Revista Percursos

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-Participação das Crianças

-Um Dedo de Prosa: Rodrigo Saballa

-Sala dos Professores

Número 1 - Fevereiro 2022

P429 Percursos para a educação infantil em Contagem [Recurso eletrônico] / n. 1, (fev. 2022). – Contagem (MG), 2022.

Editores: Sandro Vínicius Sales dos Santos, Rosalba Rita Lima, Márcia Aparecida Gomes Campos, Levindo Diniz Carvalho.

[O primeiro número da revista “Percursos para a educação infantil em Contagem” tem origem na dissertação de mestrado da pesquisadora Márcia Aparecida Gomes Campos, intitulada “A participação das crianças no cotidiano da educação infantil: a experiência da Escola Carlos Drummond de Andrade -- Contagem – MG”, apresentada ao Programa de Mestrado Profissional – Promestre – Linha Infâncias e Educação Infantil da Faculdade de Educação da UFMG e orientada pelos professores Levindo Diniz Carvalho e Sandro Vinicius Sales dos Santos].

1.Educação. 2. Educação de crianças. 3. Contagem (MG) -- Educação.

I.Título. II. Campos, Márcia Aparecida Gomes. III. Carvalho, Levindo Diniz, 1978-. IV. Santos, Sandro Vinicius Sales dos, 1979-.V. Lima, Rosalba Rita.

CDD-372

Catalogação da fonte: Biblioteca da FaE/UFMG (Setor de referência)

Bibliotecário: Ivanir Fernandes Leandro CRB: MG-002576/O

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Ficha Técnica

Pesquisadora:

Márcia Aparecida Gomes Campos

Editores:

Sandro Vínicius Sales dos Santos

Rosalba Rita Lima

Márcia Aparecida Gomes Campos

Levindo Diniz Carvalho

Revisora:

Mariângela Innocêncio

Projeto Gráfico:

Herbert de Barcelos

Laíssa Laíssa Domingues Moreira

Diagramação:

Herbert de Barcelos

Ilustrações:

Laíssa Domingues Moreira

Fotografia:

Carla Santos

Márcia Aparecida Gomes Campos

Edição de Fotografia:

Sandro Vínicius Sales dos Santos

Márcia Aparecida Gomes Campos

Laíssa Domingues Moreira

Orientação de Projeto Gráfico:

Rubens Rangel Silva

Imagem da Capa

Professora Carla Santos e as crianças da turma

Uso das imagens presentes nesta revista foi autorizado pelos responsáveis e consentido pelas crianças.

O primeiro número da revista “Percursos Para a Educação Infantil em Contagem” tem origem na dissertação de mestrado da pesquisadora Márcia Aparecida Gomes Campos, intitulada A Participação das Crianças No Cotidiano da Educação Infantil: A Experiência da Escola Carlos Drummond de Andrade - Contagem – MG, apresentada ao Programa de Mestrado Profissional – Promestre – Linha Infâncias e Educação Infantil da Faculdade de Educação da UFMG e orientada pelos professores Levindo Diniz Carvalho e Sandro Vinicius Sales dos Santos.

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Editorial O que é a Revista Percursos?

Diálogos Necessários

Um Dedo de Prosa - Conversa com Rodrigo Saballa da UFRGS

Compartilhando Experiências: A participação das crianças no cotidiano da educação infantil, alguns relatos

Sala dos Professores - Quem tem medo de criança na Educação Infantil?

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Últimas Palavras 30 34
Sumário

Editorial O que é a Revista Percursos?

A educação é um ato de amor, por isso, um ato de coragem. Não pode temer o debate. A análise da realidade. Não pode fugir à discussão criadora, sob pena de ser uma farsa.

O que move as pessoas? O que faz elas quererem transformar a realidade na qual estão inseridas?

Parto dessas questões para comentar a Revista Percursos, pois vejo, em cada linha do trabalho aqui apresentado, a paixão de uma professora pelo espaço da escola. Uma paixão plena de amorosidade, como diz Paulo Freire na epígrafe acima. Uma amorosidade que fica evidente na análise bem-feita, no olhar cuidadoso para com a prática das colegas, na busca de referenciais que acolham o fazer docente e o protagonismo das crianças, sem binarismo ou exclusões. Uma coisa não exclui a outra: é possível dizer de uma ação da professora (consciente, plural, sensível) e da participação efetiva das crianças (alegre, envolvente, lúdica) no processo de produção e organização do cotidiano escolar.

É isso que Márcia propõe nesta revista: uma reflexão densa sobre participação a partir do olhar docente. Em cada seção da revista, vocês poderão apurar o olhar para essa reflexão.

Logo no início, ao dizer o que é a revista, Márcia convida o(a) leitor(a) a pensar no tema, com indicações para aprofundamento e propondo um movimento, o de repensar a questão da participação como eixo na discussão sobre qualidade em educação.

É nesse aspecto que ela nos convoca a estudar a questão da participação infantil nas instituições de

Educação Infantil. Na seção Diálogos Necessários, traz contribuições teóricas para a discussão sobre otema. Participar, segundo ela, é mais que tomar parte. Significa ser parte, fazer parte, ter parte, num processo em que reflexão, envolvimento e comprometimento são fundamentais.

Na seção Um Dedo de Prosa, a entrevista com Rodrigo Saballa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul nos convida a pensar na pedagogia e nos conhecimentos que produzimos no exercício da docência.

Mas é claro que é na Compartilhando Experiências que Márcia dá o tom da Revista. São alguns relatos, retirados de sua pesquisa, que nos contam quão amoroso e apaixonante pode ser o tema da participação infantil. São mãos que repartem, baobás que promovem diálogos e caixas que viram foguetes. São crianças e professoras em interações ricas e significativas que mostram a boniteza do trabalho na Educação Infantil. O que nos salta aos olhos são as análises que ela faz de cada episódio. Uma análise que não teme o debate e que não perde a ternura. Márcia explicita sua paixão: uma Educação Infantil que se faz potente e criadora no chão da escola.

A Revista Percursos nos brinda com amor, paixão e discussão criadora. Convido todos e todas a ler e a se embrenhar nesses caminhos.

Boa leitura!

Os editores

É com grande alegria que apresentamos a edição da Revista Percursos – uma publicação que visa estimular a troca de experiências e a socialização de boas práticas docentes. A Percursos é um espaço dos(as) professores(as) e para os professores(as) da Educação Infantil da Rede Municipal de Ensino de Contagem.

A Revista nasceu de uma pesquisa realizada por Márcia Gomes, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), no Mestrado Profissional, no período de 2019 a 2021, que objetivou analisar, a partir das experiências vividas pelas crianças e do ponto de vista das professoras, os limites e as possibilidades da participação infantil no cotidiano na Educação Infantil.

As discussões apresentadas nas seções da revista buscam criar um espaço-tempo de reflexão que promova efeitos na qualidade do atendimento pedagógico oferecido às crianças pequenas, colocando meninos e meninas como sujeitos e colaborando para o debate sobre a ampliação da participação infantil no contexto das instituições. Busca, ainda, potencializar as práticas, bem como a reflexão contínua sobre o fazer docente.

O tema da participação das crianças como fator de qualidade na Educação Infantil há muito vem sendo discutido em publicações nacionais e

internacionais. No contexto brasileiro, é preciso lembrar dos livros: Consulta sobre qualidade na educação infantil: o que pensam e querem os sujeitos desse direito (CAMPOS e CRUZ, 2011) e Participação e Qualidade em Educação da Infância (BONDIOLI e SÁVIO, 2013).

A ideia é construir uma revista que possa contribuir como instrumento de formação continuada e em serviço de professores que atuam na Educação Infantil de Contagem sobre o tema da participação infantil. A revista traz artigos, relatos, entrevistas e outras informações que terão como foco a autoria coletiva, envolvendo crianças e professores(as).

É importante ressaltar que a Percursos não tem a pretensão de apresentar receitas de como orientar o fazer pedagógico, tampouco se configura como um manual para o(a) professor(a), mas, sim, como um instrumento que indique caminhos, que provoque reflexões e discussões entre os(as) profissionais da Educação Infantil da Rede Municipal de Contagem. Ou seja, provocar o que o próprio nome da revista indica: itinerários para deslocar o olhar quanto à participação infantil. O que se quer é provocar um movimento nas instituições de Educação Infantil que potencialize a ação da criança.

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Diálogos Necessários

Você já parou para pensar como as crianças lidam com o que você propõe em termos de planejamento? Já identificou que, muitas vezes, elas tendem a ressignificar o que você, professor(a), lhes oferece nas atividades que propõe? Já considerou que, em muitas situações, quando você está explicando sobre uma determinada coisa ou situação, as crianças apresentam um amplo repertório de conhecimentos sobre o assunto? Pois bem! Se você já considera essas questões no âmbito de seu trabalho cotidiano, é um sinal de que você é sensível à participação infantil. Mas o que é participação infantil? Como as crianças podem participar mais ativamente do cotidiano pedagógico da instituição?

A participação infantil tem sido discutida nas pesquisas realizadas em diferentes áreas do conhecimento educacional, sobretudo no campo dos Estudos da Infância, sendo a criança vista como sujeito de direitos, potente e capaz de construir e reconstruir culturas. Segundo Cruz (2011), a participação é um dos pressupostos para a qualidade do atendimento nas instituições de Educação Infantil. Nesse sentido e buscando garantir esse direito, as crianças são compreendidas como sujeitos e não objetos de pesquisa, com direito à fala e à escuta, contribuindo, assim, para a reflexão sobre as situações de aprendizagem vivenciadas e/ou construídas por elas e com elas no espaço escolar. Promover a participação das crianças depende não somente de elas poderem se expressar na escola, mas é preciso que tais expressões sejam reconhecidas

pelos adultos. É necessário que meninos e meninas também sejam reconhecidos(as) como ativos(as) na construção de sua própria vida, na vida das pessoas que os(as) rodeiam e da sociedade onde estão inseridas, não subestimando sua capacidade por se expressarem de forma diferente dos adultos (AGOSTINHO, 2010). Portanto, pensar a participação infantil é pensar o conceito de participação como “ser parte do processo”, isso quer dizer, participar de forma ativa, com o direito e poder de definir sobre as decisões ou caminhos a serem tomados, sem diminuir o papel do adulto. A limitação ou potencialização da participação das crianças depende das relações de poder que se estabelecem no ambiente, sendo possível a criação de espaços que estimulem seu envolvimento nas decisões coletivas da rotina da instituição.

