SÍNTESE DE JORNAIS E REVISTAS 11 DE DEZEMBRO DE 2014
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Indústria completa em outubro 37 meses seguidos de demissões PEDRO SOARESDO RIO Com o fraco desempenho da produção e o pessimismo de empresários, o emprego na indústria voltou a cair em outubro. O número de pessoas ocupadas no setor recuou 0,4% ante setembro. Foi a sétima taxa negativa seguida nessa base de comparação, segundo dados do IBGE. Nesse período contínuo de queda, o emprego acumula uma perda de 3,9%. Em relação a 2013, o cenário também é negativo e a indústria completou, em outubro, 37 meses consecutivos nos quais as demissões superam as contratações. Na comparação com outubro do ano passado, o emprego teve queda de 4,4%. Foi o tombo mais intenso desde outubro de 2009 (-5,4%), período em que o país vivia o auge dos impactos da crise global na economia doméstica. Com esse resultado, o total do pessoal ocupado assalariado também recuou, 3%, no acumulado de 2014. Já a taxa acumulada nos últimos 12 meses registra uma queda de 2,8% e manteve a trajetória descendente iniciada em setembro do ano passado --desde então, todos os resultados são negativos. O emprego na indústria cai na esteira da menor confiança de empresários com os rumos da economia, em razão da freada do consumo, da maior concorrência com importados e da dificuldade para exportar. SEM REAÇÃO As contratações no setor não reagiram nem com a melhora da produção no terceiro trimestre, quando a indústria foi destaque do PIB. É que empresários não enxergaram na melhora uma retomada mais consistente. Pelos dados do IBGE divulgados nesta quarta (10), o valor da folha de pagamento real dos trabalhadores da indústria (indicador do salário no setor) cresceu 1,1% de setembro para outubro. O resultado, porém, não recupera totalmente a perda de 1,3% de setembro sobre agosto. Com a deterioração do emprego, está cada vez mais difícil para as categorias da indústria obter reajustes acima da inflação. Outro sinal ruim é que os empresários têm cortado horas destinadas à produção diante da demanda mais fraca, sinalizando que o emprego, em 2015, não deve reagir. Em outubro de 2014, o número de horas pagas aos trabalhadores da indústria, já descontadas as influências sazonais, recuou 0,8% ante setembro. Foi a sexta taxa negativa consecutiva, acumulando perda de 4,1% nesse período. Os dados mostram que, se uma retomada da produção vier, os empresários ainda têm "gordura" antes de contratar. Vão aumentar as horas destinadas à produção com os empregados que já estão nas fábricas. Desse modo, e diante da expectativa de um 2015 ainda difícil para a indústria, empresários não vislumbram uma melhora das contratações do setor.
Indústria está super estocada, apesar dos ajustes já feitos Por Arícia Martins | De São Paulo Plano de demissões voluntárias, redução de jornada e flexibilização de benefícios. A fabricante de veículos comerciais MAN tem tentado fazer ajustes para poupar empregos e sustentar o plano de investimentos de R$ 1 bilhão iniciado em 2012 e previsto para ir até 2016, mas, ainda assim, num ano que surpreendeu a empresa de forma negativa pelas baixas vendas, está com 2
estoques bastante elevados. A situação da empresa revela o que vive boa parte do setor industrial do país, cujo período de ajustes, com demissões e fraco ritmo de produção, ainda não foi suficiente para reduzir os estoques, que seguem expressivos. Na média de outubro e novembro, 7 dos 14 ramos industriais pesquisados pela Fundação Getulio Vargas (FGV) na Sondagem Conjuntural da Indústria de Transformação apontaram um volume acima do normal de mercadorias paradas. O quadro é mais preocupante nas categorias de bens de capital e de bens duráveis, nas quais a fatia de empresários que considera o volume de estoques como excessivo ficou em 26,6% e 44,8% em novembro, respectivamente, acima da parcela de 13,3% na média de todos os gêneros industriais. Esses dois setores vêm indicando mercadorias paradas em excesso desde o segundo