E&M_Edição 59_Abril 2023 • Grafite - Como Estamos a Escrever a Nossa História no Mercado?

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AGRO-NEGÓCIO

COMO VAI FUNCIONAR O FUNDO DE RESILIÊNCIA

CRIADO POR GAPI-SI E USAID PARA AS PME?

INOVAÇÕES DAQUI

TENDÊNCIAS DAS HEALTHTECHS E O SEU PAPEL NA EVOLUÇÃO DO TRATAMENTO DE DOENÇAS

GAFI

MOÇAMBIQUE QUER APERTAR O CERCO CONTRA O BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS. COMO?

CIBERSEGURANÇA

“EMPRESAS NÃO ESTÃO PREPARADAS PARA LIDAR COM OS RISCOS”, INÁCIO NEVES, DELOITTE

GRAFITE

COMO ESTAMOS A ESCREVER A NOSSA

HISTÓRIA NO MERCADO?

Moçambique tem a maior reserva de grafite do mundo, mas os biliões que o minério produz passam-nos ao lado. Porquê?

MOÇAMBIQUE
Abril • 2023 • Ano 06 • Nº 59 • 350MZN

6 OBSERVAÇÃO

Azagaia 1984-2023

A morte do rapper mais influente do País, que marcou toda uma geração pela forte intervenção social

12 OPINIÃO

“A Evolução da Banca Transaccional no Mundo: Adaptarse para Sobreviver”, Denise Cruz, directora de Canais do Absa Bank Moçambique

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73 ÓCIO

74 Escape Uma aventura pelo Camboja 76 Gourmet Dez tendências da gastronomia e da restauração actuais

77 Adega Ao sabor do Tinto Casa da Ínsua

78 Moçambicanos pelo mundo A história do cientista químico premiado internacionalmente, Nuno Maulide

81 Artes Uma “Aldeia Que os Monstros Engoliram”

82 Ao volante do BMW iX5 Hydrogen

MACRO

P OWERED BY FNB

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OPINIÃO

“Desenvolvimentos na Contratação Pública”, Tiago Arouca Mendes, Managing Partner da MDR Advogados, e Geth dos Santos, Advogada Estagiária da MDR Advogados

O alcance do Fundo de Resiliência criado pelo GAPI e USAID no valor de 4,5 milhões de dólares para apoiar PME inseridas na cadeia de valor do agronegócio 20

CONTEÚDO LOCAL

Empresário e delegado provincial da Associação Nacional de Jovens Empresários de Cabo Delgado, Bruno Pinheiro, revela a frustração dos empresários da província

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OPINIÃO

“Paridades Cambiais”, Allan Mate, Trading Desk do Banco BiG Moçambique

NAÇÃO

MERCADO DA GRAFITE

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“FNB Perspectiva um Crescimento da Economia Nacional Entre os 5% e 6% para 2023”, Perspectivas Económicas para 2023 - África e Moçambique

P OWERED BY WÄRTSILÄ ENERGY

“África Pode Adoptar Energias Renováveis em Escala Maciça Economizando Milhares de Milhões de Dólares”, Kenneth Engblom, Vice-presidente da Wärtsilä Energy para Europa e África

51 E SPECIAL INOVAÇÕES DAQUI

52 Tendências das HealthTechs Como a IA está a acelerar a melhoria e a precisão dos diagnósticos e tratamento de doenças

56 Filoschool

A app que permite acesso fácil a todos os conteúdos académicos do sistema nacional de ensino, criada pelo jovem moçambicano Daniel Ngovene

24 O que perdemos Moçambique tem a maior reserva de grafite do mundo, mas perde centenas de milhões de dólares para a indústria mundial de baterias. Porquê?

32 Opinião O Potencial Impacto do Aumento das Reservas Obrigatórias na Economia Moçambicana, Klaus Nielsen, Chefe de Departamento de Gestão de Riscos Financeiros no Standard Bank

40 Potencial de África Standard & Poor’s projecta o nascimento de um novo centro de projectos de grafite com o crescimento da indústria de veículos eléctricos

64

60 68 OPINIÃO

“Culturas Regenerativas – As Mulheres são como Árvores”, Susana Cravo, Consultora & Fundadora da Kutsaca e da Plataforma Reflorestar.org

OPINIÃO

“Empresas Zombie, Negócios em Ponto-morto”, João Gomes, Partner @BlueBiz

MERCADO E FINANÇAS

O líder do Comité Executivo de Remoção de Moçambique da Lista Cinzenta do GAFI, Luís Cezerilo, explica as linhas da estratégia de combate ao branqueamento de capitais

CIBER-CRIME

Empresas Moçambicanas não Estão Prontas para Lidar com os Riscos Cibernéticos, de acordo com um survey da Deloitte em Moçambique

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Não há Iniciativas para Rentabilizar a Grafite

Moçambique é o segundo maior produtor de grafite do mundo e consta que pode possuir a maior reserva do minério com até 80% das reservas globais. Estamos a falar de um minério cuja procura tende a aumentar à medida que se descobrem as suas várias aplicabilidades nas diversas áreas da indústria, com destaque para a dos automóveis eléctricos.

Cálculos publicados no recente Global Graphite Industry Share, Growth, Value, Outlook and Forecast Report, pela Fortune Business Insights – agência indiana que faz estudos de mercado e serviços de consultoria para empresas globais –, apontam que entre 2021 e 2028 o mercado global da grafite ampliará o seu valor de 13,60 mil milhões de dólares anuais para 25,70 mil milhões de dólares.

Este intervalo de tempo será particularmente marcado pelo aumento significativo da procura por grafite para o fabrico de baterias de lítio, que são utilizadas em veículos eléctricos. Este dado configura uma importante oportunidade para os países produtores deste minério, entre os quais Moçambique.

Paralelamente, o Banco Mundial estima que para suprir a demanda por tecnologias de energia limpa, a produção mineral pode aumentar em quase 500% até 2050, e que três biliões de toneladas de minerais e metais serão necessários para suprir a expansão das energias eólica, solar e geotérmica, assim como o armazenamento de energia. Mais uma vez, fica nítida a ideia de que Moçambi-

que está bem posicionado para desfrutar desta explosão no mercado, com a operação de extracção já a expandir nos diversos projectos espalhados pelo território nacional.

Entretanto, há oportunidades, sim, mas parece não haver a noção disso. É que apesar de todas as projecções favoráveis, as autoridades nacionais não possuem qualquer plano de acção que vise transformar a exploração da grafite numa mais-valia para a economia moçambicana. Nem existe qualquer perspectiva de que isso venha a acontecer a breve trecho.

O director nacional de Geologia e Minas ao nível do Ministério dos Recursos Minerais e Energia, Cândido Rangeiro, admite que ainda não há nada pensado a este respeito, e que a grafite nacional vai sendo exportada em bruto para diversas indústrias ao redor do mundo, principalmente os EUA.

Assim, o País ganha apenas através dos impostos pagos pelas duas multinacionais que operam nas suas concessões em Cabo Delgado, nomeadamente a autraliana Syrah Resources e a alemã Gk Ancuabe Graphite Mine.

Nesta edição, um geólogo, um representante da área industrial e um representante do Governo ajudam-nos a perceber como funciona este mercado do qual pouco se fala, qual é o pulsar do mercado mundial da grafite e como podemos dar o salto no aproveitamento do grande potencial que o País tem e evitarmos, digamos, a frustração experimentada em relação ao carvão, minério em relação ao qual temos, também, reservas de dimensão mundial.

ABRIL 2023 • Nº 59

DIRECTOR EXECUTIVO Pedro Cativelos

EDITOR EXECUTIVO Celso Chambisso

JORNALISTAS Ana Mangana, Filomena Bande, Hermenegildo Langa, Nário Sixpene, Yana de Almeida

PAGINAÇÃO José Mundundo

FOTOGRAFIA Mariano Silva

REVISÃO Manuela Rodrigues dos Santos DEPARTAMENTO COMERCIAL comercial@media4development.com

CONSELHO CONSULTIVO

Alda Salomão, Andreia Narigão, António Souto; Bernardo Aparício, Denise Branco, Fabrícia de Almeida Henriques, Frederico Silva, Hermano Juvane, Iacumba Ali Aiuba, João Gomes, Rogério Samo Gudo, Salim Cripton Valá, Sérgio Nicolini

ADMINISTRAÇÃO, REDACÇÃO

E PUBLICIDADE Media4Development

Rua Ângelo Azarias Chichava nº 311 A — Sommerschield, Maputo – Moçambique; marketing@media4development.com

IMPRESSÃO E ACABAMENTO

RPO Produção Gráfica

TIRAGEM 4 500 exemplares

EXPLORAÇÃO EDITORIAL E COMERCIAL

EM MOÇAMBIQUE

Media4Development

NÚMERO DE REGISTO

01/GABINFO-DEPC/2018

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E DITORIAL
OBSERVAÇÃO 6 www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023

Azagaia 1984-2023

Nem a Morte Apagará o Legado do “Povo no Poder”

A 9 de Março de 2023, Moçambique e toda a lusofonia foram confrontados, e chocados, com a morte, aos 38 anos, do rapper e activista social Edson da Luz – o Azagaia –, vítima de uma crise de epilepsia, doença contra a qual lutava há anos.

Azagaia, um dos rappers mais influentes de Moçambique, ficou conhecido pela sua música de intervenção social. Nas suas composições, retratava as vivências dos moçambicanos dos pontos de vista político e social, criticava acções governamentais negativas, cantava sugestões de mudança e revolução para o desenvolvimento e lutava em prol dos direitos humanos.

Conhecido como o defensor das causas perdidas, dos trabalhos do artista destacam-se as músicas Mentiras da Verdade, Música de Intervenção Rápida, Povo no Poder, entre outras.

A um dos mais proeminentes ícones das artes de Moçambique e da lusofonia, a E&M presta uma GRANDE HOMENAGEM!

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TEXTO Filomena Bande FOTOGRAFIA Mariano Silva

Subdesenvolvimento

Moçambique na lista dos dez países africanos com piores índices de pobreza

A Comissão Económica das Nações

Unidas para África (UNECA) deu a conhecer os dez países africanos que enfrentam os mais altos níveis de pobreza do continente, nomeadamente Burundi, Somália, Madagáscar, Sul do Sudão, República Centro Africana, Maláui, República Democrática do Congo, Guiné-Bissau, Moçambique e Zâmbia, anunciou a secretária executiva-adjunta e economista-chefe da UNECA, Hanan Morsy, na 55.ª sessão da Conferência dos ministros Africanos das Finanças, Planeamento e Desenvolvimento Económico da UNECA, realizada a 21 de Março, em Adis Abeba, capital da Etiópia.

Referindo-se a uma pesquisa conduzida por aquela organização, Hanan Morsy afirmou que, em cada um dos dez países, 60% a 82% da população é pobre. Com base na investigação, continuou a responsável, a UNECA “estima que muitas famílias africanas gastam até 40% do seu rendimento em alimentos, e o impacto das crises globais tem atingido gravemente as famílias mais pobres de África”.

“Em 2022, cerca de 310 milhões de africanos passaram por alguma forma de insegurança alimentar e seis milhões de africanos enfrentaram fome extrema”, observou a secretária executiva-adjunta, acrescentando que “os níveis significativos de pobreza e desigualdade em África já existiam mesmo antes das recentes crises globais. No entanto, agora a pobreza agravou-se. Hoje, 546 milhões de pessoas continuam a viver na pobreza, o que representa um aumento de 74% desde 1990”.

Finanças Fitch Solutions prevê que os empréstimos bancários em Moçambique cresçam 8,4% este ano

A consultora Fitch Solutions prevê um crescimento de 8,4% nos empréstimos dos bancos em Moçambique, o que representa uma aceleração face à expansão de crédito de 3,9% registada no ano passado, sustentada pela descida das taxas de juro.

Na análise ao sector bancário, a consultora escreve que a redução do endividamento interno por parte do Governo vai dar mais espaço para que os bancos concedam mais crédito aos particulares e às empresas pri-

Migração

vadas. O regulador financeiro deverá manter a taxa de juro directora nos 17,25% este ano, o que fará com que as taxas nominais desçam, e a inflação deverá abrandar de uma média de 9,9% em 2022 para 8,6% em 2023.

Para 2024, a Fitch Solutions estima um crescimento de 8,8% no crédito aos consumidores e ao sector privado, sustentado numa redução das taxas de juro para 16,25% e numa descida da taxa de juro média para empréstimos de 19,6% este ano, e para 16,3% em 2024.

Moçambique anuncia isenção de vistos para 28 países

Moçambique anunciou a isenção de visto de turismo e de negócios para 28 países, numa decisão aprovada por Decreto do Conselho de Ministros. A isenção aplica-se aos visitantes titulares de passaportes ordinários e permite uma estadia de 30 dias, renováveis por 60 dias adicionais.

O anúncio de isenção de vistos segue-se ao lançamento, em Dezembro passado, da plataforma que permite aos potenciais visitantes solicitar uma pré-autorização electrónica para viajar para o País, medida que au-

mentou em mais de 30% o volume de viajantes que entram em Moçambique, em comparação com o mesmo período do ano anterior.

Os países contemplados são: Bélgica, Canadá, China, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Gana, Indonésia, Israel, Itália, Costa do Marfim, Japão, Países Baixos, Noruega, Portugal, Rússia, Arábia, Saudita, Senegal, Singapura, Coreia do Sul, Espanha, Suécia, Suíça, Ucrânia, Emirados Árabes Unidos, Reino Unido e Estados Unidos da América.

Os principais bancos centrais de África estão a preparar-se para aumentar as taxas de juro com o objectivo de combater a inflação persistente e impedir a venda dos seus activos, exacerbada por um sistema financeiro incerto na sequência do re-

cente colapso do credor norte-americano Silicon Valley Bank (SVB) e pelo stress no Credit Suisse Group AG.

Entretanto, de acordo com Gerrit van Rooyen, economista da Oxford Economics Africa, Moçambique

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Banca Principais bancos centrais esperam aumentar novamente as taxas de juro

manterá a sua taxa de juro de referência apesar de a inflação de dois dígitos persistir até ao primeiro semestre de 2023.

Isto deve-se, em parte, aos danos causados pelo ciclone Freddy. Apesar do aumento da

Alterações Climáticas

inflação, as medidas proactivas do Comité de Política Monetária do Banco de Moçambique (CPMO) fizeram com que a taxa de juro real de Moçambique fosse uma das mais altas de África.

Fundo global para o meio ambiente disponibiliza 25 milhões de dólares para responder aos desafios climáticos em Moçambique

O Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF – sigla em inglês) disponibilizou um montante de 25 milhões de dólares para responder aos problemas causados pelas mudanças climáticas que têm afectado o País nos últimos anos.

Falando à margem de um workshop sobre mudanças climáticas realizado em Maputo, a directora interina de Políticas, Parcerias e Operações no GEF, Paola Ridolfi, avançou que o valor alocado será usado nos próximos quatro anos, em áreas definidas pela Convenção do

Segurança

Meio Ambiente, Diversidade e Clima, das Nações Unidas. Os fundos vão servir igualmente para responder aos problemas do clima, biodiversidade, gestão de terras e poluição em Moçambique.

O GEF foi apresentado na reunião de Paris, em Novembro de 1990, como um programa-piloto para auxiliar os países em desenvolvimento na implementação de projectos que buscassem soluções para as preocupações globais em relação à protecção dos ecossistemas e à biodiversidade.

Branqueamento de capitais: Governo submete primeiro relatório de avaliação para sair da “Lista Cinzenta”

verá, entre outras acções, efectuar até 2024 a avaliação nacional de riscos para as organizações não-governamentais, instalar um sistema para a identificação do benefício efectivo e desenvolver acções de cooperação nacional e internacional no que respeita à lavagem de dinheiro, branqueamento de capitais e combate ao terrorismo. Nessas acções, o País conta com o apoio dos Estados Unidos da América, União Europeia e Banco Mundial.

O Governo moçambicano, através do Ministério da Economia e Finanças, submeteu, recentemente, o seu primeiro relatório de avaliação ao Grupo de Acção Financeira Internacional (GAFI), no quadro das iniciativas que o País está a levar a cabo para sair da “Lista Cinzenta”. Para o efeito, Moçambique de-

Moçambique foi colocado na “Lista Cinzenta” do GAFI (entidade que promove políticas internacionais de combate à lavagem de dinheiro, ao financiamento do terrorismo e à proliferação das armas de destruição em massa) no dia 21 de Outubro de 2022 por um período de observação de dois anos (2022 a 2024).

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NÚMEROS

EM CONTA

Onde as Pessoas Pedem Dinheiro Emprestado?

Ao tomar a decisão de pedir dinheiro emprestado, recorre a amigos e familiares para obter ajuda financeira, ou a uma instituição financeira como um banco ou uma empresa de cartões de crédito? Esta escolha depende frequentemente de um conjunto de factores, incluindo a disponibilidade de serviços financeiros, a literacia financeira e a abordagem cultural do próprio conceito de empréstimo em si.

Para comparar as práticas de contracção de empréstimos, tanto a nível de localização geográfica como a nível de rendimentos, os gráficos em baixo apresentam resultados de inquéritos de inquiridos com mais de 15 anos agrupados por região, excepto para os países de rendimentos elevados, que estão agrupados. Com 81% dos inquiridos a pedir empréstimos a ins-

tituições financeiras, o Canadá encabeça esta lista. Entretanto, Israel (80%), Islândia (73%), Hong Kong (70%) e Coreia do Sul (69%) não estão muito atrás. Isto não é surpreendente para as nações mais ricas, uma vez que os serviços financeiros nestes países estão mais disponíveis e acessíveis, o que, juntamente com uma maior literacia financeira, incluindo uma compreensão geral das taxas de juro e das oportunidades de construção de crédito, contribui para a popularidade das instituições financeiras.

Em contraste, para mais indivíduos em economias de menor rendimento, onde se encontra Moçambique, o método preferencial de crédito acontece no meio familiar e entre amigos ou grupos comunitários de poupança, por exemplo.

A quem as pessoas pedem dinheiro? - Instituições Financeiras

A percentagem de pessoas que recorre à banca ou a outro tipo de instituição financeira, produto ou serviço financeiro.

A quem as pessoas pedem dinheiro? - Família e Amigos

A percentagem que reportou recorrer a empréstimos por via de relações de família ou de amizade.

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Sudeste Asiático Ásia Oriental e Pacífico ** Rendimento Elevado América Latina e Caraíbas ** África Subsaariana ** ** Exclui rendimento elevado Europa de Leste e Ásia Central ** Médio Oriente e Norte de África ** 0% 40% 10% 50% 20% 60% 80% 30% 70% % de empréstimos contraídos junto de instituições financeiras Rendimento Baixo Rendimento Baixo Rendimento Médio Baixo Rendimento Médio Baixo Rendimento Médio Alto Rendimento Médio Alto Rendimento Elevado Rendimento Elevado Não classificado Não classificado 0% 40% 10% 50% 20% 60% 80% 30% 70% % de empréstimos contraídos junto de instituições financeiras FONTE Banco Mundial, The Global Index Database 2021, Visual Capitalist

A Evolução da Banca Transaccional no Mundo: Adaptar-se para Sobreviver

Osector bancário tem sido uma parte fundamental da economia global fornecendo serviços financeiros essenciais para indivíduos e empresas. Nas últimas décadas, a banca transaccional tem passado por uma série de mudanças significativas, impulsionadas pelo avanço e acesso às tecnologias e pela crescente globalização. Este artigo de opinião analisará a evolução da banca transaccional no mundo, destacando os principais factores que moldaram esta transformação e discutindo os desafios e oportunidades que se apresentam no futuro.

A Era da Digitalização

A digitalização tem sido o principal motor da mudança na banca transaccional. A transição de processos baseados em papel para sistemas digitais permitiu aos bancos oferecer serviços mais rápidos, eficientes e seguros. Além disso, a popularização da Internet e dos dispositivos móveis tem facilitado o acesso aos serviços bancários, permitindo aos clientes realizar transacções a qualquer hora e lugar.

Esta digitalização também deu origem a um novo conjunto de concorrentes, participantes e parceiros no sector financeiro: as fintechs. Estas startups têm foco em tecnologia e inovação e estão a desafiar os bancos tradicionais, oferecendo serviços financeiros mais ágeis, convenientes e personalizados.

A Globalização e a Conectividade

A globalização tem aumentado a interconectividade entre os mercados financeiros, tornando as transacções internacionais mais frequentes e importantes. A banca transaccional tem evoluído para acompanhar esta tendência, desenvolvendo soluções que facilitem as transferências internacionais de fundos e a realização de pagamentos em diferentes moedas.

Os bancos também têm procurado parcerias e alianças com instituições financeiras estrangeiras, ampliando a sua presença global e oferecendo aos clientes serviços financeiros integrados e abrangentes.

Desafios e Oportunidades

Apesar das muitas inovações e avanços, a banca transaccional enfrenta diversos desafios. A crescente preocupação com a segurança dos dados dos clientes e a necessidade de cumprir com as complexas regulamentações internacionais e locais exigem investimentos significativos em infra-estrutura e sistemas de segurança. Além disso, o rápido desenvolvimento das fintechs e a rápida mudança nas expectativas dos clientes aumentam a pressão sobre os bancos para se adaptarem e inovarem continuamente. No entanto, a evolução da banca transaccional também oferece oportunidades significativas. Através da adopção de tecnologias emergentes, como a Inteligência Artificial, o blockchain e o big data, os bancos podem desenvolver novos produtos e serviços, aumentar a eficiência operacional e melhorar a experiência do cliente. Além disso, a crescente demanda por serviços financeiros em economias emergentes e entre populações não bancarizadas oferece um enorme potencial de crescimento para a indústria bancária.

Conclusão

A evolução da banca transaccional no mundo tem sido marcada por desafios e oportunidades. O avanço tecnológico e a globalização têm transformado o sector, exigindo que os bancos se adaptem e inovem para se manterem competitivos. Para enfrentar esses desafios, é crucial que as instituições financeiras abracem a transformação digital, invistam em infra-estrutura de segurança e se esforcem para oferecer serviços personalizados e centrados no cliente. Adicionalmente, os bancos devem explorar novos mercados e procurar parcerias estratégicas para expandir a sua presença global e diversificar as suas ofertas de serviços. A evolução da banca transaccional é uma oportunidade para as instituições financeiras repensarem as suas estratégias e se prepararem para um futuro dinâmico e incerto no sector bancário global. Aqueles que conseguirem adaptar-se às mudanças e inovar de maneira contínua serão os que prosperarão na era da transformação digital e da globalização financeira.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 12 OPINIÃO
Denise Cruz • Directora de Canais do Absa Bank Moçambique
A evolução da banca transaccional também oferece oportunidades significativas.
Através da adopção de tecnologias emergentes, como a inteligência artificial

O Alcance do Fundo de Resiliência. Quais as ideias do GAPI e USAID?

As duas organizações acabam de lançar um Fundo avaliado em 4,5 milhões de dólares para financiar actividades das Micro, Pequenas e Médias Empresas (MPME) inseridas na cadeia de valor do agro-negócio e sistemas alimentares. Os destinatários são, essencialmente, unidades produtivas afectadas pelo covid-19 e por eventos climáticos adversos

Se já é difícil convencer o sector financeiro a olhar para a agricultura como uma das prioridades a financiar em ambiente social, económico e climático favorável, imagine-se quando o cenário é de eventos climáticos adversos como nos últimos anos.

É neste mesmo ambiente que a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), em parceria com a Instituição Financeira de Desenvolvimento de Moçambique (GAPI-SI), decidiram criar, no dia 1 de Março, um Fundo de Resiliência para as Micro, Pequenas e Médias Empresas (MPME).

Trata-se de um instrumento financeiro que se pretende sustentável, concebido para fornecer crédito combinado com assistência técnica às MPME afectadas não só pelas calamidades naturais, como pela pandemia do covid-19.

É um Fundo que também funciona como um meio através do qual a GAPI-SI pretende contribuir para que o sistema financeiro tenha mais capacidade para assistir às MPME que enfrentam grandes restrições de acesso ao crédito.

Está orçado em 4,5 milhões de dólares e conta, inicialmente, com a contribuição de 4 milhões de dólares do Governo dos Estados Unidos da América através da USAID e 500 mil dólares da GAPI-SI. A ideia é que este Fundo apli-

que taxas de juro relativamente baixas se comparadas com as da banca comercial. A GAPI propõe, essencialmente, aplicar para as MPME de jovens e mulheres taxas de juro que vão de 9% a 12%, para as MPME de sociedade ou individuais as taxas variam entre 12% e 15% e para instituições de microfinanças serão de 10%.

A iniciativa beneficiará empresas afectadas pelo covid-19 em todo o País e, de forma exclusiva, as províncias assoladas pelos últimos ciclones, nomeadamente Sofala, Cabo Delgado, Nampula, Zambézia, Manica e Inhambane.

A previsão é que, numa primeira fase, sejam concedidos cerca de 2700 financiamentos, sendo 700 directos e 2000 indirectos, e alcance cerca de 680 MPME, um potencial capaz de aumentar em 20% os postos de trabalho neste segmento.

Os grandes fundamentos da aposta O presidente do Conselho de Administração da GAPI-SI, Rafael Uaiene, defende que “há necessidade de se dotar o País de instrumentos para que as MPME se tornem resilientes às calamidades naturais na nossa região, e na cidade da Beira em particular, o mais rápido possível”.

Para o responsável, esta ideia representa o reconhecimento de que os efeitos das mudanças climáticas exigem de todos respostas capazes de dar robus-

tez ao tecido empresarial, para que possa, primeiro, resistir aos choques climáticos reduzindo o risco e enfraquecendo o seu impacto e, depois, transformar-se através da capacitação e de uma melhor governação num bom ambiente de negócios.

