Lusíada Economia e Empresa - 11

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Serie II, n.0 11 (2010)

Economia & Empresa Universidade Lusfada • Lisboa

Dossier: "0 Fen6meno das Catastrofes no Pensamento Econ6mico"

Universidade Lusfada Editora Lisboa • 2010


Mediateca da Unive rsidad e Lusiada - Cataloga~ao na Publica~ao LUSiADA. Economia e Empresa. Lisboa , 2001 Lusiada. Economia e Empresa 1 propr. Funda~ ao Minerva - Cultura Ensino e ln vest iga~ ao Cie ntifi ca ; dir. Jose Eduardo Carva lho. - S. 2, n. 1 (2001 ). - Lis boa : Universidade Lusiada, 2001 . - 24 cm. - Anual Cont inu a~ao de : Lusiada: revista de cie ncia e cu ltura. Se ri e de economia ISS N 1645-6750 1. Economia - Peri6dicos 2. Gestao de Empresas - Peri6dicos I - CARVAL HO , Jose Ed uardo dos Santos Soares, 1939CBC CDU

Titulo Proprietario Director

HB9 . L87 HD28. L87 330(051) 658(051)

Fie ha Tecnica Lusiada. Economia & Empresa Fundac;ao Minerva ~ Cultura- Ensino e lnvestigac;ao Cientifica Professor Doutor Jose Eduardo dos Santos Scares Carvalho

serie 11

N." 11

(Professor Catedfdtico, Universidade Luslada de Lisboa)

Conselho Editoria l

Prof. Doutor Albino Anjos Lopes (Professor Associadocom Agregas:ao, ISCTE)

Prof. Doutor Miguel Martinez-Echevarria (Professor Ordindrio, Universidade de Navarra)

Prof. Doutor Miguel Pedro St. Aubyn (ProfessorCatednitico, ISEG)

Prof. Doutor Mil.rio Caldei ra Dias (Director da Facutdade de CiE!ncias de Economla Empresa da Universidade lusfada de Lisboa)

Prof. Doutor Fernando Mario Teixeira de Almeida (Director da Faculdade de W~ ndas da Economia e da Empresa da Universidade Lusfada do Porta)

Prof.a Doutora Maria Elizabeth Real de Oliveira (Director a da Faculdade de Ciencias da Economia e da Empresa da Universidade Lusiada de Vila Nova de Famalicdo )

Conselho Consultive

Prof. Doutor George C. Krajcsik (Adjunct Professor, Everglands University/USA)

Prof. Doutor llailson Siveira AraUjo (Faculdade Cinescista de Fortaleza • FACEFOR)

Prof. Doutor Jos€ Atvaro Ass is Lopes (Professor Catedr.itico, Universidade Lus(ada de Lisboa )

Prof. a Doutora Maria Manuel Valadares Tavares (Professora Associada, Universidade Luslada de Lisboa)

Prof. Doutor Rui Lopes dos Reis (Professor Catedr.itico, Universidade Lusfada de lisboa)

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FCT Funda~ao para a Ciencia e a Tecnologia MINISTERIO DA CIENCIA E DO ENSINO SUPERIOR

Portugal


INDICE

Dossier: "0 Fen6meno das Catastrofes no Pensamento Econ6mico" 0 risco de ocorrencia de catastrofes naturais em Portugal

Carlos Garrido .. .. ............................ ................... .............. ......... ..................

13

As catastrofes: capacidade e vontade de encontrar solw;oes

Ant6nio Santiago Portela .............. .............................................................

25

As catastrofes: exemplos referenciais

Ant6nio Gouvea Portela .......................... ......... ..........................................

37

De uma versao actualizada da explica<;ao da evolu<;ao da economia Portuguesa

Ant6nio Rebelo de Sousa e Ant6nio Quintino ........ .. ................................

49

Do bin6mio Keynes-Schumpeter ao pensamento Galbraithiano

Ant6nio Rebelo de Sousa .............................................. .... .................... .....

65

A theoretical approach to the political economy of fiscal cyclicality, forecasts and consolidations

Nu no Venes ............................... ..................................... .............................

Disserta~oes

79

e Teses

0 processo de fusao na Administra<;ao Publica Portuguesa: papel central dos lideres intermedios na concep<;ao e comunica<;ao do projecto

Albino Lopes, Damasceno Dias e Pedro Parreira .. .................. .. ...............

95

Autonomia financeira e desenvolvimento sustentavel das Autarquias Portuguesas

Manual Almeida Baptista .. .. ... .. .. .. .. .. ... .. ... .. ... .. .. .. .. .. ... .. ... .. .. .. .. .. ... ... ... ... .. ..

123


Sumario

Incubadoras de Empresas e o Direito Econ6mico

Giovani Clarlc e Nizete Aratijo ...... .......................................... ...... .. ....... ...

145

0 desenvolvimento do outsourcing, seus fundamentos, riscos e beneficios

Elizabete Fonseca Correia ... .. .......... .... ........ ...... ........ .. ..... .. ....... .. .. .... ...... ... . A importancia do capital intelectual na gestao

estrah~gica

161

das empresas

Manuela Faia Correia e Graciete Honrado ... ..... ... ...... ... ............................

181

Recensao Jose Alvaro Assis Lopes .................... ........... .... ............... ................ ......... .. .

195


NOTA DE ABERTURA

Vivemos no planeta vulcao. 0 planeta Terra, no seu processo normal de evoluc;ao, esta em constante actividade tect6nica e muta<;ao climatica, provocando sismos, erup<;6es vulcanicas, maremotos e outras ac<;6es imprevisfveis da natureza. 56 depois de se aperceber o quanto estava desprotegido em rela<;ao as furias naturais, o ser humano se tornou atento e preocupado, passando a dar maior aten<;ao aos sinais que a mae natureza emitia avisando sobre as catastrofes vindouras. Corn o apoio do avan<;o tecnol6gico, o homem come<;ou a desenvolver ferramentas e tecnicas corn o intuito de se proteger dos fen6menos quando esses estivessem para acontecer: mediadores sfsmicos, bar6metros para medir a pressao atmosferica, anem6metros, etc. No entanto, a ciencia ainda nao e capaz de prever corn exactidao quando ocorrem os fen6menos naturais. Porem, a hist6ria humana mostra que nem s6 de catastrofes naturais vivem os homens, mas tambem de outros problemas provocados por eles pr6prios. Coma se nao bastassem as ac<;6es naturais do planeta, o homem inventou outros meios para se destruir a si mesmo. Sem ÂŁalar dos impactos ambientais - assunto caro aos ecologistas - o Mundo esta, mais uma vez a viver as consequencias de uma catastrofe financeira. Esta, iniciada em Mar<;o de 2007 nos EUA corn a crise do suprime, nome dado ao sistema de credito de segunda linha no pais. Sao conhecidas as causas. 0 mercado imobiliario movimentou-se corn o governo dos EUA a permitir que as pessoas se endividassem para comprar im6veis, beneficiando das baixas taxas de juro e das excelentes condi<;6es de financiamento. A orgia de dinheiro barato desencadeou os investimentos de longo prazo insustentaveis, bem como jogou gasolina nas brasas da especula<;ao desenfreada. 0 inesperado aconteceu - a catastrofe - a inadimplencia cresceu bruscamente. Ao mesmo tempo, cresceu a corrente epidemica de fraudes contabilfsticas em grandes empresas e Bancos americanos. A bolha da Nasdaq reduziu a p6 as economias de milhoes de investidores; quase seiscentas das novas empresas ponto.com faliram. Alguns Bancos entraram em situa<;ao de insolvencia, for<;ando a interven<;ao do governo norte-americano para minimizar a situa<;ao. Por efeito sistemico, identicas medidas se seguiram nos governos europeus. Grande parte da dfvida apenas mudou do sector privado para o publico, visto os governos terem interferido para apoiar os Bancos e salvar as economias de cafrem numa depressao corn maiores consequencias.

Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, n.Q 11/2010

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Nota de Abertura

A recessao econ6mica acaba por ser o acerto de contas inevitavel corn o complexo de decisoes erradas tomadas corn base no falso sinal de juros baixos. Corn a globaliza<;ao, a maioria dos pafses sofreu o impacto da crise, sobretudo aqueles que mais dependiam do mercado externo. 56, em 26 de Abril de 2009, o Banco Mundial em conjunto corn o Fundo Monetario Internacional (FMI) reconheceram que a "crise econ6mica mundial transformou-se numa cattistrofe humana e

num desastre no plana do desenvolvimento, particularmente grave nos pafses em desenvolvimento". 0 tra<;o singular das crises econ6micas desde o infcio do seculo XIX e a dificuldade de prever corn precisao as causas que as deflagram. No passado as depressoes podiam ser imputadas claramente as guerras, revolu<;6es ou catastrofes naturais. A economia capitalista moderna e diferente; quando tudo parece estar correndo bem, inexplicavelmente emergem estranhas convulsoes - catastrofes que nao podem ser explicadas por esse ou aquele evento espedfico. A arquitectura monetaria do capitalismo moderno e urn castelo de cartas sujeito a desmoronar parcial ou totahnente a qualquer momento. Os mercados financeiros sao reflexivos, pois operam apenas corn expectativas e nao corn activos tangfveis. Essa caracterfstica torna os mercados financeiros instaveis - por sua propria natureza - e exigem interven<;ao externa para garantir alguma estabilidade, principalmente em economias de institui<;6es mais frageis. Muita da teoria econ6mica moderna invocando sofisticados modelos matematicos para prever o comportamento dos mercados nao tern hoje as ferramentas conceptuais para compreender todas as mudan<;as que tern ocorrido, mostrando incapacidade para explicar cabalmente a actividade econ6mica. A economia nao trata de agregados imaginarios, meros entes de razao. Trata de seres humanos, suas ac<;6es e escolhas num mundo de imperfei<;oes e incertezas. A singularidade das crises e a enorme quantidade de erros de avalia<;ao simu!Hl.neos por parte de empresarios experientes e especuladores astutos. Para haver investimento e preciso antes ter havido poupan<;a; a diferen<;a positiva entre o que as pessoas produzem e o que consomem. Se, porem, os Bancos criam pseudo poupan<;a, emprestando alem das suas reservas, a taxas de juros reduzidas artificialmente, os empresarios e investidores sao induzidos a acreditar que ha mais poupan<;a real do que efectivamente existe. 0 dinheiro falso bombeado pelos Bancos na economia termina por alimentar grandes movimentos especulativos nas bolsas de valores e em outros mercados, como o imobiliario. 0 estimulante dessa febre ilus6ria de optimismo euf6rico e 0 credito artificialmente barato provido pelo sistema financeiro sob a apatia dos governos. Os politicos tern horizonte de curto prazo e fazem qualquer neg6cio para que a economia cres<;a, mesmo que esse crescimento seja insustentavel. Como nao podia deixar de ser, os estudiosos do assunto aventaram, a posteriori, inumeras hip6teses para a compreensao da catastrofe financeira e das flutua<;oes econ6micas. Nomes sonantes, como o polemico multimilionario George Soros eo Nobel Paul Krugman, entraram em cena para justificarem os aconte-

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Lusfada. Economia & Empresa, n.Q 11 /2010


Nota de Abertura

cimentos. Soros, por sua iniciativa, criou na Universidade de Oxford o Institute for New Economic Thinking (INET), urn think-tank para estimular urn novo pensamento econ6mico e, em particular, debater o papel da regula<;ao governamental na economia e mercados financeiros. Varios pn§mios Nobel associaram-se ao projecto, entre eles George Akerlof, Joseph Stiglitz eA. Michel Spence, formando urn vasto advisory board. Por seu lado, Krugman lan<;ou, no "The New York Times" num extenso artigo intitulado "How did Economists get it so wrong?", urn ataque contundente a corrente macroecon6mica de inspira<;ao neoclassica nascida na Universidade de Chicago, que tern dominado nas ultimas decadas a academia e alimentado o paradigma de banqueiros centrais e financeiros de Wall Street. A proposta de Kruman vai no sentido do regresso ao Keynes original, afirmando: "A economia keynesiana con-

tinua a ser o melhor enquadramento para compreendermos as recess6es e as depress6es". 0 manifesto do regresso ao keynesianismo e tambem aceite por Carlota Perez, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido. Porem, esta reconhecida especialista mundial no impacto da tecnologia na economia, prop6e uma parceria Keynes-Schumpeter. Segundo as suas palavras: "Silo ambos necessr.irios, porque a

actual crise tem as suas origens na finam;a, mas s6 pode ter uma solur;ao na economia real. 0 que tem de ser feito requer uma intervem;ao keynesiana para cobrir o campo de jogo ea visao de Shumpeter sabre a inova~ao coma motor do crescimento. 0 agente da retoma, depois das crises, nao ea despesa governamental, mas a ac~ao dos empreendedores". *********){•

A actualidade e relevancia da situa<;ao econ6mica, acima descrita, impulsionou a inclu ir nesta edi<;ao n .Q 11 de "Lusiada- Economia & Empresa" urn dossier tematico sob o titulo "0 Fen6menos das Catr.istrofes no Pensamento Econ6mico", agrupando seis artigos, em qu e os autores apresentam interessantes depoimentos. Os tres primeiros textos estao focados nos factores caracterizadores das catastrofes, ajudando-nos a uma percep<;ao holistica desses fen6menos, em grande parte de responsabilidade humana. A abordagem conceptual e ilustrada corn exemplos referenciais recorrentes na esfera econ6mica e social. Os dois artigos seguintes estao dirigidos a problematica macroecon6mica. No primeiro, centrado na economia portuguesa, procura-se sintonizar as variaveis explicativas da evolu<;ao do nfvel de actividade produtiva registada no passado recente, corn men<;ao do papel do investimento publico - referenda ao keynesianismo - como variavel impulsionadora do desenvolvimento econ6mico. No segundo, sugerem-se medidas de politica econ6mica, susceptiveis de inverterem o actual "ciclo de crise", a luz da conjuga<;ao do triangulo de contribui<;6es de Keynes, Schumpeter e Galbraith. 0 ultimo artigo do dossier esta focado na politica or<;amental, explicitando o comportamento dclico, os erros de previsao, a ineficiencia dos defices e consequente necessidade de consolida<;6es or<;amentais, bem como dos factores politicos e institucionais.

Lusfada. Economia & Empresa. Lis boa, n.Q11/2010

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Nota de Abertura

No grupo "disserta<;6es e teses" alinham-se cinco artigos resultantes de trabalhos de investiga<;ao desenvolvidos no ambito de prepara<;ao de disserta<;6es e teses para atribui<;ao de graus academicos. 0 primeiro artigo, sob titulo "0 processo de fusao na Administrar;ao Publica", foca o papel central dos lfderes intermedias e da necessidade de agiliza<;ao e flexibiliza<;ao organizacional. Os autores dao conta de quatro estudos realizados em institui<;6es publicas em processo de fusao. 0 segundo artigo, desta sec<;ao, tem_ como tema "A autonomia financeira e desenvolvimento sustentrivel das autarquias portuguesas", no qual o autor relaciona a evolu<;ao dos Fundos Gerais Municipais per capita corn uma serie de indicadores de desenvolvimento sustentavel, testando a sua correla<;ao corn o nfvel de desenvolvimento econ6mico dos munidpios, medido pelo IPC, retirando dos resultados as respectivas ila<;6es. 0 titulo "Incubadora de Empresas eo Direito Econ6mico" da corpo ao terceiro artigo da segunda parte da revista, procurando os autores demonstrar que as incubadoras de empresas sao urn dos instrumentos eficazes de viabiliza<;ao e protec<;ao das micro e pequenas empresas de base tecnol6gicas. 0 artigo seguinte esta focado no tema "0 desenvolvimento do outsourcing, seus fundamentos, riscos e beneficios". A autora, atraves de uma revisao de literatura, procura descobrir a orienta<;ao futura e as principais quest6es na aplica<;ao do outsourcing. No ultimo artigo, sob o titulo "Importancia do capital intelectual na gestao estrategica das organizar;oes", as autoras sublinham a importancia das dimens6es intangfveis na gestao e sucesso das organiza<;6es e apontam o papel do capital intelectual como factor estrategico, quer nos processos de gestao quer como contributo para a capacidade inovadora dos colaboradores. A edi<;ao n.Q 11 da revista culmina corn uma recensao ao livro "NEUROECONOMIA - Ensaio sabre a sociobiologia do comportamento". Na contra-capa desta publica<;ao de Edi<;6es Sflabo, pode ler-se: "Este e urn livro de economia da nossa vida real em sociedade. Dos nossos comportamentos e atitudes, das nossas escolhas e ambi<;6es, das nossas necessidade e futilidades. Nao e urn livro de economia, daqueles que estamos habituados a ver nas livrarias, corn muitas formulas, graficos, tabelas e modelos, tentando explicar o passado e prever os comportamentos dos a gentes econ6micos no futuro". Uma palavra final de apre<;o e agradecimento aos articulistas que colaboraram nesta edi<;ao da revista, contribuindo corn o seu saber para ampliar o conhecimento dos nossos leitores. ODIRECTOR

Jose Eduardo Carvalho

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Lusiada. Economia & Empresa, n. 0 11/2010


DOSSIER "0 FENOMENO DAS CATASTROFES NO PENSAMENTO ECONOMICO"



0 RISCO DE OCORRENCIA DE CATASTROFES NATURAIS EM PORTUGAL

Carlos Garrido Professor Associado (Universidade Lusiada de Lisboa)



Resumo: Este artigo come~a por definir catastrofe, numa perspectiva estatistica, apresentando uma ideia geral de risco, distinguindo risco tradicional de risco operacional. Faz uma listagem das principais catastrofes ocorridas em Portugal nos ultimos cem anos, constatando que sao catastrofes meteorol6gicas, as quais poderao ser potenciadas pelas previstas altera~6es climaticas. 0 artigo conclui corn uma breve apresenta~ao das principais consequencias deste tipo de catastrofes.

Palavras-chave: Catastrofe natural, catastrofe meteorol6gica, assimetrica, risco tradicional, risco operacional, impacto.

distribui~ao

Abstract: This article defines catastrophe in a technical approach, referring both the traditional and operational risks. It focuses the main natural catastrophes occurred in the last ten decades, which had a meteorological origin. The probable climate change may foster and worsen this pattern. Finally, a brief list of catastrophes impact is presented.

Key-words: Natural catastrophe, meteorological catastrophe, asymmetric distribution, traditional risk, operational risk, impact.

Lusiada. Economia & Empresa. Lis boa, n.2 11/2010

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Carlos Garrido

1. 0 conceito de catastrofe

Evulgar classificarem-se as cah1strofes em catastrofes naturais (v.g.: sismos, erup<;6es vulcanicas, cheias, ciclones, deslizamento de terras e secas) e catastrofes provocadas pelo homem (v.g.: guerras, guerrilhas e terrorismo). 0 ambito deste artigo sao as catastrofes naturais. A literatura da especialidade costuma apresentar uma grande variedade de defini<;6es de catastrofe que, de urn modo geral sao subjectivas ou incompletas. Uma defini<;ao de catastrofe, numa perspectiva estatistica e econ6mica e apresentada por Garrido (2000;3): catastrofe e toda e qualquer perda a direita de urn ponto (patamar das catastrofes) fixado arbitrariamente na aba direita de uma dada distribui<;ao. Trata-se de uma defini<;ao propicia a analise do risco, uma vez que as distribui<;6es dos sinistros sao tipicamente enviesadas; para isso e necessaria modela-las, utilizando para o efeito as distribui<;6es de Pareto, logama, lognormal ou de Weibull (vide Embrechts, Paul e outros (1997;13)).

Legenda: X' - Patamar das catastrofes

X*

X Figura 1 - Fun<;ao de densidade

A variavel X e uma variavel de perda econ6mica: v.g. indemniza<;6es, prejufzos, etc. A tematica desta comunica<;ao tern fortes liga<;6es corn a economia das catastrofes, a qual pode ser definida como uma disciplina da ciencia econ6mica que tern por objectivo estudar o comportamento da economia p6s-catastrofe e os aspectos econ6micos e financeiros da preven<;ao das mesmas, vide Garrido (2000;3). A defini<;ao destes conceitos, apresentada previamente, e importante para se evitar certas confus6es comuns quando se abordam estas materias 1 •

1 Por exemplo, as expressoes 'catastrofe' e 'fen6meno natural extremo' sao, por vezes, erradamente usados de modo indiferenciado como sin6nimos.

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0 risco de ocorrencia de catastrofes naturais em Portugal, p. 13-24

2. A ideia geral de risco

Existem duas perspectivas extremas de se encarar o risco: (1) catastrofismo; (2) irresponsabilidade. Ambas estao erradas, pois ha que analisar e gerir os riscos. As praticas concretas situam-se algures entre os dois extremos. Ha que ter uma no<;ao previa das vulnerabilidades existentes. Vulnerabilidade as catastrofes e a «exposi<;ao do suporte fisico da sociedade, grupos sociais e indivfduos aos acontecimentos extremos>>, Albala-Betrand (1993;90). Existem varios tipos de vulnerabilidades, mas trata-se de uma tematica que sai fora do ambito deste artigo. No entanto, refira-se que as vulnerabilidades estao fortemente dependentes das condi<;6es iniciais2 (condi<;6es econ6micas, institucionais, sociais e culturais). Da vulnerabilidade as catastrofes naturais decorre urn risco. 0 conceito de risco esta ligado ao conceito de probabilidade. Carvalho Rodrigues (2005;19-20) escreve: «A probabilidade ea essencia do mar da vida. Por isso, naquele provavel ha uma medida de certeza que, aquela previsao, aquela opiniao sobre o tempo, venha a ocorrer. Eo resultado da conjectura sobre argumentos para trazer certeza ao futuro . Claro que tambem fazemos, igualmente, a combina<;ao de argumentos que provam variantes da mesma opiniao incluindo, mesmo, a contraria>>. Este autor, em obra anterior, coloca-se na perspectiva das condi<;6es do fen6meno e nao do nexo causa-efeito: «Temos hoje, em vez da descri<;ao absoluta da causa-efeito, a descri<;ao das necessidades, das possibilidades que, se acontecem ao mesmo tempo, geram a probabilidade, quase a verdade dentro de urn sistema de cren<;as. See possfvel, e temos urn conjunto de conhecimentos anteriores, entao acreditamos na sua possibilidade>>, Carvalho Rodrigues (1995;194). Acerca do conceito de condi<;ao, Abbagnano (2000;171-172) afirma que «os progressos da fisica, que marcaram a queda da no<;ao de causa, exigem a substitui<;ao do determinismo causal pelo determinismo condicional ... Assim, nas disciplinas mais dfspares, o conceito de condi<;ao esta tomando o lugar do conceito de causa>>. 0 dicionario da Porto Editora define risco como a possibilidade de urn acontecimento incerto e futuro. Para Abbagnano (2000;859), o risco, em geral, e o aspecto negativo da possibilidade, o poder nao ser.

0

2 Perspectiva que convida a uma abordagem desta tematica atraves da teoria do caos, que ultrapassa 0 ambito deste artigo.

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Carlos Garrido

3. Risco tradicional e risco operacional

Hillier (1997;77) apresenta urn conceito operacional de risco. «E uma situa<;ao associada a urn conjunto de resultados ou pagamentos, em que cada resultado esta associado a urn estado que ocorre corn uma dada probabilidade». Este autor apresenta o exemplo da compra de urn bilhete da lotaria corn 0,5 de probabilidade de urn pagamento de 10 euros e de 0,5 de probabilidade de pagamento zero, o que representa uma perspectiva de risco corn dois estados: ganhar ou perder. 0 retorno esperado do bilhete de lotaria e de 0,5 x 10 + 0,5 x 0 = 5€. Rykcen (2002;30) considera tres tipos de riscos: risco de credito (75%), risco de mercado (5%) e risco operacional (20%). Os riscos de credito e de mercado sao os chamados riscos tradicionais. 0 guia para a inclusao dos riscos ambientais e sociais na concessao de credito dos Bancos portugueses nao se interessa apenas pelos riscos tradicionais, mas tambem pelos riscos operacionais. Urn emprestimo incobravel e urn exemplo de risco de credito. 0 aparecimento de novas concorrentes, tecnologias ou produtos sao tipos de risco de mercado. As catastrofes naturais, o terrorismo, a guerra e os danos ambientais sao exemplos de riscos operacionais. A partir do «11 de Setembro>> a percep<;ao dos riscos operacionais tornou-se mais patente, sobretudo nos Estados Unidos. Embrechts (1997;77) apresenta a seguinte formula<;ao do modelo classico de risco: N(t )

U(t)

= u +et- S(t),

S(t)

= LXi,

t;::: 0

i= l

em que u representa o capital inicial, c a taxa de premia e S(t) o valor total das indemniza<;6es, que e uma soma aleat6ria de sinistros, Xi, independentes e identicamente distribuidos. N (t) e urn processo homogeneo independente de Poisson de Xi. Este modelo pode ser desenvolvido nas hip6teses de grandes ou de pequenos sinistros. As resseguradoras utilizam modelos estatisticos de risco aplicados as bases de dados que possuem. Por exemplo, as perdas econ6micas provocadas por ventos cicl6nicos sao uma fun<;ao crescente da sua velocidade, existindo modelos probabilisticos que fazem tal associa<;ao, corn uma determinada margem de erro. Em termos empiricos e muito simplificados, tomemos, como mera ilustra<;ao, o caso dos riscos sismicos. Vamos supor que numa dada regiao existem cinco ciclos de sismos corn intensidade diferente, sendo 0 seu poder destrutivo decrescente relativamente a sua frequencia (v.g.: 0 ciclo de 200 anos e mais destrutivo do que 0 ciclo de 20). Ciclos (anos): 20, 40, 80,100 e 200.

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Lusfada. Economia & Empresa, n.Q 11/2010


0 risco de ocorrencia de catastrofes naturais em Portugal, p . 13-24

QUADR01

Perdas econ6micas Ciclo (an os)

Perdas

Perdas

(%)

â‚Ź

Perdas anualizadas

(1)

(2)

(3)

(4)

0,04 0,12 1,00 10,00 100,00

100 300 2500 25000 250000

20 40 80 100 200 soma

5 7,5 31,25 250 1250 1543,75

A 1. ~ coluna do quadro 1 apresenta os ciclos considerados. Na 2. 11 coluna estao listados os prejufzos percentuais ocorridos no valor do im6vel em cada ciclo. A 3.1! coluna apresenta o valor econ6mico dos prejufzos de cada ciclo (v.g .: a primeira celula, no valor de 100 euros, eo resultado da divisao de 250 mil euros por 0,0004). A 4. ~ col una eo valor anual dos danos ciclo (v.g.: a primeira celula, no valor de 5 euros, e o resultado da divisao de 100 euros por 20 nos). Urn apartamento no valor de 250 mil euros, na hip6tese te6rica e simplificada acima referida, teria urn premia anual de seguro de 1.543,75 euros, acrescidos de encargos diversos, o que equivale a 0,6175% do capital seguro. Em zonas costeiras ou expostas a sismos, tern havido uma contrac<;ao na oferta de determinadas modalidades de seguro, designadamente no que respeita a cobertura de riscos acima de determinados plafonds. 0 risco pode tornar-se tao elevado que se podem atingir os limites da nao segurabilidade, o que constitui uma falha de mercado. Uma das fun<;6es do Estado moderno e regular o mercado, minorando tais falhas. Por isso, tern havido uma tendencia para o aumento das parcerias entre o sector publico e o privado.

4. A ocorrencia de catastrofes naturais em Portugal Os tres quadros a seguir apresentados listam as dez maiores catastrofes que se verificaram em Portugal nos ultimos cem anos 3 •

3 Informa~ao

retirada na. Internet em 10 de Agosto de 2010.

Lusiada. Economia & Empresa. Lis boa, n .Q11/2010

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Carlos Garrido

QUADR02 As 10 maiores catastrofes em Portugal - n.Q de mortes Tipo

N. Q de mortes

Data

2696

Temperaturas extremas Cheias

Agosto.2003 26 Nov 1967

Temperaturas extremas Cheias

Julho.2006 21.Fev 2010

41 32

Cheias Temporal

29.Dez 1981 30.0ut 1997

30

Cheias

Jan.1979 18.Nov 1983

Cheias

462

29 19 19

15.Jun 1986 15.Maio 2005

Fogos Fogos - - - - ----- -- -- -

----

- - -- -

15 15 -----

----

Fonte: EM-DAT: The OFDA/CRED International Disaster Database Universite Catholique de Louvain - Brussels, Belgium.

QUADR03 As 10 maiores catdstrofes em Portugal - n. g de afectados Tipo

Data

N. Q afectados

Fogos Cheias

Janeiro.2003 Fevereiro.1979

150.000 25.000

Cheias

Janeiro.1979 18 Nov 1983 22 Dez 1996

20.220

Cheias Cheias Cheias

26 Nov 1967

1.100

Cheias Cheias

1.050

Cheias

08 Jan 1996 29 Dez 1981 22 Out 2006

Cheias

06 Nov 1997

2.000 2.000

900 240 200

Fonte: ibd.

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0 risco d e ocorrencia de catastrofes naturais em Portugal, p. 13-24

QUADR04 As 10 maiores catastrofes em Portugal - prejufzos econ6micos Tipo

Data

Prejuizos 1()3 US$

Cheias

21.Fev 2010

1.867.640

Fog os Fog os

Janeiro.2003 15 Mai 2005

1.730.000 1.650.000

Se cas Cheias

Set.2004 18 Nov 1983

1.338.136

Seca

Abril 1983

Fogos

09.Set 1985

Cheias Temporal

Jan.1979 30.0ut 1997

Cheias

08.Jan 1996

95.000 95.000 95.000 30.000 25.000 13.000

Fonte: ibd.

Constata-se que as temperaturas extremas, concretamente o calor excessivo, tern sido a cat<istrofe natural que tern provocado o maior numero de vftimas catastrofe que provoca ÂŤmortes silenciosasÂť, no sentido em que nao tern o aparato, a violencia, o mediatismo e a destruic;ao subita de urn sismo. As cheias da Ilha da Madeira, os fogos de 2003 e 2005 e a seca de 2004 foram as catastrofes que provocaram maiores prejufzos econ6micos. Constata-se, assim, que nos primeiros anos do seculo XXI Portugal tern sido bastante castigado pelas catastrofes naturais. As catastrofes que nos ttltimos anos tern atingido Portugal sao catastrofes meteorol6gicas. Corn as alterac;6es climaticas previstas, e provavel haja uma tendencia para que tais tipos de catastrofes sejam mais frequentes e de maior dimensao. Sao conhecidas as vulnerabilidades do Sul de Portugal no que respeita aos recursos hfdricos, devido ao aumento da temperatura ea reduc;ao do escoamento no Verao, e no que se refere ao esperado aumento do numero de dias corn temperaturas corn valores extremos. 0 Norte e o Centra do Pafs tern sido muito atingidos por fogos. A gestao de catastrofes, numa perspectiva preventiva, tern por objectivo minorar os efeitos nefastos das mesmas sabre as pessoas e o patrim6nio. Daqui decorre a necessidade de se fazer urn levantamento local dos riscos, tema que sera objecto do proximo capitula.

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Carlos Garrido

5. Analise dos riscos de catastrofes naturais a urn nivel local M.L. Carreno, O.D. Cardona e A.H. Barbat (2005), sugerem a utiliza<;ao de urn grupo de indicadores, formando urn indice de gestao de riscos, que se afigura bastante operacional e interessante, os quais medem o desempenho na gestao dos riscos e a sua eficiencia. 0 fndice utiliza uma escala dos nfveis atingidos, os quais sao comparados corn os nfveis desejados ou metas estabelecidas. 0 fndice foi construido a partir de quatro politicas publicas. Cada uma das quais compreendendo seis indicadores. Os autores designam o indice de gestao de riscos por RMI. 0 valor deste fndice e a media aritmetica dos valores de quatro indices:

• RMIRI- e uma medida da percep<;ao individual dos riscos; • RMIRR - compreende medidas de preven<;ao e de minora<;ao dos danos; • RMI 0 M - tern a ver corn a resposta as catastrofes e reconstru<;ao e apoio financeiro do Estado; • RMIFR- mede o grau de institucionaliza<;ao e de transferencia do risco. 0 valor de RMI e calculado para varias regioes da Colombia, para o pais e varios paises do continente americano. Cada sociedade apresenta a sua especificidade. No entanto, esta interessante e original experiencia merece ser estudada em detalhe e analisar-se a oportunidade da sua aplica<;ao a Portugal4 •

• 6.

Altera~6es

clirnaticas e irnpactos das catastrofes rneteorol6gicas.

As estatfsticas apresentadas nestes quadros evidenciam que as maiores catastrofes que se verificaram em Portugal nos ultimos quarenta anos sao de cariz meteorol6gico. E de admitir a hip6tese de que estes tipos de eventos naturais extremos se irao repetir corn mais frequencia, dependendo a dimensao dos seus impactos catastr6ficos de diversos factores, entre os quais as politicas preventivas prosseguidas. Provaveis impactos5 :

4 0 leitor interessado pode encontrar o artigo nos proceedings da Conferencia Internacional sobre o 250. 0 Aniversario do Terramoto de Lisboa de 1755. 5 Nao sao aqui listadas as necessarias medidas para a reduc;ao das vulnerabilidades, como por exemplo a actua <;i\o sobre o ordenamento do territ6rio e disciplina do mercado, combatendo a economia paralela e a corrup <;i\o, por tal tarefa ultrapassar o i\mbito deste simples artigo.

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0 risco de ocorrencia de cat<1strofes naturais em Portugal, p. 13-24

A- Alguns tipos de impactos econ6micos: 1 2 3 4

-

Prejuizos directos das ocorrencias. Despesas corn as operac;oes de emergencia, reabilitac;ao e reconstruc;ao. Despesas corn a formac;ao de tecnicos e educac;ao da populac;ao. Despesas de investimento em infra-estruturas e equipamentos mais vulneraveis ou mais necessarios a prevenc;ao. 5 - Provavel aumento dos premios relativos a algumas modalidades de seguros. 6 - Aumento das despesas de investimento na climatizac;ao de edificios, designadamente hospitais, creches e lares de terceira idade. 7 - Urn maior esforc;o financeiro e organizativo na gestao dos recursos hidricos. B - Alguns tipos de impactos sociais e culturais:

1 - Adaptac;ao das pessoas e das instituic;oes a uma nova realidade desenvolvimento de uma cultura de seguranc;a (necessaria uma acc;ao do Estado nesse sentido). 2 - Probabilidade de aumento da vulnerabilidade as catastrofes dos grupos de risco corn menos posses econ6micas. 3 - Maior sensibilizac;ao dos media para a tematica das alterac;oes climaticas e catastrofes naturais. 4 - Adaptac;ao dos curricula escolares a nova realidade. As catastrofes sao destruidoras de recursos naturais, econ6micos e financeiros. Por outro lado, a prevenc;ao tern custos. Ora os recursos econ6micos existentes sao escassos e de emprego alternativo, razao pela qual se deve seguir uma estrategia que apresente garantias minimas de eficiencia, sobretudo numa conjuntura econ6mica e financeira internacional desfavoravel.

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AS CATASTROFES: CAPACIDADE E VONTADE DEENCONTRARSOLU~OES

Ant6nio Joiio Santiago Portela Economista. Docente Universitario (Universidade Lusiada de Lisboa)



Resumo: Este artigo e urn depoimento breve sobre catastrofes, os seus principais factores caracterizadores, as principais causas das catastrofes de origem humana e as responsabilidades da humanidade, em particular das suas elites, na ocorrencia dessas catastrofes e na procura das respectivas solw;6es. Entre outras raz6es, sao invocadas as seguintes: incapacidade em dominar a complexidade da sociedade actual e das causas das catastrofes de origem humana; falta de eficacia dos mecanismos actuais de monitorizac;ao e controlo da evoluc;ao das sociedades; falta de "vontade" em aplicar soluc;6es, que embora eficazes na prevenc;ao e resoluc;ao das catastrofes, contrariam interesses sociais, econ6micos e politicos instalados. A actual crise econ6mica e as alterac;6es climaticas, estao entre algumas das situac;6es catastr6ficas mais referenciadas e ambas estao muito longe da sua resoluc;ao ... sobretudo por falta de vontade.

Palavras-chave: catastrofe; tipos de catastrofes: catastrofe natural; catastrofe de origem humana; factores caracterizadores das catastrofes: dimensao; intensidade; complexidade; durac;ao; frequencia; previsibilidade; ciclo catastr6fico; soluc;6es para as catastrofes; elite.

Abstract: This article is a brief testimony about catastrophes, their main characteristics, the main causes of human origin catastrophes and the responsibilities of humanity, especially its elites, in the occurrence of catastrophes and in seeking their solutions. Among other reasons, it emphasizes the following: inability to master the complexity of today's society and the causes of manmade disasters, lack of effectiveness of current mechanisms for monitoring and controlling the evolution of societies, lack of "will" to implement solutions that although effective in the prevention and resolution of catastrophes, conflict with installed social, economic and political interests. The current economic crisis and climate change are among some of the most referenced catastrophic situations, and both are very far from its resolution ... especially for lack of will.

Keywords: catastrophe; types of catastrophes: natural catastrophes, manmade catastrophes, characteristics of the catastrophes: size, intensity, complexity, duration, frequency, predictability; catastrophic cycle; solutions to catastrophes; human elite.

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Ant6nio Joiio Santiago Portela

1. Introduc;ao

Este depoimento pretende ser urn contributo para a discussao mais alargada da actual crise s6cio-econ6mica, das suas causas mais profundas e da procura de solw;6es futuras que coloquem a humanidade num patamar superior do seu desenvolvimento e que lhe permitam antecipar novas crises, atenuar os respectivos efeitos negativos e potenciar os impactos positivos. Baseamo-lo na teoria geral das catastrofes, que tern sido desenvolvida no seculo passado ate aos dias de hoje, por uma diversidade de pensadores e, obviamente, fazemo-lo na perspectiva da especie humana. A Teoria das Catastrofes esfon;a-se por descrever as descontinuidades que se podem apresentar na evolw;ao de urn sistema, admitindo-se que a evolw;ao global de urn sistema apresenta-se como uma sucessao de evolw;6es continuas, separadas por saltos bruscos de natureza qualitativamente diferente (THOM, 1995).

2. Noc;ao geral de catastrofe

Catastrofe, em linguagem comum, significa desgra<;a publica, calamidade, flagelo. Uma catastrofe pode ter origem em fen6menos naturais, em ac<;6es e comportamentos das comunidades humanas ou resultar da conjuga<;ao de fen6menos naturais e de ac<;6es humanas. De uma forma geral, a catastrofe tern uma conota<;ao negativa, embora, na perspectiva em que se vai desenvolver este artigo, a catastrofe corresponda a uma ruptura ou altera<;ao significativa nos pressupostos de desenvolvimento passado, tendo, em geral, urn impacto determinante dentro do universo em que incide e exigindo, por isso, solu<;6es diferentes para o futuro. Estas novas solu<;6es constituem uma manobra de subsistencia do conjunto do sistema gerido pelos seres humanos, como forma de: ./ atenuar ou eliminar os eventuais efeitos negativos da catastrofe; ./ potenciar os efeitos positivos; ./ assegurar novas regras de funcionamento da sociedade humana, mais eficazes na preven<;ao de futuras catastrofes identicas.

3. Tipos de catastrofes

Neste depoimento, vamos considerar apenas, dois grandes tipos de catastrofes: naturais e de origem humana. a) Catcistrofes naturais

Consideramos como catastrofes naturais, as catastrofes que tern a origem em fen6menos naturais de curta dura<;ao (terramotos, tsunamis, tempestades, ciclones,

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As catastrofes: capacidade e vontade de encontrar soluc:;6es, p. 25-36

tuÂŁ6es, cheias, etc.) ou de longa dura<;ao (aquecimento ou arrefecimento da terra; ocorrencia prolongada de fenomenos de curta dura<;ao, etc.). Urn exemplo classico de uma grande catastrofe natural, sera o da ocorrencia de uma manifesta<;ao vulcanica de dimens6es extremas no Lago Toba, na Sumatra, 70 a 75 mil anos atras e que tera reduzido, drasticamente, a popula<;ao humana mundial, alterando profundamente o clima e criando urn efeito de estrangulamento na evolu<;ao humana. As catastrofes naturais ocorrem, independentemente da vontade do homem, podem ser previsiveis em maior ou menor grau e o homem disp6e, em cada epoca da sua historia, de conhecimentos e tecnologias que lhe permitem atenuar ou eliminar os respectivos impactos negativos ou potenciar possiveis impactos positivos (controlo de cheias e uso da agua para irriga<;ao ou abastecimento de popula<;6es, por exemplo). Algumas catastrofes naturais sao provocadas ou potenciadas pela ac<;ao do homem, atraves do seu proprio processo de desenvolvimento e do uso indevido das tecnologias e/ ou da incorrecta percep<;ao dos impactos das suas descobertas. 0 homem sempre dominou melhor as tecnologias do que a complexidade do seu meio envolvente.

b) Catdstrofes de origem humana Quando uma catastrofe tern origem na actua<;ao humana, em geral, ou na actua<;ao de urn ou mais grupos, ela pode ter impactos negativos e/ ou positivos na sociedade e na economia de urn pais ou regiao ou na globalidade da terra e sabre a propria natureza e equilibrio da vida no planeta. A incapacidade de tomar medidas eficazes no dominio do ambiente, energia e agua, 0 descontrolo do sistema financeiro mundial, 0 agravamento das desigualdades sociais, a carteliza<;ao politica e economica das sociedades, sao alguns exemplos de causas da presente catastrofe economica e financeira e das replicas que se lhe irao seguir durante muitos anos, ate se chegar a urn novo modelo de desenvolvimento que contenha as solu<;6es e os equilibrios que deverao constituir as regras para as sociedades futuras.

4. Factores caracterizadores das catastrofes.

Qualquer catastrofe, quer seja natural, quer tenha origem na actua<;ao humana, pode caracterizar-se da seguinte forma: a)

Dimensiio ou intensidade

A dimensao de uma catastrofe pode ser medida atraves de parametros objectivos ou objectivados, intrinsecos a propria catastrofe ou relativos aos

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impactos externos desta, nomeadamente aqueles impactos que se reflectem directa ou indirectamente na sociedade humana. Nas catastrofes naturais referem-se, a titulo de exemplo algumas medidas: escalas de grandeza dos sismos; dimensao e velocidade de urn tsunami; extensao das areas afectadas, numero de paises atingidos ou impacto demografico da catastrofe; graus de aumento ou diminui<;ao da temperatura do ar ou da agua ou outros indicadores de altera<;6es climaticas). Nas catastrofes de origem humana, referem-se, a titulo de exemplo: indicadores associados ao crescimento e impacto da Internet, das redes sociais e das tecnologias de comunica<;ao, em geral; indicadores que descrevam a actual crise econ6mica, tais como: numero de paises afectados pela crise, dimensao das dividas soberanas, % de aumento ou quebra das exporta<;6es; numero ou % de empresas falidas; numero ou % de novas empresas; numero de paises que recorrem ao FMI; etc. A avalia<;ao da dimensao de qualquer catastrofe e sempre subjectiva, dependendo de quem avalia e da "distancia" a que esta o avaliador. Este enviesamento das avalia<;6es nao permite evitar que as catastrofes ocorram e vai implicar a adop<;ao de solu<;6es ineficazes. Diariamente, sao noticiadas micro catastrofes nacionais que concorrem, ao mesmo nivel de importancia, corn macro catastrofes em paises distantes. b) Complexidade

A complexidade de uma catastrofe tanto pode estar associada as caracteristicas intrinsecas da catastrofe em si e a natureza e numero de variaveis e de operadores ou agentes envolvidos ou afectados por ela, como aos respectivos impactos externos ou como ainda a multiplicidade e complexidade das solu<;6es que permitam: ./ atenuar ou eliminar os impactos negativos; ./ potenciar os impactos de sinal positivo; ./ prevenir identicas catastrofes futuras. Nas catastrofes naturais o esfor<;o parece ser no sentido de evoluir nas tecnicas de previsao das circunstancias em que estas ocorrem, na correla<;ao que tern corn outros fen6menos naturais ou humanos, no calculo das probabilidades de ocorrencia e na medida dos respectivos impactos, desenvolvendo solw;6es de antecipa<;ao e reac<;ao e alargando o tempo disponivel para a tomada de decis6es. Nas catastrofes corn origem na ac<;ao humana, elas tanto podem ter urn sentido positivo (descoberta de uma energia alternativa de baixo custo, segura, nao poluente e abundante; descobertas medicas que permitam a cura de doen<;as graves e ou epidemicas; obten<;ao de estabilidade militar, politica e s6cio-econ6mica numa determinada zona do globo), como podem ter urn sentido negativo, tal como se verifica corn os multiplos conflitos militares existentes, na actual crise

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As catiistrofes: capacidade e vontade de encontrar

solu~6es,

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econ6mica ou nos efeitos negativos do desenvolvimento no ambiente e na sustentabilidade do planeta. Nas catastrofes de origem humana, a dificuldade em encontrar solw;oes prende-se corn tres ordens de factores: ./ Complexidade politica, social, econ6mica e tecnol6gica das catastrofes desta natureza . ./ Falta de "vontade" em aplicar solw;oes, que embora eficazes na preven<;ao e resolu<;ao das catastrofes, contrariam interesses econ6micos e politicos instalados . ./ Falta de eficacia dos mecanismos actuais de monitoriza<;ao e controlo da evolu<;ao das sociedades, derivada da falta de vontade em os aplicar. Nas catastrofes de origem humana, a solu<;ao esta em aumentar muito a eficacia dos sistemas de monitoriza<;ao da sociedade e da economia, reduzir as disparidades sociais e econ6micas de paises e povos e fazer evoluir os sistemas democraticos.

c) Dura(iio A dura<;ao de uma catastrofe, tanto pode ser considerada como uma variavel da sua dimensao e complexidade, como pode ter uma vida aut6noma, merecendo ser destacada, sobretudo nas catastrofes complexas e de longa dura<;ao, como e o caso da actual crise. As solu<;6es associadas a crises que derivam do acumular de erros e exageros sociais e econ6micos durante largos periodos de tempo (p6s 2.u guerra mundial), passam sempre por solw;oes complexas e prolongadas no tempo.

d) Frequencia Entendemos por frequencia de uma catastrofe, o numero de vezes em que ela ocorre e que e indiciador da necessidade de encontrar solu<;6es . Quando uma catastrofe ocorre corn muita frequencia e/ ou afecta muitas entidades (desemprego, empresas falidas, pessoas afectadas por uma doen<;a, etc.), exige a procura de solu<;6es globais.

e) Previsibilidade. A previsibilidade de uma catastrofe constitui mecanismos que permitam urn factor determinante para que a humanidade desenvolva, antecipadamente, ultrapassa-la ou atenua-la quando ocorre. A previsibilidade de uma catastrofe, tanto se aplica as catastrofes naturais como as catastrofes corn origem na actua<;ao humana e, em ambos os casos, a evolu<;ao s6cio-econ6mica e do conhecimento tern permitido alargar os prazos de antecipa<;ao das catastrofes e melhorar os mecanismos de preven<;ao.

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0 ano 2010 foi pr6digo em contrariar essa capacidade de prever catastrofes naturais.

j) Natureza das solw;oes Todas as catastrofes tern uma diversidade de causas e efeitos, exigindo, por isso, uma diversidade de solw;6es. Se a humanidade quer progredir, deve procurar: ../ conhecer todas as condicionantes da vida neste planeta, dominando a sua complexidade; ../ melhorar a sua capacidade de determinar a cadeia ou sucessao de causas e efeitos das catastrofes; ../ melhorar continuamente a sua capacidade de determinar as condi<;6es e probabilidade de ocorrencia das catastrofes, tanto naturais como de origem humana; ../ ser mais eficaz na medida dos impactos previsfveis de uma catastrofe; ../ melhorar os meios e conhecimentos de que disp6e para atenuar ou eliminar os efeitos negativos de uma catastrofe ../ e, sobretudo, ter a capacidade e vontade de agir, a tempo, perante uma catastrofe que lhe pare<;a eminente. 0 maior cego e aquele que nao quer ver. Na procura de solu<;6es, a humanidade devera, continuamente, evoluir no domfnio da complexidade das catastrofes e assegurar-se, como especie, que tern vontade de encontrar essas solu<;6es.