A participação, desse modo, é um compromisso recíproco entre os sujeitos – crianças e professores -ao explorarem soluções compartilhadas para situações do cotidiano. Assim sendo, a participação se torna compromisso de toda comunidade escolar, não apenas numa acepção simplista do “fazer parte”, mas dar sentido à participação como algo próprio da vida na coletividade. O direito de participação das crianças está relacionado aos direitos de experienciar, experimentar e opinar, trazendo uma ideia de cidadania vivida nos contextos em que ela ocorre.

Reconhecer o direito de participação das crianças no contexto educacional é também reconhecer sua competência social, cabendo ao adulto a organização

de tempos e espaços para a efetivação desse direito. A participação infantil, além de um direito, é também uma necessidade para o desenvolvimento do princípio da democracia, pois implica interações, convivência, ideias, pensamentos, reflexões diversas que acontecem nas relações sociais.

CRIANÇAS E INFÂNCIAS

Partindo do pressuposto de que a participação das crianças é um fator importante para a construção do trabalho pedagógico de qualidade nas instituições de Educação Infantil, organizamos esta Revista. Ao se pensar na construção de práticas pedagógicas, as contribuições das crianças precisam ser consideradas. Para isso, é importante uma escuta sensível que objetiva apreender como a criança pensa, questiona, interpreta e relaciona a sua realidade, com seus pares e com o adulto, pois “...o que escutamos é somente uma parte de um conhecimento mais amplo, [sendo preciso] sensibilidade para ouvir e ser ouvido, não somente com os ouvidos, mas com todos os sentidos” (RINALDI, 2005, p.124).

A noção de criança e de infância resulta de uma construção social e histórica: do “miniadulto” ou do “sujeito incapaz” e que devia ser conduzido ao sujeito de direitos, ativo e construtor de cultura, que “contribui para a produção de sociedades adultas” (CORSARO, 2011, p. 15).

A história cultural da infância se “move por linhas sinuosas com o passar dos séculos”

(HEYWOOD, 2004, p. 45), sendo que a sociedade

atua como fator preponderante para a formação e integração da criança no mundo infantil e adulto simultaneamente. Com o avanço das pesquisas dos Estudos Sociais da Infância, essa etapa da vida passa a ser compreendida como plural, sinalizando a existência de diferentes infâncias e crianças em contextos diversos e muitas vezes desiguais.

As crianças contemporâneas vivem numa sociedade marcada pela exclusão e pelos contrastes, tornando, assim, impossível pensar em uma única forma de ser viver a infância. Posto isso, em uma atmosfera diversificada, as crianças se desenvolvem por meio da interação e das brincadeiras. Como sujeitos, elas influenciam e são influenciadas por seus pares, por adultos e pelo próprio meio. Desse modo, buscar uma ação pedagógica comprometida com a concepção de criança capaz de participar da definição dessas práticas é refletir sobre seu potencial como agente de instituição e transformação da sociedade onde está inserida (ANDRADE, 1997). É pensar na sua capacidade de interagir de forma independente e de fazer escolhas.

A criança estabelece relações sociais de forma ativa, incorporando papéis e comportamentos próprios da sociedade, ao interagir ativamente com os adultos e com os seus pares, assim como com o ambiente no qual está inserida.

PARTICIPAÇÃO DAS CRIANÇAS

As crianças formulam um sentido para o mundo em suas relações sociais e culturais, sabem tanto

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quanto o adulto, porém, de uma forma distinta, com uma diferença qualitativa e não quantitativa. Em vista disso, ao afirmarmos sobre a atuação das crianças em ressignificar, construir e modificar culturas, acreditamos na sua autonomia, como indivíduos capazes de exprimir pontos de vista que são genuínos, originais e merecem ser considerados. Conforme salienta Corsaro, as crianças

não são receptáculos passivos das culturas adultas, mas sujeitos ativos na produção cultural da sociedade, recebendo através das múltiplas instâncias de socialização as culturas socialmente construídas e disseminadas, que interpretam de acordo com seus códigos interpretativos próprios, configurando-se assim uma situação de “reprodução interpretativa.

(Corsaro, 1997 citado por Dorneles, 2007, p. 22-23)

Nessas relações sociais, as crianças se constroem e apreendem o mundo adulto, ressignificando-o.

Uma vez que a assimilação do mundo adulto não é somente uma imitação passiva das relações percebidas nesse intercâmbio, observa-se a utilização de diferentes formas de expressar pelas crianças. Entre as mais significativas para a infância, estão as interações e o brincar. Nesse exercício, elas consolidam os conhecimentos sobre o mundo e revelam sentimentos, desejos, inquietações e exprimem seus saberes ao experimentar, imitar, repetir, imaginar e criar.

Estudos recentes realizados por Silvia Cruz (2008), Julia Formosinho (2008), entre outros, refletem a preocupação em considerar as vozes infantis e as instituições educativas focadas no atendimento da Educação Infantil, instituições fundamentadas no mundo social da criança, como espaços privilegiados para escutá-las.

Ao discorrer sobre a necessidade de ver e ouvir as crianças, Cruz (2008) pauta a importância da construção de um olhar e uma escuta sensível e cuidadosa.

De tal modo, ouvir a criança dessa etapa é um importante passo para garantir sua participação e fortalecimento da instituição de Educação Infantil, enquanto espaço a ser apropriado pelas crianças.

Em outras palavras, o envolvimento da criança é um dos aspectos de garantia de qualidade do atendimento, “fundamental para que a creche e a pré-escola sejam espaços de enriquecimento, de desenvolvimento e de prazer, para todas as crianças” (CRUZ, 2011, p. 67).

As instituições de Educação Infantil têm o desafio de propiciar e estimular a participação das crianças nas práticas educativas, priorizando a escuta sensível e inclusiva da criança tratada como ser competente, completo e consciente das transformações ao seu redor.

Objetivando a superação desse desafio, emergem, no campo pedagógico, as pedagogias participativas, tendo como premissa central o reconhecimento da criança como centro do processo educativo. Segundo Formosinho e Oliveira Formosinho

há dois modos essenciais de fazer pedagogia o modo da transmissão e o modo da Participação. A pedagogia da transmissão centra-se no conhecimento que quer veicular, a pedagogia da participação centra-se nos atores que coconstroem o conhecimento participando nos processos de aprendizagem

(Oliveira-Formosinho; Formosinho, s.d., p. 2)

Tais abordagens têm seu foco na interação entre os atores que convivem cotidianamente na escola. Sendo assim, o(a) professor(a) é visto(a) também como um(a) pesquisador(a), juntamente com as crianças, que têm seu senso investigativo reconhecido e valorizado.

Podemos identificar diferentes abordagens e propostas curriculares, baseadas nas pedagogias participativas, que discorrem sobre a relevância da escuta e participação das crianças nos processos de construção de conhecimento (FOCHI, 2018). Nesse horizonte, podemos citar o Movimento

da Escola Moderna, a ideia de Pedagogia em Participação de Formosinho, do pedagogo brasileiro Paulo Freire, que, apesar de não ter se dedicado aos estudos da infância, tem seus trabalhos centrados nos sujeitos e na educação como prática da liberdade e, ainda, as abordagens italianas inspiradas nos

AGOSTINHO. Kátia Adair. Formas de Participação das Crianças na Educação Infantil. Tese de Doutorado em Estudos da Criança. Universidade do Minho. 2010. Disponível em: https://repositorium. sdum.uminho.pt/handle/1822/11195>. Acesso em: 11 jul. 2019.

ANDRADE, Angela Nobre de. A criança na sociedade contemporânea: do ainda não ao cidadão em exercício. Disponível em: SciELOBrasil - A criança na sociedade contemporânea: do ‘ainda não’ ao cidadão em exercício A criança na sociedade contemporânea: do ‘ainda não’ ao cidadão em exercício Acesso em: 11 jul. 2019.

COHN, Clarice. Antropologia da Criança. Rio de Janeiro: Zahar, 2005.

CORSARO, William A. Sociologia da Infância. São Paulo: Artmed, 2011.

CRUZ, Silvia Helena Vieira (Org.). A criança fala: a escuta de crianças em pesquisas. São Paulo: Cortez, 2008.

estudos de Loris Malaguzzi.

Em suma, esses autores, teorias e conceitos nos ajudam a pensar no cotidiano das instituições de educação uma pedagogia das infâncias que nos permite pensar a ampliação das possibilidades de participação das crianças.

CRUZ, Silvia Helena Vieira. Consulta sobre qualidade na Educação Infantil: o que pensam e querem os sujeitos desse direito. São Paulo: Cortez, 2011.

DORNELLES, Leni Vieira. Produzindo pedagogias interculturais na infância. Rio de Janeiro: Vozes, 2007.

HEYWOOD, Colin. Uma história da infância: da Idade Média à época contemporânea no Ocidente. Porto Alegre: Artmed, 2004.

OLIVEIRA-FORMOSINHO, Julia; KISHIMOTO, Tizuko Morchida; PINAZZA, Mônica Apezzato. Pedagogia(s) da infância: Dialogando com o passado construindo o futuro. Porto Alegre: Artmed, 2007.

PINTO, Manuel, As crianças como construção Social. In: PINTO, Manuel e SARMENTO, Manuel Jacinto. As Crianças Contexto e Identidades. Universidade do Minho, Centro de Estudos da Criança, Portugal, 1997.

RINALDI. Carla. Diálogos com Reggio Emilia: Escutar, Investigar e Aprender. São Paulo: Paz e Terra, 2005.

