Revista E&M_Edição 67 • Dezembro 2023 • Ciclones - Estaremos preparados Para que não se repita??

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MOÇAMBIQUE

ESG CINCO MULHERES CRIARAM UM PROJECTO DE RECICLAGEM. CONHEÇA O SEU IMPACTO CONTEÚDO LOCAL COMO É QUE A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA NA CERTIFICAÇÃO DE EMPRESAS NOS PODE SERVIR? CEO TALKS • GEERT KLOK, CMM SAIBA O QUE ESTÁ POR DETRÁS DA FRACA COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA MINEIRA COP28 “VAMOS À COP28 COM A MISSÃO DE BUSCAR MAIS FINANCIAMENTO”, RICARDO PEREIRA, AMER

CICLONES

ESTAREMOS PREPARADOS PARA QUE NÃO SE REPITA?

Já no início da época de ciclones, a E&M foi tentar perceber como é que o País se tem preparado para prevenir... antes de remediar. Há doadores, investimento, mas ainda falta (quase) tudo o resto Dezembro • 2023 • Ano 06 • Nº 67 • 350MZN




EDITORIAL

Celso Chambisso Editor Executivo da Economia & Mercado

A (In)Capacidade de “Fugir” aos Ciclones

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dai, Kenneth, Freddy... memórias de uma infeliz realidade que passou a fazer parte da vida dos moçambicanos, todos os anos, desde 2019. Foram vários os ciclones e tempestades tropicais que deitaram abaixo parte dos esforços de crescimento e desenvolvimento do País, com a perda de importantes infra-estruturas públicas e privadas, de produção agrícola e, mais preocupante ainda, a perda de vidas. Esta realidade mudou por completo a forma como se planifica a vida do País. Impôs a necessidade de criar espaço orçamental (já por si apertado e dependente de injecções externas em donativos e créditos) para acomodar acções de resposta aos desafios actuais - afinal, há sempre a certeza de que teremos um evento climático extremo que vai “abanar” a já frágil estabilidade económica que nos caracteriza. A propósito, nesta época ciclónica 20232024, podem estar a caminho de Moçambique o “Álvaro” e o “Zacarias”, novos ciclones previstos pelo centro meteorológico francês da Ilha da Reunião, uma das autoridades que fazem a supervisão e acompanhamento de ciclones no oceano Índico. Apesar de serem probabilidades bem menos preocupantes em relação ao que aconteceu nas temporadas ciclónicas anteriores, trazem a necessidade de nos prepararmos para enfrentar uma desgraça. Estamos preparados? Obviamente que não. Nem os países desenvolvidos estão 100% preparados para lidar com ciclones. No caso de Moçambique, falta dinheiro, falta o aperfeiçoamento estratégico e falta eficácia na coordenação institucional, segundo as diferentes fontes ouvidas pela E&M. Mas isto não significa que não se esteja a trabalhar para minorar os impactos destas catástrofes. Recentemente, o Instituto Nacional de Meteorologia (INAM) e o Instituto Nacional de Gestão de Risco de Desastres

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(INGD) reuniram-se para discutir como enfrentar o “Álvaro” e o “Zacarias” se, eventualmente, comparecerem no ringue de combate. Só esta preocupação mostra vontade de vencer. Há, igualmente, avanços importantes ao nível de políticas de prevenção e resposta aos eventos climáticos extremos, confirma o Fundo Monetário Internacional através do seu representante, Alexis Meyer-Cirkel, que anuncia, igualmente, novos instrumentos de apoio à resiliência do País, já em curso, e que devem entrar em funcionamento nos próximos tempos. Aliado a isso, existem janelas de apoio financeiro de instituições multilaterais, com destaque para a do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), cujo foco está cada vez mais voltado para a causa das alterações climáticas. Outro avanço relevante é o investimento em equipamentos. O destaque vai para o radar meteorológico instalado na cidade da Beira e que facilitará a detecção e aviso prévio da aproximação de qualquer evento climático anormal, sendo que a ideia é cobrir o território nacional com mais seis radares nos próximos tempos. Todos estes esforços são importantes e necessários para contornar um mal de que somos incapazes de fugir, pelo menos enquanto o mundo não puder pôr em prática todos os mecanismos possíveis para eliminar as emissões de carbono. E porque esta é a última edição do ano, a E&M quer agradecer-lhe, caro leitor, pela fidelidade, carinho, críticas e acompanhamento ao longo destes 12 meses. Para o ano prestes a começar, a E&M reitera o compromisso em continuar a trabalhar para ser uma revista cada vez com mais qualidade, digna de merecer a honra da sua atenção e preferência. Boas festas e próspero 2024!

DEZEMBRO 2023 • Nº 67 DIRECTOR EXECUTIVO Pedro Cativelos EDITOR EXECUTIVO Celso Chambisso JORNALISTAS Ana Mangana, Filomena Bande, Hermenegildo Langa, João Tamura, Nário Sixpene PAGINAÇÃO José Mundundo FOTOGRAFIA Mariano Silva REVISÃO Manuela Rodrigues dos Santos DEPARTAMENTO COMERCIAL comercial@media4development.com CONSELHO CONSULTIVO Alda Salomão, Andreia Narigão, António Souto; Bernardo Aparício, Denise Branco, Fabrícia de Almeida Henriques, Frederico Silva, Hermano Juvane, Iacumba Ali Aiuba, João Gomes, Rogério Samo Gudo, Salim Cripton Valá, Sérgio Nicolini ADMINISTRAÇÃO, REDACÇÃO E PUBLICIDADE Media4Development Rua Ângelo Azarias Chichava nº 311 A — Sommerschield, Maputo – Moçambique; marketing@media4development.com IMPRESSÃO E ACABAMENTO RPO Produção Gráfica TIRAGEM 4 500 exemplares EXPLORAÇÃO EDITORIAL E COMERCIAL EM MOÇAMBIQUE Media4Development NÚMERO DE REGISTO 01/GABINFO-DEPC/2018

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73 ÓCIO 6 OBSERVAÇÃO

Fique a conhecer as principais tendências da tecnologia, no próximo ano, fornecidas pela consultora americana Gartner

12 OPINIÃO

“Perspectivas Positivas para 2024”, Wilson Tomás, Research Analyst, Banco BIG Moçambique

74 Escape Os Melhores Destinos Para Conhecer em 2024 76 Gourmet Ao sabor de um naco de atum, a iguaria servida no hotel Kirimizi, em Cabo Delgado 77 Adega Aldeana, a cerveja artesanal que pode muito bem ser sinónimo de sustentabilidade 78 Empreendedor Cláudio Lobo encanta África e o mundo com as peças à base da capulana 81 Artes “Obra Dádiva”, o Resgate da Liberdade de Expressão e Educação Artística de 47 escritores moçambicanos e portugueses 82 Ao volante da Hyper Tourer, a nova minibus futurística da Nissan

14 ESG

Uma iniciativa da Gaia EES Consulting, que se destaca por envolver cinco mulheres na reciclagem de resíduos sólidos

16 OPINIÃO

“Culturas Regenerativas – Psicologia Comunitária e Plural Versus Psicologia Individual e Universal”, Susana Cravo, Consultora & Fundadora da Kutsaca e da Plataforma Reflorestar.org

20 CONTEÚDO LOCAL

O director-geral da Associação Brasileira de Normas Técnicas, Nelson Filho, revela o caminho para a criação de padrões de qualidade na certificação de empresas

22 OPINIÃO

50 GLOBAL GATEWAY

24 NAÇÃO

52 MERCADO E FINANÇAS

“Uma Perspectiva sobre o Investimento de Impacto: Desafios e Oportunidades para as Mulheres Rurais” (I), Tânia Dinis, Área de Financiamentos de Long Prazo (CIB) do ABSA Moçambique

ÉPOCA CICLÓNICA 2023-2024 24 Riscos Autoridades internacionais de previsão de ciclones antecipam baixas perspectivas de ocorrência de eventos extremos, mas o INAM e o INGD apontam riscos 36 Opinião “Certificação de Produtos em Moçambique, Oportunidades e Desafios para as Empresas”, Ricardo Velho, Partner & Business Development Manager 38 Entrevista O representante do FMI, Alexis MeyerCirkel, destaca o papel das políticas do Governo e o apoio que a instituição presta a favor da resiliência climática 42 El Niño Como África e o mundo estão a lidar com o fenómeno que dura há nove meses?

46 SHAPERS

Como o liberalismo defendido por Adam Smith influencia as políticas económicas actuais e as sociedades modernas

48 POWERED BY FNB

FNB Moçambique eleva a sua promessa de ajuda e de modernização de canais digitais, rumo a um novo patamar de actuação

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Moçambique e União Europeia renovaram laços de cooperação económica no fórum de investimentos de 22 e 23 de Novembro. Conheça os principais acordos e saiba o que deve mudar

Três bancos moçambicanos, Standard Bank, BCI e Millennium bim no ranking dos maiores de África. Saiba porquê

56 OPINIÃO

“Novo Regime de Registo Prévio em Moçambique – Virtual Asset Service Providers”, Mara Rupia Lopes, Associada Principal da MDR Advogados & Vera Esteves Cardoso, Consultora da Morais Leitão

58 CEO TALKS

O presidente da Câmara de Minas de Moçambique, Geert Klok, fala de falhas de comunicação com o Governo e da fraca competitividade da indústria mineira nacional

63 ESPECIAL INOVAÇÕES DAQUI

64 CLIMA Moçambique foi à COP28 mobilizar recursos para a expansão das renováveis, diz o presidente da AMER, Ricardo Pereira 68 MAKTUB Uma startup moçambicana voltada para a saúde reprodutiva feminina e que foi distinguida no 929 Challenge em Macau

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OBSERVAÇÃO

Mundo, 2024

Quais as Principais Tendências da Tecnologia? Já que estamos com um pé em 2024, porque não olhar para o que a tecnologia (que está a mudar radicalmente a vida do homem e a grande velocidade) nos reserva para o próximo ano? De acordo com as previsões da Gartner, uma reputada consultora norteamericana de tecnologia, em 2024 haverá um aumento de 8% nos investimentos em tecnologias e informação, chegando a um montante total de 5,1 biliões de dólares. Diante desse cenário, estar atento às novidades que prometem movimentar o mercado global nos próximos meses

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assume uma importância acrescida. Eis as cinco principais tendências tecnológicas estratégicas para 2024: 1. Inteligência Artificial (IA), democratizada pela convergência de modelos massivamente prétreinados, tornando-os acessíveis a trabalhadores em todo o mundo; 2 Como consequência, gestão de confiança, risco e segurança de IA, uma área que se tornou ainda mais urgente; 3. Desenvolvimento aumentado por IA - utilização de tecnologias

desta ferramenta para auxiliar programadores e engenheiros informáticos na codificação e teste de aplicações; 4. Aplicações inteligentes ou a habilidade que pode ser aplicada, em muitos casos, para melhorar ou automatizar o trabalho; 5. Força de trabalho online e aumentada, uma estratégia usada para optimizar o desempenho dos trabalhadores. FOTOGRAFIA D.R.

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RADAR

Finanças

Maior parte dos bancos nacionais tem crédito em incumprimento acima do recomendado

Infra-estruturas

Expansão do Porto de Maputo pode aumentar receitas públicas para 8 mil milhões de dólares nos próximos 25 Anos O Governo aprovou uma resolução que confere poderes ao ministro dos Transportes e Comunicações, Mateus Magala, para negociar com a concessionária MPDC – Sociedade de Desenvolvimento do Porto de Maputo – os termos e condições da Adenda ao Contrato de Concessão. Na mesma resolução, o Executivo solicita à concessionária MPDC a realização de investimentos adicionais para aumentar a capacidade de gestão de carga. Segundo o ministro dos Transportes e Comunicações, esta decisão pretende elevar a capacidade portuária dos actuais 37 milhões para cerca de 52 milhões de toneladas por ano. Da mesma forma, o objectivo é crescer dos actuais 270 mil contentores para um milhão, num investimento de mais de 2 mil milhões de dólares com um retorno directo para o Estado de mais de 8 mil milhões de dólares nos 25 anos previstos para a extensão da concessão. O governante, que falava durante a inauguração do Parque de Gestão do Trânsito de Pessene, sob a gestão da MPDC, revelou ainda que na base dos novos investimentos “é esperada a criação da capacidade necessária” para atender ao potencial de crescimento das mercadorias que transitam no corredor de Maputo, rodovia e ferrovia. Com o mesmo objectivo, o Governo aprovou o princípio de envolvimento do sector privado na reabilitação, operação, gestão e transformação de Ressano Garcia/Komatiport (África do Sul) numa fronteira de mercadorias de paragem única (é a mais movimentada entre os dois países).

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De acordo com o relatório sobre os Indicadores Prudenciais e Económico-Financeiros divulgado recentemente pelo Banco de Moçambique, o Banco Nacional de Investimento (BNI) e o Moza Banco foram os dois bancos moçambicanos com os rácios de crédito em incumprimento mais elevados no terceiro trimestre deste ano, sendo que a maioria está acima do limite de 5% recomendado pelo regulador (Banco de Moçambique). O BNI fechou o terceiro trimestre deste ano com um rácio de crédito em incumprimento (NPL) de 43,79% do total concedido contra os 60,45% registados no trimestre anterior.

Assim, entre os 15 bancos comerciais na listagem do banco central, segue-se o Moza Banco, com um rácio de crédito em incumprimento situado em 26,92%. Da lista divulgada pelo banco central, apenas o First Capital Bank (FCB), United Bank for Africa (UBA) e Standard Bank apresentam um rácio de crédito em incumprimento inferior ao recomendado, de 0,59%, 0,83% e 2,59%, respectivamente. No início deste mês, o governador do BdM, Rogério Zandamela, afirmou que o sector bancário nacional está “sólido e bem capitalizado”, mas alertou que o crédito em incumprimento permanece em níveis elevados.

Gestão pública

Governo anuncia melhoria da situação financeira da Petromoc

A empresa Petróleos de Moçambique (Petromoc) tem registado melhorias significativas nas suas contas há dois anos, o que contribuiu para reverter a situação de insolvência. A informação foi prestada, em Maputo, pelo ministro da Economia e Finanças, Max Tonela, e pelo administrador do Institu-

to de Gestão das Participações do Estado (IGEPE), Tomás Dimande, durante um encontro com os deputados da Assembleia da República. Max Tonela explicou que, ao longo do ano, a Petromoc conseguiu liquidar dívidas com os dois principais bancos que possuíam garantias do Estado. “A Petromoc ainda tinha uma dívida associada à falta de ajustamento dos preços de combustíveis, que propiciou a redução da importação e comercialização dos produtos petrolíferos por parte dos operadores privados”, contextualizou. Lembre-se que, pelo menos, até 2019, segundo o presidente da empresa, Hélder Chambisse, a petrolífera acumulava uma dívida de 12 mil milhões de meticais a vários bancos.

Extractivas

Rio Tinto incorre numa multa de 28 milhões de dólares por fraude na venda de activos de carvão em Moçambique A multinacional Rio Tinto deverá pagar uma multa de 28 milhões de dólares a um tribunal norte-americano por acusações de fraude, ao ter ocultado os prejuízos da mina de carvão que explorava em Moçambique. Em 2011, a multinacional anglo-australiana comprou activos para a exploração de minas de carvão na província de Tete, Moçambique. A empresa de capitais britânicos adquiriu os activos de carvão mineral a um preço de 3,7

mil milhões de dólares e, em 2014, vendeu a mina ao grupo indiano Coal Ventures Private Limited por 50 milhões de dólares, um valor muito abaixo do da compra. Este facto chamou a atenção da Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC), que apresentou uma queixa contra a multinacional junto do Tribunal Federal de Manhattan, em Nova Iorque, acusando a Rio Tinto de fraude. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


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NÚMEROS EM CONTA

O Progresso Nas Metas de Energia Renovável Para 2030 A Agência Internacional de Energia afirma que a capacidade instalada global de energia renovável deverá triplicar até 2030 para limitar o aquecimento global a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. Isto torna os próximos seis anos verdadeiramente críticos na luta contra as alterações climáticas, com o evento COP28 das Nações Unidas que se realizou no Dubai a representar um momento marcante para avaliar o progresso dos países no sentido de atingirem os seus objectivos para 2030. Tal como estabelecido no Acordo de Paris, muitos países, incluindo grandes consumidores de energia como os EUA, a União Europeia, a China, a Índia e o Reino Unido, estabeleceram objecti-

vos ambiciosos para aumentar as suas capacidades de produção de energia solar e eólica. No entanto, os dados sugerem que muitos estão a lutar para manter o ritmo dos aumentos de capacidade anuais necessários que lhes permitirão atingir esses objectivos. Actualmente, a China destaca-se como a única nação no bom caminho para atingir o seu objectivo para 2030. Em 2022, não só cumpriu, como excedeu significativamente os acréscimos de capacidade necessários para se manter na rota, acrescentando 168% dos 101 GW necessários. Vejamos agora como cada um destes países se está a sair, comparando a capacidade eólica e solar que precisavam de adicionar com a que efectivamente adicionaram em 2022.

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COMO LER Cada ponto = 1 Gigawatt (GW) • Eólicas e solares necessárias anualmente

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• Eólica e solares adicionadas em 2022 63% do consumo global de energia É atribuído a estes países ou regiões.

Em 2022, a China foi a única nação que excedeu a quota de adições de renováveis à sua rede.

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Os países representados na Agência Internacional de Energia determinaram que a capacidade das renováveis deverá triplicar até 2030 por forma que limite o aumento da temperatura global a 1,5 ºC.

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FONTE Agência Internacional da Energia, Comissão de Transição Energética

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OPINIÃO

Wilson Tomás • Research Analyst, Banco BIG Moçambique

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stamos a chegar perto do fim do ano de 2023, e a persistência de alguns desafios passados marcaram a evolução de muitas economias, um pouco por todo o mundo. O combate à inflação foi um dos grandes desafios dos bancos centrais, e embora a mesma tenha reduzido significativamente durante grande parte do ano, continua a permanecer acima dos limites de referência pretendidos. A manutenção do crescimento económico foi outro dos grandes desafios, com muitas economias a apresentarem crescimentos aquém das expectativas, influenciados pelas políticas restritivas, quer fiscais, quer monetárias. O surgimento de um novo conflito armado, com potencial de escalar para um conflito regional, foi outro dos desafios que surgiram em 2023, com a resposta de Israel ao ataque terrorista perpetuado pelo Hamas, no início de Outubro. Contudo, 2023 chega perto do fim com um alento positivo, e com a expectativa de que 2024 poderá ser bastante melhor. Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), as perspectivas de crescimento económico na África Subsaariana para 2024 são positivas. Espera-se uma aceleração no crescimento do PIB real da maioria dos países, quer sejam exportadores de recursos naturais, quer daqueles que assentam a sua economia em outros bens e serviços. A inflação é expectável que continue em trajectória descendente, impulsionada pela diminuição dos preços dos produtos alimentares, pelo alívio das restrições nas cadeias de abastecimento e pelo endurecimento das políticas monetárias. Esta desaceleração da inflação espera-se que não seja uniforme em todos os países, e que beneficie mais uns países que outros. Embora a inflação continue em queda, a verdade é que permanece elevada face às metas dos bancos centrais, com dois terços dos países a registarem uma

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Perspectivas Positivas Para 2024 inflação acima dessas metas. Um terço dos países apresenta uma inflação nos dois dígitos e, para 2024, é esperado que a política monetária se ajuste aos diferentes contextos, com os bancos centrais a adoptarem posturas restritivas ou mais neutras consoante a situação dos respectivos países. Em 2023, verificou-se uma subida generalizada das taxas de juro, quer de referência, quer das maturidades mais longas. No entanto, a contracção do financiamento ainda não terminou. O nível de endividamento dos países africa-

As perspectivas de crescimento económico em Moçambique são ainda mais animadoras em 2024, com um crescimento estimado de perto de 7%, impulsionado pelo início da exploração de gás e reinício dos trabalhos da TotalEnergies nos aumentou significativamente desde 2015, levando muitos países a atingir, em 2023, uma situação de sobreendividamento preocupante, que alimentou uma desvalorização cambial que se vinha observando desde a pandemia covid-19. O aumento das taxas de juro contribuiu para esse cenário, levando alguns países a atingirem níveis de serviço de dívida face à arrecadação fiscal não sustentáveis e a considerar pedidos de ajuda ao FMI e a reestruturação do seu stock de dívida. Segundo o organismo, a partir de 2023, a região necessita de con-

tinuar a realizar ajustamentos orçamentais para estabilizar a dívida abaixo de 70% do PIB, de modo que torne a dívida pública sustentável. Em Moçambique, o ano de 2023 é marcado por uma aceleração do crescimento e uma contínua desaceleração da inflação. Moçambique será o quinto país com a taxa de crescimento do PIB mais elevada a nível global, com principal destaque para o sector primário, especialmente a Agricultura, Pecuária, Caça, Silvicultura e Exploração Florestal. Adicionalmente, observou-se um crescimento expressivo na Indústria de Extracção Mineira, principalmente na extracção de carvão mineral e gás natural. As perspectivas de crescimento em Moçambique são ainda mais animadoras em 2024, com um crescimento estimado de perto de 7%, impulsionado pelo início da exploração de gás e reinício dos trabalhos da TotalEnergies. Em 2027 e 2028, o crescimento deverá aumentar para dois dígitos, já com o início da exploração de gás natural onshore pela TotalEnergies. A retoma das actividades de preparação da central em Afungi - Cabo Delgado - pela petrolífera francesa, após o levantamento da “Force Majeure,” poderá alimentar a confiança dos investidores e dar um maior dinamismo à economia moçambicana, lembrando que a ExxonMobil tem esta medida como referência para retomar o projecto. A inflação em Moçambique está abaixo do limite de referência do banco central há, pelo menos, sete meses, como resultado da sua postura restritiva e dos efeitos externos mencionados anteriormente. Com a inflação controlada e perspectivas favoráveis para 2024, é expectável que o Comité de Política Monetária do Banco de Moçambique reavalie sua postura, reduzindo as taxas de juro de referência já nós próximos meses. A materializar-se, essa queda nas taxas poderá contribuir para expandir a actividade económica nos restantes sectores que não estão relacionados com a extracção de gás e de outros recursos naturais. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


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ESG | RECICLAGEM

O Género e as Três Dimensões da Sustentabilidade: Uma Iniciativa Liderada Por Mulheres Esta é a história da criação de círculos de mulheres numa era de mudanças climáticas. Este capítulo conta a história de cinco mulheres moçambicanas que, preocupadas com a gestão de resíduos sólidos, juntaram-se para desafiar estereótipos de género e contribuir para a sustentabilidade do ambiente e da sociedade. Texto Ana Mangana • Fotografia Mariano Silva

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ão é dado novo que o combate às mudanças climáticas e iniciativas ligadas à gestão dos resíduos sólidos desempenham um papel fundamental na promoção do desenvolvimento sustentável e na melhoria da qualidade de vida da população de qualquer país. Mas é particularmente interessante constatar que esta actividade é realizada maioritariamente por homens, sendo, em muitos casos, um trabalho marginalizado. Trata-se de um conjunto de tarefas que exige mais do que força física, e a participação das mulheres é um exemplo de como a diversidade de género enriquece o setor e ajuda a enfrentar os desafios ambientais. O seu envolvimento também impulsiona a inclusão social e económica, criando um impacto positivo nas comunidades e no ambiente.