“Acreditamos que a criação deste Fundo é uma das respostas que o empresariado, sobretudo o mais vulnerável, nomeadamente as mulheres e jovens, estava à espera para ser mais resiliente”, sublinhou.

Já a representante da USAID, Mary Hobbs, salientou que para o alcance da resiliência desejada, alguns pressupostos deverão ser considerados, entre os quais a necessidade de fortalecer a ca-

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Texto Nário Sixpene • Fotografia Mariano Silva
A iniciativa beneficiará empresas afectadas pelo covid-19 e, de forma exclusiva, as províncias assoladas por ciclones: Sofala, Cabo Delgado, Nampula, Zambézia, Manica e Inhambane
MACRO

pacidade de gestão de negócios e práticas financeiras e profissionais adequadas por parte do grupo alvo.

“Um dos grandes desafios que se colocam consiste na restauração da capacidade produtiva do sector empresarial, por isso a USAID criou este Fundo de Resiliência como contributo para os esforços do Governo de Moçambique e da sociedade em geral para a revitalização da economia”, explicou a responsável.

O presidente da Associação Empresarial da Beira, Félix Machado, manifestando gratidão pela iniciativa, deu ênfase à transparência na gestão do Fundo para que traga os resultados esperados. “Solicitamos ainda uma maior transparência com a divulgação de todos os be-

neficiários deste processo. É muito bom saber que há fundos que vêm à nossa província, mas quando não temos dados sobre o que está a acontecer com este dinheiro fica complicado entender os passos que estamos a dar.

Historicamente, há um problema de transparência na gestão dos fundos que recebemos e espero que neste caso façamos a diferença”, apelou.

Para o presidente do Conselho Empresarial Provincial, Ricardo Cunhaque, este é o tipo de crédito que se adapta às necessidades das MPME, por isso acreditam que vai permitir a recuperação dos sistemas agrícolas alimentares, principalmente pelo seu foco nos negócios geridos por mulheres e jovens.

OS PRESSUPOSTOS DO FUNDO

Há regras estabelecidas e sob as quais estão definidos os mecanismos de acesso ao Fundo. Veja a seguir.

COMO ACEDER?

São elegíveis todas as MPME inseridas na cadeia de valor do agro-negócio e sistemas alimentares. As propostas devem ser enviadas às delegações da Gapi-SI ou às instituições de microfinanças elegíveis, conforme os seguintes critérios:

• Ser uma MPME, trabalhador por conta própria (formal ou informal) cujo negócio foi afectado pelos últimos ciclones e/ou pelo covid-19;

• No caso de ser uma sociedade, é necessária a concordância de todos os sócios no pedido de concessão de crédito;

• Estar na área de abrangência do projecto;

• A actividade deve ser uma das que constam dos segmentos elegíveis para o projecto;

• Idade mínima de 18 anos, no caso de ser um proponente em nome individual;

• Reunir toda a documentação exigida durante o processo de pedido de crédito.

CRITÉRIOS DE CONCESSÃO ÀS MICRO FINANÇAS

• Ser uma instituição microfinanceira formal, com comprovada capacidade e experiência na concessão e gestão de microcrédito;

• Ser uma instituição microfinanceira que está localizada na área de abrangência do projecto;

• Reunir a documentação exigida durante o processo de pedido de financiamento;

• Assinar um contrato de financiamento e compromisso com os princípios, objectivos e metas decorrentes do escopo do fundo.

SEGMENTOS ELEGÍVEIS

• Agro-negócio: produção, agroprocessamento e comercialização agrícola;

• Sistemas alimentares: intervenientes (envolvidos no plantio, colheita, armazenamento e distribuição) das cadeias de valor de avicultura, carnes vermelhas (bois, cabritos, exceptuando a carne suína), milho, arroz, soja, gergelim, girassol, amendoim, batata-reno, etc.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 15

Nenhum momento é tão decisivo na trajectória de uma empresa quanto o do primeiro financiamento. É quase como que uma certeza de que o negócio vai vingar, já que o financiamento toma a forma de um “atestado de confiança” da entidade que o concede. É como se dissessem: “Eu acredito que essa empresa vai ter sucesso. Toma o dinheiro e boa sorte!” Mas, aparentemente, esta confiança é mais facilmente estendida às grandes empresas, em detrimento das de menor dimensão. E esse cenário repete-se em quase todos os mercados!

Na prática, as PME possuem um papel vital na contribuição para a economia de qualquer país. São responsáveis pela criação de novos postos de trabalho, colaborando, assim, quer para o aumento da taxa de emprego, quer para a redução da pobreza, contribuem como fonte de actividades de inovação, alavancando o desenvolvimento do talento empreendedor, para além de serem uma força que flexibiliza a estrutura industrial, promovendo um grande dinamismo à economia.

Assim sendo, porque é tão difícil para estas empresas obterem financiamento?

Vamos olhar para o caso específico de Moçambique e tentar perceber as razões deste fenómeno que, muitas vezes, e em última instância contribui para a extinção do negócio.

Num mercado em que, de acordo com vários estudos, entre 95% e 98 % das empresas registadas são, efectivamente, de pequena dimensão, e considerando que a importância das PME se reflecte ao nível de vários indicadores, como é o caso do emprego e do Produto Interno Bruto, torna-se difícil, à primeira vista, compreender os entraves que são colocados ao financiamento deste segmento.

Vamos, juntos, analisar?

Começaríamos por questionar: quais os factores que afectam o acesso ao cré-

As PME e os Desafios de Financiamento

dito bancário por parte das PME? Alguns dos factores apontados são:

• Fraco nível de capitalização destas empresas;

• A, por vezes, inconsistência das suas actividades;

• Uma elevada exposição à dívida;

• Assimetria de informação;

• As exigências quanto aos rácios de capitais, e;

• Os critérios mais apertados na gestão de risco.

Todos estes factores, em separado ou em conjunto, têm levado a banca a preferir investir nas grandes empresas, em detrimento das PME.

Mas, então, como é suposto as empresas deste segmento sobreviverem?

São de louvar as iniciativas, quer de bancos, quer de instituições destinadas a apoiar o desenvolvimento empresarial, que visam dotar as PME de conhecimentos sobre acesso ao financiamento, planeamento de negócios, soluções financeiras de apoio ao investimento, entre outras.

Porém, estas iniciativas parecem pecar pelo facto de terem como finalidade última tornar as PME qualificadas às exigências dos operadores da indústria do GNL. E todas as outras PME cujas operações não fazem parte da cadeia de valor dos players do Oil & Gas? Não terão elas também direito a apoio para o seu desenvolvimento?

Ao abrigo do Programa de Desenvolvimento do Conteúdo Local é considerado vital o papel das empresas-âncora enquanto facilitadoras no suporte às PME através do circuito de confirmação entre banco-fornecedor. Mas estará este papel a ser desempenhado, na prática? Ou serão as próprias PME desconhecedoras dos circuitos que facilitam o seu crescimento?

Uma nova empresa, regra geral, não possui o auto-financiamento necessário para concretizar os seus projectos, razão pela qual é comum estas empresas recorrerem ou a financiamento de familiares e amigos ou às instituições de crédito. Quando se decidem por esta última opção, voltam-se contra si as características do seu próprio segmento: o fraco volume de negócios e a falta de historial de crédito para os bancos procederem a uma análise do risco. Neste caso, resta às instituições de crédito recorrerem à análise do projecto de investimento e ao histórico do proprietário das referidas empresas. Forma-se, assim, um ciclo do qual se torna difícil para as PME escapar.

Não nos propomos, neste artigo, a trazer respostas, mas sim promover o debate em torno deste tema. Assim, em jeito de conclusão, deixamos aqui ficar algumas questões para reflexão:

• Será esta dificuldade no financiamento resultante do facto de as PME possuírem uma “informação opaca” que não inspira confiança aos bancos?

• Estarão os bancos a sobrecarregar, desnecessariamente, estas empresas com elevadas taxas de juro e exigência de garantias?

• Estará o tão necessário apoio do Estado a este segmento a falhar no seu propósito?

• Estarão as PME a negligenciar certas etapas que contribuiriam para o seu próprio desenvolvimento?

Votos de uma boa reflexão!

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 16 OPINIÃO
São de louvar as iniciativas, quer de bancos, quer de instituições destinadas a apoiar o desenvolvimento empresarial, que visam dotar as PME de conhecimentos sobre acesso ao financiamento
Irís Chivite Guimarães • Chefe Executiva do Departamento de Pequenas e Médias Empresas na Vodacom

Aprovação do Regulamento de Empreitada de Obras Públicas, Fornecimento de Bens e Prestação de Serviços ao Estado e da Estratégia da Contratação Pública Electrónica de Moçambique

O Regulamento da Contratação Pública sofreu, desde a sua aprovação, diversas alterações de modo que responda aos principais desafios identificados no processo de contratação pública, tornando o sistema moderno e eficiente através de tecnologias de informação e de comunicação.

O anterior Decreto n.º 5/2016, de 8 de Março, foi recentemente alterado pelo Decreto n.º 79/2022, de 30 Dezembro, que aprova o novo Regulamento de Contratação de Empreitada de Obras Públicas, Fornecimento de Bens e Prestação de Serviços ao Estado (Regulamento).

Associado à aprovação deste Regulamento e com o esforço que o Governo de Moçambique tem vindo a desenvolver, foi aprovada, através da Resolução n.º 54/2022, de 30 de Dezembro, a Estratégia para Contratação Pública Electrónica (e-CP), a ser implementada no período de 2023 a 2025, estratégia esta que permitirá aos intervenientes no processo de aquisição de bens, obras e serviços utilizar tecnologias de informação e de comunicação, com vista a assegurar transparência, eficiência e eficácia no processo de contratação, contribuindo deste modo para o desenvolvimento socioeconómico do País.

No novo Regulamento, destacam-se as seguintes alterações:

1. Introdução de um sistema electrónico de contratação pública, em

Desenvolvimentos na Contratação Pública

consonância com a Estratégia da Contratação Pública Electrónica a ser implementada no período de 2023 a 2025;

2. Introdução de regras relativas ao cabimento das despesas no Plano Económico e Social e no Orçamento do Estado relativo ao correspondente exercício económico, com recurso às plataformas e-SISTAFE ou e-SISTAFE Autárquico;

5. É agora obrigatória a publicação da declaração do beneficiário efectivo, caso o concorrente vencedor seja uma pessoa colectiva, quanto aos contratos celebrados na sequência de um concurso com valor estimado de contratação superior a sessenta milhões de meticais.

No âmbito da Estratégia para Contratação Pública Electrónica, prevê-se que o software necessário seja desenvolvido e produzido ainda no início deste ano, seguindo-se depois a implementação do piloto no último trimestre de 2023.

A expectativa é a progressiva transição do sistema manual para o e-CP, até 2025 – ano em que será feita a avaliação da sua implementação.

Em conjunto com o Pacote de Aceleração Económica, recentemente aprovado pelo Governo, antecipam-se vários benefícios provenientes destes desenvolvimentos, com o aumento da concorrência e a eficácia da contratação, aliados à redução dos custos administrativos na aquisição de bens e serviços.

3. Passa a ser obrigatório que os concorrentes estejam inscritos no Cadastro Único de Empreiteiros, Fornecedores de Bens e Prestadores de Serviços ao Estado;

4. Foram actualizadas as margens de preferência aplicáveis a concorrentes nacionais, passando a estar previsto: (i) 15% do valor do contrato para empreitada de obras públicas e prestação de serviços para concorrentes nacionais; e (ii) 20% do valor do contrato para bens que sejam produzidos em Moçambique;

Com a inserção das margens de preferência aplicáveis aos concorrentes nacionais, verifica-se uma articulação com as regras aplicáveis ao processo de contratação de empreendimentos de parcerias público-privadas, nos termos da Lei n.º 15/2011, de 10 de Agosto.

A aprovação do novo Regulamento é oportuna e adequada, esperando-se um aumento de transparência, da eficácia do Governo no que concerne à relação entre o custo associado e aos benefícios, bem como do desenvolvimento de mercado competitivo e da adequação às tendências da e-CP.

O novo Regulamento entrou em vigor no dia 29 de Março de 2023.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 18 OPINIÃO
No âmbito da Estratégia para Contratação Pública Electrónica, prevêse que o software necessário seja desenvolvido e produzido ainda no início deste ano, seguindo-se depois a implementação do piloto no último trimestre de 2023
Tiago Arouca Mendes • Managing Partner da MDR Advogados & Geth dos Santos Tangune • Advogada Estagiária da MDR Advogados

“Há Muita Frustração dos Empresários em Cabo Delgado”

A E&M traz a experiência de uma empresa que conseguiu o tão desejado link com um grande empreendimento a operar no sector do Oil & Gas em Cabo Delgado, a TotalEnergies, e a visão que prevalece sobre a realidade no terreno, no que diz respeito às oportunidades de negócio por parte das Pequenas e Médias Empresas locais

Bruno Pinheiro, sócio-gerente da Mussiro Investments e delegado provincial da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE) de Cabo Delgado, revela haver muita frustração dos empresários locais pela dificuldade de conseguir um lugar na prestação de serviços aos grandes projectos de gás na fase de prospecção.

Apesar de a Mussiro – uma empresa de capitais 100% moçambicanos, com sede em Pemba, capital de Cabo Delgado, e com pouco mais de cinco anos no mercado – ter conseguido organizar dois grandes eventos solicitados pela TotalEnergies, Bruno Pinheiro entende que para que haja melhoria no acesso às grandes empresas pelas empresas locais é necessário que se melhore a comunicação sobre as oportunidades existentes.

Conseguir um contrato de prestação de serviços às multinacionais que operam nos diversos projectos em Cabo Delgado é uma tarefa difícil. Como é que a vossa empresa, a Mussiro Investments, conseguiu a ligação com a TotalEnergies?

Conseguimos prestar serviços à Total Energies e fornecer os nossos produtos através de contactos locais e por meio da apresentação de propostas financeiras que, acreditamos, estiveram de acordo com o orçamento previsto. Acredi-

tamos que a confiança depositada anteriormente nos pequenos serviços em que estivemos envolvidos, realizados com total responsabilidade e qualidade, contribuiu significativamente para o nosso sucesso na realização de dois grandes eventos que ocorreram em Palma, patrocinados pela Total.

Além da TotalEnergies já prestámos serviços de fornecimento de produtos para grandes projectos, como os casos da Saipem, Halliburton, ENH, Smith Lamnalco Mozambique, Plan International, Radarscape Mozambique, UN-Habitat, UNDP, Advanced Maritime Transport (AMT), Bollore Transport & Logistic, Montepuez Ruby Mining e muitos outros.

Qual foi o feedback dessas empresas em relação à vossa capacidade na prestação dos serviços?

Podemos afirmar, categoricamente, que o feedback foi positivo, pois conseguimos superar as expectativas e garantir a confiança dos nossos clientes em relação à nossa prestação.

Como avalia o acesso à prestação de serviços aos grandes projectos em Moçambique? O que deve ser melhorado?

A prestação de serviços aos megaprojectos está, obviamente, relacionada com o seu peso no investimento, em-

prego, produção e comércio. No entanto, a riqueza gerada pelos grandes projectos pertence às corporações que os possuem e controlam e não à economia como um todo. O impacto da riqueza produzida pelos megaprojectos na economia nacional está relacionado com o grau de retenção e absorção dessa riqueza pela economia e não apenas pela quantidade de riqueza produzida.

Ainda há dificuldades na prestação de serviços pelas PME moçambicanas, isto é, não têm tido facilidade na prestação de serviços aos megaprojectos porque estes exigem requisitos que ultrapassam as nossas capacidades. Felizmente, o Governo está preocupado com a aprovação da Lei do Conteúdo Local, o que, na minha opinião, vai beneficiar, em grande medida, as comunidades receptoras dos grandes projectos, em particular, e o País, em geral. Mas que fique claro que, neste momento, a ligação entre os grandes empreendimentos e as empresas locais é fraca. Há muito por melhorar.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 20 CONTEÚDO LOCAL
Ainda há dificuldades para as PME. Não têm tido facilidade na prestação de serviços aos megaprojectos porque estes exigem requisitos que ultrapassam as nossas capacidades
Texto Celso Chambisso • Fotografia Istock Photo

Pode enumerar as questões por melhorar?

Para que haja melhoria neste processo, deve-se criar exposições regulares de informações para que as PME locais possam estar devidamente informadas sobre as oportunidades de negócios nos megaprojectos.

Uma vez que o fenómeno das multinacionais é novo e encontrou as PME despreparadas, é importante que se crie um centro de desenvolvimento empresarial de excelência para promover o crescimento das empresas moçambicanas de modo que as torne competitivas. Penso que devem existir créditos financeiros bonificados, subvenções, entre outras vantagens, sem muita burocracia para aceder.

O Governo deve assumir um papel de liderança neste processo como um grande interlocutor entre as multinacionais, comunidades, PME e sociedade civil. É ainda importante que haja planos sustentáveis para o envolvimento das comunidades locais, isto é, não basta ape-

nas construir esta e aquela infra-estrutura sem que haja esforços para se incluir o Conteúdo Local. Quer dizer que os empresários locais e comunidades devem estar envolvidos em todos os processos de tomada de decisão e terem direito a que parte dos lucros advindos da exploração de recursos minerais sejam investidos para o bem da comunidade.

Até que ponto os grandes projectos de Cabo Delgado têm mudado a vida da população local, pelo menos à volta do local em que está situado o vosso empreendimento?

Ninguém pode duvidar do impacto dos megaprojectos. São transformadores, isto é, alteram a vida das comunidades locais para o bem ou para o mal, mudam a geografia local de forma rápida e visível. Assim aconteceu em Cabo Delgado com as descobertas de jazigos naturais. Na fase de prospecção do projecto de Gás Natural Liquefeito (GNL), a província de Cabo Delgado assistiu à entrada de grandes empresas oriundas de to-

dos os continentes, nasceram algumas estâncias turísticas e outras infra-estruturas para fazer jus à chegada dessas multinacionais. Verificou-se a emigração de pessoas de outros cantos do mundo e do País para Cabo Delgado a fim de procurar oportunidades. Com isso, era expectável que o projecto de GNL fosse um bom pontapé de saída rumo ao desenvolvimento socioeconómico das comunidades locais de Cabo Delgado devido à sua capacidade de empregabilidade, movimentação de bens e serviços e outras variáveis.

Sucede que naquela província, as grandes empresas não absorveram como era esperado o número de cidadãos locais, nem consomem bens e serviços locais. E nem as PME foram incluídas, sob o pretexto de que não há capacidade local. A única saída encontrada foi a contratação de mão-de-obra não local, até para casos em que existem pessoas qualificadas no País.

Esta medida frustrou, em grande medida, os empresários locais porque alguns recorreram a créditos bancários para responderem aos padrões das multinacionais. E como consequência, temos os nossos empresários endividados e a pagarem letras com muitas dificuldades.

Porém, há que salientar que, com o advento do GNL, o Governo entendeu que era altura de olhar para Cabo Delgado, e, neste momento, estão a ser criadas algumas instituições para que haja educação de qualidade nas comunidades, incrementando, sobretudo, o ensino técnico-profissional e cursos de curta duração. Estão também a criar-se condições para que haja infra-estruturas de qualidade (água, saneamento do meio, saúde, estradas e pontes) para benefício da população. Entendo que poderia ser feito mais, mas o terrorismo está a inviabilizar o desenvolvimento.

No geral, há muita frustração dos empresários locais em Cabo Delgado por não terem conseguido prestar serviços na fase de prospecção do projecto de GNL.

O que se pode esperar da Mussiro Investments na relação com os grandes projectos?

Sermos uma empresa robusta e totalmente qualificada, considerada e reconhecida pela excelência por parte dos nossos clientes e parceiros, como a melhor opção do ramo em que actuamos.

Por este motivo, podem esperar que aproveitemos mais oportunidades de negócios que o mercado oferece e prestemos serviços para mais megaprojectos que actuam em Moçambique, particularmente em Cabo Delgado.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 21

Paridades Cambiais

Ahistória do mercado cambial tem início no desenvolvimento do comércio e das moedas que vieram substituir as trocas directas entre produtos e serviços.

A constituição dos primeiros bancos modernos também influenciou esse desenvolvimento, sendo considerado a criação do Banco di San Giorgio, em 1406, um marco importante no desenvolvimento do sistema financeiro e cambial moderno.

Durante os séculos, os bancos e o mercado cambial foram-se desenvolvendo, com as moedas a serem vistas como reserva de valor, sendo para tal produzidas em matérias com valor reconhecido na época.

No início do século XX, com a adopção da International Gold Standard, praticamente todos os países adoptaram esta relação, ligando o valor das suas moedas nacionais às reservas que possuíam em ouro.

Esta forma de valorização das moedas nacionais fez parte de um programa de Política Monetária, onde a Reserva Federal Americana (FED) tinha de ter em reservas, em ouro, pelo menos 40% do valor das moedas e notas em circulação.

Neste período, surgiu o primeiro par de moedas internacionais transaccionado: o dólar americano (USD) e a libra britânica (GBP). Para que a cotação do GBP/USD fosse live, foi estendido um cabo de telegrafia entre os dois continentes, através do qual se transaccionava a moeda entre os dois.

Este par ficou então conhecido como “cable” e ainda hoje é utilizada essa terminologia nas principais salas de mercados internacionais. As duas moedas tinham o seu valor ligado ao ouro o que facilitava a sua convertibilidade.

O dólar americano tinha um valor de USD 35 por cada ounce de ouro e o pound britânico tinha um va -

lor de GBP 3 17s. 10,5 para cada ounce de Ouro. Contudo, nem tudo correu como esperado com o International Gold Standard . As crises económicas do início do século e as guerras mundiais motivaram alterações significativas nas reservas de ouro dos países, o que alimentou a especulação e trouxe elevada volatilidade ao sistema.

Deste modo, o Reino Unido decidiu abandonar, em 1931, o Gold Standard, sendo seguido posteriormente pela generalidade dos países na famosa reunião de Bretton Woods . Nesta reunião, vários países decidiram rever o Sistema Financeiro Mundial no sentido de criar mecanismos para que uma segunda grande depressão não se repetisse.

Todos os países acordaram fixar as suas taxas de câmbio em relação ao dólar dos Estados Unidos que, por sua vez, era convertível em ouro a uma taxa fixa de USD 35 por ounce . Isto significava que todos os países tinham as suas moedas atreladas ao dólar e este era garantido pelo ouro.

O acordo estabeleceu também a criação de duas instituições internacionais, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, com o objectivo de fornecer empréstimos e assistência técnica aos países que necessitavam de ajuda para reconstruir as suas economias após a 2.ª Grande Guerra.

Este sistema vigorou até 1971, quando a administração do Presidente Nixon decidiu abandonar o sistema de Gold Standard, com o intuito de tentar combater a elevada inflação que assolava o país.

Após o abandono da ligação das moedas ao dólar, verificou-se uma forte procura por dólares que, rapidamente, ganhou o estatuto de moeda reserva/refúgio mundial, situação que se mantém até aos dias de hoje.

Já no século XXI, com o surgimento da União Económica Monetária (UEM), o recém-criado euro (EUR)

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 22 OPINIÃO
Allan Mate • Trading Desk Banco BiG Moçambique
International Settlements, gerou em 2021 uma média de volume diário de USD 1.083 triliões
Actualmente,
o par EUR/USD representa mais de 20% de todas as transacções do mercado cambial internacional e, de acordo com o Bank for

veio destronar o principal par cambial internacional. O facto de o euro representar um bloco económico de mais de 20 países rapidamente lhe trouxe estabilidade e prestígio para ganhar espaço no estatuto de moeda refúgio.

Actualmente, o par EUR/USD representa mais de 20% de todas as transacções do mercado cambial internacional e, de acordo com o Bank for International Settlements, gerou em 2021 uma média de volume diário de USD 1.083 triliões.

Este par é ainda utilizado como um dos principais indicadores do sentimento dos investidores, sempre que um evento corporativo ou macroeconómico de carácter material ocorre.

Recentemente, as economias emergentes, como os países do BRICS, tem evidenciado taxas de crescimento económico acima da média mundial, sendo que parte desse crescimento provém de transacções no comércio internacional.

Estas operações apresentam uma mudança no paradigma do mercado cambial onde o euro vê perder o seu estatuto como segunda moeda mundial para o yuan (CNY).

A China tem sido o principal parceiro comercial para a grande parte dos países, onde a exportação dos seus productos e serviços ainda é muito competitiva pelo custo e eficiência da economia chinesa, sendo que um dos principais parceiros de comércio internacional da China é os Estados Unidos da América.

Moçambique, sendo uma economia ainda em desenvolvimento, tende a receber ajudas e financiamento de grandes economias e instituições geridas pelas mesmas, como, por exemplo, o FMI e Banco Mundial.

Adicionalmente, nos últimos tempos, tem-se verificado um incremento do volume de comércio entre a China e Moçambique, em vez dos tradicionais parceiros comerciais com, por

exemplo, a África do Sul e Portugal, entre outros. Até então, os principais pares transaccionados em Moçambique eram o USD/MZN e ZAR/MZN. Contudo, o aumento do volume comercial com outros parceiros internacionais pode vir a alterar este cenário.

A diversificação das reservas em moeda estrangeira dos países também tem sido uma realidade, e são já vários os países que estão a substituir o dólar como única moeda de reserva, em deterioramento de outras moedas ou activos.

Será que este cenário se pode verificar em Moçambique nos tempos que estão por vir? Irão os pares USD/ MZN e ZAR/MZN ter de partilhar a sua quota de mercado com moedas como o CNY ou outros activos mais recentes como Crypto Currencies? Ou a importância sistemática do dólar em Moçambique impedirá que esta mudança aconteça num curto espaço de tempo? Apenas o tempo o dirá…

NAÇÃO | GRAFITE

O que Perdemos (e Ganhamos) com o Minério do Futuro

Em 2014, mineradora Triton Minerals anunciou a descoberta do maior depósito mundial de grafite na província de Cabo Delgado, que deve conter mais de 115,9 milhões de toneladas do minério. Desde então, o País assiste a um crescente interesse de empresas de todo o mundo em explorar este recurso, cujo valor industrial proporciona biliões de dólares em lucros à indústria de baterias eléctricas e promete ser um dos recursos mais procurados nos próximos anos. Moçambique tem muito a ganhar. Mas o que acontece, de facto, no terreno?

