José Pessoa - Missionário por vocação

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José foi primeiro para a escola da WEC, na Inglaterra, mas depois viajou rumo à Suécia, onde, na companhia do missionário Bäckström, fez diversas viagens e começou a entender, mais claramente, que o caminho certo para ele seria o de missionário.

José Pessoa Tage Stählberg

Vai perguntar às gerações passadas e reflecte no ensino dos seus antepassados. Nós só nascemos ontem e nada sabemos ainda; a nossa vida é uma pequena sombra na terra. Mas eles hão-de instruir-te e ensinar-te as verdades tiradas da sua experiência.

Missionário por vocação

Job 8:8-10

Uma fé que não se torna cultura é uma fé não plenamente acolhida, nem inteiramente pensada, nem fielmente vivida. João Paulo II

O homem bom deixa boas recordações. Provérbios 10:7-aa


José Pessoa – Missionário por vocação José Manuel Martins Direitos Reservados © Letras d’Ouro, editores, 2015 Editores Letras d’Ouro, editores Revisão José Manuel Martins Direcção de Arte e Design Pedro Martins Fotografia da Capa Samuel R. Pinheiro (arquivo pessoal) Impressão e Acabamento www.artipol.net

1ª Edição, Dezembro de 2015 ISBN 978­989­8215­55­0 Depósito Legal 401265/15 Letras d’Ouro, editores Sede Rua Quinta da Flamância, n.º 3, 3º Dt.º Casal do Marco 2840­030 Paio Pires, Portugal Tlm 914 847 055 Email livros@letrasdouro.com Web www.letrasdouro.com FB Facebook.com/letrasdouro Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução por quaisquer meios, salvo em breves citações, com a indicação da fonte.


José Pessoa Missionário por vocação José Manuel Martins 1ª Edição Dezembro de 2015



PREFÁCIO

Foi-me solicitado que escrevesse algumas palavras sobre JOSÉ PESSOA, Missionário por vocação, um belo trabalho elaborado pelo autor, Dr. José Manuel Martins, que já nos deu outros de grande interesse para uma futura História do Protestantismo em Portugal. O que direi deste seu novo trabalho não será muito — direi mais sobre os meus encontros e desencontros com o irmão José Pessoa, cujo ministério missionário (e também pastoral) é o respectivo tema central. Entre nós, em Portugal, era assim tratado e conhecido — o irmão José Pessoa — ao contrário de outros servos de Deus, seus contemporâneos e obreiros de referências, que eram tratados por tio Tage, tio Fredo, tio Hipólito, por exemplo. Sobre a figura e obra do missionário José Pessoa o leitor tem imensa informação no trabalho acima referido, o qual está bem documentado; poderá dizer-se que se trata de um importante contributo para uma futura biobibliografia do filho de José Maria d’Oliveira Pessoa. Com base na leitura da obra, cujo original me foi facultado ainda em rascunho, e do que corresponde ao meu conhecimento pessoal, deixo aqui uma breve síntese dos relacionamentos e envolvimentos de José da Cunha Oliveira Pessoa, no decorrer de sua vida, não só como Missionário, mas em outras valências do seu múnus espiritual, que os leitores melhor aprofundarão com grande proveito.

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José Pessoa nasceu na freguesia Socorro, em Lisboa, no ano de 1927, vindo a falecer na cidade de Coimbra, em 1992. Fez os seus estudos na cidade em que nasceu e onde trabalhou, algum tempo, numa função secular. Em 1945, escutou a mensagem de Evangelho, acreditou e aceitou Jesus Cristo como salvador pessoal, na Amadora; no ano seguinte, foi batizado nas águas, durante o ministério do missionário Dr. Colin Bowker, e baptizado no Espírito Santo, mais tarde. Durante anos, deu a sua colaboração nas igrejas protestantes da linha do Oeste e também na Grande Lisboa. Serviu a Pátria como militar num quartel em Tavira, tendo alcançado o posto de furriel. Terminado o serviço militar, sentiu desejo de estudar teologia e foi para a Escola Bíblica da Cruzada de Evangelização Mundial, na Escócia, mais precisamente em Glasgow, entre 1950-1951. No fim de sua formação teológica, e estando já a trabalhar como missionário na Guiné, contraiu casamento com a missionária Marie Bakken, em 1953, do qual nasceram dois rapazes, o Samuel e o David. José Pessoa foi missionário, juntamente com a sua esposa, na Guiné, durante cinco anos. Regressando à Metrópole, exerceram o seu múnus espiritual na Beira Baixa, depois em Coimbra, em Cascais e na Grande Lisboa, onde levou a efeito algumas reformas. O nome de José Pessoa ficou associado a diversas obras — a saber, no universo da literatura, na beneficência e muito especialmente como intérprete nos grandes serviços de Evangelização. Num registo mais pessoal, e no que toca aos nossos encontros e desencontros, ocorrem-me algumas situações e vivências que quero partilhar com os leitores de JOSÉ PESSOA, Missionário por vocação. O pai na fé de José Pessoa, o Dr. Colin M. Bowker — que foi quem o levou a Jesus Cristo, e o batizou — depois de esperar em Lisboa, durante muitos anos, por um visto de residência para Moçambique, sem o conseguir, implantou, entre 1939 e 1954, várias Igrejas


