SÍNTESE DE JORNAIS E REVISTAS 17 DE DEZEMBRO DE 2014
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Uma fotografia na parede Por ALEXANDRE SCHWARTSMAN A sala em que ocorrem as reuniões do Conselho Monetário Nacional no Ministério da Fazenda em Brasília é um monumento à resiliência do país. Em suas paredes estão os retratos de todos os ocupantes do cargo no período republicano, exceto, é claro, o atual titular (e o próximo também). O olhar equivale a uma viagem no tempo a nos lembrar das desastrosas políticas a que o Brasil foi submetido e como, apesar dos infortúnios, aqui estamos. Guido Mantega, futuro ex-ministro em atividade, merece lugar de honra nessa galeria de horrores como principal responsável pela verdadeira herança maldita, em nada honrando a que recebeu. Ao assumir, Mantega encontrou um país que crescia algo mais que 3% ao ano, com a inflação na meta (4,6%) e um superavit de US$ 13 bilhões (1,4% do PIB) nas contas externas. O superavit primário não era maquiado e equivalia a 3% do PIB, enquanto a dívida bruta do governo caíra para 56% do PIB. Naquele momento, o Brasil gerava 1,3 milhão de empregos formais por ano e pavimentava seu caminho para receber o grau de investimento. O país que entrega não poderia ser mais diferente. O crescimento neste ano mal deve superar zero, a inflação (6,6% nos últimos 12 meses) segue perigosamente próxima ao teto da meta e o deficit externo supera US$ 84 bilhões (3,7% do PIB) nos 12 meses até outubro. O superavit primário (maquiado) caiu para 0,6% do PIB (sem maquiagem, trata-se de deficit de 0,2% do PIB), e a dívida governamental atingiu 62% do PIB. A geração de empregos formais nesse contexto caiu para pouco menos de 300 mil postos por ano. É verdade que o desemprego caiu, mas a medida mais ampla (a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, Pnad) revela que a queda no período é bem menos impressionante do que a alardeada pelo governo: de 8,4% em 2006 para 6,5% em 2013 e provavelmente o mesmo em 2014. No conjunto da obra, trata-se de desempenho para lá de embaraçoso, exceto para o próprio ministro, que, fiel à deficiência de compostura que marcou seu extenso período à frente da pasta, ainda achou tempo para se autoelogiar. Faltou-lhe, todavia, entender as dificuldades enfrentadas pelo país. Sua resposta à desaceleração da economia não poderia ter sido mais desajeitada, nem as consequências, piores. Ao mesmo tempo em que a elevação da inflação e a piora das contas externas sugeriam que as raí- zes do problema se encontravam --como ainda se encontram-- do lado da oferta, associadas à forte redução do ritmo de crescimento da produtividade, o governo reagiu a isso estimulando adicionalmente a demanda. Assim, apesar do elevado endividamento das famílias, bancos públicos seguiram expandindo o crédito. Já o BNDES viu sua carteira mais que triplicar (já descontada a inflação), saltando de 6% para 12% do PIB, privilegiando setores e empresas por critérios obscuros. O gasto federal também cresceu como nunca, atingindo quase 20% do PIB nos 12 meses até outubro, ante 16% do PIB em 2005. O investimento federal, contudo, respondeu por fração modesta do aumento das despesas, enquanto as deficiências de infraestrutura tornaram-se mais visíveis. O acúmulo de fracassos não foi suficiente, porém, para o ministro perceber o rumo equivocado da sua "nova matriz macroeconômica". Pelo contrário, o que se viu foi uma mistura ímpar de novas rodadas de medidas desorientadas (como o retorno do controle de preços para lidar com a inflação e a forte intervenção no mercado de câmbio para conter a alta do dólar), devidamente acompanhadas de redução da transparência das contas públicas, tentativa infrutífera de esconder os problemas sob o tapete. 2
Não foram o resto do mundo nem o acaso que nos trouxeram até aqui. Foi uma sequência de erros de política poucas vezes vista na história deste país, que motivaram a inédita demissão antecipada do ministro da Fazenda.
