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Contexto, metodologia e fontes
É evidente que o antijesuitismo que ultrapassou os séculos não foi um movimento único e uniforme, nossa intenção nesta introdução é apenas demonstrar as diversas faces que esse movimento histórico assumiu com o passar do tempo. Porém, não deixamos de notar que sua estrutura argumentativa de ataques e acusações à Companhia de Jesus pouco se alterou, especialmente após a campanha pombalina. Os argumentos antijesuíticos, em sua maioria, foram baseados na origem estrangeira da Ordem, na sua autonomia e na capacidade de organização política e econômica, evidenciando uma dada autonomia em relação à estrutura burocrática da Igreja católica. No entanto, esse tema parece quase inesgotável, apontando sempre para novos direcionamentos. Desse modo, querendo apresentar ao leitor a nossa contribuição para o estudo do antijesuitismo, apresentamos, a seguir, nosso contexto, metodologia e principais fontes.
Contexto, metodologia e fontes
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Dentro da historiografia sobre o antijesuitismo, defendemos a tese de que o discurso antijesuítico pombalino, assim como suas leis para a Amazônia, não eram inéditos e nem ligados a determinada época, mas influenciados por uma intensa campanha ocorrida contra a Companhia de Jesus, na primeira metade do século XVIII. Essa campanha foi empreendida por Paulo da Silva Nunes, e teve duas frentes. A primeira ocorreu na Amazônia colonial, pelo menos desde o início daquele século, quando ele chegou ao Maranhão, no ano de 1707, junto com o novo governador, Cristóvão da Costa Freire (1707-1718), e durou até sua fuga para Portugal, em 1724. A segunda fase foi empreendida no reino, quando Silva Nunes passou a fazer campanha, junto ao rei e aos órgãos da administração colonial, para buscar “remediar” a situação de “ruína” do estado e de sua população. Essa fase durou de sua fuga, em 1724, até sua morte, em 1746.
Um dos objetivos principais deste livro é compreender o alcance do discurso antijesuítico nuneano na produção pombalina da segunda metade do século XVIII. Porém, não pudemos deixar de notar, por meio da análise das fontes, que deveríamos ir além da simples compreensão de tal influência.
de História, v. 52, dez. 2015. Disponível em: http://revistas.pucsp.br/index.php/revph/article/ view/24774. Acesso em: 16 jul. 2018, p. 80.
Fez-se necessário entendermos o percurso antijesuítico de Paulo da Silva Nunes e seus aliados, os governadores Bernardo Pereira de Berredo e Castro (1718-1722) e Alexandre de Sousa Freira (1728-1732) , como uma estratégia para a construção e implantação de um projeto de governo para o Maranhão e Grão-Pará, em muitos pontos conflitantes com aquele apresentado pela Corte à região. Desse modo, o antijesuitismo desses agentes estava para além das meras questões econômicas locais. Fazia parte de um projeto político maior, visando um Estado racional, administrativamente “enxuto” e comercialmente lucrativo. Por isso, não é de se admirar que Berredo fora tantas vezes repreendido pelo rei, por não colocar em prática na região as ordens expedidas pelo reino, pois as considerava inadequadas para aquela realidade. Além disso, Silva Nunes deixou claro, em vários documentos, que a inserção de escravizados de origem africana, como mão de obra no Maranhão e Grão-Pará, não era a solução para evitar a ruína da região38 .
As fontes indicam que o antijesuitismo na Amazônia portuguesa começou a tomar uma proporção mais acentuada e menos centrada em questões apenas locais, durante primeira metade do século XVIII. Nesse período, a Companhia de Jesus havia enriquecido de forma significativa39, chamando atenção da Coroa e aumentando a reclamação de uma boa parcela dos colonos. Foi nesse contexto que se destacaram os inimigos ferozes da Companhia de Jesus, responsáveis por realizar campanhas que, a exemplo do século XVII (1661 e 1684), pediam a expulsão dos padres das terras do Maranhão e Grão-Pará.
