MAT RIZES DO SAMBA CARIOCA AGOSTO A OUT UBRO 2015
Grande parte da identidade cultural do brasileiro está associada à sua música popular. Dentre as muitas manifestações musicais, o samba desponta como parte importante da tradição nacional, dentre outras coisas, por carregar a bagagem das diversas expressões de matriz afro-brasileira. O samba desenvolvido em cada região do país tem suas particularidades, tendo recebido influências dos modos de vida próprios de cada lugar. No Rio de Janeiro, a partir de práticas culturais como o jongo, o lundu e o maxixe, afirmaram-se no século XX três vertentes distintas do samba: o samba-enredo, o partidoalto e o samba de quadra; são as chamadas matrizes do samba carioca. Os três estilos do samba foram registrados pelo iphan (Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) como bens patrimoniais imateriais do país. Partindo dessa perspectiva, o Sesc Vila Mariana concebeu essa proposta, com duração de três meses, destinado a apresentar as particularidades dos diferentes estilos do samba, explorando suas diversas sonoridades. Para tal, convidou grandes sambistas cariocas, todas mulheres cujas trajetórias tiveram relação direta com cada uma das três matrizes, para apresentá-las ao público em suas leituras características e individuais. Sesc Vila Mariana
O SAMBA E O LEGADO DAS MULHERES Olhar o samba como terreno cultural expresso em sonoridades, musicalidades, sotaques, danças e memórias, o coloca em um lugar de significados repletos de tradições e reinvenções, que extrapolam as fronteiras de ser reconhecido como um dos símbolos da identidade nacional construída por políticos e pensadores nos anos 1930, mas vivida e experienciada por diferentes africanos escravizados e seus descendentes, de diferentes maneiras, como possibilidade de vida, liberdade, vínculo de dignidade e conexão com a história. Território privilegiado de vivências e sociabilidades (entendendo território enquanto espaço definido não pelas características físico-geográficas, mas sim pelos símbolos da cultura1) o samba se apresenta como algo muito além de um estilo musical, como espaço de criação, facilitador de sentidos de pertencimento compartilhado em torno de raízes culturais comuns. Referência simbólica complexa, o samba catalisa representações práticas de extrema significação, em um universo de construção subjetiva dos sentidos dessa experiência. 1
Ancorada no plano do sensível, essa herança cultural agrega percepções de lugar de resistência entre tradições e laços familiares, misturados com a história do próprio samba e de suas origens enquanto produção coletiva, em roda, feita por mulheres e homens. Assim, diferentes sotaques do samba contados e cantados por mulheres que, nas culturas africanas e afrobrasileiras, são consideradas as guardiãs das tradições, o evidencia como forma de conhecimento e recurso narrativo que constrói e reconstrói histórias. Neste contexto, Tia Ciata, baiana que viveu no Rio de Janeiro no final do século XIX e início do XX, se destaca como memória coletiva. Na sua casa acontecia o samba que era proibido, na sua casa nomes como Pixinguinha, Sinhô, entre outros, se conheceram e compunham. No espaço privado, ela era um exemplo de guardiã e, nas escolas de samba, a valorização da ala das baianas é uma forma de homenageá-la, e à memória de todas as tias baianas do samba. Também em São Paulo, já nos anos 1930, como cordão carnavalesco, o grupo Lavapés foi fundado e presidido pela Madrinha Eunice, uma referência de guardiã na memória do samba paulista, entre outros exemplos.
Rolnik, R. “Territórios Negros nas Cidades Brasileiras – Etnicidade e Cidade em São Paulo e Rio de Janeiro” In: Estudos AfroAsiáticos, 17, 1989, pp.29-40.
