Radicalizando a democracia pelo diálogo

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Radicalizando a democracia pelo diálogo – Pólis 25 Anos Daisy Perelmutter 1 A escrita e o conhecimento histórico se constituem a partir de um empreendimento tenso e ardiloso de ordenação do que, por natureza, é pouco afeito e, muitas vezes, evasivo às grandes sínteses: o vivido. A utopia romântica de reconstituição integral de um passado esquecido ou preterido é, inexoravelmente, debelada pela metodologia histórica, pautada na identificação e leitura dos restos e vestígios disponíveis que chegam às mãos do historiador. Estes documentos não são inocentes e foram fabricados obedecendo às intencionalidades do contexto específico no qual foram engendrados. Neste sentido, não podemos pensar o conhecimento histórico como um trabalho intelectual pueril. A História vive acossada pela dualidade memória/esquecimento. Ao elegermos certos eventos/acontecimentos como emblemáticos e representativos de um determinado período ou contexto fazemos vistas grossas ou enterramos, no mesmo ato, tantos outros que, por falta de suporte de memória ou pela fragilidade de seu arcabouço, são tragados e esvaecem no curso do tempo e dos acontecimentos. A narrativa histórica é um esforço de articulação entre passado e presente, através do estabelecimento de um vaso comunicante entre os diferentes fios que constituem cada um destes tempos. Não referenda-se por uma aderência viscosa à memória nem, por outro lado, por um desdém futurista à tradição e bagagem herdadas. O esforço em reanimar o passado de modo a fazer com que suas vozes ecoem e desafiem o presente em sua suposta onipresença e auto-referência, outorga à História a insígnia de um campo de conhecimento no qual o desassossego é tido como sua premissa. Reconstituir historicamente qualquer experiência - individual, coletiva, institucional, local, nacional – não é, em absoluto, um passeio cândido, florescente. A prospecção pressupõe capacidade de pisar em terrenos instáveis, reconhecer conflitos, compreender escolhas feitas, enfrentar espinhos e, mais do que tudo, aceitar que o que trazemos á tona com nossas pesquisas e estudos são questões e perguntas instiladas pelas sinuosas trajetórias e percursos humanos. Se, como sinalizamos anteriormente, entendemos a História como um investimento que, de algum modo, contem/represa o infinito da 1

Bacharel em Ciências Sociais pela FFLCH/USP, especialização em História Oral pela Universidade de Essex/Inglaterra, Mestre em Psicologia Clínica e Doutora em História Social pela PUC/SP.

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experiência vivida através da urdidura de uma trama encadeada, esta narrativa, não obstante, é acre, jamais será sedosa, aveludada. Lendo-a por este viés indócil, é impossível fazer história com assepsia, utilizando as tais luvas de pelica. O conhecimento histórico é erigido quando o lado “sujo” e inominável das experiências é também abraçado, sem pruridos. Uma instituição com a envergadura do Pólis, que tem em seu favor uma respeitável trajetória de 25 anos de pesquisa e militância em prol da consolidação de cidades justas, democráticas e sustentáveis não se disporia a revisitar sua história senão a partir da perspectiva crítica de enfrentamento dos seus desacertos e entendimento dos acúmulos adquiridos. E, como fazer quando o “narrador” ou “escriba” para o qual foi atribuída a missão de coletar e relacionar os cacos de determinada experiência social revela profundas afinidades com o seu objeto de análise, decorrentes de utopias e valores partilhados? Como manter a necessária distância para que a pesquisa não seja empobrecida pelo excesso de paixão e entusiasmo? Privilegiada por ter sido agraciada em minha trajetória profissional como “ouvidora” e porta-voz de inúmeras experiências históricas de grande relevância, faço minhas ponderações sobre os riscos de uma vinculação passional com o tema. A fidelidade extrema ao objeto ao invés de abrandar o compromisso e embaçar o entendimento sobre as coisas, ela maximiza o rigor na prospecção e seleção das fontes, bem como na sua respectiva interpretação. Como uma instituição consubstanciada pela paixão e compromisso social, do momento mesmo em que o germe foi fecundado, até a jovem maturidade recém-ingressa, rastrear o percurso Pólis significa, necessariamente, roçar intensidades. Da mesma forma que uma trajetória individual pontuada por experimentações e ousadias não cabe em um enredo apaziguado e apático, cujo tom trairia a existência singular ao qual está referenciado, a narrativa sobre os vinte e cinco anos de história de engajamento do Instituto na ampliação dos direitos de cidadania deve buscar o mesmo diapasão que definiu o jeito Pólis de atuar na cena pública, lugar único em relação às demais ONGs com as quais estabelece uma estreita interlocução. Mas quais critérios a adotar para a escolha de um possível fio condutor desta história diante da gigantesca massa documental não sistematizada disponível ao pesquisador em seu Centro de Documentação e Informação/CDI? Como afirma Muniz de Albuquerque 2


Júnior, as marcas e objetos deixados pelo passado não carregam em si mesmos seu sentido, mas devem estar envolvidos em uma trama histórica cuja leitura e interpretação cabe ao historiador propor. Diante desta equação, que balizas factuais deverão compor o traçado desta história, tão grávida de derivadas e ramificações? Lembrando-se que a instituição sob escrutínio – Pólis – teve a constante preocupação em empoderar os atores com os quais estabeleceu um diálogo, estimulando-os a falar, inexoravelmente, em nome próprio, sua história só faz-se legítima se, de fato, engajar seus protagonistas nas escolhas e caminhos percorridos. Para tal, o instrumental metodológico da História Oral, pautado em depoimentos de história oral (de vida ou temáticos), foi de extrema valia e adequação. Os vinte e seis relatos colhidos com profissionais ligados à instituição (fundadores, ex técnicos, técnicos na ativa, ex-presidentes, membros do Conselho) possibilitaram a construção de uma cartografia histórica pontilhada por experiências interpretadas pelos depoentes como sendo emblemáticas para o desenvolvimento da instituição. Amparados por este filtro, pudemos retornar à consulta da documentação textual - relatórios, planos bienais, projetos de pesquisa, anais dos encontros, Fóruns e redes – com mais propriedade e discernimento sobre o grau de importância destes fatos/acontecimentos. O nascimento do Pólis coincide com um momento auspicioso para a história política recente do país, que é o da Assembleia Nacional Constituinte e, na sequência, a promulgação da Constituição Cidadã de 1988. Apesar da agônica crise econômica dos anos 1980, há um fortalecimento progressivo da democracia brasileira expresso pelo nascimento/ crescimento e amadurecimento, nas bases, de organizações associativas, movimentos populares e grupos identitários (mulheres, negros, sociedades indígenas, etc) que vinham, desde a década de 70, lutando pela garantia de seus direitos. Muitas das mobilizações e organizações destes movimentos terão papel decisivo na própria elaboração da Constituição de 1988. Neste contexto promissor de recrudescimento da sociedade civil nasce a idéia de um instituto com a missão e atribuições que o Pólis assumirá. Segundo as palavras galvanizantes de Heloisa Nogueira2, que integrou o grupo de fundadores e dirigiu a instituição em seus primeiros anos:

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Depoimento concedido ao projeto Pólis 25 anos, 14/12/11. Consultora. No Pólis: Sócio-fundadora.

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“A idéia de constituir o Pólis na hipergênese, mas que foi rapidamente abandonada estava pautada pelo desejo de estabelecer um diálogo com o partido. Primeiro, então, tinha uma coisa de militância... e de utopia! Eu lembro direitinho o dia que este grupo estava falando desta possibilidade lá em Paúba. Eu militava no PT, mas era de outro grupo, achava eles, inclusive, para o meu gosto, um pouco á direita. Eu era bem mais á esquerda do que eles. Mas na hora que essa idéia estava começando a ser pensada eu falei ´A, então eu estou nessa´. Eu me lembro bem da minha reação, eu me apaixonei por essa idéia desse tal de Instituto, assim de cara. Então, foi uma coisa de paixão da militância, de paixão da utopia, do processo de democratização do Brasil, 88 que era a Constituinte...Era uma Ong que ia conversar, de fato, com o Estado, uma inovação já que todas as ONGs estavam de costas para o Estado, aliadas aos Movimentos Sociais, lutando contra a ditadura. O Pólis foi uma paixão mesmo... Para mim, o Pólis foi muito importante, pois era uma forma de continuar na militância de uma maneira menos complicada e desprazerosa. Era continuar militando de um jeito muito interessante, criando uma coisa completamente inédita, com gente que eu admirava profundamente e estava no mesmo sonho. Tinha uma conjuntura ali extraordinária que nos unia, tinha uma emoção muito grande e todos os projetos que fomos desenvolvendo tinha essa característica de inovação, do novo... O Pólis era um pouco o começo de tudo.” Além da paixão pelo projeto, comum a todos aqueles que participaram das reuniões de discussão, outro fator favorecedor foi o fato de o grupo mesmo constituir-se como um sujeito coletivo no qual militância política ardente, busca de inovação das práticas políticas, engajamento profundo com os movimentos sociais e compromisso com a universalização dos direitos de cidadania integravam seu repertório. Se à dimensão subjetiva podemos atribuir responsabilidades pelo “sucesso” quase imediato do empreendimento Pólis, há um aspecto objetivo que foi crucial para a consolidação do Instituto como autoridade competente no âmbito do terceiro setor: total clareza de seus objetivos e circunscrição cartesiana de seu campo de atuação. Como relata o sociólogo Silvio Caccia Bava - sócio- fundador, captador de recursos e diretor do Instituto sucessivas vezes - o Pólis foi consolidado por um coletivo híbrido que, nos anos 80 assessorava o PT em seu nascedouro – pessoas ligadas aos movimentos populares, universidade, poder público, educação popular – e que vislumbrava a criação de uma instância ou instituto no interior do Partido onde experiências bem-sucedidas da relação da sociedade civil com os governos locais pudessem ser discutidas e 4


sistematizadas, tornando-as referência para outros gestores locais. A indiferença do PT diante da ideia levou o grupo a buscar um espaço profissional autônomo, já que o que o mobilizava, realmente, era a democratização das políticas públicas contra a exclusão. Segundo Caccia Bava 3: “O grupo começou a aumentar e a gente acabou fazendo as reuniões no Sindicato dos Arquitetos porque não cabia em outro lugar... Aos sábados, fazíamos reuniôes com mais de cem pessoas. Já nesse momento o projeto se tornou plural no sentido político, porque tinha gente de todos os partidos. Aquele entusiasmo, vamos dizer assim, pela redemocratização. A própria discussão, que acabou resultando na criação do Pólis, ela foi bem ampla, nós passamos uns seis meses discutindo. Ainda sem o financiamento da cooperação internacional, era tudo a partir de um trabalho voluntário, sem ter qualquer infra. Era uma coisa de se juntar para pensar juntos... E aí nós vamos fazer um primeiro estatuto que eu acho muito bonito porque ele expressa um idealismo.. Se você for ver lá, o Pólis foi constituído para fortalecer a capacidade autônoma de luta dos trabalhadores. Quer dizer, ele se dispunha a um engajamento político, um forte vínculo com os movimentos sociais enunciado de uma maneira, eu poderia dizer até um pouco naif, né? Mas que expressava aquele momento e tal.” O frisson provocado pela adesão em grande escala, com mais de 100 subscrições no ato de fundação do Instituto Pólis, foi aluído por um fato político insondável, que foi a vitória da candidata Luiza Erundina, nas eleições em 1988, contexto inédito em uma cidade cujo eleitorado era conhecido por seu viés à direita. Os “asseclas” do Instituto vêm-se, naquele momento, diante de um dilema de difícil resolução: a militância no âmbito da sociedade civil ou o ingresso nos quadros do governo. A opção pelo poder local acabou prevalecendo, dadas às possibilidades de intervenção direta na formulação e implementação de políticas públicas. A evasão de quadros imprevista colocou o Pólis, em seu primeiro ano de vida, confrontado com sua primeira grande crise: fechar suas portas em razão da nova conjuntura política favorável ou manter acesa a proposta de uma entidade da sociedade civil dedicada à sistematização de conhecimentos/ formação/ debate público/ monitoramento das experiências, garantindo, não obstante, independência e crítica em 3

Depoimento concedido ao projeto Pólis 25 anos. Diretor e editor-chefe do Le Monde Diplomatique. No Pólis: Sócio-fundador, Diretor e Coordenador-executivo.