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Protestantes nos arredores de Lisboa e na Linha do Oeste, como Amadora, Buraca, Carenque, Malveira, Mafra… No ano de 1955, foi para Covilhã, onde trabalhou de 1955 a 1959, abrindo muitos trabalhos, nomeadamente na Covilhã, Fundão, Guarda, Medelim, Cebolais e outros mais. Foi nesse contexto, Beira Baixa, que, nos fins de 1959, ocorreu o nosso primeiro encontro. A família Bowker deixou Portugal, indo para África, e quem assumiu a liderança na Província foi a família Pessoa. Eu fui para a Covilhã, em Abril de 1959, a convite do Dr. Bowker, e a família Pessoa chegou depois, decorridos poucos meses. Recordo que foi durante o tempo do ministério do Missionário José Pessoa que as muitas viagens, que antes se faziam de bicicleta, motorizada e mota, passaram a ser feitas de automóvel! Ele fez muitas démarches para esse fim. Eram milhares de quilómetros que se faziam na região, para atender às necessidades do trabalho, e o Inverno, na Beira Baixa, era coisa dura! Foi uma bênção, para os obreiros e para a obra de Deus em geral, a aquisição dos automóveis. Ser protestante nos anos cinquenta, em Portugal, especialmente na Província, não era nada fácil. As lutas e perseguições sucediam-se, já no tempo dos Bowkers, como depois na liderança de Pessoa. O missionário José Pessoa, que acompanhei, foi falar com o Governador Civil de Castelo Branco sobre a perseguição levada a cabo em Quintãs, concelho do Fundão. Depois disso, as perseguições cessaram. O Jornal do Fundão criticou o que se passou em Quintãs. A este jornal e ao seu Director, o nosso amigo Paulo Louro, os Protestantes muito devem a sua liberdade religiosa e cívica na Beira Baixa. O missionário José Pessoa não era só colega, mas amigo de quem com ele trabalhava. As Comunidades eram pequenas e não tinham muitos recursos para sustentar os Ministros. Deus, na nossa linguagem, ainda utiliza corvos, isto é, os cristãos que a nível pessoal ajudam os servos de Deus no serviço dos seus próximos. Pelo Natal e pela Pascoa, a família Pessoa não se esquecia dos que com eles trabalhavam. E nós trabalhámos juntos de 1959 a 1963, na Beira Baixa.

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Entre 1962 e 1963, em Coimbra e arredores, houve um despertamento religioso entre os Protestantes, o que não foi nada fácil, na altura. Foi então que se deu o nosso primeiro desencontro. A família Pessoa foi para Coimbra e eu e minha família fomos substituí-los na cidade de Castelo Branco. Mas o desencontro foi só geográfico. O missionário José Pessoa não nos deixou de todo. Em fins de 1964, fomos convidados para assumir o trabalho no Alto Alentejo, fixando residência em Portalegre. Nós íamos a Coimbra e Coimbra vinha até nós. As missões pequenas convidavam os colegas e missionários, (quem convida, deve pagar), mas no que toca aos convites que fiz ao irmão José Pessoa ele nunca quis receber nada. O nosso segundo encontro ocorreu já em meados da década de 70 do século passado. Foi precisamente em 1976, ano em que fui convidado, por alguns irmãos da Cova da Piedade, para ser o pastor da Comunidade nessa área. Por minha sugestão, os irmãos da Cova da Piedade informaram o Ministério de Lisboa, que confirmou o convite. Eram responsáveis da Assembleia de Deus de Lisboa, na altura, os pastores João Sequeira Hipólito e José da Cunha Oliveira Pessoa. Ainda antes de 1974, iniciou-se o processo das Autonomias das Igrejas Locais, o qual foi acelerado em 1978. Apesar de não existir um Ministério em Cova da Piedade, existia um Ancião que, por razões da sua vida privada, estava ausente; porém, existia uma equipa local e suficiência financeira para fazer uma Junta Administrativa e criar Estatutos, o que aconteceu em 1983. O pastor José da Cunha Oliveira Pessoa, juntamente com o ancião Paulino Verdilheiro, oficializaram a autonomia. Quem elaborou os Estatutos da novel igreja Assembleia de Deus pentecostal de Almada, com sede na Cova da Piedade, generosamente, foi o autor da obra que agora prefaciamos. Esta igreja irmã quis ficar a colaborar com a de Lisboa, mas isso não foi aceite. Deu-se assim lugar ao segundo desencontro — agora geográfico, mas também de visão estratégica — da minha pessoa com o colega José Pessoa. O resto, a história o contará.


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O Instituto Bíblico de Portugal convidou-me para lecionar História da Igreja, sendo eu o único pastor em Almada, e fi-lo, uma vez ou outra, de 1977 a 1982, depois de 1983 a 1991 a tempo inteiro, e ali leccionei uma dezena de disciplinas, entre 1983-1991. Neste período, José Pessoa era professor no Instituto, em Fanhões, mas depois fixou-se de novo em Coimbra. Novo desencontro geográfico, apenas. A amizade com o colega José Pessoa continuou, mas igualmente com o colega José Neves, responsáveis pela Assembleia de Deus de Coimbra. Neste período, os últimos dias de vida terrena do Missionário por vocação deu-se um novo desencontro, provisório, é certo, entre nós, em virtude de o Senhor o ter chamado para junto de si e dos remidos na Glória! Em Dezembro de 1992. Se a Graça divina e a Fé continuarem na minha vida, tenho a esperança de um terceiro encontro ou reencontro com José Pessoa e com os remidos por Jesus Cristo, mas na Glória, isso na altura em que Deus me chamar a mim, individualmente, ou quando Jesus vier buscar a sua Igreja. O amigo leitor poderá conhecer bem melhor José da Cunha Oliveira Pessoa lendo esta obra desde as Notas Breves de Justificação, à Introdução, passando pelos seus sete capítulos até ao apêndice sobre os pilares da salvação, sempre com grande interesse para quem deseja aprofundar as condições sócio-religiosas em que esse valoroso ministro do Evangelho exerceu o seu ministério e como ocorreu a implantação e alargamento da obra de Deus em Portugal. Por mim, e para concluir este breve prefácio da obra JOSÉ PESSOA, Missionário por vocação, quero apenas deixar uma nota final de carácter mais pessoal sobre o Ministro Evangélico que a Convenção Nacional das Assembleias de Deus em Portugal postumamente homenageou. Existe uma grande diferença entre um missionário, como o foi José Pessoa, e um pastor como eu próprio fui e sou com a função de cuidar de diversas e pequenas comunidades, que dependem de um fundo de missão geral e da contribuição local. José Pessoa, e todos os que foram missionários como ele, teve a missão de implantar novas

