F4SD Magazine #1

Page 1


Agenda 2030 | Agenda 2030

Investimento nos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável está longe do prometido em 2015

Investment in the Sustainable Development Goals is far from what was promised in 2015

Perfil | Profile

Director das Caixas Comunitárias advoga alterações na legislação para salvaguardar as micofinanceiras

Director of Community Funds defends changes to legislation to safeguard microfinance companies

EDO STORK

Representante do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) em Moçambique

United Nations Development Programme (UNDP) Resident Representative in Mozambique

"É crucial envolver os privados no desenvolvimento do País"
"It's crucial to involve the private sector in the Country's development"
Junho- Julho 2024 | June- July 2024

Índice • Contents

20

Editorial • Editorial

06

Newsroom

Notícias breves sobre as ocorrências do desenvolvimento sustentável em Moçambique e pelo Mundo

Short news stories on sustainable development in Mozambique and around the world

08

Opinião • Opinion

Apesar de maioritárias e dos avanços na sua emancipação, as mulheres continuam a participar pouco na economia de Moçambique

Despite their majority and the progress made in their emancipation, women still play a minor role in Mozambique’s economy

10

Overview

São precisos quase sete biliões de dólares por ano para conseguir realizar os ODS até ao ano 2030

It takes almost 7 trillion dollars a year to achieve the SDGs by the year 2030

16

Moz Fin Dev Talk

O holandês Edo Stork, representante do PNUD em Moçambique, salientou a necessidade de o Estado estabelecer prioridades de investimento e de fomentar parcerias com os privados Edo Stork, UNDP representative in Mozambique, stressed the need for the state to set investment priorities and foster partnerships with the private

Estudo de Caso • Case Study

Gapi ajuda a impulsionar economia de Cabo Delgado com iniciativas como o programa Agro-Jovem Gapi helps boost Cabo Delgado’s economy with initiatives such as the Agro-Jovem program

22

Opinião • Opinion

Autor advoga que seria benéfico à governança se as lideranças africanas tivessem mais literacia política

The author argues that it would benefit the governance of countries if African leaders were more politically literate

24

Parceiros • Partners

Retrato breve do Fundo Africano para a Inclusão Financeira Digital (ADFI), lançado a 13 de Junho de 2019

Brief portrait of the African Fund for Digital Financial Inclusion (ADFI), launched on June 13, 2019

26

Perfil • Profile

Enoque Changamo, Director das Caixas Comunitárias, diz ser urgente alterar a legislação para salvaguardar as microfinanceiras

Enoque Changamo, Director of the Community Funds, says it is urgent to change the legislation to safeguard microfinance companies

DIRECTOR EDITORIAL | EDITORIAL

DIRECTOR António Souto

DIRECTOR EXECUTIVO | EXECUTIVE

DIRECTOR Pedro Cativelos

EDITOR EXECUTIVO | EXECUTIVE EDITOR

Elmano Madaíl

JORNALISTAS | JOURNALISTS Ana Mangana, Felisberto Ruco, Filomena Bande, Nário Sixpene DESIGN EDITORIAL | EDITORIAL DESIGN

José Mundundo FOTOGRAFIA | PHOTO Mariano Silva TRADUÇÃO | TRANSLATION Bárbara Henriques

MARKETING comercial@media4development.com

ADMINISTRAÇÃO | ADMINISTRATIOM Media4Development

Rua Ângelo Azarias Chichava nº 311 A — Sommerschield, Maputo – Moçambique; marketing@media4development.com

IMPRESSÃO | PRINTING

RPO Produção Gráfica

TIRAGEM | PRINTING 1 000

PRODUÇÃO EDITORIAL, GRÁFICA E

COMERCIAL | EDITORIAL, GRAPHIC AND COMERCIAL PRODUCT MADE BY Media4Development

June - July 2024 • N.º 01
Junho - Julho 2024 • N.º 01

Propósito da Plataforma F4SD Purpose of F4SD Platform

“FINANÇAS PARA O DESENVOLVIMENTO”

é um termo usado após a Conferência das Nações Unidas (ONU) sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como Cúpula da Terra, realizada no Rio de Janeiro em 1992. Dez anos depois, em Monterrey, México, realizou-se a primeira Conferência Internacional sobre o Financiamento ao Desenvolvimento. Aí, foi aprovado o Consensus de Monterrey, focado na necessidade de uma resposta aos desafios do financiamento do desenvolvimento a nível mundial, em especial nos países em desenvolvimento. Seguiram-se duas Conferências internacionais, designadamente de Doha, em 2008, e de Addis Abeba, em 2015. Foi nesta que se estabeleceram os 17 Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), formalmente inscritos como Agenda 2030, em Setembro de 2015, em Assembleia Geral da ONU.

Em 2022, viu-se que as “perspectivas de desenvolvimento sustentável continuam a divergir entre os países desenvolvidos e queles em desenvolvimento”. E em quase todos os países aumentam exponencialmente as diferenças entre os mais ricos e os menos abastados. Na África Subsaariana, cresce a exclusão social. “Os ODS estão cada vez mais longe de poderem ser realizados até 2030”. Estas constatações determinaram uma 4.ª Conferência Internacional, a realizar em Julho de 2025, em Espanha.

É nesta conjuntura global e nacional que a Gapi está a actualizar a sua estratégia para poder ser mais interveniente e consequente na realização dos ODS, com particular enfoque no que depende dos instrumentos de financiamento.

A visão e estratégia da Gapi, enquanto instituição financeira de desenvolvimento criada em 1990, continuam a inspirar-se nos debates e recomendações que, desde 2002 e contidas no Consensus de Monterrey, nos actualizam sobre as prioridades que estão ao nosso alcance implementar e, assim, contribuir para um desenvolvimento mais sustentável de Moçambique. Das inúmeras reflexões destaca-se a importância da mobilização de recursos financeiros domésticos para o desenvolvimento. É o que tem motivado as sucessivas capitalizações da Gapi, atraindo capitais nacionais. Hoje, a totalidade do capital social da Gapi é

“Finance for Development” is a term used after the United Nations (UN) Conference on Environment and Development, also known as the Earth Summit, held in Rio de Janeiro in 1992. Ten years later, in Monterrey, Mexico, the first International Conference on Financing for Development took place. The Monterrey Consensus, which focused on the need for a response to the challenges of development financing at the global level, especially in developing countries, was approved there. This was followed by two international conferences, namely in Doha in 2008 and Addis Ababa in 2015. It was in the latter that the 17 Sustainable Development Goals (SDGs) were established, formally inscribed as the 2030 Agenda, in September 2015, at the UN General Assembly. In 2022, it was observed that “sustainable development prospects continue to diverge between developed and developing countries.” In almost all countries, the gap between the richest and the poorest is exponentially increasing. In Sub-Saharan Africa, social exclusion is growing. “The SDGs are increasingly unlikely to be achieved by 2030.” These findings led to a 4th International Conference, to be held in July 2025, in Spain. It is within this global and national context that Gapi is updating its strategy to be more proactive and consequential in achieving the SDGs, with a particular focus on financing instruments. Gapi’s vision and strategy, as a development finance institution created in 1990, continue to be inspired by the debates and recommendations that, since 2002 and contained in the Monterrey Consensus, update us on the priorities that are within our reach to implement and thus contribute to more sustainable development in Mozambique. Among the numerous reflections, the importance of mobilizing domestic financial resources for development stands out. This has motivated Gapi’s successive capitalizations, attracting national capital. Today, all of Gapi’s share capital is held by national investors, of which more than 90% are private. These investors, who naturally want to obtain

detida por investidores nacionais, dos quais mais de 90% são privados. Estes investidores que, naturalmente, querem obter algum retorno, almejam sobretudo contribuir para uma sociedade mais justa.

Na práxis da Gapi, “Finanças para o Desenvolvimento Sustentável” tem sido também a estruturação de fundos de desenvolvimento económico-social abertos a instituições parceiras motivadas a colaborar em iniciativas como programas ou projectos de assistência a micro, pequenas e médias empresas (MPME) capazes de gerar emprego e estimular as economias rurais.

No desenho destes projectos, a Gapi combina instrumentos para implementar o tripé da sustentabilidade e os seus três princípios: o económico, o social e o ambiental. À luz da Agenda 2030, “estes três factores têm de ser integrados para que a sustentabilidade aconteça”. Só com este tripé será possível induzir transformações socioeconómicas positivas e duráveis.

Na práxis de “Finanças para o Desenvolvimento Sustentável”, a Gapi tem, também, respondido à urgência de uma maior inclusão financeira e social intervindo em duas frentes complementares.

Primeiro: desenho e implementação de linhas de financiamento especificamente focadas no empoderamento de mulheres e de jovens com capacidade de empreenderem negócios impactantes e sustentáveis. Fundos como o Agro-investe, Agro-garante, entre outros, e, mais recentemente, o Resilience Fund, são exemplos concretos destas intervenções.

Segundo: participação na criação e modernização de instituições que fornecem serviços financeiros ao frágil tecido empresarial de MPME, bem como a segmentos de baixa renda. A constituição de microbancos rurais, caixas financeiras de mulheres, organizações de poupança e crédito de base comunitária e a reestruturação da associação nacional de instituições provedoras de microcrédito para estimular o relançamento da indústria microfinanceira são acções inscritas nos planos de actividades que a Gapi tem realizado.

Como instituição nacional há muito envolvida em finanças para o desenvolvimento, e sensibilizada pelo apelo do Secretário-Geral da ONU – “é necessária uma mudança em termos de compromisso, solidariedade, financiamento e acção…” –, a Gapi cria esta plataforma de comunicação, virtual e física, que será espaço de debate e de informação focado na promoção, comunicação e divulgação da Agenda 2030.

A plataforma F4SD – Finanças para o Desenvolvimento Sustentável tem, pois, como agenda motivar outras instituições a participarem e a contribuírem para que se alargue e se aprofunde, em Moçambique, o conhecimento dos desafios dos sistemas de financiamento focados num desenvolvimento mais justo, inclusivo e sustentável.

“Esta plataforma, virtual e física, será espaço de debate e de informação focado na promoção, comunicação e divulgação da Agenda 2030”
“This platform, virtual and physical, will be a space for debate and information focused on the promotion, communication and dissemination of the 2030 Agenda”

some return, primarily aim to contribute to a fairer society. In Gapi’s practice, “Finance for Sustainable Development” has also been the structuring of socio-economic development funds open to partner institutions motivated to collaborate in initiatives such as programs or projects to assist micro, small, and medium enterprises (MSMEs) capable of generating employment and stimulating rural economies. In designing these projects, Gapi combines instruments to implement the sustainability tripod and its three principles: economic, social, and environmental. In light of the 2030 Agenda, “these three factors must be integrated for sustainability to happen.” Only with this tripod will it be possible to induce positive and lasting socio-economic transformations. In the practice of “Finance for Sustainable Development,” Gapi has also responded to the urgency of greater financial and social inclusion by intervening on two complementary fronts. First: designing and implementing financing lines specifically focused on empowering women and young people with the capacity to undertake impactful and sustainable businesses. Funds such as Agro-investe, Agro-garante, among others, and more recently, the Resilience Fund, are concrete examples of these interventions. Second: participating in the creation and modernization of institutions that provide financial services to the fragile business fabric of MSMEs, as well as to low-income segments. The establishment of rural microbanks, women’s financial funds, community-based savings and credit organizations, and the restructuring of the national association of microcredit providers to stimulate the revival of the microfinance industry are actions inscribed in the activity plans that Gapi has carried out. As a national institution long involved in finance for development and sensitized by the UN Secretary-General’s call - “a change is needed in terms of commitment, solidarity, funding, and action...” - Gapi creates this communication platform, both virtual and physical, which will be a space for debate and information focused on promoting, communicating, and disseminating the 2030 Agenda. The F4SD - Finance for Sustainable Development platform aims to motivate other institutions to participate and contribute to expanding and deepening knowledge of the challenges of financing systems focused on fairer, more inclusive, and sustainable development in Mozambique.