Sustentabilidade reflectida na igualdade A Gaia Consulting, uma empresa especializada em economia verde, economia azul e sustentabilidade, adopta uma abordagem única. Para além do seu foco em consultoria nessas áreas, a empresa promove iniciativas de impacto social e ambiental com foco em questões de género. Em 2023, desenvolveu a primeira iniciativa climática que abrange as áreas de economia azul, energias renováveis e economia circular, criando um círculo de mulheres. Esta ação não só identifica oportunidades e sinergias, mas também

inspira inovações para o sucesso destas mulheres e o avanço no desenvolvimento sustentável do País. Dentro do vasto horizonte da economia circular, o círculo de mulheres reconheceu que a base de qualquer iniciativa deve ser a capacitação. Um diagnóstico revelou a carência de formações práticas nas áreas em Moçambique, incapazes de atender às demandas do grupo. Diante deste desafio, a Gaia tomou a frente e estabeleceu uma colaboração significativa com a empresa Sombras Matsinhe para a implementação da primeira iniciativa. “O círculo de mulheres, cultivado com carinho pela Gaia, não é apenas um símbolo de progresso, mas uma força viva alinhada com o ODS 5 - Igualdade de Género. O percurso da Gaia foi marcado por redes de mulheres que tem o mesmo objectivo. Nestes círculos de mentes brilhantes, estamos a tecer um futuro onde a equidade floresce, guiando-nos em direcção a um mundo onde todas as mulheres têm espaço para prosperar e liderar. Os homens estão ao nosso lado nesta batalha. Isto representa um princípio de igualdade.” – Mayra Pereira A Sombra Matsinhe, estabelecida em 1991 com expertise em materiais para cobertura, emergiu como uma força transformadora. Durante a adversidade do COVID-19, lançou o inovador projeto Sr. Lixo, dedicado à gestão de resíduos sólidos. Actualmente, recebe diariamente entre dez a 12 toneladas de re-

A cooperação entre as cinco mulheres da Gaia e da Sombra Matsinhe consistiu numa formação intensiva, com oportunidade para ver e vender o trabalho completo de reciclagem

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síduos de diversas empresas, os quais são habilmente transformados em novos materiais nas suas instalações. Vale ressaltar que a Sombra Matsinhe é mais do que uma empresa; é uma comunidade que reconhece o valor e o potencial das mulheres. Ao empregar um número significativo de mulheres, a empresa não apenas se destaca como um exemplo de igualdade de oportunidades, mas também promove o empoderamento feminino. “Podemos pensar na gestão de resíduos sólidos como um factor ínfimo, mas temos de aproveitar aquilo que temos, porque muitas vezes destruímos o nosso ambiente com o que consideramos ser lixo. Mas são materiais que podem ser reaproveitados”, explicou Alda Panguene, representante da Sombra Matsinhe. O círculo de economia circular e o seu impacto A 29 de Setembro, abriu as portas para um grupo de mulheres empreendedoras, que também procuram, através desses resíduos, desenvolver os seus próprios modelos de negócio. Nas instalações da Sombra Matsinhe, as cinco mulheres tiveram uma formação intensiva, intensiva, com oportunidade para ver e fazer o trabalho completo de reciclagem, desde a recepção e selecção do material recolhido até ao processamento final. Letícia Meque, fundadora da Ek’ORERA Ambiente, uma startup dedicada à transformação de plásticos em produtos resilientes de construção, conta a sua experiência. “Tive a oportunidade de estar um dia inteiro na SM, ver toda a cadeia da economia circular, desde a chegada dos resíduos até à sua transformação em várias matérias-primas para a produção de outros materiais. Saio daqui com ferramentas para a iniciativa que estou a desenvolver e criar parcerias com outras participantes”, revelou. Para www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


Letícia, um dos ganhos foi poder desenvolver um protótipo de material de construção resiliente, depois de ver o processo de reciclagem de vidro e plástico. “Isto significa que podemos criar uma aliança e, juntos, fazer testes para ter um produto de qualidade”, afirmou. E porque a área de gestão de resíduos é vasta, Márcia Dima, fundadora de uma startup produtora de compostos orgânicos, biofertilizantes e insecticidas, denominada N’toko Organic, também fez parte deste círculo de mulheres. “Sendo a N’toko uma empresa em crescimento, para efectivação da economia circular, a aprendizagem permitirá caminhar firmemente em prol da sustentabilidade”, frisou. Outra das cinco mulheres que estiveram envolvidas neste processo é Lourdes Waty, fundadora da Zero Waste Moz, empresa que se dedica ao processamento de resíduos orgânicos e biodegradáveis. Segundo Lourdes, os resíduos orgânicos não são tão discutidos quando se fala em reciclagem, mas têm um impacto enorme, pois apesar de se degradarem rapidamente, se o processo não acontecer em condições ideais, geram altas emissões de dióxido de carbono e, consequentemente, contribuem para o www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023

aquecimento global. “Assim, com a nossa actividade, diminuímos os custos de gestão de resíduos e as emissões para a atmos fera, ao mesmo tempo que ajudamos a contribuir para uma cidade mais limpa”, testemunhou. Na visita ao projecto Sr. Lixo, a fundadora da Zero Waste revelou que, além de sair da sua zona de conforto, ficou a saber mais sobre o processo de reciclagem de outros resíduos, recolhendo dados de outras experiências no tratamento de resíduos biodegradáveis. Deolinda Guila, representante do projecto de reciclagem Mãos Hábeis, que se dedica à recolha, tratamento e reaproveitamento dos resíduos sólidos para produzir diversos adereços para eventos, também participou na capacitação. Afirma que o pouco conhecimento da sociedade sobre a importância da separação do lixo impulsionou- -a a criar o projecto, que conta com sete colaboradores, dos quais cinco mulheres. O projecto tem na agenda de prioridades formar mulheres no uso de ferramentas para produção, venda e monta gem nas áreas de decoração de eventos sociais, com recursos próprios, produzidos através dos resíduos reciclados e com mão-de-obra local feminina. Para Orní-

lia Faife, fundadora da Enviroworks Soluções Ambientais, uma empresa especializada na área de limpeza geral, pós-obras, desinfecção, recolha de resíduos sólidos, controlo de pragas, jardinagem e fornecimento de consumíveis de copa e casas de banho, foi muito produtivo participar nas actividades realizadas no projecto Sr. Lixo. “Vamos consciencializar os nossos trabalhadores e clientes a fazerem uma melhor gestão de resíduos sólidos, porque todo o lixo tem valor”, realçou. A gestão dos resíduos sólidos é um domínio que pode ser enriquecido com a participação de mulheres ao lado dos homens. Ambos os géneros têm papéis importantes a desempenhar na promoção de práticas sustentáveis de gestão de resíduos. A visão do círculo de mulheres é ampliar suas fronteiras, assegurando que mais mulheres tenham acesso a oportunidades e recursos de maneira justa e equitativa, reconhecendo e abraçando suas diversas necessidades e circunstâncias. Este é um compromisso inspirador em construir um futuro onde a igualdade floresça para todas as mulheres, cultivando um terreno onde cada uma possa alcançar seu pleno potencial.

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OPINIÃO

Susana Cravo • Consultora & Fundadora da Kutsaca e da Plataforma Reflorestar.org

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as últimas semanas, navego pelos temas da Ecopsicologia e da Compaixão, em duas formações distintas e ambas com uma qualidade e relevância ímpares para os tempos que vivemos. Enquanto vou observando a decomposição do estado da modernidade, que abordei no meu último artigo, encontro neste tapete colorido e intrincado, coragem, elasticidade e compassividade, para me mover nos mundos interno-externo com coerência e integridade. Sem negar ou romantizar a dureza do que vivemos, mas mantendo o foco e presença que sustentam esta prontidão para ser útil, para ajudar, para fazer o que é preciso (que nem sempre é o mais confortável).

Num mundo em que, cada vez mais, se busca o que “está pronto”, é rápido, leve e aparece - o dom, o glamour, o troféu e o aplauso, a prontidão para ser útil e fazer o que é preciso, exige coragem e stamina. Humildade e comunidade. Numas destas sessões recentes, no âmbito da Ecopsicologia e em concreto sobre Psicologia Comunitária e Indígena, fomos convidados a reflectir sobre “como as noções plurais e interculturais de psicologia, que assentam no reconhecimento do contexto mais que humano como dialogante com o bem-estar humano, confrontam ou expandem a noção de psicologia universalizante e individual ocidental? ”E sendo este um tema que me toca muito e uma das minhas grandes inquietações, partilho, neste artigo, um resumo da minha perspectiva, também partilhada com o grupo. Sendo importante deixar, antes de mais, esta contextualização: “A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA é uma aplicação inter e transdisciplinar na abordagem participativa, afectiva e envolvente com as comunidades. A PSICOLOGIA INDÍGENA baseia-se ... (em) compreender cada cultura a par-

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Culturas Regenerativas – Psicologia Comunitária e Plural Versus Psicologia Individual e Universal tir do seu próprio quadro de referência, incluindo o seu próprio contexto ecológico, histórico, filosófico e religioso ou espiritual. (E ainda) os princípios psicológicos não podem ser assumidos como universalmente semelhantes (...). As cosmovisões geradas a partir de espaços colonizados foram excluídas do discurso eurocêntrico e americano dominante da Psicologia Comunitária. Podemos observar duas modalidades de colonização: “uma é a apropriação física, territorial, e a segunda é a chamada colonialidade, que procura instalar e controlar o pensamento.”

Distorceu-se o conceito de abundância e normalizou-se esta sensação de que, “Eu (Indivíduo) mereço, tenho direito, sem ter em conta a vasta teia colectiva e sistémica de que faço parte” São vivências psicológicas autóctones, que implicam uma mudança de paradigma, abrindo espaço aos dados culturais, sociais e psicológicos sem os grilhões de quadros conceptuais importados de outros lugares. Estas abordagens falam de uma Intervenção Comunitária, incluindo competências em práticas transdisciplinares, horizontais, imersas na diversidade e de carácter participativo. Baseadas em confiança, reciprocidade, cooperação e colaboração.” (Curso de Introdução à Ecopsicologia, Sofia Batalha, Escola de Desenvolvimento Transpessoal).

A PSICOLOGIA INDIVIDUAL/Universalizante/Ocidental – com todo o seu valor e importância, dependendo do contexto, não dá resposta, em muitas situações, aos desafios complexos que enfrentamos. Por outro lado, com a entrada desta no mundo organizacional e espiritual, há, nas últimas décadas, uma apropriação e deturpação de sabedoria indígena e ancestral, que se tem transformado numa verdadeira indústria de Desenvolvimento Pessoal, centrada na classe média/alta, no endeusamento do Indivíduo e na transcedência, e é a partir desta perspectiva que vou abordar esta “Psicologia Individual”. E lembramos a questão “Como as noções plurais e interculturais de psicologia, que assentam no reconhecimento do contexto mais que humano como dialogante com o bem-estar humano, confrontam ou expandem a noção de psicologia universalizante e individual ocidental?” Começamos por aqui: a Psique é Mais que Humana. Imaginem quanta arrogância, achar que a Psique é apenas Humana. As histórias vividas que poderiam ilustrar a minha resposta não têm espaço para ser aqui partilhadas, antes de mais por questões éticas. Mas eu diria que, o que mais sinto ser chocante é a forma como a psicologia individual/ universalizante/ocidental, focada na separação e domínio (antropocêntrica e individualista), continua a incentivar e premiar uma narrativa altamente baseada na “Jornada do Herói/Heroína” (e da auto-agência), que conduz a um “lugar” de conquista, merecimento, vitória; penalizando e/ou marginalizando quem não se enquadre nesta narrativa, assim como todos os afectados, prejudicados e usurpados por ela. Por outro lado, hiper-responsabiliza, patologiza e culpa os seres individuais, por questões sistémicas, vastas, que não podem ser “resolvidas”, “curadas” individualmente. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


Lagoa de Uembje, Praia do Bilene No fundo, creio que esta psicologia individual e universalizante, altamente dogmática e excludente, continua a incentivar a dualidade entre o bem e o mal, o certo e o errado, o “céu” e o “inferno”, a recompensa e o castigo. Quando oiço os meus pares a incentivar a estratégias de co-criação de abundância (e de auto-agência) que claramente impactam na carência e/ ou marginalização de outros seres (Humanos e mais que Humanos) em lugares que nós não vemos (nem queremos ver), é bastante desafiante. Distorceu-se o conceito de abundância e normalizou-se esta sensação de que, “Eu (Indivíduo) mereço, tenho direito, sem ter em conta a vasta teia colectiva e sistémica de que faço parte. Sem a percepção que a abundância é equilíbrio e não excesso. E que o meu excesso, garantidamente, vai causar carência/dano em algum lugar. No meu caso concreto, ao receber muitas pessoas do hemisfério norte no hemisfério sul, e sendo estas confrontadas com questões práticas destes desiquilíbrios (crianças abandonadas, trabalho indigno, corpos adoecidos pewww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023

la indústria extractiva dos nossos queridos minérios, mariscos e outros “tesouros”), o confronto e a dor que isto provoca pode gerar tanto a oportunidade de reflexão, como a fuga e projecção disto num “outro”/nos “maus”. Uma verdadeira resistência em assumir o nosso emaranhamento e em abdicar dos nossos “direitos/luxos adquiridos”. Nem sempre é engraçado ver o expertise dos VUCAS urbanos a esboroar-se fora das arenas familiares, e a auto-confiança dos Co-criadores – Eu Quero, Eu Posso e Eu Consigo, a ser posta à prova num território em que o Mais que Humano (e Humano também) nos pode levar ao limite, muitas vezes somático (porque somos realmente convidados a sair do mental e a recordar canais sensoriais e mamíferos, de diálogo, de relação, de reciprocidade). E aqui, a compaixão é vital para amparar a vulnerabilidade. Para nós próprios e para os que temos muitas vezes de amparar, fora de consultórios e de retiros perfumados de incenso e outras coisas.... que também vêm do sul. Afinal de contas, estamos apenas a ser lembrados (e confrontados com)

do claro desrespeito, distorsão e extorsão dos Lugares que perpetuamos, monopolizando-os à nossa imagem e para satisfazer as nossas necessidades. Não as necessidades do Lugar. Continuamos a fazer as nossas bolhas de elite, desrespeitando e devastando os Lugares. E a que “nós” vamos de férias, de retiro, sem nos darmos conta do sofrimento, extracção, por trás do nosso bem-estar, “cura”, quotidiano. Voltou a ser exibido, em Lisboa, este mês, o filme Catembe, filmado em 1964, altamente censurado e poucas vezes mostrado, mesmo após o 25 Abril. Eu não vivi esse tempo, mas ao ver o filme, reconheço claramente as personagens, os padrões de relação/universalização e exclusão nos dias de hoje. E sinto que “praticar” uma psicologia comunitária, a partir do Lugar, onde a relação é valorizada em detrimento da “Entidade/Ser”, onde o plural, diverso, múltiplo é ouvido, respeitado, honrado, é um desafio diário e uma das minhas grandes inquietações. Mas para ser útil ao Lugar, ao mundo e ao bem maior, há que fazer o que (sentimos ser) preciso.

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CONTEÚDO LOCAL | CERTIFICAÇÂO

Projecto da UNIDO Traz Experiência do Brasil em Normas de Qualidade O Brasil é a economia da América Latina com as empresas mais competitivas. E não é por acaso que chegou a tal patamar: houve, entre outros factores, muita dinâmica na certificação. É este conhecimento, associado à experiência e liderança da UNIDO, que deverá trazer benefícios para Moçambique, explica o director-geral da Associação Brasileira de Normas Técnicas, Nelson Filho Texto Nário Sixpene • Fotografia D.R

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á todos devem saber que um dos requisitos infalíveis para o sucesso das empresas nacionais no contexto da exploração das oportunidades dos grandes projectos é a adopção de standards de qualidade ao nível das exigências dos mercados mais avançados. Isto explica a razão pela qual, de uma hora para a outra, todas as empresas começaram a interessar-se pelo tema da certificação, numa altura em que se fala do Conteúdo Local como forma de chegar ao bolo dos petrodólares que serão (e já estão a ser) gerados pelo sector do gás. Nesta corrida, o Governo tem procurado ajuda junto de países mais experientes. O Brasil é um deles: há mais de 20 anos que cria normas e certificação de empresas através da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). À E&M, o director-geral da ABNT, Nelson Filho, fala da cooperação, das oportunidades e dos requisitos que o País deve preencher para consolidar o seu processo.

Como funciona o sistema de normalização e qualidade no Brasil? No âmbito desta cooperação com Moçambique, não haverá a necessidade de transformar os fundamentos de abordagem do INNOQ? Primeiro, é preciso que fique claro que o apoio a Moçambique é da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (UNIDO) com parceria do Brasil. A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) é o equivalente ao Instituto Nacional de Normalização e Qualidade (INNOQ) de Moçambique, sendo que a ABNT não tem serviços de metrologia. É um instituto apenas de normalização, mas que tem a componente da certificação. A metrologia fica a cargo de um instituto

estatal, pois nós somos uma associação privada, ao contrário do que acontece aqui e na maioria dos organismos africanos, que, em geral, são estatais. Enquanto ABNT, temos mais de nove mil normas já desenvolvidas, adoptando as mais importantes da Organização Internacional de Normalização (ISO, na sigla em inglês). Temos inclusivamente uma participação substancial na ISO. O princípio que reforcei junto do director-geral do INNOQ é que nos pode solicitar qualquer norma: nós podemos enviar a norma aberta, já traduzida, de modo que a transformem numa norma moçambicana, apenas com pequenas alterações. Não enviaremos um PDF fechado, mas sim a norma em formato aberto, editável, com imagens abertas para fazerem, igualmente, a edição final. E como está a correr essa experiência? Já há lições a reter? Do ponto de vista da transformação digital, do sistema de normalização e da infra-estrutura de qualidade, trago aqui a experiência brasileira, mas também a de outros países, principalmente latino-americanos, como a Argentina, Chile, Bolívia, Colômbia e Peru. Através da Colômbia, fui contactado pela UNIDO, que estava a financiar este trabalho em Moçambique. Envolvi-me directamente com a organização, que tem uma missão importante de apoio à gestão da qualidade. A partir daí, definimos uma metodologia de trabalho oficial que temos aplicado noutros países de África, como a Tanzânia e o Gana, e alguns países da Europa, como a Ucrânia. Sobre as lições a reter, primeiro, há o conceito de transformação digital que, apesar

“Com o apoio do Banco Mundial, podemos vir a ter uma estrutura de tecnologia de informação, incluindo laboratórios de metrologia”, Nelson Filho

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de ter duas palavras, muitas vezes incide apenas na área digital, com a compra de computadores e software. Isso, por si, não resolve as tarefas, porque esquecemos a transformação, que diz respeito às componentes de gestão de negócios, passando pela governança e recursos humanos - a componente mais preciosa de todas (pessoas, cultura e liderança). Se a cultura subjacente não for bem preparada, haverá muita resistência e as mudanças não vão acontecer. No terceiro nível, temos processos e modelos de negócio, e, no quarto nível, a estrutura de informação e dados. Só no quinto nível, vem, a nosso ver, a parte digital. É como uma pirâmide: não dá para começar pelo topo. A parte digital agrega algum valor, mas muitas vezes o insucesso dos trabalhos e projectos de digitalização devem-se à falta de consideração pelos processos de base. Esta é a lição que trazemos. Estamos a cooperar com o INNOQ sobre a criação e consolidação de todas estas camadas. Qual é a sua percepção sobre o ponto em que se encontra Moçambique? O INNOQ tem uma grande oportunidade de evolução do ponto de vista da transformação digital, mas tem um problema estrutural muito grande: a falta de recursos. Houve uma perda de recursos em 2017, devido a uma tempestade, e o instituto está numa situação muito precária do ponto de vista da infra-estrutura tecnológica. Por isso, estamos a desenvolver o projecto junto com a UNIDO, e talvez com o apoio do Banco Mundial, possamos vir a ter uma nova estrutura de tecnologia de informação, incluindo laboratórios de metrologia com toda a estrutura interna que possibilita a ligação ao mundo. Caso contrário, tudo vai ficar mais difícil. A isso acresce a formação de quadros… Sim. Já estamos a pensar em termos de referência para a contratação de empresas locais para fazer um estudo e, www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


posteriormente, uma possível implementação, venda de equipamentos e instalação. Está tudo ainda a crescer, em simultâneo, nomeadamente a parte infra-estrutural e a formação de quadros. Outra coisa que foi solicitada ao INNOQ é que inicie a contratação de, pelo menos, mais duas pessoas na área de tecnologias de informação, pois só existem duas para atender a tudo, e vamos precisar de mais gente. Existe uma concepção errada de que quanto mais tecnologia, menos gente se precisa. É o contrário: quanto mais tecnologia se tem, maior é o número de pessoas mais bem capacitadas que será necessário. Solicitámos esse reforço, pois temos alguns trabalhos estruturais para fazer que incluem a definição de uma estratégia e de formas de governança, ou seja, estrutura de tecnologia de informação dentro do organograma. Temos uma série de trabalhos que podem andar em paralelo, que são mais de pensamento e de redesenho. Qual é a duração do projecto e quais são as metas? O projecto vai até ao final do próximo ano, o que é curto, mas é um prazo que poderá, eventualmente, ser renovado. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023

O que mudou no Brasil? Posso contar várias histórias do Brasil e de outros países. Evoluímos muito. Primeiro, a sociedade tem, hoje, um entendimento do que é a normalização e a infra-estrutura de gestão da qualidade. Do ponto de vista dos serviços da normalização, é tudo muito maior, pois está tudo acessível e transparente. Uma pessoa pode, em poucos minutos, visualizar e adquirir qualquer norma através dos meios digitais que desenvolvemos. Não apenas meios da ABNT, mas de todo o mundo, acessível na nossa base de dados, onde temos entre 250 a 300 mil normas. Tornámo-nos agregadores das melhores normas mundiais para o público brasileiro (empresas, consultores, indústria, especialistas, pessoas singulares e às vezes estudantes). Quanto ao desenvolvimento de normas, hoje também temos uma pujança e uma participação muito maiores da sociedade. Quando vou fazer uma norma, já sei quem comprou coisas parecidas com o tema que estou a tratar. Já existe uma plataforma electrónica que convida todos os que já fizeram cursos

dentro desse tema e todos os que têm certificação na área. E assim trago os potenciais utilizadores da norma para participarem no seu desenvolvimento. Ao nível da evolução das empresas, em termos de desempenho e competitividade, há resultados visíveis? Há 20 anos, poucas empresas eram exportadoras como hoje. A normalização tem um papel, por exemplo, na dinamização das exportações, no desenvolvimento do mercado, no crescimento económico, na eficiência das empresas, que é, certamente, muito maior. Estima-se que entre 0,5% a 1% do PIB de um país seja contribuição da normalização. Então, o que ocorreu? Multiplicámos a produção de normas com a digitalização e multiplicámos por sete a venda de normas, sendo que o acesso foi multiplicado por um factor 10 ou 20 vezes. O desafio, porém, é que as empresas ainda encaram isto como um gasto. Mas não é. Pelo contrário, é um investimento. A norma é feita por dezenas, às vezes centenas, de especialistas. A norma é um sumo concentrado de conhecimento.

