ESG
“BE LIKE A WOMAN”, UMA INICIATIVA PARA ELEVAR A LIDERANÇA NO FEMININO
CONTEÚDO LOCAL
MOZPARKS, HOLLARD E FNB LANÇAM PROGRAMA NACIONAL DE ESTÁGIOS PRÉ-PROFISSIONAIS
CEO TALKS • BLUEPHARMA
“NÃO BASTA HAVER BONS MEDICAMENTOS. TÊM DE SER ACESSÍVEIS”
INOVAÇÕES DAQUI
GOVERNO E PNUD LANÇAM PLATAFORMA
ONLINE DE REGISTO DE IDEIAS INOVADORAS
ECONOMIA A DUAS VELOCIDADES PAE
Em 2022, o Governo aprovou as 20 medidas do Pacote de Aceleração Económica. Um ano depois, apenas 48% está em execução. Terá sido a ambição maior do que a capacidade ou ainda vamos a tempo de acelerar, de facto, a economia nacional?
MOÇAMBIQUE
Setembro • 2023 • Ano 06 • Nº 64 • 350MZN
Celso Chambisso Editor Executivo da Economia & Mercado
PAE: Actores, Estratégias e Coordenação
Este título foi inspirado na tese de mestrado do cientista político moçambicano José Jaime Macuane, professor de Ciência Política e Administração Pública na Universidade Eduardo Mondlane. O título original do artigo a que fazemos menção é “Reformas Económicas de Moçambique: Actores, Estratégias e Coordenação”, e procurava identificar e discutir os pontos críticos para a transformação estrutural da economia moçambicana no contexto do Programa de Reabilitação Económica (PRE) de 1987.
Nesta edição, a E&M procura fazer o mesmo exercício, mas, 36 anos depois, o foco vai para a análise ao Pacote de Medidas de Aceleração Económica (PAE), a mais importante reforma económica do País na actualidade, aprovada há um ano e que, por estas alturas, deve começar a mostrar o seu grau de eficácia ou de fracasso (não será este, obviamente, o cenário desejado).
Felizmente, há muita literatura que, lançando um olhar atento, ao longo dos anos, sobre um conjunto de características de Moçambique no domínio geo-político, socieconómico, da estrutura produtiva e da herança colonial, mostra o caminho a seguir para a construção de uma economia próspera. Não têm faltado estudos, nem informação sobre como comandar a tão ansiada viragem.
Mas como é que este caminho está a ser construído no quadro do PAE e quais são os factores críticos de sucesso? A reflexão de José Jaime Macuane introduz alguns factores que, a nosso ver, vale a pena explorar também no contexto do PAE: os actores, as estratégias e a coordenação. A base para trazer estes elementos à análise está na experiência prática do PRE, descrita pelo académico Macuane. À semelhança do PAE, o PRE - um programa de ajuste es-
trutural apoiado pelo FMI e Banco Mundial – tinha como objectivo debelar a grave crise económica e social que o País atravessava, herdada, segundo o autor, do fracasso das estratégias de desenvolvimento socialista adoptadas após a independência, em 1975, e depois da guerra civil, que assolava o país desde 1976. A existência de um sistema de partido único e o influxo de recursos externos para responder à fraca capacidade do Estado, juntamente com graves problemas sociais provocados pela guerra, entre os quais a fome, não foram suficientes para garantir um sucesso expressivo do programa de ajuste. A conclusão foi que “uma das causas do relativo insucesso do PRE” foram “os problemas de coordenação, oriundos da incapacidade do Governo em conciliar as estratégias dos actores internos e externos, durante o processo de implementação das reformas económicas”.
Hoje, no contexto do PAE, os obstáculos não são iguais aos do passado, mas também existem. Basta lembrar, entre outros, a elevada dívida pública, os desastres naturais cíclicos, a fraca produtividade da economia e os conflitos externos com impacto negativo na economia doméstica. Perante estes riscos, como está a ser conduzida a coordenação do PAE e o que assegura que não se repetem as dificuldades do PRE? A E&M ouviu o coordenador-adjunto deste programa, João Macaringue, que garante o envolvimento e foco de todos os actores interessados, que vão desde as instituições do Governo até aos parceiros internacionais, passando pelo sector privado e pelas organizações da sociedade civil. Todos exercem uma monitorização minuciosa de cada uma das 20 medidas em curso, o que afasta a possibilidade de um fracasso motivado por fragilidades de coordenação e deficiências na conciliação de estratégias. Esperamos ansiosos que o PAE, de facto, resulte!
SETEMBRO 2023 • Nº 64
DIRECTOR EXECUTIVO Pedro Cativelos
EDITOR EXECUTIVO Celso Chambisso
CONSULTOR EDITORIAL Luís Fonseca
JORNALISTAS Ana Mangana, Filomena Bande, Hermenegildo Langa, João Tamura, Nário Sixpene
PAGINAÇÃO José Mundundo
FOTOGRAFIA Mariano Silva
REVISÃO Manuela Rodrigues dos Santos
DEPARTAMENTO COMERCIAL comercial@media4development.com
CONSELHO CONSULTIVO
Alda Salomão, Andreia Narigão, António Souto; Bernardo Aparício, Denise Branco, Fabrícia de Almeida Henriques, Frederico Silva, Hermano Juvane, Iacumba Ali Aiuba, João Gomes, Rogério Samo Gudo, Salim Cripton Valá, Sérgio Nicolini
ADMINISTRAÇÃO, REDACÇÃO
E PUBLICIDADE Media4Development
Rua Ângelo Azarias Chichava nº 311 A — Sommerschield, Maputo – Moçambique; marketing@media4development.com
IMPRESSÃO E ACABAMENTO
RPO Produção Gráfica
TIRAGEM 4 500 exemplares
EXPLORAÇÃO EDITORIAL E COMERCIAL
EM MOÇAMBIQUE
Media4Development
NÚMERO DE REGISTO
01/GABINFO-DEPC/2018
www.economiaemercado.co.mz | Setembro 2023 4
E DITORIAL
6 OBSERVAÇÃO
A nova imagem dos BRICS com a adesão de mais seis países ao bloco, agora com o poder e influência muito mais ampliados na arena económica e política global
OPINIÃO
“A Banca Transaccional Como Motor da Banca Relacional: Uma Revolução Silenciosa no Sector Bancário”, Glória Baltazar, Responsável da Banca Transaccional do Absa Bank
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E SG
A consultora Ernst & Young e a agência New Faces New Voices lançaram um programa de empoderamento da mulher denominado “Be Like a Woman”. Como funciona?
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OPINIÃO
“Culturas Regenerativas – O Desejo de Reconciliação, de Regressar a Casa e as Histórias que Contamos”, Susana Cravo, Consultora & Fundadora da Kutsaca e da Plataforma Reflorestar.org
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P OWERED BY FIDELIDADE
A seguradora Fidelidade-Ímpar acaba de colocar no mercado mais um produto inovador, o aplicativo “MyFidelidade, que permite acesso aos serviços no telemóvel
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CONTEÚDO LOCAL
Como o programa de estágios profissionais desenhado pela MozParks, Hollard Seguros e o banco FNB, o MozYouth, estabelece a ligação entre a procura e a oferta de emprego
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OPINIÃO
“Logística e Transporte”, Ricardo Velho, Partner & Business Development Manager na Insite
NAÇÃO ACELERAÇÃO ECONÓMICA
24 Impacto das medidas Economistas, representantes de organizações multilaterais e o Governo admitem que o plano aprovado há um ano ainda impõe muitos desafios
36 Sector privado Empresários destacam impacto encorajador ao nível das medidas fiscais e do turismo, e fraco impacto na agricultura e electrificação
42 Entrevista O Coordenador-adjunto do Gabinete de Reformas Económicas defende melhorias na infraestrutura logística para acelerar o desenvolvimento
OPINIÃO
“A (Muito Esquecida) ‘Lei do Gargalo’: ou Como Melhorar a Eficiência do Seu Negócio”, João Gomes - Partner @BlueBiz
74 Escape O Oeste Americano 76 Gourmet Restaurante Kuxuva 77 Adega O “Detalhe” 78 Empreendedor
Charutos Bongani 80 Artes Reinata Sadimba
82 Ao volante do BMW i7
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SHAPERS
Joseph Stiglitz, Nobel de Economia de 2001, conhecido pela teoria dos mercados com informações assimétricas, chegou a fazer importantes alertas a Mocambique. O que disse?
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OPINIÃO
“A Importância dos Índices Bolsistas”, Wilson Tomás, Research Analyst do Banco Big Moçambique
MERCADO E FINANÇAS
A Ernst & Young explica a essência do FATCA, instrumento criado pelos EUA para combater a fuga ao fisco, e o que pode mudar caso Moçambique adira a este sistema
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P OWERED BY FNB
“As Contas Bancárias ao Serviço de uma Gestão Financeira Eficaz”, Mirena de Oliveira, Responsável pelo Segmento Private do FNB Moçambique
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CEO TALKS
O co-fundador da farmacêutica Bluepharma, Paulo Barradas, e Country Manager, Liliana Proença, falam do ‘estado da arte´do mercado dos genéricos no País
63 E SPECIAL INOVAÇÕES DAQUI
64 INCUBAÇÃO
O Governo e o PNUD vão criar plataforma online para o cadastro de projectos inovadores. Quais as mais-valias?
68 Energia
Conheça o projecto de jovens moçambicanos que transforma lixo em carvão e dejectos de animais em gás
73 ÓCIO
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BRICS, 2024
Emergentes Com Mais Poder
O anúncio da entrada de mais seis membros no grupo das economias emergentes composto pelo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (BRICS), a partir de 2024, vai ampliar a influência deste bloco na arena global, dada a dimensão dos novos integrantes: Argentina, Arábia Saudita, Egipto, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irão.
O bloco, que actualmente tem uma grande representatividade na economia global, com o PIB a
corresponder a 25,5% da economia global (o equivalente a 25,9 triliões de dólares em 2022) e mais de 42% da produção mundial, passa a ter um PIB por paridade de poder de compra com um peso de 36,6% do total mundial. E a representatividade do grupo aumenta de 41% para 46% da população mundial.
Aquando do anúncio da adesão dos novos membros dos BRICS, na 15.ª cimeira dos chefes de Estado e
de Governo do grupo, realizada em Agosto, o Presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, lembrou que, com estas novas adesões, o bloco passa a representar seis dos nove maiores produtores de petróleo do mundo, nomeadamente a Rússia, China, Brasil, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Irão.
OBSERVAÇÃO 6 www.economiaemercado.co.mz | Setembro 2023
D.R.
FOTOGRAFIA
Economia
Fitch Ratings prevê crescimento de 6,4% para Moçambique em 2023
A agência de notação financeira Fitch Ratings prevê, para Moçambique, um “forte crescimento económico”, com a aceleração do Produto Interno Bruto (PIB) para 6,4% em 2023 e para uma média de 4,9% em 2024/2025. Os dados constam do relatório lançado recentemente pela agência. Esta projecção está 0,6 pontos percentuais abaixo da que foi feita pelo Governo para este ano.
As perspectivas são baseadas nas projecções de aumento da produção no sector extractivo, em especial do Gás Natural Liquefeito (GNL), com aumento da capacidade de produção da plataforma flutuante Coral-Sul da Eni, que vai crescer para 70% e 90% da capacidade em 2023 e 2024, respectivamente. A capacidade total deverá ser de 3,73 milhões de toneladas por ano.
O crescimento ao longo de 2024/2025 será suportado pela retoma da construção do projecto de GNL da Total, avaliado em 20 mil milhões de dólares, no primeiro trimestre de 2024, dada a melhoria nas condições de segurança em Cabo Delgado ao longo de 2023.
Entretanto, a Fitch também aponta riscos e medidas correctivas a situações negativas no País, a começar pelo défice orçamental, que deve diminuir de 4,5% em 2022 para 3,6% do PIB em 2023 - permanecendo, mesmo assim, elevado.
Fiscalidade
MEF está a desenvolver plataforma para definição de preços na contratação pública
O Governo moçambicano, através do Ministério da Economia e Finanças (MEF), está a desenvolver uma plataforma de preços de referência com vista a travar a especulação de valores na contratação pública de bens e serviços feita pelo Estado.
Sem avançar prazos para a entrada em funcionamento da plataforma, a directora nacional do Património do Estado no MEF garantiu que o instrumento vai ajudar a disciplinar o uso do erário público. Albertina Furquia explicou que a contratação pública é um processo descentralizado, que obedece à planificação e à disponibilidade de recursos.
Por isso, “estamos a construir uma base sólida que permita ter preços de referência de mercado para os bens e serviços que são ad-
quiridos pelos órgãos e instituições do Estado. Com esta base, entendemos que podemos ajudar a disciplinar e melhor planificar” o trabalho das instituições ao elaborar os respectivos processos de contrataçãoporque têm de ter o valor estimado -, mas também “na gestão dos contratos porque, quando forem adjudicados, já terão preços de referência – mínimos, máximos e médios –, que permitirão avaliar se aquele que está a ser proposto pelo concorrente é realista”, explicou.
Álvaro Massinga, presidente da Câmara do Comércio de Moçambique, referiu ser urgente combater todos os factores ligados a actos de corrupção durante o processo de contratação pública, pois “isso prejudica o próprio Estado, que acaba por pagar um preço alto por um produto ou serviço”.
Trade Moçambique, Maláui e Zâmbia aprimoram mecanismos de integração regional
Delegações de Moçambique, Maláui e Zâmbia reuniram-se em Lusaka, capital zambiana, de 21 a 24 de Agosto, para aprimorar os mecanismos de coordenação tripartida, com vista a assegurar a redução de custos e de tempo nas transacções comerciais, assim como melhorar o acesso a infra-estruturas de transportes. As partes discutiram ainda o estado de preparação do Memorando de Entendimento de Normalização, Qualidade, Acreditação e Metrologia a ser assinado entre os três países. Muitos desafios assentam nas áreas de infra-estruturas e coordenação regional.
Os três países avaliaram também o nível de progresso na implementação do plano de acção concebido na 7.ª reunião do Comité Conjunto Tripartido de Gestão do Corredor de Desenvolvimento de Nacala (CDN), em Março, em Lilóngue, capital do Maláui, bem como actividades planificadas para 2024.
Existe um Projecto de Comércio e Coanectividade da África Austral (PCCAA), no valor global de 230 milhões de dólares, financiado pelo Banco Mundial. Espera-se que, com a melhoria da coordenação e integração regional, se verifique uma dinamização das três economias.
www.economiaemercado.co.mz | Setembro 2023 8 RADAR
O Presidente da República, Filipe Nyusi, manifestou interesse de que o País estreite a cooperação com os membros dos BRICS, para ter acesso aos fundos disponibilizados pelo banco criado por aquela organização multilateral.
O chefe de Estado destacou que o Novo Banco de Desenvolvimento dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) vai servir para reduzir o défice de infra-es-
ESG
truturas no continente africano, estas que “são importantes para impulsionar o progresso económico e criar bem-estar para os moçambicanos”.
O governante reconheceu, igualmente, que “a iniciativa de cooperação dos BRICS com países não BRICS, aliada à sua expansão, configura uma mais-valia para a materialização das iniciativas africanas para o desenvolvimento do continente.
RH CONTACT anuncia investimento na formação e consultoria já este ano
O programa da CONTACT para o ciclo 2023-2024 conta com um investimento na área de formação e consultoria, para responder ao ambiente de intensa demanda por profissionais cada vez mais capacitados, motivados e ágeis.
A cadeia de valor de Recursos Humanos no mundo, tal como em Moçambique, está em constante evolução. É por isso que é importante, além de identificar talentos que respondem às necessidades das organizações, desenvolver as habilidades, técnicas e comportamentais, para reforçar a fidelização e performance dos colaboradores nas Organizações.
É nesse sentido que, neste ciclo, a empresa quer centrar a atenção na selecção criteriosa, acompanhada do desenvolvimento contínuo dos talentos. Com 18 anos de actividade no sector dos Recur-
sos Humanos, a CONTACT quer continuar a ser uma referência como ponte entre os melhores talentos e as organizações mais promissoras em Moçambique.
As soluções desta empresa no contexto da formação e consultoria privilegiam a saúde e o bem-estar (sessões de conversa nas organizações sobre saúde mental, saúde ocupacional, liderança emocional, etc.); fortalecem a gestão e a performance (treinamentos em atendimento de excelência, gestão e resolução de conflictos, resolução de problemas, gestão de tempo e eficácia pessoal, etc.); aceleram o desenvolvimento de pessoas (formações em liderança e marketing pessoal, comunicação e competências interpessoais, técnicas de apresentação e discurso publico, etc.), entre outros aspectos.
Digital Bancos moçambicanos introduzem nova tecnologia contactless
O Governo dos Estados Unidos, através da sua Agência para o Desenvolvimento Internacional (USAID), anunciou um novo programa designado por “PLANETA”, que irá facilitar o investimento internacional em projectos de captura de carbono baseados na natureza em Moçambique.
A USAID explica que as indústrias que queimam altas taxas de carvão, petróleo e outros combustíveis libertam dióxido de carbono na atmosfera, o que leva à subida das temperaturas e a condições meteorológicas extremas.
E em resposta, os Governos de todo o mundo es-
tão a incentivar as empresas a reduzirem as emissões de carbono, sendo que uma forma de o fazer é exigir que as mesmas armazenem uma tonelada de carbono por cada tonelada das suas emissões.
“Isto representa uma oportunidade para Moçambique, que pode armazenar grandes quantidades de carbono nas suas extensas florestas tropicais.
A indústria de captura de carbono terá um crescimento exponencial, e este novo prémio irá posicionar Moçambique como um interveniente importante no mercado”, referiu a organização em comunicado.
Os bancos comerciais filiados na Associação Moçambicana de Bancos (AMB) estão a introduzir a nova tecnologia contactless para cartões de crédito e terminais de Ponto de Venda (POS, na sigla em inglês), bem como a proceder à renovação das caixas automáticas (ATM). A iniciativa visa dar maior segurança às transacções electrónicas e oferecer aos utilizadores tecnologia moderna e inovadora no sistema financeiro. “Este passo signifi-
cativo passa pela introdução da tecnologia contactless nos cartões bancários e nos POS, bem como na renovação das máquinas ATM e na inclusão de novas funcionalidades na conta móvel e no canal móvel”, refere uma nota da AMB. Durante o processo, algumas limitações podem ser registadas temporariamente nos serviços prestados pelos bancos. No entanto, as operações mais comuns já estão disponíveis e outros serviços serão gradualmente introduzidos.
Segundo a AMB, os terminais de pagamento também estão a passar por uma actualização para aceitar pagamentos sem contacto. “Este processo está a ser orientado para garantir que não haja alterações ao nível dos custos para os clientes, incluindo comerciantes”.
www.economiaemercado.co.mz | Setembro 2023 9
Financiamento Moçambique pretende cooperar com BRICS para aceder ao banco da organização
USAID lança iniciativa de 2M$ para promover mercado de carbono em Moçambique
Quando se trata de serviços bancários, um “cliché” comum que ouvimos é: “os produtos são os mesmos” ou “todos oferecem o mesmo”. Afinal, oferecem os bancos os mesmos produtos e serviços? Um olhar mais atento e aprofundado à estrutura e à evolução do sector bancário revela uma imagem muito diferente. Se no passado, quando a banca era menos sofisticada e menos competitiva, esta afirmação poderia ter alguma veracidade, hoje está muito longe de ser assim.
À medida que os bancos evoluem, também evoluem os seus serviços e a forma como interagem com os seus clientes. Impulsionados por inovações tecnológicas e transformações digitais, os bancos têm expandido os seus portfolios. Além de oferecerem produtos financeiros tradicionais, também incorporam uma variedade de serviços não bancários, tornando a oferta mais apelativa e adaptada às necessidades e estilos de vida dos clientes.
A decisão de escolher um banco vai além da simples selecção de produtos e serviços. Envolve uma série de considerações, desde a qualidade do atendimento até à facilidade de uso dos serviços, passando pela oferta de produtos, serviços personalizados e a integração de serviços (bancários e não bancários). Cada vez mais, os clientes procuram uma experiência bancária completa e integrada que seja adaptada às suas necessidades individuais e estilos de vida.
A banca tradicional, caracterizada por modelos de negócio baseados em agências físicas e respectivas operações, tem sido o padrão do sector durante décadas. Nesta abordagem, os serviços bancários tendiam a ser uniformes e altamente padronizados, focados em depósitos, créditos e alguns serviços auxiliares, com pouca diferenciação entre instituições. No entanto, a chegada da banca transaccional, impulsionada pelas inovações tecnológicas e digitais, marcou o início de uma revolução significativa no sector bancário. Em contras-
A Banca Transaccional Como Motor da Banca Relacional: Uma Revolução Silenciosa no Sector Bancário
te com a banca tradicional, a banca transaccional utiliza canais electrónicos e digitais para proporcionar acesso a uma variedade de serviços financeiros, permitindo que os clientes realizem as suas operações de forma rápida e conveniente, a qualquer hora e em qualquer lugar.
Nesta era da banca transaccional, os bancos procuram diferenciar-se através dos produtos financeiros que oferecem, mas também através da experiência geral que proporcionam aos seus clientes. Neste sentido, têm centrado o foco, cada vez mais, em proporcionar uma experiência integrada que combina serviços bancários com outros de valor agregado. Por exemplo, muitos oferecem, nos seus canais digitais, ligação a serviços de utilidade diária, como o pagamento de impostos. Estas ofertas adicionais tornam a experiência bancária mais ape-
Estas empresas, designadas fintechs, especializadas na aplicação de tecnologia para melhorar os serviços financeiros, têm-se tornado cada vez mais influentes na forma como a banca transaccional é implementada e na definição do que será a banca no futuro. As fintechs, por exemplo, tornaram-se parceiros estratégicos nesta revolução bancária, contribuindo para a transformação da banca transaccional na banca relacional.
Estas empresas estão a introduzir novas formas de interagir com os serviços bancários, desde pagamentos móveis até à utilização de inteligência artificial para aconselhamento de investimentos. Estas inovações disruptivas forçam os bancos a adaptarem-se e a evoluírem, criando uma maior conveniência e uma melhor experiência para os clientes.
Ao estabelecer parcerias com fintechs, os bancos conseguem manter-se relevantes e competitivos na era digital, melhorando a qualidade e a variedade dos seus serviços. Estas parcerias permitem aos bancos aprimorar a sua oferta de produtos e serviços e responder rapidamente às necessidades dos clientes, o que se tem tornado fundamental para a sua satisfação e estar na vanguarda da inovação tecnológica no sector em que operam.
lativa e conveniente, levando os clientes a escolher certos bancos em detrimento de outros.
Com o empenho da banca transaccional em melhorar a experiência do cliente através de serviços de valor agregado, é certo que esta tem transformado a forma como os bancos operam. No entanto, a verdadeira força motriz por detrás desta revolução não tem sido apenas a adopção de novas tecnologias pelos bancos, mas também a interacção com empresas inovadoras que estão na vanguarda da tecnologia financeira.
Estes parceiros especializados na aplicação de tecnologia desempenham um papel crucial na modelagem da banca contemporânea e destacam a importância da colaboração na condução do progresso no sector bancário. A sua influência ilustra o poder da inovação e da tecnologia na criação de uma indústria bancária mais ágil, eficiente e centrada no cliente.
A banca relacional, neste contexto, representa a fase seguinte na evolução do sector bancário. Neste “novo” paradigma, os bancos não são apenas provedores de serviços financeiros, mas são também parceiros que alcançam a compreensão profunda das necessidades e expectativas dos seus clientes. Os clientes de hoje procuram um valor agregado
www.economiaemercado.co.mz | Setembro 2023 10 OPINIÃO
Ao estabelecer parcerias com tecnológicas, os bancos conseguem manter-se relevantes e competitivos na era digital, melhorando a qualidade dos seus serviços
Glória Baltazar • Responsável da Banca Transaccional do Absa Bank Moçambique
distinto que responda às suas necessidades únicas e preferências. Aqui, a qualidade do atendimento assume um papel de destaque. Os clientes valorizam um serviço eficiente e empático que esteja disponível quando precisam e que seja capaz de resolver os seus problemas de forma rápida e eficaz.
