Jornal de estudo edição abril 2018

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Jornal de

ESTUD

Foto: Roberta Heuley

Jornal Laboratório da Faculdade de Comunicação da UFJF | Juiz de Fora | Abril de 2018 |

Arquitetura Hostil Espaços públicos denunciam as relações de poder nas cidades p. 4

CIDADE E REGIÃO

POLÍTICA

CIDADE E REGIÃO

Um projeto da Biblioteca Municipal estimula hábito da leitura e transforma crianças em escritores.

Intervenção Militar no RJ respinga em ações da PM na cidade de Juiz de Fora e região.

CGU aponta irregularidades na distribuição de alimentos nas escolas municipais.

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CULTURA

COMPORTAMENTO

Rappers discutem desafios da representatividade feminina no cenário musical juiz-forano.

Mercado de criadores de conteúdo cresce em JF e iniciativas fomentam os profissionais da área.

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Foto: Mateus Aguiar

Foto: Gabriela Reis

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EXPEDIENTE

EDITORIAL

Brasil, um país leitor! Será sonho? Por Pedro Cappeti e Thaís Mendes Uma pesquisa realizada pelo Ibope por encomenda do Instituto Pró-livro, em 2015, revelou que a leitura é um hábito de 56% da população brasileira. Em 2011 a média de leitores era de 50%. No entanto, o sutil crescimento não deve ser comemorado. Em números absolutos, os 44% de não-leitores representam quase 100 milhões de pessoas. São quase cem milhões de pessoas que não leram ao menos um livro nos últimos três meses. Cem milhões que não lêem por falta de incentivo, de estímulo, de tempo e de bibliotecas onde possam ter acesso aos livros sem que haja custos. É nítida a necessidade de se criar, promover e, principalmente, apoiar ideias que incentivam esse hábito. É preciso não deixar morrer as boas iniciativas, tais quais as que deixam livros em lugares estratégicos, como pontos de ônibus, metrôs, táxis, praças que estimulam trocas voluntárias de exemplares. No entanto, a disseminação de projetos assim ficam cada vez mais distantes. O estado deplorável dos alimentos entregues nas instituições de ensino, como mostramos nesta edição na reportagem sobre as

más condições dos alimentos distribuídos nas escolas do município (Pág. 3), exemplificam que prezar pela qualidade estrutural de ensino parece não estar entre as prioridades do Poder Público. Se nem a merenda escolar, essencial para o bom desempenho das crianças em sala de aula, é cuidada com zelo pelas autoridades, quiçá a quantidade de bibliotecas, fundamentais para o fomento da leitura. Mas ainda há esperança. Uma das propostas de incentivo à leitura, que deve ser replicada, é a desenvolvida pela Biblioteca Municipal Murilo Mendes, como apresentamos na reportagem “Pequenos escritores, grandes histórias” (Pág. 5). A iniciativa mostra que sempre há um tempo para a ler e, por ser realizada dentro de uma biblioteca, oferece aos alunos muitas opções de leitura, deixando-os livres para a escolha dos títulos. Como Bartolomeu Campos de Queirós já dizia: “Só um país leitor pode formar leitores”, e esse pequeno crescimento percentual poderia reacender em nós, brasileiros, a esperança de que estamos no caminho certo. Resta saber se há esse interesse.

Jornal Laboratório da Faculdade de Jornalismo da UFJF, produzido pelos alunos da disciplina de Técnica de Produção em Jornalismo Impresso Reitor Profº Dr. Marcus David Vice-Reitora Profª Drª Girlene Alves da Silva Pró-reitora de Graduação Profª. Maria Carmen Simões Cardoso de Melo Pró-reitor adjunto de Graduação Prof. Cassiano Caon Amorim Diretor da Faculdade de Comunicação Social Prof. Dr. Jorge Carlos Felz Ferreira Vice-Diretora Profª. Drª. Marise Pimentel Mendes

ARTIGO

Coordenador do Curso de Jornalismo Noturno Profª Ms. Eduardo Leão

No olho do furacão Por Nathália Iwasawa Em intervalos de tempo muito bem marcados pelo reloginho da disputa de interesses, presenciamos mudanças políticas significativas acontecendo no Brasil e no mundo. Mudanças essas que podem passar quase imperceptíveis se você for um espectador desatento, ou se ligar para política apenas a cada quatro anos, quando, no nosso caso, temos eleições para o sistema presidencial. Acontece, caro leitor e leitora, que as articulações políticas estão intrinsecamente ligadas ao nosso quotidiano, à maneira como vivemos, nos movemos, nos alimentamos e somos vistos pela gente de fora do Brasil - que, inclusive, parecem enxergar mais que nós mesmos. Na noite de 7 de abril, a prisão do ex-presidente Lula se consumou num cenário de completa desordem do estado democrático de direito que vivemos hoje no país. Ela representa uma disputa acirrada de poder entre os partidos de maior expressão, que lutam com unhas e dentes pela manutenção de ideologias firmadas sob o capital monetário internacional, ou seja, os grandões precisam se sustentar dentro do Congresso Nacional e tirar quem representa perigo à continuidade de um projeto que anda em trilhos cada vez mais neoliberais que vai em direção da classe trabalhadora e dos direitos fundamentais da população. Esse trem já deu partida e vai passar por cima de muita gente. O juiz federal Sérgio Moro chegou a surpreender a defesa expedindo o mandado de prisão um dia depois de negar o pedido de Habeas Corpus e não houve tempo para recorrer a uma decisão liminar favorável após a segunda

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instância. Até a própria Polícia Federal não deu conta de atuar exatamente como previu o judiciário. No frigir dos ovos, Lula foi alvo das mídias - massivas ou não - por mais de 24 horas, sendo vigiado por militantes de organizações ligadas à bandeira do PT e por todo o Brasil, dentro de um circo que virou a política nesse país de meu Deus. É importante nesse momento, buscar um pouco de clareza quanto aos últimos movimentos do STF. Estamos em um ano eleitoral no qual o nome de Lula é o mais popular até então. É muito interessante tirar o cavalo - tão flexível e poderoso - desse jogo de xadrez. A esquerda revolucionária agradece se o petista não entrar no pleito, mas precisamos entender que essa prisão significa um ataque aos princípios que um dia guiou o PT e que hoje, é luta de muitos movimentos sociais. É um ataque ao que consideramos como democracia. O STF foi comprado indubitavelmente pela hegemonia da mídia que anda de acordo com os acontecimentos do Palácio do Planalto. Precisamos, urgentemente, pensar em novos modelos para uma velha prática sem cair na linha de arremedo, ou análises superadas pelo tempo. A ideia arcaica de que religião, futebol e política não se discutem, certamente foi inventada por preguiçosos de um debate informal, de boteco ou de varanda, assim como quem falou que “em briga de marido e mulher não se mete a colher”. Um disparate. Esses tabus precisam ser quebrados porque a todo minuto que se omite uma discussão, estamos nos furtando da construção de uma sociedade livre e plural.

Chefe do Departamento deMétodos Aplicados e TécnicasLaboratoriais Prof. Dr. Cristiano Rodrigues Professora Orientadora Profª. Drª. Telma Johnson Monitoria Júlia Coêlho Repórteres Camila Monteiro de Castro, Douglas Ribeiro Gabriela Reis Ighor do Prado Isabella Peçanha Júlia Coêlho Lara Morais Mirella Polato, Nathália Iwasawa Pedro Capetti Roberta Heluey Thaís Pífano Victória Tabet Wemerson Macanha Edição e Diagramação Júlia Coêlho Wemerson Macanha Endereço Rua José Lourenço Kelmer, s/n, Campus Universitário - Bairro São Pedro 36036-900 Contato mergulhodiario@gmail.com


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CGU aponta irregularidades em distribuição de alimentos nas escolas municipais Auditoria feita em quatro colégios, no fim de 2017, revelou que alimentos da merenda são entregues em condições impróprias para consumo. Prefeitura afirma que problema foi solucionado Por Pedro Capetti Uma comissão de fiscalização da Controladoria Geral da União (CGU) instituída para averiguar o uso dos recursos do Programa Nacional de Alimentação nas Escolas (Pnae) da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) constatou que os alimentos perecíveis distribuídos nas escolas e creches do município estariam sendo apresentados em estado de deterioração, sem qualidade para o consumo. A situação foi comprovada em visitas feitas por técnicos da CGU, entre outubro e novembro de 2017, em quatro escolas da cidade, nas quais foram realizadas vistorias e entrevistas com as merendeiras e diretoras das instituições. Na ocasião, profissionais teriam alegado que aceitam alimentos nas condições que são entregues, para não ter que devolver todo o quantitativo distribuído, caso a escola opte por não recebê-los. O problema estaria levando profissionais das escolas a separem alimentos aptos para o consumo, gerando redução do quantitativo entregue e pago por contrato. A situação é agravada com a constatação da Controladoria que não há glosas das notas fiscais na entrega dos gêneros alimentícios. Em uma das escolas, por exemplo, não há balança para aferição do material distribuído. As imagens obtidas no relatório mostram a situação dos alimentos, como cebolas e batatas. Em mais de um colégio, alimentos perecíveis se apresentam com baixa qualidade e, em alguns dos casos, estragados. Em uma das instituições avaliadas, profissionais são obrigados a alterar totalmente o cardápio elaborado pela nutricionista, o que contraria o propósito do programa. Em contato com pessoas ligadas a dois dos quatro colégios avaliados, a reportagem confirmou os fatos relatados em relatórios da CGU. No entanto, os funcionários ressaltaram que a qualidade dos alimentos melhorou após a fiscalização. A diretora de uma das escolas, que pediu para não ser identificada, confirmou a informação e visita de técnicos do órgão controlador: “Na época foi isso realmente que aconteceu, ainda mais no mês que eles vieram, mas hoje melhorou consideravelmente. Ainda precisamos que aumente a quantidade [de alimentos], mas melhorou muito”, afirma. Questionado sobre a devolução de alimentos estragados, o diretor da Escola Municipal Cosete de Alencar, Mauro César Fávero, informou que, apesar de ter assumido o cargo diretivo no último dia 2 de abril, ainda não teve problemas com relação a entrega dos alimentos. “O material está chegando regular, com muitas hortaliças e muitas frutas. Não estou tendo problemas com a quantidade de ali-

Problemas foram solucionados, segundo PJF

Relatório de fiscalização mostra a situação dos alimentos na Escola Municipal Padre Caetano, no povoado de Monte Verde, na Zona Rural. Cebolas e Batatas em condições impróprias para consumo

Outras irregularidades também foram constadadas pela Controladoria mentos, não está faltando”, afirma. O documento público aponta para outras falhas no uso dos mais de R$ 3.123.814,96 do Pnae, como não cumprimento do mínimo de 30% dos recursos transferidos na aquisição de gêneros advindos da agricultura familiar. Segundo a legislação federal, a Prefeitura deveria investir esse percentual do valor repassado exclusivamente em produtos da agricultura familiar. No entanto, deste valor, apenas R$ 432.292,84 foi celebrado, em contrato para fornecimento de 14.429 quilogramas de mel de abelha, o que corresponde a 13,8% do valor total do repasse federal. O produto é o único oriundo da agricultura familiar presente na merenda escolar dos estudantes, já que a Lei Municipal nº 12.059/2010 tornou obrigatória a inclusão de mel de abelha na comple-

mentação da merenda escolar, das escolas públicas municipal. Na visão dos auditores, o relatório aponta que não foi demonstrado o interesse do município em ampliar a diversidade dos produtos, por meio de chamadas públicas a outros produtores rurais. Além disso, a fiscalização apontou a inexistência de testes de aceitabilidade do mel de abelha pelos alunos. Em resposta à CGU, o executivo municipal ressaltou que não há descumprimento por falta de interesse da administração pública, mas por incapacidade dos produtores familiares de suprir a demanda existente. Segundo a PJF, a produção de alimentos orgânicos é dividida com os outros equipamentos da cidade, como mercados livres, grandes mercados, quitandas e 19 feiras livres “onde o produtor obtém maior vantagem financeira, pois entrega seus produtos e recebe à vista”.

Em nota, a Secretaria de Agropecuária e Abastecimento (SAA) informou que atualmente não há registros de falta de merenda em nenhuma unidade escolar do município. Sobre a questão da falta das glosas nas notas fiscais, a pasta afirmou que o problema foi devidamente sanado. Questionada sobre o não cumprimento da exigência dos 30% da agricultura familiar, a pasta reafirma que compra toda a produção de agricultura familiar atualmente disponível e legalizada para venda ao setor público. “O não cumprimento dos percentuais está diretamente ligado à falta de oferta, e isso está sendo trabalhado no sentido de se incentivar os pequenos produtores a trabalharem em sistema de cooperação”, ressalta a nota. A pasta reitera que vem fazendo esforços para fomentar a agricultura familiar, mas que a efetividade da medida “depende exclusivamente da vontade dos produtores, que muitas vezes alegam que vender seus produtos de forma individual é mais rentável e com recebimento à vista”. Atualmente, de acordo com a Secretaria, apenas a Cooperativa Regional De Produtores, Trabalhadores Rurais Da Economia Familiar (Coopefar) está devidamente legalizada para vendas de produtos para merenda, e que a variedade de produtos adquiridos pode aumentar. “À medida que novas associações ou produtores devidamente credenciados possam vender para a Prefeitura, a tendência é se reduzir gradativamente o quantitativo de compra de mel”. A SAA informou também que dois novos nutricionistas foram contratados e já se encontram trabalhando e cumprindo as normas para a execução do Pnae. Além desses profissionais, a pasta afirma ter outros três trabalhando exclusivamente no controle e avaliação da merenda. LEIA O DOCUMENTO COMPLETO

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2018 abril

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CIDADE E REGIÃO

A quem pertence a cidade?

