajeitou, mudando a posição da perna para não forçar os quadris. — Houve alguns. Nunca deu certo. Sempre começava bem, mas mais cedo ou mais tarde algo acontecia principalmente coisas relacionadas ao meu trabalho. — Havia um traço de amargura em sua voz, e as palavras passaram a vir com mais rapidez. — Parece difícil para os homens entenderem que esta é a minha vida, que este é o trabalho que desejo fazer enquanto me for possível. Não é um
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passatempo até que um cavaleiro surja para me resgatar. Pertenço a este vale, aqui estão as minhas raízes, é aqui que sou feliz. Tenho sorte de conseguir trabalhar no que goste, e não tenho intenção de abandonar o lugar ou o trabalho só porque um homem acha que deveria. E todos eles fazem isso, querem que eu mude, para me adaptar ao seu modo de vida ou às suas idéias de como uma mulher deve ser. Jamais encontrei alguém que achasse boa idéia casar-se com uma guia dê excursões. Kevin escutava e ia ficando enjoado. O café em sua caneca de repente ganhou um sabor horrível; jogou o resto na fogueira. Havia conseguido, durante o dia todo, esquecer seus verdadeiros objetivos ali no vale. Emily, Laura, a mudança completa de sua rotina diária, a atmosfera repousante, o próprio isolamento, tudo contribuíra para afastar da mente o que sabia sobre a posse iminente da Companhia de Empreendimentos Pace sobre todo o território... e o conseqüente fim da vida idílica de Emily Parker. Ela iria odiá-lo e desprezá-lo quando soubesse da verdade. Sabia disso desde que o instante em que a conhecera. Só que, naquele instante, não sabia o quanto viria a se importar com o que ela achasse dele. Kevin ouvia um animal farejando do lado de fora da barraca; um animal pequeno, pelos sons que fazia. Não conseguia dormir; a respiração de Emily se alterara de repente já há algum tempo, indicando um sono profundo. Estava perto o bastante para alcançá-la com a mão. Só algumas tábuas separavam um colchão do outro. Imaginava-a, aninhada em seu saco de dormir, com aquele abrigo azul que usava como pijama. Ele vestira calças de abrigo e uma camiseta, também, para se aquecer e em nome da decência. O cheiro dos cabelos de Emily misturava-se ao da fumaça e ao perfume de uma loção suave que ela passara nas mãos depois de encerrar os trabalhos do dia. Ele se virou de bruços e aninhou a cabeça nos braços, sentindo o fino colchão de ar e as tábuas duras sob as costas. Nunca dormira assim com uma mulher: perto o bastante para tocar e de modo totalmente impessoal, desprovido dos prazeres físicos associados a dormir com alguém. Dormir daquele jeito com Emily, contudo, era ainda mais perturbador do que relacionar-se de modo íntimo com qualquer das várias mulheres com quem dormira. Por quê? Escutava-a respirar em arquejos, e até roncar um pouco. Era um som tão delicado que Kevin sorriu. Estava escuro demais para ver se ela dormira de lado ou de costas. Kevin passou longas horas ensaiando o que dizer quando ela soubesse a verdade a seu respeito, e todos os ensaios terminavam em desastre. Virou de lado outra vez. Quanto tempo teria até precisar contar-lhe a verdade? Uma semana ou mais, talvez, dependendo da duração daquela viagem. E não haveria vantagem em lhe contar a verdade antes de voltarem ao acampamento, haveria?
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Não. Seria totalmente egoísta ali, decidiu. Ia aproveitar ao máximo aqueles dias que os dois passariam juntos. Emily era uma mulher especial, única. Estavam quase se tornando bons amigos. Queria saber mais sobre ela, sobre sua infância, seus sonhos. Agora aquilo era prioritário para ele; queria confiar em uma mulher. Tentando descobrir por que Emily o afetava daquele jeito, acabou adormecendo. Kevin avistou o rosto de Emily diante de si ao acordar e pensou, Por um instante, que ainda estava sonhando. Estendeu-lhe os braços, ia dizer "bom dia", mas ela pôs os dedos sobre sua boca e sacudiu a cabeça, agitando os cabelos, pedindo silêncio. Os olhos verdes brilhavam como esmeraldas, de tanta excitação. O arranhão em seu rosto criara uma crosta. Não tirara ainda o abrigo azul. Pela pálida luz da barraca, devia ser bem cedo ainda. Ela fez um gesto em direção à porta, e Kevin se arrastou para fora do saco de dormir, ainda quentinho, e estremeceu ao sentir o ar gelado. Emily levantou a borda da cobertura da barraca, e ele viu o gelo cobrindo a relva. Deus, ali ainda era inverno! Forçando os olhos, avistou o lago, um azul vivo sob a luz cinzenta do amanhecer, e então conteve a respiração, de surpresa. Na íngreme encosta atrás do lago, dois animais pequenos, peludos, verdadeiras bolas de lã, deslizavam alegremente pelo xisto até a beira da água subiam correndo a encosta para deslizar de novo, brincando exatamente como crianças num escorregador. À distância, pareciam ursinhos de pelúcia. Emily passou-lhe o binóculo. — Bebês ursos! Acabam de sair da hibernação e estão tentando se livrar da pele de inverno, que lhes dá coceiras — sussurrou ela. Apontou para um ponto à margem do lago, a alguns metros da encosta. — Mamãe-ursa fica ali, de olho neles. O vento está a nosso favor, por isso não farejou ainda nossos cavalos, mas está um pouco nervosa, mesmo assim. Kevin trocou as lentes e a mamãe-ursa entrou no foco, tão perto que um arrepio percorreu-lhe a espinha. Era um corpo gigantesco e escuro contra as árvores e arbustos do fundo: Sua cabeça se movia de um lado para o outro, farejando constantemente. Andava inquieta, para frente e para trás. — Minha câmera — gemeu Kevin, lembrando-se, tarde demais, que a deixara no alforje. — Está lá fora. Mas Emily devia tê-la guardado, pois foi até um canto da barraca e pegou para ele. Ele ajustou o foco, usando ó zoam para tirar várias fotos da cena memorável. Os bebês ursos rolavam e davam cambalhotas, completamente livres. O ar da montanha transportava seus sons nitidamente até Emily e Kevin, que riam de seus bramidos e guinchos de alegria. Então, de repente, a mãe ficou alarmada. Urrou e correu para recolher os filhotes, batendo neles de modo nada gentil com a pata enorme. Logo a pequena família desaparecia entre as árvores da extremidade norte do lago.
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Kevin baixou a câmera e voltou-se para Emily, agachada a seu lado. O rosto dela revelava o prazer de compartilhar o espetáculo dos ursos com ele. Seus olhos faiscavam e o ar frio dera cor à sua face. — Valeu a pena acordar para ver, não valeu? — O abrigo amarfanhado aderia a seu corpo e, no ar gelado, seus mamilos apontavam eretos, sob o tecido leve. Como que atingido por um raio, ele a desejou de modo repentino e avassalador. Só queria tomá-la nos braços e puxá-la para dentro do calor do saco de dormir enquanto lhe tirava aquela maldita roupa azul e enterrava a boca na doce nudez de seu corpo. Seus olhares se encontraram, e algo do que Kevin sentia se refletiu por um instante no rosto de Emily. Ficou vermelha, afastou-se rapidamente e calçou o tênis colocado junto à entrada. — Vou acender o fogo e preparar o café. Há água fria no balde, pode se lavar e se vestir primeiro, se quiser. Quando estiver pronto, é minha vez. — Uma palavra atropelava a outra, e a voz não era muito firme. — Precisamos sair o mais cedo possível. É uma longa viagem até o acampamento. Vendo a barraca se fechar atrás dela, Kevin se agachou, apertando os olhos para lutar contra o desejo que ela lhe despertara. Santo Deus, como iria sobreviver ficando sozinho com ela nos próximos dias? Lembrou das perguntas que lhe fizera a noite anterior, se os homens não tentavam se aproveitar dela, e seu rosto contorceu-se num sorriso cínico. Era melhor Emily manter o rifle à mão. E não por causa dos ursos.
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CAPÍTULO VII
Almoçaram num vale repleto de flores. Kevin pediu a Emily que lhe dissesse os nomes das espécies. — Lírios crespos, campainhas, lírio do vale, açafrões temporões, rosas selvagens precoces, flor de tremoço, cravos e dentes-de-leão. Os índios prestam muita atenção a quais flores desabrocham em que época do ano. Acreditam que a sua presença indica se a safra vai ser boa ou não, se os ventos serão fortes e quanto vai durar o verão. — Emily estirava-se na relva de barriga para baixo. Ali era muito mais seco do que no lago Wolverine, em parte devido ao vento constante. — Este é o Vale Ventoso, por razões óbvias. Chegaram ao Acampamento do Urso Pardo no final da tarde. Haviam andado por várias horas pela encosta de uma montanha; depois Emily o guiara até um vale que se abria numa ampla campina, margeada por uma encosta coberta de relva. Um rio, que Emily chamava de Quarry, atravessava a campina, desaguando num lago turquesa que contrastava vivamente com e cenário verde. — Ele tem nome? — Tem. Anos atrás, quando éramos adolescentes e românticas, Laura o batizou de lago da Lua-de-mel. Junto à encosta, no final da campina, avistaram uma cabana baixa e comprida, feita de madeira espessa. Possuía um telhado coberto de musgo, com caimento para os fundos, venezianas em todas as janelas e uma espécie de varanda na frente. Havia um curral e um abrigo aberto dos lados para os cavalos, e um banheiro externo a alguma distância da cabana. de frente para o lago. Depois de descarregarem os cavalos e os deixarem pastando no curral, Kevin e Emily entraram na cabana, cada um com uma caixa de mantimentos. — Vovô Luke construiu tudo isso. Está quase igual ao que era anos atrás, A gente quase não vem aqui, não fizemos grandes reformas — avisou, lutando com o trinco. Enfim, conseguiu abrir a porta. O interior cheirava a mofo. A escuridão era quase completa, por causa das pesadas venezianas. Juntos, abriram-nas e prenderam-nas com varetas de madeira-. O sol do fim do dia e o ar da montanha entraram na cabana. Kevin olhou em volta, curioso. A construção tinha cerca de doze metros de comprimento. Encontravam-se numa peça de múltiplas finalidades, com um velho fogão de chaminé preta, uma mesa com belos entalhes decorativos e cadeiras e bancos artesanais. Havia um sofá improvisado: toras, tábuas e pele de animal curtida. — Os quartos são lá nos fundos. Escolha o seu — recomendou Emily. Kevin foi examiná-los. Os dois quartos tomavam toda a extensão da casa, separados por uma parede divisória que não chegava ao teto. Pareciam aconchegantes e escuros, porque ficavam sob a parte mais baixa do telhado, e os
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fundos da cabana ficavam contra a encosta. cada um continha apenas uma cama construída com toras amarradas com corda, suportando um estrado de arame e um colchão coberto com aniagem. Alguns pregos na parede para pendurar coisas, uma caixa de madeira que servia de mesa de cabeceira, e só. Kevin jogou suas malas num deles e deixou as de Emily na cama do outro quarto. Desejou que houvesse apenas um quarto. — Vovô trouxe os estrados e os colchões, só Deus sabe como. — Emily arrumava os mantimentos nas prateleiras da área reservada à cozinha. — Há uma pilha de gravetos lá fora embaixo do alpendre. Se quiser trazer alguns, vou acender o fogão e preparar o jantar. Não sei quanto a você. mas eu estou faminta. Emily nunca estava só com fome, mas sempre morta de fome, pensou ele, Nunca estava só feliz, mas em êxtase. Em conseqüência, parecia mais viva do que as pessoas comuns. Sua paixão pelos prazeres cotidianos da vida o fascinava. Enquanto enchia uma caixa de gravetos e tocos de madeira, entregou-se ao devaneio imaginando como aqueles extremos passionais se dariam ao fazer amor com Emily. Não haveria nada de passivo em ter seu corpo nu nos braços, tinha certeza disso. Gemeu diante da reação física que estes pensamentos provocaram e se pôs a cortar madeira como terapia. Logo havia um fogo ardendo no fogão, e Emily fritava batatas numa pesada frigideira de ferro. Feijões eram cozidos numa panela e ó bacon veio dividir o espaço dá frigideira com as batatas. O aroma fazia o estômago de Kevin roncar enquanto ele trazia o resto do equipamento para a cabana. Emily não era a única morta de fome. Não conversaram muito durante a refeição; comeram avidamente sem deixar sobras. Para a sobremesa, Emily abriu uma lata de pêssegos, que eles comeram junto com o resto dos biscoitos gigantes de Laura. Depois foram sentarse do lado de fora para ver o sol desaparecer atrás dos picos do oeste. — Preciso acender os lampiões e lavar a louça. —Começava a ficar escuro dentro da cabana, mas Emily sentia uma preguiça gostosa, devido ao cansaço da longa viagem.... — Por que não lavamos a louça mais tarde? É hora do pôr-do-sol, vamos passear no lago. Talvez a gente possa nadar um pouco antes de escurecer — Kevin arriscou. Adoraria ver Emily de maio; o lago turquesa parecia convidativo no crepúsculo róseo e aliviaria o calor e o suor daquela viagem cansativa. A cabana não possuía um chuveiro, é claro. Emily encarou-o como se houvesse dito um absurdo. — Você está louco, Richardson? Estamos em maio, há neve no chão em vários lugares. Não me agrada nem um pouco pular num lago gelado! Já nadei o bastante no rio Elk ontem. — A água não pode ser mais fria do que o oceano em Vancouver. Nado lá durante quase todo o ano. Água fria não me incomoda — mentiu. — Vai ser revigorante, depois da nossa longa viagem. Não tem vontade de nadar para se livrar de todo esse suor? — De jeito nenhum.
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— Ora, vamos! Dormimos em quartos contíguos. Não se importa de me incomodar com o cheiro do seu suor? Além disso, a sua função e me entreter, não é? Sou um cliente, não se esqueça — brincou ele. — Planejo trancar-me no quarto com uma grande bacia de água quente. Não é tão bom quanto um banho, mas resolve o problema. — Vocês da montanha são uns frações. Todo esse papo sobre os turistas, sobre os caras da cidade serem cheios de frescura, tudo isso é só um disfarce, porque na verdade vocês não são de nada. Achou que Emily não resistiria a um desafio desses, e acertara. Ela fuzilouo com os olhos. . — Pegue seu calção, espertinho — ordenou, correndo a pegar o maio. — Vamos ver quem é o fracote aqui! Alguns momentos depois, Kevin deu uma corrida e pulou no lago. Por um instante, achou que ia ter um ataque cardíaco. A água estava tão gelada que ficou paralisado. Com certeza havia blocos de gelo flutuando ali peito. Reunindo todas as suas forças, nadou alguns metros antes de se virar e sorrir para Emily, que permanecia a certa distância da margem, enrolada numa toalha gigante e encarando-o com ar de desconfiança. — Venha, não é tão ruim assim! — gritou Kevin. — É refrescante! — Mal conseguia pronunciar as palavras, de tanto que os dentes batiam, mas esperava que ela não o notasse a distância. Emily fez o que esperava que fizesse, largou a toalha, tomou impulso e mergulhou no lago. No instante em que tocou na água, sua respiração se transformou num arquejo agonizante. Começou a gritar e chapinhou em direção à margem. Saiu com tanta rapidez que ele se perguntou se chegara a se molhar completamente. Seguiu-a sem perda de tempo. Até o ar frio era mais quente ao tocar cm sua pele do que a água. e o riso também o aquecia. — Foi um truque nojento, seu... seu idiota! — Correu para cima dele socando-o com os punhos, mas agora estava rindo quase tanto quanto ele. — Aquela droga de água estava gelada e você sabia! Deus, eu sabia que estava gelada. Como deixei que me convencesse a fazer isso? O maiô vermelho aderia a todas as curvas daquele corpo tão atlético e tão sensual ao mesmo tempo. A longa trança molhada balançava quando ela investia contra ele, com os olhos verdes pedindo vingança. — Vou reduzi-lo a pó por causa disso, Richardson! Kevin afastou-se para evitar o soco que ela planejava lhe dar e, quando ela o seguiu, agarrou-lhe os pulsos e segurou-os, imobilizando-a. Os dois riam de modo histérico enquanto Emily lutava para se libertar. — Vou jogá-lo na água de novo, isso vai lhe ensinar — ameaçou, empurrando-o com força. O ataque pegou-o desprevenido. Cambaleou em direção ao lago antes de se firmar, arrastando-a consigo. Então, num lance de surpresa, levantou-a nos braços. — Agora vamos ver quem é que vai para a água — avisou, indo para a beira do lago.