semestre de 2013. No total da indústria de transformação, a diferença entre a proporção de empresas com estoques excessivos e insuficientes diminuiu no período, de 14,5 pontos percentuais em outubro para 11,6 pontos no mês passado. Mesmo com essa redução, no entanto, o setor manufatureiro segue superestocado no conceito da FGV, que avalia os inventários como fora da normalidade quando esse diferencial supera dez pontos. Segundo Aloisio Campelo Jr., superintendente-adjunto de ciclos econômicos da FGV, houve reequilíbrio nos segmentos de bens intermediários e bens de consumo não duráveis. Os ramos industriais que dependem mais da confiança e dos juros, no entanto, continuam com acúmulo de estoques, o que deve segurar a produção ao menos até o primeiro trimestre de 2015. A piora em bens duráveis foi puxada principalmente pelo setor de material de transporte, cujo indicador de estoques é o maior entre todos os ramos industriais (143,9 pontos). O dado ruim está em linha com os números da Anfavea. De acordo com a entidade que reúne as montadoras, 414,3 mil veículos estavam parados nos pátios em novembro, quantidade equivalente a 42 dias de vendas. "Nos bens duráveis, há um cenário de dificuldade para que o setor consiga reequilibrar seus estoques", avalia Campelo, devido a uma série de fatores, como a maior cautela do consumidor, a possibilidade de retirada dos descontos no IPI dos carros na virada do ano e, do lado do governo, a sinalização de que os juros devem continuar subindo e de que a política fiscal não será anticíclica em 2015. Para Thovan Caetano, da LCA Consultores, além da fraqueza doméstica, o setor externo também explica o maior acúmulo de estoques do setor automobilístico. Caetano diz que, de janeiro a outubro deste ano em relação a igual período do ano passado, o volume exportado de veículos de passageiros caiu 40,6%. Já o de veículos de carga diminuiu 25%, enquanto as vendas externas de tratores encolheram 15,5%. "Tanto a demanda interna como a externa estão em nível decepcionante", afirma ele. Este cenário atinge empresas como a MAN. O presidente empresa, Roberto Cortes, afirmou, em entrevista ao Valor no início deste mês que os ajustes de produção feitos até agora não foram suficientes para normalizar os estoques A fabricante de veículos comerciais da marca Volkswagen trabalha com um giro de vendas de 45 dias quando o normal seria um giro de 25 dias. De acordo com o executivo, o volume de estoques pode aumentar ainda mais se o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), do BNDES, que financia máquinas e caminhões a juros atrativos, não for renovado. No segmento de máquinas e equipamentos, muitas indústrias trabalham sob encomenda, o que não impediu que estoques fossem acumulados nos distribuidores. É o que relata Edgard Dutra, diretor da Metalplan, fabricante de compressores de ar. 3
"Não tenho esse problema, mas meus distribuidores estão com estoques cheios. Antes compravam 40 compressores de uma vez e isso não está mais acontecendo", afirma Dutra, que está com a carteira de pedidos baixa devido à situação do varejo. Segundo o empresário, mesmo aqueles que conseguiram reequilibrar o nível de inventários não estão fazendo novas encomendas, porque temem ficar superestocados novamente. Outro setor relacionado aos investimentos em capital fixo que relatou estoques acima do normal em novembro foi o de material de construção. Segundo a sondagem da FGV, o percentual de empresários do segmento que avalia o nível atual de inventários como excessivo saltou para 15,5% no mês, ante 4,8% em outubro. Para Walter Cover, presidente da Abramat, que reúne as indústrias do setor, a frustração com a demanda está por trás do dado. No início do ano, a expectativa era de alta de 4% do faturamento em 2014. Hoje, a estimativa é de queda de 5%. "As empresas acreditaram que o ano seria bom e mantiveram seu nível de produção. A partir de junho, percebemos que o ano seria ruim, e os estoques foram aumentando", diz Cover, para quem pode haver uma