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PARA SABER MAIS! Trabalho na sala de aula

Um Dedo de Prosa

Nesta seção, apresentamos a entrevista realizada com o Professor Dr. Rodrigo Saballa de Carvalho, realizada de forma on-line, na manhã do dia 18/01/2022. A conversa com Rodrigo Saballa, como ele é conhecido no meio acadêmico, teve duração aproximada de 1 hora e 30 minutos, período em que ele partilhou conosco alguns de seus conhecimentos sobre a educação da criança de zero a seis anos. Rodrigo é Doutor (2011) e Mestre em Educação (2005) pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Especialista em Gestão da Educação e Licenciado em Pedagogia pela mesma instituição. Atualmente, é Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGEdu/UFRGS) na linha de pesquisa: Estudos das Infâncias e da área de Educação Infantil do Curso de Pedagogia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (FACED/UFRGS). Realizou a pesquisa de pósdoutorado intitulada: Inventando crianças no século XXI: políticas de escolarização, capital humano e gestão de riscos nos discursos de analistas econômicos sobre a Educação Infantil (PPGEUFPEL). Membro do GEIN - Grupo de Estudos da Infância (UFRGS), líder do CLIQUE - Grupo de Pesquisas em Linguagens, currículo e cotidiano de bebês e crianças pequenas (UFRGS), Rodrigo

Saballa também acumula uma rica experiência de mais de dez anos como profissional de Educação Infantil atuando em diferentes cargos e funções: auxiliar de Educação Infantil, professor, gestor. A seguir, apresentamos os principais pontos da entrevista que Rodrigo concedeu a Marcia Gomes e Sandro Vinicius Sales dos Santos – editores da Revista Percursos – sobre a participação das crianças nas instituições de Educação Infantil. Essa entrevista ocorreu em forma de uma conversa casual, sincera e afetuosa, mas com profundo conhecimento teórico, resultando em um encontro acolhedor e dialógico.

MÁRCIA GOMES - Rodrigo Saballa, sua produção acadêmica tem importantes pontos de interseção dos Estudos da Infância com as Pedagogias da Educação Infantil, além, é claro, de outras áreas, sendo que todas elas permitem pensar o cotidiano de adultos e crianças em creches pré-escolas. Fale um pouco de sua trajetória acadêmica e profissional.

Sou um pedagogo de formação, fiz mestrado e doutorado em educação. No mestrado, trabalhei mais especificamente com a Educação Infantil, com pesquisa com crianças. No doutorado, investiguei

questões relativas à formação de professores, do pedagogo. Mas, antes da Pedagogia, minha formação foi em magistério, nível técnico e, então, sou professor desde os dezoito anos. Primeiro, desde que entrei no magistério aos quinze anos, como auxiliar de sala de Educação Infantil, depois professor concursado aos dezoito anos. Durante todo o curso de graduação, mestrado e doutorado, estive em sala de aula e atuei, paralelamente, por dez anos, como coordenador pedagógico da Educação Infantil e dos anos iniciais. Trabalho atualmente como professor do curso de graduação em Pedagogia na FACED, especificamente na área de Educação Infantil. O meu trabalho é bastante focado nas escolas de Educação Infantil, sempre pensando na formação docente ou na própria pesquisa das crianças, naquilo que vai reverberar no trabalho das(os) professoras (es). Acredito que ainda temos muito trabalho pela frente ao pensarmos na educação, na docência, especialmente da Educação Infantil, pensando nas crianças e também nas professoras. Nos últimos dois anos, tenho trabalhado especificamente com as disciplinas Seminário de Docência e Estágio em Educação Infantil. No âmbito desse grupo, temos investigados questões relativas ao currículo, às linguagens, ao cotidiano de bebês e crianças pequenas.

MÁRCIA GOMES - Em sua visão, como se relaciona a pedagogia do cotidiano com a participação das crianças no dia a dia da Educação Infantil?

Eloísa Acires Candal Rocha afirma, em sua tese, defendida há mais de vinte anos, que surgia, no Brasil dos anos de 1990, um conjunto de pesquisas e conhecimento acumulado suficiente para pensarmos numa pedagogia que tivesse a cara de um país da América do Sul, – o Brasil. Então, é necessário, mais do que nunca, retomar essa ideia de uma pedagogia da infância, que vai alimentar essa ideia de uma pedagogia do cotidiano, de pensar nos contextos nos quais estão as crianças. E essa pedagogia, esse modo de pensar esse cotidiano com as crianças, de olhar para essa vida

diária das crianças, desse fazer que ocorre desde a entrada até a saída das crianças, no contato que temos com a família, com a comunidade ao redor da escola, tudo isso está relacionado com as pedagogias participativas, isto é, tem relação direta com a participação efetiva das crianças. E, quando se fala da participação das crianças, não me refiro somente a uma participação representativa, falo de uma participação efetiva. Não da participação numa dimensão consultiva, conforme aponta Gerison Lansdwon em suas pesquisas, que trabalha com dimensões da participação, cuja primeira dimensão é consultiva, depois vem outra dimensão maior, que é participativa e uma dimensão que é autônoma. Na segunda dimensão, denominada dimensão participativa, ainda haveria a mediação do professor ou da professora, mas as crianças teriam um pouco mais de autonomia. E uma terceira dimensão que seria uma dimensão autônoma, em que as crianças tomariam as decisões. Pensando em Educação Infantil, é importante lembrar que as crianças tem de zero a cinco anos e onze meses. Então, essas dimensões estão inter-relacionadas porque são necessários processos de mediação docente

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para que elas aprendam a tomar parte e a fazer parte, que é um elemento essencial ao conceito de participação.

SANDRO VINICIUS - Ao trazer o conceito de mediação, podemos pensar que a participação das crianças parte muito mais de um olhar ou de um lugar que o professor e a professora concedem à criança nessa pedagogia do cotidiano do que de um movimento da própria criança?

Sim, podemos pensar na diferença entre participação e protagonismo. Por exemplo, uma ideia que está muito está muito forte hoje em dia é a noção de criança protagonista, tanto que virou quase um clichê. Eu prefiro a ideia de participação, de uma criança que participa desses processos, de uma criança que é o centro, mas não tem essa centralidade no sentido que tudo gira em torno dela, pois existem processos de mediação. Tal discussão é desenvolvida pela Teresa Vasconcelos em um belíssimo artigo intitulado: Do discurso da criança “no” centro à centralidade da criança na comunidade. As crianças não estão isoladas dentro da escola, elas estão junto com outros adultos que fazem parte desse contexto e que devem ser consideradas ao se pensar o conceito de participação. Alejandro Kustanovich trabalha com a ideia de participação protagônica, participação e protagonismo juntos, pensados de modo relacional e não separado.

MÁRCIA GOMES - Promover formas de ampliação da participação das crianças no contexto da Educação Infantil exige das profissionais que atuam em creches e préescolas uma grande sensibilidade, marcada por uma escuta sensível das falas das crianças e por uma observação aguçada de suas ações. Em sua visão, quais as características de uma docência que permita a construção de um trabalho dialógico e que tenha como ponto de partida as diferentes linguagens e expressões das crianças?

Para mobilizar a participação das crianças, é necessário também o conhecimento sobre

oque é, o que os(as) profissionais entendem, conceitualmente, sobre o trabalho com as crianças, sobre o conceito de participação, de que modo didaticamente se pode mobilizar e promover essa participação dentro da escola. Então, não se trata só de sensibilidade, não adianta ter só sensibilidade para ouvir, é necessário saber como mobilizar. Pensar em um processo de articulação, em uma ação didática que seja fundamentada faz parte de um ofício de um(a) professor(a), de um(a) pedagogo(a) que atua com crianças. A participação das crianças não ocorre no vazio, como se não existam propostas pensadas intencionalmente para otrabalho desenvolvido com elas. Existe todo um clichê sobre o trabalho a partir das crianças, conforme me referi anteriormente citando o artigo da Teresa Vasconcelos. Sim, partirmos das crianças, mas dentro de um contexto que promova questões; contextos investigativos que promovam a expressão das crianças, em que elas possam investigar, com que possam ter o que falar. Se estivermos vivendo um vazio de oportunidades de ação, de relações, de descobertas e investigações, não existe a possibilidade de participação das crianças na construção do currículo, por exemplo.

MÁRCIA GOMES - Considerando todo o debate do currículo na Educação Infantil, consolidado pela promulgação das Diretrizes Curriculares Nacionais e tensionado pela Base Nacional Curricular, como você vê a questão da participação infantil nas propostas de organização curricular de creches e pré-escolas?

Quanto ao documento curricular, tenho uma maior proximidade ou atração, assim diria, pelas Diretrizes. Eu entendo que as Diretrizes têm princípios estéticos, políticos e éticos. O princípio político abre muitas possibilidades para pensarmos a participação efetivamente das crianças. Em relação à BNCC, o que posso ver de proveitoso, de produtivo, é a ideia do conceito de experiência. Mas não a ideia da experiência dividida nos campos como área de conhecimento. Porque isso culminou na ideia de divisão. Objetivos de aprendizagem

e desenvolvimento culminaram na produção de material didático, de livros para as crianças e se espalharam pelo Brasil. Então, vejo, como pontos interessantes, a ideia de experiência na BNCC, a ideia dos princípios nas diretrizes, mas ainda trago a questão de que de que modo nós vamos mobilizar, porque o que se dizia é que as diretrizes eram cifradas para os(as) professores(as). Ou seja, as diretrizes tinham uma linguagem acadêmica a qual, supostamente, os professores não conseguiam traduzir em ação pedagógica intencional. A promessa da BNCC foi uma tradução, ou melhor, operacionalização, das diretrizes em ações para o trabalho com as crianças. Só que isso, na sua terceira versão, não se deu de fato como se esperava. Enfim, essa questão da participação das crianças, consigo enxergá-la mais nas diretrizes do que propriamente na BNCC. Nós temos a repercussão da BNCC na produção de material didático, na disseminação da formação continuada e cada vez mais se perde a autoria docente. Quando digo autoria, não estou falando de que não há necessidade de políticas curriculares, obviamente que elas têm que existir, e a diretriz é um exemplo disso. Eu não vejo o professor como um cenógrafo, alguém que organiza tudo e sai de cena. Vejo professor como alguém que, junto com as crianças, nesse contato com as crianças de modo relacional, constrói a sua docência, mas que também tem uma prática intencional que é pensada, que é planejada e que não espera só das crianças. Porque esperar só das crianças, num espaço vazio, num vazio de sentido para escola, para o professor, não gera, de modo algum, a participação das crianças. É preciso, então, mobilizar e também se mobiliza pensando naquilo que a Anna Bondioli chama de ecologia educativa. Ou seja, tempos, espaços, materiais, relações e linguagens no âmbito do encontro com as crianças na Educação Infantil.