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OPINIÃO

Tânia Dinis • Responsável pela Área de Financiamentos de Longo Prazo (CIB) no Banco ABSA Moçambique

Uma Perspectiva Sobre o Investimento de Impacto: Desafios e Oportunidades Para as Mulheres Rurais (I)

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Uma mulher instruída tem menos filhos e os seus descendentes têm duas vezes mais probabilidades de sobreviver após os 5 anos de idade. Além disso, mulheres educadas têm maiores probabilidades de se envolverem em actividades empreendedoras

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Investimento de Impacto (Impact Investment) situa-se na intersecção entre o crescimento financeiro e a transformação socioambiental positiva. No continente africano, onde as disparidades económicas persistem, essa modalidade de investimento surge como um farol de esperança. À medida que nos aprofundamos numa perspectiva moçambicana, este artigo procura elucidar o potencial do investimento de impacto na promoção do crescimento económico inclusivo, com um foco acentuado nas mulheres rurais. África, continente dotado de uma rica biodiversidade cultural e natural, vasta riqueza mineral e uma população jovem e dinâmica, tem enfrentado a sua quota-parte de desafios, desde a pobreza arraigada à desigualdade. No entanto, os ventos de mudança são evidentes: o investimento de impacto - uma mudança de paradigma no sector financeiro global - está, cada vez mais, a encontrar aqui a sua base. Visionários e investidores vêem o continente, não apenas como uma fronteira financeira, mas como um terreno fértil para investimentos que combinem o crescimento sustentável com mudanças socioambientais tangíveis. No meio destas intervenções, o investimento de impacto emergiu como uma ferramenta potente para impulsionar o desenvolvimento inclusivo, com foco nos desafios socioeconómicos e ambientais. De acordo com a Rede Global de Investimento de Impacto (GIIN), até 2022, 42% dos investidores de impacto tinham os seus fundos aplicados na região Subsaariana, e o mercado africano de investimento de impacto valia aproximadamente 33 mil milhões de dólares, apresentando uma taxa de crescimento anual composta de 15% entre 2017 e 2022. Além da sua escala, este número destaca o imenso potencial do investimento de impacto no continente africano. Ainda segundo o GIIN, numa pers-

pectiva global, 61% dos investidores alocam pelo menos alguns Activos Sob Gestão (AUM, na sigla inglesa) ao sector alimentar e agrícola, indicando ser o sector de investimento mais comum. Além disso, mais de metade dessas organizações (53%) também visam a mitigação, adaptação ou resiliência às alterações climáticas, reflectindo a ligação inerente entre a agricultura e o ambiente. Cerca de 55 % dos investidores da amostra alocam capital para a área energética, seguidos por pouco mais de metade (51%), que investem no sector da saúde, reflectindo o foco contínuo nas necessidades básicas, especialmente nos mercados emergentes. Mulheres rurais, muitas vezes no centro dos principais desafios, representam tanto as beneficiárias como as agentes desta mudança. Os seus papéis nesses sectores-chave, muitas vezes actuando como líderes das suas comunidades, posicionando-as como motores essenciais de desenvolvimento, torna-as nas destinatárias ideais para os investimentos de impacto. De acordo com a ONU, em 2021, 52% das pessoas empregadas na África Subsaariana estavam activas no sector agrícola, e quase metade (45%) da área mundial adequada para expansão da produção agrícola sustentável localiza-se em África. No entanto, as menores taxas de produtividade agrícola por trabalhador são encontradas no continente. Mais de 60% da força de trabalho está envolvida na agricultura, com a fracção do trabalho feminino representando a maioria (60%80%). Ainda assim, de acordo com a Organização para a Alimentação e a Agricultura (FAO), as mulheres rurais em África apenas têm acesso a 5% dos serviços de extensão agrícola e a menos de 10% do crédito financeiro oferecido aos pequenos agricultores. Os investimentos de impacto que visam reduzir estas lacunas podem aumentar significativamente a produtividade agrícola e os respectivos meios de subsistência. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


Mulheres rurais enfrentam barreiras sistémicas aos papéis de liderança nas suas comunidades Do ponto de vista da educação, no continente africano, mais de 33 milhões de raparigas não frequentam o ensino primário nem o secundário (UNESCO 2019). Quando os investimentos se concentram na melhoria da educação feminina, surgem benefícios em cascata. Uma mulher instruída tem menos filhos e os seus descendentes têm duas vezes mais probabilidades de sobreviver após os 5 anos de idade. Além disso, mulheres educadas têm maiores probabilidades de se envolverem em actividades empreendedoras, beneficiando não apenas as suas famílias, mas também as suas comunidades. No que tange à inclusão financeira, apenas 37 % das mulheres na África Subsaariana têm acesso a contas bancárias, em comparação com 48 % dos homens (FMI), e um número ainda menor tem acesso a linhas de crédito. Os investimentos de impacto em instituições fintechs e de microfinanças destinadas às mulheres rurais podem elevar significativamente o seu estatuto económico. Sob o prisma do empoderamento e liderança, as mulheres, especialmente em www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023

ambientes rurais, enfrentam frequentemente barreiras sistémicas aos papéis de liderança nas suas comunidades. No entanto, quando equipadas com os recursos certos, podem catalisar mudanças positivas em toda a comunidade. A experiência do Quénia com investimentos de impacto serve de inspiração. Iniciativas como a “Ushanga Quénia” elevaram financeiramente as mulheres rurais através do trabalho com missangas, mas também promoveram um renascimento do artesanato tradicional. Através do acesso alargado à educação, aos cuidados de saúde e às finanças, as mulheres rurais quenianas tecem histórias de emancipação. Aproximadamente 60 sociedades cooperativas para mulheres empresárias foram criadas como resultado desta iniciativa, e cinco mil mulheres conseguiram adquirir competências empreendedoras e capacitar-se. Ainda nesta nação, a iniciativa M-Kopa é uma plataforma fintech que fornece serviços financeiros digitais a consumidores com poucos recursos bancários, aproveitando dados para combinar micropagamentos digitais com acesso à In-

ternet, com o objectivo de melhorar a vida quotidiana destes utentes. Desde então, construíram uma das plataformas de financiamento online mais avançadas do mundo. Esta plataforma já dirigiu mil milhões de dólares em produtos e crédito à população financeiramente excluída, principalmente famílias rurais, predominantemente geridas por mulheres, e permitiu-lhes aceder a energia limpa através de um modelo de financiamento acessível e pré-pago (pay-as-you-go). Olhando para o outro lado do continente, o Gana também pode servir como um exemplo inspirador, destacando a agricultura sustentável. Sendo o quarto maior produtor de grãos de carité do mundo, esta oportunidade económica beneficia 470 000 mulheres agricultoras. A “Iniciativa Mulheres no Carité”, adaptada aos produtores de manteiga de carité, resume isso. Ao fundir sustentabilidade e perspicácia empreendedora (visando os principais ODS 5, 8 e 15) ampliou os rendimentos e deu às mulheres uma via para traçar o rumo ao crescimento financeiro, apoiando actualmente cerca de 13 000 mulheres agricultoras.

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NAÇÃO | CICLONES


Época Chuvosa 2023-2024

Temporada Com Menos Ciclones, Mas os Mesmos Riscos Estruturais A previsão para a temporada ciclónica 2023-2024, que agora começa, aponta para “uma mudança drástica em relação aos últimos três anos”, com uma probabilidade menor de ciclones devastadores chegarem a Moçambique. Mas as autoridades alertam: basta um para causar grande destruição, pelo que o País não pode baixar a guarda. Prevenção e resiliência continuam a ser sempre palavras de ordem. Estamos preparados? Texto Celso Chambisso & Redacção • Fotografia Istock Photo


NAÇÃO | CICLONES

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centro meteorológico francês da Ilha da Reunião, uma das autoridades de previsão e acompanhamento de ciclones no oceano Índico, antevê uma temporada de ciclones 2023-2024 caracterizada por actividade abaixo do normal em toda a bacia de ciclones do sudoeste do oceano Índico. Esta bacia estende-se desde as costas do Bangladesh e da ilha de Sumatra – a maior ilha inteiramente pertencente à Indonésia – até à costa de Moçambique. São cerca de 7400 quilómetros. Por norma, os ciclones do Índico formam-se naquelas paragens a oriente e dirigem-se para o ocidente, estando Madagáscar e Moçambique entre as zonas de impacto natural. Isto faz parte da natureza, não é consequência das alterações climáticas. Aquilo que tem mudado (para pior) é a frequência, cada vez maior, com que ciclones devastadores se formam e rasgam territórios povoados. Mas a temporada que agora começa chega com probabilidades atenuadas em relação aos últimos anos. A ver vamos. A previsão da Meteo France estima que haja entre cinco a oito sistemas (tempestades e ciclones), com dois a quatro deles a poderem atingir o estado de ciclone tropical, o mais grave. Espera-se uma actividade ciclónica muito reduzida na primeira parte da temporada, ou seja, o primeiro sistema depressionário deverá aparecer tarde. Depois, a partir de meados de Janeiro, espera-se uma actividade um pouco mais sustentada a norte e nordeste das Ilhas Mascarenhas, com fenómenos ciclónicos a deslocarem-se principalmente para sul ou sudeste. Ou seja, em vez de atravessarem o Índico numa longa viagem para oeste, as tempestades da nova temporada deverão ter tendência para “mergulhar” logo para sul, deixando as costas de Madagáscar e Moçambique mais sossegadas – prevê-se um risco de impacto reduzido. “Estimamos que haja uma probabilidade de 70% de a actividade ciclónica da temporada ficar abaixo do normal”, prevê a Meteo France, a partir do centro de observação da Ilha da Reunião. Há apenas 10% de probabilidade que haja mais depressões atmosféricas que o normal.

Um contexto diferente dos últimos três anos O contexto geral é de “uma mudança drástica em relação aos últimos três anos”, refere a previsão sazonal do centro meteorológico francês. Isto deve-se à influência, à escala global, “de um forte episódio de El Niño, combinado, a ní-

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Aquilo que tem mudado (para pior) é a frequência, cada vez maior, com que ciclones devastadores se formam e rasgam territórios povoados vel regional e na primeira parte da temporada, com uma fase positiva do Dipolo do oceano Índico”. O que são estes fenómenos? Vamos recuar um pouco. A nível global, o episódio do fenómeno atmosférico La Niña, no oceano Pacífico equatorial, começou no final de 2020. Permaneceu activo e depois desapareceu, em Março deste ano. Nessa altura, as condições de temperatura no Pacífico, em combinação com a circulação de ar, alteraram-se. E, quando assim acontece, surge o El Niño, que está em activida-

de há nove meses. “As águas do Pacífico equatorial oriental estão actualmente muito mais quentes do que o normal”, e quando esta “anomalia oceânica” acontece tem reflexos “na circulação atmosférica e oceânica global, particularmente em regiões tropicais”, resume o centro meteorológico francês. Em que ponto estamos? Espera-se que o actual El Niño atinja o pico nas próximas semanas (entre Dezembro e Janeiro), antes de diminuir lentamente. “Este é potencialmente um episódio de alta amplitude, comparável aos eventos www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


Época ciclónica 2023-2024 Probabilidade de ocorrência de ciclones

10% Acima do normal

100% 20% Dentro da normalidade

70% Mais calma

Número de tempestades/ciclones: 5 a 8 (normal: até 10) Número de ciclones tropicais: 2 a 4 (normal: até 5) FONTE Meteo France

‘LINKS’ A TER EM CONTA

de 2015-2016, 1997-1998 ou 1982-1983. Espera-se que a sua influência nas circulações oceânicas e atmosféricas continue durante todo o Verão austral”. Falta perceber o outro mecanismo desta gigante engrenagem ciclónica. A nível regional, está em curso aquilo que é designado pelos meteorologistas como “fase positiva” do Dipolo do oceano Índico. A palavra “dipolo” refere-se a duas áreas do mar com temperaturas opostas, de um lado, as águas junto à costa oriental africana e, do outro, o mar da costa oeste da Indonésia. São os dois extremos do Índico. Quando a temperatura está acima da média no Índico oeste (costa africana) e abaixo da média no Índico leste (Indonésia), temos uma fase positiva do dipolo. Quando as condições são as opostas, temos uma fase negativa. Decorre desde Agosto – e terá já atingido a intensidade máxima em Novemwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023

bro – uma fase positiva. “Uma fase negativa do Dipolo Subtropical do oceano Índico pode assumir o controlo no início de 2024, mas, por enquanto, a sua magnitude é bastante incerta”, nota a previsão da Meteo France. Seja como for, a paisagem atmosférica e oceânica prevista e que se começa a instalar para o Verão austral 2023-2024, “é diametralmente oposta à do ano passado”. Isto quer dizer que Moçambique pode baixar a guarda? Não. Nem Moçambique, nem nenhum país da bacia do Índico. É necessário implementar as precauções habituais no início da temporada de ciclones. Pode ser um alívio saber que as probabilidades de haver ciclones fortes são mais baixas, mas, “para um determinado local, basta um sistema depressionário para provocar um impacto que pode ser catastrófico”, conclui a Meteo France.

• O Instituto Nacional de Meteorologia (INAM) está acessível através do endereço www.inam. gov.mz e inclui na página de entrada a previsão do dia e um mapa com alertas e avisos. • Uma das autoridades mais fidedignas na previsão ciclónica da bacia do Índico Oeste (que inclui Moçambique) é o centro do instituto de meteorologia francês (Meteo France) na Ilha da Reunião, com boletins actualizados várias vezes ao dia no endereço meteofrance.re/fr/ cyclone • As administrações regionais de água e o Instituto Nacional de Gestão de Riscos e Desastres (INGD) são fontes de informação oficiais a seguir durante a época ciclónica na Internet. Apesar de não haver uma sistematização clara da informação, uma pesquisa nos motores de busca poderá ajudar a chegar às páginas destas instituições, incluindo nas redes sociais. • Entre a informação divulgada estão os boletins de previsão hidrológica, que incluem uma descrição do caudal e risco de subida das águas em cada rio do País. Também aqui será necessário algum trabalho de pesquisa nos motores de busca para chegar aos documentos.

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NAÇÃO | CICLONES Os riscos a ter em conta, segundo o INAM Uma explicação similar à da Meteo France foi dada à E&M pelo director-geral do Instituto Nacional de Meteorologia (INAM), Adérito Aramuge, mas com algumas particularidades, que têm em conta a experiência de ocorrência de fenómenos extremos no País. Até final do ano, o INAM prevê chuva a níveis dentro da média para Cabo Delgado, Niassa, Nampula, distritos a norte da Zambézia e na faixa costeira desta província. A precipitação poderá ficar abaixo do normal nas províncias de Maputo, Gaza, Inhambane, Manica, Sofala, Tete e parte da Zambézia. Só no período de Janeiro a Março deverá haver chuva acima do normal nas províncias de Niassa, Nampula, Zambézia e grande parte das províncias de Cabo Delgado e Tete.

O Instituto Nacional de Gestão de Desastres anunciou um défice de mais de dez mil milhões de meticais para fazer face à época chuvosa e ciclónica 2023-2024, o que quer dizer que ainda não estamos preparados para enfrentar a situação Apesar de a época ciclónica se afigurar mais calma, o INAM alerta para o risco sazonal da ocorrência de cheias no primeiro trimestre de 2024. Analisando a situação hidrológica e tendo em conta a permanência de população em zonas de cheia (aquelas que são o leito natural dos cursos de água na época das chuvas), Adérito Aramuge indica que mais de 800 mil pessoas podem ser afectadas por inundações. Face aos riscos prevalecentes, recomenda medidas de precaução. A população, por exemplo, deve evitar a travessia de rios, manter os seus bens e equipamentos em locais seguros, bem como fazer o acompanhamento da informação emitida através dos boletins e comunicados hidrológicos. Às administrações regionais de água, à Electricidade de Moçambique (EDM) e à Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB), recomenda-se a observância rigorosa das medidas de exploração das albufeiras, face às previsões.

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Previsão de actividade ciclónica

De um modo geral, a Meteo France prevê que a costa moçambicana não enfrente grandes tempestades como nas temporadas passadas. Mapas publicados pela instituição fazem menção a uma actividade ciclónica reduzida, quer na primeira parte da temporada (Novembro de 2023 a Janeiro de 2024), quer na segunda (Janeiro a Abril de 2024)

A actividade ciclónica será significativamente reduzida de Novembro a Janeiro, com uma Zona de Convergência Intertropical a lutar para se estabelecer de forma propícia à génese de tempestades tropicais

Espera-se uma mudança de regime na segunda metade da temporada (de Janeiro a Abril), mas a actividade deverá desenvolver-se principalmente no norte ou nordeste das Ilhas Mascarenhas. Madagáscar e Moçambique deverão passar por menores riscos FONTE Meteo France

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NAÇÃO | CICLONES Prevenir a actividade logística: um quebra-cabeças

Diagrama do El Niño

Estima-se que cerca de 70% das estradas em Moçambique sejam terraplanadas, sendo que grande parte das restantes carece de manutenção. Muitas das vias passam junto a rios e atravessam zonas de cheias, tornando-as vulneráveis ao mínimo sinal de cheias – que em muitos locais são certas, dada a confluência das escorrências. Assim, para quem faz vida (e negócios) através das estradas, o INAM recomenda a “programação antecipada das deslocações”, tanto no que respeita ao transporte de passageiros, como na circulação de mercadorias, através de veículos pesados. Mesmo que haja planificação

O estudo das temporadas passadas mostra uma resposta dependente da amplitude do fenómeno: pode ser maior do que o normal com um El Niño fraco, mas quando é moderado a forte (cenário deste ano), a época pode ser mais calma

Cenário El Niño

As consequências do El Niño deverão ditar falta de chuva em várias extensões de África. O Instituto Nacional de Meteorologia prevê que a seca venha a afectar, principalmente, o centro e sul do País e redundância, o INAM recomenda o aprovisionamento antecipado de carregamentos, assegurando que o transporte seja feito em períodos de bom tempo, privilegiando camiões de baixa tonelagem. Há mais de 800 pontes no País, sendo a manutenção das vias reconhecidamente débil, pelo que facilmente se podem tornar no elo mais fraco de qualquer cadeia logística.

Cenário "La Niña"

Falta dinheiro para responder aos eventos extremos O Instituto Nacional de Gestão de Desastres (INGD) anunciou recentemente um défice de de mais de dez mil milhões de meticais para fazer face à época chuvosa e ciclónica 20232024, o que quer dizer que ainda não estamos preparados para enfrentar a situação. De acordo com a presidente do INGD, Luísa Meque, há 4,3 mil milhões de meticais disponíveis e o trabalho de mobilização de recursos continua, junto do Governo e de parceiros, para tentar suprir o défice. O financiamento das actividades de recuperação e construção está entre os mais afectados. Contas feitas, Luísa Meque indica que o INGD assistiu, na época passada

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O que se espera no mundo na época ciclónica 2023-2024 A maioria das grandes massas de água da Terra é regularmente afectada por ciclones tropicais, destacando-se, até Abril as intempéries em diferentes zonas do Índico. Cada região tem as suas características próprias e diferentes mecanismos de monitorização. Saiba quais

Região da Austrália

A época ciclónica 2023-2024 começou oficialmente a 1 de Novembro de 2023 e terminará a 30 de Abril de 2024. Durante a estação, os ciclones tropicais serão oficialmente monitorados por um dos três centros de alerta de ciclones tropicais para a região, nomeadamente o Gabinete Australiano de Meteorologia, o Serviço Meteorológico Nacional da Papua-Nova Guiné e a Agência Indonésia de Meteorologia, Climatologia e Geofísica.

Sudoeste do Índico

A época ciclónica começou a 15 de Novembro e terminará a 30 de Abril de 2024, com excepção das Ilhas Maurícia e das Seychelles, para as quais terminará a 15 de Maio. São monitorizados pelo Centro Meteorológico Regional Especializado da ilha da Reunião e, a título não oficial, pelo Centro Conjunto de Alerta de Tufões.

Pacífico Sul

A temporada começou oficialmente a 1 de Novembro de 2023 e terminará a 30 de Abril de 2024. Durante a estação, os ciclones tropicais serão oficialmente monitorizados pelo Serviço Meteorológico do Fiji, pelo Gabinete Australiano de Meteorologia e pelo MetService da Nova Zelândia.

Oceano Índico Norte

A estação de ciclones do Oceano Índico Norte não tem limites oficiais, mas os ciclones tendem a formar-se entre Abril e Dezembro, com o pico de Maio a Novembro. Estas datas delimitam convencionalmente o período de cada ano em que se forma a maioria dos ciclones tropicais no norte do Oceano Índico. O âmbito de aplicação é limitado ao Oceano Índico no Hemisfério Norte, a leste do Corno de África e a oeste da Península Malaia. Em média, formam-se três a quatro tempestades ciclónicas nesta bacia em cada estação, monitoradas pelo Departamento Meteorológico da Índia.

(2022-2023), cerca de 712 644 pessoas das 1 356 671 afectadas pelo ciclone Freddy - o mais grave da última temporada -, com bens alimentares e não alimentares. Além dos ciclones, partes do sul de Moçambique estão a ser afetados por longos períodos de seca, cujos indicadores voltam a surgir nas previsões dos próximos meses – em paralelo com zonas que estão no mapa de risco de cheias. A mistura de previsões contrárias chega a parecer paradoxal, mas a extensão do território moçambicano ajuda a explicar a diversidade de zonas climáticas. O facto de estar em curso uma fase do El Niño contribui também para o contraste.