redução do nível de mercadorias paradas em dezembro, com a aceleração das vendas do varejo, influenciadas pelas reformas dos imóveis no fim de ano. Para a LCA, o PIB da construção civil vai cair 4,6% em 2014, e recuar novamente em 2015 (1,7%), cenário relacionado ao enfraquecimento da demanda. Caetano nota que, no segmento de minerais não metálicos, que engloba insumos como cimento e areia, há 21 pontos a mais de empresas superestocadas do que com estoques insuficientes. Neste ano, diz, esse setor foi prejudicado pela desaceleração do mercado imobiliário, com menor ritmo de vendas, lançamentos e financiamentos habitacionais. Em 2015, a expectativa é que o ajuste fiscal a ser implementado pelo governo tenha impacto negativo sobre os investimentos públicos. De forma geral, Caetano avalia que os estoques vão "atrapalhar bastante" a recuperação da indústria em 2015, sobretudo no começo do ano, dado que o setor manufatureiro está enfrentando estoques altos há um período longo e de forma mais disseminada. "Muito provavelmente teremos um resultado ruim da indústria no primeiro trimestre." (Colaborou Victória Mantoan)
Pesquisa mostra redução no custo da mão de obra e fechamento de vagas Por Denise Neumann | São Paulo Dados da Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salário (Pimes), do IBGE, mostram que a indústria está reduzindo o custo de mão de obra. Na comparação com 2013, desde junho a indústria gasta menos mensalmente do que em igual período do ano passado com a folha de pagamentos. A principal razão para essa economia decorre da redução do emprego. As demissões, contudo, não são a única razão do controle de gastos. O aumento real pago a quem continua empregado tem diminuído e é o menor (olhando para o acumulado em 12 meses) desde o início de 2010. Nos 12 meses encerrados em outubro, a folha real de pagamentos por trabalhador (dado que reflete o salário médio) estava 2% maior do que nos 12 meses encerrados em outubro de 2013 4
na indústria. Um ano antes, o ganho individual era muito maior, de 4,6%. A última vez em que os ganhos reais individuais ficaram abaixo de 2% foi em meados de 2010. A redução dos gastos com pessoal é um movimento já consistente na indústria, de acordo com a Pimes. Além de aparecer na comparação mensal (onde a queda no gastos com a folha total de pagamentos salariais foi de 2,3% em outubro na série sem ajuste sazonal e de 1,6% com ajuste), a redução de custos já aparece também no acumulado em 12 meses, onde alcançou 0,8% no mesmo mês. O menor aumento individual pode estar sendo provocado por dois movimentos: alta real menor nas negociações coletivas (o que aconteceu ao longo deste ano) e demissão mais concentrada nos salários maiores (que puxam a média para baixo). Qualquer que seja a causa, contudo, como a indústria também elevou a produtividade no período (de janeiro a agosto o número de horas pagas caiu 3,6% e a produção recuou 3%), os dados sugerem redução de custos a favor de melhor rentabilidade, ou, pelo menos, de uma perda menor dela.
CMN deve aumentar TJLP ainda este ano para vigorar no início de 2015 Por Claudia Safatle | De Brasília O Conselho Monetário Nacional (CMN) deve aumentar ainda este ano a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), hoje de 5% ao ano, para vigorar no primeiro trimestre de 2015. Essa é uma das medidas importantes na área fiscal. Os novos ministros da Fazenda e do Planejamento, Joaquim Levy e Nelson Barbosa, respectivamente, vão ser empossados junto com os demais ministros em janeiro, mas se não influírem na decisão da última reunião do CMN este ano, uma elevação da taxa de juros que baliza os empréstimos do BNDES só sairia em março do próximo ano. A equipe que assume o comando da economia a partir de 2015 não pretende fazer novas transferências de recursos para o BNDES, mas o fim dos aportes de recursos públicos para prover os bancos públicos não resolve toda a história. Será necessário também reduzir os subsídios à taxa de juros dos empréstimos feitos pelo BNDES às