MÁRCIA GOMES - No caso das políticas relacionadas ao currículo, como garantir que a concepção de participação infantil se efetive no cotidiano, ou seja, como possibilitar que a participação das crianças seja parte constitutiva das propostas pedagógicas das

instituições de Educação Infantil?

Acredito que a questão da mobilização, da ampliação da participação das crianças e dos(as) docentes tem um grande acento no trabalho de gestão da escola e não só no trabalho solitário do(a) docente em sala, mas da equipe gestora enquanto um todo. Então, existem experiências de assembleias, existem experiências de rodas, existem experiências das crianças participando, mas ainda digo que isso ocorre com as crianças maiores de três anos. Pensar nesses princípios mais gerais e as instituições pensarem em como prover, criar estratégias, planejar estratégias, para que as crianças, efetivamente, numa dimensão consultiva inicialmente, mas que isso se efetive, que isso se torne efeito dentro do contexto da escola. Não seja somente algo de ouvir as crianças. Tornou-se um discurso recorrente, na Pedagogia da Educação Infantil contemporânea, a ideia da criança protagonista e do ouvir as crianças. Todavia, existe uma falta de discussão sobre o que se entende quando se enuncia tal expressão

MÁRCIA GOMES - Como a formação dos (as) docentes pode potencializar e efetivar a participação das crianças na construção do currículo da Educação Infantil?

As escolas têm modos de funcionamento que o(a) docente iniciante não conhece, porque tais processos não são aprendidos na formação inicial. Mas, efetivamente, o(a) docente aprende os modos de funcionamento da instituição na labuta cotidiana, no contato com as crianças, com os seus pares, com as famílias e a equipe gestora. O que necessita, na verdade, é de uma disponibilidade de esses(as) docentes iniciantes se tornarem presentes e dispostos(as) a articular e traduzir seus repertórios teóricos emergentes da formação inicial em práticas que possibilitem a participação das crianças no que diz respeito à constituição do currículo da Educação Infantil, resistindo a práticas que não estão de acordo com os princípios de uma Pedagogia da Infância, como, por exemplo, uma alfabetização compulsória das crianças, articulada a uma escolarização precoce das crianças na Educação Infantil que tem se disseminado em nosso país. Mas, repito, entendo

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que isso é processo de aprendizagem. Isso não é só processo de aprendizagem para quem sai da formação inicial, é processo de aprendizagem para quem também está na rede. Pode estar na rede numa outra escola que não tenha nenhuma dessas práticas e essa pessoa vai entrar nessa escola e vai ter que aprender nesse contexto, nesse contexto dessa escola. Quero destacar aqui a questão da importância de a gestão ser efetivamente democrática e aberta ao reconhecimento das diferenças dos(as) professores(as) e investir nesse processo de formação continuada no âmbito da escola.

SANDRO VINICIUS- Promover processos de participação da criança requer um exercício de tradução. O trabalho didático da professora e do professor da Educação Infantil vai partir de uma tradução das ações, das relações, das interações que a criança trava no cotidiano e tudo isso em novas situações de aprendizagem. Nesse sentido, você acredita que podemos considerar então que, assim como as crianças precisam aprender a participar do cotidiano, as professoras também precisam aprender a promover essa participação?

Sim. Essa aprendizagem se faz necessária, até porque os processos de formação docente geralmente não têm sido participativos e tampouco as experiências dos(as) docentes nas escolas de Educação Infantil. Se desejamos a participação das crianças, também temos que ter a possibilidade de participar das decisões que dizem respeito às instituições em que atuamos. Os(as) docentes deveriam ter a possibilidade participar das decisões que dizem respeito à gestão da escola, calendário, organização da jornada diária, modos de avaliação, planejamento etc. Ressalto tais aspectos, porque entendo que a possibilidade de participação dos (as) docentes também repercute nos modos como eles(as) pensam nos processos de participação das crianças no cotidiano institucional. Ou seja, são aspectos relacionais. Um(a) docente que tem a possibilidade de vivenciar uma participação efetiva na instituição, a partir de uma gestão democrática, tem

mais possibilidades de reverberar tais ações em suas práticas com as crianças. Não se trata de uma relação de causa e efeito, todavia, aprender a possibilitar com que o outro participe passa, também, pelas minhas experiências de participação como docente que faz parte de um contexto de Educação Infantil, o qual nomeamos como sendo de vida.

SANDRO VINICIUS – Podemos, então, considerar que, por mais que a docente individualmente seja uma professora sensível à participação das crianças, essa participação tem maiores chances de se efetivar no cotidiano a partir de um trabalho coletivo, é isso?

A partir de um trabalho coletivo porque a participação está relacionada a uma concepção de instituição, de docência, de escola, de criança, de infância, de Educação Infantil, de currículo. A participação na escola de Educação Infantil não ocorre em um limbo, mas dentro de um contexto de currículo. Então, somente a sensibilidade para a escuta não basta. É necessário também repertório teórico para desenvolver ações que promovam a participação das crianças. A partir de uma perspectiva não só individual, mas também coletiva. Coletiva enquanto gestão, enquanto grupo de docentes que atuam naquela instituição. Então, não vejo isso de modo separado. Eu continuo reivindicando que os(as) docentes também tenham espaço de participação dentro das instituições. A questão é que cobramos muitas vezes ações participativas dos(as) professores(as). Todavia, no âmbito institucional, eles (as) só estão acostumados(as) a ouvir e a cumprir demandas da gestão. Desse modo, como podemos querer que os(as) docentes promovam a participação das crianças? Por exemplo, muitas vezes, os(as) docentes não têm poder de decisão nenhuma na gestão da escola, mas enquanto formadores(as), gestores(as), defendemos que as crianças de seus grupos devem exercer um protagonismo em suas ações. Idealmente defendemos, mas efetivamente não é isso que acontece. Não costumo utilizar essa noção de protagonismo, pois penso que esse conceito tem um desgaste acentuado no âmbito da Educação

Infantil. É claro que estou me referindo ao conceito de protagonismo apropriado pela Pedagogia e difundido pelas traduções dos livros das pedagogias italianas. A criança é protagonista. Então, em todas as instituições de Educação Infantil, as crianças são protagonistas. As crianças têm sido protagonistas do que em nossas instituições de Educação Infantil? Em que sentido tal protagonismo tem sido exercido? Desse modo, prefiro pensar na participação das crianças e não em um estado ideal de protagonismo. Ou seja, para exercer protagonismo, é preciso participar, o que se efetiva de modo relacional. Qual é o nível de participação das crianças dentro das instituições? Pensando no âmbito da creche e da pré-escola ou, ainda, na escola de Educação Infantil como um todo, percebo que há um apagamento dessas questões quando se pensa, por exemplo, na creche.

MÁRCIA GOMES - Para terminar, você poderia deixar uma mensagem para os(as) profissionais que trabalham em creches e pré-escolas e queiram ampliar as formas de participação das crianças no cotidiano da Educação Infantil?

Um recado que eu deixo para os(as) docentes é para que pensem em um currículo de Educação Infantil que seja mais contextual e menos prescritivo. Um currículo de Educação Infantil que se efetive através de um projeto pedagógico das instituições, nas quais os(as) professores(as), a equipe gestora e todos(as) que lá estão mobilizem-se para pensar em estratégias que promovam a participação efetiva das crianças não só no nível consultivo apontado por Lansdown, mas também no participativo. Ou seja, em possibilidades efetivas que todas as crianças na Educação Infantil possam fazer parte das decisões que são tomadas na instituição. Ademais, um outro aspecto que considero importante de ser pensado pelos(as) docentes é o de que não existe um modelo de professora ou de professor de Educação Infantil. Existem princípios da Educação Infantil que são traduzidos em ações dentro das instituições. A ideia modelar, prescritiva, de um tipo único de docente vai de encontro ao respeito aos contextos

nos quais estão situadas as escolas do nosso país. Penso que existem diferentes Brasis dentro do nosso país. Diferentes contextos de instituições, desde as questões de espaço físico, de recursos humanos, enfim, de investimento do município e de tudo mais. Então, é importante pensar a possibilidade de criação, de autoria docente, que pouco se discute, de uma formação mais inventiva de docentes e menos prescritiva, como defende Rosimeri de Oliveira Dias. Ou seja, mais autoria e menos prescrição, mais currículo efetivo por meio da ação docente do que prescrições que desconsideram os contextos em que estão situadas as instituições, mais princípios éticos, estéticos e políticos das DCNEI e menos prescrição docente da BNCC, referentes aos modos de ser docente na Educação Infantil

PARA SABER MAIS!

CUSSIÁNOVICH, Alejandro; FIGUEROA, Elvira. Participación protagónica: ¿Ideología o cambio de paradigma?. Infancia y derechos humanos: hacia una ciudadanía participante y protagónica. Lima: IFEJANT, p. 83 - 99, 2009.

CARVALHO, Rodrigo Saballa de. FOCHI. Paulo. A Pedagogia do cotidiano na (e da) Educação Infantil. Em Aberto. Brasília, v.30, n.100, p.15-19, set/dez 2017. Disponível em: https://doi.org/10.24109/2176-6673. emaberto.30i100.3503

ROCHA, Eloisa Acires Candal. A pesquisa em Educação Infantil no Brasil: trajetória recente e perspectivas de consolidação de uma pedagogia. 1999. Tese (Doutorado em Educação). UNICAMP, Campinas, 1999. 291f.