Essas mulheres, e tantas outras que as sucederam, têm o umbigo enterrado no mesmo território em que o samba tem seu fundamento, solo fértil de convivência cotidiana, troca de experiências, ideias e ideais. Ponto de partida dessas guardiãs que contam, cantam e espalham memórias e conhecimentos, confundir a trajetória de suas próprias vidas com os caminhos do samba, faz reverberar tudo isso, mostrando que o samba nunca está divorciado de suas práticas cotidianas, e sim permeia cada uma delas. Inspiração para todas as outras presenças femininas no samba, Dona Ivone Lara é o principal símbolo desse contexto que objetiva ampliar os olhares, vozes e escutas, trazer informação e registrar a importância dessas agentes de sua própria história, que fazem, refazem, resignificam e permanecem, apesar de todas as mudanças que uma cultura e uma história dinâmica podem e devem sempre trazer. Primeira mulher a participar da ala de compositores de uma escola de samba (fato que ocorreu no final dos nos anos 1930, no Império Serrano, RJ), sua importância extrapola “locais de samba”, e alcança respeito enquanto compositora na chamada MPB. Ao expandir o alcance de suas criações, em um espaço de produção marcado por diversas questões que refletem práticas
da sociedade, com letras pejorativas e mesmo violentas em relação às mulheres, ocupa um lugar social relevante como protagonista de uma produção que se dá de dentro para fora. As mulheres no samba são o principal sinal que ainda traduz a existência de uma comunidade de valores e tradições compartilhados. Guardam e espalham as memórias e as histórias, guardam e espalham tudo o que precisa ser conhecido, reconhecido e transmitido, fazendo com que o samba esteja no cotidiano, e seja presente, passado e futuro. Kelly Adriano de Oliveira. Doutora em Ciências Sociais pela Unicamp e mestre em Antropologia Social pela USP.
MART’NÁLIA partido-alto dias
28, 29 e 30 de agosto
Foto: Divulgação
Com mais de trinta anos de carreira, nove discos lançados, três dvd’s e diversas parcerias com grandes nomes da mpb, a cantora, compositora e percussionista Mart’nália vivenciou o samba desde cedo. Filha do compositor Martinho da Vila, desde muito jovem esteve presente nas rodas de samba das escolas Vila Isabel, Bonsucesso, Madureira e River. Neste show, apresenta repertório dedicado ao partidoalto, com obras de compositores consagrados, assim como outros menos conhecidos do grande público, mas que tiveram grande contribuição para o samba do Rio de Janeiro.
PART IDO-ALTO
O partido-alto é um tipo de samba improvisado, com versos feitos na hora, admitindo a participação de qualquer pessoa da roda de samba. Justamente por seu caráter improvisativo, essa manifestação tem como característica o fato de não ser completamente autoral, visto que sua criação é coletiva. Das três matrizes do samba carioca, o partido-alto é a que mais traz influência da cultura baiana, tendo tido destaque no bairro da Cidade Nova, no Rio de Janeiro, na casa de Tia Ciata e das outras matriarcas das famílias negras originárias da Bahia, figuras fundamentais do samba carioca. Normalmente possui uma estrofe repetida várias vezes e cantada em grupo, intercalada pelos versos de improviso dos partideiros.
Na década de 30, o partido-alto se alastrou nos morros cariocas. Entre um refrão e outro, os músicos iam criando os versos na hora, quase como repentistas. As antigas festas de partido alto às vezes duravam dias! A partir dos anos 70, meu pai, Martinho da Vila, virou um compositor marcante desse tipo de samba! O partido-alto tem esse jogo de palavras encaixadas e o pandeiro bem acentuado… fica meio uma conversa muitas vezes… um tirando sarro do outro… tristezas de amor mas sempre com humor…. A maioria da letra é o nosso cotidiano. Como dizia Candeia, o partido-alto é a expressão mais autêntica do samba! Mart’nália
REPERTÓRIO
Pra Mart’nália Agrião e Fred Camacho Cabide Ana Carolina Boto meu povo na rua Arlindo Cruz, Ronaldinho e Acyr Marques Mas quem disse que eu te esqueço Ivone Lara e Hermínio Bello de Carvalho Acreditar Ivone lara e Delcio Carvalho Sorriso negro Adilson Barbado, Jair de Carvalho e Jorge Portela Todo menino é um rei Roberto Ribeiro | Vazio Zé Luiz Na hora da sede Luiz Américo e Braguinha Casa 1 Monsueto | Tiro ao Álvaro Adoniran Barbosa e Osvaldo Moles Faixa amarela Zeca Pagodinho, Jessé Pai, Luiz Carlos e Beto Gago Tudo menos amor Martinho da Vila A flor e o samba | Parei na sua Martinho da Vila Beija, me beija, me beija Martinho da Vila Casa de bamba Martinho da Vila Nhem nhem nhem Martinho da Vila e Cabana | Segure Tudo Martinho da Vila Na aba do meu chapéu Martinho da Vila Fé Agrião e Evandro Lima Deixa a fumaça entrar Martinho da Vila e Beto Sem Braço
FICHA TÉCNICA
Mart’nália voz Analimar Ventapane voz Dandara Ventapane voz Humberto Mirabelli violão Rodrigo Villa baixo Guilherme Salgueiro percussão e cavaco Menino Brito percussão Raoni Ventapane percussão
Direção Marcia Alvarez Direção Musical Humberto Mirabelli, Menino Brito e Mart’nália Direção de Luz Marcia Alvarez e Lu Montanha Roteiro Marcia Alvarez e Mart’nália Figurino Beto Neves para Complexo B Produção Babel Produções
DONA IVONE LARA, ÁUREA MART INS E NILZE CARVALHO samba de quadra dias
25, 26 e 27
de setembro
Foto: Divulgação
A cantora, compositora e instrumentista Dona Ivone Lara é considerada a primeira mulher a compor um samba-enredo para uma escola de samba do Grupo Especial. Ela é madrinha da ala dos compositores de sua Escola, a Império Serrano, onde desfila desde 1968. Dona Ivone abriu espaço para muitas mulheres de sua geração e das seguintes por ter conquistado destaque nas rodas como intérprete e cavaquinista. Além da consagrada carreira artística, também desenvolveu importante trabalho ao lado da terapeuta Nise da Silveira, por quase quatro décadas, utilizando a música como elemento terapêutico.