Boas perspectivas ao nível da prevenção

FONTE Global Worldwide Tropical Cyclone

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Nem tudo corre mal. Há iniciativas e investimentos encorajadores nalguns meios de prevenção de desastres naturais e a experiência mais recente foi a instalação, em Abril, de um radar mewww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


teorológico na Cidade da Beira, centro do país, que faz parte de um projecto de aquisição de mais seis radares pelo Governo em parceria com o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD). O equipamento permite melhorar o acompanhamento das condições atmosféricas e, em caso de aproximação de um ciclone, consegue cobrir um raio de acção de 400 quilómetros, explicou à E&M o director-geral adjunto do INAM, Mussa Mustafa. Para toda aquela área passa a ser possível obter estimativas mais precisas de precipitação, intensidade dos ventos, bem como trajectória de ciclones. Este tipo de radar é precioso para difundir informação às comunidades e tomar medidas de prevenção. Por outro lado, o equipamento na Beira é usado para a monitorização de algumas das principais bacias hidrográficas no centro do país (Búzi, Púnguè e baixo Zambeze). Após a sua operacionalização, o radar já foi usado para o seguimento dos efeitos do ciclone Freddy, no início deste ano. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2019


Mais radares meteorológicos Se o plano se concretizar, mais seis radares deverão juntar se ao que já foi instalado na Beira, para ajudarem a antecipar medidas de prevenção

LICHINGA NACALA TETE

MANICA BEIRA

CANAL DE MOÇAMBIQUE

INHAMBANE

XAIXAI

Estão em curso negociações com o BAD para se obter mais financiamento. Espera-se que até final de 2024 estejam instalados mais dois radares, um em Xai-xai e o outro em Nacala-Porto Ainda de acordo com Mussa Mustafa, tendo em conta os diversos eventos extremos que afectam o País e a sua extensão territorial, foi feito um levantamento sobre o número de radares necessários para se alcançar um sistema de aviso prévio completo – que inclui aplicações específicas para a aviação, marinha e turismo. Moçambique precisa de mais seis radares meteorológicos a longo prazo. “Neste momento estão em curso negociações com o BAD para se obter mais financiamento. Espera-se que até final de 2024 estejam adquiridos e instalados mais dois radares, um em Xai-Xai (sul) e o outro em Nacala-Porto (norte). Para estes dois radares, o custo é de seis milhões de dólares. De referir que este valor inclui a construção de infra-estruturas para acomodar os radares, formação de pessoal para manutenção e outros meios necessários para um bom funcionamento dos sistemas”, anunciou. Ao nível da região da SADC, a África do Sul possui cerca de dez radares meteorológicos, Zimbabwe e Tanzânia têm quatro e o Botswana tem um. Os radares desses países não são necessariamen-

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te iguais ao de Moçambique. No âmbito da política da SADC sobre transportes, comunicações e meteorologia, pretende-se criar uma rede de radares para permitir maior aproveitamento e partilha de informação por parte de todos os países, no acompanhamento dos fenómenos meteorológicos, rumo ao chamado Aviso Prévio para Todos, até 2027.

Mais um sistema de aviso prévio Recentemente, o ministro das Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos anunciou o estabelecimento do sistema de previsão e aviso prévio de cheias e secas para as bacias hidrográficas dos rios Limpopo, Save, Búzi e Pungué, que será sediado em Maputo. De acordo com Carlos Mesquita, todas as quatro comissões de bacias hidrográficas mencionadas – através das quais Moçambique se destaca no estabelecimento de sistemas de aviso prévio – possuem Planos de Acção Estratégicos, Protocolos de Partilha de Dados e Informações. Em relação à Comissão do Curso de Água do Zambeze (ZAMCOM), o titular da pasta de Obras Públicas, Habitação e

Recursos Hídricos anunciou que possui agora um programa de investimento, o Programa de Desenvolvimento Integrado e Adaptação às Mudanças Climáticas na Bacia do Rio Zambeze, que abrange projectos em vários sectores relacionados com a água, incluindo agricultura, abastecimento à população, gestão do ambiente, bem como iniciativas de protecção e conservação dos recursos hídricos.

Alertas de insegurança alimentar para o início de 2024 De acordo com a rede de alerta precoce de insegurança alimentar Fews Net, financiada pela cooperação norte-americana (USAID) e usada pelas entidades de ajuda humanitária, a insegurança alimentar aguda, que coloca as famílias sob pressão (stress), deverá evidenciar-se nas zonas semiáridas remotas das regiões sul e centro. O padrão é comum a outros anos e a aridez deverá ser acelerada pelas consequências indirectas do El Niño. Enquanto parte do País enfrenta risco de ciclones, nestas áreas (sobretudo no interior de Gaza e Inhambane) prevalece a ameaça de escassez de água para a área semeada e indisponibilidade para trabalho agrícola. Como resultado, os primeiros meses do novo ano podem ser sinónimo de colheitas abaixo da média, preços elevados dos alimentos e acesso limitado ao mercado por parte das famílias com menos recursos. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023



OPINIÃO

Ricardo Velho • Partner & Business Development Manager

Certificação de Produtos em Moçambique, Oportunidades e Desafios Para as Empresas

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A relação entre a certificação de produtos e os laboratórios acreditados é estreita e fundamental para garantir a integridade e a confiança do processo de certificação

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certificação de produtos desempenha um papel fundamental na garantia da qualidade e segurança dos bens disponíveis no mercado. Em Moçambique, esse processo tem vindo a ganhar uma lenta relevância. Embora esta abordagem permita demonstrar o alinhamento com as normas internacionais, o lento ritmo que se tem verificado não tem contribuído como deveria para o desenvolvimento sustentável do País. No entanto, à semelhança de outras actividades, a certificação de produtos em Moçambique enfrenta uma série de desafios e oferece oportunidades que podem incentivar o sector privado. Como oportunidades para as empresas temos: 1. Acesso a Mercados Internacionais: - A certificação de produtos abre as portas para a entrada em mercados internacionais, permitindo que as empresas moçambicanas alcancem consumidores globais. Produtos certificados têm uma vantagem competitiva, pois demonstram a conformidade com os padrões exigidos por diferentes países e regiões. 2. Construção de Credibilidade e Confiança: - A certificação (de produtos) constrói a confiança do consumidor. Todos estamos cada vez mais conscientes e exigentes em relação à qualidade e segurança dos produtos que consumimos. 3. Estímulo à Inovação e Melhoria Contínua: - O processo de certificação requer, muitas vezes, conformidade com os últimos padrões, incentivando as empresas a investirem em pesquisa, desenvolvimento e inovação. Isso não apenas atende às exigências de certificação, mas também impulsiona a competitividade. Nos últimos tempos, muito se tem fa-

lado em certificação. A maioria das vezes fala-se em certificação de sistemas de gestão. Paralelamente, também se tem ouvido falar em certificação de produtos. No entanto, pouca ou nenhuma importância ou referência se tem feito aos laboratórios (e à sua acreditação), dos quais a certificação do produto tanto depende. A relação entre a certificação de produtos e os laboratórios acreditados é estreita e fundamental para garantir a integridade e a confiança do processo de certificação. Os laboratórios desempenham um papel essencial na avaliação e verificação de produtos, e a acreditação é uma componente crucial desse processo. Apresento alguns exemplos que ilustram esta interligação: Testes e Ensaios: Os laboratórios acreditados são responsáveis por realizar testes e ensaios em produtos para verificar se atendem aos padrões e requisitos específicos estabelecidos para a certificação. A acreditação do laboratório assegura que possui a competência técnica necessária e segue procedimentos rigorosos. Conformidade com Normas: Muitas certificações de produtos exigem que os testes sejam realizados de acordo com normas específicas. Os laboratórios acreditados são capazes de realizar esses testes de maneira precisa e confiável, garantindo a conformidade do produto com os requisitos estabelecidos. Credibilidade do Processo de Certificação: A acreditação de um laboratório aumenta a credibilidade de todo o processo de certificação. Quando um laboratório é acreditado por uma entidade reconhecida, isso significa que ele foi avaliado, de forma independente, quanto à sua competência técnica, confiabilidade e imparcialidade. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


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Os cerca de 200 laboratórios de controlo de qualidade acreditados são muito poucos para as necessidades do País

Aceitação Internacional: Muitas certificações, especialmente aquelas relacionadas ao comércio internacional, exigem que os testes sejam realizados por laboratórios acreditados. Isso facilita a aceitação dos produtos nos mercados internacionais, pois os laboratórios acreditados são reconhecidos internacionalmente como cumprindo padrões de qualidade. Rastreabilidade e Transparência: A acreditação garante que os resultados dos testes sejam rastreáveis e transparentes. Tal significa que as organizações de certificação e os consumidores podem confiar nos resultados dos testes realizados pelos laboratórios acreditados, aumentando a confiança no processo de certificação. Actualização Constante: Os laboratórios acreditados são geralmente obrigados a manter a actualização constante das suas práticas e equipamentos, o que se afigura como essencial para garantir que os testes estejam alinhados com os padrões mais recentes e reflictam as melhores práticas da indústria. Assim, os laboratórios acreditados são parceiros cruciais no processo de certifiwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023

cação de produtos. Conclui-se, justificadamente, que a sua acreditação confere confiança aos testes e ensaios realizados, garantindo que os produtos certificados correspondem a padrões de qualidade e segurança estabelecidos. A interdependência entre certificação de produtos e laboratórios acreditados é essencial para construir a confiança dos consumidores e para facilitar o comércio nacional e internacional. Moçambique tem aproximadamente 20 laboratórios acreditados, o que é largamente insuficiente para as necessidades do País. Estes laboratórios realizam ensaios de controlo de qualidade alimentar, ensaios de materiais de construção, calibração de equipamentos, ensaios na área da saúde, entre alguns outros. Para além do número de laboratórios ser reduzido, os próprios parâmetros para os quais se encontram acreditados não cobrem as mais urgentes necessidades do mercado. Uma prova desta insuficiência é o polémico Programa de Avaliação da Conformidade (PAC) recentemente lançado. A principal justificação para o PAC é a necessidade de garantir a qualidade dos produtos importados para Moçambique. A forma escolhida para se garantir esta qualidade aponta que não temos condi-

ções internas para fazer esta avaliação da conformidade na extensão do necessário. Se o PAC supostamente serve para garantir a qualidade dos produtos importados, como garantimos a qualidade dos produtos produzidos internamente? E como garantimos a qualidade dos produtos que queremos exportar? Se não temos infra-estruturas adequadas, como laboratórios acreditados independentes, a certificação do produto pode levantar dúvidas sobre a sua imparcialidade e independência. Por exemplo, se as conclusões por parte do organismo certificador se basearem apenas nos resultados do fabricante, mais difíceis serão de se conseguir, mais morosas e mais onerosas. Estes são os principais desafios que enfrentamos quando pretendemos certificar os nossos produtos. Enquanto não tivermos uma infra-estrutura da qualidade capaz de dar resposta às necessidades do País, estaremos limitados, em termos de confiança, no que produzimos e na capacidade e no potencial de exportação. A certificação dos produtos é uma oportunidade para o sector privado. No entanto, deve ser dada especial atenção aos aspectos que impedem ou limitam a sua demonstração de conformidade.

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NAÇÃO | CICLONES

FMI Trabalha com Moçambique Para Acesso ao Fundo Para Resiliência e Sustentabilidade O Fundo Monetário Internacional (FMI) tem reforçado a atenção às políticas de resiliência climática. Em Moçambique, apesar de haver importantes avanços, há desafios pela frente. O objectivo é fortalecer os mecanismos de defesa do País, diz Alexis Meyer-Cirkel, representante residente do FMI em Maputo Texto Celso Chambisso • Fotografia Mariano Silva e D.R

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oçambique tem um quadro de políticas para enfrentar os efeitos das alterações climáticas há, precisamente, uma década. É a designada Estratégia Nacional de Adaptação e Mitigação de Mudanças Climáticas 2013-2025. Adicionalmente, é indicado um conjunto de acções transversais a todos os sectores, que incluem reformas institucionais e legais, formação e transferência de tecnologia. Este aspecto ainda constitui preocupação, de acordo com o representante do FMI em Moçambique, Alexis Meyer-Cirkel, que, nesta breve entrevista, partilhou os pontos essenciais sobre a forma como o Executivo conduz as políticas nacionais resiliência climática, os avanços alcançados, os desafios prevalecentes e, sobretudo, os vários instrumentos que aquela instituição tem disponíveis para ajudar o País neste âmbito. Como é que o FMI avalia os recursos orçamentais reservados para lidar com os desastres naturais em Moçambique? Para um país com fragilidades, sob conflito e com um alto nível de endividamento público, o impacto que os eventos climáticos extremos têm sobre a economia é exacerbado por esta limitação na capacidade de resposta. A lei orçamental estabelece que o Governo aloque 0,21% da despesa total para fa-

zer face a despesas não previsíveis e inadiáveis, em particular os desastres naturais. Porém, dada a elevada frequência das intempéries - dois a três eventos por ano -, e face à magnitude desses choques, afectando mais de um milhão de pessoas, as contingências do Estado não têm sido suficientes para uma resposta cabal. No entanto, o Governo, com o apoio de vários parceiros, tem estado a levar a cabo diversas acções no âmbito da implementação da sua estratégia nacional de adaptação às mudanças climáticas, aprovada em 2013. Que acções são essas e como é que o FMI tem ajudado a limar os pontos fracos? O FMI tem como principal responsabilidade, na sua actuação, a monitorização das políticas económicas e financeiras nos países-membros e dar aconselhamento. Neste processo, o organismo identifica os potenciais riscos para a economia e recomenda ajustamentos para garantir a estabilidade macroeconómica, promover a estabilidade financeira e sustentar o crescimento. Os riscos dos eventos climáticos extremos e as oportunidades relacionadas com o clima têm sido gradualmente integrados no aconselhamento que o FMI dá aos seus membros. O foco tem sido no desenvolvimento de capacidades de apoio à adaptação, mitigação e transição para economias de baixo carbono. Ao mesmo tempo, há também a concessão de financiamentos através de um

“O interesse nos fundos do RST entre os membros do FMI é grande e os recursos são limitados, mas estamos a trabalhar para tentar viabilizar esse apoio ao País”, Alexis Meyer-Cirkel, FMI

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programa complementar, o Fundo para Resiliência e Sustentabilidade (RST, na sigla em inglês), introduzido no ano passado. O objectivo do RST é apoiar países de baixo rendimento, reforçar a sua capacidade de resiliência aos choques externos e assegurar um crescimento sustentável, contribuindo para a estabilidade da sua balança de pagamentos a longo prazo. Importa mencionar que a intervenção do FMI nestas matérias tem sido feita em colaboração com outras instituições de desenvolvimento, como é o caso do Banco Mundial. Mas a transição para uma economia com menos emissões não exige outras formas de seguimento? Na transição para economias de baixo carbono, temos analisado questões específicas de política através da ferramenta de Avaliação da Política Climática (CPAT, na sigla em inglês), que analisa o impacto da fixação do preço do carbono e de outras políticas nos compromissos assumidos em Paris, assim como impactos de subsídios à energia, avaliações de Gestão de Investimento Público (C-PIMA) face ao clima, programas-piloto de avaliação macroeconómica do clima (CMAP), a par de outras questões mais específicas do sector financeiro, relacionadas com os riscos climáticos e as políticas públicas de apoio à transição. Moçambique poderá vir a beneficiar do Fundo para Resiliência e Sustentabilidade (RST) de que falou? Tal como outros instrumentos financeiros do FMI, para que um país tenha acesso ao RST, há um protocolo a ser seguido. Primeiro, deve ter em curso um programa financeiro, com mais de 18 meses até ao seu termo - no caso de Moçambique é a actual Linha de Crédito www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


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NAÇÃO | FMI PERSPECTIVAS

FMI E A CAUSA CLIMÁTICA Em Setembro do ano passado, o FMI anunciou 40 mil milhões de dólares para a adaptação às mudanças climáticas. Era o primeiro mecanismo de longo prazo (cerca de 20 anos), com 10,5 anos de período de maturação da dívida, destinado à adaptação às mudanças climáticas. “A nossa missão é usar esse dinheiro para apoiar os países a despertarem o potencial do financiamento privado. O meu sonho é que os 40 mil milhões gerem 400 mil milhões em financiamento para adaptação e mitigação nos países-membros”, disse, na ocasião, Kristalina Georgieva, directora-geral do FMI. Segundo a responsável, o continente africano é prioritário, “por ser o que menos contribui para o problema, mas o que mais sofre com as suas consequências”. Mas o FMI intervém noutras geografias. Em Junho deste ano, por exemplo, juntou-se ao BID num compromisso que visa uma colaboração mais forte para lidar com as mudanças climáticas e estimular as finanças verdes na América Latina e Caribe.

“É verdade que os fundos existentes são reduzidos, comparando com as necessidades. Por isso, a mobilização de recursos adicionais continua a ser uma prioridade”, Alexis Meyer-Cirkel, FMI

Alargada (ECF, na sigla em inglês). Segundo, os desembolsos são ancorados numa série de reformas políticas a serem implementadas num período de tempo acordado – no caso, reformas relacionadas com mudanças climáticas. A avaliação dessas reformas é feita em simultâneo com as avaliações do programa ECF. O Governo demonstrou interesse em aceder ao RST para fazer face a obstáculos estruturais para reforço da resiliência às alterações climáticas e à preparação para pandemias. Há um trabalho em curso para o potencial RST em Moçambique, incluindo a interacção com

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as autoridades e parceiros de desenvolvimento. Algumas áreas potenciais para reformas têm sido identificadas e, adicionalmente, uma missão de avaliação das lacunas da política climática associada ao C-PIMA terão lugar no próximo ano para apoiar no desenho das medidas de reforma. O interesse nos fundos do RST entre os membros do FMI é grande, e os recursos são limitados, mas estamos a trabalhar para tentar viabilizar esse apoio ao País. Existem vários outros instrumentos de apoio à resiliência, mas são poucos para

tantas necessidades. Como se resolve esta equação? Fazer face ao impacto das mudanças climáticas exige uma conjugação de esforços dos vários actores para aumentar a resiliência, principalmente nos países de baixo rendimento, altamente vulneráveis aos choques extremos. É verdade que os fundos existentes são reduzidos, comparando com as necessidades. Por isso, a mobilização de recursos adicionais continua a ser uma prioridade, mas precisamos também de estabelecer mecanismos claros de coordenação e fortalecer o quadro institucional para dar melhor resposta à agenda climática. Por outro lado, emergem oportunidades com o desenvolvimento de novas fontes de financiamento climático, complementares às existentes. São iniciativas de organismos multilaterais e bilaterais. A título de exemplo, os créditos de carbono, títulos públicos verdes e outras opções que incluem trocas de dívida por clima, embora ainda muito limitadas ao nível da região da África Subsahariana. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023



NAÇÃO | EL NIÑO

Como é que África e o Mundo Podem Resistir? O mundo está cada vez mais em alerta, e as organizações multilaterais de ajuda humanitária tentam gerir escassos recursos para ajudar um número crescente de pessoas em condições difíceis. Entretanto, as organizações meteorológicas alertam para a ocorrência de mais eventos extremos que devem dificultar os esforços de sobrevivência. O que nos reserva o futuro? Texto Celso Chambisso • Fotografia Istock Photo & D.R

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stá em curso uma nova fase do El Niño, fenómeno natural cíclico que os cientistas julgam (ainda sem consenso) estar a ser exacerbado pelo aquecimento global. A Organização Meteorológica Mundial (OMM) da ONU alerta para o facto de o padrão meteorológico poder ameaçar vidas e devastar a agricultura nalgumas partes do mundo, nos próximos meses. Se para Moçambique há uma probabilidade mais baixa de embate de ciclones, na época que agora começa, a chuva pode, ainda assim, causar desassossego. Nalguns pontos de África, o impacto é já preocupante. Recentemente, a imprensa internacional publicou artigos a relatar que as chuvas provocadas pelo El Niño já tinham matado mais de 100 pessoas e deslocado 770 mil. O Quénia, a Somália e a Etiópia são os países mais afectados pelos mais recentes acidentes e desastres, de acordo com a ONG Save The Children. “As inundações são o mais recente de uma série de eventos climáticos extremos que, nos últimos anos, atingiram o Corno de África, onde as crianças e as comunidades se encontram no extremo da crise climática global”, disse a ONG. Diante do problema, a Save The Children pediu uma intervenção internacional para ajudar os três países. A entidade alega que as chuvas forçaram

muitas famílias a se retirarem para terras mais altas, onde não têm condições de subsistência adequadas e dependem de ajuda humanitária. Em meados de Novembro, a OMM já havia alertado que o El Niño entrou na sua fase mais acentuada, com 90% de probabilidade de que o evento climático, como um todo, só termine em Abril de 2024. Em relação aos desastres e eventos que podem ocorrer nos próximos meses, a OMM destaca chuvas fortes e inundações, secas intensas e calor extremo, e refere que algumas partes de África poderão sofrer com precipitações acima do normal. Perspectivas assustadoras e necessidade de apoio África é, igualmente, o continente que mais necessita de apoio humanitário. Parte dessa ajuda chegou, recentemente, por via do Programa Alimentar Mundial (PAM) das Nações Unidas, que disponibilizou um total de 12,8 milhões de dólares para combater o impacto iminente de outro efeito extremo, oposto das inundações: a seca igualmente desencadeada por um efeito em cadeia com origem no El Niño. Trata-se de uma seca que pode afectar mais de 550 mil pessoas em quatro países da África Austral, nomeadamente Moçambique, Lesoto, Madagáscar e Zimbabué.

Recentemente, a imprensa internacional publicou artigos a relatar que as chuvas provocadas pelo El Niño já tinham matado mais de 100 pessoas e deslocado 770 mil

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Estes 12,8 milhões de dólares são já considerados parte do maior pagamento deste tipo até à data, valor que será utilizado para implementar uma série de acções antecipadas para salvar vidas e garantir meios de subsistência aos beneficiários. Co-financiada pela Alemanha, União Europeia e Noruega, a assistência ajudará, por exemplo, a disseminar mensagens de texto de alerta precoce, a distribuir sementes tolerantes à seca e a fornecer água potável às comunidades e respectivo gado. Espera-se também que proteja o poder de compra contra a redução da produção agrícola e pecuária. Prevê-se que o El Niño ocorra num momento em que a região já enfrenta uma considerável instabilidade, com aproximadamente 47,4 milhões de pessoas a atravessarem uma grave insegurança alimentar em partes da www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


COMO É QUE O EL NIÑO AFECTA O CLIMA? O fenómeno empurra a água quente do oceano Pacífico para leste, fazendo com que a corrente marítima se desloque para sul. Isto produz um tempo mais seco e quente no norte dos EUA e chuvas intensas e inundações na costa do Golfo e no sudeste dos EUA. Na Europa, pode provocar Invernos mais frios e secos no norte e mais húmidos no sul. Durante o fenómeno, a temperatura global aumenta cerca de 0,2 graus Celsius, de acordo com a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA (NOAA), que tem, provavelmente, dos maiores arquivos de estudo sobre o El Niño.