Texto Manuel Mandlaze • Fotografia Istock Photo & D.R. Grafite

Há uma espécie de experiência negativa com que o País começa a aprender a lidar no que diz respeito à capacidade ou possibilidade de reter os benefícios da exploração de recursos valiosos para a indústria e que são aqui abundantes.

Comecemos pelo carvão que, até há uma década (dadas as reservas de dimensão global), era visto como a fonte de receita que traria equilíbrio às contas nacionais e com poder suficiente para fazer o País transitar de renda baixa para o grupo de países de rendimento médio. Embora o carvão ainda seja o recurso que garante a maior parte das receitas de exportação, acabou por não corresponder ao que se esperava em termos de capacidade de mobilização da indústria interna.

Hoje temos a grafite, minério que se está a projectar como o recurso do presente e do futuro. Contabilizadas as reservas de grafite em três projectos (dois na fase de exploração e um na fase de desenvolvimento) em Moçambique, apurou-se a existência de 121 646 000 toneladas, num total de aproximadamente 160 000 000 de toneladas em reservas existentes no mundo, o que representa cerca 80% das reservas globais já conhecidas. É um minério que dá muito dinheiro lá fora, mas de que pouco se ouve falar no País que o tem em abundância.

Como é que nos posicionamos estrategicamente neste sector? O que é que se está a pensar (se é que já se pensa) para transformar o chamado ‘chumbo negro’ numa oportunidade não só de ganhar receitas fiscais, mas de promoção do desenvolvimento que se esperou do carvão e que não veio? Vamos, antes, começar por tentar perceber o seguinte:

Quanto vale o mercado global da grafite?

Tudo começa na sua ampla aplicabilidade. O mercado da grafite é segmentado por tipo (grafite natural e grafite sintético), aplicação (eléctrodos, refractários, fundição e fundições, baterias, lubrificantes e outras aplicações) e indústria de usuário final (electrónica – uso no fabrico de computadores, por exemplo –, metalurgia, veículos e outras indústrias de usuários finais).

De acordo com a Fortune Business Insights – uma agência indiana que realiza estudos de mercado e serviços de consultoria para empresas globais, fornecendo previsões de mercado e recomendações para ajudá-las a melhor se posicionarem face à concorrência –, no seu relatório in-

titulado "Mercado da grafite 2021-2028", este mercado valerá 25,70 mil milhões de dólares por ano durante este período, depois de uma queda de 1,23% em 2020 devido à pandemia do covid-19, para 13,60 mil milhões de dólares.

“A crescente demanda é baseada em factores como combinar metais e não metais, tornando a grafite perfeita para uma variada gama de aplicações industriais. É um óptimo condutor de electricidade e calor, estabilidade térmica incomparável e lubricidade. Isso é projectado para reforçar o crescimento do mercado de grafite num futuro previsível”, refere o documento.

Os países mais destacados na exploração industrial do minério incluem os mais desenvolvidos da Europa, Estados Unidos, China, Japão e Coreia do Sul. Outro estudo, o da Mordor Intelligen-

ce, refere que o mercado global de eléctrodos de grafite está projectado para atingir mais de 12 mil milhões de dólares anuais entre 2023 e 2028. Eléctrodos de grafite são amplamente utilizados em fornos de arco eléctrico e fornos de fusão em centrais siderúrgicas, fábricas de silício, entre outras.

Tudo isto mostra o quanto Moçambique pode ocupar um lugar importante no banquete dos maiores exploradores da grafite. Mas por enquanto vamos, sem surpresa, muito atrasados.

O que acontece no terreno?

Apesar da certeza de que novas minas de grafite no mundo serão fundamentais para atender à crescente demanda e combater um potencial défice de oferta, Moçambique não apresenta qualquer plano para começar a processar

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 26
NAÇÃO | GRAFITE
A crescente aplicação da grafite na produção de automóveis eléctricos levou ao rápido aumento da procura por este minério nos últimos anos. E a previsão é que o preço continue a aumentar

AS PRINCIPAIS APLICAÇÕES DA GRAFITE NA INDÚSTRIA

A grafite é matéria-prima de uma vasta matriz de produtos industriais. Conheça, a seguir, parte das suas amplas aplicabilidades.

INDÚSTRIA QUÍMICA

INDÚSTRIA METALÚRGICA

MATERIAIS CONDUTORES

É usada na indústria eléctrica para fazer eléctrodos, escovas, barras de carbono, tubos de carbono, eléctrodos positivos de dispositivos de corrente positiva de mercúrio, peças de telefone, revestimentos para tubos de imagem de televisão, etc.

É amplamente utilizada na produção de trocadores de calor, tanques de reacção, condensadores, torres de combustão, torres de absorção, resfriadores, aquecedores, filtros, equipamentos de bomba na indústria petroquímica, produção de ácido-base, etc.

Devido ao pequeno coeficiente de expansão térmica da grafite e a capacidade de suportar mudanças rápidas de frio e calor, pode ser usada como molde de vidro. É por isso que tem aplicação na fundição de areia e materiais metalúrgicos de alta temperatura.

INDÚSTRIA AEROESPACIAL

A indústria aeroespacial não deixa margem para erros, exigindo materiais que possam suportar grandes altitudes, altas velocidades e temperaturas extremas acima de 1000 graus para atender aos rígidos requisitos de segurança da indústria.

MATERIAIS REFRACTÁRIOS

A grafite é utilizada principalmente na indústria metalúrgica para produção de aço, como agente protector para lingotes de aço e como revestimento para fornos metalúrgicos. É também usada como lubrificante na indústria de máquinas.

PRODUÇÃO DO LÁPIS

A grafite pode ser usada como grafite de lápis, pigmento e agente de polimento. Depois de especialmente processada, vários materiais especiais podem ser feitos com grafite para utilização em sectores industriais relevantes.

INDÚSTRIA DE ARMAMENTO

Na indústria da defesa, a grafite também é usada para fazer bicos de foguetes de combustível sólido, cones de nariz de mísseis, peças de equipamentos aeroespaciais, materiais de isolamento térmico e materiais de protecção contra a radiação.

ENERGIA ATÓMICA

A grafite é usada na indústria da energia atómica por possuir um bom moderador de neutrões usados em reactores atómicos. O reactor de urânio-grafite é um tipo de reactor atómico amplamente utilizado também na indústria de armamento.

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esta matéria-prima e vai exportando em bruto. Ganha apenas através dos impostos provenientes da extracção.

“O que temos de fazer é atrair os investimentos que possam vir a processar a grafite em produtos que possam ser posteriormente usados na indústria, como forma de adicionarmos valor localmente. Mas este é o desafio para o futuro”, admite Cândido Rangeiro, director nacional de Geologia e Minas no Ministério dos Recursos Minerais e Energia (MIREME).

Com efeito, Cândido Rangeiro defende a estipulação legal de uma quota de grafite que deve ser usada pela indústria transformadora local, de modo que qualquer investidor tenha garantias de acesso ao minério no caso de pretender processar em Moçambique para os diferentes fins. Desta forma, as empresas que exploram a grafite teriam uma obrigação legal de vender parte da produção à indústria local, ao invés de exportar na sua totalidade, como sucede actualmente.

Ganhamos pouco

O maior projecto de extracção de grafite do País está no distrito de Balama, província de Cabo Delgado, e é imple-

mentado pela Syrah Resources Limitada, uma empresa australiana, sediada em Melbourne e cotada na bolsa australiana ASX.

Esta empresa ganhou uma concessão mineira em Dezembro de 2013 válida por 25 anos, um Direito de Uso e Aproveitamento da Terra (DUAT) em 2015 e uma licença para usar a água da barragem de Chipembe em 2017.

A licença ambiental para a construção e operação da mina de grafite foi obtida em Abril de 2015. Todo o reassentamento de agricultores locais na planta de processamento proposta foi concluído, segundo explica o director nacional de Geologia e Minas.

A construção da planta de processamento foi iniciada em 2016 e concluída no final de 2017. O programa de prospecção de pesquisa resultou na defini-

ção de reservas estimadas em 114 milhões de toneladas. O investimento total no projecto foi de 314 milhões de dólares e a produção projectada é de 165 mil toneladas de grafite por ano.

De 2018 a 2021, a mina de Balama produziu 340 mil toneladas de grafite, o que resultou em impostos de produção de pouco mais de 4,3 mil milhões de meticais.

A produção foi quase toda para a exportação, na medida em que Moçambique não tem indústria para processar grafite, sendo que o que é retido no País é considerado de material descartável por não apresentar a qualidade desejada pelos compradores.

A E&M sabe que o projecto de Balama assinou, em 2021, um acordo com a firma norte-americana Tesla, a maior companhia de automóveis eléctricos do

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A ambição da Syrah é de ser o principal fornecedor mundial de grafite de qualidade superior e de produtos de material anódico, e para isso tem Moçambicano como prioridade

mundo, para o fornecimento de grafite para produzir veículos eléctricos do futuro. “Isto é bom porque significa que a nossa grafite tem um mercado garantido, mas nós ganharíamos muito mais se esta adição de valor fosse feita aqui e exportássemos produtos acabados”, assume Cândido Rangeiro.

Entrada da Tesla também nos passa ao lado

A Tesla está a investir seriamente na obtenção da grafite e chegou a conseguir um acordo com vários fornecedores (incluindo a australiana Syrah, que explora a grafite de Moçambique) para levar a matéria-prima para uma fábrica em Vidalia, no Estado norte-americano de Louisiana.

Para assegurar disponibilidade de grafite nas suas intenções de investimento, a Tesla ganhou o direito de retirar a maior parte da expansão proposta da capacidade de produção de grafite natural em Vidalia a um preço fixo por um período inicial de quatro anos, a partir da obtenção de uma taxa de produção comercial sujeita à qualificação final. A Tesla tem também a opção de retirar volume adicional de grafite da Vidalia, sujeito à expansão da capacidade da Syrah.

A E&M entrou em contacto com a firma australiana e ficou a saber, através de uma comunicação feita por e-mail, que a Syrah está a avançar no compromisso comercial e técnico com outros clientes-alvo para desenvolver grafite nos EUA para a produção em massa e assegurar compromissos adicionais de compra a longo prazo.

A ambição da Syrah é de ser o principal fornecedor mundial de grafite de qualidade superior e de produtos de material anódico. A empresa quer trabalhar em estreita colaboração com os clientes e a cadeia de fornecimento para acrescentar valor nos mercados de baterias e industriais. Ou seja, se Moçambique criasse uma estrutura industrial para a utilização da grafite podia contar com investimentos da Syrah também nos projectos de produção.

Projecto de Ancuabe subaproveitado

O projecto da mina de grafite de Ancuabe, também em Cabo Delgado, detido pela empresa Gk Ancuabe Graphite Mine, já exportou 12 600 toneladas do minério para a Alemanha, vendidas ao custo de 900 euros por tonelada, entre 2017 e 2021, o equivalente a 11 340 000,00 euros.

O distrito de Ancuabe está localizado na parte sul da província de Cabo Delgado, a cerca de 100 km de Pemba, a cidade capital. Na mina de grafite, que é relativamente menor que a de Balama, foram investidos 13 milhões de euros.

A planta nesta mina tem capacidade para produzir apenas nove mil toneladas de grafite por ano, estando, neste momento, a explorar o minério a níveis muito abaixo da capacidade, pois a produção média anual situa-se nas 2,5 mil toneladas de grafite nos últimos cinco anos.

As reservas no início do projecto eram de 150 000 toneladas e no final de 2018 estavam na ordem das 146 268 toneladas. De acordo com dados da Direcção Nacional de Geologia e Minas, o valor de imposto canalizado para o Estado foi de pouco mais de 6,2 milhões de meticais.

O economista do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), Yasfir Ibraimo, especialista em fiscalidade, entende que a falta de informação sobre a génese dos contratos firmados com a Gk Ancuabe Graphite Mine dificulta aferir se o valor arrecadado é justo ou não. “Mas, pelo histórico que se conhece da exploração do carvão, não me surpreen-

De um modo geral, a produção teve uma tendência de queda nos últimos anos devido à pandemia e aos ataques terroristas em Cabo Delgado.

de dólares

deria que até neste aspecto estivéssemos a perder quanto à exploração da grafite”, explicou.

O economista entende também que o maior benefício, entretanto, seria a transformação local da grafite, porque a sua cadeia seria capaz de quadruplicar a mão-de-obra na indústria e multiplicar consideravelmente as receitas da indústria nacional.

Mas como montar uma indústria a este nível?

A E&M ouviu o presidente da Associação Industrial de Moçambique (AIMO), Rogério Samo Gudo, que de forma breve esclareceu que o empresariado nacional precisaria de grandes incentivos para entrar e singrar nesta área, visto que não tem grande contacto com actividades desta natureza. Primeiro, teria de importar algum know how e maquinaria, que entende ser bastante cara.

Para o responsável, isto passaria por desenhar um plano que envolve o Governo e o sector financeiro para apoiar

esta aposta de forma coordenada. Recomenda, entretanto, que se faça um estudo que conduza aos ingredientes necessários para avançar com esta intenção. Acredita, contudo, que o empresariado nacional tem e já demonstrou capacidade de empreender em iniciativas de grande dimensão, pelo que a transformação da grafite em Moçambique seria mais um projecto bem-sucedido se fosse bem preparado e concebido.

O futuro promete mais, mas há muito por se mudar Moçambique possui, neste momento, 53 licenças de prospecção e pesquisa de grafite em vigor sendo 44 na província de Cabo Delgado, uma na província de Nampula, seis na província de Tete e duas na província do Niassa.

Em relação às concessões mineiras, o País possui 13 das quais 12 na província de Cabo Delagado e uma na província do Niassa.

O director nacional de Geologia e Minas, Cândido Rangeiro, explica que os

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NAÇÃO | GRAFITE
2021
POTENCIAL
MINA DE BALAMA Exportação Receitas em impostos
milhões
O
DE GRAFITE EM NÚMEROS
Em
(Produção em toneladas) (Em toneladas) (Em mil milhões de meticais) 152 500 151 500 2,62 104 108 92 200 11 984 27 675 71 583 65 173 1,57 0,13 0,03 2018 2018 2018 2019 2019 2019 2020 2020 2020 2021 2021 2020 2020 2020 2021 2021 2021 MINA DE ANCUABE Produção Exportação Postos de trabalho (Em toneladas) 1,021 2711 3811 1853 980 3,540 1,860 99 103 101 99 3,640 2017 2017 2017 2018 2018 2018 2019 2019 2019 5528 2603,4 112

projectos na fase de concessão estão, neste momento, a implantar a infra-estrutura de apoio à exploração, podendo, entre dois a três anos, iniciar a extracção e exportação do minério para o mercado internacional.

Em termos de ocorrência de grafite em Moçambique podemos mencionar as províncias de Cabo Delgado nos distritos de Balama, Ancuabe, Montepuez, Meluco, Macomia, Chiure e Namuno; província de Nampula no distrito de Monapo; província de Tete nos distritos de Marávia, Fingoe, Angónia e Tsangano; e a província do Niassa, no distrito de Nipepe.

Os projectos na fase de produção efectiva são o Twigg Mining And Exploration (Syrah Resources) e o GK Ancuabe Graphite Mine, cujas actividades foram afectadas tanto pelo covid-19 como pelos ataques terroristas. A produção de grafite recomeçou em Março depois de uma interrupção em 2020 causada pela pandemia que levou a uma redução de 65% da força de trabalho.

Entretanto, o certo é que as minas de grafite nunca foram atacadas pelos terroristas, mas algumas movimentações neste contexto fizeram com que os investidores reforçassem as medidas de segurança para evitar que os colaboradores fossem emboscados.

O economista do IESE, Yasfir Ibraimo, sublinha que só o facto de se ter um mapa tão rico como o que Moçambique apresenta – mesmo que num contexto de poucos países com este recurso – não é capaz de, por si, produzir muita riqueza. Pelo contrário, tornará o País num cada vez maior centro de atenção de empresas que vão aproveitar melhor a grafite nacional. Há tudo por se mudar!

Alguns sobressanltos

No ano passado, a mina de Balama chegou a encerrar devido aos ataques terroristas próximo às minas onde está localizada. Mas, depois de contactos com as autoridades, a empresa decidiuregressar, em Outubro. A evacuação da mina tinha sido feita na sequência de

MAIS UM PROJECTO A CAMINHO

Para além dos projectos da GK Ancuabe Graphite Mine e de Balama (Syrah Resources Limitada), que já se encontram na fase de produção, futuramente Moçambique contará com a produção de grafite da empresa DHming, no distrito de Nipepe, província do Niassa, que neste momento está na fase de desenvolvimento.

“Se tudo correr bem, este projecto vai passar para a fase de produção de grafite nos próximos dois anos”, previu Cândido Rangeiro.

Mas, ao que tudo indica, na ausência de um plano para uma exploração industrial deste recurso, o próximo projecto não deverá acrescentar muito à economia, senão apenas ao nível das receitas fiscais.

alertas sobre insegurança em Namuno, a 50 quilómetros.

Outras empresas mineiras de grafite e rubis já tinham sido alvo de ataques, desde Junho de 2022, nos quais morreram pelo menos duas pessoas. Os ataques obrigaram a evacuar os locais de operação, devido ao alastrar dos rebeldes armados para sul da província.

Tropas do Ruanda e de países da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) ajudaram as forças moçambicanas a retomar o controlo da zona dos projectos de gás, fazendo com que os rebeldes passassem a atacar em novos locais.

No caso da Syrah, as operações têm sofrido um ano conturbado. Em Junho, a cadeia logística já tinha sido suspensa temporariamente devido a ataques que se aproximaram da estrada por onde é escoada a grafite. Em Setembro, nova paragem foi provocada por causa de uma greve. Tirando estes incidentes, o trabalho deve ser no sentido de aproveitar no máximo o potencial que existe.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 31

O Potencial Impacto do Aumento das Reservas Obrigatórias na Economia Moçambicana

OComité de Política Monetária do Banco de Moçambique (BdM) decidiu, no dia 25 de Janeiro de 2023, aumentar o coeficiente de reservas obrigatórias (RO) dos depósitos em moeda local e estrangeira de 10,5% para 28% e 11,5% para 28,5% respectivamente.

O objectivo deste artigo é explicar o que são RO, como é que as alterações a esta métrica impactam a política monetária, porque é que o BdM pode ter optado por aumentar as RO e não as taxas de juro do mercado e quais as implicações que essa decisão terá nos clientes e nos bancos.

O que são as Reservas Obrigatórias?

As RO são as reservas mínimas que os bancos comerciais ou instituições depositárias devem manter contra as suas obrigações na forma de saldos mantidos no Banco Central. Por exemplo, por cada 100 meticais que um banco recebe em depósitos de clientes, 28 meticais terão de ser depositados no Banco Central, ao contrário dos anteriores 10,5 meticais.

Por causa do aumento das RO, a totalidade dos bancos comerciais devem reforçar os seus depósitos obrigatórios no BdM em cerca de MZN 92bn, perfazendo um total de MZN 156bns contra os actuais MZN 64bns reportados a fecho de Janeiro de 2023.

Como é que as alterações nas RO impactam a política monetária?

A lógica por detrás da decisão do BdM de aumentar as RO foi usá-las como uma ferramenta de controlo monetário para absorver o excesso de liquidez do mercado interbancário que poderia potencialmente ser convertido em crédito e, dessa forma, aumentar a inflação no futuro.

O excesso de liquidez no mercado pode ser reflectido pelo aumento de 11,6% ano a ano no stock de colocações bancárias em instrumentos líquidos que totalizaram 34,8 bns de MT em Dezembro de 2022. De forma simplificada, os fun-

dos que um banco empresta aos clientes resultam da diferença entre todos os seus depósitos e as reservas regulatórias que esse deve constituir.

Os fundos-extra que um banco detém são conhecidos como reservas em excesso. Portanto, quando as RO aumentam, os bancos comerciais terão menos dinheiro para emprestar aos clientes.

Este impacto de primeira ordem é amplificado pelo facto de que quando os bancos emprestam as suas reservas excedentes aos clientes depositam os seus empréstimos num segundo banco.

O segundo banco, por sua vez, empresta os mesmos depósitos aos seus clientes, e o ciclo continua até as reservas excedentárias se esgotarem.

A quantidade de dinheiro que o sistema bancário pode criar através deste ciclo de empréstimos/depósitos é encontrada usando o multiplicador de dinheiro, pois o mesmo determina quantas vezes um empréstimo será multiplicado mediante o mecanismo de reservas em excesso.

O importante a observar é que um aumento do coeficiente das RO reduz o multiplicador de dinheiro e vice-versa.

Quando o Banco Central decide aumentar as RO, cria uma redução no excesso de reservas e também no multiplicador de dinheiro, reduzindo assim a taxa de expansão monetária.

Quando isso acontece, é referido como uma política monetária contraccionista, pois reduz a quantia que os bancos comerciais podem emprestar e criar dinheiro novo. Por outro lado, quando o Banco Central reduz as RO, ele aumenta a oferta de moeda na economia – tal é chamado de política monetária expansionista.

Ao aumentar as RO e, consequentemente, reduzir a quantidade de crédito que pode ser disponibilizado na economia a partir do excesso de reservas, o BdM é capaz de conter potenciais pressões inflacionárias pela redução na procura por bens e serviços na economia.

Porque é que o BdM decidiu alterar as RO em vez de aumentar as taxas de juro

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 32 OPINIÃO
Klaus Nielsen • Chefe de Departamento de Gestão de Riscos Financeiros no Standard Bank
O impacto negativo decorrente do aumento das RO será especialmente relevante para os bancos com um rácio elevado de empréstimos sobre depósitos, conhecido como rácio de transformação, visto que terão de atrair mais depositantes por meio de oferta de taxas de depósitos acima das taxas do mercado

para reduzir as pressões inflacionárias? Que implicações tem esta decisão para os clientes e para os bancos comerciais?

As respostas podem estar no facto de que se o BdM aumentar a Taxa de Juro de Política Monetária, comummente referida como MIMO, isso: 1) tornará mais caro para o BdM combater a inflação, pois as taxas dos Bilhetes do Tesouro aumentarão; 2) tornará mais caro para o Governo de Moçambique angariar fundos, uma vez que as taxas dos Títulos do Governo aumentarão; e 3) num contexto em que as finanças das pessoas já estão sob pressão devido ao elevado custo de vida impulsionado pelas pressões da cadeia de suprimentos pós-covid e pela guerra na Ucrânia, qualquer aumento nas taxas de juro pode gerar elevados níveis de créditos em incumprimento.

Ao aumentar as RO, o Banco de Moçambique não só é capaz de reduzir o excesso de liquidez no mercado interbancário para baixar a pressão inflacionária, como também é capaz de fazê-lo sem aumentar os seus custos e, em certa medida, salvaguardar os devedores existentes, ainda que um aumento nas RO também implique um ajuste na Prime Lending Rate por via do prémio de risco.

Os benefícios associados à utilização das RO como instrumento de política monetária têm como contrapartida uma perda para os bancos comerciais e clientes que buscam novos empréstimos.

Para os bancos comerciais, a redução das reservas excedentárias resultante do aumento das RO traduz-se numa redução da carteira de crédito com consequente perda da receita que lhe está associada.

Em termos monetários, o aumento das RO para moeda local levará a uma perda de receitas para os bancos comerciais em 2023 na ordem de MZN 12.8 bn, enquanto para moeda estrangeira a perda de receitas será entre MZN 90m e MZN 950m.

O impacto negativo decorrente do aumento das RO será especialmente relevante para os bancos com um rácio elevado de empréstimos sobre depósitos, conhecido como rácio de transformação (rácio entre o crédito e depósitos), visto que terão de atrair mais depositantes por meio de oferta de taxas de depósitos acima das taxas do mercado para cumprir com as RO do BdM.

Por exemplo, os bancos comerciais com um rácio de transformação de 73% ou mais serão forçados a atrair novos

depositantes para cumprir com as obrigações do BdM e, consequentemente, serão obrigados a oferecer taxas mais atractivas, o que, por sua vez, faz com que outros bancos aumentem as suas taxas de depósito para proteger seus depósitos.

Por outro lado, os bancos comerciais com rácios de transformação de 50% ou menos podem não ser forçados a aumentar as suas taxas de depósitos, mas podem sofrer algumas saídas de depósitos, uma vez que os clientes procuram rendimentos mais elevados.

Concluindo, o aumento das RO protegerá a economia de possíveis pressões inflacionárias, à medida que o excesso de liquidez no mercado interbancário for eliminado e o crescimento da carteira de crédito for contido.

Por outro lado, a desvantagem que surge pelo aumento das RO é a desaceleraração da economia devido à redução da demanda agregada e uma pressão adicional no sector bancário por via da redução de receitas e potencial aumento das necessidades de liquidez.

Esta desvantagem é compensada pelo facto de o custo de vida ser estabilizado à medida que a inflação é contida e potencialmente evita aumentos consideráveis das taxas de juros no futuro.

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Recentemente, o Banco de Moçambique decidiu aumentar consideravelmente os coeficientes das Reservas Obrigatórias

“Devíamos Ser Nós a Ditar as Regras do Jogo na Exploração da Grafite”

Países da Europa, Estados Unidos e China, por exemplo, definiram a grafite como um “recurso crítico” dado o seu elevado valor industrial e a elevada procura, actual e futura. Este é o caminho que Moçambique deveria seguir, de acordo com o consultor em Geologia e Minas, Reinaldo Gonçalves Júnior

Mestre em Geologia e Minas, consultor na área de recursos minerais e com uma experiência de mais de 30 anos a trabalhar no sector da indústria extractiva, Reinaldo Gonçalves Júnior defende que o Estado deve induzir a industrialização alicerçada na exploração da grafite e de todos os recursos naturais que ocorrem no País, de um modo geral.