5. Ciclos catastr6ficos

A sociedade humana tern caminhado, ao longo da sua hist6ria, ciclicamente, atraves das seguintes etapas: ../ Catastrofe- Em determinado momento da sua hist6ria da-se a ocorrencia de urn evento ou conjunto de eventos que criam uma ruptura corn o passado (catastrofe natural, guerra, revolu<;ao, choque petrolffero, descoberta tecnol6gica de grande impacto) . ../ Solu<;ao ou Solu<;6es - Em reac<;ao a catastrofe que ocorreu, os homens procuram encontrar a(s) solu<;ao(6es) para a catastrofe que ocorreu . ../ Equilfbrio do Sistema- Encontrada(s) a(s) solu<;ao(6es), os homens partem para uma nova etapa do ciclo, em geral, de maior equilfbrio e estabilidade, adoptando regras gerais de desenvolvimento adaptadas as novas realidades, tais como eles as percepcionam.

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Nas catastrofes de origem humana, quando as solw;oes encontradas sao apenas parciais e/ ou nao resolveram os problemas de fundo - sao apenas medidas paliativas - nova catastrofe volta a ocorrer, frequentemente num intervalo de tempo muito escasso (veja-se a proximidade entre as 1.~ e a 2.~ Guerras Mundiais e a actual crise socio-econ6mica cujas solw;oes de fundo ainda nao foram encontradas, podendo vir a gerar novas catastrofes). Enesta fase que se vao acumulando as causas que vao determinar novas catastrofes . ./ Catastrofe - Sem precisar das catastrofes naturais ou altera<;6es profundas na sua envolvente, os homens entram numa nova catastrofe, quando o "reservat6rio" criado pelas novas solu<;6es, e onde ele deposita os "residuos" da sua actividade, transborda. Na crise actual, nenhum mecanismo ou entidade de avalia<;ao e controlo de que todas as sociedades disp6em (tribunais, policias, banca central, organism os reguladores, "observat6rios", mecanismos eleitorais, economia social, sociedade civil, etc.) foi capaz de prever a catastrofe, mas faltou, sobretudo, vontade de actuar no sentido de a evitar.

6. Responsabilidades da Humanidade A sociedade humana, como urn todo, ea principal responsavel pelas catastrofes s6cio-econ6micas, essencialmente porque nao domina dois grandes grupos de factores que as condicionam: ./ Complexidade do universo e da vida na terra e da correla<;ao de todos os factores naturais e humanos; ./ Complexidade da natureza humana e das regras gerais que determinam a sua forma de actua<;ao, em particular, a actua<;ao das suas elites. Porque nao dominam sistemas complexos, nem avaliam correctamente a natureza do homem, as sociedades humanas tern revelado a incapacidade de: ./ Identificar e avaliar os factores que constituem as causas de uma catastrofe e os respectivos impactos desta. Em particular, avaliar os impactos "catastr6ficos" do seu proprio desenvolvimento, tais como: introdu<;ao de uma nova tecnologia, avan<;o da medicina na preven<;ao e cura de uma doen<;a, evolu<;ao demografica, evolu<;ao do nivel civilizacional e dos modelos de consumo, etc. ./ Avaliar o efeito da natureza da especie humana eo processo de constitui<;ao e actua<;ao das suas elites . ./ Monitorizar e determinar a eficacia das solu<;6es encontradas a cada momento, na sequencia de uma catastrofe.

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7. Papel das elites nas catastrofes de origem humana A sociedade humana integra todos os individuos da especie humana, mas a sua gestao cabe, apenas, a urn numero reduzido de pessoas que constituem a sua elite. Neste depoimento, vai-se definir elite como o conjunto de pessoas que, dentro de uma sociedade humana, tern efectivo controlo sobre a estrategia e gestao das respectivas organiza<;6es, sejam elas: estado, empresas, associa<;6es patronais e sindicais ou outras entidades de natureza cientffica, cultural, artlstica, etc. ou que, no plano individual e colectivo tern uma influencia 6bvia e marcante sobre a opiniao publica (modas, gostos, convic<;6es, praticas, etc.). Podemos alargar, mais ou menos, o ambito dessa elite, ampliando o conceito da importancia que alguem tern para a organiza<;ao a que pertence ou para o pais ou regiao em que vive, mas a verdadeira elite representa 1% e, no maxima, 3% de toda a popula<;ao de urn pais, regiao ou organiza<;ao. Conhecer as motiva<;6es, objectivos, comportamentos e funcionamento dessas elites e do seu universo de inter-rela<;6es e, em particular, o perfil predador de uma parte significativa dessa elite, e compreender melhor as causas das catastrofes de origem humana e quais as raz6es que estao na base das solu<;6es que sao encontradas para reequilibrar todo o sistema s6cio-econ6mico. A elite mundial, em geral, e a elite europeia, em particular, cometeram no p6s-guerra, durante 65 anos, tres tipos de erros graves: ./ Continuarem a invocar, valores, prindpios e praticas dos quais se foram, inexoravelmente, afastando, dia a dia - e aos quais nao sao hoje fieis . ./ Foram encontrando apenas pequenas solu<;6es parcelares para as catastrofes que foram ocorrendo, cuja aplica<;ao tardia e limitada foi sempre pouco eficaz para as evitar. ./ Tern procurado, corn sucesso, esconder a situa<;ao real das economias e sociedades e a respectiva insustentabilidade. 0 homem eo maior inimigo de si proprio, porque nao compreendeu a sua natureza de predador, a forma coma se constituem as suas elites e os factores motivadores de progresso, sobretudo os factores negativos (poder, prestfgio, dinheiro).

8. Aprendizagem corn a Hist6ria Ao longo da sua hist6ria recente, o homem e confrontado corn as seguintes realidades: ./ coma ser vivo, rege-se pelas mesmas regras milenarias da sua especie (no essencial, o ser humano nao mudou);

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v" tern conseguido evoluir nos seus conhecimentos cientificos e tecnicos e

v"

v" v" v"

v"

de gestao e organiza<;ao social (os quais acrescentam novos factores condicionadores de catastrofes), no sentido de patamares civilizacionais mais complexos e sofisticados; tern conseguido utilizar alguns dos conhecimentos e experiencias passados, absorvendo-os e integrando-os nos seus modelos de organiza<;ao social futuros, embora continue a nao perceber (ou a nao querer perceber) a enorme semelhan<;a que existe entre a sociedade actual e as civiliza<;6es dos ultimos 4.000 ou 5.000 anos; continua a nao dominar a complexidade do universo e da sua rela<;ao corn a especie humana; nao sabe tirar proveito do potencial do planeta em que vive, causando danos, por vezes irreparaveis, nos respectivos recursos; continua a nao querer reconhecer as regras gerais do comportamento humano, em geral, e das suas elites, em particular, minimizando os seus efeitos negativos; nao conseguiu encontrar modelos de monitoriza<;ao e interven<;ao social, econ6mica e polftica eficazes no controlo das elites que gerem as sociedades actuais.

Leituras recomendaveis Este depoimento nao se baseia especificamente em nenhum livro ou artigo sobre a Teoria das Catastrofes, exprimindo apenas a opiniao do autor. No entanto, recomenda-se a seguinte bibliografia: CASTRIGIANO, Domenico P. L. and HAYES, Sandra A. Catastrophe Theory, 2nd ed. Boulder: Westview, 2004. ISBN 0-8133-4126-4 PETTERS, Arlie 0., Levine, Harold and WAMBSGANSS, Joachim. Singularity Theory and Gravitational Lensing. Boston: Birkhauser, 2001. ISBN 0-8176-3668-4 SANNS, Werner. Catastrophe Theory with Mathematica: A Geometric Approach. Germany: DAV, 2000. V. S. AFRAJMOVICH, V. I. Arnold, et al., Bifurcation Theory And Catastrophe Theory, ISBN 3540653791 LEWIS Munford (1998)- Tecnica e civiliza<;ao. Madrid: Alian<;a Editorial, 1998. PosTON, Tim and STEWART, Ian. Catastrophe: Theory and Its Applications. New York: Dover, 1998. ISBN 0-486-69271-X. GILMORE, Robert. Catastrophe Theory for Scientists and Engineers. New York: Dover, 1993. ARNOLD, Vladimir Igorevich. Catastrophe Theory, 3rd ed. Berlin: Springer-Verlag, 1992. RENE THOM, Esquisse d'une semiophysique: Physique aristotelicienne et theorie des catastrophes, Interedition, Paris, 1989. Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, n.Q 11 /2010

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Ant6nio Joao Santiago Portela

THOM, Rene. Structural Stability and Morphogenesis: An Outline of a General Theory of Models. Reading, MA: Addison-Wesley, 1989. ISBN 0-201-09419-3. KuHN, Thomas S. La Structure des Revolutions Scientifiques. Paris, Flammarion, 1983. RENE Thorn, Paraboles et catastrophes, Flammarion, Paris, 1983. SAUNDERS, Peter Timothy. An Introduction to Catastrophe Theory. Cambridge, England: Cambridge University Press, 1980. WooococK, Alexander Edward Richard and DAvrs, Monte. Catastrophe Theory. New York: E. P. Dutton, 1978. ISBN 0525078126.

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AS CATASTROFES: EXEMPLOS REFERENCIAIS

Ant6nio Gouvea Portela Professor Catedratico Jubilado (Universidade Tecnica de Lisboa I IST)



Resumo: Uma solw;ao para urn problema tern sempre urn tempo de aplica<;ao e uma regiao de dimens6es finitas. Esquecer esta recomenda<;ao e correr o risco de atingir o estado pre-catastr6fico e mais uns meses ou anos e ocorre o irremediavel estado de catastrofe.

Palavras-chave: catastrofe; primados financeiro, fabril, do mercado, da inova<;ao e do social; agregados; chefias. Abstract: A solution to a problem has always a time for application and a region of finite dimensions. To forget this recommendation is to run the risk of achieving the pre-catastrophic state and a few months or years later the irretrievable state of catastrophe occurs.

Keywords: catastrophe; primacies: financial, manufacturing, marketing, innovation and social; aggregates; leadership.

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Ant6nio Gouvea Portela

1. Tema

Uma boa solw;ao para urn problema se aplicada por muito tempo ou usada para resolver problemas similares, termina sempre por uma «surpresa» boa ou ma, mas, em geral ma, isto e, numa «Catastrofe» 0 motivo reside no facto de o meio onde o problema foi identificado ir evoluindo em geral sem chamar muito a aten~ao porque os meios nao sao temporal ou espacialmente invariantes e acompanham o «resto do universo>> que e uma entidade em constante convulsao. Para desenvolver este tema recorre-se a exemplos correntes mas referenciais tais como: financeiros, fabris, mercado, inova~ao, sociais e administrativos e as multiplas composi~6es, misturas e conflitos de interesses.

2. Exemplos 2.1. Primado Financeiro

Uma empresa esta em dificuldades e surgem multiplos problemas que, a parecem ser de natureza financeira. A administra~ao recorre a urn gestor financeiro, que mostrou ser uma boa escolha porque em 2 a 3 anos modernizou a contabilidade, reduziu os maus devedores, pagou as dividas aos credores, reduziu o recurso ao credito bancario. Mas este esfor~o financeiro fez esquecer o envelhecimento do sistema fabril, que a actividade mercantil nao foi renovada, que e urgente a necessidade de inovar e ate que alguns problemas sociais foram descorados. A administra~ao tentando encontrar uma solu~ao procurou esclarecer-se e tomou conhecimento da frequencia de problemas nao financeiros. Assim para satisfazer a actividade fabril, seria necessaria adquirir urn moderno equipamento e contrair urn vultuoso emprestimo a saldar em 3 anos. Para o gestor financeiro esta solu~ao era urn crime de lesa-majestade, para o responsavel pelo mercado lembrou a dificuldade de vender os novos produtos que vao ser fabricados pela nova fabrica que s6 tern compradores em mercados externos. A Administra~ao tern ainda uma solu~ao que consiste em vender a empresa tal como esta porque talvez haja alguma entidade especializada em comprar empresas a borda da falencia mas recupera-las. Esta solu~ao pode criar problemas sociais muito dolorosos. Se a administra~ao prolongar a sua indecisao por mais dois anos dificilmente a empresa escapa a falencia. administra~ao,

Conclusao, a muito boa solu~ao de resolver a situa~ao financeira foi prolongada por demasiado tempo e absorvendo quase em exclusivo a aten~ao da administra~ao, converteu-se num desastre ou catastrofe.

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As catastrofes: exemplos referenciais, p. 37-48

2.2. Primado Fabril

A administra<;ao reconhece que corn o velho equipamento fabril e difkil concorrer e que alguma moderniza<;ao e uma medida essencial e urgente. Foi executado urn projecto que continha algumas decisoes importantes, nomeadamente instalar a nova fabrica mas ja agora num novo local e ate numa outra regiao mais apropriada. A necessidade de recorrer a urn credito a medio prazo podera ser resolvido pelo fornecedor do equipamento e tal parece a administra<;ao razoavel esquecendo, porem, que o ultimo pagamento coincide em geral corn o termo da constru<;ao da fabrica que ainda nada produziu e nada vendem. Alias o departamento que gere o mercado nao tern ainda experiencia na venda dos novos produtos a fabricar. Se outra regiao foi escolhida, criou-se urn problema social de primeira grandeza porque e necessaria especializar novas equipas e encontrar solu<;6es para os operadores excedentarios da velha unidade fabril que vai cessar a sua actividade. 0 problema financeiro e enorme e implica o recurso a credores exigentes e nao clementes 0 que pode apressar a ÂŤcatastrofeÂť. Conclusao, urn problema fabril desta magnitude nao se pode realizar sem resolver previamente os problemas financeiros, mercantis, sociais e ate incentivar a inova<;ao. A administra<;ao devia nomear urn responsavel para gerir este complicado problema composto cuja solu<;ao nao foi resolvida a tempo, convertendo o problema numa catastrofe.

2.3. Primado do Mercado

A administra<;ao reconhece que a explora<;ao de novos mercados e novos modos de apresentar a mercadoria ea propaganda dos produtos vendidos terao que ser reformados e dar mais importancia ao gerente do mercado ou substituilo, mas tambem dar mais audiencia ao gerente, ouvindo corn aten<;ao as sugestoes e examinando as propostas de ac<;ao e os programas a implementar no departamento. A solu<;ao apresentada assenta na diversifica<;ao da oferta criando novos produtos e assim abrir novos centros completando a rede nacional e alguns a serem instalados em mercados internacionais para aprender a vender em ambientes de grande e diversificada concorrencia. A administra<;ao concorda corn a proposta e encarrega o gerente do departamento de mercados de executar o plano e instalar os novos postos referidos na proposta.

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Mas os problemas de mercados sao de natureza composta e nao se podem resolver sem a tender as implica<;6es com os restantes departamentos, fabril, social, financeiro e da inova<;ao. Multiplos problemas sao reconhecidos coma importantes. Esta a nova fabrica habilitada a fabricar e abastecer os novas mercados com produtos competitivos em qualidade e pre<;o? Sera facil habilitar a tempo novas tecnicos na venda dessas novas mercadorias em mercados internacionais? Coma resolver a habilita<;ao dos tecnicos tanto no activo coma os supranumerarios? Coma dar apoio aos inovadores e criadores do departamento da inova<;ao para incrementar as descobertas cientificas e tecnicas tao necessarias a sustentabilidade da empresa atraves das inclemencias e das surpresas? Novamente sao sugeridas solu<;6es mitigadores tais coma: contratar um conhecido e reputado mercador internacional que se proponha vender nos mercados internacionais tudo quanta for fabricado desde que as normas de qualidade sejam satisfeitas e os pre<;os permitam a coloca<;ao da mercadoria ou servi<;o nesses mercados internacionais. Alguns anos decorridos e tudo quanta exporta por intermedio desse reputado mercador fa-lo a pre<;os esmagados para poder concorrer com a India ou a China ate que ocorre o espectro duma famigerada falencia. No mercado interno as normas de qualidade sao cumpridas pela empresa porem o meio mercantil esta pejado de concorrentes que nao cumprem as regras da concorrencia oficiais ate porque a mercadoria e servi<;os vindos do estrangeiro nao sao controlados com exigencia pelos servi<;os nacionais. Normalmente a mercadoria vinda do estrangeiro tem dais pre<;os o que se pratica na na<;ao de origem e outro, em geral bonificado, nos mercados internacionais mais pobres para assim poderem escoar excedentes e praticar dumping. Conclusao, os problemas de mercado nao tem solu<;ao conveniente sem resolver previamente os problemas financeiros, fabris, sociais e de inova<;ao. Ha ainda que acrescentar as seguintes d'Ltvidas: a legisla<;ao nacional tem capacidade legal e esta disposta a fazer cumprir a Lei tambem as grandes empresas quer as legalmente nacionais mas de gestao internacional quer as que sao abertamente internacionais. A administra<;ao devia nomear um responsavel para gerir este complicado problema mas complementar com interven<;6es da sua responsabilidade. 0 cumprimento da Lei tem de ser garantido celere e aut6nomo. A lei tem de ser simples curta e clara As catastrofes sao sempre devidas a atrasos de algum das participantes directos ou intermediarios que com as suas hesita<;6es e delongas retem o tempo suficiente para inutilizar todos os esfor<;os dos restantes intervenientes.

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As catastrofes: exemplos referen ciais, p. 37-48

2.4. Primado da Inova9iio

Ha sempre uma probabilidade finita de introduzir urn aperfei<;oamento num artefacto, encontrar uma nova aplica<;ao. Tambem ha fen6menos de natureza «serendipendica>> que permitem descobrir coisas novas ao procurar solu<;oes para outros problemas. Tambem ha genios que se nao podem perder ou destruir para satisfa<;ao de vaidades e ambi<;oes de medfocres. Nos passados milenios houve perfodos obscuras onde inovar era crime e urn perigo para a sociedade ou religiao mas outros luminosos onde os inovadores eram aceites e reconhecidos e apreciadas as suas descobertas, inven<;oes e conceitos formais. Ja se ouve roncar os perigos da inova<;ao. Ao que parece ha que por regras eticas, criar legisla<;ao, pois parece que nem tudo se deve esclarecer ou saber. Ha que reconhecer a existencia de demasiados travestis e imitadores da ciencia que convem desmascarar porque hoje ha muita coisa que se divulga como ciencia e e apenas corn 0 fim de aperfei<;oar a imagem pessoal. Ha medicamentos que sao c6pias de outros, artigos apresentados como cientfficos mas que sao apenas decalcados habilidosamente dos originais. Patentes roubadas aos seus verdadeiros autores. 0 cientista diz sempre que meios usou na sua descoberta para que todo e qualquer descontente possa convencer-se da descoberta repetindo a observa<;ao corn os meios referidos pelo autor. 0 descontente pode na mesma revista descrever as suas duvidas. Finalmente a ciencia nao fornece verdades para acreditar e converter em conhecimento definitivo porque a cada nova descoberta ha que rever esse conhecimento. Conclusao, urn problema da inova<;ao e muito semelhante ao da arte, da filosofia, da moral, da etica, da politica, levando muito tempo a reconhecer o seu valor e qualidade. Chegam a ser seculos para se dar merito aos autores. Mas quanto mais delongas mais propiciamos a ocorrencia de catastrofes.

2.5. Primado do Social

0 problema social deriva dum problema fundamental que resulta do conceito de for<;as de «agrega<;ao>>. 0 tema da «agrega<;ao>> estando subjacente ao social e politico e tao vasto e intrincado que nao cabe aqui introduzi-lo mas apenas usar alguns conceitos e conclusoes. Se essas for<;as de «agrega<;ao>> nao existissem nao havia nucleoes, electroes, atomos, moleculas, bases qufmicas para seres vivos, celulas, protefnas e seres vivos, plantas, animais e seres humanos e as suas enormes agrega<;oes.

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Ant6nio Gouvea Portela

Para simplificar a exposi<;ao recordam-se as agrega<;6es de insectos, peixes, aves, mamiferos e humanos. Para todos havia problemas de alimenta<;ao, habita<;ao e defesa que envolvia opera<;6es colectivas e estas exigiam uma chefia para orientar e distribuir fun<;6es no agregado para que este operasse como uma entidade (mica e nao como uma horda disparada onde cada membro operava como entendesse. Assim uma agrega<;ao s6 se completa quando possuir urn chefe. 2.6. Agregados e suas Chefias

Ha essencialmente dois modos distintos de criar uma chefia: • 0 chefe e imposto a agrega<;ao por outrem, e.g. 0 chefe pode ate nao ser urn membro do agregado como sucede por conquista ou aquisi<;ao da entidade a chefiar. • 0 chefe e urn membro do agregado e a sua escolha resulta da aplica<;ao de varios procedimentos como por exemplo: - 0 chefe e o mais forte e havera competi<;ao e luta entre os candidatos como sucede corn leoes, carneiros, lobos-marinhos, peixes e aves etc. e podem ocorrer feridas graves e ate a morte. - A escolha do chefe nao envolve contactos entre os concorrentes, e sao exemplos: o que faz o melhor ninho ou tern a melhor ou maior plumagem ou faz a melhor acrobacia ou dan<;a, ou canta e trina, etc. - A escolha e feita exclusivamente pelas femeas que buscam o macho que consideram o mais adequado.

2.7. Agregados Humanos

Entre humanos podem encontrar-se escolhas identicas as referidas para animais mas sao mais complexas porque os competidores recorrem a artefactos nomeadamente armas e criam clientelas que combatem pelos chefes concorrentes. Os tipos d e agregados humanos sao hoje praticamente inumeraveis mas alguns sao os mais praticados ou referidos. • G - o agregado da chamada democracia Grega estava particionado em tres partes de dimensoes diferentes: Parte Gl era constituida pelos membros da chefia, da nobreza, da corte, do conquistador, do ditador ou rei, cerea 3 a 10 % da popula<;ao. Parte G2 era formada por artesaos, agricultores, comandos subalternos de soldados e marinheiros, chefes tribais e regionais, cerea de 5 a 8% da popula<;ao.

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As catastrofes: exemplos referenciais, p. 37-48

Parte G3 era formada pelos escravos, servos da gleba, prisioneiros, remadores das galeras, criminosos, etc., e representavam a restante popula<;ao. 56 votavam os membros da parte Gl e s6 estes procuravam imitar os comportamentos e ademanes de uma «democracia». Estas democracias duravam algum tempo e em algumas regioes, mas apressadamente regressavam aos reinos, as cidades e as ditaduras. • R- o agregado Romano foi durante algum tempo uma democracia do tipo grego e tambem entremeavam corn ditaduras as quais tinham uma dura<;ao de 3 meses e que excepcionalmente podiam ser renovadas por outro periodo. Os romanos civilizaram-se corn a ocupa<;ao da Etruria e foram brevemente monarquicos, depois republicanos mas eram essencialmente imperialistas. • N-o agregado N6rdico deu origem no ocidente, a muitos ramos nomeadamente, aos normandos e bret6es que adoptaram a solu<;ao de criar duas partes. A parte normanda constituida essencialmente pelo conquistador normando e seu sequito e a parte restante nao normanda. A parte normanda ocupava o castelo e muralhas circundantes e tinha legisla<;ao propria que lhe conferia certas prerrogativas: era possuidora do territ6rio que conquistou, dispunha do direito de possuir armas e fazer uso delas, tinha 0 direito exclusivo a ca<;a e pesca e a cobran<;a de urn quinhao das colheitas e frutos produzidos ou cultivados no territ6rio. A parte nao normanda trabalhava as terras e pagava os ja referidos quinhoes das colheitas e frutos a troco duma protec<;ao contra invasores externos. • U - os agregados corn Universalidade. Os pensadores de todas as epocas tinham questoes, duvidas e respostas nao muito convincentes e tambem verdades que converteram em credos. Entre os credos nasceu a necessidade da existencia de divindades e de locais onde viviam ou pelo menos apareciam em certas ocasi6es. A necessidade de proteger ou dar uma solu<;ao a morte, aos cadaveres, enterrando, queimando, embalsamando, afogando, de dar importancia e solenidade ao nascimento, ao casamento e sobrelevando tudo isto acreditando em divindades e nos modos de as respeitar e a recear os agravos praticados, etc. Todos estes rituais e credos deram origem a religioes que sao agregados de uma rara coesao e que tern regras tao estritas a cumprir pelos fieis que dao origem a martires e santos. Os agregados religiosos e os politicos nao coincidem em geral e criam conflitos de fundo religioso e politico que se prolongam por decadas ou centenas de anos sem solu<;ao aparente.

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Ant6nio Gouvea Portela

Ha que acrescentar os conflitos entre agregados religiosos distintos que se afiguram eternos e ainda entre agregados de politicas diversas. • 0 - Outros agregados corn relevancia. Sao agregados que tern raizes profissionais, que procuram conservar direitos adquiridos e acrescentar outros na defesa colectiva e profissional. Actividades ludicas criam amizades e formam agregados influentes ate na politica. Amizades de entre viventes em vilas, bairros, cidades tambem formam amizades corn influencia nas decis6es e comportamentos e constituem ate agregados formais. Todos estes agregados tern chefias e geralmente estes chefes sao membros de mais de urn agregado o que dificulta urn comportamento linear e coerente a esses chefes que passam a possuir muitas faces e imagens a defender.

2.8. Da Verdade da Mentira e do «Permeio»

As formas puras de verdade e mentira nao existem no mundo real. 0 que existe sao formas no interior desse vasto intervalo de valores que vao de 0 para a mentira pura a 1 para a verdade pura. Sao valores como 0.1 para uma grande mentira e 0.9 para uma grande verdade e o 0.5 para uma perfeita oculta<;ao. Assim, a busca do responsavel pela ocorrencia de urn grande cataclismo e sempre urn processo tortuoso e ramificado porque num projecto onde intervieram centenas ou milhares de operadores atribuir a urn homem ou a uma equipa urn valor de culpa, 0 a 1 isto e, de culpado a nao culpado e urn acto penoso para quemjulga. Mas urn cataclismo pode ocorrer moto proprio e por sua propria culpa e dai que nao e possivel identificar urn exclusivo responsavel. Porque e conveniente para sossego das almas e vidas culposas, em geral e 0 ultimo interveniente que e responsabilizado! «vae victis !». Mas as penas sao leves.

3. Nota Final

0 verdadeiro sentido da palavra catastrofre e o do grego original, <<acontecimento inesperado» mas esta interpreta<;ao tern hoje o reduzido significado de <<tragedia». Os romanos ainda interpretavam como <<desenlace».

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As ca tastrofes: exemplos referenciais, p. 37-48

Leituras recomendaveis

Este depoimento nao se baseia especificamente em nenhum livro ou artigo sobre o tema das Catastrofes, exprimindo apenas a opiniao do autor. No entanto, recomenda-se a seguinte bibliografia: CASTRIGIANO, Domenico P. L. and H AYES, Sandra A. Catastrophe Theory, 2nd ed. Boulder: Westview, 2004. ISBN 0-8133-4126-4 PETTERS, Arlie 0., Levine, Harold and WAMBSGANSS, Joachim. Singularity Theory and Gravitational Lensing. Boston: Birkhauser, 2001. ISBN 0-8176-3668-4 SANNS, Werner. Catastrophe Theory with Mathematica: A Geometric Approach. Germany: DAV, 2000. V. S. AFRAJMOVICH, V. I. ARNOLD, et al., Bifurcation Theory And Catastrophe Theory, ISB~ 3540653791 LEwrs MuNFORD (1998) - Tecnica e civiliza<;ao. Madrid: Alian<;a Editorial, 1998. PosTON, Tim and STEWART, Ian. Catastrophe: Theory and Its Applications. New York: Dover, 1998. ISBN 0-486-69271 -X. GrLMORE, Robert. Catastrophe Theory for Scientists and Engineers. New York: Dover, 1993. ARNOLD, Vladimir Igorevich. Catastrophe Theory, 3rd ed. Berlin: Springer-Verlag, 1992. RENE THOM, Esquisse d'une semiophysique: Physique aristotelicienne et theorie des catastrophes, Interedition, Paris, 1989. THOM, Rene. Structural Stability and Morphogenesis: An Outline of a General Theory of Models. Reading, MA: Addison-Wesley, 1989. ISBN 0-201-09419-3. KuHN, Thomas S. La Structure des Revolutions Scientifiques. Paris, Flammarion, 1983. RENE THOM, Paraboles et catastrophes, Flammarion, Paris, 1983. SAUNDERS, Peter Timothy. An Introduction to Catastrophe Theory. Cambridge, England: Cambridge University Press, 1980. WooococK, Alexander Edward Richard and Davis, Monte. Catastrophe Theory. New York: E. P. Dutton, 1978. ISBN 0525078126.

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DE UMA VERSAO ACTUALIZADA DA EXPLICA<;AO DA EVOLU<;AO DA ECONOMIA PORTUGUESA

Ant6nio Rebelo de Sousa Doutor em Economia Professor Associado (Universidade Lusfada de Lisboa) Professor Associado corn Agregac;ao (Universidade Tecnica de Lisboa)

Ant6nio Manuel Quintino Mestre em Investigac;ao Operacional e Engenharia de Sistemas (Instituto Superior Tecnico)



Resumo: 0 presente artigo pretende actualizar e aprofundar estudo anteriormente realizado pelos autores (2006), procurando-se sintonizar as variaveis explicativas da evolw;ao do nivel de actividade produtiva da economia portuguesa, no decurso das ultimas tres decadas. Foram considerados diversos modelos econometricos, desde modelos aditivos puros a modelos elaborados recorrendo a logaritmos neperianos, passando por modelos dinamicos, de acordo corn os quais as variaveis explicativas corresponderiam as taxas de varia<;ao. Chegou-se a conclusao de que o PIB- Produto Interno Bruto portugues e, sobretudo, sensivel ao Consumo Privado de Bens Nao Duradouros e a FBCFForma<;ao Bruta de Capital Fixo privada, nao fazendo sentido confundir o neoKeynesianismo ou o novo-Keynesianismo corn posi<;6es maximalistas que conduzam a defesa da tese de que o investimento publico devera ser, em todas as circunstancias, a variavel impulsionadora do desenvolvimento econ6mico.

Abstract: "On an updated version of the explanation of the Portuguese economy's

evolution" This article aims to update and deepen a study that was previously done by the authors (in 2006). This paper seeks to syntonize the explanatory variables on the developments that took place in the Portuguese economy's productive activity over the last three decades. Several econometric models were taken into consideration, from pure additive models to models that were created by using Naperian logarithms, as well as dynamic models, which say that the explanatory variables would correspond to variation rates. The study concludes that the Portuguese Gross Domestic Product (GDP) is particularly responsive to the Private Consumption of Non Durable Goods and to private Gross Fixed Capital Formation (GFCF), being that it makes no sense to deem that neo-Keynesianism or New Keynesianism are in any way connected to advocating the thesis that says that public investment shall be, in any and all circumstances, the variable that boosts economic development.

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Ant6nio Rebelo de Sousa e Ant6nio Manuel Quintino

1.

Introdu~ao

Pretende-se corn o presente artigo actualizar e aprofundar estudo anterior1, procurando-se sintonizar as variaveis explicativas da evolw;ao do nivel de actividade produtiva da economia portuguesa, no decurso das ultimas tres decadas. Foram considerados varios tipos de modelos econometricos, desde modelos aditivos puros a modelos elaborados recorrendo a logaritmos neperianos (e corn uma "componente" multiplicativa), passando por modelos dinamicos, de acordo corn os quais as variaveis explicativas corresponderiam a racios ou, melhor dizendo, a taxas de varia<;ao. 0 periodo objecto do presente estudo vai de 1980 a 2009, podendo ser considerado bastante significativo e compreendendo fases diferenciadas de evolu<;ao da economia portuguesa. Consoante os casos, foram consideradas diversas variaveis independentes, tais como o Consumo Privado Total a pre<;os constantes, as Remunera<;6es do factor produtivo trabalho (a pre<;os constantes), a Divida Directa do Estado (a pre<;os constantes), a Divida Directa do Estado em percentagem do PIB- Produto Interno Bruto, a Divida Directa do Estado "per capita", a FBCF- Forma<;ao Bruta de Capital Fixo Privada a pre<;os constantes, a FBCF- Forma<;ao Bruta de Capital Fixo Publica, tambem a pre<;os constantes, o Consumo Publico (a pre<;os constantes), o Consumo Privado de Bens Nao Duradouros (pre<;os constantes), o Consumo Privado de Bens Duradouros (pre<;os constantes), as Exporta<;6es, as Importa<;6es, o Saldo Import - Export, a Popula<;ao Activa, a Popula<;ao Empregada, a Popula<;ao Desempregada, o Numero de Alunos Matriculados no Ensino Superior, a Investiga<;ao e Desenvolvimento (total) em percentagem do PIB e a Investiga<;ao e Desenvolvimento - Empresas - em percentagem do PIB. Corn base nos diferentes modelos considerados procura-se chegar, no final, a algumas conclus6es que poderao ser tidas como relevantes para a compreensao nao, apenas, dos desafios corn que esta confrontada a economia portuguesa, como tambem para a defini<;ao de politicas consistentes que permitam, a prazo, a inversao do "ciclo da crise" ea consecu<;ao de urn modelo de desenvolvimento sustentado para a economia portuguesa.

2. Da

utiliza~ao

de modelos aditivos convencionais

Come<;amos por considerar tres modelos aditivos convencionais, a saber: (1) Y 1 = a 0 + a 1Cpt' em que

Y = PIB a pre<;os constantes de 2000 (variavel dependente) Cpt

= Consumo

privado total a pre<;os constantes.

1 Vide Rebelo de Sousa, Ant6nio e Quintino, Ant6nio in "Das variaveis explicativas do crescimento da Economia Portuguesa", Rev. Economia & Empresa, Universidade Lusiada Editora, 2006.

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Lusiada. Economia & Empresa, n.Q 11/2010


De uma versao ac tualizada da explica<;ao da evolu<;ao da economia portuguesa, p . 49-64

(2) yl = ao + a] cpt + a2II, em que I1 = FBCF total a pre<;os constantes. (3)

Yt

= ao + a1Cpt + a 2It + a 3CpDt'

em que: cpDt

= Consumo privado de bens duradouros a pre<;os constantes.

Para qualqu er urn dos modelos considerados, afigura-se possivel constatar que o nosso PIB depende, em primeira linha, do Consumo Privado Total. 0 terceiro modelo (corn urn R2 de 0,999) eo que apresenta urn grau mais elevado de "explicabilidade", verificando-se que o coeficiente "Beta" correspondente ao Consumo Privado Total atinge os 0,825, enquanto que o coeficiente "Beta" relativo a FBCF total se situa nos 0,267 (vide Quadro 1) . Curiosamente, o coeficiente "Beta" relativo ao Consumo Privado de Bens Duradouros e negativo, havendo, por conseguinte, uma rela<;ao inversa entre esta vari<3.vel e o PIB. Nao sendo facil explicar este tipo de rela<;ao, afigura-se possivel admitir que quando os consumidores advinham a proximidade de urn periodo de restri<;6es (decorrente, por exemplo, de uma recessao ou de uma para-recessao que se avizinha) antecipem as decis6es de consumo de bens duradouros ("enquanto for, ainda, possivel comprar o carro novo ou a televisao nova, compramos").

QUADRO I- Coeficientes Modelo n.Q

Coeficiente "Beta"

Estatistica "t"

Significancia

1. Consum o Privado Total a pre<;os

constantes

0,998

82,802

0,000

constantes

0,844

34,757

0,000

FBCF a pre<;os constants

0,162

6,678

0,000

constantes

0,825

36,822

0,000

FBCF a pre<;os constantes

0,267

6,377

0,000

-0,089

2,9188

0,007

2. Consumo Privado Total a pre<;os

3. Consumo Privado Total a Pre<;os

Consumo Privados Bens Duradouros a pre<;os constantes

NOTA - Variavel dependente - PIB a pre<;os constantes

Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, n.Q 11/2010

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Ant6nio Rebelo de Sousa e Ant6nio Manuel Quintino

3. Da utiliza<;ao de modelos dinamicos

Procurou-se, seguidamente, considerar quatro modelos econometricos aditivos corn variaveis explicativas dinamicas, i.e., que correspondem a taxas de varia<;ao e, por conseguinte, a racios, indo-se ao encontro das contribui<;6es positivas do modelo das vantagens competitivas dinamicas. Deste modo, foram considerados os seguintes modelos: fl.r:

(1) -

Y,

flCP,

+ a 1- - ; em que

= a0

cp,

flY

- ' = taxa Y,

de varia<;ao do PIB a pre<;os constantes de 2000 (variavel

dependente) flC -'-" = taxa de varia<;ao do consumo privado.

cp,

fl.r: flCpr M (2) = a 0 + a 1- - + a 2- , em que Y, Cp, I, 1

M, I, flYr (3) __

y

r

= taxa = <X

o

de varia<;ao da FBCF privada.

flC )/ M flS B_MT + <X __ __ ,c I_ + <X2_ I 1 + <X3s pr

em que flS BMT

= taxa

t

BMT

,

de varia<;ao da Balan<;a de Mercadorias.

SBM T

fl.r:

(4) -

Y,

= <Xo +

flCP,

Mxpt Expt

cpf

em que - - = taxa

flS BMT Mxpt + a 3 - -+ a4- -, I, sBMT Expt

M,

al - - + a 2-

d

. _ d _ e vana<;ao as exporta<;oes.

0 quarto modelo e 0 mais "explicatiV0 11 , constatando-se que a taxa de

varia<;ao do PIB depende, em primeiro lugar, da taxa de varia<;ao da FBCF (privada), seguindo-se-lhe a taxa de varia<;ao do Consumo Privado. As taxas de varia<;ao do Saldo da Balan<;a de Mercadorias (Exporta<;ao lmporta<;ao) e das Exporta<;6es tern, tambem, algum peso explicativo, o que significa que, pelo menos em parte, se aplica urn //export led growth model// (vide Quadro 11).

54

Lusfada. Economia & Empresa, n .Q 11/2010


De uma versao actualizada da explicac;ao da evoluc;ao da economia portuguesa, p. 49-64

QUADRO II- Coeficientes Coeficiente "Beta"

Estatfstica

0,846

8,261

0,000

0,522 0,439

4,046 3,407

0,000 0,002

0,495

4,063

0,000

taxa de varia<;ao da FBCF privada

0,457

3,758

0,001

taxa de varia<;ao da Balan<;a de Mercadorias

0,172

2,097

0,046

0,289

2,251

0,034

taxa de varia<;ao da FBCF privada

0,525

4,797

0,000

taxa de varia<;ao da Balan<;a de Mercadorias

0,256

3,296

0,003

taxa de varia<;ao das exporta<;5es

0,272

2,893

0,008

Modelo n .Q

"t"

Significancia

1. taxa de varia<;ao do consumo

privado 2. taxa de varia<;ao do consumo

privado taxa de varia<;ao da FBCF privada 3. taxa de varia<;ao do consumo privado

4. taxa de varia<;ao do consumo privado

Nota: Variavel dependente-

~;..;:.

4. De modelos aditivos explicativos da evolw;ao da Divida Directa do Estado Coma em todos os modelos, pressupomos que todas as outras variaveis que poderiam ser utilizadas (p.ex, no caso vertente, as variaveis correspondentes aos impostos directos e indirectos) permanecem imutaveis- analise ceteris paribus - o que, naturalmente, corresponde a uma simplificat;ao analitica. Foram considerados quatro modelos alternativos explicativos da evolut;ao da Divida Directa do Estado, a saber: (1) Div, = a 0

+ a 1 CPNDt' em que

Div1 = Divida Directa do Estado a pret;os constantes (variavel dependente); CPNDt

= Consumo Privado de Bens Nao Duradouros a pret;os constantes.

Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, nQ 11/2010

55


Ant6nio Rebelo de Sousa e Ant6nio Manuel Quintino

(2) Div 1 = a 0 + a 1CPNDt + a 2Poput' em que Poput = Popula~ao desempregada;

(3) Div 1 = a 0 + a 1CPNot + a 2PoP, 11 + a 3A 51, em que A 51= Alunos matriculados no ensino superior;

(4) Div1 = a 0 + Irt

a 1 CPNm

+ aloput + a 3A 51 + aipt' em que

= FBCF publica a

pre~os

constantes.

Dos quatro modelos considerados, o mais "explicativo" resulta de uma analise ao Quadro Ill.

e o 4Q,

conforme

QUADRO III- Coeficientes Modelo n.Q

Coeficiente "Beta"

Estatistica "t"

Signifid1ncia

1 Consumo Privado Bens Nao

0,978

24,760

0,000

Duradouros a pre<;os constantes

0,910

28,910

0,000

Popula<;ao desempregada

0)62

5)56

0,000

Duradouros a pre<;os constantes

1,237

11,977

0,000

Popula<;ao desempregada

0,129

4,492

0,000

-0,325

-3,280

0,003

1,557

13,067

0,000

0,212

6,621

0,000

-0,954

-5,165

0,000

0,334

3,787

0,001

Duradouros a pre<;os constantes 2 Consumo Privado Bens Nao

3 Consumo Privado Bens Nao

Alunos matriculados no ensino superior 4 Consumo Privado Bens Nao Duradouros a pre<;os constantes Popula<;ao desempregada Alunos matriculados no ensino superior FBCF publica a pre<;os constantes

-

Nota: Varii'ivel dependente - Div1 - Divida Directa do Estado a pre<;os constantes.

56

Lu siada. Economia & Empresa, n.Q11/2010


De uma versao actualizada da explica<;ao da evolu<;ao da economia portuguesa, p. 49-64

A principal variavel explicativa da evolw;ao da Divida Directa do Estado, no periodo compreendido entre 1980 e 2009, foi o Consumo Privado de Bens Nao Duradouros (Beta de 1,557), seguindo-se-lhe a FBCF publica (Beta de 0,334) ea Popula<;ao Desempregada (Beta de -0,954). A evolu<;ao do Consumo Privado de Bens Nao Duradouros esta associada a maior ou menor expansao (ou contrac<;ao) da economia e, por conseguinte, existe uma correla<;ao positiva entre expansao e endividamento, apresentando-se, tambem, natural que a Divida do Estado aumente corn a FBCF publica. Por outro lado, a evolu<;ao da popula<;ao desempregada apresenta-se como uma variavel, tambem ela, "explicativa" da Divida Directa do Estado. Ja a rela<;ao inversa existente entre o numero de alunos do ensino superior e a Divida Directa do Estado nao se apresenta tao linear. Tudo indica que tal resulta nao do facto de o numero de alunos no ensino superior corresponder a uma variavel explicativa da evolu<;ao da Divida Publica, mas antes de existir uma coincidencia estatistica ao longo das ultimas decadas: realmente, o numero de alunos do ensino superior tern vindo a aumentar e tal tern, tambem, que ver corn a evolu<;ao do PIB p.c. , a longo prazo; por outro lado, a Divida do Estado tern aumentado e tal, tern, tambem, que ver corn o dito PIB p.c. .

5. Da recriac;ao do modelo explicativo de 2006.

Partindo das mesmas variaveis explicativas utilizadas em artigo elaborado pelos autores em 2006 2, foram construidos cinco modelos aditivos alternativos, a saber: (1)

Y 1 = a 0 + a 1I1, em que Y 1 = PIB a pre<;os constantes de 2000; (variavel dependente) I 1 = FBCF privada a pre<;os constantes;

(2) Y 1 = a 0 +

<X/

1

+ a 2 Div1, em que

Div1 = Divida Directa do Estado a pre<;os constantes. (3) Y 1 = a 0 + a 1I1 + a 2 Div1 + aipt' em que

IP1 = FBCF Publica a pre<;os constantes. (4) Y 1 = a 0 + a/1 + a 2 Div1 + aipt + a 4 K1, em que K 1 = FBCF por elemento da popula<;ao activa (aproximando-se do

coeficiente de intensidade capitalistica). (5) Y 1 = a 0 + a 1I1 + a 2 Div1 + aipt + a 4K1 + a 5Poact 1, em que

Poactt= popula<;ao activa. 2

Rebelo de Sousa, A e Quintino, A - Ob. Cit., 2006.

Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, n.Q11/2010

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Ant6nio Rebelo de Sousa e Ant6nio Manuel Quintino

QUADRO IV- Coeficientes Modelo n.Q

Coeficiente "Beta"

Estatistica

1 FBCF Privada a prec;os constantes

0,970

20,940

0,000

2 FBCF Privada a prec;os constantes

0,561

15,402

0,000

Dfvida directa do Estado a prec;os constantes

0,468

12,848

0,000

3 FBCF Privada a prec;os constantes

0,464

9,860

0,000

Dfvida directa do Estado a prec;os constantes

0,495

14,639

0,000

FBCF Publica a prec;os constantes

0,086

2,839

0,009

4 FBCF Privada a prec;os constantes

0,701

5,950

0,000

Dfvida directa do Estado a prec;os constantes

0,456

12,453

0,000

FBCF Publica a prec;os constantes

0,223

3,227

0,003

FBCF por elemento da populac;ao activa

-0,329

-2,169

0,040

5 FBCF Privada a prec;os constantes

1,631

6,001

0,000

Dfvida directa do Estado a prec;os constantes

0,527

14,762

0,000

FBCF Publica a prec;os constantes

0,393

5,374

0,000

FBCF por elemento da populac;ao activa

-1,213

-4,468

0,000

Populac;ao active

-0,337

-3,660

0,001

"t"

Significancia

Nota: Variavel dependente - Y, - PIB a prec;os constantes de 2000.

Corn base no terceiro modelo - o mais consistente - , o PIB e "explicado", essencialmente, pela FBCF privada a pre<;os constantes e pela Dfvida Directa do Estado a pre<;os constantes. De facto, afigura-se natural que a FBCF privada tenha influencia determinante na evolu<;ao do PIB, constatando-se, tambem, ao longo dos tempos, uma evolu<;ao no mesmo sentido do PIB e da Dfvida Directa do Estado.

58

Lusfada. Economia & Empresa, n.Q11/2010


De uma versao actualizada da explicac;ao da evoluc;ao da economia portuguesa, p. 49-64

6. Da introdw;ao, por via indirecta, de uma "componente multiplicativa" A introdu<;ao de logaritmos neperianos permite determinar as elasticidades, que o mesmo e dizer, a "sensibilidade" da variavel dependente a varia<;6es marginais nas variaveis "explicativas". Corn base no modelo referido no nQ anterior (tendo por base o de 2006), introduziram-se logaritmos neperianos, considerando-se dois modelos alternativos, a saber: (1) InY1 = In(cx 0 ) + cx 11n11, em que It = FBCF privada; (2) InY1 = In(cx 0 ) + cx 11n11 + cx21nDiv1, em que Div 1 = Divida Directa do Estado.

0 segundo modelo apresenta-se mais "explicativo", constatando-se, ainda, que a maior elasticidade se verifica para a variavel InY1 (i.e., para a FBCF privada). Por outras palavras, por cada ponto percentual que a FBCF privada aumente, o PIB aumentara 0,483%, sendo certo que este valor corresponde, praticamente, ao dobro da elasticidade obtida para a Divida Directa do Estado (vide Quadro V). Mais, se se procurar "testar" a sensibilidade do PIB a varia<;ao na FBCF publica chegamos a conclusao de que a mesma se apresenta pouco significativa. Se considerarmos, agora, modelos utilizadores de logaritmos, mas corn outras variaveis "explicativas" chegamos a conclus6es, particularmente, interessantes.

QUADRO V- Coeficientes Coeficiente e Desvio padrao Elasticidades

Desvio Padrao da Elasticidade

1 Ln (FBCF Privada)

0,762

0,032

2 Ln (FBCF Privada)

0,483

0,048

0,234

0,037

Ln (Divida Directa do Estado) Variavel dependente: ln PIB.

Lusiada. Economia & Em presa. Lisboa, n. 0 11/2010

59


Ant6nio Rebelo de Sousa e Ant6nio Manuel Quintino

Assim, teremos os seguintes seis modelos: (1) InY1 = K 0 + a 1 lnCP1, em que

CP1 = Consumo Privado; (2 InY1 = K0 + a 1InCP1 + a)nl1, em que 11 = FBCF privada;

(3) InY1 = Ka0 + a 11nCP1 + a)nl1 + a 3CPNDt' em que C PNDI=

Consumo Privado de Bens Nao Duradouros;

(4) InY1 = K0 + a/1 + a 2C PNDt' nao se considerando, por conseguinte, o Consumo Privado Total (possivel multicolinearidade por causa de CPNDt ). (5) InY1 = K 0 + a 111 + a 2CPNDt + a 111, em que

A 1 = Alunos Matriculados. (6) InY1 = K0 + a 111 + a 2C PNDI + a 3 A 1 + a 4Pope1, em que

Pope1 = Popula<;ao empregada. Conforme resulta da analise do Quadro VI, o sexto modelo e o que se apresenta mais "explicativo", sendo, ainda, de salientar que o Consumo Privado de Bens Nao Duradouros e a variavel que apresenta maior elasticidade (e, por conseguinte, maior peso "explicativo" nas varia<;6es do PIB da economia portuguesa), seguindo-se-lhe a FBCF privada e a popula<;ao empregada (vide Quadro VI). A variavel Alunos Matriculados apresenta uma elasticidade mais baixa (0,064), havendo, todavia, uma rela<;ao directa entre o numero de alunos matriculados e o PIB p.c..