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Emily esperneava e gritava. Agarrou o pescoço dele com os braços. — Se eu for, você vai junto! — gritou ela.. Era inebriante, tê-la nos braços, os seios comprimindo seu tórax. Deu vários passos ameaçadores para frente, mas sua cabeça já estava bem longe daquela brincadeira. Ter Emily nos braços era fantástico. Tinha plena consciência de quão pouca roupa havia sobre ela, da maciez da pele da parte de trás das coxas, ali onde a segurava com um braço. O outro braço envolvia os quadris. Emily era ágil e musculosa, mas também suave. Kevin sentia o volume daqueles seios.. Vendo a boca de Emily a poucos centímetros da sua, Kevin não conseguia mais resistir. Permaneceu ali, em pé, com as pernas juntas, segurando-a, respirando com dificuldade pelo esforço e pela excitação. Fitou-a por um longo instante, e ela ficou quieta, ciente de que a brincadeira acabara. — Emily? — Era uma pergunta, mas ele não esperou a resposta. Baixou os lábios até encontrarem os dela num beijo terno. Os lábios de Emily eram doces e cheios sob os seus. Soltou-a para que deslizasse por seu corpo ainda molhado. Amparou-a ao vê-la cambalear, mas continuou beijando-a, envolvendo-a com um braço assim que ficou em pé, puxando-a cada vez mais para perto. Não resistindo mais, levou a mão até o seio de Emily. O mamilo endureceu ao toque, e Kevin sentiu a respiração dela acelerar-se. Estava louco de desejo. Inclinou mais a cabeça e aprofundou o beijo. Alguma parte dela havia percebido que a briga ia acabar daquele jeito. Alguma parte dela forçara aquele desenlace, indo atrás dele, socando-o de brincadeira, convidando-o ao inevitável contato corporal. Sabia que não era a forma adequada de proceder com um cliente, era contra todas as regras que estabelecera para si mesma ao longo dos anos. Mas com Kevin Richardson ela havia quebrado as regras desde o início, não havia? Sabia que não poderia repelilo. Não agora. Ainda não. Queria que ele a beijasse. Queria isso desde a última vez, na despensa do acampamento.central. O que não previra era como o estado de semi nudez de seus corpos a afetaria, o calor e o ímpeto daquele corpo apertado contra o seu, ereto e late jante, com apenas b náilon fino de suas roupas de banho os separando. A língua de Kevin explorava a sua boca, saboreando-a com tanta sensualidade que a fazia tremer, e a mão em seu seio parecia queimar. A cabeça dele se inclinara mais a fim de aprofundar o beijo. Então Kevin gemera e soltaralhe o seio para envolvê-la completamente com os braços, puxando-a pelo traseiro, abrindo-lhe as pernas e apertando-a com força contra seu membro ereto. O calor e um desejo avassalador brotaram de sua pélvis e espalharam-se por todo o seu corpo: Um grito suave veio-lhe da garganta e o corpo moveu-se por instinto contra o dele. Sabia que no minuto seguinte estariam ao chão, e isto a assustou. Foi preciso um esforço sobre-humano, mas Emily afastou a cabeça, lutando para se libertar.
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— Pare, Kevin. Pare! Por favor. Por um longo instante, duvidou que ele parasse. Mais um daqueles beijos inebriantes e ela também não conseguiria parar. Mas então Kevin ofegou e deixou que se afastasse. Não a soltou por completo, contudo. As mãos seguraram seus ombros até que os olhos dela ousassem encontrar os seus. Kevin franziu as sobrancelhas.. — O que foi, Emily? Qual é o problema? Emily respirava de modo irregular. Seu corpo doía de desejo. Era difícil exprimir o que sentia em palavras. — Você me quer, eu sei disso! A voz de Kevin era rouca e cheia de raiva. — Quero. Mas não posso! É... É quase como ser seduzida — acabou falando. Ele sacudiu a cabeça. — Não acho. Tive a sensação de que estava gostando tanto quanto eu. Somos adultos, Emily. Iguais. Que diabo é essa história de sedução?; Emily não podia explicar sem revelar mais de si própria do que pretendia no momento. Afastou as mãos dele dos ombros com um gesto de corpo, encontrou as sandálias e calçou-as,, pegou a toalha e enrolou-se nela, como que para se proteger, e começou a voltar, atravessando a campina. Kevin não a seguiu de imediato, e ela ficou-lhe grata por Isso. Acendeu o lampião e vestiu o jeans e uma camisa. Reanimou as chamas quase extintas do fogão, colocou água no fogo para lavar os pratos e começou a limpar os restos do jantar.'... Já escurecera quando ele voltou. Vestira uma camisa sobre o calção. Emily não conseguia deixar de olhar para aquele corpo musculoso quando achava que ele não estava vendo. Vira-o antes de short, já sabia como ele era, mas não podia evitar. As pernas, fortes e longas, a fascinavam, e o resto apresentava uma proporção perfeita. Perguntou-se se ele estaria furioso com ela por ter sido recusado daquele jeito. Mas Kevin sorriu amistosamente e comentou: — Acho que sabe que o banheiro não tem porta... Aliviada, retribuiu-lhe o sorriso. — Vovô achava ótimo poder apreciar a vista. Posicionou o banheiro de modo a ficar de costas para a cabana e de frente para o lago e as montanhas. — Demora um pouco para um cara da cidade se adaptar. Vou vestir o jeans e num minuto venho secar a louça para você. Assim, Emily lavava e Kevin secava, cuidadosa e meticulosamente, manejando os pratos de plástico e as xícaras de alumínio como se fossem de porcelana chinesa. As mãos dele eram grandes, mas graciosas. Emily estremeceu, pensando nelas sobre seu corpo. — Quer me dizer que história foi aquela, Emily? 65
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Ela esfregou a panela de feijão com mais vigor do que o necessário. Ele secava os talheres, e continuou colocando as facas e as colheres em seus lugares na gaveta. — O que falei sobre sedução? — Emily pigarreou e desabafou: — Às vezes os homens chegam aqui no vale, descobrem que sou a guia, e acham uma idéia divertida me levar para a cama com eles. Uma ótima história para contar aos amigos quando voltam para a cidade, à caipirinha gostosa que possuíram durante uma pescaria. Isso não teria nenhuma importância se eu tivesse a mesma atitude que eles em relação ao sexo. Então eu fico mesmo nervosa quando se trata de um envolvimento com algum cliente, no sentido sexual. — Com o rosto vermelho, ficou olhando para a panela, esfregando-a ainda, embora não houvesse mais nem uma migalha de sujeira nela. Kevin ficou sem responder por um longo tempo e, enquanto esperava, Emily achou que acabara de estragar tudo, que não tinha mais jeito. Por fim, ele estendeu a mão para pegar a panela. — É isso o que acha que estou fazendo, Emily? Tentando te conquistar para inflar meu ego, uma a mais pára aumentar a lista? O tom era neutro, e ela o fitou de soslaio para ver se alguma emoção se refletia em seu rosto. Não se refletia. — Já lhe disse uma vez, não é o meu estilo. Frustrada, Emily jogou o pano de prato na bacia e a água espirou em toda a sua camisa. — Droga, estou toda molhada de novo! Como diabos vou saber o que está tentando fazer, Richardson? Conheço-o há uma semana apenas, não é o suficiente para um exame psicanalítico profundo... Só sei que é muito errado confiar em homens, especialmente naqueles a quem sirvo de guia. — Enxugou a camisa com uma toalha. A coisa ia de mal a pior. — Parece que algum sujeito a tratou muito mal. — A voz continuava neutra mas, quando ela o encarou, o olhar era intenso. — Não é verdade, Emily? Abriu a boca para negar, mas, em vez disso, ouviu-se concordar. — É Acho que é isso. Kevin encheu duas xícaras de café, preparando a dela do jeito que ela gostava, com um pouco de açúcar e uma gota de leite condensado. Levou-as até o sofá e sentou-se, batendo no estofo a seu lado num convite silencioso. Depois de um momento, Emily secou as mãos e afundou no sofá, aceitando a xícara de cate. — Gostaria de conversar sobre isso? — Falava como se não se importasse se ela não quisesse. Ela deu de ombros e tomou um gole de café. — Não há muito a contar, aconteceu há muito tempo. — Concentrou-se para manter um tom leve, como se fosse apenas uma história, como todas as outras. — Eu era jovem e inocente, com vinte e poucos anos. Veio um grupo do Texas, dois advogados, dois fazendeiros e um vaqueiro, Jake Fowler. Jake era tão educado, tão cavalheiro, mas sabia onde pisava. Não era um garotinho inexperiente, e isso me impressionou. O resto do grupo queria ver ursos, mas ele
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queria pescar, então acabei passando muito tempo sozinha com ele. Eu não era muito experiente naquela época, e ele sabia fazer com que me sentisse especial. Emily sabia que seu tom era amargo, mas não podia evitá-lo. Continuou: — Acho que adivinha o resto. Eu era muito ingênua. Apaixonei-me por ele, e... deixei-me envolver. Ele me fez todo o tipo de promessa de um futuro juntos, dizendo que se apaixonara loucamente por mim. Acreditei nele. — Tomou um gole de café antes de continuar, e Kevin esperou sem dizer nada. — Então, na noite em que iam partir, escutei-o contar vantagem aos amigos sobre suas qualidades de garanhão conquistador, dizendo que a pequena Emily se apaixonara por ele, e que estava em suas mãos. Todos estavam bebendo e riram muito às minhas custas. A voz de Kevin possuía um toque de severidade. — E o que você fez? Ela fingiu rir. — Nada. Nada mesmo! Senti-me humilhada e envergonhada por ser ingênua a tal ponto. Era muito jovem e inocente para enfrentá-lo como faria hoje em dia. Saí de cena como um gato escaldado, parti sozinha mata adentro de madrugada no dia seguinte e fiquei fora uma semana. Nunca mais o vi. — E agora está me tomando por um Jake Fowler. — Era uma afirmação mais do que uma pergunta, e isto irritou Emily. — Não seja ridículo, claro que não! Não sou tão estúpida. Acontece que, depois dessa experiência, decidi que jamais seria impulsiva de novo. Vou com calma quando se trata de um envolvimento, penso em tudo antes de me entregar a alguém. E também decidi que, quando se trata de um cliente, negócios são negócios. — E tem cumprido esta decisão? — Tenho. Rigorosamente! Na verdade, nunca foi muito difícil, porque os homens que me interessaram não foram exatamente uma multidão. — O tom de humor negro cortava o coração de Kevin. — Não era difícil dizer "não" à maior parte dos clientes e, como já lhe falei, os caras daqui não ficam muito tempo por perto quando descobrem que passo grande parte de minha vida no bosque e que pretendo continuar a fazer isso. Kevin ficou em silêncio por um longo tempo, com as idéias confusas. Indagava-se onde estaria agora Jake Fowler, e pensou como seria se o encontrasse. Pensou em Emily, em como ela era complexa e, ao mesmo tempo, direta e honesta. Por fim, perguntou: — E nós, Emily, como é que ficamos? Ela não o encarou. Levantou e largou a xícara no balcão. Ele era um cliente, e tudo o que precisava era lembrá-lo de novo de que não ia para a cama com clientes. No entanto, sabia que aquela regra não seria obedecida no caso dele; sabia disso desde o momento em que concordara em levá-lo ao Acampamento do Urso Pardo. Queria fazer amor com ele, mas seu orgulho exigia que fosse ela a escolher o momento. Não podia simplesmente acontecer, sem mais nem menos, como se fosse acidental. Era importante demais para ela, embora não soubesse por quê.
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Olhou dentro dos olhos dele e não desviou os olhos ao declarar, com franqueza: — Preciso de um tempo, Kevin. Vou saber quando chegar o momento.. Kevin olhou-a de esguelha e assentiu, sem dizer mais nada. Foram para a cama logo em seguida, cada um de um lado da fina divisória. Como havia dito, Emily levou uma bacia de água quente para o quarto e tomou um banho de esponja antes de vestir o abrigo quente, plenamente consciente de sua.nudez e da presença de Kevin a poucos metros dali. O último som que ouviu antes de adormecer foi a voz tema de Kevin. — Boa noite, Emily. Tenha bons sonhos, querida. Ele acordou de um sono profundo com a sensação de não estar sozinho no quarto. Ainda estava completamente escuro; a janela era apenas um ponto mais claro em meio à escuridão. Abriu a janela e uma brisa fresca bateu em seu rosto e braços enquanto se apoiava num cotovelo e tentava enxergar em meio às sombras. Tonto de sono, imaginava ursos entrando na cabana... porcosespinhos... pumas.. — Está acordado, Kevin? — O sussurro de Emily era tão suave e rouco que ele quase não entendeu as palavras, — Estou algum problema? O que foi? — Lutou para se levantar, mas o saco de dormir o segurou e praguejou em voz baixa, lembrando-se de que o rifle se encontrava ao pé da cama, apoiado numa cadeira.
Ela chegara mais perto da cama quando respondeu, mas ainda sussurrava. — Não há nenhum problema. — Depois de uma pausa, sussurrou ainda mais suavemente: — Se não tiver nada contra, acho que tenho bastante tempo agora, Kevin.O coração dele bateu como um martelo em seu peito. Teve de engolir em seco.— Venha cá, meu amor — Kevin conseguiu murmurar, e um instante depois a recebeu nos braços, dentro do saco de dormir. Emily estava nua e o choque de estar com ela, macia como cetim, e trêmula, despertou-lhe uma onda de desejo tão forte que achou que ia explodir só de tocá-la.
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CAPÍTULO VIII
Emily tremia, e Kevin não sabia se era de tensão ou de frio. O quarto estava gelado. Segurou a cabeça dela com um braço, inebriado com a delícia de ter aquele corpo nu apertado contra o seu. — Eu te quero, Kevin, mas tem de haver algumas regras.— Emily se afastou um pouco. — Enquanto estamos aqui, vamos fingir que somos um homem e uma mulher, a sós, sofrendo de... de um tipo exótico de febre do vale. Mas quando sairmos daqui, então... então nada. Não quero que pensemos em futuro,porque, é claro, não existe um futuro.' Era importante para Emily que ele não pensasse nem por um momento que ela pudesse projetar um futuro baseado naquilo, ou lhe fazer algum tipo de exigência. Seu orgulho exigia que tudo estivesse claro desde o início. — Então, quando voltarmos ao acampamento central, seremos guia e cliente de novo, como se nada houvesse acontecido, certo? Isso tem de ficar bem claro antes de... de começarmos. Concorda? Concordaria com qualquer coisa só para tê-la nos braços. — Acho que deve ser melhor para nós, se é o que deseja — falou Kevin, pensando em como conseguiria fingir que não a possuíra, que não a amara. Sabia, no entanto, pelo tom de voz de Emily, que ela estava decidida e conhecia-a bem o bastante para saber que iria embora se não concordasse, e talvez jamais surgisse outra ocasião. Não tinha a menor intenção de discordar. — Emily... Em. Meu Deus, como você é bonita!:— Acariciou-a, contendo aquele desejo avassalador que o apressava, acalmando-a, ajudando-a a relaxar. Tocou-lhe os seios, cobrindo-os e massageando o centro do mamilo com o polegar, notando a sua própria excitação aumentar perigosamente ao escutá-la gemer e mover os quadris contra seu corpo. — Devagar, amor. com calma. Temos a noite toda... A noite toda, o dia todo, a noite seguinte, a próxima semana a sós com ela parecia estender-se a uma deliciosa eternidade., Kevin sentiu-se inebriado de prazer. Beijou-a, devagar, profunda e completamente, estremecendo diante da maneira como a língua de Emily respondia à sua. Deslizou a mão por todo o corpo feminino, explorando as curvas sensuais, encontrando as áreas mais sensíveis aos toques. Quando, enfim, seus dedos chegaram à fenda entre as pernas, ela gritou e esfregou-se contra a mão de Kevin. Ele sussurrava-lhe tudo o que sonhara lhe dizer durante as longas noites desde quê a conhecera. — Quero que me possua agora, Kevin sussurrou Emily. Os corpos estavam úmidos de suor, e Kevin afastou o incômodo saco de dormir para que deitassem nus sobre o lençol. Murmurando-lhe desculpas, deixou-a por um momento,
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remexeu num pacote que deixara no chão ao lado de suas calças e pegou um preservativo; Então voltou aos braços de Emily, deitando-se sobre ela, cobrindo-a com o corpo. — Está tudo bem, amor? Não Sou muito pesado para você? Emily não respondeu com palavras. Kevin arquejou ao sentir a mão dela cerrar-se em torno de seu pênis, guiando-o para dentro de si. Emily sentiu-o penetrá-la devagar e o envolveu com as pernas, levantando o corpo para acompanhar os movimentos ritmados, A força das sensações, a intensidade do desejo era algo inteirar-mente novo em sua experiência reconhecidamente limitada, e tomou-a de surpresa. Os gemidos de prazer transformaram-se em gritos intensos e irreprimíveis. Contorcia-se embaixo dele, alheia a tudo exceto àquela sensação concentrada sob o abdômen e àquele desejo desesperado pelo homem que a agarrava com firmeza. Kevin sussurrava, instigando-a, e movia-se numa cadência enlouquecedora, intensificando o prazer que a incendiava. Os gritos iam ficando mais altos e mais intensos. Cravava as mãos nas costas e no traseiro de Kevin, puxando-o, incitando-o a apressar-se. Sussurrou o nome dele e, quando ele investiu com um ímpeto mais forte, seu corpo contorceu-se, todos os músculos se contraíram e todo o seu ser explodiu em êxtase. Quando Kevin chegou ao clímax, um grito gutural saiu-lhe da garganta. O prazer não tinha fim, sugando-lhe todas as forças e saciando-o completamente. Depois de um tempo, deslocou-se, tirando parte do peso de cima de Emily. Ela descansou em seus braços, com a respiração lenta e lânguida. — Emily? — Kevin estendeu a mão e pegou o saco de dormir, abrindo o zíper para que lhes servisse de cobertor. Com cuidado, cobriu os ombros nus de Emily com o corpo, colando-se às costas dela. — Em, você está bem? A voz de Emily já era um tanto sonolenta, e Kevin riu daquele tom grave. — Claro que estou bem! Não fale. Estou bem demais para falar. Durma, Richardson. Dali a alguns minutos, ele dormiu. Através da pálida luz que entrava pela janela, Kevin sabia que ainda era cedo. Mas não cedo o bastante para Emily, que já se levantara e, pelo jeito, há tempos. Kevin se perguntava se estaria na cozinha, acendendo o fogo, mas não ouvia nenhum ruído além do cantarolar dos pássaros. De repente, ficou preocupado, achando que talvez ela se arrependesse do que acontecera à noite. Mas como poderia se arrepender de algo tão fantástico? Kevin maravilhavase com a intensidade do que ocorrera entre eles. Emily era uma mulher magnífica, impetuosa, apaixonada como nunca pensara que uma mulher pudesse ser. Simples, honesta e adorável. Só de pensar nela, desejava-a outra vez. Parou em meio ao ato de vestir as calças.