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África Austral e Central. E, como se isto não fosse suficiente, lançam-se perspectivas, no mínimo, assustadoras: o fenómeno poderá bater recordes regionais de temperatura e défice de precipitação, atingindo o seu pico em Janeiro de 2024. Neste cenário, poderá afectar o período crucial de plantação e a colheita em Abril de 2024. Novos recordes climáticos, novas ameaças As últimas previsões das Nações Unidas indicam que após três anos de arrefecimento – seguindo o padrão meteorológico La Niña –, é a vez de o El Niño durar, pelo menos, até à primeira metade de 2024, o que poderá levar o mundo a bater um novo recorde de temperatura média. “O El Niño está normalmente associado a novos recordes de temperatura a nível global. Ain-

da não se sabe se isso vai acontecer em 2023 ou 2024, mas penso que é muito provável”, afirmou Carlo Buontempo, director do Serviço de Alterações Climáticas Copernicus da União Europeia, citado pela Reuters. “A declaração da OMM é um sinal para os governos de todo o mundo mobilizarem preparativos”, disse Petteri Taalas, secretário-geral da organização. “Os avisos precoces e as acções de antecipação de fenómenos meteorológicos extremos” associados a este grande padrão climático “são vitais para salvar vidas” e poupar “meios de subsistência”, concluiu. Danos à agricultura e à vida marinha A precipitação anormal prevista para toda a América Latina está a suscitar receios no sector agrícola, de acordo com um relatório da Organização

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NAÇÃO | ENERGIA ALTAS TEMPERATURAS EM 4 PONTOS

• O fenómeno meteorológico El Niño está associado ao aumento das temperaturas globais e agravamento de fenómenos extremos. É causado por temperaturas oceânicas e ventos no oceano Pacífico, que oscilam entre o aquecimento (El Niño) e arrefecimento (La Niña). • Os efeitos do El Niño duram meses e podem fazer com que 2024 bata recordes de temperatura. • O ano mais quente de que há registo até agora foi 2016, coincidindo com um forte El Niño, embora as alterações climáticas tenham alimentado temperaturas extremas mesmo em anos sem este fenómeno. • Os últimos oito anos foram os mais quentes de que há registo no mundo, o que reflecte a tendência de aquecimento a longo prazo impulsionada pelas emissões de gases com efeito estufa.

das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). As previsões para o primeiro trimestre de 2024 apontam para mais chuva do que o habitual em países como o Peru e o Equador, bem como no México, a par de condições de seca no Brasil, Guiana e Suriname. O actual período de seca na América Central deverá durar apenas até ao final deste ano – menos que nas previsões de seca para algumas regiões de África. O relatório sublinha, igualmente, que a agricultura, que inclui as culturas, a pecuária, as florestas e a pesca, é particularmente vulnerável, uma vez que o sector pode ter de encaixar 26% das perdas económicas durante as condições meteorológicas extremas. Os efeitos extremos do El Niño também põem em perigo a vida marinha ao longo da costa do Pacífico, com impactos em ecossistemas no resto do mundo. Em condições normais, um fe-

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Muitas regiões de África, que já estão ou deverão ser devastadas pelas inundações ou secas resultantes do El Niño, necessitam de ajuda humanitária para sobreviver

nómeno conhecido como “afloramento” traz água fresca e rica em nutrientes das profundezas do oceano. Mas, quando ocorre o El Niño, este processo é suprimido ou completamente interrompido. Isto resulta em menos alimentos para certos peixes. Em Março, os cientistas descobriram que as temperaturas globais à superfície do mar atingiram um nível recorde e o El Niño está a agravar a situação. De acordo com a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos Estados Unidos (NOAA, na sigla em inglês), há 56% de probabilidades que, quando o fenómeno meteorológico estiver no auge, as temperaturas à superfície do Pacífico Oriental sejam, pelo menos, 1,5 graus Celsius mais elevadas que o normal. Noutro aspecto mais visível, as águas mais quentes provocam a descoloração dos recifes de coral, deixando-os em maior risco de morrerem. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023



SHAPERS | ADAM SMITH

O Valor do Liberalismo na Sociedade Moderna Adam Smith é considerado o pai do liberalismo, um dos pensadores e economistas mais importantes da história. A sua obra “A Riqueza das Nações” influenciou directamente áreas como: crescimento económico, ética, educação, divisão do trabalho, livre concorrência, evolução social, entre outros assuntos Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R

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uitos economistas e estudiosos de ciências económicas acreditam que Adam Smith, nascido em 1723, é, ainda hoje, um dos formadores do estado actual em que se encontra a globalização. Isto porque a sua principal obra, “A Riqueza das Nações”, contribuiu de forma preponderante para alguns conceitos utilizados na sociedade moderna. Entre eles, a valorização do individual e a limitação do papel do Estado. A biografia de Adam Smith está directamente ligada ao campo académico. Formado em Filosofia, área em que foi um dos professores de renome da sua geração, ministrou aulas de Retórica e Filosofia na Universidade de Glasgow. Em 1758, chegou ao posto de reitor na instituição, altura em que tiveram início grandiosas obras. Foi nesse período que Adam escreveu uma das suas principais publicações, “Teoria dos Sentimentos Morais”. Para muitos, foi o ensaio em que o filósofo mais orgulho teve, tanto que trabalhou nele até ao fim da sua vida. O foco principal do estudo centrou-se no comportamento do homem. Para isso, Adam Smith analisou criticamente o pensamento moral da sua época, propondo que a consciência surgia a partir das relações sociais. De acordo com a “Teoria dos Sentimento Morais”, o homem age, primeiramente, para a realização do seu interesse próprio. Ainda assim, todos nós, mesmo os “maiores violadores das leis da

sociedade”, somos capazes de sentir solidariedade pelo próximo. Essa solidariedade, chamada pelo autor de “simpatia”, tem origem na capacidade de nos pormos na situação do outro e, assim, imaginar o seu sentimento. Por isso, a benevolência pode desenvolver-se naturalmente no comportamento social. A Riqueza das Nações Em 1776, Adam Smith lançou “A Riqueza das Nações”, a sua obra de maior sucesso (ainda que ele próprio tivesse preferência pela “Teoria dos Sentimentos Morais”), principalmente por defender conceitos novos sobre como a liberdade do indivíduo deveria ser encarada, além de elaborar e defender a ideia de que o mercado se regularia automaticamente. O pai do liberalismo influenciou diversas gerações com a sua ideia de Estado e mercado. Um pouco relacionada com a “Teoria dos Sentimentos Morais”, defendia que a sociedade só funciona pela vontade própria de cada indivíduo, e não pela força de um bem maior, no caso, o Estado. “Não é da benevolência do padeiro, do talhante ou do cervejeiro que eu espero que saia o meu jantar, mas sim do empenho deles em promover o seu auto-interesse”, escreveu. Porém, o simbolismo que mais impacto causou no seu trabalho foi a ideia da “mão invisível”. Uma ideia que utilizava para reforçar o conceito de poder do indivíduo. “Assim, o mercador ou comerciante, movido apenas pelo seu próprio

“Não é da benevolência do padeiro, do talhante ou do cervejeiro que eu espero que saia o meu jantar, mas sim do empenho deles em promover o seu auto-interesse”, Adam Smith

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interesse, é levado por uma ‘mão invisível’ a promover algo que nunca fez parte do interesse dele: o bem-estar da sociedade”, defendia Smith. A “mão invisível”, segundo Adam Smith Para o economista e filósofo, se a economia fosse livre, sem intervenção alguma de órgãos externos ou de um Governo, ela regular-se-ia de forma automática, como se houvesse uma “mão invisível” por trás de tudo, fazendo com que os preços dos produtos fossem ditados pelo próprio mercado, conforme a sua necessidade. Esta é a base da Teoria Económica, que, comprovadamente, funciona na prática. Quando o mercado regista escassez de um determinado produto e existe uma procura muito grande, automaticamente os vendedores aumentam o preço desse item, pois, ainda assim, haverá consumidores interessados. Já no caso em que há produtos em excesso e não existem consumidores suficientes, os fabricantes reduzem o preço para que aqueles poucos clientes que ainda não se interessaram pelo artigo comprem o dele e não o dos seus concorrentes. Desta forma, o preço www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


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dos produtos irá sempre regularizar-se, consoante a maior ou menor a oferta do momento, e segundo o aumento ou decréscimo da procura.

Nasceu no dia 16 de Junho de 1723, na cidade de Kirkcaldy, na Escócia. Durante a juventude, frequentou o Colégio “Burgh School of Kirkcaldy”, onde estudou Latim, Matemática, História e Escrita. Com apenas 14 anos de idade ingressou no curso de Filosofia na Universidade de Glasgow, instituição onde se graduou em 1740, com 17 anos. No mesmo ano, Smith conseguiu uma bolsa de estudos na Universidade de Oxford. Após seis anos na instituição, retornou, em 1746, à Escócia. E aqui reside o seu impressionante talento: em 1751, Adam tornou-se professor de lógica em Glasgow. Um ano depois, passou a dar aulas de Filosofia Moral, uma das disciplinas mais importantes da instituição. Morreu em 1790 aos 67 anos de idade.

Prós e contras à intervenção do Estado Adam Smith era contra a intervenção do Estado na economia. Para ele, cabiam ao Estado apenas três funções: o estabelecimento e a manutenção da Justiça, a Defesa Nacional e a criação e manutenção de certas obras e instituições públicas que não fossem de interesse privado. Mas, actualmente, prevalece a ideia de que os governos podem, às vezes, melhorar os resultados do mercado, interferindo na economia. Entre os aspectos mais relevantes da ciência económica, está a sua capacidade de proporcionar instrumentos aos Estados, mais precisamente aos governos, para que avaliem a economia das sociedades, procurando eficiência e equidade – dois conceitos fundamentais para a promoção do crescimento e do desenvolvimento económico. Em linhas gerais, a eficiência estaria ligada à questão da optimização da produção, do uso e da alocação dos recursos (sejam eles matéria-prima ou capital), e do desenvolvimento da capacidade produtiva em termos de desenvolvimento tecnológico. Já a equidade

BIOGRAFIA DE ADAM SMITH

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diria respeito à redistribuição da renda, à criação de condições para uma boa qualidade de vida, procurando-se condições para que todos os indivíduos tivessem acesso às condições básicas e necessárias do bem-estar social. Porém, procurar eficiência e equidade num contexto no qual predomina o sistema capitalista não é tarefa fácil, uma vez que as bases do capitalismo estão assentes na acumulação da riqueza, na propriedade privada e, dessa forma, na desigualdade entre as pessoas. Assim, o que deve ficar claro é que a “mão invisível” é incapaz de garantir a equidade na prosperidade económica. Obviamente, devemos aqui realçar que a autonomia de mercado é fundamental para a roda da economia, mas a desregulamentação, com a diminuição do Estado de forma exacerbada, como defendiam os primeiros ideólogos do liberalismo, parece ser algo perigoso, quando não inviável. Adam Smith faleceu aos 67 anos, mas os seus pensamentos sobre a economia continuam a causar impacto em todos os modelos económicos existentes.

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FNB Moçambique Eleva a Sua Promessa de Ajuda Para um Novo Patamar Reposicionar o aconselhamento O FNB está focado no aconselhamento e não apenas nos produtos bancários. Na sua jornada de transição para além da banca convencional, cresceu como um parceiro no aconselhamento integrado, ligando os pontos entre as actividades diárias dos seus Clientes e as suas aspirações e objectivos. "Somos um parceiro que quer ajudar a alcançar objectivos através de mudanças positivas no comportamento financeiro. Estamos nas várias fases da vida dos Clientes, das suas famílias e das suas empresas. Queremos garantir que os aconselhamos sobre as soluções certas para as suas necessidades", explica Blenkinsop.

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FNB Moçambique iniciou a sua jornada rumo ao futuro, reforçando a sua promessa de ajuda e modernização dos canais digitais, tendo em mente a simplificação da experiência bancária dos seus Clientes. Uma nova imagem aliada ao lançamento de canais digitais, que tornam as operações bancárias muito mais práticas e seguras; e uma aplicação intuitiva, Internet Banking e website que reforçam a promessa de ajuda que, desde sempre, define o FNB: “como podemos ajudar?” O administrador-delegado do FNB Moçambique, Peter Blenkinsop, afirma: "Durante 16 anos, os nossos esforços têm sido fundamentais, no sentido de ajudar os nossos Clientes, famílias e empresas a prosperarem e a concretizarem os seus sonhos. A nossa promessa de ajudar os nossos Clientes, para além das operações bancárias, é materializada através de um aconselhamento de confiança e de soluções que são simples e seguras”. Reposicionar a experiência do utilizador O aplicativo FNB ON foi criado para oferecer uma ajuda ainda mais intuitiva através da sua facilidade de utilização e de uma experiência digital bastante prática e segura. O acesso à app FNB pode ser realizado

via reconhecimento facial, impressão digital ou inserção de PIN. Entre muitas outras funcionalidades, é possível personalizar a visualização do conteúdo consoante as preferências do utilizador, definir as transacções mais frequentes e mantê-las como favoritas, acompanhar a actividade das contas, tudo visível num só ecrã. A melhor forma de conhecer as imensas possibilidades desta aplicação é mesmo começar a utilizá-la. “Aguardar longas horas para realizar operações, como pagamento de impostos, transferências, consulta de extractos, pagamento de propinas, transferência de montantes para carteiras móveis, constituição ou mobilização de depósitos a prazo e consulta do saldo dos cartões de crédito e outros compromissos recorrentes, é uma rotina que pertence a um passado não muito distante”, afirma Sansão Monjane, director de Banca Electrónica e Tecnologias de Informação do FNB. A aplicação FNB ON, recentemente lançada pelo banco, traz simplicidade de utilização notória desde a adesão, e comprovada no dia-a-dia pelas funcionalidades práticas que oferece. “É uma plataforma que traz uma série de vantagens para os Clientes, que podem contar com conveniência, segurança e simplicidade desde a primeira utilização”, reforça Sansão.

“Aguardar longas horas para realizar operações, como pagamento de impostos, transferências..., é uma rotina que pertence ao passado"

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Renovar uma marca histórica O FNB está também a renovar a sua marca icónica para se tornar mais versátil e repercutir-se para além dos serviços bancários e financeiros. A directora de Marketing e Comunicação da instituição bancária, Cláudia Chirindza, explica a evolução da marca, reconhecendo que a mudança é importante para se manter relevante para os Clientes. "A actualização ajuda-nos a criar uma imagem e uma sensação de marca versátil, que se alinha com a nossa transição acelerada para ajudar os Clientes noutras áreas, além dos serviços bancários, nas categorias de estilo de vida e soluções empresariais", afirma. "Pretendemos embarcar nesta viagem, mantendo-nos profundamente enraizados na nossa herança de marca e na promessa de marca: 'como podemos ajudar?'". Segundo refere, "no centro da evolução, está o reconhecimento da responsabilidade de acompanhar a mudança radical das necessidades dos Clientes e a transição global para uma era de plataformas". "Acreditamos que os nossos esforços nos distinguem enquanto referência na prestação de serviços financeiros e de estilo de vida orientados para o aconselhamento, apoiados por uma ajuda exponencial", acrescenta Chirindza. Peter exprime um sentimento semelhante, afirmando: "A nossa viagem de plataforma continua. Quer os nossos Clientes precisem de ajuda para navegar nas suas operações diárias, para tornar cada dia mais simples, ou para realizar os seus sonhos em direcção a um futuro melhor, estamos profundamente empenhados em ajudá-los a concretizar os seus objectivos", conclui. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


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NEGÓCIOS | GLOBAL GATEWAY

Fórum de Investimentos: Moçambique e UE Promovem Parceria e Assinam Acordos O primeiro Fórum de Investimento União Europeia – Moçambique foi palco, em Maputo, para a assinatura de acordos de financiamento para cinco projectos nas áreas da Energia, Digitalização, Economia Azul e Formação Técnico-Profissional. Foram renovados compromissos, de parte a parte, para que a parceria progrida Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R.

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oçambique e a União Europeia (UE) assinaram acordos de financiamento para cinco projectos nas áreas da Energia, Digitalização, Economia Azul e Formação Técnico-profissional durante o primeiro Fórum de Investimento União Europeia – Moçambique, realizado em Maputo, nos dias 22 e 23 de Novembro. Cada projecto está orçado entre 130 e 140 milhões de euros (entre 9 e 9,6 mil milhões de meticais). Os acordos foram assinados entre a ministra dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Verónica Macamo, e a comissária da UE para a Energia, Kadri Simson. Entre outras metas, os instrumentos servem para consolidar apoios que têm sido anunciados ao longo do tempo para a reabilitação da hidroeléctrica de Cahora Bassa e suportam a iniciativa “Vamoz Digital”, destinada a reduzir o “fosso digital”. Trata-se de mais uma tentativa de apoiar um “quadro político e regulamentar” em áreas visadas ao longo de décadas: “inovação”, “competências dos jovens” e “inclusão das raparigas e das mulheres”. O Fórum foi um ponto de (re)encontro de grandes ideias. Da energia às infra-estruturas de logística e transporte, e da agricultura à economia do mar, passando pelos imperativos da sustentabilidade, foram renovadas as intenções de Moçambi-

que - com um potencial de dimensão global em diversos sectores - e a UE, com capital e grande experiência em projectos estruturantes, para unirem forças no sentido de ‘atacar’ os desafios do desenvolvimento. Na abertura do Fórum Global Gateway, que juntou várias partes interessadas dos sectores público e privado, nacional e europeu, o ministro da Economia e Finanças, Max Tonela, destacou Moçambique como país de “condições objectivas para se tornar num actor importante na produção e exportação de energias limpas, para diversos destinos à escala global”. Uma missão especialmente importante “num momento em que o gás natural da bacia do Rovuma se apresenta como alternativa para a transição energética”. Mas o governante não pararia por aí. Considerou ainda que as partes possuem todos os elementos para se posicionarem, conjuntamente, na vanguarda da transição energética verde. Ou seja, trata-se de combinar “os recursos moçambicanos e a excelência tecnológica europeia”. Como tal, “estes recursos devem ser usados para tornar a nossa matriz energética num pólo para a África Austral”. O governante aproveitou ainda a ocasião para apelar ao investimento na indústria transformadora moçambicana, para que se possa diversificar a base produtiva e desenvolver a economia.

“Em Moçambique, a UE é o segundo maior parceiro comercial depois da África do Sul e é o primeiro destino das exportações moçambicanas”, Antonino Maggiore

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UE atribuiu 428 milhões de euros em quatro anos O fórum decorreu sob o tema “Criando Oportunidades de Negócios”, organizado pelo Governo de Moçambique, pela delegação da UE em Moçambique e pela Associação das Câmaras de Comércio Europeias (EUROCAM). No evento, a comissária para a Energia, Kadri Simson, defendeu como prioridades “o desenvolvimento ecológico, apoiar os jovens e melhorar a segurança”, entre outros desafios da governação. “Para concretizar estes objectivos, a UE atribuiu 428 milhões de euros à nossa parceria com Moçambique entre 2021 e 2024”, revelou, considerando que o crescimento sustentável só pode ser alcançado através da união dos sectores público e privado e com a criação de incentivos certos. Simson manifestou interesse pelo sector da agricultura (onde Moçambique apresenta grande potencial), economia do mar (onde existe igualmente um potencial ocioso) e turismo. Há “argumentos sólidos a favor dos investimentos neste país”, sublinhou. “A UE é o nosso maior parceiro comercial multilateral”, referiu o ministro da Indústria e Comércio, Silvino Moreno, assinalando que há um “compromisso conjunto”. Declarações alinhadas com as de Simone Santi, presidente da Câmara de Comércio Europeia (EUROCAM), classificando o fórum como mais um acto que testemunha a intenção de estreitar relações de cooperação, apontando “Moçambique como o país certo para os empresários europeus investirem”. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


Apostar na energia fora da rede Moçambique aprovou, há cerca de dois anos (em Setembro de 2021), o regulamento de acesso a energia fora da rede para facilitar o desenvolvimento de projectos renováveis para abastecer locais que não estão ligados à rede eléctrica. António Saíde, vice-ministro dos Recursos Minerais e Energia, considera este regulamento como uma peça-chave para os investidores apostarem em Moçambique. O governante falava na terceira edição da Conferência Empresarial sobre Renováveis em Moçambique (RenMoz 2023), realizada a 24 de Novembro, logo após o fórum Global Gateway. “Os empresários já têm todas as condições para operar no sector energético, pois não há mais espaço para reclamações”, referindo-se aos instrumentos legais já aprovados pelo Executivo. Saíde apelou ao sector privado para apostar no ramo da energia fora da rede, e assim ajudar também o Governo a levar energia para as zonas rurais. Mayra Pereira, presidente da Associação Lusófona de Energias Renováveis (ALER), explicou que, mesmo existindo várias opções para investir em energias renováveis, o País enfrenta ainda desafios básicos ligados à sustentabilidade. Discursando durante um painel subordinado ao tema “Catalisar uma Transição Energética”, Mayra Pereira afirmou que acções colectivas são importantes para a conservação do planeta, pois geram igualdade e conservam o ambiente. “Moçambique deve começar a criar ideias e transmitir mais conhecimento sobre a questão da transição, uma matéria importante para o desenvolvimento”, disse. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


M&F | THE BANKER

Três Bancos Moçambicanos Entre os Maiores de África As elevadas taxas de inflação e a valorização do dólar foram os dois principais inimigos das contas em bancos africanos, no último ano. Ainda assim, 70% dos bancos analisados melhoraram os resultados na análise da revista “The Banker”. O Standard Bank (50.º lugar), o Millennium bim (61.º) e o BCI (69.º) são os três moçambicanos no top 100. Texto Jaime Fidalgo • Fotografia D.R

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classificação dos 100 maiores bancos de África é publicada anualmente pela revista “The Banker” e ordenada segundo o indicador Tier 1 Capital, o critério mais utilizado em todo o mundo para a análise da solvabilidade do sector bancário. A lista deste ano continua a ser liderada pelos megabancos sul-africanos Standard Bank, FirstRand (e a sua marca de retalho FNB – First National Bank) e Absa, apesar de todos terem registado um declínio dos rácios de solidez (o referido Tier 1 Capital), sendo o Absa o único deste trio que viu os seus activos (medidos em dólares) crescerem. No quarto lugar, surge o também sul-africano Nedbank, que subiu uma posição face à classificação anterior, aproveitando o facto de os dois bancos egípcios controlados pelo Estado, o National Bank e o Banque Mirs, não terem publicado as contas auditadas em tempo útil. Apesar de a África do Sul dominar o ranking deste ano, com quatro bancos nos quatro primeiros lugares, o país tem apenas sete instituições no top 100 (menos que os 15 do Egipto ou os 11 da Nigéria), o que revela uma maior concentração do seu sector bancário.