QUADRO VI- Coeficientes Coeficiente e Desvio padrao Desvio Elasticidades Padrao da Elasticidade

Estatfstica "t"

Significancia

1 Ln (Consumo Privado)

0,848

0,009

96,251

0,000

2 Ln (Consumo Privado)

0,734

0,029

25,435

0,000

0,108

0,027

4,080

0,000

0,144

0,191

0,752

0,459

Ln (FBCF Privada) 3 Ln (Consumo Privado)

60

Lusiada. Economia & Empresa, n.Q 11/2010


De uma versao actualizada da explica<;ao da evolu<;ao da economia portuguesa, p. 49-64

Ln (FBCF Privada)

0,180

0,033

5,512

0,000

Ln (Consumo Privado Bens Nao Duradouros)

0,516

0,166

3,110

0,004

0,200

0,020

10,105

0,000

0,640

0,022

29,630

0,000

0,186

0,017

11,069

0,000

Ln (Consumo Privado Bens Nao Duradouros)

0,567

0,027

21,333

0,000

Ln (Alunos Matriculados)

0,045

0,012

3,669

0,001

0,165

0,019

8,882

0,000

Ln (Consumo Privado Bens Nao Duradouros)

0.523

0,033

16,101

0,000

Ln (Alunos Matriculados)

0,064

0,014

4,399

0,000

Ln (Popula<;ao Empregada)

0,120

0,056

2,123

0,044

4 Ln (FBCF Privada)

Ln (Consumo Privado Bens Nao Duradouros) 5 Ln (FBCF Privada)

6 Ln (FBCF Privada)

Nota: Variavel Dependente - ln PIB.

7. Conclusoes

A partir dos diversos modelos considerados, afigura-se possivel concluir que o PIB portugues e, sobretudo, sensivel ao Consumo Privado de Bens Nao Duradouros e a FBCF privada. A FBCF publica apresenta uma elasticidade de cerea de 1/10 da elasticidade da FBCF privada e, por outro lado, o Consumo Publico, tambem, parece nao ter a importancia "explicativa" relevante na evolw;;ao do PIB que muitos analistas esperariam. A relevancia do Estado na explica<;ao da evolu<;ao do nivel de actividade econ6mica, de acordo corn o presente estudo, que abarca tres decadas, existe mais por via indirecta (comportamento FTL- "Follow the leader" e sindroma despesista) do que por via directa. Tal nao significa que as contribui<;6es neo-Keynesianas e novo-Keynesianas nao continuem a apresentar-se validas para uma conjuntura recessionista ou para-recessionista, em que o recurso ao investimento publico e a politicas monetarias expansionistas faz, plenamente, sentido.

Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, n. 0 11/2010

61


Ant6nio Rebelo de Sousa e Ant6nio Manuel Quintino

Alias, o proprio reconhecimento de que, em situa<;ao de crise, o Estado substitui a empresa -lider leva-nos a concluir da importancia da interven<;ao do Estado na economia, em determinadas circunstancias. Mas, nao faz sentido confundir o neo-Keynesianismo ou o novo-Keynesianismo corn posi<;6es maximalistas que conduzam a defesa da tese de que o investimento publico devera ser, em todas as circunstancias, a variavel impulsionadora do desenvolvimento econ6mico. 0 recurso ao investimento publico, para urn neo-Keynesiano, faz sentido em circunstancias espedficas, mas nao deve ser erigido em alavanca fundamental do processo desenvolvimentista em economias que se encontram em fase de crescimento sustentado. Daf que o verdadeiro sinal de que a economia portuguesa ja estara em plena fase de inversao do "ciclo da crise" passara, muito naturalmente, pela constata<;ao de uma tendencia consistente para o aumento da FBCF privada.

Bibliografia

Livros: REBELO DE SousA, Ant6nio (2008), De um novo conceito de desenvolvimento no quadro da economia internacional, ISCSP. JoHNSTON, Jack e D!NARDO, John (2001), Metodos econometricos, MacGraw-Hill. CHENERY, Hollis (1979), Structural change and development policy, Oxford University Press. Koum, J. K. (1980), Profitability and growth in a small open economy-inflation and employment in open economies, The Institute for International Economic Studies, Ed. LrNBECK, Publ. North-Holand. HARDLE, W. e L. SrMAR (2003), Applied multivariate statistical analysis, Springer Verlag Berlin-Heidelberg. PARKIN, Michael, PowELL, Melanie, MATIHEWS, Kent (2007), Economics, Pearson. SAMUELSON, Paul, NoRDHAUS, William (1985), Economics, MacGraw-Hill.

Artigos: REBELO DE SousA, Ant6nio e QurNTINO, Ant6nio (2006), Das variriveis explicativas do crescimento da economia portuguesa, "Lusfada- Economia & Empresa" n.Q 6, Universidade Lusiada Editora. REBELO DE SousA, Ant6nio e QurNTINO, Ant6nio (2008), Da relevancia da componente psicol6gica da evoluqiio futura da economia portuguesa, "Lusiada - Economia & Empresa" n.Q 8, Universidade Lusfada Editora.

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Lusfada. Economia & Empresa, n. 2 11/2010


De uma versao actualizada da explica<;ao da evolu<;ao da economia portuguesa, p. 49-64

MELICIANI, Valentina & PERACCHI, Franco (2006), Convergence in per-capita GDP across european regions: a reappraisal, "Empirical Economics", Springer, vol. 31(3), pages 549-568. ARBIA, Giuseppe, DoMINICIS, Laura De & PIRAS, Gianfranco (2005), The relationship

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Fontes de Informac;iio: INE - Instituto Nacional de Estatistica, Contas Regionais e Nacionais; PoRDATA, Contas do Estado; Educac;iio, Emprego; OECD Statistics, National Accounts; Eurostat, National Accounts.

Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, n.Q 11/2010

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DO BINOMIO KEYNES-SCHUMPETER AO PENSAMENTO GALBRAITHIANO

Ant6nio Rebelo de Sousa Doutor em Economia Professor Associado (Universidade Lusfada de Lisboa) Professor Associado corn Agrega<;ao (Universidade Tecnica de Lisboa)



Resumo: 0 presente artigo pretende analisar as contribui<;6es de John Maynard Keynes para a formula<;ao de politicas macroecon6micas consistentes, bem como a aplicabilidade do modelo explicative Schumpeteriano aos processes desenvolvimentistas que ocorreram, no decurso do seculo passado, nas economias capitalistas evoluidas. Procura-se, ainda, conciliar o bin6mio Keynes - Schumpeter corn as formula<;6es te6ricas galbraithianas, dando-se particular relevo a "good governance" e a uma perspectiva integrada e integradora de desenvolvimento. Finalmente e a luz do triangulo Keynes - Schumpeter- Galbraith, apresenta-se urn conjunto consistente de medidas de politica econ6mica, a implementar no quadro da UE (e, muito em particular, da "zona do euro"), que permitiriam inverter o actual "ciclo da crise".

Abstract: This article aims to analyse John Maynard Keynes' contribution for laying down consistent macroeconomic policies, as well as the applicability of the explanatory Schumpeterian model on the processes of structuralist economics that took place in the developed capitalist economies over the last century. The study also seeks to harmonise the Keynes-Schumpeter binomial via the Galbraithian theoretical formulations, stressing, in particular, the "good governance" and an integrated and integrating view of development. Finally, in the light of the Keynes-Schumpeter-Galbraith triangle, the article brings forward a solid set of economic policy measures to be implemented in the EU framework (and, in particular, in the euro zone framework) that would allow for the inversion of the current "crisis cycle".

Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, n.Q 11/2010

67


Ant6nio Rebelo de Sousa

1. Do Pensamento Keynesiano

John Maynard Keynes sublinhou, no Prefacio a sua "Teoria Geral do Emprego, do Jura e do Dinheiro" que "os que estao firmemente apegados aquilo a que chamarei a Teoria Classica decerto vacilarao entre a ideia de que me acho completamente equivocado e a convic<;ao de que nada de novo estou dizendo" 1 . Referindo, logo no inicio da sua obra, que os postulados classicos niio admitem a possibilidade do desemprego involuntario, Keynes adianta duas objec<;6es suplementares a produ<;iio te6rica classica: - a primeira, diria respeito ao comportamento efectivo do trabalhador, uma vez que uma redu<;ao dos salarios reais resultante de urn aumento dos pre<;os, nao acompanhado de urn incremento dos salarios nominais, nao determina, em regra, uma diminui<;ao na oferta de mao-de-obra; - a segunda, decorreria da rejei<;iio da hip6tese de que o nivel geral dos salarios reais possa ser, directamente, determinado pelo caracter das negocia<;6es sabre salarios (o que, na minha perspectiva, se articula corn a questao das "expectativas racionais", que assentam em pressupostos questionaveis). Desde Say e Ricardo que os economistas classicos afirmavam que a oferta criava a sua propria procura - o que, de alguma forma, pretendia significar que o total do rendimento deveria ser gasto par completo em consumo e em investimento, o que permitiria que a economia se situasse na fronteira de possibilidades de produ<;iio, havendo, por conseguinte, uma situa<;ao de equilibrio em plena emprego. Acontece, todavia, que este raciocinio assenta no pressuposto da igualdade ex-ante entre a poupan<;a eo investimento. Ora, para Keynes, e necessaria que exista urn volume de investimento suficiente para absorver o excesso de produ<;iio total sabre o que a comunidade deseja consumir (para o nivel de emprego considerado). Caso contrario, as receitas globais dos empresarios (C+I) serao inferiores as necessarias que oferecerem urn nivel de emprego E* (pleno emprego). Por outras palavras, S nem sempre e igual a I (s6 sendo igual ex-post, i.e., no final de urn periodo de tempo considerado). Dai que possa haver equilibrio abaixo do plena emprego, tornando-se necessaria estimular o investirnento privado e/ ou recorrer ao investimento publico para se atingir E*.

1 Keynes, J.M. - "Teoria Geral do Emprego, do Juro e do Dinheiro", Editora Fundo de Cultura, S.A., 1970, pag. 9.

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Lusiada. Economia & Empresa, n.Q11/2010


Do bin6mio Keynes-Schumpeter ao pensamento Galbraithiano, p. 65-78

De facto, para Keynes 2, "a procura efectiva associada ao pleno emprego e urn caso especial que s6 se verifica quando a propensao marginal a consumir e o incentivo para investir se encontram numa particular rela<;ao mutua" . A hip6tese classica s6 se verifica quando I=S, i.e., quando o investimento e igual ao excedente do pre<;o da oferta global de produ<;ao (resultante do pleno emprego) sobre o consumo da comunidade. Keynes considerava, ainda, que a procura agregada poderia ser influenciada pela politica monetaria e or<;amental, podendo haver urn impacto positivo da procura agregada sobre o rendimento (produto real) e o nivel de emprego, no curto prazo, e nao sobre os pre<;os. Ao contrario dos monetaristas- corn destaque para Friedman e para Phelps -os neo-Keynesianos e os novo-Keynesianos (como MANKIW, RoMERe BLANCHARD) entendem que nao e legitimo, a partir da equa<;ao da troca, afirmar-se que urn aumento no volume da massa monetaria implica sempre urn ajustamento por via do aumento dos pre<;os, sem que se produza qualquer efeito no nivel de rendimento. Em boa verdade, existe o que se convencionou designar de viscosidade dos pre<;os, o que se articula corn os "custos de menu", corn as externalidades de procura agregada, corn a alternancia dos pre<;os e corn a falta de coordena<;ao de pre<;os (havendo, ainda, a considerar, no que concerne ao mercado de trabalho, a tendencia para a rigidez salarial, conforme refere Lieberman). Do que se disse resulta a tese Keynesiana favoravel a uma interven<;ao activa do Estado na gestao macroecon6mica em situa<;ao de recessao ou de pararecessao, entendendo o autor que, em determinadas circunstancias, os governos deveriam preocupar-se mais corn o desemprego do que corn a infla<;ao. Keynes privilegiava, na sua analise, o lado da procura, considerando o investimento como uma variavel estrategica. Para Keynes, os ajustamentos macroecon6micos podiam ser operados atraves de deslocamentos da curva IS (Investment and Save), admitindo-se que nem sempre funcionava a automaticidade dos mecanismos reequilibradores do mercado. Quando a referida automaticidade dos mercados nao funcionava, a interven<;ao do Estado na economia justificava-se, pelo que, nessas circunstancias, poderia, inclusive, haver lugar a defices or<;amentais, desde que os mesmos se destinassem a financiar investimento publico reprodutivo. Assim, Keynes, ao centrar a sua aten<;ao sobre a politica anti-dclica de curto prazo, foi conduzido a considerar os meios de elevar a procura efectiva de forma suficiente para reocupar os factores subempregados. Como se disse, para Keynes, a variavel estrategica geradora d e urn fluxo de compras suplementares e o acrescimo do investimento. As despesas corn o

2

KEYNES, John Maynard - "Teoria Geral do Emprego, do Juro e do Dinheiro", Fundo de Cultura, 1970, pag. 39.

Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, n .0 11/2010

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Ant6nio Rebelo de Sousa

investimento adicional distribuem poder aquisitivo que leva a urn fluxo suplementar de compras, dada uma certa propensao a consumir, o que, por sua vez, conduz a uma expansao da prodw;ao e a urn novo incremento do investimento e dos postos de trabalho, atraves do duplo efeito multiplicador-acelerador. Se a resposta da prodw;ao e suficientemente elastica, nao havera subida sensivel dos pre<;os relativamente aos existentes anteriormente. Se a elasticidade da produ<;ao e baixa, a oferta nao responde, a curto prazo, as solicita<;6es da procura, registando-se, nesse caso, tens6es inflacionistas no mercado, s6 se tornando possivel urn investimento adicional real se o consumo diminuisse. Deste modo, ao investimento real corresponderia uma poupan<;a efectiva expost, a qual nao coincidiria corn a poupan<;a ex-ante. Assim, a igualdade fundamental do equilibrio Keynesiano, S=l, verificar-se-ia "ex-post" e nao "ex-ante". 0 modelo Keynesiano permite encontrar uma saida para as situa<;6es em que o modelo capitalista se mostra menos eficaz, permitindo encontrar uma solu<;ao para as situa<;6es de recessao ou de para recessao. Existem, todavia, duas limita<;6es na produ<;ao te6rica Keynesiana: a primeira, tern que ver corn o facto de nao se tornar possivel recorrer indefinidamente a defices or<;amentais para dinamizar a actividade produtiva, caminhando-se para o pleno emprego (sobretudo quando nao se apresenta possivel recorrer ao instrumento taxa de cambio); - a segunda, resulta de Keynes nao ter construido urn modelo de desenvolvimento a longo prazo3 .

2. Como Schumpeter combina a analise macroecon6mica Keynesiana corn a sua concep~ao de desenvolvimento econ6mico.

Para Schumpeter, o processo econ6mico nao constitui mais do que urn aspecto do processo social hist6rico global. 0 processo social constitui urn conjunto indivisivel e o estado econ6mico de urn povo nao emerge, exclusivamente, das circunstancias econ6micas previas, m as antes da situa<;ao total precedente. Schumpeter envereda, por conseguinte, por urn metodo historicista e globalista de analise, introduzindo, pela primeira vez, a distin<;ao entre for<;as produtivas materiais e imateriais.

3 Mesmo o modelo de Harrod-Domar apresentou as suas limita<;6es, no que respeita sua aplicabilidade a economias em transi<;ao.

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a

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E ao considerar as fon;as produtivas imateriais esta a dar relevfmcia ao progresso tecnologico e a organiza<;ao social, factores esses que condicionam a natureza e o nfvel de actividade economica. 0 autor parte para a distin<;ao entre crescimento e desenvolvimento economicos. Enquanto o primeiro implica "as modifica<;6es nos dados economicos que ocorrem continuamente no sentido de que o seu acrescimo ou decrescimo podem ser correctamente absorvidos pelo sistema sem distl"1rbios perceptfveis" 4, ja o segundo implica saltos qualitativos no processo economico, os quais resultam das inova<;6es introduzidas nesse mesmo processo. Para Schumpeter, "o desenvolvimento e transformat;ao espon tanea e descontinua das arterias do fluxo, disturbio de equilfbrio que altera e desloca para sempre o estado de equilfbrio pre-existente" 5 . 0 autor considerava que o desenvolvimento podia resultar da aceita<;ao de urn novo bem ou de uma nova qualidade de urn bem, da adop<;ao de urn novo metodo de produt;ao, da conquista ou abertura de urn novo mercado, da conquista de uma nova fonte de materias-primas ou, ainda, de uma nova organizat;ao do mercado ou de transformat;6es qualitativas ao nfvel das superestruturas mentais e culturais. Schumpeter considerava que o processo de desenvolvimento da economia capitalista era urn processo de "destruit;ao criadora", havendo, cada vez mais, a emergencia de uma classe de gestores tecnocratas dissociada da fun<;ao objectivo dos investidores convencionais e dos empresarios "tradicionais de familia". Por outro lado, a propria capacidade de auto-reforma do capitalismo, levaria a uma crescente interven<;ao do Estado, quer atraves de polfticas redistributivas, quer atraves da regulat;ao dos mercados e, em certas circunstancias, de programas de investimento publico e do refor<;o da interven<;ao na economia, inclusive a partir do SEE - Sector Empresarial do Estado. Paralelamente, e o proprio "sucesso" do capitalismo que conduz a uma maior mobilidade social ea uma gradual democratiza<;ao dos canais de acesso a instru<;ao e a cultura. Schumpeter fala na inevitabilidade do socialismo, mas, se analisarmos toda a sua "constru<;ao teorica", esse conceito de socialismo esta mais proximo de uma gradual socializa<;ao do capitalismo do que de urn modelo estatizante e totalitario. Schumpeter completa a analise Keynesiana no que concerne a perspectiva d e evolu<;ao da economia de mercado, a longo prazo. Mas, coube a Galbraith a chamada de aten<;ao nao apenas p ara a inova<;ao e a criatividade ao nivel dos centros de decisao, como tambem para a indispen-

4 Schumpeter, ].A. - "The Theory of economic development", Harva rd Economic Studies, H. Universi ty Press, 1934. 5 Schumpeter, J.A. - "The ana lysis of Economic Change", Review of Economic Studies, Maio de 1935.

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sabilidade da "Good Governance", do respeito pela Lei e pela Ordem e, enfim, da existencia do Estado de Direito Democratico.

3. Das Contribui<;oes "galbraithianas"

Para Galbraith, foi, tambem, do proprio processo desenvolvimentista que resultaram problemas como o do desemprego, tornando indispensavel a adop<;ao de politicas de ajustamento atenuadoras do mesmo. Mais, as reformas sao impulsionadas pelo proprio progresso: "foi o aumento da esperan<;a de vida, causado pelo desenvolvimento da medicina moderna, pelo crescimento da industria e do emprego urbano, e nao os liberais ou os socialistas, que criaram a pressao para a existencia da seguran<;a social" 6 • 0 autor, tal como Keynes, aceita que, em determinadas circunstancias, possa haver defice or<;amental. "Nao existe lei ou tradi<;ao, argumentarei, que exija um or<;amento equilibrado - receitas e despesas iguais, numa base anual" 7 • Tal nao implica, todavia, "que o or<;amento e os defices or<;amentais devam ser tratados com negligencia pelos Estados modernos; um elevado nivel de inteligencia e de prudencia e indispensavel" 8. Galbraith fala em tres categorias principais de despesas publicas, a saber: - as que servem um proposito que nao e visivel no presente ou no futuro; - as que protegem ou melhoram a situa<;ao presente da economia ou de outras condi<;oes sociais; - as que permitem um aumento, no futuro, do rendimento da produ<;ao e do bem-estar geral. 0 defice or<;amental so se justifica para financiar o terceiro tipo de despesas or<;amentais. 0 autor fala-nos numa "Sociedade Desejavel" que nao se confunde com uma sociedade igualitaria, mas antes com um modelo de organiza<;ao social que apresente, tendencialmente, uma igualdade de oportunidades. Em boa verdade, Galbraith completa a analise Schumpeteriana no que se relaciona com a perspectiva de evolu<;ao da economia mundial, num quadro de globaliza<;ao, nomeadamente, quando nos fala da "Sociedade Desejavel" assente

6 G ALBR AITH,

John Kenneth - "A Sociedade Desejavel",

Publica~oes

Europa-America,

John Kenneth - "A Sociedade Desejavel",

Publica~oes

Europa-America,

pag. 30. 7 G AL BR AITH,

pag. 30. " G ALOR AITH,

John Kenneth - "A Sociedade Desejavel", Publica<;oes Europa-America,

pag. 30.

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no refor<;o das politicas assistenciais, bem como na indispensabilidade de governos eficazes e transparentes (indo ao encontro do conceito de "good governance"), na necessidade de se apostar na educa<;ao (e, mais especificamente, num "corpo internacional de preparadores de professores"), na imperiosidade de se respeitar a Lei ea Ordem e, sobretudo, na relevancia do aprofundamento da democracia ("uma democracia genufna") 9• A combina<;ao de polfticas redistributivas corn a democratiza<;ao dos canais de acesso a riqueza e ao saber, corn o refor<;o das polfticas assistenciais, corn os mecanismos de regula<;ao econ6mica e corn o aumento da capacidade de interven<;ao dos centros de decisao supra-nacionais esta na base da socializa<;ao do capitalismo por via democratica e reformista. A prop6sito do refor<;o da capacidade de interven<;ao dos centros de decisao supra-nacionais, Galbraith afirmava existir "necessidade de haver ac<;oes por parte de uma sociedade desejavel contra as tragedias humanas mais inacreditaveis"10. Uma sociedade democratica em que o cidadao para usufruir da sua casa tern que pagar urn imposto municipal imobiliario todos os anos, sendo, ainda, compelido a pagar ao Estado urn imposto de transmissao se pretender vender uma propriedade sua e estando, ainda, obrigado a canalizar para a comunidade uma parte do seu rendimento (e/ ou da sua riqueza) nao e uma sociedade liberal pura, assente em criterios individualistas. Se o cidadao nao pagar o imposto de circula<;ao autom6vel nao podera usufruir do mesmo. Se o cidadao nao pagar uma contribui<;ao mfnima relativa a sua empresa familiar pode vir a ser executado. A Comunidade assegura, tendencialmente, uma efectiva igualdade de oportunidades no acesso a educa<;ao e a saude. A Comunidade exerce vigilancia sobre as situa<;oes de excesso de concentra<;ao e de abuso do poder econ6mico, defendendo os mecanismos concorrenciais. Existe separa<;ao de poderes ao nfvel dos diferentes 6rgaos de Soberania, o que cria condi<;oes propiciadoras de "good governance". Nao sera toda esta evolu<;ao, ditada pelo sucesso do capitalismo avan<;ado, uma forma de socializa<;ao do sistema que se procura compatibilizar corn a liberdade de iniciativa?

9

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0

GALBRAITH, John Kenneth - " A Sociedade Desejavel", cap. 17. GALBRAITH, J.K., Ob. Cit., pag. 191.

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4. Da matriz inspiradora do Estado Providencia Europeu ao pacto Keynesiano

De alguma forma, a evolw;ao registada na economia europeia, ao longo das ultimas decadas- e, muito em particular, na fase p6s II G.G.- tern muito aver corn o bin6mio Schumpeteriano- Galbraithiano: foi o sucesso do capitalismo, gra<;as a inova<;ao, a criatividade empresarial, que possibilitou a introdu<;ao de reformas conducentes ao que se convencionou designar de Estado Providencia. Nao s6 passou a haver subsidio de desemprego, de uma forma generalizada, como pens6es de reforma, acesso universal a saude ea educa<;ao, boas infraestruturas de enquadramento, como, ainda, politicas fiscais redistributivas e urn Estado Regulador, corn alguma interven<;ao na implementa<;ao de legisla<;ao de defesa da concorrencia. Mais, em alguns casos, urn Sector Empresarial do Estado forte, corn capacidade para fazer inflectir as tendencias existentes ao nivel do investimento e, por conseguinte, da despesa agregada. 0 Estado Providencia que emergiu no P6s- II G. G. apresentou, inegavelmente, algumas debilidades e algumas caracteristicas negativas no que concerne ao seu impacto sabre as estruturas de custos e a competitividade das economias europeias a escala mundial. 0 excesso de burocracia e o impacto negativo dos "custos sociais" nos pre<;os dos bens e servi<;os europeus foram as duas debilidades mais apontadas pela generalidade dos economistas, desenvolvendo-se urn discurso "catastrofista" nos termos do qual a Europa nao conseguiria sobreviver a competitividade crescente das economias asiaticas emergentes (os tao falados NIC's- "New Industrialized Countries"). Conforme autores como Sioma Kagan real<;aram, essas economias tern mao-de-obra abundante e barata (corn salarios de subsistencia), nao apresentando indivisibilidades tecnol6gicas, o que permite produzir bens a pre<;os, altamente, competitivos. Acontece, todavia, que se a Europa quisesse competir corn os NIC's pelo lado dos custos nao bastaria acabar corn o Estado Providencia, uma vez que seria necessaria dividir os salarios por 3 ou por 4 (ou, ainda, mais) para se estar ao nivel dos custos dessas economias em transi<;ao. E mesmo o mais liberal dos liberais ou o mais conservador dos conservadores nao e favoravel a ajustamentos salariais dessa ordem de grandeza. A Europa tern que se afirmar, no quadro internacional, pela aposta na qualidade e na imagem. E e o que a Alemanha e, em parte, a Fran<;a tern feito corn sucesso, em muitos sectores. As Novas Economias Emergentes terao, mais tarde ou mais cedo, pela ÂŁrente o problema dos rendimentos marginais crescentes se o "stock" de capital nao acompanhar o ritmo de absor<;ao da mao-de-obra excedentaria pelo sector avan<;ado da economia.

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Mais, sera necessaria que as Novas Economias Emergentes enveredem por modelos de Desenvolvimento Sustentado, assentes nao apenas na industrializa<;ao, mas tambem na diversifica<;ao de servi<;os. Ora, nao e essa a evolu<;ao que se tern vindo a operar, por exemplo, na China, ao contrario da evolu<;ao, mais recentemente, registada na Uniao Indiana. E, depois, existem, ainda, os mecanismos de dependencia do "centra desenvolvido", no que concerne ao investimento al6geno e a os mercados financeiros . Seria interessante analisar-se qual a principal proveniencia de capitais al6genos nos NIC's e quais os efeitos de interdependencia resultantes, por exemplo, da compra de Divida Publica americana pela Republica Popular da China. Sera a economia americana que fica mais dependente da chinesa ou sera, pelo contrario, a economia chinesa que mais "sofre" corn eventuais oscila<;6es do d6lar e da economia americana? Do que se disse nao faz sentido concluir-se que o Estado Providencia, tal coma foi concebido na Europa, nao deva passar por qualquer tipo de ajustamento ou de transforma<;ao. Mas, na sua essencia, o argumento de que deve ser, radicalmente, posto em causa, para se assegurar a competitividade da economia europeia, a escala mundial, nao faz qualquer sentido. Coma nao faz sentido afirmar-se que o Pacto Keynesiano nao e, em nada, aplicavel, hoje em dia a economia europeia. 0 argumento anti-Keynesiano mais invocado consiste em se afirmar que a injec<;ao de dinheiro induzida por aumento de gastos pl'1blicos de investimento nao vai levar a urn aumento da procura de bens e servi<;os produzidos internamente, mas antes a urn aumento das importa<;6es. Por outras palavras, o modelo Keynesiano nao seria aplicavel a economias abertas. Acontece que, todavia, a U.E. (e, muito em particular, a Zona do Euro) nao e uma economia aberta. A Zona do Euro tern uma moeda e pode passar a ter uma Politica Or<;amental Comum muito mais activa. Logo, na U.E. o modelo Keynesiano pode funcionar, ate porque existe urn elevado grau de interdependencia ao nivel das economias dos Estados Membros. E, em situa<;ao de recessao ou de para-recessao, coma, alias, acontece presentemente, faz, plenamente, sentido aplicar o Pacto Keynesiano. Em que e que consistiria, no essencial, o Pacto Keynesiano a implementar na UE? Em primeiro lugar, seria necessaria refor<;ar, significativamente, o Or<;amento Comunitario. Em segundo lugar, haveria que refor<;ar os montantes destinados a fundos estruturais, fundos esses que deveriam ser canalizados para as regi6es perifericas da Europa.

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Em terceiro lugar, importaria munir urn Fundo de Emergencia para Apoio as Economias Carenciadas dos meios financeiros indispensaveis, criando-se urn Fundo Monetario Europeu corn capacidade interventora em situa<;;oes de maior desequilibrio externo das economias dos Estados Membros. Em quarto lugar, seria necessario autorizar, temporariamente, o Banco Central Europeu a comprar Dfvida dos Estados Membros da Zona do Euro. Em quinto lugar, clever-se-fa rever o Pacto de Estabilidade e Crescimento, nao se considerando, para efeitos do "criterio do defice" e do "criterio da Dfvida Publica", os investimentos puNicos reprodutivos comparticipados por fundos estruturais comunitarios. Em sexto lugar, importaria injectar mais liquidez no mercado e manter uma polftica conducente a existencia de baixas taxas de juro. Em setimo e ultimo lugar, seria imperioso desvalorizar o euro em rela<;;ao as principais paridades alternativas. Nao compreender que a Europa tern que dar estes passos - que, de alguma forma, implicam uma crescente federaliza<;;ao- e nao perceber o que esta, hoje em dia, em causa. A titulo de mera curiosidade academica, imagine-se que vivfamos num Portugal hipotetico, que seria urn Estado Federal, corn varios Estados Federados, como ode Tras-os-Montes, o da Beira Alta, o da Beira Baixa, o do Alentejo, o da Estremadura (ou Grande Lisboa) eo do Douro Litoral (ou Grande Porto). Suponhamos que uns fundamentalistas liberais estabeleciam o princfpio de que cada Estado Membro teria o seu Or<;;amento, nao podendo, todavia, o respectivo defice ultrapassar os 3% do PIB (uma vez que se entendia ser essa o limite desejavel, em fun<;;ao da taxa de crescimento do nfvel de actividade econ6mica tida como desejavel para o conjunto da area de integra<;;ao). Simultaneamente, os mesmos fundamentalistas liberais, instalados no Governo Federal, exigiam que, a prazo, o Estado de Tras-os-Montes convergisse corn a media do Pais e, qui<;;a, corn o Estado da Estremadura, em termos do PIB "per capita". Volvidos dez anos, o Estado de Tras-os-Montes estava, ainda, mais afastado do Estado da Estremadura e os ditos te6ricos liberais concluiriam que tal resultava da inaptidao dos politicos transmontanos. Nada de mais ridfculo ... 0 Estado Federado de Tras-os-Montes s6 poderia convergir corn o resto do Pais se houvesse transferencia de fundos do Estado Central e/ ou do Estado da Estremadura e/ ou do Estado do Douro Litoral para as regioes tidas como comparativamente perifericas. Ou, entao, o Estado de Tras-os-Montes, sobretudo numa conjuntura recessionista, teria que se endividar, sendo financiado pelo Estado Central ou pelos Estados Federados em melhor situa<;;ao, em termos de Finan<;;as Publicas. Nao faz sentido dar-se a urn competidor uma bicicleta e a urn outro urn triciclo e, depois, manifestar surpresa porque o detentor da bicicleta ganhou ...

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Vivemos uma situa~ao complexa na Europa de hoje. Mas, nunca como agora, aspectos essenciais da produ~ao te6rica Schumpeteriana e Galbraithiana foram tao importantes para a compreensao dos desafios que se colocam ao modelo de desenvolvimento europeu. Coma vai fazendo sentido que os europeus nao tenham em rela~ao a Keynes os complexos que, infelizmente, muitos americanos ja conseguiram, ha muito tempo, ultrapassar.

NOTA FINAL Importa saber distinguir entre o reconhecimento da relevancia das teses neoKeynesianas e novo-Keynesianas para a analise macroecon6mica ea ideia maximalista de que, historicamente, o investimento publico se apresenta sempre como variavel explicativa determinante do crescimento econ6mico. Ser-se a favor do recurso, em situa~6es de recessao, ao investimento publico nao e 0 mesmo que entender que 0 investimento publico tern que ser 0 elemento determinante do crescimento econ6mico, em todas as fases do processo desenvolvimentista. A titulo exemplificativo, e possivel concluir-se, a partir de analises econometricas, que, para 0 caso portugues e para as ultimas decadas, 0 investimento publico nao apresentou a mesma relevancia explicativa para o crescimento econ6mico (em termos de PIB "per capita") que o Consumo Privado de Bens Nao Duradouros ou a F.B.C.F. - Forma~ao Bruta d e Capital Fixo privada (ou ate a propria evolu~ao da Popula~ao Activa). Convem, por conseguinte, nao retirar ila~6es precipitadas da apologia do neo-Keynesianismo (quanta a sua aplicabilidade em certas circunstancias), confundindo -se neo-Keynesianismo corn a defesa do primado do investimento publico, em detrimento do investimento privado.

Bibliografia

GALBRAITH, John Kenneth- "A Sociedade Desejavel", Publica~6es Europa-America, 1997. GALBRAITH, John Kenneth- "The New Industrial State", Redwood Press Ltd, 1971. KEYNES, John Maynard - "Teoria Geral do Emprego, do Juro e do Dinheiro", Editora Fundo de Cultura, SA, 1970. REBELO DE SousA, Ant6nio - "Manual de Economia do Desenvolvimento", ISCSP, 2009. ScHUMPETER, Joseph A. - "The theory of economic development", Harvard Economic Studies, H. University Press, 1934. ScHUMPETER, Joseph A.- "The analysis of economic change", Review of Economic Studies, Maio de 1935.

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A THEORETICAL APPROACH TO THE POLITICAL ECONOMY OF FISCAL CYCLICALITY, FORECASTS AND CONSOLIDATIONS

Nuno M. Venes Economista. Professor Auxiliar (Universidade Lusiada de Lisboa) . CITIS - Centra de Investiga<;ao em Turismo, Inova<;ao e Servi<;os



Abstract: In this paper we discuss some relevant theoretical issues that help to explain fiscal policy outcomes. We draw our attention to three particular dimensions of fiscal policy - its cyclical behavior; forecast errors; inefficient deficits and the consequent need to carry out fiscal consolidations. Occasionally, we also describe some empirical results on the role played by political and institutional features on fiscal policy performance.

Keywords: Cyclicality, fiscal forecasts, fiscal consolidations, common pool, voracity effect, rent seeking, opportunistic business cycles, partisan business cycles, fiscal illusion.

Resumo: Neste artigo sao apresentados alguns contributos te6ricos relevantes que contribuem para explicar o desempenho da polftica on;amental. Focamos a aten<;ao em tres dimens6es particulares da politica or<;amental - o seu comportamento dclico; os erros de previsao; a ineficiencia dos defices ea consequente necessidade de levar a cabo consolida<;6es or<;amentais. Ocasionalmente, descrevemos tambem alguns resultados sabre o papel desempenhado pelos factores politicos e institucionais no desempenho da polftica or<;amental.

Palavras-chave: Ciclicidade, previs6es or<;amentais, consolida<;6es or<;amentais, common pool, efeito voracidade, rent seeking, opportunistic business cycles, partisan business cycles, ilusao or<;amental.

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1. Introduction

Fiscal policy outcomes have long been intimately linked to political and institutional frameworks. Despite the undeniable importance of purely economic variables on the performance of fiscal policy, one should bear in mind the critical influence of political and institutional aspects if a serious analysis is to be undertaken. From the huge list of different dimensions of fiscal policy which could be analysed, we intend to focus our attention on three of the most important of these dimensions - fiscal cyclicality, fiscal forecasts and fiscal consolidations. Such topics have been intensely studied both theoretically and empirically. As regards fiscal cyclicality, for instance, and according to the Keynesian conventional wisdom, fiscal policy should behave countercyclically. However, theories based on political economy literature which help to explain why fiscal policy sometimes behaves procyclically, are easily found. As far as the fiscal forecasts are concerned, political and institutional determinants assume increasing importance, particularly in European countries indeed, the well-known difficulties that some countries have been facing in terms of their public finances, as well as the enormous public visibility and policy relevance of fiscal forecasts, make them more vulnerable to political manipulation. Given the huge budget deficits recorded in some countries, significantly above the 3% of GDP threshold imposed by the Stability and Growth Pact (SGP), the only possible way for those countries is to undertake serious and credible consolidations of their public finances. To the intrinsic difficulty of this task one must add the influence of political considerations. For example, according to the theory of the war of attrition (Alesina and Drazen, 1991), deficits may persist if political actors do not agree on the implementation of fiscal reforms. As becomes clear, political arguments often exert an undesirable influence on fiscal consolidations, which is particularly dangerous in a context of heightened pressures for sizeable reductions of deficits to be carried out. The goal of this paper is to provide theoretical arguments for the outcomes of fiscal policy in some of its most important dimensions, while some empirical evidence in favour of particular arguments is also presented. In addition, in the face of the several distortions which affect fiscal policies, we will also focus on the role of fiscal rules and institutions on the reductions of these distortions (for instance, in the attempt to handle problems such as the deficit bias or the excessive volatility of fiscal policy). The structure of this paper is as follows . In sections 2, 3 and 4, we provide an overview of the relevant theories behind the cyclicality of fiscal policy, the forecast errors and the fiscal consolidations, respectively. In section 5 we focus on the role of fiscal rules and institutions, which affect simultaneously all the different dimensions of fiscal policy described above. Finally, section 6 sets out conclusions.

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A theoretical approach to th e political economy of fis cal cyclicality, forecas ts ... , p. 79-92

2. The cyclicality of fiscal policy Researchers have recently been paying greater attention to the behavior of fiscal policy over the business cycle. According to the Keynesian wisdom, fiscal policy should behave countercyclically, with public expenditure and taxes acting in such a way as to stabilise the business cycle. Another well-known theoretical statement related to fiscal cyclicality is the "tax-smoothing" hypothesis, according to which tax rates should be held constant over the business cycle for a given path of public expenditure (Barro, 1979). This would minimise the distortionary effects of tax burden. The neoclassical literature is relatively weak in offering normative conclusions as regards public expenditure, since the typical assumption is that public expenses are exogenously determined (Lucas and Stokey, 1983; Blanchard and Fisher, 1989). As regards procyclical fiscal policies, one possible explanation for this behaviour is given by Gavin and Perotti (1997). They argue that procyclicality, which is more commonly found in Latin American countries, may have to do with the loss of access to external financing durind bad times. Hence, countries are unable to borrow in recessions, which require a contractionary fiscal policy. Lane and Tornell (1998) and Tornell and Lane (1999) give an alternative political explanation for the question as to why many countries follow seemingly procyclical fiscal policies. According to these authors, during booms, the higher availability of resources increase the common pool problem1, and the fight over common resources intensifies, leading to budget deficits. This is what they call the "voracity effect". Talvi and Vegh (2005) argue that procyclicality in developing countries has much more to do with the variability of the tax base in these countries (between two and four times higher than in G-7 countries). The authors develop an optimal fiscal policy model that includes a political distortion according to which there exists an endogenous component of government spending that depends positively on the budget surplus. A government facing strong fluctuations in the tax base will be forced to accept an increase in expenditure in good times, since political pressures become harder to resist. Given this political distortion, the best way to avoid a high growth in expenditure is to lower tax rates. This procyclical behavior is a second-best response to that political distortion. This explanation contrasts with the one given by Gavin and Perotti (1997) . In addition, the authors refer to the contribution of Lane (2003), according to whom procyclicality is also present in many OECD countries, for which the lack of access to international credit markets has not been typically an issue. A different political argument for this procyclical behavior relates to the theory of rent seeking. The concept of rent seeking, referring generally to expen1

The common pool problem occurs w hen policymakers do not fully internalise the costs of their d ecisions in terms of public expenditure, leading to higher d eficits.

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diture of resources to win a contestable prize, was introduced by Tullock (1967), while the term itself was introduced by Krueger (1974). In his paper, Krueger summed up the basic idea (p. 291): "In many market-oriented economies, government restrictions upon economic activity are pervasive facts of life. These restrictions give rise to rents of a variety of forms, and people often compete for the rents. Sometimes, such competition is perfectly legal. In other instances, rent seeking takes other forms, such as bribery, corruption, smuggling and black markets." By focusing on the use of costly resources, the rent seeking literature highlights the socially undesirable consequences of contesting rents. In a recent work, Alesina et al. (2008) have shown that procyclicality in many developing countries occurs because rational voters face corrupt politicians who appropriate part of the revenues for unproductive spending - political rents. When voters realise that a positive income shock has hit the economy, they demand immediate benefits in the form of tax cuts or increases in productive government spending or social transfers. They fear that otherwise the available extra resources would be "wasted" in rents. In the face of such a procyclical demand by voters, governments avoid to accumulate reserves in good times. They prefer to incur large debts, which is considered, from the voter's point of view, a second best indeed, if on the one hand they give up on consumption smoothing, on the other hand they avoid leaving excessive rents to corrupt governments. Finally, Woo (2009), emphasises the role of social polarisation in understanding procyclical fiscal stances often observed in a number of countries. When there is polarisation of social preferences over public choices, the incentives become greater for policymakers to implement their preferred policies. However, this individual rationality may threaten efficiency for the economy. According to the author, such incentives may become particularly strong during boom periods, since increased revenues or new resources make their preferred policies seem easier to implement, thus producing procyclical fiscal policies.

3. Fiscal forecasts - why do governments frequently err?

At least, formally developed, a "theory of fiscal forecasts" seems not to exist (Strauch, et al., 2004). Nevertheless, a number of explanations may fit fiscal forecast errors relatively well. It is the case of the opportunistic business cycle models (Nordhaus, 1975), as well as the partisan business cycle models (Hibbs, 1977; Alesina, 1987), which offer important insights into why governments often perform badly when they project fiscal figures . A key distinction here relates to the main objective of the policymaker when he can influence his chances of

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A theoretical approach to the political economy of fiscal cyclicality, forecasts ... , p. 79-92

remaining in power. Thus, a policymaker who has objectives which differ from other potential policymakers is termed partisan, while one whose primary goal is to remain in office is usually termed opportunistic.

3.1. The opportunistic political business cycle

When it comes to choose policy, a politician's desire to win the next election often swamp all other considerations. If, on the one hand, one can view policy changes induced by elections as a clear demonstration of accountability in democracies, it is also true, on the other hand, that such policy changes introduce inefficiencies into policymaking. Thus, a good point to start is the opportunistic desire to influence election outcomes. Early empirical work has demonstrated how electoral competition between incumbents and challengers influence aggregate measures of economic activity. The most well-known study in this respect is the one carried out by Tufte (1978). The author argues that not only economic conditions ahead of an election strongly affect voters' choices, but also politicians, being aware of this fact, try to take advantage of it. As regards forecasts, opportunistic motivations seem to drive governments to release too rosy fiscal and macroeconomic figures for the coming years, particularly if an election is to take place in the near future. By doing so, governments increase the probability to remain in power.

3.2. Partisan political cycles

The opportunistic models assume that all voters are identical in terms of their preferences, which is clearly unrealistic. Thus, models whose basic assumption is an incomplete description of reality, do not fit well when it comes to realistically predicting how political parties will behave immediately before an election takes place (Drazen, 2000). If one consider that all parties are purely opportunistic, then it would be obvious that they would converge to the same policies, those preferred by the median voter. However, one still see significant differences in terms of policy choices by different parties, which can be seen as evidence in favour of partisan models. These models assess the role of partisan differences as a driving force in political business cycles. In the most basic formulation, the partisan model considers differences in preferred policies as the only driving force, while more complex models allow for possible interactions of partisan and opportunistic differences.

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3.3. Transparency of the budget

In modern economies, the complexity of the budgets may help hiding the real balance of costs and benefits for taxpayers. Despite being partly unavoidable, this complexity is also partly artificially created, as policymakers have very little incentive to produce transparent budgets (Alesina and Perotti, 1999). On the contrary, politicians often try to emphasise the benefits of current and future spending, hide taxes and government liabilities (higher future taxes). For instance, Alt and Lassen (2006) argue that transparency leads to substantially lower deficits. This is supported by two theoretical arguments. On the one side there is the theory of "fiscal illusion" (Buchanan and Wagner, 1977), according to which voters usually overestimate the benefits of public spending and underestimate the costs of taxation. This apparent myopia caused by the lack of transparency of the budget tends to increase the voters' confusion, thus reducing the incentive for policymakers to be fiscally responsible. The second argument, on the other side, assumes that in the face of rational yet not fully informed voters, governments can retain a strategic advantage in introducing a certain degree of ambiguity by making it less clear how policies translate into outcomes (Cuckierman and Meltzer, 1986; Alesina and Cuckierman, 1990). With the purpose of strategically influence voters, governments may, for instance, overestimate the expected growth of the economy. This leads to an overestimation of tax revenues. Thus, the "unexpected" deficit at the end of the fiscal year may be attributed to unforeseen macroeconomic developments. Governments may also project overly optimistic forecasts of the effect on the budget balance of various adopted policies, as well as keep several items off the budget (creative accounting). An additional way that governments may use to influence voters is the strategic use of multiyear budgeting. For instance, by announcing a four-year adjustment plan with the hardest measures concentrated in the last years (a back loaded consolidation), governments are obviously buying time.

4. Fiscal consolidations Fiscal consolidations have been undertaken over the last decades in most EU countries as a result of the deficit bias, which becomes apparent when the structure of a government's budget is such that its promised disbursements exceed the structure of its revenues. In this case the government, even under normal circumstances, will run a budget deficit and accumulate debt. This happened in the aftermath of the two oil shocks, when large fiscal imbalances and unsustainable debt-to-GDP ratios accumulated, which forced European governments to embark on a wave of fiscal adjustment processes. Moreover, the

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run-up to euro area membership has proven the major catalyst for undertaking consolidations. More recently, the large deficits and growing debt-to-GDP ratios recorded in most of the EU countries has heightened the pressure over governments to credibly and seriously tackle their problems of public finances. This trend must continue as ageing population related medium and long-term public finance spending pressures, are expected to increase. This is especially true in Europe, both for demographic reasons and because of the generosity of many public pension schemes. Indeed, not only the number of pensioners is growing rapidly, but they also live longer and are wealthier, bringing additional pressures for social spending. Consequently, it is unsurprising that policy discussions are increasingly focused on the urgent need to reverse those trends. At least, two important sources of deficit bias in fiscal policy have been identified in the political economy literature: the theory of "fiscal illusion" (Buchanan and Wagner, 1977), already referred to in section 3.3 and the results of the strategic interactions between political actors. As regards this last issue, researchers have suggested two main ways that strategic interactions can produce inefficient deficits. Firstly, an elected leader may accumulate an inefficient amount of debt to restrain his successor's spending (Persson and Svensson, 1989; Tabellini and Alesina, 1990). Secondly, disagreement about the best way to divide the burden of reducing the deficit may cause delay in fiscal reform. This might occur because each group tries to force others to bear a disproportionate share of the burden - War of attrition model (Alesina and Drazen, 1991). This model has been used to explain the apparent propensity of coalition governments to run inefficient deficits (empirical evidence can be found, for instance, in Grilli, et al., 1991). Furthermore, persistent deficits may also be the result of a common pool problem in government spending. In some cases government spending is determined by several players who have particular influence over spending that benefits a specific interest group (for example, the members of his or her legislative district). Each player has to choose how much of the economy's overall tax base (the common pool) to exploit to finance spending that particularly benefits him or her, which often results in inefficiently high spending. This is clearly the case of the "pork-barrel" programmes, like public works projects benefitting a single legislative district, but paid for by the electorate as a whole. As an example of a static formal model, see for instance, Weingast et al. (1981). For a dynamic formalisation, see Velasco (1999).