A facilidade de uso dos serviços bancários também é uma consideração importante. Os clientes esperam que as operações que realizam sejam simples, intuitivas e convenientes. Isso inclui tudo, desde a abertura de uma conta até à realização de transacções diárias, transferências bancárias ou pagamentos. Os bancos que oferecem plataformas digitais amigáveis e seguras têm uma vantagem competitiva, pois proporcionam aos clientes a conveniência de realizar transacções bancárias a qualquer hora e em qualquer lugar.
Pontos-chave de uma revolução silenciosa
Em suma, a oferta de produtos e serviços personalizados tornou-se num factor determinante na escolha de um banco. Os clientes esperam que as suas necessidades financeiras individuais se-
jam entendidas. Esperam que lhes ofereçam produtos e serviços que respondam a essas necessidades, desde pacotes de contas personalizadas ou produtos de investimento adaptados ao seu perfil de risco.
Além disso, a integração de serviços bancários e não bancários está a tornar-se cada vez mais importante. Os clientes apreciam a conveniência de poder aceder a uma gama de serviços, financeiros e não financeiros, num único lugar, desde a contratação de seguros até serviços de consultoria financeira.
Assim, nesta era da banca relacional, prosperam os bancos que assumem o papel de parceiros de confiança para os seus clientes. Estes bancos compreendem que a chave para o sucesso não está apenas na oferta de produtos financeiros, mas também na capacidade de entender e adaptarem-se às necessidades e expectativas em constante mudança.
O papel da Inteligência Artificial Para alcançar esse entendimento profundo dos clientes, os bancos utilizam a tecnologia e os dados de forma
inovadora. A inteligência artificial, por exemplo, é utilizada para analisar os dados dos clientes, permitindo aos bancos identificar padrões de comportamento, compreender melhor as suas necessidades e prever futuras tendências.
Com esta informação, os bancos podem personalizar a sua oferta, fornecendo produtos e serviços que correspondem exactamente às necessidades individuais.
Essa personalização também se estende à experiência bancária em si. Com a utilização de tecnologias de interface intuitivas (user friendly) e plataformas digitais fáceis de usar, os bancos podem proporcionar uma experiência bancária funcional e agradável - desde a forma como os clientes interagem com o seu banco online ou através de aplicações móveis, até à forma como realizam operações ou acedem a serviços financeiros.
Um processo fascinante
Em essência, o que os clientes de hoje valorizam é uma experiência bancária completa e integrada que seja adaptada às suas necessidades individuais e estilos de vida. Eles esperam que os seus bancos sejam mais do que apenas provedores de serviços financeiros, mas sim parceiros que os ajudem a gerir as suas finanças e a alcançar os seus objectivos financeiros.
De forma sucinta, podemos ver que a evolução do sector bancário tem sido um processo contínuo e fascinante, desde a banca tradicional até à banca transaccional, e, agora, a era da banca relacional.
Nesta era da banca relacional, o sucesso não se mede apenas pela qualidade dos produtos financeiros oferecidos, mas também pela capacidade de um entender e atender às necessidades em constante mudança. Através da utilização da tecnologia e dos dados, os bancos podem oferecer uma experiência bancária personalizada, intuitiva e facilmente acessível, que não apenas atenda às necessidades financeiras dos clientes, mas também se integre de forma harmoniosa nas suas vidas.
Os bancos que conseguem navegar com sucesso estão bem posicionados para se destacar num sector altamente competitivo e em constante evolução. À medida que avançamos para o futuro, a capacidade de inovação e adaptação às mudanças será crucial para o sucesso no mundo da banca. E na vanguarda desta jornada, sem dúvida, estará a banca relacional - um pilar central desta nova era.
www.economiaemercado.co.mz | Setembro 2023 11
Clientes dos bancos estão cada vez mais exigentes quanto à qualidade dos serviços
Como os BRICS Querem Tornar-se no Maior Bloco Económico Mundial
A associação de cinco grandes economias - Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul - que dá pelo nome de BRICS, junta países que têm em comum o facto de serem economias emergentes a procurar melhorar a coordenação diplomática, reformar as instituições financeiras globais e, em última análise, servir de contrapeso à hegemonia ocidental.
A 24 de Agosto, o bloco anunciou a aceitação formal de seis novos membros no início de 2024: Arábia Saudita, Irão, Etiópia, Egipto, Argentina e Emirados Árabes Unidos (EAU) - e até Moçam-
bique anunciou estar na disposição de se aproximar deste novo bloco emergente.
Nesta infografia, fornecemos uma visão geral baseada em dados de como a expansão do BRICS aumentará a influência e o alcance do grupo. A maioria dos novos membros são economias em franco desenvolvimento.
Os quadros seguintes incluem as projecções do PIB para 2023, cortesia do FMI, bem como dados da população, produção de petrõleo e exportações.
Novos Membros
Candidatos a Membros
Tem sido um dos países africanos mais apoiados pela China ao nível do financiamento para a construção de infraestruturas.
É um major da produção de lítio, um material raro e crítico na transição energética.
QUOTA DE MERCADO MUNDIAL
Arábia Saudita já é uma economia de mais de 1 bilião de dólares a entrar nos BRICS
População 2023
Produção de Petróleo 2022
Exportações 2022
A entrada de países com uma grande população como a Etiópia significa que os BRICS poderão em breve alcançar 50% da população mundial.
A entrada do Irão, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita mais do que duplicará a quota actual de produção dos BRICS.
A quota dos BRICS aumentará, continuando a ser liderada pela China.
CONTA
NÚMEROS EM
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Argentina Etiópia Irão EAU África do Sul Brasil Rússia China Índia Egipto Arábia
Membros
Saudita
PIB 2023 Quanto valem os BRICS com os novos membros
PIB 2023
FONTE FMI; World Population Review; World Trade Organization, Visual Capitalist.
“Be Like a Woman”, ou o Princípio do Caminho Para Uma Liderança no Feminino
A consultora Ernst & Young e a agência New Faces New Voices (NFNV), da Fundação Graça Machel Trust, lançaram o Be Like a Woman, uma iniciativa que pretende contribuir para um ambiente de negócios mais equitativo. Pretende-se dar novas ferramentas às mulheres que ocupam posições de liderança intermédia ou que se assumem como empreendedoras de média dimensão. Como actua?
OBe Like a Woman carrega, essencialmente, três objectivos: assegurar que as mulheres estejam cada vez mais bem preparadas para integrar o mundo corporativo e que a sua relevância e o seu papel sejam reconhecidos nessa esfera; municiar as mulheres de ferramentas para, cada vez mais, conseguirem alcançar posições de decisão em grandes corporações - e, portanto, ocuparem lugares nas mesas dos conselhos de administração das empresas, influenciar as decisões de modo que garantam que as corporações sejam cada vez mais inclusivas (primeiro, na representatividade dos seus decisores, mas também nas decisões que tomam para colaboradores, clientes e comunidade em geral); e consciencializar a sociedade sobre estes desafios e, principalmente, sobre as conquistas e realizações que as mulheres permitem às empresas alcançar.
O primeiro ciclo do programa decorre desde Julho até Novembro. As participantes, mulheres com idade mínima de 28 anos, terão acesso a um conjunto de ferramentas e mentoria, como master classes sobre liderança e gestão de negócios, com especialistas espalhados pelo mundo em posições de topo; acesso à rede da EY Women Network, presente em mais de 150 países, e acesso à rede Graça Machel Trust, através da New Faces New Voices, presente em cerca de 20 países africanos. A actividade primordial do programa é fomentar iniciativas que garantam que outras mulheres e homens possam estar envolvidos e, juntos, ajudem
a consolidar projectos de transformação social liderados por si. Para tal, serão assistidas pelos mentores e pela equipa Be Like a Woman, de forma que inspirem e consciencializem outras mulheres e a sociedade no geral a valorizar o trabalho feminino.
Para além de obter conhecimento nas matérias de liderança e gestão de negócios, conforme o programa de formação, as participantes serão também desafiadas a difundir o conhecimento adquirido e gerar impacto noutras vidas, seja de mulheres ou homens, por forma que também possam alcançar o seu pleno potencial.
Glayds Gande, gestora sénior de consultoria na EY e mentora desta iniciativa, refere que “os critérios de avaliação do desempenho no programa estarão em torno da assiduidade nas actividades do mesmo, no nível de influência e no impacto gerado. Estaremos a avaliar a evolução e impacto criado pelas participantes, fazendo uso das ferramentas que o programa oferece, desde as sessões de formação, master classes com altos executivos, às sessões de mentoria”.
Parceria, Intervenção e Sustentabilidade Laboral
A parceria entre a EY e a agência New Faces New Voices (NFNV), da Fundação Graça Machel Trust, afigura-se estratégica, como um cruzar de forças, porque uma das missões da EY é “construir um mundo de negócios melhor e acreditamos que tal passa por valorizar, reconhecer e capacitar as mulheres”, diz Paulo Reis, responsável pelo escritório da EY Moçambique.
Por seu turno, Henriqueta Hunguana, representante da NFNV Moçambique, afirma que esta organização tem como visão “lutar pelo aumento do número, visibilidade e impacto da liderança feminina no sector financeiro”. A responsável realça que “a parceria com a EY para o Be Like a Woman trará algo de inovador, uma vez que olharemos também para as características inerentes à mulher como um factor diferenciador para o alcance da transformação social que tanto almejamos”.
A EY carrega a grande ambição de construir “um mundo de negócios melhor” de diversas formas, desde melhorar os modelos de gestão e de negócios dos clientes, assim como ajudar governos e outras entidades de relevância no desenho e na implementação de políticas e regulamentação que optimizem o ambiente de negócios, até à capacitação dos diversos intervenientes no ecossistema de mercado.
Um dos vectores de intervenção da EY ao nível global é a aceleração da presença feminina no mercado e, para isso, a firma possui diversos programas, nomeadamente a promoção das mulheres nas tecnologias, no sector da energia e de infra-estruturas e na gestão e liderança de negócios.
Globalmente, programas como o EY Entrepreneurial Winning Women e EY Entrepreneur of the Year têm-se mostrado bastante relevantes para a construção de um mundo de negócios melhor e, no caso de Moçambique, a aposta é na iniciativa Be Like a Woman, que parece encaixar-se melhor no contexto local e na estratégia global da consultora.
A New Faces New Voices do Graça Machel Trust nasce inspirada na forma como foi abordada a crise financeira que afectou o mundo na década 1990, quando se constatou que as soluções eram apenas discutidas por homens, embora as mulheres tenham sido tão ou mais afectadas por essa crise.
www.economiaemercado.co.mz | Setembro 2023 14 E SG | GÉNERO
Texto Filomena Bande • Fotografia Mariano Silva
Um dos vectores de intervenção da EY ao nível global é a aceleração da presença feminina no mercado e, para isso, possui diversos programas
Estabeleceu-se o dia 9 de Agosto como o Dia Internacional dos Povos Indígenas. Este dia foi proclamado na resolução 49/214, adoptada na Assembleia Geral da ONU de 23 de Dezembro de 1994, e procura chamar a atenção para os povos indígenas, estimados entre 370 e 500 milhões de pessoas em todo o mundo (ONU, Agosto de 2023).
A masterpiece que inspira o artigo deste mês, é uma brilhante carta escrita por Bayo Akomolafe, em 2016, que me parece servir como uma luva a este e tantos outros dias de celebração que instituímos – regularmente no Hemisfério Norte, muitas vezes com boas intenções, mas que denunciam a nossa ilusão de separação e um paradoxal olhar de superioridade e desejo de reconciliação.
Vamos, antes do mais, lembrar que comunidades indígenas são aquelas que, mesmo após a invasão e colonização que foi desenvolvida nos seus territórios, estão decididas a conservar, desenvolver e transmitir às gerações futuras a sua identidade, os seus saberes, património e território - frequentemente desrespeitados, usurpados e dilacerados. Citando duas fontes oficiais, a ONU afirma em Agosto de 2023 que “os povos indígenas vivem em todas as regiões do mundo e possuem, ocupam ou usam cerca de 22% da área terrestre global (...), falam a maioria das cerca de sete mil línguas do mundo e representam cinco mil culturas diferentes.”
Já em eurocid.mne.gov.pt pode ler-se que “os povos indígenas repartem-se por 90 países, constituindo 5% da população global e 15% do total da população mais pobre, mas culturalmente muito ricos. Detêm uma linguagem e cultura próprias que os distingue das sociedades ditas ‘desenvolvidas’. A degradação do ambiente, as deslocações em consequência de conflitos e de violência, bem como a apropriação ilegal das suas terras e as catástrofes naturais, fazem parte da realidade dos povos indígenas que, diariamente, lutam pelo reconhecimento dos seus direitos, dos territórios em que habitam, dos seus recursos e da sua forma de vida, que é única.”
Trazemos ainda a contribuição preciosa de Tyson Yunkaporta, autor e professor australiano e nome incontornável neste tema, que, co-autoria com outros investigadores, publicou em Junho de 2020 em “Molecular Decolonization: An Indigenous Microcosm Perspective of Planetary Heal-
Culturas Regenerativas – O Desejo de Reconciliação, de Regressar a Casa e as Histórias que Contamos
th”, a seguinte definição: “Os povos indígenas são povos resilientes com profundos conhecimentos tradicionais e pensamento científico milenares (...), têm diversas noções de resiliência baseadas em conceitos culturalmente distintos que fazem a ponte entre a pessoa, a comunidade e o ambiente. No entanto, o discurso global sobre as alterações climáticas identificou as populações indígenas como sendo um grupo altamente vulnerável devido ao facto de habitarem em regiões que estão a sofrer alterações rápidas e ao fardo desproporcionado de morbilidade e mortalidade que esta população já enfrenta. Por conseguinte, é urgente a necessidade de autodeterminação indígena e o reconhecimento formal dos conhecimentos indígenas, incluindo os conhecimentos moleculares e microbianos a nível micro, como uma base fun-
Para usar uma linguagem que aqui toda(o) s vão reconhecer, eu vou-lhes chamar ‘locais’. Na minha experiência de co-anfitriã com líderes comunitários na aldeia de Mahungo, é comum cruzar-me com três tipos de público: os que querem “ajudar os locais”, os que se querem “misturar com os locais” e os que “estão fartos dos locais”. Há um quarto tipo de público, que desenvolve uma relação mais equilibrada e saudável, que resulta normalmente da experiência e maturidade do primeiro ou do segundo público, em que eu também me revejo. Com os do terceiro caso, não há muito a fazer. Só as malas. Mas, muitas vezes, nem para isso sobrou coragem e, por isso, a amargura e revolta dos seus corações, é veneno de que nos devemos proteger, até que sejamos capazes de desenvolver um olhar compassivo. E é preciso coragem para estender este olhar compassivo aos que “exploram os locais”, que com o tempo percebemos que, infelizmente, estão infiltrados em todos os grupos.
damental para a saúde planetária”. E acrescenta: “o actual e emergente domínio da ‘saúde planetária’ é mais frequentemente definido pelas formas como os seres humanos têm impacto e são afectados pelo seu ambiente. As noções de qualidade do ar e da água, de segurança alimentar e de exposição crescente a catástrofes naturais e doenças infecciosas são vistas principalmente através de uma lente antropocêntrica”.
E agora sim, entramos na masterpiece de Bayo Akomolafe: “suspeito, de facto, que esta noção de indigeneidade como uma identidade fixa, como um estado de coisas estático, como algo a que se deve regressar, é, ela própria, um produto forjado pelo conhecimento branco. E com isto quero dizer que ninguém sabe o que significa tornar-se indígena. Nem mesmo os ‘indígenas’”.
E voltamos à masterpiece, porque há mais para escavar: “deixem-me contar uma pequena história que pode ser útil. Há muito tempo, alguns dos vossos pais dividiram o mundo em dois reinos - um reino da aparência e um reino da permanência. Os ecos desta cisão radical no coração das coisas ainda ressoam actualmente. Vivemos em binarismos. Nós contra eles. Linguagem versus realidade. Agente versus ferramenta. Mente versus matéria. Eu versus ambiente. Livre-arbítrio versus determinismo. Humano versus não humano. Homem versus mulher. Público versus privado. Consciência versus mundo. (...) No contexto desta bifurcação, algumas coisas passaram a ser vistas como ‘originárias’ ou superiores e outras ‘derivadas’ ou inferiores”.
“Os rumores desta grande cisão, deste radicalismo fora de jogo, infiltraram-se em quase tudo e todos nós ficámos possuídos por um desejo de reconciliação. De embodiment. De regresso a casa. Esperávamos que - como os santos - quando marchássemos, num dia longínquo de arrebatamento pessoal ou colectivo, conheceríamos as coisas como elas realmente são. Estaríamos finalmente em contacto, e então seríamos verdadeiros”.
“O indigenismo tem a infeliz dignidade de suportar o peso destas expectativas civilizacionais e onto-epistemológicas. Tal como a ‘natureza’. Tal como os artistas e teólogos do Iluminismo na sua busca de fundamentos puros, aprendemos a falar
www.economiaemercado.co.mz | Setembro 2023 16 OPINIÃO
É preciso desconstruir esta narrativa paternalista e distorcida que se refere a povos indígenas como um género de “espécie em extinção”
Susana Cravo • Consultora & Fundadora da Kutsaca e da Plataforma Reflorestar.org
da ‘natureza’ como se fosse um lugar de chegada incontestado. Um lugar desprovido de conflitos. Um lugar de conjuntos psicadélicos de fractais harmoniosos. Um paraíso - onde se pode explorar um campo verdejante de árvores, dobrar um ramo para trás e, de alguma forma, escapar (em virtude de se estar no paraíso) ao efeito de ricochete e à cicatriz na pele. Esta ‘natureza com uma auréola’, ou a natureza como essencialmente ‘boa’, cega-nos para as muitas formas como a ‘natureza’ se desconstrói a si própria.” (Dear White People, Bayo Akomolafe, 2016).
Tenho muitas histórias interessantes sobre este vaguear entre o fascínio pelo indígena e pelo ancestral, reavivado pelo neo-paganismo e pelas consequências que o choque do seu contraste, vulgo (des)ilusão, pode provocar. O tema é vasto, complexo e profundo, mas creio que o essencial já está em cima da mesa para reflexão.
É preciso desmontar o olhar romântico que o herói-salvador do Ocidente traz e de que os do terceiro caso (fartos dos locais) estão naturalmente cansados, bem como desconstruir esta narrativa paternalista e distorcida, presente inclusivamente em entidades oficiais, que se refere a povos indígenas como um género de “espécie em extinção”, frequentemente ilustrada com cores garridas no rosto e penas na cabeça, em habitats mais naturais do que os de parques a que se fazem passeios pagos.
Também não há nenhum lugar de pureza original para onde voltar. Nenhum lugar de felicidade eterna. Nem nenhum troféu que esteja lá fora, num outro (pessoa, lugar ou coisa). Contudo, a reconciliação – este desejo profundo de regressar
a casa (ou paraiso) também não é apenas interna, como vendem os especialistas do Desenvolvimento Pessoal. Ela acontece dentro e fora, em simultâneo, e de forma subtil. É um processo colectivo, sistémico, interdependente e potentemente intrincado com a vivência quotidiana e com o(s) lugar(es). Mas há um convite ao reconhecimento, ao respeito e a honrar (acknowledge/honouring), que é crucial para que a reconciliação se manifeste. Ora, não é a explorar, reprimir, negar, negligenciar que eu reconheço, honro e respeito. Mas também não é a apropriar, consumir, extrair e coleccionar - conhecimento, experiências, práticas, rituais e tradições - que se respeitam e honram os lugares e as suas comunidades.
A partilha de conhecimento, os convites para cerimónias, rituais e outros que aqui prefiro não designar, feitos pelos locais, só se estendem alguns, e, se aceites, têm de ser honrados. Não são meras experiências para registar em selfies e enriquecer o nosso portefólio exótico coleccionado. A ilusão de “escapar ao efeito de ricochete e à cicatriz na pele”, que Bayo tão bem ilustra, facilmente se dissolve quando somos confrontados com as forças colossais e ancestrais que a nossa imaturidade ou ingenuidade desconhece.
Voltando à visão exótica do indígena de rosto pintado e penas na cabeça, puro e vulnerável, que precisa da nossa protecção, não deixa de ser grave, também, que nós - os consumidores terminais de informação e de “verdades”, que a Professora Maristella Barenco tão bem descreve no seu trabalho de investigação -, continuemos com (e a acreditar) (n)este olhar distorcido e obsoleto que nos separa e eleva em relação aos outros (Huma-
nos, Não Humanos e Mais que Humanos). Mesmo a sustentabilidade da moda e os seus objectivos de desenvolvimento sustentável posiciona-nos, frequentemente, como separados da natureza e a “fazer o bem” por ela, para não causar mais dano aos ecossistemas, para a proteger, para parar a desordem e para punir os que se portam mal, perpetuando um paradigma antropocêntrico, arrogante e elitista.
Nós, Ocidente iluminado, somos assim os responsáveis - e divinamente designados - por combater o mal, proteger os vulneráveis e salvar o planeta. Quando precisamos, na verdade, de ressignificar o nosso olhar, a nossa forma de nos relacionarmos com a vida. Pensar e co-criar, em conjunto, sistemas vivos, que aumentem a vitalidade sistémica e contribuam para a prosperidade de todos - humanidade e seres vivos (sobre as fases entre o “business as usual” e as culturas regenerativas, recomenda-se o precioso contributo de Daniel Whal em “Design de Culturas Regenerativas”, pág. 57).
O Dia dos Povos Indígenas tem um bocadinho de Dia da Criança, Dia da Mulher, Dia da Terra e tantos outros. Se por um lado é importante lembrar os seus/nossos direitos e batalhas travadas e ganhas (cada vez mais em causa, novamente), por outro, mostra-nos o quanto estas nossas boas intenções estão baseadas em pressupostos distorcidos, denunciando a falta de justiça, igualdade e equidade que nos atravessam e tantas vezes perpetuando modos de vida pouco sustentáveis ou até degenerativos.
Não deve ser, contudo, menosprezado o caminho percorrido. Há efectivamente iniciativas importantes para defender e preservar o património e direitos dos povos. Há discurso político e tendencioso, mas também há coragem e vontade de mudar. Há os números, relatórios e trabalho para mostrar, mas também há relevância no destaque dado em cada ano, a públicos concretos - mulheres, jovens - e a temas pertinentes - alterações climáticas, saúde humana, não humana e mais que humana, migrações, entre outros.
E, sobretudo, finalmente verifica-se um claro apoio, nos últimos anos, da ONU, ao envolvimento de líderes indígenas nos diálogos globais e na tomada de decisão, pelo assumido conhecimento crucial para a preservação da diversidade cultural e biológica, “profundamente enraizado no desenvolvimento sustentável e que pode ajudar a resolver muitos desafios comuns do momento actual” (António Guterres, Secretário-Geral da ONU).
Mas, na prática, e além das celebrações, medidas e discursos bonitos, as questões a reflectir são simples: “uma humanidade que não reconhece que aquele rio que está em coma é também o nosso avô” (Ailton Krenak, em “Ideias para adiar o fim do mundo”) está alienada e esquecida.
O conhecido líder indígena brasileiro considera que a resistência indígena se dê pela não aceitação da ideia de que somos todos iguais. E bem precisamos dessa força de resistência (e sabedoria) para preservar a soberania da vida.
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“O indigenismo tem a infeliz dignidade de suportar o peso destas expectativas civilizacionais e onto-epistemológicas.”
MyFidelidade: Quando o Seguro Começa no Ecrã do Telemóvel
Em Moçambique, como no resto do mundo, as apps que dão acesso a serviços a partir de dispositivos móveis fazem parte do quotidiano. Mas poder gerir os seus seguros e ‘tê-los na palma da mão’ é uma novidade recentemente disponibilizada pela Fidelidade-Ímpar, com uma aplicação pioneira no mercado nacional
Texto & Fotografia M4D Branded Content
Nos dias que correm, o mundo dos negócios tem beneficiado de grandes transformações desencadeadas pelo crescente uso de tecnologia, o que permite a prestação de melhores serviços, com custos mais reduzidos e maior eficiência, tornando a vida dos clientes mais fácil.
