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nação
Dar créDito... ao créDito
A importância do crédito como propulsor de crescimento económico mas, sobretudo, do desenvolvimento é um dado adquirido. O problema está em criar o enquadramento para o fazer... desenvolver-se, baseado numa estrutura dotada de recursos em termos de volumes, prazos, taxas de juros e fornecedores. Um ecossistema que, em Moçambique, ainda tem tantas pontas soltas, como becos sem saída. Mas o cenário está a mudar e já há sinais disso, no aumento do crédito ao consumo e nos produtos direccionados às PME
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os bancos tȇm plena cons-
ciência do tema, algo que é evidenciado pelo ‘peso pluma’ das PME nas carteiras totais de crédito da banca de retalho (que varia entre 1% e 15%). As PME desempenham um papel importante no desenvolvimento económico do país. As estatísticas são conhecidas, e mostram que elas constituem 98,7% do total das empresas em actividade, proporcionando a grande maioria das oportunidades de emprego no país. De acordo com o Banco de Moçambique (BdM), o sector de microfinanças conta com mais de 300 instituições, embora a grande maioria não esteja, de facto, activa. Há também dois bancos comerciais que têm como alvo o sector de microfinanças, o Socremo e o Banco Oportunidade. “De acordo com o registo dobanco central, as instituições de microfinanças (IMFs) incluem dez micro bancos, oito cooperativas de crédito,12 organizações de poupança e empréstimos e 285 operadores de microcrédito, que incluem cooperativas e organizações de base comunitária, como as associações de finanças rurais e Associações Cooperativas de Crédito (ASCAs), conhecido em Moçambique como crédito rotativo e grupos de poupança)”, descreve Oldemiro Belchior – Head of credit risk do banco Moza, que escreveu um livro sobre acesso ao financiamento das PME em 2015. “Os quatro bancos comerciais que operam no sector fazem empréstimos maiores para menos clientes. As instituições que se concentram na extremidade inferior do mercado servem a maioria
3,7
mil milhões de meticais é o volume de crédito concedido a empresas nos dois primeiros meses do ano
dos clientes, que respondem por 46% dos clientes activos.” A E&M foi pesquisar nos websites das principais instituições financeiras. Boa parte delas tem iniciativas e produtos na área do crédito às PME (do adiantamento de facturas a contas caucionadas, por exemplo), mas são, ainda hoje, iniciativas isoladas, que impossibilitam uma avaliação mais global. Surge então a questão: a oferta destes produtos de crédito é adequada e suficiente para promover o desenvolvimento de forma uniforme do sector empresarial? A resposta é ampla. Há essencialmente quatro grandes formas de financiamento à economia: Financiamento Estruturado, Mercado de Capitais, Capital de Risco e Fundos de Desenvolvimento e de Garantia. O Ministério das Finanças,
Nação
O créditO
depois de em 2017 o crédito ao sector privado ter registado uma redução acentuada, em 2018 assistiu-se a uma relativa recuperação deste agregado
Em milhares de milhões de meticais
219,8
17,528 44,609
Crédito Total Moeda Nacional
Moeda Estrangeira
indústriA finAnciA-sE
Em milhares de milhões de meticais
energia, gás, água
pescas
turismo
habitação
agricultura
indústria extractiva
indústria transformadora
transportes e comunicações
comércio
particulares
outros 2
4
7
11
10
11
23
26
29
47
49
FONTE Banco de Moçambique (BdM) indústria transformadora foi a que mais cresceu ao nível da concessão de crédito, em 2018
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liderado por Adriano Maleiane, seguiu uma estratégia iniciada em 2015 quando a economia dava sinais de abrandar. “As acções ou reformas que foram feitas para facilitar o acesso ao crédito passaram, numa primeira fase, pela construção de filiais do Banco Central em todas as províncias do país com vista à redução do custo de transporte de numerário e supervisão preventiva das instituições de crédito. Depois, a criação da SIMO-Sociedade Interbancária de Moçambique, de um banco de desenvolvimento (BNI) como instrumento do Estado para o financiamento, a extensão de fornecimento
27%
Foi quanto cresceu o crédito concedido à indústria transFormadora no ano passado. a tendência mantémse este ano