Sondagem mostra recuo na intenção de investir em 2015 De São Paulo A proporção de empresas que elevou os investimentos neste ano caiu em relação a 2013, enquanto aumentou de forma significativa a fatia daquelas que reduziram os aportes, de acordo com pesquisa feita pela Fundação Getulio Vargas (FGV). Quanto a 2015, o levantamento mostra um setor privado cauteloso, com queda na intenção de investimento das empresas. Ao todo, foram consultadas 3866 companhias: 545 do setor de construção, 824 na indústria de transformação, 957 no comércio e 1540 no setor de serviços, ao longo do bimestre outubronovembro. Pela primeira vez, são divulgados resultados de outros setores produtivos, além do tradicional segmento industrial. Na indústria de transformação, 38% das empresas informaram ter aumentado seus investimentos e 31% diminuíram os aportes. Em 2013, esses percentuais foram de 40% e 25%, respectivamente. No setor de serviços, houve movimento semelhante: 36% das empresas informaram aumento nos investimentos em relação a 2013, e 15%, redução, para percentuais de 41% e 10% no ano passado na comparação com 2012. No comércio foi registrado o maior percentual de empresas indicando aumento nos investimentos em 2014 (42%) e o menor percentual de empresas informando redução (12%), mas ambos são números piores que os de 2013, de 49% e 6%. O pior resultado setorial foi na construção, na qual 26% das empresas perceberam aumento dos investimentos em relação ao ano passado, ante 33% em 2013; e 24% diminuição, fatia maior que a de 17% em 2013. Enquanto isso, o fraco desempenho econômico atual e as incertezas em relação a 2015 se refletem nas previsões das empresas para a realização de investimentos no ano que vem. Entre as empresas industriais, 41% programam ampliação dos investimentos, contra 47% que previam o mesmo no 4º trimestre do ano passado. A parcela das que projetam diminuição de investimentos ficou praticamente estável, ao passar de 19% para 18% no mesmo período. Em serviços, 45% projetam aumentar os investimentos produtivos no próximo ano, número inferior aos 48% que projetavam o mesmo no ano anterior. O percentual de empresas que projetam diminuição de investimentos também variou ligeiramente, ao subir de 7% para 8%, nas projeções para 2014 e 2015, respectivamente.
Para CNI, recuperação só deve vir no meio do próximo ano Por Lucas Marchesini e Edna Simão | De Brasília A Confederação Nacional da Indústria (CNI) espera que a economia piore um pouco mais no início de 2015 antes de começar a se recuperar na segunda metade do ano, o que levará a um avanço de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) em todo o ano. Isso porque, apontou o gerenteexecutivo de Política Econômica da CNI, Flávio Castelo Branco, "o sucesso do ajuste [fiscal] significa dificuldades nos primeiros meses de 2015". Para ele, no entanto, "é possível que com o sucesso na implementação desse ajuste, ocorra uma retomada da confiança e, a partir do segundo semestre, uma retomada do crescimento". 3
Segundo Castelo Branco, atualmente a indústria está com uso da capacidade reduzido e alguns estoques elevados. Desta forma, os investimentos que podem ser realizados só serão feitos no segundo semestre. De acordo com o economista, as duas variáveis críticas para a retomada do crescimento serão o investimento e a exportação, uma vez que o consumo será menor. Do lado das exportações, a entidade patronal espera uma contribuição positiva do câmbio, que permitirá um superávit na balança comercial no ano que vem, apesar do déficit projetado para 2014. "Vamos ter uma contribuição da taxa de câmbio que dará uma margem de competição melhor para produtos domésticos", disse. Já em relação aos investimentos, a projeção da CNI é de estagnação em 2015 após queda de 6,7% em 2014. "Se a reversão do quadro se materializar e a confiança melhorar, o investimento deve mostrar algo de positivo para a segunda metade do ano", avaliou ele. A expectativa da CNI é que a indústria tenha desempenho semelhante ao do PIB, com avanço de 1%. A indústria de transformação deve avançar 0,8% em 2015, atrás dos serviços industriais de utilidade pública, que crescerão 1,7% de acordo com a CNI, e a indústria extrativa, que avançará 2,5%. Já a construção civil deve estagnar. Além disso, na avaliação da entidade, o consumo das famílias deve contribuir com 1,4% do PIB em 2014 e 0,7% do PIB em 2015. Já a taxa de desemprego deve ficar um pouco maior em 2015. Para 2014, a expectativa é que se encerre o ano com uma taxa de 4,8% da População Economicamente Ativa (PEA). Para o ano que vem, mesmo com a perspectiva de uma ligeira melhora na economia, o desemprego deve ficar maior e atingir 5,2% da PEA. Para a inflação, a CNI projeta 6,4% este ano e 6,2% para 2015.