Atenta a este contexto, a seguradora Fidelidade-Ímpar lançou um novo produto que dá acesso aos seus serviços a partir de qualquer lugar, a qualquer hora, bastando ter o aplicativo MyFidelidade instalado nos dispositivos móveis.
“A ideia é tornar a vida dos nossos clientes mais fácil”, explica Rui Oliveira, administrador-executivo da Fidelidade em Moçambique. O objectivo é pegar na ideia de aplicação como ferramenta útil no dia-a-dia e “adaptá-la ao nosso mercado e à nossa empresa, para facilitar a experiência do cliente”. “São coisas que, quando as utilizamos, nos parecem muito fáceis, mas o trabalho que está por detrás é, de facto, muito complexo. No nosso caso, envolve equipas moçambicanas e portuguesas”.
Formado em Engenharia Civil e a viver em Moçambique desde 2005, Rui Oliveira fez parte da Ímpar Seguros de 2005 a 2021 e, a partir de 2022, com a fusão entre Fidelidade e Ímpar, foi designado para o Conselho da Administração como administrador executivo na área de Tecnologias de Informação e Comunicação (ITC), responsável pelo MyFidelidade. Com a nova aplicação, os clientes ganham tempo e poupam nos custos de se deslocarem às agên-
cias em busca de atendimento. “Temos o exemplo da participação do registo automóvel ou a entrega de despesas de reembolso do seguro de saúde, em que o cliente deve trazer documentos e, às vezes, tem de aguardar pela assistência dos nossos profissionais. Com esta ‘app’, será possível fazer tudo isso em casa. O processo é agora bastante mais fácil”, assegurou Rui Oliveira.
O aplicativo móvel, que já está disponível para os sistemas Android e IOS, vai disponibilizar um amplo leque de serviços e soluções. “O aplicativo é importante até para os clientes começarem a ter um relacionamento com a Fidelidade-Ímpar.
Por exemplo, para a obtenção do seguro de saúde ou automóvel, é possível fazer uma simulação a partir de um dispositivo móvel, bastando lançar os dados na aplicação. Depois da simulação, nós ficamos com o número de utilizador registado e a partir daí podemos sempre entrar em contacto com o potencial cliente. A simulação, para já, está disponível para produtos como o seguro automóvel”, revelou.
Uma ferramenta de inclusão
Mas as vantagens do MyFidelidade não se ficam apenas pela facilitação nas transacções com produtos da seguradora. Rui Oliveira fala também de um papel proactivo num país que, além de ser muito extenso, apresenta grandes desafios de mobilidade.
“Nós não podemos estar em todo o lado e acho que este tipo de facilidade permite que estejamos presentes em
qualquer lugar, a qualquer momento, a qualquer hora. E isso também é inclusão financeira”, defende.
O mercado, felizmente, apresenta condições para que a iniciativa resulte. “Quando cheguei a Moçambique, em 2005, uma das coisas que mais me impressionaram foi, já nessa altura, a quantidade de pessoas que usava aqueles telemóveis pequeninos”, de teclas numéricas.
“Hoje em dia, quase toda a gente tem smartphones e já acabam por ter esse tipo de interacção, muitas vezes, com os bancos, uma necessidade de primeira ordem”. Com naturalidade, a experiência expande-se agora para os produtos da seguradora moçambicana, com a inclusão em mente.
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“Temos o exemplo do registo automóvel, em que o cliente teria de trazer documentos e aguardar pela assistência dos nossos profissionais. Com esta ‘app’, será possível fazer tudo isso em casa”
Fidelidade-Ímpar
EXECUTIVO
Oliveira SERVIÇO MyFidelidade
DE CRIAÇÃO 2023
BEMPRESA
ADMINISTRADOR-
Rui
ANO
Ligar a Formação e o Emprego — O Balanço da Procura Que Cresce e Uma Oferta (Ainda) Limitada
O mercado de trabalho está cada vez mais ‘apertado’. Há poucas novas ofertas e a procura cresce exponencialmente embora, sem a qualidade e os skills necessários. O MozYouth surge para equilibrar esta difícil equação e tornar-se parte da solução e servir como ponte entre a formação e o emprego
Quantas vezes não lemos nos jornais que as vagas anunciadas para o tão ansiado emprego vão privilegiar pessoas com experiência profissional? E quantas vezes esta exigência não agudizou a agonia de quem nunca teve a oportunidade de adquirir experiência em trabalho, mas busca desesperadamente por uma oportunidade?
Para se ter uma ideia da pressão sobre o mercado de trabalho, estatísticas do Ministério do Trabalho, Emprego e Segurança Social apontam para um aumento anual de 350 mil pessoas que procuram trabalho, todos os anos, em Moçambique.
Com o número de instituições de formação profissional também a aumentar progressivamente para explorar este potencial, só a universidade pública mais antiga, Universidade Eduardo Mondlane (UEM), contribui com mais de mil formandos por ano para o mercado de trabalho.
A fraca absorção de capital humano pelo mercado laboral não está, de todo, relacionada com falta de instituições que criem competências para o efeito. É neste aspecto que ganha relevância a questão dos estágios pré-profissionais, que também têm crescido a olhos vistos.
Estas características do mercado não passam despercebidas. De olho
nestas especificidades, a MozYouth, um programa de estágios profissionais desenhado pela MozParks, Hollard Seguros e o banco FNB, realizou a cerimónia de graduação de 120 estagiários, a 17 de Agosto, em Maputo. O evento marcou a conclusão do programa de emprego, que durou seis meses. A iniciativa contou com a participação de 172 estagiários, 120 dos quais já concluíram os seus cursos de formação e estão sediados em Maputo.
Agora, a expectativa é de que “as experiências adquiridas em ambiente real de trabalho, bem como as oportunidades” de observar como as empresas operam, “facilitem a inserção no mercado laboral”, disse Oswaldo Petersburgo, secretário de Estado da Juventude e Emprego, dirigindo-se aos formandos.
E acrescentou: “Dadas as dinâmicas do mercado laboral, um mercado cada vez mais exigente e de alta concorrência, a transição da formação para o mercado de trabalho constitui um dos maiores desafios para muitos jovens. O estágio pré-profissional tem sido um diferencial competitivo” para alcançar este objectivo, destacou.
Há 39% de estagiários já empregados
O dirigente explicou que os 120 estagiários formados durante seis meses tiveram experiência prática em con -
texto de trabalho em diferentes áreas, com realce para engenharia, administração, tecnologias de informação e comunicação, ambiente e agricultura. Tudo isto permitiu-lhes adquirir competências, habilitações e preparação que os torna aptos para ingressar no mercado de trabalho. Destes estagiários, 39% já estão empregados, o que demonstra a eficácia do estágio.
Olhando para os números totais, o MozYouth já apoiou 172 jovens (82 mulheres e 90 homens), dos quais 47 ainda não concluíram os seus estágios e 76 já têm o emprego assegurado, tendo estes recebido o apoio da Embaixada da Irlanda em Moçambique, da Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação e pela Cooperação alemã (Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit, GIZ).
“Num primeiro cenário, teremos jovens que sairão daqui com emprego. No segundo, teremos jovens que farão parte daquela cifra que não terá oportunidade. E o último cenário será sobre a necessidade de continuarmos a formar, neste caso, a necessidade de continuarmos a treinar mais jovens.
Esta necessidade vai estar acima de todas as prioridades, para que os jovens não se iludam pelo facto de terem feito seis meses nas empresas que os hospedaram, acreditando que é o fim da linha”, explicou Onório Manuel, director-geral da MozParks.
De projecto... à Fundação MozYouth
A Fundação MozYouth foi formalmente lançada na cerimónia de 17 de Agosto, sendo reafirmado o objectivo de se disponibilizar uma plataforma sustentável, de longo prazo, que permita a continuação e expansão deste programa.
www.economiaemercado.co.mz | Setembro 2023 20 CONTEÚDO LOCAL | MOZYOUTH
Olhando para os números totais, o MozYouth já apoiou 172 jovens (82 mulheres e 90 homens), dos quais 47 ainda não concluíram os seus estágios e 76 já têm o emprego assegurado
Texto Nário Sixpene • Fotografia D.R.
A fundação vai operar, a nível nacional, em todos os tipos de indústria, dando o apoio necessário aos jovens e contando com o apoio dos líderes de algumas empresas de Moçambique.
Tem três membros fundadoresfundadores: Adrian Frey, presidente executivo da MozParks, Peter Blenkinsop, administrador-delegado do FNB Moçambique, e Henri Mittermeyer, director executivo da Hollard Moçambique. Dois outros membros da equipa são Agnaldo Laice, director-geral da Twigg Exploration & Mining, e Christian Roeder, director-executivo da DP World Maputo.
O presidente da MozYouth, Adrian Frey, explica que este programa irá continuar a ser um veículo de formação, empregabilidade e desenvolvimento empresarial para os jovens em Moçambique e convidou o sector privado e os parceiros nacionais e internacionais a fazerem parte do mesmo. Para o administrador-delegado do FNB Moçambique, Peter Blenkin -
sop, “esta iniciativa é extremamente relevante na vida económica de Moçambique. Precisamos de competências de alta qualidade e todos nós temos a responsabilidade de capacitar as gerações futuras. Estamos empenhados em oferecer o nosso know-how a estes jovens licenciados. Esta é uma das nossas contribuições mais importantes, enquanto FNB Moçambique e membro-fundador da Fundação MozYouth”.
O CEO da Hollard Moçambique Seguros, Henri Mittermayer, classifica a Fundação MozYouth como “a essência do próposito da Hollard Moçambique Seguros: criar e permitir um futuro melhor para todos e em Moçambique.
Aos jovens que se graduaram, apela-se à coragem para continuarem fortes no seu caminho profissional, pois a oportunidade aberta pelos estágios é, sem dúvida, uma ferramenta valiosa para conquistarem, a seu tempo, o merecido lugar ao sol”.
www.economiaemercado.co.mz | Setembro 2023 21
Ricardo Velho • Partner & Business Development Manager na Insite
Num mundo onde a globalização é um factor essencial para o crescimento económico, a logística e o transporte emergem como a infra-estrutura oculta que catalisa essa expansão.
Embora muitas vezes não sejam devidamente valorizados, esses sectores desempenham um papel essencial no nosso dia-a-dia e no desenvolvimento das nações. São os alicerces sobre os quais assentam a distribuição eficiente de produtos, o acesso a mercados internacionais e a capacidade de resposta em momentos de crise.
A logística pode ser comparada aos bastidores de uma peça de teatro, responsável pela coreografia da movimentação de bens, informações e recursos, garantindo que tudo decorra sem problemas. Os armazéns onde os produtos são guardados, os sistemas que acompanham as entregas e até mesmo as estradas que ligam as cidades e países são parte integrante do processo.
Uma gestão bem-sucedida da logística assegura que as prateleiras de supermercados estejam abastecidas, que fábricas recebam matérias-primas a tempo e que, a um nível macro, as economias prosperem.
Se considerarmos a logística como o cérebro, os transportes são os membros que executam os planos.
O transporte pode ser feito por via rodoviária, ferroviária, marítima e aérea e cada uma com suas próprias vantagens e desafios.
O transporte rodoviário caracteriza-se pela flexibilidade e por alcançar áreas remotas. O transporte ferroviário permite transportar para longas distâncias carga de grande porte e produtos a granel.
O transporte aéreo é caracterizado pela rapidez e urgência na entrega de bens e produtos. Por fim, o transporte marítimo, permite transportar cargas de
Logística e Transporte
ainda maior porte e elevado peso. Juntos complementam-se e permitem que as mercadorias percorram longas distâncias e atravessem fronteiras, aumentando as oportunidades de comércio.
Contudo, apesar da sua importância, a logística e o transporte frequentemente enfrentam desafios. Congestionamentos nas estradas, fenómenos climáticos adversos, desastres naturais, pandemias, ciberataques, burocracia alfandegária e infra-estrutura inadequada, entre outros aspectos, podem dificultar a eficiência do sistema e interromper as cadeias de abastecimento. Investir nesses sectores, repensar os modelos actuais, adaptá-los aos novos desafios e
os investidores, pois sustentam um ambiente favorável aos negócios e à circulação eficiente e segura de mercadorias.
O investimento em infra-estruturas logísticas pode impulsionar o desenvolvimento de regiões remotas ou menos desenvolvidas, permitindo a ligação adequada aos centros de produção e consumo.
Constitui também o suporte à industrialização: a logística eficaz é fundamental para a implementação de práticas industriais modernas, que exigem uma circulação rápida e precisa de matéria-prima e produtos.
Estive na semana passada no Fórum de Agro-negócio, Indústria e Logística, organizado pela Associação de Comércio, Indústria e Serviços (ACIS), que se realizou na cidade da Beira. Entre outros, os pontos acima foram discutidos por intervenientes de vários sectores de actividade.
torná-los mais resilientes contribui para uma economia global mais robusta e competitiva.
A modernização da infra-estrutura logística, a adopção de novas tecnologias e a implementação de práticas sustentáveis e seguras são medidas que se impõem.
Os países com sistemas logísticos bem desenvolvidos têm uma vantagem competitiva, já que as empresas podem responder à procura de forma rápida e confiável, destacando-se em relação a países que apresentem processos de logística menos eficientes e mais onerosos. As infra-estruturas logísticas fortes tornam os países mais atractivos para
Destacou-se o potencial que temos para que os bens possam circular de forma rápida, segura e eficaz por via aérea, terrestre, ferroviária e marítima. Destacou-se igualmente a necessidade urgente de termos infra-estruturas adequadas que permitam transformar este potencial em realidade para que possamos ser mais produtivos, mais competitivos e abraçarmos de forma mais eficaz as muitas oportunidades existentes e das quais necessitamos. Temos necessidades e oportunidades. E a logística e os transportes criam a ligação para que os negócios se concretizem.
A logística e o transporte são os pilares invisíveis que sustentam a economia moderna. Investir nesses sectores não é apenas um imperativo económico, mas uma forma de fortalecer o desenvolvimento dos países e assegurar o crescimento.
Os países que investem em infra-estrutura logística, processos eficientes e tecnologias inovadoras têm como retorno benefícios significativos para as suas economias e populações.
www.economiaemercado.co.mz | Setembro 2023 22 OPINIÃO
A modernização da infra-estrutura logística, a adopção de novas tecnologias e a implementação de práticas sustentáveis e seguras são medidas que se impõem
NAÇÃO | DESENVOLVIMENTO
Um Ano de Reformas. O Que Falta Mudar?
Em Agosto de 2022, foi aprovada a iniciativa presidencial que pretende acelerar a economia e recuperar o ritmo que se foi perdendo devido a uma combinação de eventos internos e externos que, nos últimos oito anos, fragilizaram o crescimento. Denominado como Pacote de Medidas de Aceleração Económica (PAE), um ano após a sua aprovação, a iniciativa já produz alguns resultados encorajadores, mas as 20 medidas que a compõem desdobraram-se numa agenda que vai exigir muito trabalho para chegar aos resultados pretendidos. Qual é o verdadeiro mérito do PAE?
Texto Celso Chambisso • Fotografia Istock Photo Pacote de Aceleração Económica
Comecemos pelo contexto que obrigou o Governo a embarcar na reforma materializada com a aprovação das 20 medidas do Pacote de Aceleração Económica (PAE) há, precisamente, um ano.
A economia moçambicana começou a apresentar sinais de instabilidade a partir de 2016, que foram crescendo ao longo dos últimos anos como resultado da combinação de vários factores internos e globais. Primeiro, foi a crise orçamental do Estado, quando os doadores internacionais cortaram os apoios diretos aos cofres do País, aquando da descoberta das dívidas que não tinham sido declaradas, no valor de cerca de 2,2 mil milhões de dólares.
No contexto global, a economia sofreu o impacto negativo da queda de preço das principais commodities de exportação, principalmente o carvão e o alumínio, o que reduziu substancialmente a capacidade de captação de divisas. Depois, em 2019, vieram desastres naturais de dimensão acima da média (os ciclones Idai e Kenneth) que assolaram o centro e norte do País, destruindo várias infra-estruturas públicas e privadas.
A ocorrência cíclica destes eventos representa custos anuais directos superiores a 100 milhões de dólares. A pandemia de covid-19 veio também juntar-se ao terrorismo em Cabo Delgado no conjunto de enfermidades que debilitaram a estrutura produtiva nacional.
Mas não estaria esgotada ali a sequência de eventos nefastos para a economia moçambicana. Há ano e meio, eclodiu a guerra com a invasão russa da Ucrânia, causando um impacto negativo na economia global, mas com peso importante sobre as economias em desenvolvimento como a moçambicana, que, por exemplo, depende daqueles mercados para o abastecimento de cerais e combustíveis.
O resultado foi um abrandamento acentuado do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), passando de uma média 7,3% por ano entre 2006 e 2014 para uma média de apenas 2,8%, nos últimos sete anos.
Foi assim que o Governo resolveu realizar uma série de consultas que juntaram todas as forças da sociedade e economia para encontrar fórmulas de ataque a estes problemas. E foi assim que foi criado o PAE, cujas soluções se inspiram em políticas que já tinham sido pensadas por volta de 1995,
quando foram identificados os sectores de actividade com potencial para acelerar o crescimento.
Num ano, que avanços trouxe o PAE?
O economista moçambicano Egas Daniel ainda não vê qualquer impacto do PAE no desempenho da economia. Segundo o economista do IGC-Moçambique, co-dirigido pela London School of Economics and Political Science (LSE) e pela Universidade de Oxford, e também professor de Economia no Instituto Superior de Ciência e Tecnologia de Moçambique (ISCTEM), é difícil fazer uma análise de causa-efeito, principalmente em pouco tempo (apenas um ano), num contexto em
que a economia está a passar por uma recuperação normal pós-crise.
O economista entende que a aceleração económica vista até agora está pouco ligada às medidas do PAE, mas sim a um crescimento natural, resultado da recuperação da economia pós-pandemia e do início da exploração de gás natural.
Egas Daniel argumenta que, por exemplo, entre as medidas fiscais, a redução do IVA de 17% para 16% não foi acompanhada pelo aumento do consumo privado - aliás, o consumo até se reduziu numa primeira fase, facto explicado por outros factores, possivelmente a queda de rendimentos e de expectativas.
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NAÇÃO | PAE
Os desastres naturais estão entre as razões da reforma económica em curso, já que representam mais de 100 milhões de dólares anuais em custos pela destruição de infra-estruturas
Desde a entrada em vigor do PAE, em Janeiro deste ano, o nível de cumprimento das metas propostas está em quase 48%
As 20 medidas do PAE (na cor verde as que registaram avanços)
Reduzir a alíquota do IVA de 17% para 16%
Isenção do IVA na importação de factores de produção para a agricultura e a electrificação
Reduzir a taxa do IRPC para 10% na agricultura, aquacultura e transportes urbanos
Incentivos fiscais para novos investimentos em sectores-chave nos próximos três anos
Simplificar procedimentos para repatriamento de capitais
Fortalecimento da supervisão das operações de exportação dos recursos naturais
Fomento de habitação e dinamização da indústria nacional de materiais de construção
Alocar 10% das receitas fiscais de recursos naturais às províncias onde a extracção ocorre
Criação de um fundo de garantia mutuária
Introduzir a obrigatoriedade de mistura de combustíveis importados com biocombustíveis
Melhorar a competitividade dos aeroportos e corredores logísticos nacionais
Estimular a produção local de bens adquiridos em escala pelo Estado
Rever o regime geral de vistos de entrada e promover o turismo e negócios
Ajustar as leis do trabalho e de investimento para atrair investimento externo
Simplificação de processos administrativos na relação entre o Estado, empresas e pessoas
Reforma de alguns elementos do sistema da administração da justiça
Fortalecer a supervisão dos fundos da previdência social e fundos complementares
Maior simplificação na arquitectura da administração pública
Criação e implementação do Fundo Soberano de Moçambique
Reforma do subsistema de auditoria interna do Estado
Registo digital de empresas (PAE 15)
Uma plataforma desenvolvida internamente em coordenação com o Ministério da Indústria e Comércio está a ser testada e em breve permitirá aos cidadãos registar novas empresas e actualizar as informações existentes em linha, prevendo-se que seja implementada nos próximos meses.
As acções desenvolvidas
Até Setembro passado, o balanço feito pelo Ministério da Economia e Finanças indicava a realização das seguintes acções:
Pacote fiscal (PAE 1 a 4)
Legislação que aborda as medidas fiscais foi aprovada e vigora desde 1 de Janeiro A medida já alivia os encargos do sector privado, permitindo alargar a margem de lucro e o reinvestimento na actividade produtiva e a facilitação do repatriamento de capitais.
Fundo de garantia mutuária (PAE 9)
Está a entrar na fase final do seu processo de estruturação e o conselho de administração do Banco Mundial já aprovou 300 milhões de dólares para o efeito. Inclui garantias e facilidades de crédito a sectores produtivos com dificuldades de acesso ao crédito.
Corredores logísticos (PAE 11)
A isenção de taxas e a simplificação dos procedimentos aceleraram a passagem nas fronteiras. O volume de comércio triplicou e o tempo de travessia foi reduzido de nove para apenas duas horas.
Contratos públicos (PAE 12)
Foi aprovada a proposta de revisão do decreto que redefine as regras de contratação pelo Estado, criando um novo terreno para favorecer os produtos fabricados em Moçambique em áreas onde o sector privado nacional pode fornecer consumíveis em escala ao Governo.
Regime geral de vistos (PAE 13)
Uma plataforma digital de vistos foi implementada e lançada em tempo recorde registando mais de 10 mil solicitações em menos de três meses. Além disso, uma legislação de isenção de visto foi aprovada permitindo que 29 países seleccionados entrem no País sem visto.
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FONTE Ministério da Economia e Finanças 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
O que foi proposto e o que se conseguiu
A redução do imposto na agricultura também não se fez sentir e a explicação é que é difícil ter um grande impacto quando 99% das explorações são de pequena e média dimensão. Sendo a agricultura familiar e de subsistência predominante, não há como beneficiar de mecanismos formais de incetivos fiscais pelo seu carácter informal. “Certamente que, se teve algum impacto, foi marginal. É possível que melhore no futuro, pelo facto de poder atrair mais empresas agrárias a formalizarem-se, no sentido de beneficiarem destes incentivos”, justificou o economista.
Em relação à isenção na importação de matérias-primas, tal poderá só deverá surtir efeito num prazo maior, uma vez que os sectores produtivos ainda não têm capacidade de responder e aproveitar a medida de imediatoprincipalmente porque enfrentam problemas maiores como um ambiente de negócios por vezes hostil e falta de infra-estruturas adequadas de transporte e logística, aspectos que realmente aju-
Mudança não será imediata
Em linhas muito breves, o economista-chefe do Standard Bank Fáusio Mussá destacou que as medidas do PAE observam grande parte dos aspectos relevantes para a retoma do crescimento. Mas avisou que parte importante destas não vai gerar impactos imediatos, e que será preciso esperar algum tempo para avaliar os mecanismos de transmissão na economia. Uma observação particular do economista recai sobre o efeito do alívio dos impostos na actividade empresarial e no estímulo ao investimento privado. Também elogia a medida que privilegia o desenvolvimento dos corredores logísticos, o que, no seu entender, vai conferir maior competitividade ao País no quadro da integração regional.
Banco Mundial sugere foco no emprego
O Banco Mundial faz uma análise que parece fugir dos pressupostos do PAE, apesar de ser uma das instituições que apoia o Governo de Moçambique
dariam a acelerar a economia e colocariam as empresas a maximizar as oportunidades oferecidas pelas medidas de aceleração económica.
O último factor a considerar para a fraca eficácia destas medidas, depois de um ano, tem que ver com o facto de algumas delas ainda não estarem operacionais. Por exemplo, uma das medidas mais importantes que teria um impacto imediato maior seria o fundo de garantia mutuária de 300 milhões de dólares que ainda não foi distribuído para o sector produtivo estratégico.