Fala, por exemplo, da possibilidade de produção de ânodo ou de baterias como forma de maximizar os ganhos da exploração da grafite em Moçambique e de garantir a sustentabilidade através da monetização do mesmo. Sublinhando o facto de que a industrialização envolvendo a grafite pode conduzir a uma verdadeira mudança estrutural da economia, o geólogo realça que tal deve ser feito com o envolvimento do empresariado moçambicano, o que, até agora, infelizmente, não está a acontecer.

Moçambique tem na grafite um recurso considerado estratégico pela diversidade da sua aplicação. Por exemplo, é um elemento indispensável no fabrico de baterias, que representam o presente e o futuro no desenvolvimento de energia limpa. Porque será que pouco se fala e se sabe sobre este recurso?

Eu diria que não se está a colocar a prioridade necessária sobre este recurso e outros. No mecanismo actualmente implantado de desenvolvimento de recursos minerais, esperamos que o investidor chegue ao País e diga como quer

fazer as coisas e não como nós queremos que ele faça. Do ponto de vista da pretensão, se formos para a política e estratégia de desenvolvimento de recursos minerais, vamos ver que está lá prevista a questão da industrialização, mas, na prática, estas coisas não acontecem.

Quem regula a gestão dos projectos mineiros é o Ministério dos Recursos Minerais e Energia (MIREME), atravéz do INAMI (Instituto Nacional de Minas), um processo que consiste apenas em licenciar, pagar taxas, apresentar o projecto (dizer o que quer fazer), realizar estudos de viabilidade, dizer que quer exportar e acabou. Isto é, o País não se está a apropriar dos recursos para criar riqueza, pólos de desenvolvimento industrial, investir em toda a cadeia de valor e consequentemente na mudança estrutural da economia, garantindo assim a sustentabilidade.

Não somos nós que definimos o que queremos fazer com o recurso, para em seguida chamarmos o investidor para participar no que já definimos, particularmente com a grafite, em negócios justos, onde há partilha de riscos e de benefícios entre todos os intervenientes.

Mas isto está tudo nos documentos aprovados tanto pela Assembleia da República como pelo Governo. O que está a falhar, essencialmente?

É um facto que este objectivo está plasmado na Legislação Mineira Moçambicana aprovada pela Assembleia da República, mas a Política e Estratégia dos Recursos Minerais vigente (resolução n.º 89/2013), aprovada pelo Con-

selho de Ministros, nunca foi transformada num plano estratégico ou operacional. Seria necessário que fosse elaborado um plano da sua operacionalização, com responsabilidades claras e objectivos específicos, mensuráveis e realizáveis num determinado período de tempo.

Isto significa que, actualmente, o investidor é que nos conduz o desenvolvimento dos recursos e não o contrário. Sendo assim, o nosso desenvolvimento não acontece como nós pretendemos, mas sim ao ritmo dos que têm capital para investir na extracção dos nossos recursos. Acredita que uma empresa que vem da Austrália, por exemplo, estaria engajada em defender os nossos interesses e querer adicionar valor na grafite? Claro que não.

Só vem e tira para vender no mercado internacional e/ou alimentar a indústria do seu país ou do local de interesse do seu grupo. Enquanto nós não exigir-

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Texto Manuel Mandlaze • Fotografia Mariano Silva & D.R.

mos que uma concessão de exploração deve estar associada a um plano de industrialização, particularmente nos minerais críticos ou estratégicos, nada vai acontecer.

E como ultrapassar este aparente desencontro das regras legais e colocar o investidor a actuar dentro das regras que nos seriam favoráveis?

Posso dar exemplos. Em todos os países desenvolvidos, particularmente os da União Europeia, os Estados Unidos e a China, a grafite é um recurso consi-

derado estratégico ou crítico, porque a procura, neste momento e nos próximos anos, deverá ser muito alta e superior à oferta.

Os países que estão a investir nas tecnologias de conservação de energia, como é o caso de baterias para os carros eléctricos, vão demandar cada vez mais por grafite, para se manterem, porque é um recuso fundamental e o maior componente das baterias.

Então, muitos países estão a desenhar e a implementar estratégias para garantir que o fornecimento deste recurso nunca falte, providenciando apoios às

empresas do seu país para obterem o recurso pelo mundo fora. Nós também podemos ultrapassar este estado de coisas, desenhando e operacionalizando a nossa política de desenvolvimento, aproveitando esta correlação de forças internacionais, mas priorizando o nosso interesse e a participação activa dos moçambicanos. É preciso, acima de tudo, que haja uma liderança efectiva para que este processo se desenrole e funcione.

Geralmente, em mercados com pouco rigor na exploração de recursos como o nosso, a compra dos recursos não costuma ser a um preço justo. Não será este também o caso de Moçambique em relação à grafite?

É óbvio que eles querem comprar pelo preço mais baixo possível, gastando o mínimo necessário. Chegar a Moçambique ou outro país qualquer onde é possível extrair a um preço baixo para depois irem processar nos seus países e desenvolver e fortalecer a sua economia, mantendo a hegemonia e o status quo existente, é o que pretendem a não ser que nos consigamos impor para equilibrar a balança.

Quando alguém, um dia, despertar para esta situação será tarde demais porque já teremos perdido muito e assumido compromissos que, normalmente, são de difícil reversão.

Neste momento, temos 53 licenças de prospecção e pesquisa de grafite em Moçambique, sendo que duas já estão na fase de produção e algumas outras na fase de desenvolvimento. Vamos a tempo de evitar que os que estão na fase embrionária produzam grafite exportada sem adicionar valor?

Bem, o número de licenças de prospecção e pesquisa é bom porque vai permitir-nos avaliar e quantificar os recursos e reservas que o País tem em termos daquilo que pode ser explorado. Agora, o problema está depois daí.

Após a identificação e quantificação do recurso, qual é o plano de desenvolvimento? Temos de ser nós, os moçambicanos, a definirmos o que queremos e não os investidores. Repito, uma liderança efectiva do Estado é fundamental e a participação activa dos moçambicanos é imprescindível.

Seria demasiado sonhador ter uma indústria de baterias, considerando o mercado da África Austral?

Tudo começa por aí. Produzindo o ânodo a partir da grafite, depois é só

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“Quando alguém despertar para esta situação será tarde demais porque já teremos perdido muito e assumido compromissos que, normalmente, são de difícil reversão”, Reinaldo Gonçalves

adicionar o catado - outra componente que é feita de metais como o manganês e/ou o níquel -, o cobre, que juntamente com os iões do lítio formam os minerais que compõem as baterias, e que são recursos existentes em Moçambique, alguns já em produção e outros por estimular ou promover a sua prospecção e exploração.

Portanto, precisamos de criar as sinergias necessárias para fazer isso acontecer, mesmo que tenhamos de ir buscar alguns componentes em falta nos países vizinhos ou no mercado internacional. Precisamos de começar a dar passos nesse sentido, começando por produzir o ânodo que está perfeitamente ao nosso alcance com a grafite que temos.

Em muitas das suas intervenções defende a participação do empresariado nacional. Não se coloca aqui a questão de interesse, capacidade técnica e financeira para se envolver numa área tão específica da indústria. Como se consegue isto?

O empresário moçambicano precisa do suporte do Estado para conseguir impor-se neste negócio, tendo em conta

que o objectivo é o mesmo e todos os intervenientes devem comparticipar nesta empreitada, tendo em vista ganhos mútuos.

É verdade que estamos numa economia de mercado e o Estado não intervém directamente na economia, mas deve haver consciência que o empresariado local deve ser induzido para dar o salto. Por exemplo, os Estados Unidos, depois de declararem a grafite como um mineral crítico para o seu país, criaram um fundo público para ajudar as empresas privadas a irem buscar este recurso noutras partes do mundo, incluindo em Moçambique, para alimentarem as suas indústrias e necessidades de desenvolvimento.

Isto é assim em todo o mundo, na China acontece o mesmo. Por isso, temos de ter uma estratégia que estimule o empresariado moçambicano a participar activamente neste processo. Se não fizermos isso será tudo obra do acaso.

Normalmente os outros aproveitam-se quando se apercebem que não temos clareza no que queremos, não temos planos e não estamos organizados para alcançar o objectivo pretendido. Agora, será que é esse desenvolvimento

que nós queremos para o País, onde tudo é obra do acaso? Não precisam de ser empresas do Estado, porque está provado que estas normalmente têm problemas de gestão e foco. A saída é criar regras claras, colocar o financiamento, tecnologia e outros elementos necessários à disposição dos privados e fazer acompanhamento e fiscalização. Todos fazem assim. Quem somos nós para nos mantermos na ilusão de capitalistas genuínos?

Temos capital humano capaz de dar vida às sugestões que apresenta?

Sim. Temos massa pensante, pessoas activas aqui em Moçambique, mais ou menos da minha geração, que têm por aí 20, 30 e 40 anos de carreira no sector dos recursos minerais, que trabalham como consultores ou como trabalhadores de multinacionais e que não estão a ser aproveitadas pelo Estado.

Não há nenhuma iniciativa para unir esse pessoal para ajudar a definir estratégias e planos de desenvolvimento do sector com foco na industrialização.

As organizações profissionais existentes, como a nossa AGMM (Associação Geológica-Mineira de Moçambique), lutam por se afirmar como parceiros do Governo na formulação e partilha de ideias, mas não há uma plataforma formal e clara de engajamento e aproveitamento. Isto é feito em todo mundo.

Por exemplo, aquando da crise financeira de 2008, nos Estados Unidos, o Presidente Barack Obama acabava de entrar no poder, e foram chamados para uma sala na Casa Branca grandes professores, empresários e investidores do país, que deram ideias de como reverter a situação.

Nós, infelizmente, ainda pensamos que investidor é quem vem de fora e esquecemo-nos que este investidor tem interesses, que não são os mesmos que os nossos, e que nós temos de salvaguardar os nossos interesses, participando activamente no processo.

E depois temos a questão de exportação de capitais...

Pela forma como actuamos neste momento, fica muito pouco para o País, para além de ainda ficarmos com os impactos ambientais negativos da exploração destes recursos. Quando a exploração acaba tudo acaba. Mas se criarmos pólos de desenvolvimento industrial ligados a esta matéria-prima que está a ser extraída, temos a possibilidade de continuar a produzir mesmo quando já não temos o recurso.

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Temos de criar regras claras, colocar o financiamento, tecnologia e outros elementos necessários à disposição dos privados e fazer acompanhamento e fiscalização. Todos fazem assim

Gestão de Resíduos – Desafios que o País Ainda Enfrenta

Vivi no bairro de Hulene B, onde, enquanto crescia, vi a lixeira de Hulene também crescer. Não sei quantos anos a lixeira tem, mas eu já estou na casa dos 30 anos. Lixeira onde se depositam resíduos de forma indiscriminada, incluindo resíduos perigosos. “Será que só existe este local para deposição do lixo?” Esta é a questão que coloco desde a minha infância e que permanece até aos dias de hoje por responder.

A Gestão de Resíduos em Moçambique constitui um problema que afecta todo o território nacional. Até aos dias de hoje prevalece a elevada produção de resíduos e a falta de locais adequados para a deposição final.

Actualmente, em todo o País existe apenas um aterro sanitário para a deposição de resíduos perigosos (Aterro de Mavoco), e os resíduos sólidos urbanos são depositados em lixeiras a céu aberto, o que constitui um perigo para a saúde pública e para o ambiente.

Neste artigo, convido-vos a fazer uma reflexão sobre o estado da gestão de resíduos em Moçambique e os principais desafios que o País ainda enfrenta.

Entende-se por resíduo toda a matéria, substância, objecto ou bem resultante de um processo ou operação que foi descartado, mas que ainda pode ter ou não alguma alternativa de uso (seja por meio de reutilização, ou reciclagem).

Os resíduos podem ser classificados quanto: (i) à sua forma - sólidos (resíduos sólidos), líquidos (efluentes) e gasosos (gases e vapores); (ii) às suas características - inertes, perigosos e inofensivos; (iii) à sua origem - urbanos, industriais, hospitalares, agrícolas, entre outros.

A gestão de resíduos consiste num conjunto de metodologias que visam a redução de resíduos e o seu encaminhamento para um destino final adequado, para reduzir o seu impacto no ambiente. A gestão de resíduos integra as actividades necessárias para controlar os resí-

duos desde a sua origem até ao seu destino final, nomeadamente a prevenção da sua produção, triagem, acondicionamento, recolha, transporte, transferência, tratamento, valorização e deposição final dos resíduos.

Uma adequada gestão de resíduos deve estar assente na seguinte hierarquia: prevenção, redução, reutilização, valorização e eliminação. O Artigo 90 da Constituição da República, que aborda o Direito de Ambiente, determina que todo o cidadão tem o direito de viver num ambiente equilibrado e o dever de o defender.

Com base neste artigo, foi criada a Lei do Ambiente bem como outros instrumentos legais que o complementam, entre eles, o Decreto n.º 94/2014 e o Decreto n.º 83/2014, que dividem a Gestão de Resíduos em Perigosos e não Perigosos.

Em Moçambique, a responsabilidade pela Gestão de Resíduos é do Ministério da Terra e Ambiente. Particularmente, a Gestão dos Resíduos Sólidos Urbanos (GRSU) compete aos conselhos municipais e aos governos distritais nas áreas sob sua jurisdição, enquanto a Gestão de Resíduos Perigosos compete às entidades produtoras sob orientação do Ministério da Terra e Ambiente através de regulamentos específicos.

Apesar da legislação e estratégias para a Gestão de Resíduos existentes no País, ainda prevalece o uso de um sistema de Gestão de Resíduos que coloca em causa a saúde pública e o ambiente. Exemplo disso é a existência de lixeiras a céu aberto correntemente utilizadas para deposição final dos resíduos, como a lixeira de Hulene, onde em 2018 morreram 17 pessoas por soterramento devido ao seu desabamento, que atingia já uma altura de um prédio de três andares.

Em Moçambique, conta-se apenas com um único local para a deposição final dos Resíduos Perigosos, o aterro sanitário de Mavoco em Maputo, que opera com limitações devido à insuficiência financeira e de meios materiais para o tratamento de certos resíduos perigosos,

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 38 OPINIÃO
Faizal Mote • Engenheiro do Ambiente, colaborador da InSite
Apesar da legislação e estratégias para a Gestão de Resíduos existentes no País, ainda prevalece o uso de um sistema de Gestão de Resíduos que coloca em causa a saúde pública e o ambiente

que acabam sendo depositados sem nenhum tratamento.

De facto, o País enfrenta diversos constrangimentos relativamente à implementação de uma adequada política de gestão de resíduos, começando logo na produção dos mesmos que, naturalmente, acompanha o crescimento populacional e as mudanças de hábitos e costumes.

Infelizmente, há pouco foco na redução na fonte produtora de resíduos, que apresenta falta de conhecimento das práticas de conservação ambiental e está pouco sensibilizada para este tema.

Outro problema é a separação e deposição em destino final adequado. Não existem contentores adequados em número suficiente para o acondicionamento dos resíduos sólidos e a recolha de resíduos abrangia apenas cerca entre 40% a 50% da população nacional, de acordo com dados de 2012 do MICOA (últimos dados disponíveis).

A triagem de resíduos é praticamente inexistente e a que existe é assegurada por meios menos formais, nomeadamente por algumas associações e pelos “catadores” que recolhem alguns tipos de resíduos para reciclagem, como é o caso do material plástico, do alumínio, do ferro, do vidro, do cartão, etc..

Os meios de transporte são também insuficientes, quer em número, quer em condições, estando alguns parados devido a avarias. A somar aos desafios na GRSU e na gestão dos resíduos perigo-

sos, temos ainda a gestão dos resíduos agrícolas, que constitui, a meu ver, uma lacuna na legislação nacional dado o notório crescimento e importância deste sector para a economia e o desenvolvimento do País.

No sentido de implementarmos uma política de gestão de resíduos que proteja a saúde pública e o ambiente, devemos, para além de outras acções, consciencializar toda a população para a importância da gestão de resíduos.

Em particular, seria importante a introdução da educação ambiental no currículo académico, já que os mais jovens são sempre um importante vector de mudança de comportamentos na sociedade.

É necessário fortalecer na sociedade, e em particular entre os jovens, os conceitos basilares da gestão de resíduos: (i) reduzir a produção; (ii) reutilizar sempre que possível; (iii) reciclar; e, por último, (iv) depositar nos locais adequados para tratamento.

Em suma, o País tem já um quadro legal bastante desenvolvido no âmbito da gestão de resíduos. Urge, agora, a necessidade de desenvolvermos mais infra-estruturas adequadas à implementação do preconizado na legislação e apostarmos na educação ambiental da população.

Além disso, de forma resumida, em matéria de gestão de resíduos, o País precisa ainda de enfrentar e resolver os seguintes desafios:

Na Legislação

• A divulgação dos dispositivos já existentes para os intervenientes no processo de Gestão de Resíduos e uma maior inspecção com carácter pedagógico;

• A criação de um regulamento sobre a Gestão de Resíduos agrícolas;

• A criação de um regulamento para introdução da educação ambiental no currículo académico.

Na Gestão de Resíduos não Perigosos

• A redução da produção de resíduos a partir da fonte;

• Implementação de sistemas de triagem, com recolha selectiva por fileiras de resíduos (plástico/embalagens, papel/cartão, vidro e resíduos orgânicos);

• Enceramento das lixeiras a céu aberto e reabilitação urbanística destes locais;

• Redimensionamento da rede de contentores de acondicionamento, da frota para recolha de resíduos e reabilitação das viaturas existentes;

• Optimização e extensão das rotas de recolha de Resíduos Sólidos Urbanos;

• Programas de educação ambiental para sensibilizar a população sobre a importância da conservação ambiental.

Na Gestão de Resíduos Perigosos

• Aumentar o número de aterros sanitários para resíduos perigosos;

• Equipar os aterros sanitários para poderem fazer os tratamentos necessários dos resíduos perigosos produzidos

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 39
É preciso que se introduza a educação ambiental no currículo académico

É Hora do Boom para os Projectos Africanos

A agência norte-americana Standard & Poor’s estima que a África Oriental venha a tornar-se no novo centro de projectos de grafite à medida que a indústria de veículos eléctricos for crescendo. Embora internamente não se encontrem sinais de crescimento do mercado moçambicano, por fora, o País é visto entre os que mais se projectarão neste negócio

Espera-se que o crescimento sem precedentes na produção de veículos eléctricos gere um grande aumento na demanda e nos preços de grafite na próxima década. As vendas daquele tipo de veículos tiveram um crescimento considerável nos últimos anos, atingindo 9,4% da penetração global de veículos de passageiros em 2021 e devem triplicar até 2026.

A S&P Global Commodities Insights estima que as vendas de veículos cresçam a uma taxa de mais de 28% ao longo deste período. Como consequência, os materiais de bateria rapidamente se tornaram críticos para a cadeia de suprimentos automotiva, com grandes empresas a estabelecerem parcerias com fabricantes de células de bateria e mineradoras da matéria-prima.

De acordo com os analistas da Standard & Poor’s (S&P), uma bateria de iões de lítio precisa de dez vezes mais grafite do que lítio, com cada veículo eléctrico a exigir aproximadamente 55 kg de grafite em flocos para fazer o ânodo da bateria.

“E parece que os projectos africanos podem ser beneficiados”, estima a S&P Global Commodity Insights, sinalizando que o continente “poderá ser o lar do novo boom em projectos de mineração de grafite”.

Historicamente, a maior parte da grafite foi extraída e processada na China, país que produziu 820 mil toneladas métricas de grafite em 2021, cerca de 79% da produção global total, de acordo

com o US Geological Survey. Em comparação, o segundo maior produtor foi o Brasil com cerca de 68 mil toneladas, seguido por Moçambique com 30 mil toneladas, da Rússia com 27 mil toneladas e de Madagáscar com 22 mil toneladas. Mas outros países como os da península Escandinávia, da América do Norte, Austrália – e especificamente o Leste da África – estão a lançar novos projectos.

África é alternativa ao abastecimento chinês

De acordo com a Benchmark Minerals Intelligence – entidade que regula o mercado de matéria-prima em lítio, cobalto, grafite e níquel –, Moçambique está prestes a desenvolver-se como uma importante região produtora de grafite em flocos, prevendo um aumento de até cinco vezes mais até 2030 em relação aos níveis de 2021.

“Com a produção chinesa de grafite prevista para aumentar em 45% no mesmo período, e a demanda a jusante definida para escalar ainda mais, os players do mercado chinês podem buscar cada vez mais o fornecimento no exterior para atender às suas necessidades de matéria-prima, o que fará com que África actue cada vez mais como um centro alternativo de fornecimento de grafite em flocos”, refere a Benchmark, que prevê, igualmente, que a produção de flocos africanos representará 44,3% do mercado global até 2030, em comparação com 12,5% em 2021. Este cenário poderá, simultaneamente, ser favorecido pelo

comportamento dos preços. É que embora os preços da grafite não tenham subido 400% como os do lítio, ao terem aumentado 22% em 2022 em comparação com o ano anterior fazem prever um cenário favorável.

Os preços da grafite em flocos pequenos adequados para o mercado de baterias estão acima de 800 dólares por tonelada, sendo negociados tradicionalmente entre 500 e 550 dólares por tonelada.

De acordo com a Benchmark Mineral Intelligence, a subida de preços acabou por ser influenciada pelo conflito Rússia-Ucrânia, que pode cortar 30 mil toneladas de oferta no mercado europeu da mina Zavalievsky da Volt Resources na Ucrânia e da mina Taginka da Ural Graphite na Rússia. Além disso, os ciclones no início deste ano em Madagáscar e os casos de covid-19 na China também causaram interrupções logísticas.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 40 NAÇÃO | GRAFITE
Texto Celso Chambisso • Fotografia Istock Photo
De acordo com a Benchmark Minerals Intelligence, Moçambique está prestes a tornar-se uma importante região produtora de grafite em flocos, prevendo um aumento de cinco vezes até 2030

Espera-se défice estrutural já em 2023-2024

A produção da grafite natural pode enfrentar um défice estrutural a partir deste ano e no próximo, à medida que se verificar o crescimento da demanda global por grafite processado (também conhecido como grafite esférico). Com a procura a superar a oferta, estima-se um défice natural de grafite de 3,7 milhões de toneladas até 2030, representando cerca de 37% do mercado.

Embora os ânodos de grafite para veículos eléctricos possam ser sintéticos ou naturais, até 2030 espera-se que estes materiais representem quase metade da demanda. “Prevemos que o peso de mercado da grafite natural em flocos aumente devido à sua pegada ambiental favorável, especialmente à medida que as indústrias se tornam cada vez mais focadas na sustentabilidade da cadeia de

suprimentos”, considera Ilka von Dalwigk, gestora de política da EIT InnoEnergy na European Battery Alliance, entidade fornecedora de dados de referência e apoio ao estabelecimento de um ecossistema europeu de baterias.

Este cenário reforça a previsão de que os próximos anos serão de oportunidades nunca antes vistas para os países produtores e com reservas de grafite, e Moçambique pode ganhar se a partir de agora fizer o devido acompanhamento da trajectória do mercado global e tomar medidas para assegurar um posicionamento de destaque também no que diz respeito à transformação deste minério.

Os projectos mais destacados de África

A S&P Global Commodity faz menção, mais uma vez, à Syrah Resources. Lembra que este projecto arrancou em

OS DEZ MAIORES PRODUTORES

Embora os números possam divergir em função da fonte, não há dúvidas de que Moçambique está entre os maiores produtotes globais

Ton 95,000 Ton 34,000 Ton 19,000 Ton

120,000 Ton

47,000 Ton

13,000 Ton

24,000 Ton 15,000 Ton 10,000 Ton

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MUNDO FONTE S&P Global Commodities Insights 650,000
DO
China Brasil Índia Ucrânia Paquistão Moçambique Madagáscar Rússia Noruega Canadá 1 3 5 7 9 2 4 6 8 10

Balama, província de Cabo Delgado, em Novembro de 2017 e, até ao primeiro trimestre do ano passado, havia produzido 46 mil toneladas de grafite natural com 76% de recuperação e com 35 mil toneladas vendidas.

Até ao final do primeiro trimestre do ano passado, a empresa tinha um saldo de caixa de 205 milhões de dólares. A instalação de material de ânodo activo de 11,25 ktpa (quilotoneladas por ano) deve iniciar a produção no terceiro trimestre de 2023.

Outro projecto africano de relevo está também em Moçambique e é o da Triton Minerals, cuja actividade tem lugar no distrito de Ancuabe, também em Cabo Delgado. A empresa anunciou que assinou um acordo vinculativo de aquisição com o fabricante chinês de produtos de grafite, a Yichang Xincheng Graphite (Xincheng), em Novembro de 2021.

Sob o acordo, a Triton fornecerá à Xincheng até 10 mil tpa (toneladas por ano) de concentrado de grafite em flocos da sua planta piloto comercial em An-

cuabe. O negócio, com a duração de cinco anos, tem potencial para aumentar para um volume maior após a construção completa do projecto, que tem uma capacidade nominal de 60 mil tpa, caso a fase inicial seja bem-sucedida.

O plano era construir, inicialmente, uma planta piloto comercial de pequena escala, capaz de produzir concentrado de grafite em flocos de forma comercial dentro de 18 meses, até Setembro de 2023 corrente. Em seguida, a empresa expandir-se-ia para uma mina de grande escala, conforme previsto em 2017.

