Projeto Gráfico e Editoração Márcio Bertachini Digitação Leontina Lobianco Capa Detalhe de imagem do Arco de Tito, dos arquivos da Wikipédia, com permissão de uso
Composição – 1999/2000 Santo André – São Paulo Reedição – 02/2016 Atibaia – São Paulo
ministerioescrito@hotmail.com ministerioescrito.blogspot.com
Detalhe do Arco de Tito Arco triunfal erigido em comemoração à conquista de Jerusalém (70 dC) pelo imperador Tito Flávio, em 81 dC no Fórum Romano
Referências As citações bíblicas foram extraídas da Edição Revista e Corrigida (ERC) da Sociedade Bíblica do Brasil de 1994, salvo menção específica: ERA (Edição Revista e Atualizada da SBB de 1997); NTLH (Nova Tradução na Linguagem de Hoje da SBB de 2000); SBTB (Edição Corrigida e Revisada Fiel ao Texto Original da Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil de 1995). As citações bíblicas com “duplas” aspas são literais (como em “Persiste em ler” na ERC), enquanto as com aspas ‘simples’ são uma adaptação do texto original (como em ‘persistindo em ler’). Os textos demarcados por [colchetes] dentro das citações bíblicas são acréscimos do autor para uma melhor compreensão do texto. Os verbetes enfatizados foram consultados no Dicionário Brasileiro Melhoramentos, 4ª Edição, de 1968. O texto grego do Novo Testamento examinado foi o da “Trinitarian Bible Society, England, 1987 – H KΑINH ΔIAΘHKH”.
Índice Remissivo
1
2
Prólogo
09
Do Princípio
12
Lógica na Criação
21
Revelação
23
Sem forma e vazia
23
Trevas
25
Abismo
31
Dilúvio precedente
35
Resumo
39
Dos Ministérios
42
Os 3 Ministérios em Deus
44
O Pai
44
O Filho
46
O Espírito
47
Os Primeiros Seres
49
Miguel
50
Gabriel
52
Lúcifer
54
As Pedras do Peitoral e da Nova Jerusalém
54
O Sumo Sacerdote Josué
56
O Sangue derramado desde, mas conhecido antes da fundação do mundo
3
60
As exigências de um Reino
63
O Tabernáculo celeste
66
O 1º Objetivo para o Holocausto Celeste
68
O 2º Objetivo para o Holocausto Celeste
71
O 3º Objetivo para o Holocausto Celeste
72
Da Queda
74
Absalão e Satanás
75
Os 3 Céus
79
A 1ª Grande Desgraça – Devastação do Universo
82
A Ordem levítica e sacerdotal
83
A rebeldia de Israel e sua desolação
85
A 2ª Grande Desgraça – Contaminação celeste
87
A contaminação pelo morto e pelo fluxo
87
A 3ª Grande Desgraça – Um lugar vago no Céu
89
O Princípio da Substituição
90
Davi e Saul
90
Israel e a Igreja
93
Paulo ou Matias?
97
Substituir os anjos ou humilhá-los?
100
A Libertação da Terra no Jubileu
105
O Filho é empossado Sumo Sacerdote Resumo
108 110
4
Da sombra
113
A 4ª Grande Desgraça – Intromissão do Pecado
115
A Divindade do Anjo do Senhor
117
As 7 Dispensações
122
Os gentios e Israel A sequência da montagem do tabernáculo Sua tripla divisão A Arca
125 130 135 137
As 4 argolas
138
As duas varas
139
O Véu – O 1º impedimento
140
O Propiciatório – O 2º impedimento
142
O Maná, a Lei e a Vara florescida
146
Os dois anjos do propiciatório
155
A Mesa com os pães
156
O Candelabro
161
Atai a vítima da festa... levai-a!
162
As prescrições da Páscoa
164
O endurecimento de Israel e seus ramos
169
A desconcertante escolha de Caifás
172
O Altar do Incenso O Sangue e a Nuvem
176 180
O Altar do Holocausto
184
Cobre ou Bronze? O Dia da Expiação
184 188
5
Do Verdadeiro
193
A Consagração de Aarão
193
O novilho e a gordura
196
O 1º carneiro
199
O 2º carneiro
201
O movimento da oferta
203
Os predicados e exigências do Ofício Sacerdotal
2016
As Luzes e Perfeições do Cordeiro
210
Solução para a 4ª Grande Desgraça
212
Solução para a 3ª Grande Desgraça
213
Solução para a 2ª Grande Desgraça
215
Solução para a 1ª Grande Desgraça
217
Bibliografia
223
Prólogo Por muito tempo o homem achou que a Terra era o centro do Universo. E ai de quem dissesse o contrário! Estava arriscado ao martírio se não se retratasse. Mas com o passar do tempo, à medida que o Teocentrismo (Deus no centro de tudo) dava lugar ao Antropocentrismo (homem no centro), o homem percebeu que seu mundo era apenas um pequeno ponto no Universo. E fixando mais nitidamente e demoradamente seus olhos para dentro de si mesmo, esqueceu-se de seu Criador. Como uma criança, que em tudo depende de seus pais, no momento em que percebeu sua individualidade, e suas capacidades começaram a brotar, achou que seu pai já não era tão importante assim. Já podia tomar suas próprias decisões e sair conquistando o mundo. Mas por mais atarefado ou distante que o homem esteja, ele sempre se lembra da casa de seu pai. Daí essa necessidade profunda de se encontrar a Verdade suprema, seja através dos muitos dogmas religiosos, sacrifícios de todos os tipos, castigos e penitências, pensamentos e filosofias, que, em última análise, não passam de uma tentativa de retorno ao lar, quando o mundo por si só, e seus atrativos, não respondem às nossas questões mais profundas. Como disse Agostinho: “... porque nos criastes para Vós e a nossa alma vive inquieta, enquanto não descansa em Vós”. ¹ Mas podemos perguntar: Para que Deus nos criou? Por que permitiu nossa queda? Por que resolveu salvar? E quanto aos anjos que pecaram antes de nós, por que foram imediata e irremediavelmente banidos de Sua presença? Por que Deus fez caso dos homens e não dos anjos? “Porque não
foi aos anjos que sujeitou o mundo futuro, de que falamos. Mas em certo lugar testificou alguém, dizendo: Que é o ho9
mem para que dele te lembres? Ou o filho do homem, para que o visites? (Hb 2.5-6)”. Convido você, caro leitor e leitora, irmão e irmã em Cristo, a chegarmo-nos ousadamente ao mais interior do véu, caminhando confiantemente por entre os recintos sagrados do santuário celeste, e observar os santos movimentos de seus ministros, antes mesmo da existência humana, na eternidade passada. Pois lá o nosso destino foi traçado, tanto nacional, dispensacional e individualmente, “conforme o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade” (Ef 1.11). Esta história abrangerá tudo e todos, em todo o tempo, pelo menos o tempo de que a Escritura cuida. Desde Deus e o princípio da sua criação, a aventura dos anjos e dos homens, até o final de tudo, que na verdade será o recomeço de tudo, para o retorno ao Seu extenso, sábio e maravilhoso Plano Original.