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E você, Richardson, é um filho da mãe mentiroso. Sabe disso, não sabe? Sentou-se na cama, imobilizado pelo terrível sentimento de culpa. Mais do que qualquer coisa no mundo, queria que Emily o respeitasse, acreditasse nele, fosse sua amante e sua amiga. Nunca se sentira tão atraído por uma mulher. Pela primeira vez na vida, queria estar com ela, a sós, enquanto o destino o permitisse. O que não duraria muito tempo. Uma semana, se tivesse sorte, e aí... a Companhia de Empreendimentos Pace e tudo o que ela representava arruinariam tudo. Aquela sensação de dor no estômago aumentava. Viva um dia de cada vez, senão vai arruinar o que pode ser um tempo maravilhoso. Puxou as calças para cima e fechou o zíper, depois pegou uma camisa de flanela. Precisava vê-la. Precisava certificar-se de que tudo estava bem entre eles. Precisava fazer amor com ela de novo. Viveria para aquele momento, sem ligar para o dia de amanhã. Enquanto pudesse. Emily despertara ao amanhecer. Escorregara para fora dos braços de Kevin. deliciando-se com aquele rosto adormecido, o cabelo desgrenhado e os ombros musculosos salientando-se no saco de dormir aberto. Parecia tão vulnerável, ali, daquele jeito. Até inocente. As lembranças da noite vieram-lhe à memória, e suas faces coraram. Richardson não era nada inocente. Era um amante vigoroso, completo, muito mais experiente do que ela. Fizera com que respondesse de forma tão apaixonada que se espantava ao relembrar. Seria a técnica, ou seria algo existente dentro dela, uma reação que jamais tivera antes com um homem? Não queria pensar muito nisso, então saiu sorrateiramente do quarto, fechando a porta com calma atrás de si. Tremeu ao usar a água gelada da bacia para se lavar. Vestiu o jeans e uma camisa xadrez vermelha. Passou um pente no cabelo, deixando-o solto, depois acendeu o fogão. Lá fora, o sol surgia atrás do pico das montanhas, que refletiam o seu brilho róseo e dourado. O lago espelhava o céu deslumbrante, e a luz incidindo sobre as gotas de orvalho fazia a campina brilhar como-se estivesse repleta de diamantes. A paz reinava, e o ar da montanha era puro e revigorante. Emily prendeu a respiração, encantada. Foi para frente da cabana e andou em círculo, de braços abertos, saudando a montanha. Depois, agarrou um balde e foi até o riacho, inclinando-se para encher o balde com aquela água límpida e gelada. Um grande contentamento a invadiu enquanto voltava à cabana, balançando o balde. Era naquele acampamento que ela mas se sentia em casa, aquele era o lugar que mais amava e que chamava de "seu vale". Havia algo ali que lhe dava felicidade e paz. Kevin vinha em sua direção pela campina, movendo-se com aquele jeito atlético que ela tanto apreciava. Fitou-o, lembrando-se da sensação de ter aquele
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peito nu junto a si, aqueles traseiros... Nenhuma parte daquele corpo lhe era estranha agora.' Kevin não disse nada até chegar bem perto. — Você parece uma deusa paga, andando pela relva com os cabelos soltos assim. — A voz era grave e rouca, e o sorriso,, terno. Emily ia brincar dizendo que as deusas não usam jeans e camisa, mas olhou dentro dos olhos dele e viu que o que dissera vinha do fundo do coração, e isso a encheu de alegria. Sorriu para Kevin, que lhe tomou o balde d'água das mãos, largando-o no chão, para depois abraçá-la, enterrando o rosto em seus cabelos, beijando-lhe o pescoço, o queixo, a ponta do nariz, provocando-lhe risadinhas. — Você e a minha bela mulher selvagem — proclamou, pegando-a no colo. Emily passou os braços cm tomo do pescoço dele. — Kevin, ponha-me no chão. Vai deslocar a coluna, me carregando assim o tempo todo... Mas ele ria e sacudia a cabeça, seguindo para a cabana como se ela não pesasse mais que o balde d'água abandonado na relva: — O fogo... Temos de pôr lenha no fogo... — Esqueça o fogo. Sei um jeito ótimo de ficarmos aquecidos. — Carregou-a até o quarto dele e deitou-a na cama. Ajoelhou-se a seu lado e começou a desabotoar a camisa vermelha. — A última noite foi fabulosa, minha deusa paga, mas não gostei de não poder vê-la. Agora quero beijar cada pedacinho de você, aqui... — Abriu a camisa e cobriu os seios nus com as mãos. Inclinou-se e levou a boca a um mamilo, depois ao outro, sugando-a até que gritasse e começasse a se mover sinuosamente embaixo dele. O movimento daqueles lábios quentes e molhados em seus mamilos acendeu um fogo dentro de Emily. Com pressa, Kevin tirou-lhe o jeans e a calcinha de algodão,-e suas mãos acariciaram-lhe o corpo,.fazendo-a tremer. — Você também! Não é justo só eu ficar nua! — A voz era trêmula, mas os dedos desabotoavam-lhe a camisa com firmeza. Logo, os dois estavam nus. Em vez da lânguida dança de amor que ele planejara, juntaram-se na mesma paixão selvagem e desenfreada da noite anterior. Só que, desta vez, Emily saiu da posição passiva, montando em cima dele e cavalgando-o. A cabeça de Emily se reclinava para trás, os cabelos negros sedosos espalhados pelos ombros, o corpo deslumbrante exposto para ele sem nenhuma vergonha enquanto guiava aquela cavalgada rumo ao gozo, tombando, ao final, sobre o peito de Kevin. Abraçou-a até a respiração de ambos voltar ao normal., — Li em algum lugar que o ato de amor deve levar horas — falou Kevin, passando os dedos pelo cabelo de Emily. — Acho que precisamos praticar mais. — Podíamos acionar um cronômetro — concordou ela, em Voz sonolenta e satisfeita. — Mas, no nosso caso, esse estilo rápido é muito melhor.
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— Por quê? Emily desvencilhou-se dos braços dele e tentou achar as calcinhas que haviam sido jogadas para longe descuidadamente. — Porque você e eu não dispomos de muito tempo. Ele sentiu um frio no estômago ao observá-la. — Temos uma semana inteira, juntos aqui, a sós — replicou Kevin.,. — E o que quero dizer. Não é muito tempo. Agora levante, preguiçoso, e me, ajude a fazer o café. A esta altura o fogo apagou e teremos de acender outro. Kevin investiu contra ela, brincando, e derrubou-a na cama. — Para mim está ótimo — sussurrou, em seu tom mais lascivo. — Posso acender outro fogo, daqui a uma hora mais ou menos, se tomar algumas vitaminas. Você acabou comigo, mulher! Os dois caíram na cama, rolando de rir, mas em poucos momentos o corpo de Kevin enviou-lhe um sinal de que estava pronto. E, desta vez, fizeram amor tão devagar quanto ele planejara. Desta vez ele é que ditaria as regras do jogo. Deliberadamente, levou-a ao auge da paixão e então segurou, até que ambos delirassem de vontade. Quando não podiam mais esperar, chegaram juntos ao clímax. Já era bem mais de meio dia quando finalmente acenderam o fogão. Emily fritou ovos com bacon e fez biscoitos, e devoraram tudo, até a última migalha. — Desta vez eu estava mesmo morta de fome —, declarou Emily, engolindo o último pedaço de biscoito com geléia de morango. — Agora vamos lavar a louça e sair para tirar fotos. — Levantou-se e começou a esfregar os pratos e a encher a bacia com água quente. — Estava pensando em ficar um pouco mais na cama — replicou ele, esperançoso. Emily fingiu escandalizar-se. — Você é viciado em sexo! Estou aqui, a centenas de quilômetros de qualquer lugar civilizado, com um maníaco sexual. — Detesto desapontá-la, mas quando falei em ficar na cama queria dizer tirar uma soneca. Umas duas ou três horas de sono. — O tom era terno e esperançoso. — Estou um pouco cansado. — Nada disso! Sinto muito, mas não devia ter comido tanto. — Emily mergulhava os pratos na água, retirava-os dali e depositava-os sobre uma toalha para que secassem. — O acordo era para levar você para conhecer a vida selvagem, e é exatamente isso que vamos fazer. — Mas hoje eu já aprendi bastante sobre a vida selvagem! i Emily não pôde deixar de rir, mas não cedeu. — Levante-se, Richardson. Vamos cavalgar pela campina, subir o monte Abbey e ver se encontramos bodes montanheses para fotografar. Ou alces, veados, qualquer outro animal.
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— Não consigo me mexer! Estou inválido. Talvez um beijo ajude. — Apesar de todas as queixas de não ter energia, levantou-se e aproximou-se dela, com um riso torto. Emily colocou uma cadeira entre ambos. — Pare! Já chegou perto demais. Não confio em você. — Mantendo-o a um braço de distância, reclinou-se e depositou-lhe um beijo nos lábios. — Pronto! Agora arrume suas coisas, pegue o rifle e saia! Com um rápido movimento, a cadeira foi empurrada para o lado e Emily foi puxada para os braços dele e longamente beijada. Quando todas as suas resistências haviam sido vencidas, ele a soltou. Numa espécie de êxtase hipnótico, os dois pegaram suas coisas e foram selar os cavalos. Mais tarde, ele se lembraria daquela longa tarde não tanto pela espantosa variedade de animais selvagens que encontraram, mas pelos laços profundos que se estabeleceram entre os dois. Era como se a união física tivesse tomado possível uma abertura completa entre eles; ao menos a respeito de algumas coisas. Kevin não falou da Companhia de Empreendimentos Pace, mas, pela primeira vez em toda a sua vida, conseguiu falar da mãe. Passaram pelo lago e seguiram cavalgando pela campina. — Veja, uma fêmea de alce com seu filhote — anunciava Emily, cheia de entusiasmo. O animal grande e pesado não os farejara. A fêmea estava ajoelhada num brejo, devorando algum tipo de vegetação junto ao filhote desengonçado, que tentava imitar a mãe. — Ele é uma gracinha, não é? — Os olhos de Emily brilhavam com a cena, embora ela guardasse distância. Avisou a Kevin: — Um alce com seu filhote pode ser perigoso. Prepare-se para correr se for necessário. Kevin bateu várias fotos. Então o alce sentiu o cheiro deles e correu para dentro do bosque, empurrando o filhote com ó focinho. — Adoro a primavera, quando as fêmeas têm novos filhotes Sempre me comove, o jeito como tomam conta deles. Não recebem nenhuma ajuda do pai'. Ele cumpre seu papel biológico, depois desaparece, e todo o processo de criação é desempenhado pela mãe.— Ficou em silêncio por um momento, depois acrescentou: — Não é diferente da forma como fui criada, na verdade. Mesmo quando estava vivo, meu pai não era a figura mais forte dá casa. Ele e mamãe brigavam muito. Às vezes acho que, se ele não tivesse morrido, eles teriam se divorciado. De qualquer fôrma, acho que mamãe é que acabaria nos criando. — A sua mãe criou você, e meu pai me criou. — As palavras saíam da boca de Kevin quase involuntariamente. — Jamais conheci a minha mãe. Emily ficou calada. Lembrou-se de que uma vez; perguntara-lhe sobre a mãe e ele se fechara durante horas. Não ia cometer o mesmo erro de novo. Mas, para a sua surpresa, Kevin continuou falando. — Ela teve um ataque de nervos depois que nasci. — A voz era fria e controlada, como se aquilo não lhe dissesse respeito. — Naquele tempo acho que
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chamavam isso de depressão pós-parto. De qualquer forma, foi piorando em vez de melhorar, e acabou sendo internada quando eu tinha dois anos. Levou oito anos para se recuperar a ponto de sair do sanatório e, quando finalmente saiu, não foi morar com meu pai. Em vez disso, divorciou-se dele e casou-se logo em seguida com um inglês, que conhecera durante o tempo em que esteve doente. Foi morar em Londres. Morreu há cinco anos. A história revelava muito sobre Kevin. sobre a infância solitária que devia ter tido. Partiu o coração de Emily. Ela queria, é precisava, saber mais. Não conseguiu conter as perguntas. — Mas não a visitou enquanto esteve internada? Devia ser terrível para ela, e para você também, não estar por perto durante o seu crescimento. Kevin deu de ombros. — Mal cheguei a conhecê-la. Papai não achava correto levar-me ao sanatório, então só a vi meia dúzia de vezes em todos aqueles anos. Quando saiu, eu a visitei duas vezes, mas, a essa altura, éramos dois estranhos. Não se sentia à vontade comigo e, quando se casou e saiu do país, papai não quis me deixar visitá-la. Quando já era velho o bastante para ir sozinho, simplesmente não pude fazê-lo. Ela era uma estranha. Achei que estaria me intrometendo na vida dela. Emily ficou horrorizada e triste com a história. Suas relações com Gertrude eram tão íntimas que lhe era quase impossível imaginar a situação que Kevin lhe descrevia. — Você... você foi ao funeral dela? Kevin sacudiu a cabeça. — Não. Estava em Montana vendo umas terras quando aconteceu e, quando me localizaram, era tarde demais. Além disso, me pareceu loucura. Nunca fora quando ela vivia, achei que seria hipócrita ir depois de sua morte. Havia um tom de defesa em sua voz, e Emily percebeu. Kevin se sentia culpado, e Emily quis confortá-lo. — Entendo perfeitamente — assegurou-lhe, e sentiu-se recompensada pelo olhar que ele lhe lançou. Mas queria saber mais sobre ele, agora que parecia disposto a falar. — Então deve ter uma relação bem íntima com seu pai, não? Houve um longo silêncio antes de Kevin responder, e dessa vez o tom era um tanto áspero. — Na verdade, não. Nem um pouco. Antes de ser enviado ao internato. aos cinco anos, quem cuidava de mim era uma babá. Nas férias, ele me mandava para acampamentos, acho que para me manter a distância. Sabe, meu pai é totalmente dedicado aos negócios. É viciado em trabalho, e só quando cresci e fui trabalhar com ele é que vim a conhecê-lo. Somos bons parceiros de negócios. — Havia tensão e incerteza em sua voz. — Mas não dá para dizer que temos um bom relacionamento como pai e filho. Nunca tivemos. Emily não escondia a consternação. — Nossa, Kevin! Acho que isso nem foi uma infância, acho que enganaram! — Parecia horrível, na verdade, e Emily sentiu-se grata por ter sido criada de um jeito tão incomum e adorável. — Mas o seu pai deve ter mais vontade de se relacionar melhor com você do que você pensa. Afinal, é filho dele. Já tentou conversar com ele a respeito?
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"" Kevin riu, ou melhor, deu uma espécie de uivo. — Não conhece meu pai. Barney sairia correndo de uma conversa desse tipo. E não tenho a menor idéia de como iniciar uma conversa assim. Jamais conversamos sobre esse tipo de coisa. Emily estava desnorteada. — Bem, talvez devam começar. Quero dizer, ele não vai viver pára sempre, e é o único parente que você tem. Muitas vezes desejei que meu pai tivesse vivido mais tempo para que eu pudesse ter conversado mais com ele. Ora. não é de admirar que você não queira falar de sua mãe. Deve se sentir zangado com ela, porque se manteve afastada de sua vida. Eu ficaria zangada. Fiquei furiosa com meu pai durante anos porque ele morreu daquele jeito. . Kevin lançou-lhe um olhar intrigado. — Ficar zangado com minha mãe? Nunca encarei as coisas desse modo. Acho que quando era garoto às vezes ficava zangado; mais magoado do que zangado, na verdade. Mas quando cresci compreendi que meu pai não devia ser um marido muito bom, e que provavelmente se era... ele tinha muito a ver com os seus problemas psicológicos. Não e fácil conviver com de, creia-me. — Richardson deu uma risada irônica. — Bem, a minha ex-esposa Donna deixou claro que eu não era nenhuma maravilha nesse aspecto, também. — Por quê? Desta vez ele riu de modo aberto e melancólico. — Eu prestava mais atenção aos esportes e aos negócios do que. a ela c, como deve ter notado, não sou muito bom de conversa'. — Está se saindo muito bem comigo. — Emily deu-lhe uma piscadela, tentando desanuviar a atmosfera. — Tem melhorado drasticamente nos últimos dias. — Deve ser o ar da montanha. Normalmente não falo muito. Nunca fui bom com as palavras: era melhor nos esportes do que nas conversas. Emily tentava ir com cuidado. — Então acha que o fim do casamento foi sua culpa? — Totalmente! Levei alguns anos para entender, mas acabei vendo que Donna tinha razão a meu respeito. Não sou o tipo de cara feito para o casamento. Algo dentro dela queria discordar, mas ela resistiu. — Pois é, eu também não. Nunca quis me casar e, na minha idade, a possibilidade disso ocorrer se torna bem reduzida. Então acho que vou ficar para titia, a solteirona que mora no monte Abbey e ameaça atirar em qualquer um que ultrapasse o Acampamento do Urso Pardo. — Qualquer um? — Kevin lançou-lhe um olhar malicioso. — Não abriria exceção para um forasteiro que a salvou de um afogamento no rio Elk e que empregou meios extraordinários para mantê-la aquecida à noite? Alguém que a segue fielmente montanha acima sem reclamar, mesmo quando sua vontade é... fazer outras coisas? — Pode ser, Richardson. Pode até ser. Talvez esteja num dia de sorte. — Emily mudou de assunto: — É aqui que deixamos os cavalos e começamos a
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subir a montanha a pé. Certifique-se de levar a câmera e o rifle: há muitos ursos por aqui. Kevin fitou a encosta íngreme da montanha. Ursos e uma subida quase perpendicular, sabe Deus ate onde! — Não pode imaginar como essa idéia me excita, Emily — sussurrou ele. — Quanto tempo acha que vai levar? — Ah, duas horas de escalada, mais uma hora e pouco para descer. É um.belo exercício, e temos toda a tarde. Kevin fuzilou-a com os olhos. — Se é exercício o que quer, devíamos ter ficado na cabana. Emily riu maliciosamente para ele e iniciou a escalada.