A Tritton tinha 3,2 milhões de dólares em caixa em 31 de Março de 2022.

O terceiro grande projecto é tanza-

niano e é desenvolvido pela Black Rock Mining no projecto de grafite denominado Mahenge. O potencial actual é avaliado em 213,1 milhões de toneladas. Em 2021, a empresa concluiu a operação de uma campanha de qualificação em larga escala na China, que processou 500 toneladas de grafite a granel do projecto Mahenge.

“A demanda global por grafite continua a crescer, com ventos positivos no mercado, proporcionando à Black Rock uma oportunidade excepcional de se tornar num grande produtor de grafite na cadeia de fornecimento de energia limpa”, disse a empresa num dos seus relatórios de desempenho.

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NAÇÃO | GRAFITE
Embora os ânodos de grafite para veículos eléctricos possam ser sintéticos ou naturais, até 2030 espera-se que estes materiais representem quase metade da demanda mundial de grafite

Passámos recentemente pelo Dia Internacional da Mulher e está a chegar o Dia da Mulher Moçambicana. Começo por honrá(r)-las(nos) com uma frase da Clarissa Pinkola Estés, poeta e psicanalista bem conhecida por quem se interessa pelo tema do Feminino, assim como o seu clássico Mulheres que Correm com os Lobos:

“Toda a mulher parece uma árvore. Nas camadas mais profundas da sua alma ela abriga raízes vitais que puxam a energia das profundezas para cima, para nutrir suas folhas, flores e frutos. Ninguém compreende de onde uma mulher retira tanta força, tanta esperança, tanta vida. Mesmo quando são cortadas, tolhidas, retalhadas de suas raízes ainda nascem brotos que vão trazer tudo de volta à vida outra vez. Elas têm um pacto com essa fonte misteriosa que é a Natureza.”

As Árvores são uma enorme fonte de inspiração para mim. Tanto no meu trabalho como na minha vida pessoal sempre me trouxeram insights, sustentação e sabedoria. E, por isso, ressoa em mim totalmente o que disse Herman Hesse: “Quem sabe como falar-lhes, ouvi-las, esse conhece a verdade”. Sempre encontrei várias semelhanças entre as Mulheres e as Árvores (e não só), mas hoje vou centrar-me sobre elas. Vale a pena começar com uma citação de Andreas Weber, biólogo e filósofo alemão, do seu recente curso “Ecology of Love”:

“Ecossistemas são histórias de amor. As nossas formas mais profundas de nos relacionarmos e sentirmos, de tocarmos e de sermos tocados, são formas ecológicas de dar vida, de amarmos. Quando descobrimos a ecologia como a história de amor vibrante que realmente é, podemos desaprender os hábitos violentos da nossa civilização.”.

Weber defende que precisamos de deixar cair a visão neo-darwinista de que a sobrevivência e a reprodução são os únicos imperativos evolutivos. Este reducionismo científico perde uma his-

Culturas Regenerativas – As Mulheres são como Árvores

tória rica sobre a reciprocidade, a beleza e até o amor. “Amar signifca estar plenamente vivo.” (A. Weber)

Em The Biology of Wonder, Weber revê o enigma fundamental da vida, desafiando-nos a compreender o sentimento como o princípio de toda a vida, argumentando que todos os seres vivos, como os humanos, não são máquinas biológicas, mas agentes vivos e criativos, alimentados pelo significado e pela expressão. Sentimentos e emoções estão longe de serem supérfluos para o estudo dos organismos. São, antes, o próprio fundamento da vida. Para Weber, a cisão entre nós e o mundo natural é indiscutivelmente a causa raiz da maior par-

indivíduos quando a doença e o desconforto (...) (sinalizam) os sistemas de opressão dentro dos quais estamos presos como moscas na teia de uma aranha. Pensamos que devemos curar-nos individualmente e ser bem- sucedidos individualmente.

Somos também ensinados que sentimos e experienciamos individualmente, através do contacto directo com a nossa corporalidade delineada pela pele. Este fenómeno é conhecido como “healthism” e é definido como a preocupação com a saúde pessoal e a responsabilidade pessoal pela saúde como sendo a principal, muitas vezes em detrimento da compreensão de que a saúde de uma pessoa está intimamente ligada (e representa) toda uma população (humana e mais que humana). A doença, o trauma e a dor não pertencem a um indivíduo. São uma teia que inclui alguém. Da mesma forma, a cura não é um objecto ou realização que pertença a uma pessoa. A investigação sobre cognição incorporada e ecologia, microbiologia e somática oferece um vislumbre de algo mais propagável (e cheio de “fugas”/vazamento) do que a ideia moderna de um self auto-preservado.”

te das catástrofes ambientais que se desenrolam à nossa volta. Até que nos conformemos com as profundezas da nossa alienação, não conseguiremos compreender que o que acontece à natureza também nos acontece a nós.

Vale a pena trazer aqui também um excerto da Sophie Strand, uma jovem que, com poesia, dá voz ao mundo mais que humano, que afirma estar mais interessada no “ensoilment” do que no “ensoulment” e que nos faz reflectir sobre a nossa prepotência e arrogância pelo lugar antropocêntrico que teimamos em ocupar:

”Vivemos numa cultura que preza o eu atomizado, impondo (...) a cura aos

A importância da relação, do padrão, da reciprocidade, da experiência, em vez do foco no(s) indivíduo e no(s) objecto(s), que Gregory Bateson entre outros já nos trazia, e a porosidade de todos os elementos do sistema, abrem-nos a percepção para a complexidade intrincada do Lugar e da sua história. E o Desenvolvimento regenerativo é sobre isso mesmo: ajuda-nos a compreender o Lugar como um sistema vivo, em permanente evolução. A partir desta compreensão, ganhamos também a percepção (e humildade) sobre qual é o nosso papel no Lugar ou no sistema, para que se possa caminhar em direcção à realização do melhor potencial possível.

Por outro lado, este preconceito também neo-darwinista de que a evolução é uma seta sempre em frente não corr-

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 44 OPINIÃO
Todas as Árvores e as Mulheres conhecem a ciclidade. Sabem o que é viver as diferentes estações. E do quão importante é poder contar com o apoio da rede de suporte da Floresta...
Susana Cravo • Consultora & Fundadora da Kutsaca e da Plataforma Reflorestar.org

responde à verdade. A evolução pode ser bifurcação (por aqui ou por ali), mas também pode ser dispersão e fusão (por aqui e por ali, isto e aquilo). De forma súbita, imprevisível, por vezes caótica, a troca, a reciprocidade acontecem, dando origem a um novo ser, a nova vida, a nova experiência.

O líquen, as algas, as bactérias, os fungos são provas disso. Assim o são as árvores também. E as Mulheres.

Além da mais evidente e bela relação de troca, através do oxigénio que respiramos e da sua capacidade de absorção do dióxido de carbono que expiramos, transformando o que para nós é tóxico novamente em solo fértil, há já várias investigações acessíveis em diferentes contextos, sobre a forma como as Árvores comunicam umas com as outras e se cuidam, não só entre Ancestres (Mães) e pequenas crias, mas também entre Famílias vastamente conectadas pelas suas raízes, que têm uma linguagem própria e imperceptível para nós, mas altamente poderosa e que espelha muito do que é o Feminino e a própria vida.

São claramente um exemplo de cooperação – Árvores da mesma Família não só não competem entre si, como se avisam do perigo percebido e ajudam vizinhas próximas, enviando água e outros nutrientes através do micélio. Além de estabelecerem relações significativas, possuem memória e conhecem sensações, registando-as na forma como os seus anéis internos (ou impressão digi-

tal) se tecem, na forma como abrem os seus ramos (ou braços) à vida e na fertilidade que oferecem ao ecossistema. Gostam de estar juntas, criando Florestas lindas e vibrantes, nutrem e sustentam a vida. São guardiãs e, como ja dizia o provérbio, “não negam sombra nem ao lenhador”.

Todas elas – as Árvores e as Mulheres – conhecem a ciclidade. Sabem o que é viver as diferentes estações. E do quão importante é poder contar com o apoio da rede de suporte da Floresta, quer nos momentos mais difíceis, quer nos momentos de pura partilha, convivência e celebração.

Conhecem a dor e o êxtase profundos, são capazes de experienciar emoções aparentemente opostas em simultâneo e trazem dentro de si uma diversidade de potenciais papéis. Esta ciclicidade e complexidade da Árvore e da Mulher nem sempre são entendidas e, principalmente, respeitadas no mundo bruto, competitivo e masculinizado em que vivemos. Entenda-se que esse mundo masculinizado é alimentado por Homens e Mulheres, pelo pensamento hiper-racional, pelo desequilíbrio profundo entre Feminino e Masculino, que abordei no penúltimo artigo.

Como diz a Joan Halifax (adaptando a ideia original de Thich Nhat Hanh): “Somos flores de Lótus em mares de fogo”.

E por trás desta campanha massiva do empoderamento da Mulher e da evidente importância da Mulher na econo-

mia, anda também um extractivismo, um nível de exigência, que nem sempre é compatível com a nossa natureza e sobretudo ciclicidade. Na ambição de querermos chegar a todos os Lugares, com os filhos ao colo, o tacho ao lume e a cesta (ou livros) na cabeça, esgotamos tempo e vitalidade que poderíamos multiplicar com mais equilíbrio, ao serviço da vida, para todo o ecossistema. Vejo um pouco de tudo. Mas vou evitar os assuntos graves e os clichés. Vejo Mulheres a explorar Mulheres, muitas vezes nos seus próprios Lugares. Vejo Mulheres a querer empoderar Mulheres ao final da tarde, mesmo sabendo que elas acordaram às 5h. Vejo Mulheres a preparar Festas de Família e “do bem” à custa do esforço indigno de outras Mulheres. Vejo Homens e Mulheres a continuar a desvalorizar o tempo, dedicação e preciosidade do trabalho não pago e não visto, embora imprescindível. Vejo organizações “do bem” a explorar e a adoecer os seus solos e corpos.

Vejo Mulheres a fazer rituais de Sagrado Feminino e a não cuidar da Terra e do Planeta. E este cliché é importante deixar: Vejo Mulheres a cuidar de toda(o) s e de tudo, menos delas próprias. Mas para deixar o cliché, tenho de acrescentar imediatamente a seguir: vejo-nos a todas e a todos a perpetuar a colonização das mentes, dos corpos e dos solos, com o que achamos que é. E como se lia em cartazes recentes: “O lugar da Mulher é onde ela quiser”.

Mas também vejo, e cada vez mais, Mulheres a apoiar outras Mulheres, fora do seu circuito de Amigas/Família, de forma discreta, sem propaganda, com intenções genuínas e atentas ao que verdadeiramente elas precisam e valorizam.

Vejo cada vez mais Homens a apoiar genuinamente e da forma certa as Mulheres.

Vejo cada vez mais consciência sobre o que é o Feminino e o Masculino e a importância do equilíbrio entre eles, em todas e todos nós, na forma como nos relacionamos com a vida.

Vejo cada vez mais Florestas vibrantes, vitais para reflorestar a alma, a vida e o mundo.

E ainda bem, pois por mais que nos seja difícil admitir, são sobretudo as Mulheres que garantem que a vida continua – em casa, na escola, na terra, na guerra e nos Lugares da vida económica, social, cultural e política que ela ocupa. Estamos longe de lhes dar o devido valor e poder, mas para lá caminhamos, assim espero.

As Mulheres são como Árvores e “Árvores são poemas que a terra escreve para o céu.” Kahlil Gibran.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 45
“Jovens do Programa mais emprego no âmbito da celebração do Dia da Mulher Moçambicana em parceria com a Kutsaca”

FNB Perspectiva Crescimento da Economia Nacional na Ordem de 5% a 6% em 2023

Aeconomia nacional vai registar um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) na ordem dos 5% a 6% no exercício económico de 2023. Esta é a perspectiva avançada pelo estudo divulgado esta quarta-feira, em Maputo, pelo FNB Moçambique, subsidiária do Grupo First Rand.

O crescimento do PIB será suportado pelo crescimento de sectores como a Agricultura (com uma contribuição entre 20% a 25%), a Logística, a contínua recuperação da Hotelaria e Turismo, Mineração e Pesca.

O estudo, fundamentado nas Perspectivas Económicas para 2023 - África e Moçambique, foi conduzido pela equipa de pesquisas económicas do RMB (Rand Merchant Bank), braço corporativo do FirstRand. A apresentação deste estudo foi liderada por Daniel Kavishe, economista do Rand Merchant

Bank (RMB), e Alfredo Mondlane, gestor sénior de Crédito do FNB Moçambique.

É de se esperar um crescimento num ambiente económico marcadamente adverso caracterizado, essencialmente, por choques decorrentes de incertezas geopolíticas, financeiras e de ordem político-militar (conflito Rússia –Ucrânia).

Os sinais emitidos pela economia vêm assinalar a tendência de recuperação económica, após um período de desaceleração provocado pela queda dos preços das principais commodities no mercado internacional e a pandemia do covid-19. Entretanto, prevê-se que a exportação do gás da bacia do Rovuma (projecto offshore) e do carvão mineral continue a crescer em 2023, resultante do conflito russo-ucraniano.

“A narrativa económica para Moçambique é boa e esperamos um crescimento na ordem de 5% a 6%. Quan-

do comparamos o crescimento económico deste ano com o de outros anos, é visível um estado de recuperação gradual”, disse Alfredo Mondlane, do FNB.

Daniel Kavishe anotou que, ao nível do continente africano, a inflação vai conhecer uma redução significativa e permanecerá estruturalmente acima da média, a longo prazo. Kavishe sublinhou ainda que a política fiscal poderá permanecer limitada na maioria dos mercados devido, em parte, aos elevados custos do financiamento.

O economista do RMB fez saber que está em curso o acompanhamento pormenorizado do processo de reestruturação da dívida em países como o Gana e a Zâmbia. Para este ano, anotou ainda o economista, as previsões apontam para a volatilidade da moeda com uma tendência geral para uma maior depreciação de algumas moedas.

O evento contou com a participação de 150 pessoas de diferentes sectores da economia, que tiveram a oportunidade de saber mais e esclarecer-se sobre temas relacionados com o crescimento da economia nacional e africana, regionalização, volatilidade da taxa de inflação, sectores em crescimento e outros.

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"É de se esperar um crescimento num ambiente económico marcadamente adverso caracterizado, essencialmente, por choques"
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Africa Pode Adoptar Energias Renováveis em Escala Maciça

Economizando Assim Milhares de Milhões de Dólares

Ofuturo energético de África numa encruzilhada Quando o assunto é o futuro energético em África, as decisões enfrentadas hoje pelos líderes do continente são de importância histórica, nem mais nem menos. Mais que tudo, os sistemas energéticos constituem o tecido da actividade comercial e da sociedade.

Países em toda a África querem levar a cabo o seu objectivo de construir enormes quantidades de nova capacidade de geração, a fim de antecipar os vastos aumentos na procura de energia e de colocar o continente no caminho certo rumo ao crescimento e ao desenvolvimento que ele merece. Com o seu imenso potencial energético e a sua baixa taxa de electrificação, Moçambique encontra-se na linha da frente desta tendência continental.

Os responsáveis pelo planeamento energético sabem aonde precisam de ir. A grande pergunta é: “Como?”. Mais especificamente: qual é a matriz energética mais económica que pode ser construída para garantir toda a nova capacidade de electricidade necessária? Energia eólica, energia solar, turbinas a gás, carvão, motores a gás... Há muitas opções disponíveis, mas cada país tem uma única solução ideal.

Há mais de uma década, engenheiros e analistas da Wärtsilä, de nível internacional, vêm fazendo uso da sua rica experiência no sector energético africano para responder a essas perguntas, país por país. Mobilizámos técnicas de modelização de ponta e tecnologicamente neutras e levámos em consideração todas as restrições técnicas locais e todas as tecnologias, bem como os recursos naturais. Foram desenvolvidos e comparados vários cenários de matriz energética.

Executámos os modelos de maneira rigorosa e obtivemos números eloquentes. Em Moçambique, no Senegal ou na Nigéria, entre muitos outros países, os nossos estudos revelam diferenças de custos consideráveis entre as várias estratégias energéticas possíveis.

Estão em jogo milhares de milhões de dólares

No que respeita à escolha das tecnologias energéticas, é primordial manter-se uma visão aberta, desprovida de quaisquer preconceitos. As tecnologias que podem ser adequadas para a Europa, tendo em conta a infra-estrutura existente, a densidade demográfica ou os recursos naturais neste continente, podem não servir para outras regiões do mundo.

Cada país ou região deve encontrar a melhor forma de construir o seu próprio sistema energético. Muitos países africanos, no entanto, têm um importante ponto em comum: talvez mais do que em qualquer outro lugar, os modelos apontam que a rota para se construir o melhor sistema energético em matéria de custos passa pela maximização do uso das energias renováveis.

O nosso mais recente estudo “Planning Mozambique’s optimal power system expansion” (“Planear uma expansão máxima do sistema energética de Moçambique”) mostra que Moçambique não é excepção, pois uma modelização aprofundada revela uma forte correlação inversa entre a quantidade da capacidade instalada de energias renováveis e o custo total do sistema.

Deve-se estabelecer um facto de uma vez por todas. O custo dos equipamentos de energias renováveis tem vindo a cair muito rapidamente nos últimos anos e quando esses equipamentos utilizam os recursos solares e eólicos maciços de África, o custo que se obtém por KW/h produzido vence facilmente aquele de quaisquer outras tecnologias de electricidade.

Acrescentando-se a isto o facto de que a maioria das redes eléctricas do continente é relativamente subdesenvolvida, é mais do que óbvio que se devem preferir as energias renováveis aos sistemas tradicionais de geração de energia, como as centrais eléctricas a carvão ou a gás.

Ainda que, em todo o continente, certos governos tenham estabelecido metas relativamente ambiciosas em

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 48 P OWERED BY
Cada país ou região deve encontrar a melhor forma de construir o seu próprio sistema energético
Kenneth Engblom • Vice-presidente, Wärtsilä Energy, Europa e África

matéria de energias renováveis, nem sempre é possível chegar muito longe.

Ao contrário daquilo que possam pensar certos líderes industriais e políticos, maximizar a quantidade de energia renovável que pode ser desenvolvida para o sistema é, de longe, a estratégia mais económica disponível e garante, ao mesmo tempo, uma rede estável e fiável.

Em África, as energias renováveis hão-de tornar-se a nova fonte de energia de base. De facto, as energias renováveis são intermitentes, mas a sua combinação com capacidades de geração de energia mais flexíveis garantirá a estabilidade da rede, além de proporcionar uma economia de milhares de milhões de dólares.

A intermitência das energias renováveis: um problema que tem solução

Seria equivocado considerar a intermitência das energias renováveis como um obstáculo intransponível. Tal não é o caso, visto que essas energias são associadas a modos altamente flexíveis de geração de electricidade, como as cen-

trais eléctricas a gás. Para se manter o sistema equilibrado, deve haver disponível uma fonte de energia de segurança e para os picos, para que a produção seja aumentada a uma taxa igual àquela das flutuações das produções eólica e solar, mas também para acompanhar as variações na procura de energia ao longo do dia. Os sistemas devem poder atender a imensas variações diárias em segundos ou minutos.

As centrais eléctricas a gás são a única fonte de geração de apoio destinadas a fazerem só isto. Elas manterão o sistema em segurança, permitindo ao mesmo tempo que a rede integre enormes quantidades de energias renováveis baratas.

Para Moçambique, os estudos revelam uma diferença de US$ 84 milhões no custo total do sistema ao longo dos próximos dez anos, entre um sistema que incorpore grandes volumes de energias renováveis aliados a geradores flexíveis a gás e um sistema baseado na geração térmica inflexível com uma capacidade mínima de energias reno-

SOBRE A WÄRTSILÄ

A Wärtsilä é líder global em tecnologias inteligentes e soluções completas de ciclo de vida para os mercados marítimo e de energia. A empresa já entregou 76 GW de capacidade de centrais de energia em 180 países de todo o mundo. Em Moçambique, a Wärtsilä projectou, construiu e, actualmente, opera a central eléctrica CTRG de 174 MW, alimentada por motor a gás a qual é parcialmente propriedade da EdM.

váveis. Daqui até 2050, a economia em matéria de custos pode chegar às centenas de milhões de dólares.

Energias renováveis e gás flexível: os dois pilares de uma boa estratégia energética

As energias renováveis e o gás flexível constituem os dois pilares de uma boa estratégia energética para África. Estudos semelhantes realizados noutros países africanos indicam que esta estratégia de matriz energética produzirá uma eficácia energética no valor de milhares de milhões de dólares em todo o continente, nas próximas décadas.

Objectivos altamente ambiciosos em matéria de energias renováveis em toda a África são não só alcançáveis, como também constituem a estratégia mais sólida e económica para a electrificação bem-sucedida do continente.

A tomada de decisões inteligentes em matéria de estratégia conduzirá a sistemas de electricidade mais resilientes e oferecerá uma eficácia amplamente superior dos sistemas como um todo.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023
49

especial inovações daqui

42 HEALTHTECHS

O sector da saúde é o que mais rapidamente reflecte a rápida evolução tecnológica e vai sofrendo transformações aceleradas a cada dia.

Nesta edição fique a saber como a Inteligência

Artificial está e vai influenciar a eficiência na Saúde

Uma plataforma que garante acesso a conteúdos do Sistema Nacional de Ensino

As notícias da inovação em Moçambique, África e no Mundo

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46 48 UBI
PANORAMA

As Grandes Tendências das HealthTechs

Com a transformação digital a ganhar força em todo o mundo, é importante que as instituições conheçam as tendências da tecnologia na Saúde em 2023. Existem, inclusive, diversas ferramentas que se estão a popularizar no sector visando optimizar serviços e aprimorar o atendimento ao paciente.

Moçambique ainda está distante desta realidade, claro, mas as tendências alastrarão, invevitavelmente, a todo o mundo

Muitos estudiosos de todo o mundo acreditam que é na área da saúde que mais se evidencia a rápida difusão da tecnologia, com soluções, a vários níveis, a serem anunciadas quase diariamente.

Por isso há vários estudos a demostrarem que é neste sector que a humanidade vai adquirir o maior benefício da inovação tecnológica, e as tendências têm demostrado isso. Mas antes de conhecer as tendências, há que revisitar o grande salto que a Inteligência Artificial (IA) permitiu ao sector da saúde.

Pesquisadores de diversas partes do mundo concordam que a IA ajudou aquele sector a desenvolver novos medicamentos e tratamentos e a melhorar a precisão dos diagnósticos. Um exemplo

da usuário. Além disso, os usuários podem buscar suporte e orientação de serviços de saúde mental baseados em IA fora do horário tradicional de terapia e em vários formatos (por exemplo, chatbots, meditação guiada ou exercícios respiratórios).

Alguns aplicativos de saúde mental, como o Headspace e o Calm, podem personalizar técnicas de relaxamento, meditações ou exercícios de terapia cognitiva-comportamental (TCC) para usuários que usam os seus algoritmos de IA.

A TCC é usada para tratar a ansiedade e a depressão, ajudando as pessoas a aprender como administrar os seus pensamentos e emoções de maneira saudável. Esses algoritmos de IA alteram as suas recomendações com base nos da-

é o Microsoft Project InnerEye, uma ferramenta de IA de radioterapia que acelera drasticamente o processo de detecção e tratamento do cancro.

Outro grande exemplo é o sistema Brainomix e-Stroke desenvolvido no Reino Unido, que pode receber suporte de decisão em tempo real na interpretação de varreduras cerebrais usando algoritmos de IA de última geração. Isso ajuda os pacientes a obter o tratamento correcto na hora e no local certos.

Além de diagnosticar doenças, a IA também pode melhorar a saúde mental de forma eficaz, adaptando os seus serviços às necessidades individuais de ca-

dos colectados, como os estados de saúde mental relatados pelos usuários, se eles terminam um exercício e a frequência de uso do aplicativo.

E qual será a tendência da saúde em 2023?

A primeira é chamada de interoperabilidade e trata da capacidade de um sistema se comunicar com outro de forma transparente e eficaz, sendo necessário, para isso, que exista um padrão aberto para as ferramentas se relacionarem e poderem compartilhar os seus dados sem comprometê-los durante a transferência.

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TEXTO Celso Chambisso• FOTOGRAFIA Istock Photo, D.R.
Alguns aplicativos de saúde mental, como o Headspace e o Calm, podem personalizar técnicas de relaxamento, meditações ou exercícios de terapia cognitiva-comportamental
HEALTHTECHS
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Assim, uma das principais tendências de tecnologia na saúde em 2023 caminha para a criação de um padrão nas plataformas, ou, ao menos, uma forma de interligar os sistemas com sucesso. Esse processo surgiu da necessidade de trocar informações de maneira rápida, prática e segura, algo especialmente importante na saúde.

No entanto, uma vez que existem vários fabricantes e modelos de sistemas para adoptar, espera-se que a interoperabilidade seja um conceito trabalhado para unir esses componentes nas rotinas do dia-a-dia.

Enquanto isso, a tecnologia 5G também é uma tendência de tecnologia na saúde para 2023. Com esse novo modelo de conexão via satélite, será possível ter uma menor latência, ou seja, menor tempo de resposta entre o comando e a transmissão de dados. Além disso, a velocidade da Internet pode ser até 20 vezes maior que a geração anterior.

Na saúde, essa tecnologia irá optimizar os sistemas de troca de dados em hospitais e instituições médicas, permitindo uma comunicação ainda mais rápida. Além disso, será um dos pilares para, por exemplo, fortalecer a telemedicina e telemonitoramento de pacientes.

O mesmo se aplica à Internet das Coisas, um conceito que se refere à capacidade dos dispositivos de se conectarem à Internet, mesmo sem terem sido feitos para isso.

