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1.3. A expressão através dos símbolos
58). Se fosse necessário haver angústia para haver impulso criativo e, através da arte, o artista devesse tentar exprimir suas experiências pessoais, talvez o artista não pudesse tratar do ‘insignificante’.
(...) a arte imprime um valor a objetos insignificantes em si e que, apesar de sua insignificância, ela fixa para si, fazendo deles seu objetivo e chamando nossa atenção para coisas que, sem ela, nos escapariam completamente (HEGEL apud SOULAGES, 2010: 225).
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Jung também pensou a obra de arte como forma de expressão das emoções, mas expressão através de uma forma não como reflexo de uma experiência direta, mas através de símbolos.
1.3. A expressão através dos símbolos
Jung chama de “imaginação ativa” a possibilidade de lidar com uma emoção, uma compulsão, uma inibição ou um pensamento obsessivo, atribuindo-lhe forma e aspecto, dramatizando-o, para que esse conteúdo interno possa, enfim, ser trabalhado de forma mais concreta, tanto quanto possível (GAILLARD, 2003). Quanto à expressão pictórica em terapia, Jung afirma que:
A finalidade deste método de expressão é tornar os conteúdos inconscientes acessíveis, assim aproximá-los da compreensão. Com esta terapêutica consegue-se impedir a perigosa cisão entre a consciência e processos inconscientes. Todos os processos e efeitos de profundidade psíquica, representados pictoricamente são, em oposição à representação objetiva ou consciente, simbólicos, isto quer dizer, indicam da melhor maneira possível, e de forma aproximada, um sentido que, por enquanto, ainda é desconhecido. (JUNG apud TOMMASI, 2005: 204).
Eu-Rascunho
53 Para Margarida Medeiros (2000), a arte veio cumprir importante papel na simbolização do inconsciente, simbolização esta que “noutras épocas coube preferencialmente ao mito e à religião” (p.101).
Jung também afirma que uma imagem ou uma palavra são simbólicas quando implicam em algo que vá além de seu significado imediato, estando presentes nessa simbologia conteúdos inconscientes que nunca podemos definir inteiramente (JUNG, 2008: 19). Ainda que não possam ser definidos, esses símbolos comunicam.
Quando pensamos na tradução de ideias em imagens, utilizamos símbolos; assim podemos traduzir formas mentais em linguagem. Esse é um processo complexo, pois não podemos compreender plenamente a substância da nossa mente, e transformar nossos conteúdos em linguagem faz com que utilizemos recortes (conscientes e inconscientes); a partir daí, extraímos desse conteúdo selecionado (não ‘palpável’), algo que possamos dar forma, e isso se processa através de símbolos. Quando nos expressamos através de uma linguagem, damos então forma a parte do conteúdo, que carregará inúmeros significados, não totalmente compreendidos inclusive por nós mesmos. Utilizar símbolos é uma forma de partirmos de uma substância para darmos significação a outra tão diversa, da substância mental à substância material sobre a qual trabalhamos em nossa criação. Através disso o homem também se descobre, segundo, Ostrower: “são transferências simbólicas do homem à materialidade das coisas e que novamente são transferidas para si” (OSTROWER: 2008: 53).
Por existirem inúmeras coisas fora do alcance da compreensão humana é que frequentemente utilizamos termos simbólicos como representação de conceitos que não podemos definir ou compreender integralmente. Esta é uma das razões por que todas as religiões empregam uma linguagem simbólica e se exprimem através de imagens (JUNG, 2008: 19).
O artista vai se expressar através de símbolos de forma a tentar representar conteúdos profundos para que esse significado transcenda e permita a comunicação com o espectador. Mas nesse sentido, torna-se fundamental que, para tomar o valor de símbolo, a imagem criada pelo artista seja aceita pelo espectador, que permitirá uma transferência imaginária, “transferência esta que o coloca no interior do símbolo, e que coloca o símbolo no interior do homem, cada um participando da natureza e do dinamismo do outro, numa espécie de simbiose”. (CHEVALIER; GHEERBRANT apud TOMMASI, 2005: 60).
Traduzir em formas mentais não significa necessariamente pensar com palavras, a não ser, é claro, que a materialidade em questão compreenda áreas verbais, literatura, poesia, filosofia, lógica. (...) A palavra é uma forma, e por ser forma, abrange níveis de significação. (...) Além das formas verbais, existem outras formas. São ordenações de uma matéria, formas igualmente simbólicas e cujo conteúdo expressivo se comunica. É nesses termos, de ordenações simbólicas, que se incursiona o pensamento imaginativo (OSTROWER, 2008: 34).
O processo criativo é um sistema aberto. Da mesma forma que se coloca como um organismo vivo em que todos os fenômenos completam o todo, esse sistema está constantemente realizando trocas com o ambiente. Através da sensibilidade, ocorre a primeira relação do indivíduo com o mundo ao redor, com o qual interage. Através da percepção, que é a elaboração mental das sensações segundo Ostrower (2008), ocorre uma seleção do que é consciente ou inconscientemente mais interessante, e o indivíduo então recolhe e armazena essas informações que vão funcionar como um arquivo em potencial para ser explorado posteriormente.
De todas as aparências sensíveis, o homem – na sua inquieta indagação para a compreensão dos fenômenos – desvela significações. É no homem e pelo homem que se opera o processo de alteração dos sinais (qualquer
Eu-Rascunho
55 estímulo emitido pelos objetos do mundo) em signos ou linguagens (produtos da consciência) (SANTAELLA, 2005: 13).
A partir disso, podemos pensar no seguinte esquema (Esquema 2):
ESQUEMA 2. Da sensação à expressão. Baseado na leitura de Criatividade e Processos de Criação (OSTROWER, 2008)
Importante pensar, que nesse processo também ocorrem, como já vimos anteriormente, muitos imprevistos e rupturas, interações diversas com o ambiente ou com as próprias reformulações mentais que o indivíduo vai fazendo ao longo de sua trajetória. Então, à medida que o indivíduo ordena as informações, ele pode alterar a sua própria forma de perceber o mundo; além disso, a forma como virá a ordenar essas informações dependerá muito da sua bagagem cultural, de suas crenças e ideologias, tornando esse caminho totalmente único e particular de cada indivíduo, um caminho em constante reestruturação.