LANSDOWN, G. ¿Me haces caso? El derecho de los niños pequeños a participar en las decisiones que los afectan, Cuadernos sobre Desarrollo Infantil Temprano, 36, 2005.

BONDIOLI. A, MANTOVANI, S. Manual de Educação Infantil de 0 a 3 anos. Porto Alegre: Artmed, 1998.

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Compartilhando experiêncas

A participação das crianças no cotidiano da Educação Infantil,

alguns relatos

Os relatos narrados nesta seção aconteceram na Escola Municipal Carlos Drummond de Andrade e são parte da dissertação de mestrado “A participação das crianças nas rotinas da Educação Infantil – a experiência de uma escola em Contagem – MG”. As observações para a pesquisa de campo ocorreram entre os meses de fevereiro e março de 2020.

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Brincando de Modelar

Relato 1:

Foguete

A experiência vivenciada pelas crianças nesse episódio aconteceu durante o tempo em que realizavam uma atividade proposta pela professora Vilmara, que trabalha as linguagens artísticas e corporais. Essa atividade é planejada por ela com apoio da pedagoga e das professoras referências de cada turma.

Nesse dia, as crianças demonstravam muita curiosidade no pátio interno, que é um espaço amplo, que serve de passagem para vários lugares, como o parquinho do Fundamental I, a quadrinha, o auditório etc. O espaço tinha sido pintando naquela semana e as crianças estavam curiosas com os jogos e desenhos ali representados.

Demonstrando perceber os sentimentos e a curiosidade das crianças, a professora Vilmara lançou, como proposta inicial, que as crianças explorassem as brincadeiras pintadas no chão do espaço. Porém, o interesse da proposta de exploração dos jogos e desenhos pintados no chão não durou muito tempo e, após pouco mais de dez minutos, as crianças já estavam dispersas e buscando outras formas de se locomover pelo local. A professora Vilmara, parecendo perceber o desinteresse das crianças, aproveitando a materialidade que já havia sido deixada ali anteriormente e o espaço onde estavam, ofereceu caixas de diversos tamanhos e perguntou acerca de possíveis usos

para aqueles materiais. Assim, individualmente ou em grupo, as crianças se apropriaram do espaço e do material de acordo com suas vivências, propondo diversas formas de brincar e manipular aquele material, inicialmente de forma aleatória.

Algumas começam a empilhar as caixas, outras começaram a entrar dentro delas e simular carros, outras crianças empurravam enquanto o(a) “motorista” ficava dentro da caixa.

Nesse momento, a professora Vilmara perguntou para as crianças o que elas iriam fazer com as caixas. Davi, já dentro da sua caixa, disse:

DAVI: Eu vou fazer um foguete. Vou voar.

VILMARA: Vamos contar para o Davi voar, gente? Cinco, quatro, três, dois, um.... Voou. –Acenou para o alto e se despediu do Davi.

Agatha se aproximou, e pôs a caixa próxima de Davi, entrando na brincadeira com a permissão não verbal de Davi. Os dois entraram nas caixas, cada um ocupando o seu “foguete”

e simulando uma viagem, conforme descrição dos diálogos abaixo.

DAVI: Nosso foguete vai decolar!!! A gente não precisa de nenhuma ajuda. Somos o foguete e vamos decolar.

AGATHA: Davi, meu foguete está decolando.

A professora, após circular por outros grupos de crianças da turma que haviam se formado, se aproximou após escutar o chamado de Davi que, abrindo sua caixa, reclamou:

DAVI: Eu estava decolando e você me viu caindo.

A professora entrou na simulação da viagem que Davi e Agatha propuseram:

VILMARA: Gente, o Davi caiu, vamos ver se ele está bem?

Davi respondeu:

DAVI: Fecha meu foguete. A cápsula está fecha-

da. Minha cápsula está pegando fogo.

VILMARA: Nossa, vamos apagar o fogo.

Nesse momento, a professora simulou estar pegando um extintor e fazia gestos e sons como se estivesse usando o equipamento, o que chamou a atenção de outras crianças que se aproximaram, mas não entraram na brincadeira. Ficaram só observando, com exceção de Anne, que tentou apagar o fogo junto com a professora.

DAVI: O fogo é de metal.

VILMARA: Ah, se o fogo é de metal, não tem fogo.

Davi saiu da caixa relatando para a professora, de forma apressada, a sua aventura, perdendo seu interesse, pois logo depois, Davi e Agatha encontraram outra forma de brincar com a caixa e saíram empurrando um ao outro como se estivessem em um carro.

(Notas do caderno de campo – 03/03/2020).

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Brincando com caixas

Percebemos, nesse episódio, que a professora levou em consideração o interesse que meninos e meninas demonstraram pelos jogos e brincadeiras pintadas no chão do pátio da instituição. A participação efetiva das crianças se deu em outras atividades, principalmente naquelas que envolviam a movimentação do corpo, o que foi propiciado pelo espaço utilizado pela professora para a realização da atividade. O pátio, por ser um espaço amplo e aberto, permitiu que meninos e meninas explorassem seus movimentos e elaborassem outras atividades para além daquela proposta pela professora. A atividade que, inicialmente, fora dirigida pela professora, teve seu percurso modificado após a profissional perceber que as crianças já não apresentavam mais interesse na proposta realizada. Sendo assim, Vilmara ofereceu caixas de diversos tamanhos e perguntou sobre possíveis usos para aqueles materiais. Assim, individualmente ou em grupo, as crianças se apropriaram do espaço e do material, de acordo com suas vivências, e demonstraram confiança na realização de atividades tanto individuais quanto em interação com seus pares.

Ficou evidente, nesse episódio, a aprendizagem incentivada pela participação das crianças no contexto da Educação Infantil. As crianças foram instigadas a explorar os movimentos e a expressar suas ideias e hipóteses. Protagonistas de suas experiências, na confecção das brincadeiras, elas fizeram relatos das vivências com seus foguetes imaginários, do que elas inventaram e da viagem proporcionada com o foguete. A participação das crianças, no brincar com as caixas, estimulou a curiosidade e a criatividade, e o papel da professora, portanto, foi provocar essa curiosidade mediante uma experiência vivenciada pelas crianças: a partir da escuta do adulto, dos elementos expostos pelo grupo no momento e a valorização do encantamento pelos fenômenos físicos.

As pedagogias participativas são, essencialmente, para a criação de tempos e espaços, em que as relações sejam capazes de apoiar as atividades e projetos a fim de promover a participação das crianças na

construção da própria aprendizagem (OLIVEIRAFORMOSINHO, 2007, p. 18). Voltada, portanto, às crianças e sua participação, a professora Vilmara reconheceu que todas deveriam atuar, vivenciar, opinar e ter suas ideias acolhidas democraticamente, ao flexibilizar o planejamento para atender aos interesses e curiosidades demonstrados pela turma. A professora manifestou uma escuta sensível, e sobretudo, proporcionou às crianças o sentimento de vinculação ao espaço e situação de aprendizagem.

A ação da professora é central na construção de espaços de participação infantil. Apesar da necessidade de coordenação que as crianças poderiam demonstrar em relação ao adulto, nesse episódio, observamos que não houve uma submissão em relação às ideias da professora que demonstrou compreender as crianças e suas potencialidades, vivenciando um momento de escuta e diálogo, construindo uma relação democrática com o grupo.

A professora demonstrou uma postura flexível frente às expressões verbais ou não verbais, tendo em vista que elas não expressaram oralmente que não queriam mais brincar com os jogos pintados no chão do pátio. Assim, organizou outro contexto de aprendizagem, com outros materiais que já estavam previamente disponíveis naquele espaço, replanejando o seu fazer pedagógico de acordo com a demanda do grupo. Para potencializar a participação infantil, não basta somente uma escuta atenta, mas também uma relação horizontalizada e mais significativa para as crianças e a professora, por meio da qual ambas aprendam.

Além disso, a brincadeira de faz de conta corrobora a capacidade de reelaboração da realidade pela criança. Como atores do processo de aprendizagem, as crianças utilizaram as caixas de papelão, fazendo com que elas adquirissem, no plano do faz de conta, as características de um foguete.

Com alteração do significado do objeto consolidado no mundo adulto – o foguete – o grupo demonstrou sua capacidade imaginativa de interligar a fantasia a situações vivenciadas no seu cotidiano. Assim, por meio da imaginação, a criança recria o

significado dos objetos. O objeto, portanto, é “o elemento que garante a racionalidade ao ser humano. Ao brincar de faz de conta a criança está aprendendo a criar símbolos” (KISHIMOTO, 2006, p. 40). Além disso, o episódio ainda revela que a organização dos espaços, bem como a presença de um planejamento flexível, que se mostre aberto às contribuições que as crianças trazem para o cotidiano da escola, podem ser elementos que potencializam a participação das crianças no contexto da Educação Infantil. A interação das crianças com os materiais disponibilizados, assim como com o espaço, vai compondo uma construção coletiva, no qual as crianças apresentam curiosidade, potencialidades e capacidade de se maravilhar, assim como o desejo de comunicação e interação com o outro (Rinaldi, 1999), além de se perceberem reconhecidas e confiantes para expressarem e interagirem com a proposta apresentada. Portanto, a organização do espaço também é um elemento significativo para a participação infantil, já que áreas mais abertas e livres permitem maior participação das crianças, ao não limitarem suas possibilidades de ação.

PARA SABER MAIS!

KISHIMOTO, Tizuko Morchida (Org.). O jogo e a Educação Infantil. In: ______. Jogo, brinquedo, brincadeira e educação. São Paulo: Cortez, 2006. p. 13-43.

OLIVEIRA-FORMOSINHO, Julia. Pedagogia(s) da infância: reconstruindo uma práxis de formação. Formosinho, Kishimoto e Pinazza. Pedagogia(s) da Infância: Dialogando com o passado, construindo o futuro. Porto Alegre: Artmed, 2007. p.13-36.

RINALDI. Carla. Diálogos com Reggio Emilia: Escutar, Investigar e Aprender. São Paulo: Paz e Terra, 2005.