5. Fiscal rules and fiscal institutions A number of theoretical and empirical contributions have been suggesting that fiscal institutions actually play an important role in a country's fiscal perfor-

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mance (for instance, von Hagen, 1992; von Hagen and Harden, 1994). Budget institutions include all the rules (both formal and informal) according to which the budget is prepared, approved in the parliament and carried out. These rules may exert significant effects on the outcomes of budgeting process both by distributing strategic influence among the participants in that budget process and by regulating the flow of information2 • Government spending is commonly targeted at specific groups in society, while it is financed from global tax revenues to which all tax-payers contribute. Thus, policymakers tend to engage in excessive levels of spending as they do not fully internalise the total social costs of their spending decisions (common-pool problem). This tendency to overspend increases as more representatives are involved in the spending decisions, that results in a co-ordination failure among the relevant decision makers. Researchers have been arguing that the central key to solving this problem is to create institutional frameworks that make policymakers adopting a more comprehensive view of the budget process and the budget itself. Two basic institutional approaches (or forms of fiscal governance) are shown by Hallerberg and von Hagen (1999)3 as a means to achieve that goal - the delegation approach and the contract approach. According to the former, significant strategic powers rest on an individual decision-maker - often the finance minister (less vulnerable to interest groups than the other ministers who head spending departments). During the preparation of the budget, the finance minister is given strong powers as regards the setting of spending limits, which are imposed to the other members of the executive. During the approval stage, the delegation approach is meant to protect the finance minister against sizeable and politically relevant parliamentary amendments. Finally, in the implementation stage, the finance minister holds the capacity of strongly monitoring (and correcting any deviations, if necessary) the implementation of the budget. Contrarily, the contract (or commitment) approach lies on an initial agreement (a commitment) among the parties represented in the parliament on the mediumterm budgetary strategy. This strategy may include numerical targets for specific budget items or the budget balance itself. During the planning stage, the finance minister has little power, but actually monitors the fiscal commitment. Contrarily to the case of the delegation approach, the centralisation of the budget process is ensured by the initial bargaining among policymakers. During the approval stage, the parliament assumes increased importance as it has strong powers as regards the vigilance over the executive's compliance with the budgetary targets previously defined. In the implementation stage, however, the contract and the delegation approaches are rather similar in terms of the powers held by the finance minister to control the budget execution.

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Hallerberg et al. (2007). See also Hallerberg (2004).

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Some recent empirical studies have been showing the relationship between the forms of fiscal governance and the fiscal policy performance. For instance, Pina and Venes (2007), Annett (2006) or Strauch et al. (2004), find that fiscal governance characterised by commitment or mixed 4 forms is strongly associated to more prudent budgetary forecasts. Apart from these procedural rules, another branch of the literature draws attention on the role of numerical rules (which may impose several limits to the budget balance of the general government and the other tiers of government, but they may also set limits to the expenditure and debt growth. In this respect little theoretical work has been developed perhaps due the generality of this topic. The definition of optimal quantitative rules as well as the budgetary stage in which the rules should be adopted depends on the trade-off between the commitment with a certain target and the necessary flexibility to adjust that target. In terms of empirical contributions, Pina and Venes (2007), for instance, resorted to a set of indices described in Debrun et al. (2008), and concluded that stronger expenditure rules are associated to more prudent budget balance forecasts in the EU-15.

6. Conclusions

The effect of institutions and political factors on fiscal policy outcomes has been intensively addressed in the literature. Despite assuming critical importance, purely economic variables are indeed far from providing complete answers in what fiscal policy performance is concerned. Several different dimensions of fiscal policy are identified as being closely related to political and institutional elements. In this work we have focused our attention on three of those dimensions - cyclicality, forecasts and consolidations. We sought to offer comprehensive insights into some of the most important theoretical contributions argued as being on the basis of fiscal policy results. The procyclical behaviour of fiscal policy can be related to the common-pool problem and to the rent-seeking theory. Social polarisation also seems to exert a major role. As regards fiscal forecasts, we intended to find a "theory of fiscal forecasts" that could help us to explain the reasons why do governments often err in their fiscal projections. Such a theory seems not to exist, despite both the opportunistic and the partisan business cycle models fit forecast errors satisfactorily. Besides, issues related to the transparency (or the lack of it) of the budget can also influence fiscal forecast errors.

A mixed form of fiscal governance has some elements of delegation in the fiscal decisionmaking process and some elements of commitment in the "contracts" between the executive and the opposition parties in the parliament. It only exists in countries with minority governments. 4

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Inefficient deficits, and consequently, the need to reverse them through fiscal consolidations, may be explained by the theory of fiscal illusion, but the results of the strategic interactions between political actors as well as the common-pool problem may also contribute to the accumulation of debt and deficits. Finally, the role played by fiscal rules and institutions in countries' fiscal p erformances has also been addressed.

Acknowledgements

The author thanks Jose Eduardo Carvalho for his kind invitation to write this paper, and gratefully acknowledges valuable comments and suggestions by Alvaro Pina. The usual disclaimer applies.

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DISSERTA~OES

E TESES



0 PROCESSO DE FUSAO NA ADMINISTRAC::AO PUBLICA PORTUGUESA -0 PAPEL CENTRAL DOS LIDERES INTERMEDIOS NA CONCEP<;Ao E COMUNICA<;AO DO PROJECTO

Albino Lopes Professor Associado corn

Agrega~ao

do ISCTE

Damasceno Dias Doutor em Gestao pelo ISCTE

Pedro Parreira Doutor em Gestao pelo ISCTE



Resumo: Na era da competi<;ao global, a necessidade de agiliza<;ao e flexibiliza<;ao organizacional emerge coma pilar importante dos processos de mudan<;a. A Administra<;ao Publica nao escapa a esta corrente transformacional, sendo os movimentos de fusao, uma das for<;as impulsionadoras dessa mesma dinamica. 0 presente trabalho pretende dar conta de quatro estudos realizados em duas institui<;6es da Administra<;ao Publica em fusao, uma corn regime laboral publico e outra, privado, os quais visavam analisar a cultura e a lideran<;a intermedia corn base na metodologia de Investiga<;ao-Ac<;ao e de Estudo de Caso. 0 primeiro, descritivo, analisa o diagn6stico apresentado por uma empresa de consultoria, cujos resultados parecem apontar para o fen6meno "groupthink", ou seja, o relat6rio refor<;ava as expectativas da Administra<;ao. 0 segundo, quantitativo, analisa o clima organizacional ap6s a aferi<;ao das propriedades psicometricas dos instrumentos, tendo revelado uma proximidade cultural, apesar das praticas de gestao diferenciadas e destaca o papel das lideran<;as intermedias coma agentes facilitadores de mudan<;a, elos de liga<;ao entre o topo e a base. 0 terceiro, qualitativo, interpreta os resultados obtidos nas entrevistas aos lfderes, mostrando que o processo, a partida, nao tinha objectores convictos, e se clivagens houve, seria pela condu<;ao do processo e nao por uma op<;ao a partida. 0 quarto narra os epis6dios mais marcantes da fusao, tendo por base as diferentes perspectivas de abordagem e revela que o projecto foi perdendo sentido para se resumir a uma mera mudan<;a por decreta. E discutida a questao do "choque de culturas" coma sintoma e nao coma causa dos fracassos, destacando-se a necessidade de urn projecto nascido a partir do todo em processo de fusao.

Palavras-chave: Administra<;ao Publica, Fus6es, Mudan<;a Organizacional, Lideran<;a Intermedia, Narrativas Organizacionais.

Abstract: In global competition era, the need of organizational agility and flexibility emerges as a major pillar of the change processes. Government does not escape to this transformational power, and mergers are one of the driving forces of that same dynamic. This paper intends to report four studies conducted in two GovernmentInstitutions in merging process, one of them with a public employment system and another with a private one, which aimed to examine the culture and intermediate leadership based on the methodology of Action Research and Case Study. The first, descriptive, analyzes the diagnosis made by a consulting firm,

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Albino Lopes, Damasceno Dias e Pedro Parreira

the results seem to point to the phenomenon of "groupthink", that is, the report confirmed the expectations of the Administration. The second, quantitative study examines the organizational climate after the psychometric properties of measurement instruments and revealed a cultural proximity, despite the different management practices and the role of interim leadership as facilitating agents of change, links between the top and base. The third, qualitative, interpretation of results obtained in interviews with leaders, showing that the process from the outset had no convicted objectors and if there were divisions, would be for the process and not a preliminary option. The fourth recounts the most remarkable episodes of the merger, based on the different perspectives of approach and shows that the project has lost its meaning and simply cannot be changed by decree. We discuss the issue of "cultures shock "as a symptom and not the cause of the failures, highlighting the need of creating a global project, considering merging processes.

Keywords: Public Administration, Mergers, Organizational Change, Intermediate Leadership, Organizational Narratives.

1. Intro dUI;ao

0 actual contexto organizacional tern sido caracterizado por importantes mudan<;as e transforma<;6es causadas por diversos factores, merecendo particular destaque os significativos avan<;os que se tern verificado ao nfvel tecnol6gico e a sua consequente difusao, a emergencia da sociedade do conhecimento e sobretudo, a maior exigencia do consumidor. A Administra<;ao Publica, presentemente, nao escapa a estas mudan<;as, estando a sua inevitavel reforma na agenda do dia, nao sendo, no entanto, nem facil nem consensual, balizar quer o seu leque d e abrangencia, quer a estrah~gia a adoptar. E nesta conjuntura, que se vem afirmando, na Administra<;ao Publica, urn novo paradigma organizacional, denominado de "New Public Management", compaginavel a urn conjunto determinado de ideias-chave e de processos fundamentais dos quais se podem destacar: a redu<;ao do tamanho das organiza<;6es e a emergencia duma nova postura dos seus dirigentes; a descentraliza<;ao permitindo maior autonomia e responsabilidade e novas configura<;6es organizacionais; a diminui<;ao dos nfveis hierarquicos e consequente desburocratiza<;ao dos servi<;os; a aposta das organiza<;6es em rede, coma forma de potenciar as tecnologias de informa<;ao e comunica<;ao; e a crescente orienta<;ao dos servi<;os publicos para o cidadao/utente. Em Portugal urn dos mecanismos que tern sido utilizado, tern sido, designadamente, o da fusao, quer no sector privado quer no sector publico.

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0 processo d e fusao na

Administra~ao

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2. A problematica A reforma do Estado tern ultimamente merecido particular destaque em Portugal e urn dos mecanismos que vem sendo adoptado, alias, em diversos sectores de economia no global e, em particular, em Portugal, e o da integra<;ao hierarquica, verificando-se cada vez mais intensos movimentos de fus6es no sector publico. Os fracassos dos processos de fusao, ou os menores resultados encontrados na literatura, na linha das posi<;6es tradicionais abundantemente referidas por diversos autores, sao atribuidos ao "choque de culturas" (Hofstede, 1991), nao se questionando, de facto, se essas quest6es culturais configuram urn sintoma e nao uma causa dos fracassos normalmente imputados as mudan<;as organizacionais. Em contraposi<;ao corn as teorias do "choque de culturas", as pesquisas realizadas por Beer, Eisenstat e Spector, (1990) vem destacar o papel dos agentes facilitadores da mudan<;a e sobretudo o papel crucial que, nestes casos, e atribuida a lideran<;a intermedia, em cada uma das organiza<;6es em processo de fusao. Balogun (2003), nas pesquisas que efectuou quanta ao problema da cria<;ao duma nova estrutura a partir de uma ou mais estruturas existentes, tambem releva, justamente, o papel decisivo e, normalmente, oculto dos quadros intermedios, considerados como os tradutores da mudan<;a, no seu papel de compra e venda de urn projecto de mudan<;a. 0 esquecimento, ou a mobiliza<;ao insuficiente destes quadros, conduz, na maior parte das situa<;6es, de acordo corn o autor citado, a urn inevitavel fracasso, uma vez que sao estes que fornecem aos seus colaboradores o sentido das transforma<;6es a operar. Nonaka (1994) assume, igualmente, de forma clara, a fun<;ao do nivel da lideran<;a intermedia como agente de mudan<;a, afirmando que esta nao se concretiza nem de cima para baixo nem de baixo para cima, mas sim, atraves destes dirigentes. Kanter (1997) afirma por seu lado, que a lideran<;a intermedia pode ser a mola impulsionadora da inova<;ao, da competitividade e da mudan<;a nas organiza<;6es. Perante esta problematica, pretende-se analisar a mudan<;a empreendida no processo de fusao de dois Institutos da Administra<;ao Publica, urn corn urn regime laboral e urn vinculo contratual da fun<;ao publica e outro, corn urn regime laboral privado. A investiga<;ao corporiza-se em quatro estudos que depois de devidamente triangulados dao sentido aos resultados do processo de fusao. No 1Q estudo e efectuada uma analise pormenorizada das conclus6es retiradas de urn relat6rio da analise do processo de fusao, solicitado pelo Conselho de Administra<;ao das Institui<;6es a uma empresa de consultoria. No 2.Q estudo e analisado o clima organizacional das duas institui<;6es, efectuando uma analise das lideran<;as intermedias. No 3.Q estudo, de cariz qualitativo, e analisada a percep<;ao dos gestores intermedios acerca do processo de fusao.

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No 4.Q estudo sao descritos os epis6dios narrativos que ilustram longitudinalmente as etapas mais marcantes do processo de fusao, e procura em cada urn dos epis6dios assinalar os aspectos mais importantes.

3. Abordagem te6rica dos processos de fusao

Na decada de 80, acredita-se que a maior parte dos problemas e das dificuldades enfrentadas pelos processos de fusao, passam pelos aspectos relacionados corn a cultura ea gestao da mudan<_;a. Mirvis (1985) afirma que quando a cultura de uma organiza<_;ao come<;a a estar exposta a outra, o estado de equilfbrio e perturbado, o que ocasiona muitas vezes problemas de comunica<_;ao entre as culturas. Wilkins e Ouchi (1983) acrescentam que os pr6prios valores e mesmo as convic<;6es que sao espedficos de cada cultura e que, tendencialmente, deveriam ser geridos como facilitadores do processo de comunica<;ao entre os membros da organiza<;ao, acabam por se tornar as maiores fontes de problemas de interac<;ao. Acerca do processo de mudan<_;a, Canner e Patterson (1982) entendem ser necessaria, para garantir o sucesso dum processo de mudan<_;a, o compromisso e a implica<_;ao de tres dimens6es: os promotores de mudan<;a (as pessoas que detem o poder para legitimar a mudan<;a); os agentes da mudan<;a (os que sao responsaveis pela sua implementa<;ao); os alvos da mudan<;a (as pessoas que devem adaptar-se a nova realidade em consequencia dessa mudan<;a). Na decada de 90 verifica-se uma mudan<;a de enfoque. Kotter e Heskett (1993) afirmam que o grande motor da mudan<;a e a cultura; mas afirmam, igualmente, que e na for<;a da convic<;ao e na qualidade dos dirigentes que assenta o sucesso das mudan<_;as culturais, sendo portanto necessaria que a mesma seja executada de forma continua, planeada e controlada. Por isso, acrescenta Weick (1995), torna-se necessaria o envolvimento dos dirigentes intermedias como agentes de mudan<_;a. A estes lfderes, que tern urn papel central para dar sentido a dinamica de mudan<_;a, justamente porque sao estes, quem primeiro se apercebe dos sinais de mudan<;a emergentes, sintonizando-os de forma a torna-los mais salientes ou ocultando-os; muitas vezes, porem, nao lhes e reconhecido este papel. Ecorn o prop6sito de compreender o papel destes agentes nos processes de mudan<;a profundae especificamente num processo de fusao, que procuramos reflectir tambem, sobre os estudos realizados por Janis (1982), no que se refere ao risco que pode acontecer corn a emergencia do fen6meno "Groupthink". Este pode ocorrer em situa<_;6es em que o pensamento que as pessoas desenvolvem, quando integrados em grupos, converge em busca da unanimidade, anulando completamente as motiva<_;6es para avaliar, de forma realista, as alternativas que se apresentam. Reconhecendo as complexidades e as exigencias da lideran<;a, come<_;ou a falar-se de "equipas de lfderes", ou "Comunidades de Lideran<;a" (Senge et al., 2000) as quais integram lfderes dos varios niveis da estrutura da organiza<_;ao, de

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forma a mobilizar vontades, capacidades e saberes, no sentido de ser possivel, por urn lado, conseguir atingir os objectivos definidos e, por outro, responder eficazmente aos novos desafios da qualidade, do ambiente e da responsabilidade social. Estas no<;6es contrastam corn a ideia mitica do lider (mico, tipo "lider-her6i,". A rela<;ao entre a cultura e a lideran<;a merece, ainda, ser aprofundada. Coma referem Fishman e Kavanagh (1989) a cultura de uma organiza<;ao e a forma coma as pessoas respondem aos desafios da mudan<;a e da inova<;ao e substancialmente influenciada pelos comportamentos do lider. Schein (1992) afirma, na mesma linha, que a lideran<;a organizacional e uma das fontes fulcrais de influencia nas culturas organizacionais. A refor<;ar esta posi<;ao, sao de destacar tres estudos significativos, e recentes, que tentam, precisamente, ir ao encontro da lacuna existente nesta area de investiga<;ao. 0 primeiro, urn estudo longitudinal efectuado por Kavanagh e Ashkansy (2006), tomando coma base de partida as estrategias da gestao da mudan<;a e os seus efeitos coma variaveis moderadoras, visava compreender o impacto dos lideres e da lideran<;a na capacidade de influenciar as pessoas para aceitar a mudan<;a em processos de fusao, tendo chegado as quatro ila<;6es seguintes: necessidade de seleccionar cuidadosamente a metodologia a utilizar para gerir o tipo de mudan<;a que ira ocorrer (continua, revolucionaria ou incremental); estabelecer canais de comunica<;ao fluidos e envolventes que permitam a transmissao de todas as etapas do processo a todas as pessoas; identificar e seleccionar prioritariamente os facilitadores da mudan<;a, tornando-os parceiros e em seguida, tentar convencer os mais cepticos e mais criticos da mudan<;a; e, por ultimo, liderar 0 processo reconhecendo que a mudan<;a e urn processo emocional e coma tal, as pessoas precisam de ser mudadas, corn dignidade, sendo-lhes explicado o verdadeiro sentido dessa mudan<;a. Urn outro estudo, realizado por Stoker (2006), vem corroborar a influencia que a lideran<;a exerce na gestao da mudan<;a organizacional, ao demonstrar que existe discrepancia entre a percep<;ao da gestao do topo e a da gestao intermedia nos processos de mudan<;a. 0 referido estudo conclui que essa diferen<;a reside, justamente, nas expectativas mutuas, criadas pelos dois niveis da lideran<;a, as quais, apesar de serem aparentemente antag6nicas, permitem que possa ser encontrado o ponto de intercep<;ao. Para isso, torna-se fulcra! reconhecer o papel que pode ser atribuido a lideran<;a intermedia, na compra e venda das ideias, entre a gestao do topo e o nivel operacional, e na tradu<;ao das expectativas e anseios entre essas duas for<;as . 0 terceiro estudo destaca o papel da lideran<;a intermedia na transmissao e integra<;ao da cultura organizacional em processos de mudan<;a profunda, desenvolvido por Valentino (2004), ao tentar combinar as etapas essenciais que devem ser percorridas nos processos de mudan<;a, na perspectiva de Schein (1999) em conjuga<;ao corn as competencias de Bennis (1989). A condu<;ao do processo pelos lideres, para criar condi<;6es para os empregados assumirem as transforma<;6es nas organiza<;6es, e sugerida pelo autor.

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4. Metodologia

A investiga<;ao que propomos visa desocultar o papel dos dirigentes intermedios nos processos de mudan<;a organizacional, estudando, em simultaneo, a problematica da cultura e a questao da cria<;ao de sentido que e transmitido as bases por estes actores, atraves da lideran<;a que exercem nas suas areas de influencia e como grupo. Trata-se de urn estudo de caso, inscrito no contexto dos estudos investiga<;ao-ac<;ao, dada a presen<;a de urn dos autores corn o duplo papel de responsavel de recursos humanos e como observador participante. A investiga<;ao visa contribuir para facilitar (ainda?) o processo de fusao, assim como compreender o fen6meno estudado. A componente "Ac<;ao" ganha corpo, na medida em que se pretende produzir uma mudan<;a numa comunidade, numa organiza<;ao ou num programa (Dick, 1997).

4.1. 0 Campo de Investigat;iio: as instituit;oes em processo de fusiio

A Institui<;ao "A" foi criada em 1977, tendo-lhe sido conferido urn estatuto que, na pratica, a converteu numa institui<;ao financeira regulamentadora e gestora de linhas de credito destinadas a apoiar 0 desenvolvimento dos sectores da agricultura, silvicultura, pecuaria e pesca. A Institui<;ao "B" foi criada em 1986, em virtude da adesao de Portugal as Comunidades Europeias, dando corpo a necessidade de adapta<;ao ao acervo comunitario do precedente sistema de ajudas nacionais relativas aos sectores da agricultura e das pescas, corn o prop6sito de centralizar e gerir os fluxos financeiros do FEOGA- Garantia e de funcionar como gestor do financiamento e da disciplina da interven<;ao dos demais organismos envolvidos. Atraves dum Decreto-Lei foi determinada a integra<;ao dos dois institutos num s6 organismo. 0 processo de fusao assenta no modelo de urn unico conselho de administra<;ao que assumiu as competencias atribuidas pelos estatutos aprovados pelas duas Institui<;6es.

5. Investiga<;ao empirica 5.1. 1. Q Estudo

Corn o objectivo de perceber o papel duma Empresa de Consultoria contratada para acompanhar o processo de fusao, sendo urn dos autores deste texto urn investigador participante e urn dos elementos que estabelecia a interac<;ao corn esta empresa, procedemos a uma analise do relat6rio em que se reflectia o estudo de congruencia entre a estrutura organica e os objectivos e a consequente

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recomenda<;ao do urn futuro desenho organizacional, bem coma a adequa<;ao da gestao dos recursos humanos nas diferentes areas de actividade. Da analise deste relat6rio real<;amos que o entendimento das pessoas parece suportar as conclus6es e recomenda<;6es de que todos os intervenientes consideraram a nova estrategia como 6bvia. Os pantos considerados fortes correspondem de uma maneira geral as compeh~ncias que os respondentes veem nas pessoas; os pantos fracas, ao inves, sao atribuiveis a condicionantes e actores externos a organiza<;ao. A atribui<;ao causal subjacente aos dados apresentados e interna quanto aos pontos fortes e externa quanta aos pantos fracos. Note-se que, de acordo corn a abordagem te6rica d e Rotter e de Petterson, entre outros (Lopes e Reto, 1990), quando o que funciona bem e auto-atribuido por urn individuo, grupo ou organiza<;ao e 0 que funciona mal, e atribuido a factores externos, esta-se perante urn locus de controlo externo, corn fraca ou nula disponibilidade para a mudan<;a. Os dados do relat6rio referem-se, sem hierarquizar nem diferenciar, as diferen<;as culturais e de estatuto, presumindo-se que a solu<;ao poderia encontrar-se na mudan<;a do estatuto e que dela decorreria, sem sombra de duvida, uma cultura ajustada. Ora coma os dados sobre a cultura foram concebidos num quadro de categorias antiteticas, isto e, categorias colocadas num continnum entre dois extremos, ao serem colocados como categorias sob forma isolada, e nao sob a forma de quadro construido ortogonalmente, como acontece no modelo de Quinn e por n6s utilizada noutra parte desta investiga<;ao, os valores resultantes nao teriam de evidenciar urn equilibrio entre os diversos quadrantes. No minima a cultura seria mais burocratica (regras) na organiza<;ao da Administra<;ao Publica e mais centrada nos objectivos ou na inova<;ao, na organiza<;ao mais empresarial. Ora acontece que ao nivel da cultura nao existe diferencia<;ao e, por isso, nao deveria ser tratado como problema; isto e, seria em ambos os casos, burocratica pelo que era necessaria torna-la mais inovadora e equilibrada. Deste modo, a cultura nao seria urn obstaculo a mudan<;a. Coma se pode depreender da sintese elaborada pelo editor a partir dos artigos publicados no numero especial da Revue Fran<;aise de Gestion n.Q 115, de 1997, quando a urn problema de cultura se responde corn uma solu<;ao baseada na mudan<;a de estatuto, o problema da melhoria da eficacia pode ficar sem solu<;ao, obtendo-se, inclusive, uma eficacia inferior a existente antes da mudan<;a. Mas, surpreendentemente, os respondentes nao mostraram resistencia face a mudan<;a de estatuto e apenas afloram, ao de leve, dois problemas que poderiam vir a revelar-se inc6modos: o da informa<;ao adequada e o do envolvimento dos chefes de servi<;o operacionais, ou seja os lideres da base hierarquica. Como se vera adiante, estes "pequenos problemas" revelar-se-iam verdadeiros obstaculos a condu<;ao do processo de fusao. Os dados encontrados pelos consultores parecem estar em conformidade corn o que seria legitimo esperar em qualquer organiza<;ao de cariz burocratico e administrativo, em que 0 poder e essencialmente politico e nao gestionario, coma e 0 caso das duas institui<;6es em analise.

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Em sfntese, tudo indica que a estrategia de apresenta<;ao dos dados parece ser o de nao levantar ondas e salientar os aspectos que poderiam confortar o panto de vista do CA, uma vez que, os aspectos favoraveis ao andamento da fusao mereceram globalmente uma relevancia superior a dos potenciais problemas. Estes, no entanto, pela analise que n6s pr6prios fizemos eram muitlssimo mais salientes. Podemos deste modo concluir, corn alguma seguran<;a de que o grupo resultante do par Empresa Consultora /CA funcionou coma urn verdadeiro "groupthink". 0 CA quis avan<;ar corn a execu<;ao da fusao via "top/down" e o relat6rio aponta justamente para uma postura de concordancia global sem relevar nem considerar os dados que pudessem induzir aspectos crfticos ou divergentes. Do nosso panto de vista as conclus6es que acabamos de referir revelam, corn uma clareza meridiana, que foram ditas exactamente as frases e apontados os prazos que o CA precisava para validar o curso do processo de fusao, transformalo numa mera formalidade legal e implementa-lo de facto dentro do prazo estabelecido. A leitura que se pode produzir a partir da analise crftica do relat6rio, levam a pensar que, ou nao se soube ou nao se quis tomar em considera<;ao que os "pilares" da ponte entre as duas culturas assentavam numa autentica " falha geol6gica", reduzindo urn fen6meno tao complexo coma a fusao a urn mero acto juridico I administrativo. Consideramos que neste processo o grupo inicial, que designamos de Comite de projecto, funcionou, segundo a 16gica de Janis (1982), de pensamento grupal ou "groupthink". Todos foram dizendo apenas aquilo que a administra<;ao esperava que dissessem. Do ponto de vista da Investiga<;ao/ Ac<;ao (1/ A), parecia-nos fazer todo o sentido combinar os tradicionais processos de auditoria de eficacia e de eficiencia, resultantes da interven<;ao corn vista a contribuir para o processo de mudan<;a e cujos efeitos seriam levantados a partir de inqueritos e entrevistas, corn o metodo das narrativas. Os processos de auditoria corn base em questionarios ou em entrevistas equivalem, efectivamente, a fotografias estaticas que correspondem a determinados momentos do processo. Ganhariam, por isso, em profundidade o que perdem em desenvolvimento temporal. 0 metodo das narrativas por sua vez, perde em profundidade de analise, ganhando uma dimensao crftica atraves do drama que a trama narrativa proporciona. A auditoria de acompanhamento poderia equivaler ao papel que Weick e Quinn (1999) atribuem ao agente facilitador da mudan<;a, evitando-se o eventual efeito de alinhamento corn a Alta Direc<;ao, frequentemente atribuido a empresas de consultoria contratadas e que muitas vezes, proporcionam apenas urn refor<;o do pensamento grupal. Se era tao facil decretar a fusao, porque, entao, perder tempo corn a interven<;ao de comites, de agente facilitador ou de envolvimento da lideran<;a intermedia? Eneste contexto que a IA deixava de poder seguir o seu rumo ea investiga<;ao e fon;ada a remeter-se exclusivamente as regras do estudo de caso.

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5.2. 2. 2 Estudo: analise do clima e motivariio organizacional

Este estudo de caracter quantitativo pretendia avaliar a medida da motiva<;ao nas duas organiza<;6es em processo de fusao. Tern por base os presupostos do modelo EFQM (European Foundation for Quality Management), no qual sao apresentadas variaveis utilizadas no trabalho e da rela<;ao que se preconizou existir entre elas (Neves e Lopes, 2002). 0 modelo inscreve-se tambem numa perspectiva sistemica que permite uma melhor compreensao do seu funcionamento relacionado corn a parte menos tangivel (clima, satisfa<;ao e empenhamento) em termos de causas e efeitos. Tendo por base o modelo EFQM de gestao pela qualidade total, sao contemplados os meios (lideran<;a, gestao de pessoas, estrategia de gestao, recursos utilizados e processos de transforma<;ao dos recursos em outputs), e os resultados (satisfa<;ao dos colaboradores, dos clientes e impacto da empresa na comunidade). 0 questionario designado por "EMPLOYEE MOTIVATION SURVEY" e composto por diversos itens que avaliam urn conjunto de dimens6es relevantes para a compreensao do clima e motiva<;ao organizacional.

Figura 1 - Modelo de Analise Satisfa~ao

Reputa~ao

organizacional

Objectivos da Cornunica~ao

e

Institui~ao inforrna~ao

organizacional -Corn chefia - Com trabalho - Corn carreira -Global

Gestao do conflito Estilo de

lideran~a

Aprendizagern organizacional Factores de stresse Sintornas de stresse

Irnplica~ao

organizacional

Detenninantes das recornpensas Justi~a

Polftica de Qualidade Deterrninantes das

prorno~5e s

Eficacia das estrategias de actua~ao organizacional Poder organizacional

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Cultura organizacional observada - Apoio - Inova~ao - Regras - Objectivos

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Este segundo estudo iniciou-se por uma adapta<;ao do instrumento. Foi efectuada a adapta<;ao dos instrumentos que permitiram avaliar os constructos em analise, tendo sido seguidos os procedimentos e recomenda<;6es sugeridos por Hill e Hill (2000) na avalia<;ao da validade de constructo. Recorremos a tecnica da analise factorial dos componentes principais, evidenciando a dimensionalidade do instrumento (Nunnally, 1978; Hill and Hill, 2000). A fiabilidade das dimens6es foi tambem avaliada mediante a determina<;ao do coeficiente alpha de Cronbach que globalmente apresentou valores adequados. Para o caso do instrumento de lideran<;a, alem dos procedimentos anteriormente mencionados, foram tambem efectuadas analises factoriais confirmat6rias, que mostraram indices de bondade de ajustamento adequados e de que se falara mais a frente.

5.2.1. Amostra

A amostra obtida constituiu-se por 79 dirigentes, 36 do INSTITUI<;AO "A" e 43 do INSTITUI<;AO "B", 57% do sexo masculino e 43% do sexo feminino. Em termos de idades, 43% (34) tern entre 51 e 60 anos, seguindo-se corn 40,5% (32) o grupo etario dos 41-50 anos. A maioria dos funcionarios, 84,8% (67) e detentora de uma licenciatura, seguindo-se 0 grau do 12Q ano ou equivalente corn 10,1%. Relativamente a area em que desempenham a actividade profissional, a grande maioria, 47,9% (34), trabalha nos servi<;os de apoio. No que respeita ao tempo de trabalho na institui<;ao, 35,4% (28) pertencem ao grupo dos 16 aos 20 anos, seguindo-se corn 25,3% (20) o grupo que trabalha na institui<;ao ha mais de 20 anos.

5.2.2. Instrumentos utilizados 0 questionario teve como objectivo avaliar o clima social e organizacional das duas institui<:;6es. Este instrumento, composto pelas dimens6es atras expostas, foi alvo de estudos ja efectuados em empresas e em Institui<;6es Publicas. Na Tabela 1 sao apresentadas as dimens6es, factores e itens do questionario.

Tabela 1. Instrumentos e Factores do questionario INSTRUMENTOS

FACTOR

Reputa.;ao organizacional

Reputa.;ao organizacional

Objectivos da Empresa

Objectivos funcionais (4) Objectivos globais (3)

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Cornunica~ao

e

Inforrna~ao

Transrnissao e partilha da inforrna~ao corn a chefia (3) Inforrna~ao

Estilo de

e

cornunica~ao

global (4)

Coordenador (11); Monitor (9); Mentor (8); Facilitador (13); Director (7); Inovador (8); Produtor (10) e Broker (7)

Lideran~a

Aprendizagern Organizacional

Aprendizagern Organizacional

Factores de stress

Arnbiguidade (5); Conflito pessoa-papel (4) e Carga de trabalho (2)

Sintornas de stress

Sintornas de stress (5)

Deterrninantes das recornpensas

Deterrninantes das recornpensas

Justi~a

Justi~a

Politica de qualidade

Politica de qualidade

distributiva e equidade interna (6) e equidade externa (2)

Deterrninantes das Irnpacto das Eficacia de Satisfa~ao

prorno~oes

prorno~oes

actua~iio

organizacional

organizacional

Irnplica~ao

organizacional

Cultura Organizacional observada

Deterrninantes das Irnpacto das Eficacia de

prorno~oes

prorno~oes

actua~ao

organizacional

a chefia (4); Corn o trabalho (4); Corn a carreira (3) e Satisfa~ao global (8) Irnplica~ao

organizacional

Apoio (4); Inova~ao (3); Regras (4) e Objectivos (3)

5.2.3. Estudos de construc;aofadaptac;ao e validac;ao dos instrumentos utilizados

A analise factorial explorat6ria de cada urn dos constructos evidenciou que estes eram interpretaveis, corn elevados pesos factoriais. A avalia<;ao da consistencia

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interna mediante a determina<;ao do Alpha de Cronbach evidenciou valores adequados. No entanto, foi necessario efectuar ajustamentos com elimina<;ao de itens que nao abonavam a favor da validade e fiabilidade. As analises factoriais confirmat6rias aos oito papeis de lideran<;a evidenciaram indices de bondade de ajustamento adequados. Globalmente os resultados evidenciam validade dos constructos e fiabilidade dos instrumentos.

5.2.4. Anrilise dos resultados

Os resultados apresentados nao mostram diferen<;as estatisticamente significativas entre as duas organiza<;6es, evidenciando culturas e climas similares, exceptuando-se as praticas de gestao de Recursos Humanos, onde a satisfa<;ao coma carreira e superior para a Institui<;ao "A", relativamente a Institui<;ao "B", parecendo justificar esta tendencia o facto da Institui<;ao "A" deter um vinculo laboral privado e ser subscritor duma conven<;ao colectiva de trabalho, em que as quest6es ligadas a carreira estao bem definidas e estruturadas. Nao se tendo encontrado diferen<;as globais, entre as duas institui<;6es em analise, que nos permitissem encontrar factores explicativos das dificuldades que o processo encontrava, partimos, entao, para a analise entre o grupo de lideres do l.Q nfvel, os Directores, considerados como sendo as lideran<;as de topo mais pr6ximos do Conselho de Administra<;ao, e os do 2.Q nivel, os Chefes de Servi<;o, considerados como sendo as lideran<;as intermedias mais pr6ximas do nfvel operacional. Esta analise evidenciou, justamente, diferen<;as estatisticamente significativas entre a lideran<;a do grupo de Directores e a lideran<;a do grupo de Chefes de Servi<;os, nas seguintes dimens6es: a) na reputa<;ao organizacional onde o grupo de Directores apresentava uma percep<;ao mais acentuada, o que parece indicar que por estarem mais pr6ximos do Conselho de Administra<;ao, tentavam projectar para o exterior a identidade institucional que ainda se mantinha bicefala (Institui<;ao "A" /Institui<;ao "B") e a eficacia organizacional no sentido de fazer transparecer que as institui<;6es, apesar de tudo, respondiam as necessidades do publico; b) na Comunica<;ao, informa<;ao, transmissao e partilha de informa<;ao com a chefia, mais acentuada tambem no Grupo de Directores, o que parece tautol6gico, uma vez que era este grupo quem tinha o privilegio de possuir toda a informa<;ao sobre o processo da fusao; c) nos factores de stress e carga de trabalho, mais acentuada no Grupo de Directores, o que podera ser justificado pela sobrecarga de tensao acumulada, pelo arrastamento do processo e provavelmente pelo conflito interno que acumulavam, por reconhecer que a participa<;ao e o envolvimento dos Chefes de Servi<;o era crucial; d) no papel de lideran<;a Monitor em que a evidencia deste papel parece associar-se a necessidade deste grupo de Directores ter a responsabilidade de acompanhar e explicar, em interac<;ao com o Conselho de Administra<;ao, todo o processo de fusao; e) no papel

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de lideranc;a Inovador (era urn dos mais evidentes no grupo dos Directores) porque todo o processo de mudanc;a estava concentrado neste nivel de lideranc;a, a exigir, por isso, uma profunda intervenc;ao no sentido de tornar as duas Instituic;oes mais ageis, no sentido de prestar urn melhor servic;o aos clientes; f) nas determinantes das recompensas, em que parecia existir uma noc;ao de que efectivamente este nivel de enquadramento era o que merecia maior considerac;ao por parte do Conselho de Administrac;ao; g) nas politicas de qualidade, parecendonos evidente que a tonica de empreender mudanc;as, contrariar rotinas, gerar novos processos, implementar novas formas de organizac;ao do trabalho, estavam a cargo e sob responsabilidade deste nivel hierarquico; h) e na satisfac;ao organizacional corn a chefia e satisfac;ao organizacional corn o trabalho, vem corroborar o comentario feito atras, as dimensoes: "determinantes reputac;ao organizacional"; eficacia organizacional; comunicac;ao, informac;ao, transmissao e partilha de informac;ao corn a chefia; factores de stresse e carga de trabalho; papel de lideranc;a Monitor; papel de lideranc;a Inovador; determinantes das recompensas; politicas de qualidade e satisfac;ao organizacional. A sintese dos resultados apresentada, parece confirmar, que nao seria nem o clima nem o choque de culturas o criador de obstaculos ao processo de fusao, ao contrario do que se poderia depreender, na sequencia da generalidade dos autores que trataram do tema. Existia apenas uma diferenc;a na dimensao satisfac;ao corn a carreira, que julgamos justificar-se pela diferenc;a dos tipos de vinculos laborais que as duas instituic;oes possuiam. Onde encontramos, de facto, diferenc;as significativas em variadas dimensoes, e na comparac;ao entre os dois niveis de lideranc;a, a mais proxima do Conselho de Administrac;ao (grupo dos Directores) e a mais proxima do nivel operacional (grupo dos Chefes de Servic;o). Parece assim que nao e urn problema de cultura mas sim de gestao, na medida em que, nao foi tido em conta o papel da lideranc;a intermedia na criac;ao do sentido, que e transmitido as bases, e no seu duplo papel de compra ao topo e venda aos seus colaboradores, de urn novo projecto organizacional. Manz, Bastien e Hostager (2002), ao analisarem o processo de mudanc;a, no modelo que intitularam "bicicle", fazendo uma analogia a forma como a bicicleta funciona, chamam a atenc;ao para a importancia da roda dentada do meio (lideranc;a visionaria), entre a roda de tras (lideranc;a participativa) ea roda da frente (lideranc;a transaccional). Concentram, deste modo, na necessidade de movimentar permanentemente a roda do meio, ou seja, o ciclo visionario, para que as pessoas envolvidas nao percam o sentido da mudanc;a. Por isso, entendem estes, que quem deve "pedalar" permanentemente a tal roda dentada, sao os lideres que estao em contacto directo corn a base operacional. Sao estes, igualmente, segundo Weick (1995), os tradutores da mudanc;a e, por isso mesmo, os adores chave no ciclo de mudanc;a. 0 processo parece, deste modo, constrangido a dividir as organizac;oes em dois, sendo precisamente no nucleo interior do corpo dos lideres intermedios, que passa a fronteira entre o baixo e alto da organizac;ao, tendo-se, neste caso, gerado urn estrangulamento organizacional.

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Estudo: analise qualitativa da percep~iio, do processo de fusiio, dos gestores intermedios

5.3. 3.Q

A terceira parte do trabalho empirico consistiu num estudo qualitativo que pretendeu analisar a percep<;ao dos gestores intermedios acerca do processo de fusao. 0 estudo recorreu a entrevistas que abrangeram dirigentes de diferentes niveis hierarquicos, distribuidas pelas varias areas funcionais e que foram efectuadas corn recurso a utiliza<;ao de novas tecnologias de informa<;ao e comunica<;ao, explorando as potencialidades destas, corn a utiliza<;ao de urn programa "Moodle", em regime de "software livre", o qual permitiu o tratamento das entrevistas de forma electr6nica, garantindo ainda a necessaria confidencialidade. Para a recolha da informa<;ao, elaborou-se urn Guiao de Entrevista, cuja estrutura de concep<;ao distingue tres momentos: a defini<;ao das quest5es iniciais ou preliminares, seguindo-se as quest6es intermediarias e, por ultimo, as quest5es finais. Procuramos utilizar uma tecnica assente num processo chamado de afunilamento, o qual consiste em colocar no inicio as quest6es amplas sobre o t6pico em aprecia<;ao, apelando justamente a interpreta<;ao que cada individuo tern de si proprio e das suas demais vivencias e experiencias, na linha do raciodnio de G. Brooks, quando afirma que as nossas vidas estao intimamente relacionadas corn as hist6rias que contamos. 0 processo iniciou-se corn o envio por e.mail das instru<;6es para a entrada no "Moodle", tendo sido criado, para o efeito, urn utilizador individual para cada respondente, e inseridas as instru<;5es necessarias para o preenchimento das entrevistas estruturadas, bem como para a utiliza<;ao posterior do "chat". Para o tratamento dos dados obtidos nas entrevistas, foi feita uma Analise de Conteudo segundo Bardin (1977). Seguimos as fases propostas por Bardin na analise de conteudo: a descri<;ao (a enumera<;ao resumida, ap6s tratamento, das caracteristicas do texto) e a interpreta<;ao. Ap6s a pre-analise das entrevistas transcritas (leitura flutuante ou leitura solta), procedeu-se a uma analise detalhada de cada uma das entrevistas, partindo do geral para o particular, e come<;amos a identificar grandes areas tematicas para posteriormente as podermos arrumar em categorias. Da analise de conteudo efectuada as entrevistas, come<;amos por verificar que a forma de articula<;ao interna, entre os diferentes 6rgaos das institui<;6es, apresentava algum equilibrio, nao parecendo existir uma clivagem entre os organismos, mas sim entre os niveis hierarquicos. Tudo indica que existia uma certa convergencia quanto ao grau de compreensao dos objectivos, por parte da estrutura hierarquica de ambos os organismos, muito embora os respondentes, maioritariamente, associassem os objectivos a aspectos de caracter economicista. A informa<;ao foi veiculada preferencialmente por canais informais, pelo que nos parece ter havido pouco cuidado em delinear uma estrategia de comunica<;ao, segmentada de acordo corn os diferentes publicos internos, para que a informa<;ao chegasse de forma clara e atempada. A mensagem foi captada por mais ou menos

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urn ten;o, dos respondentes, que faz uma leitura organizacional e politica favoravel

a fusao e dois ter<;os que foram mais reservados ou menos entusiastas, parecendo existir uma clivagem. Esta, plausivelmente, situava-se entre a hierarquia mais proxima do Conselho de Administra<;ao e a mais afastada. Procuramos em seguida abordar a tematica que se ligava a propria implica<;ao dos respondentes, face a concordancia corn a necessidade de fusao, constatando que 38% nao concordavam corn a fusao, no inicio, e 12% hesitavam na resposta, o que indica que os respondentes estavam divididos dado que, as respostas positivas se situavam nos 50%. Atendendo a estas respostas, parece confirmar-se a percep<;ao que tinhamos da separa<;ao dos dois blocos; tudo indica que, dado o universo dos respondentes incluir dirigentes do l.Qnivel- Direc<;ao, e os do 2.Q nivel- Chefias de Servi<;o, que esta dicotomia nas respostas se possa atribuir a clivagem entre esses dois niveis hierarquicos, na medida em que o primeiro nivel era o que detinha a informa<;ao vinda do topo. Quisemos, em seguida, perceber ate que ponto essa concordancia ou discordancia era partilhada pelos superiores; tambem aqui, aparentemente, se verificava a tendencia para a fractura em dois blocos: 20% responderam que nao concordavam e que 12% se mostravam hesitantes, o que corrobora a analise anteriormente feita, ou seja, a existencia dum grupo que alinhava corn o topo e outro nao tao alinhado. Porque entendiamos que o aproveitamento, ou a utiliza<;ao deste enquadramento hierarquico espedfico (chefias intermedias), podia sera chave para veicular as mensagens importantes do topo para a base, procuramos saber como foi recebida a noticia da fusao pelos seus colaboradores e subordinados. Esta questao, mais do que todas as anteriores, confirma que o grupo hierarquico intermedio se dividia efectivamente em tres subgrupos: o primeiro claramente favoravel nas respostas; urn segundo grupo claramente desfavoravel; e urn terceiro grupo, que admitimos situar-se entre os dois anteriores, em que ora se junta ao primeiro, ora ao segundo, criando dicotomias situadas entre dois ter<;os e urn ter<;o das respostas favoraveis ou desfavoraveis. Tambem nos interessava perceber como e que o grupo dos respondentes percebeu o alinhamento dos seus pares face ao processo de fusao. A partir desta questao, deixou de haver duvidas de que estamos em presen<;a dos tais dois blocos: os que afirmam que os seus pares tambem estao alinhados (49 %), parecendo-nos que este sera o grupo dos respondentes mais proximo do topo, os Directores, e os respondentes que dizem nao estar alinhados (51 %), parecendo-nos este ser o grupo mais proximo da base, o 2.Q nivel ou o das chefias de Servi<;os. Estando o processo de fusao a decorrer, e interessando que o mesmo avan<;asse sem rupturas no normal funcionamento dos servi<;os, procuramos perceber ate que ponto as quest6es funcionais eram tidas em conta. Verificou-se que os respondentes que tiveram alguma informa<;ao situavam-se na ordem dos 54%, e que os que nao tiveram nenhuma explica<;ao se situavam na ordem dos 46%, o que globalmente parece indicar que os procedimentos relativos a fusao nao foram percebidos e apreendidos. Como entendemos que a informa<;ao prestada nestes processos poderia estar relacionada corn a vontade em fazer parte do projecto e

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de alguma forma induzir as pessoas a participa~ao, verificamos que a maioria dos respondentes afirmou que nao foram devidamente informados. Interessou-nos perceber, tambem, dado que o processo se ia consumando a medida que a estrutura organica ia sendo adaptada a nova realidade, o sentimento de equipa que entretanto se estava a desenvolver, verificando-se que a maioria recusava o processo. Procuramos tentar perceber qual a percep~ao que os respondentes tinham do que, ainda, podia ser feito para que as pessoas aderissem ao processo, tendo verificado que as suas preocupa~6es recobrem os diversos aspectos associados a urn processo participativo, sem distin~ao entre a Institui~ao "A" e a Institui~ao "B". Esta, curiosamente, foi a pergunta a qual se obtiveram o maior numero de respostas e a totalidade dos respondentes aproveitava justamente a ocasiao, talvez para enviar urn recado para cima, utilizando a pesquisa, procurando dar ideias positivas para que o processo retomasse o rumo desejado. Ao tentar perceber ate que ponto a fusao se mostrava viavel, a maioria dos respondentes ate entendia que o projecto de fusao se mostrava compatfvel. Estas respostas sao curiosas, dado que nos permite concluir que o processo, a partida, nao tinha objectores convictos, e se houve clivagens, tera sido pela condu~ao do processo e nao por uma op~ao apriorfstica. Quisemos perceber tambem, na opiniao dos respondentes, quais seriam os eventuais obstaculos que se colocavam a integra~ao dos dois institutos, tendo obtido repostas indiferentemente distribufdas pelos dois organismos, tendo as subcategorias obtido as seguintes percentagens: choque de cultura (22 %); estatutos divergentes (17%); desconfian~a do trabalhador (7%); metodos de trabalho diferenciados (19 %); falta de comunica~ao (7%); indefini~ao estrategica (28%). Trata-se de obstaculos a cria~ao dum projecto de unifica~ao e manifesta falta de estrategia adequada. Esta visao que nao se afasta da perspectiva que apresentamos no quadro sfntese que se encontra no final desta analise. E curioso verificar que os problemas de cultural estrategia aglutinam cerea de metade das quest6es (50%). Quisemos perceber, ainda, se os respondentes entendiam qual o valor acrescentado que o processo poderia induzir e as respostas obtidas equivalem-se. A literatura, como ja fizemos referenda, diz-nos que na maior parte das fus6es as sinergias acabam por ser negativas. As respostas parecem reflectir, em parte, esta suspeita, acerca da situa~ao. Criada. Curiosamente, quer o sim quer o nao repartem-se de forma equitativa pelos dois organismos. As respostas obtidas acerca do potencial de abrangencia que o novo organismo a criar iria trazer, a maioria das respostas apontam para uma estagna~ao e mesmo receio da manuten~ao do posto de trabalho, e 33% mostram-se hesitantes quanto ao aproveitamento das suas competencias, verificando-se, inclusivamente, mais uma vez, que mesmo o ter~o dos respondentes, que se situa proximo do topo, demonstra igualmente alguma desconfian~a em rela~ao ao futuro. Por ultimo, quisemos perceber ate que ponto os metodos de trabalho dos dois organismos seriam incompatfveis, tendo verificado que 26% dos respondentes os acha compatfveis e 38%, embora corn modifica~6es, tambem acha que os

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metodos de trabalho podem vir a ser compativeis. Confirma-se, assim, que se ouve falhas, elas remetem para o progressivo afastamento da alta direc<;ao face a generalidade dos dirigentes, e principalmente, dos mais pr6ximos da base, os chefes de servi<;o. Os dados revelam a fractura do corpo dirigente e a "impossibilidade" do exerdcio da fun<;ao de media<;ao, pelos lideres intermedios enquanto corpo. Esta sfntese permite-nos concluir ainda que 0 processo, a partida, nao tinha objectores convictos. Se atendermos a abordagem te6rica que considera os dirigentes intermedias como intermediarios necessarios, no processo de mudan<;a organizacional, este aspecto foi claramente descurado, comportando-se, entretanto como uma for<;a que se anula no seio da ac<;ao. Se tivermos presente, conforme refere Valentino (2004), as competencias que Bennis (1989) sugere que sejam desenvolvidas e as etapas essenciais que Schein (1999) preconiza para que as pessoas, na organiza<;ao, assumam a mudan<;a, parece-nos tambem que corrobora o entendimento que temos vindo a expressar, na medida, em que, ao confrontarmos as perspectivas atras referidas, corn os resultados de sfntese das entrevistas, verificamos os seguintes contrastes: 1. g Contraste Competencia (Bennis) Liderar corn visao. Etapa de Schein; Induzir uma nova visao.