10
"Quem não conhece a história passada, não compreende a história presente, nem tem as condições mínimas para antever a história futura."
1 Do Princípio
N
o princípio criou Deus os céus e a terra” (Gn 1.1). Há frase mais simples e ao mesmo tempo mais complexa do que esta, apesar de toda nossa fé?
“No princípio” é o princípio de tudo. Quem poderia afirmar com certeza o que houve lá, se nós nem estávamos lá? Mas o que diz a Escritura? “Toda a escritura é divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para redarguir, para corrigir, para instruir em justiça: para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente instruído para toda boa obra” (2 Tm 3.16). “Está escrito”, como disse Jesus várias vezes, para que permaneça fiel para sempre, imutável para sempre, Salvadora para sempre, esclarecedora para sempre, condenadora para sempre. Qual o melhor meio de um sábio preservar sua sabedoria para as gerações futuras? Deus usou nossos próprios recursos para perpetuar o conhecimento de sua Pessoa e de suas obras: a Escrita. Nada mais lógico. E é por fé nesta Palavra que me atrevo a descortinar o que havia ainda antes deste princípio, quando eu ainda só existia na mente e no plano de Deus. Há muito se discute sobre “como” e “quando” se deu o princípio de tudo. Basicamente, o mundo se divide entre duas teorias: o criacio12
nismo e o evolucionismo. O evolucionismo seria a visão de que tudo está em evolução, do inferior para o superior, do ocasional para o inteligente, e isto já leva alguns bilhões de anos. Só para lembrar que toda escolha tem um preço, ou usando uma ilustração de Jesus quando Ele ensina que “conhecereis a árvore pelos seus frutos”, é interessante notarmos que, conforme citação de Archer em seu excelente livro – “Merece confiança o Antigo Testamento?” –, “o evolucionismo de Darwin tornou-se a filosofia oficial dos principais movimentos ateus do século XX (tais como as formas mais puras do Nazismo e do Socialismo Marxista)... Levou inevitavelmente ao resultado que os conceitos de moral e de religião que se descobrem na raça humana sejam considerados a mera combinação fortuita de moléculas, não representando, portanto, qualquer realidade espiritual.” ¹ O criacionismo, por sua vez, seria a visão de que Deus, um Ser Inteligente e Poderoso, criasse com Ordem e Inteligência tudo o que vemos. Este ponto de vista parece ser mais lógico, refletindo também a nossa própria capacidade. Participaríamos de coisas que Deus não participa? O nosso próprio avanço intelectual, social e tecnológico provém do acaso ou de raciocínio e trabalho? Todo e qualquer trabalho que vamos realizar, por mais simples que seja, necessita antes ser contemplado em nossas mentes, planejado, para depois ser executado. Seria diferente com Deus, guardadas as devidas proporções? Vejamos alguns exemplos práticos desta verdade na Bíblia: “Pois qual de vós querendo edificar uma torre, não se assenta primeiro a fazer as contas dos gastos, para ver se tem com que a acabar? Para que não aconteça que, depois de haver posto os alicerces, e não a podendo acabar, todos os que a virem comecem a escarnecer dele, dizendo: este homem começou a edificar e não pôde acabar. Ou qual é o rei que, indo à guerra a pelejar contra outro rei, não se assenta 13
primeiro a tomar conselho sobre se com dez mil pode sair ao encontro do que vem contra ele com vinte mil? Doutra maneira, estando o outro ainda longe, manda embaixadores, e pede condições de paz”. Esta comparação usada por Jesus, em Lucas 14.28-32, exemplifica desígnio ou propósito escorado num planejamento minucioso anterior. Em cada vida humana presenciamos objetivos que são direcionados por planejamento, como no caso de um pequeno agricultor, descrito no Provérbio 24.27: “Prepara fora a tua obra, e apronta-a no campo, e então edifica a tua casa”. Também o rei Davi, e seu filho Salomão, quando intentaram construir uma casa ao Senhor seu Deus, tiveram invariavelmente que passar pela fase de planejamento e preparativos iniciais, como descrito em 1 Reis 5.17-18: “E mandou o rei que trouxessem pedras grandes e pedras preciosas, pedras lavradas, para fundarem a casa. E as lavravam os edificadores de Hirão e os giblitas: e preparavam a madeira e as pedras para edificar a casa.” Se nestes poucos exemplos vemos planejamento para se alcançar um alvo esperado sem surpresas, será que Deus se prestaria ao ridículo de, antes de formar tudo o que vemos, não ter planejado detalhadamente cada pequena engrenagem de sua grande Criação? Ouçamos a resposta pela Sua própria boca. “Desde a antiguidade fundaste a terra: e os céus são obra das suas mãos” (Sl 102.25). Embora Deus não tenha realizado sua grande obra com mãos palpáveis, Ele usa de elementos que nós conhecemos, pois fomos fei14
tos “à sua imagem e semelhança”. No estudo teológico, denomina-se este artifício, o de usar elementos humanos para Deus, de Linguagem Antropomórfica. “Os céus manifestam a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra de suas mãos. Um dia faz declaração a outro dia, e uma noite mostra sabedoria a outra noite. Sem linguagem, sem fala, ouvem-se as suas vozes, em toda a extensão da terra, e as suas palavras até ao fim do mundo... Ele fez a terra com o seu poder, e ordenou o mundo com a sua sabedoria, e estendeu os céus com o seu entendimento” (Sl 19.12 / Jr 51.15). Estas passagens declaram a Grandeza e a Inteligência infinitas de Deus, refletidas na grandiosidade e precisão do Universo. Assim como apreciamos a criatividade e habilidade de um Michelangelo ao estontear-nos os seus complexos afrescos e esculturas, não deveríamos apreciar a Majestade de Deus ao observarmos sua maravilhosa criação? “Lançou os fundamentos da terra, para que não vacile em tempo algum... Quem mediu com o seu punho as águas, e tomou a medida dos céus aos palmos, e recolheu numa medida o pó da terra e pesou os montes e os outeiros em balanças? Quem guiou o Espírito do Senhor? E que conselheiro o ensinou?” (Sl 104.5 / Is 40.12). Os fundamentos foram meticulosamente preparados palmo a palmo, milímetro a milímetro, átomo a átomo, como um engenheiro sabe que, numa construção complexa, um erro no fundamento pode ser a ruína certa. Isto lembra aquela conhecida ilustração em que Jesus compara o homem prudente com o insensato. “Todo aquele, pois, que ouve estas minhas palavras e as pratica, será comparado a um homem prudente, que edificou a sua casa sobre a 15
rocha; e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com ímpeto sobre aquela casa, que não caiu, porque fora edificada sobre a rocha. E todo aquele que ouve estas minhas palavras e não as pratica, será comparado a um homem insensato, que edificou a sua casa sobre areia; e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com ímpeto sobre aquela casa, e ela desabou, sendo grande a sua ruína” (Mt 7.24-27).