empresas (calculado pelo diferencial dos juros de captação e de aplicação do Tesouro). Segundo os anexos relativos a benefícios creditícios e financeiros que acompanham a proposta de Orçamento da União para o próximo ano, em tramitação no Congresso Nacional, a previsão é gasto de R$ 24,33 bilhões com o diferencial de juros (entre a taxa Selic e a TJLP) mais R$ 6,24 bilhões em subsídios ao Programa de Sustentação do Investimento (PSI). Este ano a soma dos dois deve consumir cerca de R$ 25,3 bilhões. Em 2013, essa conta chegou a R$ 10,75 bilhões, e em 2012, a R$ 12,4 bilhões. Em quatro anos, portanto, segundo a estimativa do governo, os subsídios relativos aos empréstimos de R$ 430 bilhões da União ao BNDES e os benefícios ao PSI totalizaram uma despesa de mais de R$ 68 bilhões. Antes de ser escolhido ministro, Barbosa apresentou uma proposta de elevação gradual da TJLP para a taxa de crescimento esperada do Produto Interno Bruto (PIB) nominal dos próximos quatro anos. Estável em 5% ao ano desde janeiro de 2013, a TJLP vem abrindo uma grande diferença em relação à taxa Selic, que hoje é de 11,75% ao ano, engordando a cada dia mais a conta de subsídios. Pelos mais de R$ 400 bilhões recebidos como aporte de recursos do Tesouro Nacional, o BNDES paga TJLP. O custo de captação do Tesouro, por outro lado, já é de 11,75%. 5
A migração da TJLP para o patamar do PIB nominal, pela proposta de Barbosa, ocorreria em um prazo de dois anos e cortaria à metade o custo de carregamento dos empréstimos da União aos bancos públicos e ainda manteria um considerável subsídio ao investimento, pois o custo de captação do Tesouro Nacional é, em geral, maior do que o crescimento nominal da economia. Apesar da ordem de grandeza dos recursos colocados no BNDES à disposição das empresas e com juros subsidiados, a taxa de investimento pouco se alterou. Ao contrário, vem caindo. Uma escalada de riscos nos mercados globais Por diversos caminhos, cresce a percepção de risco dos investidores. A onda de incertezas criada com a perspectiva de normalização da política monetária nos EUA cresceu com a contínua queda dos preços do petróleo - boa para o crescimento global, ruim para países importantes como a Rússia e péssima para a pré-falimentar Venezuela -, indícios de desaceleração maior na China e, agora, sinais de sérios problemas na Grécia - estopim da crise da dívida soberana no euro. Após anos de terrível austeridade na zona do euro, hoje estagnada, a insatisfação política pode ressurgir no primeiro plano. A ameaça de uma vitória eleitoral da extrema-esquerda na Grécia pode ser apenas preâmbulo de mudanças políticas em economias mais importantes, como a Espanha, onde o Podemos, força independente dos partidos tradicionais, desmoralizados com a crise, como o Popular e o Socialista, sobe sem parar em popularidade, preparando-se para eleições em 2015. Risco político corre também a "Abenomics" do primeiro ministro japonês Shinzo Abe, ao convocar uma eleição antecipada para renovar o apoio, no início esmagador, a seu problemático e ousado programa econômico, que sofreu alguns reveses nos últimos meses. O primeiro ministro Antonis Samaras colocou novamente a Grécia no centro das atenções dos investidores, ao convocar eleição antecipada no Congresso para a escolha da decorativa figura de presidente. A situação é delicada, pois o governo negocia a última parcela do pacote de salvamento de € 245 bilhões, hoje maior, em valores correntes, do que o próprio PIB grego. Do outro lado da mesa estão Banco Central Europeu, Comissão Europeia e Fundo Monetário Internacional, com mais exigências de cortes de gastos e reformas. E, no Parlamento, reforçado pela vitória nas eleições para o Parlamento Europeu, o Syriza, que promete renegociar os termos dos pacotes financeiros, colocar um ponto final nos programas de austeridade de Samaras e, por exemplo, conceder 50% de aumento ao salário mínimo e energia de graça para os gregos mais pobres, entre várias outras bandeiras populares. Samaras quer o