compartilhe a sua fé com um muçulmano Charles R. Marsh Tradução Joel A. S. Melancia
Compartilhe a sua fé com um muçulmano Charles R. Marsh
Direitos Reservados © Letras d’Ouro, editores, 2015 © Charles R. Marsh, gentilmente cedidos pelos herdeiros
1ª Edição, Maio de 2015
Editores Letras d’Ouro, editores
Letras d’Ouro, editores Sede Rua Quinta da Flamância, n.º 3, 3º Dt.º Casal do Marco 2840-030 Paio Pires, Portugal Tlm 914 847 055 Email livros@letrasdouro.com Web www.letrasdouro.com FB facebook.com/letrasdouro
Tradução Joel A. S. Melancia Revisão e Edição José Manuel Martins Direcção de Arte e Design Pedro Martins Impressão e Acabamento www.artipol.net
ISBN Depósito Legal
Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução por quaisquer meios, salvo em breves citações, com a indicação da fonte.
ÍNDICE
Nota editorial Introdução 1. Princípios gerais 2. O Islão 3. O jejum do ramadão 4. A festa religiosa do ‘ID 5. O credo islâmico 6. Outros credos islâmicos 7. O senhor Jesus Cristo 8. Jesus, o filho de Deus 9. Jesus Cristo e a sua morte expiatória 10. O contacto pessoal 11. Tópicos úteis 12. Alcançando mulheres e meninas adolescentes 13. Controvérsia 14. Ajudando os convertidos 15. Sugestões finais e conclusão
NOTA EDITORIAL
Na sequência dos eventos terroristas que abalaram o Ocidente, depois de 11 de Setembro de 2001, aos cristãos em geral colocou-se de novo a questão de saber como deveriam relacionar-se com os praticantes do Islão, em particular nos países europeus em que existem milhões de cidadãos muçulmanos, cientes dos seus direitos no que tange à prática da religião. A ausência quase total de reciprocidade em relação aos cristãos dos países de maioria muçulmana, nos quais são impedidos de se assumir como tal e muitas vezes perseguidos, torturados e mortos, levantou e levanta presentemente a questão de saber como deve ser tratado o Islão e os seus praticantes nos países de maioria sociológica cristã em que todas as religiões podem expressar-se livremente e expandir-se. Em países como a França, Alemanha, Espanha, Reino Unido, Estados Unidos da Améria e Portugal, por exemplo e nas devidas proporções, a presença e visibilidade dos muçulmanos têm importante significado social e religioso. Depois desses acontecimentos de terror, em muitas nações ocidentais os cidadãos inquietaram-se, tiveram medo e, como é sabido, não faltaram acções concretas no sentido de os excluírem das sociedades respectivas.
7
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
8
No essencial, as pessoas questionam-se acerca da natureza do Islão: Não é ele particularmente intolerante? E por isso é que as sociedades suportam tamanhos custos em mortes, destruição e instabilidade social? E não é o Islão particularmente intolerante em relação aos cristãos, como as dezenas de milhar de mortos na Síria, no Iraque, na Nigéria, no Quénia, entre outros países, demonstram e os vexames e violências em relação aos cristãos, em diferentes países do Médio Oriente, confirmam? Muito se tem escrito sobre as conquistas otomanas na Europa e sobre as cruzadas cristãs no Oriente, sobre as relações sociais complicadas em países ocidentais, como a França, depois das guerras de descolonização do Magrebe, em particular por causa da prevalência da Sharia na cultura dos que, sendo cidadãos nacionais desses países, nunca «abdicaram» de se comportar como cidadãos muçulmanos, desde logo na manifestação pública dessa sua condição, mas também na exigência de manter, livres de impedimento, as suas formas de organização familiar e exibição de símbolos religiosos. Não se podem olvidar as posições mais radicais para responder a essa actuação, como, por exemplo, as que advogam que se os países muçulmanos não permitem a construção de templos de outras religiões, por que é que as nações de matriz cristã hão-de deixar que nelas os cidadãos de tais países construam as suas mesquitas? A falta de reciprocidade parece ser o argumento, mas subjacente está a ideia de que facilitar a propagação do Islão e dar os seus praticantes tanta visibilidade não é compatível com a «paz social» que se pretende assegurar, considerando essa vertente de terror dos muçulmanos, capazes de se autopropagar no seio dessas comunidades ocidentais protegidas. Ou seja, se o Islão gera violência ou, pelo menos, é capaz de a justificar (dirão os mais moderados que isso só é possível numa lógica
CHARLES R. MARSH
de radicalização do que diz o Islão, com base numa exegese forçada ou descontextualizada face ao momento histórico e ao avanço da Humanidade…), não é lógico, por um lado, sustentar o seu desenvolvimento pois o contrário significa lançar à terra a semente destruidora dos próprios fundamentos do Estado de Direito e das sociedades democráticas, mas, por outro lado, a própria natureza dos fundamentos do Estado de Direito e da democracia implicam ampla liberdade religiosa… Não é o local próprio para desenvolver este tópico, mas parece que as sociedades ocidentais, mesmo aquelas cujo secularismo exacerbado lhes impõe «renegar» os fundamentos cristãos que lhes estão na génese, não têm alternativa senão «enfrentar» o Islão e os seus praticantes por via da aplicação exigente das regras da liberdade religiosa e da adopção de medidas drásticas de combate aos fenómenos que impliquem a utilização de meios que contendam com os direitos e liberdades dos cidadãos, democraticamente assegurados. Apesar dos medos instalados após tantos eventos violentos, durante vários anos, que deterioraram as relações entre o mundo islâmico e o Ocidente, o dia 11 de Setembro de 2001 permanece na mente de todos vivo, bem como também a situação drástica no Médio Oriente e noutros países ao redor do mundo, em que os cristãos são alvo de assédio e violência. Na França, por exemplo, o véu e a burca muçulmanos reavivaram tensões «adormecidas» pois muitos vêem isso como um insulto aos direitos das mulheres numa sociedade livre e democrática, país onde o governo parece impotente para conter a violência em áreas sensíveis que, às vezes, dão origem a acusações graves contra os imigrantes, querendo significar muçulmanos. É diante desses fenómenos que muitos têm medo, em França e noutros países ocidentais. Medo do poder dos fortes grupos muçul-