Nenhum mercado ficou imune Nesta classificação de bancos, segue-se o Afreximbank, com sede no Cairo, que registou uma notável ascensão do 10.º para o 5.º lugar, fruto do crescimento de 27% do rácio de solidez (o maior incremento entre os bancos africanos analisados), não obstante a depreciação da libra egípcia em cerca de 50% desde 2022. Os outros 14 bancos deste país presentes no ranking registaram uma descida combinada dos activos em 17%, sendo o Arab African International Bank (14.º do ranking geral) o único que registou um pequeno incremento (0,2%) do Tier 1 Capital. Já o CIB Egypt manteve a 9.ª posição no top 100. O desempenho do sector bancário marroquino também foi afectado pela queda de 12% da moeda local, o dirham. O maior banco do país, o Attijariwafa Bank, foi o que melhor resistiu, registando um decréscimo de “apenas” 6% no rácio de solidez e nos activos (os restantes tiveram quedas superiores), tendo por isso logrado subir da 7.ª para a 6.ª posição do ‘ranking’ geral. Os bancos da Nigéria também não foram imunes a esta tendência. Zenith Bank e Access Bank, os mais bem classificados, no 10.º e 13.º lugar, respectivamente,

No que se refere a Moçambique, o Standard Bank é o mais bem classificado, ocupando um honroso 50.º lugar. Com activos avaliados em 2,5 mil milhões de dólares, subiu 19 lugares face ao ranking anterior

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sofreram uma descida de 8% no Tier 1 Capital, fruto, entre outras causas, da exposição aos ‘eurobonds’ do Gana, cujo valor caiu 30%. O destaque pela positiva vai para o United Bank for Africa (UBA), o terceiro maior banco do país por activos, que registou uma subida de 13% no rácio de solidez e 17% nos lucros, sendo o segundo melhor do continente neste último critério. Standard Bank Moçambique no 50.º lugar No que se refere a Moçambique, o Standard Bank é o mais bem classificado, ocupando um honroso 50.º lugar. Com activos avaliados em 2,5 mil milhões de dólares e resultados antes de impostos de 143 milhões de dólares, o Standard Bank subiu 19 posições face ao ranking do ano anterior. Segue-se o Millennium bim, no 61.º lugar (era 62.º em 2022) com lucros antes de impostos quase similares (142 milhões de dólares) e um volume de activos superior (3 mil milhões www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


Ranking por paises Egipto e Nigéria em destaque Egipto 15 Nigéria 11 Quénia 9 Tunísia 9 Marrocos 8 África do Sul 7 Maurícias 7 Angola 5 Etiópia 4 Gana 4 Botsuana 3 Moçambique 3 Namíbia 3 Outros (***) 12 *** com 2 bancos (Tanzânia, Uganda), com 1(Argélia, Burkina Faso, Costa do Marfim, Gabão, Mali, RDC, Ruanda, Togo)\ Fonte Top 100 African Banks , revista “The Banker” (Novembro 2023)

Top 100 da banca africana 4 bancos sul-africanos nos 4 primeiros lugares Ranking

Banco

País

Tier 1 Capital (*) (milhões USD)

Activos (milhões USD)

Ranking activos

Lucros (**) (milhões USD)

2023

2022

1

1

Standard Bank Group

África do Sul

11,690

169,738

1

3,025

2

2

FirstRand

África do Sul

10,087

122,518

2

2,863

3

3

ABSA Group

África do Sul

8,041

105,544

3

1,813

4

5

Nedbank Group

África do Sul

5,925

73,748

4

1,162

5

10

Afreximbank

Egipto

4,982

27,863

11

455

6

7

Attijariwafa Bank

Marrocos

4,847

60,327

5

1,084

7

8

Groupe Banque Populaire

Marrocos

4,389

47,907

6

538

8

14

Bank of Africa

Marrocos

2,600

36,666

7

466

9

9

CIB Egypt

Egipto

2,568

25,753

13

970

10

13

Zenith Bank

Nigéria

2,539

26,708

12

619

50

69

Standard Bank

Moçambique

410

2,468

83

143

61

62

Millennium bim

Moçambique

363

3,013

75

142

BCI

Moçambique

300

3,173

66

172

69

* Tier 1 Capital é o indicador mais utilizado para a análise da solvabilidade do sector bancário, correspondendo aos fundos próprios de base, isto é, ao capital social e às reservas acumuladas (soma dos lucros não distribuídos). ** Lucros antes de impostos FONTE: Top 100 African Banks , revista “The Banker” (Novembro 2023)

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EXPLICADOR O QUE É O RÁCIO TIER 1 CAPITAL? Os bancos têm a obrigatoriedade de manter determinados valores de capital, de modo que a instituição tenha recursos suficientes para suportar perdas operacionais e ainda para honrar os capitais dos depositantes, funcionando como uma margem de segurança para fazer face a prejuízos inesperados. Os designados “Tiers” foram a fórmula encontrada pelo Comité de Basileia para categorizar os elementos de capital próprio das entidades financeiras, de acordo com a sua qualidade e capacidade de absorção de perdas. O Tier 1 corresponde aos elementos de capital de maior qualidade, disponíveis para enfrentar todas as perdas. Ainda que existam outros rácios, o indicador mais relevante e exigente acaba por ser o Tier 1 capital: é o rácio entre os capitais próprios do banco (capitais próprios, reservas, acções preferenciais não resgatáveis, entre outros) e os activos, ponderados pelo risco de crédito.

significativamente o seu desempenho face ao ano anterior.

Melhor desempenho em 2023 Capitec Bank vence pelo terceiro ano consecutivo Ranking 2023

Banco

País

Pontuação (***)

1

Capitec Bank

África do Sul

6.15

2

United Bank for Africa

Nigéria

5.96

3

Equity Bank

Quénia

5.80

(*) Soma ponderada dos seguintes critérios: crescimento, rentabilidade, eficiência operacional, qualidade dos activos, retorno do risco, liquidez, solvabilidade e leverage Fonte: Top 100 African Banks, revista “The Banker” (Novembro 2023)

de dólares). Por fim, o BCI (na 69.ª posição) é o melhor do país na seriação por activos (3,2 mil milhões de dólares, o que equivale ao 66.º valor mais alto do continente) e por lucros antes de impostos (172 milhões de dólares). De referir que Moçambique e Angola são os únicos dois Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) presentes neste top 100. Angola tem cinco bancos na lista: BAI - Banco Angolano de Investimentos (26.º), Banco BIC (27.º), BFA - Banco de Fomento Angola (28.º), Standard Bank (63.º) e Banco Millennium Atlântico (65.º), sendo que todos melhoraram

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A depreciação das principais moedas africanas face ao dólar foi a variável que mais afectou negativamente os activos e os fundos próprios dos bancos

O impacto da depreciação cambial A nível geral, os analistas da revista “The Banker” concluem que a depreciação das principais moedas africanas face ao dólar foi a variável que mais afectou negativamente os activos e os fundos próprios dos bancos. Mais de metade dos membros do top 100 África registaram um declínio no critério Tier 1 Capital. Não obstante, os indicadores de rentabilidade continuam em terreno positivo desde o fim da pandemia, com cerca dos 70% dos bancos a registarem um crescimento dos lucros. No que diz respeito aos bancos com melhor desempenho (análise que leva em consideração diversos factores, tais como a rentabilidade, crescimento, liquidez, solvabilidade e qualidade dos activos), o banco sul-africano Capitec Bank Holdings foi o que registou a melhor performance (algo que sucede pelo terceiro ano consecutivo), seguido do United Bank for Africa (Nigéria) e do Equity Bank (Quénia). www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023



OPINIÃO

Mara Rupia Lopes • Associada Principal da MDR Advogados & Vera Esteves Cardoso • Consultora da Morais Leitão

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esde o passado dia 13 de Novembro, os Prestadores de Serviços de Activos Virtuais, ou seja, os Virtual Asset Service Providers (“VASP”) que exerçam actividades em nome e por conta de terceiros, direccionados a residentes em Moçambique, estão sujeitos a registo prévio junto do Banco Central, nos termos regulados pelo Aviso n.º 4/GBM/2023 (“Novo Aviso”). Para efeitos da lei e da regulamentação aplicável, será qualificável enquanto VASP qualquer entidade que realize uma ou mais das seguintes actividades ou operações comerciais, quando exercidas ou praticadas em nome ou por conta de terceiro: • a troca de activos virtuais por moedas fiduciárias; • a troca de uma ou mais formas de activos virtuais por outras; • a transferência de activos virtuais; • serviços de guarda ou guarda e administração de activos virtuais, ou de instrumentos que permitam controlar, deter, armazenar ou transferir esses activos; • a participação em operações e a provisão de serviços financeiros relacionados com a oferta ou venda de um activo virtual por um emissor; • qualquer outra actividade com activos virtuais. Por activos virtuais, entende-se “(…) a representação digital de valor que pode ser armazenado, comercializado ou transferido por via digital e usado para fins de pagamento ou investimento, os quais não abrangem a representação digital de moedas fiduciárias, valores mobiliários ou outros activos financeiros.” Autorização vs. Registo Não obstante as novidades trazidas pelo Novo Aviso, esta regulamentação não veio criar uma nova obrigação de licensing aplicável aos VASP. Tal de-

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Novo Regime de Registo Prévio em Moçambique – Virtual Asset Service Providers ve-se ao facto de a Lei n.º 14/2023, de 28 de Agosto, (a “Lei PBCFT”) qualificar os VASP enquanto sociedades financeiras, sem prever um regime específico de autorização ou registo, sujeitando-os, assim, ao mesmo regime previsto para as instituições de crédito e as sociedades financeiras, nos termos da Lei n.º 20/2020, de 31 de Dezembro. Assim, na verdade, a Lei PBCFT já determinava que certas actividades com activos virtuais só podiam ser exercidas por entidades que, para o efeito, obtivessem autorização prévia junto do Banco de Moçambique, limitando, no entanto, a competência a ser exercida por aquela Autoridade de Supervisão a matérias relacionadas com a prevenção do BCFT

No continente africano, a regulamentação tem variado de jurisdição para jurisdição, evoluindo a ritmos diferentes desde há cinco anos e do financiamento da proliferação de armas de destruição em massa. Acresce ainda que o regime em questão não seria apenas aplicável a VASP estabelecidos em território nacional, mas ainda às entidades com sede em jurisdições estrangeiras, quando verificados os seguintes pressupostos: (i) os seus serviços podiam ser subscritos ou eram disponibilizados a pessoas residentes em Moçambique; ou (ii) exerciam a sua actividade através de funcionários ou gerentes em território nacional. O novo regime de registo prévio para VASP prevê novas obrigações concretas a serem cumpridas por aquelas entidades, nomeadamente em matéria de (i) gestão de riscos; (ii) governação; (iii) deveres de

informação, cuidado e transparência para com clientes; (iv) recuperação de incidentes e continuidade do negócio; (v) implementação de sistemas informáticos específicos com valências de prevenção do BCFT; e ainda (vi) cooperação com as autoridades competentes. O novo regime prevê, ainda, com base na dimensão ou no perfil de risco associado ao VASP em concreto, a possibilidade de o Banco de Moçambique sujeitar as entidades em apreço à supervisão prudencial aplicável às sociedades financeiras, em termos gerais, pecando, no entanto, no que toca à efectiva densificação do tipo de controlos a serem implementados e do conteúdo dos deveres a serem cumpridos, não existindo, ainda, referência à conhecida travel rule. O que esperar Já se passaram quatro anos desde que o Grupo de Acção Financeira (GAFI, Financial Action Task Force) estendeu a aplicação dos seus standards globais sobre AML/CFT aos activos virtuais e VASP. Em Junho de 2023, o GAFI publicou uma actualização sobre a implementação daqueles standards e, apesar de reconhecer que alguns dos mercados mais significativos em termos de materialidade e escala da actividade têm regulamentação em vigor ou em curso, reconhece também que a sua implementação global deixa algo a desejar, bem como que o nível de Compliance demonstrado por parte dos players no mercado permanece aquém daquele identificado no sector financeiro. Nesta perspectiva, esta actualização do GAFI vem demonstrar que foram detectadas, pelo mundo fora, dificuldades em adoptar um regime regulatório robusto e funcional, capaz de estabelecer um adequado level playing field, não sendo, assim, de estranhar que também sejam identificadas eventuais áreas de melhoria no regime regulatório aplicável em Moçambique. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


Prestadores de Serviços de Activos Virtuais estão sujeitos a registo prévio junto do Banco Central

Ainda assim, olhando para os progressos obtidos noutras jurisdições, será possível antecipar alguns potenciais caminhos para o desenvolvimento do regime regulatório aplicável aos VASP em Moçambique. Outros países africanos Em África, a regulamentação tem variado de jurisdição para jurisdição, evoluindo a ritmos diferentes desde 2018. Mais recentemente, em Julho de 2023, a Lei de Activos Virtuais da Namíbia entrou em vigor, conferindo certas competências de supervisão ao Banco Central sob os VASP e os Provedores de Serviços de Oferta Inicial de Tokens. Anteriormente, já teria sido aprovada regulamentação especificamente aplicável aos VASP na África do Sul, no Botsuana e na Nigéria, com regimes divergentes, mas dos quais resulta o dever de obter registo ou autorização prévia junto da autoridade competente para o efeito. Alternativa europeia Até Maio de 2023, a União Europeia carecia de um quadro harmonizado pawww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023

ra o sector. Na ausência dessa uniformização, a legislação adoptada pelos Estados- membros era fragmentada e proporcionou a criação de posicionamentos muito distintos, tendo algumas jurisdições optado por ser tendencialmente favoráveis ao mundo cripto, enquanto outras enveredaram pelo caminho regulamentar em matéria de supervisão de BCFT ou transpuseram as normas aplicáveis ao sector financeiro para os VASP, quando preenchidos os requisitos aplicáveis. No sentido de harmonizar as normas aplicáveis e de proteger os consumidores, investidores e a integridade do mercado, foi publicado o Regulamento (UE) 2023/1114 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Maio de 2023, (“MiCAR”), com entrada em vigor no dia 29 de Junho de 2023, e com datas de implementação distintas consoante as matérias. O MiCAR é o primeiro quadro regulamentar, a nível comunitário, em matéria de cripto activos e serviços e actividades conexos ainda não abrangidos pelo âm-

bito de aplicação dos actos legislativos da União Europeia em matéria de serviços financeiros, tais como os emitentes de cripto activos e os prestadores de serviços de cripto activos. Futuro dos VASP em Moçambique Assim, embora ainda haja, por vezes, alguma resistência por parte das autoridades competentes em abraçar o mundo cripto, estes são um fenómeno já estabelecido e, tal como acontece noutras áreas de inovação e tecnologia, a lei tendencialmente optará por tentar acompanhar as evoluções mais marcantes. Havendo várias alternativas, o importante será tentar assegurar que Moçambique também avança com as necessárias avaliações e subsequente adopção de nova regulamentação, a qual deverá ter em consideração, tanto o crescimento do mercado cripto em território nacional, como a inserção de Moçambique na “lista cinzenta” de vigilância reforçada do GAFI, devido a «deficiências estratégicas» em matéria de prevenção do BCFT.

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CEO TALKS | GEERT KLOK

Como Tornar Mais Atractiva e Competitiva a Indústria Mineira Nacional? Afinal, apesar de todo o potencial, a indústria mineira moçambicana é a segunda menos competitiva para a atracção de investimentos. Saiba porquê e em que estado se encontra o mercado nacional em termos de desafios e pontos fortes, nesta entrevista concedida pelo presidente da Câmara de Minas de Moçambique, Geert Klok Texto Celso Chambisso • Fotografia Mariano Silva & IstockPhoto

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Câmara de Minas de Moçambique (CMM) foi fundada em 2011. E ficou sem funcionar por muitos anos, porque, segundo o respectivo presidente, Geert Klok, naquela altura, a indústria ainda era nova e não tinha massa crítica suficiente. No ano passado, graças ao apoio da Câmara de Comércio de Chemnitz, da Alemanha, e com fundos do Governo Federal alemão, a CMM acabou por ser relançada. Agora, tem escritório e secretariado e desenvolve programas à escala nacional. Uma das suas vocações é a transferência de conhecimento e boas práticas para o sector mineiro de pequena escala, em matérias ambientais e de direitos humanos – em particular, direitos das mulheres –, entre outros aspectos. Actualmente, a CMM já representa 88% da produção do sector informal e tem uma estrutura bem estabelecida, com um conselho de administração de sete membros, e é representada por cerca de 60 operadores, entre associações cooperativas até aos megaprojectos. O sector mineiro é bastante complexo, mexe com muitos aspectos da sociedade, da economia e da política. Qual é, hoje, o grande desafio deste sector? Existe um tipo de pesquisa semelhante ao Doing Business do Banco Mundial (que avalia o ambiente de negócios), mas direccionado para o sector mineiro e realizado pelo Fraser Institute, do Canadá. De acordo com o relatório desta instituição, de 2022, Moçambique ocupa o

penúltimo lugar no índice de atractividade de investimentos no sector mineiro. Pior, só o Zimbábue. A atractividade dos países tem duas componentes: os próprios minerais, que estão no subsolo, e a política. Moçambique tem muito potencial de minérios, mas, mesmo assim, está mal classificado porque tem um mau desempenho nos parâmetros de política e ambiente de negócios. O Botsuana, pelo contrário, está no top 10 mundial. Os investidores, quando olham para a pesquisa, reparam, por exemplo, na estabilidade do País não só em termos de conflitos, mas também em termos de legislação. O investidor quer assegurar que não haverá mudanças nas regras do jogo depois já ter investido o seu capital. No caso da classificação de Moçambique, não terá que ver com a falta de segurança no Norte? Que outros factores podem estar a influenciar esta posição desfavorável? Claro que a falta de segurança também tem impacto, e as circunstâncias em Cabo Delgado são uma preocupação. No ano passado, a situação foi péssima, porque a insurgência espalhou-se por toda a província e afectou as operações, com relatos de empresas mineiras que sofreram ataques. Este ano está muito melhor, mas a preocupação é saber se esta estabilidade poderá durar, mesmo depois de as tropas estrangeiras regressarem aos seus países, porque sabemos que não estarão aqui para sempre. O risco é que se não estivermos preparados, enquanto País,

“Parte dessas taxas [de registo mineiro] aumentaram mil vezes, estando agora entre as mais altas da região. Foram feitos aumentos sem consultar a indústria”, Geert Klok

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voltaremos à instabilidade. Cabo Delgado é uma das províncias com mais actividade mineira. Tem empresas de extracção de grafite e rubis. Temos membros, lá, que continuam preocupados com a situação da segurança. Sente dificuldade também em relação à estabilidade da legislação? Um dos maiores exemplos da nossa preocupação é a introdução recente das novas taxas no cadastro mineiro. Algumas são taxas para tramitação de pedidos, renovações e transferências de licenças. Parte dessas taxas aumentou mil vezes, estando agora entre as mais altas da região. Foram feitos aumentos sem consultar a indústria. Ficou mais caro, por exemplo, admitir um novo sócio numa empresa, porque tal passou a ser considerado como uma transferência da licença ou venda de uma participação. Mesmo que abranja apenas 1% da empresa que detém a licença, tal é considerado como transferência e está sujeito a taxas altíssimas. E isso não ajuda. Outro exemplo é o do imposto da produção mineira. É que a discussão sobre os preços de referência só tem impacto no imposto de produção mineira e as empresas estão a pagá-lo mesmo sem vender. Basta extrair o minério e este imposto é cobrado.

Ou seja, tomaram-se decisões que afectam a indústria sem a consultar? Que implicações esta situação tem nas vossas operações? O que acontece é que muitos minerais não estão nas bolsas de valores, com um preço que seja público e que se possa consultar. Existem bolsas de matérias-primas em que os preços podem ser consultados, mas muitos minerais não estão lá. Por exemplo, a grafite e os minerais de areias pesadas não são cotados em bolsa. Aí, entra a discussão em que o Governo diz que os preços que estamos www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


a usar para o cálculo do imposto (que é um percentual sobre a produção e o preço de venda) não são reais. Por isso, introduziu este diploma, que não foi bem divulgado. Simplesmente, publicaram-no e entrou logo em vigor (em Junho deste ano). Houve uma grande falta de comunicação sobre este diploma de preço de referência. Não houve nenhum período de transição para o divulgar, nem em Maputo, muito menos nas províncias. Então, quais as implicações disso? O que vai acontecer de agora em diante? Por exemplo, se o preço de uma tonelada de grafite está nos 600 dólares, mas os preços de referência indicam 900, significa que o imposto de produção mineira que as empresas estão a pagar aumentou quase em 50%. E nem temos, formalmente, um mecanismo para reclamar ou contestar. Quais são os minérios que sofreram com esta alteração? O carvão faz parte? Acredito que o carvão é mais transparente. Não é a minha área, mas tem preços www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023

públicos e mais informação disponível. Pelo contrário, nos minerais de areias pesadas e grafite não existem estes preços públicos. O assunto é complexo e, na minha opinião, teria sido necessário trabalhar mais com a indústria para entender essa complexidade. Mas esta nem sequer recebeu um esboço do diploma para fazer comentários. O grande desafio é, primeiro, dizer que nós, como Câmara, já estamos de pé e em força. Somos o parceiro certo para o Governo, para representar e apoiar a indústria, uma vez que conhecemos a prática e a realidade e podemos dar esse impulso. E que impacto é que esta mudança teve nas empresas até agora? O que é que os associados reportam? Reportam dificuldades de exportação. De repente, a papelada que tínhamos de apresentar aumentou, porque é preciso provar que o que está a ser exportado corresponde ao que é declarado. Isto causou muita confusão, porque ninguém estava preparado. Causou transtornos na exportação e aumentou muito os custos.

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Geert Klok É PCA da Câmara de Minas de Moçambique (CMM) desde Outubro de 2022. É um administrador experiente e detém a designação de Administrador Certificado do Instituto de Directores da África Austral (IoDSA). Desde 2012, Geert Klok representa a AMG Graphite como director-geral em Moçambique. A empresa opera a primeira mina de grafite de no País, localizada na província de Cabo Delgado. Antes de na AMG Graphite, trabalhou na Mozlegal como consultor sénior e como director-geral na empresa de tecnologia Global Cooling, sediada na Holanda. Geert tem um mestrado em Economia Empresarial pela Universidade de Groningen e possui uma pós-graduação em Direito Comercial pela Universidade Erasmus de Roterdão, nos Países Baixos.