Programa BRILHO ampliado até Outubro de 2026

BRILHO program extended until October 2026

O programa BRILHO, iniciativa que visa promover a sustentabilidade e o acesso à energia limpa em Moçambique, já beneficiou 2,2 milhões de pessoas com soluções de energias renováveis – eléctrica e térmica, garante a SNV (Organização Holandesa de Desenvolvimento): 1,3 milhões de pessoas com sistemas solares e 920 mil com soluções de cozinha melhorada, o que reduziu a emissão de mais de 560 mil toneladas de dióxido de carbono (CO2). O BRILHO é um programa de cinco anos (2019-2024) implementado pela SNV e os Governos do Reino Unido e da Suécia, catalisando o mercado de energia fora da rede para fornecer energia limpa acessível. Graças ao seu êxito, o consórcio aprovou a sua extensão até 2026, adcionando 688,5 milhões de meticais aos 2,6 mil milhões investidos até agora.

Obras da central eólica da Namaacha arrancam no segundo semestre Namaacha

wind farm on the go on the second trimester

A construção da central eólica de Namaacha, com capacidade de 120 Megawatts e orçada em 270 milhões de dólares, deverá arrancar no segundo semestre deste ano, anunciou Samir Salé, director de Desenvolvimento e Negócios da Globeleq, responsável pelo projecto. Do investimento total, cerca de 40 milhões de dólares irão ser investidos numa linha de transmissão de 40 quilómetros, que ligará Namaacha a Boane, integrando-se nos corredores de exportação de energia da região.

Construction of Namaacha wind farm, with a capacity of 120 Megawatts and costing 270 million dollars, is expected to start in the second half of this year, announced Samir Salé, Director of Development and Business at Globeleq, responsible for the project. Of the total investment, about 40 million dollars will be invested in a 40-kilometer transmission line that will connect Namaacha to Boane, integrating into the region’s energy export corridors.

The BRILHO program, an initiative aimed at promoting sustainability and access to clean energy in Mozambique, has already benefited 2.2 million people with renewable energy solutions –electrical and thermal, according to SNV (Dutch Development Organization): 1.3 million people with solar systems and 920,000 with improved cooking solutions, which has reduced carbon dioxide (CO2) emissions by over 560,000 tons. BRILHO is a five-year program (2019-2024) implemented by SNV and the governments of the United Kingdom and Sweden, catalyzing the off-grid energy market to provide affordable clean energy. Thanks to its success, the consortium approved its extension until 2026, adding 688.5 million meticais to the 2.6 billion invested so far.

FIDA investe 5,7 milhões de dólares para apoiar quase 5000 produtores

FIDA invests 5.7 million dollars to support nearly 5,000 producers

Cerca de 5000 pequenos produtores agro-pecuários estão a receber assistência técnica do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA) para minimizar a crise que afecta o sector. Avaliada em 5,7 milhões de dólares, a assistência – insumos e kits de rega – é feita pelo Programa de Desenvolvimento Inclusivo de Cadeias de Valor Agro-Alimentares (PROCAVA) em todos os oito distritos da Província de Maputo bem como nas províncias de Gaza, Inhambane e Niassa.

About 5,000 small agro-livestock producers are receiving technical assistance from the International Fund for Agricultural Development (IFAD) to minimize the crisis affecting the sector. Valued at 5.7 million dollars, the assistance – inputs and irrigation kits – is provided by the Inclusive Development of Agro-Food Value Chains Program (PROCAVA) in all eight districts of Maputo Province as well as in the provinces of Gaza, Inhambane, and Niassa.

País procura 4,5 mil milhões para investir nos recursos hídricos

Mozambique seeks 4.5 billion to invest in water resource management infrastructures

Moçambique precisa de 4,5 mil milhões de dólares para investir em infra-estruturas de gestão de recursos hídricos, disse o ministro das Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos, Carlos Mesquita, na Conferência Anual do Sector Privado (CASP-2024), em Maputo, o mês passado. Os projectos estão identificados – barragens de Moamba-major, Mapai, Pafúri, Cóbuè, Mugeba, e dez mil represas a construir em dez anos. O Governo garante estar já a negociar a verba com parceiros.

Mozambique needs 4.5 billion dollars to invest in water resource management infrastructures, said the Minister of Public Works, Housing and Water Resources, Carlos Mesquita, at the Annual Private Sector Conference (CASP2024) in Maputo last month. The projects have been identified – Moamba-major, Mapai, Pafuri, Cóbuè, Mugeba dams, and ten thousand reservoirs to be built in ten years. The government is already negotiating the funds with partners.

POLAROID

Cidades mais sustentáveis: Gutemburgo, segunda maior cidade da Suécia, lidera o mais recente Índice Global de Sustentabilidade de Destinos (IGSD) que elege, com base em 69 indicadores – como a taxa de reciclagem, poluição atmosférica e quantidade de ciclovias, entre outros –, as cidades que mais contribuem para um mundo melhor. Gutemburgo liderou o IGSD de 2016 a 2021; a Lonely Planet nomeou-a cidade mais sustentável do mundo em 2021; e, em 2022, inscreveu-se para ser uma das 100 cidades da União Europeia que visam a neutralidade climática até 2030. A Gutemburgo seguem-se Oslo (Noruega), Glasgow (Escócia) e Bordéus (França). No 14.º lugar, Goreyang (Coreia do Sul) é a primeira cidade não europeia a figurar no IGSD.

More sustainable cities: Gothenburg, Sweden’s second-largest city, leads the latest Global Destination Sustainability Index (GDSI), which selects, based on 69 indicators – such as recycling rate, air pollution, and number of bike lanes, among others – the cities that contribute the most to a better world. Gothenburg led the GDSI from 2016 to 2021; Lonely Planet named it the world’s most sustainable city in 2021; and in 2022, it enrolled to be one of the 100 European Union cities aiming for climate neutrality by 2030. Following Gothenburg are Oslo (Norway), Glasgow (Scotland), and Bordeaux (France). In 14th place, Goyang (South Korea) is the first non-European city to appear in the GDSI.

O desenvolvimento sustentável implica um grande investimento que vai beneficiar as gerações futuras, que ainda não votam nem pagam impostos. Daí a grande dificuldade em sensibilizar os governos para a questão.

Gro Brundtland

Directora-Geral da OMS [1998-2003]

Director-General of the World Health Organization

“Sustainable development requires a large investment that will benefit future generations, who do not yet vote or pay taxes. Hence the great difficulty in raising awareness among governments about the issue.”

Michael Redclift & Delyse Springett ROUTLEDGE INTERNATIONAL HANDBOOK OF SUSTAINABLE DEVELOPMENT

Routledge, 2017, 472 pag.

Obra abrangente acerca do desenvolvimento sustentável e que sublinha a necessidade de interdisciplinaridade na abordagem ao conceito. É o que acontece em cada um dos 28 capítulos do livro que conta com contributos originais de especialistas provindos de disciplinas e regiões diversas, incluindo o Sul Global.

A comprehensive work on sustainable development that highlights the need for an interdisciplinary approach to the concept. This happens in each of the 28 chapters of the book, which includes original contributions from experts from various disciplines and regions, including the Global South.

milhões de dólares, quase metade proveniente das Maurícias, foi o montante do Investimento Directo Estrangeiro em Moçambique no ano passado. Um crescimento de 2,1% face ao ano anterior. almost half of which came from Mauritius, was the amount of Foreign Direct Investment in Mozambique last year. An increase of 2.1% compared to the previous year.

ULTRA VOX

Mulheres mais empoderadas graças ao apoio das finanças para o desenvolvimento(I)

Aimportância do papel das mulheres no desenvolvimento social e económico é aceite por unanimidade e o seu efeito multiplicador é apoiado por evidências. Embora tenha sido estabelecido pela sociedade que as mulheres representam a parte sentimental, valores familiares, estrutura e estabilidade, o impacto das suas intervenções vai além do ambiente familiar e comunitário, designadamente para as esferas da economia e política, resultando no desenvolvimento dos países.

A literatura sobre empoderamento destaca o acesso aos recursos e a capacidade de agenciamento, ou de tomar decisões, como os dois componentes mais comuns do empoderamento. O termo empoderamento refere-se ao processo no qual os indivíduos se tornam mais envolvidos na tomada de decisões. As mulheres estão, geralmente, em desvantagem na sua capacidade de fazer escolhas eficazes em diversas áreas. O empoderamento das mulheres pode ser definido como a promoção do sentido de auto-estima das mulheres, da sua capacidade de determinar as suas próprias escolhas e do seu direito de influenciar a mudança social para si e para os outros.

A menorização da maioria

Em Moçambique, as mulheres representam 52% da população; no entanto, a sua participação na economia, formal ou informal, é muito menor que a dos homens. O mercado laboral é caracterizado por um alto grau de informalidade, com mais de 86% dos trabalhadores, por conta própria ou não, remunerados como trabalhadores domésticos. Deste universo, 52% são mulheres, ocupando maioritariamente o espaço rural. De modo

geral, o trabalho doméstico é considerado uma não profissão e, assim, os(as) trabalhadores(as) são efectivamente excluídos(as) de protecções laborais e sociais. Os dados indicam que 27% das mulheres são desempregadas, contra 23% dos homens.

Adicionalmente, a segregação de género na atribuição de tarefas, tanto no trabalho formal como no informal, coloca as mulheres em sectores com baixa remuneração. São elas que têm maior representação na categoria mais pobre do sistema laboral, como é o caso de empregos de remuneração diária e de trabalho doméstico. No sector agrícola, as mulheres não têm controlo e posse de terra, nem crédito nem treino, e têm decisão limitada em relação ao uso da terra.

O mesmo se verifica no acesso aos recursos produtivos e financeiros, o que, por consequência, limita a sua capacidade de se estabilizar financeiramente, investir e participar adequadamente na actividade económica do País. Estudos corroboram que as mulheres estão sempre atrasadas no que respeita ao acesso ao financiamento.

Exclusão financeira no feminino

De acordo com o Finscope Consumer Survey 2019, as mulheres são as mais excluídas financeiramente: 48% contra 43% dos homens. Em relação a produtos específicos, as mulheres registam menor nível de acesso e uso; para pagamentos, só 46% das mulheres o podem fazer contra 54% dos homens, e apenas 37% das mulheres têm acesso ao crédito, algo que assiste 63% dos homens. No que respeita à poupança, só 36% das mulheres poupam e a maioria recorre a regimes informais. Finalmente, no que se refere aos seguros (a lacuna mais alarmante), apenas 4% das mulheres têm alguma forma de seguro contra 59% dos homens.