Crise na Rússia balança emergentes Por José de Castro e Silvia Rosa | De São Paulo O agravamento da crise cambial na Rússia, que levou o rublo a cair 12% ante o dólar ontem, contribuiu para piorar o cenário para os mercados emergentes. A maioria das moedas tem mostrado fortes perdas, diante da combinação de queda nos preços das commodities, enfraquecimento da economia chinesa e expectativa de alta de juros nos EUA. Com esse pano de fundo, o real fechou no menor nível desde março de 2005, a R$ 2,7341 por dólar, e o mercado futuro de juros chegou a embutir uma aceleração no ritmo de elevação da Selic. O presidente do BC, Alexandre Tombini, por sua vez, sinalizou a continuidade do programa de swaps cambiais. Ainda é cedo para avaliar se a crise russa tem o potencial de arrastar outros mercados. A percepção inicial é que o contágio é limitado porque o mau humor vem de fatores muito específicos: alta dependência de receitas do petróleo, tensão política com o Ocidente que resultou em uma série de sanções, além da desconfiança com a política local. Outro fator que limitaria a extensão da crise a outras economias é o fato de hoje as posições em câmbio estarem menos alavancadas. Os investidores têm reduzindo a exposição a moedas de emergentes desde o ano passado diante da perspectiva de aumento dos juros nos EUA em 2015, diz Flavia Cattan-Naslausky, estrategista de câmbio para América Latina do Royal Bank of Scotland (RBS).
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"Estamos vendo um 'sell-off' [venda generalizada de ativos] controlado. O problema é que a liquidez nos mercados está muito baixa, com os investidores adotando uma postura mais cautelosa, evitando aumentar as posições." Para Paulo Vieira da Cunha, diretor de pesquisa do ICE Canyon, fundo de Los Angeles especializado em emergentes e ex-diretor do Banco Central, é cedo para falar em uma crise na Rússia na intensidade vista em 1998. A forte queda do preço do petróleo afeta principalmente os países com a economia atrelada à commodity. A perspectiva, segundo Cunha, é que depois de um forte ajuste, o preço do óleo se estabilize a partir do segundo semestre de 2015. "O que acontece é que em momentos de maior volatilidade e queda abrupta do preço do petróleo, as moedas de países considerados mais vulneráveis, muito dependentes de financiamento externo, sofram mais como Turquia, Indonésia e África do Sul." Apesar de não sofrerem com tensões do lado geopolítico, moedas de países como Colômbia, México, Malásia e Venezuela, também grandes exportadores de petróleo, evidenciam algum nível de vulnerabilidade devido à exposição das receitas fiscais aos preços do petróleo.
Mercado projeta aperto mais forte da Selic Por Lucinda Pinto, Antonio Perez, Silvia Rosa, José de Castro e Aline Cury Zampieri | De São Paulo Em meio ao aprofundamento da depreciação do real, desencadeado pela fuga de ativos de emergentes, investidores não apenas turbinaram os prêmios de risco ontem na BM&F, como chegaram a montar apostas para um eventual "choque de juros" - ou seja, um cenário em que o Banco Central brasileiro tenha que acelerar o ritmo de aperto monetário. Diante do derretimento do rublo, o BC da Rússia se reuniu extraordinariamente na noite de segunda-feira e elevou a taxa de juros em 6,5 pontos percentuais, para 17% ano. O tombo das divisas emergentes - já acossadas tanto pela queda das commodities quanto pela expectativa de um aperto monetário nos Estados Unidos no primeiro semestre em 2015 - suscita pressões inflacionárias e sugere que mais bancos centrais tenham que elevar seus juros. Ontem o dólar subiu pelo quinto pregão, fechando em alta de 1,8%, a R$ 2,7341, o maior patamar desde 24 de março de 2005. Durante as operações, a moeda alcançou os R$ 2,76. Em tal ambiente, se estreita o espaço para que o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC se paute pela "parcimônia" ao elevar a taxa Selic, como prometeu em sua ata. Não por acaso, as taxas dos contratos futuros de Depósitos Interfinanceiros (DI) que abrigam as apostas para os próximos passos do Copom dispararam ontem e, nos momentos de maior estresse, chegaram a atingir o limite de oscilação estabelecido pela BM&F. Depois de correr até a máxima de 12,49%, o DI com vencimento em abril de 2015 fechou a 12,27% (ante 12,05% na véspera). De longe o mais líquido do pregão (mais de 730 mil contratos negociados), o DI para janeiro de 2016 - que abrange as apostas para o rumo da Selic ao longo do ano que vem - subiu de 12,64% para 12,92%. Segundo cálculos da gestora Quantitas, a curva de juros embute 99% de chances de uma alta da Selic em 0,75 ponto percentual em janeiro e grandes chances de repetição da dose em março. No auge da tensão, as taxas chegaram a refletir alta de 1 ponto da Selic em janeiro. Embora parte expressiva do avanço das taxas futuras tenha um caráter técnico, já que resulta 5