38 Embora não tenha ocorrido uma constância no envio de escravizados de origem africana para a
Amazônia durante o fim do XVII e a primeira metade do XVIII, existem várias recomendações de agentes régios para a inserção dessa mão de obra na região, como forma de sanar as contendas envolvendo a escravização do índio. “CARTA do comissário de diligências do Serviço Real nas capitanias do Maranhão e Pará, Francisco da Gama Pinto, para o rei [D. João V], sobre a prática do cativeiro dos índios contra o determinado as disposições régias. Belém do Pará, 21 de agosto de 1722”. (Avulsos do Pará). AHU, ACL_CU_013, cx. 7, doc. 608. PARA o Governador e Capitão-General do Maranhão. Sobre a Repartição do Negros se dever fazer com igualdade, ficando metade no Maranhão, e outra no Pará. (“Livro Grosso do Maranhão”, 2ª parte), 1948, p. 53-54. Anais da Biblioteca Nacional (ABN), vol. 67; PARA os oficiais da Câmara do Pará. Sobre o mesmo. (“Livro Grosso do Maranhão”, 2ª parte), 1948, p. 54. Anais da Biblioteca Nacional (ABN), vol. 67. Além desse tipo de petição as Terribilidades Jesuíticas estão repletas de documentos das
Câmaras municipais afirmando não haver condições de os moradores arcarem com as despesas relacionadas à aquisição de escravizados de origem africana. 39 ASSUNÇÃO, Paulo. Negócios jesuíticos: o cotidiano da administração dos bens divinos. 1ª ed.
São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2009.
Um desses inimigos públicos e notórios foi Paulo da Silva Nunes. Ele não restringiu sua atuação contra os jesuítas à colônia, fora ao Reino munido de representações e petições dos moradores da mesma, e se autointitulando para tal “Procurador dos Povos do Maranhão”. O ambiente de atuação desse agente esteve tomado de personagens emblemáticos na história do Maranhão e Grão-Pará, nesta primeira metade do século XVIII: os inimigos declarados da Companhia, Bernardo Pereira de Berredo, chamado de patrono de Silva Nunes, por tê-lo acolhido na Corte quando empreendera fuga da colônia, e Alexandre de Sousa Freire, governador após saída de Nunes, mas que possuía uma relação intima com o procurador e com Berredo, também compactuando de sua antipatia pelos jesuítas.
Porém, nem só de inimigos viveram os filhos de Santo Inácio. Com a saída de Berredo do cargo de governador, assumiu em seu lugar João da Maia da Gama (1722-1728), que levou consigo o desembargador sindicante Francisco da Gama Pinto para assentar o novo governo, e fazer devassa das denúncias de descimentos clandestinos de índios e das denúncias feitas contra os padres da Companhia. Destacamos ainda a atuação de Francisco Duarte dos Santos, enviado ao Maranhão e Grão-Pará para apurar as diversas denúncias e pedidos de Paulo da Silva Nunes. Esses agentes da Coroa, nos pareceres produzidos sobre a situação da população do Maranhão e Grão-Pará, em tudo deram razão aos padres da Companhia de Jesus, sob os mais diferentes aspectos. Claro que não podemos deixar de destacar o jesuíta mais atuante nesse interim: o visitador geral das missões, padre Jacinto de Carvalho, um árduo combatente das acusações desferidas por Silva Nunes e seus aliados.
Metodologicamente, podemos afirmar que este trabalho dialoga com as connected histories, pois, não compreendemos e nem trabalhamos com o discurso antijesuítico nuneano de modo isolado, mas procuramos examinar aquela produção discursiva como parte de um movimento maior – uma vez que havia uma grande circulação de ideias e pessoas entre os continentes, seria impossível realizar o estudo do discurso antijesuítico nuneano sem compreendê-lo como parte de um “Cenário planetário”, já que estas histórias “Estão ligadas, conectadas, e [...] se comunicam entre si”40. Optamos, dessa forma, por analisar diversas produções discursivas sobre os mesmos temas: legislação
40 GRUZINSKI, Serge. Os mundos misturados da monarquia católica e outras connected histories.
Topoi, Rio de Janeiro, v. 2, n. 2, p. 175-195, 2001, p. 176.
indígena, bens da Companhia de Jesus, aldeamentos jesuíticos, uso da Língua Geral, entre outros. Essa foi uma opção realizada em razão da nossa maior preocupação consistir em compreender os discursos que se apoiavam, se cruzavam ou se excluíam. Visando, assim, explicitar a rede discursiva constitutiva do antijesuitismo amazônico na primeira metade do século XVIII, que teria influenciado a produção pombalina a partir de 1750.
Para isso, utilizaremos a análise de discurso baseado no trabalho de Michel Foucault, que, ao estudar a história das relações entre a psiquiatria e a justiça penal, deparou-se com um dossiê sobre o caso do parricida Pierre Riviére. Tal escrito, por constituir-se de discursos de origens, formas e funções diversas (médicos, juristas, testemunhas e o próprio Rivière), foi considerado um tanto diferente dos outros documentos. Sobre os discursos que constituem o dossiê, Foucault ponderou que:
Todos falam ou parecem falar da mesma coisa: pelo menos é ao acontecimento do dia 3 de junho que se referem todos, esses discursos. Mas todos eles, e em sua heterogeneidade, não formam nem uma obra nem um texto. Mas uma luta singular. Um confronto, uma relação de poder, uma batalha de discursos e através de discursos41 .