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relação à máquina administrativa? A moeda política em prol da manutenção deste espaço autônomo impôs-se e um diminuto grupo (cerca de oito pessoas) tomou para a si a responsabilidade de levar a cabo a empreitada. O primeiro apoio internacional que permitiu um mínimo de infraestrutura de trabalho aluguel de uma sala na Av. São Gabriel, no Itaim - veio da Inter-American Foundation/IAF, seguido pelo aporte de uma agência ecumênica protestante alemã, a EZE (hoje EED), que viabilizou a contratação de uma secretária, a compra de computadores e espaço para a promoção de debates. A profissionalização da equipe, no entanto, aconteceu mais tarde, quando foram angariados maiores apoios das agências de cooperação internacional que, por sua vez, já financiavam outras ONGs brasileiras estruturadas durante o período da ditadura militar, cuja atuação voltava-se para a garantia de direitos de cidadania. A credibilidade que estas organizações gozavam contribuiu, de certo modo, para que a cooperação internacional expressasse “solidariedade” ao projeto Pólis, focado em um nicho particular absolutamente inédito – questões urbanas, relação da sociedade civil com governos, democratização da gestão e estudos e pesquisas sobre participação. É importante destacar que na genealogia das ONGs, o Pólis representa uma segunda leva, embora tenha estabelecido um bom alinhamento com as chamadas ONGs históricas. Seu compromisso com os movimentos sociais não foi selado pela via da assessoria, mas pela participação na formulação das políticas públicas, buscando a construção de propostas alternativas. Embora tenha enfrentado inicialmente certa desconfiança dos movimentos sociais, o Pólis, desde o primeiro momento, deixou claro que era também um ator político, embora não fosse disputar com os demais o protagonismo do campo. A escolha do Pólis foi, desde sempre, fortalecer e empoderar a Sociedade Civil, subsidiando-a através do acesso à informação e do trabalho de formação gerados pelos seus estudos e pesquisas. Esta expertise que vai singularizar o Pólis em relação às demais organizações do chamado terceiro setor foi definida a partir de uma ampla discussão interna e decorrente de certas contingências que caracterizavam o grupo envolvido. A opção em não disputar as mesmas áreas trabalhadas por outras organizações – por exemplo, Educação e Meio Ambiente -, a participação de um grande número de urbanistas, a aposta na afirmação de direitos a partir da legislação e a estreita relação prévia dos fundadores do Pólis com os movimentos sociais, o que lhes legitimava enquanto atores do mesmo campo democrático popular; todos estes fatores, em conjunto, contribuíram para a configuração 6


e perfil que a instituição adquire. Além da retidão de seus objetivos, que faz com que o Pólis seja cioso em relação aos temas e projetos com os quais se engaja, como afirma categoricamente a assistente social Prof. Rosangela Paz, que integrou o corpo técnico do Instituto por muitos anos e se mantêm parceira em diferentes projetos, outro aspecto que franqueou ao Pólis um lócus diferenciado é o investimento na produção de conhecimento, em todos os campos trabalhados, a partir de pesquisas. O Pólis pode arvorar o ineditismo na rara articulação pesquisa e intervenção, particularidade esta que marca e projeta substantivamente o Instituto na cena pública. Reproduzindo um extrato do depoimento da socióloga Anna Luiza Salles Souto4, ex-diretora e técnica da equipe Pólis há vinte anos, tendo integrado o Núcleo de Participação e coordenado a pesquisa sobre Juventude e o Observatório dos Direitos do Cidadão: “O Pólis sempre teve essa questão da pesquisa, sempre uma pesquisa engajada em processos, não é uma pesquisa para ilustração ou para gerar debate na academia ou num pequeno grupo, nunca. Sempre tinha essa preocupação de chegar aos formuladores das políticas. Em um primeiro momento as pesquisas eram mais dirigidas para os formuladores da política do que, efetivamente, para a sociedade civil e com os Movimentos Sociais entra com mais força depois”. O embrião deste longo percurso que o Pólis vai consolidar como produtor de conhecimento (aplicado) foi um estudo sobre experiências inovadoras de gestão nos municípios, financiado pelo CEPAM, fundação com grande knowhow em assessoria municipal. Curiosamente, a publicização de sua expertise se espalha em pouco tempo e ele é convidado a participar, juntamente com um pool de outras instituições reconhecidas, de um empreendimento intitulado Projeto Gestão, financiado pelo Instituto Latinoamericano de Desenvolvimento Econômico e Social/Ildes, que tinha como objetivo aumentar a capacidade da gestão da esquerda. As três análises desenvolvidas com o aporte financeiro da agência foram sobre as experiências democráticas de gestão nas cidades de Lages (SC), Fortaleza (CE) e Icapuí (CE). O esforço de resgatar historicamente as experiências de gestão democrática no Brasil buscava cooperar com a consolidação da memória das lutas populares no país, mas também “evidenciar o surgimento e o desenvolvimento de métodos de planejamento de 4

Depoimento concedido ao projeto Pólis 25 anos, 24/11 e 21/03/12. No Pólis: Diretora (1997-1999); Coordenadora-executiva (2006-2011); Coordenadora do Observatório dos Direitos do Cidadão (20012009); Pesquisadora nos seguintes projetos: Juventude, Participação Cidadã, Controle Social das Políticas, Gestão Municipal, Avaliação das Políticas Públicas.

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políticas públicas, seu alcance e sua repercussão”, como afirma Marco Antonio de Almeida, então membro da equipe do Núcleo de Gestão Municipal Democrática. O Núcleo, financiado integralmente pelo IAF, desenvolveu projetos que obtiveram grande repercussão na mídia e que, de algum modo, contribuíram para a formação dos novos gestores os quais aspiravam desenvolver um modo de governar mais democrático, sustentável e humano. Foram desenvolvidos alguns estudos comparativos – por ex, Santos-Niterói, Fortaleza-Recife – e uma avaliação sobre as políticas públicas em São Paulo, colocando o governo Maluf sob escrutínio tendo como contraponto a gestão da Luiza Erundina. O trabalho foi feito a partir de dois enfoques distintos e complementares: o primeiro, baseado na percepção e opinião do cidadão, obtidas através de uma pesquisa qualitativa realizada nos três primeiros anos de gestão, e, o segundo, através da análise de indicadores sociais. Outra iniciativa de grande repercussão pública levada a cabo pelo Núcleo de Gestão foi à pesquisa “Como reconhecer um bom governo”, estudo sintetizado em um dos números da Revista Pólis. O investimento na divulgação destes diagnósticos, cuja metodologia sofisticada foi elaborada pelo próprio Instituto, a partir de indicadores e índices, pautou-se pelo reconhecimento de que a nova cultura política fecundada no país deveria ser creditada à contribuição das experiências de gestão municipal, lócus privilegiado da gestação de práticas e valores inovadores de governo. A reforma pela qual o Estado é submetido, descentralizando as decisões e negando o segredo burocrático e o discurso da competência técnica, inaugura um novo jeito do poder público estatal relacionar-se com a Sociedade Civil, onde a participação dos cidadãos e de suas representações coletivas é concebida como essencial. Os canais de participação são fundamentais para o incremento do diálogo Governo-Sociedade, e, na mesma medida, a transparência no acesso aos conhecimentos produzidos no âmbito do poder público. Como afirma o economista Prof Ladislau Dowbor, que integra o Conselho do Pólis desde a sua fundação: “Desde as discussões que orientaram a elaboração da constituição de 1988, a idéia de descentralização administrativa, em conjunto com uma maior participação popular, vem sendo defendida como um importante elemento da reforma do Estado no sentido de garantir uma maior eficácia das políticas sociais, aproximando os responsáveis por elas de seus usuários. Nesta direção, mesmo de forma ainda tímida, a Constituição de 1988 promoveu uma certa descentralização de recursos permitindo que forças sociais e políticas emergentes na esfera municipal pudessem 8


desenvolver projetos e práticas administrativas inovadoras. Nesse cenário de maior autonomia, o poder local, em conjunto com a sociedade civil, pode contribuir decisivamente para encontrar saídas para a crise social e a recuperação da qualidade de vida das cidades.” 5 A contribuição do Núcleo de Gestão para o entendimento sobre “o papel das administrações municipais na melhoria de qualidade de vida”, subtítulo da publicação Como reconhecer um bom governo? , foi bastante significativa. O aparato metodológico construído utilizando-se os indicadores e os processos de funcionamento da gestão permitiu análises de governos municipais que prescindiam, inclusive, das visitas in locu. A linha de pesquisa original cresceu e incorporou aos processos de avaliação de governos a opinião/percepção da população, principalmente, através das pesquisas qualitativas de discussão em grupo. As análises quantitativas cruzadas com a opinião da população produziram uma série de estudos de gestão. Este aporte trazido pelo Núcleo conferiu legitimidade ao Pólis no trabalho de consultoria junto aos municípios. Além da publicação que se tornou um marco – Como Reconhecer um bom Governo? – há outro estudo que foi elaborado e que obteve grande repercussão com os pesquisadores na área de gestão pública. Indicadores para o Diálogo foi uma pesquisa que buscou defender o sucesso/avanço das gestões democráticas na lida com a linguagem dos indicadores em nome de pactos e articulações com grupos organizados da sociedade, visando à melhoria da situação dos municípios. O Núcleo de Gestão Municipal ainda avançou em outro flanco que foi a associação da gestão de governos com a chamada gestão financeira. Foram elaborados estudos refinados sobre orçamentos municipais, especialmente, nos municípios que investiam no processo de Orçamento Participativo. Apesar de muitos governos defenderem ardentemente o processo, costumavam não dar transparência para os resultados. As análises procuraram mostrar que o alcance concreto dos chamados processos participativos em orçamento público eram extremamente limitados do ponto de vista do volume de recursos que os municípios acabavam destinando para tal. Havia, portanto, um descasamento entre o discurso participativo e os resultados, em geral, muito fracos. A compreensão de que o participativo no âmbito da gestão transcendia o processo do

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Revista Pólis, “Como Reconhecer um bom Governo?”, p.4, n.21, 1995.

