Revista +Cristão Edição04

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ENTREVISTA

Ano 02 – Nº04 | Fevereiro 2014 | R$6,90

Pastor evangélico e Senador da República, Magno Malta, destaque no cenário nacional no comando de duas importantes CPIs, a do Narcotráfico e da Pedofilia, fala sobre os desafios no combate aos crimes de violência sexual contra crianças e adolescentes e o cuidado que os pais devem ter com os filhos. Defende leis mais rígidas para crimes de pedofilia e a implementação de prisão perpétua para os criminosos.

+Cristão Ano 02 – Nº 04

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FEVEREIRO 2014

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Editora Millibros

ABUSO

SEXUAL

CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES

O INIMIGO PODE ESTAR MAIS PRÓXIMO DO QUE VOCÊ IMAGINA

Depressão

Como conviver com a doença sem perder a fé

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A fé que cura A fé pode ser um santo remédio

Tráfico Humano O que a igreja tem a ver com isso?

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Em 2009 não existia nenhuma UPA no DF. Hoje são 4 UPAs funcionando dia e noite para atender os casos de pequenas emergências e, assim, desafogar os hospitais: Samambaia, Recanto das Emas, Núcleo Bandeirante e São Sebastião. Até o final deste ano serão mais 4. Cada UPA atende em média 450 pessoas por dia. Em 6 meses são mais de 160 mil atendimentos feitos por médicos, radiologistas, pediatras e dentistas. É, a grande transformação na saúde do DF já começou.

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as o os

SABE COMO O GDF ESTÁ MUDANDO O ATENDIMENTO DE EMERGÊNCIA NO DF? ASSIM.

4 UPAS FUNCIONANDO DIA E NOITE.

Secretaria de Saúde Governo do Distrito Federal

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EDITORIAL

A Revista +Cristão é uma publicação da Millibros Editora

Contatos 61 9129-0990 jerrygaspar@revistamaiscristao.com redacao@revistamaiscristao.com

Expediente +Cristão Diretor Executivo Jerry Gaspar Diretor-Editor Jairo Cesar Diretor Comercial David Malafaia Diretor de Arte Thimóteo Soares Jornalistas Mércia Maciel Colaboração - Hosana Seiffert Revisor Eleazar Araújo (Zazo) Articulistas Ana Celia Bomfim, Carlos Oliveira, Daniel Castro, Hosana Seiffert, Josué Gonçalves, Josué Salgado, Junior Sipaúba, Zazo, o nego. Fotografia Cristiano Carvalho e Thimóteo Soares Projeto Gráfico Aeroplano Comunicação Impressão Gráfica Brasil Distribuição / Periodicidade A Revista Mais Cristão é mensal. É distribuida em várias igrejas, livrarias evangélicas e bancas de jornais do Distrito Federal.

por Jairo Cesar

“Q

uando se mexe no lixo, é preciso usar luvas para não se contaminar.” A frase é do escritor Guilherme Shelb, Procurador da República e cristão, ao proferir recente palestra sobre os perigos que as crianças brasileiras enfrentam na atualidade. É difícil não ficar impregnado de ira ao lidar com casos como os recentemente noticiados da ação da Polícia Federal do Brasil de combate à pedofilia, chamada de operação Glasnost (“transparência”, em russo), na qual foram identificados cerca de duzentos brasileiros envolvidos com a produção e o compartilhamento de imagens relacionadas à exploração sexual de crianças e adolescentes na internet. Um dos investigados que já foi identificado abusava sexualmente da própria filha, de apenas cinco anos de idade, e postava as imagens desses abusos na web. É estarrecedor. Pior ainda é que, entre os alvos da operação, existem pessoas de variadas idades e profissões, incluindo um policial militar, um soldado da FAB, um chefe de grupo de escoteiros, médicos, enfermeiras, professores e até padres e pastores. Pedofilia costuma causar revolta e até náuseas. Este é um daqueles momentos em que, segundo a palavra do profeta Joel, a Igreja precisa chorar. E essa indignação deve levar-nos a ações concretas de proteção ao maior tesouro que temos – nossas crianças. A reportagem de capa e a entrevista com o senador Magno Malta mostram um pouco do que tem sido feito nesse combate, nos últimos anos. Outro tema extremamente atual é a doença do século, a depressão, que é tratada sem rodeios, na intenção de desmistificar e expor algo que atinge tantas pessoas, as quais, por vergonha ou falta de informação, sequer procuram tratamento. A boa notícia ficou reservada para a matéria sobre o poder curador da fé em Jesus. São inúmeros testemunhos de pessoas, famosas ou não, que experimentaram a ação de Deus em suas vidas, vivendo milagres extraordinários. Temos também + missões, música, literatura e ótimos artigos. Boa leitura.

Tiragem 10.000 exemplares

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Os artigos publicados nas seções “Pastoral”, “Casamento e família”, “Política”, “Direito e Cidadania”, “Dicas de Saúde”, “Qualidade de vida” e “Contos e Crônicas”

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são de inteira responsabilidade dos seus autores. (*) Para acessar a versão digital da +Cristão, você precisa ter um leitor de QR Code em seu smartphone ou tablet. Abra a aplicação e aproxime a câmera do aparelho no QR Code, e se abrirá automaticamente um link. Caso não tenha um leitor de QR Code, sugerimos:

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+Agenda por Thimóteo Soares

CONGRESSO DE JOVENS NOVO DIA DE 28 DE FEVEREIRO A 04 DE MARÇO A Igreja Assembleia de Deus do Plano Piloto oferece o tradicional congresso de jovens Novo dia. Serão cinco dias de muito louvor com bandas e cantores da cidade e também a participação de preletores locais e do Rio de Janeiro. O congresso conta ainda com uma estrutura de alimentação e vendas de produtos evangélicos. Local: SGAS 611 Bloco E Via L2 Sul Entrada: Gratuita Info.: (61) 3445-5151 / www.facebook.com/mocidadenovodia

CONGRESSO REVOLUÇÃO G.A DE 28 DE FEVEREIRO A 04 DE MARÇO A Comunidade Cristã Ministério Vida do Novo Gama realiza o Congresso Revolução G.A, com o tema “Movimente-se”. O congresso tem como atrações: Oficina G3, Davi Sacer, Gustavo Esquivel, 3 Folds e Vida e Louvor. Pregações com: Pr. Edson Pereira, Pra. Roseane Almeida e Pr. Nelson Pereira.

Local: R 16, Conj. 02Hi, Novo Gama - GO Entrada: Gratuita Info.: (61) 9329-6565 / www.facebook.com/ccmvida

COMAADEG - COMUNHÃO COM CRISTO DIAS 01 A 04 DE MARÇO A Catedral das Assembleias de Deus do Gama realiza um grande Congresso de Mocidade e Adolescentes. Preletores: Pr. Egmar Tavares, Rev. Hernandes Dias Lopes, Pr. Cláudio Duarte, Pr. Lucinho Barreto, Pr. Sandro Fontoura, Pr. Nelson Junior e Pr. Mac Anderson. Louvor com: Thalles Roberto, Jozyanne e Davi Sacer. Local: Área Especial nº 34 - Setor Central lado Leste - Gama/DF Entrada: Gratuita Info.: www.facebook.com/comaadeg | (61) 3556-5104 / 3384-6423

QUINTA AUMENTADA - JOSIMAR BIANCHI DIA 06 - 20H Quinta Aumentada é um evento que está se tornando referência musical para o público cristão, não apenas pelo seu formato de show, mas também pelo requinte de convidados. No palco já se apresentaram cantores como: Carlinhos Félix, Stênio Marcius, Bekah Costa, Pr. Márcio Pereira, Hélvio Sodré, entre outros. Desta vez, Josimar Bianchi vem para trazer muita música e grandes histórias. Local: Espaço Nova Vida, QS 05, Lote 03, Lojas 1 e 2, Águas Claras/DF Entrada: Gratuita Info.: 61 3967-6292 / www.facebook.com/quintaumentada

Divulgue o seu evento na Revista +Cristão. Envie um e-mail para: agenda@revistamaiscristao.com; coloque no campo assunto: Divulgação Evento e nos encaminhe todas as informações necessárias para a publicação

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SUMÁRIO

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| EDITORIAL

| ARTIGOS

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Agenda

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Entrevista

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Ana Celia Bomfim

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Carlos Oliveira

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Josué Gonçalves

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Daniel Castro

A fé pode ser um santo remédio para a cura de doenças

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Zazo, o nego

Tráfico Humano

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Zazo, o nego

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Junior Sipauba

Magno Malta fala sobre o combate à violência sexual contra crianças e adolescentes

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Depressão

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Fé que cura

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Eventos e congressos

Como conviver com a doença sem perder a fé

O que a igreja tem a ver com isso?

Pr. Josué Salgado

Palavra Pastoral Dicas de Saúde Política

Casamento e família Direito e Cidadania Contos e Crônicas Mais Música

Qualidade de vida

| CAPA por Mércia Maciel Abuso Sexual contra crianças e adolescentes O inimigo pode estar mais próximo do que você imagina

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PASTORAL

por Josué Salgado

A família frente à doença da MUDANÇA

“O

s analfabetos do século 21 não serão aqueles que não conseguem ler e escrever, mas aqueles que não conseguem aprender, desaprender e reaprender” (Alvin Toffler. O Choque do Futuro, 1970). Em 1965 o autor norte-americano Alvin Toffler cunhou a expressão “choque do futuro” para descrever a tensão arrasadora e a desorientação causadas pela excessiva mudança num espaço de tempo demasiadamente curto. Toffler chamou esse choque de uma doença autêntica, um estado psicobiológico que ele denomina doença de mudança. Há quase cinquenta anos, o “sócio-futurólogo”, como ele mesmo se descreveu, afirmava que o momento representava nada menos do que a segunda grande cisão da história humana, só comparável em magnitude à primeira grande ruptura da continuidade histórica que foi a passagem do barbarismo para a civilização. Essa “segunda onda” tocaria inexoravelmente as estruturas familiares com várias mudanças e tendências. No capítulo 11 do seu livro “A Família Fraturada”, Toffler fala de “fraturas”, algumas delas absolutamente presentes em nossa realidade brasileira e até cristã, que nos desafiam à resiliência, à elasticidade, ao recobrar-se após o choque ou adaptar-se aos novos tempos: a quebra da mística da maternidade, com a chegada de embriões implantados ou bebês in vitro, a simplificação da família, limitada às vezes a um dos pais e um filho, a possibilidade de “pais profissionais” em substituição aos pais biológicos, a existência dos pais comunais e pais homossexuais, dos casamentos temporários e das múltiplas trajetórias matrimoniais, com dois, três ou mais casamentos e re-casamentos... Será realmente que tais “choques” são do presente? Ou muitos deles seriam reinvenções do passado? Será que essas fraturas familiares não representam uma terceira ruptura da continuidade histórica, agora da passagem da civilização de volta para o barbarismo reinventado? Em muitos aspectos, penso que sim! Nesse sentido a nossa capacidade de resiliência deve não apenas representar uma simples adaptação, mas também uma volta às origens. A resiliência não é apenas 8

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Josué Salgado Pastor titular da Igreja Memorial Batista de Brasília.

a capacidade de se adaptar às mudanças, mas também de se recobrar após ter sido submetido a uma deformação elástica. Parece que foi essa a orientação de Jesus a alguns religiosos que o procuraram para perguntar sobre a “fratura” – eles não chamaram assim – da banalização do casamento (Mateus 19.3-12). Eles perguntaram a Jesus: “É lícito ao marido repudiar (gr. apoluo – mandar embora de casa) a sua mulher por qualquer motivo?”. Esta era a prática “avançada” da época: mandar embora de casa a mulher, se ela, por exemplo, queimasse a comida. Jesus mostrou resiliência, não simplesmente se ajustando àquela “novidade” e “avanço”, mas remetendo ao princípio de tudo; recobrando as origens: “Não tendes lido que o Criador, desde o princípio, os fez homem e mulher (...). Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem” (vs. 4, 6). Os religiosos tentaram usar o mesmo argumento de Jesus e também recobraram as origens: “Por que mandou, então, Moisés dar carta de divórcio (gr. apostasion) e repudiar (gr. apoluo)?”. Mas Jesus Cristo lembrou que a Escritura Sagrada revelada (Moisés = o Pentateuco, a Lei) não mandava (gr. en-telomai), apenas permitia (gr. epi-trepo) repúdio e divórcio “por causa da dureza do coração” (gr. sklerokardia. vs.7-8); e lembrou novamente: “entretanto, não foi assim desde o princípio” (vs.8). O choque do futuro já chegou e não se limitou a afetar indústrias, tecnologia ou nações; “é uma força concreta que se infiltra profundamente na vida pessoal, obriga-nos a representar novos papéis e nos coloca frente a frente com o perigo de uma nova e muitíssimo perturbadora doença psicológica” (Toffler, op.cit.). É a doença da mudança nas estruturas familiares. Muitos se ajustam e até estimulam essas mudanças como se fossem de fato “avanços”, propondo contraditoriamente estruturas que caracterizavam o barbarismo. O Evangelho também propõe uma volta ao passado; não ao barbarismo, mas ao princípio de tudo, quando Deus fez homem e mulher e os uniu, fazendo deles uma só carne. Contra a doença da mudança, busquemos o remédio divino! + SOLI DEO GLORIA!

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Você inVeste mais nos pés dos seus filhos que na cabeça deles?

O mundo de hoje está caminhando sobre valores invertidos: pessoas que querem impressionar mais por sua aparência que por sua competência. Na cabeça de muitos, um caríssimo tênis de grife é status. Mas quando se trata de uma boa escola, o investimento já não é o mesmo. Educação é o maior patrimônio do ser humano. É o único bem que não se desgasta, não sai de moda. É para sempre. Do 1º ano do Ensino Fundamental à 3ª série do Ensino Médio, o Leonardo da Vinci oferece o que existe de melhor e mais completo em educação com uma proposta pedagógica eficiente e uma equipe de professores diferenciada para garantir a formação de jovens éticos, seguros, criativos e empreendedores, preparados para vencer desafios na escola e na vida.

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ENTREVISTA

Magno Malta por Mércia Maciel e Jairo Ribeiro

O

baiano Magno Malta, 56 anos, Senador do Partido da República (PR) eleito pelo estado do Espírito Santo, destacou-se no cenário nacional ao comandar duas importantes CPIs (comissões parlamentares de inquérito): a do Narcotráfico (quando deputado, na Câmara) e a da Pedofilia (no Senado). Enfrentar o crime – com ramificações poderosas – foi um imenso desafio para o pastor evangélico e integrante da banda Tempero do Mundo. Malta é casado com a

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deputada e cantora Lauriete, do Partido Social Cristão (PSC), também do Espírito Santo. Diante de um tema de grandes dimensões e implicações para a vida nacional e mundial como o da pedofilia, o parlamentar demonstra segurança, mas ainda se emociona. Na entrevista à + Cristão, o senador ressalta que, dentre as contribuições ao combate à violência contra crianças e adolescentes, as novidades na legislação foram o marco de uma mudança de mentalidade e de compromisso com a infância.