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igrejas, auxiliar os novos obreiros, contando com a ajuda de outras igrejas para o financiamento das actividades de implantação e propagação das mesmas. Tenho conhecimento que o missionário José Pessoa, em certas alturas, teve que pedir um ou outro empréstimo para cumprir os deveres assumidos por si. Também sei que não fugia daquele obreiro que lhe solicitasse um empréstimo (quando o meu filho mais velho estava a construir a sua casa, como eu não tinha de meu nada para o ajudar, pedi-lhe um empréstimo, que, segundo o combinado, devolvi, sem nada pagar a título de juros). Como é natural, os líderes não escapam a invejas e más vontades. José Pessoa não foi um líder perfeito, nem os que o criticaram o foram. Lembro-me, por exemplo, dos que desdenharam do apoio que ele deu aos filhos… mais tarde, esses fizeram precisamente o mesmo. Finalmente, respigo de parte da correspondência que trocámos alguns extractos que revelam o trato especial, a forma como se levava a efeito o trabalho evangelístico e os parcos recursos disponíveis para servir a Causa do Mestre em Portugal. Também a História apurará como foi difícil chegar aonde se chegou com o Evangelho do Senhor Jesus Cristo sob a dinâmica pentecostal de que José Pessoa foi um obreiro exemplar: 24.11.1960, Castelo Branco. «Caro irmão Barata, a Paz do Senhor… é favor de avisar bem os irmãos… também é favor dizer no Fundão… é favor tomar o culto em Medelim no Sábado…» Porto, 17.2.1961. «Escrevo para lhe pedir para ir à Lardosa… um abraço do seu irmão em Cristo.» Águeda, 19 de Junho de 1961. «Escrevi ao irmão Marmelo (de Unhais) dizendo que o irmão estará lá no dia 23, pelas 16 h da tarde… eu tratarei de Quintãs, no sábado…» Castelo Branco, 13 de Julho de 1961. «Caro irmão Barata, Shalom! Agradeço a sua carta e fiquei alegre com as suas notícias dos últimos cultos e de sua viagem e estadia em Camba… Cremos para que Deus


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faça grandes coisas por toda esta Beira Baixa… No domingo tivemos um belo culto em Oleiros…» Lagos, 11.8.1961. «Iniciámos as nossas férias oficiais… Agradecemos as vossas orações para que Deus nos dê graça para evangelizar um casal que está aqui e é de Castelo Branco… já fizemos o primeiro contacto.» Castelo Branco, 23.9.61. «Escrevi ontem ao irmão Penaforte a felicitá-lo pela sua decisão e a animá-lo pela fé (pois a sós tenho estado a pensar o que fazer com a família Penaforte…) visto que até hoje nada temos recebido daquela promessa dos 25 dólares… ontem fui ao Souto da Casa, onde tivemos um belo culto, e esta noite e tarde, em Cebolais e Quintãs, querendo Deus, e amanhã para Unhais e Covilhã… Se o irmão tiver necessidade de dinheiro para as viagens diga algo e enviar-lhe-ei um vale de correio…» (Nota: Mais do que uma vez só tinha dinheiro para ir; para voltar… era por fé… A liderança em Lisboa sempre dizia o que José Pessoa disse e nunca deixamos de voltar ao campo. Eu estava na Escola Bíblica em Lisboa.) Castelo Branco, 27.9.1961. «… o culto no domingo à tarde em Unhais foi muito abençoado e 4 almas se entregaram a Jesus — Aleluia! P.S. Já enviei um vale de 500$00, conforme o seu pedido. (Nota: Eu tinha-lhe pedido 1.000$00 e ele deu-me 500$00…) Lisboa, 13 de Outubro de 1961. «O caro irmão poderia ir a Castelo Branco, no domingo? Em breve, teremos reforços para um melhor combate… Saudações a sua esposa, beijos ao João Paulo… Saudações aos amados irmãos.» (Nota: José Pessoa estava em Lisboa, na Escola Bíblica.) Castelo Branco, 31 de Janeiro de 1962. «Se assim sentir, pode fechar o negócio com o instrutor para obtenção da carta de condução… recebi hoje um cheque do irmão Martins de Oakland, que nos vem tirar de apuros… No sábado, passaremos por aí, antes do culto de vigília, assim sendo podem ir connosco.» Natal de 1962, o campo sob a liderança de José Pessoa, António Barata e Joaquim Penaforte, Castelo Branco, Cebolais, Medelim,

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Oleiros, Souto da Casa, Fundão, Unhais da Serra, Quintãs, Covilhã, Aldeia de Carvalho, Dreia e Camba… «do irmão Bowker, 100$00, do irmão Johnson, 40$00 e dos nossos amigos americanos 500$00… Feliz Natal, Daniel 12,3, José Pessoa, Marie, Samuel e David.» (Nota: Sem segurança social, sem subsídios para os filhos, etc… o nosso sustento dependia destas doações particulares). Tulsa, 21 de Novembro de 1963. «Estou ocupado de dia até às 22 ou 23 horas… estudos intensos… porém o Senhor pôs no meu desejo aproveitar o máximo e voltar a Portugal mais cheio do Espírito Santo e mais abrasado com o seu fogo divino, para fazer a obra do Senhor… Espero que possa passar connosco em Valongo o dia 5 de Dezembro… Mais de 200 pastores de 56 Nações e 100 pastores Americanos de muitas denominações diferentes…» Pinhal Conde da Cunha, 2015. António Costa Barata


BREVES NOTAS DE JUSTIFICAÇÃO

No futuro, dirá a história, se não nos tivermos enganado, que José da Cunha de Oliveira Pessoa terá sido o primeiro missionário português a merecer da liderança sueca do Movimento Pentecostal em Portugal entusiásticos aplausos e justo reconhecimento.1 Terão sido múltiplas as razões que justificaram o acolhimento especial que os suecos lhe deram para se dedicar inteiramente à preparação para ser missionário em África. Estará, entre elas, o plano traçado, prévia e devidamente conversado, entre amigos com origens em Escolas Missionárias bem distintas, comprometidos com a evangelização de Portugal. Referimo-nos aos missionários Tage Stählberg, sueco, e Colin Bowker, inglês, que serão sempre referências para José Pessoa, e que estavam por dentro da decisão que já tomara de se dedicar ao trabalho missionário na medida em que ele correspondia também à opção de vida da mulher de quem se enamorara e com quem pretendia casar.