O acesso ao dinheiro móvel duplicou nos últimos seis anos e está a impulsionar a inclusão financeira em Moçambique. Em 2022, o Banco de Moçambique reportou a existência de 1,9 milhões de contas de dinheiro móvel.

mestre em Economia e Gestão de Empresas pela Universidade de Coimbra (Portugal), especialista em análise financeira, gestão de projectos e liderança organizacional, antes de ingressar na DAI

Global a autora passou pelos principais bancos de Moçambique

O sector financeiro tem um papel preponderante no estímulo do crescimento económico através da intermediação financeira entre os agentes económicos, fazendo a ligação entre os agentes superavitários (com recursos) e os agentes deficitários (sem recursos), e facilitando a canalização dos fundos daqueles para estes disponibilizando para o mercado produtos e serviços, inovadores e adequados, de poupança e investimento de forma a que estes agentes invistam na economia.

Mas, para que isso aconteça, é necessário que criemos uma estrutura condicente e adequada à realidade da nossa economia.

Kátia Agostinho

The Importance of Women’s Role in Social and Economic Developmen(I)

The importance of women’s role in social and economic development is unanimously accepted, and its multiplier effect is supported by evidence. Although society has established that women represent sentimentality, family values, structure, and stability, the impact of their interventions goes beyond the family and community environment, particularly affecting the spheres of economy and politics, resulting in the development of countries.

The literature on empowerment highlights access to resources and decision-making capacity as the two most common components of empowerment. The term empowerment refers to the process in which individuals become more involved in decision-making. Women are generally disadvantaged in their ability to make effective choices in various areas. Women’s empowerment can be defined as the promotion of women’s self-esteem, their ability to determine their own choices, and their right to influence social change for themselves and others.

The Marginalization of the Majority

In Mozambique, women represent 52% of the population; however, their participation in the economy, both formal and informal, is much lower than that of men. The labor market is characterized by a high degree of informality, with more than 86% of workers being either self-employed or paid as domestic workers. Of this group, 52% are women, mostly occupying the rural space. Generally, domestic work is considered a non-profession, and thus workers are effectively exclu-

ded from labor and social protections. Data indicates that 27% of women are unemployed, compared to 23% of men.Additionally, gender segregation in task allocation, both in formal and informal work, places women in lower-paying sectors. They have higher representation in the poorest category of the labor system, such as daily-wage jobs and domestic work. In the agricultural sector, women lack control and ownership of land, credit, and training, and have limited decision-making power regarding land use.

The same is true for access to productive and financial resources, which consequently limits their ability to stabilize financially, invest, and adequately participate in the country’s economic activity. Studies confirm that women are always lagging in terms of access to finance.

Female Financial Exclusion

According to the Finscope Consumer Survey 2019, women are the most financially excluded: 48% versus 43% of men. Regarding specific products, women register lower levels of access and usage; for payments, only 46% of women can make payments compared to 54% of men, and only 37% of women have access to credit, which is available to 63% of men. Concerning savings, only 36% of women save, and the majority resort to informal regimes. Finally, regarding insurance (the most alarming gap), only 4% of women have some form of insurance compared to 59% of men.

Access to mobile money has doubled in the last six years and is driving financial inclusion in Mozambique. In 2022, the Bank of Mozambique reported the existence of 1.9 million mobile money accounts.

in

and Business Management from the University of Coimbra (Portugal), specialist in financial analysis, project management, and organizational leadership. Before joining DAI Global, the author worked at the main banks of Mozambique.

The financial sector plays a crucial role in stimulating economic growth through financial intermediation between economic agents, linking surplus agents (with resources) and deficit agents (without resources), and facilitating the channeling of funds from the former to the latter by providing innovative and appropriate savings and investment products and services to the market so that these agents can invest in the economy.

But for this to happen, we need to create a structure conducive and adequate to the reality of our economy.

7 000 000 000 000 DÓLARES POR ANO CRUCIAIS PARA

O RESGATE DO MUNDO

$7 Trillion Per Year Crucial forWorld Rescue

Percorrido meio caminho da Agenda 2030, verifica-se que o investimento nos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) está muito aquém do prometido em 2015 , com apenas 15% das suas metas já alcançadas e um terço em risco de nunca vir a acontecer

Halfway through the 2030 Agenda, it is evident that investment in the Sustainable Development Goals (SDGs) is far behind the promises made in 2015, with only 15% of the targets achieved and one-third at risk of never being fulfilled

Elmano Madail

Entre cinco a sete biliões de dólares por ano. Mais milhão, menos milhão, será essa a fabulosa quantia que a Organização das Nações Unidas (ONU) estima necessária para ainda tentar cumprir, até 2030, as metas inscritas nos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), a grande referência universal de todas as políticas de desenvolvimento adoptada em 2015. Mas, se a verba é avultada e o seu número extenso, as necessidades que procura atender são ainda maiores, e só o investimento público jamais chegaria para satisfazê-las. Os ODS convocam o esforço de todos os locatários deste condomínio comum chamado Terra, e é nesse contexto que as finanças para o desenvolvimento sustentável, mais do que auxiliares, se afiguram incontornáveis. Urgentes, até. Para construir um mundo melhor para todos. E, no limite, salvar o próprio planeta.

Investimento para viabilizar futuro global

Com efeito, a responsabilidade conjunta está implícita no próprio conceito de desenvolvimento sustentável, o qual foi grafado no Relatório Brundtland (em alusão à primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland) de 1987. O documento definia-o como o “desenvolvimento que responde às necessidades do presente sem comprometer a capacidade de resposta das gerações futuras às suas próprias necessidades”, o que implica o equilíbrio entre três aspectos: a preservação do meio ambiente e o progresso do bem-estar social a par do crescimento económico. Assim, operou-se uma mudança de paradigma, com o desenvolvimento a deixar de ser visto apenas pelo prisma do Produto Interno Bruto (PIB) para passar a envolver as três variáveis contempladas pela sustentabilidade.

Com este conceito no horizonte, as finanças para o desenvolvimento sustentável são, assim, todos os recursos financeiros mobilizados para promover a sustentabilidade a nível global. Eles incluem investimentos públicos e privados – internos e externos –, financiamento público, fundos de assistência ao desenvolvimento, e recursos provenientes de instituições financeiras internacionais e nacionais destinados a projectos que visam uma integração equilibrada das três dimensões supracitadas. Cujas necessidades orçam,

Between five to seven billion dollars per year. Give or take a million, this is the fabulous amount that the United Nations (UN) estimates is necessary to still try to meet, by 2030, the goals inscribed in the Sustainable Development Goals (SDGs), the universal reference point for all development policies adopted in 2015. But, if the amount is substantial and the number extensive, the needs it seeks to address are even greater, and public investment alone would never suffice to meet them. The SDGs call for the effort of all tenants of this common condominium called Earth, and in this context, sustainable development finance, more than just an aid, is indispensable. Urgent, even. To build a better world for all. And, ultimately, to save the planet itself.

Investment to enable a global future

Indeed, joint responsibility is implicit in the very concept of sustainable development, which was outlined in the Brundtland Report (named after the Prime Minister of Norway, Gro Harlem Brundtland) of 1987. The document defined it as “development that meets the needs of the present without compromising the ability of future generations to meet their own needs,” which implies a balance between three aspects: environmental preservation, social well-being progress, and economic growth. Thus, a paradigm shift occurred, with development no longer being viewed solely through the lens of Gross Domestic Product (GDP) but rather involving the three variables encompassed by sustainability.

ingredientes do desenvolvimento: economia, ambiente e bem-estar social development’s ingredients: economy, environment and social prosperity

With this concept in sight, sustainable development finance thus includes all financial resources mobilized to promote sustainability globally. These include public and private investments – both internal and external – public financing, development assistance funds, and resources from international and national financial institutions aimed at projects that seek a balanced integration of the aforementioned three dimensions. Whose needs today range between five to seven billion dollars, according to estimates presented last September in New York, during the United Nations High-Level Dialogue on Financing for Sustainable Development.

hoje, entre os cinco e os sete biliões de dólares, segundo cálculos apresentados, em Setembro do ano passado, em Nova Iorque, no decurso do Diálogo de Alto Nível das Nações Unidas sobre Financiamento para o Desenvolvimento Sustentável.

Não por acaso, esta cimeira dialógica decorreu à margem da 78.ª sessão da Assembleia Geral da ONU que assumiu uma ordem de trabalhos ambiciosa: Reconstruir a confiança e reacender a solidariedade global: acelerar a acção para a Agenda 2030 e os ODS para a paz, prosperidade, progresso e sustentabilidade para todos . Nessa reunião, idealmente congregadora dos chefes de Estado e de Governo dos 193 países membros da ONU, verificou-se que, a meio do percurso rumo a 2030, a realidade estava muito aquém das metas estabelecidas em 2015 e dos compromissos então assumidos num clima de certo optimismo solidário, que incluíam, além da salvaguarda do ambiente, a erradicação da pobreza extrema e da fome severa.

Um roteiro pragmático e mesurável

Com efeito, nesse ano auspicioso de 2015 a comunidade internacional celebrou três acordos históricos e fundamentais para o devir de um mundo mais justo e viável: firmou o chamado Acordo de Paris , lavrado na capital francesa para limitar o aumento da temperatura em l,5°C (graus centígrados) face ao período pré-industrial; aprovou os 17 ODS (com 169 metas específicas e 231 indicadores que permitem medir o seu progresso), convertidos pela Assembleia Geral da ONU na Agenda 2030 ; e, por fim, estabeleceu, na III Conferência Internacional sobre o Financiamento para o Desenvolvimento, realizada em Addis Abeba, capital da Etiópia, na esteira dos encontros de Monterrey, no México (2002), e Doha, Quatar (2008), um Plano de Acção para captar fundos susceptíveis de alavancar os ODS e sustentar a sua realização efectiva. Embora este plano atribua a cada País a responsabilidade primária pelo seu próprio desenvolvimento, também vinca a necessidade de a comunidade internacional proporcionar apoio e um ambiente internacional propício. Isto é, forneceu pela primeira vez um quadro global para o financiamento do desenvolvimento sustentável, alinhando todos os fluxos de recursos nacionais e internacionais, políticas e acordos internacionais com as

Not coincidentally, this dialogic summit took place on the sidelines of the 78th session of the UN General Assembly, which adopted an ambitious agenda: Rebuilding trust and reigniting global solidarity: accelerating action for the 2030 Agenda and the SDGs for peace, prosperity, progress, and sustainability for all. In this meeting, ideally bringing together the heads of state and government of the 193 UN member countries, it was found that, halfway towards 2030, reality was far from the goals established in 2015 and the commitments then assumed in a climate of some solidarity optimism, which included, besides environmental safeguarding, the eradication of extreme poverty and severe hunger.