Em suma, de acordo com Egas Daniel, “todas as medidas têm potencial para gerar um bom impacto, até porque o PAE marca uma mudança de paradigma na gestão de incentivos para uma economia de mercado. Pela primeira vez, o Governo procura galvanizar a economia, tocando nos principais gargalos de natureza regulatória, burocrática e fiscal para o sector privado. Das medidas mais urgentes, o Fundo de Garantia Mutuária “é urgentíssima”, defendeu.
na sua execução. A E&M ouviu a representante-residente do Banco Mundial, Idah Pswarayi-Riddihough, que até começou por elogiar o PAE, considerando que “através deste instrumento o Governo está a dar passos importantes para apoiar a recuperação económica e estimular o crescimento do sector privado”. Segundo a directora do Banco Mundial para Moçambique, Madagáscar, Ilhas Maurícias, Comores e Seicheles, o PAE surge na altura certa, visto que a economia está a recuperar após um longo abrandamento na sequência de choques consecutivos.
Mas ao não focar a sua visão nos aspectos transformadores deste instrumento, deu a entender que os seus impactos ainda não são visíveis. Para a responsável, as perspectivas económicas do País a médio prazo são positivas.
Espera-se que o crescimento acelere a médio prazo, atingindo 6% em 2023-2025. Mas o impulso virá da contínua recuperação dos serviços, pelo aumento da produção de gás natural liquefeito e pela recuperação de preço
28 NAÇÃO | PAE
O Banco Mundial elogia o PAE, mas dá ênfase às intervenções que vão acelerar a criação de mais postos de trabalho como aquelas que vão transformar o País rumo ao desenvolvimento
das matérias-primas que Moçambique exporta. No meio deste ambiente, prevalecerão os riscos relacionados com os choques climáticos e riscos de segurança, além da pressão sobre os preços de alimentos e combustíveis, que podem reduzir o crescimento do PIB, a médio prazo, para 4,5%.
Sem ir ao encontro dos pontos destacados no PAE, a directora do Banco Mundial, à semelhança do economista Egas Daniel, diz ser necessário “reduzir a dependência da agricultura de baixa produtividade e da indústria extractiva, através de um modelo de desenvolvimento baseado em fontes diversificadas de crescimento, produtividade e emprego”. E é olhando para o perfil de crescimento dos últimos anos que Idah Pswarayi-Riddihough conclui que, apesar de o desempenho do crescimento ter ajudado a reduzir a pobreza, tal não foi suficientemente inclusivo. Algo que se deve, em parte, à forte dependência da indústria extractiva, que tem ligação limitada com a economia, em geral, e à baixa produtividade do sector agrícola,
que é a principal fonte de subsistência das populações mais pobres.
A representante do Banco Mundial sumariza o sucesso das reformas no fortalecimento do papel do sector privado, redução do custo do crédito bancário e criação de garantias de crédito às pequenas empresas. Na verdade, estes aspectos estão presentes no PAE. Mas do ponto de vista de políticas concretas, as sugestões do Banco Mundial não estão reflectidas (pelo menos de forma clara) no PAE. Delas fazem parte a transferência do apoio agrícola para bens e serviços públicos; o enfoque num apoio mais competitivo à política agrícola; redução da tributação implícita nos alimentos; e aumento dos apoios
às famílias com insegurança alimentar, entre outros.
FMI destaca a iniciativa como “excelente”
O representante do FMI em Mocambique, Alexis Cirkel-Meyer, começou pelas medidas centradas na redução da burocracia e na simplificação dos processos e fez menção a aspectos como a medida para simplificar o processo de vistos (Medida 13) através de um portal virtual já em funcionamento e que considera estar a funcionar muito bem. Depois olhou para a Medida 15, que se centra na simplificação do processo administrativo de criação de uma nova empresa, e
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As isenções de impostos aplicadas para a actividade agrícola ainda não geraram o impacto desejado, mas espera-se que, no futuro, tenham reflexo no crescimento e produtividade do sector
classificou-a como um critério muito importante para atrair novos investimentos. “Estes são os tipos de reforma que são excelentes, porque constituem um nó de estrangulamento real e muitas vezes mencionados por investidores, ao mesmo tempo que não são medidas muito dispendiosas para o Tesouro”, observou Alexis Cirkel.
Já no segmento das medidas 17 a 20, que se centram no aumento da eficiência e do alcance das instituições públicas (ver infografia), revela que “foi também indubitavelmente bem seleccionado, uma vez que se trata de medidas com uma necessidade real e identificada, e em que o FMI e outros importantes parceiros de desenvolvimento têm estado também estreitamente empenhados e a partilhar experiências de boas práticas de todo o mundo”.
Para o representante do FMI, embora se trate de reformas que têm um impacto a longo prazo na eficiência da utilização dos recursos pú-
Muito trabalho pela frente...
Há razões de fundo para se terem escolhido exactamente aqueles 20 aspectos de intervenção aprovados há um ano e já em implementação desde Janeiro. A previsão é que o Programa observe reajustes e incentivos no sentido de condições para que os sectores-chave da economia se desenvolvam. Só que durante o tempo em que já vigora, muitos aspectos estão ainda por acertar e escondem vários detalhes pouco conhecidos, mas que a E&M foi buscar junto da equipa que coordena a execução do PAE.
Ainda não há dinheiro para o Fundo de Garantia Mutuária
A ideia está lá e é consensual entre os economistas, empresários, instituições multilaterais, entre outras entidades. Trata-se da medida que defende a criação de um fundo mutuário de 300 milhões de dólares. Visa, essencialmente, dois factores: a criação de uma
blicos, “já registámos alguns avanços interessantes, como por exemplo a concepção da Lei do Fundo Soberano. Assistimos também a um maior empenho da capacidade de auditoria interna do Ministério da Economia e Finanças no contexto da Tabela Salarial Única”.
Por último, abordou as medidas de redução fiscal, “que terão e já estão a ter um impacto considerável nas contas do Governo... Avaliando com alguma distância, existe uma vasta literatura empírica que tenta estimar o efeito "multiplicador fiscal" de medidas de despesa ou reduções tributárias como estas sobre o crescimento do PIB. Não existe um consenso amplamente aplicável a partir desta investigação, o impacto dependerá das especificidades do País e do momento”, explicou o economista e representante do FMI.
Apesar desta leitura favorável à concepção do PAE, Alexis Cirkel chama a atenção para a necessidade de o mesmo se concentrar na redução das despesas correntes e na utilização de mais recursos para investir em capital humano e infra-estruturas.
garantia colateral (a entidade que solicitar financiamento bancário já não precisa de apresentar garantias; o Estado passa a suportar esse ónus) e aplicar juros que fiquem abaixo dos aplicados nos outros mercados. Tal garantia poder-se-á aplicar estritamente naquelas áreas já definidas como prioritárias, entre as quais a agricultura.
A equipa do PAE assegura que esta medida já está a ser implementada e numa fase avançada, mas existe ainda muito trabalho pela frente no que diz respeito às linhas de crédito. Ou seja, ainda não há dinheiro para as tornar efectivas.
Há que melhorar o controlo dos recursos naturais
O Governo admite que controla apenas 20% das operações que ocorrem na área dos recursos naturais, o que torna o País vulnerável à sonegação de impostos provenientes deste sector. Mas para um melhor conhecimento da dinâmica nesta área, o Executivo decidiu fazer um controlo directo dos preços a partir dos valores de referência internacional das commodities que são exploradas em
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O Governo decidiu encontrar mecanismos para exercer controlo directo sobre a actividade extractiva para evitar a possibilidade de sonegação de impostos pelos operadores
Moçambique. Foi contratada uma empresa para averiguar e validar (ou não) a informação que é dada pelas empresas que exploram recursos minerais sobre as suas próprias operações.
Políticas de habitação ainda na fase experimental
Esta componente prevê a reorientação das actividades do Fundo do Fomento à Habitação a par de um programa voltado para o fomento de materiais de construção mais resistentes.
O papel do Estado será de infra-estruturar os espaços habitacionais, enquanto o sector privado se encarrega de executar os empreendimentos. Mas esta medida ainda só está na fase experimental nas províncias de Tete e Inhambane, antes de se estender para todo o País, assim que os resultados dos testes estiverem concluídos (ainda sem data). Já há financiadores interessados, sobre os quais a equipa do PAE prefere não comentar nem revelar, e que estão dispostos a ajudar a concretizar esta iniciativa. Sobre a componente dos materiais de construção, ainda decorre a luta para trazer materiais resilientes e com características técnicas adequadas e testadas, que resistam às calamidades naturais e a um preço competitivo.
Tudo por definir na mistura dos biocombustíveis com os fósseis Trata-se de uma ideia antiga, que por diversas razões não chegou a ser materializada, mas que foi revisitada com o PAE. A mistura de combustíveis fósseis com biocombustíveis visa reduzir os encargos com a importação, aproveitando o potencial que o País tem na produção da jatropha (espécie botânica usada na produção de biocombustíveis).
Foi constituída uma equipa alargada de profissionais para trabalhar neste assunto que inclui as gasolineiras, o Ministério da Agricultura, o sector de terras, das obras públicas, indústria e comércio.
Mas falta redefinir as percentagens de mistura para se ter um produto que permita alcançar os objectivos que se pretendem com esta medida.
Mais investimento na digitalização dos corredores logísticos
Falta competitividade nos corredores logísticos do País. O Governo admite que, em parte, tal situação se deve às altas taxas cobradas aos utentes e à fraca eficiência dos portos nacionais. Aliado a isso, as fronteiras terrestres não estão organizadas e os processos de atendimento, incluindo pagamentos, não estão digitalizados.
Há um trabalho que foi desenvolvido na fronteira de Ressano Garcia, em que todos os pagamentos passaram a ser electrónicos, e que se vai estender a outros corredores.
Prevê-se igualmente a implementação de um sistema de navios designado transhiping, e que vai tornar os corredores portuários mais apetecíveis. Mas tudo isto ainda não é efectivo e levará tempo para se tornar real.
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A equipa do PAE admite que é preciso muito investimento no melhoramento dos corredores logísticos para apoiar a aceleração das medidas de reforma económica em curso
Como É Que os Empresários Olham Para o PAE?
O que melhorou e o que deve ser feito para acelerar o crescimento e o desenvolvimento? Os empresários classificam o Pacote de Medidas de Aceleração Económica (PAE) como uma reforma oportuna, corajosa e bem-vinda, mas nem todos os pontos estão a gerar o impacto que se pretende. E pedem acções mais ousadas
Texto Celso Chambisso • Fotografia Mariano Silva & D.R.
AE&M ouviu os empresários, a começar pela Associação dos Empresários Europeus em Moçambique. A EUROCAM participou na elaboração do Pacote de Medidas de Aceleração Económica (PAE) e indicou uma lista de preocupações dos investidores do velho continente. Das 20 medidas anunciadas, nove estão alinhadas com a proposta apresentada pela EUROCAM no quadro da Plataforma de Apoio ao Investidor Europeu (PAIE), uma entidade criada em parceria com a Agência para a Promoção de Investimentos (APIEX) e que serve com órgão de consulta e articulação para acabar com barreiras ao investimento.
“A EUROCAM congratula-se com esta iniciativa do Governo, que já está a trazer resultados visíveis no desempenho empresarial”, referiu Simone Santi, presidente desta agremiação empresarial, destacando, em primeiro lugar, o alargamento da isenção de vistos de entrada no País.
“Estamos extremamente satisfeitos pelo facto de a isenção de vistos de entrada ter contemplado dez países europeus. Consequência directa disso é o aumento de missões empresariais europeias de curta duração a Moçambique e o franco crescimento da actividade turística”, indicou Simone Santi. Apesar disso, a EUROCAM apela às autoridades nacionais para que a isenção seja estendida a outros três países que acredita terem fortes interesses económicos no País: Grécia, Chipre e Áustria.
Outra mais-valia trazida pelo PAE, na óptica de Simone Santi, é a mudança de
abordagem na solicitação da certidão de quitação – documento usado para a contratação de empreitadas de obras públicas, fornecimento de bens e serviços ao Estado, assim como contratação de mão-de-obra estrangeira. A certidão passa a ter validade alargada até um ano, podendo ser utilizada em mais que um concurso. Antes, se um empresário se candidatasse a dez concursos de obras ou fornecimentos, teria de emitir uma quitação para cada concurso. Por isso, o alargamento de prazo veio flexibilizar os requisitos para fazer negócios.
“A nossa preocupação foi acautelada. Antes desta mudança, a actividade empresarial no dia-a-dia era um verdadeiro pesadelo”, desabafou o responsável.
A recente alteração da Lei dos Investimentos é também bem vista pelos empresários europeus. Ao prever facilidades na contratação de técnicos altamente especializados através da agência nacional de emprego, constitui um passo importante para a entrada e enquadramento de especialistas europeus no mercado nacional de trabalho – o que tem como expoente máximo de benefícios a transferência de conhecimento para os nacionais.
Santi elogiou, igualmente, a redução do IVA de 17% para 16%, considerando-a à medida da capacidade fiscal do Estado, e faz menção ao ponto que propõe o fortalecimento da supervisão das operações de exportação dos recursos naturais. Entende que fica aberto espaço para que, nas províncias onde ocorrem os empreendimentos ligados à exploração de gás, haja investimento em infra-estruturas e formação, entre outros.
Ponto por ponto: os aspectos a melhorar Apesar dos avanços, há pontos por melhorar. De acordo com Simone Santi, um dos exemplos é que ainda não está clara a mobilidade interna dos empresários, funcionários e gestores estrangeiros. “Por exemplo, um empresário que tenha várias empresas tem dificuldade em regularizar a sua posição nos diferentes escritórios. Gostaríamos que houvesse maior flexibilidade e facilidade de reconhecimento do espaço de acção dos empresários. “Estamos optimistas em que a Lei do Trabalho, através de regulamento específico, possa acautelar esta questão”, referiu. Outro ponto em discussão entre a EUROCAM e a APIEX é a redução do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Colectivas (IRPC) de 32% para 10% que abrange a agricultura, aquacultura e transportes urbanos, pelo entendimento de que o Executivo devia ser mais ousado e alargar o benefício a mais sectores, incluindo a saúde. “Algumas licenças na saúde, ligadas a clínicas privadas e até a serviços específicos de diagnóstico, como raio-x, são caras, sem falar da necessidade de reduzir a burocracia”, exemplificou.
A EUROCAM admite que nem todas as medidas possam gerar impacto imediato. Por exemplo, “o papel da APIEX deve ser reforçado, por ser uma entidade-chave para harmonizar a interacção entre os actores do Governo responsáveis pela área de investimento e reduzir a burocracia. O Executivo deu apenas um primeiro passo de capacitação da APIEX como impulsionador de investimentos. O jogo iniciou-se, o Governo mostrou vontade, mas há que reforçar a APIEX a combater a burocracia”, concluiu.
Electrificação já dispunha de benefícios
A medida n.° 2 do PAE prevê a isenção de IVA na importação para agricultura e electrificação. No entanto, segundo o director de electrifica-
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“O papel da APIEX deve ser reforçado, por ser uma entidade-chave para harmonizar a interacção entre os actores do Governo responsáveis pela área de nvestimento”, Simone Santi, presidente da EUROCAM
ção e projectos da empresa Electricidade de Moçambique (EDM), Cláudio Dambe, os projectos não gozavam de benefícios.
“Em termos gerais, as medidas de aceleração económica não influenciaram muito o processo de electrificação em curso”, uma vez que segundo a Lei 13/2016, “os projectos de electrificação gozam de uma redução de IVA em 60%”. Ou seja, fica a ideia de que a medida em causa foi tomada sem observar outros benefícios que já foram aprovados e que vigoram no caso da electrificação.
Cláudio Dambe explicou que medidas desta natureza aliviam os elevados custos sobre factores de produção, sobretudo painéis solares e geradores, e isso não é aplicável na electrificação rural, somente para a geração.
Importa recordar que a EDM encabeça os esforços de expansão da distribuição de energia, que deve ser de acesso universal até 2030, conforme o estabelecido no plano governamental Energia para Todos.
Que mudanças no agro-negócio?
A presidente do pelouro do agro-negócio na CTA, Pilona Chongo, vê com bons olhos a decisão de baixar a taxa do IRPC de 32% para 10% na agricultura, na aquacultura e nos transportes urbanos, acreditando que tal redução servirá de estímulo a novos investimentos nestes sectores, podendo melhorar a sua competitividade.
Ainda no quadro da promoção da competitividade agrícola, o Governo pretende reduzir a taxa liberatória cobrada a entidades estrangeiras que prestam serviços a empresas agrícolas nacionais, passando de 20% para 10%. Está também previsto eliminar a taxa de 20% de retenção na fonte sobre juros de financiamentos externos destinados a projectos agrícolas.
Os resultados destes incentivos fiscais, de acordo com Pilona Chongo, ainda não se fazem sentir e vai levar algum tempo até os produtores se aperceberem da redução de custos.
Visão diferente sobre a sua área de negócio tem Alicércio Carlos Gove, jovem
empreendedor que investe em sistemas de energia solar para irrigação (SIPS, do inglês ‘solar power irrigation systems’), com o objectivo principal de erradicar o uso de combustíveis, migrando o uso para o sector das energias renováveis. Carlos Gove explica que a sua empresa trabalha com singulares (proprietários de machambas), organizações não-governamentais (ONG) de fornecimento de bombas de água portáteis movidas a energia solar, entre outras firmas do sector privado. Para Carlos Gove, já é notória a redução de custos dos equipamentos para o consumidor final.
Mas há questões que ainda devem ser acauteladas para que a redução dos custos de produção seja efectiva. Carlos Gove revelou que os componentes que mais pesam nos custos são os painéis solares, porque, separadamente, não têm sido contados como geradores de energia. “Só conseguimos isenção quando importamos o sistema de irrigação completo (bomba de água, sistema de rega gota-a-gota e painel solar), mas isso é difícil, porque os componentes vêm de ori-
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gens diferentes. Por exemplo, a nossa bomba vem da Suíça, os painéis da China e o sistema gota-a-gota da Espanha”, esclareceu.
O turismo saiu a ganhar
Já há resultados visíveis do alargamento da isenção de vistos no turismo, referiu à E&M o presidente do pelouro daquele sector na Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), Muhammad Abdullah. “Os números comprovam que, com a facilitação dos vistos de entrada – falando concretamente da isenção, emissão de vistos de fronteira e através de plataforma na Internet –, houve um incremento significativo no número de turistas que entram no País todos os dias”, explicou. “Dados que nos foram disponibilizados mostram que têm entrado, mensalmente, mais de sete mil turistas devido à isenção de vistos, de Janeiro a Junho, ou seja, no primeiro semestre deste ano foram já emitidos mais de 16 mil vistos online, pelo que estas medidas têm tido um impacto bastante positivo para o sector do turismo”, reforçou.
O responsável entende que “esta medida não resolve todos os problemas do sector, mas é, sem dúvida, um grande passo, que motiva o sector, atraindo, ao mesmo tempo, novos investimentos”.
Então, o que mais deve ser feito? “Temos ainda um caminho grande a percorrer, que inclui capacitação, formação, maior sensibilidade em relação à importância do turismo para o desenvolvimento socioeconómico e bem-estar do nosso povo, criação de actividades que façam com que estadias dos turistas sejam de maior duração, melhoria e criação de infra-estruturas, entre vários outros factores”, apontou.
E nos transportes?
A mesma medida incidiu sobre os transportes. Ou seja, a ideia era baixar a taxa do IRPC de 32% para 10% também nos transportes urbanos, com foco na redução do défice, bem como do custo do transporte público para as populações. Mas isso aconteceu? “Não. O PAE não mudou nada na área dos transportes urbanos. Pelo contrário, há uma pressão que é exercida pela área dos combustíveis e que pode resultar no agravamento do preço dos transportes”, disse o presidente da Associações dos Transportadores Rodoviários (FEMATRO), Castigo Nhamane.
O responsável entende que, nesta altura, investir na área dos transportes urbanos não é atractivo. E que é preciso tomar medidas mais arrojadas para mudar o cenário.
O que mudou?
Parte das medidas tomadas no quadro do PAE apresenta resultados encorajadores. Outra parte não...
MEDIDAS FISCAIS
EUROCAM elogia a redução do IVA de 17% para 16% e o alargamento da isenção de vistos de entrada, mas pede a inclusão de mais três países europeus na lista dos países beneficiários desta iniciativa.a
TURISMO
O presidente do pelouro do Turismo na CTA fala de um aumento significativo do fluxo turístico em resultado da facilitação de vistos de entrada. Só no primeiro semestre foram emitidos mais de 16 mil vistos.
ENERGIA
O director de electrificação e projectos da EDM, Cláudio Dambe, explicou que, em termos gerais, as medidas de aceleração económica não tiveram muito impacto no processo de electrificação.
AGRONEGÓCIO
Redução da taxa do IRPC de 32% para 10% na agricultura é bem-vinda, mas o empresariado considera que a medida ainda não se faz sentir e que é preciso criar facilidades de importação de insumos.
TRANSPORTES
Associação dos Transportadores
Rodoviários (FEMATRO) pede medidas mais arrojadas para reduzir custos operacionais, numa altura em que a pressão exercida pelos combustíveis torna o negócio pouco atractivo.
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“Os números comprovam que, com a facilitação dos vistos de entrada, houve um incremento significativo no número de turistas que entram no País”, Muhammad Abdullah, pelouro do Turismo da CTA
FONTE CTA, EDM, EUROCAM
“Precisamos de Corrigir os Problemas de Mobilidade”
O coordenador-adjunto do Gabinete de Reformas Económicas no quadro do PAE, João Macaringue, revela que todas as medidas estão em implementação - umas mais rápidas do que outras - e reconhece que as carências ao nível das infra-estruturas e da logística, dentro e fora do País, chocam com alguns dos esforços em curso
Afunção do Gabinete de Reformas Económicas é coordenar as diferentes medidas do PAE, identificar os diferentes intervenientes e com eles desenhar os planos de acção. É com base nestes planos que o gabinete monitoriza o grau de execução do programa de aceleração económica. De acordo com o coordenador-adjunto deste gabinete, João Macaringue, existe uma base regular de prestação de informação pelos diferentes sectores e, mensalmente, há um controlo do estado de implementação das medidas. O acompanhamento do que se passa em cada um dos sectores contemplados nesta reforma é feito através de uma plataforma que permite a visualização do que está em curso. Macaringue admite que há dificuldades próprias de um processo reformista, mas acredita que, com o tempo, os desafios serão ultrapassados. Então, em que pé estamos?
Muitas políticas e estratégias de desenvolvimento em Moçambique deparam-se com a descontinuidade, sobretudo nas mudanças de ciclos de governação. No caso do PAE, coincide com o fecho de um ciclo de governação 2020-2025. Qual é a garantia de que o PAE vá ser integralmente aplicado ?
O risco de descontinuidade não existe apenas em Moçambique, mas em todas as economias frágeis e democracias emergentes. Ocorre, muitas vezes, por não se ter uma visão centrada num objectivo único que mostre para onde o País quer ir nos próximos 20, 30 ou 40 anos. Se essa ambição não estiver totalmente partilhada por todos, o risco de descontinuidade das medidas é grande. Mas quero acreditar que o PAE resulta de uma reflexão profunda de todos os sectores económicos, políticos e sociais, porque a cooperação é
fundamental. Para o sucesso das medidas, precisamos que todos os sectores intervenham porque, como Governo, a nossa missão é criar ligações. Acredito que haja já alicerces para a continuação das medidas, sobretudo as que já foram implementadas. Mas, de forma geral, os riscos de descontinuidade existem.
Este quadro de medidas parece ter sido minuciosamente preparado, com elevado grau de transversalidade em termos sectoriais. Terá sido inspirado nalguma intervenção ou reforma feita internacionalmente?