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Usamos a expressão no sentido amplo de «movimento espiritual sem estruturas organizativas ou burocráticas» que não se confunde com «uma denominação ou igreja evangélica com determinadas características doutrinarias» uma vez que «o movimento pentecostal é interdenominacional e pertence à Assembleia universal de Jesus Cristo» (citando Hipólito, João Sequeira, Apontamento do Director, NA, Ano XXXIV, nº 406, Novembro de 1976, pág. 3), sem prejuízo dela poder, também, no contexto da obra, estar associada à orientação doutrinária, estratégia e acção das Assembleias de Deus em Portugal.

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A África Portuguesa há muito reclamava uma atenção particular por parte da liderança sueca, mas os recursos eram escassos. Do lado do seu amigo Colin Bowker, a missão na África Portuguesa era o propósito antigo, dele e da Missão inglesa que o apoiava, que o regime político salazarista não lhe permitia concretizar. Depois da II Guerra Mundial, as condições de mobilidade das pessoas foram-se, aos poucos, restabelecendo, parecendo oportuno ir mais além do arquipélago dos Açores e avançar para outros territórios sob bandeira nacional. Mas esse avanço para África exigia um vínculo de confiança entre quem estivesse pronto a dedicar-se à Missão, mas também integrado no plano que concitasse apoios financeiros do estrangeiro, isto é, da Suécia. E dizemos isto sem qualquer outro intuito que não seja o de anotar com nitidez que também na expansão missionária quem apoiava queria ter sob controlo os programas, as pessoas e os meios para constarem dos memorandos que se disponibilizavam nas sedes das Agências Missionárias e suportavam o convite feito aos membros das igrejas para contribuírem. Não faltaram oportunidades para investir no trabalho missionário pioneiro em Angola e Moçambique, por exemplo, antes de José Pessoa se ter ido preparar para missionar na Guiné. Mas a liderança sueca não «estava preparada» para apoiar iniciativas que lhe pudessem fugir do controlo. Um exemplo disso é «clássico»: a Angola o pentecostalismo chegou antes daquela guerra se iniciar, através de um casal de missionários americanos com o apoio da Igreja de Deus, nos Estados Unidos da América. Dramaticamente, o missionário, decorrido um ano, morreu de paludismo e a missionária recolheu-se às origens enquanto duraram as hostilidades no mundo. No tempo propício, e uma vez que em matéria de política ultramarina o regime saiu «reforçado» do período bélico, a missionária quis regressar, mas o reinício do trabalho missionário só se tornaria viável — face às orientações do regime que entretanto celebrara a Concordata com a Igreja de Roma e publicara o diploma que regulava a actividades religiosas nas Colónias — com o apoio dos pentecostais portugueses. Aos apelos dela respondeu, a título


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individual, sem consultar a liderança sueca, para tomar a decisão, Joaquim Cartaxo Martins, que não fora à escola missionária, para se formar, mediante um plano que concitasse os necessários apoios depois da verificação que a «chamada era de Deus». Só mais tarde — já a «operação Guiné» estava em curso — o seu labor missionário foi mais noticiado e, conforme os resultados se iam tornando visíveis, se tomaram medidas de apoio e reconhecimento explícito. Mas ainda antes dessa iniciativa individual, uma outra nos serve de suporte à tese de que a Missão em África ainda «não estava madura» nos planos da liderança sueca e, por isso, quaisquer iniciativas particulares nesse sentido não eram apreciadas. É o caso de Joaquim do Cerro Guerreiro que comunicou ao missionário Tage que tinha decidido ir para África; ele não gostou nada da ideia e, olhando para ele, disse: «Se vocês portugueses não querem ficar aqui para evangelizar Portugal, então eu também vou embora para a Suécia.» No caso de José Pessoa tudo foi traçado, metodicamente, desde que decidiu que seria missionário na Guiné. Era a oportunidade da liderança sueca em Portugal mostrar trabalho também em África às claras e com o apoio das igrejas que a suportavam. Havia, porém, uns quantos pormenores que importava acautelar de modo que não se suscitassem dúvidas acerca da natureza pentecostal da Missão a desenvolver no território, onde já trabalhava Mari Bakken, com apoio da World-Wide Evangelization Crusade, em colaboração da congénere inglesa. É verdade que a missionária se submeteu ao baptismo por imersão (ela era luterana, na origem) e recebeu o baptismo no Espírito Santo, com expressão glossolálica, o que a colocava numa posição nova em relação àquela que tinha no momento da partida para o campo missionário quanto ao apoio da organização que a enviara. Mas para ela e para a WEC isso não constituiu problema. Constituía para a liderança sueca, que queria a Missão portuguesa em África «verdadeiramente pentecostal». José Pessoa fora estudar para uma escola de matriz doutrinária semelhante à de Colin Bowker e de Mari Bakken. Era mister que ele, quando começou a entender,

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mais claramente, que o caminho dele seria o de missionário, fosse à Suécia ao «encontro de visibilidade e reconhecimento». Isso garantiria, no futuro, que a Missão sueca pudesse incluir nos anais que também apoiava, por intermédio da Assembleia de Deus de Lisboa, a evangelização pentecostal na África Portuguesa. Daí a «tutoria» do missionário Bäckström em complemento da formação do novo missionário, apresentando-o aos irmãos suecos nas várias viagens que com ele realizou. Mas ainda assim era necessário esclarecer muito bem os apoiantes da Missão em Portugal que José Pessoa não abdicaria de imprimir à sua vocação missionária a orientação pentecostal, custasse o que custasse e fosse qual fosse a atitude de Mari Bakken e dos irmãos que a apoiavam nos EUA. Foi ela quem felizmente cedeu e, depois de casar, só estiveram mais uns meses sob a orientação da WEC, decidindo avançar para um campo novo na Província da Guiné para, sem quebrar laços de colaboração, concretizar a sua própria vocação. Parece que a questão da identidade da missão levada a cabo por José Pessoa e Mari Bakken ficou clara, em particular depois do artigo publicado no Evangelii Härold,2 (Mensageiro do Evangelho) no final de Abril de 1953, em que estes pormenores foram dados a conhecer aos leitores para dedicaram tempo a orar por aqueles missionários pentecostais. Não temos nenhuma dúvida que José Pessoa, embora não fosse membro da Assembleia de Deus Pentecostal, quando recebeu a sua vocação missionária, nem o tendo sido até perto do final do período em que serviu na Guiné Portuguesa, se reconheceu na orientação da missão sueca em Portugal, mas não descurou, antes o captou e incentivou, o apoio das igrejas americanas, que seriam o suporte financeiro futuro do seu ministério missionário em Portugal e no mundo, sem prejuízo da relação próxima que cultivou com a liderança sueca. Nessa 2