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Foto: Moreira Mariz / Agテェncia Senado

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ENTREVISTA

Magno Malta - Emocionalmente, eu não saí bem. Saí muito duro. Até porque, se não se criar essa dureza interior, é difícil suportar tudo o que vi, como um pediatra abusar de uma criança com trinta dias de nascida; um pai violentar seu filho de um ano; líderes religiosos, que, na mesma mesa em que celebram a Santa Ceia, abusam de criança de quatro, cinco anos. São criminosos que se autointitulam padres e pastores. Eu vi todas essas imagens, principalmente, ao quebrar o sigilo do conglomerado Google – um fato inédito no mundo. Eu vi a lama, a degradação, a morte da humanidade. O pedófilo viola o emocional, o moral, o psicológico, o familiar, toda uma história de alguém. A criança violentada na infância é alguém que poderia ser outra pessoa. E quando hoje eu vejo alguém na rua, numa esquina, vendendo o corpo mutilado pelo tempo, eu tenho mais compaixão do que sentia ontem. Ali, poderia estar um nadador que nunca ganhou medalha, uma professora que nunca entrou na sala de aula, um médico que jamais salvou uma vida; mas são pessoas sofridas, traumatizadas. Então, saí mais duro e, ao mesmo tempo, mais sensível. É difícil explicar. Mais duro, porque considero essa gente irrecuperável. Mais sensível, por tudo que vi. Por isso, tenho o anseio de encorajar mais gente na vida pública, na igreja, para atentar ao problema, embora o país já esteja pautado nesse assunto, graças aos trabalhos da CPI da Pedofilia. Antes, ninguém falava disso. + Cristão – O senhor defende prisão perpétua para pedófilo. Quais são seus argumentos?

+ Cristão – A CPI da Pedofilia constatou que o perigo contra as crianças está dentro de casa. Falta coragem para denunciar? MM – Antes da CPI era assim. Hoje, não. Você liga a televisão e vê pedófilo sendo preso, a polícia fazendo

operações, o povo denunciando. E você pergunta: “Aumentou o número de pedófilos?” Não. Eles já existiam, estavam camuflados na sociedade e foram revelados pela CPI. E, com o advento da internet, aumentaram significativamente as denúncias. Antes, as famílias não queriam escandalizar e se calavam. + Cristão – As regras sobre a prescrição do crime de pedofilia praticado contra crianças e adolescentes foram alteradas recentemente. Agora, a contagem de tempo para a prescrição só vai começar na data em que a vítima fizer dezoito anos, caso o Ministério Público não tenha antes aberto ação penal contra o agressor. Até então, a prescrição era calculada a partir da prática do crime. Esse avanço na legislação poderá coibir a prática, uma vez que os pedófilos se aproveitam do medo da criança e do adolescente para manter o silêncio? MM – A lei era frágil, pois o Ministério Público, numa ação civil privada, só poderia denunciar o pai agressor se a família autorizasse a iniciativa. Se ela não desse autorização, quando a criança vitimizada fizesse dezoito anos, ela teria seis meses para denunciar. Uma aberração! Mas veio a Lei Joana Maranhão, uma das grandes contribuições da CPI. Agora, com

MM - Defendo que se faça uma miniconstituinte para debater formas de enfrentamento à violência, como o

narcotráfico, e implementar a prisão perpétua para pedófilos. É preciso ter atenção especial para a pedofilia, que é o crime dos crimes. O pedófilo vai para a rua porque tem bom comportamento. Claro! Não tem criança nos presídios. Acho que, se não fosse um cristão, defenderia outra coisa. Mas somente quem deu a vida pode tirá-la. E falo com pureza de alma. Porque um pai, um tio, que tem coragem de tirar uma criança do berço para violentá-la sexualmente e saciar sua tara, sua lascívia, sua indignidade, é um monstro – e é preciso tirá-lo da convivência da sociedade. De cada dez abusos, sete são de pessoas da família e seis são praticados pelo pai. Um sujeito que nunca foi treinador de nada e se prepara para ser um treinador de natação, de futebol ou vai para o sacerdócio, porque sabe que vai estar perto de uma criança e poderá saciar sua lascívia, isso é inaceitável. Prisão perpétua, para a gente, que é cristão, está de boa medida.

Foto: Divulgação

Revista + Cristão - Durante dois anos, o senhor mergulhou no perverso mundo do abuso sexual de crianças e adolescentes, ao presidir a CPI da Pedofilia, em 2008. Como o senhor saiu dessa experiência?

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da Microsoft, mas do Google, não. Ele se especializou em desobedecer. Porque você não tinha lei para combater crimes cibernéticos, mas tinha o Código Civil, no Brasil, que diz que qualquer empresa multinacional que se torne nacional é obrigada a cumprir o Código de Processo Civil do país. E nós tínhamos ainda o Código de Defesa do Consumidor, que eles nunca respeitaram. Como uma CPI tem muito poder, eu acabei quebrando o sigilo do Google. Esse era nosso

Foto: Lia de Paula / Agência Senado

essa lei, em homenagem à nossa nadadora premiada e que foi abusada na infância por seu treinador, o prazo para denunciar o abusador começará a contar a partir dos dezoito anos da vítima. A ação passou a ser pública, e o Ministério Público não precisa mais da autorização da família para denunciar. Agora, depois de dezoito anos, quando se sentir mais encorajada, a vítima poderá denunciar seu algoz. Foi por isso que a Xuxa denunciou, aos cinquenta anos, os abusos do namorado de sua avó. Ela falou porque agora estava protegida pela Lei Joana Maranhão. Outro avanço foi a alteração do artigo 240 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA, para punir quem produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente. Esse projeto também foi uma sugestão da CPI da Pedofilia e virou lei com apenas sessenta dias de trabalho do colegiado, quando descobrimos aquele tenente pedófilo, em São Paulo, que se suicidou quando foi descoberto pela CPI. Nos pertences dele, encontrei fotos horríveis com uma criança de dois anos. Quando o Presidente Lula viu aquilo, entrou em desespero e, logo, alteramos o ECA, criminalizando a posse de material pornográfico. Foi a primeira alteração do Estatuto, em dezoito anos de sua existência. + Cristão – A CPI da Pedofilia também deu relevantes contribuições para o combate à pedofilia na internet. MM – Sim. A polícia do Brasil foi a que mais avançou tecnicamente, mesmo sem ter legislação. Aliás, a chegada da internet pegou o mundo inteiro sem leis. Então, como punir crime cibernético? O Brasil, há quatro anos, vivia uma guerra contra o Google. Havia alguma contribuição

grande drama. Porque na Operação Carrossel, que foi demandada pela Espanha, apreenderam-se duzentos computadores de pedófilos, no Brasil, que “pagou o mico” de, dois anos depois, devolvê-los e não punir porque não tinha lei para isso. O próprio ECA protegia o crime cibernético. Ele dizia que o cara só era criminoso se fosse pego, em flagrante, remetendo ou recebendo material pornográfico infanto-juvenil. Assim, ele poderia armazenar o que quisesse. E pasmem: o Brasil está entre os três maiores consumidores de pedofilia do planeta. Ninguém era pego em

flagrante, e não se tinha a posse criminalizada. Então, o sujeito poderia ter no computador o que quisesse. Assim, além de quebrar o sigilo do Google, obrigamo-lo a assinar um termo de ajuste de conduta, que foi o grande passo da CPI. As operadoras de telefonia e de cartão de crédito também foram obrigadas a assinar esse termo. Dessa forma, o indivíduo que faz compras on line de material de pedofilia é automaticamente registrado na Polícia Federal. Ademais, as autoridades judiciárias brasileiras recebem um cartão, chamado de “navegador”, pelo qual elas entram nesses sites sem ser identificadas. Ou seja, avançamos muito no combate aos crimes cibernéticos, e o mundo se admirou da firmeza do Brasil. Graças também à parceria da SaferNet, uma associação civil de direito privado que protege os direitos humanos na internet, o Google passou a colocar banners de alerta à pedofilia. Isso não parou mais. Mas é como fechar buraco de rato. Você fecha um, e logo outro é aberto, em outro lugar. No entanto, o Brasil foi o que mais avançou nesse campo. O Google tinha uma demanda, nos tribunais internacionais, com a Índia, como tem com o Brasil. E eu fui àquele país para entregar os pedófilos que pegamos aqui, assim como todos os outros do Brasil foram entregues por nós, por meio da Interpol. E o mundo começou a aprender conosco. A legislação ainda não é perfeita, mas o fato de criminalizar a posse já foi um grande avanço. + Cristão – Falar sobre sexo ainda é um tabu entre as famílias, principalmente se a conversa é com as crianças. A falta de diálogo dentro de casa é uma das principais dificuldades não só para identificar, mas também para prevenir esse tipo de crime? MM – É preciso falar. Esse é o crime dos crimes. Você precisa orientar uma criança de tenra idade a se

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ENTREVISTA defender. E, por mais cuidado que você tenha, ela não vai ficar 24 horas debaixo de seus olhos. O pedófilo é uma sombra, alguém por quem se é capaz de colocar a mão no fogo. É um sujeito acima de qualquer suspeita. A mãe deve, ao dar banho em seu filho, dizer que o seu “piupiu” é só pra fazer xixi e que ninguém pode tocá-lo e que o carinho do adulto não é ali, mas no rostinho. A mamãe deve dizer que, se alguém tentar colocar a mão na sua calcinha ou cuequinha, é para gritar. Eles são tão covardes que correrão. É preciso ensinar, orientar. Filho da gente não pode dormir na casa de ninguém. Por mais que você conheça a pessoa, o pedófilo você não conhece. “Ah, é meu vizinho há mais de vinte anos”. Não, o pedófilo você não conhece. E até porque criança não precisa dormir na casa de ninguém, porque dormindo ela não brinca. Mas alguém poderá querer brincar com ela. Nas redes sociais, os pais precisam saber com quem os filhos falam. Computador deve ficar na sala, não no quarto; tem que ficar onde você possa ver o que seu filho

faz na web. Pai e mãe não podem ser analfabetos em internet. E é preciso saber identificar a criança abusada. Ela não fala, mas sinaliza. Faz xixi na cama, adoece, fica depressiva, chora muito, tem pesadelos e cai no rendimento escolar. Ela dá todos os sinais porque se sente culpada, pois o pedófilo sempre agrada, em troca do silêncio. E quando chega às vias de fato, ele toca o terror – diz que é um segredinho “só meu e seu e se contar, poderá acontecer uma coisa ruim com seus pais” – e a criança leva esse drama pela vida toda. Se não vomitar esse monstro, lá na frente, será uma pessoa desequilibrada. É um crime tão terrível que é preciso vencê-lo.

“Você ensina a história do Mar Vermelho e de Noé, sua arca e os bichinhos. Isso tudo é bacana e tem que ensinar, mas não livra uma criança do abuso. É preciso orientar. Quem instrui, precisa falar.” (Magno Malta)

+ Cristão – E quanto às igrejas e lares cristão? MM – Você ensina a história do Mar Vermelho e de Noé, sua arca e os bichinhos. Isso tudo é bacana e tem que ensinar, mas não livra uma criança do abuso. É preciso orientar. Quem instrui, precisa falar. Quando você tem alguém que diz que é pastor, mas abusa; um líder de criança e adolescente

que é abusador, é uma prova de que não estamos imunes a isso. Dizer que é evangélico não é suficiente. Acho que já superamos muito esse problema, mas ainda existe algum tabu e é preciso vencê-lo, em favor de nossas crianças.

Foto: Divulgação

+ Cristão – O senhor é presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Família Brasileira. Há muitos ataques à instituição, que está no coração de Deus?

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MM - Claro que há. E isso é espiritual. Tudo que se fez, nos últimos quinze anos, foi tentar bombardear pilares. Por isso que a sociedade está caminhando para essa degradação. A discussão agora é tirar do calendário escolar o Dia dos Pais, o Dia das Mães, retirar a palavra sexo e colocar identidade de gênero, e aí pode ser qualquer coisa. Há uma tentativa de homossexualizar o país, de violentar a natureza de Deus, que criou macho e fêmea. Então, acho que há uma tentativa nesse sentido, e advirto que, por muito menos, Deus destruiu Sodoma e Gomorra. +

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POLÍTICA

por Carlos Oliveira

O PARADOXO DO ORÇAMENTO IMPOSITIVO

A

aprovação da Proposta de Emenda Constitucional 358 de 2013 é o principal sonho de consumo dos parlamentares brasileiros, quase tanto quanto a reeleição. Essa PEC obriga o governo a liberar emendas de deputados e senadores ao orçamento da União. É questão de honra para o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), aprová-la antes de terminar a legislatura atual. Inclusive, a comissão especial responsável pela análise da proposta foi instalada agora, em 19 de fevereiro. Pelos planos de Alves, o cronograma está mais que atrasado. A meta era ter aprovado a PEC no ano passado, em tempo de as mudanças figurarem na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e, por consequência, no orçamento de 2014. O otimismo foi tamanho, que a votação da LDO atrasou mais de quatro meses. Fosse nos Estados Unidos, seria o fim do mundo. Imagina, todo o planejamento de gestão do país atrasado, à espera do “eldorado” dos políticos. Como não houve condições conjunturais de aprovação do orçamento impositivo ainda no ano passado, deputados e senadores conseguiram negociar com o governo a inclusão de regras previstas na PEC já para o orçamento atual. Porém, ainda não está como querem os congressistas. Tanto é que a gritaria é geral com o recente anúncio do governo avisando a contingência de mais de R$ 13 bilhões das emendas para este ano. Poderia ser pior. A vantagem é que a LDO aprovada para 2014 é, ao menos, um alento para os parlamentares, ainda mais em ano eleitoral. Segundo a lei, o governo não pode bloquear as emendas individuais em percentual superior ao que for aplicado de corte no total das despesas discricionárias. É importante salientar que os recursos previstos nas emendas devem ser aplicados nas regiões de cada congressista. Em tese, seria uma implicação mais direta da atuação do representante sobre o representado. A princípio, o dinheiro vai para construção de pontes, viadutos, escolas, postos de saúde, para eventos culturais, etc. Portanto, parece algo muito bom, não? Por isso mesmo, o que seria paradoxal no orçamento impositivo? Vamos lá. De um lado, prefeitos, governadores e, principalmente, os órgãos de controle saberão com antecedência, e certeza, os valores exatos destinados por deputados e senadores aos seus municípios e estados. Aí os bons gestores terão melhores

Carlos Oliveira é mestre em ciência política e jornalista.

condições de planejar políticas públicas, o bem-estar do povo, com os fiscais sempre de olho. É o melhor dos mundos. Por outro lado, o mais tenebroso, não por excesso de pessimismo, mas pelo calejar da história, é o da corrupção. Antevejo os amantes do malfeito de plantão tramando maracutaias, contando com a certeza de que a emenda do deputado, do senador fulano de tal, chegará ao destino sem nenhum risco de ficar empacada nos cofres do Tesouro. Corruptores e corruptos terão todas as chances das artimanhas, de planejarem com astúcia o direcionamento de licitações, o superfaturamento, o desvio, o roubo. Num ambiente perfeito, talvez as imagens de figurões da política brasileira atrás das grades iniba o apetite das sanguessugas à espreita. Contudo, no fundo, no fundo, temo haver tantas delas impunes por aí, que muitas podem enfrentar o risco da cadeia, literalmente “pagar pra ver”, ou, “roubar pra ver”. A saída, no plano institucional, é cada eleitor deste imenso Brasil não dar um nanômetro de folga a político algum. Não podemos ser inertes. Vamos fiscalizar cada emenda destinada à nossa cidade, ao nosso Estado. Calculemos centavo por centavo, qual a aplicação, sob quais processos licitatórios estão sendo investidos. Eu concordo que fazer isso requer esforço além do limite, pois todos temos nossa vida muito corrida. Então, vamos pelo menos delimitar a fiscalização àqueles nos quais votamos. Se cada um fizer isso, o todo será beneficiado. Portanto, ao primeiro sinal de desvio, de “mão-grande”, acione o Ministério Público, a Polícia, quem quer que seja, mas não deixe os corruptos escaparem dos castigos destinados aos bandidos. Esta é a esperança material para o aniquilamento dos larápios, sugadores das forças do povo. Quando pensamos no plano espiritual, a nossa ação como seguidores de Jesus Cristo é capaz de prevenir os malfeitos comuns à humanidade decaída. É importante lembrar que seguir a Jesus é viver, agir e reagir como Ele. Se formos assim, em todo tempo, em qualquer lugar, damos o primeiro passo para contagiar os mais variados ambientes com o legado cristão; não é religião, mas a prática de vida espelhada em Jesus. E a presença d’Ele nos corações impede a preponderância do mal. Vale lembrar sempre que a Bíblia nos orienta a orar pelas autoridades, para termos + uma “vida quieta e sossegada” (1 Timóteo 2, versos 1 e 2). É isso. +CRISTÃO FEVEREIRO 2014

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DICAS DE SAÚDE

por Ana Celia Bomfim

MIOMAS UTERINOS: Preciso me preocupar?