Com tudo isto em mente, podemos concluir pela lógica, e atestado pelo testemunho da carta áurea de Deus aos homens, que “no princípio criou Deus os céus e a terra”. Eis aqui o primeiro versículo de Gênesis, em que Deus não faz esforço algum para provar sua existência nem seu ato criativo, pois Ele É, e Ele só, como descrito em Isaías 43.13. “Ainda antes que houvesse dia, EU SOU”. Como havia dito anteriormente, os homens basicamente se dividem em dois grupos: os que creem na Criação direta de Deus, e os que creem na evolução do nada para o tudo. Embora também encontremos os que tentam conciliar as duas teorias, tentando agradar a Deus e aos homens. Mas mesmo entre os Criacionistas há muita divergência, o que não é estranho, visto a grandeza e dificuldade do assunto. Os famosos seis dias da criação, e o sétimo de descanso, sempre foram motivo de especulação entre teólogos e leitores da Escritura. Há os que creem que estes seis dias são dias literais, e os que creem que estes dias representam longos períodos de tempo que coincidiriam com as eras geológicas já tanto estudadas e comprovadas cientificamente. Aqui temos muitos problemas, dos quais vou abordar rapidamente o principal, pois não sou perito quanto à parte científica. 16
Se todo o Universo foi criado em seis dias, sendo que o homem no sexto, pela cronologia e genealogia oferecidas pela Bíblia o planeta não poderia ter mais que dez ou quinze mil anos, o que não corresponderia com a ciência, que, embora moralmente duvidosa, também não pode ser descartada. Seria hipocrisia de nossa parte recorrer constantemente ao avanço tecnológico, que nos é agradável, e desprezarmos cabalmente a ciência quando nos pareça contrária. Já está mais que comprovado cientificamente pela Geologia e estudos afins que a Terra tem milhões de anos. Mas há uma outra teoria comumente denominada ‘Teoria do Intervalo’, citada pelo Dr. Oswald Chambers no início do século XIX, antes das primeiras descobertas de fósseis e artefatos do homem préhistórico, feitas na década de 1850, em que provavelmente entre o primeiro versículo de Gênesis e o segundo versículo haja um incalculável espaço de tempo. Esta teoria, embora não muito divulgada, tenta responder a questões muito importantes que não são totalmente esclarecidas na Bíblia, ou que são esquecidas propositalmente pela dificuldade de interpretação. Não vou me ater a todas as possíveis teorias a respeito da criação, pois meu objetivo não é tocar em assuntos há muito debatidos. Além de haver escritores infinitamente bem mais capacitados para isto, mencionarei somente a Teoria do Intervalo, por ser esta, a meu ver, a que responde melhor a algumas velhas questões e que melhor se coaduna com o todo da Escritura, dentro de princípios de interpretação citados pela própria Revelação da Palavra de Deus, e que mencionarei ao longo do estudo. Antes, contudo, vale a pena ressalvar que não é mais importante 17
o conhecimento dessas Teorias que a fé depositada na Palavra de Deus. Menciono o fato porque ao iniciar a minha fé em Cristo e os meus estudos na Bíblia, cria com sinceridade que o Universo todo tivesse sido criado em seis dias. Mas conforme fui me desenvolvendo e aprendendo, percebi que ela não respondia a todas minhas indagações; mas a minha fé ainda repousa no testemunho infalível da Palavra de Deus de que tudo foi criado por intervenção direta de Deus. Porque Jesus mesmo disse: “Passará o céu e a terra, mas as minhas palavras não passarão” (Mc 13:31). Se tudo foi criado em seis dias, ou seis longos períodos de tempo, com ou sem intervalo, ou algo novo que ainda não alcançamos, o que importa, como disse Paulo, é Cristo, e este crucificado por nossos pecados. Embora a Palavra de Deus não possa desmentir a realidade. Retornando então ao que foi dito, a Palavra de Deus assevera que “no princípio criou Deus os céus e a terra”. O segundo versículo de Gênesis diz por sua vez que “a terra, porém, era sem forma e vazia, e havia trevas sobre a face do abismo. E o Espírito de Deus se movia por sobre as águas”. Se crermos que aqueles seis dias são o começo absoluto da criação dos céus e da terra, teremos então de admitir que Deus começou sua criação com o seguinte projeto arquitetônico para o planeta: não havia forma, estava vazia, havia trevas e uma “face do abismo” de difícil interpretação. Para ajudar, havia uma como que ‘tsunami’ global. Eu havia dito há pouco que me basearia em princípios de Interpretação ditados pela própria Palavra de Deus, e isto também segue uma lógica. Quando se compra algum produto eletrônico sofisticado, a primeira coisa que vamos fazer é dar uma olhada no Manual de Instru18
ções, já que é o fabricante que tem as melhores condições e o dever de nos ensinar como o produto deve funcionar. Jamais o consumidor deve alterar a forma de funcionamento do produto, ou certamente acabará por danificá-lo. Encaro a Bíblia da mesma forma. Se ela é a Carta de Deus aos homens, e que fala de assuntos complexos e invariavelmente com propósitos bem acima de nosso cotidiano egoísta, também deve conter o Manual de Instruções para seu perfeito funcionamento, que são os Princípios de Interpretação. É porque não se segue estes Princípios que vemos uma Igreja dividida em tantas denominações e dogmas, tantas manifestações teológicas incongruentes, tantos egos elevados. Esquece-se de um princípio fundamental ditado por Cristo, quando diz que “toda cidade, ou casa dividida contra si mesma não subsistirá” (Mt 12.25). Antes, porém, vamos analisar esta questão de forma puramente racional e lógica, e depois com o apoio da Escritura. Vou começar pela lógica por ser este argumento natural a todos nós, independente da Revelação Específica de Deus. Embora a lógica possa ser prejudicada por preconceitos vários, ela se encontra naturalmente em todos nós, ainda que em vários estágios. Deve-se lembrar, porém, que o argumento lógico deve ser encarado como um subsídio de demonstração, mas que jamais deve se sobrepor à Revelação Específica de Deus. A Revelação é que deve direcionar, ou mesmo redirecionar, o argumento lógico, para que este cumpra o papel simples de atestar, de concordar, de aceitar a Revelação. Portanto, se a lógica não concordar com a Revelação, é porque ela está deturpada por algum motivo, e deve retornar à sua posição primária em obediência à Revelação. Para quem acha que não há lugar para raciocínio ou inteligência 19