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orçamento participativo foi um saldo importante desta avaliação, permitindo a desmistificação da prática como eficaz per si. O Núcleo de Gestão ainda desenvolveu outros projetos de grande envergadura, mas se dissolveu, de certa forma, em razão do desligamento de certos técnicos e da mudança de perspectiva de análise do Pólis, que, terminando o mandato dos primeiros prefeitos eleitos após a Constituição de 1988, passa a incorporar como seu campo problemático “la gente”, a sociedade e seus movimentos sociais. Segundo o relato do médico e sanitarista Jorge Kayano6: “A gente acabou evoluindo para uma idéia, e eu fui responsável também, parcialmente, para uma área que a gente chamava de ´desenvolvimento local´. Essa idéia da gestão municipal foi evoluindo para um olhar mais amplo dos municípios, pensando o binômio ´governo e sociedade´. A ideia de ´desenvolvimento local´, contempla melhor essa nossa abordagem de que o nosso problema não é apenas o governo, mas sim a sua capacidade de interação com a realidade local e com a sociedade” Embora o tema do desenvolvimento local tenha estado sempre no escopo de preocupação do Pólis, atravessando vários de seus projetos, durante um período, constituiu-se como uma área específica, reconhecida externamente pelo acúmulo gerado através de seus conteúdos e produtos. Algumas pesquisas de grande repercussão foram viabilizadas neste contexto em torno da questão da mobilização da sociedade civil na busca de soluções locais para seus problemas e a incidência sobre as políticas públicas – “Aspectos Econômicos do Desenvolvimento Local” (financiada pela Fundação Friedrich Ebert), “Novos Contornos da Gestão Local”, “Novos Paradigmas de Produção e Consumo” (financiada pela Oxfam/Novib). No momento em que um novo quadro político começa a se configurar são criados inúmeros espaços de participação nos quais o Pólis desempenha grande protagonismo, comprometendo-se, a partir de então, de forma irrevogável, com a sociedade civil e suas demandas de participação na arena pública. A substantiva expertise adquirida com as análises das experiências de administração pública, as quais produziram as tais “inversões de prioridades”, favorecendo a inclusão 6

Depoimento concedido ao projeto Pólis 25 anos, 23/12/11. No Pólis: Presidente (1999-2001), Diretor (2005-2009), GT Indicadores da Plataforma Novib (2000-2003), Coordenador da Red de Educación Popular y Poder Local/REPPOL (2007).

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de parcelas da população excluídas, foi sendo sistematizada pelo Pólis na forma de fichamentos intitulados “Experiências Inovadoras de Gestão Municipal”. O compromisso em dar extroversão ao conhecimento gerado pelas suas pesquisas esteve sempre presente no escopo das atribuições mestras do Instituto. A realização plena desta sua premissa aconteceu quando o Pólis, em parceria com a Fundação Friedrich Ebert, cria um boletim mensal de divulgação de idéias – propostas e experiências bem sucedidas em termos de políticas públicas – visando à capacitação de prefeitos, vereadores e lideranças municipais. Em 1993, nasce o Boletim DICAS – Idéias para a ação municipal que, desde o início, aposta na simplicidade e didatismo na veiculação das experiências consideradas exitosas no âmbito da gestão municipal. A acolhida entusiasta que recebe surpreende e supera as expectativas iniciais e o Boletim passa a ser um instrumental utilizado para os mais diversos fins: capacitação dos funcionários públicos, elaboração de propostas de lei, municiamento de diversas organizações da sociedade civil com vistas à proposição de políticas alternativas, etc. Os primeiros anos do Boletim DICAS, todavia, não parecem ser um prelúdio do sucesso que ele irá alçar por volta do ano 2000, quando a iniciativa atinge o ápice de seu reconhecimento, tendo o apoio do BNDES para a compilação de 125 experiências bem sucedidas de gestão pública, com tiragem de 25.000 exemplares. A elaboração dos primeiros números foi relativamente simples, dada a facilidade de entrada que o Pólis tinha com as prefeituras progressistas, àquelas que apostavam, justamente, na linha da “inversão de prioridades”. Grande parte das informações era encaminhada pelo telefone, diante da inexistência da internet e, em alguns casos, faziase necessário uma espécie de radiografia in locu. Às vezes, alguns aspectos difusos da gestão eram justificados por especialistas chamados a dar seus pareceres técnicos. A pauta era elaborada anualmente e buscava-se contemplar as diversas áreas de atuação do Pólis, equilibrando, no entanto os quatro temas da gestão local: desenvolvimento social, desenvolvimento urbano, ação administrativa e relação governo-sociedade. A periodicidade do Boletim, durante vários anos, foi quinzenal, o que implicava nada mais nada menos do que o levantamento, sistematização (a grande dificuldade apontada por seus técnicos era a simplificação dos textos, sem vulgarizá-los, ou, o contrário, a sua complementação sem sofisticar em excesso) e divulgação de 24 iniciativas inovadoras e exitosas em termos de gestão pública.

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Há um fato exógeno ao cotidiano do Pólis e que acaba se revertendo em benefício da instituição, que foi a criação do Programa Gestão Pública e Cidadania, em 1996, pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, numa iniciativa com a Fundação Ford. A meta do Programa era premiar e divulgar amplamente experiências inovadoras em gestão pública local, que existissem há mais de um ano e que promovessem um impacto direto na construção da cidadania. A seleção era feita por um Comitê Técnico com representantes de diversas instituições, incluindo o próprio Instituto Pólis. Este enorme “banco de dados” facilitou o rastreamento das iniciativas e o Boletim passou a contar com um manancial de experiências que retroalimentavam a produção de seus volumes. O diálogo estreito com o Programa da FGV acrescido ao apoio do BNDES para a elaboração do exemplar 125 DICAS, no ano de 2000, foi o aspecto que chancelou e solidificou definitivamente a iniciativa que, dentre seus vários legados, permitiu o diálogo mais estreito dos movimentos com a gestão pública, flexibilizando o antagonismo existente entre as demandas da militância e a falta de porosidade da administração pública diante dos clamores sociais. Segundo a jornalista Veronika Paulics7: “Esse projeto do BNDES deu muita visibilidade para o Pólis, principalmente, porque o Boletim vinha com o carimbo do Banco, isso fazia com que os prefeitos dessem atenção especial a ele. Aí nós fomos chegando a algumas conclusões. Primeiro, descobrimos que vários prefeitos, que não eram do campo político partidário da esquerda brasileira, muitas vezes, nem abriam o que nós mandávamos, porque o Pólis ou não existia ou era identificado com os outros, “não nós”. O carimbo do BNDES sempre significou dinheiro para a prefeitura, todos os prefeitos abriram esses envelopes e nenhum foi parar na mesa do assessor do assessor. O livro era gordo e podia ser interpretado do ponto de vista dos prefeitos como proposta de verba. Então, deu-se mais atenção ao DICAS nas prefeituras e nós ganhamos uma visibilidade enorme. No fim, o DICAS foi impresso, foram feitas as três edições, chegou em 25.000 exemplares impressos. Eu brinco sempre que é o best seller das políticas públicas.” 7

Depoimento concedido ao projeto Pólis 25 anos, 15/12/11. Jornalista. No Pólis: Integrante da equipe do Boletim DICAS - revisão e adequação de linguagem dos textos (1994-1998), Coordenação do DICAS (1998-2001), Diretora (2001-2003) e, desde 2009, ao afastar-se do corpo técnico da instituição, está filiada como sócia.

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Deste momento em diante, o DICAS logra pleno reconhecimento e, com o apoio do BID, desenvolve um projeto sobre a replicabilidade das experiências, ou seja, como e o que fazem as pessoas quando tomam conhecimento de iniciativas que devem lhe servir de baliza para sua ação. Este contexto profícuo no início dos anos 2000 outorga ao Pólis credibilidade no âmbito nacional e internacional. Duas das publicações sobre a questão da gestão democrática – 125 DICAS (2000) e Novos Contornos da Gestão Local (2002) – passam a ser amplamente utilizadas pelos cursos de Administração Pública, configurando-se quase como bibliografia obrigatória. O comprometimento visceral do Pólis com a qualificação e fortalecimento da sociedade civil foi determinante para a distenção do chamado monopólio das políticas públicas por parte do Estado. A construção de uma esfera pública includente, a partir da absorção de diferentes atores que se reconhecem mutuamente, é a centelha que se manteve acesa ao longo de todo o processo de consolidação da instituição. Este seu engajamento é cimentado de forma indelével a partir da sua filiação às inúmeras redes temáticas nacionais, que já vinham se estruturando da segunda metade dos anos 80 até a primeira dos 90, tais como: Fórum Nacional de Reforma Urbana, Fórum Nacional de Participação Popular, Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional, Fórum de Lixo e Cidadania, Fórum Intermunicipal de Cultura, Central dos Movimentos Populares. Apesar de o Pólis não reivindicar créditos como o fundador/cunhador de das tais redes, o Instituto desempenhou indiscutível liderança, mantendo-se anos a fio na coordenação desses fóruns. O tema da Participação foi cotejado no Pólis por uma área intitulada Participação Cidadã, cujo arco de ação e intervenção contemplou uma miríade distinta de pesquisas: os impactos sociais do Orçamento Participativo, experiências de participação no Estado de São Paulo e no âmbito federal, avaliação sobre os Conselhos Municipais, elaboração do boletim Repente (veículo que buscava contribuir na formação de participantes de Conselhos e pessoas engajadas com o fortalecimento de espaços participativos e de exercício da cidadania ativa), estudos sobre a participação das subprefeituras da cidade de São Paulo, entre tantos outros desenvolvidos em parceria com instituições de indiscutível renome como CEBRAP, IBASE, INESC, Transparência.

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O Núcleo Participação Cidadã teve também atuação destacada na secretaria executiva de dois fóruns importantes – Fórum Paulista de Participação Popular (basicamente de prefeituras) e o Fórum Nacional de Participação (basicamente de ONGs). A característica do Fórum Nacional era promover eventos de grande visibilidade que permitissem o aprofundamento da discussão sobre o tema. O primeiro levantamento sobre Orçamento Participativo no Brasil foi feito, justamente, pelo Fórum a partir dos resultados obtidos no evento Fórum Nacional sobre Orçamento Participativo, realizado em São Luis do Maranhão, em 2003, com a presença de mais de 1000 pessoas. Em 2004, outro marco importante da atuação do Fórum Nacional foi à avaliação da participação no âmbito federal, que gerou, posteriormente, a publicação Os Sentidos da Democracia e da Participação (Publicações Pólis, n. 47). A plataforma da Reforma Política, que ensejava a expressão de todas estas organizações com suas respectivas pautas e reivindicações, foi lançada logo após a organização destes grandes encontros. Buscando não incorrer em proselitismos, o Núcleo de Participação analisou alguns canais de participação consagrados, tentando compreender os entraves que obstruíam uma participação mais plena e eficaz. Apesar da questão da participação não ter sido uma prerrogativa da área, já que todas as demais, sem exceção, no Pólis sempre envolveram os atores que se posicionavam na ponta das políticas, a idéia de constituir um núcleo específico foi para se pensar em estratégias mais amplas de atuação. O diferencial dos estudos desenvolvidos pelo Núcleo residiu, justamente, no seu caráter propositivo: apontava as feridas, mas também sinalizava para onde as questões poderiam ser pensadas. A avaliação de canais de participação do tipo Conselhos e Ouvidorias, ou, em outros termos, o que o diálogo Sociedade Civil/Estado deflagra para que as pessoas sintam-se, de fato, “empoderadas” pode ser considerada a contribuição do Pólis para a plataforma da Reforma Política estruturada em cinco eixos distintos. O reconhecimento público do Pólis como organização da sociedade civil brasileira foi granjeado, em grande parte, pela sua capacidade em identificar e mobilizar atores para o diálogo; antecipar e enunciar questões que posteriormente entrariam, de fato, na agenda pública e, por último, arquitetar estratégias políticas com vistas à exigibilidade de direitos de cidadania. A participação propelente do Instituto na criação de novas esferas públicas orientadas para intervir nas políticas e na gestão pública contribuiu para o ardiloso processo de democratização do Estado brasileiro, marcado pelo padrão centralizador, autoritário e excludente. 14