9
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
10
manos, com grandes apoios financeiros dos países enriquecidos pela exploração do petróleo mais radicais, na islamização das sociedades secularizadas (em aproveitamento do forte desinvestimento na afirmação dos valores cristãos, mais consentâneos com as raízes e tradições culturais autóctones), medo da Sharia (lei islâmica) e costumes muçulmanos arcaicos e intolerantes, medo da perda identidade europeia e cristã (onde é ainda relevante), medo de proselitismo dos grupos muçulmanos radicais. Em geral, parece-nos que o futuro só pode ser encarado com optimismo através daquele enfrentamento pois não há condições, dado o carácter universalista do Islão, para restringir a sua expansão onde «os campos estejam prontos para a sementeira». Além de acautelarem a segurança, as nações ocidentais de matriz cristã têm que pugnar pela estrita compreensão e aplicação dos documentos universais relativos aos direitos humanos e pugnar pela sua aplicação a todas as criaturas do mundo, independentemente da vigência maioritária desta ou daquela religião, deste ou daquele quadro de expansão do Islão. Naturalmente, e por aqui vamo-nos aproximando do essencial que pretendemos enunciar em relação a Partilhe a sua fé com um muçulmano, podem ser diferentes as estratégias dos cristãos consoante eles sejam de vinculação católica romana ou reformada, protestante ou evangélica. Por razões históricas, nos últimos anos, a Igreja Católica Romana pretendeu dar um contributo decisivo para a harmonia dos povos, através do «diálogo religioso», em particular com os muçulmanos. Dir-se-á que todos os esforços de aproximação para a convivência pacífica são necessários. Mas isso pressupõe que se desista da missão principal dos cristãos que é levar o Evangelho de Jesus Cristo a todos os povos, «até aos confins da terra», se os esforços a desenvolver visarem apenas criar as condições para que
CHARLES R. MARSH
cada um semeie a «sua religião» sem violência e respeitando os respectivos campos de acção. A abordagem dos cristãos que seguem a orientação de Roma tende a resolver o dilema entre os que entendem que quaisquer passos no sentido de manter a coexistência pacífica é ingenuidade e os que rejeitam, pura e simplesmente, essa abordagem, colocando-se na posição de rejeição do próprio Islão. «Mas entre ingenuidade e a rejeição não haverá lugar para uma abordagem diferente?», interrogam-se. A resposta é afirmativa: há! Para isso se fala das quatro vias para o diálogo inter-religioso, que, segundo o Papa Bento XVI, é uma necessidade vital: A amizade e a ajuda diária mútua; o trabalho comum para a justiça e a paz; o intercâmbio espiritual através de experiências religiosas comuns; o intercâmbio teológico, estudando as respectivas tradições muitas vezes num quadro de relacionamento institucional. Considerando que é preciso estimular uma leitura não violenta dos textos sagrados, como o Alcorão, que contem números versículos que proclamam a paz e a harmonia, e pode também contribuir para o progresso da «consciência universal» (partindo ainda do pressuposto que a maior parte dos muçulmanos no mundo não defende a violência e rejeitam a automarginalização social com receio de «contaminação religiosa», querendo apenas justiça e condições dignas para o exercício do culto muçulmano), a Igreja valoriza e estima os muçulmanos porque adoram o «Deus único, vivo e subsistente, misericordioso e omnipotente, criador do céu e da terra, que falou aos homens.» Mesmo se, no decurso dos séculos, não poucas disputas e hostilidades surgiram entre cristãos e muçulmanos, o «sagrado Concílio exorta todos a esquecer o passado e trabalhar sinceramente para o entendimento mútuo e para proteger e promover em conjunto, por todos os homens, a justiça social, os valores
11
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
12
morais, a paz e a liberdade.» (Citado de um texto do Concílio Vaticano II). Parece politicamente correcta esta orientação da Igreja de Roma, que visa no essencial munir as igrejas nacionais dos países de grande imigração muçulmana, em particular por razões próximas dos fenómenos de descolonização com mais de 50 anos, duma estratégia adequada às situações em que a instabilidade social é preocupante. Também não é indiferente às razões de diplomacia que o Estado do Vaticano deve observar, dada a sua natureza, na relação com os Estados de vinculação islâmica, alguns dos quais submetidos à Sharia com consequências ao nível da organização do poder político, justificando a «união» entre «poder temporal» e «poder espiritual». Na verdade, a Igreja de Roma já «abdicou» da universalização do Evangelho e admite que uma parte (grande parte) da proclamação do «Deus único, vivo e subsistente, misericordioso e omnipotente, criador do céu e da terra, que falou aos homens» seja realização do Islão! O problema é que essa posição obnubila uma realidade que, para os muçulmanos, é muito viva, consistente e inegociável: os povos do Livro, sejam cristãos ou Judeus, mas em particular aqueles, são respeitáveis, usufruem de «direitos» que outros povos não têm diante do «avanço» inexorável do Islão, mas não adoram nem servem o mesmo Deus: «Não há outra divindade que não seja Alá, e Maomé o seu profeta.» Este é o primeiro dos fundamentos da fé islâmica, o seu credo. Alá não é o Deus de Abraão, Isaque e Jacó, o Deus que se deu a conhecer através do seu Filho, Jesus Cristo, cujo sacrifício sanguinolento na cruz foi feito pela humanidade, ressuscitando depois para assumir o seu lugar no Céu, junto do Pai, e enviar o Espírito Santo. Não é e, por isso, por muito que custe assumi-lo, não se pode associar a prática do Islão, nem de longe nem de perto, ao cumprimento da missão que Jesus entregou aos seus discípulos!
