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Ismael Margarido: Uma aventura solitária pelos 4 mil kms da Route 66
// Foi em 2018 que embarcou numa primavera diferente, numa viagem solitária pela americana Route 66. Ou seja, sozinho, montado numa Harley-Davidson, como manda a tradição, percorreu durante três semanas os 4 mil kms da Route 66 entre Chicago e Santa Mónica, nos Estados Unidos. O caderno da viagem de Ismael Margarido, em 2018, está agora “plasmado” num livro editado pelo aventureiro.
Uns dias antes do Natal de 2022 a Junta de Freguesia do Pego recebeu uma apresentação de um livro, numa colaboração da Junta de Freguesia, do Clube Desportos e Motorizado do Pego e do próprio autor. Tudo porque o piloto abrantino Ismael Margarido, que umas semanas antes tinha brilhado nas 24 horas de Fronteira num todo-o-terreno construído a 100% na Barrada, concelho de Abrantes, ia apresentar o seu livro. O livro que representa “um diário” de uma viagem feita em 2018, mas que a pandemia “obrigou” a reagendar até 2022.
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E o livro surgiu depois da leitura dos vários apontamentos que o piloto foi fazendo ao longo de três semanas em que, sozinho, rumo à aventura se lançou na Route 66, nos Estados Unidos. Um livro que não foi pensado antes da viagem, senão haveria mais conteúdo gráfico. Mesmo assim os registos da viagem foram escritos e depois editados para o manuscrito.
E mais do que a viagem de 4 mil quilómetros ao longo de três intensas semanas, as aventuras e pequenas histórias foram ficando registadas no diário que Ismael levou nesta demanda. Porque fazer uma aventura destas, sozinho, e fora do espaço habitual e noutro continente é mesmo uma demanda que teve de ser preparada cuidadosamente ao longo de vários meses. Desde logo pela dificuldade da moto. Em vez de levar a moto de Portugal para os Estados Unidos seria mais fácil alugar uma do lado de lá do Atlântico. E mais do que alugar, o levantamento e a entrega da moto também era um desafio, porque há todo um continente entre o ponto de partida e de chegada. “Felizmente que o meu amigo nos EUA ajudou e encontrámos uma empresa em que podia recolher a moto em Chicago e entrega-la, na outra ponta, perto de Los Angeles”, explicou o piloto abrantino. Depois de encontrada a empresa o outro desafio. A moto escolhida foi uma Harley-Davidson. E há duas dimensões, a de fazer toda a Route numa Harley, que é mítica, mas “para mim uma moto muito mais pesada e com a qual tive algumas dificuldades de adaptação. No início da viagem se parasse e a deixasse tombar para o lado era queda certa”, conta entre sorrisos de quem teve as dificuldades, mas que foram ultrapassadas ao logo do percurso.
Três semanas sozinho em cima de uma Harley em território nunca antes visto teve de ter uma logística meticulosa. Uma mochila com o essencial, mas com nova dificuldade. Uma partida do Leste, de Chicago com chuva e zero graus e uma chegada a Santa Mónica com sol intenso e 35 graus. E este essencial tinha de contar com o espaço para guardar a roupa à medida que o tempo ia aligeirando. Depois perceber os locais para pernoitar, locais de abastecimento de combustível ou os sítios fora da Route para visitar. ”Aqueles que são imperdíveis.”
E destes, Ismael conta que fez dois desvios. Um para o Grand Canyon e sobre o qual diz que é ainda mais impressionante do que aquilo que vemos na televisão. Outro desvio Las Vegas. “Tinha de ser. Aquilo é hotéis casino que funcionam 24 horas sobre 24 horas. Sais de um e já estás no outro. Depois têm todas as novidades nos “néons”, ou seja, nos placares luminosos e coloridos. Têm as novidades, nem que mudem todos os meses. Depois depositam num grande depósito no deserto. São quilómetros e quilómetros com estruturas retiradas dos casinos. Assim como o cemitério de aviões. São muitos quilómetros de aviões a apodrecer com o passar do tempo”, conta o aventureiro.