da zeragem de posições, não há dúvida de que já se formam apostas em torno de um ciclo de aperto monetário mais forte e extenso. Segundo o diretor executivo e chefe de pesquisas para mercados emergentes das Américas da Nomura Securities International em Nova York, Tony Volpon, como o sistema de preços no país é muito rígido por causa do nível de indexação, a receita para uma alta do dólar é o aperto monetário. "Do contrário, veremos a inflação subir acima de 7%", afirma, ressaltando, contudo, que a aposta de choque de juros não é a mais adequada. "Acho que o que estamos por ver é o prolongamento do ciclo. O BC deve elevar o juro em 0,5 ponto e, então, observar o mercado", diz. Para o economista-chefe da Opus Gestão de Recursos, José Marcio Camargo, a forte instabilidade vivida pelos mercados financeiro pode impedir que o BC cumpra seu objetivo de fazer um ciclo de aperto monetário curto. Camargo trabalha com uma alta da taxa Selic para 13% ao longo dos próximos meses e ressalta que sua projeção pode estar "otimista". Para Bruno Rovai, estrategista do Barclays, um "choque de juros" não seria adequado. Ele ressalta que a depreciação do real vem no bojo de um movimento global e não por conta da piora da percepção dos fundamentos domésticos. "Não vejo um ataque especulativo contra o real que exija essa resposta da política monetária", afirma Rovai, que mantém expectativa de alta de 0,50 ponto percentual em janeiro e elevação final de 0,25 ponto em março. Em meio à expectativa de aperto monetário mais forte, as taxas longas também dispararam, com aumento da percepção de risco. O DI para janeiro de 2021 subiu de 12,49% para 12,64%. A instabilidade dos mercados ontem fez com que o Tesouro Nacional cancelasse o leilão de venda de 450 mil NTN-B, papel atrelado à inflação. Para o estrategista para a América Latina do Standard Chartered Bank, Italo Lombardi, o BC dispõe de diversos instrumentos cambiais, que podem ajudar a minimizar os efeitos da turbulência russa. Para tentar amenizar a forte pressão de desvalorização do real, tem realizado leilões de linha de dólar com compromisso de recompra, cujo volume ofertado já soma US$ 6 bilhões, mais do que os US$ 4 bilhões ofertados no ano passado. Os investidores também reduziram a exposição a risco à espera da reunião do Federal Reserve (Fed, banco central americano), que anuncia hoje sua decisão de política monetária. Flavia Cattan-Naslausky, estrategista de câmbio para América Latina do Royal Bank of Scotland (RBS), espera que o Fed retire de seu comunicado a expressão "período considerável" para se referir ao prazo em que a taxa de juros permanecerá perto de zero. O Fed pode afirmar que será "paciente", repetindo um terno usado em 2004. Com a instabilidade externa, o Ibovespa trocou de sinal ao longo do pregão, oscilando entre queda de 2,47% e alta de 1,22%. No fim do dia, marcou baixa de apenas 0,02%, aos 47.008 pontos.
Turbulência estimula fuga de ativos de risco Por Michael Hunter e Kathrin Hille | Financial Times, de Londres e Moscou As turbulências envolvendo o rublo russo espalharam-se ontem para os mercados globais, com os investidores correndo para ativos considerados mais seguros e derrubando os rendimentos dos bônus alemães para um patamar recorde de baixa. 6
A incapacidade do banco central da Rússia de conter a queda da moeda com um aumento emergencial das taxas de juros para 17% ao ano, despertou especulações de que Moscou poderá introduzir controles de capital. A cotação da moeda caiu para 80 rublos por dólar. Apresentou posteriormente uma pequena recuperação, e terminou com desvalorização de 12%. "Não dá para a situação piorar muito mais para a Rússia. O passo final para a tempestade perfeita seria a imposição dos controles de capital", disse Heinz Rüttimann, estrategista de mercados emergentes do banco Julius Baer. A queda dos preços do petróleo e as sanções ocidentais estão cobrando um preço alto para a economia da Rússia, no momento em que o país luta para conter a inflação, que segundo economistas poderá passar dos atuais 9,1% para os dois dígitos. Mas uma política monetária bem mais apertada ameaça transformar a desaceleração em uma recessão. Num sinal da pressão que recai sobre os planejadores econômicos, Sergei Shvetsov, vicepresidente do banco central, disse em um evento em Moscou: "Jamais poderia imaginar um ano atrás que uma coisa dessas aconteceria - nem nos meus sonhos mais loucos. A situação é crítica". O petróleo do tipo Brent continuou ontem sua sequência de quedas, com o preço recuando 3,2% para US$ 59,08 o barril, em meio a alguns dados desapontadores oriundos da China. É a primeira vez que o Brent cai abaixo