Há sempre referências para se realizar qualquer tipo de reformas de grande envergadura, como as que são sugeridas pelo PAE. Naturalmente, fomos visitar algumas iniciativas impactantes, desenvolvidas noutras economias, considerando a realidade e características da nossa. Mas, de forma objectiva, as medidas que constam do PAE resultam de uma reflexão interna. Temos, sim, a colaboração externa, mas a ideia é genuinamente moçambicana.
Que avaliação faz do grau de execução de todas as medidas previstas neste pacote? A imprensa tem vindo a fazer menção a algumas que dependem de financiamentos para avançar. Qual é o ponto de situação?
Não temos medidas paradas. Já estão todas em andamento, algumas ainda em fase de desenvolvimento, havendo ainda questões por alinhar, como, por exemplo, a problemática da medida n.º 7. Esta medida diz respeito ao fomento à habitação e dinamização da indústria nacional de materiais de construção. Mas todas as medidas já mostraram que têm pernas para andar. Há algumas questões de financiamento que não foram acauteladas, porque não se tinha a dimensão real da intervenção a concretizar, mas a
maior parte já está implementada. Fazem parte deste conjunto a medida n.º 10 (mistura de biocombustíveis), medida n.º 18 (simplificação da arquitectura da Administração Pública), entre outras. O óptimo seria que avançássemos com todas as medidas ao mesmo tempo, mas, quando as estruturámos, já tínhamos em conta essa questão. Assim, à medida que vão sendo maturadas, entram no processo normal de implementação.
Em relação ao acesso ao financiamento, a equipa do PAE chegou a reunir-se com a embaixada dos Estados Unidos da América para, entre outros pontos, definir a estratégia para lidar com actividades que carecem de recursos financeiros para a sua operacionalização. O que se avançou neste encontro?
Os EUA manifestaram interesse em apoiar as iniciativas de implementação e não necessariamente financiar a execução de medidas específicas. A implementação do PAE tem um grau relativamente elevado de complexidade e os Estados Unidos vão apoiar-nos nas questões de estratégia e organização para atacarmos os pontos mais objectivos desta causa. Ou seja, não terão uma intervenção directa.
Salta à vista uma questão pertinente que está na medida 18, “simplificação da arquitectura da Administração Pública”. Que espaço é reservado, dentro do PAE, para a questão da digitalização do aparelho do Estado e que tem foco também no combate à corrupção??
Todas as medidas têm foco no sector privado. Estamos em busca de transparência como um dos ingredientes para uma actuação mais fácil do sector privado no mercado. Devo admitir que é muito difícil eliminar comportamentos inadequados dos funcionários do Es-
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tado, e não só, como a corrupção. Mas estamos convencidos de que todo o esforço de digitalização, simplificação de procedimentos e interoperabilidade entre os sectores na Administração Pública vai tornar mais previsível e fácil identificar tentativas de defraudar os sistemas. Contudo, temos de aceitar que isso vai levar o seu tempo.
Nos primeiros dias, após o anúncio das 20 medidas de intervenção, a que mais se destacou e acabou muito criticada, principalmente pelo sector privado, foi a redução do IVA de 17% para 16%, por ser considerada pouco impactante. Há quem até hoje acredite que esta medida não foi suficiente-
mente ousada para ajudar o empresariado. Como encara esta questão?
Não concordo que esta magnitude de redução não seja impactante. Este passo já foi muito ousado. Representa um esforço muito grande do Governo. Creio que os críticos fazem comparações com outras realidades diferentes da nossa, mas já é um grande esforço, num país em que o Estado não tem muitas alternativas para colher receitas e fazer as despesas de que precisa. Lembre-se que foi introduzido o IVA na saúde e na educação, medida que também está a causar muita indignação. O que temos de reconhecer é que, durante 30 anos, os investidores privados destes dois sectores não pagavam
o IVA, com o pressuposto de que durante esse período iriam criar factores multiplicadores. Passadas três décadas de isenção, o que se espera é que esses sectores já tenham criado os tais factores. Portanto, retirar o IVA não seria uma medida a considerar. Devíamos, sim, pensar em colher as receitas dos investimentos privados nestes sectores para canalizar para a saúde e educação pública. Este é o pensamento para mais adiante, porque agora estamos focados em fortalecer as fontes de receitas do Estado, para depois as canalizar para os sectores que mais precisam.
Existe algum orçamento para a implementação do PAE?
Não temos nenhum orçamento estipulado para este programa. O que se definiu foi o uso das parcerias que temos e dos orçamentos internos para a sua implementação. Temos três projectos de ajuda, um dos quais designado por G3, e a contribuição financeira do Ministério da Economia e Finanças. É através desses financiamentos que se
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O que temos de reconhecer é que, durante 30 anos, os investidores privados na saúde e na educação não pagavam o IVA, com o pressuposto de que durante esse período iriam criar factores multiplicadores
está a avançar. Temos outros projectos e parceiros, mas cada um numa linha diferente de actuação.
A isenção do visto de entrada é uma das medidas mais elogiadas pelo sector privado, por ter ajudado a aumentar o fluxo turístico e a atracção de investimentos. Mas têm-se ouvido reclamações relacionadas com o acumular de muita gente nas chegadas em aeroportos...
De facto, a nossa infra-estrutura logística não está suficientemente preparada para receber tanta gente. Existem alguns horários de pico em que os aeroportos ficam lotados. Por isso, procuramos melhorar as nossas infra-estruturas, no sentido de treinar o nosso quadro de técnicos para lidar com isso. Mas não é uma situação alarmante. Está ao alcance do controlo pelas autori-
dades. As vantagens desta medida têm muito mais peso do que os constrangimentos que possam ocorrer.
Mas admite que problemas ao nível das infra-estruturas, sobretudo as estradas, são um desafio à implementação do PAE.
Essa questão está na medida 11 (“melhoria da competitividade dos aeroportos e corredores logísticos”). Nesta medida já foram realizadas várias acções, mas os resultados não serão imediatos. Quanto às estradas, o problema não é apenas do lado de Moçambique, mas também dos países vizinhos e está a afectar o PAE. Todas as acções de simplificação da mobilidade que realizámos encontram obstáculos neste aspecto. Há muitos problemas que são de outros países e que afectam os nossos esforços.
Até que ponto as dificuldades de tesouraria, nomeadamente com o impacto da nova Tabela Salarial Única (TSU) e os atrasos no arranque das receitas do gás, podem condicionar o PAE?
Não estamos muito ligados a estas questões da TSU. Estamos mesmo focados nas medidas de aceleração da economia. Será com o acelerar da economia que vamos gerar mais receitas e resolver as questões de tesouraria do Estado. Este é o pensamento do PAE. Procurar resolver os problemas que assolam o País e aliviar todas as pressões de forma transversal.
Que alterações se podem esperar ao longo dos próximos anos na economia, à medida que os resultados do PAE se forem fazendo sentir?
Temos a plena consciência de que à medida que fazemos o desenvolvimento das medidas e a sua implementação, surgem outras questões que têm ligação com o PAE. Mas olhamos para elas numa perspectiva evolucionista e tudo o que aparecer e agregue valor vai ser acompanhado. O nosso objectivo é criar um País mais próspero, com bem-estar para todos, porque quanto mais rico foi o País melhor.
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Todas as acções de simplificação da mobilidade que realizámos encontram obstáculos. Há muitos problemas que são de outros países e que afectam os nossos esforços
@BlueBiz
Vem este artigo a propósito de três viagens intercontinentais que efectuei, as quais tiveram um final absolutamente insatisfatório em termos de perda de malas, de tempo, de aumento de custos e de grandes aborrecimentos. Segundo um estudo recente da McKinsey & Company, os gargalos podem implicar perdas significativas para as empresas. Estima-se que os custos adicionais1 associados a gargalos possam variar de 10% a 30% dos custos operacionais totais.
Uma pesquisa realizada pelo Institute of Industrial Engineers constatou que a identificação e eliminação de gargalos podem levar a aumentos médios de produtividade de até 40%.
Neste artigo, convido o meu leitor@ a responder à pergunta: O que é a “Lei do Gargalo (LG)” e que estratégias poderão as empresas utilizar para minimizar os seus efeitos e, consequentemente, melhorar a eficiência dos seus negócios?
Vejamos sucessivamente:
- Definição e funcionamento da “Lei do Gargalo”.
- Estratégias para minimizar os seus efeitos negativos.
- Acções concretas para lidar com a “Lei do Gargalo” e problemas associados.
- Conclusão.
1. Definição e funcionamento da Lei do Gargalo (LG)?
Na esfera da economia, a LG é também designada por “Lei do Elo Mais Fraco”.
Desde o início da Revolução Industrial, no século XIX, a produção em massa começou a revelar a importância de identificar os pontos de estrangulamento nos processos produtivos.
Eliyahu Goldratt, autor2 do livro “A Meta” (1984), e cuja leitura recomendo vivamente, introduziu o conceito do gargalo como um ponto crítico de um processo que limita a produtividade.
A (Muito Esquecida) “Lei do Gargalo”: Ou Como Melhorar a Eficiência do Seu Negócio
Neste contexto, gargalo é o elo com a menor capacidade de resposta que determina o fluxo/a velocidade/a eficiência de entrega de um produto ou serviço.
2. Que estratégias empregar para minimizar os efeitos negativos da “Lei do Gargalo”?
Vejamos três exemplos. a) No sector das tecnologias de informação: gargalos na implementação de software.
Situação: A LG é muitas vezes evidente na implementação de software. Imagine uma empresa que deseja actuali-
mizando a interrupção das operações.
b) No sector do transporte aéreo: gargalos na manutenção de aeronaves.
Situação: A LG pode afectar a manutenção de aeronaves. Uma companhia aérea pode enfrentar atrasos significativos devido à falta de disponibilidade de peças sobressalentes para reparações.
Consequências : Esse gargalo pode causar cancelamentos de voos, insatisfação dos passageiros e custos adicionais.
Estratégias de solução: Ao i) proceder à análise detalhada dos gargalos, ii) ao investir num sistema eficaz de gestão de peças sobressalentes, iii) e em parcerias com fornecedores confiáveis, a companhia aérea pode optimizar a disponibilidade de peças e minimizar o impacto dos gargalos na manutenção.
c) No sector do comércio internacional: gargalos na cadeia de abastecimento.
Situação: A LG pode surgir na cadeia de abastecimento. Por exemplo, uma empresa envolvida na importação de produtos pode enfrentar atrasos significativos na alfândega devido a procedimentos burocráticos demorados.
zar o seu sistema de gestão empresarial. O processo de implementação pode enfrentar um gargalo no subprocesso de migração de dados.
Consequências : Enquanto outras partes do processo podem estar prontas, a ineficiência no subprocesso de migração de dados pode atrasar todo o projecto.
Estratégias de solução: Ao proceder à i) reengenharia de processos, ii) à formação dos colaboradores, iii) e à automação do subprocesso de migração de dados para reduzir o tempo e o risco de erros humanos, a empresa pode garantir que a implementação do software seja concluída de maneira eficiente, mini-
Consequências : Isso pode resultar em atrasos na entrega aos clientes e aumento dos custos de armazenamento.
Estratégias de solução: Ao i) implementar tecnologias de rastreamento e conformidade, bem como ii) estratégias para agilizar o processo aduaneiro, a empresa pode minimizar os gargalos na cadeia de abastecimento e melhorar a eficiência do comércio internacional.
3. Acções concretas para lidar com a “Lei do Gargalo” e alguns problemas associados Com base na minha experiência na modelação e optimização de processos de negócio nos meus clientes, sugiro dez
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Segundo a McKinsey & Company, os gargalos operacionais e logísticos podem resultar em perdas significativas, variando de 10% a 30% dos custos operacionais totais
João Gomes • Partner
A automação de processos pode acabar com estrangulamentos nos negócios passos práticos que podem ser seguidos para implementar a LG de maneira eficiente e eficaz.
Passo 1: Identificação dos Gargalos
Analise e examine atentamente os processos operacionais para identificar onde ocorrem atrasos, congestionamentos ou limitações no fluxo.
Problema associado: Mas na execução deste passo, atenção à “Complexidade de Identificação”. Identificar os verdadeiros gargalos exige análises detalhadas e pode ser desafiador em sistemas complexos.
Passo 2: Análise de Impacto e Avaliação das Consequências. Entenda como cada gargalo afecta os tempos de produção, os custos, os níveis de stocks e a capacidade de responder à procura.
Passo 3: Priorização dos Gargalos Classifique por importância e priorize os gargalos com base no seu impacto financeiro e operacional, focando nos que têm maior potencial de retorno.
Problema associado: Atenção ao “Custo Excessivo”. Investir em eliminar gargalos pode ser dispendioso e, nalguns casos, pode não resultar em ganhos significativos.
Passo 4: Desenvolvimento de Soluções. Formule estratégias de mitigação e
desenvolva abordagens para resolver ou reduzir os gargalos, considerando tecnologias, ajustes de processos e realocação de recursos (ver no texto acima alguns exemplos de soluções).
Problema associado: Atenção ao “Risco de Desperdício”. A alocação excessiva de recursos para superar gargalos temporários pode resultar em capacidade ociosa após a resolução do problema.
Passo 5: Implementação Gradual Teste e valide. Implemente as soluções de forma gradual e flexível, monitorizando os resultados e fazendo ajustes conforme necessário.
Passo 6: Monitorização Contínua Acompanhe regularmente e mantenha um sistema de monitorização para garantir que os gargalos resolvidos permaneçam sob controlo.
Passo 7: Feedback e Melhoria. Avalie constantemente e solicite feedback dos colaboradores sobre a eficácia das soluções implementadas, buscando sempre oportunidades de melhoria.
Passo 8: Envolvimento da Equipa. Forme uma equipa multidisciplinar com competências variadas para colaborar na identificação e solução dos gargalos.
Passo 9: Inovação e Adaptação. Esteja preparado para inovar e adaptar as solu-
ções à medida que a empresa evolui e as circunstâncias mudam.
Passo 10: Cultura de Melhoria Contínua. Estabeleça uma cultura de melhoria contínua, incentivando todos os níveis da organização a procurar e resolver gargalos de maneira proactiva.
Problema associado: Atenção ao “Foco Excessivo”. A obsessão com a eliminação de gargalos pode desviar a atenção de outros aspectos importantes da gestão e estratégia.
4. Conclusão
O tema da “Lei do Gargalo (LG)” é muitas vezes esquecido, mas revela-se crucial para melhorar a eficiência dos negócios. Segundo a McKinsey & Company, os gargalos operacionais e logísticos podem resultar em perdas significativas, variando de 10% a 30% dos custos operacionais totais. Além disso, um estudo do Institute of Industrial Engineers revela que a eliminação de gargalos pode levar a aumentos de produtividade de até 40%.
Para minimizar os efeitos da LG, é importante implementar estratégias adequadas. Por exemplo, no sector de TI, a implementação de software pode ser prejudicada pela migração de dados ineficiente. Através da reengenharia de processos, formação dos colaboradores e automação é possível garantir uma implementação eficiente.
Neste artigo, e fruto da minha experiência, sugiro dez passos práticos para lidar com a LG, incluindo a identificação, análise de impacto, priorização e desenvolvimento de soluções. No entanto, é importante evitar excessos e manter um equilíbrio entre a eliminação de gargalos e outras áreas de gestão.
Em última análise, a criação de uma cultura de melhoria contínua é fundamental para enfrentar os desafios impostos pela “Lei do Gargalo” e para melhorar constantemente a eficiência operacional.
1 De acordo com a Deloitte, a indústria de manufactura enfrenta gargalos em áreas como cadeia de suprimentos, produção e distribuição. A pesquisa aponta que, em média, as empresas gastam cerca de 20% do tempo lidando com gargalos e interrupções na produção.
2 Outros autores e livros relevantes nesta matéria: John D. Little - “Little’s Law and the Management of Inventory” (1961). Donald J. Wheeler
- “Understanding Variation: The Key to Managing Chaos” (1993). Paul Harmon - “Business Process Change: A Business Process Management Guide for Managers and Process Professionals” (2007). Michael H. Hugos - “Essentials of Supply Chain Management” (2006).
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Joseph Stiglitz.
Da Teoria da Informação aos Avisos para Moçambique
O Nobel de Economia esteve por duas ocasiões no País, a primeira em 2012 e a mais recente em 2019. Em ambas, deixou importantes lições acerca de políticas de apoio ao crescimento e desenvolvimento. Mas que contributo global deu à ciência económica?
As obras de Joseph Stiglitz, economista, professor e estudioso norte-americano, têm influência directa nos campos de finanças públicas, crescimento, distribuição de renda, eficiência de economias capitalistas e, especialmente, no estudo de teorias de mercado. Stiglitz tem parte da sua carreira ligada ao sector público e às instituições financeiras.
Foi Prémio Nobel da Economia em 2001, juntamente com A. Michael Spence e George A. Akerlof, pela criação da teoria dos mercados com informações assimétricas, segundo a qual dois ou mais agentes económicos envolvidos em transacções podem deter informação qualitativa ou quantitativamente superior em relação a outros, gerando falhas de mercado.
As contribuições de Stiglitz
A análise determinante para a nomeação e atribuição do Nobel é considerada um dos seus maiores contributos para a teoria económica, em que analisa as disparidades entre agentes mal informados e agentes bem informados para as dinâmicas de mercado. A assimetria entre a informação, segundo Stiglitz, pode ser a chave para a compreensão de fenómenos de mercado, assim como para perceber problemas sociais e económicos que afectam diferentes nações e blocos, como o desemprego e o racionamento de crédito.
Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R
Stiglitz põe em causa modelos económicos mais antigos, apontando que estes pressupõem a existência de informação perfeita, sendo que os modelos actuais demonstram que não é isso que ocorre. Ainda que a informação sofra ajustes ou diferenças mínimas, os efeitos no mercado são grandes.
Para melhor compreender as distorções, vejamos um exemplo: na transacção de um carro usado, o vendedor possui muito mais informação sobre o veículo do que o comprador. Este, por seu lado, quer evitar um mau negócio e só vai fechar a compra se o preço for relativamente baixo, porque tem receio de arcar com mais custos de manutenção no futuro.
A consequência desta indisponibilidade em pagar um preço mais alto é que, cada vez mais, apenas os automóveis em piores condições de conservação entrarão para o mercado de carros usados. E com carros piores, a média do preço vai continuar a diminuir, o que vai atrair veículos ainda piores para o mercado.
O anti-liberalismo
Os seus estudos concentram-se em finanças públicas, crescimento, distribuição de rendimento e teorias sobre mercados e eficiência das economias capitalistas. Com Bruce Greenwald, economista considerado como o “Guru dos Gurus de Wall Street”, criou a Economia da Informação, campo interdisciplinar entre
economia, ciência da informação e comunicação que trata os dados disponíveis como um bem de produção necessário às actividades do sistema capitalista pós-industrial. É pioneiro nos conceitos de risco moral e selecção adversa, actualmente utilizados por teóricos e analistas políticos de todo o mundo.
Joseph Stiglitz, com o seu trabalho, ajudou a explicar contextos em que os mercados não funcionam e a mostrar como a intervenção selectiva de um governo pode ajudar a aprimorar as suas performances. Crítico severo e contundente dos “fundamentalistas do livre mercado”, questiona o que chama de “bases ideológicas” que regem a maior parte das decisões económicas mundiais.
Durante muito tempo, a ideia de um mercado, sem interferência do Estado, capaz de alcançar o máximo de bem-estar social, dominou a academia. As possíveis falhas de mercado foram, em muitos casos, ofuscadas pela suposta máxima eficiência nele presente. Diante disso, há quem defenda que somente o mercado desimpedido para agir nos levará à eficiência e produtividade máxima; do outro lado, há quem defenda a intervenção estatal na economia como caminho para o crescimento e igualdade social.
Nesse contexto aparentemente inconciliável, Joseph Stiglitz aponta uma forma de ambos se complementarem: cabe ao mercado ser o principal agente de produção e alocação de recursos, mas cabe ao Estado corrigir as falhas, sobretudo a assimetria de informação.
Também ataca a ideia de que o PIB de um país possa ser uma indicação confiável de poder e bem-estar dos seus cidadãos. Entende que as práticas liberais na economia fazem com que uma ínfima parcela da população enriqueça, quando grande parte da mesma permanece sem direitos básicos de subsistência.
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Stiglitz advertiu para a necessidade de o Governo moçambicano aprender com os conflitos já registados ao nível de alguns países ricos em recursos naturais e daí tirar vantagens
Os “recados” para Moçambique
Na sua primeira presença no País, em Julho de 2012, o Nobel da Economia viajou a convite do Centro de Integridade Pública (CIP) para uma aula aberta com o título “Como Evitar a Maldição dos Recursos”. Na ocasião, advertiu para a necessidade de o Governo moçambicano aprender com os conflitos já registados nalguns países como resultado da descoberta de riquezas minerais.
E sugeriu a Moçambique que usasse as lições aprendidas por outros para tirar maiores vantagens daquilo que hoje é chamado o boom (crescimento) dos recursos minerais no país. “Se tiverem consciência dos perigos de usar mal o dinheiro dos recursos naturais vão geri-lo melhor.
Há que manter a transparência e assegurar uma forte base democrática e só desta forma se podem evitar os conflitos internos, que muitas vezes resultam da fraca distribuição da riqueza”, disse. E sugeriu um caminho: “Moçambique
deve aproveitar as vantagens dos recursos naturais, criando emprego e principalmente promovendo a diversificação da economia, usando os recursos para a educação e infra-estruturas.
Na sua segunda visita ao País, em 2019, Stiglitz deslocou-se a convite do Gupo Soico para uma conferência económica e manifestou preocupação com o elevado endividamento público. “Uma tendência inquietante em economias que descobrem grandes reservas de recursos naturais é o endividamento excessivo, porque vivem no conforto de que haverá dinheiro para pagar as dívidas”, observou.
E alertou: “se os bancos ocidentais ou asiáticos acreditam que Moçambique terá condições de devolver empréstimos, porque tem muitos recursos naturais, é lógico que se sentirão seduzidos a emprestar o dinheiro e, muitas vezes, em condições lesivas para o País”. Palavras certeiras, no rescaldo do escândalo das dívidas ocultas.
Joseph Eugene Stiglitz nasceu no dia 9 de Fevereiro de 1943, na cidade de Gary, Estados Unidos. Em 1964, formou-se em economia no Amherst College. Entre 1965 e 1967 estudou em Cambridge. Três anos após a graduação, ganhou o título de Ph.D. no Massachusetts Institute of Technology (MIT). Foi justamente no MIT que formulou parte dos seus conceitos. O modelo da instituição de ensino, em primar pela objectividade na hora de encontrar soluções para questões económicas importantes, agradou ao cientista.
Desde o início dos anos 2000, é professor de economia na Universidade de Columbia. Foi uma figura relevante no Governo de Bill Clinton, entre 1995 e 1997.
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BJOSEPH STIGLITZ
Wilson Tomás • Research Analyst
A importância dos Índices Bolsistas
Os índices bolsistas, também conhecidos como índices de mercado, são indicadores económicos específicos de cada país. Podem ser ponderados pelo valor de mercado das empresas ou pelo preço das acções cotadas que compõem o índice.
Geralmente, são identificados por capitalização e segregação sectorial das empresas. Esses índices são regularmente acompanhados pelos meios de comunicação e por investidores e pode, inclusive, ser usados como instrumento de investimento.
Cada índice possui o seu próprio método de cálculo, embora a média ponderada seja a principal base para esses cálculos, já que os valores são derivados de uma média ponderada do valor total da carteira.
Dessa forma, os índices ponderados pelo preço serão mais afectados por alterações nas acções com preços mais elevados, enquanto os índices ponderados pela capitalização de mercado serão mais influenciados por mudanças nas acções das maiores empresas.
Alguns índices baseiam-se na ponderação da capitalização bolsista, na ponderação das receitas, nas flutuações dos preços dos activos, entre outros. A ponderação é um método para ajustar o impacto individual dos itens num índice.
Os índices possuem características específicas que focam directamente em determinados segmentos de mercado. Por exemplo, podem representar sectores de actividade ou maturidades, no caso de títulos de rendimento fixo, ou po-
dem ser criados para representar segmentos geográficos do mercado, como os que acompanham países ou blocos emergentes ou acções nos principais mercados. Isto proporciona aos investidores uma visão simplificada de um grande sector de mercado, sem a necessidade de examinar cada activo individualmente.