Nesta viagem solitária, dos dias mais monótonos há o registo dos desertos de 50 quilómetros de reta, estradas a perder de vista “como nos filmes. Parece que estamos parados.”
Mas há muitos outros porme - nores que podem ser lidos no livro e outros ainda que só em conversa com o piloto, que entre risos vai desfolhando episódios e pequenas histórias. “Num dos dias chovia bastante e parei num edifício abandonado à beira da Route para me abrigar. Tinha fechado e quando os donos saíram, saíram. Pelo chão deixaram papelada, registos de hóspedes e por aí for”, conta Ismael
Três semanas
Margarido que acrescenta logo que nas bombas de gasolina ninguém pergunta quanto quer abastecer, ou seja, “é sempre para atestar”. Há museus de todos os tipos, por exemplo, um deles mostra todas as garrafas de bebida, em vidro, dos Estados Unidos. “Parecem árvores com todas as garrafas enfiadas nos paus. Estão lá todas de todo o tipo de bebidas”, diz ao mesmo que tempo de coça a cabeça e releva a vila em que ainda se fazem os duelos dos “Cowboys” como nos western’s do Oeste Americano. Até porque esta foi a rota que os colonos fizeram para desbravar o continente em busca do Oeste, do pacífico. Outra nota é o facto de as linhas ferroviárias acompanharem a estrada. Uma ferrovia muito utilizada em mercadorias. “Cada comboio é enorme, duas locomotivas à frente e outras duas atrás e pelo meio 100 corda uma pequena vila cheia de burros, que circulam soltos e sem dono, a outra, Cadillac Ranch, em que estão seis carros enterrados e que os grafitter’s acabaram por decorar, o ponto central da Route, a ponte Chain of Rock Bridges, muito vista em filmes americanos, ou a Calico Ghost Town, a tal cidade do velho Oeste americano.
Ismael Margarido nunca pensou em desistir, pois, este era um dos seus objetivos, após ter feito a mítica Estrada Nacional 2, em Portugal, com os seus 739 quilómetros de liga Chaves a Faro.
Esta via foi construída, na década 30 do século passado, quando os EUA tinham um plano nacional de autoestradas. Inaugurada em 1938, ela tinha cerca de 4 mil quilómetros de extensão, cruzando
A Route 66 começa em Chicago, no Estado de Illinois, e vai até Los Angeles, na Califórnia. Cruza os estados do Missouri, Kansas, Oklahoma, Novo México e Arizona. Também chamada de Rua Principal da América, em 1950 ela perdeu importância quando foi perdendo espaço para as novas autoestradas interestaduais.
Foi desativada em 1984, passando a ser chamada de “Histórica Rota 66” e ainda proporciona a nostalgia para os que desejam uma viagem ao passado. É a mítica Route 66 muito associada a motards. É uma das maiores do mundo. Mas para além da Route 66 e da Nacional 2 Portuguesa ainda existe a Ruta 40 nos planos do abrantino.
Ismael Margarido contou ao Jornal de Abrantes que é uma via- gem, para a América do Sul, que já está em preparação, embora com um pequeno entrave por causo dos tumultos do Perú. Mesmo assim há possibilidade de poder entre 2023 e 2024 lançar-se numa nova aventura, desta vez com uma particularidade para além de uma extensão de 5.224 quilómetros. É a cordilheira dos Andes, pois há locais em que a Ruta 40 atinge uma altitude de quase 4.900 metros. Muito mais que os dois mil da “nossa” Serra da Estrela.
A Ruta 40, a Argentina, percorre 5224 quilómetros começando ao nível do mar, atravessa 20 parques nacionais, 18 importantes rios, liga 27 pontos de montanha na cordilheira andina e sobe aos 4.895 metros de altitude ponto de montanha denominado Abra del Acay, na província de Salta.
Jerónimo Belo Jorge