lógica no culto de adoração a Deus, deveria examinar estas passagens: “Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional” (Rm 12.1). Um Deus racional, inteligente, deve ser adorado à altura. “Que farei, pois? Orarei com o espírito, mas também orarei com o entendimento; cantarei com o espírito, mas também cantarei com o entendimento” (1 Co 14.15). Aqui se vê a interação entre a espiritualidade e a inteligência. A espiritualidade não deve cegar nosso entendimento, antes, deve alargálo, como demonstra Paulo em Efésios 1.17-18. “... para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos dê em seu conhecimento o espírito de sabedoria e de revelação, tendo iluminados os olhos do vosso entendimento, para que saibais qual seja a esperança da sua vocação, e quais as riquezas da glória da sua herança nos santos...” Vemos de novo a união da ‘sabedoria e da revelação, para que saibais’. A revelação deve alargar o conhecimento para enxergarmos o que antes estava muito distante. A aceitação, porém, de uma revelação sem base lógica ou racional poder-se-ia dizer que se trata de fanatismo religioso. Dito isto, podemos começar uma análise lógica e racional para o problema da criação original, passando depois para o testemunho da Palavra de Deus.
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Lógica na criação Sem o testemunho da Escritura, parece-nos lógico e mesmo razoável crermos em um Deus Onipotente, Onisciente e Onipresente. Não haveria nada que Ele não pudesse fazer, ou então não poderia ter controle sobre todo o Universo. Não haveria nada que Ele não pudesse conhecer, ou então Lhe faltaria sabedoria para agir soberanamente. Não haveria nenhum lugar onde Ele não pudesse estar, ou então este lugar estaria fora de Seu domínio. Se temos uma noção instintiva e universal de um Deus nestas proporções, como poderíamos admitir que este Deus Maravilhoso e Santo, cheio de Amor, pudesse começar nossa habitação, a Terra, sem forma, vazia, com uma face do abismo em trevas, e encoberta por águas? Esta visão não parece mais uma construção paralisada por falta de verba ou competência, como estamos acostumados a ver, deixada ao relento e aos roedores em meio ao capim que cresce em seus alicerces? Parece ilógico coadunar um Deus Criador de Ordem e Propósito com expressões tão negativas como trevas, abismo, dilúvio, vazia. Se isso for possível, teremos de admitir que Deus seja o criador das trevas e do abismo, e que o Espírito de Deus pairou sobre este dilúvio inicial ocasionado por Ele mesmo. Qual a razão lógica em começar algo assim, se Ele é o dono de todo o poder? Ou então, numa segunda hipótese mais coerente, Deus, implicando e escorado em todas as Suas Santas Características e Peculiaridades, formou os céus e a Terra em Caráter perfeito, de forma instan21
tânea e madura. Então, se pouparmos Deus da criação e promoção direta das trevas, abismo, águas inundantes e ambiente sem forma, há que se considerar a possibilidade de um agente externo oposto e contrário à vontade do Criador, que de alguma forma se intrometesse em Seu plano, por Sua permissão onisciente, contaminando Sua Criação Original, sendo, portanto, o verdadeiro responsável por aquele estado deplorável. Assim como em nosso mundo físico percebemos e convivemos com forças antagônicas, o bem e o mal, a justiça e a injustiça, provavelmente no ambiente celestial também houvesse algo ou alguém que se opusesse à Perfeição e Santidade de Deus. Podemos perceber este antagonismo, como reflexo, em nosso próprio desenvolvimento físico, ao sermos abalados por agentes externos que não temos controle, como as disfunções orgânicas várias, os agentes bacterianos e a própria morte. Também no campo intelectual, e principalmente no moral, vemos uma oposição brutal, e que provavelmente parte daquele mesmo inimigo que se incita contra Deus desde o princípio da criação. E este ser avesso, em luta aberta e franca contra Deus, além de levar à destruição uma possível ordem universal anterior a esta, tem infectado toda a criação desde o princípio. A questão então se divide em dois pontos: ou Deus é o criador das trevas, ou as trevas se colocaram entre Deus e seu plano original. Visto que pela lógica não podemos imputar a Deus a criação direta das trevas, no sentido de que Ele pudesse dizer a respeito dela que “era boa”, inundemos de luz o quarto escuro e limitado do raciocínio, observando o que está escrito.
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Revelação Se a dificuldade da lógica se encontra nas palavras trevas, abismo, águas inundantes, sem forma e vazia, então essas mesmas palavras deveriam ser examinadas à luz da Revelação, em suas várias aparições pelo texto bíblico, sempre dentro do seu contexto próprio, pois texto sem contexto é pretexto. O que estas expressões insinuarem através de suas várias ocorrências, deverá ser transportado na mesma proporção para sua primeira aparição, “olho por olho, dente por dente”. É o que faremos a seguir. Seguindo pela ordem do texto Sagrado, vemos no 2º verso de Gênesis: “E a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo; e o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas”.