CHARLES R. MARSH
Não se nega com isso, no plano dos princípios, toda a legitimidade ao Islão para fazer a propaganda e expansão do seu sistema religioso desde que não colidam com as regras mais elementares, hoje consensuais no mundo, quanto à salvaguarda dos direitos humanos e reciprocidade em relação às demais religiões para se propagarem e expandirem, na mesma base, mesmo onde o Islão é predominante. Mas isso não está o Islão disponível para aceitar. Afirma-se portador da última revelação de Alá e tem um «mandado» para «submeter» todos os povos do mundo. É incompatível fazê-lo de «mãos dadas» com os povos do Livro se, na sua génese, o Islão apregoou a adulteração, por parte dos Judeus e dos Cristão, da mensagem até então revelada, seja na Tora, seja no Livro de Salmos, seja nos Evangelhos. Assim, não é pela confrontação dos «sistemas religiosos» nem pela via da «associação de interesses» para a coexistência pacífica (em qualquer circunstância um valor fundamental para a sustentação da paz no mundo) que o único Deus, revelado nas figuras do Pai, Filho e Espírito Santo (que o Islão considera uma manifestação do politeísmo que combate feroz e sistematicamente, negando, desde logo, quaisquer atributos divinos ao «filho de Maria», que é, no Alcorão, referido como um venerável profeta…) deve ser apresentado aos povos. Parece claro que a Igreja de Jesus Cristo não pode substituir-se aos poderes instituídos para velar pela paz e harmonia no mundo sob o dever estrito de aplicação das normas de direito internacional e nacional, legítimas e democráticas. E também não é pela ostracizarão e rejeição dos muçulmanos, enquanto praticantes do Islão, que a Igreja será luz do mundo e sal da terra. É pela afirmação de que também os muçulmanos são povo, são gente que precisa de alcançar uma posição espiritual elevada, que o Islão não garante, desde logo a certeza do perdão dos pecados, incluindo o original (que o Islão completamente rejeita), através do
13
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
14
sacrifício salvífico de Jesus Cristo, o Filho de Deus, para ter a certeza da vida eterna (a dúvida sobre o destino eterno do muçulmano é permanente e está dependente da boa-vontade de Alá no momento de pesar as boas obras de cada um…). Isto não se consegue de «mãos dadas com o muçulmano» para que cada um faça a propaganda do seu sistema religioso em paz: os cristão e os muçulmanos, como se fossem agentes do mesmo propósito divino, apenas separados por razões culturais e de ritual religioso. Parece que o caminho possível para alcançar os povos muçulmanos para Jesus Cristo é a interacção pessoal, a interacção familiar, a interacção profissional, a interacção de género… sim, interagir para poder chegar à fala com os muçulmanos, que é a tarefa mais difícil, dada a «protecção» a que estão submetidos para não se relacionarem com as pessoas do Livro, com os cristãos. Interacção é permitida quando os muçulmanos querem dar expressão a um dos pilares do Islão — o dever de fazer bem, dar esmola, ajuda os pobres e necessitados — ou, ainda, quando o «infiel» faz aquela declaração de adesão ao Islão (só Alá é Deus e Maomé o seu profeta) e passa a ter o benefício de pertença à comunidade. A tarefa é extremamente difícil, não se pense o contrário! O exemplo do autor desta obra, que agora introduzimos, é bem claro. É verdade que ele interagiu com os muçulmanos num contexto exógeno à sua própria sociedade e cultura, tendo de ultrapassar as difíceis barreiras linguísticas, culturais e de costumes enraizados, quase incompatíveis com a vivência paradigma das sociedades cristãs e democráticas em que se esbateram há muito as diferenças de género. Hoje, quiçá numa situação de alto privilégio, os leitores, sendo cristãos reformados, protestantes, evangélicos ou católicos romanos, não importa, têm a possibilidade de interagir com muitas dezenas de milhar de concidadãos que não conhecem a beleza que há na
CHARLES R. MARSH
mensagem de Cristo e a certeza da salvação que n’Ele podem alcançar abrindo-se para entender e alcançar o que tanto procuram no Islão, debalde. Não é, repetimo-nos, tarefa fácil. Quem já teve oportunidade de interagir com um muçulmano praticante (mais sunita, mais xiita, mais isto, mais aquilo, não importa porque o Islão tem tantas ou mais clivagens na expressão religiosa do que os cristãos) constatou que o diálogo é pacífico e o entendimento possível quanto ao dever da oração e quanto ao dever de fazer bem aos necessitados. O muçulmano tem especial encanto quando fala do bem que faz para que Alá lhe considere o mérito, se for o caso, no momento de aplicar a sua misericórdia e lhe dar lugar no paraíso. Tal já não acontece quando o tema de conversa resvala para a questão do reconhecimento (e identificação) de Alá, a sua natureza, e do papel de Maomé, como profeta. Jesus Cristo é completamente reduzido à sua condição de profeta, humano, que não experimentou a morte, etc., etc. E fecham-se como caracol na sua carapaça! Não há discussão possível nem argumentação que valha para avançar na apresentação do plano da graça de Deus. Mas não é tarefa impossível falar de Jesus Cristo aos muçulmanos! Muito menos está enfraquecido o Espírito Santo de Deus para «convencer do pecado, da justiça e do juízo» o muçulmano mais convicto dos fundamentos da sua religião! É preciso apenas chegar à intimidade de cada um em particular e, paulatinamente, mostrar-lhe o que não tem e lhe faz falta e que, por isso, tanto busca na prática do Islão! Não nos vamos aqui envolver com a metodologia já estudada na Missiologia,1 a chama «ciência das missões», pois isso
1
Os leitores poderão consultar, para maiores desenvolvimentos, Instruções para a evangelização dos muçulmanos, Missiologia, a missão transcultural da igreja, apêndice j, pág. 388 e segts., Pate, Larry, Editora Vida, Miami, Florida, EUA, 1987.