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OS PRINCIPAIS MINÉRIOS PRODUZIDOS NO PAÍS A Câmara de Minas de Moçambique estima que os minerais tenham um peso de 7% nos impostos pagos ao Governo e representem 30% no volume de exportações. Eis parte do potencial do País:

• Metálicos Ouro; Tantalite; Ilmenite; Zircão; Rutilo; Concentrado de areais pesadas. • Pedras preciosas e semipreciosas Turmalinas; Granada; Morganite; Rubi; Esmeraldas. • Minerais combustíveis Carvão de coque; Carvão térmico. • Hidrocarbonetos Gás natural de Temane; LNG - Rovuma; Gás condensado-Rovuma; Gás condensado-Temane. FONTE Plano Económico e Social e Orçamento de Estado (PESOE) para 2023

“Em geral, a indústria tem todo o interesse em aumentar o conteúdo local, para ter os fornecedores por perto. Actualmente, muitos produtos e equipamentos vêm de fora”, Geert Klok Qual deveria ser o caminho a seguir? Neste assunto específico, estamos a fazer um inventário dos problemas que as empresas estão a encontrar para o partilhar com a autoridade tributária, detalhar os pontos e fazer recomendações. Em geral, acho que é importante envolver a indústria, já na fase de elaboração da legislação, o mais cedo possível, e partilhar as propostas de legislação. Por exemplo, temos uma discussão, agora, muito relevante para a indústria, que é sobre a política de industrialização do País. A sustentabilidade passou a ser a palavra de ordem dos últimos tempos.

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Nesta corrida para o carbono zero até 2050, o sector extractivo, pela sua natureza, será um dos mais afectados. Estamos preparados para lidar com as limitações que daqui podem advir? Há várias componentes a analisar, porque cada país tem o seu padrão. Cabe ao Governo definir os padrões de Moçambique. Por exemplo, ainda não temos carros eléctricos. E o País não é pioneiro na introdução destes veículos, tendo em conta que todo este equipamento precisa de manutenção e de peças. Fica difícil uma transição enquanto não houver nada neste ramo. Outra parte da questão é que a transição energética requer muito mais minerais críticos, que devem

aumentar exponencialmente. Outro ponto estratégico que vemos na Europa e nos EUA é a importância de diversificar as fontes de matérias-primas para a indústria e para a transição energética. Estão à procura de outras fontes e introduziram uma nova legislação neste ramo. Este é que deve ser o caminho. Não há uma lei de conteúdo local ainda em Moçambique. Como podem funcionar as parcerias com empresas moçambicanas, mesmo não havendo um dispositivo que as obrigue a fazer isso? Em geral, a indústria tem todo o interesse em ter e aumentar o conteúdo local, para ter os fornecedores por perto. Muitos produtos, equipamentos, peças e consumíveis, neste momento, vêm de fora e isso é complicado, porque acarreta custos e demoras. Para a indústria, seria uma mais-valia ter estes fornecedores de produtos e serviços por perto. É uma das formas mais viáveis para industrializar o País, porque as indústrias mineiras já estão implantadas. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


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especial inovações daqui 64

MOCAMBIQUE NA COP28

A Associação Moçambicana de Energias Renováveis (AMER) esteve na COP28, realizada no início deste mês de Dezembro, em Dubai, com uma agenda clara de busca de fontes de financiamento que ajudem o País na sua agenda de transição energética. O presidente da AMER, Ricardo Pereira, explica em linhas gerais, os avanços que podem ser trazidos daquele mega evento

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MAKTUB

A startup que foi distiguida em Macau por criar soluções para a saúde reprodutiva feminima

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PANORAMA

As notícias da inovação em Moçambique, África e no Mundo.


COP28

COP28 e a Transição Energética: “A Grande Missão é Procurar Mais Financiamento” Para realizar uma transição energética completa em Moçambique, em todos os sectores de actividade, podem ser necessários 80 mil milhões de dólares – uma estimativa calculada a partir da experiência de outros países. Só uma pequena parte deverá ser apoiada por fontes tradicionais e o País preciso de abrir caminho por entre novas formas de financiamento climático. A cimeira do clima COP28, que, por estes dias, tem centrado atenções, é a plataforma em que a Associação Moçambicana de Energias Renováveis (AMER), presidida por Ricardo Pereira, espera colher frutos. TEXTO Nário Sixpene • FOTOGRAFIA Mariano Silva & Istock Photo

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ouco antes da partida para o Dubai, palco da COP28, cimeira do clima organizada pelas Nações Unidas, Ricardo Pereira explicou à E&M em que medida a grande reunião é importante para fazer cumprir a agenda nacional no quadro da transição energética, na óptica da expansão das renováveis. É uma das plataformas que permite encontrar intervenientes chave de todo o globo, apresentar planos convincentes e dar voz às aspirações de Moçambique – que está entre os que menos emitem gases com efeito de estufa, mas mais sofrem com as consequências. A COP28 é um ponto de partida para a estratégia ser bem-sucedida, a bem do País… e do planeta. De que forma a AMER chegou à COP28? A participação da AMER é facilitada pela GLA - Global Lighting Association, focada na expansão de energia fora da rede e no acesso a energias renováveis pelas populações rurais. O outro parceiro é a Global Renewables Alliance (aliança de várias associações ligadas às energias renováveis). São entidades europeias que concentram a vontade de levar associações africanas para o diálogo, vendo que

o futuro das renováveis está em África. Também fomos convidados pelo Ministério dos Recursos Minerais e Energia (Mireme) para fazer parte da sessão em que participa o Presidente da República. Isto além de um painel promovido pelo Fundo de Energia (FUNAE), sobre a transição energética. A participação da AMER na COP28 tem por base, por um lado, o alargamento da nossa rede de contactos e, por outro, a intervenção em sessões de promoção de fontes renováveis. A AMER tem também muito interesse no financiamento climático, que está muito ligado à transição energética. A transição energética está sempre presente, mas há financiamento ? Temos como missão procurar mais financiamento, tentar ao máximo estar em sessões da designada “zona azul”, o que é bastante importante para ter acesso a outros governos, outras delegações e muitos financiadores. Há esta parte da negociação, que é muito importante, mas interessa-nos muito o Global Stock Take (GST), um balanço global da ONU para acompanhar e avaliar a implementação das metas do Acordo de Paris

“O que importa neste momento é saber exactamente onde estamos, porque esse ponto irá definir o nível de esforço e a trajectória que temos de tomar.”, Ricardo Pereira

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APROVADO FUNDO PARA FINANCIAR OS MAIS VULNERÁVEIS A COP28 arrancou com um feito: um acordo sobre a entrada em funcionamento do fundo para financiamento de ‘perdas e danos’ resultantes das alterações climática. “O facto de termos conseguido concretizar o que foi prometido em Sharm ElSheikh”, local da COP anterior, é histórico e é uma conquista sem precedentes”, afirmou o sultão Al Jaber, presidente da COP28. A entrada em funcionamento do fundo para financiamento de ‘perdas e danos’ resultantes das alterações climáticas foi adoptada com aclamação por cerca de 200 países, no Dubai, Emirados Árabes Unidos. Para Al Jaber, foi o reflexo do “ambiente optimista” da cimeira. Vários países assumiram, desde logo, compromissos de contribuir para este fundo. Os Emirados Árabes Unidos anunciaram 100 milhões de dólares, valor igual ao anunciado pela Alemanha. O fundo, que prevê um financiamento de 100 mil milhões de dólares por ano para os países mais vulneráveis e concretiza o principal resultado da COP27, realizada em 2022, no Egito, em que foi alcançado um acordo de princípio sobre o fundo, mas sem contornos exactos. O secretário-executivo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (UNFCCC), Simon Stiell, destacou a “decisão histórica”, apelando aos líderes mundiais para que “usem este impulso para alcançar resultados verdadeiramente ambiciosos”.

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COP28 no longo prazo. Esta é a primeira vez que será gerado um relatório para o qual todos os países terão de contribuir com métricas e, assim, percebermos qual o ponto de situação, o patamar em que nos encontramos em relação à implementação do Acordo de Paris. Tudo aponta para um cenário em que estamos péssimos, pois um dos maiores compromissos, em 2015, foi de manter, até 2032, uma temperatura média que não passasse de 1,5 graus Celsius, o que significa que já vamos muito mal. Foi acordado um investimento de 300 mil milhões por ano para a transição energética e, até agora, andamos nos 0,3%. O financiamento global para esta transição são quatro triliões e só temos 600 mil milhões disponíveis. Logo, estamos a falhar em todas as métricas que nos levariam ao caminho certo. Que visão tem sobre o funcionamento da COP e a sua importância? A COP consiste numa série de conferências anuais realizadas ao abrigo da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (UNFCCC). A primeira COP ocorreu em 1995. Estas reuniões congregam representantes de governos, organizações não-governamentais e especialistas, para discutir medidas globais no sentido de combater as mudanças climáticas. Podemos dividir a COP em duas partes: a primeira

Olhando às metas que têm ficado por alcançar, em termos de proteção da temperatura do planeta, ainda há esperança? Do que já foi anunciado na agenda de acção, há iniciativas concretas no âmbito dos pilares do Acordo de Paris de 2015, principalmente a mitigação (compromissos de redução de emissões), com mobilização de países para alcançar três vezes mais energia renovável e duas vezes mais eficiência energética até 2030. Está também presente o pilar da adaptação (reforçando a resiliência), que consiste em envolver grandes produtores de alimentos, comprometidos com a agricultura regenerativa. E temos o pilar das finanças, com várias intervenções de apoio dos países desenvolvidos para os países em desenvolvimento. Além destes pilares de ação, temos as conclusões do relatório de Avaliação Global com mensagens chave: o Acordo de Paris conseguiu reduzir a temperatura em um a dois graus Celsius; a janela para alcançar 1,5 graus até 2032 está a estreitar-se rapidamente; todas as soluções estão disponíveis, especialmente as renováveis, mas a sua implementação não está a ser suficientemente rápida; e é necessário ampliar as finanças climáticas e direccioná-las para as economias emergentes. Vivemos um momento único, um momento de verificação crucial da

“Moçambique, como outros países, participa na COP28 para contribuir com a sua perspectiva e compromissos para enfrentar as mudanças climáticas”, Ricardo Pereira centra-se na questão de negociações e a segunda na agenda de acção liderada pelas presidências. Penso que a importância da COP reside nas negociações em que as decisões são impulsionadas pelo consenso. A COP tem uma função crítica de servir de arena principal para estabelecer políticas públicas. O resultado destas negociações é o texto de decisão que todas as partes concordam subscrever. A presidência da COP lidera a chamada agenda de acção, cujo papel é o de garantir que aquilo que está a ser discutido na mesa das negociações esteja ligado à economia real, promova a inovação, olhando para soluções viáveis e alimentando o processo de negociação, garantindo que existem pioneiros cruciais, tanto nos sectores público como no privado.

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realidade e definição de planos de acção, para renováveis, metano, sectores de emissões intensas, alimentos, natureza, água e saúde. O que importa neste momento é saber exactamente onde estamos, porque esse ponto irá definir o nível de esforço e a trajectória que temos de tomar. Por não termos um planeta “B”, não podemos estar a contar com um plano “B”. E é importante Moçambique estar presente na COP28? O País enfrenta desafios relacionados com as mudanças climáticas e a transição energética é uma estratégia fundamental para mitigar os impactos adversos e contribuir para os esforços globais de redução das emissões de gases com efeito de estufa. A transição energética é um

tema crucial, pois envolve uma grande questão: como é que países em vias de desenvolvimento como Moçambique podem ter acesso a recursos financeiros para assegurar um desenvolvimento sustentável e, simultaneamente, um acesso justo e equitativo à sua população? A participação activa na COP28 permite que Moçambique partilhe as suas experiências, desafios e dê contributos, seja ouvido, nas discussões globais sobre a transição para um futuro mais sustentável em termos energéticos e climáticos. A COP não é um fim em si mesmo, mas uma das várias plataformas que compõem uma agenda climática global contínua. As negociações de financiamento climático de cada país constroem-se com iniciativas e empenho www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


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CARTA ABERTA: “PERDOEM A DÍVIDA DOS PAÍSES MAIS POBRES” Os países do sul ‘global’ com dívida elevada, entre os quais estão todos os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, “estão a gastar 12 vezes mais para pagar da crise climática, do que para lidar com ela, com muitos a serem obrigados a explorar os seus recursos naturais, incluindo combustíveis fósseis, para gerar receitas para os pagamentos da dívida”. O alerta constitui um dos argumentos na base da carta aberta de mais de 300 organizações não governamentais e cerca de 550 economistas, incluindo Yanis Varoufakis e Thomas Picketty, a defender o cancelamento da dívida dos países mais pobres, na abertura da COP28. “A declaração defende o cancelamento das dívidas dos países de baixo rendimento que estão na linha da frente da emergência das alterações climáticas e que os países ricos aumentem significativamente os níveis de doações para o financiamento climático”, lê-se no comunicado. Coordenada pelo Movimento Asiático sobre Dívida e Desenvolvimento, Latindadd, Rede Europeia sobre Dívida e Desenvolvimento (Eurodad) e Debt Justice, a declaração refere que “há 54 países sobre-endividados com o maior volume de dívida dos últimos 25 anos” e argumenta que “a dívida drena os recursos da saúde, educação, proteção social e de uma transição verde justa, dificultando a mitigação das alterações climáticas, e transfere estes ativos para os bolsos dos credores estrangeiros”.

contínuo do País nestas diferentes plataformas. Devido ao facto de a estratégia de rransição energética de Moçambique ser muito recente, a COP28 surge sobretudo como uma plataforma de apresentação do compromisso do Governo moçambicano. Existem indicações de que a transição energética moçambicana vai necessitar de um investimento de 80 mil milhões de dólares. O que esta incluído? É realista esperar um financiamento climático desta magnitude? Os detalhes desse investimento ainda não foram publicados. No entanto, com base no custo da transição energética noutros países, esse valor é certamente uma estimativa do valor total para programas e projectos que estão previstos www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023

dentro da transição de Moçambique até 2050 – isto é bastante amplo, incluindo, entre outros, projectos de produção e distribuição de energia, mas também descarbonização do sector do transporte, com biocombustíveis, e a descarbonização do sector agrícola, com redução da utilização da biomassa. Grande parte do financiamento destes programas e projectos virá dos canais tradicionais. É importante gerir as expectativas dos intervenientes nacionais, pois apenas uma pequena parte deste valor virá de veículos dedicados ao financiamento climático e estará, naturalmente, condicionada à implementação de compromissos com a transição. Por exemplo, a África do Sul estima um investimento total para a sua transição energética até 2050 na ordem dos 300 biliões de dólares.

Deste valor total, apenas 8,5 biliões foram assegurados em veículos dedicados para financiamento climático pelo IPG (International Partners Group – uma coligação da UE, Reino Unido, EUA, Japão, entre outros). Ou seja, quando uma notícia destas é publicada, é preciso explicar que não vamos conseguir os 80 mil milhões de dólares. Este número é a avaliação do que vamos precisar em todos os sectores de actividade do País. Não é o valor que Moçambique vai conseguir numa COP. Seria bom, mas não é assim. Neste momento – e esta estratégia vai até 2050 –, há mecanismos de financiamento tradicionais e há novos modelos, mais baratos. Creio que Moçambique tem de definir quais os programas que entram neste financiamento climático, que, de facto, estarão dentro deste bolo.

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STARTUP

MAKTUB

Macau Distingue Ideia Moçambicana Que Dignifica a Mulher A partir da reutilização de produtos agrícolas desperdiçados, nasce um projecto sustentável a pensar na saúde menstrual de milhões de mulheres que trabalham no mundo rural moçambicano. A ideia acaba de ser premiada numa competição de startups em Macau, China. A dupla empreendedora explicou à E&M a essência deste trabalho que está a captar atenções TEXTO Ana Mangana • FOTOGRAFIA D.R.

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Maktub é uma startup moçambicana criada por dois jovens empreendedores com uma grande ambição: enfrentar os desafios da sociedade, através da valorização sustentável da cadeia de valor das culturas agrícolas. Como? Promovendo a utilização eficiente e sustentável de resíduos. A ideia foi distinguida numa competição, em Macau, legado português, hoje região administrativa especial da China. Neide Ussiana e Sidney Mouga decidiram levar a sua empresa ao 929 Challenge, um evento co-organizado pelo Fórum Macau com universidades e diversas outras entidades, no sentido de desenvolver a criação de ideias de negócios que liguem a China e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Nesta que foi a terceira edição, o concurso contou com cerca de 290 equipas, divididas em duas categorias, uma para universidades e outra para startups. E por entre tantas equipas, o que levou a Maktub a ser distinguida como a ´Startup Com Maior Impacto´? “Nós desenvolvemos um projecto de aproveitamento dos resíduos agrícolas de determinadas culturas. No entanto, o nosso foco não foi tanto na componente agrícola, mas sim nas mulheres e raparigas em idade reprodutiva. Em média, 6,5 milhões de mulheres em Moçambique vivem nas zonas rurais e não têm acesso a informação, nem a meios financeiros para poderem adquirir produtos de higienização, quando se encontram no seu período menstrual”, explicou Neide. Foi neste contexto que surgiu a ideia dis-

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tinguida na China. “Pensámos numa solução que mantivesse a dignidade, mas que fosse de baixo custo, fácil acesso e menor impacto ambiental, tendo em conta que desperdícios criam poluição”, detalhou Sidney. Resolve-se um problema social, no âmbito da saúde reprodutiva, promove-se a igualdade de género e a preservação do ambiente, “reduzindo o uso de plásticos e a poluição”. Os absorventes são produzidos com base em produtos específicos de culturas agrícolas (cujos mentores preferem não divulgar). “Trata-se de material que muitas vezes é descartado das plantas. Por isso, atacámos essa componente dos resíduos para produzir um material biodegradável”, esclareceu Sidney Mouga. A estratégia consiste em produzir absorventes localmente e tentar manter o custo ao nível mais baixo possível. “Obviamente, temos também como estratégia interagir com organizações não-governamentais (ONG) e programas ligados à saúde sexual e reprodutiva”, concluiu Sidney. A Maktub foi a única empresa africana a receber uma distinção no 929 Challenge e teve, ao longo do concurso, a oportunidade de conhecer vários especialistas e organizações que podem vir a ter um papel importante no desenvolvimento do projecto O 929 Challenge é um concurso de startups que tem como objectivo reforçar o intercâmbio comercial e empresarial entre a China e os países de língua portuguesa. Este ano teve duas vertentes: uma para as universidades e outro para startups.

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EMPRESA Maktub PROJECTO Absorventes sustentáveis ANO DE CRIAÇÃO 2015 PROPRIETÁRIOS Neide Ussiana e Sidney Mouga

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PANORAMA

FinTech

Sistema inteligente nas ATM do Absa Moçambique passa a marcar notas roubadas As caixas automáticas (ATM) do banco Absa Moçambique passaram a contar com um sistema inteligente que vai tingir notas roubadas. De acordo com Denise Cruz, directora departamental da instituição, “as ATM do banco contarão com um sistema inteligente que inutiliza as notas através do uso de uma tinta permanente, indelével e rastreável, sempre que ocorrer um evento de intrusão”. A responsável acrescentou que as notas fica-

rão parcialmente tingidas, cobrindo pelo menos 20% da superfície, não devendo ser aceites como forma de pagamento e impedindo-as de ser depositadas nos balcões junto de agentes”, explicou. A responsável esclareceu que o sistema visa reduzir o risco de roubo e circulação de dinheiro ilegal e está alinhado com as políticas de combate à lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo.

Healthtechs

Hospital provincial de Lichinga passa a realizar tomografia axial computorizada (TAC) “Value2Prevent”

Resíduos florestais e fungos juntos para criar um novo cimento “Value2Prevent” é o nome do novo produto de uma equipa de investigadores da Universidade de Coimbra, em Portugal, criado a partir de resíduos florestais e fungos. O que é que este material tem de novo? Pode ser usado na construção, em paredes interiores de edifícios, com o propósito de valorizar a biomassa florestal. Os cientistas da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) acreditam que este é o tipo de iniciativas que podem incentivar os proprietários a limpar as suas terras, porque os resíduos têm um novo valor – o tipo de motivação que pode funcionar em qualquer parte do mundo. Na base da invenção está a mistura de resíduos de biomassa florestal com um fungo que tem a capacidade de degradar parcialmente a biomassa e criar uma espécie de cimento, agregando todas as partículas e formando um bloco. Depois de seco, o fungo é inactivado e o produto pode ser utilizado no interior de placas de madeira, substituindo materiais sintéticos. O “Value2Prevent” é promovido pelo SerQ – Centro de Inovação e Competências da Floresta, tendo como parceiros a Universidade de Coimbra, o Instituto Superior de Agronomia (ISA), o Centro Ciência Viva da Floresta de Proença-a-Nova (CCVF) e a Proentia – Essential Oils.

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O Hospital Provincial de Lichinga, no Niassa, norte do País, já realiza exames de tomografia axial computorizada, exame mais conhecido como TAC. Os exames serão feitos com recurso a um aparelho digital que consegue fazer um diagnóstico mais preciso de vários tecidos do corpo humano. Os exames através de TAC têm capacidade de diagnosticar com precisão problemas nos

pulmões, crânio, coluna, sistema digestivo, entre outros. A introdução do aparelho que permite a realização dos exames computorizados está inserida numa iniciativa que visa a modernização da capacidade de diagnóstico de várias doenças, naquela unidade sanitária, que recentemente beneficiou de uma requalificação.