Do mesmo modo, buscamos compreender o discurso sobre o antijesuitismo. Seus agentes também parecem tratar do mesmo tema: a suposta ruína que a atuação da Companhia de Jesus teria causado à colônia e ao Reino. Mas, igualmente, eles estavam travando “Uma luta singular, um confronto, uma relação de poder, uma batalha de discursos através de discursos”. Os jesuítas, tentando defender-se dos constantes ataques sofridos; Paulo da Silva Nunes, buscando pôr em prática seu plano de governo para o Maranhão e Grão-Pará; e os agentes reais, procurando meios de formular seus relatórios e pareceres sobre aquele embate para a Coroa. Todos travando batalhas discursivas que se cruzavam e entrecruzavam nas principais tópicas argumentativas, tal qual uma máquina de guerra.
41 FOUCAULT, Michel (Coord.). Eu, Pierre Rivière, que degolei minha mãe, minha irmã e meu irmão... um caso de parricídio do século XIX, apresentado por Michel Foucault; tradução de
Denize Lezan de Almeida. Rio de Janeiro: Edição Graal, 1977, p. XII.
Além dos elementos discursivos repetidos, também utilizamos longas e necessárias citações de alguns trechos documentais, principalmente nos capítulos referentes ao discurso produzido pelos nossos sujeitos históricos. Fizemos essa opção, pois, de forma consoante à Foucault, pretendemos [re] fazer “De algum modo o plano dessas lutas diversas, restituir esses confrontos e essas batalhas, reencontrar o jogo desses discursos, como armas, como instrumentos de ataque e defesa em relações de poder e de saber42”. Assim, buscando abranger a profusão de argumentos formados por religiosos e seculares, trabalhamos com discursos de vários agentes contrários e favoráveis à Companhia de Jesus para compreender a rede discursiva constituidora da pujança antijesuítica durante o século XVIII. Tais argumentos foram estudados a partir de um conjunto de fontes documentais, que nos permitiu analisar os principais argumentos do discurso antijesuítico construído na primeira metade do século XVIII e a atuação dos agentes dessa história no contexto social, econômico e político do final do século XVII e de boa parte do século XVIII.
A fonte basilar desse livro é a Coleção das Representações, Propostas, e Providencias, Sobre As ruinas, que aos Povos do Estado do Gram Pará, e Maranhão fizeram aos denominados Jesuítas, até o fim do Reinado do Senhor Rei dom João Quinto (1686-1755), que faz parte das Terribilidades Jesuíticas no Governo de D’El Rei dom João Quinto43 . Essa coleção de documentos presentes no Arquivo Histórico Ultramarino (AHU) foi digitalizada pelo Projeto Resgate. Ela é formada por três maços documentais compostos por cartas, traslados, petições e etc., todos fazendo referência direta ou indireta à atuação da Companhia de Jesus no Maranhão e Grão-Pará: os problemas relacionados ao uso da mão de obra indígena, o patrimônio jesuítico e a situação econômica da colônia.
Além das Terribilidades, trabalhamos outros escopos documentais presente no AHU. A caixa de documentos avulsos, especialmente referentes ao Maranhão e Grão-Pará, e o Registro de cartas régias para o governador e outras entidades do Maranhão dos anos de 1673 a 1726. Esse acervo digital nos permitiu compreender o cenário da primeira metade do século XVIII, dando-nos acesso às informações sobre Paulo da Silva Nunes antes do início de sua campanha. Assim como aos seus principais requerimentos e às cartas trocadas
42 FOUCAULT. Eu, Pierre Rivière, que degolei minha mãe, minha irmã e meu irmão..., p. XII. 43 Doravante, denominamos o referido documento de Terribilidades Jesuíticas.
entre ele e Alexandre de Souza Freire. Nesses documentos, pudemos analisar suas principais reclamações contra os jesuítas e o modo como Silva Nunes compreendia a realidade local, tanto no aspecto econômico, quanto no político. Além disso, esse corpus documental permitiu entrever a relação íntima entre o procurador e Alexandre de Souza Freire – que chegavam a tratar-se de “mui amado amigo” –, e as expectativas nutridas pelo governador do Maranhão sobre a empreitada de seu amigo em Portugal. Esses documentos nos revelaram ainda a contenda pessoal existente entre Freire e os padres da Companhia de Jesus, especialmente com Jacinto de Carvalho.