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CAPÍTULO IX
Levou quatro dias para Kevin perceber que parará de usar relógio. O tempo, sempre medido por ele em unidades meticulosas e gasto com parcimônia, transformou-se cm mera questão de ritmos. Ele e Emily dormiam quando estavam cansados, acordavam quando se sentiam dispostos, comiam quando a fome o exigia e faziam amor quando sentiam vontade, o que acontecia com uma freqüência muito maior do que qualquer um dos dois jamais sonhara possível. Também conversavam, riam e discutiam, e até brigavam a respeito de assuntos em que se julgavam entendidos ou muito ao contrário, a respeito de assuntos de que não entendiam nada, como no caso de Emily em relação à política, assunto pelo qual demonstrava total falta de interesse. Kevin descobriu que muitas vezes ela nem se importava em ir votar, e ficou chocado. Emily riu dele e insistiu que a Constituição lhe garantia o direito de votar ou não votar, conforme sua escolha, e acabaram discutindo aos berros. Emily jogou uma caneca de alumínio em cima dele e atingiu-o na orelha. Reconciliaram-se da melhor maneira possível, é claro. — Kevin, é assim que costuma ser, entre um homem e uma mulher? — Era fim de tarde, e haviam feito piquenique à beira do lago. O verão parecia ter chegado sem esperar a primavera. O ar estava calmo e o sol forte. Haviam nadado, almoçado estendidos numa toalha sobre a relva e feito amor, lenta e Languida. Com a cabeça apoiada no tórax másculo, Emily escutava o bater do coração e a respiração de Kevin. Ele mantinha os olhos fechados, mas Emily sabia que não estava dormindo. Haviam chegado a um estágio de relacionamento tão íntimo que achava que podia perguntar-lhe qualquer coisa e que ele faria o possível para responder. Uma união tão forte se estabelecera entre ambos que Emily se sentia segura, amada e livre. — Kevin? Responda! É assim, normalmente? Abriu os olhos e fitou-a, intrigado. — Devia ser capaz de responder isso por você mesma. Emily corou e gaguejou um pouco. — Bem, não tive tanta experiência assim. Não tanta quanto você, de qualquer jeito. Você foi casado, afinal, e é um homem solteiro vivendo numa cidade grande... Fiquei pensando se... se é assim que costuma ser — finalizou — o tempo todo. . O que podia lhe dizer? Kevin observou Emily: os ossos salientes da face, o nariz queimado de sol descascando um pouco, os claros olhos verdes com longos cílios. Seus braços
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envolviam aquele voluptuoso corpo feminino praticamente nu, com apenas uma camisa de algodão dobrada sobre os seios para protegê-los do sol. Emily era uma beleza tão primitiva e não corrompida quanto o vale que amava. Era única. Jamais conhecera uma mulher como aquela, tão abertamente sensual e ao mesmo tempo tão inocente, de um jeito singular. Era direta ao falar e agir, e Kevin descobrira que podia abrir-se com ela mais do que com qualquer outra pessoa. Mas a pergunta era difícil. Tentou responder. — Cada um é diferente, eu acho. Um casal não age da mesma maneira que outro, sabe disso. — Acariciou-lhe o pescoço com o polegar, deliciando-se com a maciez da pele. — Mas acho que o que há entre nós é bastante incomum. Por exemplo, eu nunca havia feito amor com uma amiga antes. — Eu também não. Talvez aí esteja a diferença: somos amigos. — Talvez — concordou ele, sem acreditar muito. Havia algo de mágico cm torno de Emily que ia muito além da amizade. — Além disso, nossa situação aqui é especial. Não há nenhum tipo de incômodo, exceto aquele telefone à bateria. Não há televisão, nem outras pessoas para perturbar. É um cenário perfeito, como se fosse o nosso Jardim do Éden particular. Ela deu uma risada, — Sem a cobra. Pelo menos, acho que não há cobras por aqui. Como há todos os outros tipos de animais selvagens, talvez apenas não tenhamos encontrado nenhuma ainda. Kevin sentiu aquela pontada familiar no estômago. Havia uma cobra, sim. Emily suspirou. — Acho que esta foi a melhor semana de toda a minha vida, mas precisamos pensar em voltar. Já ficamos dois dias a mais dó que o planejado. Devem estar lhe esperando em Vancouver. — Uns dias a mais não farão mal. Não vão mandar um grupo de busca aqui por causa disso — Kevin lhe garantiu, beijando-lhe a orelha. — Onde você mora em Vancouver? — Num apartamento, perto da Universidade. , — É um bom lugar? Acolhedor? Tem quintal? — Não fica no décimo segundo andar. Há uma sacada minúscula com vista para o Banco Espanhol, e só. Não é grande coisa, mas não passo muito tempo lá. Vancouver parecia muito distante, e por um momento ele imaginou como seria se nunca voltasse para lá. Ao dar-se conta de que seu tempo juntos terminaria em breve, Kevin despertou no meio da noite, em plena escuridão. O sol não dera ainda nenhum sinal de vida. Emily dormia aninhada em seus braços. Kevin cobria-lhe os seios com a mão e mantinha a barriga encostada em seu firme traseiro. Vendo que dormia profundamente, roncando de leve, Kevin sorriu, lembrando-se de como ficava ofendida e amuada quando ele zombava de seu ronco. Nos últimos dias, Kevin resolvera não pensar muito sobre o modo como enganava Emily. Abandonara-se totalmente ao prazer de estar ao seu
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lado.Jamais compartilhara idéias, sonhos e lembranças com alguém como fazia com ela. Espantava-se e fascinava-se com as excursões que ela planejava. Emily dava-lhe o vale de presente,conduzindo-o a lugares onde jamais levara ninguém. Agora percebia com clareza que o vale não era só a fonte de sustento de Emily, mas o lugar onde moravam o seu coração e a sua alma. Durante as excursões, Kevin tentara discutir o relacionamento dos dois, querendo dizer-lhe que era algo especial para ele, mas Emily não quisera saber. — Fizemos um acordo: esta semana e só. Um caso de febre do vale, sem arrependimentos. Vamos cumprir o acordo, tudo bem? Sem arrependimentos. Que piada. Kevin pensava na Pace e em seu pai. Decidira mentir a Barney, dizendo-lhe que a região não era o que ele esperava, num último esforço para proteger as Parker. Mas sabia que seria um esforço infrutífero. Barney já mexera os pauzinhos, e não havia nada que Kevin pudesse fazer a respeito. Havia uma coisa, corrigiu-se ele, sentindo um nó na garganta: podia contar a Emily antes de saírem dali. Podia confessar a ela e tentar fazê-la entender que cancelaria o plano todo, se pudesse, que desprezava a si próprio por lhe haver mentido sobre quem era e o que fazia. E que sentia muito, muito mesmo, pelo que a Companhia pretendia fazer. Podia fazer isso, pedir-lhe perdão por arruinar-lhe a vida. E de que isso adiantaria? Pior ainda, quebraria para sempre a magia que o lugar adquirira para os dois. Em vez de lembranças de alguns dias no paraíso, aquele acampamento seria contaminado para sempre em sua memória com os ecos da briga inevitável e as terríveis conseqüências de sua confissão. Não. Era melhor esperar até voltarem ao acampamento central, decidiu. Contaria primeiro a Emily, a sós, e depois confessaria às outras duas Parker. As perspectivas eram horríveis, mas decidiu que era a única atitude honrada que lhe restara tomar. Emily suspirou. Esfregou-se nele quando a chuva começou a bater no telhado. Kevin ficou o mais perto possível, cobrindo-lhe o ombro nu e desejando que o tempo parasse, que pudessem ficar para sempre na cabana. Ficou imóvel, abraçando-a, esperando o sol nascer. Desde a chegada a cabana, Emily usara o telefone à bateria várias vezes para entrar em contato com o acampamento central e tranqüilizar Gertrude quanto à sua segurança. Utilizou-o novamente naquela tarde e, ao desligar, a preocupação estampava-se em seu rosto. — Mamãe diz que está chovendo muito lá embaixo e que o rio encheu. O boletim meteorológico diz que há uma forte tempestade e que vai durar no mínimo uma semana. Não temos mantimentos suficientes para ficar aqui todo esse tempo, mesmo que você pudesse. E você não pode. Certo? A Viagem de Kevin terminara, oficialmente. Sabia que, se ficasse mais tempo, Barney encontraria um modo de entrar em contato com ele para ver qual era o problema, e não queria que o pai conversasse com Gertrude antes de ter a oportunidade de falar com ela pessoalmente.
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— Certo — confirmou, com relutância.: — Bem, é melhor arrumarmos as coisas esta noite e partirmos amanhã. Mamãe acha que teremos de subir e descer o monte Abbey, porque o rio está alto demais para o atravessarmos. Fica muito mais longe, mas não temos escolha. Temos sete ou oito horas de cavalgada pela frente, então precisamos sair daqui ao entardecer. — Emily escutou a chuva batendo forte nó telhado. — Horas de cavalgada sob a chuva. Não é um grande final para a nossa excursão, Kevin! Sinto muito. Ele também sentia, embora não fosse a chuva que o perturbasse. Tomou-a nos braços e tentou guardar na memória a sensação de abraçá-la, o jeito como seus corpos se ajustavam um ao outro, o modo como ela envolvia sua cintura, apertando-o afetuosamente. A cabeça de Emily dava bem embaixo de seu nariz. Kevin ergueu-lhe o queixo e beijou-a, falando, com entusiasmo forçado: — Esta foi a melhor semana de toda a minha vida, mas ouvi dizer que todas as boas coisas têm um fim, mais cedo ou mais tarde! Se temos de ir, vamos. Vamos começar a arrumar as malas. Nunca se sentira mais deprimido em toda a sua vida. Partiram antes do amanhecer no dia seguinte, sob a chuva e o vento gelado. Kevin parou e olhou uma vez mais para a cabana quando chegaram ao alto da montanha, ansioso por gravar a cena em sua memória, mas logo tudo desapareceu na neblina como se jamais houvesse estado.ali. Depois daquele início lamentável, o dia só piorou, O vento e a chuva chicoteavam-lhes os rostos, congelando-os. Teimoso recusou-se a subir a bacia de xisto que levava ao pico do monte Abbey. Kevin apeou e teve praticamente de içar o animal pela encosta, o que lhes tomou uma hora a mais de viagem. No meio da manhã, a garrafa térmica com o café quente escapou das mãos de Emily e caiu no precipício para nunca mais ser vista. O mais aterrorizante aconteceu quando pararam para almoçar. Abrigandose da chuva sob uma grande árvore, tinham acabado de desembrulhar os sanduíches quando um urso saiu do bosque a alguns metros deles. Emily estava tentando acender uma fogueira pára tomarem algo quente, e não tinha o rifle à mão. Kevin conseguiu apanhá-lo, mas ó tiro que desferiu passou por cima da cabeça do animal. — Corra! — gritou Emily, e Kevin seguiu o conselho. Dispersaram-se, enquanto os cavalos ficavam alucinados. Os animais tinham sido amarrado frouxamente às árvores para poderem pastar, e todos os três romperam a corda e desapareceram na mata. Kevin certificou-se de estar entre Emily e o urso antes dê parar e virar, pronto a mirar e atirar quando necessário. Mas o urso pardo tinha outros planos em mente. Saiu gingando em direção à mata sem prestar muita atenção àqueles seres humanos assustados atrás dele, parando só o tempo suficiente para engolir os sanduíches, com papel e tudo. Os dois tremiam de medo, e levaram mais uma hora para encontrar os cavalos ariscos. Por fim, mais famintos e encharcados do que nunca, partiram novamente. 81
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A noite, exaustos, molhados até os ossos e famintos, finalmente avistaram as luzes do acampamento central, como um farol amigo em meio à chuva e às trevas. Apesar da hora, Laura os esperava com chilli e pães doces quentinhos, e um bule de café soltando fumaça. Gertrude e Laura eram as únicas ainda acordadas. O resto do grupo fora dormir a muito tempo. Sabendo como chegariam molhados e gelados, haviam preparado uma banheira de água quente para o chuveiro improvisado junto à cozinha para que pudessem tomar um banho quente. — Que chilli gostoso, Laura! — Os dedos de Emily tropeçavam em cada palavra. Contou sobre a viagem e o susto com o urso, mas não mencionou a semana que ela e Kevin haviam passado juntos a sós. Mais tarde conseguiria falar daquilo como de algo corriqueiro, mas naquele momento ainda não. — Se o chilli está tão gostoso, por que não come mais? Os dois comeram como passarinhos. Qual é o problema? O urso "roubou o apetite de vocês? Emily assegurou à irmã que a comida estava ótima, frias era inegável que não conseguira comer muito. O mais estranho era que Kevin ia pelo mesmo caminho: seu, prato de chefe mal chegara à metade, e ele o fitava como se nunca houvesse visto chefe na vida. Gertrude, também, parecia absorta; falara muito pouco desde a chegada deles, e não lhes fizera as perguntas habituais sobre a viagem. — Estou morta! Esta viagem foi terrível — Emily tentou explicar a Laura. Era verdade, mas não era a viagem que mais a aborrecia. Não se sentia apenas exausta, mas também morbidamente deprimida. Era quase impossível continuar a conversa com a mãe e a irmã. Só conseguia pensar que o seu tempo ao lado de Kevin acabara, e isso deixava um vazio dentro de si. A cada passo da horrível viagem de volta, ficara-lhe mais evidente que seus sentimentos por Kevin eram complexos e intensos. Como chegara a pensar que poderia "desligá-los" quando saíssem do Acampamento do Urso Pardo? Durante o dia todo pensara em como seria duro deixá-lo para sempre dali a um ou dois dias. Num determinado momento daquela tarde interminável, molhada até os ossos e trêmula, achara que nunca chegariam ao acampamento central e apesar da chuva, do vento e da fome, não se importara. Fora então que admitira que se apaixonara perdidamente por Kevin Richardson. A questão era... o que iria fazer? Enquanto atravessavam a lama e a chuva, pensara várias vezes em contar a verdade a Kevin, mas lhe faltara a coragem. Além disso, quanto mais perto chegavam do acampamento, mais ele se fechava, voltando ao silêncio de outrora. Quando Emily tentava puxar conversa, Kevin respondia com monossílabos, até ela desistir e calar-se.
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— Se me derem licença, acho que vou dormir. — Kevin se levantou de repente, acenou para Laura em despedida, disse boa noite a todos, lançou um longo e desesperado olhar para Emily e saiu às pressas do pavilhão. Emily sentiu-se corar até a raiz dos cabelos. Aquele olhar dissera tudo, o quanto ele desejava estar com ela, o quanto sentia que estivessem de volta e entre outras pessoas. Laura, especialista em interpretar expressões faciais, viu e entendeu a comunicação silenciosa. Piscou o olho para Emily. — Temos muito a conversar, mana — sinalizou, com uma expressão intrigada. Gertrude, no entanto, parecia alheia a tudo. Permaneceu o tempo todo com o olhar perdido e, tão logo Kevin se retirou, deu um suspiro e virou-se para Emily, com uma expressão sombria e rugas de preocupação na testa. — Sei que não devia jogar isso em cima de você numa hora dessas, com você tão cansada, mas talvez não possamos conversar em particular amanhã. — Gertrude falava e traduzia em sinais ao mesmo tempo, para que Laura tomasse parte da conversa. — E o seguinte, algo muito estranho está acontecendo e estou preocupada. Lembra-se de que enviei o cheque para renovar o arrendamento do nosso território logo antes de vocês partirem para o Acampamento do Urso Pardo? A preocupação fora do comum na voz da mãe fez com que Emily se esquecesse de Kevin por um instante. — Claro, mamãe, lembro. O que aconteceu? Gertrude franziu as sobrancelhas e meneou a cabeça. — Algo muito estranho. Parece que uma tal de Companhia de Empreendimentos Pace tomou o nosso arrendamento. Um dos ajudantes que contratei me trouxe a correspondência esta manhã: meu cheque foi devolvido. Havia um aviso formal informando que o arrendamento foi entregue a essa Companhia de Empreendimentos Pace. Tentei telefonar para o nosso advogado, em Victória, e descobrir o que estava acontecendo, mas já era tarde e que os escritórios já haviam fechado. Hoje o telefone não estava funcionando por causa da tempestade e, assim, não sei ainda o que está acontecendo. — Por que acha que essa Companhia Pace quer o nosso território? — perguntou Laura. — Talvez seja um mal-entendido, não é? Laura e Gertrude ficaram em silêncio, esperando a reação de Emily, esperando, esperando... pelo que? Emily tentava raciocinar. Que diabo seria aquilo? O que poderia dizer para tranqüilizá-las? As palavras da mãe tinham lhe dado enjôo. Ficou olhando para a mãe e a irmã, tentando desesperadamente pensar numa explicação lógica e inocente para tudo, mas não encontrou. — É óbvio que os clientes não devem saber que há alguma coisa errada, precisamos ser discretas — declarou Gertrude, por fim, desalentada. — Vou tentar telefonar ao escritório, logo que acordar e pedirei a Alvin Blcckcr para descobrir o que está acontecendo. — Alvin Blecker era o advogado delas.