de energia a todos os distritos do país e a introdução da prime rate única que traz uma maior transparência na sua determinação”. Feita a base, falta o resto: “Agora há que dinamizar o funcionamento do mercado primário de títulos, proceder à criação de mais Sociedades de Capital de Risco, estimular o desenvolvimento de produtos derivados especialmente para cobertura da taxa de juro e de câmbio, criar uma Central de Registo do Crédito Comercial e acentuar o papel do Estado na redução de riscos e incerteza através da criação de um bom ambiente de negó-
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cios, partilhando alguns dos riscos com os bancos. Devemos também estabelecer incubadoras de negócios e unidades de transformação do sector informal em formal.” Claro que o abrandamento económico que se viveu desde 2015 não ajudou os níveis de crédito à economia a crescer. Bem pelo contrário. Eles contraíram até ao ano passado nos cinco maiores bancos nacionais (BCI, Millennium bim, Standard Bank, Barclays Bank e Moza) embora menos do que em anos anteriores e, nos casos do Moza e do Barclays, até ter aumentado, pela primeira vez em largos anos de análise. ano novo, crédito novo No entanto, o início deste ano trouxe algumas boas notícias, especialmente nos volumes de crédito concedido ao sector privado, que ilustram uma tendência para a recuperação, contrariando a trajectória negativa de anos anteriores marcados por um grande volume de emissões de títulos de dívida pública, com vista ao financiamento do défice das contas do Estado. Nos primeiros dois meses do ano, o crédito concedido às empresas públicas e privadas foi de cerca de 3,7 mil milhões de meticais, com o endividamento do sector privado a situar-se nos 2,5 mil milhões de me-
Nação
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Banco central tem reduzido as taxas de juro consistentemente, tentando impulsionar o crédito
ticais, um incremento em 1,3%, e o ramo empresarial públicos não financeiro a registar um fluxo de 1,2 mil milhões de meticais, mais 8% do que no período homólogo. O Banco de Moçambique refere que a melhoria deste indicador reflecte “a redução das taxas de juro dos empréstimos e o aumento da confiança do sector empresarial. O BdM reviu em baixa, no ano passado, a taxa MIMO por quatro vezes, num total acumulado de 525 pontos base (pb), para 14,25%, e incrementou o coeficiente de RO para os passivos em moeda estrangeira em 1 300 pb, para 27%, no fecho de 2018. Em linha com a queda da taxa MIMO, as demais taxas de juro do Mercado Monetário Interbancário (MMI) e as taxas de juro praticadas pelos bancos comerciais nas transacções com o público também reduziram. Assim, a queda das taxas de juro, associada ao pagamento dos atrasados de bens e serviços públicos pelo Estado na parte final do ano, permitiu reforçar a capacidade financeira das empresas, contribuindo para a relativa recuperação do crédito bancário à economia, num contexto de queda do crédito malparado.” No entanto, e ainda de acordo com o Banco Central, o crédito às famílias continua desfavorável ao aumento do consumo, a avaliar pelo seu elevado grau de endividamento e pelos níveis das taxas de juro de empréstimos. Concretamente, entre Janeiro e Fevereiro, o crédito bancário às famílias foi de apenas 295 milhões de meticais (mesmo assim, regista uma apreciação face ao ano passado). Depois de em 2017 o crédito “Queda das taxas de juro, associada ao pagamento dos atrasados de bens e serviços públicos pelo Estado na parte final do ano, permitiu reforçar a capacidade financeira das empresas”
ao sector privado ter registado uma redução acentuada, em linha com uma procura agregada inexpressiva, em 2018 assistiu-se a uma relativa recuperação deste agregado, ao apresentar um fluxo acumulado de -5 800 milhões de meticais (-2,6%), após -35 398 milhões de meticais (-13.6%) um ano antes. Em termos de moeda, a componente em moeda estrangeira reduziu em 5 217 milhões de meticais (o equivalente a menos 118,5 milhões de dólares), perante menos 583 milhões de meticais do crédito concedido em moeda nacional. A distribuição do crédito por sectores de actividade mostra um crescimento do crédito para a indústria transformadora (27%), particulares (6,2%) e turismo (9%), perante uma manutenção do saldo da indústria extractiva, sectores
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Nação
2018: EMPrEsAs cOM MAis créditO...