Através dos documentos do AHU, também conseguimos vislumbrar a complexa relação social e política desenvolvida entre o procurador e seus aliados, assim como entre os demais agentes que apoiavam a Companhia de Jesus, como João da Maia da Gama, o desembargador Francisco Duarte dos Santos e os próprios missionários. Conseguimos analisar a dinâmica entre a Coroa, os governadores do Maranhão e Pará, as Câmaras municipais e a população. Por exemplo, por meio de sua análise, compreendemos que a relação existente entre o governo de Berredo e as autoridades reinóis não foi pacífica, pois o governador agia de forma que desagradava ao rei, especialmente ao não cumprir suas ordens. Para o povo, Berredo agia como um “pai”; para a Corte, era desobediente e desrespeitoso. Além disso, a documentação nos revela a preocupação das Câmaras municipais com a utilização de escravizados de origem africana como mão de obra, especialmente diante da conjuntura econômica do Estado.
Outra coleção documental importante para nosso trabalho é o livro de Alexandre José de Mello Moraes, Chorografia histórica, chronográphica, genealógica, nobiliária e política do Império do Brasil, sobretudo os tomos III e IV. Essa obra possui uma gama diversa de documentos referentes à atuação de Paulo da Silva Nunes (cartas escritas pelo procurador às Câmaras de São Luís e Belém; pedido de ajuda pecuniária realizado às Câmaras por Bernardo Pereira de Berredo, para Paulo da Silva Nunes; Traslados das propostas do procurador e etc.) e, principalmente, as respostas dadas à Coroa pelos jesuítas e seus principais defensores, a respeito das queixas e acusações de Nunes. Por meio dela, tivemos acesso às defesas elaboradas pelos jesuítas João Teixeira e Jacinto de Carvalho, e aos pareceres solicitados pelo Conselho Ultramarino ao governador João da Maia da Gama e ao desembargador Francisco Duarte dos Santos.
Por isso, esse livro foi fundamental para nossa compreensão sobre a organização discursiva das acusações que sofreram os jesuítas, e de suas defesas.
Utilizamos, ainda que de forma mais secundária, documentos do Arquivo Público do Estado do Maranhão (APEM) e as fontes impressas contidas nos Anais da Biblioteca Nacional (ABN). Os documentos desses arquivos foram importantes para reconstruirmos a legislação a respeito da liberdade do índio, assim como para entendermos as flutuações e modificações realizadas nessas leis entre o final do século XVII e o século XVIII.
Para analisarmos o período pombalino na Amazônia, utilizamos a coletânea de cartas trocadas entre Pombal e seu irmão, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, organizada em um livro por Marcos Carneiro de Mendonça e publicado pelas edições do Senado Federal, em 2005, com o título de A Amazônia na era pombalina, Tomos I, II e III. Além disso, trabalhamos com o Diretório dos Índios e as obras Erros ímpios, e sediciosos, de 1759, e Relação abreviada, de 1757, ambas com sua autoria atribuída ao marquês de Pombal. Através desses documentos, buscamos traçar um paralelo entre a produção discursiva de Paulo da Silva Nunes e as leis e catecismo antijesuítico pombalinos.
É importante apontarmos que os elementos discursivos encontrados nos documentos não se configuram inéditos. Ao contrário, eles se repetem e se assemelham até mesmo na estrutura, sofrendo, segundo José Eduardo Franco, um “Processo mimético da repetição”. Porquanto, muitas “Ideias forças estruturantes do mito e a sua roupagem linguística argumentativa fundamental acabam por se tornar repetitivas44”. Assim, perquirimos os argumentos basilares do enunciado antijesuítico amazônico para compreendermos como a situação daquela região foi representada e compreendida na documentação. Entendemos que a estrutura da linguagem e todas as noções substanciais formam um sistema constituído por pares contrastantes, cujos integrantes constituem uma relação indissolúvel e recíproca, nos permitindo apreender “As formas e o tipo de interação verbal em ligação com as condições concretas em que se realiza45”. Dentre os pares, destacamos os seguintes: sucesso da missão e ruína do estado, liberdade dos índios e escravidão indígena, administração temporal e administração espiritual, bem público e bem particular. Enfim, essa
44 FRANCO. O Mito dos Jesuítas em Portugal, no Brasil e no Oriente (Séculos XVI a XX), vol. I, p. 27. 45 BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Editora Hucitec, 1986, p. 124.
documentação nos auxiliou a perceber o arranjo dos elementos formadores do antijesuitismo, considerando os diferentes escritos, não apenas como parte das ideias e concepções dos inimigos declarados da Companhia de Jesus, mas como elemento de um ideário social pertencente a um período concreto. Pois, “Cada época e cada grupo social tem seu repertório de formas de discurso na comunicação sócio-ideológica46”.