No âmbito endógeno, um aspecto que, de certo modo, imanta a atuação dos diversos campos embrenhados pelo Pólis é a afirmação de direitos a partir da legislação, ou seja, a pregnância conferida à consolidação de marcos regulatórios. Embora este objetivo fique mais evidente no caso do Núcleo de Direito à Cidade do Instituto, cuja militância é reconhecida amplamente desde o início nos Comitês Populares Pró-Constituinte até a aprovação do Estatuto da Cidade, em 2001, as outras áreas – Segurança Alimentar, Resíduos Sólidos, Cultura – também se orientaram por esta premissa. E a despeito de uma relativa autonomia e independência entre os diferentes campos de pesquisa/ação que consubstanciam o Pólis, jocosamente definido por seus próprios quadros como uma “federação de projetos”, é possível identificar um aspecto de seu largo alicerce que serve de pilar para as suas múltiplas janelas: o valor atribuído às instituições democráticas na contenção e minimização da lógica excludente que fundamenta o sistema capitalista. Segundo o arquiteto Renato Cymbalista8: Há uma maneira de compreensão do mundo, marxista, que é a idéia de que as lógicas próprias do sistema capitalista produzem excluídos, que a sociedade tem os seus dominantes e os dominados. Todos compartilham dessa ideia no Pólis, ninguém acredita que o mundo, por meio das suas próprias técnicas e de suas próprias forças vai melhorar sozinho. Há a compreensão que são necessárias intervenções nesse funcionamento. Do ponto de vista das intervenções necessárias para corrigir ou dar limites a esses processos, algo que une o pensamento de todos que trabalham no Polis é a ideia de que as abordagens para isso não são as revolucionárias, e sim a transformação progressiva das instituições e práticas. O Pólis é uma instituição que acredita em instituições. Todos no Pólis acreditam que os espaços participativos são importantes, que os espaços conquistados, por mais problemas que tenham, devem ser ocupados. O Polis é uma instituição que acredita que o Estado é importante, e que o Estado está sempre em disputa. - a não ser em casos extremos como os Governos tipo Maluf em São Paulo. A atuação de atores sociais específicos, principalmente uma atuação coletiva, significa uma possibilidade de reorientar o Estado para cá ou para lá, fazendo com que as pessoas mais desfavorecidas consigam disputar melhor as condições do bolo de riqueza social. 8

Depoimento concedido ao projeto Pólis 25 anos, 01/11/11. Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo/FAU-USP. Atuação no Pólis: Técnico da área de Urbanismo (1996-2003), Coordenador da área (2003-2008), Coordenador editorial (2000-2004).

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Essa é uma luta que é permanente e o Pólis sabe muito bem de que lado ele está dessa luta, que é o lado daqueles que estão em desvantagem nas correlações de forças do sistema. Sempre vão existir espaços e instancias de luta para fazer isso, ainda que esses espaços mudem permanentemente. A melhor expressão da militância pela via da institucionalidade que outorga ao Pólis um lugar bastante destacado na arena pública é, sem dúvida, o longo processo de luta jurídica que resultou na aprovação do Estatuto da Cidade, em 2001. Considerado como um dos mais importantes instrumentos para a exigibilidade de direitos no âmbito da política urbana, a sua tramitação e aprovação foi fruto de uma construção coletiva de cidadania ativa a qual envolveu uma multiplicidade de atores distintos. A articulação do Pólis no sentido de reclamar uma ação mais incisiva do Estado enquanto regulador dos enormes conflitos sociais engendrados pela agônica realidade excludente das cidades brasileiras, acirradas pela crise dos anos 80, encontrou amplo eco na sociedade, que começava a acordar da sua letargia cívica vivida nos anos de chumbo da ditadura militar. O Pólis integra uma ampla coalizão denominada Movimento Nacional pela Reforma Urbana que, posteriormente, foi renomeado de Fórum Nacional pela Reforma Urbana. Este coletivo agregava ONGs comprometidas com a democratização das políticas sociais (Inesc, Ibase, entre outras), organizações regionais (Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Dom Helder, Bento Rubião), os vários movimentos de luta por moradia capilarizados em algumas regiões do país (União Nacional dos Movimentos de Moradia/UNMM, Movimento Nacional de Luta por Moradia/MNLM, Confederação Nacional de Associação de Moradores/CONAM), representantes de setores profissionais (arquitetos, engenheiros e geógrafos e suas entidades representativas), organizações dos trabalhadores (Federação dos Funcionários a Caixa/FENAE, Federação dos Urbanitários ligada à CUT), técnicos do poder público, acadêmicos, pesquisadores e institutos de pesquisa (Associação Nacional de Planejamento Urbano/ANPUR). Essa discussão ocorreu, principalmente, nas capitais das grandes cidades e a primeira grande conquista do movimento foi à inclusão de um capítulo de Política Urbana na Constituição de 88 por emenda popular, cuja natureza consiste no reconhecimento da centralidade das questões urbanas como objeto de interesse nacional. Ao alçar os municípios à categoria de ente federativo, a Constituição cidadã de 1988, transfere a eles parte da responsabilidade pela promoção de políticas

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habitacionais e urbanas, estimulando a invenção de soluções locais para problemas de difícil equacionamento pela política na esfera federativa. A luta pela reforma urbana travada ao longo de toda década de 90 pela sociedade civil, mas também por gestores públicos e parlamentares que haviam participado anteriormente do movimento e , em caráter experimental, tentavam aplicar aspectos desta plataforma – gestões participativas, Planos Diretores – cria o caldo favorável para o processo em curso no Congresso Nacional, que culmina com o sancionamento da lei 10.257/01 que aprova o Estatuto da Cidade. Os dois principais articuladores políticos responsáveis por esta aprovação foram o Instituto Pólis e a Fase9. O Pólis manteve-se por um longo período na coordenação do Fórum de Reforma Urbana através do seu Núcleo de Direito à Cidade, contribuindo com a formulação das legislações para a implementação destas políticas. A estratégia de atuação da área foi fundamentalmente no sentido de advocacy e produção de subsídios para as políticas públicas. Ao participar como um de seus atores protagonistas do debate e luta política que cimenta valores os quais à sociedade brasileira se mostrava refratária – função social da cidade e da propriedade, gestão democrática da cidade, direito à cidade e à cidadania – o Pólis adquire reconhecimento nacional e as suas áreas de Direito à Cidade e Urbanismo passam a ser amplamente procuradas pelas prefeituras, movimentos sociais, técnicos e academia, em busca de melhor instrumentalização do dispositivo do Estatuto da Cidade. Todas as idéias que o Instituto propugnava como bandeiras de luta, tais como democratização das cidades, planejamento participativo, regularização fundiária, regulação do uso e ocupação do território, ganham estatuto de lei federal. Neste momento em que os holofotes estão dirigidos para a aplicabilidade do Estatuto da Cidade, a Caixa Econômica Federal encomenda ao Pólis a elaboração de um material didático cujo objetivo era traduzir ampla e irrestritamente o novo marco legal. A Caixa Econômica Federal em parceria com o Congresso Nacional subsidia as duas edições de 15.000 exemplares cada, os quais serão distribuídos para todos os municípios e ONGs existentes no território nacional. O chamado “guia laranja” foi o primeiro esforço de interpretação seguido, então, pelo Kit das Cidades, tido como a mais bem azeitada 9

FASE – Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional. Fundada em 1961 pelo sacerdote católico Padre Leising, a instituição, constituída no formato “nacional-internacional”, será batizada em meados dos anos 80 como uma ONG voltada para a educação extra escolar popular. Desenvolvendo projetos de forma independente das dioceses, suas iniciativas não eram pautadas pela tônica assistencialista e paternalista.

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estratégia de disseminação e capacitação do Estatuto da Cidade. Como a soma de várias iniciativas, o Kit era apresentado em uma caixa na qual constavam: um guia (material tecnicamente denso elaborado pela equipe de advogados do Pólis, que explicava, passo a passo, as implicações urbanísticas e jurídicas, destinado a técnicos já com formação para se apropriar dessa nova ferramenta) uma cartilha, um vídeo, vinhetas de rádio gravadas, um CD, um CD ROM mais técnico, um jogo (espécie de RPG). Apoiado em vários tipos de linguagem – popular e não popular – o Kit teve uma repercussão estrondosa e foram feitas duas tiragens de mais de 1.500 cada para atender à crescente demanda em curso. Com o financiamento do Lincoln Institute of Land Policy, o Núcleo de Urbanismo do Instituto ainda promoveu a formação de multiplicadores escolhidos cuidadosamente em todo o país de modo a replicarem seus conhecimentos. Considerada como uma das fases mais auspiciosas, o Pólis, a partir de 2002, passa a receber inúmeras demandas de assessorias para a formulação ou revisão de Planos Diretores à luz do Estatuto da Cidade, palestras, participação em seminários, cursos e oficinas de capacitação. A idéia dessas assessorias era desenvolver junto aos governos locais experiências de planejamento participativo e inclusão nos planos diretores dos instrumentos de política urbana inovadores, os quais pressupunham a democratização do acesso a terra urbana por famílias de baixa renda. A exposição e visibilidade do Pólis conquistadas nesta primeira metade dos anos 2000 em razão do novo marco jurídico representado pelo Estatuto da Cidade coincidem com outro fato de grande relevância a nível institucional, que foi decisão de mudar a sua sede, anteriormente no bairro de Pinheiros, para o Centro da cidade de São Paulo, investindo para tal na compra de um imóvel próprio. Para arquiteta e urbanista Raquel Rolnik10, a vinda para o Centro foi uma espécie de culminação do projeto Pólis, fortalecendo sua interação e diálogo junto aos movimentos sociais, os quais passaram a ter maior facilidade de acesso, bem como a possibilidade de ocupar livremente o novo espaço. Segundo ela: “Uma das teses mais importantes que defendíamos no âmbito do Direito à Cidade era a questão das áreas vazias, subutilizadas e infra-estruturadas, que deveriam ser ocupadas e ocupadas por todo tipo de pessoas, por todo tipo de ação. Tínhamos uma militância, 10

Depoimento concedido ao projeto Pólis 25 anos, 01/12/11. Professora da FAUUSP e relatora especial para o Direito à Morada do Conselho de Direitos Humanos da ONU. No Pólis: Coordenadora de Urbanismo (1997-2002).

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uma advocacy mesmo pela volta ao Centro, saindo do vetor Sudoeste, que era o Itaim, Pinheiros onde os serviços e o comércio de classe média se instalaram. A idéia era voltar para o Centro num espaço compartilhado por todo tipo de pessoas. Houve um debate muito forte dentro do Pólis sobre as implicações dessa mudança e muitas pessoas resistiram. Foi um debate político e venceu a opção pelo Centro. Fomos procurar o prédio, as características que queríamos que ele tivesse. Esse processo para o Pólis foi também importante do ponto de vista político. Ele acabou sendo uma das primeiras instituições que voltou para o Centro, saindo do vetor Sudoeste. Ao voltar para o Centro, ele afirma que é isso, justamente, que tínhamos que fazer. Muitas outras instituições, depois disso, acabaram indo também. A Ação Educativa se instalou ali muito perto e outras como as assessorias jurídicas e a assessoria a morador de cortiço, que sempre se mantiveram por ali. Essa decisão de ir para o Centro foi muito importante e representou um salto, em minha opinião, na consolidação do Pólis. Logo depois, ele estourou, ampliou.” A porosidade do Pólis às novas pautas, aos novos sujeitos em cena, às redes em ebulição também fica evidente ao cotejarmos a trajetória da sua área de Cultura que, apesar de não ter sido uma aposta inicial da instituição, vai ganhando sólido arcabouço e enorme reconhecimento externo já nos seus primeiros anos de atividade. Com sensibilidade fina, no início da década de 90, o Pólis alinha-se a uma visão abrangente de cultura que, naquele contexto, tinha abrigo restrito em poucos grupos. Para além da concepção mainstream que reduz o campo da cultura à dimensão da produção artística, o conceito que avalizou a atuação/intervenção do setor foi à cultura entendida na sua dimensão antropológica, ou seja, os significados e valores engendrados pelos sujeitos na produção de seu cotidiano, inserindo aí a especificidade dos fazeres e saberes cotidianos na cidade. A vocação catalizadora do Pólis no sentido de dar continência às muitas vozes e expressões capilarizadas está sintetizada com bastante propriedade no depoimento do jornalista Altair Moreira11: “Na época, a esquerda tinha seu inimigo principal, a ditadura. O Pólis era uma entidade aberta, curiosa, circulava muitas idéias. Era um espaço que as pessoas se identificavam. Acho que o espaço Pólis transmitia a nós o que queríamos que o Brasil fosse. Ele era muito vivo, acolhedor e transparente. Tanto é assim que tudo que eu fiz para e com o 11

Depoimento concedido ao projeto Pólis 25 anos, 16/12/11. No Pólis: Consultor em Cultura.