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— Acho que é só o que podemos fazer, por enquanto — falou Emily, devagar. Levantou-se e foi até a mãe, abraçando-a. — Mãe, tente não se preocupar! Você parece cansada. É tarde, vocês foram uns amores esperando a gente. Tenho certeza de que há uma explicação racional para essa confusão toda, — Na verdade, não tinha certeza alguma, mas não conseguiu pensar em mais nada a dizer para tranqüilizar a mãe. Gertrude juntou-se a filhas,e as três mulheres se abraçaram por um longo tempo, buscando o conforto mútuo. Então Laura bocejou e declarou: — Puxa, estou cansada! Vamos dormir, amanhã a gente conversa. Como mamãe sempre diz, de manhã as coisas parecem melhores. Gertrude e Laura dormiam no pavilhão, então Emily pegou uma lanterna e seguiu sozinha em direção à sua cabana. As notícias perturbadoras que a mãe lhe transmitira misturaram-se aos sentimentos confusos que a haviam assaltado o dia todo e, de repente, sentiu que precisava conversar com Kevin. Durante a última semana, estivera com ele constantemente, dividindo cada pensamento e cada sentimento, e agora precisava dele. Apesar do conselho da mãe para não deixar que os clientes soubessem que havia algo errado, queria confiar em Kevin. Tinha de conversar com alguém, tentar encontrar um fio de lógica na história toda. Sentia-se não apenas cansada, mas ameaçada e aterrorizada, e precisava ouvir palavras de conforto. Sabia também que teria de lhe contar o que sentia por ele. Deixar que partisse sem revelar-lhe os sentimentos com honestidade não seria justo para nenhum deles. Desviou rumo à cabana dele. Como tudo estivesse escuro, acendeu a lanterna e iluminou os degraus. Deveria acordá-lo, se estivesse dormindo? Parou junto à cabana e, enfim, no maior silêncio possível, abriu a porta e entrou. Era como entrar numa gruta. Não havia luz alguma, mas podia sentir o cheiro dele, o cheiro agradável e másculo de Kevin. — Emily? — Havia esperança w profundo alívio na pergunta sussurrada, e ela se moveu em sua direção em meio às trevas. — Que tudo vá pára o inferno, Em. estava rezando para você vir! Sei que fizemos um acordo para fingirmos que nada aconteceu ao chegarmos aqui, mas, Deus do céu, acho que não consigo cumprir! — Eu também não! Kevin estava em pé, e seus braços a envolveram. Por longos momentos, Emily deixou que o abraçasse, mas quando a puxou para a cama, sacudiu a cabeça e resistiu. — Não posso dormir com você aqui, Kevin. sabe disso. Mas preciso conversar com você. Está acontecendo uma coisa que deixou mamãe preocupada. Na verdade, me deixou preocupada também. É um negócio maluco, sobre o arrendamento de nosso território. E ridículo, mas parece que uma companhia adquiriu o nosso arrendamento. Ela o viu ficar paralisado, e um estranho medo a invadiu. Os braços de Kevin ainda a envolviam, e podia ouvir o bater de seu coração.
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—. Kevin? Kevin, o que houve? Qual é o problema?O ritmo da batida de seu coração aumentara e os braços apertavam-lhe a cintura como uma garra de ferro, esmagando-a. — Kevin? Conte-me o que é que... Emily tentou afastar-se um pouco e, por um instante, ele resistiu, mas logo a deixou ir, trôpega. As molas rangeram quando ele se sentou na cama, com todo o peso.— Emily... — Era como se lhe doesse pronunciar seu nome. Emily reteve a respiração, com medo, mas sem saber do quê. Tateou em busca de uma cadeira e encontrou, mas não se sentou. Agarrou-se às costas da cadeira com firmeza e esperou pelo que lhe pareceu uma eternidade. —— Preciso lhe contar uma coisa, mas antes disso, queria que soubesse... — Interrompeu-se e respirou fundo, trêmulo. — Meu Deus, Em, não pensei que fosse acontecer isso entre nós, é o que estou tentando dizer. Nunca sonhei... — Kevin fez outra pausa, e aquele pavor que a fazia tremer começou a transformar em raiva. — Kevin, precisa me contar, seja lá o que for. Não fique enrolando desse jeito! Posso agüentar. Você por acaso — Pensou no modo como ele reagira ainda há pouco, e uma idéia inimaginável lhe ocorreu. — Meu Deus, tem a ver com o arrendamento, não tem, Kevin?, Sentiu orgulho de si mesma pelo tom frio que usara, embora seu corpo tremesse tanto que precisasse fincar os dedos na cadeira para manter-se ereta. Ficou feliz por estar escuro para que ele não visse o medo estampado em seu rosto, para que não visse o modo como tremia. — Tem. — Havia resignação na voz de Kevin agora. — Tem sim. Devia terlhe contado antes, mas não consegui. A verdade, Emily, é que a Companhia de Empreendimentos Pace é minha e de meu pai. Ele comprou o arrendamento porque quer montar um complexo hoteleiro aqui. Emily reuniu todas as forças para se controlar. — Um complexo hoteleiro? Aqui no vale? Aqui no meu... no nosso... território de excursões? Sem poder vê-lo, imaginou-o assentindo com um gesto de cabeça. — É Receio que sim. Um grande complexo, campos de golfe, piscinas, trilhas para andar a cavalo, esse tipo de coisa. Emily, precisa entender que este vale está pronto para a exploração, que é inevitável que as mudanças aconteçam. Não pode parar o progresso. A monstruosidade do que ele dizia penetrou devagar na consciência de Emily. Sentiu a cabeça esvaziar-se, como se fosse desmaiar. Lutou contra isso, tentando respirar fundo, sem conseguir. — Então... então o que estava fazendo aqui, Kevin? Fingindo ser um cliente quando sabia o tempo todo que...? — O cérebro não ajudava, mas a resposta estava ali. Era fácil, era só saber os fatos. — Está inspecionando o território, vendo se é mesmo adequado, certo? — Algo desse tipo. — Esteve nos espionando. E então eu... você... você fez amor comigo, como parte da barganha. — Havia calma em seu tom, como se finalmente tivesse
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desvendado o enigma. — Ora, acho que serviu como um bom passatempo, hein, Kevin? Como disse certa vez, não há muita coisa para fazer aqui no vale. — Emily, ouça-me, por favor. O que houve entre nós não tem nada a ver com isso. Essa última semana foi... Mesmo que eu soubesse que isso ia acontecer, tinha medo de estragar o que havia entre nós. — O que havia entre nós era obviamente uma mentira. Ia mesmo me contar ou ia pegar um aviãozinho e deixar que eu acabasse descobrindo mais tarde? — Planejava contar-lhe de manhã. Primeiro a você, depois a Gertrude e a Laura. — Meu Deus, que digno da sua parte, Kevin! — A voz vinha repleta de sarcasmo, mas sentia um nó na garganta e sabia que não conseguiria segurar as lágrimas por muito tempo. — Vou conversar com sua mãe e Laura de manhã. Mas, por favor, Em, vamos conversar de modo racional, vamos separar o que sentimos um pelo outro do... — Racional? Espera que eu seja racional a respeito disso? — Ela riu, quase num soluço. — Você me diz que planeja arruinar meu vale e quer que eu seja racional? Viu-o levantar e aproximar-se, e não agüentou. — Emily, me dá um abraço, vamos conversar. — Não me toque, por favor. Fique longe de mim! Emily virou-se e precipitou-se em direção à porta, abrindo-a e descendo os degraus escuros. Para a sua surpresa, ainda segurava a lanterna. Acendeu e saiu correndo na chuva. Kevin foi atrás dela, mas Emily entrou na cabana antes de ser alcançada. Bateu a porta e trancou-a. — Emily, me deixe entrar, senão vou derrubar esta porta! — Sabia que estava gritando. Viu uma luz se acender numa das cabanas vizinhas. Em breve outros clientes sairiam, querendo saber que diabo estava acontecendo. — Abra, Em! Kevin não se importava com eles. Nem passara pela sua cabeça que estava de cueca e camiseta, de pés descalços, que eram três da manhã e que chovia a cântaros. — Emily, está me ouvindo? Preciso falar com você, que droga! Vamos, abra esta maldita porta! A porta se escancarou de repente e o cano de um rifle encostou em seu peito. — Saia daqui, Richardson, senão eu lhe meto uma bala na cabeça. O tom era definitivo. Kevin sabia que ela falava sério e, mesmo assim, esperou durante um longo e tenso momento antes de recuar um passo. — Não há nada que possa me dizer, traidor. Suas ações dizem tudo. Deixeme em paz! Entendeu? Deixe-me em paz! —Entrou e bateu a porta de novo. Logo ele percebeu que se encontrava descalço, enlameado, gelado e completamente encharcado.
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Não havia nada a fazer exceto voltar para a sua própria cabana e esperar a manhã chegar. Como ela dissera, nada do que dissesse explicaria suas ações. Só de madrugada veio a entender plenamente o que fizera. Devia ser um idiota, pensou, por não ter entendido antes. Pela primeira vez na vida, apaixonara-se por uma mulher. E, no velho estilo Richardson, transformara tudo em ruínas antes ter a oportunidade de construir uma relação sólida entre eles.
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CAPÍTULO X
Maldição, não doeria tanto se não o amasse. Apoiada contra a porta que acabara de bater, com a arma nos braços, as lágrimas que Emily segurara aquele tempo todo começaram a escorrer-lhe pelo rosto. Apaixonara-se por ele, por aquele que agora vinha lhe roubar tudo o que significava alguma coisa para ela: a liberdade, a felicidade, a confiança, o vale... Deus, o vale... Kevin Richardson sabia muito bem o que estava fazendo. Abrira-lhe a alma durante a última semana, deixara que visse o quanto o desejava, o quanto precisava dele, e mostrara-lhe de todos os modos a importância que dava ao seu trabalho e ao vale. Assim, Richardson sabia melhor do que ninguém, sabia exatamente que efeito exerceria sobre ela a revelação da verdade. E não pensara duas vezes. Quando as lágrimas aliviaram-lhe um pouco a agonia, pensou em Gertrude e Laura, em como se sentiriam ao entenderem a gravidade do que lhes acontecera, e sentiu vergonha. Aos olhos delas, e a seus próprios olhos, Emily dormira com o inimigo, literalmente. A magnitude do desastre lhe deu náuseas. A Vale do Elk Excursões era a vida delas, tanto quanto a sua. Era o seu ganha pão. O que aconteceria.com elas agora? Não conseguia parar de tremer: Enrolou o saco de dormir em torno de si e deitou-se na cama, sabendo que não conseguiria dormir. Enquanto esperava o amanhecer, viu tudo com clareza. Não queria que Gertrude e Laura soubessem ainda o papel desempenhado por Richardson na história toda. Não podia suportar que a encarassem e testemunhassem a extensão da sua vergonha e desolação, porque logo adivinhariam que se apaixonara por ele. Eram íntimas, as três, e sem dúvida Gertrude e Laura saberiam. Laura já sabia, e Gertrude teria percebido a noite anterior se não estivesse tão preocupada com o arrendamento. Kevin precisava partir enquanto ela ainda possuía algum controle. Teria de levá-lo ao aeroporto. Gertrude precisava cuidar dos clientes, e Emily não queria responder às perguntas que Gertrude lhe faria se declarasse de repente que não queria mais trabalhar como guia de Kevin. Seria uma agonia, ficar sentada a seu lado durante o tempo de viagem, mas teria de suportar. Valia a pena, declarou a si mesma, livrar-se dele. Aquele traidor, Judas, mentiroso, pérfido! O homem a quem se entregara, de corpo e alma. Oh, Deus, precisava livrar-se dele! Seria a primeira coisa a fazer de manhã.
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Esperou o nascer do sol, depois ficou de tocaia, até vê-lo sair de sua cabana. Alcançou-o, correndo sob a chuva. Levantou a cabeça ao chegar peito dele. Kevin andava cabisbaixo, desalentado, mas ela tentou não ver a dor que havia em seus olhos. — Olá. Em. — Precisa partir. Imediatamente! — A voz dela era áspera e o mais distante possível; o rosto, frio como uma máscara. Kevin parecia tão arrasado quanto ela, mas Emily se recusava a notá-lo. A chuva molhava seus cabelos e pingava pelos narizes enquanto eles se encaravam como dois adversários face a face sobre um ringue invisível. Difícil acreditar que, ainda no dia anterior, eram amantes. Kevin concordou, aceitando a decisão. — Planejava mesmo partir. Minhas coisas estão prontas. Mas quero explicar tudo a sua mãe e Laura primeiro, Emily. — Não quero que lhes explique nada. Eu... — Por um momento, perdeu a voz, mas recuperou o controle. — Eu mesma quero lhes contar, quando me sentir pronta. Ainda acham que há algum engano, e prefiro que pensem assim, por enquanto. Há outros clientes a considerar. Mamãe e Laura vão ficar mal quando descobrirem o que está acontecendo, e não terão o mesmo ânimo para atendê-los. Não quero que Laura se aborreça, por causa do bebe'. É mais fácil assim. Ele a observou, com o rosto impassível. Havia algo estranho em Kevin Richardson naquela manhã. — Por favor — sentiu-se forçada a dizer. Finalmente, Kevin concordou. — Não gosto de fazer as coisas desse jeito, mas se é o que deseja, tudo bem. Quando quer que eu vá? — Assim que estiver pronto. - Já estou pronto. — Vou pegar as chaves do carro. A estrada, que nunca fora uma maravilha, estava horrível naquela manhã. Castigada pela chuva já há quatro dias, apresentava vários pontos quase obstruídos devido a pequenos deslizamentos. O jipe derrapou na lama e saltou obstáculos nos primeiros quinze quilômetros, até que, num ponto especialmente difícil derrapou numa vala, inclinando-se num ângulo perigoso. Emily tentou voltar à pista, mas as rodas ficaram girando inutilmente. Até aquele instante, sentira-se grata pelas condições terríveis, que a forçavam a concentrar toda a atenção na direção do carro. Várias vezes, Kevin tentara puxar conversa, mas Emily fingira estar tão surda quanto Laura. Ele acabara desistindo, e seguiram em silêncio. Quando saltou para fora do jipe e afundou na lama até a altura dos joelhos, viu que teria de pedir ajuda a Kevin. Não podia cavar para tirar as rodas dali e dirigir ao mesmo tempo. Empertigou-se para falar com ele, mas antes que pudesse dizer alguma coisa, ele já se encontrava a seu lado, pegando a pá na caixa de ferramentas. Emily quis tomá-la de suas mãos.