Como a “arquitetura hostil” vem redefinindo o uso dos espaços públicos

Barras de ferro da janela do Centro Cultural Bernardo Mascarelhas é um dos exempos era algo que destruía e nem depredava. Gostávamos de ir para pular, tem uma altura boa que dá para fazer umas manobras mais simples, mas agora eles colocaram grades e não dá mais nem para passar. Em Juiz de Fora parece que isso é até uma cultura. A Avenida Rio Branco tem vários pontos com grades; antes elas pontiagudas e agora elas são curvas para evitar que as pessoas pulem”, acrescenta Wellington. Esse tipo de arquitetura divide algumas opiniões. Existem pessoas que defendem que essa interferência no espaço público ocorre em consequência do alto índice de vandalismo, violência e degradação de alguns lugares. Para o arquiteto Emmanuel Pedroso, realmente existem casos que os espaços utilizados sofrem depredações sendo em alguns momentos até destruídos. “No nosso país a gente deve se perguntar se tais episódios estão relacionados tão somente ao uso por determinados grupos ou se eles são reflexo de uma situação mais ampla, referente ao entendimento que grande parte da população ainda possui de que o espaço público ainda não é dela”. Pedroso acrescenta a importância de que, paralelo a ações de inclusão social, haja um processo de conscientização acerca da importância do espaço público, sobretudo pelos governantes, para que a população tome consciência e identificação com os espaços que utilizam. Para o sociólogo Gustavo Pacceli, essa arquitetura pode ser um reflexo da violência, já que é a forma imediata que alguns setores criaram para lidar com essa questão. “A violência deve ser combatida com políticas públicas de inclusão, de acesso à saúde, à educação. As pessoas encontram nessas construções uma maneira rápida de tentar resolver um problema que é de ordem estrutural, mas a maneira encontrada não é eficaz e tampouco certa”. Dentre as várias áreas de conhecimento que analisam essa relação sociedade-cidade, a Sociologia estuda o impacto da vida moderna dentro das cidades, principalmente os fenômenos de inclusão e exclusão, as formas de ocupação dos espaços, os direitos à cidade e as relações de poder de determinados grupos dentro dos centros urbanos, expressas principalmente, na arquitetura. Para o sociólogo Gustavo Paccelli, o pri-

meiro ponto para entender esse aspecto da arquitetura hostil é entender as relações de poder. “É necessário perceber a forma como é distribuído o espaço dentro das cidades. Nessa panorama conseguimos observar tanto no caráter estético da arquitetura, quanto na ocupação e locação de pessoas dentro

fenômeno recente que vem acontecendo ao longo dos últimos 20 anos, que é o processo de gentrificação, ou seja, bairros que antes eram não vistos pela sociedade como rentáveis, passam a sofrer uma transformação espacial, uma gourmetização, que valoriza o local e afeta os moradores de baixa renda. É o caso da cracolândia em São Paulo. Um exemplo clássico da cidade de Juiz de Fora é a chamada Curva do Lacet. O espaço antes era um campo de futebol, sendo usado constantemente como área de lazer da comunidade do bairro Dom Bosco. Após construção do Shopping Independência, o local que tem mais de 2.000 metros quadrados se tornou apenas ponto de passagem. Já aconteceram vários protestos dos estudantes de Arquitetura e Geografia da UFJF e até audiências na Câmara para tentar solucionar essa demanda dos moradores, mas até o momento nenhum outro lugar de lazer foi construído para a população. Para tentar minimizar esse tipo de problema e criar um urbanismo inclusivo para todos, arquitetos conceberam a noção de Gentileza Urbana. O termo incentiva a criação de espaços que favoreçam as trocas pessoais e principalmente que enalteçam o sentimento de pertencimento em relação à cidade. O Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) criou o prêmio IAB de Gentileza Foto: Roberta Heluey

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Foto: Roberta Heluey

Por Roberta Heluey As cidades surgiram com o propósito de fixação de uma determinada sociedade em um espaço. A ocupação e a necessidade de organização dos lugares resultou em distribuições desiguais de propriedades. Com o intuito de amenizar os problemas gerados a partir dessas divisões e por conta do rápido processo de urbanização brasileiro, a Constituição Federal de 1988 contém leis específicas a respeito do direito à cidade. É assegurado a todos os cidadãos o acesso a espaços públicos democráticos e a mobilidade urbana de qualidade, mas será que na prática isso realmente funciona? O termo “Arquitetura Hostil” foi cunhado recentemente pelo repórter britânico Ben Quinn, do The Guardian, e se refere a elementos existentes nos espaços urbanos que inibem sua utilização por indivíduos considerados para alguns, como indesejáveis, como por exemplo, pessoas em situação de rua, skatistas, casal de namorados etc. De acordo com o arquiteto e professor da UFJF, Emmanuel Pedroso, o termo serve para denunciar as barreiras existentes entre os espaços públicos e privados. Pedroso observa que o espaço público pertence a todos. “Nós devemos zelar por ele. O espaço possui um papel fundamental na identificação e no afeto de uma população por sua cidade. O elo, uma vez consolidado, constitui uma base para a existência de respeito, zelo, cuidado e preservação do espaço urbano por todos. Dessa forma, a maneira como é tratado acaba por denunciar o estado desse vínculo entre população e cidade”. Os elementos espaciais que caracterizam a “arquitetura hostil” abrangem pedras pontiagudas, bancos públicos com separações, armações de ferro e grades de variados estilos. Eles constituem uma barreira prejudicando a relação com a cidade ao impossibilitar o uso e apropriação desses locais por todas as pessoas. Ao mesmo tempo, ilustram e ratificam a separação entre público e privado. Em 2014, época em que o jornalista Ben Quinn inventou o termo “arquitetura hostil”, skatistas de Londres estavam indignados com a ampliação do uso de espetos em locais onde praticavam o esporte. Assim, eles criaram uma petição online e reuniram mais de 100 mil assinaturas em prol da remoção desses aparatos de exclusão. O prefeito da época, Boris Johnson aderiu à manifestação e autorizou a retirada do material. O skatista Wellington de Oliveira Gomes, conhecido como Mosley, pratica o esporte há 19 anos, denuncia esse tipo de arquitetura em alguns lugares da cidade. “Em Juiz de Fora é mais comum o uso de grades. Tem um estabelecimento na Avenida Olegário Maciel que agora está todo gradeado. Antes os skatistas usavam muito porque as rampas do lugar chamavam atenção, o estilo da parede, as bordas que eram boas de escorregar. Agora, os moradores optaram por gradear. Acho que eles perdem mais do que os skatistas. De toda forma, fica um ambiente hostil como diz o cantor Falcão do Rappa: As grades do condomínio são para trazer proteção, mas também trazem a dúvida se é você que está nessa prisão. E eu vejo como uma prisão, isso me incomoda”. Outro local modificado por grades foi em frente ao bar Procopão, no bairro Mariano Procópio. “A gente sempre andou de skate ali, era só para pular pra rua, não

Na Rua Santo Antônio, espetos de ferros impedem pessoas de sentarem na porta de garagem

desse espaço. Prédios imponentes [indicam] uma arquitetura mais incisiva para causar um determinado sentimento de pequenez humana, criando espaço de exclusão”. O direito à cidade, que é algo assegurado na legislação, passa a ser renegado a algumas classes sociais, como pessoas em situação de rua. A criação de mecanismos não permitem que essas pessoas ocupem determinados espaços, o que é exemplificado por grades, cacos de vidros embaixo de viadutos, espetos de metal nas beiradas de lojas - tudo com o intuito de reforçar essa relação de poder e fazer com que essas pessoas não gerem infortúnio. Paccelli observa que a cidade é um espaço de consumo amplo, então é necessário garantir que esses percalços não prejudiquem a relação com o comércio. Muitas lojas lançam mão da “arquitetura hostil” para evitar o desconforto de potenciais consumidores. O sociólogo chama atenção para um

Urbana, em 1993, para estimular iniciativas que contribuem para a melhoria da vida urbana. “A ideia consiste em premiar e valorizar os pequenos atos, as pequenas atitudes dos cidadãos que colaboram para deixar a vida nas cidades cada dia melhor. São atitudes, gestos, intervenções que propiciem um novo olhar sobre a cidade, promovendo a preservação do seu patrimônio cultural e natural e ampliando o conceito de cidadania”, de acordo com o website da instituição. O direito à cidade não é para ser compreendido como um direito individual. Os espaços urbanos devem ser utilizados por todos como local de interação e troca social. A inclusão e efetivação de políticas públicas para garantir o que é direito se faz cada vez mais necessária em um momento em que convivemos diariamente por espaços excludentes e limitados. O direito à cidade é para todos e deve ser assegurado a todas as pessoas.


CIDADE E REGIÃO

2018 abril

Pequenos escritores, grandes histórias

Foto: Gil Velloso/fFunalfa

Projeto de incentivo à leitura, “Escola de Escritores”, muda rotina de crianças

Alunos do projeto autografam seus livros na noite de lançamento do livro “Escola de Escritores - Antologia II”

“Um país se faz com homens e livros”. A frase é de Monteiro Lobato, talvez dita em princípios do século XX. A leitura, desde seu surgimento, tem papel fundamental na formação de uma sociedade. Os livros carregam histórias de erros que não devem ser repetidos; contam as conquistas de heróis lendários, heróis reais que, com seus feitos nobres, salvaram nações; ou até vilões que convenceram povos a destruírem seus semelhantes. Narrativas felizes, tristes, assustadoras e desbravadoras de mentes. Cada qual com sua importância, gerando transformações e aguçando a curiosidade de leitores e leitoras. É nessa pegada e sob a inspiração de José Bento Renato Monteiro Lobato que a criadora e coordenadora Margareth Marinho, através do Projeto Escola de Escritores, conquista e mantém os novos leitores. Novos sim, pois o projeto atende crianças com idade entre seis e 12 anos. Vai da alfabetização até a fidelização do leitor. Tudo começou em 2014. Uma turma, uma vez por semana, 12 alunos nem sempre presentes. A proposta inicial era realizar uma “Oficina de incentivo à leitura”, algo que duraria pouco mais de quatro meses. E lá se vão quatro anos de projeto permanente de estímulo à leitura. Hoje, a Escola de Escritores tem quase 70 alunos, divididos em quatro turmas ao longo da semana. Para Juliana Mattos, de 11 anos, que participa desde 2015, os livros e o projeto a ensinaram a fazer coisas melhores, como texto, poesia, prosa. “Com a Escola de Escritores eu aprendi a melhorar não só no português ou na escrita, mas em muitas outras matérias. Comecei a melhorar no colégio e na minha vida inteira. A escola de Escritores fez parte da minha vida, me ajudou”, afirma. Iracema Reis, mãe de Juliana, diz que sempre estimulou a filha no quesito leitura, mas havia ainda a barreira da timidez a ser rompida, por isso afirma que as atividades desenvolvidas no projeto transformaram Juliana em outra criança. “Meu esposo e eu

aplaudimos e apoiamos a Escola de Escritores de pé pelo magnífico trabalho de incentivo à leitura e escrita que fez uma transformação total em nossas vidas. Nossa filha, hoje, lê e escreve muito. É raro encontrar um erro ortográfico, graças ao excepcional trabalho estimulante e lúdico desenvolvido pela Margareth e sua equipe”, destaca Iracema. A Escola de Escritores desenvolve papel fundamental ao incentivar e mostrar que sempre há um tempo para a leitura, deixar para a livre escolha do aluno o que ler e, por ser desenvolvida dentro de uma biblioteca, apresenta para as crianças um mundo de opções gratuitas ao alcance de todas elas. A diretora da Biblioteca Municipal Murilo Mendes, Gerda Machado, destaca o valor do projeto e a forma como a professora Margareth trabalha a leitura: “Projeto riquíssimo em que as crianças têm contato com diversos segmentos da literatura e, de forma lúdica, os alunos são motivados a se interessar pela leitura. Datas históricas, eventos do cotidiano, entre outras estratégias utilizadas fazem com que as crianças, além de adquirir conhecimento,

Uma pesquisa realizada em 2015 pelo Ibope por encomenda do Instituto Pró-livro indicou um ligeiro aumento no número de leitores no Brasil: em 2011, 50% da população era considerada leitora. Na última pesquisa, o percentual subiu para 56%. Apesar disso, se adotarmos um outro ponto de vista, a população não-leitora brasileira representa 44%, o que, em números reais, quer dizer quase 100 milhões de pessoas que não leem. A pesquisa considerou leitor quem leu, inteiro ou não, pelo menos um livro nos últimos três meses. Já o não leitor é aquele que declarou não ter lido nenhum livro nos últimos três meses. Ainda de acordo com a pesquisa, a maior parte das pessoas não leitoras argumenta falta de incentivo, de tempo e de bibliotecas próximas para o empréstimo de livros.

levem para casa lições de cidadania também”. Danielle dos Santos é mãe do Igor. Ele entrou no projeto no ano de 2017 e para ela as mudanças, não só nos hábitos de leitura, como na forma de se expressar, de escrever e até de socializar, mudaram: “Esse é o segundo ano que meu filho participa do projeto Escola de Escritores. Notei nele uma grande mudança em relação à escrita e à leitura. O interesse em pegar livros para ler também aumentou bastante. É um projeto maravilhoso que ele adora. Com isso meu filho, que era uma criança bem tímida e retraída, está muito mais solto”.