Na medicina, é um conceito que caminha com a interoperabilidade e com o 5G, pois permite mais eficiência nos processos médicos ao inovar os equipamentos com acesso online. Por exemplo, será mais simples localizar o processo clínico do paciente (documento digital que reúne todas as informações) e actualizá-lo com novos dados a partir de sistemas e triagens conectadas.

A aplicação da Internet das Coisas também beneficia os registos de exames e tratamentos. Por exemplo, pace-makers conectados podem informar o profissional no caso de inconsistências ou falhas cardíacas, aumentando as probabilidades de atendimento rápido.

O metaverso e os sistemas integrados dos hospitais

Uma das tendências de tecnologia na saúde para 2023 é também o metaverso, um conceito que une espaços físicos e virtuais, replicando as experiências humanas na rede.

Esse ambiente de realidade aumentada está a ser desenvolvido com foco no entretenimento e investimentos, mas,

1. Internet das Coisas médicas

2. Conexão 5G na área da saúde

3. Metaverso nas clínicas e consultórios médicos

4. IA e Big Data aplicadas à medicina

5. Cirurgia robótica com menos riscos e melhores resultados

6. Nanotecnologia na área da saúde

7. Realidade virtual para médicos e profissionais de saúde

8. Modernização dos atendimentos

9. Telemedicina

10. Crescimento de demanda na saúde privada

na área médica, pode ser uma ferramenta promissora. Afinal, reduz a distância entre as pessoas, sejam profissionais ou pacientes.

Além disso, permitirá estudos mais complexos, avaliações mais completas e planeamentos mais efectivos de tratamentos. Será possível criar simulações reais e treinar especialistas com mais rapidez, sem utilizar sistemas ultrapassados. Pode ser também uma forma de tornar os atendimentos mais humanizados, pois oferece distracções para crianças em tratamentos, melhora a experiência

do paciente e traz a realidade virtual como aliada para incentivar os pacientes nos seus hábitos diários.

Os sistemas de integração para hospitais são, igualmente, uma das tendências de tecnologia na saúde no presente ano porque buscam atender à necessidade de conexão rápida que as instituições precisam. Assim, será possível não apenas aplicar a transformação digital em larga escala, mas também em pequenas rotinas, como integrar sectores internos e transmitir dados mais rapidamente pelo servidor. Com o uso da IA, as

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 54
HEALTHTECHS
Os custos dos procedimentos e dos equipamentos ainda podem representar barreiras... mas o ano de 2023 promete aumentar a quantidade de procedimentos médicos realizados por robots
AS DEZ TENDÊNCIAS DAS HEALTHTECHS EM 2023

plataformas integradas também poderão usar mais bancos de dados para avaliar situações e diagnósticos, contribuindo para que o profissional chegue a uma conclusão mais ágil e precisa.

Robotização e cirurgia robótica

Que a cirurgia robótica traz mais precisão ao procedimento cirúrgico, os profissionais da área da saúde já sabem. Mas o que a maioria das pessoas não entende é como é que esse procedimento reduz os riscos pós-operatórios, tanto em mortalidade como em morbidade. Um robot também pode auxiliar o médico na questão da segurança na intervenção. Diversas áreas da medicina já utilizam robots para auxiliar em procedimentos cirúrgicos: ortopedia, urologia, geriatria.

Os custos dos procedimentos e dos equipamentos ainda podem representar barreiras para que de facto isso seja uma realidade comum, mas o ano de

2023 promete trazer um aumento significativo na quantidade de procedimentos realizados por robots.

A realidade é que a sociedade global está cada vez mais próxima de um cenário futurista, mas com mais humanização nos processos, o que promove o contacto humano mais empático e voltado para o paciente.

Atenção à saúde mental

O impacto da pandemia na saúde mental da população, somado aos efeitos psicológicos de factores tão variados quanto a guerra na Ucrânia, a crise climática e a inflação global, talvez seja incalculável.

Por isso a saúde mental passou a ser, também, o grande foco das healthtechs. As consultas online oferecidas por psicólogos, psicanalistas e outros profissionais da área dão uma pista. Irrisório até à quarentena, o acesso virtual a esses es-

pecialistas deverá movimentar 8,2 mil milhões de dólares até 2030. Pelas contas da consultoria Verified Market Research, foram 2,6 mil milhões de dólares no ano passado.

Estudiosos e pesquisadores das áreas de tecnologia acreditam que o futuro da healthtech é brilhante e que nos próximos anos a tecnologia desempenhará um papel cada vez mais indispensável no sector da saúde.

A propósito, estas questões acabaram por ser discutidas na cimeira sobre o assunto – HealthTech Summit – no dia 23 de Março, em Leuven, Bélgica, durante a 5.ª edição da conferência global sobre inovação na área da saúde. Anteriormente conhecido como Life on Chip, a HealthTech Summit reúne especialistas de todo o mundo em medtech, biotecnologia, saúde digital e atendimento ao paciente para examinar o estado actual e o futuro da inovação colaborativa.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 55

Quando a ‘School’ Está no Écran do Telemóvel

O mundo académico tem testemunhado o surgimento de inocações na área do ensino, e Moçambique já acompanha esta tendência. Uma iniciativa de um jovem chamado Daniel Alexandre Ngovene prova como, com um telemóvel e a disponibilidade de Internet, podemos aceder aos conteúdos do Sistema Nacional de Ensino

FFerramentas tecnológicas que ajudam estudantes, autodidactas e até curiosos a chegarem ao conhecimento são muitas e não são de hoje. Basta olhar para as funcionalidades do YouTube ou do Google, entre outras ferramentas capazes de disponibilizar uma série de dados em pouco tempo sobre toda e qualquer área do saber que interesse também à área académica.

Mas, com o desenvolvimento das startups, este movimento não pára de evoluir e, nesta edição, trazemos a história da iniciativa desenvolvida pelo jovem Daniel Ngovene, natural da província de Gaza.

Partindo da sua experiência de leccionar aulas particulares, Daniel viu na programação a solução para resolver o problema da distância que o separava dos seus explicandos que, curiosamente, eram seus colegas de escola no nível secundário. Recorrendo ao conhecimento adquirido através do YouTube, criou uma rede social designada Filoschool (com o domínio filotchila.com) que consiste na troca de material escolar, explicação e resolução de tarefas académicas.

Embora esta não seja uma novidade para o mundo como tal (tanto é que, noutras geografias, plataformas como esta já existem), cá em Moçambique esta constitui uma boa nova. Se atentarmos a outros pontos do globo mundial, temos o caso da Alemanha que está na dianteira quanto à criação de redes sociais académicas, de onde se destaca o researchgate. com, que conta, actualmente, com mais de 16 milhões de usuários, e ajuda muitos pesquisadores a partilharem as suas experiências e a disponibilizarem os seus trabalhos.

Outra rede social académica é a academia.edu.com, de origem norte-americana. A plataforma é mundialmente reconhecida e ajuda com à disponibilização de diversos trabalhos já feitos por vários pesquisadores sobre diversos temas.

A do Daniel Ngovene, embora seja apenas mais uma no mundo, ganha particular importância por ser moçambicana e adaptada às necessidades do sistema nacional de ensino, que é acessível aos estudantes desta realidade. É uma das poucas iniciativas desta natureza em Moçambique, país que tem a particularidade de estar exposto a eventos climáticos adversos, obrigando, muitas vezes, ao encerramento de escolas. E é aqui onde a Filoschool ganha particular relevância.

interagir com o mundo da Internet, procurei sempre saber como as pessoas criavam aplicativos, até porque não sabia como era o processo. Com o andar do tempo, em finais de 2018, comecei a assistir canais no Youtube, altura em que também comecei a interessar-me muito pelo mundo de programação. Como já produzia aulas usando blogs e wordpress, acabei mesmo por aprender muito sobre o assunto”, esclareceu Daniel Ngovene.

Através da junção da palavra grega ‘filo’, que significa ‘amigo’, com a palavra inglesa ‘school’, que significa escola, saiu a expressão ‘amigo da escola’ – o nome da plataforma que já conta com uma equipa composta por dez pessoas.

Desde a sua criação, em 2020, a plataforma contabilizou mais de dez mil usuários. Devido, porém, a determinadas mudanças introduzidas para lhe dar maior dinamismo, perdeu cerca de quatro mil que não conseguiram voltar a aceder, tendo, por isso, ficado com seis mil usuários.

Daniel Alexandre Ngovene USUÁRIOS

PRÓPRIETÁRIO Alexandre Coelho

O que é a Filoschol, essencialmente? “É uma rede social que ajuda os alunos na resolução dos exames, exercícios de aplicação e perguntas. O que pode ser encontrado na plataforma são exames feitos e resolvidos. Agrega, também, uma biblioteca na qual pode ser pesquisado um qualquer livro, com a oportunidade de o usuário colocar as suas dúvidas e ter o devido esclarecimento”, explica Daniel Ngovene, fundador da plataforma.

Para se registar na rede é necessário preencher um formulário, indicando apenas o nome completo e o género.

Mas quando é que começa esta caminhada? “Na verdade, quando comecei a

“Por enquanto, ainda não começámos a rentabilizar a plataforma, mas estamos já a tentar colocar anúncios e, dentro de alguns meses, iremos começar a limitar respostas grátis, para que as pessoas, durante o mês, tenham de pagar para ter acesso às respostas”, explica Daniel Ngovene ao falar da sustentabilidade da plataforma.

O responsável destaca que “estamos, simplesmente, a pensar em colocar anúncios. Mas se a ideia dos anúncios não sair como esperado teremos de cobrar a mensalidade”.

Daniel Ngovene mostra-se optimista quanto ao desenvolvimento da sua plataforma e assegura que “a sociedade está a aderir, apesar de alguns impasses no que diz respeito à disponibilidade e custo de Internet, mas estamos a ter um feedback positivo”.

Neste momento, o grande desafio é a rentabilização da plataforma para poder construir um escritório próprio.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 56 EDTECHS
BPLATAFORMA FILOSCHOOL PROPRIETÁRIO
6000
COLABORADORES 10 ANO DE CRIAÇÃO 2020
FILOSCHOOL
TEXTO Nário Sixpene • FOTOGRAFIA Marino Silva
POWERED BY

Ciências Investigadores desenvolvem

Bioimpressora 3D que pode reparar órgãos dentro do corpo

humano

Um grupo de investigadores australianos desenvolveu uma bioimpressora 3D que pode reparar órgãos dentro do corpo humano. O equipamento, desenvolvido na Universidade de Nova Gales do Sul (UNSW), na Austrália, foi capaz de imprimir, em 3D, uma variedade de materiais com formas diferentes na superfície do rim de um porco.

Os cientistas criaram um robot semelhante a uma cobra, macio e flexível, que terá como missão entrar no corpo dos pacientes, através de uma pequena incisão e imprimir células vivas em 3D, exactamente no local onde forem necessárias.

Os investigadores desenvolveram vários protótipos, variando o diâmetro das cabeças de 20 mm a 11 mm. A versão menor tem aproximadamente o tamanho dos endoscópios usados actualmente para analisar o cólon.

Além de imprimir biotintas, o robot pode operar como um endoscópio, bisturi eléctrico e dispensador de água, conforme demonstraram os investigadores num cólon artificial.

Agora, os especialistas precisam de testar a impressora em animais vivos, para depois testar em seres humanos. Se a investigação correr de acordo com o que estão a planear, acreditam que a bioimpressora 3D estará pronta para uso clínico dentro de cinco a sete anos.

Healthtechs

Moçambique já dispõe de laboratório de dosimetria

A Agência Nacional de Energia Atómica (ANEA) inaugurou o primeiro laboratório de dosimetria do País, que realizará a leitura da dose individual dos trabalhadores expostos à radiação.

A instalação do laboratório, que resulta da cooperação técnica entre Moçambique (representado pela ANEA) e a Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), custou mais 9,4 milhões de meticais financiados pelo Estado e espera-se que com este se possam reduzir os

Digitalização

encargos para os operadores que lidam com materiais que emitem radiações ionizantes.

O laboratório tem capacidade instalada para monitorar perto de cinco mil trabalhadores expostos, sobretudo nos serviços de radiologia das principais unidades hospitalares do País. Numa primeira fase, apenas 500 trabalhadores do Serviço Nacional de Saúde e privados serão submetidos ao controlo regular de exposição à radiação.

Moçambique quer acelerar a inclusão digital

O Ministério dos Transportes e Comunicações, representado pelo ministro Mateus Magala, anunciou que está a trabalhar para implementar acções para promover a inclusão digital em Moçambique, expandir o acesso aos serviços públicos e promover a literacia digital.

A informação foi prestada durante o Fórum Aliança Ministerial para as Nações Digitais da Commonwealth, em Londres, uma iniciativa da Organização das Telecomunicações da Commonwealth (CTO) que tem por objectivo facilitar a

Sustentabilidade

colaboração entre os Estados-membros na transformação digital daquele espaço. Segundo o governante, espera-se que o projecto anunciado se materialize e alcance todos os cidadãos até 2025.

Mateus Magala referiu-se ainda aos desafios de Moçambique na digitalização do país, destacando a concepção e implantação de infra-estruturas de acesso aos serviços de banda larga de alta velocidade e o acesso digital para áreas rurais, pessoas de baixa renda, escolas e outras instituições.

Investigadores descobrem enzima que pode gerar electricidade a partir do ar

Um novo estudo publicado na revista científica Nature indica que um grupo de cientistas na Austrália descobriu uma nova enzima capaz de transformar o ar em electricidade, o que poderá representar uma nova fonte de energia limpa.

A investigação refere que esta enzima, de nome Huc, é capaz de usar pequenas quantidades de hidrogénio presentes no ar para criar corrente eléctrica.

Os investigadores, que pertencem ao Instituto de Descobertas em Biomedicina da Universidade de Monash em Melbourne, Austrália, terão conseguido extrair esta enzima e armazená-la com sucesso mantendo a sua eficácia.

Com mais estudos e testes, é provável que consigam encontrar formas de fazer uso destas substâncias orgânicas para ter uma nova forma de energia limpa, levando electricidade até às partes mais remotas do globo de uma forma fácil e prática.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 58
PANORAMA

Vem este artigo a propósito de uma observação feita por um colega professor, no âmbito da 5.ª edição do “Global MBA in Impact Entrepreneuship”1, realizada recentemente em Harare, o qual afirmava que no Zimbabué a grande maioria das MPME - Micro, Pequenas e Médias Empresas (sobre)vive em … ponto-morto (Break Even Point).

Como já tive ocasião de aqui escrever2, a [Economia] “Informal é normal” na região SADC3, arrisco-me a generalizar que não é só no Zimbabué que predominam as empresas Zombie.

Neste artigo desafio o meu leitor@ a responder à pergunta: porque (sobre)vive a maioria das MPME, na região SADC, em estado Zombie?

Vejamos sucessivamente:

- O que é a empresa Zombie.

- Porque não crescem as empresas Zombie.

- Conclusão.

1. O que é a empresa Zombie?

Na minha opinião, uma empresa Zombie caracteriza-se pela presença combinada dos seguintes elementos:

- Trata-se de uma organização económica (i.e., utiliza e transforma recursos escassos, em ambiente muito competitivo),

- [Organização] não necessariamente formalizada (i.e., na região SADC, até é maioritariamente informal, não registada, não pagadora de impostos e de contribuições para a segurança social).

- A qual [Organização] oferece, a uma clientela com fraco poder económico,

- Uma muito estreita gama de produtos e/ou serviços,

- [Produtos e serviços] de muito baixa qualidade e valor.

Empresas Zombie, Negócios em Ponto-Morto

- Em consequência, a empresa Zombie pratica geralmente preços unitários muito baixos.

- Os quais são acompanhados por volumes de produção de bens e/ou serviços igualmente baixos.

- Operando neste contexto [de preços unitários baixos x volumes baixos] não é de estranhar uma muito baixa capacidade de geração de receita.

- A qual [Receita] cresce muito abaixo dos custos dos inputs, agravados pelo facto de a empresa Zombie operar em economias na região SADC com muito fraco desempenho económico.

- Fraco desempenho económico que tem sido agravado pelo aumento brutal dos custos dos inputs, resultante das crises combinadas do co-

ta à acção persecutória do Estado, nem à pressão do serviço de dívida do sector financeiro, nem às regras do direito do trabalho e comercial, assim se vai livrando da liquidação certa.

2. Porque não crescem as empresas Zombie?

Um estudo5 muito interessante da Universidade de Nairóbi constatou que as PME quenianas, e dependendo dos sectores, demoram, em média, 16,74 meses a chegar ao Ponto-Morto de Vendas (PMV)⁴, registando um mínimo de três meses (nos sectores de marcenaria, padaria) e um máximo de 40 meses (supermercados).

E, ainda de acordo com o estudo, uma duração superior a 18 meses para atingir o PMV é claramente indiciadora de riscos futuros para o negócio e para a empresa.

Ora, as empresas Zombie nunca ultrapassam o PMV: é como se vivessem nele, permanentemente e numa espécie de limbo.

vid-19 e da guerra da Ucrânia.

- Com [preços unitários muito baixos x volumes de produção muito baixos - custos dos inputs muito altos], as empresas Zombie vivem praticamente sem margem.

- Situação que torna a empresa Zombie incapaz de acumular capital para inovar e reinvestir na expansão do negócio.

- Qual morto-vivo, a empresa Zombie apenas é capaz de ir gerando receita para cobrir os seus custos (fixos e variáveis) da operação: e (sobre) vivendo em permanente estado de Ponto-Morto de Vendas (PMV)4

- E porque a empresa Zombie opera predominantemente na economia informal, não está assim expos-

De acordo com Rothberg⁶, a duração para atingir o PMV é um excelente indicador para nos dar nota, respectivamente:

i) Da capacidade de planeamento e de gestão de recursos financeiros (atributo individual).

De acordo com o já citado estudo, o nível de formação em gestão financeira é a co-variável mais importante, explicando até 12,1% da variação na duração do PMV: quanto maior esta competência, menor a duração para atingir o PMV. Ora, na empresa Zombie esta competência inexiste.

ii) Da estrutura da firma e da sua capacidade em divulgar os seus produtos e serviços (atributo organizacional). Os resultados do estudo indicam que:

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 60 OPINIÃO
Na região SADC, onde a “economia informal é normal”, a empresa Zombie surge como uma válvula de escape para aliviar a pobreza
João Gomes • Partner @BlueBiz

As empresas Zombie são geralmente de rendimentos reduzidos e sem competências em marketing

- A percentagem de empresas que atingiram a PMV nos primeiros dez meses de funcionamento foi mais elevada entre as sociedades anónimas e mais baixa entre as PME que operam como empresas individuais. Ora, na empresa Zombie predomina o titular individual, e a informalidade é a norma.

- 28,5% das PME que publicitaram as suas mercadorias e serviços atingiram a PMV nos primeiros nove meses das suas operações, em comparação com 10,5% das que não publicitaram. Ora, na empresa Zombie orçamentos reduzidos, a par da falta de competências em marketing, impedem acções promocionais efectivas.

- A disponibilidade de recursos financeiros foi uma das co-variáveis mais importantes, explicando até 7,5% da variação na duração do PMV: as PME que investem pouco capital levam mais tempo para atingir o PMV. Em contrapartida, em níveis mais elevados de investimentos de capital, o tempo necessário para as PME atingirem o ponto de equilíbrio foi relativamente

mais curto. Ora, na empresa Zombie os recursos financeiros são praticamente inexistentes.

- A dimensão das PME (medida em número de trabalhadores) foi uma das co-variáveis mais importantes, explicando até 6,8% da variação na duração do PMV: empresas de menor dimensão levam mais tempo para atingir o PMV. Em contrapartida, em empresas de maior dimensão, o tempo necessário para as PME atingirem o ponto de equilíbrio foi relativamente mais curto. Ora, na empresa Zombie predomina a muito pequena dimensão (um a três trabalhadores).

iii) Da qualidade das infra-estruturas (atributo ambiente de negócios).

Os resultados do estudo que temos vindo a acompanhar indicam que, e por esta ordem, os seguintes factores (resposta múltipla) atrasam significativamente o tempo médio para as PME quenianas atingirem o PMV:

- 30,03% dos respondentes indicou o alto nível de competição;

- 24,92% dos respondentes indicou a

alta taxa de pobreza do país; - 23,00% dos respondentes indicou o alto custo da energia.

Sem tirar nem pôr, estes três parâmetros fazem parte do dia-a-dia e condicionam o crescimento da empresa Zombie.

Em conclusão

Na região SADC, onde a “economia informal é normal”, a empresa Zombie surge como uma válvula de escape para aliviar a pobreza.

Contudo, o efeito combinado i) da falta de capacidade de planeamento e de gestão de recursos financeiros (atributo individual); ii) a par da estrutura individual da empresa e da sua incapacidade em divulgar os seus produtos e serviços (atributo organizacional); iii) e da qualidade deficiente das infra-estruturas (atributo ambiente de negócios) impedem que as empresas ultrapassem o Ponto-Morto de Vendas (PMV), possam conhecer o factor escala7 e contribuir para o desenvolvimento das economias da região.

A empresa Zombie estagna e aí permanece num ponto de equilíbrio muito precário, fazendo jus ao ditado popular “chapa ganha, chapa gasta”.

1 Realizada pela Catholic University of Zimbabwe, em associação com a E4Impact Foundation, no âmbito da Alliance4Impact. Esta Aliança conta já com a participação de 23 universidades e é liderada pela Università Cattolica del Sacro Cuore (Milan).

2 GOMES, João “Informal é Normal”, Revista Economia & Mercado, publicado em Setembro de 2021.

3 SADC: A Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) é uma organização intergovernamental com sede em Gaborone, Botsuana. Em 2022, a SADC tinha um total de 16 Estados-membros.

4 Ponto-morto de vendas (aka, ponto de equilíbrio das vendas ou break-even point): é um ponto no qual uma empresa não obtém lucros, nem incorre em perdas (Ndaliman e Bala, 2007; Rothberg, 2012). O ponto-morto de vendas (PMV) é calculado através da seguinte fórmula: PMV = Custos totais / Margem de Contribuição (Preço unitário – Custo variável unitário).

5 RAMBO, Charles M. “Time required to break-even for Small and Medium Enterprises: Evidence from Kenya”, University of Nairobi.

6 ROTHBERG, A.F. (2012) “Using break-even analysis to determine your company’s financial Health”. CFO Edge, LLC.

7 GOMES, João “O Afroempreendedor@: Entre a necessidade e a escala”, Revista Economia & Mercado, publicado em Outubro de 2021.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 61

Branqueamento de Capitais

Uma Luta com Todas as Armas

O Gabinete de Acção Financeira Internacional (GAFI) deu apenas dois anos para Moçambique melhorar a sua estrutura de prevenção e combate ao branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, a contar desde 21 de Outubro de 2022. Se falhar, sofrerá bloqueios nas transacções financeiras internacionais. A luta, agora, é com todas as armas

Pressionado, o Governo acabou de criar o Comité Executivo de Remoção de Moçambique da Lista Cinzenta – que coloca o País entre os mais propensos aos crimes de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo – dirigido pelo académico Luís Cezerilo.

Em Março último, o GAFI recebeu o primeiro relatório de Moçambique sobre os progressos alcançados. Em Maio próximo, espera-se a remoção de dez recomendações de um total de 93 apresentadas pelo GAFI no ano passado.

Ainda que pareça difícil, ou até impossível, Moçambique mantém a esperança de melhorar a pontuação e de conseguir sair da lista cinzenta, de acordo com Luís Cezerilo, que fala dos avanços até aqui alcançados, e do que se deve esperar em termos de reformas nos 18 meses que restam para “arrumar a casa”.

Mas, primeiro, é preciso perceber como é que Moçambique falha uma avaliação que foi feita 12 anos depois de ter acesso às recomendações?

O que falhou?

Luís Cezerilo admite que tanto na conformidade como na efectividade, Moçambique teve resultados negativos e que tudo o que foi feito não foi suficiente para que o País fosse considerado cumpridor das 40 recomendações do GAFI.

“Eu costumo usar uma metáfora para explicar o que aconteceu: ao GAFI não interessam as laranjas, mas sim o pomar. Isto significa que eles viram que temos instituições e legislação para prevenir e combater o branqueamento de capitais e o financiamento ao terrorismo, mas querem perceber, efectivamente, qual é a capacidade destas instituições no terreno”, explicou o responsável.

E prosseguiu: “nós preocupámo-nos em mostrar laranjas e não o pomar e, por isso, em 21 de Outubro de 2022, Moçambique foi colocado na lista cinzenta do GAFI. Nesta situação, somos considerados como uma nação de risco moderado de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, pois ainda existe a lista negra”.

O GAFI constatou apenas 11 deficiências, mas emitiu 96 recomendações para que, num período de dois anos, as instituições moçambicanas trabalhem no sentido de as suprir.

A tendência normal, de acordo com o dirigente do Comité Executivo de Remoção de Moçambique da Lista Cinzenta, seria encontrar justificativas do porquê de terem colocado o País na lista cinzenta e perder-se ainda mais tempo, “mas o Governo de Moçambique não agiu nestes termos.

Foi assim que, a 06 de Dezembro de 2022, o Ministério da Economia e Finanças apresentou ao Conselho de Minis-

tros uma estratégia de remoção de Moçambique da lista cinzenta. E a 22 de Dezembro, o Comité de Alto Nível, liderado pelo primeiro-ministro – e do qual fazem parte os ministros da Economia e Finanças, da Justiça, do Interior, da Indústria e Comércio, o governador do Banco de Moçambique, a procuradora-geral da República e o presidente do Tribunal Supremo –, reuniu-se para fazer a análise e aprovação do Plano de Remoção da Lista Cinzenta, dando recomendações para a criação de uma estratégia de implementação do plano do GAFI”, esclareceu.

Foi neste contexto que o ministro da Economia e Finanças assumiu a liderança da estratégia de reversão da situação. Tempestivamente, o governante criou uma estrutura executiva de enfrentamento deste processo.