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Pólis era por acreditar nas suas convicções por um mundo melhor. A convergência de idéias era o lugar de todos nós.” A mola propulsora para o desenvolvimento da área de Cultura do Pólis foi o projeto “Cidadania Cultural” idealizado pela filósofa Marilena Chauí quando esteve à frente da Secretaria Municipal de Cultura, de 1989-1992. O lócus da cultura como essencial para o exercício da cidadania e a cultura como direito básico inalienável, que avalizavam a elaboração desta política pública, vinham ao encontro das aspirações da área de Cultura do Pólis por uma mudança de paradigma de leitura do conceito. As discussões e inquietações geradas por este novo jeito de pensar a cultura no nível da gestão pública, experimentado nas cidades de São Paulo, Santo André, Porto Alegre, São Bernardo do Campo, Belo Horizonte encontraram pleno abrigo no Pólis por meio da edição de revistas reflexivas e dos inúmeros seminários, debates e colóquios realizados. È importante destacar o profundo comprometimento do Núcleo de Cultura com a difusão do conhecimento gerado nos projetos e nas pontas da sociedade através de uma reflexão textual. Em razão disso, explica-se o grande volume de publicações editadas pela área, entre elas os volumes “Cidadania Cultural” e “O Modo Petista de Governar”, que serviram como canais de aprofundamento das primeiras experiências das gestões democráticas da cultura, explicitando as angústias e, por outro lado, as criativas soluções encontradas pelos gestores ao trabalhar a dimensão cultural a partir de uma nova perspectiva. A inquietude que marca os trabalhos na área de Cultura fica também evidente pela capacidade visionária em elaborar conceitos inéditos, que só posteriormente vão, de fato, reverberar na sociedade, como por exemplo, “projeto cultural para o governo sustentável” (não se falava ainda em sustentabilidade, em governo sustentável e muito menos na ligação entre a cultura e sustentabilidade) e “políticas públicas de cultura”. Há mais uma dimensão da área que merece destaque, que é sua capacidade articuladora. Antes mesmo da popularização do que é conhecida, hoje, como gestão em rede, em 1995, o Pólis convocou gestores públicos, dirigentes culturais e a sociedade de maneira extensiva para que constituíssem um fórum de discussão sobre questões ligadas á cultura, ao desenvolvimento local e à criação artística. Desta forma é que surge o Fórum Intermunicipal de Cultura/FIC, espaço de valorização de identidades culturais locais e de afirmação deste paradigma pluralista de cultura que vinha se buscando nas gestões 20


democráticas. O primeiro FIC, realizado em parceria com a Secretaria de Cultura de Belo Horizonte teve como tema transcendente a questão do desenvolvimento humano. Este encontro intitulado “Cultura, Políticas Públicas e Desenvolvimento Humano”, que reuniu mais de 900 pessoas, recebeu representantes de 26 estados e contou com a participação em suas mesas de nomes de grande representatividade social como as do Prof. Aziz Ab Saber e da senadora Marina Silva, teve total protagonismo do Pólis. Durante seus anos em atividade, o FIC foi muito importante para a afirmação das políticas locais de cultura e para o intercâmbio de experiências entre as comunidades locais e a nacional. No final dos anos 90, a área engaja-se com articulações internacionais e se envolve com a “Aliança por um mundo solidário”. Em 1997 há o grande encontro da Aliança no Sesc, em Bertioga, com a presença de 62 países, coordenado e secretariado pelo Pólis. Daí surge a ideia de uma articulação da cultura com uma rede de artistas e é lançado um encontro chamado “Desenvolver-se com Arte”, reunindo várias iniciativas bemsucedidas espalhadas pelo país que investiam nesta articulação específica. Essas experiências ainda não haviam sido sistematizadas e a publicação “Desenvolver-se com Arte”, editada pelo Pólis, acabou cunhando uma correlação entre desenvolvimento e arte, conexão esta que o Núcleo de Cultura acabou disseminando nas redes. É criado o “Fórum Eletrônico de Arte e Cultura”, cujo objetivo era debater o papel social da arte, a questão da globalização e a discussão sobre o local. O encontro mundial que aconteceu em Itapecerica da Serra, em 2001, gerou um documento intitulado “Carta de Responsabilidades do Artista” e como corolário foi criada a Rede de Artistas. Este é o momento que, justamente, o debate da cultura tende a retroceder em termos filosóficos-conceituais em razão do prestígio que as leis de incentivo passam a gozar. Colocando-se como espaço de trincheira contra às ideias correntes sintetizadas nos slogans “cultura dá dinheiro” e “cultura como um bom negócio”, o Pólis reafirma sua perspectiva inexpugnável de cultura como construção de cidadania, que depois será abraçada pela gestão do Ministro Gilberto Gil, pautada em seus primeiros anos, em grande medida, pela plataforma política elaborada pelo Instituto. Com a multiplicação de atores que passam a protagonizar o campo é criado o Laboratório de Desenvolvimento Cultural – São Paulo e Itapecerica da Serra - do Fórum Intermunicipal de Cultura, que tinha o objetivo de trazer novas idéias, ser um espaço de 21


socialização das dinâmicas culturais e lugar de reflexão sobre políticas públicas de cultura. O primeiro foco do Laboratório de São Paulo foi à discussão sobre democracia participativa. Ali foi deflagrada uma ampla discussão sobre a retomada do Conselho de Cultura da cidade e coube ao Pólis liderar esta articulação. Pelo Laboratório foram desenvolvidos os seguintes projetos: o Cineclube Pólis, que traz, para dentro do espaço do Instituto, jovens de 19/20 anos oriundos dos bairros que não costumavam circular pela área central; a publicação da Revista Pólis “Você quer um bom Conselho?”, que se tornou uma referência sobre a discussão dos Conselhos de Cultura, ao realizar um balanço sobre seus impasses, desafios e lugar ocupado na cidade e a elaboração do livro Jovens da Cidade Tiradentes: De onde ecoam suas vozes sobre a condição de vida e dos direitos dos jovens da Cidade Tiradentes produzido através de uma longa pesquisa qualitativa pautada no método de ausculta sociocultural, em parceria com o Centro Cultural da Espanha. Vale destacar a atuação expressiva da área de Cultura do Pólis em duas articulações distintas: nos tres Fóruns Sociais Mundiais, inoculando em território até então virgem a discussão sobre gestão da cultura, arte e cultura, papel da cultura no desenvolvimento local e também a participação na discussão em torno da cultura de paz, na criação do Conselho Municipal de Cultura de Paz e na criação de um Pontão de Convivência de Cultura de Paz, que, dentro do Programa Cultura Viva, é um ponto articulador de pontos cuja missão é produzir ideias e formar as pessoas para os novos cenários da cidade, partindo da premissa que a “Cultura de Paz” não é anulação do conflito, mas formas, métodos e posturas de se lidar com o dissenso. Com trajetória semelhante à área de Cultura que se embrenha em um campo embrionário, antecipando pautas que só se tornariam correntes pelo menos uma década depois, as pesquisas e a advocacy investidas pela área de Segurança Alimentar também podem reivindicar estes louros. O trabalho de Segurança Alimentar no Pólis tem início na esteira da questão mobilizadora na agenda pública daquele momento, que era o combate à fome ensejada pela Campanha da Ação da Cidadania, oriunda do Movimento pela Ética na Política. O engajamento do Pólis no combate à fome e desnutrição, se faz através da introdução da metodologia de aproveitamento integral dos alimentos desenvolvida pela Pastoral da 22


Criança, vertida para uma escala mais ampla de política pública. As atividades da área pautaram-se, desde o início, pelo trabalho de conscientização em relação aos processos ligados aos alimentos e à opção pela qualidade como uma atitude e não como uma questão de acesso ou renda. O reconhecimento da gestão local como a instância político- administrativa mais eficaz no sentido de equacionar problemas a partir de soluções inovadoras, justifica a realização de assessorias em programas municipais. Os primeiros projetos desenvolvidos pelo núcleo de Segurança Alimentar teve como prerrogativa do financiador – Comitê Catholique contre la faim et pour le developement/CCFD a realização de um estudo/intervenção no norte do país e, em vista às afinidades políticas do Pólis com a gestão petista de Jorge Viana, o projeto piloto foi implantado em Rio Branco/Acre. As dificuldades de gerenciamento à distância e as diferenças de paradigmas culturais com os parceiros locais - técnicos, pesquisadores e agricultores foram adversidades as quais o projeto teve que habilmente driblar. Não chegaram, todavia, a comprometer o trabalho de sensibilização da comunidade por alternativas alimentares regionais e reaproveitamento integral dos produtos locais, vislumbrando uma alimentação rica, equilibrada e nutritiva. Tendo tido participação destacada na Cúpula Mundial de Alimentação, em Roma, em 1996, e, não obstante, insatisfeito com os resultados obtidos, o Pólis, juntamente com outros atores da sociedade civil, mobilizou-se em torno da formação de um fórum de debate político sobre a questão do direito humano à alimentação adequada, que se efetivou, em 1998, com o Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional. Atinente às premissas do Pólis em produzir conhecimento através de suas pesquisas e divulgá-las por meio de suas publicações, a área de Segurança Alimentar investiu na edição de alguns números da Revista Pólis que se tornaram referências importantes para o debate – “Alternativas contra a Fome” (edição especial, 1994), “Diretrizes para uma Política Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional” (n.38, 2001) “Segurança Alimentar e Inclusão Social – A escola na promoção da saúde infantil” (n.42, 2002). No final da década de 90, a área ganha considerável respeitabilidade e as assessorias às prefeituras na formulação de políticas públicas de saúde alimentar multiplicam-se. A 23