Projeto premiado Em 2017 o projeto Escola de Escritores foi classificado no Prêmio IPL - Retratos da Leitura, pelo Instituto Pró-Livro, como uma das 10 melhores iniciativas brasileiras de fomento à leitura, na categoria “Biblioteca”. O patrono da premiação foi Maurício de Sousa, que entregou o selo de finalista nas mãos de Margareth Marinho. A educadora fala do gosto pela leitura e do papel da escola na formação de leitores: “Se a criança gostar de ler, ela vai se tornar

um leitor. Geralmente a gente não consegue gostar de ler só na escola regular. A escola ensina a ler, mas não forma leitores. Então é isso que precisa: você trabalhar com as histórias com ludicidade. Isso faz a criança gostar, imaginar essas histórias e querer estar dentro dela, querer escrever e falar com o autor”. Quanto à mensagem que deseja passar para a sociedade ao desenvolver esse tipo de atividade, a professora deixa seu recado: “O gosto e o prazer de ler. Fazer com que todo mundo quando abrir a boca sinta o hálito da leitura -- quem falava isso era Bartolomeu Campos de Queiróz, que o leitor tem o hálito da leitura. A pessoa que lê realmente tem esse hálito. Você sabe quando ela abre a boca, na rodinha de amigos ou em qualquer lugar, a gente consegue detectar quem é leitor e quem não é”. Ao longo desses quatro anos, mais de 300 crianças já passaram pelo projeto. Em 2016 e 2017 três livros foram lançados: Escola de Escritores - Antologia I e II e Os Monstros dos Nossos Medos. Os volumes, que contêm um texto de cada aluno, reforçam mais uma vez a ideia de Monteiro de que “quem escreve um livro cria um castelo, quem o lê mora nele”. Foto: Gil Velloso/Funalfa

Por Thaís Mendes

Juliana Mattos em processo criativo

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CIDADE E REGIÃO

2018 abril

Verba enviada pelo MEC não será suficiente e UFJF pagará as contas de 2018 com verba de arrecadação própria A previsão é de contas apertadas. MEC liberará R$ 69 milhões, enquanto os custos da universidade chegam a R$ 102 milhões Custeio x Capital Para onde vai esse dinheiro? Custeio Programas acadêmicos, Ampliação da Manutenção do Campus, Bolsas, Aporte às Unidades Acadêmicas. Capital Obras, Reformas, Aquisição de equipamentos para as unidades e para os laboratórios de pesquisa, Infraestrutura/Energia Contando moedas para pagar as contas

Foto: Douglas Ribeiro

O ano de 2017 foi complicado para a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). A verba vinda do Ministério da Educação (MEC) foi liberada gradualmente e só chegou à totalidade de R$ 66 milhões, que representava 65% dos R$102 milhões necessários para a universidade funcionar sem ter nenhuma de suas atividades afetadas. O montante restante foi conseguido através de lutas da atual gestão para conseguir uma liberação do MEC de uma verba de R$ 20 milhões da receita própria da universidade e também a utilização de R$ 25 milhões do superávit do ano de 2016. No dia 20 de abril, o reitor Marcus David, acompanhado da vice-reitora, Girlene Alves, e do pró-reitor de Planejamento, Orçamento e Finanças (Proplan), Eduardo Condé, apresentou um balanço da gestão de 2016/2017 e o planejamento de 2018 e 2019. O encontro aconteceu no anfiteatro do Instituto de Ciências Humanas, sendo transmitido ao vivo na internet pela UFJF . No local, puderam comparecer membros do Conselho Superior e dos conselhos setoriais, diretoras e coordenadores de unidades administrativas, chefes de departamentos, chefes das secretarias das unidades acadêmicas e das unidades administrativas, direções da Associação de Professores de Ensino Superior de Juiz de Fora (Apes), do Sindicato dos Trabalhadores Técnico-Administrativos das Instituições Federais de Ensino do Município de Juiz de Fora (Sintufejuf) e do Diretório Central dos Estudantes (DCE), além de discentes representantes dos Centros e Diretórios Acadêmicos. No encontro, antes do reitor apresentar os dados, Condé contextualizou a situação financeira da universidade frente à conjuntura política atual. Segundo ele, desde 2015 os repasses financeiros do governo para as universidades têm declinado, e após a PEC55 - agora Emenda Constitucional 95 - que congela o teto de gastos na saúde e educação, o cenário é muito preocupante. A verba que chega para a universidade já não é suficiente e, no longo prazo, essas medidas se mostram inviáveis. “Pelas conversas que tivemos em Brasília pudemos perceber que o MEC não tem a menor ideia de como vai lidar com a EC95”, afirma Condé. De acordo com a emenda, o valor atual de R$ 69 milhões, enviado pelo MEC, av partir de 2018 será sempre o mesmo, ajustado somente com o valor da inflação - que fica entre 2 e 3% ao ano. Apesar disso o custo da universidade tem crescido. Houve um aumento no gastos

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Foto: Douglas Ribeiro

Por Douglas Ribeiro

Pró-reitor de Planejamento, reitor e vice dão entrevista coletiva para explicar orçamento da UFJF

dos terceirizados, na faixa de R$ 1,5 milhão. O de R$ 340 para R$ 370, e no ano que vem setor de segurança e os motoristas receberam passarão para R$ 400. Esse reajuste represenum reajuste que estava em atraso. Os funcio- ta também um aumento no custeio anual da nários de limpeza passaram UFJF de quase R$ 2 milhões “Pelas conversas a receber insalubridade. O em 2018, e mais R$ 1,5 miPrograma de Apoio à Qua- que tivemos em Brasí- lhão em 2019. lificação (Proquali) também Segundo o reitor Marcus receberá pouco mais que o lia pudemos perceber David, a Associação Naciodobro da verba de 2018 para que o MEC não tem a nal dos Dirigentes das Inssuprir a defasagem de 2016, tituições Federais de Ensino onde o programa só funcio- menor noção de como Superior (Andifes) havia nou até o meio do ano. vai lidar com a EC95” prometido um aumento no Na reunião, foi anunciaorçamento baseado na curva Eduardo Condé do também o aumento dos de crescimento das universisubsídios das bolsas de Treidades - ampliação de vagas e namento Profissional (TP), Iniciação Científi- criação de cursos novos -, o que não está sendo ca e Monitoria que, em 2018, serão reajustadas cumprido.

Fonte: UFJF

A UFJF está entre as universidades brasileiras que mais têm verba de arrecadação própria, cerca de R$ 20 milhões por ano. O dinheiro vem de projetos desenvolvidos na universidade, da taxa do Restaurante Universitário, da locação de imóveis, como agências bancárias e cantinas, taxas do Sisu, entre outros. Essa receita, somada à liberação de R$ 17 milhões, que eram créditos retidos no MEC desde 2015, permitirá que as contas de 2018 e 2019 sejam mantidas em equilíbrio e que se termine o ano sem déficit. Um cenário atípico se comparado às outras universidades brasileiras. A Universidade de Brasília (UnB), por exemplo, já divulgou que poderá fechar em agosto deste ano. Durante apresentação, o reitor disse ser necessária a mobilização de toda a comunidade para se repassar, juntos, os objetivos da universidade. A estudante de bacharelado interdisciplinar de Ciências Humanas e representante do DCE, Ana Emília Carvalho, disse que “o MEC está forçando as universidades a conseguir fontes de arrecadação própria para se manter funcionando. Não é uma política que o DCE concorde, porque acreditamos que a universidade tem que ser financiada pelo dinheiro público”. Mas, no momento, é a única saída para a universidade se manter nos próximos dois anos. “Depois de 2020 não sabemos como vai ser o quadro da universidade, continuando esse cenário de arrocho com a PEC55/EC95 as coisas podem piorar muito”.

Obras e investimentos Serão investidos R$ 33 milhões, divididos entre 2018 e 2019. O Campus de Governador Valadares (GV) ficará com pouco mais de R$ 3 milhões, 10% do valor, por também ter um décimo dos estudantes que existem em Juiz de Fora. Dos R$ 30 milhões do campus JF, R$ 20 milhões serão destinados para gastos com Capital (ver box) e R$ 10 milhões para Custeio. O caso HU está longe de terminar. Existem ações ajuizadas e a obra do Hospital Universitário está sendo acompanhada pelo Ministério Público Federal (MPF) e o Tribunal de Contas da União (TCU). Apesar disso a Pró-Reitoria de Infraestrutura trabalha para que algumas das obras no local sejam retomadas até o meio do ano. O Campus GV também passa por complicações judiciais e aguarda ação fiscal da Controladoria Geral da União para a re. O Campus poderá ter prédios adquiridos. Os prédios atuais são alugados por R$ 7 milhões ao ano.


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CIDADE E REGIÃO

2018 abril

Intervenção Militar no Rio de Janeiro gera ações da PM em Minas

O decreto assinado por Michel Temer vem para mediar, mais uma vez, uma disputa de classes espetacularizada pela roupagem de guerra às drogas Por Nathália Iwasawa Neves

ção de praças - os aprendizes do sistema. Para Tatiana Lima, o que acontece, basicamente, é a criação da cultura do medo estabelecida a partir do caos político e da desordem do estado democrático de direitos com o respaldo da grande mídia. “O que foi diferente das ocupações das UPP’s é que a intervenção foi armada a partir da disputa do discurso e das alegorias. Foi muito forte o uso da produção de imagens que foram ao ar em horário nobre. Você tá em casa e assiste aquelas imagens do exército, da polícia dentro da favela, - lugar que sempre te venderam como perigoso - chegando e tendo um certo controle, você cria, de fato, uma sensação de segurança na população”. E os nomes de altos cargos do Exército, coronéis que datam da Ditadura Militar de 1964, ressurgem em momentos de crise, em que o estado de exceção alarma por todos os setores da vida pública.

minado de ação em que ele deve fazer abordagem nas pessoas que estão entrando no nosso estado”, completa. Existe, ainda, uma ação suplementar dos batalhões para reforçar o policiamento nas cidades menores como Rio Preto e Simão Pereira. No caso de Juiz de Fora, o 27º Batalhão é responsável por monitorar mais 13 cidades da região e quando necessário, “engrossar o caldo” enviando mais efetivos para as cidades mais vulneráveis. Numa terceira fase, a PM realiza ações simultâneas nas 25 cidades, em um mesmo horário previamente estabelecido. Segundo dados da PM, na primeira fase, 38 operações foram deflagradas. Foram 1.806 veículos abordados, 2.843 pessoas vistoriadas, o que resultou na prisão de cinco pessoas. Toda a operação é bem estrutura em conjunto com a Polícia Rodoviária Federal (PRF) e Polícia Civil (PC). O Major Jovânio Campos alerta para um campo de ação estratégica e intelectual que normalmente não se aplica à PM, o que firma o compromisso de serventia às ordens governamentais. “A polícia militar não é só ação ostensiva de policial fardado na rua. A gente tem também o núcleo de inteligência, que não se confunde com a investigação criminal (responsabilidade da PC), mas um núcleo de inteligência de segurança pública, que é a troca de informações entre as agências”. A questão da segurança pública anseia solucionar a crise do capital através do combate da violência nas favelas a qualquer custo para que ela não chegue até o asfalto. Em 31 de março de 1964, 6 mil homens do exército foram enviados, a mando do general Olímpio Mourão Filho, comandante da 4ª Região de Juiz de Fora, rumo à capital fluminense. Era a realização das insatisfações que cresciam nos quartéis em uma ação concreta para destituir o então presidente João Goulart. A marcha foi apoiada por políticos e empresários influentes em Minas Gerais, que criticavam a suposta ligação de “Jango” com ideais comunistas. Nesse contexto de proximidade com o Rio de Janeiro, onde hoje, a intervenção é realidade, há consequências que se esbarram em Juiz de Fora, genitora do golpe em 1964. Foto: Hector Santos