15
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
16
ficaria para além desta breves notas de chamada de atenção para o tema crucial e presente na obra Partilhe a sua fé com um muçulmano, em cuja leitura se poderão encontrar exemplos muito práticos capazes de tornar bem-sucedida a tarefa de evangelizar um vizinho, um companheiro de trabalho, um colega de estudo, até um amigo que professa o Islão. No nosso país, falando a mesma língua, num contexto sociocultural sem difíceis barreiras de relacionamento, a evangelização dos muçulmanos pode ser a gota de água que o Espírito Santo quer transformar num mare magnum que influencie «outras margens» em que as razões culturais, religiosas, políticas, sociais, militares, geográficas, o que for, constituam barreiras muito mais difíceis de transpor. Pelo menos no nosso contexto, dentro das fronteiras do nosso território, nós, portugueses de convicção cristã, discípulos de Jesus Cristo, podemos derrubar barreiras chegando aos corações de muitos muçulmanos ansiosos por conhecer a verdade libertadora que não está acessível através do Islão, muito menos da prática extremista de morrer matando para aceder ao paraíso. Daremos um contributo decisivo para a paz e harmonia entre as pessoas interagindo com vista a encaminhar um muçulmano para a vereda em que, de modo livre e voluntário, pode começar a caminhar rumo à eternidade, em segurança e certeza! Uma palavra para esta iniciativa da Letras d’Ouro, editores que coloca à mercê dos cristãos portugueses, sejam católicos romanos, sejam ortodoxos, sejam reformados, protestantes ou evangélicos, um texto simples, prenhe da experiência dum servo de Deus de espírito aberto e alma sedenta de servir, que foi «às entranhas» dum povo muçulmano, respeitosamente, levar a Palavra de esperança que muito receberam. Não é que não existam outros textos relevantes sobre o Islão e as estratégias de comunicar o Evangelho em ambiente intrin-
CHARLES R. MARSH
secamente hostil. Este, porém, tem a superior vantagem de nos dar o testemunho dum homem de acção, que desenvolveu o seu ministério despido de todos os preconceitos da sua época e escreveu antes da «contaminação» geral contra os muçulmanos, ocorrida a partir de 11 de Setembro de 2001. Sem prejuízo da orientação Conciliar para os católicos romanos, das orientações sinodais, convencionais, pastorais ou outras para os reformados, protestantes ou evangélicos, importa cumprir a missão que Jesus confiou aos seus discípulos e, para isso, cada um Partilhe a sua fé com um muçulmano. Amora, Outubro de 2014 José Manuel Martins
17
INTRODUÇÃO
Em 1927, era eu um missionário, pioneiro e solitário, entre os Muçulmanos. Nessa altura, desejei muito ter um livrinho para me orientar e dar-me algumas pistas sobre a forma de abordar a evangelização deste povo — tão difícil quanto atraente e para o qual Deus me havia chamado. Nos quarenta e cinco anos que se seguiram de serviço activo entre eles, aprendi muitas lições, algumas das quais apresento neste livro. O mesmo desdobra-se em dois propósitos: primeiro, ajudar jovens missionários que se sintam chamados para trabalhar entre Muçulmanos noutros países; em segundo lugar, ajudar as pessoas de língua inglesa2 que querem saber mais acerca da religião daqueles que, vindos do estrangeiro, moram no seu país. Apesar de ter falado a milhares de Muçulmanos em vários países e de muitas vezes os ter visto cativados pela mensagem do Evangelho, não é fácil ensinar outros na arte de os ganhar para Cristo. Os Muçulmanos têm orgulho na consideração do facto de a sua religião ser considerada uma irmandade universal e de que todos os Muçulmanos estão unidos entre si. Porém, apesar dos fundamentos do Islão não divergirem, a linguagem, o passado histórico, os costumes e as práticas variam imenso de país para país. 2
E agora também de língua portuguesa. (N. do T.)
19
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
20
Os métodos e lições sublinhados neste livro foram aprendidos e postos em prática no Norte de África e na República do Chade. Inicialmente, este livro surgiu como um curso em Francês e Árabe, por isso as palavras do árabe coloquial foram nele inseridas. Algumas dessas palavras estão escritas entre parêntesis e podem ser adaptadas para a língua do país onde o estudante pensa ir trabalhar. Este livro é eminentemente prático e contém sugestões quanto à forma de utilizar os vários artigos de fé e prática dos Muçulmanos, para que os mesmos possam ser considerados como um ponto de contacto inicial para a apresentação do Evangelho. Alguns países dominados pelo Islão estão a fechar-se ao Evangelho; muitos Muçulmanos, porém, estão a emigrar para o Ocidente. É, obviamente, dever e privilégio de cada Cristão contactá-los e apresentar-lhes a mensagem do Evangelho. Com muita frequência o Muçulmano é casmurro, preconceituoso e fanático, mas tem um grande temor de Deus e interessa-se por falar sobre religião. Os Muçulmanos são acessíveis. Não é de todo impossível conquistar a confiança deles, e quando o contacto é mesmo estabelecido, muitas vezes eles ficam cativados pela mensagem cristã. A linguagem desempenha aqui um papel muito importante. A possibilidade de falar com um homem na sua própria língua faz com que o seu coração seja conquistado. Este deve ser o objectivo do especialista ou do trabalhador a tempo inteiro. Para outros isso não será possível, e o Inglês poderá ser o veículo de aproximação. Tenha sempre presente, porém, que em Inglês3 o vocabulário religioso de um Muçulmano é muito limitado, e que palavras, que para si têm um determinado significado, bem podem querer dizer outra coisa totalmente diferente para ele. A sua mente não só está eivada de preconceitos produzidos 3
Tal como em Português, também. (N. do T.)
CHARLES R. MARSH
pelos ensinos do Islão, mas também pelo modo de vida, conversação e convicções de fé4 dos Ocidentais, que são vistos por ele como sendo todos Cristãos.