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— Eu cavo, você dirige — ordenou secamente. Kevin segurou firme o cabo e sacudiu a cabeça. — Esqueça, Emily. Você dirige e eu cavo. Encarou-o, de nariz empinado, mas havia uma expressão implacável no rosto de Kevin que a convenceu. Entrou no jipe e bateu a porta com violência. Quando ele lhe gritou para ligar o motor Emily deu um jeito de se vingar. Sabia que a lama ia espirrar para cima dele, e sorriu de modo perverso. Bem no alvo, Companhia Pace. Levou quase uma hora para colocarem o jipe de volta na pseudo-estrada e, quando o conseguiram, Kevin estava irreconhecível. A lama sujara toda a sua roupa e o rosto, e as mãos ficaram imundas. Entrou no jipe sem dizer nada, mas com uma expressão sinistra. — Você está horrível! Bom, acho que a sua companhia vai ter de gastar uma pequena fortuna para melhorar esta estrada, Sr. Richardson. Nós não tínhamos recursos para isto, mas é claro que dinheiro é o que não falta a grandes empresários como o senhor e seu pai, correto? Somos café pequeno diante de corporações como a Pace. Deve até acreditar que está fazendo um favor a nós, caipiras, vindo aqui e nos mostrando como é que se faz um negócio, não é mesmo? Queria deixá-lo furioso. Queria brigar com ele, de verdade. Queria colocar para fora tudo aquilo que a magoava a ponto de achar que morreria de dor. Ele encarou-a de modo ameaçador, mas não mordeu a isca. — Já falei que me sinto muito mal por isso, Emily. — A voz era baixa e controlada, —Não há mais nada que possa dizer a respeito. Pararia o projeto, se pudesse, mas não estou sozinho nisto. Há investidores a serem considerados, fornecedores. São negócios que envolvem companhias inteiras. — Certo! Claro! Negócios são negócios, eu devia saber. De onde você vem, as pessoas não importam, não é? — Pisou no acelerador com violência, ignorando as condições cada vez mais perigosas da estrada. Kevin agarrou-se no banco e bateu a cabeça na capota quando caíram num buraco quase da altura do próprio jipe— Cuidado, Em! Ouviu o grito de Kevin assim que avistou um espaço vazio no lugar onde costumava haver uma ponte. Pisou no freio; o jipe atravessou a pista de um lado para o outro e, enfim, parou a poucos centímetros da margem do rio. Um íngreme declive despencava direto num lamaçal com pedras ao fundo. O motor morreu e restou apenas o som da chuva incessante, batendo na capota. — A droga da ponte deve ter sido carregada — falou Emily. Tremia, imaginando o que podia ter acontecido se não tivesse parado a tempo. Talvez ficassem inconscientes, ou morressem, dentro da lama. Devagar, percebeu as conseqüências do desmoronamento e baixou a cabeça sobre o volante, perguntando-se o que fizera para merecer aquilo. Não havia mais jeito de passar, de chegar ao aeroporto ou à cidade. teria de ficar com Kevin Richardson até a ponte ser consertada.:
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Fez-se silêncio por um longo e melancólico intervalo. — Bem, parece que não há escolha. Vai ter de voltar ao acampamento e esperar a tempestade passar. Emily achou que sua vida transformava-se num verdadeiro pesadelo, com algumas piadas de humor negro como tempero. As notícias do desmoronamento da ponte impediram a mãe de interrogar Emily detalhadamente sobre os motivos da partida de Kevin antes do café da manhã. Com Laura, no entanto, não funcionou. No final da refeição sem que Emily e Kevin tocassem na comida, Laura levou Emily para o seu quartinho e fechou a porta., — O que se passa? — perguntou, sentando Emily em sua cama. — Você parece uma estátua de mármore, ele parece que levou uma surra, ninguém fala nada... Explique. Já — "" — O jipe atolou, ele ficou coberto de lama. Brigamos. — Por quê? — Laura acariciava distraidamente a barriga. Crescera bastante na última semana, pensou Emily. Dava até para ver o nenê se mexendo sob a camiseta. Estendeu a mão e colocou ternamente sobre o ventre de Laura, fascinada com o movimento do sobrinho ou sobrinha. — O bebê está ficando grande! Não fica preocupada de tê-lo aqui, Laura? Laura não se deixou enganar.,„ — Não, nem um pouco. Brigou com Kevin por quê?? Emily sacudiu a cabeça, exasperada, pedindo a Deus para Laura deixá-la em paz. Mas Laura não desistiria até receber uma resposta satisfatória; Emily sabia disso por experiência. — Brigamos a propósito de tudo — declarou através de sinais, sem conseguir pensar em nada melhor. — Quer dizer, a propósito de nada. Mas você o ama? — Era mais uma afirmação do que uma pergunta. Emily rangeu os dentes e desviou o olhar, sem saber até quando resistiria. Laura tocou em seu rosto suavemente para chamar a sua atenção. — Kevin a ama, também. Sei disso pelo jeito como olha para você. A raiva invadiu Emily. Se a irmã soubesse quão ridículo era imaginar que Kevin a amava! Bem, Laura logo saberia. Não era um segredo que pudesse guardar por muito tempo. Gertrude não pudera entrar em contato com o advogado naquela manhã, pois o rádio-telefone continuava não dando linha. Além disso, sem a ponte, nenhuma correspondência chegava. Emily agradecia aos céus, pois isto lhe dava mais algum tempo. Laura a observava e franzia as sobrancelhas. — Acho que amar é difícil para as Parker. — “Acariciou a barriga e acrescentou:” — Quanto ao amor físico, nos saímos bem, mas — continuou, pondo a mão no coração e depois na cabeça — aqui e aqui... é difícil para nós. 91
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Talvez sejamos independentes demais, nós todas. Certo? — O rosto travesso tinha um ar sombrio, os olhos azuis brilhavam inquietos. Emily tentou sorrir e não conseguiu. — Certo — mentiu. O problema era que não fora suficientemente independente. Chovia dia e noite, não uma leve garoa, mas um dilúvio, acompanhado de ventos fortes, raios e trovões, num espetáculo apavorante. Não havia nada a fazer exceto esperar, e logo os nervos de todos estavam à flor da pele. Emily não conseguia dormir. Durante aquelas longas noites na cabana minúscula, o tempo parecia não passar. Os dias eram ainda piores. Ter de ficar perto de Kevin era uma tortura e, embora ele desaparecesse por horas, aparentemente caminhando ou correndo no meio da chuva, não havia jeito de evitá-lo por muito tempo. Sem poderem sair, todos precisavam ficar sozinhos em suas cabanas ou com os outros, no pavilhão. O sofrimento a deixava com um terrível mau humor. Até Frank Livetti parou com suas cantadas, depois de uma ou duas respostas que ela lhe deu. Frank, Sam e Melvin passavam o tempo jogando intermináveis partidas de canastra, mas era óbvio que não agüentavam mais. A atmosfera de reclusão contribuía, mas havia um outro, fator determinante: só então os homens notaram que a gravidez de Laura chegara a um estágio avançado. Viam-se ali, presos junto com ela, e sentiam certo desconforto., Bastava que espirrasse para todos trocarem olhares preocupados e ficarem inquietos. Um problema de gases provocava histeria. Quando teve uma câimbra na perna, todos entraram em pânico. Não queriam deixar que Laura erguesse nenhum peso e, em conseqüência, não saíam de seu caminho e não a deixavam em paz. Na tarde do quarto dia, Emily. chegou a ouvir Sam Lucas distribuindo tarefas a Frank e Melvin caso algo acontecesse a Laura. Em outra ocasião, teria achado engraçado, mas, naquele momento, só serviu para irritá-la. Acabou explodindo; — Em vez de ficarem aí sentados como uns idiotas, por que não saem e cortam um pouco de lenha ou coisa parecida? Vocês, homens, são patéticos, sentados aí sem fazer nada. — Lançou um olhar fulminante a todos. Um minuto depois, todos vestiam rápido as capas de chuva e fugiam em debandada. Gertrude mexia uma panela de guisado. Ouviu tudo e olhou para Emily, observando-a. — Não sei se esqueceu, Em, mas esses homens são nossos clientes. Estão pagando a hospedagem, e devemos tomá-la o mais agradável possível. Não devia precisar lembrar-lhe isto. Expulsá-los de casa em plena tempestade para cortarem lenha não vai fazer com que desejem voltar no ano que vem, e nossos negócios dependem disso. — Não me importo se nunca mais voltarem — resmungou Emily. E não se importava mesmo. Graças a Kevin, não haveria "ano que vem" para a Vale do Elk
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Excursões: Tinha vontade de entregar-se à histeria que a dominava interiormente há dias. O que aconteceria com ela, Laura e Gertrude? Para não gritar, Emily começou a tirar tudo das prateleiras, batendo canecas e louças no balcão com violência e despejando desinfetante numa bacia. — Laura acabou de limpar estas prateleiras! — Gertrude exasperava-se. — Que bicho mordeu você. Em? Se é por causa do arrendamento, tudo bem, também estou preocupada, mas não podemos fazer nada até consertarem a ponte ou o rádio voltar a funcionar. O mínimo que podemos fazer é sermos profissionais e não deixar que isto afete os clientes. Emily sentia-se a ponto de desabafar toda a maldita história, mas se conteve e pôs-se a esfregar tudo o que via pela frente. A tensão afetava Gertrude, também, por mais que tentasse esconder. Quase batera em Sam na hora do jantar ao ouvi-lo contar uma piada sobre ser abandonado com ela numa ilha deserta. A única pessoa não afetada por aquilo tudo era Laura. Calma e serena, cozinhava e assava guloseimas deliciosas para todos e distribuía o seu sorriso cristalino sem reservas. Emily achava o bom humor perpétuo da irmã extremamente irritante. Enfim, na quinta manhã, justo quando Emily cogitava seriamente um assassinato em massa seguido de suicídio, a chuva parou e um pálido sol apareceu. Todos saíram correndo e ficaram a manhã toda fora de casa., Um pouco antes do meio-dia, Emily juntava feno para os cavalos quando avistou Jackson Briggs, enlameado e encharcado, descendo a estrada rumo ao acampamento. Bufando, o grande lenhador barbudo não se preocupou em dizer "olá". Os olhos castanhos se arregalaram ao falar, ofegante: — Como está Laura? Santo Deus, ela ainda não teve o filho, teve? Tenho andado desesperado de preocupação com ela e o bebê. Onde está ela? Emily lhe assegurou que a irmã estava ótima. — Eu há vi quinze minutos atrás, assando pão. Está gorda, mas com ótima saúde, Jackson. Na verdade, parece bem melhor do que você, no momento. Não devia correr desse jeito, vai ter um ataque cardíaco! De onde veio, a propósito? Como atravessou o rio? — Nadando. Estava enlouquecendo! Só ontem descobri que a ponte ruiu, então levei o meu pessoal para reconstruí-la. Mas não consegui ficar esperando, resolvi atravessar a nado. Emily pensou na água gelada e na corrente feroz, e sua admiração por Jackson aumentou ainda mais. — Venha, venha vestir algo seco. Pode pegar alguma roupa de Sam, ele não vai se importar. Depois você almoça conosco. O almoço decorreu num clima pesado. O bom humor de Laura desapareceu com a chegada de Jackson. Deixou claro que se zangara por ter sido imprudente a ponto de atravessar o rio na cheia e garantiu, em termos nada delicados, que era perfeitamente capaz de tomar conta de si própria. Discutiram, e ela deixou o
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pão queimar, o que a enfureceu ainda mais. Jackson cometeu o erro de insistir para que fosse embora com ele assim que a ponte fosse reparada, e Laura respondeu com um gesto de mão ofensivo que todos, infelizmente, compreenderam. Emily fazia questão de sentar-se o mais longe possível de Kevin, Este parará de lhe dirigir qualquer comentário, já que ela ignorava qualquer coisa que dissesse. Jackson parecia pronto a explodir, e Laura foi se trancar no quarto, batendo a porta e recusando-se a sair. Um silêncio constrangedor reinava à mesa. Por fim, Jackson suspirou e deu de ombros. — Algum de vocês quer vir junto e nos dar um mãozinha na reconstrução da ponte? Sem dúvida, qualquer auxílio é bem-vindo e, se trabalharmos nas duas extremidades, ficará pronta mais cedo. Os homens vibraram com a idéia. — Levem o caminhão — sugeriu Gertrude. Depois que os homens partiram, virou-se para as filhas. — Estou envergonhada com as duas — desabafou Gertrude. — Laura, ao menos, tem a desculpa de que a gravidez pode estar afetando seu cérebro, mas você, Emily... Estou aborrecida com o modo como anda tratando Kevin! Não há desculpa pára isso. Está sendo infantil. Se tiveram alguma briguinha de namorados, pode ao menos tentar ser educada. Gosto dele. É um cavalheiro. Emily sabia que, enfim, chegara a hora de contar a Gertrude e a Laura os terríveis fatos sobre a Companhia de Empreendimentos Pace e Kevin Richardson. Era um fardo que não suportava mais carregar sozinha. — A Companhia de Empreendimentos Pace, que comprou o nosso arrendamento, pertence a Kevin e seu pai. Foi como um pesadelo, observar Gertrude e Laura absorverem todas as implicações do que dizia. Ficaram chocadas e horrorizadas, e nenhuma delas aceitava, a princípio, o fato de Kevin havê-las traído a tal ponto. Contar a elas era como passar por tudo aquilo novamente. Como já esperava, o mais difícil era que elas sabiam exatamente o que Emily sentia em relação a Kevin e, assim, diante da forma como ele a traíra, enchiam-se de compaixão. Como era do seu feitio, Gertrude não demorou muito a enfurecer-se. Se Kevin estivesse por perto, Emily tinha certeza de que a mãe o agrediria fisicamente. — O que podemos fazer para impedi-los? — Foi Laura que formulou a questão prática, enfim, è as três gastaram tempo e energia tentando desesperadamente achar uma saída, mas logo todas compreenderam que era impossível. Foi Gertrude quem sintetizou a situação.
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— Não temos o dinheiro nem a influência política necessária para lutar em igualdade de condições. Fomos vencidas, garotas. Não há nada a fazer exceto aceitar a derrota. Pela primeira vez em toda a sua vida, Emily achou que a mãe parecia velha. Os homens voltaram no fim da tarde. A ponte fora reconstruída, e o árduo esforço físico lhes fizera bem após tantos dias inativos e entediados. Como sempre, Kevin procurou Emily em primeiro lugar, mas ela não estava por perto. Então notou os rostos abatidos e zangados com que Gertrude e Laura o encaravam e soube que Emily havia contado tudo. Era um alívio; sentia-se um traidor, e era muito melhor que tudo ficasse às claras. — Jackson se ofereceu para me levar à cidade esta noite, e decidi partir agora mesmo. Gostaria de me despedir de Emily. Sabem onde está? Gertrude cruzou os braços e lançou-lhe um olhar petrificante. — Foi verificar um outro acampamento. Não vai voltar hoje. Acho que é uma boa idéia ir embora. Emily nos contou que a sua companhia vai assumir a posse de nossa terra. — É, achei que houvesse contado. Eu mesmo queria lhes contar, mas Emily me pediu que não o fizesse. — Vir aqui foi um gesto sujo, nojento, Kevin Richardson. — A voz dela era baixa e cheia de desprezo. Kevin retribuiu ao olhar rancoroso de modo demorado e firme. — Foi, Gertrude, e sinto tê-las magoado. Mas nunca me arrependerei de ter vindo — insistiu, ainda fitando-a nos olhos. — Por muitas razões, estas últimas,semanas foram as melhores de toda a minha vida. — Saia da minha frente. — Gertrude cuspiu em cima.dele, depois se virou e se retirou. Kevin dirigiu-se a Laura, e o brilho de traição e mágoa em seus claros olhos azuis dilacerou-o. — Pensei que fosse amigo — ela sinalizou, acusando-o. — Verdade — foi tudo o que conseguiu declarar. Estendeu a mão e acariciou o rosto de Laura. — Obrigada pelos pratos deliciosos que me preparou, e por ter me ajudado a aprender melhor a linguagem dos sinais. Nunca vou me esquecer de você. Cuide da sua irmã por mim, está bem? Laura fuzilou-o com os olhos. — Você magoou minha irmã mais do que a nós todas. O que vai fazer a respeito? A pergunta era ao mesmo tempo simples e profunda. Por um momento, Kevin ficou imóvel, sem palavras, sem sinais a transmitir. Que poderia fazer? Como poderia consertar o que fizera a Emily? Esforçou-se por encontrar uma resposta e acabou transmitindo a verdade pura e simples. — Ainda não sei. Vou pensar em alguma coisa. Prometo que vou pensar, porque eu amo Emily.
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O sinal para "amor" era as mãos cruzadas, dobradas sobre o peito, junto ao coração. Era um sinal muito claro e de grande poder visual, um sinal que nunca havia feito antes. No entanto, notou que Laura não acreditou nele, e não a culpou por isso. A viagem até a cidade com Jackson foi longa e entediante. Os empregados iam na parte de trás do caminhão, mas adormeceram assim que deixaram o acampamento central. Kevin ia ao lado de Jackson, na frente, e os dois trocavam comentários sobre o clima, a situação política na Colúmbia Britânica e esportes. — É casado? — perguntou Jackson a seguir. — Divorciado, há muito tempo. — Conheceu bem Laura, no acampamento? — Havia ansiedade no tom do lenhador, e Kevin simpatizou com ele. — Ela e Emily me ensinaram a linguagem dos sinais. Antes eu entendia, mas havia esquecido. Sim, eu a conheci bem. É uma ótima pessoa. Jackson assentiu devagar., — Isso ela é mas também é teimosa como uma mula. O bebê que ela vai ter é meu, sabe, e, mais do que tudo no mundo, quero me casar com ela, mas ela não quer. Acha que se o bebê nascer surdo, vai haver problema. — Forçou os olhos para enxergar no escuro e praguejou. — Por que diabos acha isso eu não entendo. Ela é surda e eu a amo tanto que às vezes tenho vontade de estrangulála. E Deus é testemunha de que sou um homem de paz. Para qualquer outro, aquilo pareceria uma contradição em termos, mas Kevin entendia perfeitamente, sabendo como as Parkers poderiam tirar um homem do sério. — Sinto o mesmo por Emily. Embora ela possua uma boa razão para me odiar, quanto a isso não há dúvida. — De repente, Kevin se viu contando a Jackson tudo sobre Empreendimentos Pace e a conquista do arrendamento.
a
Companhia
de
Ao final da história, Jackson assobiou. —Emily deve ter ficado muito aborrecida com isso. Conheço-a desde os tempos do colégio. Ela ama este vale mais do que qualquer outra pessoa que já conheci. Certa vez, um dos meus amigos se apaixonou por Emily, mas nunca conseguiu nada com ela é uma mulher forte. Admiro-a por isso Jackson concordou. — Mas será a pessoa mais prejudicada com esse empreendimento de que você me falou. — Passou por um buraco maior do que os outros e depois se virou para encarar Kevin. — Se gosta dela como diz, vai ser difícil conseguir alguma coisa com ela depois desta. Não vai pensar em mais nada por um bom tempo, só na perda da Vale do Elk Excursões. — Terei de esperar, então. Kevin resmungou: — Bem-vindo ao clube!
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CAPÍTULO XI
E de volta a Vancouver, Kevin telefonou ao pai. — Onde diabos você andava? — Barney saudou-o em tom acusatório. — Devia ter voltado há uma semana! Já aprontou o folheto com as fotografias para os investidores?Andei trabalhando numas legendas para as fotos... Eles querem ação! Nada mudara. Tudo mudara. — Já tentou dizer "Oi, Kevin, como vai você?"? É bom conversar com você também, papai. Vou tirar folga amanhã, então o verei no escritório, na quartafeira, pelas dez horas. Aí conversaremos. Ignorando as manifestações veementes de surpresa do outro lado da linha, Kevin desligou e tirou o telefone da tomada. Estava esgotado, exausto mental e fisicamente, e só conseguia pensar em Emily. Precisava elaborar um plano de ação. Kevin chegou ao trabalho antes das nove horas na manhã de quarta-feira. — Barney está em sua sala, chegou bem cedo esta manhã — avisou-lhe, sorridente, Ruth Wilkins, a secretária de meia idade. — Quer um pouco de café? — Aceito, Ruth, obrigado. O pai sempre ia trabalhar de madrugada, o que não era de admirar, considerando que a Pace era toda a vida de Barney. Seguiu até a sala do pai e encontrou-o atrás da escrivaninha, estudando uma pasta cheia de mapas. Era um homem grande, bem acima do peso nos últimos anos, mas de boa aparência. Kevin herdara os ossos salientes e os ombros largos do pai. Como de hábito, Barney não perdeu tempo perguntando como Kevin fora de viagem, ou o que vinha a ser, na verdade, a Vale dá Elk Excursões. Investiu como um trator, como sempre, reclamando da demora de Kevin e do fato de não ter ido trabalhar assim que chegara. Depois disso, entrou direto nos detalhes do projeto do complexo hoteleiro. Quanto custariam as estradas, Kevin encontrara boas localizações para determinados componentes do complexo, tirara boas fotos, capazes de despertar o interesse dos investidores? Kevin escutava e notava, com nitidez, a falta de comunicação existente no relacionamento com o pai. Era como se fosse um estranho, um empregado de Barney. Pela primeira vez, não reprimiu a mágoa que sentia. Ruth chegou com uma bandeja e, quando saiu, Kevin pegou uma xícara e afundou numa das poltronas de couro. — Quero conversar com você, Barney. — O que acha que estamos fazendo? — Barney acendeu um charuto e soltou uma baforada. Já havia cinzas em sua gravata. — E quanto aos antigos arrendatários? Conseguiu...