Foto: Divulgação/PMl

A Intervenção Militar no Rio de Janeiro é uma continuidade ostensiva do programa de Unidades de Polícia Pacificadora (UPP’s) que começou em 2008, na favela Santa Marta no estado do Rio de Janeiro. Para Tatiana Lima, professora, especialista em UPP’s e segurança pública da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), o programa acelera um mercado militar, uma indústria de armamento. “O novo urbanismo, baseado na militarização, vai transformando os espaços das cidades. Temos desde a questão da iluminação pública ao aumento da necessidade de guardas. Mas, com o aumento do policiamento, cria-se a necessidade de armamentos. A demanda de segurança pública, vem junto com Operação Migro na fronteira entre Rio e Minas a demanda do capital, tanto em questões de Hoje, vivemos esse estado de calamidade, calamitoso e frágil da história, tomando as réconsumo e venda de produto ligados à esse e o que vem por aí, boa coisa não pode ser. deas para garantir a ordem e o cumprimento mercado como a categorização dos espaços”. das leis, essa instituição ideologicamente auSegundo o relatório final da Comissão O futuro repetindo o passado toritária vem para instaurar um tipo de obscuParlamentar de Inquérito (CPI) “Assassinaridade arbitrária que atinge, necessariamente, tos de jovens”, divulgado em 2016, 77% das Em 16 de janeiro deste ano, o Congresso a favela. mortes nas favelas no Brasil são de meninos Nacional aprovou um decreOperação Migro negros e pobres. O relatóto assinado pelo então presirio de 155 páginas, aponta “A demanda de segurandente Michel Temer (PMDB) A Constituição Federal prevê como resque de fato, o Brasil é o ça pública, vem junto que determina a intervenção ponsabilidade da PM a manutenção da ordem país com maior número com a demanda do capi- militar no Estado do Rio de pública, isto é, a instituição deve evitar qualde homicídios do mundo tal, tanto em questões Janeiro, deixando nas mãos quer perturbação que altere a regularidade e que sua polícia também é a que mais mata. A CPI de consumo e venda de das Forças Armadas - Exér- da cidade e, quando for o caso, deter sujeitos cito, Marinha e Força Aérea que infrinjam as leis federais. Tendo esse fato corrobora, especificamente produto ligados à esse - a segurança pública do posto, a Operação Migro começou a ser planeem sua página 44, com o mercado como a catego- Estado. O nomeado para tal jada em 20 de fevereiro deste ano como uma relatório da Anistia Internacional sobre os homicírização dos espaços” operação, o general do Exér- resposta das Regiões Integradas de Segurança cito Walter Braga Netto, que Pública (RISP) de Minas Gerais ao decreto de dios cometidos pela Polícia Tatiana Lima lidera o Comando Militar do Intervenção Militar no estado do Rio de JaneiMilitar “Você matou meu Leste (Rio de Janeiro, Minas ro, para evitar que sujeitos envolvidos a crimifilho”, publicado em 2015. Gerais e Espírito Santo), co- nalidade migrem para o estado. São assassinatos fundamentados sob a meça a responder somente ao presidente, pasA Migro é operacionada pela 4ª RISP de tônica de guerra às drogas. O reflexo da sando por cima das decisões do governador do Juiz de Fora e a 17ª que tem a sede em Poubase governamental para o problema estruEstado, Luiz Fernando Pezão (PMDB). Com so Alegre. A ação acontece na fronteira entre tural dessa guerra interna no país delimitaisso, o secretário de Segurança Pública do Rio dois estados (MG e RJ) que abrange 25 cidase em montar programas - muito diferente de Janeiro, Roberto Sá, foi exonerado, poden- des, totalizando mais de 300 km de extensão. de políticas públicas -, como instalar UPP’s do atuar conforme as ordens do general. Segundo o Major Jovânio Campos, operante nos morros para combater a perturbação. As Forças Armadas são um órgão nacional há 22 anos na carreira militar e responsável Assim, sobem com mais armamento e trupermanente que tem como missão, zelar pela pela assessoria de comunicação da 4ª RISP, as culência, colocando a população no meio garantia da soberania nacional e pela ordem ações acontecem diariamente em horários alde um fogo cruzado. Recursos bélicos não da pátria, o que significa, declarar guerra ao ternados. faltam à Polícia Militar no Brasil, que está inimigo se preciso for. Não é a primeira vez “O policial que trabalha nas cidades de armada até os dentes e treinada para conque essas forças ressurgem num momento fronteira, deve desempenhar um tempo deterfronto intenso desde as escolas para forma-

Tatiana Lima, de preto, subindo o morro do Alemão com companheiros da comunicação popular

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COMPORTAMENTO

2018 abril

Especialistas debatem o armazenamento da imagem na era digital Foto: Camila Monteiro de Castro

A descontinuidade de redes e a questão da durabilidade são grandes ameaças

Flickr da Universidade Federal de Juiz de Fora pode ser acessado por alunos

O tradicional álbum de fotos, que reúne lembranças e histórias de famílias, tem se tornado raro devido ao armazenamento digital. A maneira como guardamos esses momentos eternizados por um clique se tornou objeto de estudos para especialistas no assunto. De acordo com pesquisadores, essa mudança afeta diretamente a perda da memória fotográfica. A fotografia sempre foi ligada à memória. Era uma forma de construção de identidade, onde famílias registravam momentos em câmeras analógicas, revelavam filmes, colecionavam em um livro e compartilhavam aos finais de semana com amigos e entes queridos. O registro era algo muito valioso, guardado com muito zelo. Já a superexposição no Instagram acontece de forma dinâmica e com mutações constantes, tornando a identidade coletiva e altamente marcada pela efemeridade. Nas várias transformações da fotografia como instrumento comunicacional, tanto da perspectiva da imagem material como imaterial, as relações humanas com esse objeto também sofrem alterações e novas leituras em relação à noção de memória, adquirindo novos significados. Uma dessas ressignificações surgem em função das redes sociais ligadas à imagem. O professor de fotografia do Instituto de Artes e Design da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Rogério Terra Júnior afirma que com o surgimento das redes de compartilhamento a fotografia, como instância de construção de manutenção de memória e de identidade, se perdeu. Visto que hoje é possível, a todo momento, construir e reconstruir a imagem. Rogério acrescenta que as identidades híbridas tendem a criar um personagem para contar o que você quer mostrar na rede, e que isso muda o tempo inteiro: “Esse fenômeno é recente e as pessoas ainda estão aprendendo a lidar com isso”, observa o professor. Já o jornalista Antônio Augusto Alvarenga, fotógrafo da Diretoria de Imagem da UFJF,

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Foto: Camila Monteiro de Castro

Por Camila Monteiro de Castro

defende que a mudança na relação com a fotografia é consequência do contato da pessoa com a imagem nos séculos XX e XXI. A introdução da memória digital é reflexo da era mecânica das coisas e da maneira como a sociedade deste século enxerga as coisas ao seu redor. “Não creio que haja uma mudança como memória e, sim, a fugacidade que o século representa. Todas as coisas são feitas para consumir rapidamente, para não durarem muito”. O fotógrafo completa que a única maneira de armazenamento de imagem era a impressão, e considera a durabilidade menor, porque tudo deteriorava mais rápido, com exceção dos papéis muitos antigos. Em relação à memória, a imagem pode ser armazenada em um álbum digital e continuar como um arquivo relacionado à lembrança, mas isso depende de cada pessoa, e muitas têm usado as redes para divulgação da imagem como trabalho. O estudante de Nutrição Pablo Jacob, usuário intensivo do Instagram, gosta em especial de registrar momentos com seus familiares e amigos. Antes das redes sociais, ele conta: “Eu revelava muitas fotos, porque era o meio que nós tínhamos para relembrar os momentos vividos. Hoje não revelo tanto como antigamente, mas tenho o hábito de fazer uma seleção e revelar as melhores, conservando minhas imagens antigas”. O fotógrafo Alexandre Dornelas revela a preocupação de que com o surgimento do Instagram existe uma incerteza em relação ao armazenamento das imagens na rede quando comparado ao álbum de fotos tradicional físico: “Existe a possibilidade de outras redes serem descontinuadas, fazendo com que suas informações sejam totalmente perdidas. Você não tem o poder total como tem de imagens reveladas por você e guardadas fisicamente”. Antigamente, o volume de fotos produzido era bem menor. Em relação à qualidade, com o surgimento da tecnologia do smartphone é possível observar que se manteve dependendo da capacidade de resolução de alguns aparelhos. Todos os meios de armazenamento de imagens podem ser consideradas um álbum de fotos, mas o único questionamento é até quando esse álbum digital vai existir quando comparado à durabilidade dos álbuns antigos.

Aplicativos de armazenamento de imagens O Instagram é aplicativo mais básico para quem quer compartilhar fotografias e, é claro, acompanhar as publicações de amigos, celebridades das mais variadas artes e também de fotógrafos profissionais ou amadores. A rede conta com milhões de usuários e uma incontável quantidade de imagens. Flickr é uma das páginas mais conhecidas de toda a web quando o assunto é rede social focada em fotografia, o é um campo fértil para diversos tipos de usuários. Pertencente ao Yahoo!. Este serviço oferece espaço para armazenamento, álbum virtual e conta com milhões de imagens sob as mais variadas licenças e está no ar desde 2004. Fonte: Canaltech

Instagram é um aplicativo de fácil usabilidade e acessibilidade entre a população


COMPORTAMENTO

2018 abril

Mercado de produtores de conteúdo aumenta em Juiz de Fora Profissionais da área digital falam sobre desafios e expansão do ramo Foto: Mateus Aguiar

é o fã se projetar ainda mais na vida de seu ídolo, enxergando-o mais próximo e atingível.

Iniciativas para criativos na região

Helena Gomes de Sá produzindo conteúdo para postagem sobre look nerd plus size

para mídias sociais vem mudando. A jornalista e Head de Marketing Ombrelo e Carambolaz, do Grupo Libertempo, Carolinne Rodrigues, 31 anos, analisa o cenário atual. “Antes, as grandes marcas achavam que podiam interferir no conteúdo do influenciador e logo foi percebido que era um tiro no pé. O grande aprendizado foi: o seguidor sabe exatamente quando seu ídolo está falando o que está escrito em um roteiro feito por outra pessoa. E não gosta. Conteúdo é sempre o auge da questão”. E essa produção de conteúdo vem ganhando espaço e destaque. Ainda de acordo com Carolinne, “crescimento houve com certeza e, mais do que isso, expansão para cidades menores daquilo que se concentrava antes na figura de influenciadores das capitais. Tirando raras exceções como o Rezende Evil, que é de Londrina e foi um dos primeiros desse movimento no Brasil, ou o fenômeno Whindersson Nunes, que veio do Piauí para conquistar o país inteiro”. Além disso, o quadro dos criadores de conteúdo vem mudando. Hoje quem ganha destaque nas mídias são os microinfluenciadores, pessoas comuns. O resultado

Foto: Nanda Gondim

que ainda existe um estigma sobre o fato de se ter um trabalho sério nas mídias sociais. Isso Os criadores de conteúdo, conhecidos porque, muitas vezes, o trabalho feito pelos muitas vezes como blogueiros, youtubers e produtores de conteúdo ainda é confundido influenciadores digitais, são aquelas pessoas com mero hobby. Por consequência, há a desque investem tempo, criatividade e até mesmo valorização da área. Helena aponta que mídias dinheiro nas plataformas digitais, a fim de dis- tradicionais vêm tentando ocupar o lugar dos seminar informação relevante para o perfil de criativos, tentando até mesmo agenciar, “mas nunca o produtor de conteúdo leva alguma usuários que querem atingir. vantagem nessa história”, afirma. Esse fenômeno, que surgiu Além disso, ainapós os anos 2000, se transda há o preconceito formou em profissão e prin“Se destacar no meio de com a área. Muitas cipal fonte de renda para alpessoas, de acordo gumas pessoas. Muitas vezes, muita coisa igual, fugir das com Helena, veem esse trabalho é visto como pessoas que vão tentar te co- o produtor de confácil ou fútil. A blogueira Hecomo uma lena Gomes de Sá, 31 anos, piar, te explorar, conseguir teúdo pessoa fútil, que desmistifica essa ideia ao ter um critério e um bom tem o ócio como enumerar alguns dos desafios senso para postar um conte- ocupação principal que enfrenta: “Se destacar no e passa o dia recemeio de muita coisa igual, fuúdo de qualidade e que não bendo os chamados gir das pessoas que vão tentar influencie de forma negativa mimos. Por isso, a te copiar, te explorar, consealternativa de proguir ter um critério e um bom as pessoas” fissionais que lesenso para postar um contevam o ramo a sério údo de qualidade e que não Helena Gomes de Sá é apenas mostrar influencie de forma negativa situações do dia a as pessoas”. dia que realmente Helena é formada em Direito e Turismo e atualmente trabalha com condizem com seu estilo de vida. Esse estilo de vida criativo varia entre pesprodução de conteúdo online, tanto para o blog “Garotas Rosa Choque” como para outros si- soas. Mariana Mendes, 25 anos, formada em tes. Até agora falou-se de criador ou produtor Artes e Design e também em Moda, hoje trade conteúdo, mas por que não dizer influen- balha como modelo e influenciadora digital. ciador? Segundo Helena, influenciador pode No Instagram, ela trata de autoestima e aceiser qualquer pessoa. Isso porque, cada qual tação e é seguida por quase 30 mil pessoas. influencia alguém de alguma forma. Logo, os Mariana tem uma marca de nascença no rosto termos produtor e/ou criador de conteúdo se- e se tornou mundialmente conhecida por pesriam mais adequados à profissão que se torna soas que a veem como inspiração de aceitação. “A partir das entrevistas que eu dei sobre cada vez mais relevante para o mercado. autoestima, foram surgindo trabalhos na área de moda e fotografia e, com isso, aumentando O panorama em Juiz de Fora o número de seguidores e de pessoas que se identificam e se motivam com o meu conteúO mercado de criadores de conteúdo em do”. E essa é a consequência de ser produtor Juiz de Fora ainda é muito prematuro. Tudo de conteúdo influenciar pessoas de forma poé muito novo. Alguns amam e abraçam as ini- sitiva. ciativas da área, outros nem tanto. É visível A questão de motivar e elaborar materiais Por Júlia Coêlho

