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na província de ouro, nem tudo o que luz... é riqueza. Bem pelo contrário

No retrato de uma província tantas vezes esquecida, é importante lembrar que “nem tudo o que luz é ouro”. E o adágio popular parece assentar que nem uma luva ao que se vive e se vê, ainda hoje, por toda a Província de Manica

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a nível nacional, Manica é considerada a província de ouro, porque é lá onde este metal precioso mais abunda. No entanto, o desenvolvimento tarda em acontecer, até porque este recurso só enriquece verdadeiramente os garimpeiros ilegais (nacionais e outros vindos de países vizinhos, como malauianos e zimbabueanos), e pouco acrescenta à balança comercial de uma província onde ainda são poucas as empresas formais que se dedicam à exploração deste precioso minério. Sabendo que, em termos de produção, a Província registou nos últimos cinco anos uma evolução gradual que se elevou províNcia mAniCA

capital Chimoio área 61 661 km² Número de habitaNtes 21 911 237 região Centro

dos 75 quilogramas, reportados em 2015, até aos 457 quilogramas do ano passado, continua a verdade corrente por aquelas bandas que este resultado fica, ainda assim, demasiado aquém da real produção extraída dos rios e minas de Manica.

riqueza informal Existe, inclusivamente uma estimativa mais ou menos oficial, que atesta esta realidade, e de que a quantidade reportada andará mesmo pela casa dos 20% de um total que ninguém verdadeiramente pode estimar.. Dados obtidos pela E&M junto de fontes locais apontam que a extracção artesanal

de ouro em Manica é a principal actividade informal no domínio da exploração de recursos minerais na Província. Ali, os garimpeiros é que ditam as leis, não as autoridades, sendo que a Polícia não penetra no seu território sem avisá-los. “Os zimbabueanos, na sua maioria, saqueiam o ouro a seu bel-prazer em áreas concessionadas pelo Estado e, claro, Moçambique nada ganha com o negócio”, diz-nos uma fonte do governo provincial que prefere permanecer não identificada. Até por esta percepção de alguma informalidade excessiva, tem havido movimentações para devolver alguma ordem à exploração de ouro na região. Ainda recentemente, com o anúncio da instalação de um entreposto comercial para a compra e venda de ouro por parte da Empresa Moçambicana de Exploração Mineira (EMEM), detida pelo Estado, um dos exemplos de investimentos em curso na área do garimpo. Por via disso, o Governo de Manica acredita estar na formalização da actividade “a real solução para a captação de maiores receitas por parte do Executivo local.” Contactada a Direcção Provincial de Recursos Minerais e Energia de Manica, esta disse à E&M que a exploração do ouro naquele ponto tem registado “uma evolução significativa em termos de quantidade”, mas assinala também que o que tarda “são as receitas”, algo que atribui “à proliferação de garimpeiros ilegais”, dizem-nos. “Não podemos afirmar que as receitas que conseguimos correspondem ao potencial do ouro existente, acho que é uma parte daquilo que devia ser”, considera Silva Manuel, director provincial de Recursos Minerais e Energia, para depois sublinhar que “ainda não nos sentimos confortáveis porque a nossa área é vasta e tem muita gente a trabalhar também de forma ilícita.” Um estudo feito pelo Observatório do Meio Rural (OMR), em 2016, intitulado “Exploração Artesanal em Manica”, refere que durante a era colonial, a produção de ouro chegou a ser feita em escala empresarial, proporcionando emprego às populações locais, tendo baixado durante a guerra civil do pós-independência (19761992), pelo facto de muitos trabalhadores se terem refugiado nos países vizinhos. E as minas de ouro de Mimosa e Munhena, no distrito de Manica, de Bandire e de Tsetsera, no distrito de Sussundenga, e de Ngwawala, no distrito de Macossa, são até consideradas as cinco maiores minas de ouro no país.