A pragmatic and measurable roadmap

países da ONU aprovaram, em 2015, a Agenda 2030

UN’s countries approved, in 2015, the 2030 Agenda

Indeed, in that auspicious year of 2015, the international community celebrated three historic agreements fundamental to the future of a fairer and more viable world: the so-called Paris Agreement, forged in the French capital to limit the temperature increase to 1.5°C (degrees Celsius) compared to the pre-industrial period; the approval of the 17 SDGs (with 169 specific targets and 231 indicators to measure their progress), converted by the UN General Assembly into the 2030 Agenda; and, finally, the establishment of an Action Plan to raise funds capable of leveraging the SDGs and sustaining their effective realization, at the Third International Conference on Financing for Development, held in Addis Ababa, Ethiopia’s capital, following the meetings in Monterrey, Mexico (2002), and Doha, Qatar (2008). Although this plan assigns each country the primary responsibility for its own development, it also emphasizes the need for the international community to provide support and a conducive international environment.

ODS têm 169 metas específicas e 231 indicadores de progresso

SDGs have 169 specific targets and 231 progress indicators

That is, it provided for the first time a global framework for sustainable development finance, aligning all flows of national and international resources, policies, and international agreements with economic, social, and environmental priorities. It integrated all SDG targets into a comprehensive financing framework, serving as a roadmap for the actions of governments – which should channel at least 0.7% of GDP for public development aid – international organizations, businesses, civil society, and philanthropists. The major players, after all, in the sustainable development finance ecosystem.

prioridades económicas, sociais e ambientais. Integrou todas as metas dos ODS num quadro de financiamento abrangente, servindo de roteiro para a acção dos governos – os quais deveriam canalizar pelo menos 0,7% do PIB para a ajuda pública ao desenvolvimento –, das organizações internacionais, das empresas, da sociedade civil e dos filantropos. Os grandes actores, afinal, do ecossistema das finanças para o desenvolvimento sustentável.

Sucede que, entretanto, o mundo mudou. Para pior. Primeiro, com a pandemia da Covid-19. Anunciada pela Organização Mundial da Saúde no limiar de 2019, levou à contracção deliberada da actividade económica, do comércio internacional e da mobilidade global para prevenir o contágio. Daí resultou a queda abrupta de quase 3% da economia mundial e no aumento drástico dos défices internos e da desigualdade, tanto entre países como dentro deles – segundo a Oxfam, apenas 1% da população detém, hoje, dois terços da riqueza planetária.

Depois, quando se presumia a recuperação do choque pandémico, os seus efeitos nefastos foram exacerbados com a invasão da Ucrânia pela Rússia, em Fevereiro de 2022. A nível mundial, a guerra, que ainda lavra, levou à contracção do PIB, que diminuiu de 5,8% de 2021 para apenas 3% em 2022 e 2023,

However, in the meantime, the world has changed. For the worse. First, with the COVID-19 pandemic. Announced by the World Health Organization at the turn of 2019, it led to the deliberate contraction of economic activity, international trade, and global mobility to prevent contagion. This resulted in an abrupt 3% drop in the global economy and a drastic increase in internal deficits and inequality, both between countries and within them – according to Oxfam, just 1% of the population now holds two-thirds of the planet’s wealth.

Then, when a recovery from the pandemic shock was presumed, its adverse effects were exacerbated by Russia’s invasion of Ukraine in February 2022. Globally, the ongoing war led to GDP contraction, which decreased from 5.8% in 2021 to just 3% in 2022 and 2023, while inflation jumped from 4.7% in 2021 to 8.7% in 2022 (and 6.8% in 2023) with the exponential increase in fuel, raw materials, and grain prices. Conditions that led central banks to adopt a strongly restrictive monetary policy and confront many governments with stringent budgetary restrictions and increasing debt service burdens. .

Further from the goal with halfway progress

Such changes led to a lack of available funding, particularly for the poorest countries. Foreign direct investment (FDI) in least developed coun -

FOTO:
D.R.

Overview

ao passo que a inflação saltou de 4,7% em 2021 para 8,7% em 2022 (e 6,8% em 2023) com o aumento exponencial do preço dos combustíveis, das matérias-primas e dos cereais. Condições que levaram os bancos centrais a adoptarem uma política monetária fortemente restritiva e a confrontarem muitos governos com restrições orçamentais rigorosas e encargos crescentes com o serviço da dívida.

Meta mais longe com meio caminho andado

Tais mudanças levaram à falta de financiamento disponível, designadamente para os países mais pobres. O investimento directo estrangeiro (IDE) nos países menos desenvolvidos, por exemplo, diminuiu 16%, ficando nos 22 mil milhões de dólares em 2022, segundo o Relatório CNUCED de Investimento Mundial. No global, a escassez geral de financiamento, de proveniência diversa, passou de 2,5 biliões de dólares anuais para 3,7 biliões no final de 2023, afectando sobremaneira o progresso dos ODS

No que respeita às alterações climáticas, por exemplo, a Cimeira da ONU decorreu no fim do Verão mais tórrido de sempre, denunciando uma trajectória do aumento da temperatura global de 2,7°C, com cidades a serem castigadas por ondas de calor extremo jamais vistas. Os termómetros indicaram 21 de Julho de 2023 como o dia mais quente desde que há registo, levando o secretário-geral da ONU, António Guterres, a declarar: “A era da ebulição global chegou!”.

Quanto à pobreza – viver com menos de 2,15 dólares por dia –, verificou-se a reversão de quase três décadas de progressos. Segundo dados do Banco Mundial, em 2022 havia mais 70 a 89 milhões de pessoas em situação de pobreza extrema, por comparação com as projecções anteriores à pandemia. Mais do que isso, se a tendência actual persistir, é provável que 574 milhões de pessoas – cerca de 7% da população mundial – continuem a viver nessa condição miserável em 2030.

E, no que se refere à erradicação da fome, o Índice Global da Fome elaborado pelo International Food Policy Research Institute (IFPRI) denunciava, em Outubro de 2023, o aumento do número de pessoas subnutridas, cujo contingente passou, naquele ano, de 572 milhões em 2017 para 735 milhões, principalmente no sul asiático e África Subsaariana.

tries, for example, decreased by 16%, amounting to $22 billion in 2022, according to the UNCTAD World Investment Report. Globally, the overall shortage of funding from various sources increased from $2.5 trillion annually to $3.7 trillion by the end of 2023, severely affecting SDG progress.

Regarding climate change, for example, the UN Summit took place at the end of the hottest summer ever recorded, indicating a trajectory of global temperature increase of 2.7°C, with cities being hit by unprecedented extreme heat waves. Thermometers marked July 21, 2023, as the hottest day ever recorded, leading UN Secretary-General António Guterres to declare: “The era of global boiling has arrived!”

As for poverty – living on less than $2.15 per day – nearly three decades of progress have been reversed. According to World Bank data, in 2022 there were 70 to 89 million more people in extreme poverty compared to pre-pandemic projections. Furthermore, if the current trend persists, it is likely that 574 million people – about 7% of the global population – will still live in such miserable conditions in 2030.

Regarding hunger eradication, the Global Hunger Index by the International Food Policy Research Institute (IFPRI) reported in October 2023 an increase in the number of undernourished people, rising from 572 million in 2017 to 735 million that year, mainly in South Asia and Sub-Saharan Africa.

Thus, halfway through the 2030 Agenda, none of the SDGs have been met. Only 15% of their targets are on track, 48% show some hope, and more than a third (37%) have either stagnated or regressed. In terms of investment, the biggest gaps are in energy, water, and transportation infrastructure.

Additional and better-distributed effort

Despite this less-than-encouraging scenario –further complicated by the renewed Israeli-Arab conflict in October 2023 – positive trends were observed in sustainability investment in global capital markets. According to the UN’s World Investment Report 2023, although needs have increased, the sustainable finance market also grew, increasing capital volumes by about 10% to $5.8 trillion in 2022 alone.

On the other hand, considering the total financial assets in the world, estimated at around $454.5 trillion at the beginning of 2023 by the UBS Global Wealth Report, reallocating just 1%

De modo que, a meio da Agenda 2030 , nenhum dos ODS se cumpriu. Apenas 15% das suas metas estão bem encaminhados, 48% suscitam alguma esperança e mais de um terço (37%), se não estagnou, regrediu. Em termos de investimento, as maiores lacunas registam-se nas infra-estruturas de energia, água e transportes.

Esforço suplementar e melhor distribuído

Não obstante este cenário pouco entusiasmante – acrescentado, entretanto, do reacender do conflito israelo-árabe em Outubro de 2023 – observaram-se tendências positivas no investimento em sustentabilidade nos mercados de capitais mundiais. De acordo com o World Investment Report 2023 , da ONU, embora as necessidades tenham aumentado, o mercado financeiro sustentável também cresceu, aumentando o volume de capitais em cerca de 10%, para 5,8 biliões de dólares, só em 2022.

Por outro lado, se considerarmos o total dos activos financeiros no mundo, estimados, no início de 2023, em cerca de 454,5 biliões de dólares pelo Global Wealth Report da UBS, a reafectação de apenas 1% destes fluxos financeiros em projecto de desenvolvimento sustentável cobriria o défice necessário para cumprir os ODS e os compromissos assumidos por cada país no Acordo de Paris de 2015.

Capital não é, pois, um problema; esse encontra-se antes na sua mobilização e, depois, na distribuição das finanças para o desenvolvimento sustentável, actualmente muito desigual. Com efeito, enquanto o investimento internacional nos sectores dos ODS aumentou nos países desenvolvidos, diminuiu nos países em desenvolvimento. Em África, de resto, a diminuição foi visível em todos os fluxos de investimento, que caíram, nesse mesmo ano de 2022, para apenas 45 mil milhões de dólares.

Assim, aumentar o capital dedicado aos ODS para os ideais 7 biliões de dólares, e promover a sua afectação mais criteriosa do ponto de vista geográfico e sectorial constituem, hoje, os grandes desafios que convocam os actores, sem excepção, das finanças para o desenvolvimento sustentável. Para não hipotecar definitivamente a Agenda 2030 e conseguir resgatar o mundo de um futuro que ninguém quer: tenebroso porque insustentável. Para todos.

of these financial flows to sustainable development projects would cover the deficit needed to meet the SDGs and commitments made by each country in the 2015 Paris Agreement.

Capital is not the issue; the problem lies in its mobilization and, subsequently, in the distribution of sustainable development finance, which is currently very unequal. Indeed, while international investment in SDG sectors increased in developed countries, it decreased in developing countries. In Africa, moreover, the decline was visible in all investment flows, which fell to just $45 billion in 2022.

Thus, increasing the capital dedicated to the SDGs to the ideal $7 trillion and promoting its more judicious allocation from a geographical and sectoral perspective are today the major challenges calling for action from all actors, without exception, in sustainable development finance. To avoid definitively jeopardizing the 2030 Agenda and to rescue the world from a future that no one wants: bleak because unsustainable. For everyone.