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iomas uterinos são os tumores benignos mais comuns em mulheres e têm incidência variável conforme a idade. Em estudos científicos, observou-se a presença deles em 4% das mulheres com idades entre vinte e trinta anos, podendo chegar até em 33% das mulheres de faixa etária entre quarenta e sessenta anos. Assim, o mioma é um tema recorrente em círculos de conversa feminina e ainda traz muitos questionamentos. Alguns fatores reconhecidamente aumentam o risco para a presença desses tumores benignos: raça negra, histórico familiar de mioma, pacientes que nunca engravidaram, obesidade e idade superior a quarenta anos; por outro lado, diminuem o risco de incidência: menopausa, gestações em quantidade superior a cinco, utilização prolongada de anticoncepcional, tabagismo e uso de acetato de medroxiprogesterona de depósito, que é também um anticoncepcional. A importância dos miomas em relação à fertilidade deve-se, sobretudo, à faixa etária em que são muito frequentes, a qual coincide com a faixa de idade em que muitas mulheres estão planejando engravidar, ou seja entre trinta e quarenta

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Ana Celia Bomfim é médica

ginecologista e obstetra. Formada pela Universidade Federal do Piauí, pós-graduada em Cirurgia Ginecológica Minimamente Invasiva pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais.

anos. Nesse ponto, devemos entender como o mioma se comporta ou, na verdade, como ele não se comporta. Assim, os miomas podem ser únicos ou múltiplos; muito pequenos (menores que um centímetro) ou extremamente grandes (de 10 a 20cm). Podem localizar-se na parte mais externa do útero (porção subserosa) e causar pouco sangramento; ou podem localizar-se na parte mais interna do útero (porção submucosa) e provocar grandes hemorragias. Ocorre ainda passarem um período sem aparentar nenhum crescimento, ou crescer de forma significativa em pouco espaço de tempo. Com esse comportamento variável, conseguimos entender por que existem tantas possibilidades para o tratamento dos miomas, tais como apenas acompanhar por meio de ultrassonografia, em intervalos regulares (por exemplo, uma vez por ano). Existem outros tratamentos como o uso de bloqueadores hormonais, a exemplo da cirurgia para retirada apenas do mioma (miomectomia), ou a retirada cirúrgica do útero como um todo (histerectomia). Em caso de diagnóstico de mioma, a mulher deve conversar com o seu médico de +confiança, que orientará o tratamento mais adequado.

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Foto: Divulgação

PEDOFILIA

por Mércia Maciel

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e você não estiver preparado para entrar no triste mundo de crianças e adolescentes vítimas de pedofilia, pare essa leitura. Mas saiba que esse mal somente poderá ser combatido com coragem e informação. Assim, esta reportagem tem muito a dizer. No Brasil, 165 crianças e adolescentes, por dia, sofrem abusos, segundo dados da campanha nacional “Todos Contra a Pedofilia”. 18

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Ela rejeita o toque de carinho, perde a fome, o sono e a vontade de brincar. Vive retraída, triste, com medo, tem baixo rendimento escolar e chora sem motivação. As alterações comportamentais são sinais de um perverso crime que rouba a inocência e a alegria da criança vítima de abuso sexual. Em 2009, o caso de G.M.B.S., engravidada pelo padrasto aos nove anos, em Pernambuco,

chocou o país. O corpo franzino carregava um casal de gêmeos quando chegou ao hospital. A menina foi levada pela mãe para fazer um aborto. Estava amparada pela lei que autoriza o procedimento em situação como essa, na qual a gestante corre risco de morrer. Na sacola que levava, alguns brinquedos e uma triste história de três anos de abusos. Atônitos, os médicos se comoveram diante da

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ABUSO SEXUAL

CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES O inimigo pode estar mais próximo do que você imagina

menina, que pesava 33 quilos, não passava de 1,36m de altura e tivera sua infância interrompida. Do ponto de vista médico, a pedofilia é um distúrbio psicossexual. Para que alguém seja considerado pedófilo, basta que sinta desejo sexual por crianças e nutra fantasias constantes com elas. Já aos olhos da lei, é criminoso aquele que, da fantasia, parte para a ação. De acordo com a Orga-

nização Mundial da Saúde (OMS), o transtorno costuma manifestar-se na adolescência e, em geral, o portador é tímido e inseguro. É aquele indivíduo que costuma ser “uma pessoa acima de qualquer suspeita”, o que facilita sua perversa atuação. Quando se fala em pedofilia, as primeiras reações são aversão e revolta contra o agressor. Mas... e quando o inimigo mora dentro de

casa? Estimativas apontam que quatro em cada cinco casos desse tipo de crime são cometidos por familiares ou pessoas próximas, como pais, padrastos, tios e amigos da família. O abuso sexual infantil é um problema silencioso e sofrido. Confusas e amedrontadas, em razão das ameaças de seus agressores, as pequenas vítimas também sentem vergonha e até mesmo culpa pela violência que sofrem.

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passa a espancá-la ou a fazer terrorismo emocional”, alerta a subtenente Guerreiro. A omissão da família é mais um duro golpe contra a criança que sofre abuso sexual. No lugar onde deveria se sentir amada e protegida, há quem exija o seu silêncio, enquanto outros minimizam o caso por medo das consequências de uma denúncia. Segundo Guerreiro, 90% das mães são coniventes com o crime. “Elas fingem que não veem ou, quando percebem, não abordam a situação. Muitas, por ciúmes e por julgar que foi o filho quem seduziu o marido, passam a maltratar a frágil vítima”, afirma. A subtenente, que é membro da Igreja Evangélica Quadrangular de Curitiba, diz-se radical quando trata do assunto. “Culpo 100% os pais pela negligência com seus filhos. O que me assusta não é a violência de poucos, mas o silêncio de muitos. Quem poupa o lobo sacrifica a ovelha”, resume. Em geral, as pequenas vítimas levam anos para falar da agressão ou jamais o fazem. Na maioria das vezes, a dor emocional é tão intensa que o silêncio ensurdecedor impera. Na tentativa de amenizar o sofrimento da vítima – se é que isso é possível –, a psicóloga e especialista em violência doméstica contra crianças e adolescentes, Cristina Fukumori Watarai, de Londrina, interior paranaense, utiliza em seus atendimentos, inclusive nos

Foto: Arquivo pessoal

”QUEM POUPA O LOBO SACRIFICA A OVELHA.” O nome não poderia ser mais apropriado: Subtenente Guerreiro. Sobrenome de coragem para uma tarefa tão difícil. Há trinta anos na Polícia Militar do Paraná, Tânia Mara Guerreiro é a única policial militar do Brasil especialista no combate à pedofilia e representante da ONU nessa área. Toda essa experiência credenciou-a a dar palestras país afora e pelo mundo. A convite da Interpol, já palestrou em países como Hungria, Canadá, França, Portugal e Alemanha. De norte a sul do Brasil, ela viaja para alertar pais, professores e famílias sobre a importância de denunciar. Tânia Mara Guerreiro entrou nesse perverso mundo quando coordenava a área de desaparecidos do Movimento Nacional em Defesa da Criança Desaparecida do Paraná e logo percebeu que crianças e adolescentes achados nas ruas não queriam voltar para suas casas. Intrigada, procurou as causas e se deparou com os abusos sexuais que sofriam em seus lares. “Nas ruas, eles se protegiam e ninguém avançaria os seus sonos. Mesmo assim, muitos dormiam com uma faca embaixo do travesseiro”, relembra. Quando o algoz é um parente ou tem vínculo com a família, por conta dos laços afetivos e de confiança, a criança com idade de até sete anos pode não interpretar o abuso como agressão. Como é molestada desde cedo, considera como naturais as brincadeiras sexuais. “O pedófilo é astuto. Ele inventa historinhas e jogos, brinca, dá doces e presentes e, assim, ganha a confiança. Quando a criança percebe que o ‘carinho’ que ela recebe não é o mesmo que ele dá às outras crianças, passa a considerar a atitude errada. Então ela se isola, fica triste, agressiva, urina na cama e passa a ter dificuldades escolares. Já o pedófilo impõe o pacto de silêncio e, quando a criança diz ‘não’,

Tânia Mara Guerreiro, subtenente da Policia Militar do Paraná

“Estimativas apontam que quatro em cada cinco casos de pedofilia são cometidos por familiares ou pessoas próximas.”

casos de abuso com fins de perícia judicial, atividades lúdicas, brincadeiras e historinhas. Tudo para levar a criança a relatar como foi a agressão que sofreu e quem a vitimizou. “No trabalho com crianças, conduzimos a entrevista de forma a trazer menos dano a ela. O profissional que atende às vítimas precisa ter um mínimo de experiência na área; caso contrário, o envolvimento com a parte prejudicada, a história relatada e os sentimentos despertados no profissional podem gerar ansiedade e interferir no processo de avaliação”, explica. Ainda segundo Watarai, o profissional deve ser cauteloso ao perguntar para as crianças, de forma que não as induza a responder. Cristina Fukumori Watarai, membro da Igreja Evangélica Holiness, em Londrina (PR), por vários anos atendeu no Centro de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS), da cidade paranaense. Lá chegam crianças vítimas de violência, e seu trabalho era descobrir se elas teriam sofrido também abusos sexuais. Durante o tempo em que atendeu no CREAS, ao lado da psicóloga Alessandra Rocha Santos Silva, ela ouviu histórias tristes e assustadoras de crianças e adolescentes destruídos pelos abusos sexuais.

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Foto: Beto Ribeiro Foto: Arquivo pessoal

Zazo, servidor público, músico e compositor

Cristina Fukumori Watarai

Como fruto dessa intensa vivência profissional, Cristina, Alessandra e outras duas psicólogas escreveram o livro “O Segredo da Tartanina”, com o objetivo de ajudar terapeutas e assistentes sociais a diagnosticar suspeitas de pedofilia. Com abordagem lúdica e interativa, a literatura conta a história de uma pequena tartaruga vítima de agressão, servindo-se dessa analogia para alimentar uma conversa franca e elucidativa sobre esse tema tão difícil. “O abuso sexual se manifesta de forma silenciosa e tem como característica o segredo, justificado pelo medo da revelação, ameaças do autor, vínculo estabelecido com o agressor, vergonha e culpa que a vítima pode vir a sentir. Dessa forma, são raros os casos em que ela, mesmo adulta, conte espontaneamente, com facilidade”, afirma Cristina. O retorno foi tão satisfatório, que o livro passou a ser recomendado também a pais, professores e responsáveis como forma de diagnosticar suspeitas e colaborar na prevenção. Os desenhos também ajudam a criança a se expressar. Em 2010, uma exposição realizada na Espanha e

batizada de “Os monstros da minha casa” exibiu desenhos criados por crianças vítimas de abuso. Chocantes e revoltantes, os traços mostravam a violência inominável que haviam sofrido e o que se passava na cabecinha dos pequenos. Os rabiscos destacam seus próprios órgãos genitais ou de membros da família, ou mostram situações explícitas de abusos. O PERIGO A UM CLICK A internet tem-se tornado um campo fértil para os pedófilos. Não é para menos. As crianças deixaram de lado as brincadeiras inocentes e se aventuram no mundo virtual. Hoje existe um lucrativo comércio que alimenta a rede de pornografia infantil online, onde fotos e vídeos são vendidos e chegam a movimentar 5 bilhões de dólares por ano. Segundo a Polícia Federal, o Brasil é o país recordista em venda de imagens de abuso infantil pela internet. Já pesquisa realizada nos Estados Unidos demonstrou que, em todo o mundo, a cada cinco crianças que navegam na rede mundial de computadores, uma recebeu proposta de um pedófilo,

enquanto uma em cada 33 já se comunicou com um desses indivíduos, por telefone, e recebeu dinheiro ou passagem para se encontrar com seu algoz. No mês passado, a organização holandesa Terre des Hommes, que defende os direitos das crianças, alertou o mundo para a epidemia de menores pagos para realizar atos sexuais via webcam. A ideia foi ousada. Para atrair pedófilos, numa sala de bate-papo na internet, a ONG criou Sweetie, uma menina virtual filipina de dez anos. Durante dez semanas, a animação em 3D, altamente realista, foi conectada por 20 mil pervertidos que ofereceram dinheiro para que ela se exibisse na webcam ou aceitasse propostas sexuais. Desses, mil foram identificados. A ONG conseguiu coletar seus nomes, endereços, números de telefones e fotos e encaminhou as informações às autoridades competentes de cada país. Terre des Hommes lançou uma campanha mundial contra a exploração sexual infantil pela internet. A estimativa da organização é de que haja mais de 750 mil pedófilos online. Para aumentar a eficiência das punições, a entidade realizou uma petição mundial que explica sua estratégia às autoridades de cada país e detalha como a garota Sweetie foi criada e usada para capturar os predadores sexuais. Segundo levantamento da comScore Inc, que monitora os acessos à rede mundial de computadores, as redes sociais e as salas de bate-papo são o principal passatempo dos quase 9 milhões de crianças brasileiras que navegam pela internet e, assim, tornam-se presas fáceis dos pedófilos. Eles atraem crianças e adolescentes, com perfis falsos e linguagem que cativa o público infantil; ganham confiança de suas vítimas e fazem chantagem emocional com elas. Foi numa dessas salas de bate-papo, em 1998, que a vida de um casal de São José dos Campos, no interior paulista, mudou. O técnico