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É o número de empresas que detêm licenças de exploração. no entanto, deste número, apenas 20 É que estão a operar

A insuficiência das receitas provenientes da exploração tem também a ver com a localização das explorações de ouro junto à fronteira, não havendo para tal um controlo efectivo das fronteiras. “Temos esse problema, pois é uma área vasta e não conseguimos controlar tudo, porque isso significa que todo o minério devia ser vendido em Moçambique e não havendo contrabando. Mas a fronteira está aberta, temos controlo, mas não podemos dizer que é fácil fazer um controlo efectivo de toda a extensão”, justifica Silva Manuel. No entanto, este está longe de ser um mal exclusivamente nacional. Segundo uma pesquisa realizada pelo CDI EU-ACP (Centre for Development of Industry European Union, Africa Caribbean and Pacific) sobre o sector de mineração de pequena e média escala em África, a nível mundial, um quarto do ouro é produzido pelos sistemas de mineração artesanal ou de pequena escala. Em Maninca, a maior parte do ouro é, todos o assumem, explorado em moldes artesanais e exportado ninguém sabe bem para onde. E este é um segmento que até tem crescido, sendo que hoje o garimpo ilegal de pequena escala atrai cada vez mais gente, de camponeses locais a migrantes que vêm do estrangeiro em busca de uma oportunidade (dourada) de enriquecer, sujeitando-se, por vezes, a condições de vida desumanas.

Fraca fiscalização A E&M contactou o Conselho Empresarial (CEP) de Manica, que, simplesmente, não hesitou em apontar “a falta de fiscalização das áreas de exploração mineira” como a principal razão para a informalidade que tomou conta do sector da mineração de ouro, com resultado nas parcas receitas que a Província de Manica consegue angariar por via deste recurso tão abundante por ali. E não é só pelo garimpo ilegal, explica Samuel Guisado, presidente do CEP-Manica, pois, prossegue, “se olharmos para o nível do investimento feito pelas empresas que exploram ouro, notamos que não corresponde aos relatórios que eles publicam. Isto significa que o ouro que está realmente a ser produzido não corresponde ao que está a ser reportado pelas empresas. Depois, estamos a assistir a um nível de poluição crescente que está a contaminar rios e campos agrícolas” reitera a fonte, sublinhando que “até aquelas áreas que estavam definidas para a produção agrícola já estão todas ocupadas,

província

Poluição é evidente em muitos dos canais de água da Província, devido ao garimpo desenfreado

mas não sabemos quem as ocupou”. Ainda assim, para o sector empresarial nem tudo está perdido, visto que é possível haver uma solução para inverter esse cenário. Para tal, o CEP-Manica enumera um conjunto de relatórios que mostram ser possível uma maior fiscalização desses grupos que fazem exploração mineira, bastando para tal a vontade do Governo provincial “em apertar o cerco”.

mais do que ouro Diga-se, em abono da verdade, que não é só pelo ouro que Manica é reconhecida, uma vez que existe abundância de outros metais preciosos e pedras ornamentais, como o granito, que no entanto ainda pouco pesam nas contas gerais da Província. Numa visita recente à região, o Presidente Filipe Nyusi não escondeu a sua satisfação com o que viu e leu nos documentos apresentados em várias reuniões e, por isso, na inauguração da fábrica de processamento de granito nos arredores de Chimoio, dizia que “apesar da crise e dos problemas, as coisas em Manica e no país estão a acontecer”. A fábrica de processamento de granito, extraído nas minas de Moatize em Tete e Sussundenga em Manica, é disso exemplo. Trata-se de um investimento de cerca de 10 milhões de dólares de um total de 30 milhões que a proprietária da Helnin Mining pretende investir em Moçambique. Toda a cadeia de produção emprega perto de 200 pessoas e a fábrica terá capacidade de processar mais de 900 mil toneladas de granito por ano. Parte do produto final será comercializado localmente, mas a quase totalidade da produção será destinada à exportação para a Ásia e para a Europa. No entanto, também ao nível do agro-negócio, Manica apresenta-se como grande produtora de banana mas, dizem-nos, “com um enorme potencial por explorar”, no sentido de catapultar o desenvolvimento local através de uma cadeia de processamento e comercialização.

“O ouro que está a sair da Província não corresponde ao que está a ser reportado pelas empresas. E depois, estamos a assistir a um nível de poluição crescente que está a contaminar rios e campos agrícolas”

OPINIÃO

A inteligência assente nos dados. Que passos dar em Moçambique?