Em Juiz de Fora têm sido criadas diversas iniciativas para fomentar o mercado de criadores de conteúdo da região. Exemplo disso são eventos como o “Encontro de Blogueiros e Youtubers”, a revista digital Ombrelo, que conta com criativos para produzir conteúdo de qualidade e influente dentro de seus segmentos específicos, além de cursos que vêm sendo promovidos a fim de capacitar profissionais da área de produção de conteúdo online. O “Encontro de Blogueiros e Youtubers”, criado em 2010 com o objetivo de conectar e gerar uma rede de contatos entre criativos de Juiz de Fora e região, hoje é sucesso. Em suas duas últimas edições as vagas foram esgotadas e a aparição na mídia foi intensa. Isso não só estimula quem está trabalhando neste mercado, como gera uma comunidade mais unida e forte em torno do ramo. Atualmente ele é organizado por Helena Gomes de Sá e Camila Villas. Além de organizar o evento, elas também buscam parceiros para que todos tenham oportunidade de crescer na área. Já a Ombrelo vem para dar ao produtor de conteúdo um lugar nas mídias tradicionais. Quem se associa a revista, não só tem espaço para co-criar conteúdo no veículo digital, como aparecer em meios de comunicação do Grupo Libertempo - Rádio Cidade, Rádio Alô e outras mídias. Segundo Carolline Rodrigues, a ideia é reunir múltiplos conteúdos, opiniões formatos em um só lugar. As informações passadas não são factuais, uma vez que o objetivo é levar material atemporal, divertido e dinâmico para o público. É possível perceber, portanto, que o mercado vem crescendo exponencialmente na cidade e região. O criativo deve se atentar às mudanças e acompanhá-las de perto para não ficar para trás. E quem quer ingressar na área deve estar ciente dos desafios e responsabilidades da profissão. Sim, profissão. Esta que vem se tornando cada vez mais a carreira de sucesso do momento.

Mariana Mendes é convidada por empresas internacionais para trabalhos como modelo

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CULTURA 2018 abril COMPORTAMENTO

2018 abril CULTURA

Já que é para tombar, elas tombaram

Foto: Gabriela Reis

Os desafios de ser uma rapper e a representatividade feminina no RAP juiz-forano

MC e poeta Tata Dellon Por Gabriela Reis

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ter uns três anos”, destaca Tata. Apesar de já ter se acostumado com as mudanças, a família de Tata teve dificuldades para compreender as opções dela. “Eu tive que ficar me autoafirmando por um tempo, para todo mundo entender que realmente não era uma fase minha, não era rebeldia, que não me deu a louca”, acrescentou a juiz-forana. Assim como Laura, Tata também presenciou e vivenciou diversas situações de machismo dentro do RAP, sendo que a discriminação era mais evidente dentro da igreja. A produtora de eventos e DJ Amanda Messias, 29 anos, começou a se envolver com o RAP participando das rodas que acontecem em Juiz de Fora. Quando conheceu o movimento, imaginava que a sua participação se limitaria à presença nos eventos, por conta do machismo. “O movimento Hip Hop é muito machista e isso já me fez refletir, mas nunca pensei em parar em definitivo”, comentou. Amanda também já presenciou situações envolvendo machismo dentro do RAP, sendo que uma se destaca por partir de uma amiga dela. “Ela, em algum momento, fez um comentário tipo, ‘tá gritando igual mulherzinha’, e eu virei para ela e disse ‘poxa’. Ela entendeu o que eu quis dizer. Esse é um exemplo dos muitos momentos de machismo que eu presencio dentro do movimento.”

Com a palavra, elas

entre as três mulheres que aparecem nesta reportagem: apesar das dificuldades, as rappers têm tido mais espaço. “Sempre teve muita mina, mas agora a gente tem um pouco mais de visibilidade. A gente está lutando, se unindo mais e aparecendo mais”, comenta Laura. Já para Tata, se comparada a cidades próximas, a Manchester Mineira ainda não é tão representativa quando falamos de mulheres no RAP. “Aqui em Juiz de Fora, as meninas estão se unindo, tanto que a gente criou o movimento da Roda das Manas, que é uma roda que acontece de 15 em 15 dias”. Tata acrescenta que o Brasil está se preparando para receber a representatividade feminina. “Juiz de Fora, por ser uma cidade universitária, tem um contato muito próximo com a representatividade. As mulheres estão mais atentas ao que as outras estão fazendo, estão apoiando e motivando, já que é um processo que não começa sozinho.” Uma das questões tratadas com as mulheres do RAP foi a representatividade em termos de gênero. Amanda acredita que Juiz de Fora já pode ser considerada uma cidade que tem um movimento Hip Hop igualitário. Para Tata, a sociedade ainda é muito preconceituosa e tenta encaixar o ser humano em uma determinada categoria, ferindo a liberdade e o espaço alheio. Como se não bastasse, para alguma delas, a discriminação por ser rapper vem acompanhada pela lesbofobia, racismo e outras discriminações diárias e marginalizadas pela sociedade.

Foto: Ledislaine Assis

Não há muitos estudos e mapeamentos sobre a representatividade das mulheres brasileiras no RAP. No entanto, existe um consenso

Foto: Gabriela Reis

A predominância masculina no movimento RAP (ritmo e poesia) é nítida ou era, até bem recentemente. As mulheres vêm ocupando cada vez mais os espaços que são delas por direito, mas que por várias questões a elas foram negados. Em Juiz de Fora, as rappers têm ganhado visibilidade nas mídias sociais, nos eventos e nos veículos de comunicação da região. A poeta Laura Conceição, 22 anos, é uma das mulheres que têm se destacado na cidade por estar sempre presente em eventos musicais, saraus, competições, apresentando poesias com críticas sociais e com mensagens que pretendem conscientizar o público. Desde criança, o contato da poeta com a arte literária é muito forte, já que sua mãe era professora de literatura. “Desde os 13 anos eu escrevo nesse estilo. Uma vez, uma professora de português levou um RAP para a sala, e eu me apaixonei”, conta. Sobre os desafios de ser uma rapper, Laura comenta que nunca pensou em desistir apesar de já ter ficado extremamente desanimada e triste com diversas situações, como preconceito por parte do público e contratantes. “Sendo mulher, é muito mais difícil e isso é um fato. É muito complicado. Mas sigo resistindo, porque poesia é resistência”, reforça Laura. A MC e poeta Tata Dellon, 23 anos, também é referência quando o assunto é representatividade feminina no RAP de Juiz de Fora, por também estar sempre presente nos eventos poéticos e musicais da cidade e participar do coletivo Las Manas New Gang, que reúne mulheres que lutam pela visibilidade feminina na cena do Hip Hop. A artista, que lançou o seu primeiro single recentemente, teve no RAP um divisor de águas, pois antes ela cantava em uma igreja evangélica. “Durante o meu tempo na igreja, eu sentia necessidade de expressar toda a minha realidade e, dentro daquele contexto, eu fundei um grupo (de RAP) com um menino e quatro minas. Não deu certo, eu saí e continuei a minha carreira solo como MC, que já deve

Poeta Laura Conceição

DJ Amanda Messias

#históriadorap: Nascido e criado na rua, o RAP (ritmo e poesia) surgiu na Jamaica na década de 1960 e, posteriormente, foi levado na década de 1970 para os Estados Unidos, principalmente para os bairros pobres do país. Já no Brasil, o discurso rítmico chegou na década de 1980, tendo a cidade de São Paulo como principal difusora do estilo, que depois se espalhou pelo país.

#anotaoconvite: Roda das Manas Quinzenalmente, aos domingos, às 18h30. Em frente ao Cine-Theatro Central. Espaço para declamar, batalhar e se descobrir. Amanda acredita que, além da discussão sobre a representatividade feminina no RAP, também é necessário discutir o papel da mulher negra no movimento e a reprodução de certos pensamentos, como a ideia de que a mulher negra deve compor um RAP mais agressivo, enquanto a mulher branca normalmente produz RAPs com temáticas amorosas. “Desde a época da escravidão, a base de tudo sempre foi a mulher negra e, dentro do movimento Hip Hop, existe mais representante negra do que branca. Inclusive, tem essa diferenciação. Mas a gente tem tentado combater isso, mostrando que somos personalidades diversas como todo ser humano”, finaliza a produtora de eventos. Apesar das dificuldades e barreiras a serem quebradas, percebe-se uma maior visibilidade dessas mulheres que transformam as suas conquistas, felicidades, mas também os obstáculos e decepções amorosas em RAP. No entanto, ainda há um caminho a ser percorrido para que o movimento alcance o estágio ideal de representatividade feminina em Juiz de Fora. Manas à obra!


CULTURA ESPORTE

2018 abril

Audiovisuais atuam como atrativos para o turismo Por Victória Tabet Gonçalves A ideia de um imaginário do paraíso na Terra é criada por cada um a partir de sua bagagem cultural, ou seja, de todo conhecimento e experiência adquiridos ao longo da vida. A imagem e, principalmente, peças audiovisuais como filmes, novelas e séries são fortes influentes desse imaginário por envolverem imagens reais. A ilha tailandesa Kho Phi Phi foi cenário de um dos clássicos do cinema mundial, “A praia”, estrelado por Leonardo DiCaprio. Parte da repercussão do filme foi a grande popularização da Maya Bay - a praia paradisíaca usada como locação principal do filme - que a partir da estreia tornouse um chamariz para o turismo na Tailândia. O impacto da divulgação de imagens foi tão grande que, nos anos 2000, quando o filme foi lançado, 10 milhões de turistas visitaram o país, além do aumento de 22% da circulação de capital no mercado local, segundo o “Estudo de Sinergia e Desenvolvimento entre as indústrias do turismo & Audiovisual brasileiras” (2007). A massificação do turismo fez com que grande parte dos parques nacionais marinhos da Tailândia fechassem durante quatro meses do ano, geralmente entre meados de maio a meados de outubro, para a preservação do meio ambiente. Koh Phi Phi possui uma enorme demanda turística em relação aos demais parques do país desde 1999, quando a equipe Hollywoodiana chegou para as filmagens, fazendo com que as autoridades tailandesas mantivessem as ilhas abertas para visitação ano após ano. Duas ilhas são voltadas diretamente para o turismo. Phi Phi Don é conhecida por seu lado mais “civilizado”, comercial, uma vez que comporta hotéis, restaurantes e bares, além de funcionar como porto para desembarque dos turistas. Já Phi Phi Lay, é completamente natural e não habitada - conhecida por sua exuberância natural, com praias paradisíacas, entre elas Maya Bay, “a praia”. O grande fluxo de pessoas e a poluição têm abalado o ecossistema local. Com as alterações climáticas, houve também impactos na vida marinha, e principalmente na barreira de corais que fica no entorno da ilha. Phi Phi Lay, que recebia por volta de 4.000 visitantes por dia, em média 200 barcos ancorados em Maya Bay, também fechará pelo período de quatro meses a partir de junho de 2018. Assim como foi feito com as outras ilhas pelo do Departamento Nacional de Parques e Vida Selvagem, a única maneira de frear os impactos e reabilitar a vida marinha na região é fechando completamente o local, para que a natureza possa se recuperar dos danos causados por muito anos de turismo incessante. O departamento tailandês anunciou que após o primeiro período de fechamento será estabelecido um limite de 2.000 turistas por dia e possivelmente haverá a implementação de taxas para quem quiser visitar as praias paradisíacas. A ancoragem de barcos na praia favorita da ilha será proibida e os barcos terão um novo porto de abrigo, a Loh Samah Bay (veja no mapa).

