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Henrique Furtado

Filho de mineiros, professor, autista, londrinense

Escreve há uns bons anos, como quem faz diário Sem pontos finais, porque essas coisas nunca acabam

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como haviam posto-nos pedras no estômago, pendíamos para o chão

a primavera passou Pisadeira sobre os corpos todas as noites, abríamos os olhos no sono e víamos grande e pesado nada [a caminhar sobre nós, mas nossos braços e pernas e dedos [e nossa alma pesavam para o chão, e nossa voz parava na [garganta, atrás da pedra, atrás do nó; o verão trouxe nada além do sol emudecido [a nos manter no chão, adormecidos, abríamos o peito para inspirar, mas os pés cobriam [nossos corpos e marcavam o contorno de nós na areia das [coisas, – e o calor o calor nos enchia o estômago, [e quanto [mais cheio,

quando as coisas começaram a amarelar e cair, [nossos dedos puderam se mover um pouco e a cada emortecida que engolia os verdes e o [que restara de nós espremidos pelo chão, um dedo a mais [podia se levantar, ainda que nossos restos [permanecessem alastrados inertes; de corpos frios pudemos nos mover, embora talvez [não houvesse mais o que mover com o que sobrou das mãos abrimos os restos de [peito ao meio e viemos ao mundo chocando por [dentro as pedras como ovos e desde que aprendemos a morrer sempre, [quando o nada vem pisar em nós, tem de pisar em ovos

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