Jornal semanário, propriedade das Assembleias de Deus suecas, com 16 a 24 páginas e tiragem de 50.000 exemplares, em 1942. (NA, nº 2, Fevereiro de 1943, pág. 8, Do Vigilante Fiel)


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ambivalência se foram delapidando as condições de perpetuar, para além da vida de Tage Stählberg, uma liderança pentecostal nacional, com estreito relacionamento às raízes suecas e capaz de resistir aos ímpetos concorrentes das igrejas americanas — e, mais tarde, também brasileiras — com os resultados que se conhecem, por exemplo, na «menorização» da Missão portuguesa nos países que correspondem aos antigos territórios ultramarinos, mas também na capacidade de reunir forças para chegar com a mensagem pentecostal, melhor e mais rapidamente, a toda as cidades, vilas e aldeias, plano que integrou e perspectivava a visão missionária dos pioneiros e missionários suecos. Cem anos de história (ou apenas noventa, dependendo onde cada um coloca o ponto de partida…) podem significar muito, pouco ou quase nada para as gerações que hoje se identificam, nominalmente ou não, com o Movimento Pentecostal em Portugal. Muitos evangélicos, na sua prática litúrgica, quase conseguem transformá-lo num epifenómeno. A nosso ver, por défice de afeição à memória dos que lutaram pelo direito à existência do Movimento do Espírito, que já grassava no seio de comunidades cristãs, em vários países do mundo, e singular desconhecimento dos seus perfis pessoais e ministeriais, nomeadamente quanto ao exemplo de vida consagrada e à substância do ensino ministrado. Não basta citar um ou outro nome da lista aberta, não exaustiva, dos heróis da fé, que registou o escritor da Carta aos Hebreus, para tirar imediato benefício do que cada um significa para viver vidas de fé e de entrega à Causa de Deus. É precisa ir mais fundo e conhecer as respectivas histórias de vida. Só assim cada um desses nomes é inspirador. Do mesmo modo, julgamos nós, a afeição pelos que nos precederam, a inspiração que nos pode trazer o percurso de vida que tiveram e a luz que vem do ensino que ministraram só são possíveis se soubermos em que contexto decidiram largar os seus projectos de vida para se entregar à causa maior de servir os portugueses, evangelizando o país, levando adiante o nome do Senhor Jesus Cristo na força do Espírito Santo, abalando

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os fundamentos da religião tradicional instalada e interpelando o protestantismo à conjugação de esforços na acção evangelizadora que a renovação espiritual de que eram agentes implicava. Evidentemente que a afeição por esses heróis da fé só é tangível quando se abandona o estado de ignorância em relação a quem foram e ao que fizerem. Não é suficiente aproveitar o bom nome que tiveram, às vezes com despudorado interesse pessoal ou de grupo restrito. A relação com o passado exige um compromisso de preservação do que ele representou, não em recordações de meras datas ou eventos, mas de feitos que consubstanciem a acção de homens e mulheres, comprometidos com a Verdade e movidos pelo Espírito de Deus, na conversão e genuína transformação de milhares de compatriotas que formaram novas comunidades cristãs, que preservam, sem descaracterização, o ensino recebido. A invocação do testemunho dos que já descansam no Senhor é ilegítima se não for associada aos exemplos concretos de fé, convicção e acção que os caracterizou; tal invocação tem de pressupor que o seu testemunho não é indiferente às novas gerações, antes as inspira para prosseguir no caminho encetado, se possível de modo ainda mais excelente. Invocando-se esse testemunho, a legitimidade para fazer dele o que bem se entende inexiste! Não se pode, a um tempo, dizer que o legado é bom, pois recorda tempos de prosperidade, e a outro tempo dizer que já não serve para nada (ou serve para muito pouco) porque as necessidades actuais são outras… Só que, a nosso ver, aceitar o testemunho implica agir de acordo com ele, não desdizê-lo ou ignorá-lo… O que temos visto aponta mais no sentido de «desfazer» o passado na medida em que é invocado como mera lembrança que já não tem potencialidades para responder às necessidades ou exigências actuais. Ou seja, o contentamento com o passado é apenas para dizer que existe… passado! Não vá alguém dizer que «descobrimos a pólvora» quando apregoamos que queremos viver o pentecostalismo hoje... Não, já os nossos pioneiros viveram, temos história, não é doutrina da moda… Só que isso na boca de quem não sabe nada do