Sem forma e vazia Como já foi notado por grandes teólogos bíblicos, a expressão sem forma e vazia é a tradução do hebraico tohu wabohu, encontrado em algumas passagens que denotam um estado caótico devido ao julgamento Divino. Em sua Bíblia anotada², o Dr. Scofield coloca três textos exemplificando esta questão. “Porque assim diz o Senhor que tem criado os céus, o Deus que formou a terra, e a fez; ele a estabeleceu, não a criou vazia [tohu], mas a formou para que fosse habitada” (Is 45.18). Se Deus não a fez para ser um caos, subentende-se que este esta23
do não fazia parte de Sua Vontade Original. “Porque será o dia da vingança do Senhor, ano de retribuições pela luta de Sião... E ele estenderá sobre ela cordel de confusão e nível de vaidade [tohu... wabohu]” (Is 34.8,11). Tendo-se o cuidado de ler o contexto, veremos Deus usando esta expressão como consequência de julgamento da nação de Edom, por seus maus tratos a Israel. “Deveras o meu povo está louco, já não me conhece; são filhos néscios, e não entendidos; sábios são para mal fazer, mas para bem fazer nada sabem. Observei a terra, e eis que estava assolada e vazia [tohu wabohu]; e os céus, e não tinham a sua luz” (Jr 4.22.23). Aqui, o profeta Jeremias antecipa a destruição de Jerusalém por seus muitos pecados, antevendo sua destruição total pelo Império Babilônico em 586 a.C., e muito bem registrado pela história. Nestes três casos, vemos que a expressão tohu wabohu refere-se a um estado de calamidade advindo de um julgamento prévio por Deus, o que nos leva a deduzir que o estado caótico encontrado logo após a criação dos céus e da terra, também sejam resultado de um julgamento ou castigo Divino.
Apesar desta colocação feita por tão renomadas autoridades, talvez para muitos não fale com a devida propriedade, devido à falta de conhecimento da língua hebraica. Mas se Deus não faz acepção de pessoas, como está escrito, temos que encontrar provas mais convincentes dentro de nossa própria capacidade intelectual, ou seja, dentro de nossa própria língua.
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Trevas O segundo relato notável a respeito das trevas encontra-se em Êx 10.21-23, quando Deus castiga a nação do Egito por não querer deixar Israel sair ao deserto. Note que, no entanto, Israel permanecia em luz. “Então disse o Senhor a Moisés: Estende a tua mão para o céu, e virão trevas sobre a terra do Egito, trevas que se apalpem. E Moisés estendeu a sua mão para o céu, e houve trevas espessas em toda a terra do Egito por três dias. Não viu um ao outro, e ninguém se levantou do seu lugar por três dias; mas todos os filhos de Israel tinham luz em suas habitações”. Este mesmo castigo com trevas poderá ser visto pelos rebeldes impenitentes durante a tribulação no reinado próximo do anticristo, aquele a quem eu chamo de ‘o filho primogênito da globalização’.
“E o quinto anjo derramou a sua taça sobre o trono da besta, e o seu reino se fez tenebroso; e eles mordiam as suas línguas de dor” (Ap 16.10). “... porque o dia do Senhor vem, ele está perto: dia de trevas e tristeza; dia de nuvens e de trevas espessas... O sol se converterá em trevas, e a lua em sangue, antes que venha o grande e terrível dia do Senhor” (Jl 2.1-2,31). “Ai daqueles que desejam o dia do Senhor! Para que quereis vós este dia do Senhor? Trevas será e não luz... Não será pois o dia do Senhor trevas e não luz? Não será completa escuridade sem nenhum resplendor?” (Am 5.18,20). “E, logo depois da aflição daqueles dias, o sol escurecerá, e a lua não dará a sua luz, e as estrelas cairão do céu, e as potências dos 25
céus serão abaladas. Então aparecerá no céu o sinal do Filho do homem” (Mt 24.29-30), nas palavras do próprio Senhor Jesus. Vejamos agora algumas exortações para que o homem deixe o mundo das trevas. Sinta o teor espiritualmente negativo em todas as citações a seguir. “A candeia do corpo são os olhos; de sorte que, se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo terá luz; se, porém, os teus olhos forem maus, o teu corpo será tenebroso. Se, portanto, a luz que há em ti são trevas, quão grandes serão tais trevas!” (Mt 6.22-23). “E a condenação é esta: que a luz veio ao mundo, e os homens amaram mais as trevas do que a luz, porque as suas obras eram más. Porque todo aquele que faz o mal aborrece a luz, e não vem para a luz para que as suas obras não sejam reprovadas. Mas quem pratica a verdade vem para a luz, a fim de que as suas obras sejam manifestas, porque são feitas em Deus” (Jo 3.19-21). Aqui, além da diferença gritante entre luz e trevas, percebe-se que luz se refere a boas obras, enquanto trevas referem-se a obras más. “Falou-lhes pois Jesus outra vez, dizendo: Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida” (Jo 8.12). “Eu sou a luz que vim ao mundo, para que todo aquele que crê em mim não permaneça nas trevas” (Jo 12.46). “A noite é passada e o dia é chegado. Rejeitemos pois as obras das trevas, e vistamo-nos das armas da luz” (Rm 13.12). “Portanto nada julgueis antes de tempo, até que o Senhor venha, 26
o qual trará também à luz as coisas ocultas das trevas” (1 Co 4.5). “Porque Deus, que disse que das trevas resplandecesse a luz, é quem resplandeceu em nossos corações, para iluminação do conhecimento da glória de Deus, na face de Jesus Cristo” (2 Co 4.6). Nesta passagem iluminada, vemos o paralelo perfeito entre as trevas da criação e as trevas do coração. Assim como Cristo nos tirou das trevas do pecado, como visto acima, Deus retirou a terra das trevas do castigo, dizendo: “Haja luz. E houve luz” (Gn 1.3). “Porque noutro tempo éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor: andai como filhos da luz” (Ef 5.8). “Dando graças ao Pai que nos fez idôneos para participar da herança dos santos na luz; o qual nos tirou da potestade das trevas, e nos transportou para o reino do Filho do seu amor” (Cl 1.12-13). “Quem há entre vós que tema a Jeová, e ouça a voz do seu servo? Quando andar em trevas, e não tiver luz nenhuma, confie no nome do Senhor, e firme-se sobre o seu Deus” (Is 50.10). Assim como o homem pecador que não se arrepende permanece nas trevas do conhecimento espiritual, se ele morrer nestas condições receberá as mesmas trevas como castigo. “Mas eu vos digo que muitos virão do oriente e do ocidente, e assentar-se-ão à mesa com Abraão, e Isaque, e Jacó, no reino dos céus; e os filhos do reino serão lançados nas trevas exteriores: ali haverá pranto e ranger de dentes” (Mt 8.11-12). Aqui, Jesus mostra a condenação eterna dos filhos rebeldes do povo de Israel que crucificaram o seu Messias, e a oportunidade que 27