Para dar fluidez ao texto, dividimos este livro em cinco capítulos. No primeiro, intitulado Portugal e Amazônia na primeira metade do século XVIII, analisamos as mudanças ocorridas na época, convencionalmente conhecida como Moderna, principalmente o fim do século XVII e a primeira metade do XVIII, quando os iluminismos tomaram forma, pois entendemos que o antijesuitismo se acirrou nesse contexto. Também buscamos conhecer as transformações sociopolíticas ocorridas nos longos reinados de D. Pedro II (1667-170647) e D. João V (1706-1750), tanto na Corte quanto na região amazônica, perquirindo a tentativa de racionalização das políticas portuguesas.
No capítulo seguinte, Os projetos do secretário de Estado Sebastião José de Carvalho e Melo para Portugal e para Amazônia, continuamos estudando as políticas empregadas pelos reis portugueses. Mas nos centramos na segunda metade do século XVIII, especialmente nas políticas e práticas pombalinas, pois, a partir delas, nos foi possível analisar os elementos formadores do Iluminismo luso. Além disso, visando entender as rupturas e permanências na construção desse movimento em Portugal, pesquisamos os conceitos de pombalismo e jesuitismo. Trabalhamos ainda com as políticas pombalinas postas em práticas na Amazônia portuguesa através de Francisco Xavier de Mendonça Furtado, meio-irmão do marquês de Pombal, assim como procuramos compreender como tais medidas geraram graves conflitos com a Companhia de Jesus.
Fizemos essa análise das políticas, empregadas nos reinados portugueses entre o fim do século XVII e o século XVIII, para analisarmos as ações e propostas de Paulo da Silva Nunes, assim como as ações e reações dos jesuítas e de seus aliados. De fato, compreendemos haver uma forte ligação entre esses cenários: as mudanças na legislação, especialmente a indígena, e a campanha de Paulo da Silva Nunes. Desse modo, no terceiro capítulo, intitulado Os padres
46 BAKHTIN. Marxismo e filosofia da linguagem, p. 43. 47 De 1667 a 1683, D. Pedro segurou a regência para seu irmão, D. Afonso IV, forçado a renunciar.
Já como príncipe regente, o futuro D. Pedro II deteve o poder político.
da Companhia e o procurador dos povos do Maranhão e Grão-Pará, discutimos os posicionamentos dos diversos grupos sociais existentes na Amazônia portuguesa em relação à atuação da Companhia de Jesus e de seu opositor: o procurador autoproclamado das Câmaras de Belém e São Luís, Paulo da Silva Nunes. Analisamos a existência de diversas disposições controversas e intrínsecas a um mesmo grupo social, por exemplo, o posicionamento das referidas Câmaras e o dos principais membros da governança em relação à campanha do procurador na Corte.
No capítulo seguinte, Os argumentos e propostas de Paulo da Silva Nunes, optamos por estudar o cerne da documentação produzida por Paulo da Silva Nunes, com destaque à correspondência que ele trocou com Alexandre de Souza Freire, no período em que realizou sua campanha na Corte. É nessa documentação que encontramos os “remédios” propostos pelo procurador para tirar a colônia do suposto estado de “ruína” em que, segundo ele, se encontrava, além das denúncias contra as ações “despóticas” dos jesuítas. Acreditamos que os capítulos terceiro e quarto dialogam entre si, à medida que costuram a ideia de um projeto político pensado por Nunes e seus aliados para a região.
No entanto, o capítulo central deste livro é o quinto, Os escritos amazônicos e a síntese antijesuítica de Pombal, colocado propositalmente como o último. Nele, após estudarmos os contextos que compõem o nosso objeto de estudo, buscamos apontar os paralelos existentes entre a argumentação nuneana e pombalina no tocante às políticas e ações antijesuíticas indicadas para a Amazônia lusa e à produção discursiva antijesuítica pombalina. Para isso, primeiro analisamos a composição das Terribilidades Jesuíticas, um dos documentos-chave desta pesquisa, para entendermos a sua formação discursiva, visto ser esse corpus documental constituído por diversos gêneros textuais – cartas, ofícios, leis, entre outros – com finalidades, interlocutores e contextos diversos. Por fim, traçamos um paralelo entre a produção discursiva nuneana e a pombalina, visando perceber a influência do primeiro sobre o segundo.
Após apresentarmos o objeto deste livro, convidamos os leitores a percorrerem esse caminho conosco.
Boa leitura!