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David Ricardo. Pessimista ou Justo no Comércio entre Nações?
Com um forte contributo no campo teórico, o economista inglês David Ricardo foi decisivo na definição das regras de jogo do comércio internacional. As suas ideias sofreram influências, mas a sua visão deixa uma marca muito própria: o pessimismo!
David Ricardo, nascido em Londres, viveu entre 1772 e 1823, foi um político e economista inglês, um dos mais influentes membros da Escola Clássica, conhecido pela sua teoria das vantagens comparativas. Proveniente de uma família judia holandesa, recebeu uma educação judaica ortodoxa.
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Formou-se e cedo foi trabalhar com o seu pai que era trader na Bolsa de Valores de Londres. Casou com uma mulher cristã, facto que o afastou da família e levou a que fosse trabalhar por conta própria como corretor e especulador de câmbios, fazendo fortuna rapidamente.
A sua formação económica foi muito autodidacta, tendo sido fortemente influenciada pela obra de Adam Smith, “A Riqueza das Nações”. A partir desta obra desenvolveu o seu próprio pensamento, inicialmente focado em questões monetárias. Nesta área não foi muito original, defendendo a teoria quantitativa da moeda que estabelecia uma relação directa entre a inflação e a quantidade de moeda no mercado. Por outras palavras, é o princípio segundo o qual aumentar a quantidade de moeda em circulação numa economia eleva o poder de compra dos agentes económicos (famílias, empresas e Governo), o que, por sua vez, aumenta a procura por bens e serviços e acelera a inflação. Trata-se de uma teoria muito presente na gestão macroeconómica de quase todos os países, sendo um dos exemplos a política monetária restritiva do Banco de Moçambique que, recorrendo aos instrumentos que limitam a emissão de moeda, busca cumprir o seu principal mandato: manter a inflação baixa e estável. James Mill, célebre historiador e filósofo inglês, e grande defensor do liberalismo, foi amigo de David Ricardo e, consciente do valor intelectual deste, encorajou-o a divulgar a sua concepção teórica do sistema económico.
Foi assim que em 1817 surgiu a obra “Princípios da Economia Política e Tributação” que, apesar de sintética, contém a formulação mais sistemática e consistente do pensamento económico clássico.
Teoria da vantagem comparativa e a “confusão” com o marxismo
Apesar dos vários contributos dados para o desenvolvimento da Teoria Económica, aquele pelo qual David Ricardo ficou mais conhecido foi a Teoria da Vantagem Comparativa relativa ao comércio internacional. Segundo esta teoria, todos os países, mesmo aqueles com menos capacidades produtivas, lucram com o comércio livre, sem restrições e sem monopólios, desde que se especializem na produção daquilo em que sejam comparativamente mais eficientes. Este pensamento de Ricardo é ainda hoje a base de todos quantos defendem a existência de comércio livre e a abolição de todo o tipo de barreiras e medidas proteccionistas como condição para um maior desenvolvimento e crescimento económico.
Mas a obra que David Ricardo haveria de deixar como seu legado continha também diversos elementos que permitiram interpretações de tipo socialista. De facto, o pensamento económico do russo Karl Marx (filósofo, economista e revolucionário socialista, autor do “Manifesto Comunista” e do triplo volume “O Capital”) consistiu, em grande parte, no desenvolvimento das ideias de Ricardo. Por exemplo, defendia que apenas o trabalho produz valor, ideia esta utilizada por Marx para defender que os capitalistas exploram os trabalhadores. Marx também aproveitou a ideia de estado estacionário por profetizar o inevitável colapso do sistema capitalista, esgotado pelas suas próprias contradições.
Teoria do valor-trabalho
David Ricardo argumentava que o valor de determinado bem poderia ser medido a partir do trabalho necessário para que ele fosse produzido. Assim, dizia que o custo não deveria basear-se apenas na compensação da mão-de-obra, mas em todo o custo envolvido no processo produtivo. Essa teoria seria, mais tarde, um dos fundamentos do marxismo.
Para Marx, aliás, esta teoria supõe que em toda e qualquer troca de mercadorias há tendência para existir uma permuta de quantidades iguais de trabalho utilizado na produção. Por exemplo, um maço de cigarros vale vinte caixas de fósforos, porque o tempo de trabalho necessário à produção do primeiro seria vinte vezes maior do que aquele utilizado para produzir o segundo.
Foi essa que se consagrou como a teoria clássica do valor, cuja influência na teoria económica foi absoluta até à segunda metade do século XIX, quando ocorre a chamada revolução marginalista, defendendo a tese de que o valor de uma mercadoria não depen - de das horas de trabalho necessárias à sua produção – uma medida objectiva –, mas sim do grau de satisfação que essa mercadoria é capaz de proporcionar ao consumidor – uma medida subjectiva. Desde então, essas duas concepções teóricas têm ocupado espaço destacado na arena do debate teórico da economia.
Pessimismo expresso na lei dos salários a ferro e fogo
Ao contrário de Adam Smith e de alguns dos seus intérpretes que tinham uma visão geralmente optimista quanto às perspectivas da humanidade, David Ricardo jamais foi considerado optimista, segundo John Kenneth Galbraith, outro dos mais importantes economistas canadianos do século XX, na sua obra “A era da incerteza”.
O mesmo pessimismo subjacente à concepção do “estado estacionário” pode ser observado na forma como Ricardo, influenciado por Thomas Robert Malthus (economista inglês que desenvolveu uma teoria sobre o crescimento populacional e a produção de alimentos) olha para a tendência per-
Bbiografia De David Ricardo
David Ricardo (1772-1823) nasceu em Londres, Inglaterra, no dia 18 de Abril de 1772. Seu pai era um judeu holandês que fez fortuna na Bolsa de Valores. Em 1799, com a leitura da obra de Adam Smith, “A Riqueza das Nações”, passou a interessar-se por economia. Escreveu “O Alto Preço do Ouro, uma Prova da Depreciação das Notas de Banco”. A sua teoria foi aceite por um comité da Câmara dos Comuns, o que lhe deu grande prestígio.
Em 1817, escreveu “Princípios da Economia Política e Tributação”, onde são analisadas as leis que determinam a distribuição de tudo o que poderia ser produzido pelas três classes da comunidade: os proprietários da terra, os trabalhadores e os donos do capital.
manente de queda nos salários. Ainda de acordo com Galbraith, tal como o seu amigo Malthus, David Ricardo previa um contínuo aumento da população, e a população de Malthus tornou-se o operariado de Ricardo. Entre os operários haveria tamanha concorrência na procura de emprego, de um lado, e de comida, do outro, que tudo ficaria reduzido a um simples processo de subsistência.
No mundo ‘ricardiano’, os trabalhadores receberiam o mínimo necessário à subsistência, nada mais do que isso. Era a chamada lei de ferro e fogo dos salários. E era, na sua óptica, o destino da humanidade.
Em relação ao “estado estacionário”, Ricardo previa, igualmente, o fenómeno de uma pressão populacional que seria responsável pelo cultivo de terras cada vez menos férteis.
Ao chegar a determinado limite, o lucro seria tão baixo que a acumulação de capital simplesmente cessaria, prejudicando o desenvolvimento económico. Para adiar esse “estado estacionário”, seria necessária a aplicação de um programa económico liberal.