preocupação em difundir a visão abrangente que caracteriza o jeito brasileiro de abordar o tema – que contempla o acesso a terra, a maneira como o alimento é produzido e o momento que ele é consumido – balizaram a ação do núcleo de SAN do Pólis. Neste contexto mais promissor, são feitas diversas ações nas esferas dos governos estaduais, municipais e organizações da sociedade civil e o debate, antes circunscrito, alça espaços nos quais ainda não havia penetrado: entidades sindicais, movimentos populares e universidade. A vitória do Lula em 2003 é, sem dúvida, o ponto de inflexão da luta, já que o tema da alimentação ganha uma centralidade indiscutível na agenda pública. A erradicação da fome passa a ser prioridade absoluta do governo e o programa Fome Zero, mundialmente reconhecido, cimenta as bases para a construção de uma Política Nacional de Segurança Alimentar. Das múltiplas frentes investidas pela área de Segurança Alimentar – pesquisa/formação, assessoria a governos municipais e participação no debate público – a sobressalente militância da área pode, sem dúvida, arrogar o título de protagonista na criação e gestão de várias instâncias de mobilização, como os diversos fóruns e conselhos existentes: Fórum Global de Segurança Alimentar (1996), Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional (1998), Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional/CONSEA (1993), Conselho Municipal de SAN/COMUSAN, Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar/FBSSAN. A participação no fortalecimento dos fóruns, a atuação contínua no CONSEA (2003-2011), assim como o empoderamento das lideranças sociais, através do trabalho de formação, permitindo uma participação mais qualificada nas arenas de negociações com o poder público são algumas, dentre várias, conquistas mensuráveis da atuação diligente do setor. No âmbito da pesquisa/formação, não há como não destacar o projeto piloto implantado pelo Pólis em parceria com o Programa Mercosul, na sub-prefeitura do Butantâ (SP), intitulado Centro de Referência Local em SAN, que, de certo modo, reafirma o compromisso atávico do Instituto com trabalhos locais, entendendo o sentido do local como termômetro em termos da agenda política do momento e como ponte para uma perspectiva mais ampla que tenha efeito irradiador para outras cidades. Em termos de produção de conhecimento agregado à difusão ampla e irrestrita, premissas da intervenção do Pólis na arena pública, vale ainda destacar a radiografia minuciosa das 24


demandas de segurança alimentar de municípios da região do semi-árido brasileiro que serviu, posteriormente, de subsídio para a consolidação de políticas públicas para a área, capacitando inclusive à ação dos Consea´s locais no combate e erradicação da fome no nordeste brasileiro; a difusão de um banco de iniciativas de segurança alimentar e nutricional promovido por prefeituras e entidades sociais e disponibilizadas no site www.fomezero.org.br (Pólis em parceria com Instituto Ethos & International Financial Corporation/IFC) e, mais recentemente, os projetos de estudos e formação associados ao tema da agricultura urbana e periurbana, articulando as pautas dos núcleos de Urbanismo e Segurança Alimentar de forma bastante orgânica. A aprovação da Lei Orgânica de Segurança Alimentar, em 2006, é o marco indubitavelmente mais expressivo da marcha propugnada por este conjunto de atores o qual o Pólis integra. A mudança cultural engendrada por esta advocacy bem-sucedida está expressa no texto da socióloga Christiane Costa12: “Um aspecto importante da lei é afirmar a alimentação como um direito humano. Noto que o Brasil vem sendo reconhecido também por isso. Conhecido por ser um país exportador de alimentos, de uns anos para cá, estamos sendo procurados para exportar esse know how de criação de marco legal da questão alimentar, que eu acho muito legal. Um país que se debruçou sobre a campanha da fome e criou a partir daí uma institucionalidade. O que tem aí de novidade? É deslocar o debate da fome, do lugar da caridade para o nível do direito, da política pública. Havia esse lapso em nossa constituição que não incluía o direito à alimentação no artigo 6 dos direitos sociais. Como a pessoa pode ter direito à saúde e à educação, se não tem direito a comer? O Estado não fica alheio a conseguir vagas nos hospitais, nas escolas, mas, se uma criança morrer na esquina do Pólis, o Estado não tem nada a ver com isso? Agora não. Só que ainda estamos no início do processo inicial, extraindo as conseqüências da conquista deste direito, que ainda é recente.”

A dimensão inquiridora do Pólis aparece de modo expressivo na trajetória de outra área engendrada e nomeada no próprio processo da construção do conhecimento e da 12

Depoimento concedido ao projeto Pólis 25 anos, 29/11/11. No Pólis: Coordenadora da área de Segurança Alimentar (desde 1993), Consultora na área de Segurança Alimentar no projeto Litoral Sustentável (desde 2011).

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militância: RESÍDUOS SÓLIDOS. O marco para a incorporação das questões ambientais dentro da agenda política foi, sem dúvida, a Rio 92. Ao ser convidado a participar da conferência, o Pólis identifica a inexistência da articulação entre as questões ambientais e urbanas e engaja-se neste diálogo, trazendo a questão urbana via as pautas trabalhadas pelo Fórum de Reforma Urbana. O contexto da Rio-92 serviu como uma gigantesca vitrine para o Pólis, que, a partir deste momento, ganha visibilidade nacional. Embora jovem, a instituição, não obstante, tinha já um acúmulo ensejado pela pesquisa realizada com o apoio financeiro da agência alemã EZE (atualmente EED) sobre a questão ambiental em São Paulo. Elaborada a partir de um extenso mapeamento e entrevistas com diferentes atores e lideranças que vinham militando em torno das questões da poluição do ar, da água, da preservação das bacias que abastecem São Paulo, entre tantas outras, e pelos conteúdos levantados em um amplo seminário que contemplava quatro diferentes temas – poluição urbana, água, solo e saneamento – a pesquisa resultou em uma publicação intitulada “Ambiente Urbano e Qualidade de Vida” (Revista Pólis, n.3, 1991). Considerada pioneira, a publicação foi distribuída na Rio-92 e trazia não só artigos acadêmicos, mas propostas de como intervir nos fenômenos em curso. Havia um “caldo” favorável para as discussões em torno dos problemas ambientais em São Paulo, naquele momento, que era o fato de convergir com a agenda política da então prefeita, Luiza Erundina, que vinha investindo em ações deste largo guarda-chuva de diferentes formas: utilização de gás natural, reaproveitamento de áreas verdes, coleta seletiva de lixo. Em meados da década de 90, há uma guinada profunda na organização dos movimentos sociais e as redes emergem como a corporificação da pluralidade dos atores que intervêm com voz própria. Em 1993, o Pólis integra o Fórum Brasileiro de Meio Ambiente e a questão dos resíduos e coleta seletiva, tema ainda pouco tematizado dentro da questão do saneamento, começa a despontar. Em 1998, é feita uma publicação sobre experiências municipais e de iniciativa da sociedade civil de coleta seletiva – “Coleta seletiva, reciclando materiais e reciclando valores” (revista Pólis, n.31) que se tornou um material de referência para gestores municipais. Em 1999, o Pólis é convidado a participar de um seminário em Brasília chamado “Lixo e Cidadania”, convocado pela Unicef, que reúne gestores municipais, ONGs, institutos de pesquisa e demais representantes da sociedade civil preocupados com a presença insalubre de 26


crianças nos lixões brasileiros. Constrói-se neste momento o marco de uma grande campanha “Criança no lixo nunca mais” e o Pólis, com sua expertise em desenvolver pesquisas mirando a construção de alternativas, investe em estudos e publicações com propostas para a população. Graças à participação pró-ativa que passa a exercer no debate, o Instituto é convidado a desenvolver, com o apoio da Unicef, um projeto piloto de assessoria à prefeitura de São Bernardo do Campo (1998-2000), cuja cidade tinha um dos maiores lixões da America Latina. Um dos principais papeis do Pólis foi angariar adesões para a proposta de reaproveitamento de resíduos, construindo um grupo intersetorial, articulando parceiros apoiadores e promovendo intervenções concretas, como a sensibilização de professores sobre o caminho do lixo e realidade das crianças oriundas dos lixões, a partir do relato sensível de suas mães. Outra ação Pólis de grande impacto político foi a defesa e ampla divulgação na mídia do modelo de compostagem e reciclagem, esbarrando com os interesses das empreiteiras cujo caixa 2 está condicionado ao lixo misturado. A intervenção do Pólis gerou vários desdobramentos, entre eles, a criação de duas associações de catadores e um artigo publicado dentro do volume Segurança alimentar do programa Fome Zero. O estofo adquirido decorrente desta assessoria levou o Pólis a tomar à dianteira na criação do Fórum Lixo e Cidadania na Cidade de São Paulo, em 2000. Com apoio financeiro da Fundação Friedrich Ebert, o Instituto faz o seu evento de lançamento envolvendo diferentes organizações da sociedade e sindicatos de trabalhadores. O sucesso da iniciativa contribuiu para a consolidação definitiva da área de Resíduos Sólidos dentro do Pólis e para a visibilidade que, desde então, adquiriu. Neste momento, a instituição vive o seu boom como espaço de articulação de atores, despertando muita credibilidade. A área de Resíduos Sólidos contribui para o seu fortalecimento institucional ao trazer uma diversidade de apoiadores parceiros. A respeitabilidade adquirida com as agências financiadoras é acrescida à legitimidade junto ao Movimento Nacional de Catadores de Recicláveis, que reconhecia a postura respeitosa do Pólis ao valorizar a sua autonomia e soberania. Na área de Resíduos Sólidos, o Pólis ainda deu outra contribuição importante ao elaborar uma concepção de sistema público de reaproveitamento de resíduos, incluindo os catadores, que, embora não façam parte da estrutura administrativa do governo, realizam um trabalho para a cidade de grande valia e necessitam, portanto, 27


investimentos para que sua intervenção seja sustentável. Esta advocacy em nome da valorização dos catadores de recicláveis e garantia de seus direitos acaba arrastando o Pólis para o debate sobre a política nacional para o setor, que teve início no Fórum Social Mundial. O grande salto se dá com a conquista de um marco regulatório para a área, que ocorre em 2010, com a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, lei 12.305/2010, que prevê que as administrações têm que elaborar planos de gestão integrada de resíduos sólidos e estabelecer termos de compromissos com o setor empresarial, responsabilizando-o também pelo processo de reaproveitamento. As conquistas obtidas pela agenda da Segurança Alimentar são inquestionáveis. No entanto, há uma luta, hercúlea, cuja mediação e vigilância do Pólis ainda se faz extremamente necessária, que é o comprometimento do empresariado com a questão do lixo e do seu reaproveitamento. Segundo a socióloga Elisabeth Grimberg13: “...então acho que o grande desafio é o empresariado assumir, é estruturar as cooperativas de modo a fazerem parte dessa nova lógica, estruturando pólos de reciclagem para escoar tudo isso e não se implantar incinerador, que é tudo de ruim do ponto de vista da contaminação ambiental e de ser poupador de mão de obra. A reciclagem ela integra essa massa de pessoas ambientalmente, o produto tem um ciclo de vida, ao invés de encurtar, alonga o ciclo de vida indo para a reciclagem. Enterrar ou queimar e você reaproveitar como matéria prima ou para fazer um outro produto, então, do ponto de vista da sustentabilidade econômica, ambiental, social é muito melhor do que queimar. Acho que tem esse problema grave no momento e tem a questão do empresariado assumir essa responsabilidade, que eu acho que tem lá uma coisa que quem vai gastar com incinerador é o Poder Público, não é a Nestlé, a Coca-Cola, Ambev. Então quer dizer, eles ficarem lá se fazendo de mortos em relação ao resíduo domiciliar que tem outros 6 que foram indicados na lei, que já eram responsabilidade deles, com exceção de lâmpadas e de eletroeletrônicos, já tinha Resolução CONAMA. È o momento de cobrar que realmente façam, pilha, bateria, pneus, agrotóxicos e óleos lubrificantes, embalagens de óleos, um trabalho de processamento adequado do óleo de automóvel, de óleos de transporte e combustível para transporte, então eu acho que o 13

Depoimento concedido ao Pólis 25 anos, 22/11/11 e 21/03/12. No Pólis: Sócio-fundadora, Diretora, Coordenadora da área de Resíduos Sólidos e Consultora na área de Residuos Sólidos para o projeto Litoral Sustentável.