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— Barney, pelo amor de Deus, quer ficar quieto e me ouvir um pouco? — A raiva e o desamparo afligiam Kevin. Ergueu-se, bateu com a xícara na escrivaninha e fixou os olhos sobre o pai. Barney olhou para ele, atônito, esquecendo por um momento o charuto, deixando-o pendurado no canto da boca — Calma! O que foi que lhe deu? Teve algum problema lá? — Não. Sim. Droga, Barney, estou farto do... do jeito como as coisas acontecem entre nós, foi isso que me deu! Por uma vez na vida quero ter uma conversa de verdade com você, e não é sobre negócios. — Kevin passou os dedos no cabelo, tentando encontrar as palavras, a velha falta de jeito ameaçava paralisá-lo e ele lutava com todas as suas forças contra ela. — Você é meu pai, pelo amor de Deus, e não me lembro de uma única vez em que tenha realmente conversado comigo sobre algo que fosse importante de verdade! Era difícil. Sentia-se embaraçado, como se o que tentasse fazer não fosse viril aos olhos do pai, mas insistiu. — Nunca fui muito bom com as palavras, mas com, certeza este também não é o seu forte, Barney. — Um pouco da raiva se dissipara, mas decidiu ir em frente. Respirou fundo. — Acho que somos parecidos neste aspecto, não falamos muito sobre o que realmente importa. Mas sabe você não é mais um jovem, e eu também não. Então vamos tentar enquanto ainda existe uma possibilidade. Concorda? Encarou o olhar perplexo de Barney de igual para igual e esperou. Barney lembrou-se do charuto e fechou a boca. — O que é isso, um desses papos modernos sobre as relações entre os homens? — Ficou de rosto vermelho, mas pegou uma xícara de café e sentou-se, cuidando de manter a escrivaninha entre ele e o filho. Fitou Kevin com um ar preocupado, como se achasse que ele perdera a razão. — Fique calmo, hein, Kevin? Não está falando coisa com coisa. O que quer dizer com isso de que nunca conversamos? Conversamos todo o tempo, todo dia. — Sobre negócios. Acontece que há mais na vida além de negócios, Barney! O pai franziu a testa e falou, de modo abrupto: — Está começando a falar como... — Parou de repente e praguejou baixinho. Desviou os olhos, mirando, pela janela, os barcos no rio, com a boca retorcida numa careta. Kevin sorriu de modo triste. — Como a minha mãe, era o que ia dizer, Barney? Sobre ela, também, nunca talamos. E talvez devêssemos. Barney parecia prestes a explodir. — Que diabo lhe aconteceu no vale? Nunca tivemos problemas antes! O que trouxe toda essa bobagem à tona de repente? Kevin enfrentou o olhar hostil do pai. — Essa bobagem, como você diz,é importante para mim. Há fatos sobre a minha mãe que eu gostaria de saber, e não há ninguém a quem perguntar além de você. 98
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A próxima parte era a mais difícil. Jamais em sua vida admitira uma fraqueza a Barney, pelo menos desde os cinco anos, quando confessara ao pai seu medo de ir para o internato. — Seja um homem — Barney lhe ordenara então. — Quê diabos você é, um covarde? Homem que é homem não fica choramingando por qualquer coisinha. Fora a última vez que contara ao pai sobre como se sentia realmente a respeito de algo, até aquele momento. Emily dissera que devia tentar e, por Deus, iria fazê-lo. — O que aconteceu no vale do Elk foi... foi que me apaixonei, papai. Por uma mulher chamada Emily Parker. Barney tirou o charuto da boca e largou-o descuidadamente no cinzeiro abarrotado. — Parker... Parker... Não é o nome daquela gente... Que dirige a Vale do Elk Excursões. É Contei a ela o que íamos fazer, e ela ficou muito magoada. Não quer mais nada comigo, e isso é bastante compreensível. Mas o fato é que eu a amo e pretendo casar-me com ela, mesmo se precisar levar cinqüenta anos para convencê-la. Kevin se ouviu dizer aquilo e percebeu que era verdade. Talvez aquela conversa fosse boa, no fim das contas. Era óbvio que sua boca sabia de coisas que o cérebro não conseguira reconhecer ainda. Chegara a hora de fazer Barney soltar espuma pela boca de raiva. — Em primeiro lugar, abandonarmos este projeto.
quero
saber
se
existe
alguma
forma
de
Os olhos de Barney quase saltaram das órbitas. — Caramba, você ficou doido de vez! Está pensando com o pênis em vez de pensar com a cabeça. Esqueça! Só porque se enrabichou por essa caipira? Os olhos de Kevin se estreitaram ameaçadoramente. — Cuidado com o que diz. Barney! O nome dela é Emily, e já lhe falei que eu a amo. — Desculpe. Desculpe ter falado assim. — Barney parecia olhar para Kevin e vê-lo pela primeira vez. — Não. Não podemos abandonar, Kevin. Conhece as cifras melhor do que eu, sabe o quanto já investimos. E os investidores, não podemos deixá-los na mão, caso contrário jamais conseguiremos recuperar o prestígio na cidade. Além disso, a região está pronta para o que planejamos. Se não nos mexermos agora, alguém mais o fará num futuro próximo. E talvez provoque mais danos do que os que planejamos. Barney tinha razão. Com relutância, Kevin admitiu. Nada iria preservar o vale de Emily para sempre, as mudanças eram inevitáveis. Talvez houvesse algum vale remoto ao norte da Província de Alberta ou nos Territórios do Noroeste que pudesse comprar para ela. Ia procurar algum, porque a queria de volta, custasse o que custasse. No momento, entretanto, havia providências a tomar para tomar a vida dela ao menos um pouco mais fácil.
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—Então proponho que recompensemos financeiramente as Parkers, do modo mais generoso possível, pela perda dos negócios e do acampamento. Barney arregalou os olhos e começou a sacudir a cabeça, mas nesse ponto Kevin se mostrou inflexível. — Faz sentido em termos comerciais, Barney. Deve pagar a elas o valor das casas, de qualquer jeito. E se elas quiserem, podem nos processar pela perda dos rendimentos, então vamos oferecer uma soma generosa, para evitar confusões. E também quero adiar o início do projeto até a próxima primavera, para que possam cumprir os contratos firmados para este verão. — De jeito nenhum! Estamos ainda no começo da primavera. Temos o verão inteiro e o outono para adiantarmos o projeto. Perderemos dinheiro... Levaram uma hora em árduas negociações, mas, ao final, sob protesto, Barney concordou com quase tudo o que o filho queria. — É teimoso como uma porta quando põe alguma coisa na cabeça, isto devo admitir — declarou Barney, com uma ponta de orgulho na voz. — Agora que conseguiu o que queria, ao menos me pague o almoço. — Pegou a capa de chuva no armário e vestiu-a. Falou, em voz abafada: — Sua mãe era assim, sabe. Teimosa como ninguém, quando queria alguma coisa. Acho que você puxou- a ela em vários aspectos. Não era muito, mas era um começo. Laura deu à luz a criança em 17 de julho, perto da meia-noite, num sábado, duas semanas depois do esperado. Teve a consideração de escolher um momento em que um grupo de clientes acabara de partir e o próximo não chegara ainda: assim, Emily pôde estar a seu lado no quarto quando o sobrinho de quatro quilos e duzentos gramas nasceu. — Parece com o pai — declarou Laura quando o bebê chorão e vermelho lhe foi colocado nos braços. Emily achou que era o bebê mais bonito que já vira e Jackson Briggs, obviamente, também. Inflexível até o último instante, Laura deixara que Emily chama-se Jackson apenas uma hora antes, e ele quebrara todas as regras do hospital para assistir ao nascimento do filho. O médico lhes assegurara que fora um parto sem problemas, mas Jackson quase não sobrevivera. O robusto lenhador quase tivera um ataque nos estágios finais do parto. Agora fitava Laura e o bebê de um modo que não deixava dúvidas sobre o quanto os amava. Havia adoração em seus olhos, e o prenuncio de uma lágrima. — Tem o queixo teimoso da mãe — afirmou, sinalizando com gestos desajeitados. Vinha tomando lições no último mês e ficava cada vez mais evidente que vencia, aos poucos, a resistência de Laura. Emily os observava, lágrimas rolando nas faces, feliz pela irmã, mas sentindo o coração partido. Na maior parte do tempo, evitava pensar em Kevin de modo consciente, embora não conseguisse evitar a dor: uma agonia incessante e irremediável. Fazia o possível para ignorá-las não dormia mais do que uma hora por dia e seu
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apetite, normalmente voraz, desaparecera. O jeans começava a ficar frouxo ali onde antes ficavam os seus quadris. Queria odiá-lo pelo que fizera e nem isso conseguia. E naquela noite, diante do milagre de assistir ao nascimento do sobrinho, de modo totalmente irracional, sentiu falta dele e desejou o impossível. Queria estar com Kevin, queria um dia segurar um filho dele nos braços como Laura agora segurava o de Jackson. Porque nada mudava o fato de que o amava. Amaldiçoou-se por ser fraca, por trair a família e a si própria, mas a razão não mandava em seu coração. Quando lhe vieram as regras, dando-lhe a segurança de que tudo estava bem, que nenhum filho resultaria do que houvera entre eles no Acampamento do Urso Pardo, passara a noite toda soluçando, admirando como nunca as decisões que Laura tomara durante os últimos nove meses. Laura jamais pensara em aborto. Emily sabia que, se estivesse grávida, também teria o bebê. Contra todo o bom senso. Gertrude chegou correndo, a tempo de segurar o neto antes que a enfermeira o levasse para o berçário. Sam Lucas entrara com ela. Ao que tudo indicava, Sam havia assinado contrato para todo o verão com a Vale do Elk Excursões. Emily não gostava nem de pensar no que acontecia em sua clínica veterinária enquanto ele andava pelo vale com Gertrude. Com mil demônios, será que os animais de San Diego não tinham problemas de saúde em julho e agosto? — Tentei telefonar-lhe algumas vezes, mas você não estava — reclamou Emily. A mãe andava passando muito tempo com Sam nos últimos dias e Emily não sabia se gostava disso. — Sam e eu tivemos de ir buscar feno e depois fomos jantar fora. Laura estava se sentindo bem quando saímos. O tom de Gertrude era defensivo, e Emily sentiu vergonha. A mãe parecia novamente de bem com a vida nas últimas semanas. Depois de passado o choque inicial, Gertrude aceitara a perda dos negócios de um modo que deixara Emily estarrecida. A Pace oferecera-lhes uma enorme compensação financeira, e o alívio das constantes preocupações financeiras parecia ter feito muito bem a Gertrude. Começara a fazer o cabelo e até comprara roupas novas. Naquela noite, inclusive, usava um vestido novo, azul, de algodão, que ressaltava a sua silhueta elegante. Era perverso de sua parte fazer a mãe sentir-se culpada, admitiu Emily. Colocou o braço em tomo dos ombros de Gertrude e deu-lhe um abraço. — Não é lindo, o nosso bebê? — Parece a vovó — comentou Sam, lançando um olhar meloso a Gertrude que fez Emily achá-lo com cara de carneirinho apaixonado. Mas Gertrude sorriu para ele e até o deixou segurar sua mão ao saírem juntos do hospital, e Emily se sentiu mais solitária do que nunca. Acenou amavelmente, contudo, quando eles se afastaram e entraram em Matilda para a longa viagem de volta ao lar,
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"A terrível questão era... o que ia fazer da vida? O problema a afligiu durante todo o verão, enquanto trabalhava como guia, cozinhava e fingia sorrir aos últimos clientes da Vale do Elk Excursões. Um dia, no final de setembro, depois de levar o último grupo de clientes ao aeroporto e voltar, sentiu-se desolada. Entrou no jardim e sorriu ao ver o carrinho do bebê na varanda e Caleb ao lado, protegendo-o. Caleb fora encarregado da tarefa de proteger o pequeno Alexander Robert Jackson Parker Briggs com a própria vida. Cumpria a responsabilidade com seriedade. Pôs-se em pé e latiu furiosamente, mostrando os dentes, quando Emily se aproximou do carrinho. — Caleb, você é um banana! Sou a tia do bebê, pelo amor de Deus. Sente aí e fique quieto! Caleb ficou mansinho enquanto Emily pegava o bebê no colo e ia até a velha cadeira de balanço, ajeitando aquela trouxinha quente e cheirosa nos braços com muito cuidado. Podia ouvir Laura batendo ovos dentro de casa, provavelmente fazendo bolo de chocolate para Jackson. Nos últimos dias parecia estar sempre fazendo bolos para Jackson, embora continuasse se recusando a casar com ele. — Primeiro vamos ver se nos damos bem juntos, depois tomaremos a decisão. Assim, Laura e Alex iriam mudar-se para a casa de Jackson no próximo fim de semana, e Emily aproveitava todas as oportunidades para mimar Alex antes que isso acontecesse. — E aí, meu rapaz, pegou algum peixe ou matou algum urso na minha ausência? Alex olhava para ela e dava um daqueles sorrisos de bebê, ingênuos, escancarados, de derreter o coração. Alex adorava conversa. Chorava quando ouvia ruídos fortes, o que deixava a avó e a tia extasiadas, porque era a prova de que ele podia ouvir. A mãe e o pai não se preocupavam tanto se ele ouvia ou não; conversavam sobre as conseqüências de ambas as possibilidades e, aparentemente, lidavam com ambas de maneira satisfatória. — Então mamãe e papai vão te levar para morar com eles, o que eu acho uma grande injustiça, e vovó vai para San Diego com o velho Sam, passar umas férias naquele outro mundo selvagem, para variar um pouco. Gosto não se discute, não é? Francamente, menino, a sua família é muito louca. A não ser eu, é claro! Incomodava-a o fato de que a perda da Vale do Elk Excursões não afetara a Gertrude e a Laura tanto quanto a ela própria. Elas tinham dado um jeito e levado adiante suas vidas. — Vai ser bom, na verdade, se a sua avó resolver ficar com Sam Lucas, Alex. Conhecendo-a como conheço, acho que nunca vai concordar em se casar com ele, mas e daí? Vai ser divertido apresentá-los a seus amigos um dia... Dois. velhos vivendo em pecado! Alex deu um gritinho e pôs o polegar na boca.
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— Convidaram-me para ir com eles à Califórnia, te contei? Mas sabe como é, um é pouco, dois é bom, três é demais. Fiquei comovida com o convite, mas recusei, é claro. Que diabos eu ia fazer na Califórnia? A propósito, o que estava fazendo? — Assim, a sua velha tia Em vai ficar sozinha, não é? Via que podia conversar com Alex. Era um grande ouvinte e não se importava com as lágrimas que caíam de vez em quando sobre suas cobertas. Mas naquele dia Emily não chorou. Para que chorar? Era pura perda de tempo e energia. Decidira controlar-se, usar as próximas semanas a sós para pensar na vida e no que iria fazer. Também queria despedir-se do vale à sua maneira, e decidira ir até o Acampamento do Urso Pardo e enfrentar os fantasmas que lá a aguardavam. Talvez assim pudesse tomar uma decisão, seguir em frente em vez de ficar presa às lembranças que a atormentavam. — Pena que não sabe cavalgar, meu rapaz. Além disso, é muito dependente da mamãe quanto à alimentação. Se não fosse isto, poderia ir comigo. Talvez no ano que vem... — Mas lembrou-se que, quando Alex aprendesse a cavalgar, o vale não seria mais o mesmo. Não era só a Companhia de Empreendimentos que estava alterando o vale, todavia. O que Kevin dissera a respeito de ser inevitável que outros empreendimentos se desenvolvessem na região provara-se verdadeiro. Durante o verão, ricos investidores haviam começado a construir uma estância-hotel luxuosa junto a um lago isolado que até -o mês anterior não contava nem mesmo com um acesso à estrada principal. Dois novos hotéis estavam em construção em Elkford, e havia rumores sobre um campo de golfe de nível internacional a ser construído numa remota campina até o momento habitada só pelos alces. — Vou tirar um monte de fotos para você, menino, para que veja o vale do Elk como era — sussurrou para Alex. Nesse instante, a imagem de Kevin veio-lhe à lembrança e, mais uma vez, as lágrimas umedeceram o cobertor amarelo claro de Alex. Maldição! Como podia sentir tantas saudades de alguém ao mesmo tempo desprezá-lo pelo que lhe fizera? Quando desceu o monte Abbey, três dias depois, e avistou a campina e a cabana, seu coração disparou. Tudo se encontrava exatamente como haviam deixado naquela manhã chuvosa de maio. Desencilhou Conde e soltou-o no curral, então abriu a porta da cabana. Deus, como doía, estar ali. Ficava o tempo todo de sobreaviso, como se ele pudesse estar esperando-a, oculto nas sombras. Abriu as venezianas para deixar o ar fresco do entardecer penetrar, largou as malas num dos quartos, tomando o cuidado de escolher para si o quarto onde hão haviam dormido. Lá fora, os alamos, em tons flamejantes de escarlate, laranja e dourado, anunciavam que o outono avançava e que o inverno não tardaria. Já havia neve
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nos pontos mais altos das rochas. A relva amarelara; o verão fora seco. Mas o Lago da Lua de Mel, com seu azul turquesa cintilando ao crepúsculo, evocava lembranças daquele primeiro entardecer com Kevin e do modo como ele a enganara fazendo-a pular na água gelada. Até aquele instante, reprimira todas as lembranças de Kevin, porque as reminiscências lhe eram muito dolorosas. Por muito tempo, tentara odiá-lo, com toda as suas forças, mas jamais conseguira. Odiava o que ele fizera, mas não o odiava. Deu um giro, devagar, fitando as montanhas imensas e o vale que amava. Aquele fora o seu mundo, seu mundo selvagem. Fora a sua profissão, o seu conforto, o seu lar. Sentira-se segura e feliz ali: Não era mais assim. Tudo perdera o sentido sem Kevin a seu lado, aquele mundo selvagem tornara-se um deserto. Não era mais um lar. Será que até uma cidade como Vancouver, que Deus a perdoasse; poderia transformar-se num lar, se estivesse com alguém a quem amasse? Já escurecia quando voltou. Esquentou uma sopa no fogão a lenha, acendeu o lampião e, aos poucos, passou a relembrar os bons tempos que haviam passado ali. Kevin... Deixou que a imagem dele a invadisse, os cabelos escuros e macios, os olhos penetrantes, as covinhas que surgiam nas bochechas quando ele ria. Emily zombara dele por ter covinhas e ele ficara ofendido. Lembrou de sua força física, do jeito calado, de como lhe era difícil falar da infância solitária e dos sentimentos confusos a respeito da mãe. Precisara de muita coragem para, enfim, contara história toda, e Emily o admirara por isso. Quando a noite caiu, Emily entrou no quarto, apagou o lampião e em meio à escuridão, enfiou-se no saco de dormir. Foi nesse momento que mais sentiu a falta dele. Todo o seu corpo ansiava pelo toque de Kevin. Lembrou-se de tudo, do que sentira quando ele. a tocara ali...e ali... Por fim, levantou e levou o saco de dormir e o travesseiro para o outro quarto. Encontrou a cavidade, nas velhas molas do estrado, que assinalava o local onde seus corpos haviam-se entrelaçado e, aninhando-se ali, fez de conta que ele estava a seu lado. Os coiotes uivaram por um longo tempo, uivos lúgubres e solitários. Gradualmente, percebeu que não restara mais nada para ela ali, sem Kevin. Ficaria alguns dias e partiria. Talvez lhe escrevesse uma carta, ou coisa parecida. Um pouco antes do amanhecer, adormeceu, enfim. Kevin alugara um carro no aeroporto e seguira rumo ao vale. Telefonara a Jackson várias vezes durante o verão para saber de Emily, mas já fazia algum tempo que não entrava em contato. No entanto, sabia que os últimos clientes haviam partido; o verão terminara. Na estrada, ficou admirando a folhagem amarelecida do outono e lembrou-se da primeira viagem com Emily. Quando entrou na estradinha de acesso à casa das Parker, o coração acelerou. Emily estaria em casa? Estaria disposta a ouvir o que queria dizer-lhe? Por bem ou por mal, ia fazê-la ouvir.