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testemunho dos predecessores não passa dum mero apoio securitário do que ensinam de modo a fazê-lo coincidir, na aparência, com o que foi ensinado e praticado e teve sucesso! É também uma forma de enjeitar as doutrinas, experiências, métodos de trabalho e meios utilizados por antiquados, inadequados, quiçá errados, mas manter o vínculo ao sucesso que nele reconhecem e, como bandeira, apropriar-se dele. Se é apoio securitário para tornar credível a distinção entre os que chegaram agora, os neopentecostais, e os que são centenários, os pioneiros do pentecostalismo, parece-nos estultícia porque é pelos frutos que os conhecereis…. Não interessa o testemunho histórico que se invoca, interessa o que se é! Não é honesto, intelectualmente, invocar o testemunho dos pioneiros, mas aceitá-lo apenas em parte. Parece-nos pura estultícia invocar o testemunho dalguém quando só queremos aproveitar o que «é de boa fama» ou interessa à nossa promoção pessoal ou do grupo em que militamos ou cuja orientação perfilhamos. O que queremos dizer é que não é razoável invocar o testemunho dum homem, dum grupo, duma comunidade, se não for para fazer melhor ou, pelo menos, igual. Melhor no sentido de o tornar mais abrangente, mais inclusivo, mais factor de unidade, de universalidade, de bem-estar moral, espiritual e social, mais igreja para todos… Para retalhá-lo, adaptá-lo a múltiplos interesses de células ou organizações é melhor deixá-lo intacto no silêncio da história ou, melhor ainda, no coração daqueles que se inspiraram nele para estabelecer os seus padrões de vida e prosseguir ideais compatíveis… É pena que o conhecimento e a cosmovisão dos que são tidos por pioneiros ou referências do Movimento Pentecostal em Portugal não motivem os que ainda «têm vida pequena» — no sentido de que ainda não têm história — a interpelá-los para instruir-se e aprender acerca das verdades que eles tiraram da sua experiência. Não ouvimos, ou não ouvimos com frequência, perguntar «ao passado» tudo quanto foi significante para a obra realizada e reflectir nisso. Preferimos andar por caminhos que eles consideraram espúrios, no seu

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zelo pela preservação dos limites que foram sendo estabelecidos, não porque tenhamos a certeza de que seja por eles que se alcançam idênticos resultados, mas para afirmar a desconformidade própria duma geração de ruptura que não fecha as portas ao passado por ele ainda ser o chapéu protector do menor denominador comum que mantém a aparência de continuidade…

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O que vemos na prática pessoal de muitos ministros do Movimento Pentecostal em Portugal, em cujo rol está à cabeça José da Cunha de Oliveira Pessoa, se quiserem, na essência do «legado» que deixaram, é uma enorme largueza de vistas, os olhos postos num horizonte cada vez mais «empurrado para diante» consoante as conquistas se confirmavam! Era dele e de todos os demais essa visão de fazer com o pouco disponível o bem de todos, isto é, pregar a mais pessoas e trazê-las à comunhão dos santos para cada uma dela, como célula, se reproduzir dentro do corpo, alargando-o, ampliando-o, tornando-o mais visível e influente na sociedade cativa da nomenclatura clerical da religião estabelecida. Há, hoje, seguramente, mais recursos materiais, mas com eles, proporcionalmente, não se alcançam mais pessoas. Ontem um simples acordeão, por exemplo, podia servir para animar a acção evangelística em várias cidades, vilas e aldeias e cativar a atenção de gentes de diferentes estratos sociais. Hoje, o mais sofisticado equipamento electrónico beneficia os participantes das celebrações dominicais se se deslocarem às «catedrais» em que estão instalados. Ontem, a Bíblia andava debaixo do braço, à vista de todos, como primeiro sinal de identificação e destrinça. Hoje, ela vai «fechada» num equipamento electrónico, «à mistura» ou «paredes meias» com produtos que promovem o que radicalmente exclui… Ontem, a leitura da Bíblia era uma partilha de experiências, de comunhão, de emoções, de alegrias, de tristezas, de angústias… Hoje, a leitura da Bíblia é um momento de «vaidades», de exibição de estatuto, de mera liturgia da modernidade. Ontem, a leitura da Bíblia implicava a respectiva explicação.


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Hoje, é dramático ouvi-la ler para servir de pretexto ou suporte de meras opiniões sobre os acontecimentos recentes que se refiram «à concorrência» ou «à maldade humana» expressa nas acções dos que não são da nossa «denominação» ou do «nosso credo»… Parece razoável sugerir que se dê oportunidade às novas gerações no contexto do Movimento Pentecostal em Portugal para interpelarem a experiência de obreiros dedicados, como foi o caso de José Pessoa, por via da conferência cuidada e exaustiva do seu percurso de vida e do que ensinou. Esta obra tem esse objectivo. Não chega que alguns — e são poucos — coevos dos pioneiros, ainda se lembrem, em pequenas notas nas redes sociais, ou nas conversas de amigos do «mesmo tempo», do que se fazia, como se fazia, o que se ensinava, o que se aprendia, o que acontecia «antigamente». É preciso levar ao quotidiano de cada um a memória do que pertence a todos — o testemunho que nos legaram os nossos heróis da fé mais chegados depois dos que ainda estão vivos, e estão na nossa comunidade cristã, no nosso círculo de amigos, na nossa família. Quanto mais objectiva essa memória for, melhor se concretizará o que foi importante na metodologia que empregaram na divulgação da Mensagem e como esta preencheu o vazio e alimentou os sonhos de tantos portugueses! Quanto mais se consubstanciar em factos, melhor se compreenderá a razão de tanto ânimo para percorrer caminhos e chegar a lugares em que prevalecia o obscurantismo religioso ou, pelo menos, onde a tradição se fechava a «sete chaves» para não permitir contactos como o perigoso protestantismo, essa seita madre de tantos hereges! Bem se sabe que a memória de cada um se comporta, amiúde, de modo tão traiçoeiro em relação à verdade! E no que tange à invocação do que ensinaram os pioneiros desta causa pentecostal ouvimos, às vezes, o que nos deixa estarrecidos, boquiabertos, desiludidos, inquietos… Lá está, como não há memória esclarecida, firme, convicta do passado qualquer um pode dizer e passar incólume que o ensino ministrado não é outro, é o mesmo, só que dito por pessoas diferentes para tempos novos. Sinalizar o caminho percorrido é