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grande desafio realmente é agora não se caminhar para a queima e a sociedade conseguir pressionar para que os empresários assumam isso e sejam recursos deles não repassados para o consumidor os preços”.

Embora não estivesse articulado a um dos núcleos de atuação do Pólis, vale mencionar um projeto que foi fundamental para reafirmar os compromissos da instituição com os Movimentos Sociais: Observatório dos Direitos do Cidadão, em parceria com a PUC-SP e com financiamento da Fundação Ford (2001-2009). A iniciativa trouxe para dentro do Instituto os principais sujeitos do Movimento Popular – Saúde, Habitação, Assistência, União de Moradia e dois fóruns de Criança e Adolescente - e o grande aporte trazido foi possibilitar o estreitamento do diálogo entre os Movimentos, que se encontravam de costas uns para os outros. A idéia inicial era realizar um balanço das políticas públicas da cidade, a partir da perspectiva da sociedade civil. O marco zero foi considerado a gestão democrática da Luiza Erundina, passando pelo Maluf/Pitta até o governo de Martha Suplicy. Em razão das dificuldades de acesso aos dados e índices de certas gestões, o projeto de monitoramento da política pública ganhou outro contorno e passou a ser o monitoramento a partir dos Movimentos, de como eles significavam e avaliavam estas políticas. Os acúmulos produzidos – nos seminários, nas publicações e nos diálogos – foram de grande riqueza e mesmo com a retirada do apoio da Fundação Ford, em 2009, o projeto se manteve em curso. Se o trabalho de formação às lideranças sociais e assessoria aos governos locais sofreram algumas intermitências ao longo da história do Pólis, a cunha da instituição como produtora de conhecimento em várias áreas manteve-se imaculada mesmo em seus momentos de crise, mais ou menos agudas. A pesquisa sobre Juventude financiada pela International Development Research Centre/IDRC (ligada ao parlamento canadense) e realizada pelo Instituto em parceria com o Ibase, com a supervisão local da Ação Educativa, em 2005, é reveladora da credibilidade conquistada, levando-se em conta que o convite para integrar a parceria não se deveu ao fato de a instituição atuar no campo político da juventude (no final da década de 90, foi desenvolvida uma pesquisa pontual sobre jovens e mercado de trabalho, com o apoio da Unicef), mas por ser conhecido como um think tank. Nesta conjuntura favorável do Governo Lula, quando foram criadas as institucionalidades da juventude – Pro-Jovem, Secretaria 29


Nacional da Juventude e Conselho Nacional da Juventude – é que o projeto se insere. Conciliando pesquisa quantitativa com “grupos de diálogo” (tradução de choice work dialogue), metodologia que consiste em colocar frente a frente à heterogeneidade da sociedade para discutir questões da agenda pública, o projeto buscava compreender a qualidade da articulação entre juventude, democracia e representação. A gigantesca repercussão na mídia impressa e eletrônica deveu-se, em parte, aos resultados obtidos na contra mão do senso comum pautado na idéia da sinonímia entre juventude e individualismo e juventude e apatia política. A certeza de que o conhecimento gerado pelo diálogo incidia sobre a agenda pública levou os apoiadores a bancar a realização de um segundo projeto, ampliando o olhar para a juventude sulamericana (pesquisa em rede na Bolívia, Chile, Uruguai, Paraguai, Argentina e Brasil). O Pólis manteve-se na coordenação adjunta e na coordenação nacional. A aplicação de uma pesquisa quantitativa (entrevistas e questionários) e a realização de grupos de diálogo entre os jovens dos seis países, reunidos em torno da discussão sobre questões transversais – afinidades e singularidades culturais, utopia política e projeto de nação, identidades étnicas e de gênero - produziram uma radiografia rica e pungente da juventude e um material reflexivo de grande complexidade. Além do acervo gerado, a parceria entre ONGs com diferentes competências revelou bons resultados em termos dos acúmulos obtidos e na divulgação. A visibilidade conquistada ainda rendeu ao Pólis uma cadeira no Conselho Nacional de Juventude. As demandas contínuas para o desenvolvimento de pesquisas qualitativas dentro do seu campo de competências revelam que o Pólis permanece como uma referência de instituição crítica com olhar politizado para as experiências sociais. Esta insígnia não foi perdida a despeito das crises atravessadas. As novas tecnologias sociais, a radiografia sobre a situação das cidades brasileiras, a questão da participação são alguns dos temas que o Instituto vem problematizando nos últimos anos. Muitas outras iniciativas e projetos caberiam dentro deste esforço de sistematização. A amplitude de suas intervenções na cena pública e a relativa autonomia de cada uma das áreas de atuação, como se a história de cada uma trilhasse um caminho singular, obrigou- nos a fazer escolhas (duras, diga-se de passagem). A seleção dos tais “fatos históricos” arrolados por este trajeto foi pautada, como explicitado inicialmente, pelos próprios atores e o critério de escolha, de certo modo, foi balizado pela equação 30


investimentos que resultaram em avanços. Sem querer aferir um habeas corpus para as escolhas tomadas, a configuração desta paisagem, nos termos que ela se estruturou, procurou transmitir a riqueza e profundidade do acervo conceitual, técnico e político construído pelo Instituto e que hoje constitui seu grande patrimônio imaterial: o saber acumulado nos seus 25 anos de atividades e lutas. Obviamente, nem todas as apostas lograram sucesso e várias pautas que se mostraram a posteriori de grande apelo e relevância, e que poderiam ter sido levantadas pelo Pólis, foram indevidamente desconsideradas ou pouco valorizadas. Portanto, as fragilidades e fracassos são igualmente constitutivos a esta história, assim como as conquistas destacadas até este momento. Em 2008, ao ser atravessado por uma de suas crises mais agudas, que, na opinião de vários de seus protagonistas, não se restringiu a uma crise financeira em função da retirada do apoio substantivo das agências de cooperação internacional, mas também uma crise de paradigma e gerenciamento, o Pólis viu-se impelido, em nome de sua sobrevivência, a realizar uma avaliação sem pruridos sobre suas forças e fragilidades. Este processo que vinha correndo desde o início da crise foi potencializado pela efeméride dos 25 anos como uma oportunidade privilegiada de celebrar as muitas vitórias obtidas e, por outro lado, escarafunchar os aspectos que hoje vulnerabilizam e/ou inviabilizam a instituição. A despeito da capilarização do Pólis, há um sentimento geral de que muitos dos predicados antes associados ao Instituto – ousadia, irreverência, generosidade, desassossego permanente, capacidade visionária e escuta apurada para a emergência de novas pautas, reconhecimento de novos atores sociais, entrosamento fino com os movimentos sociais, protagonismo na formação da sociedade civil e lideranças sociais para uma interlocução qualificada com os gestores públicos - hoje não são mais exclusividades suas.

A fragilização do Pólis coloca-se, portanto, como um dado da realidade. Os possíveis fatores da perda da vitalidade institucional (a discussão sobre a viabilidade econômica serviu como ponta de lança de um processo mais profundo de expiação) vêm sendo problematizados pelo seu corpo de técnicos de diferentes maneiras e em diversos graus. 31


A recuperação desta história pontilhada pela trilha das memórias potencializou, de certo modo, a varredura que já vinha sendo perscrutada, sinalizando alguns possíveis determinantes: obsolescência de certos discursos e conceitos que deixaram de funcionar como operadores de análise da dinâmica social; miopia em relação à configuração de novos atores e movimentos sociais e de suas respectivas agendas; subutilização das novas tecnologias de comunicação; posicionamento à margem nas articulações nacionais e locais em torno dos mega projetos de infra-estrutura, entre eles, os mega eventos Copa do Mundo e Olimpíadas; incapacidade de aproveitar a energia e as ideias do seu corpo técnico jovem e concentração de poder na mão dos sócios-fundadores; dependência financeira dos projetos governamentais e, por decorrência, perda de autonomia enquanto ator político. Este suposto “descarrilamento” vivido pelo Pólis nos últimos anos também é justificado por problemas agônicos que nunca foram devidamente enfrentados e se arrastam desde a sua gênese: pouco investimento na formação e capacitação de seus quadros; fragilidade de interlocução intra- áreas e da instituição com os seus Conselheiros e parceiros externos; amadorismo na gestão administrativo-financeira.

O reconhecimento de que a instituição sofreu um enorme desgaste e que a manutenção de seu perfil como entidade da sociedade civil depende de um esforço diligente de reinvenção é consensual. Há algumas poucas vozes dissonantes, não obstante, que consideram que a missão histórica do Pólis foi plenamente realizada e que hoje, caso tenha que fechar suas portas, terá cumprido seu ciclo vital de forma magnânima. O amadurecimento substantivo da sociedade civil, a absorção de inúmeras pautas pelos governos na formulação de suas políticas públicas, a multiplicação de atores e espaços de reivindicação de direitos de cidadania, o amadurecimento dos movimentos sociais e sua autonomia das ONGs como mediadoras na relação com o Estado e a consolidação de marcos regulatórios substancializados em leis são conquistas decorrentes da ardilosa luta a qual o Pólis esteve à frente. No entanto, o horizonte que serviu como propulsor da ação/intrevenção do Pólis nestes seus vinte e cinco anos, ou seja, a construção de “cidades justas, democráticas e sustentáveis” ainda está muito longe de ter sido alcançado. Segundo a arquiteta e urbanista Raquel Rolnik:

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“Tudo está numa espécie de limbo e do ponto de vista urbanístico essas propostas inovadoras conquistadas no âmbito do ordenamento jurídico, simplesmente, não foram implementadas. Temos os marcos legais de promoção dos direitos de cidadania mas, o que impera, na prática, é a lógica da violência, da truculência, da exclusão, do processo decisório concentrado em poucas mãos, da privatização do Estado, de uma elite que governa e continua governando sozinha, da montagem dos negócios entre empresários e políticos. Então, é isso que aconteceu. O problema não é só do Pólis, mas de toda a esquerda, de todo o campo dos movimentos que trabalhavam na linha da Reforma Urbana. A agenda foi para o espaço, o que não quer dizer que um monte de conquistas importantes não aconteceram a partir dali. A urbanização das favelas, por exemplo, hoje é uma política muito mais consolidada, o que não impede de se fazerem – ao mesmo tempo – remoções em massa desrespeitando totalmente os direitos. É uma coisa discricionária como é tudo no Brasil: tem as leis e aí eu uso ou não dependendo, convém ou não, é ou não é. Esse aspecto é um ponto que não foi superado na construção de nosso processo democrático. Por outro lado, tem toda a distribuição de renda que começa a acontecer, as políticas sociais que começam a acontecer, que começam a chegar lá na ponta. Isso coloca então outro desafio, uma reconfiguração do país. Eu estou falando isso desde 2007 e naquele momento muito sozinha. Hoje eu sinto que estou falando com mais gente, pouco a pouco está se constituindo uma agenda pós era Lula, nesse novo país e nessa nova configuração política, onde as lutas dos últimos 30 anos tiveram ganhos, não àqueles que imaginávamos, outros desafios e outras questões emergiram”.