5,8

biliões de dólares era a estimativa de 2022 para o valor global do mercado financeiro sustentável

trillion dollars was the 2022 estimate for the global value of the sustainable financial market

454

biliões de dólares era o valor dos activos financeiros mundiais no início de 2023

trillion dollars was the value of the world’s financial assets at the beginning of 2023

“É CRUCIAL ENVOLVER OS PRIVADOS NO DESENVOLVIMENTO DO SEU PAÍS”

Edo Stork, Representante Residente do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) em Moçambique, em conversa no podcast Moz Fin Dev Talk, reitera o compromisso da agência com o País e sublinha a necessidade de o Estado reforçar as prioridades de investimento e fortalecimento do sector privado.

Dez anos após a proclamação dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), Edo Stork, representante do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) em Moçambique, reiterou o compromisso da agência com os ODS e, nesse contexto, com o desenvolvimento sustentável do País. Na conversa que decorreu no âmbito do Moz Fin Dev Talk, podcast promovido pela Gapi em parceria com a F4SD, Stork destacou ainda os desafios relacionados com o investimento, não só no âmbito da sua captação, mas também da sua aplicação num País a braços com muitos e amplos desafios, e no qual alguns dos ODS, mais do que estagnar, regrediram.

“O PNUD está muito comprometido com os ODS e, por suposto, com Moçambique”, afirmou Edo Stork, sublinhando a dedicação da organização em fomentar iniciativas indutoras do desenvolvimento sustentável. O impacto global da pandemia Covid-19 e das crises financeiras – com destaque para a espiral inflacionista em muitos países, o agravamento das dívidas e certo retrocesso nas finanças para o desenvolvimento – foi abordado por Stork, que analisou o modo como esses eventos contribuíram para certa ansiedade global à qual o PNUD chamou, no relatório de 2020-2021, de “complexo de incerteza”. “Está relacionado com a sensação de que estão a perder o controlo sobre as suas próprias vidas”,

FOTO: REDACÇÃO

explicou. Edo Stork, aparentemente, não perdeu o controlo da sua, cujo percurso profissional pelo mundo converteu este holandês num putativo especialista do hemisfério Sul – é, aliás, casado com uma cidadã do Peru, país da América Latina ao qual acrescenta, no currículo, Honduras e Trinidad e Tobago – e, também, da Lusofonia, tendo trabalhado em Angola. Com efeito, Stork passou pelas Fiji, as Ilhas Salomão e a Papua Nova Guiné, no Pacífico, desaguando em Timor-Leste nos anos 1990, então sob o jugo da Indonésia, quando ainda se chamava Timor Português: “Visitei Moçambique nessa época, em 1996. Fiquei impressionado naquele tempo e estou muito contente de voltar”, diz.

Sinergias necessárias

Nesse regresso, o representante do PNUD deparou-se com problemas de monta. Uns mais recentes, como as mudanças climáticas (com efeitos nas secas a Sul e nos ciclones do Centro e Norte), e outros mais antigos, como a insegurança alimentar. Entre as prioridades do PNUD – cuja amplitude abarca a resiliência climática, o apoio técnico aos processos eleitorais visando a eficiência e transparência dos sufrágios, e a geração de emprego, principalmente para os mais jovens, por exemplo –, está incluso o conflito que lavra na província de Cabo Delgado desde 2017. “Há um esforço significativo do PNUD no apoio ao programa de estabilização em Cabo Delgado, procurando ajudar as pessoas deslocadas pelo conflito a retomarem as suas vidas de forma segura e digna”, garantiu.

cessidade “de escolher bem as prioridades e que elementos podem acelerar a agenda dos ODS”. No podcast Moz Fin Dev Talk, o representante do PNUD em Moçambique também abordou o sobreendividamento de muitos países, obrigados pela Covid-19 a recorrer a empréstimos suplementares cujo serviço da dívida, para alguns, drena mais recursos do que os gastos em Saúde e Educação, dois sectores fundamentais. Sobre Moçambique, que conseguiu “reduzir a percentagem da dívida de mais de 120% para pouco mais que 80%”, Stork diz que tal redução dá margem para criar um “espaço fiscal” necessário para poder investir mais em desenvolvimento sustentável.

Aliviar o fardo da dívida

“É crucial encontrar formas de envolver actores nacionais no desenvolvimento de Moçambique – como o sector privado, além das organizações e do Governo –numa mistura equilibrada”

Além disso, Stork sugere ainda que Maputo deve promover a “renegociação de dívidas” e “procurar mais investimentos internacionais e garantir que, uma vez que o dinheiro flua, os investimentos beneficiem realmente os moçambicanos em todas as províncias, permitindo que todos sintam que há progresso e que suas vidas estão a melhorar”. Sobre a eficácia do financiamento do desenvolvimento, Stork referiu os “custos de intermediação” devidos ao uso, pelos financiadores, de intermediários – que retiram a sua parte dos recursos – em vez de reforçarem as instituições dos países receptores.

Apesar da abrangência do PNUD, cujos orçamento e volume de projectos atingiram um número recorde em 2023, Edo Stork enfatiza a importância das sinergias para realizar os ODS aqui. “Tem que ser com muitas parcerias, um trabalho muito de perto com o Governo, com parceiros nacionais, com o sector privado, com outras agências das Nações Unidas, com todos os que estão envolvidos no desenvolvimento de Moçambique”, afirmou.

Ao evocar os desafios de financiamento do desenvolvimento e a necessidade de mais recursos, Stork referiu o dilema, sempre presente, entre o financiamento imediato das emergências humanitárias e o investimento necessário para um desenvolvimento a longo prazo. E advogou a ne-

Ouvir em

“É crucial encontrar formas de envolver, o mais possível, actores nacionais no desenvolvimento de Moçambique – como o sector privado, além das organizações e do Governo – numa mistura equilibrada para assegurar que há capacidades nacionais suficientes”, afirma. Mas não basta: “Também requer que o Governo tenha uma perspectiva crítica sobre como priorizar e onde dedicar os fundos do Estado, envolvendo o sector privado e convidando investimentos privados estrangeiros em áreas onde o financiamento local pode não ser suficiente para gerar um núcleo de desenvolvimento”. E destacou a prioridade da Educação e da Saúde.

Por fim, Edo Stork reiterou a vontade do PNUD em trabalhar com parceiros na promoção do desenvolvimento sustentável em Moçambique. “Acreditamos muito no trabalho da Gapi e estamos contentes em participar e explorar mais parcerias”, disse, optimista em relação a um futuro mais próspero.

“IT IS CRUCIAL TO INVOLVE THE PRIVATE SECTOR IN THE DEVELOPMENT OF THE COUNTRY”

Edo Stork, representative of the United Nations Development Program (UNDP) in Mozambique, in a conversation on the podcast Moz Fin Dev Talk, reiterated the agency’s commitment to Mozambique and the importance that the state continues to reinforce investment and strengthening the national private sector.

Ten years after the proclamation of the Sustainable Development Goals (SDGs), Edo Stork, representative of the United Nations Development Program (UNDP) in Mozambique, reaffirmed the agency’s commitment to the SDGs and, in this context, to the sustainable development of the country. In the conversation held as part of the Moz Fin Dev Talk podcast, promoted by Gapi in partnership with F4SD, Stork also highlighted the challenges related to

investment, not only in its attraction but also in its application in a country facing many and broad challenges, where some SDGs have not only stagnated but regressed.

“The UNDP is very committed to the SDGs and, of course, to Mozambique,” said Edo Stork, emphasizing the organization’s dedication to fostering initiatives that promote sustainable development. He discussed the global impact of the COVID-19 pandemic and financial crises – highlighting the inflation spiral in many coun-

FOTO: REDACÇÃO

tries, the worsening debts, and certain setbacks in development finances. He referred to these events contributing to global anxiety, which the UNDP called, in the 2020-2021 report, a “complex of uncertainty.” “It relates to the feeling that people are losing control over their own lives,” he explained.

Edo Stork, apparently, has not lost control over his life, which has led him around the world, turning this Dutchman into a putative specialist in the Southern Hemisphere – he is, after all, married to a Peruvian, a country to which he adds Honduras and Trinidad and Tobago in his resume – and also in the Lusophone world, having worked in Angola. Stork has been to Fiji, the Solomon Islands, and Papua New Guinea in the Pacific, arriving in Timor-Leste in the 1990s, then under Indonesian rule when it was still called Portuguese Timor: “I visited Mozambique at that time, in 1996. I was impressed back then, and I am very happy to be back,” he says.

Necessary Synergies

Upon his return, the UNDP representative encountered significant problems. Some are more recent, like climate change (with effects on droughts in the South and cyclones in the Center and North), and others are older, like food insecurity.

between immediate humanitarian emergency financing and the necessary investment for long-term development. He advocated the need “to choose the priorities well and which elements can accelerate the SDG agenda.”

On the Moz Fin Dev Talk podcast, the UNDP representative in Mozambique also addressed the over-indebtedness of many countries, forced by COVID-19 to resort to additional loans whose debt service, for some, drains more resources than spending on Health and Education, two fundamental sectors. Regarding Mozambique, which managed to “reduce the debt percentage from over 120% to just over 80%,” Stork says this reduction creates the necessary “fiscal space” to invest more in sustainable development..

Easing the Debt Burden

“It is crucial to find ways to involve national actors in Mozambique’s development - such as the private sector, in addition to organizations and the government - in a balanced mix”

Among the UNDP’s priorities – which include climate resilience, technical support to electoral processes aiming for efficient and transparent elections, and job creation, especially for the youth – is the conflict in Cabo Delgado province since 2017. “There is a significant effort by the UNDP to support the stabilization program in Cabo Delgado, seeking to help people displaced by the conflict to resume their lives safely and with dignity,” he assured.

Despite the UNDP’s broad scope, whose budget and project volume reached a record number in 2023, Edo Stork emphasizes the importance of synergies to achieve the SDGs here. “It has to be with many partnerships, working closely with the government, national partners, the private sector, other UN agencies, and everyone involved in Mozambique’s development,” he stated.

When discussing the challenges of development financing and the need for more resources, Stork mentioned the ever-present dilemma

Moreover, Stork suggests that Maputo should promote “debt renegotiation” and “seek more international investments and ensure that once the money flows, the investments truly benefit Mozambicans in all provinces, allowing everyone to feel progress and that their lives are improving.” Regarding the effectiveness of development financing, Stork referred to the “intermediation costs” due to the use of intermediaries by financiers – who take their share of resources – instead of strengthening the recipient countries’ institutions.

“It is crucial to find ways to involve national actors as much as possible in Mozambique’s development – like the private sector, in addition to organizations and the government – in a balanced mix to ensure there are sufficient national capacities,” he says. But that is not enough: “It also requires the government to have a critical perspective on how to prioritize and where to allocate state funds, involving the private sector and inviting foreign private investments in areas where local financing may not be sufficient to generate a core of development.” He highlighted the priority of Education and Health.

Finally, Edo Stork reiterated the UNDP’s willingness to work with partners in promoting sustainable development in Mozambique. “We believe in Gapi’s work and are happy to participate and explore more partnerships,” he said, optimistic about a more prosperous future.