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em informática Anderson Batista e a advogada Roseane Miranda foram surpreendidos por uma imagem que invadiu seus computadores – uma menina com cerca de oito anos, nua, acorrentada pelo pescoço e pelos braços, sendo violentada por um adulto. Atônitos e chocados, naquele mesmo ano, criaram o site censura.com.br, que recebe denúncias de pedofilia. Com o apoio da Secretaria Especial de Direitos Humanos, do governo federal, e a adesão de internautas do mundo inteiro, o site deu origem à Campanha Nacional de Combate à Pedofilia na Internet. Hoje as denúncias feitas no site são diretamente direcionadas para a Polícia Federal. “A internet é uma aliada do pedófilo, que se esconde no anonimato. Eles assumem qualquer personalidade e enganam nossas crianças. Com pouca ou quase nenhuma capacidade de se defender e resistir ao assédio, são presas fáceis”, adverte Roseana Miranda. A preocupação da advogada se justifica. Levantamento da organização norte-americana Norton Online Family Report, que ouviu crianças e adolescentes com idades entre oito e doze anos, em 23 países, revelou que as crianças brasileiras passam 13,8 horas, em média, conectadas por semana. Especialistas brasileiros em segurança digital fizeram pesquisa para saber como os pedófilos conquistam a confiança dos pequenos. Quando, ardilosos, perguntam onde fica o computador, querem saber, na verdade, se a criança tem privacidade ou se há adultos por perto. Eles demonstram interesse ao dizerem que a criança parece triste e perguntam o que ocorreu – a intenção é a de transformarem-se em confidentes dela. E, para mostrar afinidade, perguntam qual é a banda preferida, o clube de futebol do coração, o filme predileto. As informações também servem para que saibam quais tipos de presentes podem oferecer – CDs, 22

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ingressos para jogos ou shows. No Brasil, segundo o levantamento, 14% das crianças que usam internet já sofrem algum tipo de assédio. Nesse cenário, vale o conselho dos mais velhos de não aceitar balas, nem carona de estranhos e aplicá-lo para o computador. O engenheiro Lauro Mendonça, de Brasília, monitora as páginas acessadas por seu filho de nove anos. O computador ficava no quarto do menino, até que o pai o surpreendeu em conversa com um estranho. “Fiquei alucinado, cego de pavor. Foi quando percebi que não estava orientando meu filho para os perigos do mundo digital e dos pedófilos de plantão”, relata. Depois do susto, as conversas entre pai e filho tornaram-se frequentes, e o computador passou para a varanda da sala de estar, sob olhos vigilantes do pai. O legislativo brasileiro também deu sua contribuição no combate à pedofilia. Em 2008, por iniciativa do senador Magno Malta (PR/ES), o Senado Federal criou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o crime Brasil afora e colocar o tema na pauta da sociedade e das autoridades públicas. Deu certo. O colegiado investigou denúncias de delitos em nove estados e produziu um relatório final de quase duas mil páginas. Pastor evangélico e integrante da banda gospel Tempero do Mundo, Magno Malta, que presidiu a CPI, ressalta que, entre as contribuições, as modificações na legislação foram marco de uma mudança de mentalidade e de compromisso com a infância. Um dos resultados obtidos pela Comissão foi a lei que aumentou a punição e abrangência de crimes relacionados à pedofilia na Internet. Além de elevar de seis para oito anos a pena máxima de crimes de pornografia infantil na rede, a norma jurídica criminalizou a aquisição, a posse e a divulgação para venda de mate-

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Foto: Divulgação

rial pornográfico, condutas que não estavam previstas na legislação e que já são tipificadas pelas leis em outros países. “O Brasil é campeão em consumo de pedofilia no mundo. E esse é um título do qual não nos orgulhamos. A ausência de políticas de prevenção a crimes cometidos pela rede mundial de computadores e a dificuldade em obter acesso aos dados das empresas de Internet e de telecomunicações, que poderiam identificar os criminosos, foram as principais queixas de delegados, procuradores, promotores e operadores do Direito em geral, além de representantes de entidades ligadas ao tema ouvidos em audiências públicas promovidas pela CPI”, avalia Magno Malta. Outro fruto da CPI foi a Lei 12.650, de 2012, que alterou as regras sobre a prescrição dos crimes de pedofilia, estupro e atentado violento ao pudor praticados contra crianças e adolescentes. Agora, a contagem de tempo para a prescrição só vai começar na data em que a vítima fizer dezoito anos, caso o Ministério Público não tenha antes aberto ação penal contra o agressor. Até então, a prescrição –

“Culpo 100% os pais pela negligência com seus filhos. O que me assusta não é a violência de poucos, mas o silêncio de muitos. Quem poupa o lobo sacrifica a ovelha.” (Tânia Mara Guerreiro)

que é a perda do direito de processar pelo decurso de prazo – era calculada a partir da prática do crime. O projeto ficou conhecido como Lei Joanna Maranhão, em homenagem à nadadora que denunciou os abusos a que foi submetida durante a infância por um treinador. “Uma criança que sofreu

abusos não tem condições de denunciar seu agressor. Era preciso corrigir essa distorção, sob pena de o abusador ficar impune”, afirma o senador capixaba. Quando fala em pedofilia, o semblante de Magno Malta muda. O parlamentar afirma que foi difícil encarar os pedófilos, durante os depoimentos prestados perante ao CPI. “Eles são uns monstros e, indefesos, os pequenos perdem a ingenuidade e a alegria da infância”, afirma com os olhos marejados. Os resultados – depoimentos, imagens e denúncias – da CPI da Pedofilia inspiraram o pastor Rodrigo Delmasso, que atua com jovens da Igreja Sara Nossa Terra, no Sudoeste. “Depois de tudo que vi, não podia ficar de braços cruzados, enquanto crianças e adolescentes são molestados ao nosso redor. Com um grupo de amigos, partimos para a ação”, afirma determinado. Surgia assim o Movimento Brasília contra a Pedofilia, formado por voluntários que não fecharam os olhos para o problema. Nos finais de semana, eles fazem palestras para alunos, pais e professores; entregam folhetos em feiras e locais de

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grande circulação e, quando identificam pessoas que querem denunciar abusos ou são procurados por elas, encaminham os casos às autoridades competentes. Trabalho não falta. O Distrito Federal é a quarta unidade da federação em casos de pedofilia. “Temos uma boa parceria com o Ministério Público, Polícia Civil e Polícia Federal, esta última para os casos de pedofilia na internet. Formalizamos a denúncia e servimos de muro para proteção entre a vítima e o agressor”, acrescenta. Rodrigo Delmasso alerta para a sexualização das crianças e adolescentes. Ele lembra que, no início do ano, um livro paradidático classificado como “um guia inusitado para crianças descoladas”, da autora francesa Hèléne Bruller, causou indignação em pais e professores e desencadeou uma petição pública para a revogação imediata da indicação do livro às escolas do país. A obra fala sobre sexo, masturbação e métodos contraceptivos para crianças e pré-adolescentes entre nove a catorze anos. O texto e as ilustrações são explícitos e ensinam, passo a passo, como manter relações sexuais. Numa das páginas, há um desenho de um casal de adolescentes fazendo sexo enquanto três meninos observam. A ilustração sugere que a relação foi interrompida por conta de uma bola de sorte que caiu em cima do casal, deixada cair por um dos meninos que olhava. E ainda ensina que “o Kama Sutra é um livro que ensina todas as posições que existem para transar”. Para Delmasso, a publicação estimula as crianças a fazerem sexo precocemente e facilita a ação de criminosos. Ele conta que comprou o livro como uma leitura complementar, na lista de material escolar da filha de cinco anos, mas ao folhear o material, empalideceu-se de susto. “O conteúdo é inadequado e um verdadeiro manual para os pervertidos. As crianças imitam super-heróis e adultos. Um livro desses, em mãos 24

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erradas, é um perigo. Os pais devem ficar de olho em seus filhos, em materiais que são distribuídos nas portas das escolas, e o conteúdo que está sendo dado”, alerta Delmasso. “O meu povo perece por falta de conhecimento.” (Oséas 4.6) Nos dias atuais, as crianças e adolescentes são bombardeados por todo tipo de estímulo na área sexual. Tudo tem conotação sexual – filmes, músicas, propagandas da TV. E cada vez mais cedo eles são iniciados no assunto, nas escolas e pelos amigos. Na contramão dessa realidade, em boa parte das igrejas o tema ainda é tabu. Para a subtenente Tânia Mara Guerreiro, o povo de Deus sofre por falta de conhecimento. Segundo ela, os pedófilos se infiltram dentro das igrejas porque encontram um campo fértil e um povo ingênuo. “O crente precisa deixar de ser bobo, inocente. O fiel leva os filhos à igreja e os deixa soltos e Deus que cuide! E o pedófilo sabe disso”, alerta. Ainda segundo Guerreiro, o assunto deve ser abordado com franqueza. “Basta olhar o noticiário e constatar que falsos pastores e falsos fiéis se aproveitam da boa índole do cristão para abusar de seus filhos. Estamos pagando o preço por nossa inocência”, reitera. Recentemente, a Polícia Federal deflagrou uma das maiores operações do combate à pedofilia já realizadas no país. A Operação Glasnost, como foi batizada pela PF, expediu cerca de oitenta mandados de busca e colocou na cadeia 26 pessoas, dezoito delas presas em flagrante. A ação ocorreu em onze estados e é fruto de dois anos de investigações. Entre os alvos da operação, há pessoas de todas as idades e profissões, incluindo um policial militar, um soldado da Aeronáutica, vários professores e um chefe de grupo de escoteiros. Os investigados compartilhavam fotos e vídeos de adolescentes, crianças e até de bebês, muitos deles sendo abusados sexualmente por adultos, e as enviavam para seus contatos no Brasil e

Pastor Rodrigo Delmasso

no exterior. Um deles abusava sexualmente da própria filha, de apenas cinco anos de idade, e compartilhava as imagens desses abusos na internet, com outros pedófilos ao redor do mundo. De acordo com a Polícia Federal, além dos alvos da Operação Glasnost, mais de duzentos suspeitos continuam sob investigação. A PF informou, ainda, que, em todos os casos identificados, providências imediatas foram tomadas a fim de que os abusos fossem prontamente interrompidos. O nome dado à operação – Glasnost – é uma referência à medida política implantada, juntamente com a Perestroika, na União Soviética, durante o governo de Mikhail Gorbachev, que contribuiu em grande parte para a intensificação de um clima de instabilidade causado por agitações nacionalistas, conflitos étnicos e regionais e insatisfação econômica, sendo um dos fatores causadores da ruína da antiga URSS. A ideia de batizar a operação com esse nome era de fazer ruir o império perverso da pedofilia no Brasil. No início desta reportagem, um desafio a esta leitura foi feito para que o lobo poupado não sacrificasse + a ovelha. Missão cumprida.

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CASAMENTO&FAMÍLIA

por Josué Gonçalves

Felicidade conjugal Não é um acidente

Josué Gonçalves é pastor, terapeuta familiar e presidente do Ministério Família Debaixo da Graça.

As decisões podem estabelecer sua felicidade conjugal e familiar

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família é oásis no deserto da vida. O pai, mesmo que tenha uma profissão sem nenhum glamour na sociedade é, naquele ambiente, o herói de todos. A mãe, que raramente se parece com as modelos produzidas das revistas, é recebida em casa como a mais bela das mortais. Os filhos são apoiados, têm suas habilidades desenvolvidas e suas limitações trabalhadas. Queridos incondicionalmente, repreendidos e abraçados, treinados e alimentados, levam consigo a continuação do nome da família e dos ideais culturais e espirituais pelos quais os pais tanto prezam. Ah, família, lugar de descansar e recobrar as forças. Espaço para recuperação das doenças e desfrute dos anos que passamos na terra. Mas nem sempre tudo funciona tão bem, não é verdade? Cada membro tem suas limitações, seus pecados, suas fraquezas e suas manias. Felicidade não é fruto do acaso, mas resultado de trabalho concentrado e embasado em princípios deixados pelo Criador, que realmente deseja e está empenhado em fazer da sua casa o melhor lugar do mundo. Nossa história de vida é marcada por decisões. Na raiz dos nossos sucessos e fracassos lá estão elas. Se estamos com a cabeça quente ou serena, se estamos apressados ou tranquilos, se fomos bem influenciados ou não, se agimos por impulso ou se refletimos sobre a situação, todos esses elementos exerceram algum tipo de pressão sobre as decisões que tomamos – e não devemos menosprezar o clima que envolve a tomada de uma decisão, qualquer que seja. O clima no qual estamos envolvidos quando tomamos decisões interfere diretamente sobre o que decidimos, mas não podemos atribuir ao ambiente a responsabilidade por uma decisão errada da nossa parte. Até mesmo se identificarmos uma pessoa próxima a nós, cujo conselho tenha nos levado a uma decisão desastrosa, em última instância a palavra final de quem foi? Foi nossa. Se uma decisão errada pode arruinar a vida de uma ou mais pessoas, o contrário também é verdadeiro: uma decisão acertada pode levar você a lugares espaçosos, a delícias que jamais imaginou provar, a sensações de grande

alegria e gozo que podem ser divididas com as pessoas que você ama e para as quais você quer o melhor. E, novamente, lá está ela, a decisão, a sua decisão! Eu poderia montar aqui um quadro de como uma decisão feliz e acertada pode mudar a vida de pessoas, de famílias, de igrejas, cidades e até mesmo um país. Não faltariam exemplos em nenhuma área para demonstrar isso. Se hoje sofremos com os problemas do pecado, foi pela decisão de alguém, a decisão deliberada de desobedecer à Palavra de Deus; mas por outro lado, até mesmo a salvação de todo aquele que crê em Jesus e a esperança que temos hoje a respeito da vida eterna também podem ser atribuídas a uma única decisão: Deus amou o mundo e decidiu dar seu Filho unigênito para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna. Que maravilha é ter consciência de que podemos contar com o Senhor na orientação dos nossos passos, das nossas decisões. Há quarenta e dois anos, o Senhor havia tirado o seu povo do Egito, onde era escravo e estava sendo oprimido pelo sofrimento imposto pelo faraó. O Senhor organizou a remoção do povo que saiu do Egito e foi dirigido por Ele à Terra Prometida, Israel. Isso aconteceu há mais de 3 mil anos. Pouco antes de aquela multidão apossar-se da terra herdada, o Senhor usou Moisés para aconselhar o povo nos passos seguintes. Quando Moisés reuniu os milhares de Israel, disse que a terra seria para eles uma herança eterna, pois era o cumprimento de uma promessa que não pode falhar. O povo, porém, poderia tomar o caminho que quisesses, contanto que assumisse as consequências. O caminho bom e o caminho mal estavam diante do povo de Israel, e o Senhor aconselhou o seu povo a escolher o caminho que leva à vida. Reconheço que tomar decisões não é tarefa fácil, mas podemos confiar no cuidado de Deus que nos acompanha e guia em nossas decisões. Ele deseja ver seu povo acertando e sempre escolhendo a vida. Há situações que vemos como imutáveis, monstruosas, mas que podem ser transformadas para melhor + com uma decisão acertada debaixo da graça de Deus.