21
4
Ou crenças, no original, beliefs. (N. do T.)
1
PRINCÍPIOS GERAIS
Uma comparação cuidadosa dos textos do Evangelho de João 3:1-21 e 4:7-26 mostra-nos que o Senhor Jesus apresentou a mensagem à mulher samaritana de um modo totalmente diferente do que foi usado para confrontar Nicodemos. Em Actos 2:14-36, Pedro proclamou o Evangelho aos Judeus, enquanto em Actos 10:34-43 dá praticamente a mesma mensagem aos Gentios. Em ambos os casos, a mensagem é basicamente a mesma, mas a sua apresentação varia de acordo com o enquadramento sócio-religioso dos ouvintes. Mostram-se diferentes aspectos do mesmo Senhor, recorrendo-se a um vocabulário diferente e a uma forma de apelar variada. Do mesmo modo, as pessoas a quem nos vamos dirigir fazem com que tenhamos que adequar não só o vocabulário que usamos, mas também o modo como apresentamos a mensagem imutável. Não chega conhecer bem a Bíblia; é preciso conhecer também o homem a quem nos vamos dirigir. A abordagem a um pagão sem Deus é totalmente diferente da forma como se fala com um Muçulmano que crê em Deus. Há também uma grande variedade na cultura, educação e moralidade dos Muçulmanos. Alguns conhecem bem o Alcorão, enquanto outros apenas são capazes de recitar de cor o primeiro capítulo. Alguns são mesmo devotos e tementes a Deus, enquanto
23
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
24
outros fazem da religião um capote para o seu pecado. Cada Muçulmano transporta em si a marca distintiva da terra de onde provém, mas a base da sua fé é a mesma dos seus correligionários Muçulmanos e, muitas vezes, o modo de deles nos aproximarmos é idêntico. Por outro lado, muitos estudantes oriundos de países Muçulmanos, que estão a estudar no estrangeiro, falam do Islão com desdém, pretendendo com isso querer significar que romperam com ele quando saíram dos respectivos países. Provavelmente, a única maneira de realmente alcançar os corações de tais homens é falando bem a sua língua de origem. A melhor maneira de os abordarmos é a mesma que usaríamos para falar com agnósticos do nosso próprio meio cultural. Depressa será visível que a profissão de fé daqueles é contraditória com o que realmente conservam na mente e no coração. Mais uma vez insisto nisto: muitos Muçulmanos são fanáticos em extremo, enquanto outros são simpáticos e querem muito ouvir-nos. Nos países Ocidentais, os Muçulmanos constituem a minoria e por essa razão pode-lhes parecer suspeito o motivo pelo qual os Cristãos pretendem conquistar a sua simpatia e fazer amizade com eles. No entanto, aqui eles estão livres da atmosfera geral dos países Muçulmanos e podem mais facilmente romper com as tradições e laços familiares que, noutras circunstâncias, os impediriam de aceitar o Salvador. Em cada país, a abordagem de cada homem e de cada mulher tem que ser diferente, tal como o apelo a um Muçulmano culto difere do apelo a um que seja iliterato. Ao lidar com esta última categoria de pessoas, em qualquer que seja o país em que se esteja, o Cristão deve acautelar-se de os instruir na religião do Islão ao discutirem os méritos relativos do Cristianismo e do Islão. Muitos missionários aos Muçulmanos em África têm feito isto inconscientemente. Em muitos países, os Muçulmanos apenas têm um conhecimento superficial da sua religião. Recitam o testemunho para com Maomé,
CHARLES R. MARSH
seguem as orações Muçulmanas e observam o jejum do Ramadão. Lembre-se de que ao mesmo tempo que devemos saber aquilo em que o Muçulmano crê, o nosso objectivo não é comparar religiões, mas conduzi-los a um compromisso pessoal com o Senhor Jesus Cristo como Salvador. Não há sombra de dúvida de que, para se conquistar os Muçulmanos no estrangeiro, é de importância primordial um bom conhecimento do vernáculo e do Árabe — pelo menos o Árabe suficiente para conhecer os vocábulos dos termos religiosos importantes para os Muçulmanos. Eles têm o seu próprio vocabulário religioso e os missionários Cristãos devem conhecê-lo e usá-lo. Isto não será possível para a generalidade das pessoas no Ocidente ou para o obreiro de curto prazo. Ao usarmos a língua inglesa5 para comunicarmos, é muito importante ajudarmos o Muçulmano a compreender o vocabulário religioso que utilizamos. Expressões como expiação, Calvário, a cruz, o novo nascimento, regeneração, o Espírito Santo, o Filho de Deus poderão não querer dizer nada a um Muçulmano ou poderão mesmo causar uma falsa ideia na sua mente. Para que a nossa mensagem seja clara, essas palavras devem ser evitadas ou, então, explicadas. A nossa tarefa deve ser apresentar a mensagem à sua mente de tal modo que ele seja capaz de a compreender e captá-la. Por outras palavras: temos que comunicar. Lembre-se de que os termos religiosos que usa podem ser totalmente vazios de significado para a pessoa que o está a escutar. Por outro lado, e por vezes, uma palavra na língua Árabe pode ter um determinado significado para o Cristão e, ainda assim, consistir num significado totalmente diferente para a mente de um Muçulmano. Esta foi a desvantagem de muitas das traduções missionárias dos primeiros tempos. 5
Neste caso, a língua portuguesa, bem entendido. (N. do T.)