máximo de apoio político que possa obter para fechar negociações com a "troika" e suas medidas de aperto. Precisará de apoio de 180 parlamentares, tem 155, e só com grande esforço poderá reunir o número necessário. Se não conseguir - tem três etapas para isso, em 17, 23 e 29 de dezembro - eleições gerais poderão colocar a legenda esquerdista no comando do país. Se isso ocorrer, a questão da ruptura da zona do euro ressurgirá na ordem do dia. O anúncio da eleição antecipada jogou os títulos soberanos da Grécia a 8% e fez a bolsa de Atenas cair 12,8%, no maior tombo desde 1987. Os títulos alemães de 10 anos voltaram a captar a fuga dos riscos, com os rendimentos caindo abaixo de 0,7%. As chances da esquerda grega são alimentadas pelos mesmos fatores que se espalham pelo bloco monetário - estagnação, alto desemprego e o perigoso deslizar para a deflação. Ao detonar a crise do euro em 2009, a Grécia foi o país que mais sofreu para se reerguer, dada a magnitude de seus problemas. O PIB caiu por cinco anos seguidos, encolheu 28,5% e voltou a crescer este ano 0,6%, na estimativa do FMI. Com 27,3% da força de trabalho desempregada e 6
deflação no ano (-0,8%), o país, apesar de todo o esforço, terá dívida de 174% do PIB, ainda a maior da Europa. A melhoria econômica da Grécia, ainda que instável, será colocada em xeque com a vitória do Syriza, expressão de rejeição popular aos pacotes draconianos que vem sendo executados. A "troika" deve levar isso em conta e pode tornar mais flexíveis suas exigências, como foi feito com a dilatação do prazo para redução da meta fiscal de Itália e França. Diante de difíceis decisões de rumos de seu programa de relaxamento monetário, sobre os quais não há consenso, a última coisa que o BCE necessita é de uma recidiva da crise grega, que pode ser o estopim de outras reviravoltas políticas. Grande parte dos governos trocaram de comando sob o peso do ajuste, e não se pode dizer que agora os partidos no poder na Itália, França e Espanha, gozem de boa popularidade. O ano termina com sobressaltos nos mercados, prometendo emoções mais fortes em 2015 quando o Fed finalmente deixar para trás a era dos juros perto de zero.
Muito além da carga tributária Por José Carlos Gerardo A equivalência ricardiana preceitua que a ampliação da despesa pública será financiada ou pela elevação da carga tributária ou via aumento do endividamento público. Como a dívida apenas posterga os impostos para o futuro, os contribuintes se antecipariam à subida dos impostos, aumentando sua poupança, adquirindo títulos da dívida pública. Os efeitos sobre a economia, decorrentes do financiamento da despesa pública por dívida pública, seria equivalente ao financiamento via impostos dado que a riqueza do setor privado não seria afetada. Por este raciocínio a conexão entre o financiamento da despesa pública ou pela expansão da carga tributária contemporânea ou via endividamento público - elevação da carga tributária no futuro, ceteris paribus - seria uma questão aritmética, certo? Errado! O problema dessa concepção é que, implicitamente, assume-se como iguais a carga tributária e as receitas fiscais. Há, no entanto, diferenças nos conceitos e as receitas fiscais, recentemente, têm crescido substancialmente devido a ampliação de algumas receitas que não compõem a carga tributária, como royalties sobre o petróleo e dividendos, classificados na contabilidade pública como receitas patrimoniais. Comparando as receitas fiscais primárias, utilizadas na apuração do resultado primário do setor público - Resultado do Tesouro Nacional, Execução Orçamentária dos Estados e Finanças do Brasil - FINBRA (municípios) - verifica-se que o total destas receitas para o período 20082012 foi de, em média, 36,7% do Produto Interno Bruto (PIB) ao ano. Já a carga tributária apurada pela Receita Federal, no mesmo período, foi de, em média, 34,5% do PIB ao ano. As receitas fiscais foram superiores à carga tributária em 2,2 pontos percentuais do PIB, devido principalmente ao maior patamar das receitas fiscais quando comparadas à carga tributária. A diferença seria ainda maior caso algumas receitas parafiscais, oriundas do FGTS e do Sistema S, não fossem incluídas no cômputo da carga tributária. Para que se tenha ideia da magnitude dos valores envolvidos, em 2012, do total da carga tributária de R$ 1,575 trilhão (35,86% do PIB) as receitas parafiscais totalizaram R$ 99,3 bilhões (2,26% do PIB), dos quais R$ 85,8 bilhões referentes ao FGTS e R$ 13,5 bilhões ao 7