Os índices funcionam também como benchmarks, ou seja, servem como referências para diversos objectivos nos mercados financeiros. Uma ampla gama de investidores utiliza índices de mercado para acompanhar as praças financeiras e gerir as suas carteiras de investimento.
Os índices estão profundamente integrados na gestão de investimentos, sendo utilizados como referências para comparações de desempenho de activos, especialmente desempenho dos gestores de activos dos fundos de investimento.
Um exemplo notável são os índices de mercados de acções, que oferecem uma visão geral e rápida do desempenho de várias acções cotadas em mercados de capitais de diferentes países, regiões e sectores.
Nos Estados Unidos, temos o Dow Jones (composto pelas 30 empresas líderes dos diferentes sectores de actividade americana), o S&P 500 (composto pelas 500 maiores acções por capitalização bolsista) e o Nasdaq (composto principalmente por acções de empresas de tecnologia). Esses índices de referência são uma boa representação do mercado de acções do país e existem em todos os mercados financeiros internacio-
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O crescimento da utilização destes índices como referência para a tomada de decisões de investimento pelos participantes no mercado de capitais moçambicano está condicionado ao aumento do número de empresas cotadas nos próximos anos
do Banco Big Moçambique
nais que possuam uma bolsa de valores.
Também existem índices de rendimento fixo abrangentes, utilizados por investidores em títulos de dívida e por gestores de Exchange-Traded Funds (ETFs), como referência para avaliar o seu desempenho relativo. Um exemplo é o Bloomberg Aggregate Bond Index, composto por títulos do tesouro e títulos corporativos.
A análise dos índices de mercado de obrigações é crucial por três razões principais. Primeiro, as carteiras de títulos de fundos de pensões e de investidores individuais cresceram substancialmente nos últimos anos, com os fluxos para fundos de renda fixa a superar as entradas para fundos de acções.
Segundo, os índices de referência para fundos de índices de obrigações tornaram-se populares, pois muitos gestores de carteiras de obrigações não conseguiram superar os ganhos obtidos em índices de obrigações, semelhantes ao comportamento dos gestores de ac-
ções. Terceiro, devido à magnitude e importância do mercado de obrigações, pesquisas substanciais têm sido realizadas e os índices de mercado de obrigações fornecem medições precisas e oportunas das características de risco/ retorno desses activos e do mercado.
Frequentemente, os investidores optam por investir em índices em vez de acções ou obrigações individuais, de modo que consigam atingir graus de diversificação superiores. Investir numa carteira de fundos de índice pode optimizar os retornos e equilibrar os riscos.
Por exemplo, investidores tendem a adoptar estratégias de índices sectoriais que reagem de forma diferente aos ciclos económicos para proteger o valor das suas carteiras ou investir 50% dos seus fundos em índices de acções e os outros 50% em índices de obrigações.
Ou seja, a utilização de fundos que usam os índices como benchmark veio melhorar muito o acesso a instrumen-
tos que permitem gerir melhor a diversificação dos investimentos, quer de particulares, quer institucionais.
A Bolsa de Valores de Moçambique (BVM) possui um índice global, IBVM_Global, que mede o desempenho do mercado de capitais como um todo, considerando títulos de capital (acções) e dívida (obrigações). Além disso, a BVM tem outros dois índices: o IBVM_Acções e o IBVM_Obrigações que agrupam os instrumentos cotados na Bolsa de Valores de Moçambique pelas suas características.
O crescimento da utilização destes índices como referência para a tomada de decisões de investimento pelos participantes no mercado de capitais moçambicano está condicionado ao aumento do número de empresas cotadas nos próximos anos. Esse aumento será necessário para auxiliar na escolha dos instrumentos que melhor se adequam ao perfil de risco de cada um dos investidores.
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Investidores tendem a adoptar estratégias de índices sectoriais que reagem de forma diferente aos ciclos económicos
Uma Possibilidade Que Muda a Banca e o Fisco
Moçambique não é signatário do FATCA – um instrumento criado pelo Governo norte-americano para combater a fuga ao fisco dos seus cidadãos fora de portas –, mas pode vir a aderir, a avaliar pelas vantagens e pela tendência mundial. A EY explica o que é este mecanismo e o que poderá acontecer em Moçambique
D.R.
Não há estatísticas fiáveis sobre quantos norte-americanos vivem em Moçambique, nem vice-versa, mas o facto de os Estados Unidos da América (EUA) estarem entre os maiores investidores e parceiros económicos do País reveste os acordos bilaterais de importância estratégica.
No caso do FATCA, por exemplo, Angola tornou-se signatário do acordo em 2015 e uma das vantagens que relata é o fim da taxa agravada de retenção na fonte de 30% que recaía sobre os rendimentos de origem norte-americana com destino a Angola e suas instituições. Estes valores têm convencido cada vez mais aderentes, a nível global. Mas o que é o FATCA? Para evitar a fuga ao fisco dos seus cidadãos além-fronteiras, o Governo dos EUA criou, em 2010, o mecanismo Foreign Account Tax Compliance Act, ou seja, Lei de Conformidade Tributária de Contas Estrangeiras.
O instrumento prevê a obrigatoriedade de as instituições bancárias estrangeiras abrangidas fornecerem dados dos seus clientes de nacionalidade norte-americana às autoridades dos EUA. Trata-se de uma modalidade de actuação pouco conhecida em Moçambique, o que levou a consultora Ernst & Young (EY) a organizar um pequeno-almoço executivo com o objectivo de partilhar informações com instituições financeiras sobre este instrumento legal. “Isto já tem alguns anos. O FATCA foi introduzido pela legislação norte-americana com o objectivo central de prevenir a fuga e a
evasão fiscal”, apontou o director de serviços financeiros da EY, Vasco Pais. À luz do FATCA, as instituições financeiras que operam fora dos EUA podem executar um conjunto de procedimentos de due dilligence (verificações necessárias) e de identificação dos seus clientes, para apurar potenciais situações de declaração de património e rendimentos detidos por pessoas dos EUA e que sejam susceptíveis a tributação.
O FATCA funciona num regime global e mais de 100 países já celebraram um acordo com os EUA. “Moçambique ainda não celebrou o acordo, mas existe a possibilidade de ter as instituições financeiras que aqui operam a participar no regime, através de um acordo directo entre si e as autoridades norte-americanas, tal como pode vir a acontecer em relação a muitos países do continente africano”, esclareceu Vasco Pais.
O entendimento é de que esta abordagem, apesar de ter lugar num país com características socioeconómicas diametralmente opostas às de Moçambique, teria um enquadramento quase perfeito com a perspectiva da luta pela transparência fiscal que o País procura - através de um regime de reporte de informação que permite às autoridades acompanhar os seus contribuintes e o grau de cumprimento dos compromissos fiscais.
“Alguém que nasce nos EUA é automaticamente um cidadão norte-americano”, destacou Vasco Pais, frisando esta evidência para clarificar que, ao ostentar
a nacionalidade, os cidadãos assumem, automaticamente, um compromisso fiscal que vai além-fronteiras.
Implicações para Moçambique
De acordo com o director dos serviços financeiros da EY, “esta questão tem duas perspectivas. A primeira, desde logo, é que temos mais de 100 países que já aderiram a um acordo directo com os Estados Unidos”. Estamos a falar de um regime que prima pela transparência fiscal”, em linha com as acções “de vários Estados e países”, no sentido de “promover a luta contra a evasão fiscal, pela defesa da transparência e pela tributação justa dos rendimentos auferidos”.
Para Vasco Pais, “nesta perspectiva, dentro da qual vários países já têm vindo a celebrar este acordo, entendemos que, naturalmente, será algo que no futuro irá acontecer relativamente a Moçambique”.
Numa segunda dimensão, prosseguiu, assiste-se a um conjunto de outros regimes, como é o caso do Common Reporting Standard, desenvolvido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), que abrange uma multiplicidade de países e uma troca de informação com múltiplas jurisdições. À semelhança do que acontece com o FATCA, Moçambique ainda não faz parte deste instrumento. “Diria que o caso mais próximo que temos, com uma adesão plena a estes dois regimes, é a África do Sul”, explicou Vasco Pais, admitindo que o mesmo venha a acontecer com Moçambique.
As instituições financeiras e a confidencialidade
A cooperação no âmbito do FATCA pode ser operacionalizada através do chamado Acordo de Cooperação Intergovernamental (IGA, na sigla inglesa), que é um contrato que vincula dois Estados, neste caso, os EUA com a sua contraparte. Este instrumento permitiria
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Texto Nário Sixpene • Fotografia
Mais de 100 países já celebraram um acordo com os EUA. Moçambique ainda não, mas existe a possibilidade de ter as instituições financeiras que aqui operam a participar no regime.
a troca automática de informações tributárias para fins do FATCA entre os Governos moçambicano e norte-americano, relativamente a operações e transacções realizadas por contribuintes dos EUA nos mercados financeiro e de capitais moçambicanos.
Ou seja, as informações previstas seriam encaminhadas pelas instituições financeiras locais para as autoridades fiscais moçambicanas e, posteriormente, para a receita dos EUA. A parte moçambicana, por sua vez, receberia, através do mesmo acordo, informações das autoridades norte-americanas sobre movimentações financeiras de contribuintes nacionais em instituições financeiras no mercado americano.
A assinatura do IGA também ofereceria às instituições financeiras nacionais um benefício importante, pois eliminaria a exigência de enviarem informações directamente à receita americana, o que
poderia colidir com as obrigações de confidencialidade e sigilo das instituições financeiras para com a informação dos seus clientes.
Vasco Pais reforça que, se Moçambique se comprometer com os EUA em adoptar internamente um conjunto de regras e medidas de legislação do FATCA, a esfera estatal terá de cumprir os princípios que estão previstos no acordo, ao nível de procedimentos de verificação e reporte.
Mudanças de procedimento em instituições financeiras
Na prática, há vários actos do quotidiano financeiro que estão em causa. “Temos, em primeiro lugar, os procedimentos de abertura de conta financeira: isso é algo que está definido no regime. Por exemplo, tanto pode ser uma conta de depósito bancário, como uma apólice de seguro” com componente de in-
COMBATE AO BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS
O director-executivo da EY, Nuno Calha, entende que o FATCA tem que ver também com o risco de branqueamento de capitais, existindo já uma série de medidas de prevenção que vão na mesma linha. “Na sessão que tivemos sobre este tema, alguém questionou sobre o investimento em tudo isto.
O investimento tem de ser feito”, porque “todo este processo de identificação está legislado pelo Banco de Moçambique. Por isso, os bancos têm de cumprir”, apontou Nuno Calha.
O exercício para as instituições financeiras consiste em olhar para os clientes e para as suas operações e identificar quem é que tem a cidadania norte-americana.
E, nesses casos, tudo é vertido automaticamente num relatório.
vestimento. “Os bancos, as seguradoras ou outras instituições financeiras têm de adaptar um conjunto de procedimentos com vista à correcta identificação e tratamento de dados dos clientes”, esclareceu Pais. E continuou: “isto acaba por ter impacto nas instituições ao nível dos sistemas, dos procedimentos adicionais de validação e de verificação de dados e de recolha de documentação destes clientes que estão potencialmente sujeitos a reporte”.
As obrigações são um aspecto muito importante, porque não dizem respeito somente aos americanos, devendo ser cumpridas por todos os clientes. “Se alguém, amanhã, abrir uma conta num banco em Moçambique, a instituição financeira deve estar preparada para solicitar toda essa informação ou documentação.
Depois, chegando à conclusão de que o cliente não é um cidadão dos EUA, mas um residente fiscal em Moçambique, este não vai ser alvo de reporte para efeitos deste regime. Mas o banco tem a obrigação de executar os devidos procedimentos para todos os clientes”, apontou. Aqui existe uma segunda dimensão ao nível das obrigações que são exigidas às instituições financeiras e que se prende com os actos de identificar, tratar e documentar todos os clientes.
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O FATCA é um mecanismo que prevê a obrigatoriedade de as instituições bancárias abrangidas fornecerem dados dos seus clientes de nacionalidade norte-americana.
Seja para manter o seu dinheiro seguro, maximizar as suas poupanças ou efectuar pagamentos físicos ou online, possuir uma conta bancária é essencial, e entender como os diferentes tipos de contas bancárias funcionam é importante, tanto para clientes particulares, como para as empresas. Aqui ficam breves linhas sobre o tema, pelas palavras de Mirena de Oliveira, Gestora do Segmento Private do FNB .
Começando por conceitos básicos, uma conta bancária é um produto de depósito disponível em instituições financeiras credenciadas - os bancos -, e um depósito bancário define-se como um contrato de guarda de fundos (dinheiro) em que o Banco é o fiel depositário, sendo os titulares da conta os proprietários dos mesmos.
Quanto às especificidades das contas bancárias, nalgumas delas é necessário manter saldos mínimos, enquanto noutras pode não ser necessário manter qualquer saldo. Do mesmo modo, é possível movimentar os fundos livremente nalgumas contas ou sofrer uma penalização pelo levantamento de valores noutras.
No que toca à abertura e movimentação de contas bancárias tituladas por menores de 15 anos, esta deve ser realizada por intermédio de representantes legais do titular da conta. Para os menores com idade compreendida entre os 15 e 18 anos de idade, a abertura e movimentação de contas bancárias pode ser levada a cabo pelos próprios, mediante autorização escrita, assinada e devidamente reconhecida dos seus representantes legais ou, em certos casos, com autorização do curador de menores da área de residência.
De facto, nunca é demais reforçar a importância de incutir o hábito da poupança e incluir as crianças, desde cedo, na gestão financeira – começando pelas suas próprias poupanças.
É importante entender os diferentes tipos de contas de depósito disponíveis e saber como usá-las de forma inteligente, por forma que giram eficazmente as suas
As Contas Bancárias ao Serviço de Uma Gestão Financeira Eficaz
finanças e, assim, fazer crescer o seu dinheiro.
Contas de depósito à ordem
As contas à ordem são, geralmente, utilizadas para a realização de operações rotineiras, para recepção de fundos e pagamento de despesas, incluindo as que estão relacionadas com as prestações de crédito. Como podem ser movimentadas em qualquer altura, normalmente não são creditados juros. Ao abrir uma conta à ordem, o titular desta tem acesso a produtos e serviços como cartões de débito, cheques, seguros, acesso a Internet Banking, incluindo via aplicativo, entre outros. As contas à ordem podem ser individuais, colectivas ou empresariais. No FNB, estão disponíveis as contas Júnior, Smart, Platinum e Private, ca-
cidos aos depósitos já existentes, incrementando periodicamente o depósito a prazo com poupanças pontuais que, ao invés de se manterem disponíveis numa conta à ordem sem uma finalidade específica, podem render juros se adicionados a um depósito a prazo.
Contudo, se for necessário, é possível movimentar os fundos antes do final do prazo estabelecido, mediante uma compensação ao banco sobre o valor dos juros corridos durante esse período.
No FNB Moçambique, entre os tipos de depósitos a prazo, contam-se a Conta Poupança Flexível, Conta Poupança Júnior, Conta Poupança Trocos, Depósito a Prazo Oferta e Depósito a Prazo Particular em Moeda Estrangeira. Estes depósitos têm finalidades distintas, periodicidades específicas e concedem condições e serviços específicos aos seus titulares.
Algumas soluções destinam-se a guardar e rentabilizar as poupanças de titulares menores, outras “arredondam” e poupam trocos em todos os seus pagamentos feitos com cartão (uma forma fácil e simples de poupar) e outros ainda implicam depósitos de médio/longo prazo, com taxas de juro consideráveis.
da uma com diferentes especificidades e benefícios associados.
Contas de depósito a prazo
Uma conta a prazo é uma conta de depósito em que o titular guarda um determinado valor, tendo como contrapartida o pagamento de juros pelo banco. Ao contrário das contas à ordem, as contas a prazo são uma óptima forma de poupar, uma vez que durante o período de tempo acordado com o Banco não se pode movimentar o valor (imobilizado), beneficiando-se da entrega de juros. Geralmente, quanto mais longo o prazo do depósito, maior é a taxa de juro paga ao depositante. Existem, também, diferentes tipos de depósito a prazo em que o titular tem a opção de fazer reforços, acres-
Actualmente, com os serviços bancários digitais, também é possível subscrever depósitos a prazo remotamente. Basta aceder ao Internet Banking e visualizar todos os seus depósitos, numa única plataforma.
Ao definir a sua estratégia de poupança e investimento, tanto a nível particular como profissional, é importante analisar os tipos de depósito disponíveis, as contrapartidas e taxas de juro em vigor, fazer todos os cálculos e esclarecer as suas dúvidas junto de profissionais dedicados. Desta forma, com toda a certeza, irá escolher soluções que melhor satisfazem os seus objectivos e fazem crescer o seu capital, de forma segura. Uma coisa é certa: ter conhecimento sobre os tipos de contas e depósitos bancários e encarar o seu banco como seu parceiro, é o primeiro passo para uma gestão financeira eficaz e sustentável.
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"Ao definir a sua estratégia de poupança e investimento, é importante analisar os tipos de depósito disponíveis"
Mirena de Oliveira • Responsável pelo Segmento Private do FNB Moçambique
“Não Basta Haver Bons Medicamentos. Têm de Ser Acessíveis”
A Bluepharma, grupo farmacêutico português que está a completar 22 anos de operação, e há 12 em Moçambique, lidera no segmento dos medicamentos genéricos, uma ‘novidade’ que introduziu à época no mercado nacional que, depois da desconfiança inicial, não dispensa hoje este tipo de solução. Para o futuro próximo, a receita prescrita passa pela inovação na oferta
Ogrupo Bluepharma é, actualmente, constituído por 20 empresas que abrangem todas as fases da cadeia de valor da indústria farmacêutica. Com duas décadas de existência, e presente em mais de 45 geografias, em Moçambique, está envolvida em projectos que pretendem dar um importante impulso ao crescimento do sector da Saúde. Em entrevista conjunta à E&M, o co-fundador da Bluepharma, Paulo Barradas, e a Country Manager farmacêutica, Liliana Proença, recordam o trajecto da farmacêutica num mercado em que os medicamentos genéricos eram, inicialmente, olhados com desconfiança, até aos dias de hoje, em que são aceites e cada vez mais procurados enquanto alternativa às marcas multinacionais. E apontam ainda a novos caminhos e objetivos da farmacêutica.
Gostaria que começasse por falar da estratégia de sucesso da Bluepharma.
(Paulo Barradas) Adquirimos, inicialmente, uma empresa em Portugal, uma multinacional, e hoje estamos a exportar para 45 países e empregamos mais de 800 pessoas nas 20 empresas que criámos em duas décadas, todas no sector dos medicamentos, algumas já fora de Portugal, e outras startups da Universidade de Coimbra. Tudo isto na área dos genéricos, que é a que traz grande dinâmica ao mercado, democratiza- o e dá acessibilidade ao cidadão. Não basta trazer medicamentos bons, há que os tornar acessíveis a quem precisa. E os genéricos facilitam a disponibilidade de recursos por parte do Estado para investir em medicamentos mais sofisticados.
Quando começaram o projecto em Portugal, havia esse mesmo cenário que encontraram em Moçambique, um desconhecimento e desconfiança em relação ao genérico?
Vamos dividir esta análise em duas partes de dez anos porque acreditamos que esse seja o tempo para conseguir fazer alguma coisa sólida. Nos primeiros dez, deixámos de produzir para a fábrica da Bayer (depois da aquisição desta) e passámos a produzir os nossos próprios medicamentos e a preocupar-nos em satisfazer os nossos clientes. A última década serviu para credibilizar o sector e dar confiança à população de que podia usar os medicamentos genéricos porque eram mais baratos e de igual qualidade. Por sermos uma empresa especializada em genéricos, temos um portefólio grande e produzimos para várias companhias. O resultado da nossa qualidade advém dos nossos princípios e exigência profissional. Somos auditados por muitas indústrias – são cerca de 100 empresas mundiais que fazem auditoria para aferir se estamos nos termos em que devemos estar para que se adquiram os remédios connosco. Chegámos a Angola e a Moçambique quase na mesma altura (um pouco antes aqui). Constatámos, há 25 anos, que os medicamentos genéricos eram uma necessidade neste mercado. Já estávamos noutros mercados em países altamente industrializados como a Alemanha ou Reino Unido e outros, nos quais a quota dos remédios genéricos era maior. O consumo de remédios genéricos é um indicador de qualidade de vida; países que consomem mais este tipo de medicamentos são os que têm melhor qualidade de vida.
E, quando iniciaram a operação no País foi o desconhecimento a principal dificuldade que encontraram?
(Liliana Proença) Bem, tivemos de começar pelo princípio, ou seja, por sensibilizar o mercado para as diferenças de preços existentes, que advêm dos medicamentos originais passarem por um processo de pesquisa e testes que leva anos e é dispendioso, e que vai da procura do princípio activo à prova de eficiência para, depois, serem lançados no mercado com patentes que os protejam e façam rentabilizar o investimento efectuado em todo o processo. E, durante um tempo determinado pela patente, esse medicamento só pode ser produzido por aquela indústria. Depois, quando os princípios activos são tornados públicos, digamos assim, e de forma muito simplificada, existem os medicamentos genéricos. No início, este contexto era um pouco desconhecido no nosso mercado, e por isso gerava desconfiança. O mercado era feito por medicamentos originais que eram muito caros pelas razões de que falei antes. E depois havia os de origem asiática, muito mais baratos, e havia uma desconfiança da qualidade dos genéricos que começavam a aparecer. Por isso, quando aqui chegámos, e com uma aposta de longo prazo, firmámos o compromisso de vender medicamentos com elevadíssima qualidade a um preço mais justo, não muito alto e não demasiado barato.
Hoje em dia, essa questão mudou? Sem dúvida, e temos muito orgulho porque fomos os pioneiros na mudança dessa percepção para a aceitação dos medicamentos genéricos que são totalmente seguros e com qualidade, feitos com fidelidade aos medicamentos originais. Hoje em dia, já há uma percepção de que os medicamentos que vêm da Europa são seguros, independentemente da marca, e essa mensagem aqui foi semeada por nós, creio que é justo dizê-lo. O processo de entrada dos genéricos foi
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Texto Pedro Cativelos • Fotografia Mariano Silva & D.R.
“Remédios genéricos são um claro indicador do índice da qualidade de vida de um país e lideram em muitos dos mercados mais industrializados”
acompanhado pela parte médica, pelos utentes e pela classe farmacêutica. Depois, as dificuldades que as famílias têm em aceder a um bem de tanta importância como o medicamento faz com que a sensibilidade ao preço também seja grande e quando encontram uma solução mais barata aderem. Logo, este tem sido o grande sucesso dos medicamentos genéricos.
Existem necessidades específicas no tipo de medicamento que se consome em África, por exemplo?
(Paulo Barradas) Sim, existem. Em África tínhamos a percepção de que os medicamentos para doenças com dor teriam mais adesão. Mas foi uma surpresa que, desde o momento em que começámos a trazer remédios para doenças sem dor, como a diabetes, problemas cardiovasculares e outras doenças crónicas que precisam de medicamentos mais elaborados, as pessoas aderiram. Somos a empresa com maior registo nas autoridades ao nível dos pontos de vendas no País.
O mercado mudou muito em comparação com o que era há alguns anos, há cada vez mais pessoas com seguros de saú-
de, por exemplo. Como é que isso influencia o sector dos medicamentos?
(Liliana Proença) O mercado está a crescer, as pessoas têm mais conhecimento e informação. Em termos de leis e da dinâmica de trabalho, ainda estamos na mesma, não houve grandes mudanças, mas isso caracteriza o mercado dos medicamentos. Então, de forma geral, houve, sim, uma grande evolução. Os seguros de saúde vieram ajudar a população a ter um acesso mais concreto ao medicamento porque o aparelho do Estado adquire medicamentos por concurso público e disponibiliza aos hospitais, mas, com a melhoria da qualidade de vida, as pessoas procuram, cada vez mais, medicamentos no sector privado, e essas farmácias têm uma capacidade de aquisição que não tinham no passado.