Deus dá aos demais povos ao arrependimento, agora no Messias ressurreto. “Tendo os olhos cheios de adultério, e não cessando de pecar, engodando as almas inconstantes, tendo o coração exercitado na avareza, filhos de maldição; os quais, deixando o caminho direito, erraram seguindo o caminho de Balaão, filho de Bosor, que amou o prêmio da injustiça; mas teve a repreensão da sua transgressão; o mudo jumento, falando com voz humana, impediu a loucura do profeta. Estes são fontes sem água, nuvens levadas pela força do vento: para os quais a escuridão das trevas eternamente se reserva” (2 Pe 2.14-17). “Ai deles! Porque entraram pelo caminho de Caim, e foram levados pelo engano do prêmio de Balaão, e pereceram na contradição de Coré. Estes são manchas em vossas festas de amor, banqueteandose convosco e apascentando-se a si mesmos sem temor: são nuvens sem água, levadas pelos ventos de uma para outra parte: são como árvores murchas, infrutíferas, duas vezes mortas, desarraigadas; ondas impetuosas do mar, que escumam as suas mesmas abominações: estrelas errantes, para os quais está eternamente reservada a negrura das trevas” (Jd 11-13). Também certa categoria de anjos já foi condenada às trevas devido à sua enorme rebeldia. Leia o contexto para uma melhor compreensão. “Porque se Deus não perdoou aos anjos que pecaram, mas havendo-os lançado no inferno, os entregou às cadeias da escuridão, ficando reservados para o juízo” (2 Pe 2.4). “E aos anjos que não guardaram o seu principado, mas deixaram a sua própria habitação, reservou na escuridão, e em prisões eternas até ao juízo daquele grande dia...” (Jd 6). 28
Mas profundamente triste foi o próprio Senhor Jesus Cristo ter experimentado o abandono de Deus nas trevas, por nossos pecados. “E, chegada a hora sexta, houve trevas sobre toda a terra até a hora nona. E à hora nona, Jesus exclamou com grande voz, dizendo: Eloi, Eloi, lama sabactâni? Que, traduzido, é: Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste?” (Mc 15.33-34). Parece lógico supor, após analisarmos todas estas passagens, que as trevas, seja no sentido físico, seja no sentido espiritual, retratem, na realidade, o castigo sobre o pecado e a desobediência. Mas resta ainda observarmos algumas passagens mais esclarecedoras. “E esta è a mensagem que dele ouvimos, e vos anunciamos: que Deus é luz, e não há nele trevas nenhumas” (1 Jo 1.5). Esta declaração é óbvia demais. Se Deus é luz, e nele não há trevas nenhumas, como pôde Ele ter feito a terra em trevas? As trevas são o oposto da própria essência Divina. Portanto, é obvio que as trevas, descritas em Gênesis, são resultado do pecado, e visto que o pecado não pode partir de Deus, já que “Santo, Santo, Santo é o Senhor dos Exércitos” (Is 6:3), alguém mais estava presente no dia da criação, e que de alguma forma foi o responsável pelo pecado e pelo julgamento de toda a terra. Há ainda outra declaração que mostra bem a separação intransponível entre luz e trevas. “Não vos prendais a um jugo desigual com os infiéis; porque, que sociedade tem a justiça com a injustiça? E que comunhão tem a luz com as trevas?” (2 Co 6.l4).
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Então se Deus é luz, como poderia ter Ele partilhado das trevas no princípio da Sua criação? Mas não precisamos nos prender ao passado ou mesmo só ao presente; também nos foi revelado o futuro, já que é o Hoje de Deus. Quando Deus tiver condenado todos os ímpios e impenitentes, e do outro lado, limpado dos nossos olhos toda lágrima, a lágrima da vergonha do pecado, Deus então erguerá uma Nova Cidade. “E levou-me em espírito a um grande e alto monte, e mostroume a grande cidade, a santa Jerusalém, que de Deus descia do céu... E nela não vi templo, porque o seu templo é o Senhor Deus Todo Poderoso, e o Cordeiro. E a cidade não necessita de sol nem de lua, para que nela resplandeçam, porque a glória de Deus a tem alumiado, e o cordeiro é a sua lâmpada; e as nações andarão à sua luz; e os reis da terra trarão para ela a sua glória e honra... E ali não haverá mais noite, e não necessitarão de lâmpada nem de luz do sol, porque o Senhor Deus os alumia; e reinarão para todo o sempre” (Ap 21.10,22-24; 22.5). Assim, vemos as trevas banidas da presença de Deus, e, em seu lugar, a luz natural do Cordeiro, que disse: “Eu sou a luz do mundo” (Jo 8:12). Ele alumiará não só a Terra, mas todo o novo Universo. Seria, na mesmíssima proporção, indigno do caráter santo de Deus a presença, daquilo que será banido eternamente, na criação original. Resta ainda examinar e esclarecer uma outra passagem. “Eu formo a luz e crio as trevas; eu faço a paz, e crio o mal; eu, o Senhor, faço todas estas cousas” (Is 45.7). Olhando esta declaração isoladamente, pode parecer que luz e trevas são criações semelhantes de Deus. Mas lembre-se: texto sem 30
contexto é pretexto. Se, como vimos, Deus é luz, e nele não há trevas nenhumas, então Ele não pode ter criado as trevas, tanto quanto o mal, de Sua Própria Natureza, mas como justiça e juízo sobre o pecado e a desobediência. Citando o Dr. Scofield, “Deus fez a tristeza e a desgraça como frutos certos do pecado”.³ Creio que somente a análise da palavra trevas em toda a Bíblia é mais que suficiente para entendermos que Deus criou os céus e a terra de forma pura e santa. Mas que devido à introdução do pecado, que veremos mais a frente, Deus condenou a Terra à escuridão, sem forma e vazia, e encoberta pelas águas como castigo. Daí, o famoso relato da criação em seis dias, na verdade, tratar-se da reconstrução do mundo abalado. Mas não podemos ainda nos satisfazer. Temos que analisar as outras duas expressões marcantes.