Sistema S. Além dessas receitas são consideradas na carga tributária, e não computadas como receitas fiscais, as contribuições patronais para o regime próprio de previdência dos servidores, que somaram R$ 13,5 bilhões (0,31% do PIB), e elevam para R$ 112,8 bilhões (2,57% do PIB) as rubricas da carga tributária não computadas nas receitas fiscais. Já as receitas fiscais totalizaram em 2012 R$ 1,660 trilhão (37,8% do PIB), valor R$ 84,7 bilhões superior à carga tributária. Somados aos R$ 112,8 bilhões, as receitas fiscais não elencadas como carga tributária totalizam R$ 197,5 bilhões - 4,5% do PIB. Deste valor são receitas fiscais da União R$ 123,2 bilhões (2,8% do PIB), compostas por: R$ 35,7 bilhões da cota parte de compensações financeiras, que inclui royalties sobre o petróleo; R$ 28 bilhões pagos à União como dividendos e R$ 63,7 bilhões referentes a outras receitas, tais como multas e demais receitas arrecadadas pela União não classificadas como carga tributária. Nos Estados e municípios compõem as receitas fiscais exclusive a carga tributária: R$ 42,9 bilhões (0,98% do PIB) e R$ 31,4 bilhões (0,72% do PIB), respectivamente. Para o ano de 2013, as receitas fiscais atingiram R$ 1,840 trilhão, o equivalente a 38% do PIB. O crescimento das receitas fiscais foi maior na União, que passou de R$ 1,062 trilhão (24,2% do PIB) para R$ 1,181 trilhão (24,4% do PIB) entre 2012 e 2013 - crescimento de 0,2 ponto percentual do PIB no período. Nos Estados, as receitas fiscais foram de R$ 468,9 bilhões (10,7% do PIB) para R$ 522,7 bilhões (10,8% do PIB), crescendo 0,1 ponto percentual do PIB no período. Nos municípios, a receita fiscal foi de R$ 136,6 bilhões (2,8% do PIB) - em 2013 e exibiu decréscimo anual de 0,1 ponto percentual do PIB, quando comparada aos R$ 128,4 bilhões (2,9% do PIB) de 2012. Considerando-se que o crescimento da arrecadação federal foi de apenas 0,67%, em termos reais, até setembro, a carga tributária deve manter-se no mesmo patamar em 2014. A boa notícia é que a carga tributária, descontada as receitas extraordinárias advindas do Programa de Recuperação Fiscal (Refis) promovido pela Receita Federal em 2013 (e também em 2014), é estruturalmente menor do que o valor a ser divulgado - que só em 2013 foi de R$ 21,8 bilhões, ou 0,45% do PIB. A má notícia é que dada a rigidez das despesas devido às vinculações de receitas e despesas semi rígidas (Bolsa Família e demais políticas sociais) que consomem cerca de 93% das receitas, sem contar demais despesas com custeio e investimento, é inevitável a elevação da carga tributária, em patamar até superior ao obtido via Refis. Devido tanto ao baixo crescimento econômico quanto à pequena expansão da produção de petróleo, tanto as receitas com dividendos como aquelas provenientes de royalties serão, mantida a atual dinâmica de crescimento das receitas fiscais no ano vindouro, insuficientes para gerar quaisquer resultado primário positivo. Ante tal cenário a questão é definir se o financiamento das despesas será efetuado via elevação dos tributos ou expansão do endividamento público, o que, na validade da equivalência ricardiana, traduz-se ou em elevação da carga tributária no presente ou no futuro. A outra possibilidade seria a expansão das receitas fiscais que não compõem a carga tributária. Tal escolha, no entanto, não prescindiria da elevação do endividamento no curto prazo. De qualquer forma, independentemente da opção adotada, haverá crescimento da participação do Estado na economia, pois haverá expansão da carga fiscal.