Bruno Dias • Associate Partner, EY Moçambique

a inteligência artificial é habitualmente definida como a capacidade de uma máquina realizar funções cognitivas, tipicamente associadas à mente humana como a percepção de fenómenos, o raciocínio, a aprendizagem e a resolução de problemas. A proliferação de dados e o aumento significativo da capacidade computacional e de storage catapultaram a Inteligência Artificial de um conceito exótico para a realidade. Lembro que os utilizadores de devices electrónicos geram 2,5 quintiliões de dados por dia e que 90% dos dados existentes no mundo foram produzidos nos últimos dois anos. Em cada minuto os utilizadores do Youtube vêem quatro milhões de vídeos e os utilizadores móveis enviam mais de 15 milhões de mensagens em diversas apps. Com o auxílio de algoritmos de “machine learning” podem detectar-se padrões e fazer predições e recomendações, processando dados em vez de seguirem instruções de programação tradicionais. Estes algoritmos também se adaptam em resposta a novos dados e experiências para melhorar a sua eficiência com o tempo. Os modelos podem, portanto, ser preditivos para antecipar ou prever acontecimentos e utilizados como fontes de insight para tomada decisões ou, de forma prescritiva, dando recomendações para atingir objectivos e metas. Ao nível corporativo é particularmente útil a detecção de padrões, utilizando dados estruturados das várias bases de dados corporativas ou não estruturados, como os existentes em redes sociais. É uma ferramenta poderosa de identificação das melhores ofertas e da propensão de consumo de vários clientes, que podem fazer a diferença no aumento das vendas e na captação de outros elementos de valor empresarial. Se alguma vez fez uma busca no Netflix ou comprou na Amazon, seguramente que um algoritmo de inteligência artificial foi usado para o auxiliar no seu processo de decisão. Se alguma vez se intrigou porque aparecem pop-ups para destinos de viagem ou para um produto que, por acaso, está neste momento a ser equacionado em sua casa, tenha a certeza que foi baseado em algoritmos que monitorizam a actividade online. Outras áreas complementares de utilização de inteligência artificial nos domínios corporativos com impacto na top-line são, por exemplo, a optimização e personalização do pricing, a qualificação de oportunidades, o up-sell e cross-sell de produtos e a gestão de performance. A transformação digital e o novo perfil de consumidor - mais bem informado e exigente - são igualmente forças motrizes na introdução deste paradigma, e na construção de um novo modelo de relacionamento com os clientes, que implica conhecer as suas preferências e fornecer um atendimento personalizado e proactivo. Estas capacidades são particularmente relevantes em sectores com elevado nível de relacionamento com o consumidor final, como o retalho, o turismo, a banca e seguros e as telecomunicações. Complementarmente, estes modelos analíticos podem igualmente focar-se na optimização do bottom line e em problemas operacionais específicos, como por exemplo: optimização de rotas, manutenção preditiva, de custos com combustível e previsão de gastos de energia. O espectro alarga-se a outros sectores como a indústria, os transportes e a energia. Para quem viu o “2001 Odisseia no Espaço”, de Stanley Kubrick, o computador “HAL” era apenas um devaneio de ficção científica, mas hoje para aí caminhamos a passos céleres. Em Moçambique, este tema ainda é embrionário, mas os dados existem quer nas bases de dados corporativas, ou em repositórios de informação externos como as redes sociais. Cabe aos vários gestores decidir por encurtar etapas e implementar, desde já, este tipo mais diferenciado de analítica nos seus planos empresariais. Afinal, Moçambique já o soube fazer de forma pioneira, em outras áreas, como os pagamentos móveis. Uma vez que é comum, hoje em dia, dizer que “os dados são o novo ouro ou petróleo”, é importante tirar partido também deste recurso, em paralelo com os mega projectos extractivos, nesta interessante senda de crescimento que se avizinha.

Os modelos podem ser preditivos para antecipar ou prever acontecimentos e utilizados como fontes de insight para tomada decisão ou, prescritivos, meios para atingir objectivos e metas

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