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Relatos
Carolina Lino
Natural da Póvoa de Varzim. Mestrado Integrado em Medicina Dentária pela Universidade de Coimbra. Em estágio profissional na Mundo A Sorrir.
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Desde pequenina que queria fazer voluntariado, e escolher a área da saúde já era um objetivo que tinha o voluntariado no seu âmago. Comecei por projetos nacionais ao longo do meu percurso académico, mas aos 25 anos senti a vontade de finalmente concretizar o sonho de ir mais além. Conheci a Mundo A Sorrir e apaixonei-me pelo projeto que desenvolve em São Tomé e Príncipe desde 2013: o “Saúde A Sorrir”. Respondi ao desafio com o maior entusiasmo possível, e fui, por três meses. E ainda bem!
Em São Tomé estive nos distritos de Lembá e Cantagalo a promover ações de prevenção, educação e assistência médico-dentária junto de crianças do primeiro ao quarto ano de escolaridade e a trabalhar numa clínica social com pessoas de todas as faixas etárias. Em ambiente clínico efetuei consultas de Medicina Dentária e em regime de ambulatório, distribuí escovas e pastas nas escolas, fiz ações de capacitação sobre a saúde oral adaptadas ao nível de aprendizagem dos alunos e tratamentos médico-dentários com uma unidade portátil.
Num país onde os acessos a cuidados de saúde são difíceis, dispendiosos, escassos e sustentados por débeis infraestruturas e formação dos profissionais de saúde, é de esperar que a saúde oral não seja uma prioridade. Assim, deparamo-nos com uma ausência generalizada de hábitos e técnicas de escovagem e higiene e com uma marcada inexistência de acessos à saúde oral e à Medicina Dentária.
Tudo isto traduz-se em quadros clínicos exacerbados com inúmeras lesões de cárie, restos radiculares e dentes com prognóstico impossível, não só em adultos, mas também em crianças. Assim, situações clínicas que no nosso país são consideradas banais e cuja evolução é travada facilmente com
Carolina Lino, de 25 anos, é natural da Póvoa de Varzim. Após ter concluído o Mestrado Integrado em Medicina Dentária na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, trabalhou seis meses como médica dentista numa clínica privada e depois decidiu partir, numa missão de voluntariado da Mundo a Sorrir, para São Tomé e Príncipe — ao abrigo do projeto “Saúde a Sorrir” — naquela que considera ser “a maior aventura da sua vida”. A jovem médica dentista encontra-se atualmente em estágio profissional na carismática organização não governamental que se dedica a promoção da saúde oral dentro e fora do país.
Carolina Lino apaixonou-se pelo projeto “Saúde a sorrir”, que a ONG desenvolve em São Tomé e Príncipe desde 2013.
Em São Tomé esteve nos distritos de Lembá e Cantagalo a promover ações de prevenção, educação e assistência médico-dentária junto da comunidade escolar.
consultas e tratamentos regulares, em São Tomé escalam muito rapidamente para quadros complicados de infeção, desdentações e consequentemente para uma perda significativa da qualidade de vida e estados de saúde muito comprometidos.
Por ser assim, a presença da Mundo A Sorrir é extremamente importante e reconhecida pela população em geral e por membros das entidades de saúde como uma enorme mais- -valia. Fui recebida com um enorme entusiasmo e admiração por cada uma das pessoas que cruzaram o meu caminho durante os três meses. As crianças transmitiam uma alegria contagiante cada vez que entrava numa sala de aula e nos tratamentos a atmosfera era de um enorme agradecimento e muita curiosidade.
A longo prazo, depois de tudo o que testemunhei, acredito que a intervenção da Mundo A Sorrir no país tem melhorado não apenas os acessos à saúde oral, mas a própria área em si, através da capacitação e promoção de técnicas de escovagem e higiene oral e hábitos de saúde saudáveis junto da comunidade.
A voluntária sublinha que não há nada mais reconfortante do que “receber em troca os sorrisos dos quais cuidamos”.
Termino este testemunho com um nome: Mauro. O Mauro é um menino (recentemente) órfão de Colónia Açoreana, uma das roças e comunidades de Cantagalo. Melhor aluno da turma e jura a tia, com quem vive e para a qual trabalha para contribuir para a comida que ela lhe dá, que nunca faltou a um dia de escola, até eu chegar lá. No dia em que fiz a palestra à turma dele, e apontei o seu nome para tratamentos em ambulatório, ele suplicou à tia para o deixar ir à consulta. Não era de longe o menino com a pior boca que eu já tinha visto, mas foi o primeiro a chegar ao Centro de Saúde, foi o último a ser atendido a seu pedido para eu ver os colegas que estavam com dores. No fim de ouvir a sua história, de ver o seu comportamento, de o conhecer e lhe dar um enorme abraço e beijinho, lembro-me de ter pensado: “é por isto que estou aqui, para que nunca o sorriso deste miúdo desapareça com uma dor de dentes ou um abcesso ou pela vergonha de não ter dentes para sorrir”. O Mauro fez um esforço enorme para ir ter comigo, apesar das agulhas e do sangue, e eu só lhe posso agradecer. O Mauro mudou a minha vida e o sentido que hoje coloco na Medicina Dentária. Não há mesmo nada mais reconfortante do que receber em troca os sorrisos dos quais cuidamos, e acima de tudo daqueles que fazem de tudo para não o perder.
Durante a missão, Carolina Lino deparou-se com uma marcada inexistência de acessos à saúde oral e à Medicina Dentária.