UNIDADE
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ORALIDADE E ESCRITA
LEITURA E PRODUÇÃO DE TEXTOS
EXCELÊNCIA EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
ORALIDADE E ESCRITA Nesta unidade, iremos abordar a modalidade oral e escrita da linguagem. A língua reflete a forma como o falante pensa, sente e vê o mundo. Segundo a professora Mara Lúcia, em seu artigo “Uma língua, duas modalidades: o texto oral e o escrito”: o estudo da língua - quer na expressão oral, quer escrita -, em seus vários dialetos, leva-nos ao conhecimento do homem e de sua história. Outra razão para o estudo da língua oral e escrita é o registro da sua evolução, uma vez que, como já estudamos nas unidades anteriores, a língua vai-se transformando sob a influência do tempo, do contato com outras línguas, etc. Sendo assim, os estudos linguísticos, em seus vários níveis, bem como o controle do aparecimento de novas formas e do desuso de outras, fornecem dados para o registro da história interna de uma língua e suas tendências evolutivas. (PARÁ, 2003, online)
A linguagem oral e a linguagem escrita constituem universos específicos da comunicação e possuem características próprias. Na modalidade oral há sempre uma tendência à informalidade, pois a relação com quem falamos é direta, espontânea e ágil. Na modalidade escrita, o texto tende por uma elaboração mais formal, ou seja, para além da preocupação sintática, o autor procura excelência no conteúdo, precisão vocabular, objetividade e clareza de ideias. Segundo Fávero (2005, p.09), “a escrita tem sido vista como de estrutura complexa, formal e abstrata, enquanto a fala, de estrutura simples ou desestruturada, informal, concreta e dependente do contexto”. Apesar de a linguagem oral ser mais abrangente do que a linguagem escrita, isso não significa que uma seja superior à outra, já que nos utilizamos de ambas para expressar nosso raciocínio. Como bem asseverou Marcuschi (2003, p.17): “sob o ponto de vista mais central da realidade humana, seria possível definir o homem como
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um ser que fala e não como um ser que escreve”. Entretanto, o uso da escrita para a sociedade tem um valor social superior, pois a norma padrão é a utilizada em livros, jornais, artigos científicos por ser a língua prestigiada no âmbito de aprendizado escolar. É importante destacar que a oralidade é adquirida nas relações sociais do nosso dia a dia, desde o nosso nascimento. Assim, o contexto é que determina o tipo de linguagem que devemos utilizar. Por isso, a prática da oralidade é uma forma de inclusão social e de socialização. Já, a escrita, é fruto de um aprendizado escolar num contexto mais formal da língua. Salienta-se que, a linguagem escrita em conjunto com a linguagem oral é usada nos diferentes contextos sociais da vida: trabalho, escola, dia a dia, família, vida intelectual, no entanto para cada situação comunicativa há objetivos diversos em relação ao uso da escrita e da oralidade. Apesar de haver correlação entre a linguagem escrita e a oral, o ato de escrever é muito diferente do ato de falar. A grande diferença reside, essencialmente, de o interlocutor1 estar presente na hora da fala e ausente no ato da escrita. No ato da fala, qualquer problema na interpretação ou incompreensão da mensagem pode ser imediatamente solucionado, por meio de gestos, expressões faciais, tom de voz. No entanto, no ato da escrita, não há a presença desses recursos expressivos. Por esse motivo, a linguagem escrita é abstrata, pois quando escrevemos não há gestos, nem olhares, nem entonação, apenas as palavras.
Observe estes dois exemplos:
• Texto 1: Linguagem oral “Ela tava ali, lindinha e nos conformes, cara... fiquei olhando, imaginando um jeito de dize!; bem, você sabe, né? De dizer aqueles negócios que fico pensando sem ela. Era hora, agora, vou lá, dou uma chavecada nela, buzino umas no ouvidinho dela, tá na minha... bom, tava faltando coragem, puxa, foi me dando um frio, uma coisa, um estado... virei as costas, meu irmão, e me mandei... “ • Texto 2: Linguagem escrita 1 Interlocutor: O termo interlocutor designa cada um dos participantes de um diálogo. Os interlocutores de um texto, portanto, são os leitores/ ouvintes em que o autor pensa no momento de elaborá-lo.
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“Digo a você que ela estava lá, diante dos meus olhos. Perfeita. Olhei-a imaginando um jeito de dizer o quanto era importante para mim, dizer o que pensava dela quando estava a sós comigo mesmo. Pensei ser a hora certa, conversar: Mas me faltou coragem. Fugi.” Podemos observar no texto 2 as características da linguagem escrita, o qual apresenta um todo com significado, com partes bem estruturadas como: repetições, pausas, abreviações, sem expressões vulgares e sem as marcas da oralidade. Quando escrevemos um texto na norma culta da língua e pertencente a um gênero textual específico, isso limita bastante a forma como nos expressamos. Assim, devemos evitar, por exemplo, palavras e expressões que deem ao leitor a impressão de que conversamos com ele. Uma das características da oralidade é o fato de interagir conversando com alguém, e isso não pode acontecer, por exemplo, nos textos científicos. Evite, portanto, usar palavras como: “você”, “né”, “tá”, assim como, verbos no imperativo e/ou quaisquer outros tipos de interação com o leitor. Para Bortoni-Ricardo (2004, p. 47), algumas dessas expressões ainda aparecem em textos devido à “educação em língua materna”. E enfatiza as diferenças de grupos etários, de gênero, de status socioeconômico e de grau de escolarização. Em relação ao grupo etário, essa pesquisadora cita como exemplo, um avô, que na hora de escrever, vai utilizar-se de vocabulário e de expressões diferentes das do seu neto adolescente. Para as expressões relativas ao gênero, a autora diz que as mulheres usam mais diminutivos, já os homens uma linguagem menos formal, mais pejorativa, com gírias. Ainda salienta que essas diferenças entre o vocabulário feminino e o masculino fazem referência aos papéis sociais, os quais são culturalmente condicionados. No que diz respeito ao status socioeconômico, de acordo com Bortoni-Ricardo (2004, p. 47) as diferenças representam desigualdades na distribuição de bens materiais e de bens culturais, o que se reflete em diferenças sociolinguísticas. Entre os bens culturais, ressalta-se a inclusão digital, o acesso ao computador e à internet. Com referência ao grau de escolarização, há a evidência da diferença, pois uma pessoa que teve a oportunidade de estudar terá uma forma de escrever bem diferente da de uma pessoa que não teve acesso a uma universidade, por exemplo.