dos US$ 60 em cinco anos e meio, o que aumenta a preocupação dos investidores com a demanda global. O rendimento do bônus referencial de dez anos da Alemanha caiu ontem para menos de 0,6% pela primeira vez e por volta do meio-dia chegou a 0,56%. Os rendimentos dos títulos equivalentes do Tesouro americano caíram ao menor nível em um ano (2,01%), enquanto o rendimento dos bônus de dez anos do Japão caiu ao patamar recorde de baixa de 0,36%. Os rendimentos dos bônus britânicos de 30 anos caíram abaixo dos 2,5% pela primeira vez. O preço do ouro subiu 0,5% pra US$ 1.214. O caos no mercado eliminou quase € 3 bilhões do valor de mercado combinado dos três bancos europeus com maior exposição à Rússia - o Société Générale da França (SocGen), o UniCredit da Itália e o Raiffeisen Bank International da Áustria. Mas as perdas foram além da área de serviços financeiros. A ação da Carlsberg, a fabricante dinamarquesa de cerveja que tem uma grande participação no mercado de cervejas da Rússia, caiu 7,7%. Na Metro, companhia varejista alemã com lojas na Rússia, a perda foi de 3,6%. "O trabalho duro para o banco central da Rússia está apenas começando. Agora que eles optaram pela linha dura, terão de prosseguir com a linguagem forte e com intervenções pesadas no mercado de câmbio", disse Benoit Anne, estrategista de mercados emergentes do Société Générale. Laris Christensen, analista-chefe do Dansk Bank, disse que enquanto os preços do petróleo continuarem caindo, o banco central terá dificuldades para estabilizar o rublo. Ele acrescentou que a alta dos juros representou "a primeira grande mudança de rumo" do banco central em relação à sua estratégia recente de permitir a livre flutuação da moeda russa. As ações globais caíram pelo sétimo dia consecutivo, com o índice russo Micex recuando mais de 3%. Além disso, moedas de mercados emergentes como a lira turca, a rúpia indiana e o rand sul-africano caíram em relação ao dólar. "O câmbio e o crédito do resto dos mercados emergentes finalmente acordaram para a realidade de que a Rússia não poderá continuar do jeito que está sem repercussões negativas 7
para o risco dos mercados emergentes", disse Luis Costa, estrategista de câmbio de mercados emergentes do Citigroup em Londres. Os rendimentos dos bônus referenciais de dez anos da Rússia aumentaram mais de 2 pontos percentuais, para 15,36%, o maior nível desde 2007, enquanto seus títulos equivalentes denominados em dólar ganharam 36 pontos-base para 7,55%. SocGen, UniCredit e Raiffesen têm posições de empréstimos significativas no varejo e entre empresas russas e seriam prejudicados por uma crise econômica no país. As ações do SocGen caíram 7,3% ontem. O banco francês tem a maior exposição entre todos os bancos europeus à Rússia, de € 24,8 bilhões, segundo cálculo do Citigroup. As ações do UniCredit, que tem uma exposição de € 18,4 bilhões à Rússia, caíram 3,2%, enquanto as do Raiffesen, com uma exposição de € 15,4 bilhões e que gera a maior parte de seus lucros no país, recuaram 8%. Imitando a alta acentuada dos juros com que os bancos centrais de países como a Turquia e o Brasil contiveram turbulências cambiais este ano, o Banco da Rússia aumentou sua taxa referencial, que era de 10,5%, depois da meia-noite, citando a necessidade de conter a grande desvalorização recente do rublo e os riscos inflacionários. O banco central também proporcionou maior liquidez em moeda estrangeira para os bancos russos, ampliando os leilões de recompra de dólares. Embora anos de uma política fiscal prudente e reservas internacionais de US$ 400 bilhões tenham ajudado a Rússia a conter uma crise financeira total, a fuga desordenada dos investidores do rublo aumentou muito o peso dos mais de US$ 600 bilhões em dívida externa mantida por bancos e empresas. Pouca coisa dessa dívida pode ser refinanciada porque as sanções ocidentais em grande parte alijaram os tomadores russos dos mercados de capitais dos Estados Unidos e Europa. "As autoridades deveriam implementar linhas de crédito emergenciais para companhias sistêmicas", disse Costa, do Citigroup. "Essa é a única maneira de conter a queda agressiva do risco soberano e corporativo russo." Oleg Kouzmin, economista para a Rússia da Renaissance Capital em Moscou, disse que a fraqueza do rublo "coloca os mercados financeiros domésticos sob uma grande pressão, incluindo o setor bancário doméstico". Ele acrescentou que o aumento drástico dos juros pelo banco central provavelmente será seguido por grandes intervenções diretas. "Pelas nossas estimativas aproximadas, se o banco central russo vender cerca de US$ 20 bilhões de liquidez em dólar no resto do mês e o preço do petróleo continuar estável, o rublo poderá ter uma valorização de 10% a 15% em relação aos níveis atuais", disse ele.