Ciência

Cientistas criam plástico biodegradável… a 25% Cientistas da Universidade de Tóquio, no Japão, desenvolveram um plástico inovador que se destaca pela sua resistência e capacidade de regeneração durante o uso, com a particularidade de se decompor facilmente em componentes básicos para ser reciclado. Por exemplo, quando danificado com um arranhão, o plástico - designado VPR - foi capaz de se auto-regenerar, bastando aquecê-lo a 150°C por apenas um minuto. Além disso, se for moldado numa forma específica e depois achatado, o VPR pode reverter à forma original atra-

vés do calor, uma propriedade conhecida como “memória de forma”. Se descartado no meio-ambiente apresenta menos riscos que outros plásticos. Os testes demonstraram que, submergido em água do mar durante 30 dias, o VPR biodegradou-se em 25% e libertou moléculas que servem de alimento para a vida marinha. Este plástico avançado terá aplicação numa série de áreas, da robótica à medicina, da moda sustentável às infra-estruturas e revestimentos para automóveis. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023




ócio

(neg)ócio s.m. do latim negação do ócio

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ESCAPE

GOURMET

ADEGA

EMPREENDEDOR

ARTES

VOLANTE

Destinos 2024 Os melhores locais do mundo eleitos pela National Geographic

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Restaurante Kirimizi Naco de Atum, uma atracção para os visitantes de Pemba, Cabo Delgado

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Aldeana Cerveja artesanal portuguesa que é sinónimo de sustentabilidade

Chibaia Clothing Um moçambicano que quer levar roupa com capulana para todo o mundo

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“Obra-Dádiva” Exposição literária de 47 autores de Portugal e Moçambique

Nissan Hyper Tourer Um novo conceito futurista dos veículos eléctricos geridos por Inteligência Artificial

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Turismo mundial

Os Melhores Destinos Para África está também representada entre os destinos preferenciais do próximo ano

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Com a chegada do novo ano, surgem novas oportunidades para explorar o mundo. O ano de 2024 promete estar repleto de bons motivos para partir à descoberta de destinos enriquecedores. Quer seja um viajante ávido por aventura ou alguém à procura de tranquilidade em paisagens deslumbrantes, há diferentes variedades de destinos para cativar a imaginação de cada gosto. Neste artigo, proposta da “National Geographic” (The Cool List 2024), embarcamos numa viagem pelos melhores destinos a visitar em 2024, apresentando locais que encantam pela sua beleza natural, riqueza cultural e experiências únicas. Das férias aos feriados que pode usar para fins-de-semana prolongados, todas as oportunidades são boas para viajar. Pode sempre aproveitar para partir à descoberta, seja durante uma semana ou um mês. O mais difícil, contudo, é mesmo escolher o destino.

Conhecer em 2024 Alojamento num comboio nocturno “Antes do novo ano, cruzámos o mundo para encontrar os destinos mais emocionantes para 2024. Com a abertura de hotéis de referência, ambiciosos projectos de repovoamento de espécies e novas rotas ferroviárias - que tornam as viagens mais fáceis -, há muito por onde escolher”, escrevem. Na Europa, por exemplo, há um reavivar de comboios com cabines-dormitório (os chamados ‘sleeper train’), permitindo viajar durante a noite, cruzando cada quilómetro de terra, numa forma mais aprofundada de conhecer o mundo. E se pensarmos num serviço de bordo cinco estrelas, com a melhor cozinha a bordo, é fácil ficar a matutar com insistência na ideia. A lista é variada. Aqui há opções para todos os gostos: para aqueles que desejam mer-

gulhar na natureza da Noruega, escalar os picos dos Himalaias ou saborear a culinária de Lima, capital do Peru, na América do Sul – que está a ganhar notoriedade em várias listas internacionais de locais gourmet. Basta pesquisar online. A Europa é uma parte dominante das escolhas na “National Geographic”, com locais que incluem a capital de Malta, La Valletta, a cidade italiana de Pompeia e os alpes albaneses. Uma das grandes surpresas, para muitos, pode ser a inclusão do País de Gales. A participação numa lista de destinos de viagem é justificada com uma experiência de nicho, no caso, beber o whisky desta parte do Reino Unido, bebida que conta com uma tradição centenária e que é, muitas vezes, ofuscada pelo percurso das destilarias da Irlanda e Escócia. Mas, garantem os autores, para os apreciadores, va-

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le bem a pena suportar o clima austero do País de Gales. “Não há nada como prová-lo na origem”, garantem. À redescoberta do povo Maia Já no continente americano, a revista destaca a península de Yucatán, no México, uma das zonas mais interessantes para conhecer no próximo ano, a propósito das descobertas arqueológicas de antigas civilizações. Afinal, agora é possível percorrer um trilho de longa distância para conhecer a história da civilização Maia. O Camino del Mayab leva os visitantes ao coração Maia de Yucatán, em Dzoyaxché - uma pequena comunidade construída em torno de uma quinta do século XIX -, e até aos templos escavados de Mayapan, uma das últimas grandes capitais deste povo. “Agora, tudo o que resta são os grandes edifícios de pedra e templos de pirâmide, mas cerca de seis milhões de pessoas na região ainda falam línguas maias”, e essa cultura viva está disponível em cada canto dos espaços a visitar na região. Paisagens de árvores gigantes Em África, Madagáscar, Serra Leoa e Ruanda estão em maior destaque. Em Madagáscar, ilha companheira do nosso País no Canal de Moçambique, “a Reserva Natural Integral do Tsingy de Bemaraha, Património Mundial da UNESCO, é famosa pelo labirinto de pináculos de calcário, irregulares. Os limites foram alargados este ano para incluírem as Florestas Secas de Andrefana”, com muitas espécies endémicas. Mas basta uma só para valer a pena a visita: as paisagens das gigantes árvores baobab, também chamadas de embondeiro, poilão ou pé-de-cabaceira, são especiais. A árvore cresce em 32 países africanos, mas ganha uma forma distinta nestas florestas de Madagáscar. Texto Ana Mangana Fotografia D.R. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023

A Europa é uma parte dominante das escolhas na “National Geographic”, com locais que incluem a capital de Malta, La Valletta, a cidade italiana de Pompeia e os alpes albaneses. Uma das surpresas é o País de Gales TOP 10 DOS DESTINOS DE ELEIÇÃO PARA 2024 Entre todas as sugestões para o próximo ano, a “National Geographic” destaca estas dez – incluindo um destino de África

1. Miami, EUA; 2. Lima, Peru; 3. Alemanha; 4. Galloway e Ayrshire, Escócia; 5. Esteros del Iberá, Argentina; 6. Emilia-Romanha, Itália; 7. República Dominicana; 8. Belfast, Irlanda do Norte; 9. Andrefana Dry Forests, Madagáscar; 10. Deserto de Atacama, Chile. FONTE National Geographic

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RESTAURANTE KIRIMIZI

Avenida da Marginal Praia de Nahimbe, 9691 Pemba, Moçambique Horários: De segundafeira a domingo das 07h00 às 22h00

+258 272 20180

g o restaurante do hotel kirimizi, em Pemba, província de Cabo Delgado, vai ganhando popularidade graças aos seus pratos, muitos baseados em marisco, mas também no pescado obtido da faina que se observa, da varanda, onde se servem as refeições. Barcos artesanais com a vela latina (triangular) cruzam o amplo horizonte, a compor uma paisagem idílica. Kirimizi, que significa “local escondido”, até faz jus ao local, um recanto com a sua própria praia. O restaurante está sob gestão de Vasco Ferreira Leite, um profissional apaixonado pela hotelaria, e que tem no currículo vários países, principalmente africanos. A vista do restaurante Kirimizi é deslumbrante, as ondas do mar marcam o ritmo do dia, enquanto abrem o apetite para uma refeição, digamos, marcante. Esta é uma casa de sabores onde um dos pratos mais

Naco de Atum… O Sushi apreciados e solicitados é o Naco de Atum. “Fazemos uma coisa que, se calhar, é diferente de tudo o resto. O nosso menu não é extenso. Evitamos apresentar pratos que não fazemos”. Mas peixe é coisa que não falta. “Conseguimos encontrá-lo facilmente em Pemba”, explicou Vasco Leite. “Estamos mais virados para os grelhados”. E é aqui que se apresenta o famoso Naco de Atum. Em que consiste este prato? Trata-se de atum servido em bifes com “corte de rolha”, ou seja, bifes pequenos, tamanho tirado à medida para quem prefere atum selado por fora, cru por dentro. É quase um sushi do Kirimizi. “Eu, por exemplo, não como o bife de atum baixo, porque o atum é um peixe seco. O naco, cru por dentro, é um prato com-

É servido em bifes com “corte de rolha”, ou seja, bifes pequenos, tamanho tirado à medida para quem prefere atum selado por fora, cru por dentro

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pletamente diferente. É muito conhecido aqui, porque somos os únicos a fazê-lo”, detalhou. Um menu com outras estrelas A estrela do menu está apresentada, mas não é a única. Ao lado de um naco de atum de sonho, tem de haver bebidas à altura. “Isso fica à escolha do cliente. Temos a nossa selecção de vinhos, mas os sumos naturais são sempre os mais escolhidos. Para mim, um bom vinho branco cai sempre bem com um bom atum”, aponta. E porque o pessoal do restaurante tem entusiasmo e criatividade, este possui um outro prato também muito apreciado, sendo igualmente específico do Kirimizi. É o “marlim panado com molho de marisco”. A valorização da matéria-prima local é outra marca de interesse deste restaurante. “Temos uma horta, que ainda é pequena, onde produzimos alimentos de difícil acesso em Pemba, além de alguns produtos básicos como o tomate, a

do Kirimizi abóbora, a melancia e o limão, e algumas frutas como a papaia e a banana”, revelou Vasco Leite, acrescentando que conta, igualmente, com fornecedores locais de verduras. O hotel Kimirizi está aberto desde Junho de 2018 e apresenta-se como “um terraço escondido”, localizado na praia de Nanhimbe, a cinco quilómetros do Aeroporto Internacional de Pemba e a pouco menos de uma das grandes superfícies da cidade – terra de gente afável, à beira da terceira maior baía do mundo com praias fabulosas e ponto de partida para variados destinos. A unidade hoteleira é composta por quatro edifícios de dois pisos, enquadrados num palmar, com piscina sobre a praia, ao lado do restaurante. Texto Nario Sixpene Fotografia D.R. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


A Aldeana é uma cerveja que é um bom exemplo de sustentabilidade, economia circular e mitigação do desperdício. É produzida a partir de sobras de pão usadas no processo de fermentação

Aldeana, Cerveja Artesanal, Sinónimo de Sustentabilidade

Em Julho passado, foi apresentada ao mercado uma nova cerveja artesanal. De nome Aldeana, a bebida começou a ser criada em 2014, quando o jovem português Miguel Cáceres se apercebeu, numa viagem ao norte de França, que boa parte dos bares e cafés ofereciam aquilo que em Portugal, na mesma altura, não havia em quantidade ou diversidade: cerveja artesanal. O empresário, natural do Montijo, de regresso a Portugal e movido pela curiosidade - depois de um período de estudos no estrangeiro -, começou a preparar as primeiras receitas. A história do cervejeiro artesanal começa a ganhar forma. “O caminho foi-se fazendo: explorar ingredientes, aprender, montar o negócio, sempre com muito autodidactismo”. A história do nome tem o mesmo nível de criatividade das próprias receitas que dão origem à bebida. “O Montijo, antigamente, era conhecido como aldeia galega. Os habitantes não gostavam de ser associados a uma aldeia, e, entretanto, esta subiu a vila. Hoje o sentimento é contrário, e já ninguém se chateia por ser um ‘aldeão’ ou ‘aldeana’”. E aí está o nome desta cerveja artesanal. A Aldeana é um bom exemplo de sustentabilidade, economia circular e mitigação do desperdício. “Temos uma cerveja produzida a partir de sobras de pão. O processo passa pela recolha dessas sobras, que são usadas no processo de fermentação”, explica Miguel Cáceres. A pandemia pode ter sido um momento determinante para as cervejas artesanais. Na opinião do fundador da Aldeana, aconteceu uma distinção clara entre o profissionalismo e os projectos de garagem. “Ao vermos as marcas que trabalham melhor, e que estão a crescer, houve uma clara consolidação, sendo que os pequenos projectos de produção caseira desapareceram. É uma evolução e uma selecção naturais. Os consumidores são hoje muito mais informados e têm uma apetência muito maior por este tipo de cerveja, num caminho que não se faz de um dia para o outro”, acredita Miguel Cáceres. Para além da já referida cerveja feita a partir de sobras de pão, o portefólio da Aldeana é relativamente grande. Desde a Original – uma cerveja do estilo Bière de Garde, típica do norte de França –, até uma Saison, mais leve e fresca, são várias as cervejas que a Aldeana tem lançado no mercado. E além do portefólio fixo, existem, naturalmente, as cervejas de estação, mais pontuais, como, por exemplo, a produzida em parceria com a Adega de Palmela com a casta Moscatel Graúdo. São, no total, oito versões diferentes da Aldeana: a Aldeana Trigo, de espuma persistente, aveludada, branca e frondosa, fresca www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023

e muito versátil; Aldeana Original, dourada, turva, com espuma pouco persistente, caramelizada e salivante; Aldeana Stout, negra, mas não totalmente, com espuma ligeira, castanha, abaunilhada e doce; Aldeana Saison, com espuma média, alguma persistência, de cor relativamente dourada, pouca fruta e seca; Aldeana Mini, de cor amarela palha, com espuma média, predominância do cereal, mas também de citrinos, que lhe conferem uma boa acidez; Aldeana IPA: amarela, com um amargo que não descola desde o primeiro contacto e sabor frutado; Aldeana Imperial Stout, totalmente negra, com um paladar achocolatado, penetrante, quase mastigável; e a Aldeana de Cacho, de espuma bege, com persistência média, em que a acidez e até alguma frescura são pontos a destacar e que mitigam os 10,5% de álcool. TEXTO Filomena Bande FOTOGRAFIA D.R

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Chibaia Clothing Company

Cores, Estampas e Tecidos

que Representam Moçambique e África Cláudio Lobo, criador da marca Chibaia, nasceu em Nova Iorque, filho de pais moçambicanos, naturais da província da Zambézia. Formou-se em Marketing e Comércio Internacional e, mais tarde, em Design. Depois de terminar o curso, já em Moçambique, trabalhou em publicidade na agência DDB. A veia de empreendedor começou antes da Chibaia. Cláudio chegou a ter uma empresa de comunicação, mas a crise económica forçou-o a encerrar o projecto. A marca moçambicana de roupas e acessórios de tecidos de capulana surge, como explica, por acaso. A ideia germinou depois de, em 2013, ter mandado fazer um casaco com capulana a uma costureira. A peça foi tão apreciada que começou a ter vários pedidos e, naquela altura, percebeu que a ideia poderia transformar-se num negócio. Em 2014, Cláudio cria a marca Chibaia, inspirada no nome original da sua família. No tempo colonial, o avô teve de adoptar um apelido português, “Lobo”, deixando cair o sobrenome natural da família, “Chibaia”, que é também o nome de uma localidade em Tete, interior do País. O jovem estilista começou por transformar casacos, criando formas com capulana, e os seus principais clientes eram, sobretudo, estrangeiros. Mas, nos últimos anos, conseguiu cativar um público mais amplo, incluindo jovens moçambicanos de classe média. Não só a clientela cresceu, como também a variedade de produtos. Hoje, a Chibaia produz bolsas estilizadas, calções, tops e t-shirts, mantendo o foco em casacos (para homem e senhora) de variadas formas, que têm como principal marca de identidade o uso da capulana. A Chibaia é mais do que uma marca - é um meio que Cláudio encontrou para representar Moçambique e África. “Escolhi trabalhar com capulana porque é um tecido que nos une como moçambicanos e africanos. Quando as pessoas dos outros continentes olham para a capulana sabem que o assunto é africano. Ela é uma espécie de bandeira da nossa região”, esclareceu. Actualmente, a marca posiciona-se como uma das mais prestigiadas de Moçambique, com uma ambição contínua de crescer e alcançar outros patamares, facto que deixa o seu criador satisfeito, porque o sucesso foi fruto de “trabalho árduo, todos os dias, com muita fé, humil-

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dade, coragem, criatividade e foco”. A empresa e marca Chibaia ambiciona crescer e ajudar a criar empregos. Actualmente, tem sete trabalhadores directos e colabora com muitos mais de forma indirecta. Cláudio considera que o mercado da moda em Moçambique está a desenvolver-se e tem ainda muito por oferecer. É preciso que haja mais pessoas a criar, a expor as suas ideias e, acima de tudo, a produzir peças que exaltem a identidade cultural do País e de todo o continente africano. “Não é fácil ser moçambicano, mas nós temos muita beleza nas nossas vidas, e temos de partilhar isso com o mundo. Temos algo para oferecer e não podemos ter medo de mostrar quem somos”. TEXTO Filomena Bande FOTOGRAFIA D.R. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023


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mpreendedor

“Escolhi trabalhar com capulana porque é um tecido que nos une como moçambicanos e africanos. Quando as pessoas dos outros continentes olham para a capulana sabem que o assunto é africano...”, Cláudio Lobo

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LITERATURA

“Obra-Dádiva”, com 47 obras, é uma forma de expressar, ainda que de maneira subentendida, a ligação entre Moçambique e Portugal

O Centro Cultural Português-Camões inaugurou, a 11 de Novembro, em Maputo, a exposição colectiva de artes plásticas “Obra-Dádiva”, uma colectânea de 47 obras originais realizadas sobre papel, pertencentes a 47 artistas diferentes, de Portugal e Moçambique. A exposição “Obra-Dádiva” foi organizada pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (FBAUP) por ocasião do VIII Encontro Internacional sobre Educação Artística, englobando docentes e investigadores da CPLP, particularmente de Moçambique, da Universidade Eduardo Mondlane, da Universidade Pedagógica, do Instituto Superior de Artes e Cultura e da Escola Nacional de Artes Visuais. Os artistas envolvidos na exposição estão todos ligados à FBAUP, entre estudantes, antigos alunos e professores que estão a contribuir para a divul-

“Obra-Dádiva”, o Resgate da Liberdade gação da cultura, da arte e “para que o mundo possa avançar para algo melhor”. A exposição é um encontro de 47 artistas, com 47 formas de ver o mundo e de expressar diferentes sentimentos e percepções. A essência da “Obra-Dádiva”, na explicação de Paulo Luís Almeida, curador da exposição, é “dar para permanecer”. Artista plástico, professor associado da FBAUP e director da sua Unidade de Investigação, Paulo Almeida explica que, nas várias tensões do conceito de dádiva, compreende-se que este se refere, tanto ao acto de dar como ao retorno. Ou seja, não são só necessariamente as coisas que são dadas, mas “o sujeito que dá e que se distribui a si próprio, pelos outros, como uma ‘pessoa distribuída’. A dádiva é o evento pelo qual as coisas se dão a si pró-

Os 47 artistas envolvidos na exposição estão ligados à Faculdade de Belas Artes, entre estudantes, antigos alunos e professores... www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2023

de Expressão e Educação Artística prias, onde se reproduzem as relações de comunidade, se reforçam e se criam vínculos”, explicou. Interesses comuns entre dois países “Obra-Dádiva” é, ao mesmo tempo, uma forma de expressar (ainda que de maneira subentendida), a ligação entre dois países com relações históricas, num sentido em “que os artistas portugueses encontraram de estar presentes com os artistas de Moçambique, e de reforçar que entre os dois grupos há muitos interesses comuns do ponto de vista da construção de tempos melhores, de um mundo melhor e de melhoria da visão da arte”, explica José Paiva, um dos organizadores da exposição. Paiva destaca ainda que a importância de uma exposição que tem 47 obras de artistas diferentes consiste em “mostrar que a arte é um espaço de liberdade, onde os artistas podem falar e exprimir-se como quiserem, de uma forma mais directa, subli-

minar ou mais silenciosa. Mas é deste espaço de liberdade que nós precisamos para toda a comunidade, onde cada um tem a sua forma de se exprimir, de falar, de mostrar os seus desejos e de colaborar com o mundo inteiro”. O VIII Encontro Internacional sobre Educação surge na sequência do compromisso que o Grupo de Estudo sobre Ensino Artístico em Moçambique assumiu aquando da presença desta delegação no anterior encontro (Cabo Verde, 2021). Na ocasião, sublinhou-se a necessidade de dar continuidade ao debate iniciado, no que diz respeito aos desafios da educação artística na CPLP, com atenção às forças e fragilidades instaladas nas práticas de ensino artístico em Moçambique e abrindo-o à sub-região da Comunidade de Desenvolvimento de África Austral (SADC). TEXTO Filomena Bande FOTOGRAFIA Mariano Silva

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NISSAN HYPER TOURER

Ao girar 360 graus, os passageiros da frente e de trás ficam frentea-frente quando o automóvel está a conduzir de forma autónoma.

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Nissan Apresenta Uma Sala de MINIBUS, MINIVAN, MONOVOLUME? O Hyper Tourer é um conceito futurista em que os veículos eléctricos autónomos serão amplos espaços de convívio geridos por IA. O evento Japan Mobility Show 2023 serviu de palco para a Nissan apresentar um novo conceito automóvel, a carrinha monovolume Hyper Tourer, modelo futurista com funcionalidades surpreendentes. É um veículo 100% eléctrico com o objectivo de antever um futuro monovolume de luxo de alta tecnologia com capacidade de condução autónoma. O desenho exterior do automóvel conjuga aerodinâmica com linhas rectas abruptas - foram criados canais na carroçaria para suavizar o fluxo de ar e as jantes foram concebidas para uma rolagem com o menor arrastamento possível. O Hyper Tourer não tem espelhos retrovisores exteriores nem puxadores de porta. O novo conceito da marca apresen-

ta formas angulares agressivas e uma superfície vidrada que se funde com a carroçaria. A asa traseira é uma referência à herança desportiva da marca Nissan. O luxo é uma realidade muito acentuada no interior deste monovolume, onde a marca japonesa combina tecnologia com a essência do “omotenashi” (hospitalidade japonesa). O modelo Hyper Tourer foi desenvolvido para as viagens de longa distância. Os assentos giram e viram-se uns para os outros, como se o interior fosse uma acolhedora sala de estar. Ao girar 360 graus, os passageiros da frente e de trás ficam frente-a-frente quando o automóvel está a conduzir de forma autónoma. Os passageiros da retaguarda também podem usar um visor semelhante a óculos de realidade virtual para controlar o ecrã de entretenimento, à frente. As baterias de alta densidade foram embaladas de forma

Estar do Futuro que maximizem o espaço interior e mantenham o centro de gravidade o mais baixo possível, para permitir uma aceleração e travagem mais suaves, e curvas feitas sem oscilação. A Nissan explica ainda que a Hyper Tourer recorre à Inteligência Artificial para monitorizar vários aspectos da saúde dos passageiros, tais como o ritmo cardíaco, respiração e transpiração. Manter a boa disposição é outro dos objectivos. A viatura traz a possibilidade de ajustar automaticamente a iluminação ambiente, tem painéis LED planos no piso, que podem mostrar imagens de rios, céu azul ou outras. Pode ainda seleccionar música de forma que se adeque ao estado de espírito do condutor e dos passageiros. As funcionalidades são imensas, resta saber quais serão seleccionadas na eventualidade de este conceito chegar à fase de protótipo.

A Nissan explica ainda que a Hyper Tourer recorre à Inteligência Artificial para monitorizar vários aspectos da saúde dos passageiros, tais como o ritmo cardíaco, respiração e transpiração




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