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Mediante tais definições, nota-se que a fala refere-se ao uso coloquial/popular e a escrita ao uso culto da língua; ou seja, na oralidade são “aceitas” expressões simplesmente “ignoradas” na escrita. A linguagem escrita e a linguagem oral não constituem modalidades estanques; apresentam diferenças devido à condição de produção, mas o processo se dá a partir da língua. Fávero, Andrade e Aquino (2005, p.74) estabelecem as especificidades da fala e da escrita, considerando o contexto de produção de ambas, através do seguinte esquema:
FALA Interação face a face Planejamento simultâneo ou quase simultâneo à produção Criação coletiva: administrada passo a passo Impossibilidade de apagamento Sem condições de consulta a outros textos A reformulação pode ser promovida tanto pelo falante como pelo interlocutor Acesso imediato às reações do Interlocutor O falante pode processar o texto, redirecionando-o a partir das reações do interlocutor O texto mostra todo o seu processo de criação
ESCRITA Interação à distância (espaço-temporal) Planejamento anterior à produção Criação individual Possibilidade de revisão Livre de consulta A reformulação é promovida apenas pelo escritor Sem possibilidade de acesso imediato O escritor pode processar o texto a partir das possíveis reações do leitor O texto tende a esconder o seu processo de criação
Assim, a linguagem oral se caracteriza essencialmente por ser falada e há particularidades que a tornam uma modalidade específica da língua. Essas particularidades são, de fato, elementos exclusivos da linguagem oral: a gesticulação, a fluidez das ideias, a velocidade da produção oral e o fato de o falante ter o controle da comunicação no momento de sua efetivação, isto é, a eficácia na correção da informação em caso de incompreensão da mensagem por parte do interlocutor.
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Diante do exposto, vale ressaltar que a língua escrita assume um caráter mais rígido quanto à forma e, principalmente, quando se trata de uma escrita literária ou cientifica, na qual se usa a norma culta, valorizando a importância da língua escrita para a manutenção da unidade linguística.
“Narradores de Javé”
A pequena cidade de Javé será submersa pelas águas de uma represa. Seus moradores não serão indenizados e não foram sequer notificados porque não possuem registros nem documentos das terras. Inconformados, descobrem que o local poderia ser preservado se tivesse um patrimônio histórico de valor comprovado em “documento científico”. Decidem, então, escrever a história da cidade - mas poucos sabem ler e só um morador, o carteiro, sabe escrever. Depois disso, o que se vê é uma tremenda confusão, pois todos procuram Antônio Biá, o escrivão da obra de cunho histórico, para acrescentar algumas linhas e ter o seu nome citado. Contextualizando o preconceito linguístico dentro de nossa língua, o filme, “Narradores de Javé”, apresenta um belo ensaio sobre a linguagem e sua ludicidade2, na maneira do protagonista brincar com o ato de escrever ao poetizar a respeito do papel e da tinta. Os seus escritos na parede, seus poemas, mostram a relação dele com a escrita, sua defesa por uma língua que liberta e que não aprisiona. Um dos grandes méritos do filme é enfocar as dificuldades que vivem os grupos sociais fundados na oralidade em preservar a memória e, ao mesmo tempo, reviver a tradição das narrativas orais populares transmitidas de geração para geração. Além de criar um espaço de reflexão sobre as tensões estabelecidas entre práticas do mundo da oralidade e do mundo da escrita. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Trm-CyihYs8
2 Ludicidade: Forma de desenvolver a criatividade, os conhecimentos, por meio de jogos, música e dança. O intuito é educar, ensinar se divertindo e interagindo com os outros.
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Há diferenciação dos modos de fala em diferentes situações comunicativas? Há diferenciação da fala e da escrita de acordo com grupos etários, de gênero, de status socioeconômico e de grau de escolarização?
REFERÊNCIAS BORTONI-RICARDO, S. M. A comunidade de fala brasileira. In: Educação em língua materna – A sociolingüística na sala de aula. São Paulo: Parábola Editorial, 2004. FÁVERO, Leonor Lopes; ANDRADE, Maria Lúcia C. V. O. & AQUINO, Zilda G. O. Oralidade e escrita: perspectivas para o ensino de língua materna. 5. Ed. São Paulo: Cortez, 2005. MARCUSCHI, Luiz Antônio. Da fala para escrita: atividades de retextualização. 4. Ed. São Paulo: Cortez, 2003.
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