Abismo Lembre-se de que havia trevas sobre a face do abismo, as mesmas trevas analisadas há pouco, portanto, o abismo também não pode ser coisa boa. Embora a palavra abismo seja a tradução de pelo menos duas palavras do grego, que não será estudado aqui, é interessante notar que em qualquer dos casos, o abismo reporta ao castigo divino. Observemos. “E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tão pouco os de lá passar para cá” (Lc l6.26). A famosa história do rico e Lázaro levados ao lugar chamado 31
Hades, no grego, que era o lugar dos mortos na mitologia grega, neste triste sítio havia um abismo intransponível entre os salvos e perdidos. Leia todo o contexto de Lucas 16. Fazendo um breve parêntesis, não se deve crer aqui que se trate de uma parábola. E mesmo que fosse uma parábola, deveria ser entendido como algo literal, realmente acontecido, pois “Deus não é homem para que minta”. Quando lemos, por exemplo, Jesus dizendo: “Houve um certo homem...”, este homem certamente existiu, pois saiu da mesma boca que disse: “Haja luz. E houve luz”. “Sempre seja Deus verdadeiro, e todo homem mentiroso” (Rm 3.4). Uma parábola nada mais é que uma história contemplada pelo Deus Onisciente e Onipresente, tão real e verdadeira quanto a história de Paulo, Pedro, eu ou você, usada como exemplo ou ilustração de uma realidade espiritual. Lembre-se: “Se vos falei de coisas terrestres, e não crestes, como crereis, se vos falar das celestiais?” (Jo 3.12). Mas aqui não se trata de uma parábola. Aqui se vê uma história ao vivo contada como advertência para o destino dos homens na época, que recusavam o teor espiritual da Lei de Moisés e dos Profetas. E a diferença entre uma parábola (ou comparação) e uma história específica está no nome dado ao homem pobre da história: Lázaro. Em nenhuma parábola se menciona o nome do personagem, a não ser aqui, uma história direta e literal. Esta história, e juntamente todas as parábolas, são literais e verdadeiras, vividas pelos personagens sem nome, mas contempladas pelo “Pai que vê em oculto” (Mt 6.18). Daquele que disse, “Eu sou a verdade” (Jo 14.6), não pode sair nenhuma mentira ou uma história da carochinha para ilustrar uma realidade espiritual tremenda. 32
Mas voltemos à história. Aquele abismo que separava os salvos dos ímpios no Hades, ou lugar dos mortos, na época da Lei, antes do sacrifício do Filho de Deus por nossos pecados, separava, conforme a descrição, dois recintos: o lado de Abraão, que confortava Lázaro e os da mesma sorte, do lado do sofrimento, no qual estava o rico e muitos outros. Não vamos nos deter na questão doutrinária. Se o leitor se interessar pelo assunto, pode ler um livreto deste mesmo autor que trata detalhadamente, com inúmeras passagens citadas, sobre “O Lugar dos Mortos’. O que queremos demonstrar é que o abismo fazia separação cirúrgica no Lugar dos mortos, separando o tecido são do necrótico, nas partes mais baixas da terra, e que um grupo de homens sofria ardentemente pelos seus pecados, representado pelo homem rico sem nome. Este mesmo abismo também está relacionado ao julgamento de certo anjo, e também na tribulação vindoura. “E o quinto anjo tocou a sua trombeta, e vi uma estrela que do céu caiu na terra; e foi-lhe dado a chave do poço do abismo. E abriu o poço do abismo, e subiu fumo do poço, como o fumo de uma grande fornalha, e com o fumo do poço escureceu-se o sol e o ar. E do fumo vieram gafanhotos sobre a terra; e foi-lhes dado poder, como o poder que têm os escorpiões da terra. E foi-lhes dito que não fizessem dano à erva da terra, nem a verdura alguma, nem a árvore alguma, mas somente aos homens que não têm nas suas testas o sinal de Deus... E tinham sobre si rei, o anjo do abismo; em hebreu era o seu nome Abadom, e em grego Apoliom (Destruidor)” (Ap 9.1-4,11). Aqui, vemos gafanhotos representando demônios, que sobem do abismo para atormentar a última geração humana no auge de sua rebe33
lião contra Deus, e que provavelmente são os mesmos anjos que estiveram presos em cadeias para o dia do juízo, descritos em Jd 6 e 2 Pe 2.4. “A besta que viste foi e já não é, e há de subir do abismo, e irá a perdição; e os que habitam na terra (cujos nomes não estão escritos no livro da vida, desde a fundação do mundo) se admirarão vendo a besta que era e já não é, mas que virá” (Ap 17.8). Vemos que a própria besta, filho legítimo de Satanás em sua imagem e semelhança, ressuscita do abismo. Sobre esta ressurreição macabra, o leitor pode se inteirar lendo outro livro deste escritor: ‘Mistério, a grande Jerusalém’. “E vi descer do céu um anjo, que tinha a chave do abismo, e uma grande cadeia na sua mão. Ele prendeu o dragão, a antiga serpente, que é o Diabo e Satanás, e amarrou-o por mil anos. E lançou-o no abismo, e ali o encerrou, e pôs selo sobre ele, para que mais não engane as nações, até que os mil anos se acabem. E depois importa que seja solto, por um pouco de tempo” (Ap 20.1-3). O próprio Satanás será preso no abismo por tempo já determinado de mil anos, logo após sua ação maléfica na tribulação. Mas temos um texto interessante em Lc 8:31 (leia o contexto do versículo 26 ao 33), em que os demônios possuindo um certo homem, à repreensão de Jesus, “rogavam-lhe que os não mandasse para o abismo”. Certamente estes demônios viram na eternidade passada seus irmãos sendo lançados no abismo, e sabiam o que lhes esperava se para lá fossem enviados. Lembre-se de Jd 6 e 2 Pe 2.4. Como em linguagem figurada, “a manada precipitou-se de um despenhadeiro no lago” (Lc 8.33), insinuando a prisão futura destes demônios, por ordem do Senhor, para o início do reino milenar de Cristo. 34
Todas estas passagens mostram com clareza que o abismo está relacionado a lugar de julgamento, e não seria diferente quando o abismo estava escancarado no princípio da criação, pois o Espírito de Deus pairava por sobre as águas e podia-se ver sua face desnuda.