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ENTROU EM CENA Como conviver com a doença sem perder a fé por Mércia Maciel

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entir-se triste é uma reação natural diante de frustações, de um passado sofrido, de escolhas erradas, de perdas ou do medo delas. Mas se o sofrimento vem sem motivo ou a reação a ele é desproporcional; se a melancolia insiste em não dar trégua; se a solidão for a melhor companhia e até mesmo o desejo de morrer, uma opção... cuidado! A depressão entrou em cena. Em todo o mundo, cerca de 340 milhões de pessoas sofrem desse mal. A Organização Mundial de Saúde (OMS) calcula que, em vinte anos, o distúrbio emocional ocupará o segundo lugar no ranking das doenças que mais matam. O crente pode sofrer de depressão? Essa dor da alma é uma doença psíquica ou uma ação maligna? Longe da intenção de responder

a essas perguntas, uma constatação: a igreja é a primeira a fechar os olhos para o problema do irmão. Logo, a indiferença se reveste de um manto de falsa santidade e, em lugar da mão amiga estendida, surgem julgamentos precipitados e condenações: “É falta de fé!”, exclama um. “Crente fiel não passa por isso!”, constata outro. Isso quando não se põe na conta do Diabo (sem eximir sua ação maléfica na área emocional do homem) a culpa pela depressão. Hoje, há mais amigos de Jó do que companheiros de jugo. O ambiente eclesiástico, equivocadamente, leva o cristão a pensar que está imune às doenças emocionais e protegido das fragilidades humanas. Mas a própria Bíblia narra histórias de heróis que viveram momentos di-

fíceis e de conflitos da alma. Quem poderia imaginar que o profeta Elias, um homem espiritual que enfrentou corajosamente a apostasia do povo de Israel, os falsos profetas e a ira de seus inimigos, render-se-ia à depressão? Até ao triunfo do Carmelo, quando, sozinho, enfrentou 450 profetas de Baal, não se via nele nenhum sinal de tristeza profunda e apatia. Entretanto, o servo de Deus esperava o avivamento – que não veio – de Israel. E o ânimo de Elias mudou. Tudo isso o deixou com uma pesada sobrecarrega emocional e, diante da ameaça de morte sentenciada por Jezabel, teve medo e fugiu. O homem que corajosamente enfrentara os profetas de Baal se refugiou numa caverna, caiu em profunda depressão e desejou a morte. +CRISTÃO +CRISTÃO FEVEREIRO FEVEREIRO2014 2014

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DEPRESSÃO O profeta é personagem recorrente em estudos bíblicos sobre depressão. Não por menos, Tiago, em sua Carta, afirma que Elias “foi homem semelhante a nós, sujeito aos nossos sentimentos”. Segundo o pastor Denilson Torres, da Igreja Batista Missionária Vale de Matatu, em Salvador (BA), de modo geral, o meio cristão tem uma visão distorcida da enfermidade. Para ele, é um equívoco atribuir à depressão o sinal de fraqueza espiritual, de falta de fé ou de não confiar em Deus. “Isso acaba estigmatizando e trazendo ainda mais sofrimento ao que já está deprimido. Há um grande equívoco quando consideramos o homem como um ser compartimentado. Não somos apenas seres espirituais que habitam casulos de carne. Biblicamente, o homem é um ser integrado, no qual corpo, alma e espírito se interagem. Aquilo que acontece com o corpo físico ecoa no nosso espírito; e o mesmo ocorre no caminho inverso”, argumenta. Um antigo cântico diz: “Não pode estar triste um coração que ama a Cristo...”. Por conta da cultura que impera nas igrejas de que o crente deve estar sempre alegre porque é um vencedor, muitos negam a doença. “Sem contar que a culpa acompanha de perto quem caiu em depressão. E por mais que a pessoa saiba quais são as causas do transtorno – seja química, traumática, neurológica ou até genética – trata o seu próprio “sentir depressivo” como algo moralmente ruim. É o deprimido quem mais se cobra por estar assim. E ainda quando recebe críticas de pessoas que não entendem a situação, a coisa se torna mais séria. O linchamento moral autoinfligido é um dos aspectos mais danosos com que o deprimido tem que lidar”, afirma o pastor Denilson Torres. Ele recorda-se de um

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e-mail que recebeu, com um pedido de ajuda. Quem escreveu dizia: “finjo ser feliz para não chatear quem está do meu lado... mas não sei se aguentarei por muito tempo”. Ainda segundo Torres, se o homem fosse apenas um ser espiritual que habita um corpo, não haveria a necessidade da ressurreição da carne. “Uma enfermidade pode ter origem tanto nas coisas do espírito quanto originar-se nas questões de nosso corpo ainda não redimido. De qualquer forma, temos que tratar o indivíduo nas duas dimensões. Na espiritual, por meio de jejum, oração, leitura bíblica, aconselhamento. Na física, o tratamento deve vir pelo acompanhamento médico, de um bom terapeuta, psicólogo ou psiquiatra, de preferência cristão”, aconselha. Na avaliação do pastor batista, a igreja precisa ser sensível com o irmão deprimido. “Quando têm dor de cabeça, crentes tomam analgésicos, sem nenhum sentimento de culpa; hipertensos e diabéticos usam remédios de uso contínuo, mas condenam quem toma remédio para combater a depressão”, lamenta. O pastor jubilado da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil, em São Paulo, e doutor em Psicologia da Religião, Reverendo Zenon Lotufo Jr, também considera equivocada essa forma de ver a depressão. Ele garante: “É causa do agravamento do problema e de muito sofrimento desnecessário. Entre outros fatores, uma pessoa pode estar deprimida por se sentir culpada em relação a algum acontecimento, real ou imaginário, e se sentirá ainda mais culpada por ser ‘espiritualmente fraca’. Essa percepção envolve uma atitude crítica e reprovadora que jamais ajudará a pessoa a melhorar”. Ainda de acordo com Lotufo, que também é membro do Corpo de Psicólogos e Psiquiatras Cristãos (CPPC), quem

convive com o deprimido deve evitar dar conselhos ou exortá-lo a reagir ou a ter mais fé. “Isso só contribui para piorar as coisas, por mais que venha revestido de boa vontade. Ninguém pode ser responsabilizado por algo que se passa em seu interior, mas que ele jamais aprendeu a controlar. Por outro lado, dizer simplesmente que tal pessoa é vítima de forças que estão além de seu alcance poderá privá-lo da oportunidade de aprender a exercer maior controle sobre sua própria vida”, completa. Quem ouve as melodiosas e profundas composições de Stênio Marcius, algumas gravadas pelo cantor João Alexandre e outros nomes da MPB cristã, nem de longe imagina que o carismático cantor evangélico sofre de Transtorno Bipolar Tipo II. A característica marcante desse distúrbio psiquiátrico é a alternância, às vezes súbita, de episódios de depressão com os de euforia e de períodos assintomáticos entre eles. Descontroladas, as fases podem durar dias, semanas ou mesmo meses. Quando descobriu a doença – o primeiro diagnóstico foi o de depressão – Stênio já estava na casa dos quarenta anos. No entanto a doença, de origem hereditária, deu seus primeiros sinais aos seus dezessete anos.

“Uma enfermidade pode ter origem tanto nas coisas do espírito quanto originar-se nas questões de nosso corpo ainda não redimido.” (Denilson Torres)

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Músico e compositor Stênio Marcius

Ao lado de sua esposa, Selma, o músico viaja pelo Brasil, com seu ministério de adoração. Em cada lugar, quando fala do problema, os atentos ouvintes ficam abismados. “Eu digo que tomo remédio, vou ao psiquiatra, faço tratamento e ainda trabalho no Reino. Quem tem a doença ou convive com parentes ou amigos que são bipolares ficam aliviados e sempre alguém vem comentar: ‘Ah, então eu posso ter um ministério?’ ou ‘Então, não sou louco? Deus me ama?’ Mesmo com os problemas, exercemos nosso ministério, seguindo o conselho do Mestre de tomar a cruz e segui-lo”, explica o cantor. A depressão se reveste de várias formas. Para alguns, os sintomas são tão intensos que os incapacita para a vida pessoal, social e familiar. Para outros, a doença persiste, em um nível reduzido, durante meses ou anos, até que apresenta sua conta. Foi o caso do pastor da Igreja Nova Vida de Brasília, Nilson Luiz dos Santos. Segundo ele, o sinal de alerta de que algo estava errado com suas emoções vinha aceso havia anos, até que, num piscar de olhos, a depressão se instalou de vez. “A luzinha amarela já estava acesa havia bons e longos anos, só que, por falta de conhecimento e estilo de vida, eu não dei bola. Até que, da noite para o dia, eu amanheci muito mal. No dia

anterior eu estava bem, apesar de muito cansado. Fui dormir normalmente, mas a enfermidade amanheceu com o dia”, lembra. O drama do pastor da Nova Vida só estava começando. A depressão chegara com tal força que os sintomas se assemelhavam aos da dengue. Ele passou por oito médicos e ficou internado por quatro dias, com diagnósticos equivocados. Foram sessenta dias de prostração. A força de vontade para se levantar e viver tinha desaparecido. A análise certeira veio mais tarde, quando um amigo cardiologista, depois de outra série de exames, constatou estresse agudo depressivo. “Foi uma notícia ruim, mas recebida com certa alegria. Até que, enfim, algo iria ser cuidado”, recorda Nilson Santos, que segue em tratamento, com uso de medicamentos. A ciência entrou em campo para amenizar a vida de quem tem depressão. Uma nova técnica testada no Hospital das Clínicas (HC) de São Paulo promete abreviar o tratamento da enfermidade. Sem necessidade de cirurgia, os médicos usam ondas eletromagnéticas para estimular determinadas partes do cérebro. São dois segundos e meio de estímulo para pouco mais de 27 segundos de intervalo. No total, são quinze minutos de sessão. Essas on-

das atravessam o crânio e penetram no cérebro, gerando um estímulo dez mil vezes mais potente do que o campo magnético da Terra. Segundo Marco Antonio Marcolin, coordenador do Grupo de Estimulação Magnética Transcraniana (EMT), PHD pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, e autor do livro “Estimulação Cerebral Transcraniana para o Tratamento de Transtornos Psiquiátricos”, des­car­gas de energia modificam o padrão de trabalho de áreas do cérebro. “Em determinadas regiões do cérebro, os circuitos neuronais podem ser hipoativos, ou seja, funcionam menos, como se estivessem mais lentos que outros circuitos que temos; com essa estimulação magnética, conseguimos corrigir o seu funcionamento e melhorar os sintomas da depressão. São métodos promissores para o tratamento de problemas neurológicos e psiquiátricos. Temos pacientes que conseguiram diminuir drasticamente a dose diária de remédios que tomavam, e muitos sintomas da depressão desapareceram”, comemora. A estimulação eletromagnética transcraniana já é reconhecida pelo Conselho Federal de Medicina, e alguns planos de saúde cobrem esse procedimento. CUIDADO! SEU PASTOR PODE SURTAR A QUALQUER MOMENTO! Não é brincadeira, não. O caso é sério! Basta olhar a agenda de um pastor. Sepultamento pela manhã; reunião de liderança à tarde; celebração de casamento ao entardecer; culto à noite. A vida agitada, marcada por alternância de emoções – luto, preocupação, alegria, responsabilidade, exortação – ajuda a explicar o elevado índice de líderes espirituais em depressão. Sem contar a ansiedade de ministros do Evangelho que vão +CRISTÃO FEVEREIRO 2014

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pastorear em outra cidade, levar a três deles sabiam a causa da doença: família, começar do zero. Segundo a missão de resolver problemas de pesquisa de Francisco Lotufo Neto, relacionamento, a falta de suporte, a médico psiquiatra, pós-doutorado solidão ministerial e mesmo a baixa pela Universidade de Pittsburgh e remuneração financeira de muitos. professor de Medicina do Hospi- Desse estudo de caso, o pastor psital das Clínicas em São Paulo, foi quiatra levantou, entre os pacientes, encontrada a maior incidência de questões como estresse relacionado doenças mentais entre ministros ao exercício da atividade profissioprotestantes, se comparados à po- nal, falta de apoio da igreja, propulação geral. Os transtornos de- blemas de relacionamento com os pressivos responderam por 16,4% membros, pecado e enfraquecimendas doenças mentais encontradas to da fé. Segundo o pastor Pérsio, nos ministros protestantes. problemas com as esposas também Pesquisa realizada em 2008 pelo foram significativos. “A tônica das psiquiatra Pérsio Ribeiro Gomes dificuldades de relacionamento conde Deus, mestre em Ciências da jugais”, constata ele, “referiu-se à inReligião e professor da Univer- satisfação delas [esposas] pela falta sidade Presbiteriana Mackenzie, de tempo e, consequentemente, de mostra que o ministério pastoral, dedicação à família. Não raro, o pasintensamente entrelaçado com a tor exerce a função de um verdadeivida pessoal, pode desencadear ro executivo”. depressão e ansiedade – sem conCoautor do livro “Eclipse da Alma”, tar as exigências por parte dos fi- que trata da depressão sob o olhar da éis, expressas em cobranças e ex- psiquiatria, da psicologia e do aconpectativas da igreja. Filho de reve- selhamento pastoral, Pérsio Ribeiro rendo, desde cedo, o pastor Pérsio Gomes de Deus tem uma certeza: acompanhou os dramas e dificul- pastores também precisam ser cuidades de diversos colegas que têm dados. “A preocupação com o ‘reum chamado. “Meu próprio pai banho’, com o povo de Deus, com adoeceu em razão da grande de- as almas a serem salvas é genuinavoção ao pastorado, vivido 24 horas por dia. Seu corpo apresentou diversos sinais de fadiga, e aí veio o primeiro enfarte e outras doenças. Ao me formar em Medicina, fiz um voto a Deus de que, quando estivesse preparado, atenderia aos pastores, profissionalmente”, revela. Dentre os cinquenta prontuários de pacientes cristãos atendidos pelo pastor e psiquiatra num período de seis meses, treze eram de pastores de várias denominações pertencentes ao protestantismo histórico, representando 26% dos atendimentos. Somente Pérsio Ribeiro Gomes

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mente tão intensa que se torna prioridade absoluta, refletida inclusive na orientação das Sagradas Escrituras: ‘O bom pastor dá a sua vida pelas ovelhas’. Longe de apresentar qualquer pretensão teológica, afirmo, apenas, que o Bom Pastor é um só e já deu sua vida pelas ovelhas. Portanto, os demais pastores estão dispensados de cumprirem essa orientação em sentido literal”, ressalta. Com a experiência de quase quarenta anos de profissão, o pastor e psiquiatra completa: “Para temperar o que afirmo, recordo-me de uma interpretação dada por um experiente pastor presbiteriano a respeito de um versículo das Sagradas Escrituras: “Com a mesma medida que primeiramente vocês amam e cuidam de vocês mesmos, amem também a seu próximo”. Depois de descobrir que estava com depressão, o pastor da Nova Vida de Brasília, Nilson Luiz dos Santos, reconheceu que a vida ministerial é desgastante e já leva em conta suas limitações. “Hoje eu conheço melhor meus limites, aprendi a dizer ‘não’ para muitas coisas e mudei muito meu estilo de vida. Como dizem as Escrituras: ‘Há tempo para todo propósito debaixo do céu’. Eu tenho procurado distinguir o que é importante e necessário do que é urgente e nem sempre importante. É algo muito complexo, e cada dia é um aprendizado. Portanto, eu procuro viver um dia de cada vez”, pondera Santos. A Igreja Católica também já enxergou o problema. Recentemente, o congresso “Padre no Divã: conforto e desconforto no trabalho pastoral”, realizado no Instituto de Psicologia da Pontifícia Universidade Salesiana, em Roma, na Itália, debateu essa questão a fundo.