25
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
26
Podemos falar do céu (al janna) e os seus pensamentos irem imediatamente para o paraíso Muçulmano, um lugar em que ele terá a possibilidade de satisfazer os seus desejos mais sensuais com mulheres que são virgens perpétuas, onde correm rios de vinho, etc.. Deste modo, temos que definir céu por outras palavras; falando-lhes desse lugar como um lugar onde a Presença de Deus habita, ou um lugar que é a Casa do Pai. A oração (salãt), para nós, é essencialmente intercessória, mas para um Muçulmano é, antes de mais, a altura em que ele pratica o rito da oração, com a repetição das frases que memorizou nos cinco períodos de tempo que lhe são destinados. Para ele, a oração é adoração, antes de mais, ou submissão à vontade de Deus — uma pura formalidade. Se quisermos orar com um Muçulmano, podemos sugerir o seguinte: «Podemos pedir a bênção de Deus (barakhat Allah) para a sua casa» ou «sobre esta criança enferma», em vez de dizermos «vamos orar juntos.» Se usarmos com frequência a palavra árabe para crer (ãmana), com ela cada Muçulmano devoto pode afirmar, com toda a honestidade, que crê no Senhor Jesus. Assim, temos que lhes mostrar o verdadeiro significado da Fé usando outras palavras que mostrem, com toda a clareza, que a fé salvífica envolve a mente e a crença nos factos históricos tal como estão relatados na Bíblia (Kalãm Allah). Deverá não apenas crer nas declarações e promessas da Bíblia, mas confiar (ittakala) no Senhor Jesus para a salvação, comprometendo a sua vida com Ele e obedecendo aos seus comandos. Quando falamos de pecado (danb) provavelmente irá pensar que nos referimos a uma, ou às três, destas coisas: adultério (zina), homicídio (al qatl), ou ao pecado de associarmos um homem a Deus, isto é, colocar Jesus Cristo no lugar de Deus (shirk). Para exprimir os vários aspectos do pecado, ele usa uma ampla gama de palavras, tais como transgressão, desregramento6 e desobediência. Se usarmos
CHARLES R. MARSH
estas palavras, traremos à sua consciência o verdadeiro significado do pecado. Um missionário veterano e trabalhador experimentado entre os Muçulmanos num mesmo país deve estar apto a prover o jovem missionário com um tal vocabulário. É da maior importância encontrar as palavras correctas no vernáculo pois o Árabe tem um vocabulário religioso muito diversificado. Eis alguns princípios gerais que devem ser usados como guião na apresentação do Evangelho aos Muçulmanos: 1. Devemos evitar condenar o Islão ou falar de modo pouco lisonjeiro acerca da pessoa de Maomé. Ao invés de criticar o Islão, devemos antes, com simpatia, compreendê-lo, colocando-nos nós próprios no lugar do Muçulmano. A atitude mais sábia é nunca permitir que se entre na discussão acerca da vida e carácter do homem que eles veneram como profeta. O nosso objectivo deve ser atrair o Muçulmano ao Senhor Jesus, mostrando-lhe que Jesus é uma Pessoa viva, capaz de salvar e de satisfazer o seu coração. O Senhor deu-nos um importante princípio de ensino ao dizer aos discípulos, nas suas regras de ouro básicas: «...pois não se colhem figos dos espinheiros, nem se vindimam uvas dos abrolhos.» (Lc. 6:44) Daqui retira-se que o que Ele quis ensinar é que os espinheiros e os abrolhos da controvérsia repelem, mas que toda a gente é atraída pelos frutos! Apontar a um Muçulmano as insuficiências da sua religião é o mesmo que estar a criar antagonismo com ele. Alguns Cristãos dizem aos Muçulmanos que a sua religião é uma religião de obras e que o homem apenas pode ser salvo pela graça de Deus. Insistem em afirmar que a forma de um Muçulmano orar não é, de modo algum, oração verdadeira e que o que Deus requer é um coração verdadeiramente 6
No original inglês lawlessness, que se pode traduzir por anarquia, sem lei. Achou-se preferível o termo desregramento pois atenta a conotação ética e moral que esta palavra indicia. (N. do T.)
27
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
28
contrito e arrependido e não o mero prostrar do corpo. E dirão mesmo que se Maomé fosse um verdadeiro profeta ele não teria tido tantas mulheres. A mensagem de tais Cristãos é negativa e crítica. O Muçulmano é, assim, repelido e molestado pelos abrolhos. O nosso objectivo deve ser, antes, apresentar a videira verdadeira de tal maneira que nele cresça o desejo de colher para ele próprio o fruto do Evangelho. A apresentação da verdade deve ser feita de uma forma positiva. Não devemos provocá-lo a ponto de lhe estimular uma resposta retaliatória. 2. Devemos ter sempre presente que um Muçulmano é um crente em um único e verdadeiro Deus e nas suas leis. As suas ideias podem ser falsas, mas um estudo cuidadoso dos noventa e nove nomes de Deus, que repete com a ajuda do seu rosário, mostra-nos que ele crê e adora o único e verdadeiro Deus, uma vez que estes atributos se encontram na Bíblia e no Alcorão. Deste modo, pode-se sempre falar com ele sobre Deus, a sua existência, poder, julgamentos, fidelidade e santidade. Ele sabe que Deus é omnipresente, omnipotente e omnisciente. Assim, nunca deverá ser tratado como um pagão, um agnóstico ou mesmo um idólatra. 3. No coração de cada verdadeiro Muçulmano há o temor de Deus. Este deve ser o ponto de aproximação mais importante. Ele não apenas crê em Deus de forma teórica, mas lá no mais íntimo do seu ser sabe que terá que se encontrar com Deus para o julgamento. Está perfeitamente cônscio das suas imperfeições e falhanços. Ele sabe que existe um inferno e receia ser lançado nele. Esta atitude de receio é bem expressa quando se prostra em oração, na atitude de um verdadeiro escravo que se submete ao seu senhor. Tudo isto contrasta totalmente com a atitude filial do crente em Cristo que sabe que Deus é o seu Pai Celestial; assim, onde existir este genuíno temor de Deus, temos a base para um apelo à consciência. O temor de Deus, que