Que marcas deixou a pandemia do covid-19 no vosso negócio, enquanto empresa, e enquanto sector em que actuam?
(Paulo Barradas) Trouxe duas grandes lições: a primeira é que todos somos poucos para as necessidades que o mundo tem. O mundo ficou em aflição e as parcerias entre grandes e pequenos ficaram mais evidentes. Outro ensinamento foi sobre a inovação. Muitos pensam que a inovação vem das grandes compa-
BBluepharma
A Bluepharma celebrou no dia 1 de Março o seu 22.º aniversário. Ao longo destes anos, a empresa transformou uma unidade industrial que empregava 58 pessoas e operava para o mercado português, num grupo farmacêutico de 20 empresas e que emprega mais de 800 colaboradores. Aprovada pela FDA (dos EUA) desde 2009 para o desenvolvimento de formas farmacêuticas sólidas, tornando-se na primeira empresa farmacêutica portuguesa a exportar para o mercado norte-americano, está hoje presente em 45 mercados, e em Moçambique desde 2011.
Por ocasião do seu 22.º aniversário, inaugurou uma unidade industrial para a produção de medicamentos sólidos orais de alta potência, nomeadamente na área da oncologia. O investimento ascende a 30 milhões de euros e resulta numa fábrica única em Portugal e uma das maiores da Europa.
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nhias e grandes empresas, mas na pandemia comprovámos que não é verdade. Foram pequenas empresas, como a Biontec, que trouxeram inovação ao mercado embora não o tenham feito sozinhas. A inovação vem de pequenas empresas que se associaram às grandes porque estas têm melhor capacidade financeira, têm cadeias de fornecimento globais montadas, mais rápidas e conseguem, mais facilmente, chegar ao cidadão. Esse sentido de parceria e partilha entre os pequenos e os grandes foi um ensinamento que a pandemia nos trouxe. Há um aspecto muito importante que é o da regulamentação. Temos ouvido que um medicamento, quando inventado, leva 20 anos a ser desenvolvido e testado para poder ser dado aos pacientes, um verdadeiro desalento para quem está a começar. Quando necessitamos, conseguimos fazer as coisas mais rapidamente, as vacinas foram desenvolvidas com quatro meses de pandemia, o que mostra que não precisamos de levar tanto tempo. Foi a parceria entre o público e o privado que fez esse milagre. As instâncias oficiais e legais fizeram essa ligação.
Qual é o objectivo de médio e longo prazo da empresa em Moçambique?
(Liliana Proença) A maneira como vemos o futuro é muito optimista. Vamos continuar a fazer formação porque há
muito que fazer e é essencial, tanto ao nível das farmácias como ao nível dos hospitais. Estamos a trabalhar para nos expandirmos: temos uma comitiva na Beira e Nampula. Talvez o próximo passo seja Tete. O que nós queremos é fazer crescer o mercado e justificar o crescimento da equipa comercial. Claro que há uma relação entre o desenvolvimento económico do País, e o negócio dos medicamentos, como outros. Estamos muito certos de que o continente africano é o futuro da humanidade porque se constitui de países de grande crescimento. Temos a certeza que Moçambique vai continuar no seu trajecto de desenvolvimento económico e social. (Paulo Barradas) No início da operação, transformámos uma multinacional que tínhamos em Portugal numa empresa portuguesa multinacional. E queremos crescer da mesma forma em Moçambique. Embora o mercado nacional tenha ainda uma dimensão reduzida comparando com outros em que actuamos, temos percorrido todo o País e ficamos surpreendidos quando viajamos por outras províncias, vamos a farmácias e encontramos os nossos produtos. Já estamos em mais de 100 farmácias. Temos uma parceria com a Medimpor, que nos ajudou a desbravar o mercado, e uma paixão por este sector dos medicamen-
tos, tanto em termos económicos, como também enquanto forma de ajudar o País nas condições em que está. Os primeiros dez anos da empresa serviram para criar relações, estratégias e parcerias. Os últimos dez foram para gerar confiança nos nossos medicamentos e garantir que fossem bem ministrados. Para esta terceira década, vamos continuar a apostar na formação dos nossos funcionários e colaboradores para que operem melhor e tenham mais segurança no que fazem porque a segurança traz motivação. E um outro objectivo que temos, olhando a nível do grupo, é especializarmo-nos mais... em medicamentos mais difíceis, digamos assim.
Em que aspecto?
Medicamentos difíceis são os de alta potência, muito dirigidos para o cancro, por exemplo, uma doença com elevada prevalência hoje em todo o mundo. Inaugurámos, agora, uma fábrica de medicamentos que é única em Portugal e que, esperamos, nos ajude a aproximar de encontrar soluções que mitiguem esta ameaça global à saúde e bem estar de tantos milhões de pessoas.
Estão a trabalhar com alguns remédios específicos para África?
Trabalhamos com anti-maláricos, por exemplo. O nosso objectivo é que os doentes moçambicanos, e africanos de um modo geral, não sejam tratados de forma diferente dos demais, que tenham acesso a medicamentos concebidos com as melhores tecnologias, tal como noutros países.
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“Pandemia veio mostrar que não são precisos 20 anos para fazer vacinas e que foi a parceria entre público e privado a fazer esse milagre”
especial inovações daqui
64 INVESTIMENTO
O Governo e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) decidiram colaborar na criação de um website que vai facilitar a partilha de ideias e informações entre criadores inovadores, com foco na resolução de problemas concretos das comunidades à escala nacional. Qual a sua essência?
Conheça a iniciativa de jovens estudantes que transforma resíduos em carvão e gás de cozinha
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68 70 SUSTENTABILIDADE PANORAMA
Uma Única Casa... Para Todas as Inovações!
Moçambique tem sido palco, desde há alguns anos, de uma explosão de ideias inovadoras, criadas por jovens, e com as mais diversas utilidades. Mas falta uma entidade que lhes dê força e as torne mais acessíveis, evitando que sejam subaproveitadas. Felizmente, esta fragilidade pode ter os dias contados.
O Governo, em parceria com o PNUD, está a ultimar uma plataforma online para o cadastro de inovadores. Em que consiste?
OPrograma das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) vai colaborar com o Governo moçambicano, através do seu Laboratório de Aceleração, para a concepção de uma plataforma nacional que facilite a partilha de ideias e soluções para o desenvolvimento sustentável da sociedade moçambicanacom foco nas áreas socioeconómica e ambiental. Trata-se de uma ferramenta online que pretende juntar todos os criadores.
“É um website que vai permitir que o inovador registe a sua ideia ou solução. Não é obrigatório que esteja já na fase final ou que tenha um protótipo. Basta que a ideia esteja bem estrutura-
“Geralmente, quem tem a ideia não tem dinheiro para desenvolvê-la. Então, esta plataforma será também um ponto de encontro entre a indústria, os potenciais investidores e o inovador. E depois temos a questão do conhecimento, em que prevemos incluir uma componente de formação. É dentro desta plataforma que vamos realizar uma série de eventos para fomentar e promover a inovação”, disse Alexandra Antunes.
A plataforma pertence ao Ministério da Ciência e Tecnologia, sendo que o Laboratório de Aceleração do PNUD aparece para dar suporte e assistência técnica ao projecto - que conta já com uma versão inicial, em fase de aperfeiçoamento junto dos vários actores do
da e o autor poderá ter a oportunidade de registá-la na plataforma”, explicou Alexandra Antunes, responsável pela área de mapeamento de soluções locais no Laboratório de Aceleração do PNUD, em Moçambique.
Com este procedimento, o inovador conseguirá ter acesso a uma série de benefícios. A título de exemplo, o Ministério da Ciência e Tecnologia tem estado comprometido com a protecção da propriedade intelectual, no sentido de defender os criadores. Esta será uma forma de o conseguir.
Além disso, a plataforma vai ser um ponto de encontro, não só entre os inovadores, como também entre estes e a indústria.
ecossistema de inovação. “A plataforma será lançada ainda este ano. Só não posso partilhar o endereço do website porque ainda é algo sob gestão interna, mas já temos um protótipo numa fase avançada”, apontou a responsável do Laboratório, destacando que, “neste momento, já estão registados cerca de 200 inovadores”.
Alexandra Antunes referiu ainda que um dos desafios para a implementação da iniciativa “é o facto de muitos inovadores viverem em áreas remotas, sem acesso à internet. Então, estamos a tentar perceber como é que faremos chegar a plataforma até eles. Estamos a envidar esforços junto do Ministério para tentar ultrapassar este problema”.
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TEXTO Nário Sixpene • FOTOGRAFIA Mariano Silva & Istock Photo
“Geralmente, quem tem uma ideia não tem dinheiro para desenvolvê-la. Então, esta plataforma será também um ponto de encontro entre a indústria e os potenciais investidores”
INVESTIMENTO
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A importância do Laboratório de Aceleração do PNUD
O Laboratório de Aceleração do PNUD é uma iniciativa daquela agência das Nações Unidas, lançada em 2018. Está presente em 93 países e presta apoio a mais outros 20. A ideia do Laboratório é criar uma unidade de inovação para responder de forma mais rápida a desafios complexos.
“Estamos a falar, por exemplo, das mudanças climáticas, da empregabilidade dos jovens e da transformação digital. O que vemos é que os problemas que os países enfrentam estão a ficar cada vez mais complexos”, referiu Alexandra Antunes.
Nesta unidade de inovação, o trabalho começa pelo ponto de vista da comunidade, seguindo-se uma fase de investigação. “Existem soluções práticas que as comunidades vão adoptando para mitigar os efeitos dos desastres naturais”, por exemplo.
“Tentamos identificar estas práticas e depois fazemos um mapeamento no qual envolvemos a comunidade”, explicou a responsável.
Os métodos de trabalho do Laboratório estão centrados nos residentes, aos quais se juntam organizações e o Governo local para discutir o problema, procurando identificar as barreiras, as oportunidades existentes e as soluções que têm sido aplicadas. “Como é que podemos ter alternativas de serviços e produtos financeiros no meio rural? Como diminuir o desemprego juvenil e fomentar a empregabilidade? Como garantir o acesso a cuidados de saúde usando a inovação ou a tecnologia? Inovação não é meramente tecnologia, mas pode ter uma componente tecnológica ou não”, esclareceu Alexandra Antunes.
A responsável avalia positivamente o desempenho do Laboratório de Aceleração, por entender que não impõe soluções às comunidades, mas faz com que estas as procurem. “O que tentamos fazer é analisar as diferentes soluções que se encontram nas comunidades e partilhá-las com outras que enfrentam o mesmo problema, mas só depois de se fazer um estudo profundo”, apontou.
No final é apresentada “uma determinada solução à entidade competente, para fazê-la entender que pode resolver o problema numa determinada perspectiva ainda melhor”, demonstrando as vantagens em replicar boas ideias. “Geralmente, depois do mapeamento das soluções locais, vemos quais as mais adequadas e aí fazemos uma experiência”, acrescentou.
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INVESTIMENTO
Forte intervenção nas renováveis
O Laboratório de Aceleração trabalhou durante dois anos na área das energias, no sentido de estimular as comunidades rurais a usar outras fontes, em vez do carvão feito à custa do abate de árvores e vegetação. Neste contexto, foram feitos vários estudos em diálogo com entidades públicas e privadas, bem como com as comunidades.
Foi identificada como principal barreira o facto de os residentes “não terem acesso formal a fontes de rendimento, pois vivem em zonas remotas, com pouco acesso aos centros urbanos. Isso faz com que seja mais barato usar a madeira e o carvão”, explicou Alexandra Antunes.
Como estratégia, o PNUD sensibilizou as comunidades para o benefício
do uso de gás de cozinha, como forma de travar a desflorestação - e, mesmo assim, não foi fácil, pois esta questão não se afigura como prioritária. Com o tempo, as comunidades foram aderindo à ideia.
Perceberam que, antes, bastava caminharem durante dez minutos para encontrar uma árvore para fazer o carvão, mas agora têm de andar muito mais, devido ao impacto da desflorestação. “Então, trabalhámos com estas comunidades e fizemos uma experiência muito interessante no sentido de estimular a adopção do gás doméstico como meio para cozinhar”, apontou.
Para Alexandra Antunes, Moçambique tem muito potencial na área da inovação. “Olhando para Moçambique e para a população, vejo que há muitos jovens, o que significa que o potencial de criatividade está lá. Agora, falta dar-lhes apoio para que possam colocar em prática as suas ideias”, concluiu.
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Os métodos do Laboratório estão centrados nos residentes, aos quais se juntam organizações e o Governo local para discutir o problema, procurando identificar as barreiras, as oportunidades existentes e as soluções
Transformar Lixo em Carvão e Gás. Um Teste aos Limites da Inovação
Muitos empreendimentos estão a orientar-se para a sustentabilidade, em busca de respostas para desafios críticos do nosso tempo, desde os ambientais aos económicos. Um grupo de estudantes moçambicanos mostra um projecto com o qual ambiciona fazer a diferença
Embora o carvão seja uma fonte de energia crucial desde o século XIX, nas últimas décadas a sua utilização tem vindo a ser questionada e, em muitos casos, abandonada, devido aos seus elevados custos ambientais, sociais e climáticos. É que a combustão do carvão é uma importante fonte de emissões de gases com efeito estufa, contribuindo para as alterações climáticas e para o aquecimento global. Além disso, a poluição que provoca afecta a qualidade do ar e a saúde humana, causando problemas respiratórios e cardiovasculares. Os organismos ambientais globais esforçam-se em desincentivar a sua produção, numa altura em que se intensificam as estratégias de descarbonização até 2050.
Pensando nestas questões, um grupo de estudantes finalistas da Universidade Eduardo Mondlane (UEM) e da Universidade Pedagógica de Maputo (UP-Maputo) desenvolveu um projecto que se apresenta como inovador e sustentável. Intitulado “Construção de boas práticas, resiliência climática e desenvolvimento comunitário”, consiste na produção de um tipo de carvão ecológico e de gás doméstico com base em resíduos sólidos e estrume de gado bovino.
Sensibilizar comunidades e reciclar resíduos
O grupo propõe um novo tipo de combustível designado de carvão ecológico que consiste em produzi-lo de forma ecologicamente correcta, respeitando o meio ambiente desde a obtenção da matéria-prima até ao produto final, sem desmatação. Neste caso, os estudantes aproveitam materiais como papel, bagaço de cana-de-açúcar e de coco, cascas de amendoim, de arroz e serradura da madeira.
O grupo, que ainda não dispõe de material tecnológico eficiente, decidiu apresentar a ideia às comunidades do distrito da Manhiça, na província de Mapu-
to, onde o projecto foi bem recebido e está a revolucionar a produção e comercialização de carvão. “Primeiro fazemos um processo de recolha da matéria-prima, que são os resíduos sólidos, com a participação da comunidade”, que os deposita nos ecopontos, locais criados pelo grupo para a deposição do lixo. “Posteriormente, seleccionamos o material que pode ser útil, que vai passar por um processo de descarbonização - eliminação das substâncias tóxicas e poluentes. Depois, submetemo-lo a um processo de trituração, que torna o material completamente fino. O passo subsequente é unir o composto. Por fim, o produto é exposto ao sol, e, dependendo da temperatura, leva um a três dias a estar pronto”, explicou Michaque Mota, um dos membros do grupo que criou o projecto.
Numa fase inicial, a actividade está focada na sensibilização e formação das comunidades, escolas primárias e estabelecimentos penitenciários. Michaque Mota contou à E&M que trabalha com 13 localidades do distrito da Manhiça, onde as famílias já conseguem produzir o seu próprio carvão ecológico e comercializá-lo através das técnicas leccionadas.
O projecto trabalha com o estabelecimento penitenciário do distrito da Manhiça e já teve a oportunidade de ensinar os reclusos a produzirem carvão ecológico e assim desenvolverem boas práticas ambientais, adquirindo uma noção de empreendedorismo baseado num projecto concreto.
Como produzir gás para uso doméstico?
O projecto abraçou também a oportunidade de inovar através do estrume de gado bovino. Usando esta matéria-prima, os estudantes conseguiram produzir gás que já está também a ser aproveitado pelas famílias e comunidades. Neste projecto, estão envolvidos os criadores de gado, que têm apostado na iniciativa e colaborado com o grupo. Tudo assenta
na fermentação anaeróbica num tanque, um processo que degrada a matéria orgânica pela acção de micro-organismos, na ausência de oxigénio. Este processo resulta na formação de biogás (composto de metano e dióxido de carbono) e de um líquido efluente, utilizado como fertilizante, por conter minerais e nutrientes ricos para o solo e plantas na agricultura. Outro aspecto que interessa ao grupo é a inclusão das mulheres e raparigas neste processo. Muitas têm conseguido fabricar e comercializar o seu próprio carvão, apoiando a sua emancipação.
De acordo com Ediménio Uqueio, outro membro do grupo, o projecto serve igualmente como oportunidade para jovens desempregados, contribuindo para os afastar do consumo de drogas, excesso de álcool e prática de crimes. “Temos o plano de levar esta ideia ao maior número possível de jovens, para que possam ter uma boa ocupação, empreender, gerar rendimento familiar e, principalmente, ajudar a combater o consumo de drogas”, realçou Uqueio.
O sonho de construir uma fábrica
O projecto está a ser implementado em vários pontos do País e em diferentes sectores de actividade. Além da província de Maputo, a iniciativa já se estendeu à província de Gaza. “O nosso maior sonho é conseguir produzir em escala industrial, com técnicas mais aprimoradas e assim gerar vários postos de trabalho. Acreditamos que podemos contribuir para o desenvolvimento da economia local, conservação e preservação do meio ambiente”, sublinhou Mota.
O grupo ainda não considera o seu projecto como um substituto do carvão vegetal, mas acredita que com a construção da almejada fábrica será possível apostar mais neste modo de produção ecológico e proteger o meio ambiente dos impactos negativos criados pela produção tradicional do carvão.
www.economiaemercado.co.mz | Setembro 2023 68 SUSTENTABILIDADE
TEXTO Ana Mangana • FOTOGRAFIA D.R.
BPROJECTO
Produção de carvão ecológico e gás doméstico
CRIAÇÃO
Fevereiro de 2023
MEMBROS
PLATAFORMA
10
ABRANGÊNCIA
Províncias de Maputo e Gaza
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Ciência
Implante cerebral devolve movimentos e sensações a homem tetraplégico
Nos Estados Unidos, um homem tetraplégico de 45 anos recuperou alguns movimentoas das mãos e alguns estímulos sensoriais após receber um implante cerebral. Mesmo com o aparelho tecnológico desligado, foram identificadas melhorias duradouras, como a recuperação parcial do tacto.
Através de um procedimento inovador, os investigadores do Northwell Health’s Feinstein Institutes for Medical Research conseguiram reconectar electronicamente, com a ajuda de algoritmos de Inteligência Artificial (IA), o cérebro, o corpo e a medula espinal do paciente Keith Thomas, um dos poucos seres humanos a experimentar uma tecnologia movida pelo “poder do pensamento”.
Com a ajuda dos chips, o paciente liga-se a um computador que utiliza a IA para ler, interpretar e traduzir os seus pensamentos – mais precisamente, a actividade dos seus neurónios. A recente forma de “controlo” dos braços é conhecida como terapia dirigida pelo pensamento.
Tudo começa quando o doente pensa em apertar a mão para apanhar um objecto, o que gera actividade neuronal. A acção envia sinais eléctricos do implante cerebral para um computador e este envia sinais para eléctrodos altamente flexíveis e não invasivos que são colocados sobre a coluna vertebral (medula espinal) e nos músculos da mão.
Paralelamente, minúsculos sensores na ponta dos dedos e na palma da mão enviam informações sobre o tacto e a pressão para a área sensorial do cérebro. A combinação de todos estes estímulos faz com que o paciente seja capaz de agarrar o objecto que deseja, sentindo o toque.
Telecomunicações Fibra óptica por cabo submarino chega ao Norte de Moçambique
A operadora de telecomunicações Vodacom anunciou a chegada do primeiro cabo submarino de fibra óptica ao norte de Moçambique, mais concretamente na cidade de Nacala, em Nampula.
A operadora refere que o chamado ‘2Africa’, o maior sistema de cabos submarinos de telecomunicações do mundo, que depois de Maputo chega à cidade de Nacala, liga a fibra óptica ao novo centro de dados também inaugurado localmente pela Master Power Technologies.
Com esta ligação, pretende-se garantir o apoio ao crescimento da economia digital no País. O projecto deve-
rá ligar 33 países, sendo 19 em África, com maior capacidade de internet e conectividade acelerada para os clientes da Vodacom. Prevê servir 3 mil milhões de pessoas quando estiver em pleno funcionamento, em 2024, num comprimento total de 45 mil quilómetros e uma largura de banda de 115 terabytes.
O cabo submarino ‘2Africa’ interliga Europa (com ligações em Portugal e Reino Unido), África (Senegal, Gana, Angola, África do Sul, Moçambique, Somália, Egipto, entre outros) e Ásia (Iraque, Irão, Paquistão, Índia, entre outros), num total de 46 pontos e regressa ao continente europeu através de Itália e França.
Digital Moçambique vai iniciar tributação de transacções comerciais digitais
A Autoridade Tributária (AT) vai iniciar, este semestre, a fase piloto da tributação de transacções comerciais realizadas através de canais digitais, com o objectivo de melhorar o controlo dos rendimentos gerados em Moçambique.
De acordo com Amorim Ambasse, coordenador da Unidade de Tributação da Economia Digital (UTED) da AT, a ideia pretende, igualmente, criar mecanismos para arrecadar mais receitas para os cofres do Estado.
O plano de tributação da economia vai intermediar a cobrança de impostos através de carteiras móveis, como as dos operadores de telefonia no País. Trata-
Startups
-se de um novo paradigma para Moçambique e vários outros países em África e na Europa. E, na visão da AT, esta tributação, para o consumo e rendimentos, não vai duplicar as cobranças, dado que o comércio digital, muitas vezes, envolve vários países.
Para já, o capital humano capacitado para implementar o projecto é de 41 pessoas, incluindo gestores da UTED, com perfil de analista de sistema, auditores e contabilistas.
Contudo, o quadro legal ainda carece de actualização para acomodar a incidência dos impostos sobre os serviços digitais, entre outros.
Startup Portugal e Djassi promovem participação de startups africanas na Web Summit
A Startup Portugal e a organização não-governamental Djassi Africa assinaram um acordo que vai dar a 15 startups ligadas a África a possibilidade de participarem na Web Summit, ao abrigo do programa Road 2 Web Summit que vai decorrer em Lisboa de 13 a 16 de Novembro deste ano.
Com o acordo, as duas empresas pretendem promover a inclusão, diversidade e impacto social das startups africanas. “Trata-se de uma parceria que quer facilitar a identificação de projectos empresariais de empreendedores sub-representados, incluindo os de origem africana, afro-descendentes, cidadãos de paí-
ses africanos e outros grupos”, lê-se numa nota divulgada pelas duas empresas.
O acordo tem a colaboração estratégica da Bantumen, uma publicação online focada na cultura da lusofonia e marca um passo importante para a concretização dos objectivos de responsabilidade social da Startup Portugal, nomeadamente no âmbito da promoção da inclusão, diversidade e impacto social.
A Startup Portugal é uma organização que visa fortalecer e expandir a sua acção na identificação e selecção de projectos para os seus programas de incentivos e políticas públicas de apoio ao empreendedorismo e inovação.
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PANORAMA
ócio
74 76 77 80 82 78
ESCAPE
EUA
Continua a aventura pelo fascinante Oeste americano
GOURMET Kuxuva Ao sabor da gastronomia de Goa em Maputo
ADEGA ‘Detalhe’
A nova marca de vinhos que conquistou um prémio de excelência
EMPREENDER
Bongani Cigars
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ARTES
Escultura O percurso da célebre artista moçambicana
Reinata Sadimba
VOLANTE i7 da BMW Conheça o novo e luxuoso BMW à prova de bala
(neg)ócio s.m. do latim negação do ócio
A primeira marca de charutos made in Moçambique v
João Tamura nasceu em Lisboa, nos anos 1990. É músico, poeta e fotógrafo. Partiu, em Setembro de 2022, numa viagem sem data de regresso ou destino definido. Tem documentado a sua jornada através de crónicas, numa simbiose entre as suas linguagens predilectas - a prosa e a fotografia analógica - que tentam ao máximo transportar o leitor para os longínquos lugares pisados pelo autor.