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Foto: Cristiano Carvalho

No Brasil, já existem centros especializados no tratamento dos servos de batina. O mais famoso e querido deles, Padre Marcelo Rossi, mergulhou em depressão, durante um longo período em que precisou tratar de uma lesão no tornozelo. Em função do tratamento, numa cadeira de rodas, chegou a engordar quarenta quilos e ficou privado de uma das atividades de que mais gosta – exercitar-se. Mas Rossi venceu a depressão e afirmou ter descoberto o ‘tempo de Deus’ para cada coisa em sua vida. Para o pastor presbiteriano Zenon Lotufo Jr., o sábio conselho do Livro dos Provérbios deve ser levado a sério – “Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, pois dele procedem as saídas da vida”. Ele conclui: “As verdades bíblicas libertam o homem. Tomar consciência de que o Deus que Jesus mostra é bom e misericordioso, que está do nosso lado e quer o nosso bem e de que graça significa que Deus nos ama incondicionalmente constitui a base da boa saúde mental e espiritual. A memorização e repetição

“Sabemos que Deus é poderoso para nos curar, se assim quiser. Mas também Ele pode não querer nos curar e continuar a nos usar assim, com esse espinho na carne, como usou a Paulo, Davi, e tantos outros.” (Stênio Marcius)

constante de passagens bíblicas que nos lembrem disso, bem como a leitura de livros edificantes – como ‘Maravilhosa Graça’, de Philip Yancey ou ‘O Valor do Pensamento Positivo’, de Norman Vincent Peale – são coisas que podemos fazer e que ajudam a evitar e a superar a depressão”. Já para o cantor Stênio Marcius, o Evangelho que se prega hoje é triunfalista, no qual Deus parece ter a obrigação de nos fazer ricos, sãos e felizes. “Sabemos que Deus é poderoso para nos curar, se assim quiser. Mas também Ele pode não querer nos curar e continuar a nos usar assim, com esse espinho na carne, como usou a Paulo, Davi, e tantos outros dos quais não aliviou a carga que tinham de carregar”, ressalta. “Mas nós cremos num Jesus o qual disse que no mundo teríamos aflições, mas era para termos bom ânimo, pois Ele tinha vencido o mundo. Cremos nEle e dEle dependemos a todo instante e para tudo”, conclui Stênio Marcius, sem se importar se terá crise ou não, porque + sabe quem está no barco com ele.

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Foto: Arquivo pessoal

Um santo remédio para a cura de doenças por Mércia Maciel

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e, há algum tempo, boa parte da classe médica torcia o nariz para a certeza das coisas que não se veem, hoje se rende à constatação de que ela remove montanhas e cura enfermidades. Estudos nesse sentido começaram com o médico americano Harold Koenig, do Instituto de Pesquisas Psíquicas Imagik. Ele e sua equipe acompanharam 455 idosos internados e concluíram que pacientes que confiam em Deus têm mais chances de superar a doença. Nos casos menos graves, Koenig observou que a média de internação daqueles que frequentavam a igreja mais de uma vez por semana era de quatro dias. Já os que raramente ou nunca iam, estes chegavam a ficar internados por até doze dias. Por acreditar em milagres, orar por seus pacientes e pregar a fé como remédio para a cura de doenças, ele já foi chamado de louco pelos colegas. Mas o cardiologista do Instituto do Coração (Incor) de São Paulo, Roque Marcos Savioli, com Doutorado pela Universidade de São Paulo, não liga e até se 32

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diverte com o título. Tudo porque ele sabe em quem crê. E algumas das experiências sobrenaturais que vivenciou com seus pacientes estão no livro que escreveu, Milagres que a Medicina Não Contou. Segundo Savioli, a ideia de escrever o volume veio logo depois de sua conversão, o que ele mesmo julga ter sido o maior milagre de sua vida. Dr. Savioli é um dos pioneiros, no Brasil, a levar Deus para o consultório. Durante as consultas, o cardiologista convida seus pacientes a orarem com ele. “É um convite para que Deus esteja à frente do tratamento e de suas vidas. O paciente fica mais calmo, reduz a ansiedade, enquanto fortalece seu otimismo na cura”, afirma. A iniciativa do cardiologista cristão é mais do que uma estratégia. É uma necessidade de quem está em busca do restabelecimento físico. Segundo levantamento americano, 73% dos doentes que vão a consultórios gostariam que os médicos falassem de Deus para eles. Savioli adverte que Deus deixou a Ciência para os homens e que negá-la é falta de sabedoria. “Muitos

pacientes não querem tomar remédios, mas esquecem que Deus exorta à prudência e Ele usa também a Medicina para curar. Somos apenas os instrumentos dEle”, esclarece. A fé curadora também foi objeto de estudo da psicóloga Joelma Ana Espíndola, da Universidade Federal de Roraima. Ela liderou pesquisa com doze voluntários em tratamento de câncer no Hospital Beneficiência Portuguesa, em Ribeirão Preto, interior paulista. O resultado não deixou dúvidas: pacientes que têm crença religiosa se mostram mais confiantes em enfrentar a do-

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Regis Danese em família. O carismático cantor, que teve sucesso estrondoso com a canção “Faz um milagre em mim”, jamais imaginou que um milagre visitaria sua casa.

ença. A pesquisa concluiu, ainda, que metade dos psicólogos ouvidos acredita que ter fé é o melhor recurso para lidar com situações de adoecimento. Segundo Joelma Ana Espíndola, em alguns serviços de oncologia, já se reconhece a necessidade de, além do psicólogo, um capelão fazer parte da equipe, independentemente de uma ordem religiosa. “Mesmo que a cura não ocorra, os cuidados paliativos podem trazer qualidade ao restante de vida do paciente. É importante mencionar que a definição de cuidados paliativos da Organização Mundial de Saúde, além da dimensão

biopsicossocial, abrange a dimensão espiritual”, observa Espíndola. “Faz um milagre em mim”. A letra da composição de Régis Danese, que em 2009 conquistou os primeiros lugares das rádios de todo o país, pede o milagre da transformação de vida. Mas nem de longe o carismático cantor iria imaginar que um milagre visitaria sua casa, três anos depois. De férias com a família, na Disney, no início de 2012, sua caçula, Brenda, então com três anos, passou mal em um dos parques temáticos. No carro, a caminho do hospital, debilitada, ela

surpreendeu os pais com uma afirmação: “Eu estou podre, mas não vou morrer”. Começava aí uma história de fé e cura. Brenda passou por uma série de exames, até a terrível doença ser diagnosticada – leucemia. “Vi nosso mundo desmoronar, mas, ao mesmo tempo, recebi um conforto do Senhor. Deus havia usado a própria boca da minha filha para dizer que iria curá-la”, conta Danese. A família voltou ao Brasil para um doloroso tratamento. E foi de fé em fé que o cantor e sua esposa, Kelly, encontraram forças para enfrentar o que vinha pela frente. +CRISTÃO FEVEREIRO 2014

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Em meio aos riscos e efeitos da quimioterapia, Régis Danese mantinha a confiança de que Deus estava operando o milagre. “A imunidade de Brenda ficou muito baixa, a menina tinha de tomar plaquetas e leocócitos para melhorar o sistema de defesa do organismo. Certa vez, na UTI, houve uma complicação. Então, começamos a jejuar e orar. Os irmãos de todo o Brasil oravam conosco. Dez dias depois, o Senhor ouviu nosso clamor, e Brendinha já estava tomando refrigerante e comendo sanduíche”, relata. Depois do tratamento intensivo, Régis e Brenda entraram no estúdio para gravar a música “Amor de Pai”, uma forma de agradecer a Deus o milagre recebido. O cantor e compositor Zazo, o Nego, um dos integrantes do grupo Céu na Boca, também passou pelo vale da sombra da morte. A sua história mistura fé e submissão a Deus. Em março de 2007, as malas estavam quase prontas para uma viagem missionária à África, quando os primeiros sintomas de um agressivo câncer no intestino começaram a dar sinais. Os planos do carioca radicado em Brasília foram adiados, e começava uma árdua batalha pela vida. Depois de três cirurgias envolvendo a retirada de um tumor e um quadro de infecção generalizada, os órgãos começaram a entrar em falência. Um coma agravara mais ainda a situação, e a equipe médica não dera esperanças. Era uma questão de tempo – pouco tempo. Querido pela comunidade evangélica, o servidor público recebeu mais do que carinho e palavras de conforto. Igrejas de várias denominações, no Brasil e até no exterior, mobilizaram-se em oração, jejum e vigílias, na certeza de que o milagre viria. “Eu não tive metástase, mas as orações em meu favor, sim”, diz Zazo, com o bom humor, que embala sua vida e canções. Oração respondida, chegou a hora da quimioterapia. Mas nem as dolorosas e graves complicações do tratamento abalaram a fé do compositor, que compôs em todos os seus momentos de luta. “Cheguei a perder trinta 34

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quilos e tive aftas espalhadas pelo corpo inteiro. Em meio à dor, louvava, só louvava”, conta Zazo. Nessa difícil luta pela cura, Zazo contou com a fé da esposa, Dorine Duarte, a Doquinha. Também intérprete, de voz harmoniosa, ela se lembra de que, em meio à iminente morte, numa entrega total, orou. “Em lágrimas, falei para Deus que Zazo era meu amado e meu melhor amigo, mas antes de tudo era dEle e que, assim, fizesse sua vontade. Não iria perder a fé e sabia que Deus era soberano e estava no controle da situação, independentemente de qual fosse a resposta”, recorda. A firme convicção de que a vontade de Deus era perfeita deixou-a tão tranquila, a ponto de as pessoas acharem que ela não estava entendendo a gravidade da situação ou negando-a. O milagre na vida de Zazo foi tão impactante que, no dia em que deixou o hospital, médicos e outros profissionais do estabelecimento pararam para filmá-lo tocar e cantar. “Algumas pessoas que cuidaram dele no hospital estavam desviadas e voltaram para Deus. Foi um tempo de visitação muito forte para nossa família e amigos”, explica Doca. As coisas do Espírito venceram os céticos e ganharam status oficial de partícipes do bem-estar humano em 1988, quando a Organização Mundial de Saúde mudou a definição de saúde. Deixou de ser apenas o fato de não ter doença para ser o bem-estar biológico, psicológico, sociológico e – vejam só – espiritual. Hoje já existe a percepção de que os médicos não devem ignorar as necessidades espirituais de seus pacientes. “Assim como o profissional pergunta se o paciente fuma, faz exercícios ou se há casos da doença na família, deveria também saber deles se querem um conforto espiritual. E ainda temos os capelães prontos para ajudar”, argumenta o cardiologista Savioli. E essa iniciativa já é consenso no American College of Physicians – oferecer atenção espiritual àqueles com doenças graves. A influência da fé na cura das mais diversas doenças é uma realidade entre médicos de todo o mundo.

Nos Estados Unidos, por exemplo, há mais de dez anos se exige que todos os programas de residência para psiquiatras incluam no currículo questões religiosas e espirituais. O cirurgião do Hospital de Base de Brasília Luiz Roberto Silva Filho era daqueles profissionais que colocava as curas de seus pacientes apenas na conta da Ciência, até que uma grave doença acometeu seu filho mais velho, então com seis anos. Abalado, tinha que ser forte para encarar um câncer que roubara a vitalidade de Raphael, um menino, esperto e cheio de alegria. Até ali, suas convicções eram alicerçadas em tudo que havia estudado nos livros de Medicina e nos conceitos filosóficos apreendidos em intensas leituras. Mas a dor de ver o pequeno sem andar e falar levou Luiz Roberto aos pés de Deus. Ele se converteu no início do tratamento do menino, que passou um ano em São Paulo, para o doloroso tratamento no Hospital Sírio Libanês. O médico, que é membro da Igreja Memorial Batista, dava seus intermináveis plantões durante a semana, para seguir, às sextas feiras, à capital paulista, onde estava sua esposa, também médica, a cardiologista Márcia Marísia. A cura de Raphael, hoje com onze anos, mudou Luiz Roberto. “Eu vivi um milagre. Deus operou no sistema imunológico de meu filho, que produziu anticorpos para combater aquele tumor. Ele é o médico por excelência e, como cristãos, sabemos que nenhuma folha cai sem o consentimento do Senhor”, testemunha, ainda emocionado.

“Cheguei a perder trinta quilos e tive aftas espalhadas pelo corpo inteiro. Em meio à dor, louvava, só louvava.” (Zazo)

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Foto: Beto Ribeiro

O médico cirurgião também passou a levar Deus para seu consultório. “Não perco a chance de mostrar que sou cristão, que tenho o conhecimento da Ciência, mas é Deus que, em sua soberania, é o supervisor do meu trabalho. Se o paciente abrir as portas para ouvir a Palavra, falo de sua doença, da Ciência e, sobretudo, de um Deus que cura e tem o domínio de todas as coisas. Se, do contrário, ele resiste, respeito e não insisto, pois o médico precisa ter a confiança de seu paciente”, ressalta. Luiz Roberto também percebe a importância da fé no tratamento de doenças. “O ato de crer gera esperança, bem-estar ao doente. Um paciente deprimido tem mais chances de complicações, pois o estado em que se encontra diminui a imunidade de seu organismo e também dificulta a cicatrização. Já aquele que consegue extravasar, por meio da fé, tem uma válvula de escape, porque espera pela ação de Deus, por um milagre”, observa. Ainda segundo o cirurgião, o cético é fatídico e só olha as estatísticas. “Quais são as chances, as porcentagens de cura. E quem tem fé sabe que as estatísticas existem, sim, mas ele espera numa chance a mais, numa espécie de bilhete premiado, que é Deus e seu poder curador”, argumenta. Pesquisa feita entre médicos pela Humaniza SUS constatou que 56% de médicos entrevistados acreditam que religião pode ter influência na saúde, mas ainda é significativa a parcela que resiste em introduzir o método na sua rotina de trabalho. A análise feita desse cenário foi a de que os jovens médicos de hoje têm dificuldade em conversar com os pacientes e em colher as histórias das doenças – o que se dirá de sua história espiritual? O Humaniza SUS é uma política nacional que existe desde 2003 para efetivar os princípios do Sistema Único de Saúde no cotidiano das práticas de atenção e gestão da saúde pública no Brasil, com o objetivo de qualificar o atendimento aos pacientes.