CHARLES R. MARSH
começa a rarear no nosso país, hoje em dia, pode-se ainda encontrar em muitos dos países muçulmanos. Muitos poderão argumentar dizendo que isto é apenas uma forma de superstição; a verdade, porém, é que está lá e todo o trabalhador Cristão entre os Muçulmanos deve estar ciente do seu valor. 4. A maior parte dos Muçulmanos tem um certo senso do pecado. Normalmente, não existe uma convicção profunda do pecado, mas os Muçulmanos estão profundamente cônscios da sua incapacidade em alcançar os padrões de conduta requeridos por Deus. De alguma forma, a sua religião apela à sua consciência e à Lei de Deus, que ele sabe que transgrediu. Nas suas orações diárias ele implora por perdão e repete continuamente esta fórmula: «Peço o perdão de Deus.» (astaghafr Allah) Ele sabe quando fez mal e espera ser perdoado pela misericórdia de Deus. Ainda assim, ele sabe que pela sua religião não pode ter qualquer certeza de perdão ou remissão dos seus pecados. Apenas pode esperar. O facto, porém, é que este desejo pelo perdão dos seus pecados existe lá bem no íntimo do seu coração e, assim, podemos fazer uso disso. Tem pouca dificuldade em entender a natureza pecaminosa, maldosa, do homem — aquilo a que a Bíblia chama carne ou pecado. Isto poderá ser expresso de várias maneiras de homem para homem, usando palavras diferentes, mas em cada Muçulmano devoto há uma aguda consciência do mal que nele habita. Ele sabe que a sua natureza é má. Tendo um grande desejo de fazer o bem, é incapaz de o alcançar. Tenta, sinceramente, seguir o seu código moral, mas falha. E sabe que isso acontece por causa do seu coração pecaminoso. A resposta a essa sua profunda necessidade da alma está em Cristo. Tenhamos sempre isto em mente ao iniciarmos a nossa aproximação. 5. Pelas razões agora apontadas, tentemos esquecer que ele é um Muçulmano e lembremo-nos de que é um ser humano, tal como nós,
29
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
30
e um pecador. Os pecadores necessitam de um Salvador e só nós temos a mensagem que pode satisfazer esta necessidade. Como Muçulmano, ele tentará debater a sua religião, apontando as diferenças entre o Cristianismo e o Islão. Devemos procurar trazê-lo sempre de volta à consciencialização de que necessita de um Salvador, tentando evitar a discussão e fazendo apelo, antes de mais, não ao seu intelecto, mas à sua consciência. Devemos mostrar-lhe que a nossa fé é lógica. O homem deve ser alcançado na sua integralidade, os problemas teológicos devem ser tratados, mas a primeira preocupação deve ser a conquista do coração e da consciência. Uma característica dos Muçulmanos é que nunca têm vergonha de dizer no que crêem. Afirmam sempre de forma muito linear e categórica as suas convicções. Nunca hesitarão em tentar fazer com que o seu interlocutor repita a frase de confissão a Maomé, para o converter ao Islão. De igual modo, também admiram este zelo e esta franqueza — isto é, esta confissão pública da fé — nos outros. Assim, não se deve fazer qualquer tentativa de encobrimento das verdades da Bíblia, para as sombrear ou colorir de forma mais agradável e afeiçoada ao gosto pessoal de cada um, ou, tão-pouco, fazer com que essas verdades se encaixem com as crenças islâmicas. Islão e Cristianismo são diametralmente opostos e é impossível procurar uma fé comum fazendo a adaptação da Mensagem Cristã ao pensamento islâmico. Os Muçulmanos têm uma mente arguta e rapidamente descobrem qualquer tentativa feita com o objectivo de deturpar a verdade ou comprometer as convicções que se afirmam. O Dr. Zwemer, certa feita, afirmou que se pode dizer tudo a um Muçulmano desde que seja dito com amor e um sorriso. Eles têm muito respeito por um homem que, sozinho e no meio de uma multidão de Muçulmanos hostis, tem coragem para afirmar as suas convicções e contar toda a verdade. No entanto, é muito importante que
CHARLES R. MARSH
esta afirmação das convicções seja apoiada e sustentada por uma vida consistente. 6. É, também, muito importante lembrar que a mensagem que proclamamos é julgada pelo carácter do mensageiro que a proclama. De facto, numa primeira abordagem, tão importante é a mensagem como o mensageiro. E isto porque, no passado, com frequência, o mensageiro agia de forma tão contrária aos ensinos de Cristo que os Muçulmanos — ou outros — nem queriam ouvir a mensagem. O fruto do Espírito é amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, fidelidade, cortesia e autocontrole. Juntas, estas virtudes constituem o padrão para um carácter Cristão e apenas podem ser reproduzidas em nós pelo Espírito Santo. Por toda a parte, a Bíblia ensina que é o carácter do servo que conta. O carácter que conta, e que é respeitado pelo próximo, é o amor que permanece, apesar do seu ódio e amargura, que tudo sofre e é amável, tudo crê, tudo espera e tudo suporta; a alegria no Senhor, apesar de toda a sua oposição e perseguição; a paz de Deus, que tão pressurosamente almejam; a paciência perseverante que não desarma; a bondade manifesta em acções práticas, a que eles não conseguem opor qualquer resistência; a fidelidade à palavra dada; o homem a quem eles conhecem e que sabem em quem podem depositar toda a confiança, pois tem uma fé viva em Deus e na sua mensagem para eles; a simplicidade, quando confrontados com a sua arrogância; e o autocontrole, quando tentados a explodir-lhes na cara ao terem que suportar e ouvir os seus argumentos tolos e sem sentido. A tudo isto deve ser adicionado um espírito de reverência e sobriedade. Os Muçulmanos não entendem as emoções alegres que caracterizam alguns Cristãos. Um homem de Deus é alegre, no entanto deve ser sóbrio e reverente, especialmente quando fala das verdades de Deus. Tendo declarado tudo isto, podemos agora apresentar o princípio mais importante na nossa tentativa de aproximação e no nosso ensino.