Professora e crianças e a exploração de materiais não estruturados

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Relato 2:

Baobá

A Escola Municipal Carlos Drummond de Andrade possui formas de organização do trabalho de cuidado e educação das crianças que, no cotidiano, possibilitam e favorecem a participação infantil. Uma das mais relevantes formas de organização e planejamento previstas no Projeto Político Pedagógico são as oficinas, que são outra forma de organização flexível que ocorre na instituição. Em uma das oficinas, pude perceber que as crianças construíram formas de participação que visavam ressignificar aquilo que fora proposto pelas professoras.

A professora Carla optou por trabalhar a proposta de oficina cujo tema era a diversidade étnico-racial, tendo sido desenvolvido por meio da literatura. Nesse dia, a professora organizou as mesas da sala em forma circular antes da recepção das crianças. Logo após estarem todas sentadas na roda, a professora Carla informou para as crianças que elas iriam conhecer a história do Baobá. A professora foi contando a história e utilizando vários recursos, como um livro com ilustração do mapa-múndi e até o próprio celular para mostrar como era um Baobá.

A maioria das crianças ouviu a história com atenção, com exceção de Ana Bianca

que se recusou a sentar próxima de Milena, sem justificar o motivo dessa recusa, o que demandou intervenção da professora. Mesmo com a intervenção da professora, Ana Bianca demonstrou sua insatisfação com a organização do grupo e, ao se sentar, abaixou a cabeça e cantarolou uma música inventada por ela naquele momento. Ao terminar de contar a história, a professora propôs para as crianças a realização de uma atividade de arte: a pintura do baobá. Organizou a sala de uma forma diferente, colocando as crianças em duplas, uma de frente para a outra, aproveitando o momento para propor uma brincadeira de contagem do

número de crianças presentes, envolvendo a linguagem matemática. A professora acompanhou durante todo o tempo a atividade que as crianças estavam realizando, enquanto estas discutiam sobre sua pintura, ensinavam uns aos outros e mexiam na tinta com as mãos, além de fazerem perguntas o tempo todo sobre as cores utilizadas e a história que ouviram. A professora pediu sugestões, opinião e hipóteses sobre a história do baobá para as crianças durante a execução da proposta e elas, em sua maioria, expressavam seus pensamentos aparentemente sem dificuldade. Ana Bianca aproveitou as questões levantadas pela professora e começou a cantarolar sobre a mistura de cores: “Vermelho com azul dá marrom”. A professora aproveitou a fala da criança para misturar as cores propostas e a mistura sugerida por Ana Bianca foi utilizada na pintura realizada pelas crianças, que exploraram os suportes e a materialidade

fornecidas, compararam suas pinturas e utilizaram o próprio corpo para experimentar a textura e cores das tintas. Os meninos Daniel e Bruno utilizaram o cotonete e os dedos para fazer registros nos braços, dizendo que fizeram “pata de leão”. Bruno levantou e mostrou à professora: “Eu também fiz tatuagem.” Perguntei se poderia tirar uma foto da tatuagem deles, o que me foi permitido e eles me pediram para ver a foto. Depois de mostrarem a tatuagem para os colegas, eles novamente se aproximaram de mim e disseram que iriam lavar os braços.

Após o término da pintura pelas crianças, a professora pendurou todas as produções em um varal do lado de fora da sala, para que secassem e finalizou a oficina ao chamar as crianças para lavar as mãos e iniciar a preparação para o lanche, no refeitório da escola.

(Notas do caderno de campo – 05/03/2020).

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Onde fica a África? Localizando o continente no Mapa Mundi

Esse episódio ocorreu durante uma oficina que abordou a temática das relações étnico-raciais. Apesar de estarem abertas aos interesses das crianças, as oficinas são previamente organizadas pelas professoras e com temas anteriormente definidos e que são previstos no Projeto Político Pedagógico da Instituição.

Naquele dia, a proposta da oficina de relações étnico-raciais tinha como objetivo utilizar a literatura infantil como forma de abordar o estudo de elementos da cultura africana, a partir da história de uma árvore nativa do continente africano: o baobá. A professora, ao desenvolver o planejamento, informou às crianças que elas iriam conhecer a história dessa árvore gigantesca, e, assim, prosseguiu com a contação de história. Ela utilizou vários recursos, como um mapa-múndi e até o próprio celular, para mostrar como era um baobá.

Ao terminar de contar a história, a professora propôs a realização de uma atividade de arte que consistia na pintura do baobá. Carla acompanhou minuciosamente as crianças durante a confecção da atividade. Enquanto elas discutiam sobre as pinturas feitas, ensinavam umas às outras, mexiam na tinta com as mãos e questionavam (sem intervalo) sobre a experiência. A professora pedia sugestões, opiniões e hipóteses sobre a história do Baobá para as crianças, que, em sua maioria, expressavam seus pensamentos aparentemente sem dificuldade.

É importante considerar que, nesse episódio, os diversos momentos em que a professora reorganizou a sala evidenciaram um elemento importante o qual permitiu diversas formas de participação das crianças. Carla iniciou a contação de história com as crianças sentadas nas carteiras em roda, sendo que, quando ela lançou mão do mapa-múndi e do celular, as crianças se levantaram das cadeiras para interagir mais diretamente com os conteúdos que a professora apresentava – o que demonstrava o seu interesse de participar ativamente daquela situação. Quando Carla propôs a segunda parte da oficina, que compreendia a pintura do Baobá, a professora reorganizou as carteiras de modo que as crianças

pudessem ficar perfiladas, mas em duplas – uma em frente da outra. Na perspectiva da pedagogia italiana direcionada à Educação Infantil, a organização do espaço contribui diretamente para oprocesso de aprendizagem nas crianças, já que oespaço e suas potencialidades são considerados como um segundo educador (Rinaldi, 2005).

Esse episódio também nos permite compreender que pensar a participação é estar em constante diálogo com os aspectos sociais e culturais que marcam o contexto de vida das crianças, percebendo-as como sujeitos ativos e sujeitos sociais que, em suas interações, estão a todo tempo “significando e recriando o mundo ao seu redor. A aprendizagem é a possibilidade de atribuir sentido as suas experiências” (CORSINO, 2009, p. 117).

Além disso, podemos afirmar que as crianças participam não somente quando estão em ação, mas também quando suas especificidades e singularidades são consideradas ao planejar as propostas pedagógicas da turma. Nesse sentido, ao enfatizarem a importância da escuta criança no planejamento, as oficinas possibilitam condições de construção de partilha de conhecimentos (OLIVEIRA-FORMOSINHO, 2007). Porém, a partir do episódio, fica claro que pensar nas especificidades das crianças no momento de planejar as oficinas, no momento de execução das propostas nem sempre é tarefa das mais fáceis –oque pode ser visto quando Ana Bianca propõe a mistura de cores. Além disso, por mais que a proposta das oficinas seja previamente organizada –o que é importante num contexto de educação e cuidados coletivos – ainda assim, é preciso que ela abra espaço para a participação das crianças, envolvendo seus saberes, seus interesses e suas necessidades de aprendizagem. Ou seja, as situações cotidianas que são ofertadas para as crianças devem abrir espaço para as informações que elas inserem no cotidiano pedagógico da turma.

A partir dos aspectos elencados acima, podemos destacar a participação das crianças ao realizar suas próprias propostas, transcendendo o que foi

sugerido pela professora, ao utilizar o material oferecido para pintar seus braços, simulando tatuagens. No decorrer da pintura, os meninos utilizaram os dedos para fazerem registros nos braços e, ao finalizarem o desenho, afirmaram ter feito uma “tatuagem” de “pata de leão”: “Eu também fiz tatuagem”, disse Bruno, ao se levantar e mostrar para a professora e a pesquisadora. Durante o diálogo, perguntei se poderia fotografar a “tatuagem” e os meninos permitiram, contanto que pudessem ver as imagens. Depois de mostrarem a tatuagem para os colegas, eles novamente se aproximaram de mim e disseram que iriam lavar as “tatuagens”.

Por um lado, a reconstrução da proposta feita pela professora demonstrou que as crianças ainda apresentavam uma visão estereotipada sobre o continente africano, o que não foi ampliado pela professora, talvez pelo tempo no qual a oficina foi realizada, mas acredito que poderia ser ampliado na próxima semana, caso não tivesse ocorrido a suspensão do atendimento presencial por conta da pandemia. Porém, por outro lado, a ressignificação que as crianças fizeram da história contada pela professora e da atividade proposta nos mostram que as crianças não são meros receptáculos da cultura adulta, elas ressignificam as informações que lhes são apresentadas. A proposta realizada pela professora estava relacionada com sua vivência acadêmica e social e as crianças, em interação entre elas, reconfiguraram a pintura do baobá em outra experiência, que teve como resultado a pintura dos braços.

Além disso, a reconstrução da proposta realizada pelas crianças é um indicativo que elas participam do cotidiano da turma, independente da permissão da professora, o que podemos denominar de participação para além da presença do adulto, ou seja, a presença do adulto ou até mesmo sua autoridade sobre as crianças podem limitar a participação, mas não fazer com que ela não ocorra. De acordo com Agostinho (2010), a participação infantil acontece, porém, em ritmos e formas diversificadas e que alguns fatores interferem na forma como essa participação ocorre. Essa autora considera que as crianças são sujeitos

que podem e devem participar do cotidiano da Educação Infantil,

[...] embora reconheça que são constrangidas por um conjunto de fatores: o poder adulto, as estreitas fronteiras entre proteção e participação, ainda tênues espaços e tempos abertos para fazê-lo, acesso às informações necessárias para o percurso e os encaminhamentos do processo, um conjunto de recursos que, ainda não incorporados, colocam limites à efetiva participação (AGOSTINHO, 2010, p. 25).