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a mais rigorosa forma de garantir «aos caminhantes» que não estão equivocados nem se «meteram em atalhos». Isto, bem entendido, é importante para quem não está disponível para «grandes confrontos» com o revisionismo, que por aí campeia, antes quer abeirar-se, honestamente, do testemunho desses homens e mulheres, que também é seu por convicção, de modo a poder resumir, para os de hoje e para os vindouros, os valores que eles erigiram e conservaram. Conhecer melhor o que pensavam e o modo como agiam os nossos mentores, responsáveis espirituais ou que «velaram pelas nossas almas» e já alcançaram a glória é uma necessidade premente para não permitir que as convicções formadas entrem em processo de desânimo, desconfiança ou até de falência. O revisionismo tem esse objectivo — manter o pentecostalismo mas «estigmatizando» o ensino ou as bases de quem o ensinou e praticou! Só que para trás vão ficando, em estado de orfandade ou de acomodação, aqueles e aquelas que já não têm capacidade de adaptação às teses revisionistas dos que agora dizem «levar o facho» dos pioneiros, como se fossem «siameses». O que é uma pena! Porque deviam estar na frente do combate contra a ignorância dos autoproclamados e preclaros mentores do revisionismo, chamando a atenção para o facto de na «pentecostalidade destes dias» — se fosse a dos pioneiros, certamente apresentaria os mesmos resultados — não se vislumbrar, em geral, senão a espuma da denominacionalidade das opções em que os sinais de diferenciação com o mundo, com o que é mero secularismo, inexistem ou se apresentam obnubilados. Estamos certos que reflexão sobre os dias que se vivem implica perguntar se os homens e mulheres que labutaram durante cinco décadas pela afirmação da fé foram uns «visionários iletrados», como alguns, directa ou indirectamente, afirmaram ou insinuaram, meteoros dum tempo que exigia doutrinas e práticas de conjuntura, mestres de excentricidades só possíveis no seio de populações ignaras, ou, ao contrário, como pensamos, pelo que ensinaram, pelo que


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fizeram, foram ilustres portadores de uma fé vívida que milhares e milhares de portugueses aceitaram e com a qual se conformaram, fielmente. Eles foram lídimos e esforçados agentes de Deus, movidos pela acção do Espírito Santo, homens bons que deixaram testemunho, recordações. Se foram capazes de semear os fundamentos que caracterizaram o Movimento do Espírito em Portugal de modo tão eficaz que as gerações futuras os acolham, pensem neles e vivam de acordo com eles é questão que não sabemos responder. Os sinais das últimas décadas não apontam no sentido duma resposta afirmativa, a nosso ver. Hoje, se quisermos ser imparciais, teremos de admitir que faltam lideranças consensuais que aglutinem todos os que culturalmente se identificam com esse património espiritual. Desfizeram-se os vínculos que permitiam a comunhão de todos os pentecostais em qualquer lugar em que se reunissem. Hoje, até na própria casa muitos têm que «enjeitar», para não se sentirem estranhos, as referências da vivência eclesial em que nasceram, cresceram e… envelheceram! Se os factores de identificação forem apenas os que resultam da simpatia por este ou aquele líder, por esta ou por aquela doutrina ou prática mais liberal, por mais música clássica ou moderna, por mais isto ou aquilo que se permite ou proíbe, não valeu de nada terem andado os pioneiros por todos os caminhos de Portugal a pregar a unidade na base do mesmo credo, a estabelecer as bases da vivência da fé estivesse onde estivesse aquele que se identificasse com elas. O que se vê aponta para sucessivos deslizamentos da obra realizada, que se caracterizará, no futuro, por ter gerado muitas «amostras» que, juntas, não se identificam com o padrão inicial. Ao menos, nesta obra, até onde foi possível, pugnamos por deixar abertas as portas que permitem continuar à procura dos homens bons que deixaram boas recordações. Sem prejuízo do direito ao revisionismo, o que o exemplo da vida e obra de José da Cunha de Oliveira Pessoa nos permite, pelo menos, é identificar os momentos em que a causa da unidade do Movimento Pentecostal e a sua feição cultural

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exigiam maior comprometimento na preservação das suas linhas mestras originárias e o enfrentamento corajoso, claro, envolvente, das linhas de fractura que se alimentaram demasiado tempo da indefinição e se consolidaram, por si só, à mercê do tempo, as mais das vezes com enviesamento perturbador…

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Para escrevê-la, consultámos todas as fontes disponíveis, de modo exaustivo, procurando sempre a verdade dos factos. Não é a nossa primeira experiência e, por isso, não nos surpreendeu a dificuldade da tarefa. Primeiro, porque os que escreveram as notícias, relataram os eventos, minutaram as actas, trocaram correspondência, fotografaram e filmaram não tiveram senão a preocupação de corresponder aos objectivos imediatos, pensando neles próprios, nas comunidades que representavam, nos destinatários e outros beneficiários; segundo, porque muito do que está subjacente aos documentos disponíveis ficou no «segredo dos gabinetes» ou, melhor dizendo, na memória dos que pensaram e executaram o que é público, mas cujas razões ou justificações não foram explicitadas. Talvez um simples exemplo faça luz sobre o que queremos dizer: A revista Novas de Alegria, fonte indispensável do que, em grande parte, averiguámos, era, desde o seu aparecimento, Órgão de Reavivamento e Cristianismo Bíblico e passou a ser, primeiro, Revista Evangélica de Reavivamento e Cristianismo Bíblico e, depois, tão-só Revista Evangélica (presentemente, Revista Evangélica de informação e formação. Órgão oficial da Convenção das Assembleias de Deus em Portugal). Tal sucedeu em dois momentos de grande significado no ministério pastoral de José Pessoa, em Lisboa, em Janeiro de 1979 e em Fevereiro de 1983, respectivamente, como teremos ocasião de confirmar. Quisemos saber as razões dessas alterações, aparentemente sem importância, mas que nos parecem estar relacionadas com efectivas «mudanças de ciclo» na orientação do Movimento Pentecostal (na primeira alteração, João Sequeira Hipólito e Tage Stählberg estavam