Primeiros dois meses do ano mostram aumento
Em milhares de milhões de meticais
crédito a empresas
crédito ao consumo 3,7 0,2
... sEgUindO A tEndênciA
Crédito malparado fez abrandar o mercado
Em milhares de milhões de meticais
2016 75 18 7
2017 74 19,1 6,9
2018 71 19,1 6,9
Empresas Particulares Públicas
FONTE Banco de Moçambique (BdM)
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Martin Mandivenga, cEO da Britam, fala de um seguro desenhado para “impulsionar” o crédito às PME
que também impulsionaram o crescimento do PIB em 2018. Os restantes continuam, ainda, com variações negativas. Adicionalmente, o sector privado recebeu financiamento externo no valor de 1 667 milhões de dólares dos quais 922 milhões foram contratados pelos grandes projectos e 745 milhões de dólares pela restante economia (um incremento de 590 milhões face a 2017). No mesmo período, os reembolsos totalizaram 227 milhões de dólares. Assim, em 2018, o rácio do crédito face ao PIB reduziu ligeiramente e o dos depósitos aumentou, facto a que o BdM associa “a acção da moeda electrónica (M-Pesa, mKesh e e-Mola) que nos últimos anos tem vindo a retirar parte do numerário em circulação.” a importância das seguradoras As companhias de seguros desempenham igualmente um papel importante dentro do ecossistema de financiamento das PME de duas formas principais: protegem-nas de perdas, compartilham os riscos com os credores e podem (ou deveriam) criar produtos para melhorar o seu perfil de risco, geralmente no apoio às actividades de crédito. No entanto, isso pouco acontece no mercado nacional. A Britam será uma das excepções a essa lógica. Com o lançamento do Seguro de Crédito Comercial em Moçambique, a seguradora lança um produto a que apelida de “missing link” entre a banca e as empresas, nomeadamente as PME em busca de crédito mais acessível. “Este seguro é
não é só a banca que tem um papel principal no aumento da concessão de crédito à economia, mas também as seguradoras
uma protecção contra o risco de não pagamento quando os fornecedores concedem condições de crédito aos clientes em que a Britam indemniza entre 80% a 90% pela perda financeira gerada pelo não pagamento das facturas. Os fornecedores podem conceder prazos de crédito a clientes locais e estrangeiros e o Seguro de Crédito Comercial pode fornecer cobertura independentemente da domiciliação do comprador. É estruturado de tal forma que se adapta à estrutura de negócios do fornecedor e, portanto, podemos fazer uma apólice à medida. A oferta de produtos inclui o Seguro de Crédito para o Comércio doméstico, de exportação, de desconto e, ou, compra de facturas e de financialmento à cadeia de suprimentos”,
explica Miguel Jóia, consultor especialista da seguradora. “Somos a primeira companhia no mercado a oferecer esta solução. No seguro sobre o adiantamento de facturas, por exemplo, temos já uma base de dados das grandes empresas e dos seus níveis de rating. Se temos um fornecedor que tem uma factura para receber e uma empresa de ‘rating A’, nós asseguramos esse crédito junto do banco. O grande factor diferenciador aqui é que, por um lado, as PME vêem facilitada a cobertura do seu crédito e os bancos, por outro, asseguram uma garantia nos empréstimos”, explica Martin Mandivenga, CEO da seguradora em Moçambique. O seguro abrange um conjunto amplo de serviços: a falha de um comprador em pagar uma dívida segurada indiscutível relacionada com bens ou serviços para os quais o devedor aceitou a entrega a seis meses, a contar da data de vencimento. Depois, há um Seguro de Crédito para Compra de Recebíveis (Factoring ou Desconto de Facturas) em que a apólice é destinada aos bancos dispostos a liquidar facturas de fornecedores antes da data de vencimento. E há ainda um Seguro de Crédito de Supply Chain Finance com apólice direccionada a Bancos que desejam liquidar facturas de fornecedores antes da data de vencimento. “A Britam monitora e envolve os devedores segurados, e usa a experiência de outros fornecedores para aconselhar o fornecedor, caso o risco de crédito do comprador se deteriore durante o prazo da apólice. Este seguro de crédito Bancos, seguradoras e empresas devem trabalhar juntas no sentido de se criar um verdadeiro ecossistema financeiro que propicie o aumento do volume de crédito concedido, especialmente às PME nacionais
dá ao segurado a confiança necessária para explorar oportunidades de negócios de maior risco, que normalmente evitariam por medo de não pagamento e protege o fluxo de caixa do segurado. E o titular da apólice economiza custos ao investigar os seus devedores, já que isso será feito pela seguradora”, prossegue.