Podemos perceber que, mesmo abrindo espaço para a fala das crianças e suas contribuições, a escuta nem sempre ocorre de forma efetiva, pois, conquanto exista uma sensibilidade da professora em tentar captar as falas e as ações das crianças, nem sempre é possível considerar todos os elementos que elas trazem, pois são muitas questões simultâneas e distintas. Cabe, nesse sentido, também à professora filtrar, equilibrar e conduzir essa comunicação e tomada de decisões. Por isso, considero que a participação infantil não pode ser tarefa de uma professora em específico, mas parte do projeto pedagógico que visa, dentre outras questões, ao desenvolvimento da autonomia das crianças – conforme prescrevem as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 2009) devendo, portanto, ser foco de formação continuada e em serviço das professoras de creches e pré-escolas.

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Trabalho coletivo com a imagem do baobá

PARA SABER MAIS!

AGOSTINHO. Kátia Adair. Formas de Participação das Crianças na Educação Infantil. Tese de Doutorado em Estudos da Criança. Universidade do Minho. 2010. Disponível em: https://repositorium.sdum.uminho.pt/ handle/1822/11195>. Acesso em: 11 jul. 2019.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Básica. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Brasília: MEC, SEB, 2009.

CORSINO, Patrícia (org.). Educação Infantil: cotidiano e políticas. Campinas, São Paulo: Autores Associados, 2009.

OLIVEIRA-FORMOSINHO, Julia. Pedagogia(s) da infância: reconstruindo uma práxis de formação. Formosinho, Kishimoto e Pinazza. Pedagogia(s) da Infância: Dialogando com o passado, construindo o futuro. Porto Alegre: Artmed, 2007. p.13-36.

RINALDI. Carla. Diálogos com Reggio Emilia: Escutar, Investigar e Aprender. São Paulo: Paz e Terra, 2005.

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Utilização do celular para pesquisa e visualização do Baobá Trabalho coletivo com a imagem do baobá

Sala dos Professores

Quem tem medo de criança na Educação Infantil?

Sales dos Santos Professor do Curso de Pedagogia da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM. Atuou como professor de Educação Infantil na Prefeitura e Belo Horizonte de 2005 a 2014.

Fui convidado por Marcia Gomes para partilhar algumas de minhas experiências como professor de Educação Infantil – cargo público que eu ocupei de junho de 2005 a abril de 2014 – na Prefeitura Municipal de Belo Horizonte e que envolvem a participação das crianças no contexto de minha prática pedagógica.

Confesso que este exercício de revisitar minhas memórias do período em que fui professor de Educação Infantil me proporcionou lembranças e muita saudade desse momento de minha trajetória profissional e acadêmica. Se, hoje, sou professor universitário (e pesquisador do campo da infância e da Educação Infantil), com certeza, as origens desse percurso encontram-se no período em que atuei como professor nas Unidades Municipais de Educação Infantil (UMEIs), hoje, Escolas Municipais de Educação Infantil (EMEIs) de Belo Horizonte.

Nos quase dez anos de atuação em diferentes instituições de cuidados e educação de belohorizontinas, trabalhei com crianças de diferentes faixas etárias. Sempre gostei de atuar com os bebês –no berçário – pois acredito que acompanhar e poder contribuir com os processos de desenvolvimento que eles vivenciam nesse momento da vida é muito gratificante. Considero ser uma experiência ímpar trabalhar como mediador dos processos de apreensão do mundo pelos bebês.

De igual modo, também gostava muito de trabalhar com as crianças maiores, em especial, as de cinco anos de idade. Acredito que o maior domínio que elas possuem da linguagem oral me permitia uma maior aproximação com seus universos de referência; com suas produções culturais e com as experiências sociais que elas vivenciavam dentro e fora da escola. Ao me aproximar das experiências delas, eu tinha a possibilidade de construir outras e novas situações educativas que eram significativas tanto para elas quanto para mim. Foi assim que me constitui professor de Educação Infantil: me esforçando para observar e ouvir as crianças. Acredito que esse professor é, na realidade, o pai do pesquisador (e do docente universitário) que me tornei.

Mas, como profissional de Educação Infantil eu também possuía algumas limitações. Recordo-me que, ao longo de minha trajetória profissional eu

evitava atuar com as crianças de três anos de idade. Não sei explicar o porquê dessa limitação; talvez porque a política da Educação Infantil na PBH previsse que as crianças e três anos fossem atendidas a partir de uma lógica organizacional muito próxima daquelas de quatro e cinco anos, quando, na realidade, seus processos de desenvolvimento as aproximassem das crianças de dois anos de idade. Não sei! O que sei é que, como costumo brincar com os/as estudantes do curso de Pedagogia, eu tinha pavor de crianças de três anos. O fato curioso é que, uma das experiências mais importantes envolvendo a participação das crianças no planejamento das práticas pedagógicas na Educação Infantil aconteceu, justamente, com as crianças de três anos.

No ano de 2010, eu fui aprovado no processo seletivo para ingresso no curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação Conhecimento e Inclusão Social da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (PPGEFaE-UFMG). Assim, já no início de 2011, eu abri um processo na PBH pleiteando licença sem vencimentos para estudos. Esse processo, aberto em fevereiro daquele ano, levava cerca de três meses para tramitar em diferentes instâncias, até que me foi concedida a liberação para os estudos em maio de 2011. Ocorreu que, naquele período, uma das minhas colegas de profissão, professora da turma das crianças de três anos, perdeu um ente muito querido e desenvolveu um quadro depressivo severo, vindo a licenciar-se já no início do ano letivo. Como eu ainda estava trabalhando e para evitar que uma professora advinda de outra instituição substituísse a colega, a direção me pediu que assumisse a turma de três anos, pois havia muitas crianças novatas e uma pessoa totalmente estranha àquele contexto, poderia não ser bom para os/as pequenos/as.

Aceitei o convite, mas fiquei apreensivo, pois, como dito, eu sempre evitei trabalhar com as crianças de três anos. As Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) (Brasil, 2009) tinham acabado de ser revistas, ampliadas e reeditadas pelo Conselho Nacional de Educação, há poucos mais de dois anos. Nelas, havia toda uma discussão curricular que pressupunha que o trabalho pedagógico na Educação Infantil deveria partir das crianças, de suas experiências e das situações que elas vivenciavam no cotidiano. Ademais, essas Diretrizes concebiam as crianças como centro do trabalho pedagógico em creches e pré-escolas. Na PBH, vivíamos um momento de ampla formação, pois a RME, criava, por meio de um processo coletivo e dialógico, as Proposições Curriculares para Educação Infantil da PBH, que tinham como documento norteador as DCNEI. Diante disso, comecei a investigar formas de me conectar com o grupo de crianças de três anos. Após, muita leitura e investigação na e sobre a própria prática, decidi partilhar com as crianças o meu planejamento. No primeiro mês de trabalho, eu busquei identificar quais eram as atividades que as crianças mais gostavam. Dentre essas atividades, meninos e meninas me mostravam que gostavam da “Hora da Leitura”; da “Hora da matemática”; da “Hora do Baú do Faz-de-Conta” – uma caixa com fantasias que havia na UMEI; da “Hora da descoberta” – um momento em que eu levava alguma brincadeira ou atividade de exploração de conceitos científicos; da “Hora das Artes” –que poderia ser um desenho, uma pintura, uma colagem ou qualquer outra situação que envolvesse as artes visuais; a “Hora da Música”; “a Hora da Dança” (quase sempre aconteciam juntas); a Hora do Projeto (naquela ocasião, as crianças tinham um projeto de observação de um casal de corujas que habitava na escola), além da Hora do Parquinho –que naquele contexto era compreendido como um direito inegociável das crianças.

Depois que eu identifiquei que essas eram as atividades de que as crianças mais gostavam, comecei a registrar fotografias da turma de

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crianças de três anos nessas atividades. Solicitei à direção que imprimisse as fotografias em tamanho maior (15x21cm), colei-as em papel cartão colorido e coloquei o nome da atividade: Hora da Leitura; Hora da matemática etc. Por fim, plastifiquei as plaquinhas e passei a levá-las para a sala de referência a turma de três anos de idade. Assim, todos os dias, eu planejava o maior número possível de atividades e, sempre no início da manhã, logo após o desjejum das crianças, apresentava as plaquinhas ao final da roda de conversa e negociava com elas as atividades que iríamos desenvolver naquele dia. Muitas vezes, era um processo de negociação mesmo, pois em determinadas situações elas diziam para mim: –Sandro, a gente queria fazer desenho hoje! e eu dizia:

–Gente, mas nós desenhamos ontem?! Que tal a gente trocar: a gente substitui a “Hora das Artes” pela “Hora da Leitura”, pois eu trouxe um livro bem legal para a gente ler juntos hoje. Amanhã eu estou querendo trazer uma atividade de pintura! Vamos trocar?

Algumas vezes, eu conseguia convencê-las, outras não. E foi assim que, entre os meses de fevereiro e maio de 2011 eu consegui vencer minha insegurança de atuar com as crianças de três anos. Sem dúvidas esse foi um dos períodos em que eu mais trabalhei, contudo, foi também um dos momentos de minha trajetória profissional em que mais me realizei profissionalmente. Ao reconhecer que, apesar da pouca idade, do pouco repertório linguístico, as crianças eram capazes de apontar caminhos para uma prática pedagógica que fosse prazerosa para elas, mas sobretudo, repleta de sentidos para mim. Naquela situação, eu me aproximava cada vez mais delas e as compreendia melhor. Acredito que naquele período, eu compreendia uma das especificidades da docência da Educação Infantil: reconhecer a criança como sujeito no tempo presente, capaz de participar da própria educação.

Só depois de muito tempo, ao intensificar meus estudos sobre a prática pedagógica na Educação

Infantil é que fui me dar conta de que, naquela ocasião, ao buscar superar meu inacabamento profissional, eu estava construindo uma forma de ampliar a participação das crianças no planejamento da prática pedagógica na Educação Infantil. Considerando as crianças como sujeitos que participam ativamente de diferentes processos sociais, inclusive, das práticas de cuidado e educação a elas destinadas.

PARA SABER MAIS!

BELO HORIZONTE. Proposições Curriculares para a Educação Infantil: Fundamentos. (Desafios da Formação, 1) - Belo Horizonte: SMED, 2014. 136 p.

BRASIL, Ministério da Educação. Resolução CNE/CEB nº 05. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Oficial da União. Diário Brasília, 17 de dezembro de 2009.