Foto: Mariza Lima
Áurea Martins é parceira de Dona Ivone Lara, assim como de outros nomes do samba. Recebeu o troféu de Melhor Cantora no Prêmio da Música Brasileira de 2009. Seu primeiro compacto teve arranjos do maestro Guerra Peixe. Seu lançamento mais recente, o dvd Iluminate, (2012), contou com a participação de Chico Buarque.
Foto: Divulgação
A sambista e cavaquinista Nilze Carvalho recebeu o Prêmio Música Brasileira Samba da Lapa nas categorias Melhor Cantora e Melhor cd pelo álbum solo O que é meu. Há 15 anos integrante do grupo Sururu na Roda, a compositora, que recebeu influência de bambas do samba como Dona Ivone Lara, agora é destaque de sua geração.
SAMBA DE QUADRA
O samba de quadra (ou samba de terreiro) é aquele composto para os sambas na quadra da Escola de Samba fora do Carnaval (antigamente as escolas não tinham quadras, e sim chão de terra batida, o terreiro). Até a primeira metade do século XX, os desfiles do Carnaval apresentavam vários sambas de quadra antes do samba-enredo. Seus temas giram em torno da vida cotidiana e dos ambientes populares e seus variados assuntos, além de personagens típicos dos bairros suburbanos cariocas.
A palma que marca na própria palma Esquenta o terreiro e incendeia a alma O samba rasgado embala o meu sorriso Desata o laço e afasta o meu penar O brinde selado no copo estala Apura o sabor e tempera a fala A palma que marca na própria palma Esquenta o terreiro incendeia alma Trecho da composição na própria palma, de Dona Ivone Lara, Bruno Castro e Mauricio Verde
REPERTÓRIO
Alvorecer Dona Ivone Lara e Delcio Carvalho Benguelé Pixinguinha e Benedito Lacerda Minha vontade Chatim Bom dia Portela David Corrêa e Bebeto di São João Moema morenou Paulinho da Viola Liberdade Dona Ivone Lara e Delcio Carvalho Tem capoeira Batista da Mangueira Samba no quintal Everaldo Cruz e Toninho Nascimento Barraco de Mangueira Estudante | Verde e rosa Mauro Pereira | Sempre Mangueira Nelson Cavaquinho e Geraldo Queiroz Salve a Mocidade Luiz Abdengo dos Reis Pra lá pra cá Nei Lopes e Dauro do Salgueiro | Palmas no portão Dacri Luis e Walter Dionísio Nasci pra sonhar e cantar Dona Ivone Lara e Delcio Carvalho Foi um rio que passou em minha vida Paulinho da Viola Portela na avenida Mauro Duarte e Paulo Cesar Pinheiro Samba de roda pra Salvador Dona Ivone Lara Axé de Ianga Dona Ivone Lara Sereia Giomar Dona Ivone Lara e Delcio Carvalho Samba é minha raiz Dona Ivone Lara e Delcio Carvalho A cigana Dona Ivone Lara e Delcio Carvalho Nos combates desta vida Dona Ivone e Delcio Carvalho Candeeiro da vovó Dona Ivone Lara e Delcio Carvalho Tiê Tiê Dona Ivone Lara Sorriso negro Jorge Portela e Adilson Barbado
FICHA TÉCNICA Dona Ivone Lara voz Áurea Martins voz Nilze Carvalho voz Sarah voz PC Castilho sopros André Lara cavaquinho Hudson Santos violão Silvio Carvalho percussão Fabiano Salek percussão Diego Zangado bateria
T ERESA CRIST INA samba-enredo dias
16, 17 e 18
de outubro
Foto: Washington Possato
Uma das principais vozes do samba carioca, Teresa Cristina conquistou prêmios como o Rival BR e Tim de Música - cantora revelação, e foi indicada ao Grammy Latino de melhor disco de samba de 2003. Em 1998 iniciou sua trajetória como cantora profissional, apresentando-se em diversos países da Europa, África e Ásia. Em 1999, passa a dividir palco com o Grupo Semente, tornando-se um dos protagonistas do ressurgimento da boemia na região central do Rio de Janeiro. A cantora segue se dedicando à música por meio de projetos diversos. Seu álbum mais recente, lançado em 2010 com o grupo Os Outros, homenageia o cator e compositor Roberto Carlos.