31
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
32
7. Devemos fazer uso da verdade que ele já conhece para o levar a aceitar toda a verdade da Palavra de Deus. Deste modo, seremos capazes de encontrar muitos pontos de contacto ao explorarmos aquilo em que ele crê e que já conhece. Ele sabe que Deus é Luz e que não há n’Ele trevas algumas. Ele sabe que Jesus é o Filho de Maria. Está perfeitamente ciente de que um dos seus títulos é o Verbo divino (Kalimat Allah). Sabe que o Senhor Jesus Cristo virá em breve para reinar. Sabe que um homem se deve purificar para se aproximar de Deus, através da oração. Desta e de muitas outras maneiras, ele tem um vislumbre da verdade. Podemos agradecer a Deus por isso. Podemos felicitá-lo por aquilo que ele conhece e crê e então conduzi-lo às maiores profundezas da verdade. Logo no início poderá não querer aceitar o nosso ensino; mas de certeza que vai ficar a reflectir. Usemos, assim, a verdade que ele já conhece para o conduzir a uma verdade ainda mais profunda. 8. O próximo ponto extremamente importante a ter em mente é que o Muçulmano é sensível à linguagem do amor. Ele tem que ter a certeza de que nós nos preocupamos, de facto, com ele, enquanto ser humano, que o amamos e temos um genuíno apreço por si, pela sua pessoa, e não apenas pela sua condição espiritual. Em quase todos os casos de conversão de Muçulmanos ao Senhor Jesus, a primeira influência, que de forma mais perene nele perdurou, foi a demonstração do amor Cristão. Si Mebarek foi um jovem estudante Corânico que ensinava rapazes na mesquita a decorarem o seu livro sagrado. Assistiu a classes de Escola Dominical, durante muitos anos, mas os ensinos e a doutrina pouca influência exerceram sobre ele. Endureceu o seu coração para com o Evangelho e gozava com os professores. Ao atingir os dezoito anos, estava muito orgulhoso dos seus conhecimentos do Islão; então, foi certa noite visitar uma missionária a sua casa e pediu-lhe um Evangelho em árabe, dizendo-lhe que
CHARLES R. MARSH
gostaria muito de o ler novamente. A serva de Deus vibrou de emoção. Aqui estava uma resposta clara às suas orações: um jovem estudante islâmico buscando o Senhor. Si Mebarek tomou o Evangelho nas suas mãos, olhou-o de relance e, acto contínuo, com um olhar desafiador, rasgou-o em pedaços, lançou-o ao chão e espezinhou-o. Como reacção a um tal acto, esperava uma séria reprimenda por ter tratado a Palavra de Deus, enquanto tal, daquela maneira. Ao invés, viu lágrimas a assomarem aos olhos da serva de Deus, que, com um olhar de uma tristeza indefinível, mas de genuíno amor, se virou sem uma palavra. Foi para casa para orar por ele. Si Mebarek tomou o seu caminho para casa, mas aquela expressão de amor paciente de Cristo, da sua doçura e cortesia, de facto atingiu o seu coração. Em menos de uma hora, estava de volta para, agora, qual pecador convicto, receber a salvação. Aquela simples expressão de amor, por aquele que chorou sobre Jerusalém, realizou aquilo que anos de ensino e doutrinação nunca haviam alcançado. Tão importante é o mensageiro como a Mensagem. É nisto que os Cristãos têm falhado ao longo dos anos, especialmente desde a época das Cruzadas e até aos nossos dias. Alguns missionários ainda continuam a lutar contra o Islão com argumentação, exigências injustificáveis e ridicularia. É tão importante demonstrar este amor de uma forma prática, destruindo paulatinamente as barreiras existentes! Nunca tropeces no acto de deixar de saudar o teu amigo Muçulmano com um sorriso, mesmo em tempos de tensão política. Mostra simpatia em tempos de doença e luto. Pratica para com ele pequenos actos de serviço. Convida-o para ir a tua casa e aceita os convites que te fizer para ires à sua. Sê escrupulosamente honesto em todos os negócios que faças com ele. Mostra-lhe que ages sempre como um Cristão, mesmo nos detalhes mais ínfimos da tua vida. Se um lojista Muçulmano te der o troco errado, certifica-te de que lho
33
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
34
mostras sem quaisquer reservas. Sê respeitoso e presta-lhe honra quando a honra for devida. Mostra-lhe que o amas ao tentar entender o seu ponto de vista. Sê um bom ouvinte. Se há algo que Deus me ensinou, ao longo da minha vida e agora que sou velho, é a sabedoria de escutar pacientemente a outra pessoa, seja ele um jovem adolescente inglês ou um Muçulmano fanático. Se concordar com algo que ele diga e lhe quiser dirigir algumas palavras de apreço por isso, não hesite em fazê-lo — mas seja absolutamente sincero e transparente ao fazê-lo. Os Muçulmanos podem-nos ler como quem lê um livro e, frequentemente, os epítetos que colocam nos missionários que conhecem correspondem exactamente à impressão que estes lhes causam — sendo apropriados em extremo, muitas vezes... Lembre-se sempre de que o verdadeiro amor não esconde nem falseia a verdade. Você tem uma mensagem de amor para comunicar e transmitir. Antes de um Muçulmano conseguir aceitar e amar o seu Senhor, tem primeiro que aprender a amá-lo a si. Antes de confiar no seu Senhor, tem primeiro que ter a certeza que pode confiar em si. No final, lembre-se sempre de que o caminho de Deus é o amor. 9. A nossa ênfase final deve ser no trabalho e na obra do Espírito Santo. Devemos depender totalmente d’Ele para nos ensinar o que dizer, para trazer convicção de pecado e fé em Cristo, para criar uma nova vida e dar a certeza da paz. Sem isto, os nossos esforços redundarão em verdadeiros actos inúteis. (Jo. 16: 8-14)
COMPARTILHE A SUA FÉ COM UM MUÇULMANO
36