resolver malparado Claro que um dos eixos insuficientes do mercado era a incapacidade de cobrança de malparado. As dificuldades são bem conhecidas do sistema financeiro. O que levava José Reino da Costa, PCE do Millennium bim, a incorporar a opinião de tantos outros gestores bancários, quando recentemente, em entrevista à E&M, dizia que “antes do mais, as empresas
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Nação
POr OndE crEscE O créditO
Há várias opções em cima da mesa das PME nacionais
financiamento Estruturado
efectuado com base em fluxos de caixa e apresentação de relatórios financeiros e histórico da empresa.
Mercado de capitais
iPo’s, oPv’s, oPa’s, oPd’s de acções; obrigações; papel comercial; instrumentos financeiros híbridos. tem a vantagem da transparência, credibilidade e reputação empresarial; reforço de liquidez; alargamento da base accionista.
capital de risco
reforço da estrutura financeira da empresa; facilitação do acesso a outras fontes de financiamento; sinalização sobre a credibilidade da empresa; acesso a assistência técnica; partilha de risco com o financiador.
fundos de desenvolvimento e garantia
estruturação e bancabilização dos projectos de micro e pequenos empreendedores; financiamento de projectos a taxas bonificadas; fundos de garantia de crédito. tem a vantagem da viabilização de projectos com baixa viabilidade financeira, mas com elevada viabilidade social com vista à inclusão financeira e com taxas de juros bonificadas.
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celso Poio, director geral da Octus. diz que a “recuperação de crédito torna-se um mercado apetecível”
devem gerir as suas operações com base no valor gerado e não apenas recorrendo ao crédito bancário”. E, de facto, foi o que muitas fizeram, o que levou o malparado dos principais bancos para níveis insustentáveis nos últimos anos. Situado abaixo dos 6% em Dezembro de 2016 o Rácio de Crédito em Incumprimento (NPL) disparou atingindo um pico de 13,8% no último trimestre de 2017, tendo fechado o ano na casa dos 12%. Também por isso, surgiram, nos útimos anos, algumas empresas de recuperação de crédito, como a WST - We Solve That ou, desde 2015, a Octus. Celso Poio sempre trabalhou na banca e nas telecomunicações nos departamentos de crédito, o que naturalmente o levou à percepção de que parte importante do que a banca considerava perdida era recuperável. “Havia ali uma grande oportunidade”. Foi por isso que criou a Octus, uma empresa de recuperação de crédito. O primeiro cliente foi o Moza Banco, tendo-se seguido outros grandes clientes, como o Millennium bim. E não ficou por aqui, trabalhando na recuperação de activos de grandes empresas como a CDM, por exemplo. “As taxas de sucesso na recuperação de crédito são elevadas num processo que envolve duas etapas: o rastreamento (procura pelo devedor) e a cobrança (recuperação). Ocorre que, na maior parte dos casos, chegam à Octus situações em que se perdeu o rasto ao cliente e esta etapa é a mais difícil. É por isso que, na cobrança, a Octus fica com uma percentagem que pode ir até aos 39% do crédito do devedor”, explica o gestor. Graças a este sucesso, a empresa deu um salto para uma carteira de 700 milhões de meticais de crédito malparado, desde o início das operações. Foram também as dificuldades do mercado que levaram ao surgimento, também recente, da Compuscan, o primeiro bureau de crédito. “Os bureaus de crédito fornecem dados e informações ajudando a prever riscos e a reduzir fraudes, através de relatórios, pontuações de crédito, verificações de identidade, avaliações de acessibilidade”, explica Lara Cangi, responsável da empresa em Moçambique. Taxas de juro a baixar, PME mais bem preparadas, seguros sobre o crédito, informação interligada e completa e novos instrumentos de recuperação do malparado levam a pensar que o panorama do crédito, especialmente às PME, só pode vir a melhorar.