Turismo e audiovisual andam de mãos dadas Consciente ou inconscientemente, uma imagem é fixada no imaginário do espectador, a partir do que lhe é apresentado nas telas. Despertando um desejo em viver o que é

Foto: Victória Tabet Gonçalves

Locações utilizadas na produção de filmes têm transformado espectadores em turistas, formando assim um ciclo virtuoso entre as indústrias

Uma das praias da ilha de Phi Phi Lay, na Tailandia, cenário do filme “A Praia” (2000)

representado em suas narrativas favoritas, os filmes funcionam como poderosos influenciadores na hora da escolha de um destino. Sendo assim, incentivam a vontade de viajar.

“Quando um filme é gravado, alterações que são inerentes à imagem e ao som trazem consigo assim sensações, afetos” Nilson Alvarenga O professor da Faculdade de Comunicação Nilson Alvarenga, que possui ênfase Cinema, acredita que os filmes não devem ser pensados só como a história, a narrativa, mas também como a produção de estímulos de sentido. “Quando um filme é gravado, alterações que são inerentes à imagem e ao som trazem consigo assim sensações, afetos”. O trabalho com a luz, câmera, figurino e cenografia podem transmitir um certo encanto ou tensão ao filme: “Esses fatores compõem uma espécie de espaço imaginário criado pelo filme, e muitas vezes glamourizado”, reforça Nilson. Ele afirma ainda que as pessoas buscam visitar as locações não mais como espectadores, se transformando em turistas, resgatando a memória daquele espaço imaginário que foi vivenciado ao assistir o filme. Tendo a comunicação como um dos aliados para seu crescimento, o marketing turístico deu origem a um segmento não muito conhecido: o Turismo Cinematográfico. Além de “A Praia”, outros clássicos do cinema consagraram suas locações, dando-as o caráter de destinos turísticos, algumas vezes exclusivamente

pela divulgação das imagens do local. Alguns exemplos são: “O Senhor dos Anéis”, na Nova Zelândia; “Bonequinha de Luxo”, em Nova York; a saga “Harry Potter”, no Reino Unido e a série de filmes “Piratas do Caribe”, no Caribe. Além do estímulo de conhecer locações, festivais de cinema também se encaixam neste segmento do turismo. Atuando como uma das maiores vitrines da produção cinematográfica mundial, sendo um eficaz canal de difusão das obras audiovisuais, eventos como o Festival de Cannes (França), Toronto International Film Festival (Canadá), o Festival de Cinema de Gramado e a Mostra de Cinema de Tiradentes (ambos no Brasil), acontecem anualmente movimentando as cidades com a chegada de artistas e turistas. Este nicho do turismo é motivado por perspectivas diferentes às motivações tradicionais - relaxar em um ambiente diferente de casa, como numa praia ou num campo. Os Set-Jetters, como é nomeada a geração de turistas motivados pelo audiovisual, são geralmente viajantes regulares que buscam diversificação em suas viagens, com rotas divergentes dos fluxos tradicionais, em busca de viver experiências mais significativas e enriquecedoras.

O ciclo virtuoso Há uma sintonia de interesses entre o setor de turismo e do audiovisual, de acordo com o Ministério do Turismo brasileiro. Condiz numa relação proporcional um ciclo virtuoso no desenvolvimento de ambos os setores - ao escolher a locação, uma produção gera afluxo de investimentos e consequentemente o aumento da exposição nacional, fazendo com que cresça o volume de turistas. Assim, mais produções nacionais e internacionais são atraídas para a mesma locação, gerando

capital e movimentando a cadeia de serviços, possibilitando mais investimentos e incentivos no mercado local, além de atrair mais visitantes. E assim o ciclo se mantém virtuoso. Os públicos que buscam este tipo de turismo e locações para suas produções audiovisuais são qualificados, e um tanto quanto exigentes em relação ao serviço prestado nos destinos. Um cuidado maior em relação à infraestrutura é importante em setores como hospedagem, transporte e alimentação. Olhando pelo patamar das produções, além da instalação da equipe no país, alguns fatores funcionam como atrativos para a escolha de locações: incentivo ou isenção fiscal, desburocratização de procedimentos de vistos de trabalho, disponibilidade de mão-de-obra para criação dos cenários e facilidade na autorização de filmagens em espaços públicos. Woody Allen, cineasta e roteirista americano, fechou contratos com a secretarias de turismo ou diretamente com as prefeituras, de cidades como Paris, Barcelona e Roma para incluir um pouco da cidade no contexto da narrativa. Assim, filmes como “Meia Noite em Paris”, “Vicky Cristina Barcelona” e “Para Roma com Amor” tiveram seus roteiros influenciados pelas cidades. Não só o espaço (cenário) é criado pela narrativa, mas a narrativa é criada para aquele espaço, promovendo o local turístico. Confirmando a eficiência da divulgação dos destinos, principalmente por meio do audiovisual, o Reino Unido pode ser considerado um dos principais exemplos referente à esta questão. Segundo o VisitBritain, órgão de turismo britânico, 30% dos turistas dizem-se motivados pela exposição britânica na mídia. Mesmo possuindo a moeda mais cara do continente europeu, o país se encontra no sexto lugar do ranking da Organização Mundial do Turismo (OMT) dos destinos internacionais mais visitados no mundo.

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ECONOMIA

2018 abril abril de 2018

Alternativas do mercado empreendedor de Juiz de Fora

Foto: Zeca Frota

A Manchester Mineira respira novas formas de empreender, seja através de micro e pequenas empresas ou no aprendizado de futuros empreendedores

pacitação, mas atrelado a isso, é buscar a inovação e cooperação. A inovação se dá Historicamente, Juiz de Fora sempre teve nos processos produtivos, como a redução seu desenvolvimento atrelado a um papel de custos, comunicação com o cliente e asde ponto de passagem. Pela localização ge- pectos na gestão empresarial. Em relação ográfica, desde o começo estivemos em um à cooperação, atualmente o mercado não é lugar estratégico para escoamento das ri- competitivo apenas por conta da territorialiquezas do país e de trânsito de pessoas e in- dade local, mas temos uma competição com formações que iam sempre em direção aos empresas do mundo inteiro, por conta dos grandes centros. Atualmente, essas caracte- e-commerces. Portanto, é importante buscar rísticas ainda permanecem, mas o papel de modelos que possam ser de destaque para a simples coadjuvante já não cabe mais a Juiz competitividade do mercado”, observa Paulo. Estabelecer o mercado empreendedor de Fora. Com espírito inovador e o pioneirismo que sempre fizeram parte da nossa é um desafio que Juiz de Fora tem buscado essência, a Princesa de Minas vem se desen- há alguns anos. Paulo Veríssimo afirma que volvendo com grande olhar para o futuro. a cidade ainda tem caminhado lentamente, mas se mostra bem esEm 2017, Juiz de perançoso quando visa Fora foi reconhecida o posicionamento da como a terceira melhor “A gente caminha para Manchester Mineira cidade de Minas Gerais para se investir, estanconsolidar esse mercado com um empreendedodo atrás apenas de Belo baseado principalmente rismo fortificado. “Eu vejo um cenário muito Horizonte e Uberlândia. em suas potencialidades.” positivo, principalmente Se comparado ao terriuma série de ações sentório nacional, a Manchester Mineira está Paulo Veríssimo (Sebrae) do feitas para fortalecer esse empreendedorismo entre as 50 melhores, na cidade. A gente casegundo o ranking elaminha para consolidar borado pela Urban Systems em parceria com a Revista Exame. Essas esse mercado baseado em suas potencialidacolocações mostram o quanto a cidade tem se des, como serviço de educação, saúde, comérdesenvolvido e buscado novas soluções para cio, indústrias (confecção, construção civil, se posicionar cada vez mais no mercado. mecânicas, alimentos e bebidas) e do próCom o avanço da cidade, novas opor- prio turismo de Juiz de Fora”, complementa. Ser dono do seu próprio negócio, traz tunidades foram surgindo, fazendo com que Juiz de Fora deixasse de ter apenas consigo a responsabilidade de aprendizado foco estudantil ou atrelado somente ao seu constante e da busca em se adaptar ao mercomércio. Novos caminhos são abertos cado. Essa situação acontece com a maioria quando o assunto é o empreendedorismo. dos Microempresários Individuais (MEIs), Segundo dados do Serviço Brasileiro de como no caso do programador Gregório BruApoio às Micro e Pequenas Empresas (Se- no, que em 2018 se regulamentou oferecenbrae), a cidade possui cerca de 20 mil mi- do serviços de informática e programação. cro e pequenos empresários e tem tido um “Desde muito cedo, trabalhei para empreaumento de empreendedores. “Esse aumen- sas e tinha apenas a obrigação de fazer meu to é visível, pois reforça a necessidade de serviço. Agora como dono da minha própria atender um mercado cada vez mais exigen- empresa, a realidade muda, principalmente, pois o cliente busca isso. Ele quer pro- te por ter que cuidar da parte de gestão, que dutos e serviços que agreguem mais valor, era uma coisa que até então nunca teria tido não monetário, mas na satisfação final”, interesse em buscar aprender e, que pela afirma o analista do Sebrae Paulo Veríssimo. falta de experiência, cria algumas barreiPaulo acrescenta que uma das maiores ras para se enquadrar no mercado”, declara. Gregório conta que em diversos momendificuldades das Micro e Pequenas Empresas (MPEs) de Juiz de Fora é se adap- tos ficou com medo de realmente abrir sua tar ao mercado, principalmente as em- empresa por conta da receptividade dos nepresas de grande porte ou que já estão gócios que já atuam na cidade: “Antes eninseridas no sistema econômico da cidade. xergava que as empresas (grandes) de Juiz “É importante a busca constante pela ca- de Fora preferiam contratar mão de obra e

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serviços de fora da cidade, mesmo pagando mais, do que contratar a mão de obra local. Mas pude perceber, após a minha formalização como MEI, que justamente o que falta é mão de obra ou de um determinado serviço específico, e que ainda tem muitas outras oportunidades inexploradas na cidade”. Sonhar com seu próprio empreendimento, pode ser uma tarefa difícil para aqueles que querem iniciar seu negócio. Para Gregório, a maior dificuldade é a burocracia para a abertura de micro e pequenas empresas: “Alguns documentos necessários são fáceis de conseguir como, por exemplo, para gerar meu CNPJ gastei apenas 10 minutos, mas se comparados à documentação referente à Prefeitura, durou em média três meses. Para quem hoje busca abrir uma empresa, quer facilidade e agilidade no processo”, conclui o microempreendedor.

Aprendizado na prática O empreendedorismo de Juiz de Fora não se resume apenas ao comércio local. Por também ser reconhecida como grande polo estudantil, a cidade se adapta com novas ações. Com 11 Instituições de Ensino Superior (IES) na cidade, 80% destas abrigam o Movimento Empresa Júnior. O MEJ, como também é conhecido, tem a premissa formar, por meio da vivência empresarial, profissionais cada vez mais capacitados e que durante a sua graduação têm a oportunidade de aprender na prática a experiência de fazer parte de uma empresa. As empresas juniores são formadas apenas por alunos e pelos serviços ofertados conseguem impactar o ecossistema empreendedor. Atualmente, Juiz de Fora possui 23 em-

presas juniores de diversos segmentos que oferecem ao mercado local e da região viços com valores abaixo do mercado, mas com qualidade similar a uma empresa sênior. A participação em uma empresa júnior vai além do aprendizado operacional, mas tem por objetivo a capacitação dos membros por meio de projetos e de gestão. Um dos focos das empresas juniores, é atender às MEIs e MPEs, uma vez que assim conseguem se inserir no mercado com maior facilidade. O presidente da Impacto Jr., empresa júnior da Faculdade de Engenharia Mecânica da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Victor Baesso, afirma que através dos projetos que oferecem, capacitam os membros em busca de um aprendizado contínuo. “Além dessa capacitação prática, e que muitas vezes é deficitária ao curso, a EJ consegue mexer com outras questões relacionadas à comportamentos e a capacidade de obter outros olhares na àrea de atuação do futuro profissional”, informa. Só nos três primeiros meses de 2018, a Impacto Jr. conseguiu realizar 33 projetos em diferentes empresas. “O nosso foco é melhorar a empresa financeiramente, reduzindo os custos, aumentando a produtividade, regulamentando conforme as normas e outros serviços. Hoje conseguimos nos inserir no mercado muito facilmente, atingindo as empresas de pequeno porte, contribuindo para o desenvolvimento delas também”, conclui Baesso. O mercado empreendedor ainda precisa estar mais aberto às oportunidades que vêm surgindo, buscando melhorar. As novas formas de empreendedorismo chegam como fortes alternativas para um maior desenvolvimento econômico local. Assim é possível pensar em uma Juiz de Fora mais inovado-

Foto: Wemerson Macanha

PorWemerson Macanha

Membros da EJ se capacitam por meio de projetos práticos para se desenvolverem.