S&P rebaixa perfil de crédito da Petrobras para 'grau especulativo' Por Thais Carrança | Valor SÃO PAULO - A agência de avaliação de risco Standard & Poor’s (S&P) rebaixou o perfil de crédito individual da Petrobras, conhecido pela sigla em inglês SACP, de “bbb-” para “bb”. Com isso, considerada de forma independente de seu controlador, a União, a estatal tem nota correspondente ao grau especulativo.
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No entanto, a S&P reafirmou a nota de crédito corporativo da petroleira em “BBB-”, mais baixo patamar do grau de investimento, devido à grande probabilidade de “ajuda extraordinária pelo governo”, em caso de dificuldade financeira, segundo a agência. A perspectiva estável reflete a nota de crédito soberana do Brasil. O rebaixamento do perfil de crédito individual espelha menor projeção de liquidez, acesso mais restrito a financiamento e geração de fluxo de caixa potencialmente mais fraca, à luz das investigações de corrupção em curso, afirma a S&P. Segundo a agência, a geração de caixa pode ser afetada por redução de investimentos, com consequente impacto sobre o aumento de produção, e por multas decorrentes das investigações da Polícia Federal e da Securities and Exchange Commission (SEC, a comissão de valores mobiliários americana). A S&P revisou, ainda, a nota de administração e governança da Petrobras de “satisfatória” para “justa”. “Acreditamos que a Petrobras tem menor capacidade de identificar e efetivamente controlar riscos estratégicos, como visto nas investigações de corrupção e nos atrasos na divulgação de informações financeiras”, escreveram os analistas. A nota de crédito corporativo da Petrobras somente deve ser rebaixada, sem nenhuma ação sobre o rating soberano brasileiro, caso o perfil de crédito individual caia para nota “b”, ou inferior, adianta a S&P.
Em busca de uma política comercial para a indústria Por Diego Bonomo e Constanza Biasutti Em 2015, o desafio do novo governo no comércio exterior será enorme, sobretudo se quiser preservar e modernizar o parque industrial brasileiro. Embora o Brasil esteja próximo de atingir o expressivo valor de US$ 500 bilhões em fluxo de bens com seus parceiros comerciais, a situação do comércio exterior da indústria é ruim e com perspectiva de piora. Para reverter o quadro, o país terá de adotar uma ambiciosa política de competitividade e realizar três mudanças na política comercial: de visão, com uma política comercial para as empresas; das instituições, com sua reforma; e de postura em negociações internacionais, com a adoção de uma agenda de novos acordos. Os números falam por si. A balança comercial do Brasil está à beira de um déficit, mas a de bens manufaturados já atingiu um saldo negativo de mais de US$ 105 bilhões em 2013. Não só as exportações totais do país não crescem desde 2011, como as da indústria estão estagnadas desde 2008, em valor e em embarques físicos. Como consequência, a participação dos manufaturados brasileiros nas exportações mundiais caiu de 0,83%, em 2008, para 0,72%, em 2013. O Brasil está entre os 10 maiores parques industriais do mundo, mas é apenas o 30º maior exportador de produtos manufaturados e sua desconexão das cadeias de valor dos centros dinâmicos da economia mundial - América do Norte, Europa Ocidental e Ásia do Leste - é gritante. A solução desses problemas é conhecida: o país precisa ampliar a inovação e a produtividade para assegurar a competitividade da indústria. Para tanto, é necessário mais investimento em educação e a realização das diversas reformas para sanar os problemas que os empresários costumam caracterizar como "custo Brasil" - financiamento, infraestrutura, relações de trabalho e tributação. Essas reformas devem ser acompanhadas por um ambiente 9
macroeconômico estável, um Estado eficiente, o desenvolvimento dos mercados interno e externo, e segurança jurídica e redução da burocracia. No entanto, o próximo governo não poderá aguardar a execução dessa agenda ambiciosa para adequar a política comercial às necessidades da indústria. A mudança, urgente, é de três ordens. A primeira é de visão: a política comercial tem que ser feita para as empresas. Para um país como o Brasil, que não tem pretensões militares para expandir sua influência no mundo, o comércio internacional é a via mais rápida e eficaz para projetar poder. A China e os Estados Unidos, países tão distintos em seu modelo de organização da relação Estado-mercado, há décadas chegaram a essa conclusão - defender suas empresas e seus negócios no jogo do comércio é a receita para fortalecer suas economias nacionais e, por consequência, aumentar sua projeção