O Oeste Americano (II)
O lugar do cinema, da televisão, da música. O lugar familiar onde nunca estivemos. Seguimos em Los Angeles e rumo a Las Vegas.
Em poucas décadas, Los Angeles expandiu-se desmedidamente, até esbarrar nas suas fronteiras naturais: as montanhas, o deserto e o oceano.
A Califórnia tornou-se sinónimo do American Dream e todos ambicionavam morar na american suburbia, de infinitas moradias unifamiliares, jardim e garagem, somente interrompidas pelas lojas de grandes cadeias e restaurantes de fast food, tão comuns por aqui.
O carro tornou-se um bem indispensável, a cidade perdeu a sua pedonalidade e a sua rede de transportes públicos nunca conseguiu satisfazer as necessidades da população.
eVivem aqui mais de doze milhões de pessoas e não será mais uma faixa de trânsito ou uma nova auto-estrada que solucionarão os
seus problemas de locomoção. Parados no trânsito, rapidamente se abate sobre nós o saudosismo da metrópole asiática, onde o metro passa a cada dois minutos e eficientemente nos transporta a qualquer canto da cidade. LA tem várias características únicas, mas nenhuma mais fascinante que a diversidade da sua população. A cidade é um melting pot como nenhum outro, onde coexistem as mais diversas culturas, religiões e nacionalidades.
Com o maior número de mexicanos fora do México, de samoanos fora do arquipélago de Samoa e de coreanos fora da Coreia, LA é dos lugares mais multiculturais do planeta. O que daí origina? O mundo inteiro nestes quatro mil quilómetros quadrados. Koreatown, Little Tokyo, Little Armenia, Thai Town, Chinatown, Little Ethiopia, Filipinotown, El Pueblo...
Cada um destes bairros tem a sua própria cultura e identidade, fazendo-nos crer que não estamos na Califór-
nia, mas nalgum outro lugar do globo. E a gastronomia destes bairros? É incrível! O melhor pad thai que já comi fora da Tailândia? Thai Town! O melhor sushi fora do Japão? Little Tokyo!
Os melhores dumplings fora da China? Chinatown! Passamos os dias a percorrer os imensos bairros da cidade, a conhecer a história das suas comunidades e a visitar os locais dos nossos filmes e videoclipes favoritos: o banco de 500 Days of Summer, o Griffith Observatory de La La Land, Mulholland Drive de... bem, Mulholland Drive, a ponte de Sixth Street de Terminator e Long Beach de inúmeros videoclipes de Vince Staples e de Snoop Dogg.
Voltando à gastronomia… cheat day? Talvez cheat week seja o mais correcto… o frango com waffles do Roscoe’s, os dónutes do Randy’s, os hambúrgueres do Chick-fil-A e do Shake Shack, os doces do Cheesecake Factory… não há como resistir.
Museus? Existem dezenas e são alguns dos melhores que já visitei. Interesse por Belas Artes? LACMA, MOMA, Getty Center são imperdíveis. Interesse por história? Museu do Holocausto, Museu de História Natural e o California African American Museum merecem uma visita.
Há demasiado para fazer em Los Angeles: demasiada arte, demasiado entretenimento, demasiadas galerias, cinemas, exposições e concertos, demasiadas culturas e subculturas. Precisamos de mais dias aqui: passou uma semana e sentimos que ainda mal conhecemos a cidade e as suas pessoas… mas é altura de partir.
De Los Angeles a Las Vegas são 300 milhas (482 quilómetros), cinco horas. Partimos após a chegada da noite, de maneira que evitemos o trânsito. O deserto está mais perto que o esperado e, aos poucos, a cidade começa a
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EUA
desvanecer: desaparecem os restaurantes e os parques de estacionamento; depois, as casas e os campos de futebol; e, finalmente, os carros.
Os faróis iluminam o alcatrão e somos só nós e a estrada - ninguém à nossa frente, ninguém atrás de nós. A noite despe-se dos tons laranja das luzes da metrópole e voltamos ao breu e às estrelas que o interrompem.
Desaparecem todos os sons, menos o constante rumor do motor e é este que nos mantém na linha fina entre o road movie (8) romântico e o filme de terror. Estrada e mais estrada.
Os ponteiros avançam e fazemos de tudo para nos mantermos acordados até que, abruptamente, as luzes de novo. Luzes como nunca vi, mais coloridas e intensas do que em qualquer outro lugar, como um resplandecente oásis a meio do deserto, como algo entre o sonho e a realidade. Las Vegas.
Também aqui, o mundo inteiro. No entanto, não em bairros que preservam a cultura dos lugares distantes de onde os seus habitantes são provenientes, como em Los Angeles, mas sim em casinos e resorts que, ao longo desta gigantesca avenida, mimicam os mais emblemáticos locais do globo: os canais de Veneza, Nova Iorque e a Estátua da Liberdade, o Arco do Triunfo e a Torre Eiffel, o Coliseu de Roma e a Fonte de Trevi.
Caricato? Sim. Curioso? Também. O que sei sobre Las Vegas? A famosa trilogia de Soderbergh, “Fear and Loathing in Las Vegas”, “Panic! at the Disco”, e pouco mais. Mas é assim que prefiro um lugar: com mais a desbravar e a descobrir. E o que acontece em Vegas, fica em Vegas… Portanto, o melhor é ficarmos por aqui.
O Oeste americano: a última fronteira, o lugar do sonho. O lugar do cinema, da televisão, da música. O lugar familiar onde nunca estivemos
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Texto João Tamura
Fotografia João Tamura & D.R.
Endereço:
1019 Av. dos Mártires da Machava, Maputo Horário: Quinta-feira a Domigo das 10h00-18h00
Telefone: 85 725 9885
um antigo restaurante de uma família goesa, que muitos em Maputo conheciam como “O Petisco”, dentro da antiga residencial Hoyo Hoyo, ganhou nova vida, dinâmica e um novo nome também, mas com o sabor (e saber) de sempre. Gabriela e a mãe, Ninette Pinto Lobo, mantêm a tradição e os paladares da típica cozinha de Goa, resultado de influências seculares que se misturam com a história daquela região indiana.
Por isso, um dos exemplos maiores dessa quase filosofia gastronómica, se podemos chamar-lhe assim, é o famoso vindaloo que, na verdade, deriva da bem portuguesa carne em vinha de alhos, geralmente oriunda do porco.
Ou aquela que é, talvez, a receita mais emblemática de Goa, o Sarapatel, que também encontra a sua origem remota no Norte de Portugal, embora aqui, nesta extensão de Goa que cresceu num jardim no coração de Maputo, ele seja trajado com o toque original da identidade goesa, intimamente ligado às memórias e afectos familiares. Não há goês que não o reconheça, claro, mas não é preciso ser de lá para apreciar este prato confecciona-
A Casa da Saudade Apaziguada
do a partir das miudezas de porco, borrego ou cabrito, e que terá surgido nas comunidades de cristãos-novos de Portugal que lhe chamavam, surpreenda-se, ‘Papas de Sarrabulho”.
Na gastronomia, histórias como estas não são raras, se pensarmos na maioria dos pratos que conhecemos e gostamos, feitos, muitos deles, com o ingrediente principal da mistura secular entre povos e saberes, percebemos como haverá qualquer coisa de visceral, quando se viaja pelo espaço e o tempo, através do paladar. Porque reencontramos os sentidos, e regressamos a nós.
No Kuxuva, não é só o alimento que ganha vida graças às receitas que a dona Ninette prepara, herdadas da mãe que as recebeu, ainda menina, da avó, num encadeado temporal que é, na verdade, a sua história contada sobre a mesa, cozinhada pela herança geracional de uma família, e de um povo inteiro. Reabriu em Novembro de 2022, baptizado com um nome carregado de emoção, “Kuxuva” que em Xichangana significa saudade. Gabriela explica-o.
“A minha irmã é que começou este projecto, estava eu ainda na Alemanha onde vivia há décadas. Depois, quando ela partiu, eu regressei a Moçambique para vir ajudar a minha mãe a continuar com esta, que sempre foi a nossa casa”, explica.
É ali, na casa da saudade, e lugar da família desde que, há mais de um século, chegaram a Moçambique oriundos de Goa, que se desfia o entrelaçado da memória que se sente logo desde o portão da entrada. Imerso num jardim que abriga um silêncio pouco encontrado em Maputo, o Kuxuva é o lugar para partilhar uma refeição em família ou entre amigos, sem tempo nem horas marcadas, dando voz, lugar e momento aos sentidos. “Quando as pessoas se sentem bem ao provar a nossa comida sinto o meu coração a pular, acelerado, como se estivesse apaixonada. Faz-me bem que saiam com as barrigas cheias e felizes”.
Por ali, na atmosfera, ainda navegam as poeiras dos caris de Goa, esbatidos em temperos, como o louro, o gengibre, o cravinho e os outros, que Ninette não revela porque estão guardadas no cofre metafórico dos “segredos de família”, diz, a sorrir, e que são ali batidos num almofariz de pedra antiga, sendo depois levados à brasa para ganhar tosta. Ao lado, na mesa,
no Sabor do Saber
os chutneys de tâmara, manga, limão e gengibre, e piri-piri, deixam-se submergir por chamuças de carne ou galinha.
Na ementa (onde também há pratos não goeses e alguns, até, tipicamente moçambicanos), se o sarapatel é obrigatório, o caril de camarão ou caranguejo desfiado acompanhado com arroz bazmati é incontornável. E ainda há outras preciosidades da gastronomia goesa, como o chacuti de cabrito, e as sanãs (ou bolinhos de sura, que também reconhecemos de Moçambique). Os vegetais que acompanham os pratos, são colhidos ali mesmo na machamba da casa, para garantir que a viagem é breve e chegam à mesa frescos e saudáveis.
E para sobremesa, o doce das dez camadas que apazigua, num pequeno prato, ovos, farinha e muito açúcar, numa ligação nem sempre doce entre Portugal, Índia e, porque não, Moçambique. É um trato de amor e um pacto de perseverança que, empratado camada sobre camada, nos revela as histórias de muitas vidas que podiam ser a nossa. E, porque não, também a sua. Saboreie e veja se não é assim.
Texto Pedro Cativelos Fotografia Mariano Silva
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KUXUVA g
O antigo “Petisco” ganhou uma nova vida, mas não esqueceu a sua longa história, talvez o melhor tempero do que por ali se pode saborear
O Detalhe Que Conquistou o Prémio Excelência numa Gala de Vinhos
a adega cooperativa do cartaxo, fundada em 1954, por um grupo de 22 associados proveniente de uma região com uma forte tradição vitivinícola, lançou recentemente uma nova marca de vinhos de mesa designada Detalhe.
Diz a marca que o produto - disponível nas versões de reserva branco e tinto - sur ge pela necessidade de continuar a proporcionar vinhos de qualidade superior, focados no momento de degustação, especialmente quando acompanhado de saborosas iguarias gastronómicas.
A Adega do Cartaxo leva como assinatura da marca a frase “É dos Detalhes que nascem os grandes vinhos”, com o intuito de evidenciar todo o ritual de vinificação, o que no fun do é um elogio a todos os momentos e etapas para a elaboração destes vinhos, desde a vi nha até à garrafa.
As duas versões do Detalhe já chamaram para si a atenção dos apreciadores. A Reserva Branco de 2021 já conquistou o mais prestigiado prémio na Gala dos Vinhos do Tejo de 2023, decorrida em Junho.
Detalhe Branco 2021 do Tejo
Foi lançado apenas em Março, mas já mostrou a força e o potencial que carre ga e entrou no mercado competitivo para demarcar o seu lugar: a primeira edi ção do Detalhe Reserva Branco conquistou, recentemente, o Prémio Excelência na Gala de Vinhos do Tejo, elevando a Adega do Cartaxo ao estatuto de melhor entre as melho res adegas da região.
Elaborado a partir das castas Verdelho e Sauvignon Blanc, este vinho revela boa intensidade aromática, destacando frutos tropicais, especialmente abacaxi e manga, deixando uma nota vegetal que remete para espargos.
O estágio em barrica confere-lhe estrutura e complexidade, contribuindo para um sabor envolvente, untuoso, de perfil frutado e bela acidez. Deixa um final de boca prolongado e apelativo. Esta versão é óptima para harmonizações gastronómicas, acompanha bem pratos de peixes gordos no forno ou na grelha e carnes brancas.
Detalhe Reserva Tinto 2019 do Tejo
Esta versão é elaborada a partir das castas Touriga Nacional, Ali cante Bouschet, Syrah, Merlot e Cabernet Sauvignon, originárias de vinhas de natureza argilo-calcários. Esteve dez meses em barricas de carvalho francês e posteriormente usufruiu de um estágio de no ve meses em garrafa. As suas maiores características provadas in cluem a intensidade aromática, boa presença de notas de frutas, em especial frutos vermelhos e silvestres bem maduros, uma frescu ra que remete para apontamentos de menta, especiarias finas e baunilha.
Na boca revela bom corpo e volume, excelente acidez e frescura, aprimorada pelas notas de eucalipto, boa intensidade, taninos aveludados e boa persistência no final.
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A Adega do Cartaxo leva como assinatura da marca a frase “É dos Detalhes que nascem os grandes vinhos”, com o intuito de evidenciar todo o ritual de vinificação. É um elogio a todos os momentos e etapas para a elaboração destes encantos.
Bongani
A Primeira Marca
de Charutos em África... 100% Made in Mozambique
Quando pensamos em charutos, são inevitáveis as imagens de Cuba ou da República Dominicana e de figuras como Churchill, Fidel ou Hitchcock, inseparáveis nos retratos que deixaram, do charuto a fumaçar. São retratos colectivos de todo um imaginário construído ao longo de anos, e que pouco, ou mesmo nada, têm que ver com África.
No entanto, nunca é tarde para desenhar novas memórias. E este produto de luxo, que habitualmente associamos à América Central onde, diz a mitologia, é enrolado manualmente entre as coxas de uma anciã cubana, começou agora a ser produzido em Maputo, na zona da baixa da cidade, paredes meias com a Avenida 25 de Setembro.
É ali que, desde 2016, são enrolados os Bongani Cigars, um produto premium moçambicano, actualmente comercializado em mais de 200 pontos de venda de todo o País (em espaços de diversão nocturna, à unidade, retalho de bebidas, hotéis, lodges de luxo, aeroporto) e fora do País, com presença na África do Sul, Costa do Marfim, Nigéria, Suíça e Estados Unidos. Chegou a estar à venda no Quénia, mas a marca abandonou o mercado por ser muito burocrático e caro.
A Bongani, palavra que significa “ser grato” em zulu, surge como fruto de curiosidade e diversão de Kamal Moukheiber, um ex-banqueiro de investimentos britânico. Como diz Kamal, “muitas boas coincidências aconteceram e houve sinais do potencial deste negócio desde o seu início, tanto que eu fiz disto o meu trabalho a tempo inteiro”.
Kamal explica que o sucesso da Bongani não surgiu por coincidência. “Os charutos são, em muitos casos, para pessoas que gostam de se parecer com pessoas bem-sucedidas e há essa associação, entre o charuto e o sucesso. O que faz dos mercados com maior poderio financeiro os nossos principais alvos.
Depois, há o factor de ser o primeiro charuto feito em África, um produto de luxo, de qualidade, feito aqui, e isso é algo imbatível pela concorrência, porque as pessoas estão interessadas em experimentar produtos africanos, não querem apenas consumir produtos importados de outros lugares”.
“Faz muito sentido” ter produção local Mas como se faz, afinal, um charuto moçambicano? “Na essência usamos uma mistura de folhas de tabaco nacional e de importação. A folha utilizada para enrolar o charuto provém dos Camarões, que já fornece alguns dos melhores charutos cubanos, e da República Dominicana. A caixa de madeira, em sândalo, é feita na China.
O trabalho é inteiramente manual e 100% nacional. Demora quase um ano até alguém estar preparado para enrolar charutos com a qualidade exigida”, conta Kamal e acrescenta que “África, e Moçambique mais especificamente, há muito que
produz tabaco de primeira qualidade. Faz muito sentido desenvolver as habilidades localmente e ter produção em Moçambique, em vez de enviar a matéria-prima para outro lugar”.
Com a pandemia do covid-19 e as restrições por ela impostas, a Bongani Cigars teve alguns constrangimentos. “A nossa cadeia de fornecimentos tornou-se muito difícil e cara, o negócio desacelerou e tivemos períodos em que fechámos completamente.
No entanto, nunca perdemos o pagamento de um salário e conseguimos ter uma equipa e negócios mais fortes”, assegura. Nos últimos anos, a Bongani vin-
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cou a sua presença no mercado, com a visão de criar produtos (exclusivamente charutos) de alta qualidade em África, que requeiram mão-de-obra altamente qualificada, e exportar para todo o continente, tendo como base o mercado local. “Actualmente, o mercado de charutos em Moçambique está muito activo e há muitos aficcionados. O próximo passo da Bongani é fortalecer a sua presença em mercados maduros, como a Suíça e os EUA”, finalizou.
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“É o primeiro charuto feito em África, um produto de luxo, de qualidade, feito aqui. Isso é algo imbatível pela concorrência, porque as pessoas estão interessadas em experimentar produtos africanos.”
mpreendedor
TEXTO Pedro Cativelos e Filomena Bande FOTOGRAFIA Jay Garrido & D.R.
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ESCULTURA E CERÂMICA
A mais recente exposição da Reinata Sadimba teve lugar em Maputo
não se pode falar da arte em moçambique sem se mencionar o nome de Reinata Sadimba, a escultora e ceramista conhecida mundialmente pelas obras de arte com formas antropomórficas (com traços humanos), umas agradavelmente estranhas, outras bastante excêntricas. Nasceu em 1945, numa família de camponeses em Cabo Delgado, distrito de Nemu, região da etnia maconde, como mostram as tatuagens verdes no seu rosto, feitas à faca, uma marca de identidade da sua cultura.
Aprendeu a trabalhar o barro mesmo no seio familiar. Inicialmente, fabricava objectos de uso doméstico,
“O Barro é Como se Fosse Meu
sem mesmo pensar na possibilidade de os comercializar. Despertou para a possibilidade de explorar comercialmente os seus produtos graças a um grupo de turistas que naquela altura visitou a aldeia.
“Os turistas viram-me trabalhar o barro, apreciaram os objectos que eu fabricava, que no caso eram panelas, e pagaram por cada uma delas um valor que correspondia a cerca de mil meticais.
Foi aí que percebi que podia ganhar dinheiro por isso”, disse a “mamã” Reinata, como é
carinhosamente tratada, com um tom de orgulho notável, ao pronunciar as palavras em xi-makonde, sua língua natal, da qual não se despega.
Depois de descobrir a possibilidade de comercializar os produtos que fabricava, e tendo perdido o pai muito cedo, Reinata usou a sua aptidão para comparticipar as despesas familiares. Além de objectos utilitários, virou-se para a arte, vendendo as peças em Mueda, uma das mais importantes sedes de distrito, no interior da província, onde chegou a residir.
A guerra e a evolução na Tanzânia Com a guerra civil em Moçambique, de 1976 a 1992, Reinata migrou para a vizinha Tanzânia à procura de abrigo. Lá desenvolveu novas técnicas de modelagem e cozimento para melhor trabalhar o barro.
Regressou ao País pela mão do Governo moçambicano, para que a arte moçambicana fosse valorizada, juntamente com outros artistas proeminentes da altura, entre os quais o renomado pintor Ma-
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Marido”
langatana, já falecido. Reinata passou a residir na cidade de Maputo, com atelier sediado num espaço do Museu de História Natural, onde funciona até aos dias que correm. Continuou a desenvolver os seus trabalhos e a ser cada vez mais valorizada em Moçambique, por toda a África e além.
Actualmente é considerada uma das artistas femininas mais importantes do continente africano. Já expôs as suas obras em vários países como Bélgica, Suíça, Portugal, Dinamarca, Itália, África do Sul e Tanzânia. Tem trabalhos em colecções de várias instituições nacionais e internacionais.
Nova exposição: “Quem Somos”
Reinata revela que vive da arte, embora já não seja tão rentável como antes. Recorda-se de dias em que “fazia muito dinheiro com as obras”. A baixa rentabilidade da actividade artística não é, entretanto, um crivo para a sua criatividade e nunca a fez pensar em recuar ou aposentar-se.
“Vou dedicar-me à arte todos os dias da minha vida, não penso nunca em parar, vou trabalhar nisto até ao dia em que morrer. O barro é como se fosse meu marido, vou dedicar-me sempre a isto”, expressou mamã Reinata, mostrando com orgulho as mãos “pintadas” de barro.
Passadas décadas de actividade artística e aos 78 anos de idade, Reinata Sadimba continua a trabalhar activamente com o barro. Recentemente, a 9 de Agosto, inaugurou a exposição “Quem Somos”, na Fundação Fernando Leite Couto. Trata-se de uma colectânea de 40 obras nas quais a ceramista reflecte sobre a essência da existência humana (quem somos, de onde viemos e para onde vamos) e narra, através das suas esculturas em barro e grafite, o quotidiano das sociedades moçambicanas.
TEXTO Filomena Bande FOTOGRAFIA Mariano Silva & D.R.
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É considerada uma das artistas femininas mais importantes do continente africano. Já expôs as suas obras em vários países.
Modelo: BMW
Protection
Motor: Eléctrico
Potência:
400 Kw (544 cv)
Um Carro ou Um Tanque?
A BMW, fabricante alemã de automóveis, divulgou recentemente o seu primeiro carro feito para ter segurança máxima. Designado por “Protection”, o veículo oferece resistência a explosões e um tanque de combustível vedante, para evitar perda de combustível, entre outros detalhes.
O veículo da linha i7, versão eléctrica lançada no dia 20 de Abril de 2022, ganhou na recente versão Protection uma carroçaria de aço, blindada, reforçando as portas, a parte inferior e o tecto.
vDe acordo com a BMW, estes Série 7 oferecem protecção máxima contra balas, ataques de drones, granadas de mão e explosivos, possuindo vidros protectores com classificação VPAM 10 – o mais alto que um veículo de protecção civil pode ter. Além da componente de
Conheça o Novo BMW à Prova
protecção, este BMW leva um conjunto de pneus de 20 polegadas que têm um anel run-flat que permite uma condução até cerca de 80 km/h quando os pneus ficam sem ar. Entretanto, todas as alterações fizeram, obviamente, com que este i7 perdesse performance.
A BMW não revelou o peso total do veículo, mas a versão 100% eléctrica faz agora mais de nove segundos dos 0 aos 100 km/h, enquanto o modelo normal cumpre esta distância em menos de cinco.
Considerando que a capacidade da bateria do i7 é de 101,7 kWh, podemos estimar que o seu alcance seja de cerca de 338 km – bem abaixo da versão regular do i7 M70, que possui alcance estimado de 475 km. O fabricante alemão procurou
de Bala
manter as protecções bem minimalistas, de modo que os únicos elementos visuais notáveis são os pneus run-flat e o porta-bandeira acima dos pára-lamas dianteiros.
O i7 está equipado com um motor eléctrico de 400 quilowatts (equivalente a 544 cavalos) de potência, enquanto o Série 7 é alimentado por um bloco V8 de 4,4 litros de capacidade, capaz de debitar 530 cavalos.
A BMW trabalhou também nos acessórios para o modelo Protection, entre os quais estão o sistema avançado de ar condicionado, extintores de incêndio com descarga automática e manual, luzes de sinalização especiais e comunicação via rádio.
PROTECTION
Para além da componente de protecção, este BMW leva um conjunto de pneus de 20 polegadas que têm um anel run-flat que permite uma condução até cerca de 80 km/h quando os pneus ficam sem ar.