texto Pedro Cativelos & Celso Chambisso fotografia Jay Garrido & istoCk Photo
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Na voz de...
moçambique, Portugal e Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) assinaram, em Novembro passado, o Compacto Lusófono, um instrumento que dá acesso a financiamentos do BAD combinados com garantias da Sociedade para o Financiamento do Desenvolvimento (SOFID). Assim, cerca de 400 milhões de euros em garantias serão destinados a apoiar o desenvolvimento de 25 projectos de investimento transformadores da economia, direccionados a PME a actuar em sectores estruturantes como a Educação, Turismo, Energia, Agricultura e Infra-Estruturas. Teresa Ribeiro, Secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação de Portugal, explica à E&M o que representa este instrumento financeiro e como pode ajudar a economia nacional a atingir os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável fixados na Agenda 2030 das Nações Unidas.
O que mudou, em termos de financiamento da cooperação para o desenvolvimento, com a Agenda 2030?
A Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD), assente em recursos públicos dos Estados doadores, foi, até 2015, a grande fonte de financiamento da Cooperação para o Desenvolvimento. Mas a agenda 2030, ao consagrar 17 Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, veio alterar as necessidades de financiamento. A APD representa anualmente, no conjunto dos doadores, algo como 148 mil milhões de dólares. Para executar a Agenda 2030 é necessário um valor entre 3,3 mil milhões a 5,5 mil milhões de dólares por ano. Para isso, e porque a ajuda tradicional dos doadores não chega, temos de recorrer ao investimento privado,
Há qUATROPILARES vITAISEM qUEASSENTA OCOMPACTOLUSóFONO: ASSISTêNCIATéCNICA, PASSOESSENCIAL PARAAvALIARA BANCABILIDADEDO PROjECTO, MITIgAçãO DERISCO, PORqUE ESTAMOSAINvESTIR EMPAíSESPOR vEzES COMRISCOELEvADO, FINANCIAMENTOE DISSEMINAçãODE OPORTUNIDADES, O qUE PODERá vIRASERUMA ESPéCIEDEFóRUMPARA TROCADEExPERIêNCIAS EPARTILHADELIçõES APRENDIDAS
se queremos criar uma dinâmica progressiva e de prosperidade nos países nossos parceiros de cooperação.
E qual o papel da Ajuda Pública ao Desenvolvimento neste novo paradigma? Continuará a ser fundamental, investindo em Educação, Saúde, Capacitação Institucional, na boa governação e no estabelecimento de um ambiente de negócios favorável ao investimento. é importante associar o investimento público ao privado e a políticas públicas coerentes. Só assim podemos enfrentar os grandes desafios do desenvolvimento sustentável.
É assim que nasce o Compacto Lusófono?
Ele nasce de uma visita que o Presidente do BAD, Akinwumi Adesina, fez a Portugal em 2018. Atendendo às características da instituição, com especiais responsabilidades em áfrica e olhando para os países que, no continente falam português, percebemos que os elementos comuns entre os PALOP permitiriam sinergias interessantes. Assim, assinámos a primeira declaração de intenções na Cimeira do Sal, em Cabo verde, em julho de 2018. E em Novembro do mesmo ano, no contexto do African Investment Forum, assinámos o Compacto Lusófono.
Quais são as características deste novo instrumento financeiro?
Assenta em quatro pilares vitais: assistência técnica, passo essencial para avaliar a bancabilidade do projecto, mitigação de risco, porque estamos a investir em países por vezes com risco elevado, financiamento e disseminação de oportunidades, o que poderá vir a ser uma
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Na voz de...
espécie de fórum para troca de experiências e partilha de lições aprendidas.