Zazo, servidor público, músico e compositor

E QUANDO TUDO DÁ ERRADO... Em muitos aspectos, o pastor Mardiel Santana de Almeida, da Missão Batista Mundial, em Senador Camará, no Rio de Janeiro, assemelha-se à sofrida história do servo Jó – prosperidade, vida sem turbulências, saúde, família feliz, até que... ele mergulhou em profundas águas de um mar revolto de sofrimentos que começaram com a doença de seu filho. O menino nasceu com uma grave deformação no rosto. Era preciso esperar que completasse um ano para operar as mandíbulas, porém, antes disso, veio sua primeira experiência com o sobrenatural: a cura, sem intervenção cirúrgica, deixou os médicos atônitos – as mandíbulas estavam exatamente iguais. A vida voltou ao normal até que... um ano depois, outra tragédia familiar. Sua amada esposa, Mary, apresentou um grave quadro de hidrocefalia. Ela passou por inacreditáveis dezesseis cirurgias no cérebro, várias pneumonias, uma meningite, uma trombose e quarenta dias com a parte frontal do cérebro aberta. Foi desenganada pelos médicos e sentenciada à morte. Mas a fé de que Deus era o dono da vida deu forças para que o pastor Mardiel continuasse a lutar. “O versículo que estava encravado no meu coração, enquanto passava por tanto sofrimento e via minha mulher vegetar em cima de uma cama, estava em Gênesis: ‘Haverá alguma cousa difícil ao Senhor?’ Não, não há limites quando resolvemos acreditar nEle. Somos seres racionais, mas quando temos fé, Deus muda nossa história. Muitas pessoas não deveriam estar enterradas. Claro que teremos que morrer por algum motivo, mas nada é impossível ao que crê.

Tudo para a glória de Deus”, completa Mardiel. A história do pastor batista está no livro que escreveu, Milagres pela Perseverança. Depois da experiência que teve, ele viaja por todo o país, contando seu testemunho de fé e cura. E quando a cura vem imediatamente? “Aí, é milagre”, responde o pastor Isaías Barbosa, do Ministério Ouvir e Crer, de Samambaia. Com diagnóstico de fibromialgia, anomalia que o deixava prostrado na cama, com dor da ponta dos pés à cabeça, e uma neuropatia difusa adquirida de uma época em que era alcoólatra, ele também creu no sobrenatural para a cura de seu corpo. “Esse corpo mortal está acostumado à doença, mas o decreto de Deus é vida”, afirma. Segundo o pastor Isaías, a Bíblia trata a questão da cura em três aspectos: Palavra, imposição de mãos e unção. “Comigo foi com a Palavra de Deus. Enquanto o físico está sendo cuidado, temos que nos apropriar das verdades bíblicas e introjetar em nossas mentes que Deus cura. Precisamos desenvolver a nossa fé ao ponto de ter a certeza de que a doença não nos aflige mais, e somos salvos e curados pela fé”, analisa o pastor Isaías Barbosa. Dezoito longos anos. Assim como a mulher que Jesus curou, depois de sofrer por muito tempo, o pastor Orcélio de Almeida Amâncio, da Assembleia de Deus do Núcleo Bandeirante, passou pela experiência curadora. Uma dor de estômago intensa o acompanhou por quase duas décadas, a ponto de quase o tornar “PHD em endoscopias”, como costuma brincar. Com dois anos de casados, ele flagrou sua

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jovem esposa chorando na cozinha. “Ela não gostava de lidar com as panelas, e ainda tinha que fazer dois tipos de comida – uma normal e uma dieta especial para mim. Entendi as razões dela e pedi ao Senhor a cura”, lembra. Até que um dia, Orcélio foi pregar na cidade de São João do Paraíso, no Rio de Janeiro, na igreja do sogro, também pastor. Naquela noite, as dores não deram trégua. Do púlpito, pregava e se retorcia. As pastilhas não aliviavam a terrível sensação. “Eu via gente dando glórias pelas curas que Deus operava naquele lugar”, recorda. Culto encerrado, de volta à casa do sogro. Na cozinha, achou uma lata, com um belo pedaço de pernil mergulhado em óleo. Não pensou duas vezes. “Há anos não saboreio uma iguaria dessas, mas hoje vou comer, porque estou curado”, disse o pastor, diante dos olhares incrédulos e apavorados da mulher. Em meio à euforia, pegou uma frigideira, fritou um bom naco de pernil, dourou com cebolas e jogou farinha. Já lambia os beiços só em pensar em saborear aquela belezura. Àquela hora, sua esposa, quase gritando, disse: “Você não vai comer essa gororoba. Misericórdia! Olha a sua saúde, homem!”, exclamava, quase em pânico. Orcélio, indiferente às súplicas da esposa, ainda a desafiou – caprichou na dose de um vidro de pimenta que encontrara. A traquinagem estava feita. Queria provar a todos que estava curado! Semanas depois, uma forte crise estomacal o levou ao hospital. Em todo o momento, o pastor assembleiano repetia que estava curado. Diante do médico e um tanto sonolento, por conta de um remédio que tomara para que o exame fosse feito, via seu estômago na tela de um computador, até que ouviu o médico afirmar: “Você não tem nada! Vejo uma cicatriz de uma úlcera. Qual é o nome do médico que fez a cirurgia? Está muito bem feita. Nunca vi nada igual”, exclamou. O pastor Orcélio não respondeu de imediato. Seus pensamentos voltaram-se para aquela cidade fluminense, onde pregara, com dores, enquanto Deus operava mila36

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gres. “Pensei no pernil, na farinha, na pimenta e, claro, na misericórdia de Deus. Satanás tinha tentado colocar dúvida no meu coração, mas agora tinha certeza da cura”. Deus queria me mostrar que havia me curado, e eu tinha que testemunhar. Então, respondi ao médico: ‘Quem me curou foi o chefe da Clínica’. O doutor derramou-se em elogios, dizendo que ele era muito bom mesmo. Ao que retruquei: “Ele é o melhor, o Médico dos médicos. Jesus me curou”, testemunhava. O ano era 2011. A história da policial civil Eudynar Gomes Lima, da Igreja Batista Ebenézer de Sobradinho, começou com um diagnóstico que mais parece uma sentença de morte para muita gente. Não foi diferente para ela. Antes de abrir o envelope com o resul-

“Deus era zeloso em todos os detalhes, e eu tinha fé de que Ele estava operando. Passei a cantar e orar a toda hora do dia.” (Eudynar Gomes)

tado de uma mamografia, Eudynar parou em frente a sua igreja e orou. Fez um pacto com Deus de que iria servi-lo, independentemente do resultado que estava sacramentado naquele papel. Criada em lar evangélico, àquela época estava longe do aprisco. “Mas ainda tinha o temor a Deus”, apressa-se em acrescentar. O resultado foi positivo – câncer de mama. O mundo da policial civil desabou. Ela chorou copiosamente, questionou os desígnios de Deus, e os sentimentos de inferioridade e de culpa tomaram seus

pensamentos. “Aí vieram as coisas ruins que o Diabo manda em flechas para nossas mentes”, conta. Mas Eudynar conhecia o Deus de seus pais, como costuma dizer. E se entregou completamente à adoração. “Comecei a conhecer um amor tão grande, que aquilo inundava meu coração. Em meio ao doloroso tratamento, Deus operava em meu corpo, mente e espírito e me ajudava em tudo. Até a peruca que usei durante a quimioterapia era perfeita, igual aos meus cabelos, que eu cultivava com tanto cuidado. Deus era zeloso em todos os detalhes, e eu tinha fé de que Ele estava operando. Passei a cantar e orar a toda hora do dia”, lembra animada. “Eu nem cantava no banheiro. Mas, um dia, estava em casa, soltando a voz, quando meu cachorro começou a latir sem parar, como se percebesse alguma coisa diferente. Eu cantava, ele latia. A cada nota que dava, ele latia ainda mais. Não reconhecia a minha melodiosa voz de louvor”, brinca. Casada e com dois filhos, agora é uma nova mulher. A exemplo do pastor Orcélio, Edynar escreveu sua história e batizou o livro de O Poder da Oração. Restaurada, sabe que foi a fé quem a ajudou a superar a doença e a conhecer o Deus de Jó, pois os seus olhos viram a salvação. Quando passa por experiência de cura, o cristão não é mais o mesmo. Zazo, o Nego, garante que muita coisa não é mais a mesma, depois que seu decreto de morte foi mudado. “Toda vez que me percebo dentro de uma situação de futilidade, de egoísmo, de fragilidade, lembro-me de que não voltei para isso. Meu foco é o Reino de Deus”, afirma. O cantor Régis Danese também assegura que muita coisa mudou com a cura de Brendinha. “Mudaram os valores; o olhar para a vida, o compromisso com Deus ficou mais sério. Certas brincadeiras e pequenas mentiras não fazem mais parte da minha vida”, diz Régis Danese, na certeza de que Deus entrou na sua casa, na sua vida, mexeu com+suas estruturas e sarou suas feridas.

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DIREITO&CIDADANIA

por Daniel Castro

Daniel Castro é advogado criminalista e eleitoral, pedagogo e chefe da assessoria de atendimento do gabinete do GDF.

Black Blocs e a desordem social

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os últimos dias, as manifestações ocorridas nas ruas das principais cidades do país chamaram a atenção pela forma violenta de protesto na busca de direitos. Grupos denominados black blocs mostraram a maneira violenta de reivindicar suas insatisfações sociais. Essas manifestações explodiram principalmente no Rio de Janeiro e em São Paulo, cidades que foram vítimas de ataques de depredação, tendo como alvo principal o patrimônio público. Os supostos manifestantes destruíram ônibus, prédios, praças e obras arquitetônicas. Os intitulados “manifestantes” não levantam bandeiras políticas, quer seja de esquerda ou de direita, não há uma definição específica de suas atitudes, apenas querem demonstrar, pela prática da violência e da destruição, que existem. Assim como na Europa e nos Estados Unidos, os black blocs, assumem a ponta da lança nas manifestações, iniciando o confronto direto com a polícia, e agora como novo alvo, a impressa. Não há uma definição de suas ações, nem mesmo uma justificativa plausível para tal afronta e agressão.

Fazem uma verdadeira barreira humana e enfrentam a polícia ou qualquer outro obstáculo à sua frente e nesse confronto utilizam-se de morteiros, coquetéis, barras de ferro, placas de sinalização e pedras, estilingues e tudo mais que apareça e que sirva como arma para seu ataque. O chamado “vandalismo arbitrário” tem como objetivo, na visão dos “manifestantes”, chamar a atenção das autoridades de que, por meio da desordem social, do caos e da destruição, algo tem que ser mudado. Será? O Congresso Nacional, na busca de uma solução para o problema, já elaborou projetos que buscam coibir esse tipo de manifestação exacerbada, mas vem a pergunta: a imputação desses “manifestantes” nas esferas civil e criminal não seria suficiente? Os Códigos Civil e Penal dispõem de tipificações para esses atos de vandalismo gratuito. Resta imputar responsabilidade aos agressores! Acredito que uma atuação eficiente dos órgãos de segurança, na prevenção dessas manifestações, aliada a um serviço de inteligência eficiente e constante, pode identificar com antecedência esses “manifestantes”, minimizando assim a agressão e destruição ao patrimônio público e, acima de tudo, responsabilizando os responsáveis pelos excessos praticados. +

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MISSÕES

Tráfico

Humano

O que a Igreja tem a ver com isso? Dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância mostram que 150 milhões de meninas e 73 milhões de meninos de até dezoito anos são vítimas de exploração sexual em todo o mundo. Na Índia, estima-se que doze mil crianças são traficadas por ano por Hosana Seiffert

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omes e lugares desta reportagem que envolvem missionários foram trocados. O motivo: segurança. As histórias parecem sair do roteiro de um filme, mas estão longe de ser ficção. Pelo contrário, refletem o drama de milhares de crianças e famílias que moram na Índia. O país, o segundo mais populoso do planeta, abriga cerca de um bilhão e 38

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duzentos milhões de pessoas. Fica no continente asiático e é limitado ao noroeste pelo Paquistão, ao nordeste pela China e ao leste por Bangladesh, Nepal e Butão. Ao sul está limitado pelo oceano Índico. A fauna e a flora são exuberantes. A cultura também. O país encanta e seduz os visitantes pela diversidade de sons, cheiros e monumentos, como o Taj Mahal.

Para os indianos, a religião é um estilo de vida. Berço do Budismo e do Hinduísmo, o país também convive com o Islamismo, o Cristianismo, o Jainismo, o Sikhismo, o Zoroatrismo e inúmeras outras tradições religiosas. Há milhares de deuses e deusas adorados no país. Mas são os hindus e os mulçumanos os dois maiores grupos de influência na sociedade.

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Foto: Cristiano Carvalho

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Tráfico humano – Um paradoxo que não para por aí Em todo esse contexto, o tráfico humano surge como uma das principais mazelas da população. Dados do UNICEF, o Fundo das Nações Unidas para a Infância, mostram que 150 milhões de meninas e 73 milhões de meninos de até dezoito anos são vítimas de exploração sexual em todo o mundo. Na Índia, estima-se que 12 mil crianças sejam traficadas por ano. Os motivos são os mais variados: prostituição, trabalho escravo, rituais e até tráfico de órgãos humanos. Também é comum a venda de meninas entre famílias pobres, algumas com apenas seis anos de idade. Missionários e 40

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grupos humanitários que atuam no país relatam que algumas adolescentes envolvidas em prostituição são obrigadas a atender a mais de dez clientes por dia em troca de um prato de comida. As denúncias se multiplicam, a polícia tenta agir, mas a rede de tráfico humano está tão infiltrada no país que as autoridades estão longe de conseguir combater esse tipo de atividade e dar um ponto final a ele. Sem uma resposta ágil do governo, a situação se transformou também em um problema de saúde pública. Em poucos anos, meninas expostas à prostituição ou a trabalhos forçados, sem alimentação adequada e em ambientes insalubres, encontram-se tão doentes que já não atendem mais às exigências de seus algozes. Nessa fase da vida, a maioria, entre quinze e vinte anos, são lançadas às ruas, sem abrigo, sem destino e sem esperança. Os dados são alarmantes. A UNICEF estima que há 500 mil crianças escravas da prostituição in-

fantil só na Índia. E é nesse contexto que surgem iniciativas de organizações humanitárias e grupos cristãos. O maior problema é a já conhecida perseguição religiosa que existe na Índia. Contraditoriamente o país, que convive com milhares de deuses e considera divinos até os animais, dá lugar a uma enorme tensão entre hindus, mulçumanos e cristãos. Para se ter uma ideia, oito estados indianos têm leis anticonversão. Empréstimos e até empregos são vetados para quem se torna cristão. Há notícias também de ataques a igrejas, que são queimadas, em pequenas vilas. Por tudo isso, missionários que atuam na Índia são orientados a manter o sigilo e trabalhar com cautela, em conjunto com a igreja indiana. A estratégia tem sido dar as mãos aos cristãos da Índia, que conhecem bem a cultura e o modo de vida locais, e mobilizar a igreja brasileira a dar um passo de fé na busca de justiça social também naquele país.

Foto: Missão Cristã Mundial

A Índia ainda convive com o sistema de castas, extinto por lei no fim da década de 40, quando o país tornou-se independente da Inglaterra, mas que ainda influencia fortemente cada setor da sociedade. Com uma organização social tão complexa e diversificada, entender a cultura indiana é um desafio à mentalidade ocidental. Segue-se a tudo isso a questão econômica: o crescimento verificado não tem beneficiado toda a população. Segundo o Fundo Monetário Internacional, a Índia tem uma economia emergente e está em 12º lugar no mundo, graças às multinacionais instaladas no país. A mão de obra numerosa com baixo custo e o tamanho do mercado consumidor são grandes atrativos. Mas, se de um lado a Índia se destaca na produção industrial de tecnologia de ponta, de outro, mais de 21 por cento dos indianos permanecem desnutridos, índice que chega ao dobro, em comparação com outros países em desenvolvimento, como a China e o Vietnã. Organismos internacionais apontam a corrupção, o desperdício e a má gestão de programas de governo como os principais fatores causadores da fome e da miséria que imperam na Índia.