APOIO DA GAPI AJUDA EMPRESAS E EMPRESÁRIOS DE CABO DELGADO

GAPI’S SUPPORT HELPS COMPANIES AND BUSINESSMEN IN CABO

DELGADO

Iniciativas como Agro-Jovem e parcerias estratégicas com instituições de Ensino Técnico e Superior proporcionam competências fundamentais aos empreendedores locais

Initiatives such as Agro-Jovem and strategic partnerships with Technical and Higher Education institutions provide essential skills to local entrepreneurs

Aprovíncia de Cabo Delgado, no Norte de Moçambique, padece de um triste paradoxo: abastada em recursos e rica em cultura, a região enfrenta, ao mesmo tempo, ameaças graves ao seu tecido económico e social. É neste contexto desconcertante que a Gapi, instituição financeira de desenvolvimento no terreno há mais de duas décadas,

The province of Cabo Delgado, in Northern Mozambique, suffers from a sad paradox: rich in resources and culture, the region simultaneously faces severe threats to its economic and social fabric. In this challenging context, Gapi, a development finance institution that has been active in the field for over two decades, has committed to

FOTO:
MARIANO SILVA

se afirma empenhada em contrariar as adversidades através de iniciativas como o Agro-Jovem, projecto que visa estimular a economia local com a força do empreendedorismo juvenil. “A instabilidade em Cabo Delgado exige uma resposta para lá do financiamento”, afirma Nocif Magaia, director da Indústria e Comércio na província. “A nossa intervenção conjuga formação e capacitação em gestão de negócios, essencial para que os recursos alocados se traduzam em crescimento sustentável”, explica.

A empresa Kiyago Company é paradigma dessa conjugação formativa e da aplicação das competências que proporciona: “Antes do apoio da Gapi, estávamos limitados a 7 toneladas de farinha por dia; hoje, produzimos entre 15 a 20 toneladas”, diz Jonh Fernandes, gerente da Kiyago Company, sobre os efeitos transformadores da assistência recebida. O benefício das novas competências adquiridas com apoio da Gapi é também exaltado por Horácio Rage, do distrito de Metuge, que realça a sua nova condição empresarial: “Aprendemos a registar o nosso negócio e a posicionar a nossa empresa no mercado. Passámos da informalidade para uma operação totalmente legalizada e pronta”, afirma.

Também Somar Almeida, avicultor em Metuge, aponta o impacto positivo do projecto na sua vida particular e, por extensão, no bem-estar da sua comunidade: “Com o apoio da Gapi, a minha produção de frangos duplicou, passando de 300 para 600, reflectindo o crescimento da nossa comunidade”, declara, satisfeito.

As parcerias com instituições de Ensino Técnico e Superior têm sido cruciais, ministrando conhecimento teórico e monitorando a sua aplicação empírica, com a teoria a converter-se em empreendimentos empresariais concrectos. “Estamos a trabalhar com a Gapi no programa ‘Ligações de Mercados’”, explica Nocif Magaia, sublinhando a importância da conectividade e intersectorialidade nas operações produtivas e de transformação regional.

Almeida Gueiba, do Aviário de Sucesso, em Chiure, e vítima dos fenómenos climáticos extremos, não esquece o auxílio recebido: “A Gapi foi a única que nos apoiou após o ciclone, permitindo-nos reerguer e fortalecer o nosso trabalho”, diz. A história de Gueiba e demais empresários são narrativas de desafios superados por comunidades fortalecidas que tecem, com as próprias mãos, um amanhã mais resiliente e próspero para Cabo Delgado. E a prova viva de que cada empresário apoiado pelo Agro-Jovem não é apenas um beneficiário, mas antes o ícone vivo do potencial que a Gapi e seus parceiros estão a liberar em Moçambique.

countering these adversities through initiatives like Agro-Jovem, a project aimed at stimulating the local economy with the power of youth entrepreneurship. “The instability in Cabo Delgado requires a response beyond financing,” says Nocif Magaia, director of Industry and Commerce in the province. “Our intervention combines training and business management capacity building, essential for allocated resources to translate into sustainable growth,” he explains.

The company Kiyago Company exemplifies this combination of training and application of the skills provided: “Before Gapi’s support, we were limited to 7 tons of flour per day; today, we produce between 15 to 20 tons,” says John Fernandes, manager of Kiyago Company, about the transformative effects of the assistance received. The benefit of the new skills acquired with Gapi’s support is also highlighted by Horácio Rage from the Metuge district, who emphasizes his new business status: “We learned to register our business and position our company in the market. We moved from informality to a fully legalized and ready operation,” he says.

Somar Almeida, a poultry farmer in Metuge, also points out the positive impact of the project on his personal life and, by extension, on the well-being of his community: “With Gapi’s support, my chicken production doubled, from 300 to 600, reflecting the growth of our community,” he declares, satisfied.

Partnerships with Technical and Higher Education institutions have been crucial, providing theoretical knowledge and monitoring its empirical application, with theory converting into concrete business ventures. “We are working with Gapi on the ‘Market Linkages’ program,” explains Nocif Magaia, highlighting the importance of connectivity and intersectoral operations in regional productive and transformation activities.

Almeida Gueiba, from Aviário de Sucesso in Chiure, and a victim of extreme climate phenomena, does not forget the support received: “Gapi was the only one that supported us after the cyclone, allowing us to rebuild and strengthen our work,” he says. The story of Gueiba and other entrepreneurs are narratives of challenges overcome by strengthened communities, who, with their own hands, are weaving a more resilient and prosperous tomorrow for Cabo Delgado. And the living proof that each entrepreneur supported by Agro-Jovem is not just a beneficiary, but a living icon of the potential that Gapi and its partners are unlocking in Mozambique.

Mais literacia política seria benéfica para a governança africana

Amaioria dos países ditos em desenvolvimento é marcada por forte desigualdade. Muita gente está a ser deixada para trás. Uma das explicações é a falta de responsabilização pública. Embora os decisores políticos africanos sejam óptimos a adivinhar os desejos dos doadores, as reais necessidades da sua nação são, não raro, uma reflexão posterior. Assim, demasiados projectos são planeados para corresponderem às modalidades pré-definidas pelas instituições doadoras, mas sem servir as necessidades dos africanos.

Em muitos países, as condições de vida não melhoraram – até deterioraram – desde a saída das potências coloniais. Mesmo nos casos em que o crescimento económico e outros parâmetros formais parecem bons, o quotidiano continua muito difícil para as massas populares. Isto apesar de os governos apresentarem regularmente planos de desenvolvimento com todo o tipo de objectivos. Usalmente, centram-se em questões de desenvolvimento humano, como a segurança alimentar, a saúde e a educação.

Financiamento do desenvolvimento tem de ser mais bem gasto

A ideia que subjaz aos planos de desenvolvimento dos governos africanos é sempre a de melhorar o nível de vida. Mas é pouco provável que seja a verdadeira intenção dos decisores políticos quando os elaboram. Governos com falta de dinheiro usam esses planos para garantir fundos de desenvolvimento. Sabem o que as instituições doadoras querem ler nas propostas. Se as reais necessidades do povo africano são tidas em conta, ficam para depois. De facto, muitos projectos não respondem às necessidades reais. Usar um grande empréstimo chinês, por exemplo, num centro de conferências

multimilionário, pouco contribui para melhorar a vida da população. Independentemente da instituição bilateral ou multilateral que concede o crédito, muitas vezes não é bem gasto. Fazer hospitais caros de última geração não faz sentido quando é óbvio, desde o início, que haverá poucos médicos e enfermeiros qualificados, que os medicamentos vão ser cronicamente escassos e que o abastecimento de água e de energia não é fiável.

A prioridade da maioria dos decisores africanos é obter dinheiro. Fazem os impossíveis para acedecer a empréstimos e subsídios. Se um projecto pode ter êxito, é secundário. Sabem que, garantido o financiamento, podem esbanjar milhões. Também se podem safar com parte do dinheiro a ir para os próprios bolsos. Ao mesmo tempo, grandes projectos aumentam o peso da dívida que os países africanos têm de suportar.

Educação para promover responsabilização pública

BABA G. JALLOW é o primeiro bolseiro

Roger D. Fisher na área de negociação e resolução de conflitos na Faculdade de Direito da Universidade de Harvard e ex-secretário executivo da Comissão de Verdade, Reconciliação e Reparações (TRRC) da Gâmbia.

Os povos africanos não têm, muitas vezes, forma de responsabilizar os dirigentes políticos. A maioria não tem, sequer, noção de como funciona o sistema económico internacional. As pessoas ignoram as condições dos empréstimos e subsídios, nem percebem que o país será responsabilizado pelo pagamento das dívidas. Devido à ignorância generalizada, as instituições de governação formalmente democrática não podem funcionar bem. A educação tem de melhorar se se quiser travar a corrupção governamental e a má gestão dos fundos públicos em África. Escolas, media e sociedade civil podem contribuir para melhorar a literacia económica e política. África precisa de uma cultura cívica que dê às pessoas o poder de responsabilizar os funcionários públicos. É aconselhável que as instituições doadoras apoiem muito mais neste domínio. Tal como está, os governos beneficiários tendem a concentrar-se em encher os bolsos. Os doadores devem abandonar directrizes de desenvolvimento feitas à medida e centradas em políticas motivadas por interesses geopolíticos e razões de lucro. A tónica deve estar nas necessidades imediatas das populações-alvo. Embora não se espere o puro altruísmo de doadores e agências multilaterais, um acompanhamento e avaliação mais rigorosos ajudaria a atingir os objectivos. Fala-se da participação dos grupos-alvo nas acções de desenvolvimento; programas e projectos continuam, porém, a serem marcados pelo que peritos estrangeiros das instituições doadoras consideram adequado.

Claro que também há decisores políticos bem intencionados em África. Porém, tal como as coisas estão organizadas, têm dificuldade em fazer a diferença. Com demasiada frequência, a democracia formal não resulta na verdadeira representação do povo. O grande desafio é elaborar planos de desenvolvimento adequados à finalidade e que possam ser implementados de forma sustentável. É essencial percber o que se passa nas bases.

Baba G. Jallow

More political literacy would benefit African governance

Stark inequality marks most so-called developing countries. Large numbers of people are being left behind. One explanation for this trend is the lack of public accountability. While African policymakers excel at second-guessing donor wishes, their nation’s true needs are often only an after-thought. Too many projects are thus planned in ways that fit the pre-defined modalities of donor institutions, but do not serve African people’s actual needs. In many African countries, living conditions have not improved – or even deteriorated – since the colonial powers left. Even where economic growth and other formal yardsticks look good, everyday life remains extremely difficult for masses. This is so even though governments regularly come up with development plans that contain all manner of goals. They typically focus on human-development issues such as food security, health and education.

The idea behind African governments’ development plans is always to improve the standard of living. It is unlikely, however, that this is what policymakers really intend when they draft such documents. It is not far-fetched to argue that cash-strapped governments use such plans to secure development funds. They know what donor institutions want to read in proposals. The old adage that “beggars have no choice” fits quite well. If African people’s real needs are considered at all, they typically remain an afterthought.

Funding needs to be better spent

Many projects indeed do not respond to actual needs. Using a huge Chinese loan, for instance, to build a multi-million-dollar conference centre does little to improve the lives of local people. No matter which bilateral or multilateral institution provides a credit, development funding is often not well spent.