Pouca conviq;ao face a nova visao: A decisao de fusao surge coma imposta e nao como uma vontade assumida.

2. g Contraste Competencia (Bennis) Liderar corn sentido. Etapas de Schein Formar e dar feedback; Desenvolver urn papel positivo.

Exclusao face a informa~ao acerca do processo Informat;ao transmitida preferencialmente aos Directores; Decisoes tomadas sem a participa<;ao de liderant;a intermedia (os Chefes de Servi<;o).

3. Q Contraste Competencia (Bennis) Liderar gerando confiant;a. Etapas de Schein; Facultar oportunidades de format;ao; Criar o sentido de mudan<;a e auto-aprendizagem; Apoiar e dinamizar grupos.

Desconfian~a face ao futuro Incerteza quanto ao seu destino; Incerteza quanta ao rumo do processo; Nao controlo da situat;ao; Ultrapassagem pelos acontecimentos.

4. g Contraste Competencia (Bennis) Liderar apelando a auto-gestao. Etapas de Schein; Alinhar as organizat;5es corn novas formas de trabalhar e pensar.

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Falta de interac~ao e participa~ao A interac<;ao, quer corn o nivel imediato (Directores) quer corn o Conselho de Administra~ao, mostrava-se inconsistente; 0 sistema de comunicat;ao estava dificultado justamente pelo afastamento dos lideres intermedios no processo de fusao .

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Parece haver urn paradoxo nestes processos de fusao: instabiliza-se a lideran<;a intermedia quando e esta que pode ganhar a base para 0 exito da opera<;ao.

5.4. 4. Q Estudo: epis6dios narrativos da fusiio

Este ultimo estudo de natureza qualitativa teve como principal objectivo compreender como as pessoas constroem a experiencia de participar num projecto de fusao, desenvolvido no seio de uma organiza<;ao, utilizando as hist6rias como pivot para fazer sentido, ajudando a compreensao, sugerindo uma ordem causal para os eventos, permitindo que as pessoas falem sobre as coisas ausentes, actuando como mnem6nica, ac<;ao guia e fazendo partilhar valores e significados atraves das narrativas. Procura-se perceber os sinais de mudan<;a emergentes, de forma a torna-los mais salientes, captando os sinais que traduzem e explicam as revoltas, os anseios, as angustias e tudo o que se passa a margem do processo de mudan<;a em si. A orienta<;ao metodol6gica foi derivada da interpreta<;ao hermeneutica, utilizando-se, neste caso, a analise desse metodo de narrar os acontecimentos. 0 diario de investiga<;ao foi apresentado depois sob a forma de narrativa, ap6s analise e ordena<;ao dos epis6dios recolhidos por urn dos autores deste texto que desempenhou o papel de observador participante. Do texto produzido pode verificar-se, que a composi<;ao do Conselho de Administra<;ao (C.A.), a partida, corn a inclusao de elementos que ja haviam pertencido anteriormente as duas institui<;6es, se por urn lado trazia vantagens designadamente ao nivel operacional, por outro, ao nivel do processo de fusao em si, esta situa<;ao mostrava-se delicada na medida em que gerava urn certo ambiente de divisao entre elas. A tentativa salom6nica do C.A. de nomear metade dos dirigentes da institui<;ao "A" e a outra metade da institui<;ao "B", esta acabou por criar do is blocos de dirigentes, aparentemente antag6nicos, em cada uma das estruturas, corn urn sentimento de n6s e eles, parecendo-nos ter-se perdido o sentido de coesao, e de cumplicidade. A sinergia que era expectavel e desejavel vir a acontecer, em projectos desta natureza, funcionou ao contrario. As praticas de recursos humanos diferenciadas, em nada terao contribuido para facilitar o processo. 0 epis6dio caricato, e corn uma certa gra<;a ate, de troca de log6tipos, para uns A/B e outros B/ A, parece reflectir que as quest6es ditas simb6licas, intangiveis, perduram para alem das regras e rotinas organizacionais. Parece-nos tambem basilar que num processo desta natureza, a gestao da identidade deve ser muito bem cuidada, uma vez que estes sao indicativos justamente dos problemas submersos e, como tal, devem ser, na nossa perspectiva, tidos em conta na forma como se gere a cultura. A mudan<;a politica do C.A. viria a complicar ainda mais a situa<;ao ja de si, completamente confusa. Se de facto o processo nao estava a correr como o desejavel, a mudan<;a da lideran<;a do topo, sem a manuten<;ao de pelo menos urn membro da equipa anterior, deitou por terra completamente

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o processo, parecendo-nos desejavel que os projectos desta natureza sejam conduzidos, do principio ao fim, por uma mesma equipa, orientada pelo mesmo lider de projecto, coma recomendam Womack et al. (1990), a partir da explica<;ao que fazem dos exitos na cultura japonesa. 0 sentimento de protec<;ao dos funcionarios pelas chefias intermedias, funcionou quase coma se de urn sindicato se tratasse; esta cumplicidade que caracterizava a rela<;ao e a interac<;ao entre as chefias intermedias e os colaboradores poderia ter sido aproveitada, justamente, para dinamizar e facilitar o processo se a aposta tivesse sido feita no sentido de implicar estas chefias no processo, na linha do que e preconizado pelo modelo de lideran<;a de Hersey e Blanchard. Os autores, comae bem conhecido, prop6em que se actue no sentido de desenvolver competencias e saberes no perfil de colaboradores, do tipo "M4", ou seja, gran de maturidade e autonomia para assumir responsabilidades. Isto teria facilitado o processo de delega<;ao de poderes, libertando assim a lideran<;a de topo dos problemas da gestao corrente e para se dedicar as verdadeiras quest6es, num processo de mudan<;a. Curiosamente, verificou-se mesmo algo de estranho, se atendermos a base te6rica do modelo: a lideran<;a intermedia foi claramente envolvida numa primeira fase coma se tratasse de colaboradores do tipo "M4", para em seguida ser dividido em dois, em que o grupo dos lideres mais pr6ximos do CA passaram a ser tratados coma tipo "M3" e os mais pr6ximos da base, a serem tratados coma se fossem do tipo "Ml". Das narrativas deduz-se que o problema da comunica<;ao, ou falta dela, tornava-se visivel senao mesmo, critica. A informa<;ao nao circulava. Antes, parecia existir urn gargalo que afunilava o fluxo de informa<;ao para baixo e para cima. Sentia-se a falta de alguem que intermediasse as mensagens quer de cima quer de baixo. Segundo as pesquisas de Dotlich, Noel e Walker (2005), a maior dificuldade coloca-se na gestao da "zona neutra", conforme ja anteriormente referimos. Trata-se segundo Bridges (1980), dum vazio que caracteriza o impasse entre a velha e a nova realidade em que as duas culturas se "partem", as emo<;6es e raz6es se confundem, sendo necessaria uma lideran<;a que ajude a alavancar e a fazer ressurgir uma nova realidade, permitindo, assim, refazer valores, reorientar atitudes e refor<;ar o auto-conceito. Na perspectiva de Dotlich, Noel e Walker (2005), parece que, o papel da lideran<;a intermedia, mostra-se crucial para garantir que a transi<;ao seja bem sucedida. Este papel de liga<;ao, que segundo a literatura e atribuida a chefia intermedia, nao foi tido em conta, neste caso. 0 que parece claro nas narrativas e que 0 processo nao tera sido gerido da melhor forma e que o progressivo alheamento das chefias intermedias se traduziu numa completa anomia por parte das pessoas. Mostram, tambem, conforme fizemos referenda, a importancia central do papel da lideran<;a intermedia, cuja ausencia de implica<;ao coerente e activa retirou vida e alma ao proprio processo.

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6.

Valida~ao

dos dados apurados

Os resultados dos quatro estudos, globalmente apontam para sustentar a validade do conceito de bloqueio ou de "tradu<;ao" entre a base e o topo das organiza<;6es aplicado as chefias intermedias na sua triplice dimensao de: 1. Validade de construto (satura<;ao das fontes de informa<;ao e completude do conceito de lideran<;a intermedia, a partir de estudos sincr6nicos e diacr6nicos), inqueritos e entrevistas versus narrativas, fazendo corn que uns remetessem para os outros e desse modo fizessem evoluir o sentido da pesquisa no terreno; 2. "Validade interna", a qual depende dos criterios de aceita<;ao e de coerencia, pelo que se utilizaram, como suporte de informa<;ao, outros estudos, e aqueles que nos pr6prios realizamos junto da totalidade do subgrupo em estudo, para responder ao primeiro criterio; no que respeita ao 2.Q criterio (coerencia interna), pela sua dificuldade em termos de operacionaliza<;ao, procuramos ter em considera<;ao todas as formas de fugir a subjectividade, atraves do caderno do observador, de entrevistas electr6nicas e de questionarios, aetas de reuni6es, etc., procurando sempre estar muito pr6ximos das abordagens te6ricas existentes e assim controlarmos o grau de validade dos resultados que iamos encontrando; 3. "Validade externa" a qual se prende corn a generaliza<;ao. Se bem que nao fosse o nosso prop6sito explicito, nao deixamos de ter presente a fonte de inspira<;ao mais citada para a moderniza<;ao administrativa, por urn lado, e a problematica vasta e complexa das fus6es e aquisi<;6es, para que a generaliza<;ao; no que respeita ao papel da lideran<;a intermedia, pudesse fazer-se sem temeridade excessiva.

Os dados parecem-nos robustos e sublinham o caracter crucial do envolvimento da lideran<;a intennedia e do erro fundamental que consiste na sua instabiliza<;ao.

7. Amilise integrativa de resultados

Da analise global dos resultados, importa salientar a necessidade de ter em conta quatro aspectos: 1. Prepara<;ao das institui<;6es para a necessidade de mudan<;a, agiliza<;ao e flexibiliza<;ao; alinhar a Administra<;ao Publica Portuguesa por este novo paradigma a luz do conceito do New Public Management e trazer este paradigma para o seio da discussao na Administra<;ao Publica Portuguesa; 2. A fusao/aquisi<;ao como forma de induzir mudan<;as profundas e criar sinergias no sentido de juntar valencias e ajudar a responder a publicos

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mais exigentes, evitando duplica~ao de estruturas; devera ser muito bem preparada e conduzida por equipas de projecto estaveis; 3. As possibilidades de media~ao dos lideres intermedios deverao ser reconhecidas, evitando-se a pouca considera~ao pelo seu papel, como no caso vertente; 4. As narrativas organizacionais, como forma de organizar o material recolhido por urn observador participante e a utiliza~ao das hist6rias como pivot para fazer sentido ajudando a compreensao, sugerindo uma ordem causal para os eventos, permitem situar as opinioes das pessoas, actuam como mnem6nica, como ac~ao guia e podem ser devolvidas aos intervenientes como instrumentos de partilha de valores e significados. 0 caso em estudo insere-se, precisamente, no ambiente desta altera~ao paradigmatica, referido no primeiro ponto, e que pode ser associado a mudan~a por fusao/aquisi~ao de dois organismos muito diferenciados da A.P., decidida por decreta. Reportando-se ao problema da cria~ao duma nova estrutura a partir de uma ou mais estruturas existentes, (Balogun, 2003) releva, a este prop6sito, o papel decisivo, e normalmente esquecido, dos quadros intermedios, considerados como os tradutores da mudan~a, no seu papel de "compra" e de "venda" de urn projecto, na linha do que tinha igualmente proposto Weick e Quinn (1999). 0 esquecimento ou a mobiliza~ao insuficiente destes quadros tern conduzido, na maior parte das situa~6es, de acordo corn Balogun, a urn inevitavel fracasso, uma vez que sao estes que fornecem aos seus colaboradores o sentido das transforma~6es pretendidas pelo topo da organiza~ao. No ambito da sua pesquisa sobre a gestao do conhecimento e das transforma~6es que implica, Nonaka (1994) assume claramente a fun~ao de lideran~a intermedia como agente de mudan~a, afirmando que esta nao se concretiza nem de cima para baixo (top/down) nem de baixo para cima (bottom/up), mas sim atraves da ac~ao mediadora da lideran~a intermedia. 0 autor tern, de resto, voltado ao tema, repetidamente. A mudan~a em apre~o, perspectivada sob a forma de decreta imperativo, determinando a fusao de dois organismos muito diferentes, passou por cima das quest6es levantadas por estes autores, nao envolvendo, no processo a dita gestao intermedia. Independentemente do sector de actividade ou da natureza juridica das organiza~6es em causa, a literatura tern referido o cuidado a ter na compatibiliza~ao entre culturas organizacionais diferentes, evidenciando a no~ao de choque entre culturas e do potencial perigo dai decorrente para a eficacia .das fus6es ou aquisi~6es. Os resultados de diversas investiga~6es apontam mesmo para urn nivel de fracassos (por falencia ou por menor eficacia, menor eficiencia, ou por ambas) proximo de 70% dos casos (Aiello e Watkins, 2000; Ashkenas e Francis, 2000). 0 papel dos lideres intermedios tern, entretanto, sido desvalorizado pela sua fun~ao de obstaculo eventual a passagem da comunica~ao entre o topo e a base das organiza~6es. Os estudos de Mintzberg, a prop6sito da agiliza~ao das estru-

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turas organizacionais, tern igualmente denunciado a desvaloriza<;ao da importancia destes mesmos lideres. Estes sao conhecidos pela sua fun<;ao balcanizadora e geradora de dificuldades a necessaria transversaliza<;ao das estruturas organizacionais, mas e o mesmo autor a sublinhar que a ac<;ao deles e, entretanto, necessaria e ate crucial para se obter esse efeito. Depende da lideran<;a de topo que eles actuem de uma forma ou da outra. Apenas algumas investiga<;6es enquadradas na literatura sobre mudan<;a organizacional tern levantado de forma consistente a necessidade de uma media<;ao entre o alto e o baixo das estruturas organizacionais, dai derivando o problema das lideran<;as intermedias corn urn duplo papel, de "compra" ao topo e "venda" aos seus colaboradores, de urn novo projecto organizacional (Weick, Quinn, Blogun, Nonaka, Mintzberg). Destas investiga<;6es podera concluir-se pela necessidade de desocultar o papel da lideran<;a intermedia, tal como e entendida pelo senso comum, de que esta mais nao seria do que uma mera instancia de liga<;ao e, como tal ultrapassavel, senao mesmo dispensavel, na rela<;ao entre o topo ea base. No caso vertente, a instabiliza<;ao do vinculo e dos cargos destes lideres, como ja fizemos referenda, contribui para o bloqueio do processo. A ideia do choque de culturas, por sua vez, tern relevancia pela positiva e negativa. Pela positiva, porque parece poder ser vista, na linha da corrente minoritaria emergente na qual nos temos baseado, como urn sintoma e nao como uma causa dos fracassos. Sendo este choque inevitavel nos casos de mudan<;a organizacional e de cria<;ao de estruturas ageis, a partir de organiza<;6es antes redundantes, o choque sera uma variavel a ter necessariamente em conta. De resto, se as estruturas hierarquicas procuram cada vez mais evoluir para configura<;6es em rede, a resistencia a mudan<;a estaria, inclusive, a indicar o caminho correcto, na medida em que mostra as condi<;6es de avan<;o, embora problematico, nao podendo, por isso, ser vista como negativa mas sim, como sintomatica. Pela negativa, tern relevancia porque nao permite enfocar o verdadeiro problema da cria<;ao de urn projecto, nascido a partir do todo em processo de fusao, consolidando apenas a ideia da importancia de evitar uma incompatibilidade que possa fazer perigar o projecto concebido pelo topo da organiza<;ao. E o proprio conceito de choque de culturas que assim fica em causa, podendo falar-se antes em potencial cultural de uma fusao, desde que se tenha em conta o periodo de transi<;ao, de que falam Reitter et al. (1998) e Bridges (1980). A questao da valoriza<;ao do credito idiossincratico, no sentido que lhe dao Ashkenas e Francis (2000), e proximo, igualmente, do significado que lhe atribui Hollander (cf. Reto e Lopes, 1991), que muito frequentemente o topo ou nao possui ou nao exerce, pode ser pertinente na medida em que a lideran<;a intermedia esta melhor posicionada e em condi<;6es de poder traduzir o projecto do topo, em aspira<;6es de base, e as realiza<;6es, muitas vezes quase ocultas (Quinn, 1996) da base, em vectores que se podem integrar no projecto do topo.

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Efectivamente a teoria da mudan<;a distingue, de acordo corn Weick e Quinn, entre mudan<;a epis6dica e continua. A mudan<;a epis6dica e de certo modo compativel corn a visao de urn projecto vindo de cima para baixo, bastando para o efeito que ele seja explicado, que se evitem as armadilhas culturais e que ele seja habilmente implementado passo a passo, de forma a nao gerar resistencias impeditivas do processo de mudan<;a. Reconhece-se nesta reformula<;ao a teoria da mudan<;a de Lewin em tres etapas: descongelar as ideias existentes para facilitar a entrada de urn novo projecto, reorientar os aspectos valorativos e refor<;ar os pequenos passos no sentido desejado, na 6ptica do projecto. Este processo de mudan<;a apresenta como handicap possivel urn eventual desvio face as idiossincrasias existentes, ao nao contemplar e nao permitir as ideias e propostas ja existentes na base das organiza<;6es. Ora, justamente a sua detec<;ao e valoriza<;ao, mesmo parcelar, tornaria o processo essencialmente end6geno. Em lugar de lideres que querem ser reconhecidos pelo que inovaram, as organiza<;6es necessitariam de figuras que se apagam por detras do que os seus colaboradores fizeram; lideres carismaticos mosaicos e nao totemicos (Reto e Lopes, 1991). A mudan<;a profunda, enquanto caracteristica, supostamente indispensavel nos processos de fusao, deve ser alicer<;ada de forma continua. Como tal, deve ser permanentemente relan<;ada, a partir de ciclos sucessivos de comportamentos desejaveis, sendo o papel dos agentes facilitadores de mudan<;a essencial para se estabelecer a liga<;ao entre os tres niveis da organiza<;ao (topo, lideran<;a intermedia e base). Este papel da detec<;ao dos pontos de ancoragem das alavancas da mudan<;a, parece estar apenas ao alcance da lideran<;a intermedia, como instancia mediadora e tradutora dos valores da cultura de topo e da cultura de base. Epois, o nivel intermedio que pode estabelecer as necessarias conex6es corn o topo e transformar-se no tradutor e interprete entre o topo e a base. Ao topo vai buscar as balizas da visao; a base vai encomendar a procura das melhores formas de operacionaliza<;ao, a partir de aspira<;6es e experimenta<;6es em curso, muitas vezes presentes de maneira informal. A estrutura pensada desta forma assume a inversao da piramide hierarquica, em que no topo, uma vez invertida, se encontra uma nova visao que se vai renovando continuamente, em fun<;ao das finalidades a atingir, num mundo em permanente mudan<;a. A gestao intermedia pode transformar esta visao mutante em energia motivadora, atraves de praticas de gestao adequadas ao efeito desejado. A base organizada em equipas de produ<;ao, encontra nos seus recursos cognitivos e competencias de ac<;ao, formas de materializar a visao do topo, sem que esta lhe seja imposta. Note-se que ja no inicio dos anos 80, Mintzberg apontava a necessidade de inversao da piramide hierarquica, numa das suas obras de referenda (Power), quando sao os especialistas a guiar o topo. Sendo o topo dotado de legitimidade politica, como e o caso, dispensar os dirigentes intermedios num processo de mudan<;a tao profundo, equivale a dispensar o guia, em territ6rio desconhecido e hostil.

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A lideran<;a intermedia, poderia ter agilizado quatro tipos de papeis fundamentais, de acordo corn Balogun (2003): - Dar continuidade a produ<;ao; - Detectar incidentes criticos, resultantes do proprio processo de trabalho nas equipas, as quais poderiam gerar descontinuidades problematicas; - Criar cenarios multiplos de evolu<;ao futura, de modo a preparar a organiza<;ao para a emergencia de fenomenos inusitados; - Consultoria a equipa de gestao estrategica, facilitando a sua compreensao de toda a organiza<;ao, da qual esta necessariamente mais longe do que a lideran<;;a intermedia. Ora, o caso em estudo mostra que estes papeis nao foram assegurados. 0 processo de mudan<;a teve ate, inicialmente, urn desenho que parecia relativamente correcto, ou seja: wna administra<;ao corn wn projecto; urn grupo de agentes de facilita<;ao, constituido pela propria administra<;ao, pelos directores e pela direc<;ao de uma empresa de consultoria; uma direc<;ao intermedia que deveria assegurar a transi<;ao de uma situa<;;ao para a outra; e urn estudo organizacional que deveria mostrar os pantos de ancoragem da mudan<;;a e os possiveis obstaculos. As conclus6es que obtivemos dos resultados evidenciam a preocupa<;;ao de responder apenas as exigencias formais do decreta de fusao, entendida como mero acto juridico/administrativo. Consideramos, ainda, que neste processo o grupo inicial que designamos de Comite de Projecto funcionou, apenas, segundo a logica de Janis (1982) de pensamento de grupo ou groupthink. Todos foram dizendo aquilo que se esperava ver ou que correspondia as expectativas da administra<;;ao. A investiga<;;ao, que consistiu numa primeira fase em trabalho empirico- a medida da motiva<;;ao a partir de num inquerito por questionario, composto por urn conjunto de itens avaliadores de urn conjunto de dimens6es relevantes para a compreensao da motiva<;;ao e do clima motivacional e numa segunda fase, feita a partir das entrevistas estruturadas aos lideres intermedios, demonstra que a partir de urn certo periodo, toda a logica de actua<;;ao se resumiu a cartes nos custos e na elimina<;;ao de redundancias. Ocorre que nao foi possivel estabelecer urn consenso para saber quem seria dispensavel; cada grupo de partida refugiou-se na sua trincheira; e, dentro destes, cada subgrupo passou a evitar a exposi<;;ao que colocaria, na pratica, em causa, a continuidade do seu vinculo como lider intermedio. 0 diario de investiga<;;ao, apresentado, num terceiro momento, sob a forma de narrativa, elaborada a partir da situa<;;ao de urn investigador corn o estatuto de observador participante, que permitiu ordenar as experiencias vividas a medida que iam fazendo sentido, vem demonstrar que o projecto se resumiu a implementa<;;ao formal de urn decreta de fusao

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0 processo de fusao na Administra<;ao Publica Portuguesa, p. 95-122

Cinquenta anos depois de Crozier (1963) ter evidenciado que as sociedades e as organiza<;6es nao se mudam par decreta, continuamos a assistir, na Administra<;ao Portuguesa, a urn empenhamento consistente para procurar desmentir este autor.

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AUTONOMIA FINANCEIRA E DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL DAS AUTARQUIAS PORTUGUESAS Manuel Alberta de Almeida Baptista Mestre em Economia e Politica Autarquica Doutorando em Economia (Universidade Lusiada)



Resumo: Corn este artigo pretende-se analisar as finan<;as locais em Portugal continental, nomeadamente as transferencias e o seu papel no desenvolvimento dos concelhos, assim como outros factores tambem que tambem sao essenciais, como a implementa<;ao de certas politicas que sao conducentes ao fortalecimento dos pilares do desenvolvimento sustentavel, entre elas, a existencia de urn sistema adequado de goveman<;a. Neste ambito, desenvolveu-se urn enquadramento te6rico da rela<;ao entre finan<;as locais e desenvolvimento sustentavel. Do ponto de vista empfrico analisou-se a evolu<;ao dos fundos desde 1984 e elaborou-se uma matriz do tipo Strenghts, Weaknesses, Opportunities and Threats (SWOT). Urn dos principais contributos desta tese deve-se ao facto de relacionar a evolu<;ao dos Fundos Gerais Municipais per capita corn uma serie de indicadores de desenvolvimento sustentavel, testando a sua correla<;ao corn o nivel de desenvolvimento econ6mico dos municipios (medido pelo IPC), recorreu-se a uma regressao linear multipla (Panel-data), no programa SPSS 16.0 (Statistical Package for Social Sciences), considerando os anos de 2002 e 2008. Os resultados desta regressao revelaram que os concelhos menos populosos, corn area inferior, mais rurais, corn mais endividamento, menor fndice de Desenvolvimento Social (lDS), menor numero associa<;oes municipais e de parcerias, logo corn menores indicadores de Governan<;a, corn menores despesas na protec<;ao do ambiente, corn menores condi<;oes de nfvel de vida, sao os que arrecadam maiores niveis de Fundo Geral Municipal (FGM) "per capita", mas tern men or Indicador Per Capita do poder de compra (IPC). As sucessivas altera<;oes das leis das finan<;as locais, ajustadas a realidade municipat revelam a dificuldade em se encontrar urn modelo de descentraliza<;ao financeira que seja consensual e satisfa<;a simultaneamente os objectivos de uma afecta<;ao eficiente de recursos e de equidade horizontal. Urn novo contributo, para a area em estudo, poderia ser ode comparar o impacto de outras variaveis de eficiencia da Governan<;a ja monitorizadas para outros pafses, que deveriam ser tambem utilizadas em Portugal.

Palavras-Chave: Descentraliza<;ao financeira; Finan<;as locais; Desenvolvimento Sustentavel; Analise econometrica; Governan<;a. Abstract: This article sought to analyze municipal finance in mainland Portugal, including transfers that have an important role in the degree of development of municipalities, as well as other factors also which are also

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essential, as the implementation of certain policies that are conducive to strengthening the pillars of sustainable development, including the existence of an adequate system of governance. In this context, it was undertaken a theoretical framework of the relationship between finance and local development. From the empirical point of view it was analyzed the evolution of funds since 1984 and developed a matrix of the type Strengths, Weaknesses, Opportunities and Threats (SWOT). One of the main contributions of this thesis is the attempt to relate the evolution of the General Municipal Fund per capita with a range of indicators of sustainable development, testing its correlation with the level of economic development of municipalities (measured by IPC), the regional to a multiple linear regression (Panel-data) in SPSS 16.0 (Statistical Package for Social Sciences), considering the years 2002 and 2008. The results of this regression showed that the less populous counties, with the lower, more rural, more debt, less Social Development Index (SDI), fewer municipal associations and partnerships, so with lower governance indicators, with lower costs in environmental protection, from a low level of life are the ones which register the highest levels of City General Fund (CGF) per capita, but have lower levels of per capita purchasing power (IPC). Successive changes in local finance law, adjusted to reality, show the difficulty in finding a model of fiscal decentralization that is consensual and meets all the objectives of an efficient allocation of resources and horizontal equity. A new contribution to the area of study could be to compare the impact of other variables in the efficiency of governance already monitored in other countries, which should also be used in Portugal.

Keywords: Financial Decentralization, local finance; Sustainable Development; Econometric analysis; Governance.

1. Introdu~ao

Segundo a Carta Europeia de Autonomia Local (Conselho da Europa 1985) a defini<;ao de autonomia locale o direito ea capacidade efectiva para as autarquias locais regularem e gerirem, no quadro legal, sob a sua responsabilidade e para proveito das respectivas popula<;6es, uma parte importante dos neg6cios publicos.

Siio infinitas as elaborar;oes doutrinais levadas a cabo, cam um refinamento de subtileza e matrizes, cam um virtuosismo dialetico que criou, em torno do problema, um ambiente de profunda confucionismo, resultando dificil entre o emaranhado de trio diversas definir;oes e teorias, chegar a conclusoes definitivas que unifiquem esses dispares criterios e permitam determinar, cam exactidiio, o que e que deve entender-se par autonomia ALBI (1996:191). Sobre o conceito de autonomia local tern incidido, ate hoje, grandes debates, reve-

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lando-se ainda uma certa ambiguidade relativamente a sua verdadeira dimensao e aplica<;ao a realidade, como se pode verificar pelas sucessivas altera<;6es e revoga<;6es das leis que se debru<;am sobre este assunto. 0 objecto de estudo e, em primeira instancia, a analise da autonomia financeira das Autarquias Locais e da sua evolu<;ao no futuro tendo em conta, por urn lado as altera<;6es do contexto juridico operadas em 2007 e por outro lado o enquadramento te6rico.

2. Objectivos gerais da investiga-.ao A motiva<;ao I objectivos gerais da investiga<;ao sao enunciados da seguinte forma: l .Q) Inserir as finan<;as locais numa visao estrategica de desenvolvimento local e regional para Portugal Continental; 2.Q) Efectuar uma analise empirica acerca da rela<;ao entre niveis de financiamento das autarquias (nomeadamente, dos montantes de transferencias e de credito) e 0 valor de alguns indicadores de desenvolvimento sustentavel em Portugal Continental. A estes objectivos gerais correspond em outros de caracter intermedio I especificos que pretendemos alcan<;ar, nomeadamente: (a)

efectuar uma revisao da literatura sobre as Finan<;as Locais e desenvolvimento regional, especialmente sobre o caso Portugues; (b) - no que concerne a ajuda intergovernamental, analisar e comentar a evolu<;ao recente1 do Fundo de Equilibrio Financeiro (FEF), Fundo Geral Municipal (FGM) e o Fundo de Coesao Municipal (FCM) enquanto transferencias do desenvolvimento regional e local fontes relevantes de receita das autarquias locais; (c) - Caracterizar os contextos: Interno, estabelecimento do papel e potencialidades da actual lei das finan<;as locais no desenvolvimento socioecon6mico. Externa, concorrencia do espa<;o da UE-27, evolu<;ao prevista nos fundos comunitarios, etc. Elaborar uma matriz SWOT, tendo em conta uma visao estrategica, objectivos estrategicos e linhas de ac<;ao.

1

lei n .0 2/2007 d e 15-01-2007.

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Manuel Alberto de Almeida Baptista

3. Justificac;ao do Tema

As finan<;as locais nao devem ser analisadas fora do contexto da problematica do desenvolvimento estrategico sustentavel das comunidades locais e regionais. Pretende-se contribuir para a conceptualiza<;ao de uma abordagem inovadora das finan<;as locais, visualizando estas como urn instrumento da visao estrategica. Na globalidade, pretende-se enquadrar a evolu<;ao das finan<;as locais nas perspectivas de desenvolvimento regional e sugerir estrategias para a prossecu<;ao de uma politica regional eficiente e assente em criterios de equidade horizontal corn vista a minimiza<;ao das assimetrias regionais.

4. Hip6teses

A Hip6tese de Investiga<;ao parte dos pressupostos normativos seguintes: - e possfvel elaborar uma conceptualiza<;ao relativamente inovadora da problematica da autonomia financeira das autarquias nas suas interac<;oes corn o desenvolvimento local e regional que tenha por base os pressupostos de desenvolvimento sustentavel e da governan<;a democratico-participativa. - e necessaria equacionar os objectivos de equidade inter jurisdicional corn os de eficiencia na afecta<;ao de recursos nacionais mas, tambem, corn os de eficacia na prossecu<;ao de objectivos de desenvolvimento, enquadrando-os num perspectiva da Estrategia Nacional. Quanta bibliografia

a metodologia

0

trabalho sera efectuado a partir da analise da

5. Metodologia

Quanta aos metodos aplicados recorreu-se: - a pesquisa bibliografica e de sftios da Net, sabre a materia e do tratamento dos dados disponfveis em fontes documentais, nomeadamente as produzidas pelo Instituto Nacional de Estatfstica. - survey da literatura, sfntese das principais abordagens e reflexao crftica; esta informa<;ao servira de suporte para uma avalia<;ao e caracteriza<;ao preliminar do fen6meno em estudo. - metodo de analise estatfstica corn base no programa SPSS 16.0: modelo econometrico; metodologia da parte empfrica, a hip6tese a ser testada e que as finan<;as locais - nomeadamente as transferencias, tern urn papel importante no grau de desenvolvimento dos concelhos mas, outros factores

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tambem sao essenciais, coma a implementac;ao de certas politicas/ projectos que sao conducentes ao fortalecimento dos pilares do desenvolvimento sustentavel, nomeadamente, a existencia de um sistema de governanc;a local. Sera realizada uma analise d e um conjunto de pesquisas anteriores, ao longo das quais podemos ir consolidando a convicc;ao de que hoje, mais do que nunca, e impossivel continuar a d esenvolver as regioes, logo, o pais, sem uma visao estrategica, sem politicas de ordenamento e de planeamento eficazes e sem uma adequada e consensual distribuic;ao de competencias e de recursos entre os varios niveis de governo - central, regional e local. Embora, nos ultimos anos, se tenha vindo a notar um esforc;o do poder central e local para reforc;ar a diminuic;ao das assimetrias regionais, as sucessivas alterac;oes das leis das financ;as locais ajustadas a realidade municipal revelam a dificuldade em se encontrar um modelo de descentralizac;ao financeira que seja consensual e satisfac;a simultaneamente os objectives de uma afectac;ao eficiente de recursos e de equidade horizontal. Depois de enunciado o modo como a questao da autonomia financeira sera encarada, cabe esclarecer a estrategia de investigac;ao a utilizar ou seja a delimitac;ao de um campo de analise que possibilitara o estudo anteriormente definido. Assim, em termos de metodologia de trabalho, a investigac;ao ira iniciar-se com o estudo aprofundado da teoria da descentralizac;ao, numa perspectiva econ6mica. Far-se-a um levantamento da Leis das financ;as locais desde 1979, tendo uma perspectiva hist6rica das su cessivas alterac;oes e das suas repercuss6es na equidade e eficiencia das autarquias locais. 0 estudo da bibliografia existente incidira sobre trabalhos de autores nacionais e estrangeiros relacionados com esta problematica, bem como da legislac;ao, procurando comentar a evoluc;ao registada nas financ;as locais e a situac;ao actual. Tendo sido as transferencias da UE uma fonte importante de recursos para o desenvolvimento das infraestruturas aos niveis locais e regional, serao apresentados resumidamente os objectives dos varios QCAs. Tendo em conta a necessidade d e partir de uma visao estrategica nacional, serao analisados contextos a nivel externa no espac;o da UE-27, assim como a afectac;ao dos fundos comunitarios propostos pelo governo ao nivel do QREN. No que se refere aos recursos nacionais destinadas as autarquias, prosseguiremos com uma analise da lei das financ;as locais.

6. Enquadramento Te6rico

Segundo 0 ATES (1977), o prindpio btisico do federalismo consiste em consignar cada problema ao nivel de govemo mais baixo que for capaz de o resolver de forma

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adequada, para o que se teriio de ponderar os pr6s e os contras das diferentes soluq6es (citado em HmscH 1970:3), nesta acep<;ao qualquer sistema de governo e mais ou

menos federalista na medida em que a capacidade de decisao fiscal esteja mais ou menos descentralizada. 0 Federalismo Fiscal constitui urn modelo administrativo que reparte o exercicio do poder em territ6rios de grande extensao, de forma geral, pressupondo-se que os individuos tern uma cultura diferenciada de acordo corn o total que habitam; baseia-se no estabelecimento de governos de ambitos regional e municipal, em divis6es administrativas designadas estados, provincias, departamentos, condados, distritos, subordinados a urn governo central; implica a livre negocia<;ao entre as partes, corn a finalidade de assegurar urn certo grau de autonomia e tra<;ar a divisao das fun<;6es a serem cumpridas pelos varios niveis administrativos e a distribui<;ao dos recursos exigidos.

6.1. Classificafiio de Musgrave da intervenfiio do Estado

De acordo corn a classifica<;ao de MusGRAVE (1959) as fun<;6es da politica Or<;amental sao a afecta<;ao, distribui<;ao e estabiliza<;ao. As fun<;6es de distribui<;ao e estabiliza<;ao sao desempenhados de uma forma mais eficaz a nivel central. A afecta<;ao deve ser repartida pelos diferentes tipos de governo consoante as caracteristicas dos bens publicos e, coma argumentamos no ponto anterior, para ser eficiente deve ser descentralizada. Os objectivos sao respectivamente: a correc<;ao da afecta<;ao de recursos que derivam do funcionamento puro dos mecanismos de mercado; a redistribui<;ao da riqueza e rendimento que resulta da 16gica do mercado, a estabiliza<;ao econ6mica, visando garantir o pleno emprego dos recursos, a estabiliza<;ao na evolu<;ao dos pre<;os eo crescimento econ6mico, segundo urn caminho 6ptimo.

6.2. A descentrali zafiio e a teoria dos bens publicos

Referem 0ATES (1972: 21 -30; 1977) e MusGRAVE (1959: 18-20), o fornecimento de bens publicos que beneficiem os habitantes das varias comunidades2 e mais eficiente quando proporcionado pelo Governo CentraP. Nao tinha sentido que urn Governo Local, qual condado da Idade Media, tivesse o seu exercito particular devido ao facto de o raio de ac<;ao de alguns equipamentos militares ultrapassar em muito a area de influencia de urn Governo Local e tendo em conta os altos custos de aquisi<;ao e manuten<;ao que e necessaria suportar, implicava que os Governos Locais limitrofes tivessem urn comportamento de "free-riders" e levando a que, medido o nivel da na<;ao, o nivel de defesa fosse inferior ao necessaria. 2 3

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Designado por Bem Publico Nacional. Ex: 0 bem publico Defesa Nacional.

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Mas, existem custos para o bem estar da sociedade resultantes da imposi~ao pelo Governo Central de um nivel de consumo de um certo bem publico de forma uniforme a nivel nacional. Esse custo, como refere 0 ATES (1977), vai depender da elasticidade do pre~o da procura individual por esse bem e da diferen~a entre a quantidade desejada e a quantidade oferecida. Este tipo de calculo mostra algumas dificuldades relacionadas com a defini~ao de uma fun~ao procura individual desses bens. BRADFORD e 0 ATES (1969) em rela~ao ao consumo de educa~ao e BERGSTROM e GooDMAN (1973) relativo a outros bens publicos locais, concluiram pela existencia de perdas de bem-estar nao de modo negligenciavel. 0 fornecimento de bens publicos que tenham uma area de servi~o geograficamente localizada e delimitada sera mais eficientemente gerido a nivel local. Geralmente pode-se afirmar que um Governo Local consegue adaptar melhor o seu "output" ao conjunta de bens e servi~os publicos desejados pelos individuos que dele dependem, evitando que eles abandonem o seu municipio, provocando uma redu~ao da base tributaria.

Grafico 1:

Caracteriza~ao

dos bens publicos e nivel de decisao eficiente Nivel governo:

E

1

F nao-exclu sao .......................... ...........

LOCAL REGIONAL NACIONAL

c A

0

1 nao-rivalidade Fonte: BRAVO, A. B. S. e SA, J. A. V. (2000:31), Autarquias Locais, Descentralizafii.O e Melhor Gestii.o, Verbo, Lisboa

Verifica-se atraves da piramide as caracteristicas dos bens publicos de nao rivalidade e nao exclusao 4, assim com o eixo das ordenadas (OF) e do eixo das 4

A base foi inspirada do ARONSON (1985: 27).

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abcissas (OG), os bens publicos puros situam-se no canto superior direito da base (C) enquanto os bens privados ficariam no canto oposto (A), onde o grau de nao-rivalidade e de nao-exclusao sao zero, ou seja sao rivais e excludentes. 0 que fundamenta a distribuit;ao da provisao publica pelos diversos nfveis de governo, que e a raiz da teoria do federalismo ort;amental. 0 nfvel de decisao do governo local esta na area central na base da piramide em torno do F, ou seja onde os bens tern caracterfsticas mistas e, quanta as restantes dimensoes, situam-se no pico da piramide (E), onde a delimitat;ao local de beneffcios e maior. Alguns bens publicos de incidencia local e regional a partir de certo fndice de utilizat;ao, perdem a caracterfstica de nao rivalidade (sem competit;ao entre os indivfduos para a utilizat;ao do bem). 0 tempo que as pessoas gastam no percurso pendularS utilizando essa infra-estrutura (via-rapida), sera mfnimo. Mas, se a facilidade de circulat;ao funcionar como urn convite a que mais indivfduos passem a viver e a trabalhar nessa cidade, entao e de esperar que a via rapida alcance o ponto de saturat;ao corn longas filas de transito nas horas de ida para os empregos e de volta a casa. Podem ocorrer situat;6es parecidas corn a vigilancia do ensino ou policial. Estes cenarios provocam perdas no bem-estar dos agentes econ6micos e perdas de eficiencia na gestao dos fundos publicos pelos governos locais que nao obtenham dos novos habitantes o nfvel de receitas que compense as despesas adicionais que sao obrigados a fazer. Uma forma de evitar esta situat;ao seria colocar barreiras a entrada de novos habitantes. A tipologia dos bens publicos sera caracterizada aprofundadamente na pagina 87. Segundo BROWNING e BROWNING (1979), essas barreiras tambem podem servir para alcant;ar objectivos menos louvaveis. Tambem existe alguma ineficiencia nas despesas publicas locais quando os Governos se deparam corn o chamado efeito "spillover" 6. A existencia deste tipo de efeitos justifica a aplicat;ao por urn nfvel de governo mais alto, que internaliza os efeitos "spillover" interjurisdicionais de urn regime de transferencias intergovernamentais de fundos, corn o objectivo de nao prejudicar o fornecimento eficiente de certos bens publicos locais. Segundo SnGLITZ (1986), existe alguma semelhant;a entre a forma coma as decisoes de cada comunidade levam a condut;ao a urn fornecimento 6ptimo de bens publicos e a forma como as decisoes das empresas e das pessoas conduzem, no caso dos bens privados, ao alcant;ar o 6ptimo de Pareto. CREMER (1996) vai mais longe e mostra a possibilidade de se aplicar a distribuit;ao de competencias pelos diversos nfveis de governo as tecnicas usadas para analisar a descentralizat;ao nas empresas.

5

Casa-emprego-casa. Spillover define-se como o impacto que resulta duma autarquia sobre as autarquias vizinhas, impacto esse nao resultante das rela-;oes de mercado, ou seja, quando a realiza-;ao de certo servi<;o e geradora de beneficios que ultrapassam a fronteira geografica da comunidade que os paga. 6

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A representa~ao da piramide em Portugal, tem representado uma divisao tradicional de fun~6es entre os diferentes ambitos territoriais. Assim, a Administra~ao Central ira tem preservado as responsabilidades macroecon6micas basicas, enquanto que as Administra~6es Perifericas e outras institui~6es de ambito territorial local I regional manti~m as atribui~6es que se justificam pela aplica~ao do principio de subsidiariedade. Pode explicar-se assim: 0 que pode ser feito por uma sociedade ou um ente menor, nao deve ser feito por uma sociedade ou um ente maior. Deste modo, respeita e aproveita as iniciativas, energias e capacidades dos diferentes elementos da sociedade. Os grupos maiores e o Estado s6 intervem para aquilo que os grupos menores nao podem fazer sozinhos. E um prindpio prudencial e depende da capacidade de iniciativa de todos. Este prindpio nao e matematico. Nao existem solu~6es exactas para os problemas sociais. Poderao vir a assumir algumas das politicas microecon6micas que ate ha pouco tempo (2003) pertencentes ao domfnio de interven~ao da Administra~ao Central.

7. A evolw;ao do regime de financ;as locais em Portugal

Segundo ANTUNES (1987) e MATIAS (1987), as medidas que se tomaram em 1976 elevaram a capacidade financeira das autarquias. Para tat contribufram as transferencias do Estado que aumentaram de modo significativo em 1975. Nesse ano a capacidade financeira aumentou 36%, o que possibilitou fazer face a uma subida de 50% das despesas com o pessoal e de 35% das despesas de investimento, sem aumentar o recurso ao credito. 0 FEF foi financiado pelo OGE na quantia, de pelo menos, 30% das despesas municipais estimadas para o exerdcio econ6mico de 1979, atraves da Lei 1/79. Ao FEF foi atribufdo o papel de instrumento de partilha de rendimento entre os varios nfveis da administra~ao; ao substituir o criteria "capita~ao impostos directos" pelo criteria "Indice de capita~ao fiscal" a perequa~ao financeira de calculo do FEF passa a ter um elemento de 5% que conduz a uma equaliza~ao tributaria (Dec.Lei 2/92). Com a Lei n.Q 42/98 o FEF passou a designar-se por FGM e tern criterios de atribui~ao que se podem comparar mais facilmente com os do FEF, assim mediante a actuallei o IRS passa a ser variavel em 5% (Transferencia Incondicional). Actualmente a perequa~ao financeira do FEF total e atribufda 50% para o FCM e 50% para o FGM para todos os concelhos. A aplica~ao da lei das finan~as locais, que foi alvo de fortes crfticas por parte da ANMP que argumentava que a nova legisla~ao iria fazer com que as quantias que o Estado transferia para as autarquias se mantivessem inalterados face ao ano anterior, cumprindo a garantia dada pelo Governo de que a actual Lei das Finan~as Locais tera um efeito neutro no or~amento. Este facto dificultou a prepara~ao da proposta or~amental do Governo para 2007, muito embora as implica~6es das altera~6es das leis fossem obviamente contempladas de modo a que o impacto

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Manuel Alberta de Almeida Baptista

Quadro 1: Evolu<;ao dos Criterios

Lei 1/79

crih~rios

Lei DL 1/79 98/84

de Reparti<;ao do FEF e FGM

Lei n. 0 2 Lei Dec.Lei Lei Lei 1/87 2/92 n. 0 42/98* n. 0 94/01 22/2007

art.Q S.Q art. QS .Q b) c) Transferencia Incondicional 0

N. de Habitantes

50%

Area

10%

Capitac;ao de Impostos Directos

40%

5%

5%

10%

15%

5%

35%

45%

45%

40%

35%

40 %

65%

15%

10 %

10%

15%

30%

30%

25%

15%

10 %

!

fndice de Carencias

35%

20%

N. de Freguesias

15%

5%

0

I

i

5%

5%

Rede Viaria

10 %

10%

N. 0 de Alojamentos

5%

fndice de Desenvolvimento socioecon6mica

5%

15%

15 %

!

Residentes corn menos de 15 anos

5%

fndice de Compensac;ao Fiscal

5%

Grau de Acessibilidade

5%

5%

5% I

I

10 %

IRS

10 %

Razao directa da area afecta a rede NATURA 2000

3%

Razao directa da area protegida e nao incluida na Rede Natura 2000

2%

Total

i

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Fontes: Baseado na apresentac;ao introduzida por BRAVO, A. B. S. e SA, J. A. V. (1996), "Finanr:;as Locais" Documento de Trabalho n.Q 4/96 do Departamento de Gestao do ISEG *Apenas arrecadam FCM os concelhos que tern uma capitac;ao media de impostos locais inferiores a capitac;ao media nacional e/ ou tern urn desenvolvimento social inferior ao nacional.

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financeiro da actuallegisla<;ao tivesse urn peso reduzido no OE de 2007. Na Lei das Finan<;as Regionais, que foi aprovada ap6s o or<;amento, e na nova legisla<;ao referente ao sistema de Seguran<;a Social, os responsaveis governamentais classificam o efeito no OE de "pouco significativo".

8. As finan-.as locais e o desenvolvimento sustenhivel: a necessidade de uma visao estrah~gica

MUDACUMURA (2006:147) refere, nao existe uma teoria geral do desenvolvimento sustentavel baseado num referendal multidisciplinar solido. Corn efeito, as abordagens que existem nao tern, a partir de uma teoria da sustentabilidade, conseguido explicar fen6menos coma a pobreza, a desigualdade ou a crise ecol6gica, sem que estejam isentos de quest6es ideol6gicas. Par outro lado, conceito de desenvolvimento sustentavel tern limites, nao limites absolutos, mas limita<;6es impostas pelo estagio actual da tecnologia e da organiza<;ao social, no tocante aos recursos ambientais, e pela capacidade da biosfera de absorver os efeitos da actividade humana. Mas tanto a tecnologia quanta a organiza<;ao social podem ser geridas e aprimoradas a fim de proporcionar uma nova era de crescimento econ6mico. A pobreza generalizada ja nao e inevitavel.