As conquistas substancializadas na era pós-Lula - política nacional de reforma urbana, política nacional de resíduos sólidos, política nacional de segurança alimentar e nutricional - não excluem, portanto, a necessidade de enclaves políticos que monitorem, observem e interpretem a dinâmica conflituosa entre os interesses da sociedade civil, do mercado e do Estado. Neste sentido, a singularidade construída pelo Pólis como um facilitador de processos e diálogos entre a sociedade civil e a administração pública e entre os próprios movimentos sociais, promotor de novas arquiteturas institucionais, como articulador de redes e realizador de pesquisas coadunadas com estratégias

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políticas de intervenção, continua ainda imprescritível. Segundo a assistente social Rosangela Paz14: “O Pólis produz conhecimento, mas a natureza é muito diferente da produção de conhecimento acadêmica ou de quem está na gestão da política. Produzimos um conhecimento que está diretamente vinculado com a intervenção dos atores, isso ninguém faz. O que a academia faz? Dá subsídios, o time da academia é outro, o time do Pólis produz conhecimento que tem que ser o instrumental mesmo dele, tem que ser útil para quem está intervindo, para quem vai estar lá no Conselho, que tem um assento. Então , eu acho que ele produz conhecimento para a intervenção, não produz conhecimento para nada ou para acumular conhecimento. Hoje, no mundo tecnológico, com a Internet e etc., você acessa muita coisa o tempo inteiro, temos muita informação, mas não é uma informação trabalhada. Eu acho que o Pólis dá essa informação com outro filtro, nós temos o filtro da sociedade de um campo que não é político partidário, mas é um campo bem definido, tem escolhas definidas. Então, qual é a escolha do Pólis? É fortalecer a Sociedade Civil, não é fortalecer o Estado, queremos fortalecer a Sociedade Civil, a intervenção dos atores na Sociedade Civil. Quem busca o Pólis vem buscar isso. Hoje você tem muita coisa na mídia e a mídia forma a opinião pública absolutamente despolitizante, uma informação absolutamente despolitizada. Eu acho que é um diferencial, acho imprescindível esse tipo de formação e informação que o Pólis produz.”

A vivência da crise e o trabalho de resgate da história contribuíram para um inexorável exercício de crítica. Este enfrentamento compulsório ainda não foi devidamente mitigado e, portanto, não há ainda uma posição coesa sobre os caminhos a ser percorridos. No entanto, há um tom passível de ser escutado pelas frestas dos discursos de vários de seus protagonistas que confluem para duas direções distintas: em primeiro lugar, reengajar-se com atividades com as quais esteve historicamente associado e, em segundo, retorcer às suas dinâmicas internas de trabalho e gestão de conhecimento.No âmbito da retomada, há quase um consenso sobre a necessidade imperativa do Pólis se comprometer com a formação de atores e lideranças/movimentos sociais, bem como de 14

Depoimento concedido ao Pólis 25 anos, 19/12/11. Professora da Faculdade de Assistência Social da PUC/SP. No Pólis: Coordenadora do Observatório dos Direitos do Cidadão.

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gestores públicos, atividade que esteve presente desde a gênese do Instituto como parte da sua missão institucional e que está muito associada ao DNA do Instituto. Ao longo de quase uma década, a questão da formação ficou concentrada no projeto da Escola de Cidadania do Pólis e, a despeito dos sérios problemas de financiamento, obteve resposta entusiasta do seu público alvo e expressiva repercussão social. No âmbito da inovação de práticas, há uma percepção, curiosamente elaborada por vários de seus atores, que a nova agenda com a qual o Pólis deve se comprometer é a articulação entre todas as agendas já investidas (a inexistência de uma relação orgânica, até o momento, entre as várias frentes de atuação explica a dificuldade sentida ao longo desta elaboração em tecer um enredo comum). Fazendo uso da condição como observadora, ouvidora, analista e relatora da trajetória da instituição, a partir da análise e interpretação dos documentos textuais e orais produzidos, arrisco a prognosticar que a revitalização e futuro do Pólis dependam, talvez, de um movimento aparentemente simples, singelo, que alude à maior de suas bandeiras: a radicalização do diálogo. Se o Pólis, ao longo de seus vinte e cinco anos de aguerrida participação na vida pública promoveu estas trocas com maestria, é chegado o momento de radicalizar o debate, mas agora, endogenamente (entre seus próprios técnicos e entre o corpo técnico e os membros do Conselho e demais parceiros), possibilitando o que até hoje ainda não havia sido feito: a construção de uma elaborada síntese urbana. Que a tônica impressa pela pesquisa no sentido de resgatar e reverberar as diferentes vozes constitutivas a esta história seja potencializada, permitindo que a interlocução entre seus atores aconteçam não apenas no corpo do texto, mas no embate corpo-acorpo.

Finalizo este passeio realizado com saltos, paradas e miradas emprestando dois pequenos extratos de depoimentos concedidos ao projeto Pólis 25 anos, nos quais o “novo” o qual o Pólis deve perseguir não se encontra fora das competências já acumuladas pelo Instituto, mas pode ser vislumbrado no movimento prosaico de conexão em nome de uma agenda única de visibilidade:

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O Pólis precisa se atualizar é não é uma atualização fácil. Para seguir na metáfora transporteira, alguns “bondes” passaram e nós não estamos neles, não sei se ainda se dá para correr e pegá-lo lá na frente. Talvez não seja para pegar um bonde específico, a questão da mobilidade, da ciclovia, apesar de eu achar que deveria já que o tema está ganhando bastante importância. Acho que talvez o nosso desafio seja construir o “bonde da síntese”. Como construir a síntese da cidade? Somos uma das poucas organizações que consegue olhar para diferentes dimensões e com uma razoável capacidade de integrá-las. As outras organizações são muito segmentadas, continuam segmentadas ou tem uma dimensão muito despolitizada, muito de classe média, tem um embate a ser feito... Precisamos estudar, discutir isso, é uma máquina de acumulação, porque ela funciona de tal maneira e não de outra? Porque ela é funcional de certa maneira a alguns grupos que a controlam? Tem uma série de embates, nada disso é linear. Não estou aqui fazendo um marxismo tosco, mas não dá para olhar a cidade sem um pouquinho de Marx...Talvez tenhamos uma dificuldade e que nós não conseguimos nunca articular uma pauta sintética urbana porque isso tem a ver com organização interna também. Como as pessoas eram especialistas em temas, muitas vezes, as coisas eram fragmentadas..Como tivemos uma fragmentação, não conseguimos articular nunca uma agenda única de visibilidade. Claro que é mais difícil para nós do que para o SOS Mata Atlântica, o nome diz tudo, não precisa falar mais nada. Ação Educativa, o nome diz tudo. O nosso nome diz tudo só que é tudo tão complicado, é um constructo tão elaborado discutir a temática urbana, é tão cheio de contradições ali dentro, tão às vezes fragmentado porque a gestão das nossas cidades é fragmentada porque se ela não fosse fragmentada não seria um instrumento de acumulação capitalista que elas são. Elas não poderiam ser apropriadas pelos vários setores econômicos, basicamente setores de serviços urbanos, transportes urbanos e o setor imobiliário, de construção elitista. Esses setores só dominam porque a cidade é fragmentada. Nós não conseguimos construir esta pauta. Quando as pessoas pensam em cidades elas não pensam no Pólis. Não conseguimos nos aproximar do grande público, sempre ficamos muito focados nas Organizações Sociais, nos Movimentos Sociais, Organizações Estudantis. Acho que como estratégia está correto, é por aí mesmo, mas isso nos fez ser incapazes de construir um discurso mais amplo, mais sintético.”

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José Carlos Vaz15

“Eu acho que esse projeto Petrobras trás uma possibilidade de articular algumas agendas que, na década de 90, não estavam tão claras, principalmente articulação entre desenvolvimento urbano, desenvolvimento econômico e desenvolvimento regional, que não existe no Brasil. Se nós conseguirmos deixar claro essa articulação e tentar apresentar propostas a partir dessa articulação, aí nós tocamos em uma coisa nova e uma coisa que o Brasil vai precisar trabalhar nesse contexto de crescimento econômico. Quando nós discutíamos a política urbana e habitacional na década de 90, eu ainda era recém formado, mas a Raquel, o Nelson, o pessoal da Reforma Urbana estava discutindo em um contexto de crise, contexto de escassez de recursos, que vinha da década de 80. Naquele momento, a agenda das necessidades sociais e dos direitos sociais é que preponderavam. Só que essa conjuntura mudou e hoje nós temos um contexto de crescimento econômico e de ampliação do mercado de trabalho. Antes, nós tínhamos um contexto de recessão, desemprego, empobrecimento da classe média, crise da dívida externa, era tudo isso. Hoje você tem o contrário, tem crescimento econômico, ampliação do mercado de trabalho, aumento de renda de vários setores da sociedade, disseminação de estruturas produtivas para outras regiões do país e abundância de recursos para investir no espaço urbano. Por isso, discutir política urbana no começo da década de 90 é uma coisa e, discutir política urbana do começo da década de 2010, é outra coisa. A agenda mudou mesmo e eu acho que essa mudança se deve muito a essa relação entre desenvolvimento urbano, desenvolvimento econômico, crescimento econômico e articulação inter-regional. O projeto Petrobrás tem essas três dimensões, não está simples, vamos ver se vai ser frutífero. Mas acho que essa é uma vertente importante. Desde o começo de 2005/2006, eu venho falando que as nossas agendas estão entrando na agenda do Governo, das políticas públicas. O novo seria articulação entre elas, não são novas agendas, são articulações de agendas que já são trabalhadas. Dessas articulações pode surgir um novo”. Kazuo Kakano16

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Professor do curso de Gestão de Políticas Públicas da EACH-USP (USP-LESTE). No Pólis: Coordenador do DICAS (1993-1995), Coordenador de Formação (1997-1995), Secretário executivo (1999-2001), Coordenador do Logolink América Latina (2001-2006) e Coordenador geral (2003-2006). 16

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BIBLIOGRAFIA ALBUQUERQUE JUNIOR, Durval Muniz de. História – a arte de inventar o passado. Bauru, SP: Edusc, 2007. ALMEIDA, Marco Antonio de. Estudos de Gestão: Icapuí e Janduís. São Paulo, Pólis, 1993. CACCIA BAVA, S.&PAULICS, V. & SPINK, P. (orgs.). Novos contornos da gestão local: conceitos em construção. São Paulo, Pólis: Programa Gestão Pública e Cidadania/FGV-EAESP, 2002. CAMARGO, Aspásia.& CAPOBIANCO, João Paulo Ribeiro & OLIVEIRA, José Antonio Puppim. Meio Ambiente Brasil: avanços e obstáculos pós Rio-92. São Paulo e Rio de Janeiro: Estação Liberdade & Fundação Getúlio Vargas, 2002. FARIA, Hamilton & MOREIRA, Altair & VERSOLATO, Fernanda (orgs.). Você quer um bom conselho? Conselhos municipais de cultura e cidadania cultural. São Paulo: Instituto Pólis, 2005. (Publicações Pólis, n.48) FERREIRA, Anna Luiza S. Souto. Lages um jeito de governar. São Paulo, Pólis, 1991. GRIMBERG, Elisabeth. Ambiente urbano e qualidade de vida. São Paulo: Instituto Pólis, 1991. (Publicações Pólis, n.3). ________,__________. Coleta seletiva com inclusão dos catadores – Fórum Lixo e Cidadania da Cidade de São Paulo. Experiência e desafios. São Paulo: Instituto Pólis, 2007. (Publicações Pólis, n. 49) KAYANO, Jorge & CALDAS, Eduardo. Indicadores para o diálogo. São Paulo: Pólis/Programa Gestão Pública e Cidadania-EAESP/FGV, 2001. KOWARICK, Lúcio& MARQUES, Eduardo (orgs.). Sâo Paulo: Novos Percursos e Atores – Sociedade, cultura e política. São Paulo: Editora 34 e Centro de Estudos da Metrópole/CEDEM- CEBRAP, 2011. LANDIM, L. Pensar com os outros: 50 anos de FASE: trajetórias de uma organização da sociedade civil brasileira. Rio de Janeiro: FASE, 2011.

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