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Mais algumas palavras

Trazemos nesta seção o relato de algumas profissionais que atuam ou atuaram na rede municipal de Contagem sobre suas percepções a respeito da educação, da relação com as crianças e das crianças com a escola e suas profissionais. São pequenos trechos de memórias afetivas que ficaram na trajetória de cada uma, seja enquanto professora ou gestora de escolas públicas do nosso município. Com a palavra, nossas profissionais da educação.

Eu gosto de ver as crianças da EI na escola fundamental. Vou vendo elas pequenininhas, andando pela escola. Elas correm pra lá e pra cá, observam tudo e parecem gostar da escola. No dia a dia passamos por vários encontros: nos corredores, na biblioteca, no refeitório, na entrada, na saída, no banheiro, no parquinho, no pátio, nos eventos, feiras, festas e sempre é um “oi”, “a professora do meu irmão”, “eu vou ser dessa sala”, um “tchauzinho”. E vai ficando a

Algumas crianças chegam no CEMEI curiosas para saber qual a programação do dia. “Se é dia de oficina; qual horário do parquinho; porque não podemos brincar lá fora...” esse momento de saber qual é a rotina, é um momento de saber como será a participação deles no decorrer do dia. Se estão empolgados, falantes, sonolentos, se faltou alguém, se alguém trouxe um brinquedo diferente. Elas se deixam influenciar e influenciam o cotidiano, gerando novas possibilidades de se construir a rotina. Há sempre algo no cotidiano escolar que demanda a participação das crianças, seja a entrega do diário na secretaria da escola, acompanhar o

lembrança, a marca desse tempo. Quando chega no fundamental, dá para ouvir um “eu já conheço essa professora”, “você lembra de mim?”. E muita coisa acontece assim, na informalidade, no cotidiano da criança na escola, ela aprende muito nessa rotina.

RELATO DE CIBELE BRAGA – ASSESSORA SEDUC NA DIRETORIA DE EDUCAÇÃO INFANTIL DE 2010

ATÉ 2012/PROFESSORA PEB1 – E.M. CARLOS

DRUMMOND DE ANDRADE

colega ao banheiro, solicitar material a pedagoga, recolher os papéis do chão, limpar as mesas sujas de tintas, organizar as cadeiras na sala, auxiliar ocolega na organização da mochila, parar no corredor para observar os gatos. Para além das experiências vivenciadas inscristas nos cadernos de currículos, há outras que nem sempre são valorizadas, mas que também fazem parte do cotidiano, e abre inúmeras possibilidades de aprendizagem para as crianças.

RELATO DA PROFESSORA CARLA SANTOS –EX DIRETORA DO CEMEI NOVO ELDORADO E PROFESSORA DA EDUCAÇÃO INFANTIL NA E M CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

Na entrada da escola, a família já percebe que existe um portão separado para a educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental.

O CAIC assusta a princípio pelo tamanho mas aos poucos, a criança vai tomando conhecimento do espaço reservado ao seu segmento.

No primeiro dia de aula a professora faz uma excursão com a turma apresentando os ambientes da escola. É possível ver o brilho nos olhos causado pelo encantamento, principalmente pelo parquinho. Sim! A educação infantil tem um parquinho só pra eles! A brinquedoteca, o pátio, o refeitório, a sala de aula, o auditório, a biblioteca... É um vasto mundo para nossos pequenos. Os lugares e suas regras de

uso logo são incorporados por eles.

É incrível a capacidade de adaptação de uma criança. Tiramos aqui o choro de uns poucos pelo colo materno nos primeiros dias... Logo passa...

Na biblioteca infantil, as estantes tem os livros dispostos de acordo com o alcance dos olhos ou das mãozinhas... As obras com pouco texto e muita imagem ficam pertinho deles.

A escolha de um livro é feita em geral pela capa. Mas também observa se a procura por uma história que já foi contada pela família, pela professora ou pela bibliotecária.

RELATO DE MARY ÂNGELA – BIBLIOTECONOMA DA E.M. CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

Uma das coisas que mais me encanta na EI é a capacidade que as crianças tem de “toparem” fazer tudo o que lhe é proposto. Elas tem uma energia e uma alegria que são contagiantes e não titubeiam em realizar todo tipo de atividade proposta, seja ela correr, saltar, rolar, cantar, colorir, recortar… Dentre as várias atividades que elas desenvolvem no decorrer no dia, uma que se destaca, ao meu ver, na Umei onde eu trabalhava é a “Rodona”. É o momento do acolhimento, das cantigas, dos relatos das crianças.

É muito gratificante receber os pequenos com esse clima agradável, onde as crianças se interagem de forma tão espontânea.

É um momento mágico, onde é possível perceber, num curto período de tempo, um grande salto no desenvolvimento das crianças, principalmente na linguagem oral.

As crianças amam esse momento e eu também.

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RELATO DE MARY GOMES PROFESSORA E DIRETORA APOSENTADA DA REDE. Pintando com a professora

Retorno presencial, ah!! Tão aguardado, especialmente pelas crianças! Quanta ansiedade! Quantas expectativas! O ambiente escolar, antes tão frio e silencioso, passou a receber algumas crianças que trouxeram de volta a alegria e a vida à escola. Apesar de tanto tempo afastadas, as crianças não enfrentaram nenhum problema de readaptação à nova rotina e aos espaços que pouco conheceram antes da suspensão das atividades presenciais. Queriam logo brincar, ocupar os espaços, mas incialmente perceberam que havia mudanças. Nada de toques carinhosos, nada de proximidade com as demais crianças e com a professora. No entanto, não causou desmotivação em relação à participação nas experiências propostas. Foram se apropriando da nova forma de convivência. Em relação ao cumprimento dos protocolos sanitários, tais como a higienização das mãos (com água e sabão ou álcool em gel), o distanciamento entre eles na sala ou entre as demais turmas e no geral no uso da máscara (às vezes queriam tirar só para respirar um pouquinho e tinham dificuldade para colocar, quando tiravam para lanchar por exemplo) – coisas que com o tempo foram se resolvendo.

Na continuidade de projetos introduzidos durante o atendimento remoto, já presencialmente, foi possível observar o interesse delas pelos momentos de aprendizagem da escrita e seus registros (reconhecimento e escrita do seu nome, das

letras do alfabeto); das rodas de conversa (palco de muitas discussões/reflexões sobre o contexto da pandemia no geral, sobre a necessidade da prevenção e cuidados, do que provocou em relação à escola - seu fechamento e criação de novas maneiras de aprender e conviver, e de introdução de novos saberes e conhecimentos tais como direitos e deveres das crianças), de leitura e contação de histórias (que tanto estimulam a imaginação, criatividade e vivência do faz de conta, bem como a compreensão do uso social da escrita, o manuseio de livros), de música (que envolveram oconhecimento de instrumentos musicais e exploração de seus sons, bem como os sons emitidos pelo próprio corpo e outros objetos, e as brincadeiras com música ); e pelos momentos de aprendizagem e registros em relação ao universo da matemática (reconhecimento e escrita dos numerais, contagem, quantificação, pensamento lógico matemático, conceitos, dentre outros); e de suas produções em geral (desenho, escultura, pintura). Pelos momentos do brincar, seja na sala, no parquinho ou brinquedoteca, bem como nas brincadeiras que lá acontecem, que envolviam criatividade, imaginação e alegria, que sem sombra de dúvida, são efetivamente o que mais apreciaram, e a interação, realmente cobre as lacunas deixadas no atendimento remoto.

RELATO DA PROFESSORA PEB 1 CLEOMAR, ATUAL VICE DIRETORA DO CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

Proporcionar as crianças um ambiente acolhedor e com segurança, onde elas possam explorar os espaços e juntos fazerem descobertas para novos conhecimentos, considerando que os professores construam juntamente com elas, uma rotina diária onde todos possam ter autonomia de discutir e argumentar suas escolhas. Ao pensar na participação das crianças no cotidiano da Educação Infantil é fundamental pensar nos direitos de conhecer-se e conviver, nos direitos de participar eexpressar,

nos direitos de brincar e explorar, elaborando um planejamento a partir das intencionalidades educativas. Nesse sentido pensar na organização de espaços e materiais para que as crianças façam experimentações, para que cada um possa aprender com o outro e com situações vividas, tendo em vista todos os direitos de aprendizagens acima citado.

RELATO DA PROFESSORA AGNES PEB1 CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE, PROFESSORA ED. INFANTIL PBH

A interação na Ed. Infantil é favorecida através de oportunidades de escuta das crianças. Levamos em consideração a sua história de vida e tentamos oportunizar algumas experiências em grupos, trios, duplas apara trabalharmos algum tema por elas apontados em oficinas e projetos. Mesmo no dia a dia da sala de aula, tentamos fazer essa escuta, trabalhamos muito a autoestima de cada criança

valorizando suas produções e tentativas. Sempre tentamos conversar, dar oportunidade para a fala e escuta dos pequenos. Ali vemos várias oportunidades de troca e acredito que todos saímos ganhando. Aprendo muito com os pequenos todos os dias.

RELATO DA PROFESSORA PEB 1 II MICHELLINE, CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

A participação das crianças se inicia na acolhida,na forma como a recebemos,como as olhamos,proucurando sempre enxergar o que elas nos trás e como se apresentam no seu cotidiano.

A interação das crianças na roda de conversa é essencial para o desenvolvimento do trabalho ao longo do dia,a escuta e necessária o tempo todo.

Prporcionar experiências onde elas pissam interagir de firma natural e prazerosa,através do brincar,dessa forma ela constrói e reconstrói seu pensamento.

Criar juntos com elas a rotina do que vai aconter no dia também é muito importante, transmite segurança e organização e perceção do tempo é uma forma de avaliação do seu cotidiano. Contar e recontar historias,parlendas,poesias,músicas, textos e contextos contribui para o seu imaginário e sua formação pessoal.

RELATO DE JUCIMAR, PEDAGOGA EDUCAÇÃO INFANTIL – CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

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Trabalho em grupo
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