9. Estudo empirico aplicado aos municipios portugueses

Dada a importancia dos indicadores ligados a governan<;a e a sustentabilidade (Habitat), elaborou-se urn estudo para os Municipios portugueses. Corn os resultados pretende-se testar a hip6tese que se lan<;ou no inicio da tese coma metodologia, ou seja, analisar se existe algum impacto dos indicadores da governan<;a e da sustentabilidade no desenvolvimento dos municipios, utilizando o IPC coma proxy do produto dos concelhos. Assim, seleccionaram-se seis variaveis independentes para os anos de 2002 e 2008, fndice de Desenvolvimento Social (IDS), Despesas em ambiente, Emprestimos/Receitas pr6prias, FGMpc, Associa<;6es municipais e Parcerias. A variavel parceria e uma variavel Dummy- toma o valor 1 se " 0 municipio tern parceria" e 0 se "0 munidpio nao tern parceria". Para tal utilizou-se o programa SPSS 16.0 para manipula<;ao dos dados estatisticos (espaciais) coma se pode analisar a seguir (ver base de dados e outputs em anexo). A escolha destes anos, deve-se ao facto de serem os primeiros anos de cada lei. 0 ano de 2002 e o inicio do QCAIII (2000-2006), e o inicio da Lei n .Q 42/98 de 6 de Agosto, na redac<;ao dada pela Lei n.Q94/2001, de 20 de Agosto. 0 anode 2008 eo inicio da lei n .Q 2/2007, DR n.Q 10 serie I de 15-01-2007, ou seja refere-se ha actuallei das finan<;as locais e tambem ao inicio do QREN (2007-2013) . A justifica<;ao da escolha destas variaveis deve-se ao facto de explicar melhor o desenvolvimento sustentavel, ou seja a sustentabilidade e a governan<;a, pelo

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que a su stentabilidade visa a protec<;ao do ambiente como e explicada atraves da variavel das Despesas corn o ambiente, o nao endividamento e analisado corn a variavel de Emprestimo em percentagem das receitas totais. Para reduzir a pobreza e a exclusao social e demonstrada corn a variavel do IDS e a governan<;a implica descentraliza<;ao, responsabiliza<;ao como e evidenciada corn a variavel FGMpc tornando uma autonomia financeira mais consideravel, e tambem a variavel do numero de associa<;6es municipais e a variavel das parcerias para mostrarem e promoverem a participa<;ao pl1blica na tomada de decisoes e a na elabora<;ao de projectos. Deste mod o estas variaveis escolhidas foram condicionadas pela informa<;ao disponfvel p ara os concelhos de Portugal Continental. Coma referido anteriormente o modelo utilizado para estes dados foi o de uma regressao linear multipla de dados longitudinais. Foram obtidas observa<;6es de 278 Municipios d e Portugal Continental para o perfodo de 2002 e 2008. Tomando o IPC como variavel dependente e proxy do produto, pretende-se testar se a varia<;ao inter-concelhia deste indicador pode ser explicada atraves: - da protec<;ao do ambiente corn as Despesas corn o ambiente; - do nao end ividamento corn o Emprestimo em percentagem das receitas totais; - da ausencia de exclusao social (IDS); da governan<;a: descentraliza<;ao e responsabiliza<;ao (atraves do FGMpc) e tambem o numero de associa<;6es municipais e as parcerias para aumentarem a participa<;ao publica na tomada de decisoes. Deste mod o, pretende-se verificar se a varia<;ao do Indicador per capita do poder de compra esta associado a indicadores de sustentabilidade respeitando as gera<;6es vindouras sem delapidar os recursos e permitindo urn born uso e aplica<;ao dos mesmos, criando crescimento econ6mico e consequentemente uma boa qualidade de vida e bem estar. Pressupoe-se que o aumento do poder de compra esta associado a uma maior participa<;ao dos munidpios nos impostos do estado, contribuindo para uma maior coesao social corn urn born acesso a educa<;ao, born servi<;o de saude, boas vias de comunica<;ao, promover o plena emprego (desenvolvimento socioecon6mico). Tomando o IPC como variavel dependente, de Portugal Continental, foi assumido que o IPC e uma fun<;ao linear determinada pelos seguintes Indicadores:

IPC (Poder de Compra Per Capita)it= F (IDSt; Despambit; Emp/Rectotit; FGMpc/ despit ; ass munit e parceriait) Onde: IPC,1 = _Indicador do Poder de Compra Per Capita no munidpio i e ano t. IDS1 = Indice d e Desenvolvimento Social no munidpio i e ano t. Despambit = Despesas corn ambiente no munidpio i e ano t. Emp/rectotit = Emprestimo em percentagem das receitas totais no municipio i e ano t.

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FGMpc = Fundo Geral Municipal per capita no municipio i e ano t. Assmunit = N.Q de Associa<;6es municipais no munidpio i e ano t. Parceriasit = Parcerias no munidpio i e ano t (variavel dummy). Foram testados varios modelos, mas o modelo que apresentou melhores resultados e permitia uma melhor interpreta<;ao dos mesmos foi: IPCit = B + B1IDSit +Bipespambit + BitEmp/rectotit+ BlGMpcit +B5assmunicit+ B6Dit (parcerias) + e Atraves desta equa<;ao conseguimos medir o significado das variaveis independentes na varia<;ao do IPC entre regi6es/NUTS. Pretende-se, corn a estima<;ao deste modelo, obter resultados que nos permitam responder a seguinte pergunta: 0

- Qual o impacto das variaveis relacionadas corn o desenvolvimento Sustentavel no IPC a nivel municipal para Portugal Continental para o ano 2002 e 2008?

10. Conclusao

0 estudo econometrico salienta a importancia da visao estrategica, pais os concelhos corn menos popula<;ao e area, ou seja os "mais pobres" sao os que recebem mais FGMpc e menos FGM total. De facto, apesar de parecer incongruente, acabam por ser os que deveriam receber mais FGM total, porque sao os mais carentes a nivel de equipamento, infraestruturas, mais rurais e tern uma fraca industrializa<;ao, acompanhada de urn debil suporte do sector dos servi<;os, logo tern urn menor IPC, ou seja todas as variaveis do desenvolvimento sustentavel utilizadas na regressao linear multipla, incluindo o FGMpc, sao os concelhos que mostram menos impacto no IPC. 0 sinal negativo do coeficiente do endividamento aponta para que quanta maior o endividamento (que nao se revelou significativo), evidenciado corn o maior Emprestimo em percentagem das receitas totais (Emp/ /rectot), mais pobre eo munidpio, porque nao tern capacidade de se auto-financiarem, logo evidencia pouco poder de compra (IPC), isto e, genericamente os munidpios mais pobres sao os que se endividam mais. Quanta menor e a pobreza ea exclusao social- mostrada corn urn aumento do (IDS), sao os que tern maior aumento do niveis de poder de compra (IPC). Isto e, natural vista que, os munidpios mais desenvolvidos apresentam menores indicadores de carencia social e necessidades; das despesas municipais corn o acrescimo da protec<;ao do meio ambiente respeitam gera<;6es vindouras, sem haver desperdicio de recursos corn preocupa<;ao por uma boa gestao e aplica<;ao dos recursos, logo, implica urn maior IPC. A participa<;ao dos cidadaos e a existencia de parcerias entre os agentes econ6micos (dummy-parcerias e a variavel do numero de Associa<;6es municipais), na elabora<;ao dos pianos estrategicos para o desenvolvimento

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sustentavel e harmonioso maior sera o impacto no IPC. Assim o FGMpc e o endividamento corn a variavel emprestimos em percentagem das receitas totais (Emp/rectot), variam no sentido contn1rio do IPC, devido a terem os coeficientes negativos e o acrescimo destes esta ligado a uma descida do IPC. Os municipios mais ricos tern maiores receitas pr6prias logo, menos dependencia do credito e do FGM. Pretendia-se tambem dotar as Autarquias de uma autonomia financeira capaz de gerar as suas pr6prias receitas, permitindo-lhes tomar decis6es estrategicas e de gestao a medio e longo prazo, de forma aut6noma. Devido ao facto do montante do FEF, ate 1998, ser calculado corn base em previs6es de cobrant;a de impostos indirectos, fez corn que o valor recebido pelos municipios ficasse sempre aquem do que deviam ter recebido, provocando desvios nas verbas a receber e a consequente revolta por parte dos autarcas. As varias alterat;6es das leis das finant;as locais, ajustadas a realidade municipal, mostram a dificuldade em se encontrar urn modelo de descentralizat;ao financeira que seja consensual e satisfa<;a em simultaneo os objectivos de uma afecta<;ao eficiente de recursos e de equidade horizontal. Deste modo, o FGMpc evidencia na regressao econometrica, que por si s6, nao e significativo para promover 0 desenvolvimento sustentavel, mas deveria ser. Segundo CLAUDINO (2006) as recentes tentativas de reconstrut;ao do mapa regional, em renovada corografia, evidenciam a necessidade de valorizar a escala supra-concelhia, num processo de associativismo municipal que se tendera a aprofundar e em cujo desenvolvimento reconhecemos. As leis das finant;as locais de 1998 e a de 2007 possibilitam correct;6es de algumas das fraquezas do regime anterior. Segundo Mafra e Silva (2004) o Planeamento e a Gestao do Territ6rio sao poli:ticas de natureza pluridisciplinar e ganham muito corn a abordagem em termos de sistema. 0 espa<;o implica a not;ao de distancia, que por sua vez possibilita custos de transporte e de localizat;ao. Duas importantes entidades do espa<;o, porque dele dependem, sao a cidade ea regiao, que se influenciam e interligam de forma mutua. Segundo ANMP (2007) constata-se que a Concentrat;ao do FGM num grupo de seis concelhos (Lisboa, Porto, Amadora, Oeiras, Almada, Sintra) em euros a passagem de 2006 para 2007 trouxe maior equidade, pois o grupo dos 6 maiores concelhos tern menor % do montante total dos fundos de 8,61% para 3,60% respectivamente, mas esta variat;ao ainda nao foi significativa. Prova-se corn a regressao para os anos em estudo que os concelhos menos populosos, corn area inferior, mais rurais, corn mais endividamento, menos lDS, menos associat;6es municipais e parcerias (eficiencia da Governant;a), menos despesas na protect;ao do ambiente, menos industrializados, corn menos condit;6es de nivel de vida, corn menos peso no sector terciario sao os que arrecadam mais FGM "per capita", mas tern men or IPC. A populat;ao residente e a area sao variaveis bastantes importante no calculo e na distribuit;ao dos fundos, logo a revisao da Lei das finant;as locais fez bem em continuar a dar-lhes maior peso. As hip6teses formuladas e os resultados obtidos levaram a concluir que os criterios utilizados no calculo dos fundos (FGM) e sua distribuit;ao deveriam ter

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em menos considera<;ao as variaveis quantitativas (area) e em maior aten<;ao a realidade qualitativa (casos, carencias e necessidades concretas) entre os distritos e concelhos menos desenvolvidos de Portugal Continental, corn especial aten<;ao para a oferta de bens, equipamentos, infra-estruturas e servi<;os (Consultas de centro de saude, edificios concluidos para habita<;ao, alojamentos em hoteis, escolas, hospitais, vias de comunica<;ao, emprego para atrair jovens, etc.). Os criterios deveriam ainda contribuir para o desenvolvimento da agricultura e industria, a par da promo<;ao da terciariza<;ao da economia regional e explora<;ao dos factores end6genos do turismo. Portugal Continental precisa entrar num processo de desenvolvimento duradouro e sustentavel, apostando em quatro vectores fundamentais: o sector agro-florestal; as agro-industrias; o turismo e o ensino, gerando empregos e oportunidades, para que a qualidade de vida nao se circunscreva a qualidade ambiental. Deveria nao haver limite ao endividamento e a taxa variavel do IRS de 5% deveria ser alterada para uma maior percentagem e haver uma maior autonomia financeira. Refira-se, ainda, a necessidade de rever os indices de Desigualdades de Oportunidades (IDO) e Carencia Fiscal (ICF) para uma melhor e equitativa distribui<;ao do FCM em favor dos distritos e concelhos mais carenciados, de forma a haver coesao e equidade. Embora o problema seja que as maiores necessidades estao nas regioes mais ricas, porque sao as que atraem mais popula<;ao, mas tambem devem beneficiar os concelhos mais pobres para fixarem a popula<;ao e reduzirem as assimetrias. A reparti<;ao entre os munidpios e feita corn base em criterios que penalizam os Munidpios do Interior, onde os investimentos unitarios terao de ser muito mais elevados, para a instala<;ao e conserva<;ao de infra-estruturas e equipamentos, em areas de baixa densidade populacional. Inverter esta situa<;ao de desequilibrio progressivo entre o Interior e o Litoral, exige uma revisao urgente da lei de finan<;as locais, que aumente as verbas destinadas aos Munidpios e Freguesias, revendo os criterios de atribui<;ao, dando peso ao indice de desenvolvimento econ6mico. Devem os munidpios apoiar e incentivar a descentraliza<;ao de competencias e recursos para as freguesias de modo a que a execu<;ao de determinadas actividades se verifique ao mais baixo nivel que garanta a eficacia, aumentando e melhorando os servi<;os, tomando mais agil a gestao municipal, governando mais proximo do interessado. Abdicando de algumas competencias a favor das Freguesias, os Munidpios terao de se empenhar em obter competencias acrescidas e meios financeiros correspondentes e complementares aos desajustamentos existentes relativos as actuais atribui<;6es. Aguarda-se a curto/medio prazo a cria<;ao de urn espa<;o de decisao e planeamento intermedio entre a Administra<;ao Locale a Administra<;ao Central, onde as politicas regionais possam ser tratadas num quadro de maior eficacia e corn os recursos financeiros adequados, e por essa via contrariar o crescimento das assimetrias regionais. Corn a cria<;ao deste nivel intermedio de administra<;ao nao podera resultar urn quadro que limite e contrarie o aumento de competencias dos munidpios e das freguesias. A cria<;ao de uma marca de qualidade regional para os produtos, associada a uma deno-

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mina<;ao de origem e certificarao e claramente uma tarefa a justificar o envolvimento de todos os municipios, quer seja no sector da came de qualidade das ra<;as aut6ctones, no das frutas e legumes, ou mesmo nas feiras e certames que devem ser organizados para que as nossas terras e suas produ<;6es se deem a conhecer de forma organizada e eficaz. Os concelhos apresentam grandes potencialidades turisticas assentes no patrim6nio natural, etnognifico, hist6rico, cultural e os importantes espa<;os naturais, condi<;6es excelentes que lhe permitem intensificar a capta<;ao dos crescentes fluxos turisticos. Representando os recursos humanos, a parcela mais rica e promissora do potencial end6geno dos concelhos, o ensino, a forma<;ao e a cultura deverao adquirir prioridade, corn vista a eleva<;ao da capacidade empreendedora, atraves da fixa<;ao de urn nllinero significativo de quadros universitarios colocando-a num patamar seguro de desenvolvimento. Na Europa das Regioes os concelhos nao podem viver fechados sobre si proprio, e preciso formular projectos de coopera<;ao inter-regional e transfronteiri<;o, potenciando ac<;6es ligadas ao comercio, ao turismo a cultura e ao ensino, fortalecendo o acesso a redes de informa<;ao e servi<;os e avenda dos produtos da terra. As Autarquias Locais tern urn papel importante no desenvolvimento econ6mico e social do Pais pelo que devem, igualmente, contribuir para inverter a actual situa<;ao, que se prop6e: - Alocar 50% das verbas destinadas usualmente a anima<;ao cultural, a dinamiza<;ao/anima<;ao do comercio de proximidade, devendo a gestao das mesmas ser feita em parceria corn as associa<;6es locais; Suspensao, por urn prazo de dois anos, da generalidade das taxas municipais, que incidem sobre o exercicio da actividade empresarial e a redefini<;ao de uma politica de taxas mais coerente e articulada a nivel nacional. - Dinamiza<;ao das rela<;6es de compras publicas entre as autarquias e as micro e pequenas empresas locais, atraves, nomeadamente, da cria<;ao de portais de compra municipais; - Redu<;ao, para metade, do Imposto Municipal sobre Im6veis; - Refor<;o do investimento publico autarquico direccionado para a reanima<;ao dos centros urbanos corn grande predominio de actividade comercial; Definir uma politica de parqueamentos que favore<;a o comercio local, atraves, nomeadamente, da sua desonera<;ao.

0 novo contributo para a area em estudo seria o de comparar o impacto de outras variaveis, nomeadamente, da governan<;a ja monitorizadas para outros paises, que deveriam ser monitorizadas para Portugal Continental (atraves de inquerito), e analisar quais os municipios que arrecadam maiores excedentes de sustentabilidade e quais os municipios que mais ganham, a nivel de produtividade ou poder de compra (IPC). Existem falta de estatisticas actuais ao nfvel da governan<;a para Portugal e poucos estudos relativos a este tema escolhido. As estatisticas existentes por vezes os servi<;os nao disponibilizam logo. Impossibilidade de entrevistas/inque-

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ritos aos colaboradores, lideres e promotores de projectos, auditoria limitada. A falta de informa<;ao sobre a regulamenta<;ao das atribui<;5es e competencias ao nfvel, bem como das sobreposi<;5es corn o nfvel regional. 56 existe urn estudo de avalia<;ao de Piano estrategico, o que impediu a analise mais aprofundada sobre os restantes pianos no que respeita a aplica<;ao das ac<;6es estrategicas propostas. Para ultrapassar as limita<;5es aqui evidenciadas, seria necessaria, realizar uma consulta aprofundada de diplomas legais, ou seja ter em conta a delega<;ao da quase todas as atribui<;6es e competencias municipais tern sido objecto da legisla<;ao especial. Fazer inqueritos aos colaboradores para obter informa<;6es para realizar indicadores de governan<;a mais completos. Analisar a liga<;ao da intensidade de tempo entre equidade e eficiencia (eficacia), na afecta<;ao dos fundos e nas variaveis do desenvolvimento sustentavel. Estas ideias de melhoramentos possfveis para a tese ficam como alternativas para futuras linhas de investiga<;ao. Ainda nao se atingiu o objectivo da coesao econ6mica e social da UE-27 para Portugal Continental, ou seja a Regiao de Lisboa e vale do Tejo insere-se no objectivo da competitividade e emprego, ficando numa fase de apoio e degressiva ate 2013. A Regiao do Algarve e Madeira insere-se no Objectivo da Convergencia, apesar de sofrer corn o efeito estatfstico, registando urn PIB per capita superior aos 75% da media da UE-27. As restantes regioes e concelhos de Portugal Continental encontram-se no Objectivo da Convergencia recebendo fundos estruturais e de coesao. A compara<;ao do PIB per capita, calculado em paridades do poder de compra, corn a media da EU-27 mostra que, no perfodo entre 1995 e 2004, quer o pafs, quer a maioria das regioes portuguesas, se situaram aquem daquele valor (75%). 0 emprego em I&D esta aquem da media europeia na maior parte das regioes atlfmticas. 0 Espa<;o Atlantico sofre devido a sua grande heterogeneidade. Sao vistas as diferen<;as de conteudos estrategicos de desenvolvimento, tambem como das culturas jurfdicas e estruturas. A evolu<;ao da ajuda e a aplica<;ao dos fundos das Finan<;as Locais no desenvolvimento socioecon6mico pode nao ter contribufdo de forma significativa para promover a equidade e a coesao entre os distritos e concelhos de Portugal Continental. A actuallei das finan<;as locais deveria ser mais ajustada, e atribuir melhor aos Municfpios os recursos adequados e proporcionais ao custo real do exercfcio das suas atribui<;6es.

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INCUBADORA DE EMPRESAS E 0 DIREITO ECONOMICO

Giovani Clark Doutor em Direito Economico (UFMG) Professor Universitario (PUC Minas) Diretor-Presidente da Funda<;ao Brasileira de Direito Economico (FBDE)

Nizete Lacerda Araujo Mestre em Direito Internacional e Comunitario Advogada em Propriedade Intelectual e Inova<;ao Docente Universitaria



Resumo: 0 presente artigo destina-se a demonstrar que as incubadoras de empresas sao urn dos instrumentos eficazes de viabiliza<;ao e prote<;ao das micro e pequenas empresas no mercado nacional, e que, portanto, nao se deve restringir o seu uso as empresas de bases tecnol6gicas. Quando as politicas econ6micas estatais usam adequadamente este instrumento, pode resultar no pluralismo de agentes econ6micos em nosso mercado interno e na efetiva<;ao dos comandos da Constitui<;ao brasileira de 1988.

Palavras-chave: Incubadora de empresas. Micro e Pequena Empresa. Empresas de Bases Tecnol6gicas. Inova<;ao. Politica Econ6mica Estatal. Amplia<;ao do Uso das Incubadoras. Desenvolvimento. Abstract: The objective of this paper is to demonstrate that the incubator enterprises are one of the important instruments of viabilization and protection of micro and small business in the Brazilian national market, and, therefore, their adoption shouldn't be restricted only at those of technological basis. When the governmental economic policies use these instruments adequately, it can result in the pluralism of economic agents in the internal market activity, as in the effectiveness of the Brazilian Constitution of 1988.

Key-words: Incubator Enterprises. Micro and Small Business. Tecnological Basis Enterprises. !novation. Governmental Economics Politics and the Micro and Small Enterprises. Development.

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Giovani C lark e Nizete Lacerda Araujo

1.

Introdu~ao

Recentemente tern merecido destaque a questao da transforma<;ao dos novos conhecimentos em solu<;6es tecnol6gicas apropriaveis pela industria. Essa discussao tern a sua razao de ser em urn mundo "globalizado", em que se vive a denominada era do conhecimento, onde a inova<;ao, na sua acep<;ao mais ampla, e uma exigencia do mercado, seja de produtos, seja de servi<;os. Ao mesmo tempo, a questao do fortalecimento do processo de industrializa<;ao no Brasil e tema recorrente, corn especial aten<;ao as pequenas e micro empresas, pela sua importancia no sistema produtivo nacional. Dentre os impactos trazidos pelo tema ao atual estagio civilizat6rio destaquese o fato de ter apontado, de maneira explicita, as disparidades entre os paises do norte e os do sul, ou seja, entre ricos e pobres. Percebe-se em conseqi.iencia, a necessidade da redu<;ao de tais disparidades, o que requer esfor<;o, participa<;ao e comprometimento de todos os envolvidos, tanto em nivel nacional, quanto internacional. As denominadas na<;6es em desenvolvimento, em especial, tern enfrentado o duplo desaf1o de, por urn lado, gerar novos conhecimentos, e, por outro, transformar esses conhecimentos em tecnologias competitivas. Some-se a esse desafio a recente crise economica internacional, digo, do neoliberalismo de regula<;ao, que atingiu todas as na<;6es do mundo, penalizando grande parte de seus individuos.

"Inclusive, na atualidade (anos de 2008 e 2009), o neoliberalismo de regular;iio demonstra objetivamente, mais uma vez, o seu /ado destruidor, seja no Brasil ou nas demais Nar;oes. Em virtude da "contida" atuar;ao estatal no domfnio economico, todavia sempre em pro/ da multiplicar;ao dos ganhos do capital, instalou-se uma aguda crise socioecon6mica mundial iniciada nos setores imobilicirio e financeiro dos Estados Unidos . A irresponsabilidade e a ineficcicia das polfticas econ6micas reguladoras publicas e privadas estiio resultando em recessiio, dilatar;ao dos nfveis de desempregados e em mortos, ou seja, na "pandemia reguladora" (CLARK, 2009, p. 82)." Reconhece-se que uma das formas de alavancar o desenvolvimento economico, no micro e no macro ambiente, e atraves do estimulo a inova<;ao. No atual cenario economico mundial encontra-se, de urn lado, a industria buscando sistemas de inova<;ao para adquirir e estabelecer o seu diferencial de competitividade. De outro lado, os governos, em especial, nos Estados chamados emergentes, come<;am a tomar consciencia da importancia do incentivo a inova<;ao por meio de politicas publicas estimuladoras e sedimentadoras de urn sistema inovador nacional, possibilitador de empregabilidade e gerador de renda interna. Contudo, existem outros tipos de empreendimentos (micro e pequenas empresas), sem vies de inova<;ao tecnol6gica, ou corn baixo potencial inovativo, tambem importantes e que podem ser estimulados e protegidos pelas incubadoras.

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Este artigo pretende versar as quest6es envolvendo o fortalecimento das micro e pequenas empresas, independentemente do grau de inova<;ao, enquanto instrumento moderno de expansao produtiva e de absor<;ao de mao de obra, par meio da utiliza<;ao de mecanismo especifico, ou seja, das Incubadoras de Empresas. Todavia, ate o presente momento, as incubadoras tern sido utilizadas corn sucesso, entre nos, pelos geradores de conhecimento voltados ao ensino e a pesquisa. Porem, ainda sao inexploradas as suas multiplas possibilidades na sociedade em geral. Pretendemos abordar a figura da Incubadora de Empresas coma instrumento ativo de politica econ6mica, de maneira ampla, otimizando a sua utilizat;ao na realidade brasileira e tendo a participat;ao construtiva de multiplos segmentos, tais coma: os empreendedores, os governos, prestadores de servit;os, associat;6es, ambientalistas, trabalhadores e, consequentemente, a sociedade. Para se visualizar objetivamente as possibilidades a serem exploradas pelas Incubadoras de Empresas, o artigo foi estruturado em cinco subtitulos, sao eles: Introdut;ao; Inovat;ao e empresas de bases tecnol6gicas; A experiencia da incubadora de empresas; A politica econ6mica estatal e as incubadoras de micros e pequenas empresas e Conclusao. Nao temos a pretensao de oferecer solut;ao aos grandes problemas nacionais, desejamos somente abrir a discussao sabre alternativas que levem a sociedade brasileira a encontrar o desenvolvimento, em nfveis aceitaveis e inclusivos, considerando o potencial do pais, e nao apenas o crescimento modernizante. Em nosso entender, a Incubadora de Empresas e uma dessas alternativas.

2.

Inova~ao

e as Empresas de Base Tecnol6gica

0 termo "inova<;ao" tern sido bastante utilizado a partir do final do seculo passado e infcio do seculo XXI. Inovat;ao em todas as acept;6es que o termo pode expressar significa (sintetizando) coma a capacidade de converter urn invento tecnico em produto/servit;o econ6mico. Portanto, em toda a sua amplitude, inova<;ao abrange tanto os pequenos incrementos, quanta a criat;ao de produtos baseados nos chamados conhecimentos de ponta; tanto o aspecto cientffico, quanta o comercial; o organizacional, quanta o tecnol6gico; a gerat;ao de produtos, quanta a prestat;ao de servit;os. Compreender tal amplitude e importante porque inovar e uma das maneiras de agregar valor aos produtos e servit;os disponibilizados ao comercio local, regional, nacional e internacional. A inovat;ao e a base do sucesso empresarial, diferenciando, adicionando valor para o cliente e/ ou apresentando solut;6es aos problemas. Portanto, inova<;ao detona o impulso de empreender e garante a continuidade da iniciativa empresarial. Tardiamente, a sociedade brasileira comet;a a internalizar o conteudo e os reflexos do sistema de inovat;ao trazido aos indivfduos, as empresas, ao comercio, aos Municipios, aos Estados e a Nat;ao.

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Para corroborar corn esta percepc;ao, verificam-se, especialmente a partir do ano de 2006, varias publicac;oes apontando dados estatfsticos retratando a falta de investimento e de preocupac;ao, por parte d o Brasil, na adoc;ao de urn sistema inovativo nas linhas de produc;ao e de prestac;ao de servic;os do pais. Tais desvelos tiveram como consequ encia imediata a adoc;ao de praticas e uso de tecnologias obsoletas, emperradoras do desenvolvimento nacional. E o retrato da renovac;ao do pacto colonial nesses tempos atuais, como ensina o Prof. Giovani Clark:

"A "globalizac;ao" nao passa da renovac;ao do pacto colonial em bases p6smodernas. Ela somente impulsiona as asas do plissaro universal da miseria, jli que nas trocas internacionais as Nac;oes em desenvolvimento exportam riquezas e importam pobreza. Os numeros explicam o caos global, ou seja, apenas 20% da populac;ao da terra controla 80% da riqueza produzida (SouzA & CLARK, 2008, p. 37)." Apenas a titulo de ilustrac;ao, em dados publicados pela Organizac;ao Mundial da Propriedade Intelectual-OMPI, em 2007, o Brasil ocupou o 24.Q lugar em urn ranking de 138 pafses signatarios do Tratado de Cooperac;ao de Patentes-PCT. Na comparac;ao corn os pafses do BRICs (sigla formada pelas iniciais de Brasil, Russia, India e China, ou seja, das grandes potencias economicas emergentes mundiais) os dados revelaram as seguintes posic;oes: China no 7.Qlugar; India no 19.Q lugar e Russia no 22.Qlugar. Especialistas tern se dedicado ao assunto disponibilizando diagn6sticos e enfatizando a necessidad e de inovar, de agregar novos conhecimentos ao modus operandi da praxis brasileira de produc;ao, apresentados exaustivamente em varios documentos sobre o tema. Temos como exemplos: Guilherme Ary Plonsky, em "Rumo a Primeira Divisao no Campeonato da Inovac;ao Tecnol6gica", em Encontro de propriedade intelectual e comercializac;ao de tecnologia, 7; Workshop de Propriedade Intelectual da Anprotec, 2. Rio de Janeiro, Rede de Tecnologia do Rio de Janeiro, INPI, Brasflia, ANPROTEC, 2004, p . 201 a 210. E ainda Paulo N. Figueiredo, em "Aprendizagem Tecnol6gica e Inovac;ao Industrial em Economias Emergentes: uma Breve Contribuic;ao para o desenho e Implementac;ao de Estudos Empfricos e Estrategias no Brasil", em Revista Brasileira de Inovac;ao, volume 3, numero 2, Julho/Dezembro d e 2004, p . 323 a 361. Entre n6s, ja foi editado urn arcabouc;o legal formado por algumas normas federais voltadas para 0 estfmulo a implantac;ao e a sedimentac;ao de urn sistema de inovac;ao brasileiro, inclusive dando ao termo a amplitude necessaria aos resultados que se almeja. A principallegislac;ao federal referente ao tema e a Lei N. 10.973, de 02 de dezembro de 2004, corn a finalidade de criar medidas de incentivo a inovac;ao e a pesquisa cientffica no ambiente produtivo constitufdo das instituic;oes que executam atividades d e pesquisa aplicada, de carater cientffico ou tecnol6gico (ICTs), das empresas e de inventores independentes. A Lei N. 11.196, de 21 de novembro de 2005, tambem, referida como a Lei do Bern, estabelece os mecanismos 150

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para desonerar os investimentos realizados em projetos de inova<;ao e, o Decreta N.Q 5.798, de 08 de junho de 2006, regulamenta os incentivos fiscais a inova<;ao. Muitos Estados da Federa<;ao (Estado de Minas Gerais, Lei N.Q 17. 348/08 e Amazonas, Lei N.Q 3.095/06, por exemplo) tambem promulgaram as suas respectivas leis estaduais de incentivo a inova<;ao, que, juntamente corn as leis federais, oferecem apoio e estimulos ao empreendedor nacional em urn esfor<;o das duas esferas de governo, federal e estadual, na referida area. Exemplo cabal de politica economica indutora, corn norma premial, editada pelo Direito Economico. No que se refere a legisla<;ao federal, alguns pressupostos fundamentam a sua edi<;ao. Dentre eles, pode-se mencionar o reconhecimento da inova<;ao tecno16gica como urn dos fatores de desenvolvimento da na<;ao e de sua inser<;ao no sistema economico p6s-moderno, a "recupera<;ao" do gap tecnol6gico do pais e o estimulo a cria<;ao de urn sistema de inven<;6es nacionais envolvendo todos os atores sociais. Nao se tern firmado, entre os estudiosos do assunto, uma defini<;ao para o termo "inova<;ao". No Manual de Oslo (2006) "Uma inovarao ea implementac;iio

de um produto (bem ou servic;o) novo ou significativamente melhorado, ou um processo, ou um novo metodo de marketing, ou um novo metodo organizacional nas prriticas de neg6cios, na organizac;iio do local de trabalho ou nas relac;oes externas" (p . 21 ).

Eurn conceito amplo de inova<;ao, o fornecido pelo Manual de Oslo (2006), em que pese tratar-se da inova<;ao tecnol6gica, incluindo apenas urn elenco possivel de inova<;6es, amplitude essa recepcionada pela Lei de Inova<;ao brasileira (Lei N.Q 10.973/2004), na qual se encaixa perfeitamente as estruturas mais flexiveis de produ<;ao e gera<;ao de renda. No contexto da Lei de Inova<;ao federal, o legislador patrio pretendeu conceder estimulo a constru<;ao de ambientes especializados e cooperativos de inova<;ao para forma<;ao e capacita<;ao de recursos humanos nacionais, a sua absor<;ao pelo segmento da industria e da presta<;ao de servi<;os, ea expansao da produtividade brasileira por parte do setor privado. Os objetivos claramente explicitados na normatiza<;ao brasileira de incentivo a inova<;ao sao 0 de capacitar e 0 de alcan<;ar a autonomia tecnol6gica e 0 desenvolvimento industrial do pais, ai incluidos tanto a linha de produ<;ao quanta o setor de fornecimento e presta<;ao de servi<;os constituidos de pequenos neg6cios. 0 legislador foi adiante nessa regulamenta<;ao, corn previs6es sabre a titularidade dessas inova<;6es quando protegiveis pela legisla<;ao da propriedade intelectual e na situa<;ao de parceria. Obviamente, tal prote<;ao e de interesse estrategico da na<;ao pelo esfor<;o de implanta<;ao da cultura de propriedade intelectual que se processa entre n6s e pela apropria<;ao pelos nacionais das inven<;6es criadas. Alem de essa prote<;ao ser urn dos fatores de analise de desenvolvimento ou do crescimento modernizante. Urn dos ambientes especializados e cooperativos de inova<;ao para forma<;ao e capacita<;ao de recursos humanos nacionais pretendidos pelo legislador na Lei de Inova<;ao, e ainda nao totalmente absorvido pelos interessados, e a modalidade denominada Incubadora de Empresas. Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, n.Q 11/2010

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3. A

experH~ncia

da incubadora de Empresas

A ideia denominada "Incubadora de Empresas" surgiu no final da decada de 1950 nos Estados Unidos quando a familia Mancuso, sob a lideran~a de Joseph Mancuso, resolveu dividir urn galpao de grandes dimens6es, de sua propriedade, para que pudesse ser utilizado par varias pequenas empresas e compartilhado entre as mesmas determinados servi~os. A inspira~ao do name de "incubadora" para o predio surgiu do fato de uma das primeiras empresas hospedada no galpao ter sido urn aviario. A ideia da famflia Mancuso surgiu em urn momento favoravel, uma vez que havia tres movimentos se processando naquele pais, quais sejam: (a) o de condominia de empresas, (b) de empreendedorismo e (c) de apoio a novas empresas de base tecnol6gica. Soma-se a esses movimentos o surgimento, nas maiores universidades americanas, de programas de empreendedorismo e de produ~ao de inova~ao, envolvendo professores e alunos, corn a finalidade de transferir os novas conhecimentos apreendidos na academia para a sociedade. Os resultados apresentados por esses dais contextos come~aram a atrair a aten~ao de iiwestidores, que nao tardaram em aplicar tempo e dinheiro nesses empreendimentos de perfil inovado. Escrevem Carolina Dias e Luis Felipe Carvalho:

"Hoje, mais de quatro decadas depois de Mancuso, os programas de incubar;ao de empresas abarcam seus tres movimentos originais. Sao processos dinamicos de formar;ao de empreendedores e empreendimentos, alimentados par servir;os de suporte e capital humano, subsidiados par investimentos de diversas naturezas e respaldados nos ativos intelectuais e tecnol6gicos de centros de formar;ao e de pesquisa (Dias & Carvalho, 2002, p. 14)". Acrescentam ainda Baeta, Barges & Tremblay: "dentre as experiencias que contribuem para uma nova paisagem no mundo das organizar;oes estiio as Incubadoras de Empresas. A ideia de Incubadora vem se difundindo e ganhando forr;a nas ultimas decadas intensificando-se nos anos 1990 (BAt.TA, BaRG ES & TREMBLAY, 2006, p. 10)". Hoje ja se tern estabelecido urn conceito sabre Incubadora de Empresas. No Glossario Dinamico de Termos nas Areas de Tecn6polis, Parques Tecnol6gicos e Incubadoras de Empresas, essa ultima expressao significa "(a) Agente nuclear do

processo de gerar;iio e consolidar;iio de micro e pequena empresas; (b) mecanismo que estimula a criar;ao e o desenvolvimento de micro e pequenas empresas industriais ou de prestar;iio de servir;os, empresas de base tecnol6gica ou de manufaturas leves, par meio de formar;iio complementar do empreendedor em seus aspectos tecnicos e gerenciais; (c) agente facilitador do processo de empresariamento e inovar;ao tecnol6gica para micro e pequenas empresas (p. 59)". 0 tempo em que urn empreendimento ou empresa nascente e hospedado na Incubadora de Empresas e denominado incuba~ao. Durante esse periodo ha estimulo ao seu desenvolvimento e a promo~ao das condi<;6es adequadas de compartilhamento pelos pequenos empreendimentos, das instala~6es fisicas, do ambiente instrucional e do suporte tecnico e gerencial, durante todas as etapas

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da incuba~ao. 0 pequeno negocio ou empresa nascente, hospedado em uma Incubadora, recebe o nome de "incubada" ou empresa residente. Percebe-se, assim, que a empresa nascente recebe "cuidados" e apoio em urn dos seus momentos de maior fragilidade, qual seja, o da sua cria~ao e inicia~ao, ah~m de teras despesas de infra-estrutura compartilhadas e de receber a forma~ao gerencial, que somados contribuem para a sua continuidade e futuro sucesso. Apenas para demonstrar a importancia das micro e pequenas empresas no cenario produtivo e socioeconomico nacional, segundo os dados apresentados no site (www.sebrae.com.br) do Servi~o Brasileira de Apoio as Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), elas criaram 96% dos empregos formais no Brasil no periodo de 1995 a 2000. Apenas 51% das pequenas empresas abertas sobreviviam ate 02 anos em 2002, ja no anode 2005 essa porcentagem cresceu para 78%. Isso apesar de o nosso modelo exportador I importador ser voltado a os interesses das grandes empresas transnacionais e ao agronegocio, deixando a reboque o mercado interno e os pequenos empreendimentos. E mais conhecida entre nos a modalidade de Incubadora de Empresas identificada como de base tecnologica, isto e, aquela que recebe micro empresa incubada, cujos produtos, servi~os ou processos advem de resultados de pesquisas cientificas, normalmente corn a agrega~ao de alto valor tecnologico. Essa modalidade foi uma das pioneiras na historia da cria~ao de Incubadoras de Empresas e tern relevante importancia no contexto da inova~ao nacional, mas, por exigir urn alto investimento na produ~ao de novos conhecimentos, e mais restritiva, em razao de nao oferecer ao grande publico chance de implanta~ao el I ou diversifica~ao de pequenos negocios. Porem, existem outras modalidades de Incubadoras de Empresas menos proclamadas pelos estudiosos e pouco conhecidas pela sociedade, como: a de setores tradicionais, a mista, setorial, a agroindustrial, a de cooperativa, a social, a cultural e a de artes. Portanto, o seu campo de aplica~ao e amplo e cobre uma grande gama de demanda do mercado e da sociedade, alem de manter dinamico o sistema produtivo nacional. A partir desta amplitude de foco, o sistema de Incubadora de Empresas pode se tornar urn grande aliado de governos, dos cidadaos, dos pequenos empreendedores e das organiza~6es sociais no estimulo ao desenvolvimento, gerando renda e empregos. Assim sendo, necessitamos de politicas economicas publicas planejadas nesse sentido, a fim de consagrar os comandos da Constitui~ao brasileira de 1988, sobretudo o seu preambulo e os arts. 170, caput, IV, VIII, IX; 174, caput e ยง lY; e 179. 0 usuario da Incubadora de Empresas, isto e, aquele destinatario da sua a~ao, e o empreendedor que pretende iniciar o seu proprio negocio, a empresa que se encontra em fase de implanta~ao, a empresa ja implantada e o setor de desenvolvimento tecnologico de empresa ja constituida. Percebe-se, assim, a importancia da Incubadora de Empresas enquanto instrumento promotor e facilitador da cria~ao de micro e pequenas empresas, transformando-se assim em agente de desenvolvimento socioeconomico e tecnologico no Brasil.

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A Incubadora de Empresas apresenta, ainda, a vantagem de se relacionar de maneira sinergica e integrada corn varios atores envolvidos no seu processo de a<;ao. Sao eles: as entidades promotoras da Incubadora, as institui<;6es parceiras, o poder publico, os empreendedores ea comunidade. E nesse ambiente de integra<;ao, os resultados produzidos pelas Incubadoras trarao vantagens a todos esses atores, e conseqiientemente aos excluidos, desempregados e subempregados. Edson Gon<;alves Pereira e Tania Gon<;alves Pereira enumeram algumas das vantagens para cada urn dos mencionados atores no que concerne a implanta<;ao das incubadoras corn bases tecnol6gicas, todavia tal apontamento serve para se ter uma visao geral dos beneficios criados por aquelas, independentemente dos incubados. Vejamos:

a) Vantagens para o governo

* Identificar as reais oportunidades de neg6cios competitivos e viabilizar sua cria<;ao e o desenvolvimento sustenta; * Promover e apoiar o desenvolvimento de politicas regionais/locais de inova<;ao, especialmente para MPEs; * Promover o desenvolvimento tecnol6gico do estado; * Promover a diversifica<;ao da economia local/regiona;. * Gerar emprego e renda; * Fortalecer o espirito associativista.

b) Vantagens para as instituir;6es mantenedoras/parceiras da incubadora * Identifica<;ao de novos fornecedores e prestadores de servi<;os bem coma ofertante de novos produtos e servi<;os; * Identifica<;ao de pesquisa e desenvolvimento corn viabilidade de comercializa<;ao e/ ou sua transforma<;ao em novos produtos e servi<;os de alta tecnologia, e corn isso, diversificar as fontes de receita; * Contribui<;ao para o desenvolvimento rapido de empresas nascentes; * Melhor utiliza<;ao de competencia tecnica e estrutura ociosa; * Oportunidades para forma<;ao complementar de alunos; * Diminuir a taxa de mortalidade das micro e pequenas empresas.

c) Vantagens para a comunidade local * Incremento no numero de novos postos de trabalho e gera<;ao de renda; * Impulso e revitaliza<;ao da economia local; •¡ Implementa<;ao de novas redes de neg6cios.

d) Vantagens para os empreendedores

* Assistencia para diminuir a distancia entre conhecimento te6rico e pratico; * Redu<;ao do custo e riscos do processo de inova<;ao; * Estabelecimento de redes/ alian<;as estrategicas;

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* Facilidades para o acesso rapido ao mercado; * Criar cultura de gestao, inova<;ao e planejamento; * Incentivar praticas gerenciais para a competitividade; * Acesso a equipamentos de elevado investimento em capital fixo e que poderiam inviabilizar o infcio de urn pequeno empreendimento; * Redu<;ao dos custos operacionais e de parte das atividades gerenciais basicas coma manuten<;ao, vigilancia e limpeza (PEREIRA & PEREIRA, 2002, p. 35-36)."

A Associa<;ao Nacional de Entidades Promotoras de Investimentos de Tecnologias Avan<;adas- ANPROTEC, mencionada por Baeta, Barges & Tremblay (2006) em Comportamento Organizacional e Gestao, 2006, vol. 12, N.Q 1, p 14, esclarece ainda:

"uma incubadora de empresas e um ambiente flexfvel e encorajador onde e oferecida uma serie de facilidades para o surgimento e crescimento de novas empreendimentos. Alem da assessoria na gestiio tecnica e empresarial da empresa, a incubadora oferece a infraestrutura e serviqos compartilhados necesstirios para o desenvolvimento do novo neg6cio, coma espaqo fisico, salas de reuniiio, telefone, fax , acesso aInternet, suporte em informtitica, entre outros. Oesta forma , as incubadoras de empresas geridas par 6rgiios governamentais, universidades, associaqi5es empresariais e fun daqi5es, siio canalizadoras do processo de desenvolvimento e consolidaqiio de empreendimentos inovadores no mercado competitivo (As sociaqiio Nacional de Entidades Promotoras de Investimentos de Tecnologias Avanqadas- ANPROTEC)".

Eunanime o entendimento, conforme ilustrado ate aqui, de que a Incubadora de Empresas possui flexibilidade para varios tipos de neg6cio, sendo urn ambiente favoravel e encorajador do pequeno empresario, facilitador /indutor de novos rnicros e pequenos empreendimentos, assim coma estimula o crescimento daqueles ja iniciados, racionalizando as despesas iniciais e facilitando a forma<;ao e a capacita<;ao da mao de obra. Do mesmo modo, refor<;a o desenvolvimento local, micro regional, metropolitano, regional e nacional. Portanto, a incubadora d e empresas no Brasil contribui, enquanto instrumento de politica publica, na concretiza<;ao da existencia digna aos individuos conforme os ditames da justi<;a social (art. 170, caput da Constitui<;ao brasileira de 1988).

4. A Politica Econ6mica Estatal e as incubadoras de micro e pequenas Empresas Considerando a fun<;ao desempenhada pelas Incubadoras de Empresas, elas merecem uma abordagem pela 6tica do Direito Econornico, buscando melhores resultados, especialmente quanta a cria<;ao e prote<;ao de micro e pequenas empresas nacionais, independentemente de seu potencial de inova<;ao tecnol6gica .

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Sendo o objeto do Direito Economico a "juridiciza<;ao" das politicas economicas publicas e privadas, cabera ao mesmo versar sobre essas modalidades de empresas, inclusive ocupando-se dos instrumentos d e sua implanta<;ao na realidade social e nos mercados, via, por exemplo, da utiliza<;ao das incubadoras de empresas.