Moçambique foi o primeiro país a aderir ao Compacto. Porquê?
Sim, em Março estive em Moçambique em visita oficial, e foi realizada a assinatura do Compacto específico para o país, entre Portugal, o vice-Presidente do BAD, Mateus Magala, um entusiasta deste instrumento financeiro, e o Ministro das Finanças de Moçambique, Adriano Maleiane. A assinatura foi também simbolicamente realizada numa sessão, com a participação maciça de empresários moçambicanos, portugueses e luso-moçambicanos, organizada pela Câmara de Comércio Moçambique-Portugal.
E como é que Portugal participa?
Portugal manifestou disponibilidade para mobilizar diversos instrumentos em prol da concretização do Compacto Lusófono, seja através de assistências técnicas, seja pela mobilização de financiamento ou outros apoios ao investimento privado. A Sociedade para o Financiamento do Desenvolvimento terá aqui um papel fundamental na mobilização dos instrumentos e no desenvolvimento dos projectos que são apresentados ao BAD. Por outro lado, Portugal inscreveu no seu Orçamento deste ano 400 milhões em garantias para projectos no âmbito do Compacto, permitindo assim que o Banco Africano de Desenvolvimento vá mais longe no seu financiamento. Pretendemos promover as condições para que apareçam bons projectos de investimento privado nos países lusófonos em áfrica. Muitas vezes o problema do desenvolvimento sustentável não é financiamento, é a falta de bons projectos que sejam consistentes na criação de emprego.
Como se realizam as candidaturas?
já há vários projectos apresentados em sectores como a educação, turismo, energia, agricultura e infra-estruturas. Terão agora de ser trabalhados com os investidores, com o governo moçambicano e com os financiadores para que sejam devidamente estruturados. Este é um trabalho que está em curso.
Quem vai gerir o financiamento?
Os projectos apresentados para financiamento no âmbito do Compacto, através da SOFID ou via Banco Africano de Desenvolvimento, serão acompanhados pelas estruturas destas instituições ”PORTUgALINSCREvEUNOSEUORçAMENTODESTE ANO 400 MILHõESEM gARANTIASPARAPROjECTOS NO âMBITODO COMPACTO, PERMITINDOASSIM qUE O BAD vá MAISLONgENOSEUFINANCIAMENTO”
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localmente, mas também em Abidjan e em Lisboa, dando todo o apoio aos investidores.
Podem estes projectos ajudar à recuperação económica de Moçambique?
Moçambique só tem a ganhar com o investimento privado, sobretudo nesta fase de reconstrução pós-ciclones, e nesse sentido o Compacto pode ser uma grande oportunidade para o país e para a reconstrução das zonas afectadas. Será possível recuperar habitações e infra-estruturas e tornar a agricultura mais resiliente, estudada para resistir às alterações climáticas que fustigam o país. O Compacto surge num momento importante para Moçambique, foi assinado na véspera da passagem do ciclone Idai, acredito que vá criar esperança.
Portugal mobilizou-se na ajuda a Moçambique, há noção do volume total dessa ajuda?
Enviámos para Moçambique ajuda de emergência, equipas de resgate e salvamento e equipas médicas que ainda estão no terreno, bem como muito material. Ainda não apurámos os valores totais mas creio que podemos considerar que, no imediato, terão sido cerca de 4 milhões de euros em ajuda de emergência e humanitária. E continuamos presentes na fase de reconstrução, na reabilitação das escolas, postos de saúde, agricultura, infra-estruturas, mas também na revitalização da actividade económica e na recuperação de empresas, através de instrumentos financeiros como o Investimoz, o FECOP e o Compacto,
Nasceu em Moçambique, como é que isso influenciou a sua vida?
Sim, nasci em Moçambique e tenho um carinho especial pelo país. Passei aí uma parte muito importante da minha infância e juventude, o que se tornou relevante na pessoa que eu sou hoje e no modo como olho o mundo. Moçambique foi essencial na minha formação, na minha mundividência e continua a influenciar a minha relação com áfrica.
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