A Estrutura da nova ‘força-tarefa’

O novo grupo de trabalho engloba, para além da liderança do ministro da Economia e Finanças, um coordenador nacional (neste caso, o nosso entrevistado,

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 64 MERCADO & FINANÇAS
Texto Manuel Mandlaze • Fotografia D.R.
Haverá algumas revisões pontuais da lei. Temos uma boa lei, mas o que o GAFI e ESAAMLG querem é que o gabinete jurídico das instituições aborde matérias sobre branqueamento de capitais

Luís Cezerilo), com três grandes áreas ou subsectores, nomeadamente o subsector de Assistência Técnica e de Coordenação, do qual fazem parte os parceiros de assistência técnica; o Grupo de Trabalho Multissectorial liderado pelo Gabinete de Informação Financeira de Moçambique (GiFim); e o sector privado e as organizações da sociedade civil.

“Portanto, o Comité Executivo de Remoção de Moçambique da Lista Cinzenta olha para esta situação de forma holística. Porque podemos ter muitas instituições funcionais na prevenção e combate ao branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, mas se duas ou três delas apresentarem deficiências não vão passar no GAFI. Isto significa que seremos avaliados de forma integrada”, explicou o responsável.

Ou seja, as instituições devem estar a funcionar no sentido de mostrar que há uma articulação, desde o Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC) até aos tribunais entre outras instituições que devem condenar ou absolver as pessoas acusadas.

É necessário rever a legislação

Toda a acção necessária e prevista poderá impor algumas revisões pontuais da lei. Luís Cezerilo entende que o País até tem uma boa legislação, mas o que o GAFI e ESAAMLG (Grupo de Luta Contra a Lavagem de Dinheiro da África Oriental e Austral) querem que o gabinete jurídico das instituições, como é o caso da Inspeção-geral de Jogos, abordem matérias sobre branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo. Então, a recomendação é que se faça uma revisão para acrescentar esta matéria na lei.

Mas o que pode acontecer caso o País falhe no cumprimento das metas impostas pelo GAFI nos dois anos de prazo concedido?

Para Cezerilo, desde logo, Moçambique sofreria um dano reputacional, pois seria considerado país não seguro no sistema financeiro internacional, na medida em que permite que dinheiro ilícito seja introduzido no sistema, tornando-o lícito. “Poderemos ter restrições na utilização de sistemas de pagamentos inter-

nacionais. Os cidadãos sentem rapidamente esta situação porque o seu cartão de crédito deixa de funcionar nos outros países, com todos os transtornos que isto pode representar. As consequências são mais drásticas. Seriam as sanções políticas e económicas, como no caso da Coreia do Norte e Mianmar que não são países do sistema financeiro internacional”, exemplificou.

Que trabalho já foi feito para colocar o País no caminho certo?

“Em meados do mês de Março, apresentámos o nosso primeiro relatório ao GAFI. E no dia 29 de Maio do corrente ano, o GAFI vai reunir em Conselho de Ministros para analisar um documento submetido pelo Governo moçambicano, e que resulta de uma contestação pelo facto de não termos concordado com dez das 93 recomendações que nos foram feitas na sequência da avaliação de 2021”, revelou Luís Cezerilo.

Ainda de acordo com o responsável, Moçambique terá sido relativamente mal avaliado “porque a nossa situação não é aquela. Ora, o ESAAMLG já considerou que os dez pontos submetidos tinham sido, de facto, mal avaliados, sendo que se o Conselho de Ministros do GAFI anuir com o posicionamento de quem trabalha no terreno, Moçambique poderá rapidamente melhorar a sua pontuação. Agregado a este relatório, que até já foi apresentado ao público, existe a esperança de que não sairemos já da lista cinzenta, mas teremos dado sinal de um cometimento político sério sobre o engajamento do Governo e de outras instituições do Estado neste processo. Temos a expectativa de que nos possam dizer que tomaram boa nota sobre o nosso trabalho”, garantiu.

Entretanto, o tempo está a passar para a conclusão dos dois anos e o Comité Executivo de Remoção de Moçambique da Lista Cinzenta entende que o GAFI tem noção de que há acções imediatas e outras de natureza estrutural neste processo.

Isto é, “os resultados imediatos são estes que se reflectem no nosso relatório. Por exemplo, a realização de workshops, formações e revisão pontual de uma lei. Agora, montar um sistema de interconectividade que liga a Polícia, a procuradora-geral da República e os tribunais leva o seu tempo. Falo da demanda de recursos - como equipamentos e softwares -, que já temos, para a sua implementação”, explicou.

Entretanto, o relatório enviado pelas autoridades moçambicanas confirma que a realização deste trabalho já come-

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 65

çou, pelo que agora o País está a formar pessoal e a testar os equipamentos para a implementação do sistema.

“Uma das coisas que se pretendem com a interconectividade é que, no dia em que uma sentença transite em julgado, ela entre imediatamente no registo criminal do cidadão em causa, e o GAFI tem consciência que isso não será feito de hoje para hoje”, disse Luís Cezerilo.

O que o GAFI quer que mude

Na linguagem comum, o GAFI quer saber quem é o dono da propriedade ou do dinheiro que circula nos mercados. Por exemplo, no caso de existir uma empresa que é uma Sociedade Anónima e não se conhecer o dono, o GAFI preocupa-se em saber quem é a pessoa possivelmente escondida.

É um trabalho que está sob a égide do Ministério da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos. E é também para descortinar este tipo de situações que

se vai rever a lei. “O que posso dizer é que eles querem saber quem é o último dono ‘da coisa’. Porque podemos ter alguém que está ali como ‘capa’, enquanto existe outra pessoa por trás. Então, temos de destapar o rosto invisível nos negócios, em particular do sector imobiliário”, revelou.

O GAFI está também preocupado com os crimes de raptos e de tráfico de drogas, pelo que exige informações convincentes sobre os protagonistas e a sua responsabilização.

Em termos de legislação, mais uma vez, Moçambique está bem. O que falta é a sua aplicação. Mas, em relação aos raptos e de tráfico de drogas são crimes

Quando há um suspeito destes crimes, o que deve ser feito é uma investigação que visa a apreensão e recuperação dos activos a favor do Estado. É isto que o GAFI quer. No fundo, que ha-

ja priorização destes processos na justiça. Por isso, tanto no Tribunal Supremo como na Procuradoria-Geral da República houve formação de magistrados com o objectivo de consciencializar a classe sobre matérias relcionadas com os crimes de branqueamento de capitais e a necessidade de priorização dos mesmos nos processos de investigação e julgamento para que, neste trabalho colaborativo, possam ajudar Moçambique a sair da Lista Cinzenta do GAFI.

A articulação com o Banco de Moçambique

O Banco de Moçambique, na qualidade de supervisor do sistema financeiro, trabalha com os bancos para identificar transacções suspeitas. Por exemplo, um indivíduo que declara ser vendedor de água, mas que tenha na sua na conta bancária cinco mil meticais e, de um momento para o outro, começa a depositar cinco milhões de meticais, significa que deve ser investigado.

Isto é, o Banco de Moçambique tem o poder de análise e de reporte para que possa saber o que está a acontecer. Portanto, não só informa, como também age quando detecta irregularidades no funcionamento de um determinado banco ou instituição financeira, principalmente através da aplicação de multas correspondentes à infração.

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precedentes aos de branqueamento de capitais.
Moçambique está, agora, na lista cinzenta do GAFI, o que indica haver vulnerabilidade do sistema para o financiamento ao terrorismo que, aliás, é uma das preocupações actuais do País

Empresas Moçambicanas Não Estão Prontas para Lidar com os Riscos Cibernéticos

Líderes empresariais, organizações e Governo já despertaram para os perigos dos ataques cibernéticos, mas a fronteira entre o “saber”, o “prevenir” ou o “solucionar” continua substancial, de acordo com um survey recente da Deloitte em Moçambique. Mas há medidas que podem ser tomadas para mudar este quadro

Como é que estamos no capítulo da cibersegurança? As respostas estão no Deloitte Cybersecurity Survey for Mozambique, um estudo cujas conclusões apontam para uma realidade repleta de fragilidades. Apenas o sector financeiro está a traçar um caminho promissor, mas todos os restantes precisam de intervenções de vulto.

Nesta entrevista, Inácio Neves, líder em risco operacional, risco regulatório, risco cibernético e controlo interno da Deloitte traz a fotografia do País no presente e as linhas orientadoras para melhorar os sistemas de defesa.

Em traços gerais, pedir-vos-ia para contextualizar um pouco este survey.

Decidimos conduzir esta pesquisa num contexto de perceber a maturidade cibernética das organizações do sector público e privado em Moçambique. Sabemos que a cibersegurança se tornou fundamental para os negócios e que a transformação digital, acentuada pela pandemia do covid-19, evidenciou e acelerou ainda mais esta necessidade.

Com o recente aumento do trabalho remoto devido à pandemia e o uso crescente de plataformas digitais, os ataques cibernéticos multiplicaram-se colocando diversos riscos às empresas. Diariamente são descobertas novas ameaças cibernéticas que estão em evolução e que se tornam ainda mais complexas e recorrentes.

As ameaças passaram, então, de um simples problema da área de TI para um problema da empresa como um todo. Actualmente, não há mais incidentes ciber-

néticos isolados ou ataques direccionados a sectores específicos.

Quanto mais as organizações e pessoas se tornam digitais e conectadas, os riscos de ataques aumentam exponencialmente. O estudo mais recente de cibersegurança da Deloitte ao nível global mostra que as organizações estão a olhar para além das ameaças e a concentrar-se na prevenção e na consciencialização sobre cibersegurança.

No caso de Moçambique, as principais questões que se colocam para as organizações são: Como é que lidam com os riscos cibernéticos? Qual o nível de capital humano para cibersegurança no País? As empresas investem neste tema?

O futuro pode transformar-se na próxima fonte de risco para as empresas? A pesquisa “Keep an eye on what matters: Cybersecurity Survey for Mozambique”, que conduzimos em 2022, foi em busca destas respostas.

Olhando aos resultados, e pegando até num dos pontos do estudo, perguntaria até que ponto as empresas moçambicanas estão, de facto, prontas para enfrentar os ciber-riscos?

A maioria das empresas, segundo a pesquisa, não tem um plano de resposta a incidentes cibernéticos (apenas 18% responderam ter), não tem seguro contra ataques cibernéticos (apenas 23% responderam ter), não investe o suficiente na mitigação deste risco, que é real (a maioria das empresas investe menos de 10% dos custos operacionais). Estes dados já são suficientes para concluirmos que as empresas em Moçambique não

estão prontas para lidar com os riscos cibernéticos.

Num contexto de riscos cibernéticos, estar pronto é implementar e manter uma governação proactiva, com práticas de gestão fortes e programas de conformidade. A empresa deve fazer uma avaliação de maturidade cibernética, identificar e entender os seus principais riscos de negócio e de exposição a ameaças cibernéticas.

A partir dai, é possível definir estratégias e o roteiro para implementá-las. Esta visão holística do ciberespaço permite decisões de negócio e de investimento acertadas por parte do conselho de administração e da direcção da empresa e, como consequência, aumenta a confiança sobre gestão e remediação destes riscos.

Aqui destacaria o sector financeiro. É o mais bem preparado para estas questões?

Segundo a pesquisa, este é o sector em Moçambique que assume o risco cibernético como um dos principais riscos no seu Enterprise Risk Management e, por consequência, mais faz a monitorização e gestão proactiva de incidentes cibernéticos.

Este é também o sector que confirmou realizar, de forma regular, a avaliação de vulnerabilidades e teste de pene-

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Texto Celso Chambisso • Fotografia Mariano Silva & Istock Photo

tração ou uma revisão do código-fonte do software. Existem vários factores que determinam esta postura, sendo de destacar o contínuo crescimento da banca digital e consequente aumento de incidentes cibernéticos, assim como os requisitos e padrões de segurança de dados de pagamento com cartões, por exemplo o PCI-DSS, que são impostos às empresas deste sector por entidades como a VISA.

Organizações maduras em matérias de boas práticas em cibersegurança efectuam avaliações regulares de segurança e testes a cada seis meses, o que permite correcções de problemas antes da invasão ou tentativas.

Adicionalmente, o sector financeiro, em particular a banca, já se preocupa com cibersegurança há muitos anos, principalmente pelo facto de os seus activos serem constantemente visados por atacantes devido à sua natureza maioritariamente líquida.

Na nossa pesquisa, a maioria das empresas deste sector concordou que a rápida evolução das ameaças cibernéticas é o principal desafio que enfrentaram até então. Apesar de as implicações como perdas financeiras e reputacionais serem algo comum a todos os sectores, para o financeiro, em especial, pode acarretar prejuízos irreparáveis, especialmente na relação da instituição com os seus clientes em caso do vazamento de dados pessoais.

Vale ressaltar que, tendo em conta a relevância do risco cibernético, o Banco de Moçambique, desde 2020, enquanto entidade reguladora do sector financeiro, tem vindo a desencadear um conjunto de acções com o objectivo de garantir um ambiente de cibersegurança resiliente do sector financeiro, incluindo o desenvolvimento de um quadro legal e regulamentar que promova uma cultura de gestão do risco cibernético; a cooperação

e partilha de informação sobre as ameaças cibernéticas; e o estabelecimento de um quadro analítico de supervisão da cibersegurança e reporte de incidentes cibernéticos e avaliação da resiliência cibernética no sector, no sentido de apurar o nível do risco intrínseco, sendo expectável que seja publicada legislação específica associada a qualquer momento.

Enumeram, a determinado ponto, os maiores riscos dos ciber-ataques.

As ameaças que mais preocupam as empresas em Moçambique, segundo a pesquisa, são perdas financeiras, roubo de informação sigilosa e perda de reputação e confiança da marca. Essas são, de facto, grandes ameaças para um negócio, mas vale destacar que multas e acções judiciais também podem constituir consequências depois de um ataque.

Dependendo do tipo de negócio, os ataques cibernéticos podem resultar na interrupção da cadeia de fornecimentos ou serviços e ocasionar danos irreparáveis, como a incapacidade de honrar compromissos contratuais de fornecimentos ou prestação de serviços para com os clientes, com consequências financeiras que podem tornar a empresa insolvente, e também danos reputacionais que podem ditar perda de parte significativa da quota de mercado para a empresa.

Olhando aos resultados obtidos, há algum tipo de dado ou conclusão que vos tenha surpreendido?

Alguns dados chamaram-me a atenção, principalmente o facto de o conselho de administração de mais da metade das empresas inquiridas não estar a par do risco cibernético e o facto de a maioria das empresas investirem menos de 10% dos custos operacionais para gestão de risco de cibersegurança.

Um outro dado que me chamou a atenção na pesquisa foi que a maioria das empresas tem apenas um responsável pela gestão de cibersegurança e mais da metade delas não tem um chief information security officer (CISO) ou um chief information officer (CIO). E diria que este é um ponto para as empresas terem atenção.

Será que as empresas têm o risco cibernético devidamente destacado na agenda da alta direcção? Será que estão a colocar pessoas com habilidades necessárias para lidar com as ameaças cibernéticas? Será que estão a treiná-las e a mantê-las preparadas para os desafios diários? O cenário de ameaça e o risco cibernético da organização deve ser sempre avaliado em tempo real já que, actual-

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“A maioria das empresas tem apenas um responsável pela gestão de cibersegurança e mais da metade delas não tem um chief information security officer”, Inácio Neves, Deloitte

mente, os adversários cibernéticos são extremamente organizados e usam ferramentas sofisticadas. A capacidade preventiva da empresa deve ser, então, ainda melhor.

Durante muito tempo, a cibersegurança sempre esteve ligada à protecção de dados financeiros, propriedade intelectual ou informação identificável e era, então, da exclusiva responsabilidade do departamento de TI. Actualmente, a necessidade de proteger a informação estende-se também aos sistemas e às pessoas.

Os ataques podem ocorrer em qualquer lado, num servidor de um centro de dados, numa plataforma petrolífera no oceano ou num automóvel. As competências tecnológicas precisam de estar presentes, na fase de desenho de um produto, nos testes, na elaboração de uma campanha de marketing, na criação de experiência para o consumidor e em muitas outras.

Assim como as ameaças virtuais passaram de um problema de TI para um desafio organizacional, agora também há uma mudança no planeamento cibernético, que deve dar suporte aos objectivos estratégicos e ao crescimento do negócio. As figuras de CISO ou de CIO deveriam exercer um papel mais relevante na estrutura organizacional consideran-

do a importância da cibersegurança para o negócio como um todo. Uma empresa que não investe efectivamente em gestão de risco cibernético, independente do sector, será sempre considerada um negócio de risco.

Empresas que, por outro lado, investem em segurança cibernética integrada, com acções de consciencialização para todas as equipas internas, antecipam problemas, melhoram a resiliência, aumentam a agilidade e fornecem confiança para inovar.

Nota-se aqui um nível de awareness de 98% quanto à percepção dos ciber-riscos existentes. Sendo isso um bom sinal, depois temos um nível de 50% apenas de empresas que agiram na formação das suas equipas a este nível. Será algo a atentar, no nosso mercado, esta questão da formação de quadros e de criação de conhecimento das equipas para esta questão específica?

A maioria das empresas que participaram no inquérito tem uma postura muito positiva em relação à gestão do risco cibernético. Entretanto, menos de 50% diz ter formação periódica e quase 50 % sofreu algum ataque cibernético nos últimos anos, ou não sabe se sofreu. Ter uma equipa técnica altamente qualificada,

que saiba operar as mais variadas ferramentas de segurança, é fundamental para o sucesso de uma estratégia de cibersegurança. Além disso, para as empresas que sofreram algum tipo de ataque, é necessário investir numa preparação cuidadosa, com uma gestão eficaz e integrada para a recuperação assertiva de incidentes cibernéticos, para que saia mais forte da crise e se torne resiliente.

Como é que a Deloitte se posiciona neste segmento?

A Deloitte é líder mundial em assistir organizações na prevenção de ataques cibernéticos e na protecção dos seus activos mais valiosos, através dos nossos centros de inteligência cibernética. Acreditamos que estar seguro, vigilante e resiliente passa não só pela prevenção e capacidade de resposta a diferentes ameaças, mas também na gestão de risco cibernético no sentido de gerar novas oportunidades.

Ajudamos os nossos clientes a incorporar o risco cibernético no início do desenvolvimento da sua estratégia para gerir de uma forma mais eficaz os riscos associados à informação e tecnologia. Não se trata, portanto, apenas de risco, tecnologia e compliance. A jornada cibernética requer uma visão ampla de negócio, que

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impulsione a capacidade de liderar transformações profundas nas organizações. A nossa proposta de valor inclui mobilizar, gerir e entregar um programa de trabalho estruturado e priorizado para ajudar as organizações a melhorar a governação cibernética, segurança, vigilância e resiliência.

Fazemos a gestão de riscos cibernéticos e conformidade, avaliação da maturidade cibernética, desenvolvimento de estratégias e roteiros cibernéticos accionáveis entre outros serviços.

Sendo este survey limitado a quem respondeu, obviamente gostaria de lhes pedir um olhar mais amplo, e de saber a vossa opinião sobre o ‘estado da arte’ da ciber-segurança em Moçambique, os principais riscos e os desafios.

As empresas que participaram na pesquisa disseram que o maior desafio que enfrentam é a evolução das ameaças cibernéticas, seguido pelo tempo necessário para desenvolvimento de habilidades e capacidades.

Em terceiro está o orçamento insuficiente para iniciativas de cibersegurança e em quarto a falta de compreensão da liderança sobre questões de segurança cibernética. As consequências destes desafios são evidentes nos acontecimentos

dos últimos anos, sendo de destacar o aumento do número de casos de invasão ao ciberespaço, a propagação de informações falsas, golpes de clonagem, roubo de identidade, crimes financeiros e outros.

Estes casos preocupam as autoridades que têm vindo a envidar esforços para garantir um ciberespaço seguro e proteger as infra-estruturas críticas de informação. Um dos alvos preferidos dos cibercriminosos são os websites, que parecem ser mais vulneráveis em Moçambique, especialmente os sites do sector público.

Todos assistimos aos eventos ocorridos em Fevereiro de 2022 em que cerca de 30 portais de instituições do Governo foram atacados e isso colocou em risco a confidencialidade de dados e informações sigilosas. O sector bancário e o mercado de capitais são outro alvo preferencial com ataques como golpes de clonagem de sites de bancos, clonagem de car-

organizações devem ter em conta para a gestão de riscos cibernéticos, embora estejam em curso vários debates e acções que indicam que o País caminha nessa direcção. Devido à natureza incontornável do aspecto cibernético quando se aborda matérias relativas a tecnologias e digitalização, existem diversos instrumentos associados a esta matéria que, de uma ou de outra forma, acabam tocando aspectos relacionados com a cibersegurança. O levantamento que efectuámos no âmbito do survey identificou alguns destes instrumentos embora, conforme menciono, não ofereçam uma visão sobre as estruturas e o processo necessário para endereçar ameaças cibernéticas.

Mesmo se olharmos para o continente africano, apenas 20% dos países têm legislação relacionada com a cibersegurança até agora. Enquanto país, em 2018, Moçambique adoptou a Convenção da

tões, phishing e roubo de identidade.

Há também um número crescente de ataques de ransomware e outros que são realizados através da “Dark Web” e “Deep Web” que envolvem a venda de lista de números de cartão de crédito válidos, entre outras actividades ilícitas. Os ataques a dispositivos móveis também aumentaram exponencialmente, devido à sua constante utilização.

Estes acontecimentos são uma prova da urgência com que as organizações e Governo devem procurar integrar riscos cibernéticos na sua agenda de gestão de riscos e canalizar investimento adequado para a implementação de medidas de mitigação.

Acredito que as conclusões apresentadas na pesquisa conduzida por nós podem ajudar as autoridades e os reguladores a terem uma visão mais clara, crítica sobre determinados assuntos e ajudar a fortalecer e acelerar a implementação do quadro de gestão de riscos cibernético no País.

Ao nível legal, como estamos hoje a este respeito?

Moçambique ainda não dispõe de um quadro legal ou regulatório, tanto nacional como sectorial (exemplo sector financeiro), que estabeleça o processo que as

União Africana sobre Cibersegurança e Protecção de Dados Pessoais. A adopção da legislação deve estar de acordo com as capacidades da justiça criminal, desde a criação de unidades especializadas em investigação de crimes cibernéticos e informática forense, ao reforço da aplicação da lei e formação judicial, cooperação interagências, investigações financeiras, protecção à criança e cooperação público-privada e internacional.

Por fim, um olhar sobre as principais conclusões deste survey.

Procurávamos perceber a maturidade cibernética do mercado, os principais desafios e as boas práticas de cibersegurança em Moçambique. Concluímos que, apesar de a cibersegurança ser uma preocupação nacional tanto do sector público quanto do privado, a falta de uma legislação faz com que este tema não seja tratado, por muitos, como um tema de risco.

Os responsáveis da área de TI têm conhecimento e sentem-se preparados para lidar com os riscos cibernéticos, porém, os desafios são ainda muitos. Se o tema não é visto pela administração das empresas como prioritário e se não existe um investimento proactivo, este departamento, sozinho, não é capaz de enfrentar todas as ameaças.

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Há um número crescente de ataques de ransomware e outros que são realizados através da “Dark Web” e “Deep Web”, que envolvem a venda de lista de números de cartão de crédito válidos...

ócio

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Qual a diferençã entre turista e viajante? Vá ao Camboja e descobrirá a resposta

e

g76

As dez tendências da gastronomia e da restauração da actualidade

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Ao sabor do Tinto Casa da Ínsua, o campeão dos vinhos já disponível em Moçambique

(neg)ócio s.m. do latim negação do ócio

João

nasceu em Lisboa, nos anos 90. É músico, poeta e fotógrafo. Partiu, em Setembro de 2022, numa viagem sem data de regresso ou destino definido. Tem documentado a sua jornada através de pequenas crónicas, numa simbiose entre as suas linguagens predilectas – a prosa e a fotografia analógica –que tentam ao máximo transportar o leitor para os longínquos lugares pisados pelo autor.

Camboja

Be a traveler, not a tourist

Anthony Bourdain, mítico chef, autor e rosto dos programas televisivos No Reservations e Parts Unknown moldou a maneira como viajo e vejo o mundo. Numa das suas mais icónicas fotografias, ergue um papel com o seguinte mantra: “be a traveler, not a tourist”. Tal mandamento ficou gravado na minha cabeça desde a adolescência e por este tenho-me regido.

Os dicionários pouco distanciam estes dois conceitos, mas Andrew Zimmern, também chef, autor e viajante, não só concorda com Bourdain como acrescenta: “Sê, por favor, um viajante, não um turista.

Tenta coisas novas, conhece pessoas novas e olha para além do que está mesmo à tua frente. Estas são as chaves para compreender este mundo fantástico em que vivemos.”

Viajo não só para compreender este fantástico mundo que Andrew menciona, mas também para me compreender. Descubro-me, enquanto nestes lugares me perco, e a viagem permite-me não só desbravar quem sou, mas também compreender quem quero ser.

eSão estes novos lugares e pessoas que constantemente desafiam e corrigem as minhas perspectivas acerca da vida, do

mundo e, sobretudo, acerca de mim mesmo. Observo os lugares onde aterro com a mesma ânsia e curiosidade com que um recém-nascido observa o mundo que frente a si se apresenta: sem ideias preconcebidas ou receios infundados. Sou privilegiado e sortudo: escuto mais do que falo, aprendo mais do que ensino.

Chegámos a Phnom Penh, capital do Camboja, país que suplica e vocifera para seguirmos o mantra de Anthony Bourdain.

O Camboja, cada vez mais, tem estado nas bocas do mundo: a casa do famoso Angkor Wat, um dos maiores e mais belos complexos religiosos do mundo, tem-se tornado cada vez mais popular entre turistas e viajantes.