"Direito Econ6mico eo ramo do Direito que tern par objeto a 'juridicizac;iio', ou seja, o tratamento juridico da politica econ6mica e, par sujeito, o agente que dela participe. Coma tal, e o conjunto de normas de conteudo econ6mico que assegura a defesa e harmonia dos interesses individuais e coletivos, de acordo cam a ideologia adotada na ordem juridica. Para tanto, utiliza se do prindpio da economicidade (SOUZA, 2005, p. 23) ." Portanto a Incubadora de Empresas e instrumento de politica economica a ser usado para efetivar a ideologia constitucional adotada (SouzA, 2005) pelos comandos da Constitui<;ao brasileira de 1988. Entendemos por politica econ6mica como sendo o conjunto de medidas praticadas no campo s~)Cioeconomico, de forma planejada, posteriormente avaliadas, a fim de atingir os objetivos da ideologia adotada na ordem juridica, inclusive superando os conflitos entre os interesses publicos e privados (SouzA, 2005). Logicamente, as politicas economicas voltadas ao micro e pequenos empreendimentos, corn a roupagem de empresa, deve estar inserida no ambito das a<;6es estatais, nao s6 da Uniao (por exemplo, a Lei Complementar n. 123, de 14/ 12/ 2006, e altera<;6es- Estatuto Nacional da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte), mas tambem dos Estados e Municipios, a fim de que realizem os preceitos constitucionais. Alias, quanto as politicas economicas em nossa na<;ao, alerta o Prof. Giovani Clark:

"No plana nacional, as nossas politicas econ6micas devem ser planejadas, respeitar as diferenc;as locais e regionais, e destinadas ao desenvolvimento sustentdvel, sem copiar modelos alienigenas, tendo um proprio, que busque a produc;iio de bens e servic;os necessdrios as massas populacionais desprovidas de dignidade humana, ou seja, que priorize o mercado interno. {.. } (SouzA & CLARK, 2008, p. 43)." 0 Direito Economico tern em sua missao, dentre outras, quando versa sobre politicas economicas, inclusive quando destinadas as empresas tratadas neste artigo, garantir o desenvolvimento sustentavel (art. 3, II da CR); consagrar os direitos e garantias fundamentais (arts. 5.Q a 11 da CR) essenciais a convivencia humana; buscar a soberania economica nacional (art. 170, I da CR); efetivar a livre concorrencia (art. 170, IV da CR); fomentar o associativismo (art. 170, IX da CR), inclusive das pequenas empresas. Ademais, a propria Constitui<;ao Federal de 1988, na Ordem Economica e Financeira, chamada doutrinariamente de Constitui<;ao Economica, diz que ela e fundada na valoriza<;ao do trabalho humano e na livre iniciativa (art. 170,

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caput) e entre os seus princfpios encontra-se o tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte, leia-se micro e pequenas empresas. Nao se pretende aqui exaurir o leitor interessado corn a transcri<;ao de artigos da legisla<;ao, porem e de grande valia ao entendimento a rapida men<;ao aos principios gerais da atividade economica tra<;ados pelo constituinte brasileiro, efetivada nos itens I a IX do ja citado artigo 170. Sao os seguintes princfpios: Art. 170. A ordem econ6mica, fundada na valorizac;ao do trabalho humano e na livre iniciativa tern par fim assegurar a todos existencia digna, conforme os ditames da justic;a social, observados os seguintes prindpios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; m - func;ao social da propriedade; W - livre concorrencia; V - defesa do consumidor vr - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e servic;os e de seus processos de elaborac;ao e prestac;ao; VII - reduc;ao das desigualdades regionais e sociais; vm - busca do plena emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno parte constitufdas sob as leis brasileiras e que tenham a sua sede e administrac;ao no pafs. A Incubadora de Empresa deve ser utilizada dentro das politicas economicas publicas voltadas ao micro e pequenos empreendimentos (empresas), devendo-se conjugar apoio estrutural e financeiro, incentivo fiscal, qualifica<;ao profissional, desembara<;os na aquisi<;ao de insumos, etc. Por sua vez, aquelas contribuirao na gera<;ao novos empregos, possibilitarao a redu<;ao das desigualdades sociais e ativarao a concom2ncia. Assim sendo, urn dos instrumentos incrementadores e viabilizadores das micro e pequenas empresas nao pode ser apenas utilizado para os empreendimentos de bases tecnol6gicas. Alias, e salutar alargar-se a implementa<;ao (interpreta<;ao) das leis brasileiras de incentivo a inova<;ao tecnol6gica, a fim de enquadrar todos aqueles inovadores, seja de grande potencial, seja o de pequeno ou reduzido potencial, como imp6e o significado do termo, a legisla<;ao nacional e a nossa realidade socioeconomica e tecnol6gica. Portanto, os poderes publicos, nos ambitos federal, estadual, e municipal, devem ampliar a utiliza<;ao das incubadoras a outros tipos de empreendimentos (micro e pequenos), inclusive corn urn desenho juridico proprio, em seus ordenamentos legais, a fim de incentiva-los e protege-los. Em rela<;ao as politicas economicas por parte do poderes locais para aqueles, extremamente importantes

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em uma nat;ao de dimens6es continental e corn urn oceano de excluidos, disserta Clark (2001): "0 principio constitucional de tratamento favorecido a pequena empresa, logicamente, e mais ampla do que dispi5e a norma do art. 179 da CF. Apesar de sua grande importancia na realidade da pequena e microempresa, tal comando limitase a incentivri-las atraves de simplificac;ao, reduc;ao e eliminac;ao das obrigac;i5es. Contudo, o Municipio tern plenas condic;i5es de eliminar, reduzir e simplificar, em regra, as obrigac;i5es administrativas e tributririas, par vezes as creditfcias, quando a elas concede emprestimos a fim de criar-lhes condic;i5es de sobrevivencia e desenvolvimento, principalmente em nosso pais, cam um mercado altamente oligopolizado e uma burocracia estatal inoperante. Quando se impi5e coma principio 0 tratamento favorecido a pequena empresa, significa que as polfticas econ6micas estatais, portanto do Municipio, devem oferecer condic;i5es reais para a sua criac;ao, desenvolvimento e permanencia no mercado. Sendo assim, o Poder Local pode e deve realizar a intervenc;ao direta e indireta neste intuito, apoiado, para tanto, em sua competencia constitucional arts. 24, I e V; 30, I e II e 179 da CF.) . . E passive/ o Municipio ter uma lei que trate especificamente da pequena empresa, criar fundos de financiamento a ela para aquisic;ao de bens de produc;ao (mriquinas) e de tecnologia ou aumento de capital, reduzir os impostos municipais, dispor de areas de sua propriedade, atraves de concessao de uso aquelas, viabilizar locais para incubadoras de empresas e criar autarquias, sociedades de economia mista ou empresas publicas para desenvolver tecnologia a ser colocada a disposic;ao das pequenas empresas (CLARK, 2001, p. 139-140)."

Atraves das micros e pequenas empresas podemos ampliar o mercado interno, alimentado a cadeia produtiva nacional, possibilitando o aumento da arrecadat;ao tributaria estatal e diminuindo assim a vulnerabilidade dos poderes publicos diante do poderio econ6mico I contributivo das empresas transnacionais, reduzindo ainda nossa dependencia externa e transversalmente distribuindo a riqueza produzida. Logicamente, o fortalecimento e a insert;ao dos referidos tipos de empresa no mercado brasileiro, marcado por oligop6lios internacionais cartelizados e consequentemente por algumas at;6es ilegais, depende de uma serie de medidas conjuntas e paralelas, incluidas nas at;6es e nos planos estatais, tais como: efetiva repressao das praticas de abuso do poder econ6mico (art. 173, paragrafo quarto da Constituit;ao brasileira de 1988), incremento do credito, redut;ao das exigencias burocraticas, estimulos tecnol6gicos, facilidades nas operat;6es de transporte e na contratat;ao de mao de obra, etc. Ou seja, politicas econ6micas especificas, articuladas e planejadas para as micro e pequenas empresas.

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5. Conclusao Nesta abordagem demonstramos o potencial oferecido pela Incubadora de Empresas coma espa~o/instrumento de a~ao sistemica para varias modalidades de micro e pequenas empresas corn vistas a gera~ao de renda, cria~ao de empregos e fortalecimento do mercado interno. As na~6es em desenvolvimento ganham extremamente corn a explora~ao desse potencial, especialmente quando se e possuidor de dimens6es territoriais coma o Brasil, onde a busca do desenvolvimento local e regional e urn imperativo para o sucesso daquele no plana nacional. Em urn cenario coma o brasileiro, corn ampla diversidade geografica, cultural e de grande potencial produtivo, os Estados e os Munidpios, nao excluindo a Uniao, devem ter urn papel fundamental de catalisador de a~6es voltadas a implanta~ao das Incubadoras de Empresas, inclusive criando cons6rcios para explora~ao de potenciais locais e/ ou estaduais, corn amp la participa~ao das comunidades beneficiadas. Assim, havera o fortalecimento do tecido social, via a "democratiza~ao" do processo produtivo, instituindo-se urn grau minima de pluralismo dos agentes economicos. A titulo de ilustra~ao podemos mencionar atividades que podem receber o incremento fortalecedor, via utiliza~ao de Incubadoras de Empresas, corn beneficios as comunidades diretamente envolvidas e ao seu entorno, tais coma: a explora~ao de pedras semipreciosas em certas regioes brasileiras; confec~6es; cal~ados; artesanato variado; produ~ao de softwares educativos, personalizados e culturais; design grafico e de embalagem; produ~ao de doces de frutas locais; produ~ao de mel de abelhas, etc. Possuimos, ainda, outras experiencias importantes na area de presta~ao de servi~os, tendo 0 papel de formador de mao de obra e de impulso a cria~ao dos pequenos neg6cios de operador de equipamentos inovadores concebidos na Academia e nos Institutos de Pesquisa; de manuten~ao dos equipamentos existentes no mercado; de bombeiros e eletricistas; e de contadores e tecnicos. Intencionalmente, nao mencionamos na exemplifica~ao supra a Incubadora de Empresa de Base Tecnol6gica, porque esta modalidade se encontra em fase de fortalecimento na nossa cultura por meio das Universidades e entidades privadas. Procuramos chamar a aten~ao de outras modalidades a serem absorvidas e implantadas na realidade nacional devido a sua amplitude e potencialidade na cria~ao, prote~ao e desenvolvimento de novas empreendimentos de pequeno vulto na industria, agricultura, pesca, pecuaria, servi~os, turismo, arte, lazer, etc. Finalmente, as Incubadoras de Empresas devem ser inseridas necessariamente nas politicas economicas estatais, porque sao essenciais ao desenvolvimento nacional em patamares condizentes corn a inten~ao do constituinte de 1988, conforme se pode depreender de varios artigos do Texto Constitucional de 1988.

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Giovani Clark e Nizete Lacerda Ara(ljo

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0 DESENVOLVIMENTO DO OUTSOURCING, SEUS FUNDAMENTOS, RISCOS E BENEFfCIOS

Elisabete Maria Fonseca Correia Doutoranda em Ciencias Empresariais Professora Universitaria (Instituto Superior de Contabilidade e Administrac;ao d e Coimbra - IPC)



Resumo: 0 outsourcing tornou-se uma importante ferramenta estrah~gica no actual ambiente de neg6cios competitivo. Este artigo, descreve o seu desenvolvimento, os seus fundamentos te6ricos e analisa alguns dos riscos potenciais que uma empresa enfrenta quando terceiriza as fun<;6es de apoio internas. Os seus beneffcios tambem sao apontados. Atraves de uma revisao da literatura pretendemos descobrir a orienta<;ao futura e as principais quest6es que se podem colocar sobre o outsourcing.

Palavras-chave: outsourcing, make-or-buy, custos de transa<;ao, teoria baseada nos recursos Abstract: Outsourcing has become an important strategic tool in today's competitive business environment. This paper, describes his development, their theorectical fundaments and discusses some of the potential risks that a company faces when outsources internal support functions. Their benefits are also pointed out. Through a literature review we intend to find out the future orientation and futures issues about the outsourcing.

Key-words: outsourcing, make-or-buy, cost transactions, resource- based-view

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Elisabete Maria Fonseca Correia

1. Introdw;ao

Na tentativa de se tornarem mais competitivas, muitas organiza~6es tern recorrido ao outsoursing. Este fen6meno registou grande crescimento, sobretudo a partir da ultima decada, expandindo-se a organiza~6es privadas e pubicas, das mais diversas areas de actividade e dimensao, tornando-se numa pratica generalizada a urn nivel global. No ambito da literatura econ6mica e de gestao o tema tern merecido grande interesse continuando sobre o mesmo a proliferar trabalhos de investiga~ao. Corn base na revisao da literatura efectuada pretendemos apresentar uma sintese das principais vertentes sobre o assunto. Assim, ap6s defini~ao do conceito de outsourcing, percorremos a sua evolu~ao ao longo do tempo, e focamo-nos nas duas principais teorias que constituem os seus fundamentos te6ricos. Serao ainda enfocadas as areas onde mais se tern recorrido a pratica de outsourcing, assim como abordados os seus riscos e beneficios. Seguros de que corn uma abordagem global do tema se abdica de uma maior profundidade, tentamos ainda assim, levantar em todos os pantos algumas quest6es que, por serem mais controversas ou porque ainda nao lhes foi dada uma resposta satisfat6ria, merecem maior reflexao.

2. Conceito

Definir outsourcing nao e faciP, e determinar a sua origem como conceito cientifico, e mesmo como pratica, pode ate ser impossivel, como fazem notar Busi e Mclvor (2008). Segundo estes autores o outsourcing e defendido por alguns investigadores como uma evolu~ao da questao "make-or-buy", sendo por outros considerada como uma tendencia recente na gestao, que teve inicio apenas a alguns anos. Para essa dificuldade contribui tambem, na opiniao de Hatonen e Eriksson, (2009), a existencia de numerosas linhas de investiga~ao por tras do conceito. Devido a esta diversidade cientifica, o conceito manteve-se bastante variado. Corn efeito, podem ser encontradas diferentes acep~6es de outsourcing. Por exemplo, o Institut for Supply Management define outsoursing coma uma versao da decisao make-or-buy na qual uma organiza~ao escolhe comprar urn item ou urn servi~o que ja foi realizado "em casa". Tal envolve recorrer a urn fornecedor para fornecer o item ou servi~o concluido em vez de comprar os componentes e fabricalos (Monczka et al., 2005). Brickley et al. (1997) referem que este termo e

1 As defini~oes diferem de autor para autor, podendo apresentar urn sentido mais ou menos amplo. A propria tradu~ao de outsourcing acarreta algumas dificuldades, registando-se coma as tradu~oes mais vulgarizadas, coma assinala Oliveira (2002), as expressoes "externaliza~ao", "recurso a fontes externas", "mandar fazer fora" e "subcontrata~ao". E ainda frequente utilizar indistintamente "terceiriza~ao".

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frequentemente utilizado para descrever urn movimento de afastamento da integra<;ao vertical- desloca-.se uma actividade para fora da empresa que anteriormente era feita dentro da empresa, mas tambem para descrever urn arranjo atraves do qual uma empresa obtem uma parte ou servi<;o de uma empresa externa. Parece-nos que das varias defini<;6es propostas na literatura, a defini<;ao de outsourcing como urn processo de transferencia de actividades e processos outrora realizados internamente para uma entidade externa, na linha das propostas de varios autores (v.g. Ellram e Billington, (2001), Ellram e Matz, (1997) e Varadarajan (2008)), contem o elemento central presente no outsourcing: a utiliza<;ao de recursos externos para realizar actividades que tradicionalmente seriam executadas por colaboradores e utilizariam outros activos da propria organiza<;ao (Oliveira, 2002). 0 que pode entao variar consideravelmente sera o nfvel ou grau do outsourcing escolhido por uma organiza<;ao. Ellram e Matz, (1997) consideram que a decisao pode ir desde o outsourcing de urn item ou subconjunto de itens ou urn servi<;o, ao outsourcing de uma actividade ou mesmo da totalidade de uma fun<;ao. Brickley et al. (1997) consideram, por outro lado, que e u.til pensar na decisao de outsourcing como uma escolha num continuum de possibilidades onde os extremos sao as transac<;6es no mercado onde urn produto ou servi<;o pode ser adquirido a qualquer urn dos potenciais fornecedores (spot market) ate a integra<;ao vertical. Entre estes dois extremos, ha a considerar uma grande diversidade de contratos de medio e longo prazo que podem assumir formas muito diversas e que incluem, por exemplo, os usuais contratos de compra e venda mas tambem joint-ventures, ou alian<;as estrategicas. 0 tipo de rela<;6es estabelecido entre o contratante e o contratado, podem assumir formas de dependencia ou de coopera<;ao, por via, fundamentalmente, do grau de autonomia conferido a cada urn deles. Esse tipo de relac;oes dependera da proximidade, natureza e ambito das actividades objecto de outsourcing, do core business da empresa, do numero de potenciais contratados alternativos e corn credibilidade existentes, e das difictildades eventualmente associadas a transi<;ao para o outsourcing (Santos, 1998). 0 outsourcing implica entao uma rela<;ao contratual de presta<;ao de servi<;os atraves da qual uma entidade externa (contratado) assume a responsabilidade de desenvolver determinadas fun<;6es (Brito e Ramos, 2001), mas onde se assume urn relacionamento mutuamente benefico (essencial para 0 seu sucesso), de medio e longo prazo. Dintingue-se da utiliza<;ao pontual (acto isolado) ou esporadica dos servi<;os de uma outra organiza<;ao, pelo recurso sistematico, utiliza<;ao continuada, ou pelo menos corn essa inten<;ao, desses servi<;os (Santos, 1998) e implica transferencia simultanea d e propriedade e de localiza<;ao de uma actividade (Hatonen e Eriksson, 2009). Caniels e Roeleveld (2009) destacam a diferen<;a entre as usuais rela<;6es que se estabelecem entre compradores e fornecedores e as estabelecidas pelo outsourcing da seguinte forma: o outsourcing representa a decisao fundamental de rejeitar a internaliza<;ao de uma actividade, o que faz desta decisao uma decisao estrategica que influencia toda a organiza<;ao.

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3. 0 desenvolvimento do outsourcing

Considerando-se ou nao urn conceito novo ou o resultado de uma evolu<;ao, e mesmo a dificuldade em estabelecer urn conceito aceite por todos, o que parece ser incontestavel e o facto do outsourcing, que registou urn grande impulso a partir da decada de 1980, ter passado a ser amplamente adoptado pelas organiza<;6es e a assumir uma importancia crescente para o seu sucesso (Hatonen e Eriksson, 2009). Corn efeito, a vaga de outsourcing em organiza<;6es publicas e privadas e evidente durante a ultima decada (Lenders, et al., 2006). Destaca-se o elevado numero de casos observados sobretudo nos sectores que requerem urn grande esfor<;o tecnologico de que sao exemplos os sectores automovel, telecomunica<;6es, aeroespacial, informatica, farmad~utico, qufmico, saude, servi<;os financeiros, ou energia (Shy e Stenbacka, (2003); Hatonen e Eriksson, (2009)), mas tambem a extensao do outsourcing aos sectores mais tradicionais (Dfaz Mora e Gandoy Juste, 2008), alterando a forma como as empresas competem nesses sectores. 0 impulso das estrategias de outsourcing foi favorecido pelo elevado grau de decomposi<;ao do processo produtivo que as empresas puderam alcan<;ar gra<;as aos avan<;os tecnologicos, particularmente os trazidos pelas novas tecnologias de informa<;ao e comunica<;ao, e por tecnologias de produ<;ao mais flexfveis. Por urn lado, estas novas tecnologias de produ<;ao permitem que os fornecedores se adaptem mais facilmente e rapidamentre as exigencias dos clientes; por outro lado permitem nalgumas situa<;6es a redu<;ao da especificidade dos activos, favorecendo a contrata<;ao, logo o outsourcing em detrimento da produ<;ao interna. Os grandes avan<;os registados nas tecnologias de comunica<;ao e informa<;ao, por seu turno permitiu a identifica<;ao e facilitou a comunica<;ao corn parceiros de negocio, tendo impactos importantes tambem na redu<;ao dos custos de associados a informa<;ao e contrata<;ao. Nao pode tambem ser ignorado que muitas altera<;6es tecnologicas surgidas, e a utiliza<;ao mais generalizada de determinados metodos (como sistemas just in time, gestao da qualidade) que implicam urn relacionamento proximo corn fornecedores ou distribuidores favoreceu tambem que as decis6es de outsourcing se orientassem para rela<;6es contratuais de longo prazo, como salientam Brickley et al. (1997). Outro elemento importante no desenvolvimento do outsourcing e a propria globaliza<;ao dos mercados que amentou a possibilidade de explora<;ao de economias de escala. Corn efeito a progressiva liberaliza<;ao das trocas comerciais proporcionou urn crescente protagonismo ao outsourcing. Ao envolver o recurso a empresas terceiras de outros paises, passou a ser utilizado o termo offshoring para designar esta realidade. Olhando para os desenvolvimentos que ocorreram nesta estrategia podem ser identificadas tres grandes fases distintas. Hatonen e Eriksson (2009) designam essas fases como a era do Big Bang, a era da Bandwagon, e a era da Organizations Barrierless. Resumidamente, utilizando a categoriza<;ao proposta pelos autores, podemos dizer que na primeira fase, que durou ate o final da decada de 1980, o outsourcing era uma ferramenta para tornar as organiza<;6es mais eficientes.

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Estando as unidades econ6micas viradas para a maximiza<;ao do lucro, a enfase era colocada nos processos para reduzir custos operacionais. A segunda fase e caracterizada por urn efeito de seguidismo, em que a imagem transmitida do outsoursing e muito optimista e onde atingir a eficiencia de custos nao era mais o (mico motivo do outsourcing. As empresas passaram a procurar competencias externas e conhecimentos para fornecer valor aos mais complexos e estrategicamente importantes processos organizacionais. Surge entao urn novo termo para designar esta nova abordagem: o strategic outsourcing, em que corn o outsourcing das fun<;5es mais estrategicas, as organiza<;5es passavam a estender as suas fronteiras para ganhar vantagem competitiva e se exigia agora a constru<;ao de rela<;5es mais estreitas corn os seus fornecedores. A popularidade do outsourcing, tornou-o na viragem do milenio, numa norma e nao numa excep<;ao. 0 outsourcing nao mais era urn diferenciador competitivo. Os recursos passam a estar disponiveis para todas as empresas, independentemente do sector, localiza<;ao geografica ou do tamanho da empresa. Nesta nova fase, fala-se de transformational outsourcing pois esta em jogo uma mudan<;a de paradigma, em que se visa a cria<;ao de urn novo modelo de neg6cio radical por oposi<;ao ao traditional outsourcing, no qual o outsourcing se centra na empresa. Isto e, o outsourcing nao se centra mais (ou apenas) na agiliza<;ao das opera<;5es internas, mas o outsourcing e entendido como uma ferramenta que permite transformar as empresas em formas flexiveis de organiza<;ao em que 0 papel da hierarquia e suplantado pela existencia de redes flexiveis e integradas de actores organizacionais. Do ponto de vista da gestao, a coopera<;ao, colabora<;ao e co-desenvolvimento tornam-se quest5es-chave na gestao das rela<;5es entre todos esses actores. 0 novo desafio reside pois na cria<;ao de uma organiza<;ao flexivel, em que uma empresa se concentra nas actividades em que possui maiores competencias, criando valor, e deixando que especialistas externos forne<;am o restante valor. Apesar dos desenvolvimentos mencionados, a questao de saber se deve realizar actividades especificas (e quais actividades) dentro dos limites da empresa ou fora das suas fronteiras continua a ser hoje uma preocupa<;ao constante para as empresas.

4. Fundamentos te6ricos

Sobretudo a partir dos anos 80, certamente acompanhando o crescimento do fen6meno, o outsourcing tern vindo a ganhar uma aten<;ao crescente entre os investigadores de diferentes disciplinas, sendo urn assunto muito analisado na literatura econ6mica e de gestao (Giniels e Roeleveld, 2009). Duas das mais importantes teorias que tern dado valiosas contibui<;5es para compreender o outsourcing sao a Teoria dos Custos de Transac<;ao (TCT - Transaction Cost Economics) ea Teoria Baseada nos Recursos (RBV - Resource-Based-View). A literatura econ6mica tende a focar a perspectiva nos custos de transac<;ao, enquanto que na literatura de gestao prevalece a abordagem das competencias nucleares, a que

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se refere a RBV Ambas as perspectivas tern em considera<;ao quest6es de eficiencia, mas centram-se em factores distintos quando procuram determinar as fronteiras das empresas. Apresentam-se de seguida os aspectos principais destas teorias atraves dos quais o outsourcing tern sido analisado.

4.1. Teoria dos custos de transaq;iio

Considerando a teoria neoclassica tradicional que fora da empresa o sistema de pre<;os e o factor de coordena<;ao da aloca<;ao dos recursos, Coase, considerado o fundador da Teoria dos custos de transac<;ao, coloca no seu artigo pioneiro "The Nature of the Firm" em 1937 duas grandes quest6es: porque existem empresas e porque, a existirem, a produ<;ao nao e toda levada a cabo por uma grande empresa. Estas quest6es viriam a constituir o panto de partida para novas interroga<;6es acerca da origem e natureza da empresa. Na perspectiva coaseana existem duas formas alternativas de coordena<;ao econ6mica: o mercado ea empresa. No mercado, a afecta<;ao dos recursos e feita atraves .do sistema de pre<;os, sendo o processo autbmatico e flexfvel. Ja as empresas respeitam urn princfpio organizativo diferente deste, a hierarquia, onde a autoridade e usada para afectar recursos. Para Coase a empresa existe devido aos custos inerentes a utiliza<;ao do mecanismo de pre<;os, que podem ser evitados ou reduzidos ao organizar-se a produ<;ao de urn determinado bem ou servi<;o atraves de rela<;6es de autoridade que direccionam e coordenam a afecta<;ao dos recursos. Esses custos que viriam a ser designados de custos de transac<;ao englobam, entre outros, os custos da descoberta dos pre<;os adequados, os custos de negocia<;ao e os custos de desenho de contratos (Coase, 1992), e mesmo de encontrar solu<;6es para situa<;6es de incurnprimento dos contratos e eventualmente de os fazer executar judicialmente. A ideia dos custos de transac<;ao e retomada por Williamson nos anos 70, que constr6i uma teoria mais elaborada da origem e do movimento dos limites das empresas em rela<;ao aos mercados. A TCT assenta em dois pressupostos: assume que existem limites na capacidade cognitiva dos indivfduos para processar a informa<;ao disponfvel e que ha oportunismo no seu comportamento (Williamson, 1998). Tais pressupostos implicam o surgimento de custos de transac<;ao. Assim, alem de considerar os custos necessaries para produzir urn produto ou servi<;o internamente, ha que considerar os custos de comprar urn bem ou servi<;o, ou seja de realizar as transac<;6es atraves dos mercados. A TCT e portanto uma abordagem que procura explicar as decis6es sabre as fronteiras das organiza<;6es, ou seja, procura analisar as raz6es que levam a escolha do mercado ou hierarquia ou de formas organizacionais intermedias que podem ser adoptadas atraves de mecanismos contratuais (Barthelemy e Quelin, 2006) . Para avaliar qual a estrutura de governo mais eficiente (mercado, integra<;ao vertical ou outras formas intermedias), ha pois que avaliar os custos de transac<;ao. A empresa teria como fun<;ao economizar estes custos. Corn efeito, a maioria

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destes custos de transac<;ao nao existem ou sao minorados quando as empresas produzem internamente urn produto ou servi<;o (Mata, 2005), conduzindo assim o outsourcing, regra geral, a menores custos de produ<;ao e a maiores custos de transac<;ao. A op<;ao sera pois produzir internamente em vez de optar por urn processo de outsourcing sempre que os custos de transac<;ao relacionados corn a aquisi<;ao de urn determinado produto ou fun<;ao no mercado sejam superiores aos custos da sua realiza<;ao interna (Thouin et al, 2009). Pode em todo o caso, quando os custos de transac<;ao sao negligenciaveis, o mercado constituir o modo de organiza<;ao mais eficiente, ja que pode possibilitar o aproveitamento de economias de escala e beneficios associados a agrega<;ao de procuras diferentes por parte do fornecedor havendo assim que ponderar os custos e beneficios do recurso ao mercado. A TCT considera ainda que os atributos que diferenciam as transac<;6es podem determinar o recurso ou nao ao mercado, logo a justifica<;ao para a existencia ou nao de outsourcing. Os principais atributos sao: a incerteza a que as transac<;6es estao sujeitas, a frequencia da sua realiza<;ao e o grau de especificidade dos activos envolvidos no fornecimento dos produtos ou servi<;os em causa. Relativamente a este ultimo atributo, percebe-se que colocam-se alguns problemas a realiza<;ao de transac<;6es no mercado quando uma das partes tern investimentos em activos que sao espedficos a transa<;ao em causa e nao podem ser facilmente adaptados a outras realiza<;6es 2 . Quando 0 grau de especificidade dos activos e a incerteza e baixo, e as transac<;6es sao relativamente frequentes, as transac<;6es serao governadas pelo mercado. Produzir internamente (mecanismo hierarquico) ocorre quando a incerteza e a elevada especificidade dos activos conduz a dificuldades nas transac<;6es. Niveis medias de especificidade dos activos conduz, segundo Thouin et al (2009), a formas de alian<;as co-operativas entre as organiza<;6es, mecanismo intermedio entre a empresa e o mercado. Apesar da importfmcia de todos os atributos mencionados e reconhecida a criticidade da especificidade dos activos, o que tern sido corroborado por diversos estudos empiricos, que confirmam tambem a sua rela<;ao positiva corn o mecanismo hierarquico (v.g. Gulbrandsen et al, 2009) 3 • Os estudos ja nao sao conclusivos

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Esta especificidade pode ter varias fontes: as caracteristicas fisicas dos activos envolvidos (corno ern moldes ou materiais especiais, rnaquinas de uso (mico, etc), a sua instala<;ao num d eterminada localiza<;ao e dificilmente transferiveis, activos totalmente dedicados a produ<;ao de um cliente, activos hurnanos que sao especificos de urna deterrninada empresa ou actividade, especificidad e obtida sobretudo atraves do learning by doing (Brickley et al., 1997) ou especificidade temporal, onde o tempo envolvido no desenrolar da transa<;ao pode implicar perda d e valores transacionad os, corno no caso d e produtos pereciveis. 3 0 m aior grau de especificidade esta associado a necessidade de maiores salvaguardas contratuais e a urn rnaior interesse ern es tender a dura<;ao dos contratos. Esta situa<;ao esta associada a existencia d e custos afundados (sunk costs) . Para um activo corn alto grau de especificidad e, onde a quebra do contrato irnplica exp6r o activo a perda total (ou residual,

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quanta a rela~ao positiva entre a incerteza ou frequencia das transac~6es corn esse mecanismo. Na perspectiva da TCT, a decisao de "make-or-buy" e pois influenciada sobretudo pela especificidade dos activos. A especificidade dos activos, e o facto de se considerarem os contratos incompletos (este ultimo, pressuposto em que assenta a teoria dos direitos de propriedade) pode conduzir a comportamentos oportunistas por parte dos decisores. Esse comportamento oportunista prende-se corn a possibilidade de existir informa~ao assimetrica entre os participantes numa transac<;ao e pode manifestar-se por exemplo na possibilidade do vendedor nao fornecer ao comprador informa<;ao sobre o real estado do objecto ou praticar ac<;6es que lhe retirem valor, ou nao cumprir o combinado (Mata, 2005). Como fazem notar Caniels e Roeleveld (2009), o fornecedor pode explorar a sua posi<;ao dominante, renegociando os termos do contra to ou insistindo em condi<;6es diferentes numa proxima oportunidade, o que pode levar a que se defenda a manuten<;ao das actividades em casa (explicando a preferencia pela integra<;ao vertical). Por outro lado, a empresa que realize os investimentos espedficos pode ficar refem da empresa que os utiliza, potenciando comportamentos oportunistas por parte desta. Por outro lado, como refere Mata (2005), os comportamentos oportunistas sao mais faceis de evitar dentro da empresa do que entre partes independentes do mercado, o que podera explicar a produ<;ao interna de bens que sao criticos para a sua actividade. Brickley et al. (1997) analisam esta questao dos comportamentos dos compradores e dos fornecedores, nomeadamente a questao da expropria<;ao (hold up problem) existente sempre que haja investimentos especificos, concluindo da sua analise que, e tal como ja anteriormente referido, a medida que o grau de especificidade dos activos aumenta, torna-se desejavel a integra<;ao vertical e mesmos os contratos. Consideram que a realiza<;ao de contratos pode ser, numa situa<;ao corn grau de incerteza baixo, utilizada para resolver conflitos provocados por uma media ou mesmo elevada especificidade dos activos, mas que a probabilidade da op<;ao pela integra<;ao vertical aumentara a medida que aumenta a incerteza. Os contratos, sao assim uma boa solu<;ao que procura limitar o desenvolvimento de comportamentos oportunistas. Contudo, as negocia<;6es do contrato podem envolver custos consideraveis para prevenir esses comportamentos. Por outro lado, perante o envolvimento de investimentos espedficos, o numero de potenciais vendedores que tenham feito ou estejam dispostos a fazer o investimento adequado e claramente reduzido, podendo dificultar a negocia~ao dos termos da transa<;ao. Assim, a hip6tese ha muito prevalecente na literatura e a de que quando a especificidade atinge urn determinado nivel, as solu<;6es contratuais

se o contrato tiver sido cumprido parcialmente) do seu valor produtivo, ou a usos alternativos de baixo retorno.

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tornam-se demasiado dispendiosas e a integra<;ao vertical torna-se mais provavel. Kval0y (2007) adopta contudo outra posi<;ao, indo de encontro ao defendido por outros investigadores, sublinhando que quando as partes voluntariamente estabelecem relacionamentos de longo prazo, os contratos, mesmo sendo incompletos, sao protegidos por efeitos de reputa<;ao, o que se pode traduzir em patentes incentivos para as partes, e demonstra que contrariamente a ideia dominante, a especificidade pode ser urn argumento para a nao integra<;ao. Embora a TCT e os seus desenvolvimentos possa ser vista por muitos como a teoria subjacente ao outsourcing, e sendo ainda hoje considerada de entre a diversa literatura te6rica como a mais influente (Montagna, 2006), ela tern centrado-se4 no papel dos contratos incompletos, na especificidade dos activos e nos custos de transac<;ao mas focando-se num quadro de relacionamento bilateral entre urn unico produtor e o potencial fornecedor (Montagna, 2006). Mais recentemente alguns autores sugeriram a necessidade no ambito desta teoria de contextualizar os relacionamentos dentro de urn quadro te6rico que admita diferentes estruturas de mercado. Independentemente do facto de novos modelos admitindo diferentes estruturas de mercado surgirem (v.g. Leahy e Montagna, 2006) considerando novas perpectivas, para alguns autores a TCT e as ideias centrais em que a mesma assenta e insuficiente para explicar a amplitude do fen6meno actual para o qual o outsourcing evoluiu (Hatonen e Eriksson, 2009).

4.2. Teoria baseada nos recursos

A teoria de recursos ve a empresa como sendo uma pool de recursos produtivos e administrativos, logo cada empresa tern condi<;6es particulares, que permanecem e se consolidam ao longo do tempo. Segundo esta teoria considerar como unidade de analise a transac<;ao, ignora o aspecto mais relevante da empresa: o conjunto de competencias que detem e que lhe permite decidir sobre o que produzir, mas tambem como o podera fazer. As diferen<;as de desempenho entre empresas sao explicadas pela diferen<;a de recursos e capacidades entre elas (heterogeneidade de recursos). Ea mobilidade imperfeita desses recursos que permite que essas diferen<;as se mantenham. Porem,

4 A teoria dos custos de transac~ao despertou tanto interesse como crfticas. Estas iiltimas, no entanto, nao apagam os importantes aportes te6ricos e conceptuais da teoria. Conceitos como o de activo espedfico, a no~ao da empresa como uma estrutura de governan~a e a relativiza~ao dos argumentos tecnol6gicos para explicar a integra~ao vertical, s6 para citar alguns exemplos, sao contribui~6es definitivas. No entanto, criticas de varias correntes te6ricas apontam, por exemplo, que: falta-lhe superar o caracter estatico (a TCT ignora as competencias e os custos de transac~ao dinamicos), ha ausencia de considera~6es sobre o poder e toma coma dado o ambiente institucional.

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nem todos os recursos e capacidades de uma empresa tern potencial para servir de base para uma vantagem competitiva. Esse potencial sera realizado se os recursos e capacidades forem valiosos, raros, dispendiosos de imitar e insubstituiveis. De urn modo geral, as vantagens competitivas sao constituidas pela combina<;ao e integra<;ao dos conjuntos de recursos. Se for entendido que as capacidades de uma organiza<;ao resultam do trabalho conjunto de varios grupos de recursos e materializam-se naquilo que uma organiza<;ao produz, ao efectuar a analise dessas capacidades para ser bem sucedida, e detectar uma lacuna, a organiza<;ao podera ter varias alternativas: comprar uma empresa que possua essas capacidades, desenvolve-las internamente, ou cooperar corn outras empresas que ja as possuam, utilizando o mecanismo de mercado ou urn mecanismo intermedio entre o mercado e a hirerarquia (Oliveira, 2002). Esta lacuna nas capacidades, e mesmo nos recursos, pode motivar o outsourcing de modo a torna-lo vantajoso. 0 outsourcing aparece assim justificado pela aquisi<;ao de recursos e capacidades nao disponiveis internamente, ampliando-os de modo a estender as posi<;6es de vantagem competitiva e alargar as oportunidades estrategicas da empresa. Corn os contributos de Prahalad e Hamel para esta teoria nos anos 90, afirmando que as "competencias nucleares" sao a fonte da vantagem competitiva (Prahalad e Hamel, 1990) e que a capacidade de adaptar essas competencias e o que permite sustentar essas vantagens ao longo do tempo, tornou-se evidente que essas competencias nucleares devem pernanecer em casa, enquanto as outras poderiam ser objecto de outsourcing (Caniels e Roeleveldm, 2009). Urn aspecto fundamental a considerar segundo Langlois (1992) e que as competencias tern os seus limites e ha rendimentos decrescentes no alargamento das competencias a mais actividades (ate porque cada actividade sera mais dissemelhante daquela corn que a empresa se iniciou). Assim, uma empresa centrar-se-a nas actividades que sao semelhantes. Esta perspectiva, segundo a qual as organiza<;6es deveriam entao focar-se nas suas competencias nucleares, ou seja, naquilo que sabiam fazer melhor do que os outros (Prahalad e Hamel, 1990) foi ganhando popularidade em muitos sectores. Sao varios os trabalhos sobre o outsourcing desenvolvidos em diferentes sectores de actividades que assentam neste quadro te6rico (v.g. Espino-Rodryguez e Padr6n -Robaina, 2005). Considerar isoladamente esta ou outra qualquer teoria, pode conduzir a uma perspectiva parcial e incompleta do outsourcing. Varios investigadores tern utilizado a TCT a par corn a RBV em varios estudos. E o caso de Gulbrandsen et al. (2009) que entendem que as decis6es de outsourcing podem beneficiar do uso conjunto da TCT e da RBV. Tambem Marshal! et al. (2007) utilizam ambas as teorias para determinar quais as influencias chave no processo de outsourcing e nos seus resultados em industrias no sector de telecomunica<;6es. Ja Holcomb e Hitt (2007) constroem urn modelo para explicar o outsourcing estrategico corn base nestas teorias.

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Os desenvolvimentos verificados nas anteriores teorias, bem coma em outras teorias ou perspectivas diferentes da organiza<;ao, tern procurado contribuir para a compreensao do outsourcing: para identificar os factores que devem ser considerados ao seleccionar as actividades a ser objecto de outsourcing e os varios aspectos a acautelar no processo. Sao exemplos dessas teorias a teoria da agencia, a teoria dos direitos de propriedade, a teoria da dependencia dos recursos, a perspectiva politica das organiza<;6es (ver Oliveira, 2002), a teoria dos sistemas ou a teoria das redes. Hatbnen e Eriksson (2009) procuram mostrar a rela<;ao entre as diferentes teorias e os seus desenvolvimentos e as quest6es chave que se foram colocando na investiga<;ao do outsourcing, coma pode ser observado na figura 1. Fig. 1. Conex6es entre teorias e quest6es-chave do outsourcing Q UEST fiES CHAVE

DESENVOLVIMENTO T E.ORlA S

TE ORlAS

BAS E

(~'"!!~~~!~EMAS ~

•-·· ··· ·

ConexAo uduptoda de B u ckley &Les o ord , 200 5

...,. _ _ conexl:to adapatada de W olrof e kler, 2 001 .,. .... .. . C~nex.~o oduptada de VV:i.IB:ku, 2002 C ll';:m eX ZJ O propos ta por H a.t o n e n c Etiksson , 2009

Fonte: HiitOnen e Eriksson (2009) Muitos autores concordam que abordagens que integrem as varias teorias devem ser utilizadas, mas nao esta ainda disponivel uma teoria unificada que permita compreender na integra este fen6meno. No entanto, os gestores continuam a ter de tomar decis6es. A questao central continua a ser escolher entre as formas de organiza<;ao que implicam produzir internamente ou proceder ao outsourcing. Nesse processo de decisao tern de ser ponderados os beneficios e os custos das alternativas. Foram abordadas de forma mais detalhada as principais quest6es a ser equacionadas na perspectiva da TCT e da RBV. Nao podem contudo deixar de ser referidos outros elementos importantes. Ha vantagens atribuidas ao recurso ao mercado (spot market) de que se destacam: adapta<;ao mais eficiente das empresas a novas condi<;6es, incentivo maxima para que os custos sejam minimizados, economias de escala, facilidade na troca de fornecedores, tendencia para que as empresas sejam mais inovadoras. Mas

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tambem sao usualmente assinalados alguns custos (alem dos custos de transao;ao) coma as dificuldades associadas a coordena<;ao dos fluxos de produ<;ao pela

cadeia vertical e a partilha de informa<;ao sensivel. 5. Areas de outsourcing

Nao obstante os estudos se terem focalizado na area dos sistemas de informa<;ao, area a que esta ligado desde 0 inicio, de tal forma que ha quem defenda que o outsourcing s6 se aplica nessa area especifica (Oliveira, 2002), reconhece-se hoje que o seu campo de aplica<;ao e muito mais vasto, estendendo-se a areas muito diversas. Do outsourcing de actividades nao criticas (como seria esperado, na 6ptica da RBV), hoje comum em muitas organiza<;6es, que subcontratam ao exterior servi<;os de suporte, ou secundarias, que geralmente nao lhes trazem valor acrescentado como a limpeza, o catering, a jardinagem, a seguran<;a, os recursos humanos, as finan<;as e contabilidade, os centros de atendimento ao consumidor, para referir os mais comuns, passou-se a sua aplica<;ao a areas criticas do neg6cio (Santos, 1998). Nas areas de suporte o risco e minima, porque essas fun<;oes nao sao uma importante fonte de receita ou de vantagem. Estas fun<;6es podem as vezes ser realizadas corn o minima de conhecimento e personaliza<;ao. Contudo, quanta maior o conhecimento exigido no desempenho de determinadas fun<;6es, menos provavel eo outsourcing. Processos como os referidos podem constituir urn born primeiro passo para urn processo de outsourcing mais ambicioso, como salientam Kakumanu e Portanova (2006). Cada vez mais componentes criticas e de conhecimento intensivo hoje em dia sao objecto de outsourcing, muitas vezes desenvolvidas em estreita colabora<;ao corn o fornecedor. 0 desafio e cada vez mais na cria<;ao de uma organiza<;ao flexivel, em que uma empresa se concentra em determinadas competencias fundamentais de forma a criar valor deixando que especialistas externos forne<;am o restante valor (Hitonen e Eriksson, 2009). No entanto, o outsourcing de actividades de produ<;ao (aquisi<;ao, fabrica<;ao /montagem, teste, repara<;ao, logistica, por exemplo) sugere que uma empresa enfrente riscos substancialmente acrescidos, implicando muitas vezes a reestrutura<;ao das organiza<;6es. Refira-se ainda que o outsourcing podera ser parcial (ou selectivo), indicando que uma parte significativa duma fun<;ao continua a ser desenvolvida internamente, por oposi<;ao ao outsourcing completo (ou total), em que a fun<;ao e transferida totalmente para o fornecedor durante o tempo do contrato. 6. Beneficios e riscos do outsourcing Os motivos que conduzem as empresas a equacionarem a hip6tese de efectuar o outsourcing de uma deterrninada area, podera estar relacionada corn a expectativa 174

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de obten<;ao de certos beneficios. Atendendo que a maioria dos estudos disponiveis sabre o impacto do outsourcing nas empresas dependem de resultados percebidos ao inves de medidas directas (Jiang e Qureshi, 2006)5, e sobretudo corn base nessas percep<;6es que sao relatados os beneficios do outsourcing. Os beneficios podem ser agrupados em diversas categorias. Lacity e Hirschheim (1995) (cit. por Oliveira, 2002) prop6em as seguintes: econ6mico-financeiros, de neg6cios, tecnol6gicos e politicos. Monczka (2005) consideram as categorias: custos, focus nas com petencias e rendimentos. Corn base na classifica<;ao proposta pelos primeiros autores, e conciliando corn a dos segundos, apresenta-se no quadro seguinte uma sintese desses beneficios.

Quadro 1. Beneficios do outsourcing

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Reduzir custos

Acesso a conhecimentos/ competencias tecnicas escassas

Melhorar o controlo dos custos

Acesso a tecnologias de ponta

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Obter fundos atraves da venda de activos (em muitos contratos ha transferencias de equipamentos e imobilizado)

Melhorar a qualidade do servi<;o

Crescimento de rendimentos

Provar eficiencia

Concentrar a aten<;ao nas competencias nucleares

Justificar a aquisi<;ao de novas recursos

Facilitar fusoes e aquisi<;oes

Imitar os rivais (efeitos de seguidismo)

Facilitar o donwsizing

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Mitigar o risco e incerteza tecnol6gica

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Eliminar areas causadoras de problemas

Iniciar mais rapidamente a actividade

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Concentrar recuros nas actividades tecnicas criticas

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Evitar ou adiar investimentos avultados, nomeadamente nas actividades de apoio

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Facilitar a descentra liza<;ao, a reengenharia e a reestrutura<;ao organizacional

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Obter credibilidade

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Partilhar riscos inerentes ao neg6cio Criar capacidade adicional Aumentar a flexibilidade e capacidade de resposta ao ambiente 5 Os trabalhos sabre o outsourcing tern sido essencialmente de natureza te6rica e baseiam-se principalmente em evidencias a partir de estudos de casos, inqueritos e outro tipo de dados para apoiar afirma<;oes. Poucas analises corn base em dados financeiros tern sido realizadas (Jiang e Qureshi, 2006).

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Parece ser ideia generalizada que a principal motiva<;ao para o outsourcing e a redu<;ao de custos seguindo-se do foco nas competencias nucleares (Monczka, 2005; Lacity et al., 2009 e Rainborn et al., 2009). Dos factores que podem contribuir para esta redu<;ao de custos destacamse as economias de escala e de gama que podem ser conseguidas por parte do contratado que resultam em servi<;os mais acessiveis do que se a empresa os realizasse internamente (Rainborn et al, 2009), bem coma a redw;ao de investimentos em capital. 0 outsourcing pode tambem permitir as empresas aproveitar as competencias do contratado em areas muito espedficas. Os beneficios incluem o aumento da flexibilidade das empresas que se ganha por ter acesso as mais recentes e mais eficientes tecnologias, a melhores metodologias e praticas, sem a constru<;ao e manuten<;ao de uma infra-estrutura complexa e dispendiosa, permitindo fundos para serem investidos em actividades mais rentaveis. 0 outsourcing permitira tambem as empresas ganhos de eficiencia, pois possibilita que as empresas melhorem as actividades consideradas criticas, onde detem competencias estrategicas. A decisao de outsourcing pode contudo ser usada sem ter subjacentes fundamentos econ6micos, estrategicos ou tecnol6gicos. Podera ter motiva<;6es de natureza politica, estando associados a obten<;ao de poder: a promo<;ao de agendas pessoais, tais como progressao da carreira, ou maximiza<;ao de beneficios financeiros pessoais. Apesar de na literatura serem abundantes os relatos de casos de sucesso de outsourcing (Lau e Zhang, 2006), ha riscos que devem ser equacionados antes de tomar uma decisao de outsourcing. Rainborn et al. (2009) estabelecem quatro categorias de riscos: perda de controlo, perda de inova<;ao, perda de confian<;a na organiza<;ao e custos mais elevados do que o esperado, que serao abordados de seguida. Estas categorias agregam os varios obstaculos correntemente mencionados (Lau e Zhang, 2006). • Perda de controlo Sendo certo que a existencia de uma cultura comum, ao assegurar que todas as partes duma organiza<;ao se movam na mesma direc<;ao e partilhem os mesmos valores e objectivos, facilita a coordena<;ao, parece evidente que corn o outsourcing esta tarefa estara dificultada, complicando por conseguinte as tarefas de controlo. A perda de controlo sobre as tecnologias de processo e normas de trabalho e assim urn risco importante a considerar. Acordos de nivel de servi<;o cujas especificat;6es estejam incorrectas ou feitos de forma inadequada podem sujeitar o contratante a comportamentos oportunistas por parte do contratado como aumentos de pret;os imprevistos ou injustificados, ou mesmo traduzir-se numa deteriorat;ao do servit;o (tempos de resposta mais longos, erros frequentes, falta de assistencia na resolut;ao de problemas).

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• Perda de inova<;i'i.o Empresas que prossigam estrategias de inova<;ao devem reconhecer a necessidade de recrutar e contratar individuos altamente qualificados (Rainborn et al, 2009). Ora corn o outsourcing pode reduzir-se os contactos entre os departamentos que estao muitas vezes na origem de novas ideias, e nos casos em que a inova<;ao resulta de urn conjunto de inova<;6es interdependentes, pode acarretar problemas de coordena<;ao, podendo acabar por impedir a propria inova<;ao (Oliveira, 2002). • Perda de confian<;a A influencia do outsourcing ao nivel da cultura da organiza<;ao e das redes informais, pode repercutir-se negativamente na motiva<;ao, pois abala o sentimento de perten<;a dos trabalhadores a organiza<;ao e cria sobre eles pressao excessiva (devido a amea<;as de perda de emprego, receios de transferencia for<;ada para outra empresa, por exemplo) corn consequencias sobre o seu envolvimento nas tarefas que tern que executar e na organiza<;ao. Corn efeito, a inseguran<;a que pode provocar sobre os trabalhadores podera alimentar a distrac<;ao e o erro, inibindo a experiencia, a coloca<;ao de quest6es e a aprendizagem. • Custos mais elevados do que o esperado Apesar da redu<;ao dos custos ser apontada como urn dos principais motivos para avan<;ar para o outsourcing, verifica-se em muitas ocasi6es que tal nao e conseguido. Tal deve-se ao facto de por vezes eles se revelarem apenas no longo prazo, e muitos deles nao serem capturados por sistema de contabilidade. Apesar destas dificuldades, eles nao podem ser ignorados. Estes custos podem ser custos de coordena<;ao em que incorrem as organiza<;6es que efectuam o outsourcing de mllitiplas actividades junto de empresas distintas; custos de transi<;ao que englobam os custos de reafecta<;ao de trabalhadores ou de transferencias de equipamentos muitas vezes subavaliados; custos "ocultos" nos contratos pelo facto destes nem sempre contemplarem urn conjunto de situa<;6es nas suas clausulas, fazendo aumentar os custos ou obrigando a rectifica<;6es contratuais implicando custos adicionais. Os beneficios do outsourcing nao sao pois automaticos havendo a possibilidade de ocorrencia de resultados indesejados, pelo que a negocia<;ao e acompanhamento de urn acordo de outsourcing requer urn investimento consideravel de tempo e grande aten<;ao por parte da gestao. A decisao de outsourcing dos servi<;os de suporte e menos arriscada do que o outsourcing da produ<;ao, mas tal nao significa que os danos para a organiza<;ao nao sejam significativos, carecendo igualmente todo o processo de outsourcing de planeamento, avalia<;ao e controlo. Abordagens como o ERM (Entreprise Risk Management) podem auxiliar as empresas nessas tarefas (Rainborn et al., 2009).