The construction of expensive, state-of-the-art hospitals does not make much sense when it is obvious from the start that there will be too few qualified doctors and nurses, drugs will stay in chronically short supply and neither water nor power supply can be relied on. Most African policymakers’ priority is to get money. They do what they can to gain access to loans and grants. Whether a project can be implemented successfully is of secondary relevance. Politicians know that, once they secure funding, they can squander billions. They can also literally get away with some of that money ending up in their own pockets. At the same time, huge projects systematically increase the debt burden that African nations are shouldering.

Improving education to promote public accountability

The depressing truth is that African people often have no way of holding their political leaders accountable. The vast majority lack even a basic understanding of how the international economic system works. People neither know on what terms loans and grants are secured, nor do they comprehend that their nation as a whole will ultimately be held responsible for repaying debts. Because of wide-spread ignorance, institutions of formally democratic governance cannot work properly. Education must improve if government corruption and the mismanagement of public funds are to be curbed in Africa. Formal schools, the media and civil-society can all contribute to improving economic and political literacy.

BABA G. JALLOW is the inaugural Roger D. Fisher fellow in negotiation and conflict resolution at Harvard University’s law school and the former executive secretary of Gambia’s Truth, Reconciliation and Reparations Commission (TRRC). He launched Gambia’s independent Never Again Network.

Africa needs a civic culture that empowers people to hold officialdom accountable. Donor institutions would be well-advised to do much more in support of related efforts. As things are, recipient governments tend to focus on lining their pockets. Donor institutions should back off from the tailor-made, policy-centred development guidelines that are drafted in their capital cities and are motivated both by geopolitical interests and profit motives. The focus must be on the immediate needs of target populations in poor world regions. While we cannot expect pure altruism from donor countries and multilateral agencies, it is worth pointing out that more stringent monitoring and evaluation would help them achieve their goals. In past decades, there has been much talk about the participation of target groups in development action. Nonetheless, programmes and projects are still largely marked by what foreign experts at donor institutions believe to be appropriate.

There are, of course, well-intentioned policymakers in Africa too. However, the way things are organised, they struggle to make a difference. Too often, formal democracy does not result in true representation of the people. The big challenge is to draft development plans that are fit for purpose and can be implemented in a sustainable manner. An understanding of what is going on at the grassroots level is essential.

ADFI visa a inclusão financeira digital ADFI Aims for Digital Financial Inclusion

OFundo Africano para a Inclusão

Financeira Digital (ADFI, em Língua Inglesa), visa acelerar a inclusão financeira digital em África, promovendo a segurança e a expansão das transacções financeiras digitais. Lançado a 13 de Junho de 2019 nas reuniões anuais do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) em Malabo, Guiné Equatorial, os seus fundadores incluem o BAD, a Fundação Bill & Melinda Gates, a Agência Francesa de Desenvolvimento e o Luxemburgo. O grande objectivo é garantir que mais 320 milhões de africanos, dos quais quase 60% mulheres, usem serviços financeiros digitais até 2030.

“Com investimentos certos em inovação e crescimento digital inteligente, acreditamos conseguir superar os obstáculos para alcançar a inclusão financeira e maiores oportunidades económicas para todos”, disse em Malabo o presidente do BAD, Akinwunmi Adesina. O seu projecto inaugural foi a subvenção de 11,3 milhões de dólares pela Fundação Bill & Melinda Gates ao BAD e ao Banco Central dos Estados da África Ocidental para criar um sistema de pagamento digital interoperável.

O ADFI é ecléctico nas parcerias, trabalhando com bancos e financeiras não bancárias, operadores de redes móveis, prestadores de serviços de remessas e pagamentos, fintechs, governos e organizações económicas regionais. Tal abrangência tem garantido a captação de novos parceiros, como o Governo da Índia e a Women Entrepreneurs Finance Initiative, ambos em 2023.

Entre suas iniciativas, destaca-se o projecto, de 2 milhões de dólares, com o Centro de Recursos de Cibersegurança Africano para combater o cibercrime e fortalecer os ecossistemas financeiros digitais; e a concessão de 2,33 milhões para modernizar a infra-estrutura de pagamentos na Etiópia, e vários outros relacionados com microfinanças.

The African Digital Financial Inclusion Fund (ADFI) aims to accelerate digital financial inclusion in Africa, promoting the security and expansion of digital financial transactions. Launched on June 13, 2019, at the annual meetings of the African Development Bank (AfDB) in Malabo, Equatorial Guinea, its founders include the AfDB, the Bill & Melinda Gates Foundation, the French Development Agency, and Luxembourg. The primary goal is to ensure that over 320 million Africans, nearly 60% of whom are women, use digital financial services by 2030.

“With the right investments in innovation and smart digital growth, we believe we can overcome the obstacles to achieving financial inclusion and greater economic opportunities for all,” said AfDB President Akinwunmi Adesina in Malabo. Its inaugural project was an $11.3 million grant from the Bill & Melinda Gates Foundation to the AfDB and the West African Central Bank to create an interoperable digital payment system.

ADFI is eclectic in its partnerships, working with banks and non-bank financial institutions, mobile network operators, remittance and payment service providers, fintechs, governments, and regional economic organizations. This breadth has ensured the acquisition of new partners, such as the Government of India and the Women Entrepreneurs Finance Initiative, both in 2023.

Among its initiatives, notable is the $2 million project with the African Cybersecurity Resource Center to combat cybercrime and strengthen digital financial ecosystems, and the $2.33 million grant to modernize payment infrastructure in Ethiopia, along with several others related to microfinance.

“URGE ADEQUAR A LEGISLAÇÃO DE MICROFINANÇAS”

“IT

IS URGENT TO ADAPT MICROFINANCE LEGISLATION”

Enoque Changamo, Director das Caixas Comunitárias, defende alterações na Lei que salvaguardem as microfinanceiras

Enoque Changamo, Director of Community Banks, advocates for legal changes to safeguard microfinance institutions

N A

a transição do século XIX para XX, vimos as primeiras manifestações de microfinanças na Associação de Pão de Raiffeinsen (Alemanha) e nas Caísses Populaires (Canadá). Mas foi nos anos 1970, com Muhammad Yunus, no Bangladesh, que se popularizou este movimento pró-desenvolvimento, cujo papel na erradicação da pobreza foi reconhecido em 2005 com o Ano Internacional do Microcrédito, da ONU, e Muhammad Yunus, fundador do Grameen Bank, a receber o Prémio Nobel da Paz. Em Moçambique, o movimento começou nos anos 1990, dominado por organizações não-governamentais (ONG) e iniciativas para reinserir a população afectada pela guerra, estabilizar a paz e prover a segurança alimentar. Assistiu-se à expansão das instituições de microfinanças (IMF), algumas apoiadas por agências de cooperação, incluindo a fundação da Associação Moçambicana dos Operadores de MicroFinanças (AMOMIF). Mas, nos anos seguintes, desapareceram muitas IMF enquanto ocorria uma forte expansão de bancos comerciais, com programas como “1 distrito 1 banco”, que canalizou avultados recursos em seu benefício. Há sinais, porém, de um relançamento da indústria de

t the transition from the 19th to the 20th century, we saw the first manifestations of microfinance in Raiffeinsen’s Bread Association (Germany) and the Caisses Populaires (Canada). However, it was in the 1970s, with Muhammad Yunus in Bangladesh, that this pro-development movement gained popularity. Its role in poverty eradication was recognized in 2005 with the UN’s International Year of Microcredit, and Muhammad Yunus, founder of Grameen Bank, received the Nobel Peace Prize. In Mozambique, the movement began in the 1990s, dominated by non-governmental organizations (NGOs) and initiatives to reintegrate war-affected populations, stabilize peace, and ensure food security. There was an expansion of microfinance institutions (MFIs), some supported by cooperation agencies, including the foundation of the Mozambican Association of Microfinance Operators (AMOMIF). However, in subsequent years, many MFIs disappeared while there was a strong expansion of commercial banks with programs like “one district, one bank,” which channeled significant resources to their benefit. There are signs, however, of

FOTO: D.R.

microfinanças, pois, como disse o Governador do Banco de Moçambique (BdM), a exclusão financeira tem implicações negativas na justiça social. Por isso, a F4SD foi conversar com Enoque Changamo, director das Caixas Comunitárias.

Como evoluiram as microfinanças no País?

Corresponde ao que disse. As microfinanças, que já existiam na Europa e se chamavam cooperativas, conheceram um salto no Bangladesh. Yunus era professor e, no seu percurso diário, via situações dramáticas de pobreza das senhoras que vendiam na rua em condições precárias. Soube que iam buscar a mercadoria para vender e, no fim, devolviam o dinheiro, ficando com quase nada. Decidiu emprestar-lhes dinheiro para comprarem mercadoria em vez de revenderem a de outros. Como conseguiam devolver o dinheiro, mais pessoas foram apoiadas e assim surgiu o actual conceito de microfinanças. Há também exemplos em África, e em Moçambique, com o Banco Popular de Desenvolvimento, cuja finalidade era o crédito que os bancos tradicionais não faziam, mas não vingou.

Por razões conjunturais ou má gestão?

Uma mistura. Mas, o principal é a legislação. Um banco tem de cumprir muitas regras formais, prestar contas ao BdM, o que implica, em parte, não ser inclusivo para segmentos de baixa renda.

É na falha sistémica que surgem as microfinanças em Moçambique?

Antes do actual modelo, havia iniciativas como o xitique, que está modernizado, que respondiam às lacunas do sistema financeiro que não servem as classes pobres. Por exemplo, para um depósito ou abrir conta, pedem o documento de identificação, o NUIT, etc. No nosso País, muita gente não tem documentos e, assim, fica excluída, enquanto no xitique basta o conhecimento mútuo e a confiança. Estes modelos também inspiraram as microfinancas.

Como é que as microfinancas podem participar na inclusão financeira e no combate à pobreza?

Em Moçambique, as microfinanças foram sempre vistas na óptica do alívio à pobreza, sobretudo nos anos difíceis da guerra, da fome, da miséria, em que não tínhamos nada. Houve um retorno massivo da população que estava nos países vizinhos, em camiões, machibombos, que, ao voltar, não encontrava nada, tudo se perdera – é quando

a revival of the microfinance industry, as the Governor of the Bank of Mozambique (BdM) said, financial exclusion has negative implications for social justice. Therefore, F4SD spoke with Enoque Changamo, director of Community Banks.

How have microfinances evolved in the country?

As stated, microfinances, which already existed in Europe under the name cooperatives, took a leap in Bangladesh. Yunus, a professor, saw the dramatic poverty situations of women selling on the streets under precarious conditions daily. He learned that they would buy goods to sell and, in the end, return the money, keeping almost nothing. He decided to lend them money to buy merchandise instead of reselling others’. As they managed to repay the money, more people were supported, thus creating the current concept of microfinance. There are also examples in Africa and Mozambique, with the Popular Development Bank, aimed at providing credit that traditional banks did not offer, but it did not succeed.

Due to circumstantial reasons or mismanagement?

A mix of both. But primarily, it is the legislation. A bank has to comply with many formal rules, report to the BdM, which implies, in part, not being inclusive for low-income segments.