Pouco sabia acerca do país antes de aterrar na sua capital. Havia visto fotografias do Angkor Wat, é claro, e o filme First They Killed My Father, realizado por Angelina Jolie, que explora o regime de terror causado pelo Khmer Vermelho (1).

Falhei, enquanto viajante, e pouco li ou estudei acerca do Camboja e da sua capital; poucas foram as questões que coloquei e pouco procurei conhecer os seus problemas e dificuldades. Cheguei ao Camboja despreparado e traí o

mantra de Bourdain. Viemos, como tantos outros, para ensinar inglês.

Para fazê-lo, foram-nos apresentadas duas opções: na primeira destas, ensinaríamos crianças pelo período mínimo de um mês numa parte rural do Camboja.

Oferecer-nos-iam dormida e duas refeições por dia. Como não podemos ficar um mês no país, considerámos a segunda opção: pagaríamos uma taxa diária a uma agência de voluntariado e daríamos aulas num dos muitos orfanatos da capital.

Não haveria período lectivo mínimo e, desde que diariamente pagássemos a mencionada taxa, ensinaríamos quantos dias quiséssemos e pudéssemos. Fizemos amizade com o recepcionista do nosso hostel e só essa amizade nos levou a repensar o nosso plano:

- Orphanage? Please be careful...

Thearan adverte-nos para uma realidade que facilmente poderíamos ter descoberto a priori, caso tivéssemos lido, estudado, pesquisado: muitos destes orfanatos e agências de voluntariado não são o que aparentam. O Camboja é um país pobre - um dos países mais pobres do Sudeste Asiático.

O rendimento de muitos habitantes do país não ultrapassa os $4/dia. A maioria das famílias é numerosa e há pais incapazes de alimentar todas as bocas que se sentam em redor da mesa. A solução que estes pais em dificuldades encontram?

Entregar a criança mais velha a um dos orfanatos do país, na esperança que esta seja alimentada três vezes ao dia, tenha acesso a uma educação formal e a cuidados médicos.

Estima-se que pelo menos 80% das crianças nos orfanatos do Camboja não sejam, na verdade, órfãs. Os orfanatos tornaram-se, para uma minúscula minoria, um negócio extremamente rentável. Estes são alimentados por doações in-

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Tamura

ternacionais e pelas hordas de voluntários que diariamente têm o seu passaporte carimbado num dos vários postos fronteiriços do país.

Estas instituições beneficiam da desinformação daqueles que crêem praticar o bem: apresentam-se, falaciosamente, como benfeitoras.

No entanto, uma pesquisa mais aprofundada é o suficiente para desmascarar a maioria destas organizações. Estes orfanatos obrigam as crianças a um interminável loop: tornam-se a sua vida e trabalho, uma peça de teatro que desempenham dia após dia.

Estas crianças já assistiram à mesma aula de inglês incontáveis vezes. Todas sabem as vogais e as consoantes do alfabeto latino; todas sabem os pronomes de sujeito e recitá-los de trás para a frente; e todas sabem conjugar o verbo “to be” na perfeição.

São diariamente apresentadas a um novo professor e despendem-se deste assim que o sol se põe. Ao contrário destas crianças, o professor, com um sorriso no rosto e um peito cheio de sentimento de dever cumprido, dá a sua missão por terminada e retorna ao seu quarto de hotel, no centro da cidade.

Na manhã seguinte, parte para Siem Reap, onde se deslumbrará com a beleza de Angkor Wat. O “hello” e o “goodbye” são uma constante. Sem pais presentes - ou figuras que os substituam - estas crianças são incapazes de criar laços duradouros - a impermanência destes voluntários impossibilita-o.

Muitos destes orfanatos não estão sob qualquer tipo de regulamentação ou controlo governamental – funcionam como uma entidade privada, e as crianças estão inteiramente à mercê daqueles que gerem estes estabelecimentos como vulneráveis marionetas, sem controlo sobre os seus fios ou cruzeta. Felizmente, cada vez mais olhares têm caído so-

bre estes orfanatos: o crescente turismo serviu para desmascarar estas instituições e trazer alguma verdade à tona, e tanto o Governo cambojano como diversas organizações internacionais têm intervindo e lutado contra estes lobos com pele de cordeiro.

Também somos culpados pela proliferação deste fenómeno – se aqui não estivéssemos e se para estes não contribuíssemos, estes orfanatos não teriam como existir.

É o nosso dinheiro que alimenta este monstro e, enquanto viajantes, a nossa carteira tem desmedido peso; enquanto viajantes, a nossa carteira é um voto.

Esse voto poderá beneficiar ou prejudicar países, pessoas, comunidades – a escolha é nossa, e essa escolha deverá ser o mais informada e ponderada possível.

Tomemos o exemplo de Siem Reap, cidade no norte do Camboja, lugar de Angkor Wat. No ano de 2019, mais de dois milhões de turistas visitaram a cidade e o seu templo – muitos destes, em excursões organizadas por agências de viagens do seu país de proveniência.

Consequentemente, grande parte dos dólares aqui gastos por turistas não permanece no país ou beneficia a economia local.

Estas agências estrangeiras mantêm os seus clientes numa “bolha” que os distancia e separa do lugar que visitam –chegam ao aeroporto com um roteiro pré-definido e inflexível, que os limita a hotéis, autocarros privados e aos mais famosos templos da cidade.

Estas agências e roteiros turísticos pouco ou nada estão interessados em ser uma fonte de rendimento para a comunidade de Siem Reap ou em preservar o património e a cultura local dos quais tanto bebem. Os alojamentos escolhidos por estas agências? Resorts e hotéis de cadeias internacionais. Aquele homestay que tão boas opiniões tem no Google

Maps? Nem pensar! E almoçarmos ou jantarmos naquele restaurante que dizem servir deliciosa comida Khmer (2)? Para quê se o hotel oferece buffet continental?

E a tão fugaz passagem destes visitantes por Siem Reap em nada contribuiu para as vidas destas famílias. Aqui, a partilha não é equitativa entre o turista e o lugar.

O Camboja pede que sejamos melhores: melhores pessoas, melhores viajantes. Precisamos ler sobre os locais que visitamos, falar com as pessoas que neles habitam, não temer fazer questões, conhecer, aprender, desaprender.

O Camboja, e tantos outros lugares, precisam que sejamos melhores: melhores pessoas, melhores viajantes

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O Camboja, cada vez mais, tem estado nas bocas do mundo: a casa do famoso Angkor Wat, um dos maiores complexos religiosos do mundo
Texto & Fotografia João Tamura

gnum mundo em mudança constante, imposta não só por fenómenos político-sociais, como pelos naturais (alterações climáticas, pandemias, etc.), a gastronomia e a restauração não permanecem no mesmo lugar. A conceituada revista portuguesa

“Gosto” – uma referência na criação de cenários de interacção entre todos os elementos da comunidade gastronómica tais como concursos, eventos e publicações – que, desde 1989, se dedica à elevação e dignificação da gastronomia em Portugal e no mundo, apresenta as dez tendências que estão a marcar o universo gastronómico e da restauração. Fique a par

1. Cozinha interventiva –Chefes e marcas que se posicionam ao lado de causas ambientais e de produção alimentar mais controlada e sustentável. É um compromisso assumido, uma escolha de não neutralidade com a qual o consumidor se identifica e apoia, dando um novo papel ao restaurante e aos seus protagonistas.

2. Mais mulheres no comando – O lugar da mulher… é onde ela quiser. E isso também se aplica à liderança de restau-

As Dez Tendências da Gastronomia

rantes e conceitos gastronómicos por mulheres.

O sistema de reconhecimento da restauração nem sempre a espelhou como um sector de todos. No actual contexto, essa obrigação não pode ficar de novo para trás.

3. It’s Show Time – A restauração é o palco perfeito para a magia acontecer e, cada vez mais, vamos assistir à proliferação de conceitos gastronómicos com música ao vivo, DJ, eventos temáticos.

Mais confortáveis, os novos restaurantes querem participar na celebração da vida e no espírito informal e a festividade alastra, pois é preciso que o cliente fique o maior tempo possível na instalação para aumentar o consumo.

4. O rio à mesa – Com a escassez de pescado de mar e o preço de mercado de algumas espécies que dele provêm, torna-se imperativo valorizar o pescado de rio. Com as suas características é, muitas vezes, símbolo da gastronomia de algumas regiões ribeirinhas. É notó-

e Restauração na Actualidade

ria a preocupação dos chefs de cozinha e restauradores na exploração deste tipo de pescado, apresentando receitas que os valorizam e lhes garantam notoriedade.

5. Gourmet low-cost 2.0 – O gourmet low-cost foi uma das faces visíveis da resposta deste sector à crise de 2011, tendo-se valorizado o produto regional e de época.

Fizeram-se no passado menus com criatividade, a preços controlados e uma apresentação refinada. No actual clima de inflação galopante, mantém-se a proximidade ao produto regional e de época.

6. Transparência é exigência – A origem dos produtos, a pegada ecológica, o modelo de produção do ponto de vista agrícola ou industrial, os recursos usados e a participação humana, as estações do ano, a logística e a distribuição, as embalagens, a validade, os ingredientes, o comércio, as pessoas. Tudo em causa, tudo disponível para ser partilhado.

7. Gratificação à la carte –Os restaurantes apresentam sugestões de gratificação incluídas nos valores totais a pagar pelo cliente. Há um valor (em média 5%) que está a surgir destacado

nas contas dos restaurantes, informando-se que o cliente pode acrescentar essa quantia a título de taxa de gratificação.

8. Um restaurante, várias nações - É o tempo de os emigrantes terem um papel mais visível na restauração. É uma nova possibilidade para os emigrantes poderem subir no reconhecimento e responsabilidade dentro do restaurante.

9. Formação al-dente – A diminuição do interesse pelas carreiras na restauração obriga a reforçar capacidades dos que se mantêm ao serviço, com vista à fidelização dos trabalhadores e a gerar atractividade para novos. Estão a surgir opções mais rápidas e sólidas de formação.

10. Veganização – Em linha com as tendências internacionais, a saúde, o bem-estar animal e o alarme climático, repensam-se as confecções com proteína animal e o mundo vegetal soma e segue no reconhecimento. A par da abordagem mais contemporânea, cresce o exercício de reinventar receitas já existentes, substituindo a proteína animal por proteína vegetal.

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O que está a mudar na restauração pelo mundo
MIA
A diminuição do interesse pelas carreiras na restauração obriga a reforçar capacidades dos que se mantêm ao serviço com vista à fidelização dos trabalhadores
GASTRONO-

Complexo, Denso e Aromático.

o tinto casa da ínsua reserva 2017 é um vinho da Região Demarcada do Dão, distribuído em Moçambique pela Mercury Comercial, do Grupo Visabeira Moçam bique. A secular tradição de produção de vinhos da Casa da Ínsua remonta ao sécu lo XVIII e já deixou uma marca indelével na produção da região, fruto da constante inovação e apuro da qualidade dos vinhos.

A história começa pelos anos 400, quando a quinta foi adquirida para moradia e para a produção agrícola. Actualmente, os vinhos do Dão são parte dos mais afa mados produtos da Casa da Ínsua, distinguidos por diversas vezes ao longo dos sé culos, nos mais exigentes concursos e prémios nacionais e internacionais. Recen temente, os vinhos do Dão Casa da Ínsua conquistaram mais duas medalhas de ouro na 13ª edição do prestigiado concurso internacional Catavinum World Wi ne & Spirits Competition 2023, que teve lugar numa das capitais da gastronomia mundial, a cidade de Vitoria- Gasteiz na Espanha. O vinho, cuja qualidade foi re conhecida em Portugal com uma distinção com Medalha de Ouro e tributado com 92 pontos na oitava edição do concurso Crédito Agrícola, está disponível nas melhores bottle stores e restaurantes de Moçambique. É produzido a par tir das castas Touriga-Nacional, Tinta-Roriz e Alfrocheiro.

Com 12 meses de estágio em barricas de carvalho francês e americano, o Tinto Casa da Ínsua Reserva 2017 revela uma complexidade aromática, em harmonia com a barrica, notas frutadas e especiarias, taninos poderosos, complexo e denso, que revela um final de boca longo e persistente.

O galardão agora conquistado vem reforçar o já extenso portefólio de prémios nacionais e internacionais que os vinhos da Casa da Ínsua, do Grupo Visabeira têm vindo a coleccionar. Este reconhecimento robustece a imagem da Casa da Ínsua como uma referência da produção de vinhos na Região Demarcada do Dão.

Os trinta hectares de vinhedo, que se es tendem ao redor do Parador Casa da Ínsua, uni dade hoteleira de cinco estrelas localizada em Pe nalva do Castelo, foram o berço desta colheita.

O Tinto Casa da Ínsua Reserva de 2017 possui grande capacidade de envelhecimento, podendo tornar-se um vinho de guarda.

No entanto, é melhor quando apreciado no mo mento. Pelo seu sabor, acompanha muito bem com pratos complexos.

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Texto Filomena Bande Fotografia D.R.
O galardão agora conquistado vem reforçar o já extenso portefólio de prémios nacionais e internacionais que os vinhos da Casa da Ínsua, do Grupo Visabeira, têm vindo a coleccionar
Já está em Moçambique o Campeão da Casa da Ínsua

sempre uma música

filho de pai moçambicano e mãe santomense foi considerado o cientista do ano, em 2019, pela comunicação social da Áustria onde Nuno Maulide vive e ensina Química Orgânica na Universidade de Viena.

Eterno apaixonado por música realiza recitais e as suas palestras sobre ciência são, muitas vezes, acompanhadas por Johann Sebastian Bach. Com dois livros editados e imenso sentido de humor vai descomplicando e desconstruindo a complexidade das moléculas. Agora prepara-se para dar um novo sentido à agricultura, aproveitando os excedentes para criar novas oportunidades de negócio.

Como chega à Áustria para ensinar Química Orgânica?

Acabei por fazer o percurso igual a muitos investigadores. Após terminar a licenciatura no Instituto Superior Técnico, segui para Paris onde fiz o mestrado na École Polytechnique, concluí o doutoramento na Universidade Católica de Louvain e, na Universidade de Stanford, fiz o pós-doutoramento. Só depois concorri para iniciar a carreira académicaa.

A carreira académica que teve início na Alemanha e só depois na Áustria.

Sim, no Instituto Max-Plank, com um contrato de cinco anos que podia ser prolongado à razão de dois de cada vez até sete ou nove anos. Quando terminou este contrato concorri para um lugar na Europa, não estava preso a qualquer país, por isso eram todos bem-vindos. Tive ofertas de cinco universidades e optei pela Universidade de Viena que era a melhor proposta. Desde 2013 tenho um contrato até fazer 65 anos.

E na Áustria foi considerado o cientista do ano. Ficou surpreso?

Fiquei sim, é um prémio de escolha, ninguém pode concorrer. É atribuído por um grupo de jornalistas, especialistas em ciência e em educação aqui da Áustria. E ao que parece a escolha foi unânime. Este prémio é atribuído a quem melhor faz comunicação de ciência.

Os seus pais, ambos médicos, vieram de África estudar para Portugal, alguma vez pensaram em voltar?

O meu pai nasceu em Moçambique, especializou-se em pneumologia e foi director do serviço do Hospital de Santa Maria. A minha mãe, nascida em São Tomé, era ginecologista na maternidade Alfredo da Costa.

Quanto ao voltar, creio que eles tinham como objectivo regressar a África. Depois de se formarem em Coimbra foram para Lisboa fazer especialização em Medicina Tropical, o que não faria sentido se a vontade não fosse regressar e exercer medicina num país tropical. Creio que seria Moçambique, pelo menos até às independências, mas não aconteceu e ficaram por Portugal.

O seu nome tem uma história.

O meu nome vem de quem proclamou a independência de São Tomé, Nuno Xavier, e é o nome do aeroporto internacional deste país. Foi também o primeiro presidente da Assembleia Constituinte de São Tomé e

Príncipe. Chamo-me Nuno Xavier por causa do Nuno Xavier que era irmão da minha mãe e faleceu em 1976, num acidente de avião em circunstâncias pouco claras.

Quando voltámos a São Tomé as pessoas acercaram-me por causa do nome e da família, fiquei com a ideia de que ele seria uma espécie de Dom Sebastião, havia no ar o sentimento de que com ele o país teria chegado a melhor porto há mais tempo.

E a Moçambique alguma vez pensou ir?

Estive em Moçambique com a família quando tinha 15 anos, por isso está na altura de regressar. Houve uma tentativa há pouco tempo que não se concretizou, mas penso ir lá.

A minha mulher tem também muita curiosidade em conhecer o país. A maioria da minha família está em Maputo e outros em Maxixe e Inhambane. Gostaria de rever estes familiares, talvez consiga ir em férias.

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2023 78
Nuno Maulide
«Escolho
para explicar os conceitos científicos»

Voltemos à química, em que projectos está

agora a trabalhar?

Ando a tentar perceber o que se pode aproveitar do desperdício, de muitos produtos agrícolas, para gerar valor económico. E estou a trabalhar no tremoço na óptica da Agricultura 2.0. Até hoje, a agricultura serve para produzir alimentos que são vendidos.

Mas aqui há muitos subprodutos que podem gerar processos químicos e novas indústrias. No caso do tremoço, ele não se come tal como nasce, porque é muito amargo. Esta semente, depois de apanhada, passa por um processo até inchar e ficar com aquele aspecto bonito que conhecemos.

É preciso passar por água para tirar esse amargo – o dito amargo resulta da acção de um alcalóide, componente que se pode converter num outro alcalóide de forma simples. O produto final é vendido a preços que chegam aos 100 euros euros

o grama. Este retorno é a partir das águas de lavagem, isto é, essencialmente vamos ao lixo buscar a matéria-prima para fazer negócio.

Se pensarmos noutros produtos alimentícios que têm processos idênticos, estamos a identificar novas cadeias de valor, contribuindo assim para a economia circular. A Agricultura 2.0 é a química a olhar para a agricultura e perceber que se pode analisar quase tudo para obter subprodutos que gerem valor.

Qual é o resultado de juntar música à química?

Escolho sempre uma música para explicar os conceitos científicos. Começar com a música é algo intuitivo e emocional, toco nas pessoas pelo lado emocional e depois vou do coração ao cérebro.

Esta é a ligação que falta quando se fala de ciência ao público em geral, as pessoas ficam paradas no cérebro e vão direc-

tamente à ligação intelectual. E eu acredito que para explicar ciência é preciso uma abordagem mais emocional, mais afectiva.

Algum compositor de que goste especialmente?

Johann Sebastian Bach é o que mais gosto de tocar e gosto muito de ouvir também. É uma música que toca no coração, mas quando a estudamos toca no cérebro.

Há quem diga que ele era um matemático, porque quando se desconstrói muitas das suas composições é-nos revelado o quanto organizado estava o seu cérebro. Por isso as suas composições são perfeitas para explicar as reacções químicas.

E também para explicar algumas reacções química já escreveu dois livros.

É verdade. Escrevi, primeiro, um livro entitulado Como Transformar Ar em Pão. Não é de todo um livro sobre o pão! É uma metáfora para uma reacção química, muito bem-sucedida e fundamental para a humanidade, que é a reacção que transforma azoto, tal como ele existe no ar.

Já o Como Desvendar o Quebra Cabeças da Vida é um pouco diferente. Nele reuni 27 perguntas sobre a Vida e o Universo. As pessoas, no geral, colocam-me muitas questões, por carta e e-mail, e muitos alunos também, durante as videoconferências que fiz e continuo a fazer para muitas escolas.

Por isso percebi que era interessante reunir algumas questões importantes e fazer uma espécie de abecedário da química.

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Moçambicanos pelo mundo
TEXTO Cristina Freire FOTOGRAFIA D.R.

O drama da guerra na vida das crianças de uma das aldeias de Cabo Delgado retratada em livro

Uma “Aldeia Que os Monstros Engoliram”.

até 2017, a aldeia da suzi, em cabo Delgado, no norte de Moçambique, era uma aldeia normal, como qualquer outra. As crianças brincavam, passeavam, estudavam e viviam todas no calor e protecção das suas famílias.

Crianças e adultos podiam fazer as suas actividades de forma livre, ouviam-se pássaros todas as manhãs a anunciar a chegada do sol e o emanar de um novo dia. Por essas alturas, ninguém imaginava o pesadelo que logo transformaria a aldeia num lugar sombrio e de muita dor: chegaram à aldeia alguns monstros que atacavam e destruíam tudo o que lhes aparecia pela frente.

Matavam crianças e adultos, separavam os filhos dos pais, impediam as crianças de frequentar as escolas… a aldeia ficou irreconhecível e inóspi-

ta. Em vez do chilrear dos pássaros, ouviam-se estrondosos sons de armas a disparar e, cada vez que uma bala era expelida, uma vida era ceifada e uma família era atingida, o cheiro doce das flores que no campo se abria foi substituído por uma mistura perfeita de pólvora e de cadáveres putrefactos que ornavam a aldeia (se assim ainda se pudesse chamar).

Em meio dessa nova e triste realidade daquele lugar, Suzi, uma menina de 10 anos, viu-se obrigada a fugir de casa e caminhar centenas de quilómetros para escapar dos “monstros” que atacaram a sua aldeia, na esperança de chegar a um lugar seguro.

O enredo acima está expresso no livro A Aldeia que os Monstros Engoliram, lançado a 22 de Março no Instituto Camões, em Maputo, pela ONGD

Uma Lição para a Vida!

Helpo, em parceria com a empresa Galp Energia.

O livro é da autoria de Maria João Venâncio que, a partir das histórias das crianças de Cabo Delgado, criou uma personagem fictícia (Suzi) para contar a realidade vivida por quase todas as crianças e jovens daquela região e conta com ilustrações de Luís Cardoso.

A Aldeia que os Monstros Engoliram, como explica Carlos Almeida, coordenador nacional da Helpo, resulta de um projecto realizado pela própria no ano passado, designado “A Escola do Caminho Longo”, que retrata a história de 20 crianças bolseiras da ONG que tiveram as suas vidas afectadas pelos ataques terroristas em Cabo Delgado.

São histórias, segundo Carlos Almeida, “muito dramáticas e que mereciam ser contadas. Por isso, a Helpo decidiu fazer este livro infantil como forma de fazer chegar a mensagem a crianças de outras idades, alertar a sociedade sobre a situação

que as crianças em Cabo Delgado vivem, apesar da situação no momento estar muito melhor, e angariar fundos para continuar a ajudar as crianças dessa região”.

A Fundação Galp, representada por Claúdia Ngwenya, afirmou o seu compromisso de longo prazo com o desenvolvimento económico e o progresso social de Moçambique e dos moçambicanos, sendo que 26% das verbas que alocam às iniciativas de responsabilidade social destinam-se a projectos educativos.

A Helpo opera na província de Cabo Delgado desde 2009. Quando começaram os ataques armados, a organização começou a acompanhar atentamente para onde as famílias se tinham deslocado e sobre as condições existentes, sobretudo as relativas à escola das crianças.

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LITERATURA
“São histórias muito dramáticas e que mereciam ser contadas. Por isso, a Helpo decidiu fazer este livro infantil como forma de fazer chegar a mensagem a crianças...”

HYDROGEN

Modelo: iX5

Hydrogen Velocidade

máxima: 180 km/h

Potência: 401 cv

Consumo: 1,19 kg de hidrogénio a cada 100km

BMW Lança Modelo Movido

A BMW LANÇOU, recentemente, uma frota de 100 protótipos do modelo iX5, automóveis movidos a hidrogénio que já se encontram a circular em estradas. A marca fez este lançamento para testar a tecnologia do hidrogénio.

O modelo conta com uma potência total de 401 cavalos (cv), sendo que 170 são gerados pelo sistema de célula de combustível. No que diz respeito ao consumo em estrada, segundo os números oficiais da marca, o iX5 gasta 1,19 kg de hidrogénio a cada 100 km percorridos.

Os 100 protótipos do modelo iX5 são capazes de percorrer um total de 504 quilómetros, graças ao tanque de 6 kg de hidrogénio e à bateria que oferece 170 kW de capacidade. Em termos de performance, o iX5 Hydrogen é capaz de uma aceleração dos 0

aos 100 km/h em menos de seis segundos e uma velocidade máxima superior a 180 km/h.

O Presidente do conselho de administração da BMW AG, Oliver Zipse, afirmou, durante a apresentação dos protótipos, que o uso do hidrogénio se deve ao facto de este ser um elemento fundamental para a transição energética, sobretudo para a área automação.

“O hidrogénio é uma fonte de energia versátil que tem um papel fundamental a desempenhar no processo de transição energética e, por conseguinte, na protecção do clima.

Afinal, é uma das formas mais eficientes de armazenamento e transporte de energias renováveis. Devemos utilizar este potencial para acelerar também a transformação do sector da mobilidade. O hidrogénio é a

peça que falta no quebra-cabeças quando se trata de mobilidade sem emissões”, realçou.

O iX5 Hydrogen será produzido na fábrica-piloto do grupo no seu Centro de Pesquisa e de Inovação em Munique, na Alemanha. Especialistas na tecnologia de hidrogénio, desenvolvimento de veículo e de montagem inicial têm trabalhado para integrar as tecnologias de ponta nos motores e nos sistemas de armazenamento, sem alterar as suas características funcionais e dinâmicas.

Os sistemas de pilha de combustível a hidrogénio montados sob o capot do iX5 Hydrogen são produzidos pelo centro especial da BMW para o hidrogénio em Garching, no norte de Munique.

BMW IX5
vO Presidente do Conselho de Administração da BMW AG, Oliver Zipse, afirmou, durante a apresentação dos protótipos, que o uso do hidrogénio se deve ao facto de este ser um elemento fundamental para a transição energética, sobretudo para a área automação.
a Hidrogénio

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