internacional. No Brasil, contudo, a política comercial tem mãe e madrasta. De um lado, é utilizada como ferramenta da política externa. De outro lado, é vista como instrumento de política econômica e é uma das primeiras vítimas da política fiscal quando os recursos ficam escassos. Para crescer, o Brasil precisará de uma política comercial independente, com objetivos e lógica própria, ancorados nas necessidades do setor privado. A segunda mudança é das instituições: a organização institucional do comércio exterior precisa ser reformada. Basta elencar algumas perguntas para se ter a medida dos problemas. Faz sentido, no mundo das cadeias globais de valor, a estrutura da tarifa de importação brasileira? O Brasil consegue competir, em condições de igualdade, contra Alemanha, China, Estados Unidos e Japão, sem dispor de um banco de exportações e importações, um Eximbank? Tem razão a indústria não dispor de adidos de indústria e comércio em mercados estratégicos, para realizar a defesa do setor no exterior, remover barreiras e monitorar as políticas industrial e comercial dos parceiros do país? Faz sentido tributar as exportações e investimentos no exterior e deixar que a indústria arque com resíduos tributários e bilhões de reais em créditos não ressarcidos? Essas são algumas das perguntas que o Brasil ainda não respondeu. Por fim, a terceira mudança é de postura em negociações internacionais: a política comercial precisa abandonar a visão "soberanista" dos acordos internacionais. O país tem uma longa tradição de suspeita em relação aos tratados internacionais, sobretudo aqueles de caráter comercial. Além disso, o nacionalismo brasileiro criou uma autoimagem de nação excepcional, isto é, única no mundo. O resultado prático dessa conjunção é que o Brasil sempre considera a negociação de acordos comerciais como um exercício de resistência a "pressões externas" e em defesa de um "espaço para políticas de desenvolvimento" que ninguém sabe definir ao certo qual é e para que serve. Como consequência, o país resiste à negociação de uma série de acordos, de livre comércio à eliminação de vistos; de proteção de investimentos àqueles para evitar a dupla tributação. Sem mudança nessa postura, a indústria brasileira continuará carente de instrumentos para aprofundar sua inserção internacional e para contribuir com o desenvolvimento do Brasil. Como se pode observar, essas mudanças são de difícil realização, mas precisam ser iniciadas e de forma simultânea -, pois seus resultados são lentos. Se o país quiser recuperar a década perdida do comércio exterior da indústria, a hora de agir é agora.
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Políticas para seres reais, não ideais Por Martin Wolf Da madeira torta da humanidade, nenhuma coisa aprumada foi jamais produzida. Essa famosa observação do filósofo alemão Immanuel Kant é particularmente relevante para os economistas. O "homo economicus" é presciente, racional e privilegia seu autointeresse. Seres humanos reais não são nada assim. Somos feixes de emoções, e não máquinas de calcular. Isso é relevante. O mais recente Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial (RDM), do Banco Mundial examina esse território. O documento observa que a "economia comportamental" modifica nossa visão do comportamento humano de três maneiras: em primeiro lugar, a maior parte de nosso pensamento não é deliberativo, mas automático; segundo, é socialmente condicionado; e, em terceiro lugar, é moldado por modelos mentais errôneos. Em seu livro "Thinking, Fast and Slow", de 2011, Daniel Kahneman, agraciado com um prêmio Nobel, explorou a ideia de que nós pensamos de duas maneiras diferentes. A necessidade de um sistema automático é evidente. Nossos ancestrais não dispunham de tempo para elaborar as respostas aos desafios da vida a partir de princípios básicos. Eles incorporaram reações automáticas e predisposição cultural no sentido de adotar regras práticas. Nós herdamos esses dois traços. Assim, somos influenciados pela maneira como um problema é formulado. Outra característica é a "tendenciosidade para confirmação" - um viés no sentido de interpretar novas informações como suporte a crenças pré-existentes. Nós também sofremos de aversão a perdas - uma feroz resistência a perder o que já temos. Para os nossos antepassados, com sua sobrevivência por um fio, isso fazia sentido. O fato de que os seres humanos são intensamente sociais é evidente. Até mesmo a ideia segundo a qual somos autônomos é, ela própria, socialmente condicionada. Além disso, não somos, absolutamente, exclusivamente egoístas. Uma consequência infeliz do poder das normas é que