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O curral estava vazio, e mesmo o celeiro parecia deserto. Parou o carro na frente da casa e em questão de minutos percebeu que não havia ninguém morando ali. Não encontrou nem mesmo Caleb. Saiu e foi até a porta, batendo várias vezes só por desencargo de consciência, mas, como era de se esperar, ninguém atendeu. Sentiu um frio no estômago, de medo. Era como se ninguém estivesse mais morando ali. E se Emily tivesse partido? E se houvesse encontrado alguém e resolvido afogar as mágoas casando-se? A idéia não havia passado por sua cabeça, mas, de repente, tornou-se uma obsessão. Voltou ao carro e deu a partida. Na metade da estradinha, um velho Thunderbird vermelho surgiu à sua frente. Laura vinha ao volante, com o nenê ao lado. Kevin freou e saltou do carro, e Laura parou. Por um instante, entreolharam-se. — Oi, Laura! Que menino lindo você tem aí! — sinalizou Kevin. — Parabéns!. Um grande alívio o invadiu ao vê-la sorrir e sair do carro. —Um guloso come o tempo todo — contou-lhe, orgulhosa. — Obrigada pelos presentes! Logo as roupinhas vão servir. Kevin enviara a Alex o menor par de botas de cowboy que encontrara, junto com uma Levis em miniatura, uma camisa Western e um mini-chapéu Stetson. Jackson enviara um bilhete em agradecimento, mas Laura não mandara nenhuma resposta. Observava-o agora, com o olhar azul franco e direto de sempre. — Pensei muito se você voltaria ou não — falou com os dedos. — Preciso falar com Emily. Onde ela está? Não há ninguém em casa. — Mamãe está em San Diego. Alex e eu mudamos para a casa de Jackson, a um ou dois quilômetros daqui. Os cavalos estão com o vizinho. Caleb está conosco enquanto mamãe não volta. Dentro do carro, o nenê começara a se agitar. Sem poder ouvi-lo, Laura ainda não percebera, mas Kevin sabia que, quando percebesse, era provável que entrasse e fosse embora. Ainda não contara do paradeiro de Emily, e Kevin notou que não tinha intenção de lhe contar. Desesperou-se, e sentiu os dedos rígidos e desajeitados. — Amo sua irmã, Laura. Preciso conversar com ela! Laura mantinha o nariz empinado e fitava-o em desafio. — Partiu o coração de minha irmã! Não quero que isso aconteça de novo. Kevin se esforçava para encontrar os sinais adequados. — Sei que a magoei muito,e jamais o farei de novo. Quero casar-me com ela. . Os olhos de Laura desceram até o indicador, sem aliança. — Não é fácil casar-se com uma Parker.
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Jackson insistira muito no último telefonema, avisando Kevin de como eram difíceis as Parker quando se tratava de casamento. — Bem, vou fazer o possível, de qualquer modo. — Deu um longo suspiro. — Preciso vê-la, casando-se comigo ou não vou pegar no pé dela até que me dê uma oportunidade, Laura. Vou convencê-la! — Teimoso! Como Jackson. Mas não se esqueça, está furiosa com você. — Lançou-lhe um olhar demorado e cuidadoso. — Talvez lhe dê um tiro em vez de conversar. A possibilidade passara pela cabeça de Kevin.— Vou tomar cuidado. — Agora bebê berrava a plenos pulmões. Kevin teria de chamar a atenção de Laura logo. — Por favor, diga-me onde ela está, Laura!, Mas Laura se reclinou e olhou pela janela para o bebê furioso. — Com fome de novo — declarou com as mãos, preparando-se para entrar no carro e partir, exatamente como ele temera. Kevin segurou sua mão, forçandoa a encará-lo. — Por favor, Laura! Os olhos azuis enviaram súbitas faíscas ameaçadoras em sua direção. — Se a magoar de novo eu mesma o mato! Ela está no Acampamento do Urso Pardo. Lago da Lua de Mel.Kevin fez o sinal que significava "obrigado" diversas vezes, mas ela já se estava indo embora.
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CAPÍTULO XII
Levou um dia inteiro, mas, enfim, Kevin conseguiu alugar um cavalo e juntar suprimentos, inclusive um rifle. Jackson ajudou, e ofereceu-se para transportar Kevin e o cavalo até o acampamento central. — Sei o que está passando, amigo. — Jackson deu-lhe uma batidinha no ombro. — Boa sorte, hein? Kevin ia mesmo precisar. Lembrou-se daquela trilha de origem sísmica que levava ao rio Elk. Lá chegando, encontraram o rio consideravelmente mais baixo do que na primavera. O cavalo, um capão de boas maneiras chamado Charlie, atravessou sem nenhum problema. Kevin agradeceu aos céus. Aos céus e a Charlie, a quem contou a história toda da travessia anterior. Ficar sozinho num lugar deserto como aquele era uma experiência enervante. A seguir, tentou lembrar-se do caminho por onde Emily o conduzira após a travessia do Elk. Não havia trilha e, ao final da tarde, viu-se completamente perdido. Voltou sobre seus próprios passos. Enfim, meio que por acaso, deu com o desvio oculto por onde haviam penetrado num bosque. — Encontramos, Charlie. meu velho! — Kevin gritara, triunfante. Chegara a imaginar-se vagueando por ali durante dias ou semanas. A esta altura, porém, o sol se punha. — Vamos acampar, Charles, e de manhã cedo prosseguimos a viagem. Engraçado, jamais entendera as pessoas que conversavam com animais e no entanto, fizera isso o dia todo. Era evidente que, aquela experiência lhe estava sendo instrutiva, em vários aspectos. Não foi um acampamento perfeito. Rodeado de árvores secas, ele não ousou acender uma fogueira. A janta consistiu em salsichas frias e sanduíches ressequidos, com água para rebater, e Kevin descobriu que os ramos de pinheiro que cortara para servir de cama espetavam um bocado. O frio era de rachar os ossos e os coiotes começaram a uivar assim que anoiteceu. Em certo momento, um animal de grande porte atravessou o bosque a poucos metros dali, deixando Charlie nervoso. Kevin manteve o rifle à mão e não fez questão de dormir muito tempo. Pensava em Emily, e nas coisas que poderiam lhe acontecer, naquele mundo selvagem. Sabia que, se conseguisse se casar com ela, teria de aceitar o seu estilo de vida. Raios, havia jogadores de rúgbi de cento e vinte quilos que não aceitariam explorar aquela região sozinhos. Ele mesmo não o faria, se não fosse por Emily. Mas moraria numa barraca ali mesmo, se este fosse o desejo da amada. O verão que passara sem ela lhe ensinara o bastante sobre a solidão.
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Então, refletiu sobre as mudanças que fizera em sua vida por causa de Emily. Ele e Barney tinham um longo caminho a percorrer até chegar a um relacionamento como o que Gertrude tinha com as filhas, mas, ao menos, o velho começava a se abrir. Até falava sobre a mãe de Kevin, de vez em quando, sobretudo quando Kevin o forçava a isso. Passeavam juntos no fim da tarde ou aos domingos, e gastavam só uma parte do tempo discutindo sobre trabalho. Trabalho. Esta era outra questão. Assumira uma nova atitude cm relação ao trabalho nos últimos tempos, sem dúvida alguma, Chegava mais tarde ao escritório e saía mais cedo, e sua vida não era mais controlada pelo relógio. Começara a tirar fotografias como passatempo: fotos de paisagens e de rostos que via nas ruas. Revelara as fotos de Emily que tirara £ ampliara todas, sem exceção. Cobrira as paredes do seu pequeno apartamento com aquelas fotos coloridas, que passaram a ser as últimas imagens que via quando ia para a cama e as primeiras que avistava ao amanhecer. Aquelas fotos o haviam ajudado a suportar o verão, sem dúvida. Outro fator que também ajudara fora manter-se sempre ocupado. Quisera muito voltar de imediato, mas achara mais sábio esperar, deixar que um pouco da mágoa e da raiva de Emily se dissipassem antes de tentar conquistá-la novamente. Durante todo o verão esperara que ela escrevesse, ou mesmo telefonasse e, embora soubesse que era irracional, continuara esperando. Mantivera-se ocupado, tudo bem, mas o verão também lhe dera tempo para pensar, para elaborar uma estratégia para chegar até ela. Dedicara-se à preparação do plano para reconquistar Emily com um afinco que jamais dedicara a qualquer negócio. Agora, rememorava o plano e esperava, impaciente e nervoso, que o dia amanhecesse. Era quase meio-dia e Emily acabara de levantar. Tomara um banho e agora preparava um chá com torradas. Tendo adormecido de madrugada, acabara acordando tarde, mas isso não tinha importância. Não havia nada urgente a fazer, na verdade. Deixara a porta aberta, e a manhã suave de outono entrava, espalhando o ar fresco e o sol quente pela cabana. Os pássaros cantavam e Conde relinchava na campina. Foi então que ouviu um cavalo se aproximando, e agarrou o rifle; uma mulher sozinha, naquele fim de mundo, não podia se descuidar. Saiu de casa. Ele apeou do cavalo e deu alguns passos em sua direção, fitando o rifle com ansiedade. — Não vai usar esta arma contra mim de verdade, vai, Em? — falou, com um sorriso. Por um instante, Emily pensou que fosse desmaiar. Sentiu a garganta seca e o coração cm disparada, como se fosse ter um ataque. Todo o corpo tremia e esqueceu-se completamente do rifle, ainda mirando mais ou menos em direção ao peito dele. —. Kevin! — sussurrou, invadida por um súbita e delirante onda de esperança e alegria. Pigarreou e tentou falar, conseguindo, afinal, balbuciar: — O que... o que está fazendo aqui? Como chegou aqui?
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Kevin se aproximou devagar e, quando chegou perto o bastante, tomou-lhe o rifle das mãos, largando-o ao chão cuidadosamente. Soltou a respiração, num suspiro de alívio. — Como me encontrou? Laura lhe contou? Deve ter contado, porque ela e Jackson eram os únicos que sabiam que eu estava aqui! Ele assentiu com a cabeça, ainda sem dizer nada. Olhou para ela, do mais alto fio de cabelo até os pés descalços, como se estivesse memorizando cada detalhe, e Emily se lembrou de que ainda não penteara o cabelo, nem vestira o jeans. Ainda usava o abrigo de dormir, sem nada por baixo. De repente, sentiu-se vulnerável e um pouco tímida. Bem, ele a vira daquele jeito muitas vezes antes, pensou, erguendo o nariz em desafio e encarando-o, tentando não sorrir. Deus, Kevin parecia bem, mesmo com a barba por fazer e as marcas na pele que sugeriam que não tirara a roupa para dormir na noite anterior. Um arranhão profundo numa face, os olhos, injetados; rugas em torno dos olhos que não existiam antes, mas também uma expressão de absoluta determinação. —Encontrei um território para você trabalhar como guia, Emily — declarou, num só fôlego. — No Caribe É semelhante a esta região, selvagem e virgem. Sei que vai gostar. Cinco mil acres, muitos animais e peixes, algumas cabanas, vários lagos. O atual arrendatário está velho demais. Tem uma boa clientela e vai passá-la a você. Aos poucos, Emily acordou e entendeu o que ele dizia. Era incrivelmente simples. Fora uma idiota de não adivinhar de cara. Ele se sentia culpado. A consciência o incomodava, e queria acalmá-la. Precisava do perdão dela. Era disso que se tratava. Isso era tudo. Emily, tome este outro território, e assim eu fico em paz com a minha consciência. Por um instante, achou que não ia suportar tanta decepção. Ainda bem que ele lhe tomara o rifle, porque naquele momento teria mesmo sido capaz de atirar nele. — Você... seu filho da mãe! Seu... — Não suportava mais olhar para ele. Não queria ficar perto. Começou a correr pela campina em direção ao lago, ignorando a relva seca e pontiaguda que cutucava seus pés descalços. Não ia chorar não ia. Correu mais rápido, engolindo os soluços que a sufocavam. — Emily! Em! Que diabos...? Escutou-o gritar, e sabia que vinha atrás dela. Correu ainda mais rápido, odiando-o. Kevin agarrou-a antes que chegasse ao lago, e Emily lutou como uma gata selvagem, usando contra ele toda a sua considerável força e o poder da raiva contida, chutando, socando e tentando dar-lhe uma joelhada. Kevin ofegava quando, enfim, conseguiu dominá-la, montando em cima dela, segurando-lhe o corpo com as coxas e as pernas, e os pulsos com as mãos. Emily soluçava abertamente agora, em grandes arquejos que faziam seu peito doer, e fechou os olhos para não ter de ver o rosto de Kevin enquanto se remexia e contorcia embaixo dele.
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— Solte-me! — Emily, que diabo está acontecendo com você? — gritou-lhe, respirando pesado. — Andei milhares de quilômetros para vê-la e você age desta maneira! Santo Deus, Emily, sei que a minha companhia a prejudicou. Sei que foi imperdoável da minha parte mentir a você dá forma como menti, mas, pelo amor de Deus, mulher, estou louco de amor por você. Não consegue ver isso? Kevin estava realmente furioso. Sacudia os pulsos de Emily e beirava. Sua voz ecoava nas montanhas mais próximas. Apesar disso, Emily não sabia se ouvira bem. Fazia tanto barulho, gritando daquele jeito, e o peso a esmagava. Parou de lutar e chorar a fim de escutar, mas manteve os olhos fechados. Daquele modo, podia concentrar-se melhor no que ele dizia. — Passei todo o maldito verão voando pela Colúmbia Britânica, atravessando pântanos e sendo comido vivo pelos mosquitos e pernilongos, procurando um lugar, algum lugar que pudesse comprar ou arrendar para você. Um lugar que pudesse aprender a amar do jeito que ama este vale. Não foi fácil pode acreditar. Até fui perseguido por um puma, certa vez. Mas acabei encontrando o lugar, e agora que venho lhe contar, você fica danada comigo! Respirou fundo e soltou o ar devagar. Continuou, em tom violento e decidido. — Olhe, não me importo se levar o inverno todo e morrermos de fome, vou segurá-la aqui até que concorde em se casar comigo, mulher. Eu... eu vou amarrá-la se for preciso, está me ouvindo? — Parecia esgotado. Foi a primeira vez que ela o viu perder totalmente o controle. Emily estava até gostando. Kevin era sempre tão reservado, a maior parte do tempo. A não ser quando faziam amor, é claro. — Vocês, malditas Parker, deixam os homens loucos! São umas teimosas. Que diabo têm contra o casamento, afinal? Emily abriu os olhos e fitou o seu cabelo despenteado, a cabeça emoldurada pelo céu azul. Os olhos escuros tinham um brilho -feroz e fulminante sob o cenho franzido. — Está me tirando do sério, Emily, sabe disso? Não ia deixá-la escapar, mas passou a segurá-la com mais suavidade, embora a voz continuasse agitada e furiosa. — Vou ter de viajar bastante por causa do meu trabalho, mas não importa onde eu moro. Diabos, existem máquinas de fax, telefones e computadores. Se odeia tanto assim o Caribe, encontraremos outro lugar de que goste. Tenho de supervisionar as construções aqui no vale do Elk, então acho que ainda temos bastante tempo. A raiva desapareceu dê sua voz. — Ou isso tudo é porque você não me ama, Em? A expressão revelava o quanto havia nele de vulnerável. Soltou abruptamente as mãos de Emily e apoiou-se no chão, ao lado dela, como se esperasse um golpe.
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— Não seja ridículo — gritou Emily, tentando sentar e olhar para ele enquanto arrumava o cabelo. — E claro que te amo, seu idiota. Mas quando falou do Caribe, achei que estava tentando me comprar. Por que não disse logo que me amava? Além do mais. tenho de ficar aqui, preciso ver Alex crescer. E um dos outros chefes de grupos de excursão, Martin Fowler, me ofereceu emprego como guia no próximo outono. Acho que vou aceitar, o salário é bom. Não posso deixar este vale, Kevin. Devia saber disso. Eu... Kevin tapou-lhe a boca com a mão, interrompendo a torrente de palavras. — Mas, afinal, quer ou não se casar comigo? berrou, e o eco foi mais forte desta vez, como se viesse de todos os lados: casar comigo... casar comigo... Ela o deixou esperando até o último momento. Kevin parecia haver esquecido que ainda lhe tapava a boca com a mão, mas isso não importava. O sinal que significava "sim" era muito simples: um punho dobrado movendo-se vigorosamente para Cima e para baixo. Usou ambas as mãos para expressar seu entusiasmo. Levou um minuto para Kevin entender que podia beijar Emily enquanto ela respondia.
BOBBY HUTCHINSON cresceu no vale do Elk, uma região de beleza estonteante, localizada na Província da Colúmbia Britânica, Canadá. Embora suas matérias favoritas no colégio fossem inglês e redação, hesitava em assumir o sonho de tornar-se escritora. Este sonho, entretanto, veio a realizar-se em 1984, com a publicação de seu primeiro livro. Depois deste primeiro grande sucesso, vários outros se seguiram. Em visita ao antigo lar, no último verão, a talentosa autora decidiu que o vale do Elk era o cenário perfeito para um romance: Hot Developments. Divirtam-se!
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