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no limiar das suas vidas terrenas, vindo ambos a falecer em 1979 e 1980, respectivamente; na segunda, quando estava em marcha o processo de autonomização das igrejas e de substituição da geração dos obreiros, que fizeram a sua implantação e nela colaboraram, por outra que frequentara o Instituto Bíblico de Portugal), mas não lográmos encontrá-las documentadas ou simplesmente esboçadas onde seria curial que estivessem — na Assembleia de Deus Pentecostal de Lisboa. E não é querer saber por querer saber, mas para descortinar que influência, nessas decisões, teve o pastor da igreja que editava a revista e, naturalmente, quais os objectivos que se pretendia alcançar com as mudanças operadas. Este e outros temas de relevo só poderiam ser iluminados com a participação de quem lidou com eles mais de perto. Mas se, na altura, não lhes ocorreu que os fundamentos das decisões tomadas podiam permitir mais clara compreensão e o fluir da história com melhor consistência, não é agora que lhes vamos perguntar… Aliás, muitos protagonistas do tempo em que José da Cunha de Oliveira Pessoa exerceu o seu múnus espiritual ao serviço dos portugueses já se finaram e só alguns deles nos deixaram, por escrito, ténues vislumbres do muito que viveram. Grande parte estará na memória dos que lhes sobreviveram e, porventura, ainda em condições de partilharem a essência dessas vidas. Não disfarçamos que, antes de nós, outros deram precioso contributo para fixar os factos que são relevantes no percurso deste ministro insigne que tão cedo se recolheu no seio do Pai. Mas, como em toda a obra humana, nem sempre com o rigor que se impunha porque, umas vezes, as fontes primárias já estavam «inquinadas», e, outras vezes, porque faltou esforço suficiente para «aliviar» o «colete-de-forças» que o tempo foi cerzindo (se está escrito, está certo…) e quebrar o ciclo da repetição. Vemos isso em relação ao momento exacto em que ele se converteu e foi baptizado, à forma e data do seu casamento, aos locais e períodos em que estudou, morou, pastoreou e terminou o seu ministério (havemos de concluir, no

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texto, que jamais deixou o ministério da Palavra e do Aconselhamento enquanto viveu, como se chegou a escrever…). Procurámos confirmar o que está publicado, corrigir o que não tem fundamento e, quando não tivemos fonte e apoio fidedigno, confirmável, apenas nos ficámos pelo que foi possível apurar, com verosimilhança. Para que fique claro, estamos convictos que o ministério de José da Cunha de Oliveira Pessoa, como missionário, evangelista, pastor e intérprete, exercido em múltiplas vertentes das suas capacidades e dons, não se esgota no que apurámos para escrever esta obra. Ele esteve em muitos outros lugares, contactou com muitas mais pessoas, ensinou noutras ocasiões e lugares, pregou e interpretou outros pregadores, com mais resultados do que aqueles que descortinámos. A simples razão de o não sabermos, não termos conseguido o registo dos respectivos locais e datas ou por incapacidade nossa nos terem escapado, não minimiza a conclusão de que trabalhou arduamente, numa intensidade só comparável aos demais heróis da fé que deram a vida no desempenho do seu ministério. Esta obra não é uma biografia, antes um simples memorial do desempenho que teve na implantação e desenvolvimento do Movimento Pentecostal em Portugal, durante quatro décadas, do que representa para muitos milhares de pessoas a quem pregou, ensinou ou foi intérprete nas casas de oração, recintos desportivos, teatros, cinemas, ou onde foi propício, pelo país inteiro, em África, na América, na Europa e até na Ásia. Obviamente, não é que não se justificasse biografá-lo, contando aos leitores pormenores do seu nascimento, contexto-sócio familiar, formação académica, emprego, serviço militar, casamentos, nascimento dos filhos, e por aí fora, até ao decesso prematuro, quando se esperava que os ventos mais tempestuosos, que assolaram a sua vida pessoal e ministerial, amainassem e pudesse ainda servir a comunidade, com que sempre se identificou e à qual dalguma maneira sempre regressou, ao longo da vida, por muitos e felizes anos. Todavia, nem nós temos essa competência, nem as fontes consultadas nos disseram o suficiente para realizar esse tipo


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de trabalho, nem a grande parte dos que privaram com ele manifestou disponibilidade para participar na procura que a biografia demanda. Há homens que, pela dimensão e importância do serviço que prestaram às comunidades em que exerceram o seu múnus, serão sempre exemplo inspirador para quem os conheceu, mas só o poderão ser para os demais se lhes for apresentado. Não desejamos outro mérito para esta obra senão o reconhecimento de que, por meio dela, a memória deste ministro do evangelho se perpetua com vantagens para quem ler o testemunho que é possível legar às gerações que não tiveram tamanho privilégio de beneficiar do seu serviço à causa do Reino de Deus. A biografia (ou biografias, porque, estamos certos, diante da dimensão ética, moral espiritual e social de José da Cunha de Oliveira Pessoa, muitas serão as tentativas de aproximação à realidade completa do que viveu) virá a seguir, da qual esta obra será um antecedente que eventualmente se nomeará num lugar menor da especificação da bibliografia consultada.3

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Porque nos elementos de natureza mais pessoal, que foram publicados depois da morte de Mari Bakken e do próprio José Pessoa, há lapsos, justifica-se este primeiro apontamento correctivo: De acordo com o registo de nascimento nº 76 da Oitava Conservatória do Registo Civil de Lisboa, realizado em 4 de Janeiro de 1928, José da Cunha d’Oliveira Pessoa nasceu, às 4 horas do dia 8 de Dezembro de 1927, na Travessa do Hospital, freguesia Socorro, filho de José Maria d’Oliveira Pessoa, de 46 anos de idade, solteiro, funcionário público e proprietário, natural de Lisboa, freguesia da Pena, e de Cândida Fernandes, solteira, doméstica, natural da freguesia de São Pedro do Rio, Montalegre. Intervieram no registo, além do respectivo funcionário da Conservatória, Maria José Pessoa Barbosa, solteira, proprietária, domiciliada no Fundão, representada no acto por Carlos Augusto de Oliveira Pessoa, casado, domiciliado na Rua Sara de Matos, 34º, 3º, Lisboa, e José António Gil da Silva, solteiro, maior, proprietário, domiciliado no Fundão, os quais declararam querer ser padrinhos. A mãe só interveio, por instrumento de perfilhação, em 5 de Julho de 1947, cerca de 20 anos depois do registo de nascimento, estando domiciliada na Rua Elias Garcia, J.W.M., Amadora, Oeiras.

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