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Foto: Divulgação

“As denúncias se multiplicam, a polícia tenta agir, mas a rede de tráfico humano está tão infiltrada no país que as autoridades estão longe de conseguir combater esse tipo de atividade e dar ponto final a ele.”

Você também pode agir A estratégia adotada para o resgate de crianças vítimas do tráfico humano passa pelo cuidado integral. Em dois meses no Brasil, a equipe do projeto “Resgate”, mobilizou igrejas e começou a levantar recursos para a compra de um terreno e construção de uma casa de recuperação que vai atender às vítimas. “A ideia é trazer esperança a essas meninas, que são abandonadas depois de serem exploradas quase até a morte”, conta o coordenador do projeto, um pastor indiano que precisa ter o nome em sigilo. Projetos semelhantes têm sido desenvolvidos pelo ministério Meninas dos Olhos de Deus, coordenado pela MCM – Missão Cristã Mundial, no Nepal, Camboja, Moçambique e também no Brasil, em Natal. Na Índia, as ações ainda são um sonho e um milagre, se comparadas ao tamanho do país e da miséria: estima-se que a Índia abrigue um terço dos pobres do

mundo – 37% da população está abaixo da linha da pobreza. O Projeto está em fase de estruturação em uma das cidades consideradas o centro do tráfico humano. Os gastos são enormes porque envolvem a construção de casas e prédios com dormitórios, salas de aula, consultório médico, quadra esportiva, salão multiuso e uma capela. Além de aprenderem sobre o Evangelho, as vítimas vão ter acesso a educação e a cursos técnicos profissionalizantes, abrindo assim uma perspectiva de vida e sustento para quem se formar. O grande desafio, no entanto, é a saúde física e emocional dessas meninas. “O maior gasto previsto é com tratamento médico. A maioria das vítimas chega às casas de recuperação em estado de subnutrição, com inúmeras doenças venéreas e muitas feridas na alma”, revela uma missionária brasileira que está há três anos na Índia e trabalha diretamente com o projeto de resgate.

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de grande valia; médicos, dentistas e psicólogos podem doar seus serviços profissionais por alguns dias ou semanas; professores, técnicos, educadores e costureiras po­dem montar um curso e ensinar um ofício às me­ ninas. Para os que querem ajudar daqui do Brasil, ofertas específicas em dinheiro também têm seu valor, pois são destinadas à aquisição de um terreno e construção; ou ofertas mensais, para a adoção de uma menina indiana. De acordo com a coordenação do projeto, com apenas 250 reais mensais é possível tirar das ruas uma vítima do tráfico humano e da prostituição, bem como dar-lhe os cuidados necessários à sua + reabilitação como ser humano.

Caso queira conhecer mais sobre o projeto “Resgate”, entre em contato com a redação da revista Mais Cristão:

redacao@revistamaiscristao.com

Foto: Divulgação

Sônia (nome fictício) convive com histórias como a da menina Deepa, de quinze anos, família endividada, pai alcóolatra, somente a mãe trabalha para sustentar a casa. Deepa recebeu uma proposta de emprego em Mumbai, a maior cidade da Índia, mas acabou sendo levada para escravidão sexual; ou do menino Raja, de oito anos, sequestrado quando jogava bola perto de casa, levado para trabalho forçado em fábrica de tijolos. Onde estarão Deepa e Raja agora? A pergunta deve ecoar dentro das Igrejas e comunidades cristãs brasileiras. A Grande Comissão deixada pelo Senhor passa por desafios como o projeto de resgate, reabilitação, educação e reintegração de vítimas de tráfico humano e exploração sexual na Índia. Para os coordenadores do Projeto Resgate, o voluntariado é bem-vindo: engenheiros, arquitetos, mestres de obras, eletricistas e equipes que ajudam a construir prédios, durante as férias, são

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CRÔNICAS E CONTOS

por Zazo, o nego

O atendente

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arde de clima abafado, um daqueles meses de final de ano, época em que Brasília é palco de dias quentes e a população clama por chuvas. Mauro ia a uma agência dos correios. Um tanto irritado, estacionou o carro perto do posto, subiu uma pequena rampa de acesso. Levava uma caixa daquelas que a Empresa de Correios e Telégrafos vende para encomendas, já fechada, com tudo preenchido. Era só postar. A máquina que dava as senhas de atendimento estava quebrada, de modo que as pessoas organizavam uma fila na base do olhômetro. Um sujeito magro e careca de blusa amarela, do outro lado do balcão, acenou para que se aproximasse. Era o atendente. Chegara sua vez. - Boa tarde, senhor. Humm... encomenda para Lajes, Santa Catarina... qual é a forma como o senhor quer enviá-la? Sedex 10, Sedex normal, encomenda registrada, PAC...? - A que for mais barata - respondeu Mauro, ainda com ares de contrariado. Mas acrescentou: - Só quero que seja registrada e sem aviso de recebimento. O funcionário advertiu, com olhar grave: - O senhor sabe que os correios estão em operação tartaruga. Se eu fosse o senhor, mandava por Sedex. Como carta registrada ou PAC, pode demorar muito. Só Deus sabe quando chega... - Ah, é?! Bom, se é assim, que seja! É a segunda vez que eu tenho de mandar isso. Já havia enviado pelo Sedex, mas, por causa de uma informação besta que eu não coloquei, acabou voltando. Não vou mentir, fiquei irado com isso. Os caras do correio ainda ligaram pro destinatário, pegaram a informação que faltava, disseram que iam entregar, mas não adiantou nada! Voltou assim mesmo. Raiva...! Bom, tá explicado o motivo da ira do Mauro. Continuemos. O sujeito da blusa amarela mudou o rumo da conversa e arriscou: - O senhor me desculpe, mas... desde que começou a falar, tive a impressão de que sua voz se parece muito com a do Jair Rodrigues. Lembra dele...? - Jair Rodrigues?? Sério??? - Sério. Sua voz é idêntica! Ele é do seu tempo? - Sim, eu me lembro da Disparada. E, chegando mais perto do funcionário, arriscou a melodia: Prepare o seu coração para as coisas que eu vou contar, eu venho lá do sertão, eu venho lá do sertão... - Incrível, igualzinho!!! Entusiasmou-se o servidor. – Ainda mais com essa voz rouca... - Humm... mais ou menos, mais ou menos. - Então você se lembra do Jair Rodrigues! - Como não lembraria? Eu sou de 59. Você é de quando?

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Zazo é servidor público e professor de Gramática e Oficina de Textos no Centro de Formação e Aperfeiçoamento da Câmara dos Deputados.

- De 55. Mesma geração. Tempo bom, né? - Ô, nem fala... e aquela assim: deixa que digam, que pensem que falem, deixa isso pra lá, vem pra cá, que que tem?! Eu não tô fazendo nada, você também... Lembra dessa? - Essa não é do Simonal...? - Hummm... agora você me deixou na dúvida. Vou pesquisar no Google. - Peraí, que eu vou pegar uma almofada de carimbo. Essa aqui tá fraca. (...) Pronto, beleza. Olha, eu gosto daquela do cravo e da rosa. Só não sei cantar que nem você. E, de mais a mais, você é moreno que nem ele. - Negro. - Sim, mas você entende. Hoje em dia... Rapaz, se você quisesse fazer uma imitação dele, dava certinho! - Quê isso... - A “Disparada” foi do festival da Record de 66, né? Ou foi da Tupi? - Não lembro. A gente era guri... - Ó, sua encomenda deve chegar depois de amanhã. Vai pagar em dinheiro ou cartão? - Cartão. - Débito ou crédito? - Débito. - Pode pôr a senha. Cara, se você não fosse de 59, eu ia acreditar que você era o próprio Jair Rodrigues. É verdade que ele é mais velho. Fala a verdade, você não é nenhum parente dele? - Não, não... Nessa altura, já se notavam três pessoas a serem ainda atendidas. Uma delas uma senhora que se abanava com um pedaço de papelão dava sinais de nervosismo ainda contido, pelo fato de sua vez não chegar nunca. Vale lembrar: estamos em Brasília, numa daquelas tardes quentes de fim de ano. “Se conversasse menos, trabalharia mais”, deveria estar pensando a mulher. Nosso protagonista já não percebia em que instante exatamente a sua própria raiva havia passado. E perguntava-se em pensamento por que as pessoas, entre as quais ele mesmo se incluía, ficavam tão nervosas às vezes por motivos tão pequenos... O certo é que foi ali, numa agência dos correios, que Mauro refletiu sobre a bem-aventurança de encontrar pessoas como aquele atendente. Gente que, sem querer, nos faz lembrar da graça de Deus de uma forma tão singela, tão verdadeira, que nos deixa tão leves... e despediu-se de seu contemporâneo com uma alegria nova no coração, como se tivesse encontrado um enviado dos céus, a advertir-lhe prazerosamente+de que, apesar dos percalços, a vida tem seus momentos bons.

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+Música

por Zazo, o nego

Linha do Tempo – 32 anos de estrada “O tempo passou e escreveu, nas linhas da história, nossa trajetória, nossas canções e os nomes de todos aqueles que, junto conosco, a vivenciaram”. A declaração é de Paulo César da Silva, líder do Grupo Logos. Nesse gancho, vai a dica para quem passou pela primeira juventude no início dos anos 1980: presenteie a si mesmo com o álbum Linha do Tempo, do Logos, um trabalho acústico de valor antológico que comemora os 32 anos de estrada da banda. Válido também para estudiosos da música evangélica no Brasil e interessados no tema, o disco traz releituras de canções que marcaram a trajetória do Logos (e de muita gente) ao longo dessas três décadas. Músicas como Mão no Arado, Espinho, Portas Abertas, Situações e o “hino oficial” de uma geração (Autor da Minha Fé) estão reunidas na obra, com arranjos de Paulinho Fô e Tuta Ribeiro. Nesse espírito, “a família Logos” conseguiu juntar integrantes de diversas épocas para as gravações. O resultado não poderia ser melhor. Mas a coletânea também aponta para o presente, ao apresentar composições inéditas como Expressão de Louvor, Grande Deus e Obreiro Aprovado. Vale ainda destacar a faixa 09 (Pai), uma homenagem de Paulinho Fô, “prata da casa”, a seu pai, Paulo César, uma verdadeira obra prima. Saiba mais em https://www.facebook.com/LogosOficial/timeline?filter=2 ou www.logos.com.br.

Não Vou Andar Sozinho – Alann Marino Quer ouvir música cristã no jeito popular brasileiro, feita por compositor criativo, bom de letra e harmonia, executada por um instrumental refinado? Aos que responderam “sim”, segue o primeiro passo: a composição Quasar, escrita por Alann Marino e Gladir Cabral, tem áudio e vídeo disponíveis para degustação em http://www.alannmarino.com.br/. O passo seguinte é adquirir o CD Não vou andar sozinho, primeiro álbum de Alann Marino, que se destaca não apenas pela beleza estética: a música é essencialmente cristã e expressa isso de maneira bela, ao longo das dez faixas do disco. Produção independente, o CD conta com arranjos de Ronaldo de Oliveira e João Alexandre. As composições, com exceção da última, o hino tradicional Mais perto quero estar, são de autoria do cantor. O CD traz ainda participações instrumentais de Hilquias Alves, Tiago Vianna e Felipe Silveira, além do próprio João. De quebra, uma extraordinária participação vocal solo de Gérson Borges na faixa 03 (Tua Palavra). Belo trabalho, deixa um gostinho de “quero mais”. Interessados, anotem: https://www.facebook.com/Alannmarinobanda.

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QUALIDADE DE VIDA

por Júnior Sipaúba

Junior Sipaúba é pastor presbiteriano, mestre em Aconselhamento, matemático, licenciado em Ciências e faixa-preta pela Conferedação Brasileira de Taekwondo.

Evangelho de areia

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odo aquele que ouve estas minhas palavras e as pratica será comparado a um homem prudente que edificou a sua casa sobre a rocha; e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com ímpeto contra aquela casa, que não caiu, porque fora edificada sobre a rocha. E todo aquele que ouve estas minhas palavras e não as pratica será comparado a um homem insensato que edificou a sua casa sobre a areia; e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com ímpeto contra aquela casa, e ela desabou, sendo grande a sua ruína.” (Mateus 7. 24-27) Aristóteles pertenceu à Academia de Platão. Não era ateniense, mas da cidade de Estagira. Era filho de um médico. O pensador é considerado como aquele que, na cultura grega, organizou, sistematizou e ordenou as várias áreas de conhecimento. Produziu um vasto tratado sobre a ética como ciência. Dentre as obras que tratam do tema creditado ao filósofo estão: “Ética a Nicômaco”, “Ética a Êudemo” e “Ética Maior”. Em seu tratado “Ética a Nicômaco” (2001, p.36), afirma: “A presente investigação não visa, como outras, ao conhecimento teórico (não estamos investigando apenas para conhecer o que é a excelência moral, e sim para nos tornarmos bons, pois se não fosse assim nossa investigação viria a ser inútil), cumpre-nos examinar a natureza das ações, ou seja, como devemos praticá-las [...]”. Uma investigação de qualquer natureza que não produza no mínimo uma reflexão, na percepção de Aristóteles, viria a ser inútil. Reflexão vem da expressão latina reflectere, que significa “voltar atrás”. Ou seja, repensar detidamente, prestar atenção, analisar com cuidado e interrogar-se sempre sobre as opiniões,

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as impressões, os conhecimentos técnico-científicos e o próprio sentido da filosofia. O Senhor Jesus nos ensina que não basta ouvir suas palavras; é essencial para o discípulo colocá-las em prática. Jesus compara a pessoa que apenas ouve e não internaliza a verdade, a “um homem insensato que edificou a sua casa sobre a areia; e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com ímpeto contra aquela casa, e ela desabou, sendo grande a sua ruína”. Tenho a nítida impressão de que nossa reflexão teológica é extremamente teórica, não ultrapassando os limites de uma categoria de repetição doutrinária. Em minha percepção, passamos muito tempo da nossa jornada espiritual construindo um tipo de vivência que denomino “evangelho de areia”. “Evangelho de areia” não nos transforma em discípulos de Cristo, mas tem o poder de nos moldar em soldados de chumbo de uma denominação religiosa; ele desaba diante dos ventos da vida; ele aprende, mas não chega ao conhecimento da verdade; ele não suporta as “caretas e os sustos” da existência. Evangelho de areia é todo evangelho que significa “boas novas” para o outro, para o vizinho, e não para minha vida. Que o estudo da Palavra de Deus seja profundamente transformador em nossa caminhada, pois não dá para ler a Bíblia da mesma forma como eu leio um gibi, uma revista, um jornal ou coisa parecida. É preciso reverência interior para ouvir a voz de Deus! Que as comunidades espirituais possam fazer do estudo da Bíblia um caminho de expressão de vida e de graça, e que a nossa oração seja também a do salmista: “Desvenda os meus olhos, para que eu+ contemple as maravilhas da tua lei” (Salmos 119,18).

+CRISTÃO FEVEREIRO 2014

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25/02/2014 15:50:17




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