ECONOMIA

2018 abril

Empresas familiares no cenário empresarial juiz-forano Os maiores desafios caracterizam a mudança de gestões nos negócios Por Mirella Polato Apesar de não haver uma definição precisa do que são as empresas familiares, elas são muito comuns no mercado como um todo. Segundo a pesquisa “Empresas Familiares” do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), feita em 2017, a maioria dos empreendimentos são de caráter familiar (aquelas em que há parentesco entre os sócios e/ou entre os empregados e colaboradores). O estudo afirma que 36% dos pequenos negócios do Brasil são familiares e que seu controle fica com uma ou mais famílias. Ainda segundo a pesquisa, Minas Gerais tem 23,2% dos empreendimentos caracterizados como familiares por terem parentes como sócios e 23,9% por terem parentes como funcionários. Assim como no cenário geral, Juiz de Fora também tem empresas que possuem familiares na direção e quadro de funcionários. A contadora Pricila Barino afirma que muitas empresas se constituem de forma familiar pelo “risco” da estabilidade perdurar ou não: “Caso o negócio não dê certo, ter um familiar como sócio pode dar mais segurança na hora de lidar com a situação”. Para ela, o convívio familiar é algo positivo para o relacionamento empresarial. Segundo a assessora contábil Ana Paula Barbosa, não existem privilégios para as empresas familiares quando o assunto são tributos: “Não tem diferença por ser empresa familiar ou não. O imposto é feito de acordo com o regime da empresa, ou seja, atividades que podem ser definidas como lucro presumido, simples nacional ou lucro real”. A contadora afirma que a mudança está no dia a dia de trabalho das empresas familiares: “Geralmente,

É possível que cada família ou parente possua mais de uma conexão com a empresa. Fonte: Reprodução do modelo de três círculos da pesquisa “Empresas Familiares” (2017) do Sebrae

pessoas querendo saber como o negócio está”. Pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) apontam que o maior desafio das empresas familiares é a fase de sucessão, seja em empresas de pe-

Fonte: consultoria da Strategos Consultoria Empresarial

quando a família tem uma empresa, acaba que demonstra uma preocupação maior. Há um pouco mais de controle, já que existem outras

queno, médio ou grande porte, atuantes em qualquer área (comércio, indústria ou serviços). Os principais desafios no momen-

to da sucessão são a falta de capacitação da geração seguinte, a centralização das decisões por parte do fundador ou até mesmo brigas entre os herdeiros pelo poder. O sócio-diretor da consultoria Ricca & Associados Domingos Ricca afirmou que os problemas relacionados à sucessão das empresas familiares podem e devem ser combatidos por meio de programas que preparam previamente os sucessores. “A sucessão deve ocorrer em uma época pré-determinada, com os mais experientes participando do processo e abrindo caminho para a geração seguinte”, explicou Domingos. Há quatro anos, a microempresa M.M Pescados e Alimentos é administrada pelos membros da família Baio. Lucas é administrador geral junto com o primo Leonardo, enquanto seus irmãos Hugo e Felippe ficam responsáveis pelas vendas. Lucas assumiu a empresa antes de começar o curso de Administração e conta que a transição de gerações na empresa foi complicada já que a nova gestão ainda não tinha formação adequada: “A gente teve dificuldade, não conhecíamos bem o negócio e nem o mercado. Não tínhamos a ‘maldade’ da coisa. Hoje em dia já sabemos como funciona”. Segundo Lucas, a relação dele com o primo e os irmãos é bem tranquila porque eles sabem separar o pessoal do profissional. “Existem estresses, mas onde não tem esse tipo de problema?”, completa. Ele também conta um pouco sobre a rotina de trabalho: “Nós chegamos todos os dias na empresa às sete da manhã. A primeira coisa que fazemos é esperar os pedidos do dia e depois disso liberamos as entregas na cidade. Isso se repete depois do almoço para as entregas que serão feitas na parte da tarde. Tra-

balhamos em família e os outros funcionários são amigos, por isso o clima é bem caseiro”. Já os irmãos Matthaus e Gabriel Fernandes abriram juntos uma microempresa em 2017, a Brother’s Barber Shop. Como eles são os fundadores, não houve dificuldades para assumir a administração. Antes de abrir o negócio, os irmãos procuraram se capacitar através de cursos. Matthaus já trabalhava em salões de beleza e por isso ficou acordado entre os dois que ele cuidaria da parte financeira da barbearia, enquanto o irmão ficaria responsável pela parte de pagamentos e manutenção do negócio. Ambos são barbeiros e cabeleireiros qualificados, o que facilita o cotidiano profissional, principalmente na marcação de horários na barbearia. A Strategos Consultoria Empresarial, de São Paulo, compilou dados de 90 organizações de todo o país, a maioria de médio porte, com as quais trabalhou durante 22 anos. Segundo a consultoria, um dos fatores que pesam no fracasso de algumas empresas é a falta de gestão profissionalizada, além do planejamento a longo prazo por parte dos sucessores. A pesquisa da Strategos indicou que cerca de 70% das empresas não sobrevivem à segunda geração, 10% passam para a terceira e apenas 3% para a quarta. Para o grupo Kika Colorida, a sucessão não tem sido problema, tampouco a qualificação dos herdeiros. O grupo possui, atualmente, oito lojas em Juiz de Fora, além de outras duas lojas em Governador Valadares e em Itaipava (RJ). A empresa alcançou seus 36 anos e já está sob o comando da segunda geração. Alípio Padilha, que tem 74 anos, é o fundador da empresa e exerce o cargo de presidente. O filho Marcello, de 48 anos, formado em Administração, é o diretor-executivo do grupo há 15 anos e comanda a empresa. Além dele, os outros três

Irmãos Padilha, do Grupo Kika Colorida Foto: acervo de família

filhos de Alípio também trabalham no grupo. Fernando é o responsável pela administração da loja de Itaipava, Raquel Padilha é a advogada do grupo e Marina, com MBA, assumiu a direção de Marketing do grupo há sete anos. Todos os herdeiros começaram a trabalhar na empresa como vendedores. Marina conta que o desejo de trabalhar surgiu espontaneamente. “A cada um que completava 18 anos era mais um funcionário na loja. Trabalhamos no balcão antes de assumir qualquer função na empresa”, conta. A família espera que as próximas gerações continuem a assumir a gestão da empresa: “Eu ficaria muito feliz em vê-los assumindo cargos, mas isso é uma coisa que só o tempo dirá”, acrescenta Marina. É a expectativa para que a empresa siga firme no mercado.

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ECONOMIA

abril de 2018

Moda consciente Longe de serem produtos velhos ou fora de moda, os brechós vêm ganhando cada vez mais espaço no gosto dos consumidores

A proprietária da Lujinha, Luisa, vem investido na venda de peças das marcas Zara, Dress To e Farm.

Vem comigo Fernanda Tabet é dona de um brechó itinerante de nome peculiar: “Vem comigo que no caminho eu te explico”. Para a comerciante, a loja física foi uma oportunidade de mostrar o trabalho artístico e conceitual com roupas antigas e que, segundo ela, “ninguém tem”. O brechó da Fernanda começou simples, com poucas araras, até se fazer necessário um espaço maior, fato muito comum em diversos brechós da cidade. Hoje, o “Vem comigo” está localizado na Avenida dos Andradas e atrai diversos consumidores em busca de novidades e peças diferenciadas. Fernanda comenta que a maior dificuldade no ramo é não se dedicar verdadeiramente: “É um mercado que está crescendo muito, mas é algo rápido, sazonal. A maioria dos brechós que estão surgindo não se mantém por muito tempo. As pessoas pensam que é só comprar algumas peças, juntar as amigas e começar a vender. Não é por aí. É preciso empenho, é pre-

Foto: Victória Tabet

Imagine comprar um vestido 60% mais barato do que em diversas lojas; um sapato de marca por R$ 70 ou ainda montar um look completo por menos de R$ 100. Em tempos de crise, lojas com preços acessíveis são cada vez mais visadas e é nessa onda que os brechós embarcam e se destacam cada vez mais. Se antigamente as lojas que comercializavam produtos usados eram conhecidas pelo visual sem capricho e o cheiro de mofo, hoje os brechós investem na ambientação do espaço, comunicação visual e no marketing, fazendo sucesso entre os consumidores mais antenados. Uma pesquisa realizada em agosto de 2017, pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), aponta que oito em cada 10 consumidores acreditam que o consumo colaborativo tende a tornar a vida mais prática e fácil. Ainda segundo o levantamento, 47% buscam o brechó para economizar dinheiro. No entanto, ainda há outras motivações para grande parte dos consumidores como: evitar desperdício (46%), combater o consumo excessivo (45%), ajudar o próximo (36%); troca de experiência com outras pessoas (34%), preservação do meio ambiente (31%), novas redes de relacionamento (30%), melhorar a qualidade de vida (29%) e, por último, vem a oportunidade de ganhar dinheiro (28%). Em Juiz de Fora não é diferente, as lojas que vendem artigos usados estão sendo cada vez mais vistas nas ruas do Centro e de bairros da cidade. A estudante de moda e empreendedora Glynnis Brum é consumidora assídua de brechós e administra uma loja há seis anos. Para ela, houve uma grande mudança durante esse tempo tanto nos estilos de lojas, quanto nos consumidores: “Seis anos atrás o público de brechós era totalmente outro. Hoje posso dizer que eu não tenho nenhuma amiga que pelo menos não tenha alguma peça de brechó. Muitos homens também têm aderido a ideia, mas ainda é um número pequeno”. Apesar de estar cada vez mais comum, os brechós ainda enfrentam certo preconceito na cidade. “Minha família mesmo quando descobriu que eu comecei a trabalhar com brechó achou a ideia pobre e sem sentido. Hoje em dia eles sempre querem ver as peças que eu tenho e vendem suas próprias peças pra mim”, comenta Glynnis.

Foto: Isabella Peçanha

Por Isabella Peçanha

ciso olhar o brechó como empreendimento”. Ainda segundo a empresária, as lojas de brechó são uma oportunidade de aprender: “Brechó é aprendizado sobre moda, cultura e vida. Sem falar na questão financeira. Brechó é saber lidar com o público, é ter satisfação, generosidade, olho clínico. A vantagem do brechó é ver pessoas felizes gastando pouco dinheiro, dando a elas diversas opções de escolha”, completa.

Investindo online Apesar de muitas lojas em Juiz de Fora se concentrarem nas vendas exclusivamente feitas dentro das lojas físicas, alguns brechós têm investido nos meios digitais, seja para venda ou ainda como divulgação. O

O luxo em brechós Com objetivo de atingir os públicos de classe A e B, alguns brechós se especializaram no mercado de luxo. Com grifes e marcas famosas, as lojas têm apostado nos desapegos de mulheres bem sucedidas financeiramente que procuram desfazer de peças que foram pouco usadas para adquirir novos produtos.

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Para Victoria Polovanick, dona do brechó de luxo “Desapega Madame” em Santos, essa ~ é a loja do futuro: “Acredito que um dia vão acabar os shoppings e serão somente lojas online e brechós. É um mercado que só tem a crescer. Atualmente o ramo da moda sustentável está muito em alta no mundo”. Ainda segundo Victoria, a conscientização sobre o consumo tem sido maior, o que acaba transformando o pensamento de quem antes tinha certo preconceito com roupas usadas e de segunda mão.

O Brechó Itinerante Vem Comigo realiza ensaios fotográficos de tempos em tempos para divulgar as peças nas redes sociais

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Juiz de Fora ainda não conta com brechós exclusivos de peças de luxo, mas com um pouco de paciência e olhar clínico é possível adquirir peças de grandes marcas nacionais e internacionais nos brechós da cidade por um preço bem abaixo do normal.

brechó da Fernanda Tabet é um deles: com ensaios fotográficos e uma ampla divulgação nas mídias digitais, o “Vem Comigo” tem atingido um público cada vez maior. Outros brechós surgem aos montes no Instagram e no Facebook vendendo não apenas roupas, mas conceitos, fotos bem montadas e um pensamento: consumo consciente. É o caso da Lujinha 405. Com mais de 9 mil seguidores no Instagram, o brechó aposta em peças de marca, no conceito fashion e em parcerias com blogueiras juiz-foranas, que criam suas araras de desapego dentro da loja. Luisa Barbeta tem 22 anos e é a proprietária da Lujinha. A loja começou com a exposição das próprias roupas da empresária e acabou ganhando proporções maiores graças ao Instagram. Hoje em dia, o meio online é o carro-chefe das vendas da “marca”: “A facilidade com que as informações se propagam, a fácil comunicação que ele proporciona e o custo praticamente zero da ferramenta, faz do Instagram a base para a loja. Através do Instagram expomos nossos produtos, cativamos nossas clientes e expressamos nosso cuidado e carinho em cada etapa do nosso processo”. Outra maneira de vender peças usadas de forma online é apostar nos grupos do Facebook. Em Juiz de Fora são muitos, alguns com mais de 30 mil seguidores, que estimulam a venda e a compra de peças de roupa, sapatos e acessórios entre os participantes, que não precisam ser exímios vendedores, basta postar uma foto do produto, fornecer as informações e pronto, a venda já pode ser feita. Amandah Silveira é administradora do grupo “Adoro Brechó JF” e ressalta as vantagens dessa forma de compra e venda: “Muitas vezes compramos uma peça que acabamos nem usando. Pra não jogar dinheiro fora, existem os grupos do Facebook de desapego. Essa é a ideia, consumo consciente, passar para o próximo aquela peça bacana por um preço justo”.