Is it in this systemic failure that microfinances arise in Mozambique?

Before the current model, there were initiatives like xitique, which has been modernized, responding to the gaps in the financial system that do not serve the poor classes. For example, to make a deposit or open an account, identification documents and NUIT are required. In our country, many people do not have documents and are thus excluded, while in xitique, mutual knowledge and trust are enough. These models also inspired microfinances.

How can microfinances participate in financial inclusion and poverty alleviation?

In Mozambique, microfinances were always viewed from the perspective of poverty alleviation, especially during the difficult years of war, famine, and misery when we had nothing. There was a massive return of the population

entram as ONG a distribuir roupa e comida para aliviar a pobreza. Mas sabia-se que eram necessárias soluções locais. Assim, o Governo aprova a criação da CCOM, em 1993.

Como foi esse processo?

Com a participação de membros do Governo em fóruns internacionais, visitaram outros países e viram como as IMF mudavam a vida dos pobres. Então, o Governo decidiu criar um projecto. Em 1995, fez-se um estudo de viabilidade em Maputo, na Zambézia e em Cabo Delgado e, com a Agência Francesa de Desenvolvimento, começa em 1997 um projecto de apoio aos agricultores nos regadios em Gaza, e à União Geral das Cooperativas em Maputo – foi onde nasceram as primeiras na zona Sul. Em Cabo Delgado, foi em Montepuez, Chiure, Balama, Ancuabe e Namuno.

O acesso ao crédito melhorou?

Criámos tudo do zero, a ensinar o conceito, a criar comités de gestão e, através de uma linha de financiamento – a fazer empréstimos sem muita burocracia. Aliás, o microfinanciamento visa resolver problemas pontuais com celeridade.

Quais são os desafios, hoje, das microfinancas?

Continua o mesmo. Devido ao êxito no combate à pobreza, passaram a ser moda. Como AMOMIF, continuamos com o papel de tornar sustentáveis as actividades de microfinanças, para que possam contribuir de forma eficaz para aliviar a pobreza e edificar uma economia de base, sustentada por pequenos negócios. Isso faz-se com a formação dos nossos membros, a introdução de tecnologia e através do lobby para que se façam as devidas alterações legais para salvar esta indústria.

E como estão as microfinanças em Moçambique?

Têm estado a melhorar, mas há desafios que se devem à génese de muitas das IMF. O apoio das ONG levou a uma corrida para criar IMF e receber dinheiro do estrangeiro. Como não havia capacidade de gestão, nem capacitação, quando o apoio caiu, após 2005, a maior parte das IMF não tinha sustentabilidade operacional e fechou. Ou abraçou a agiotagem. Não havia uma estrutura, e o surgimento da AMOMIF visava uma plataforma de discussão das questões das microfinanças. Infelizmente, apesar de parcerias recentes que nos dão alento, sobrevivemos de quotas. Noutros países vemos que alguns governos en-

from neighboring countries, in trucks and buses, who found nothing upon their return, having lost everything – that’s when NGOs came in to distribute clothes and food to alleviate poverty. But it was known that local solutions were needed. Thus, the government approved the creation of the CCOM in 1993.

How was this process?

With government members participating in international forums, they visited other countries and saw how MFIs changed the lives of the poor. Then, the government decided to create a project. In 1995, a feasibility study was conducted in Maputo, Zambezia, and Cabo Delgado, and in 1997, with the French Development Agency, a project began to support farmers in Gaza and the General Union of Cooperatives in Maputo – where the first ones in the southern zone were born. In Cabo Delgado, it was in Montepuez, Chiure, Balama, Ancuabe, and Namuno.

Has access to credit improved?

We created everything from scratch, teaching the concept, creating management committees, and, through a financing line, making loans without much bureaucracy. In fact, microfinancing aims to solve specific problems swiftly.

What are the current challenges of microfinances?

The same issues persist. Due to their success in poverty alleviation, they became trendy. As AMOMIF, we continue with the role of making microfinance activities sustainable so they can effectively contribute to poverty alleviation and build a grassroots economy sustained by small businesses. This is done by training our members, introducing technology, and lobbying for necessary legal changes to save this industry.

How are microfinances in Mozambique today?

They have been improving, but challenges stem from the genesis of many MFIs. NGO support led to a rush to create MFIs and receive foreign money. As there was no management capacity or training, when support dwindled after 2005, most MFIs lacked operational sustainability and closed or embraced usury. There was no structure, and AMOMIF was created as a platform to discuss microfinance issues. Unfortunately, despite recent partnerships

tenderam o valor das microfinanças e criaram instituições que lidam especificamente com isso. Mas Moçambique não tem; só a AMOMIF tenta vias de apoio.

Que recomendaria aos decisores para as IMF serem um activo para o desenvolvimento?

O Governo deve entender as dificuldades que começam na legislação. Há um desafio de sustentabilidade das IMF: quem não capta depósitos não é sustentável. Em Moçambique, as licenças para operadoras de microfinanças interditam-nas de captar depósitos, o que as torna totalmente dependentes de fundos externos. E, quando seca a fonte das ONG, acabam por se comprometer com bancos comerciais, pedindo linhas de crédito com taxas de juro insustentáveis, o que agrava as taxas dos empréstimos das microfinanceiras que, quanto mais altas forem, mais os beneficiários de micronegócios tendem a falhar o pagamento. Houve uma revisão da legislação, mas só cooperativas e microbancos estão autorizados a captar depósitos do público.

Há alguma contraproposta da AMOMIF?

that give us hope, we survive on quotas. In other countries, we see that some governments understand the value of microfinances and create institutions specifically for them. But Mozambique does not have this; only AMOMIF tries to find ways of support.

What would you recommend to decision-makers for MFIs to be an asset for development?

“Noutros países vemos que alguns governos entenderam o valor das microfinanças e criaram instituições que lidam especificamente com isso. Mas Moçambique não”
“In other countries, we see that some governments have understood the value of microfinance and have created institutions specifically to deal with it. But Mozambique has not.”

O BdM teve várias iniciativas que respondem a parte das nossas preocupações, mas pouco pode fazer. Devia ser criada uma instituição reguladora das actividades de microfinanciamento ou uma unidade dentro do BdM para lidar só com as IMF, com regras diferentes das da banca comercial. De contrário, será difícil ter as microfinanças a exercerem o seu papel na dinamização da economia com a flexibilidade desejada. O Governo deve criar um fundo nacional de apoio às IMF que não captam depósitos: não pode ser um banco comercial a fazer-lhes empréstimos. Esse fundo deverá ser gerido de modo profissional visando fazer crescer a indústria de microfinanças. E uma IMF, para ter acesso a este financiamento, deve cumprir alguns requisitos, como ter um sistema de informação, ter capacidade de gestão demonstrada, diligências demonstradas de que pode gerir e prestar relatórios. E ser membro da AMOMIF.

The government must understand the difficulties starting with legislation. There is a sustainability challenge for MFIs: those that do not attract deposits are not sustainable. In Mozambique, licenses for microfinance operators prohibit them from attracting deposits, making them completely dependent on external funds. When the NGO source dries up, they end up compromising with commercial banks, seeking credit lines with unsustainable interest rates, which worsens the microfinance loan rates. The higher they are, the more microbusiness beneficiaries tend to default. There was a legal review, but only cooperatives and microbanks are authorized to attract public deposits.

Does AMOMIF have any counterproposals?

The BdM has had several initiatives that address some of our concerns but can do little. A regulatory institution for microfinance activities or a unit within the BdM to deal solely with MFIs should be created, with different rules from commercial banking. Otherwise, it will be difficult for microfinances to play their role in boosting the economy with the desired flexibility. The government should create a national fund to support MFIs that do not attract deposits: a commercial bank cannot lend to them. This fund should be professionally managed to grow the microfinance industry. And an MFI, to access this funding, must meet some requirements, such as having an information system, demonstrating management capacity, and showing due diligence in managing and reporting. And be a member of AMOMIF.

AGENDA

CONFERÊNCIA-DEBATE | CONFERENCE-DEBATE

05 JUN. | 08H00 – 18H00

Conferência Anual do Banco Sobre Economia do Desenvolvimento 2024 Annual Bank Conference on Development Economics 2024

A Conferência Anual do Grupo do Banco Mundial sobre Economia do Desenvolvimento (ABCDE) é um fórum já com 35 anos que estimula o debate entre os líderes das políticas globais e os investigadores, decisores políticos e profissionais do desenvolvimento dos países membros do Banco Mundial. The World Bank Group’s Annual Conference on Development Economics — ABCDE — is a 35-year-old forum to stimulate an exchange of ideas between leaders in global policy discussions and researchers, policymakers, and development practitioners from the Bank’s member countries.

KIGALI (RUANDA) & ONLINE

ORG : The World Bank & Center for Global Development

INFO : https://worldbankabcde.wufoo.com/forms/abcde-2024-registration

EXPOSIÇÃO | EXHIBITION

26 – 30 JUN | 10H00 – 20H00

Business EXPO Moçambique

Evento que visa reunir empresários de vários sectores e segmentos para mostrarem as suas inovações, estabelecerem contactos comerciais e explorarem oportunidades de colaboração. O evento conta com exposições, workshops e oportunidades de networking. This event aims to bring together entrepreneurs from different sectors and segments to showcase their innovations, establish business contacts and explore opportunities for collaboration. The event features exhibitions, workshops and networking opportunities.

CENTRO INT. CONFERÊNCIAS JOAQUIM CHISSANO

Av. da Marginal, 4441 – Maputo

ORG : Made In Mozambique

INFO : www.madeinmoz.co.mz

CIMEIRA | SUMMIT

27 JUN | 08H00-17H00

Mozambique CEO Summit

O maior evento de negócios em Moçambique, conta com mais de 40 oradores, especialistas nacionais e internacionais, e mais de 200 empresas, junta executivos de topo e líderes organizacionais. The largest business event in Mozambique, it features more than 40 speakers, national and international experts, and more than 200 companies, connecting top executives and organizational leaders.

RADISSON BLU HOTEL – MAPUTO

Av. da Marginal, 141 – Maputo

ORG : High Mastery

INFO : https://m-ceosummit.com

CIMEIRA | SUMMIT

02-04 JUL. | 08H00 – 18H00

Cimeira Internacional de Energia e Indústria de Moçambique 2024

Mozambique International Energy and Industry Summit (MIES) 2024

Com a perspectiva de milhares de milhões de dólares em projectos colaborativos, a 3.ª Cimeira Internacional de Energia e Indústria de Moçambique (MIES) irá proporcionar acesso directo aos stakeholders, visando um Moçambique diversificado e multi-sectorial através da realização das oportunidades sem paralelo que as receitas da indústria energética proporcionam a todos os sectores. With the prospect of billions of dollars in collaborative projects, the 3rd Mozambique International Energy and Industry Summit (MIES) will provide direct access to stakeholders, aiming for a diversified, multi-sector Mozambique by realizing the unparalleled opportunities that energy industry revenues provide for all sectors.

AVANI PEMBA BEACH HOTEL - PEMBA (CABO DELGADO)

ORG : GEP - Global Event Partners

INFO : https://mozambique-ei.com/

Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.