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As ernpresas devern analisar cuidadosarnente os irnpactos das suas decis6es de outsourcing. Considerando que a (mica forma de evitar totalrnente os riscos do outsourcing e a ernpresa realizar ela propria todas as actividades, este nivel de preven<;ao dos riscos pode trazer por seu turno grandes custos pois inviabiliza a realiza<;ao dos beneficios que podern ser conseguidos corn o outsourcing. Cabe a cada ernpresa dar rnuita aten<;ao a escolha do parceiro e fun<;6es objecto de outsourcing, e desenvolver rnecanisrnos, por exernplo, ao nivel dos relacionarnentos corn os fornecedores que perrnitarn potenciar os beneficios, irnpedir a escalada de custos e atenuar os restantes riscos.

7. Conclusao

Parece ter ficado claro que as explica<;6es para o outsourcing sao rnais cornplexas do que urna prirneira analise poderia indicar, nao residindo na TCT o unico fundarnento te6rico, e revelando-se necessaria urna visao holistica do fen6rneno, integrando contributos de outras abordagens te6ricas. Ao nivel da investiga<;ao, as quest6es chave (porque, o que, corno e onde?) que tern conduzido a investiga<;ao deste carnpo no passado perrnanecern actuais. No entanto, e expectavel que, tal corno no passado, o outsourcing continue a evoluir criando novos desafios para decisores e investigadores. Continuara a ser irnportante para os gestores avaliar os riscos e beneficios do outsourcing bem corno conhecer os deterrninantes do seu sucesso. Por firn, ernbora o nivel de analise dorninante do outsourcing seja, e provavelrnente continue a ser, a ernpresa ou projecto, ere-se que teria interesse analisar, e a investiga<;ao nao tern dado rnuita aten<;ao a este t6pico, os efeitos rnais arnplos desta estrategia sobre o nivel de, por exernplo, urn sector, ou rnesrno urn pais. As rapidas altera<;6es no arnbiente ern que as organiza<;6es actuarn, conduzirarn a urna adop<;ao crescente desta pratica, rnuitas vezes acusada pela opiniao publica de contribuir para o aurnento de taxas de desernprego (sobretudo quando ern causa o offshoring). Assirn, urna das quest6es que podera ser equacionada pelos poderes politicos e entidades reguladoras e lirnitar o outsourcing. A existencia ou possibilidade da sua avalia<;ao a nivel macro parece-nos util para poder, pelo rnenos, rnelhor fundarnentar esse e outros tipos de decis6es.

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IMPORTANCIA DO CAPITAL INTELECTUAL NA GESTAO ESTRATEGICA DAS ORGANIZAC::OES

Graciete Honrado Professora Adjunta (Escola Superior de Gestao do Instituto Polih2cnico de Tomar)

Manuela Faia Correia Professora Associada (Universidade Lusfada de Lisboa) Secretaria da Faculdade de Ciencias de Economia da Universidade Lusiada de Lisboa



Resumo: Ha alguns anos que se vem sublinhando a importancia das dimens6es intangfveis na gestao e no sucesso das empresas e outras organiza~6es . Desde os anos 70, quando nao se consegue explicar de urn ponto de vista estritamente racional (leia-se econ6mico ou financeiro), o insucesso de uma organiza~ao corn identicas caracterfsticas de mercado, dimensao, tecnologia, estrutura, processos, investimentos e ate de recursos humanos (nos seus aspectos formais, vide: idade, habilita~6es, sexo) a uma outra corn sucesso, remete-se a explica~ao para dimens6es intangfveis. 0 capital intelectual pode ser descrito como a capacidade estrategica e intangfvel ao dispor de uma organiza~ao que abarca o conhecimento, a informa~ao, a investiga~ao e desenvolvimento de novos produtos, a propriedade intelectual, a marca, a experiencia, os metodos de trabalho, os processos de gestao, o talento e a capacidade de inova~ao dos colaboradores.

Palavras chave: capital intelectual, conhecimento, estrategia, gestao.

Abstract: For some years now that intangible dimensions in entrepreneurial management and success have been gaining increasing significance. From the Seventies, when the failure of an organisation with similar characteristics to a successful one: size, technology, structure, procedures, investments and even human resources (same age, qualifications and gender) cannot be explained from a strictly rational standpoint (i.e. economical or financial), it is attributed to intangible dimensions. Intellectual capital may be described as the strategic, intangible ability at an organisation's disposal covering knowledge, information, research and development of new products, intellectual property, branding, experience, work methods, management procedures, and talent and innovation skills of its staff.

Keywords: intellectual capital, knowledge, strategy, management.

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1. Introdw;ao

0 n ovo enfoque estrategico de neg6cio e a identifica<;ao e desenvolvimento das competencias centrais, o que conduz a uma crescente enfase nos activos subjacentes a essas competencias: capacidades das pessoas, conhecimento, informa<;ao e capacidades tecnol6gicas. A necessidade de uma nova linguagem e de ferramentas para a gestao do conhecimento da origem a uma serie de express6es como capital humano, activos intangiveis ou capital intelectual; este representa, ja na actualidade, o valor mais importante para fazer face ao desafio competitivo (Lopez & Ibarra, 2000). Roos, Dragonetti, e Edvinsson (1997) consideram que as origens conceptuais do capital intelectual estao relacionadas corn dois fluxos: o fluxo da estrategia afecto a cria<;ao e utiliza<;ao do conhecimento, bem como a rela<;ao entre o conhecimento e a cria<;ao de valor, e o fluxo da medida, relacionado corn a produ<;ao de instrumentos de medida que possibilitem urn conhecimento mais aprofundado do desempenho organizacional. Klein e Prusak (1994) defendem o capital intelectual como sendo o material intelectual que foi formalizado, capturado, resultando numa mais valia, a fim de produzir urn activo corn maior valor acrescentado na organiza<;ao. Assim, esse material torna-se capital ao ser capturado, descrito e compartilhado para ser desenvolvido e utilizado em beneficia da cria<;ao de valor para a organiza<;ao, sempre alinhado corn os seu s objectivos estrategicos.

2. Definic;;oes e classificac;;oes do Capital Intelectual

Varias defini<;6es, bem como classifica<;6es, de capital intelectual aparecem na literatura, sendo a classifica<;ao tripartida a mais comum. 0 capital humano, de quem a empresa nao pode ser proprietaria, consiste na combina<;ao de conhecimentos, habilidades e capacidades dos seus colaboradores, e inclui, tambem, os valores, a cultura ea filosofia da empresa (Edvinsson & Malone, 1999, p. 27); o capital cliente "e o valor do relacionamento de uma organizac;iio cam as pessoas cam quem faz neg6cio" (Stewart, 1997, p. 111); o capital estrutural "inclui patentes, conceitos, modelos e sistemas infomuiticos e administrativos" (Sveiby, 1997, p. 10). No entanto, "o capital intelectual niio e criado a partir de conjuntos discretos de capital

humano, estrutural e de cliente, mas, pelo contrririo, pela interacc;iio existente entre eles." (Stewart, 1997, p. 113). Num mundo profundamente competitivo onde os mercados, os produtos, a tecnologia ea propria sociedade se transformam a urn ritmo acelerado, o capital intelectual e reconhecido como fonte de vantagem competitiva sustentavel, enquanto recurso valioso e (mico numa economia globalizada (Cabrita, 2009). As novas formas de organiza<;ao do trabalho, sobretudo ao nivel da dissemina<;ao das novas tecnologias de informa<;ao e de comunica<;ao, da flexibiliza<;ao do

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proprio trabalho e da inseguran~a e incerteza quanta ao futuro das rela~oes laborais, deram origem a um novo conceito da gestao do conhecimento: o capital intelectual. Ah~m de ser cada vez mais determinante e importante na actividade econ6mica, o conhecimento distingue-se de um mero recurso. Permite criar riqueza independentemente da forma coma existe nas organiza~6es. Distingue-se da generalidade dos recursos consumidos durante a produ~ao porque a sua utiliza~iio e feita ao longo de todo 0 processo produtivo e nao pressupoe a sua destrui~ao ou desaparecimento cam a incorpora~ao (Drucker, 1994). Par isso, adquire o estatuto e a forma de capital, passando a chamar-se capital intelectual. As empresas devem interrogar-se acerca de: - o que fazer cam vista a criar e aumentar os core intangibles? - quais as actividades que afectam positiva e negativamente aqueles core

intangibles? - que competencias, valores e atitudes se devem promover que facilitem a inova~ao, a competitividade e o crescimento sustentavel? - em que medida uma visao baseada no capital intelectual da empresa favorece a inova~ao da empresa baseada no conhecimento? A natureza multidisciplinar da pesquisa sabre capital intelectual tem produzido uma literatura fragmentada sem um enquadramento te6rico coerente, de tal forma que nao se conhece uma defini~ao consensual de capital intelectual (Beattie & Thomson, 2007). As varias defini~oes existentes apenas parecem ser concordantes no que respeita a ideia de que os seus beneficios nao se esgotam num s6 momento (Abeysekera, 2006), mas antes, contribuem durante varios periodos para a forma de uma organiza~ao alcan~ar vantagens competitivas sustentadas. Para Biirgi e Roos (2003), o conhecimento e um conceito muito amplo que se refere a forma coma cada individuo atribui significado as experiencias, enquanto que o conceito de capital intelectual representa uma contribui~iio individual, valiosa par si mesma e no potencial de agrega~ao que apresenta. Wiig (1993) evidencia o car<icter humano e instrumental do conhecimento na rela~ao das pessoas cam a informa~ao . Refere que o conhecimento consiste em verdades e cren~as, perspectivas e conceitos, julgamentos e expectativas, metodologias e know-how. 0 conhecimento e acumulado, organizado e integrado e detido par longos periodos para estar disponfvel para ser aplicado a lidar cam situa~oes espedficas e problemas. Informa~ao consiste em factos e dados que sao organizados para descrever uma situa~ao particular ou um problema. 0 conhecimento e aplicado, ao nivel operacional, subsequentemente para interpretar a informa~ao disponivel sabre uma situa~ao particular e para decidir coma lidar cam ela. Os autores mais recentes refor~am o aspecto active do conhecimento e preferem propor defini~6es mais simples e tacticas. Applehans, Globe e Laugero

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(1999), num trabalho de concepc;ao pratica de urn sistema de gestao de conhecimento sobre tecnologia e internet afirmam que 0 "conhecimento ea habilidade para transformar a informac;ao e os dados em acc;ao efectiva ... ". Para Dixon (2000) conhecimento organizacional e sobretudo a base da acc;ao dos empregados e define conhecimento comum como: "o conhecimento que os empregados aprendem ao fazer as tarefas na organizac;ao" e afirma que se trata de urn entre muitos tipos de conhecimento que existem numa organizac;ao. Para Stacey (2001), conhecimento e urn processo social que emerge se houver interacc;ao entre humanos. "Conhecer e uma acc;ao corporal e ninguem pode ser proprietario dela. Seria o mesmo que dizer a alguem que pode ser proprietario do meu acto de andar. Todo o movimento para a gestao do conhecimento passar do nfvel implicito para 0 explicito, codificando-o, e passar a fase de medic;ao do capital intelectual e baseado em algo impossfvel." 0 conceito foi desenvolvido para lidar corn determinados conjuntos de quest6es e problemas e todas as definic;6es sao validas cabendo ao utilizador seleccionar a definic;ao que se adaptar melhor ao seu conjunto de necessidades. Apesar.da existencia de multiplas definic;6es de capital intelectual, existem alguns aspectos que aparecem como predominantes na literatura: • 0 capital intelectual diz respeito ao conhecimento detido pelos colaboradores de uma organizac;ao e que influencia o seu comportamento (Bukowitz & Williams, 2002); • 0 conhecimento tern urn caracter dinamico uma vez que sofre alterac;6es ao longo do tempo (Davenport & Prusak, 1998); • 0 conhecimento tern uma componente social na medida em que as interacc;6es entre os colaboradores facilitam a sua aquisic;ao e modificac;ao (Sveiby, 1997; Allee, 1997); • 0 conhecimento (tacito) e potenciador de novo conhecimento (explicito) (O'Dell & Grayson, 1998). Embora o conceito de capital intelectual tenha sido alvo de muita atenc;ao por varios autores, sobretudo na ultima decada, existe ainda uma falta de consenso sobre os seus componentes e definic;6es (Marr & Moustaghfir, 2005, p. xiv) . Para Petty e Guthrie (2000, p. 158), "o numero contemporanea de modelos de classificac;6es do capital intelectual tern refinado a distinc;ao, especificamente, dividindo o capital intelectual nas categorias de capital externa (relacionamento corn os clientes), de capital interno (estrutural) e de capital humano". Destas tres categorias, o capital estrutural e, por vezes, categorizado em capital processos, em propriedade intelectual e em inovac;ao. Knight (1999) identifica urn factor adicional: o desempenho financeiro, para alem do capital humano, capital estrutural e capital externa. Na Tabela 1 consta uma lista de elementos do capital intelectual obtidos a partir de investigac;6es publicadas de varios autores. Os itens referentes ao capital

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humano, ao capital cliente (relacional ou capital externa) e ao capital estrutural (capital interno) baseiam-se em estudos publicados por Guthrie, Petty, Ferrier, e Wells (1999) e Guthrie, Petty, Yongvanich, e Ricceri (2004) e Oliveras, Gowthorpe, Perramon, e Kasperskaya (2004), mas tambem incorpora varios itens ou elementos sugeridos por outros autores. A metodologia a adoptar, insere-se no trabalho desenvolvido por Guthrie et al (1999, 2004) e Oliveras et al (2004), que apresentaram urn modelo que divide o capital intelectual em capital humano, capital cliente e capital estrutural. 0 capital humano e, segundo estes autores, o capital dos recursos humanos de uma organiza<;ao, composto pelas suas competencias, pelo valor acumulado das suas praticas, pela sua criatividade, pela sua capacidade de relacionamento, pelos seus valores, etc., fazendo tambem parte deste capital a cultura e os valores organizacionais da empresa. Segundo os autores, e este capital que e fonte de inova<;ao e de renova<;ao. Kovacs (1994) aponta que, em pafses menos industrializados, nomeadamente Portugal, a escassez de recursos qualificados e a falta de capacidade do sistema de educa<;ao e forma<;ao para responder a escassez de trabalhadores qualificados sao os dois principais obstaculos ao desenvolvimento dos chamados "sistemas de produ<;ao antropocentricos". Contudo, as organiza<;6es parecem estar a mudar e, coma resultado, ha uma crescente mudan<;a na enfase do capital financeiro para urn foco na crescente importancia do capital humano e aprendizagem continua como uma vantagem estrategica e competitiva (Teixeira, 2002). 0 capital cliente corresponde ao valor dos relacionamentos entre a organiza<;ao e os seus clientes. Para Stewart (1997, p. 127), a componente do capital cliente acrescenta valor para a organiza<;ao (potencial e efectivo) atraves das rela<;6es intangfveis de mercado, as quais tambem incluem os efeitos dos nomes das marcas e a sensibilidade dos clientes ao pre<;o. Esta componente do capital intelectual pode ser considerada como uma deriva<;ao das habilidades do ser humano em se relacionar, manter estrategias de inova<;ao que permitam o encantamento do cliente e, por conseguinte, a reten<;ao e lealdade dos mesmos. 0 capital estrutural, por seu lado, e entendido como 0 valor que e deixado na empresa pelos seus recursos humanos quando eles regressam a casa, por exemplo as bases de dados, os manuais, a lista de clientes, etc. Este capital corresponde ao capital de processo (processos de cria<;ao e de nao cria<;ao de valor na empresa), ao hardware, ao software, a estrutura organizacional, as patentes, as marcas comerciais e tudo o resto da capacidade organizacional que suporta a produtividade dos empregados - numa palavra, tudo o que fica na empresa quando os empregados vao para casa. Acerca da importancia do crescimento dos elementos intangfveis para as organiza<;6es, Lev (2001) considera que mudan<;as nas estruturas e no foco das estrategias das organiza<;6es devem ser consideradas a fim de contemplar a existencia da componente capital estrutural. Prossegue o autor afirmando que a recente onda de interesse sobre os activos intangfveis esta relacionada corn a

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combina<;ao de dois fen6menos: a intensifica<;ao da competi<;ao entre as organiza<;6es e o desenvolvimento da tecnologia da informa<;ao. Segundo Lev (2001), os citados fen6menos, urn politico e econ6mico e o outro tecnol6gico, tern afectado dramaticamente a estrutura e a estrategia das organiza<;6es e tornado os intangiveis como a fonte de maior valor das empresas nos paises desenvolvidos. Contrariamente ao capital humano, o capital estrutural, pode ser possuido pela empresa e transaccionado. 0 capital cliente corresponde ao valor dos relacionamentos entre a organiza<;ao e os seus clientes. Assim, segundo esta visao, o capital intelectual e a soma do capital cliente, do capital estrutural e do capital humano, sendo este o ceme da capacidade de cria<;ao de valor de qualidade superior. Na Tabela 1 verifica-se esta diferencia<;ao ao nivel do capital intelectual. De referir que tanto o capital humano, coma o capital cliente, como o capital estrutural sao constituidos por intangiveis criticos que dao origem aos recursos e as actividades nas organiza<;6es.

Tabela 1. Elementos do Capital Intelectual C6digo

Elementos

0 capital humano

Know-how I especializa<;ao dos colaboradores Nivel de educa<;aolqualifica<;ao profissional dos colaboradores Tarefas relacionadas corn a competâ‚Źmcia dos colaboradores Criatividadelinova<;ao dos colaboradores Tarefas relacionadas corn o conhecimento dos colaboradores Satisfa<;ao profissional dos colaboradores Taxa de turnover dos colaboradores Lideran<;a, qualidade dos gestores Forma<;ao dos colaboradores Rentabilidade dos colaboradores (ex: receita por colaborador) Sistema de recompensasiProgramas de incentivos Experii~ncias anteriores de emprego dos colaboradores Motiva<;ao dos colaboradores Fidelidadellealdade dos colaboradores Custos corn o recrutamento dos colaboradores

0 capital cliente

Procura de mercado para os produtoslservi<;os Fidelidade dos clientes a sua empresa ou aos produtos (ex: repetir vendas) Canais de distribui<;ao da empresa que permitem aos clientes o facil acesso aos produtoslservi<;os Oportunidades de gestao de alian<;aslparceriaslcolabora<;oes Oportunidades para licenciamento I acordos de franchising Contratos favoraveis obtidos devido a situa<;ao unica da empresa Satisfa<;ao dos clientes (ex: atraves de questionarios) corn a empresalproduto Tempo oportuno na entrega do produtolservi<;o

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Numero de reclama<;6es dos clientes e respostas as reclama<;6es Angaria<;ao de novas clientes Rentabilidade dos clientes Quota de mercado Crescimento no volume de neg6cio ou servi<;o Grau de dependencia dos principais clientes Actualiza<;ao da lista/perfil dos clientes 0 capital estrutural

Explora<;ao e gestao de patentes, direitos de autor e marcas Explicita<;ao (escrita) da cultura organizacional Sistemas de tecnologias de informa<;ao e a sua utiliza<;ao na empresa Sistemas de networking e bases de dados de clientes, fornecedores, etc. Sistema de controlo de gestao (incluindo a financeira) Sistema de comunica<;ao interno Documenta<;ao do conhecimento (manuais, bases de dados, etc.) Sistemas de fornecimento e de acesso a informa<;ao relevante Execu<;ao das estrategias organizacionais Eficacia da despesa em I&D Desenvolvimento de novas ideias/produtos/servi<;os Implementa<;ao de novas ideias/produtos/servi<;os Dura<;ao do tempo de concep<;ao dos produtos/desenvolvimento do produto Qualidade do produto ou do servi<;o fornecido Ciclos de vida dos produtos Imagem da empresa na sociedade

Fonte: adaptado de Guthrie et al (1999, 2004) e Oliveras et al (2004)

No trabalho que desenvolverarn sobre a irnportancia da definic;ao dos elernentos do capital intelectual, Mouritsen, Larsen, Bukh, e Johansen .(2001), defenderarn que e extrernarnente cornplexo atribuir urna escala de irnportancia aos varios elernentos pois todos eles referern-se aos recursos (o que sao), as actividades (o que fazern) e aos efeitos que produzern (o que acontece), tendo assirn urna consequencia bern visfvel nas organizac;6es. A taxonornia e, portanto, apenas urn ponto de partida para qualquer gestor, pois os seus cornponentes terao que ser desenvolvidos de acordo corn a cultura, as caracterfsticas e rarno de actividade da organizac;ao e a intenc;ao e a finalidade espedfica que cada gestor lhe quer atribuir. Assirn, e possfvel inferir que os elernentos do capital intelectual podern diferir de cultura para cultura corno, por exernplo, a percepc;ao de urna elevada distancia ao poder ou de urn baixo fndice de individualisrno versus urna cultura rnais colectivista e rnais sociavel (Brewer & Brown, 1998).

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3. 0 Capital Intelectual nas Organizac;oes Qualquer estudo desenvolvido na area comportamental deve entrar em linha de conta corn os aspectos tecnol6gicos, humanos e organizacionais (Roos & Krogh, 1995), nao esquecendo ainda, que a organiza<;ao faz parte de urn ecossistema em que se podem distinguir dois tipos de envolventes: a envolvente contextual - constituida por urn conjunto de componentes tecnol6gicas (novas tecnologias e novos mercados, como por exemplo o comercio electr6nico), politicas (incentivos a moderniza<;ao tecnol6gica, varia<;ao dos impostos), legais (acordos de exporta<;ao e importa<;ao, legisla<;ao sobre as regras de neg6cio), demograficas, sociais (fen6menos culturais, desemprego), econ6micas (restri<;6es ao credito, varia<;ao das taxas de juro) e ecol6gicas, que condicionam o campo de actua<;ao da organiza<;ao; a envolvente transaccional, constituida por urn conjunto de agentes econ6micos (fornecedores, clientes, competidores, grupos reguladorespor exemplo o estado e as institui<;6es financeiras) corn quem a organiza<;ao contacta directamente. Em todo este processo, deve existir urn envolvimento de todos os colaboradores pois sao os principais interessados e afectados pelo mesmo. E fundamental cativar os potenciais colaboradores e tornar a resistencia natural a mudan<;a em motiva<;ao e empenho (Roos & Krogh, 1995), explorando os seguin tes aspectos:

• a existencia de experiencias previas da organizaqiio - na hist6ria da empresa, possivelmente, existem experiencias positivas ou negativas corn as inova<;6es geradas; • a adaptabilidade - grau de flexibilidade relativo a mudan<;a. As organiza<;6es em mudan<;a, frequentemente desenvolvem conhecimento para gerir essa mesma mudan<;a, obtendo desta maneira uma melhor gestao e optimiza<;ao das iniciativas tecnologicamente inovadoras; • a definiqiio de metas congruentes - a sintonia entre as metas preconizadas para a organiza<;ao e as dos individuos e fundamental para evitar que os colaboradores fiquem surpreendidos, questionando-se sobre o porque de mudan<;as desprovidas de sentido e confusas, sem saberem como e que a inova<;ao os ira beneficiar; • a definiqiio de nfveis de controlo- e fundamental que os individuos interiorizem a posse de controlo e envolvimento nas mudan<;as do processo, o que pode conduzir a uma predisposi<;ao destes para aceitar as mudan<;as. Alguns estudos, por exemplo, Lopes e Matos (2005, 2006), Lopes e Mateu s (2003), Gon<;alves (2005), indiciam que a inova<;ao organizacional, entendida como a capacidade que as organiza<;6es tern para se renovarem de forma equilibrada, esta relacionada corn a forma como e gerida a inova<;ao interna do seu capital intelectual, a qual se traduz em produtos e servi<;os capazes de surpreender

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o cliente. Isto significa que, em todos os processos organizacionais, sera necessaria incorporar capital intelectual e por toda a organiza<;ao a pensar e a fazer de cada colaborador urn agente inovador. Segundo Stewart (1997) as organiza<;6es deverao colocar sempre em primeiro lugar a preocupa<;ao corn a gestao dos seus colaboradores e s6 depois se deverao centrar na gestao financeira do capital ou em qualquer outro recurso empresarial. Segundo este autor, as empresas que ja se deram conta disso e voltaram-se para os seus colaboradores, sao hoje as que maior sucesso obtiveram no mercado. 0 capital intelectual, tratando-se de urn activo tao importante, e indispensavel proceder a sua avalia<;ao corn objectividade. Nao existe, ainda, nenhum metodo definitivo ou sistema de informa<;ao corn dados suficientes para avaliar o valor do conhecimento disponivel na empresa. Edvinsson e Malone (1997) sustentam que o modelo tradicional de contabilidade que tao brilhantemente registou as opera<;6es empresariais ao longo de meio milenio esta agora a revelar-se incapaz de acompanhar a evolu<;ao verificada na actividade empresarial. E necessaria identificar e medir os activos nao contabilizados actualmente para dar objectividade aos sistemas de informa<;ao empresariais, designadamente os contabilisticos. Edvinsson e Malone (1997) alertam para as consequencias desta situa<;ao ao afirmar que "uma economia que nao pode medir adequadamente o seu valor nao pode distribuir corn objectividade e rigor os seus recursos nem recompensar adequadamente os seus cidadaos" (p. 19). 0 processo de cria<;ao de urn sistema de medida devera ser urn processo topdown, fundamentado na estrategia de longo prazo da organiza<;ao, sua visao e missao, que permitirao identificar dois conjuntos de variaveis: as categorias do capital intelectual, que conduzem a cria<;ao de valor, e o conjunto de factores criticos de sucesso e de indicadores apropriados como medidas de desempenho (Bontis, Dragonetti, Jacobsen & Roos, 1999). Hall (1993) real<;a o papel dos recursos intangiveis no processo da gestao estrategica, em particular a identifica<;ao das fontes intangiveis de vantagens competitivas sustentaveis, elaborando urn modelo, que interliga a vantagem competitiva, os diferenciais de capacidade e os recursos intangiveis. 0 capital intelectual esta intimamente relacionado corn a competitividade estrategica, sendo por isso necessaria identifica-lo, medi-lo e incorpora-lo como urn dos principais intangiveis da gestao estrategica.

4. Conclusao

Varios estudos tern sido desenvolvidos em diversos paises corn vista a analise das praticas existentes no seio das empresas, alguns deles corn objectivos mais ambiciosos de as ajudar a melhorar a sua postura face a medida e gestao do seu capital intelectual, muitos integrados em programas de institui<;6es internacionais, como e o caso do programa Measuring Intangibles to Understand and Improve Innovation

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Management promovido pela Comissao Europeia, e as conferencias organizadas pela Organization of Economic Co-operation and Development (OCDE). Joia (2001) afirma que o capital intelectual, isoladamente, nao tern valor, devendo ser entendido coma uma forma de "refinar" a estrategia da empresa. Esta nova estrategia empresarial, concretizada atraves de novas estruturas organizacionais e de urn novo modelo de neg6cios, tern proporcionado as organiza<;6es detentoras de marcas (ou de outros activos intangiveis) fortes, a possibilidade de alcan<;ar altas taxas de crescimento, sem a necessidade de grandes investimentos. Portanto, a valoriza<;ao do capital intelectual deve ter urn claro alinhamento corn a estrategia da organiza<;ao, corn a sua missao, corn a sua visao e corn os seus objectives. Ao se definirem as componentes do capital intelectual e de coma as mesmas podem afectar o desempenho das organiza<;6es atraves das decis6es tomadas, gra<;as ao seu caracter estrategico, fica claro que os investimentos em activos desta natureza, na actual sociedade do conhecimento, podem levar a desempenhos econ6micos superiores as organiza<;6es, gerando valor para os seus accionistas e investidores. Segundo Brooking (1996), deve-se referenciar. que, actualmente, nenhuma organiza<;ao e valorizada ou vendida sem se ter em considera<;ao o seu capital intelectual.

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Lusfada. Economia & Empresa, n. 0 11/2010


RECENSAO "NEUROECONOMIA Ensaio sobre a sociobiologia do comportamento" Jose Eduardo Carvalho, Edic;oes Sz1abo, 2009

Jose Alvaro Assis Lopes Professor Catedratico da Universidade Lusiada de Lisboa



CARVALHO, Jose Eduardo (2009), NEUROECONOMIA - Ensaio sabre a sociobiologia do comportamento, Lisboa, Edi<;6es Silabo

Este ensaio pretende analisar, corn sustenta<;ao, as raz6es pelas quais os economistas falham nas suas previs6es, nomeadamente nas crises verificadas nas economias que infelizmente, em periodos mais recentes, apresentam uma frequencia mais acentuada. As causas mais profundas podem ser encontradas, de acordo corn o autor, na abstrac<;ao do homo economicus, definido como ente racional que maximiza as suas preferencias de acordo corn o seu interesse proprio. Este elemento que suportou todos os desenvolvimentos da teoria neoclassica da Economia e posto em causa ao longo de todo o texto. 0 escritor ressalta a importancia da contribui<;ao dos genes e da cultura no comportamento humano, adoptando um percurso que integra as contribui<;6es da Sociobiologia e os desenvolvimentos da Neurociencia, como um campo prornissor para construir os ftmdamentos de uma nova explica<;ao dos fen6menos de natureza econ6mica. A Neuroeconomia, como e designada esta nova especialidade, estuda designadamente a forma como o cerebro se relaciona corn o ambiente exterior de maneira a gerar um real comportamento econ6mico.

0 livro desenvolve-se em dezasseis capitulos, havendo uma 16gica subsequente que torna a leitura envolvente, uma vez que e patente a constru<;ao s6lida e sequente desta nova disciplina. Assim, nos quatro primeiros capitulos, descrevem-se os principais contributos das varias escolas do comportamento econ6mico. Saliente-se a forma interessante por que se optou para a sua escrita, ja que, a par de uma sintese rigorosa, apresenta as principais contradi<;6es e criticas reconhecidas, havendo referencias e explica<;6es de contexto hist6rico que tornam a leitura extremamente agradavel. Os tres capitulos seguintes sao dedicados ao conhecimento do individuo humano em tres vertentes distintas: Desenvolvimento da especie, descri<;ao da anatomia e das ftm<;6es cerebrais e, finalmente, como e concretizado o pensamento. Destaque-se em particular, os pontos respeitantes a Investiga<;ao Genetica, a Quimica da Regiao Cerebral ea Intelec<;ao, incorporados em cada um dos temas atras referidos, pelo interesse que despertam no leitor, uma vez que se comenta,

Lusfada. Economia & Empresa. Lis boa, n.9 11/2010

197


Jose Alvaro Assis Lopes

de forma simples e clara desenvolvimentos ou fen6menos corn caracteristicas naturalmente complexas. Os capitulos de oito a catorze sao dedicados ao consumo, ao bem-estar, descrevendo e explicando, corn base cientifica, algumas das patologias verificadas na sociedade contemporanea, nomeadamente a neuroteologia, o craving e a sociopatia. Nos dois ultimos capitulos, o autor elabora, no primeiro, sobre os prop6sitos da Neuroeconomia, referindo e explicitando os desenvolvimentos que permitem descrever de forma sustentada alguns aspectos da colabora<;ao entre as pessoas. 0 capitula dezasseis e dedicado exclusivamente ao Neuromarketing, a sua leitura e simultaneamente irresistivel e perturbadora pela sensa<;ao que e transmitida da vulnerabilidade do ser humano em face a aplica<;ao de tecnicas publicitarias baseadas nos conhecimentos adquiridos recentemente pelas Neurociencias. 0 autor relata o conjunto de experiencias que fomentam, por exemplo, as compras compulsivas nas grandes superficies, concluindo que " .. .Somos governados, os nossos cerebros moldados, os nossos gostos formados, as nossas ideias sugeridas, em grande medida por homens dos quais nunca ouvimos falar ... ". Este ensaio e uma pedra no charco que abala uma parte substantiva das teorias neoclassicas suportadas pelo homo economicus, ente construido muito longe das verdadeiras particularidades do ser humano que intervem nas reais decis6es econ6micas da sociedade. 0 autor nao se limita a desenvolver uma critica sem consequencias, uma vez que propoe uma nova abordagem para a explica<;ao dos fen6menos desta natureza, suportada pela nova area cientifica da Neuroeconomia, onde confluem os conhecimentos da Neurociencias e da Economia. A leitura deste livro e envolvente e de certa forma apaixonante, nao s6 pela forma cuidada como esta escrito e pela actualidade do tema, mas principalmente, pela sua estrutura, uma vez que constr6i de maneira sustentada e progressiva os alicerces desta nova ciencia. Esta, pois, de parabens o seu autor, ja que o desiderata que se propos atingir corn o trabalho apresentado, foi plenamente alcan<;ado e ate ultrapassado. Esta obra e particularmente indicada para economistas e gestores, mas a sua leitura e acessivel e recomendada a todos aqueles que pretendem uma explica<;ao rigorosa e fundamentada dos fen6menos econ6mico-sociais.

Jose Alvaro Assis Lopes

198

Lusiada. Economia & Empresa, n. 0 11/2010


INDICE TEMATICO DOS ARTIGOS PUBLICADOS NOS NUMEROS 1 A 11 DE "LUSIADA- ECONOMIA & EMPRESA"



Administra~ao

A

avalia~ao

da

Publica forma~ao

na

Adrninistra~ao

Publica Portuguesa

Cesar Madureira .. ... ............... .. ............ .. .......... .. .. .. ... .................. .... .......... As

finan~as

4

locais e o desenvolvirnento regional: estudo de caso

Manuel Almeida Baptista ............. ............ .. ............ ....... .. ........................

7

As cornpetencias cornportarnentais na Adrninistra~ao Publica: essencia para urn "saber agir" e urn "saber fazer" adaptativo(s) e generalistas na era da globaliza~ao

Cesar Madureira ............ ............................ .. ... ................ .......................... A

rnoderniza~ao

da

Adrninistra~ao

Publica passa por urna

7

revolu~ao

burocratica

Albino Lopes e Carlos Rodrigues ...................... ................................. .. ...

10

0 processo de fusao na Adrninistra~ao Publica Portuguesa: papel central dos lideres interrnedios na concep~ao e cornunica~ao do projecto

Albino Lopes, Damasceno Dias e Pedro Parreira .............................. :....

11

Autonornia financeira e desenvolvirnento sustentavel das Autarquias Portuguesas

Manual Almeida Baptista ........................................................................

11

Economia Portuguesa 0 processo de

regionaliza~ao

portuguesa

Colares Vieira ......................... ....................... .................................... .......

1

Enquadrarnento internacional da econornia portuguesa: as variaveis explicativas do crescirnento econ6rnico

Ant6nio Rebelo de Sousa e Ant6nio Manuel Quintino ..........................

Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, n.Q 11/2010

6

201


fndice Tematico

Da relevancia da componente psicol6gica na evolu<;ao futura da economia portuguesa

Ant6nio Rebelo de Sousa ............ ....... ......... ..... ..................... ........... ........

8

De uma versao actualizada da explica<;ao da evolw;ao da economia Portuguesa

Ant6nio Rebelo de Sousa e Ant6nio Quintino ........................ ................

11

Economia Internacional Os processos integracionistas nas economias asiaticas

Ant6nio Rebelo de Sousa .................................. .......................... .......... ...

1

A medi<;ao da vantagem comparativa

Miguel Coelho ...... ................................. .......................... .........................

1

Exporta<;6es e inova<;ao- uma aplica<;ao ao caso portugues

Augusto Teixeira da Costa ...... .. .. .. .. .. ....... .... ....... .... .. ..... ....... .. .... ... .. ..... ...

1

A industria de constru<;ao e obras publicas: a performance de Portugal face a Uniao Europeia

Luis Palma Ferro ......................................................................................

2/3

Das economias em transi<;ao aos novos desafios da integra<;ao

Ant6nio Rebelo de Sousa .........................................................................

4

Internacionaliza<;ao das empresas: o contexto das PME

Henrique Pimentel Reis ... ... .. ........... ....... ....... ... ............ ...........................

6

Economia do Turismo Motiva<;6es turfsticas dos seniores portugueses no mercado interno: analise multivariada

Manuela Sarmento e Joana Neves ..... .. ................................................ ....

6

0 turismo em Portugal: situa<;ao actual e caminhos de futuro

folio Martins Vieira ..................................................................................

7

Turismo e desenvolvimento local

Maria Teresa da Costa e Rui Lopes dos Reis

202

8

Lusfada. Economia & Empresa, n.Q 11/2010


fndice Tematico, p. 199-208

Observat6rio da produtividade das grandes empresas na economia portuguesa: cluster do turismo 2005-2006

Jose Eduardo Carva.lho ............................................................................

8

Epistemologia e Sociologia das Organiza\6es Econ6micas Educa~ao

e

investiga~ao:

especificidade da ciencia econ6mica

Jose Eduardo Ca.rvalho ............................................................................ Cultura e subculturas: gestao do sistema cultural nas

organiza~6es

Ant6nio Correia Berna.rdo .................................... .................................... A

representa~ao

2/3

2/3

social do dinheiro: algumas perspectivas te6ricas e

empiricas

Vitor Pina. da Costa .................................................................................

2/3

Efemerides: Kaldor e Galbraith (l.Q centenario)

Virgilio Rapaz ......................... .. ........................ .................. ......... ......... ...

8

"Measuring corporate identity: a case study using a corporate personality scale"

Gaura.v Bahirva.ni, Natcflia. Teixeira. e Rui Vinhais da Silva ........... ......

9

Efemeride: Pierre-Joseph Proudon (1809-1865)

Virgilio Rapaz ....... ...................................................................................

Estrah~gia

10

Empresarial

A identidade e a imagem das

organiza~6es

Maria Helena Faveiro .............................................................................. Estrategia empresarial: da

diferencia~ao

2/3

a sobrevivencia

Mdrio Alexa.ndre Antiio ...........................................................................

4

Observat6rio da Produtividade Empresarial

Jose Eduardo Carva.lho .............................................................. ..............

4

Modelos tipicos de gestao nip6nica: perspectivas de desenvolvimento em Portugal

Felipa Lopes dos Reis .............. .......... ......................................................

Lusfada. Economia & Empresa. Lisboa, n.Q11/2010

7

203


fndice Tematico

Observat6rio da produtividade das grandes empresas na economia portuguesa: trienio 2003 I 2005

Jose Edum路do Carvalho .............................................................................

7

Gestao da marca no ambito dos servi<;os: o trabalho temporario

foana Madureira..... .... ... ... .. .... .. ... .. ... .. .. ..... .. .... ... .. ..... .. ... ... .. ...... ... .. .. .... ... ..

9

"Balanced Scorecard" nas Organiza<;6es de Saude: estudo de caso

56nia Carmo Silva e Rui Lopes dos Reis............ ................ .... ............ ....

10

A orienta<;ao estrategica para o baixo custo da avia<;ao comercial

Felipa Reis e Cristina Felix ...... .. .................. .......... .... .............. .... .. .. ...... .

10

0 desenvolvimento do outsourcing, seus fundamentos, riscos e beneficios

Elizabete Fonseca Correia .......... .. .............. ............ .. .. .. .. .. .. .... ................ ...

Inova~iio

11

e Gestiio da Qualidade

Inova<;ao para a sustentabilidade de empresas portuguesas num ambiente limpo

Manuela Sarmento e Manuela Duarte ....................................................

4

"Systeme d'innovation au Portugal: comparasion avec quelques pays de l'Europe Centrale et Orientale"

Ant6nio Teixeira da Costa .......... ........................ .............................. .. .....

5

Os sistemas de gestao da qualidade nas PME's: certifica<;ao e dimensao organizacional

Elisabete Correia e Sara da Silva e Sousa .......... ............ ........................

5

A relevancia da qualidade e da inova<;ao nos servi<;os

Henrique Re is e Luisa Carvalho .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .... .. .. .. .. .. .. .. .

8

Incubadoras de Empresas e o Direito Econ6mico

Giovani Clark e Nizete Araujo ..................................... .............. .... ...... ..

11

Mercados Financeiros Os modelos mistos de avalia<;ao de empresas

Leonor Ferreira e Manuela Sarmento .............. .. ...................... ................

204

5

Lusiada. Economia & Empresa, n. 2 11/2010


fndice Tematico, p. 199-208

A

transposi~ao

de

demonstra~6es

financeiras expressas em moeda

estrangeira

Ricardo Pinheiro ................................................................................... ....

5

do mercado bolsista a informa~ao financeira: evidencia empirica na Euronext Lisboa

Reac~ao

Ant6nio Lourenr;o e Manuela Sarmento .. ..................... ....... .. .............. .... Divulga~ao

de resultados anuais e rendimento de

ac~6es

Ant6nio Lourenr;o e Manuela Sarmento .................................................. Contagia financeiro entre mercados de durante a crise asiatica

ac~6es

7

8

de paises desenvolvidos

Julio Lobiio ........... ......................................................... ......... ......... ..........

9

Mercado de Trabalho e Gestao de Recursos Humanos Economia do trabalho - aspectos conceptuais e instrumentais

Jose Eduardo Carvalho ............................................................................

1

A gestao de recursos humanos e o recrutam ento: "a m ao invisivel" da desqualifica~ao

Jose Casqueiro Jardim .............................................................................. A

satisfa~ao

no emprego: para uma nova abordagem da e da eficacia das organiza~6es

moderniza~ao

Francisco Rocha... ..... ... .. .. ... .. ... .. .. .. .. ... ..... .. .. ... .. .. ... .. .. ... .. .. .. ... .. .. ..... .. .. .. ... .. Gestao dos recursos humanos na performance das empresas: dos resultados sociais e organizacionais

5

media~ao

Vi tor Costa .. .. ... .. .. .. ... ... .. .. ..... .. ... .. .. .. .. ... .. .. ... .. ... .. .. .. ... .. .... ... .. .. .. ... .. .. .. ..... .. Mobilidade do capital intelectual: condicionantes da guesa

5

legisla~ao

6

portu-

Jose Adelino Afonso e Albino Lopes ........................................................

7

A contabilidade do capital humano como urn problema de prioridade

Jose Adelino Afonso .... .. .. ... ... .. .. .. .. ... ......... ..... .. ... .. .. .. ... .. .. .. ... .. .. .. ... .. .. .. .. ... A importancia da gestao de competencias nas

organiza~6es

Joiio Sousa Mendes e Manuela Sarmento ................................................

Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, n. 2 11/2010

8

9

205


fndice Tematico

A lideran<;a e o trabalho em equipa

Jose Carlos Rouco e Manuela Sarmento ..................................................

9

Desempenho academico e adapta<;ao ao ensino superior academico: o caso da Academia Militar Portuguesa

Ant6nio Rosinha e Manuela Sarmento .............. .....................................

10

A importancia do capital intelectual na gestao estrategica das empresas

Manuela Faia Correia e Graciete Honrado .......................................... ...

11

Metodos Quantitativos Dinamica discreta nao linear de popula<;6es isoladas

Ant6nio St' Aubyn e Alexandra Afonso .. .... .............. ...............................

6

Modela<;ao de redes probabilisticas para diagramas de influencia

Ant6nio St' Aubyn e Catarina Venancio .......... ........................................

8

Moeda I Credito I Seguros A zona do franco "CFA", o acordo de coopera<;ao cambial entre Portugal e Cabo Verde eo "Comprehensive Development Framework"

Ant6nio Rebela de Sous a ... ... ... .. ... .. .. .. ... ... .. .. .. ... .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. ... .. .. .. ..

1

A analise do risco eo euro: que futuro em Portugal?

Pedro Frouco Marques .............................................................................

2/3

Seguradoras portuguesas: que futuro?

Manuel Marques Valido .............................. .............................................

2/3

"A regime switching model of risk for the banking system"

Anabela Sergio ................................................. .........................................

4

Uma perspectiva microecon6mica do risco de credito soberano nos paises em vias de desenvolvimento

Mart a Loff de Sous a Men des .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. ... .. .. .. .. .. .. ... .. .. .. .. .. .. .. .. .

4

Linhas estrategicas do sector bancario em Portugal

Ruben Raposo ................ ................ .......... .. ............ ................... ............ ....

206

5

Lusiada. Economia & Empresa, n .Q11/2010


fndice Tematico, p . 199-208

Politica Econ6mica Uma nova politica on;amental

Ant6nio Rebelo de Sousa ...................................... ...................................

1

Reforma on;amental- o caso portugues (breve guiao)

Manuel Teixeira .. .. ... ..... .. ... .. ....... .. ... .. .... ..... ... .. .... .. ... ... .. .. .. ..... .. .. ..... .. .. .. ...

1

A contratualizac;ao em saude: modelos de financiamento

Ricardo Silva Santos ............. .. .................................................................

2/3

Retorno fiscal do investimento publico na educac;ao: caso do ensino secundario

Car/os Sant' Ovaia e Rui Lopes dos Reis ..... ... ..... .. ........ .. ....... .. .. ..... ..... ..

8

0 neoliberalismo de regulac;ao como intervenc;ao do Estado: a regulac;ao e a Constituic;ao Brasileira de 1988

Giovani Clark ... ...................... ...... ... .......................................... ...............

9

Um novo paradigma na teoria econ6mica: a necessidade de repensar a escassez de recursos

Ant6nio Eduardo Martins e Felipa Lopes dos Reis .................... ......... ..

9

0 risco d e ocorrencia de catastrofes naturais em Portugal

Carlos Garrido .......... ................ ....... ....... ............ ......................................

11

As catastrofes: capacidade e vontade de encontrar soluc;6es

Ant6nio Santiago Portela .......................................................... ................

11

As catastrofes: exemplos referenciais

Ant6nio Gouvea Portela ..................................... ............................. .........

11

Do bin6mio Keynes-Schumpeter ao pensamento Galbraithiano

Ant6nio Rebelo de Sousa .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. ... ..

11

A theoretical approach to the political economy of fiscal cyclicality, forecasts and consolidations

Nu no Venes .............................. ......... ........................................................

11

Tecnologias de Informa!_;ao e Comunica\ao A informatica, os sistemas de informac;ao e a economia

Raposo de Lima .. .. .. .. ... .. .. .. .. .. .. .. .......... .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. ... .. ..... .. .. .... .. .

Lusiada. Economia & Empresa. Lisboa, n.Q 11 / 2010

1

207


fndice Tematico

Complexidade do sistema transaccional de gestao: as prescri<;oes medicas corn suporte em rede

Jose Carlos Correia ...................................................................................

7

"Senior eo-housing in rural areas: telemedicine the answer?"

Cristina Caramelo Games e Ana Lott Dare ...... ............................ .. ........

9

A era virtual das tecnologias de informa<;ao e comunica<;ao: arte e expressividade em multimedia

Maria Eduarda Carvalho ................................................. .. ............. ........

9

Componentes do conhecimento em estruturas de dados persistentes: aplica<;ao em sistemas de decisao aut6nomos

Paulo Enes da Silveira ............................ .. .... ..... ............... ............. .........

10

Rastreabilidade Reactiva de Artefactos no Desenvolvimento de Sistemas de Informa<;ao (React-MDD)

Mar eo Costa ........... ..................... ....... ..... .................. ................. ..............

10

Foreign keys and multi-domain indexing

Paulo Pinto e Hongi Yang ...... ....... .............. .. ........ .. .. ............ ..... .. ..........

10

Definition of sort function in relations and its usage in relational database management systems

Paulo Pinto e Hongi Yang ......................................................................

10

Analise de Imagens sem restri<;6es: uma visao geral do processo de classifica<;ao de tumores de pele

Joaquim da Cunha Viana .........................................................................

20

10

Lusiada. Economia & Empresa, n.Q 11/2010



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