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As primeiras escolhas Por Mário Mesquita As primeiras escolhas de um governante frequentemente dão a tônica de todo um mandato. Nesse sentido, a julgar pela sinalização inerente na montagem da nova equipe econômica, a presidente Dilma prepara uma substancial inflexão de política. Tal inflexão esteve longe de ser sinalizada na campanha eleitoral e tem provocado espanto na direita e mal-estar na esquerda. No entanto, é razoável considerar que o movimento nada mais é do que um retorno ao consenso social-democrata estabelecido por seus antecessores imediatos. O cerne desse consenso é a ideia que o avanço nas conquistas sociais não pode ocorrer sem estabilidade macroeconômica. Para reforçar as fundações da estabilidade, o novo governo irá se nortear, ao que parece, no lado fiscal, por uma agenda de recuperação da transparência e credibilidade. Essa agenda já foi evidenciada, por exemplo, na adoção das projeções consensuais sobre crescimento do PIB como premissas para a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2015. Além disso, a entrevista do ministro indicado para a Fazenda, Joaquim Levy, aponta para uma trajetória ascendente do superávit primário de cerca de zero em 2014 para 1,2% do PIB em 2015 e para pelo menos 2% a partir de 2016. As declarações do futuro ministro apontam também para uma bem-vinda mudança de foco na política fiscal, da dívida líquida para a bruta, que não desconta ativos de qualidade heterogênea - a primeira iniciativa nesse sentido deve ser uma tardia elevação da TJLP e a consequente redução da despesa com crédito subsidiado. À primeira vista, a meta fiscal para 2015 parece desafiadora, mas factível. Assumindo que o esforço parta de um resultado primário recorrente de -0,2% do PIB em 2014 (o que seria até otimista do ponto de vista de alguns observadores), o governo poderia chegar próximo aos 1,2% do PIB, sem maiores criatividades do lado tributário. Isto envolveria aumentar a Cide para 28 centavos por litro, o que traria 0,6% do PIB de aumento de receita primária. Se emular a experiência de 2003, o governo cortaria algo com 0,5% do PIB em despesas, especialmente investimentos - o esforço residual viria da ajuda de Estados e municípios e de aumentos adicionais de impostos (IPI). Objetivos mais agressivos parecem requerer um ativismo tributário mais intenso - como, por exemplo, a retomada da cobrança da CPMF a partir do segundo semestre. Mas há claramente na sociedade, e no Congresso, uma resistência a aumentos adicionais da carga tributária (que é alta demais dado nosso patamar de renda per capita). Conseguir apoio para aumento de impostos vai requerer, necessariamente, alguma sinalização de controle de gastos, o que parece também estar encaminhado, como sugere a declaração recente da presidente de que iria adotar reformas para "adequar a taxa de crescimento do gasto público ao crescimento da economia". Se o encaminhamento da sucessão na economia foi uma boa notícia, que limita, no curto prazo, o risco de um rebaixamento da dívida soberana abaixo do grau de investimento, a situação da Petrobras atua na direção oposta. A empresa teria, segundo a demonstração financeira de junho, uma dívida externa bruta superior a US$ 100 bilhões, ante menos de US$ 43 bilhões para o soberano, com uma disponibilidade de caixa de US$ 26 bilhões. Atualmente, o custo de se segurar contra um evento de crédito do governo, no prazo de cinco anos, está em cerca de 178 pbs, frente a 350 pbs para a empresa. Parece razoável supor que, caso o Tesouro venha a ter que oferecer garantias para a dívida soberana da empresa, algum contágio acabaria ocorrendo e o custo do 9
seguro de crédito provavelmente ficaria em algum ponto entre os valores acima, nada irreversível, mas um desconforto a mais. Às preocupações com um potencial impacto fiscal da situação da Petrobras, se somam, mais importantes, dúvidas sobre o crescimento. O governo usou, revertendo a uma prática bem estabelecida, parâmetros de mercado para embasar o projeto da LDO. Ocorre que a expectativa de crescimento de 0,8% pode ser otimista, em especial se o período chuvoso não propiciar uma recuperação do patamar dos reservatórios das usinas hidrelétricas, de forma a afastar o risco de racionamento. Estimamos que um racionamento de energia semelhante ao de 2001 ceifaria 1,4% do crescimento do PIB. Com isso, dificilmente escaparíamos de uma recessão, o que exigiria esforço fiscal redobrado. A presidente parece inclinada a buscar em um dos principais nomes da transição de 2003 a senha para repetir a trajetória de ajuste e recuperação rápida observada naquela conjuntura. Ocorre que as dificuldades da principal empresa sob controle estatal e a precária situação hídrica ensejam riscos fiscais adicionais que não estão sob total controle das autoridades. Uma repetição de 2003 é possível, mas talvez não seja o cenário mais provável. O governo e sua base de apoio político devem enxergar no ministério Levy a sua melhor chance de sucesso, mas isso não necessariamente vai ficar claro no curto prazo. A primeira escolha é importante, mas a persistência também.
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