SAMBA-ENREDO
O samba-enredo caracteriza-se por canções compostas nas escolas de samba, especialmente para os desfiles de Carnaval. Como o próprio nome diz, o samba-enredo apresenta uma narrativa, tendo como uma de suas características o tom épico e propício à dramatização para o desfile. Talvez seja a vertente do samba que mais sofreu modificações ao longo dos anos. Nasceu exaltando as cores da Escola com uma primeira parte pré-definida e a segunda improvisada. Com o surgimento dos carnavalescos e a escolha do enredo ficando nas mãos desses profissionais, o samba ganhou outras cores além de novos andamentos, por conta de questões extramusicais, como o tempo limite de duração dos desfiles.
Tenho uma relação afetiva com sambas de enredo desde cedo na minha vida. Cantar essas pérolas em um único show mexeu com minhas recordações, meu carnavais, minha infância. Estou diante de um repertório infinito de sambas belíssimos, gloriosos. Meu critério de escolha foi o coração e a minha memória. Ao me deparar com a escolha feita por mim, vi que separei sambas das décadas de 70 e 80, com exceção aos mais recentes da Portela, minha escola, e da Renascer de Jacarepaguá, onde conquistei meu primeiro estandarte de ouro como compositora de samba-enredo. Será um show pra cantar, dançar e se divertir. Pode apostar! Teresa Cristina
REPERTÓRIO
A criação do mundo Beija Flor (1978) Ziriguidum 2001 Mocidade Independente de Padre Miguel (1985) Bruxaria Mocidade Independente de Padre Miguel (1986) Os sertões Em Cima da Hora (1976) Tititi da Sapoti Estácio de Sá (1987) Brasil devagar com o andor Unidos da Tijuca (1983) Macobeba, o que dá pra rir dá pra chorar Unidos da Tijuca (1981) O que é que a baiana tem Imperatriz Leopoldinense (1991) E por que não Salgueiro (1987) 100 anos de abolição Mangueira (1988) Caymmi Mangueira (1986) A lenda das sereias Império Serrano (1976) Tiradentes Império Serrano (1949) Os imigrantes Império Serrano (1977) Aquarela brasileira Império Serrano (1964) Heróis da liberdade Império Serrano (1969) Bumbum paticumbum Império Serrano (1982) Domingo União da Ilha (1977) É hoje União da Ilha (1982) O amanhã União da Ilha (1978) Ilu Ayê Portela (1972) Macunaíma Portela (1975) Das maravilhas do mar Portela (1981) Hoje tem marmelada Portela (1980) Contos de areia Portela (1984) O mundo melhor de Pixinguinha Portela (1974) Imaginário, 450 janeiros de uma cidade surreal Portela (2015) Axé Candeia Renascer de Jacarepaguá (2015)
FICHA TÉCNICA Teresa Cristina voz João Callado cavaquinho Bernardo Dantas violão Trambique percussão Paulino Dias percussão Esguleba percussão Mingo vocal e percussão
Sesc Rua Pelotas, 141, CEP 04012-000 Vila Mariana TEL.: +55 11 5080 3000 email@vilamariana.sescsp.org.br
sescsp.org.br/vilamariana
Ana Rosa 750m
ParaĂso 1000m