Três dicas para comprar em brechó 1- Pegue tudo que achar que tenha potencial. Depois, faça uma triagem. Sim, muitas peças na arara ficam de um jeito e no corpo ficam de outro. Vale a pena observar estampas diferentes, peças conceituais e levar tudo para o provador. 2- Olhos atentos. A hora da triagem é bem importante. É nessa hora que você vai analisar coisas como tamanho, qualidade, modelagem, potencial, se combina com o seu estilo, se o preço vale a pena, se tem defeitos, se tem um zíper quebrado, enfim, essas coisas. Faça isso em um cantinho, com calma, sem que ninguém te atrapalhe para que você possa pensar bem e analisar bem as peças. 3- Ajustes. Algumas peças, às vezes, precisam de pequenos ajustes para serem perfeitas.Se você conhece alguém que possa fazer um ajuste, leve a peça para casa. Mas opte por peças de ajuste simples, como uma bainha, encurtar um short, dar um pontinho de costura, etc. Dependendo da peça e do preço, fazer ajustes vale a pena!


ESPORTES

abril de 2018

Bem mais que diversão, games ganham status de esporte No final dos anos 1970 e início de 1980, uma nova tendência surge no dia a dia das famílias Por Lara Morais

Foto: Lara Morais

A indústria de games é a que mais fatura no Brasil no ramo de entretenimento. No último levantamento feito em 2017, pela Global Games Market Report, o Brasil se destacou como o 13º país que mais gera receita no setor, evidenciando sua importância na economia como um dos melhores setores de investimento. Isso porque, nos últimos anos, os games se tornaram muito mais que recreação. A popularização dessa tecnologia começou ao final dos anos 1970 e início dos anos 1980, com o surgimento dos arcades (jogos de fliperama). Eles foram adquirindo cada vez mais espaço na rotina das pessoas, produzindo uma nova tendência. E foi com o surgimento dos consoles domésticos, que os games, literalmente, entraram no ambiente familiar. É o que explica a coordenadora do grupo de pesquisa Ciberludens, professora Letícia Perani. O grupo Ciberludens estuda o lúdico digital e é vínculado ao Instituto de Artes e Design da Universidade Federal de Juiz de Fora. Hoje, os games são considerados uma modalidade esportiva. Agências de consultoria que atuam no mercado de jogos projetam boas perspectivas para o desenvolvimento do setor. De acordo com a PwC, o investimento no Brasil em 2016 chegou a US$ 644 milhões e a expectativa é que em 2021 essa cifra chegue a US$ 1,4 bilhão. Já a Agência Firma mostra que em 2017 foram movimentados cerca de U$ 1,5 bilhão.

Consoles domésticos levaram os games para as residências, na foto: gamer com console Xbox - Produto da empresa Microsoft

Phelipe Reis, 18 anos

Lara Bissagio, 19 anos, é gamer e cursa a graduação em Engenharia Computacional, ela que já participou de alguns times em competições explica que seu contato com os games começou aos oito anos, mas por ser mulher enfrentou muito preconceito: “Minha mãe não me dava um videogame porque era coisa de menino”. Segundo ela, muitas amigas já foram assediadas dentro das disputas online e, na maioria das vezes, são menosprezadas, tanto que na liga do Campeonato Brasileiro não há nenhum time feminino ou com participantes mulheres. Lara, Bissagio 19 anos

Os games podem se tornarum vício? Com o avanço dos games e a popularização dos e-sports, é comum aumentar também a discussão sobre o vício. Mas para o campo da psicologia, a problemática está em processo de estudo. Segundo o mestrando Gilson Peres, os videogames são uma prática lúdica que podem ser utilizados como fuga e até cau-

sar dependência psicológica, entretanto, tudo depende de como eles são utilizados pelos jogadores: “O que nos dá prazer de alguma forma tem potencial para ser um vício psicológico ou virar um sintoma de compulsão”. Gilson é bacharel em Psicologia e atualmente desenvolve pesquisa intitulada “Sobre o Lúdico e o Ciberativismo: Affordances percebidas na cultura de fãs”, onde é analisada a interatividade em uma página no Facebook de um game específico. Os atletas dos e-sports em praticamente nada se diferenciam de atletas de outras modalidades esportivas no quesito psicológico. Eles passam pelas mesmas pressões e estresses que jogadores de futebol, por exemplo, garante. Ele explica que a Psicologia do Esporte é um ramo de trabalho que pode auxiliar esses atletas de diversas maneiras, como auxiliar na melhoria do trabalho em equipe, controle emocional, lidar com situações de estresse e auxiliar com o enfrentamento da derrota. O psicólogo reforça que o vício não de-

pende do game ou do tempo que as pessoas passam nele, mas da pessoa em si, de sua estrutura, personalidade e, principalmente, de seus problemas pessoais e como ela os encara.

Premiações Campeonato Brasileiro ‘League of Legends’ de 2018

Foto: Lara Morais

A pesquisadora Letícia Perani explica que o público vem se diversificando cada vez mais devido à amplitude do mercado: “Até porque você tem toda uma geração que já cresceu com os videogames, que adquiriu esse hábito na infância e continua jogando na idade adulta”. O crescimento da área é inquestionável. A designer de jogos Mariana Salimena, ilustradora no Studio Nebulosa, de Juiz de Fora, afirma que o mercado para smartphones definitivamente é um dos que vai continuar apresentando grande crescimento. “Acredito também que vamos continuar tendo a maior parte dos games online e, talvez, com mecânicas cada vez mais cooperativas”, completa.

Foto: Arquivo Pessoal

Foto: Arquivo Pessoal

O gamer Phelipe Reis, que tem18 anos, e atualmente cursa o ensino médio, participou de dois campeonatos internacionais: em 2017, na França e, em 2018, foi a convite da Microsoft para os Estados Unidos. Ele conta que sempre viu os games como diversão, mas após participar da competição na França, na qual representou o Brasil e conquistou a 20ª colocação, percebeu uma oportunidade de se profissionalizar no ramo: “Meus pais sempre me apoiaram em toda e qualquer decisão em minha vida e essa não foi diferente. Eles sabem a importância e a dificuldade desse nível de competição”.

1º: R$ 70 mil 2º: R$ 40 mil 3º: R$ 25 mil 4º: R$ 25 mil 5º: R$ 15 mil 6º: R$ 10 mil 7º: R$ 7,5 mil 8º: R$ 7,5 mil

Em 2017, Premiação do Mundial do jogo ‘League of Legends’ ultrapassou US$ 4 milhões

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ESPORTES

abril de 2018

A jornada Carijó de 2018

Após o Mineiro, o Tupi segue firme na preparação para o Brasileiro da série C Por Ighor Prado

Oito dias. Este foi o tempo de folga para os jogadores do Tupi, após serem eliminados na semifinal do Campeonato Mineiro de 2018, diante do Cruzeiro. Apesar da eliminação, diretoria, comissão técnica e torcedores comemoraram bastante a classificação na tabela: ficando atrás apenas das três equipes da capital. Em 4º lugar, o Tupi conquistou não apenas o título de campeão do interior, mas também uma vaga na Copa do Brasil de 2019, competição que não disputa desde 2015.

Na segunda feira, dia 2 de abril, exatos oito dias após o revés para o Cruzeiro, a equipe alvinegra se reapresentou no centro de treinamento de Santa Terezinha, visando a estreia na Série C do Brasileirão. O treinador Ricardo Leão, toda a comissão e o diretor de futebol Nicanor Pires tiveram uma conversa de cerca de 15 minutos com os jogadores, explicando o projeto para a continuidade da temporada 2018. Após o bate-papo, os atletas seguiram para o treinamento, passando por testes físicos no gramado, e realizaram atividades com bola em campo reduzido. O lateral Afonso voltou e retomou as ativida-

des com o grupo após lesão. Renato Kayser, Francesco e Tiaguinho se apresentaram no dia seguinte, terça-feira. Como todo time das divisões inferiores do Campeonato Brasileiro, ao término do Estadual, o vai e vem do mercado começa a ficar agitado, com perda de jogadores que tiveram destaque na última competição disputada, e a chegada de reforços para fortalecer o elenco e ajudar a colocar em prática o esquema de jogo que será definido pelo treinador. Três titulares na ótima campanha no Mineiro não fazem mais parte do plantel para o Brasileiro. É o caso dos jovens Patrick Brey

e Renato Kayser, que receberam e aceitaram proposta do Cruzeiro, atual campeão do estado. A equipe celeste optou por emprestar Renato para o Atlético Goianiense, time que disputará a segunda divisão do nacional. O experiente Tchô acertou a sua transferência para o Botafogo de Ribeirão Preto, equipe treinada pelo ex-carijó Léo Condé, e que, assim como o Tupi, vai disputar a Série C do Brasileirão. Diferente dessas três baixas, os atacantes Douglas e Igor não tiveram seus contratos renovados e, por opção do clube, não fazem mais parte do elenco. Foto: Ighor Prado

Conferência de abertura com o pesquisador espanhol Ignacio Aguaded

Agindo em busca de reforços

O artilheiro está de volta Três anos. Esse foi o tempo que os torcedores alvinegros esperaram para ver o retorno de um dos xodós da equipe em 2015. Daniel Morais, carinhosamente chamado de Danigol, foi a contratação de maior destaque para a série C, mas ainda não está 100% fisicamente, e não participará da estreia na competição. Daniel acumula passagens por equipes de peso no cenário nacional, como Náutico, e recentemente, conquistou o acesso à série A do Brasileiro com o Paraná. O atacante, que na sua primeira passagem por Juiz de Fora marcou 15 gols com a camisa do Tupi, falou sobre seu retorno à cidade: “Estou muito feliz de ver todo o movimento

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Foto: Bruno Ribeiro

da torcida, que me enviou muitas mensagens, e isso me motiva a fazer novamente um bom trabalho”. Chegando para brigar pela posição com o atacante Reis, que jogou bem durante todo o Estadual, Daniel comenta: “O Tupi precisa de um grupo bom, com boas opções. O Brasileiro é um campeonato longo, e a gente precisa que todos os jogadores estejam no melhor nível para atuar, e eu estou trabalhando firme para estar o mais rápido possível à disposição do treinador e poder ajudar o Tupi”. Foto: Ighor Prado

Com a perda dos três titulares na campanha do Mineiro, a diretoria teve que sair em busca de jogadores para recompor o elenco. Para suprir essas perdas, nada melhor que contratar um bom número de reforços - e foi exatamente o que o Tupi fez. Para ocupar a posição de Tchô, o Galo repatriou o meio Diego Luis, que atuou pelo clube em 2017. Ele estava no Boa Esporte, de Varginha, e terá a função de armar o jogo. Também para o meio campo, chegaram João William (ex-Baeta e Ipatinga), Rodrigo Dantas (ex-Botafogo e Maringá) e Fábio Henrique, que veio da base do Cruzeiro. Para o ataque, dois jogadores novos, que têm a velocidade e o drible como características principais: Paulinho, de 21 anos, e também Wellington Barbosa, 23 anos, que deverá iniciar a partida diante do Tombense, no dia 14 de abril.

A visão de Leão acerca das perdas e novas contratações do Carijó

Conferência de abertura com o pesquisador espanhol Ignacio Aguaded

“Estou muito feliz de ver todo o movimento da torcida, que me enviou muitas mensagens.Isso me motiva a fazer novamente um bom trabalho” Daniel Morais

O mercado de transferências desfalcou o Tupi, mas também permitiu que o clube tivesse a oportunidade de se reforçar. O treinador Ricardo Leão, um dos responsáveis pela marcante campanha no Mineiro, comentou sobre a semana do time: “Foi uma semana positiva de trabalho, fizemos grandes treinos, de pegada, velocidade de jogo e intensidade. Tivemos um fator negativo, que foi a saída dos atletas, o que é ruim. A gente perde componentes de trabalho e sabíamos que isso iria acontecer. É um momento de transição. Esperamos que os que cheguem, cheguem logo”.

A busca de jogadores para suprir as baixas foi intensa e com rápido retorno. Mesmo com pouco tempo de contato com os reforços, Ricardo conseguiu analisar as características de três dos sete que chegaram: “O Wellington e o Paulinho são extremas que têm o arrasto e o finta, que são importantes para romper linhas e criar superioridade no ataque. O Dantas é um jogador de qualidade, faz um segundo e terceiro volantes e meia, e tem boa finalização. Ele está se entrosando com o nosso grupo e naturalmente vai ganhando espaço”.


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