sociedades podem permanecer aprisionadas em padrões de comportamento destrutivos. Nepotismo e corrupção são exemplos disso. Se eles estiverem arraigados, pode ser difícil (ou perigoso), para as pessoas, não participar. Normas sociais, porém, também podem ser valiosas. Confiança é uma norma valiosa. Ela repousa sobre um dos mais fortes comportamentos da humanidade: cooperação condicional. As pessoas punem aproveitadores mesmo quando isso lhes impõe um custo. Este traço fortalece grupos - e, nessa medida, amplia as chances de sobrevivência de seus membros. Modelos mentais são essenciais. Alguns parecem ser inatos; e alguns podem ser danosos assim como produtivos. Ideias sobre "nós" e "eles", reforçadas por normas sociais, podem muito bem produzir um leque de resultados - do meramente injusto ao catastrófico. Igualmente importantes podem ser modelos mentais que criam expectativas autoconcretizáveis sobre quem terá êxito e quem fracassará. Há evidências, observa o RDM, que modelos mentais enraizados na história podem moldar as visões de mundo das pessoas durante séculos - casta é um exemplo. Esses modelos mentais sobrevivem por que são reproduzidos socialmente e tornam-se parte de nosso sistema automático e não deliberativo. Eles influenciam não apenas nossa percepção dos outros, mas percepções de nós mesmos.
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Para ilustrar a relevância dessas realidades, o relatório analisa as dificuldades na formulação de políticas focadas em pobreza, desenvolvimento na primeira infância, condição financeira familiar, produtividade, saúde e mudanças climáticas. Em economia doméstica, por exemplo, o relatório assinala que faz diferença se potenciais tomadores de crédito são informados quanto mais caro lhes custará crédito debitado em folha de pagamento do que um empréstimo num cartão de crédito. Revelar o status de meninos de baixa casta em uma sala de aula mista piora o desempenho de alunos de castas mais baixas, em comparação com o que acontece se a casta não é divulgada. O comportamento dos meninos depende de como eles são apresentados. Pobreza não é apenas escassez de recursos materiais: ela compromete a capacidade de pensar com deliberação. Somos todos feitos de madeira torta de Kant: ninguém tem a sabedoria e o autocontrole atribuídos aos deuses. A maneira como as pessoas pensam pode também afetar sua produtividade. Um exemplo é o proveito proporcionado por contratos que penalizem uma trabalhadora que descumpra metas de produção que ela tenha assumido voluntariamente. Saúde pública proporciona exemplos cruciais, como a importância dos modelos mentais. Um deles, evidente, é a histeria antivacinação. Outra, ilustrada pelo RDM, é a tendência de as mulheres pobres acreditarem que o tratamento correto para a diarreia é cortar a ingestão de líquidos - para fazer um filho parar de "vazar". Outra área na qual um foco estreito apenas em incentivos provavelmente será enganosa é regulamentação financeira. Muitos economistas acreditam que o comportamento disfuncional nos mercados financeiros é unicamente devido a incentivos distorcidos: seguro de depósitos, a percepção de que as instituições são "grandes demais para falir" e uma série de outros subsídios explícitos e implícitos. Igualmente importante, no entanto, são as normas comportamentais, como a visão de que o executivo bancário deve fidelidade primeiro a si mesmo, e não a seus clientes; ou modelos mentais inadequados, como a convicção generalizada, pré-crise, segundo a qual os preços das casas não poderiam cair em todo os EUA. Os regulamentos precisam ser estabelecidos com base em uma compreensão dessas fragilidades humanas. Até que ponto deveriam as políticas basear-se nessas percepções, especialmente levando em conta que os formuladores de políticas são, como admite o RDM, propensos a todo tipo de viéses em suas próprias tomadas de decisões? Somos todos feitos de madeira torta de Kant: ninguém tem a sabedoria e autocontrole supostamente divinos. No entanto, políticas precisam ser formuladas. Certamente é melhor formular políticas bem embasadas e realistas do que com base em uma visão grosseiramente simplista. Além disso, dar um empurrãozinho nas pessoas para que tomem o rumo correto aonde elas já querem ir incentivando-as a poupar, aprender, comportar-se de forma saudável ou educar melhor seus filhos - dificilmente pode ser taxado de grave violação da liberdade. No entanto, incentivos não devem descambar para a coerção. Adultos não devem ser tratados como crianças. Isso, também, é uma norma social - e uma norma bastante fundamental.
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