Dilúvio precedente
Analisando este quarto e último ponto referente à criação original, demonstramos de forma cabal o ambiente caótico da criação como consequência de julgamento do pecado. O primeiro relato de um dilúvio encontra-se na famosa história de Noé e sua arca. “E viu o Senhor que a maldade do homem se multiplicara sobre a terra, e que toda a imaginação dos pensamentos do seu coração era só má continuamente. Então se arrependeu o Senhor de haver feito o homem sobre a terra, e pesou-lhe em seu coração... Porque eis que eu trago um dilúvio de águas sobre a terra, para desfazer toda a carne em que há espírito de vida debaixo dos céus: tudo o que há na terra expirará” (Gn 6.5-6,17). O motivo para tamanha destruição deveria ser de peso. Nada mais que rebeldia profunda e falta de arrependimento poderiam trazer consequências tão graves. Esta declaração tão contestada pelos homens sábios de todas as gerações foi confirmada pelo próprio Senhor Jesus, de quem ‘ninguém é digno de desatar a correia da alparca’ (Jo 1.27). “Porquanto, assim como nos dias anteriores ao dilúvio, comiam, bebiam, casavam e davam-se em casamento, até ao dia em que Noé 35
entrou na arca, e não o perceberam, até que veio o dilúvio, e os levou a todos – assim também será a vinda do Filho do homem” (Mt 24.3839). Uma passagem interessante relaciona três castigos como consequência de rebeldia: sobre os anjos lançados nas trevas, o mundo humano sob o dilúvio e a destruição de Sodoma e Gomorra sob cinzas. “Porque, se Deus não perdoou aos anjos que pecaram, mas, havendo-os lançado no inferno, os entregou às cadeias da escuridão, ficando reservados para o juízo; e não perdoou ao mundo antigo, mas guardou a Noé, pregoeiro da justiça, com mais sete pessoas, ao trazer o dilúvio sobre o mundo dos ímpios; e condenou à subversão as cidades de Sodoma e Gomorra, reduzindo-as a cinza, e pondo-as para exemplo aos que vivessem impiamente...” (2 Pe 2.4-6). Uma outra passagem interessante, que sob um olhar mais rápido e descuidado pareceria se tratar do dilúvio de Noé, não necessariamente se reporta a ele. “Bendize, ó minha alma ao Senhor: Senhor Deus meu, tu és magnificentíssimo, estás vestido de glória e de majestade. Ele cobre-se de luz como de um vestido, estende o céu como uma cortina. Põe nas águas os vigamentos das suas câmaras; faz das nuvens os seus carros, anda sobre as asas do vento. Faz dos ventos seus mensageiros, dos seus ministros um fogo abrasador. Lançou os fundamentos da terra, para que não vacile em tempo algum. Tu a cobres com o abismo, como com um vestido: as águas estavam sobre os montes; à tua repreensão fugiram, à voz do teu trovão se apressaram” (Sl 104.1-7). A sequência do relato parece sugestiva e coerente com o todo da Escritura. No 1º verso vemos o próprio Deus, em glória e majestade, vestido da luz. Em seguida, estende os céus. Após, cria os ministros, 36
seus anjos. Então lança os fundamentos da terra. Tudo ia bem. Não poderiam, sem intervenção estranha, vacilar jamais. Mas de repente, ela é coberta com o abismo, e os montes são cobertos por águas, descrição conforme o estado do intervalo de Gênesis. Aqui parece ser forçoso e simplista uma interpretação favorável ao Dilúvio de Noé; primeiramente pelo contexto citado, e depois pela declaração do verso 7: “à tua repreensão fugiram, à voz do teu trovão se apressaram.” No dilúvio de Noé, as águas abaixam naturalmente, enquanto aqui parece ser um caso de atuação poderosa “à tua repreensão”, que coincide com a narrativa encontrada em Gn 1.9-10. O que nos leva a crer que entre os versos 5 e 6 do Salmo referido, haja um acontecimento oculto, que coincide com o espaço de tempo entre o 1º e 2º versos da criação dos céus e terra em Gênesis. Mas o que importa aqui, a esta altura, é o fato de que o dilúvio de Noé foi devido ao julgamento de Deus sobre uma humanidade pecaminosa e perversa, assim como o dilúvio em que a Terra se encontrou depois da criação original. Analisados estes quatro importantes pontos, gostaria apenas de fazer uma ressalva quanto ao texto original, que poucos podem perceber, mas quando percebem não dão seu devido valor. Iniciamos este estudo transcrevendo as primeiras palavras de abertura do texto sagrado. Estamos tão acostumados a elas que qualquer outra coisa soa mal aos ouvidos. Mas o original hebraico assim inicia. “Em um princípio criou Deus os céus e a terra”. Na língua original não há a ideia de definição exata de quando seria este princípio, ou seja, ela dá a entender que é somente mais um dos princípios de Deus. Ou seja, a própria Escritura não afirma em seu texto original que aquele princípio seja o ponto de partida de tudo, assim como os seis dias da criação são apenas outro princípio. 37
É bem verdade que o hebraico do Antigo Testamento foi escrito somente com suas consoantes, e que os massoretas bem mais tarde adicionaram as vogais, que indicariam o artigo definido ‘o’ ou indefinido ‘em’. Mas os massoretas foram fiéis à tradição oral corrente à época, pois seria muito mais simples reescrever “No princípio”, que querer complicar com algo indefinido “Em um princípio”, pois ninguém teria aceitado tal interpretação. Seria o mesmo que confundir “o Deus de Israel” com “um Deus de Israel”. Mas o santo Escritor, na Sua infinita sabedoria e com todo o zelo pela Sua bendita Palavra, usou esta mesma linguagem no Novo Testamento, agora em língua grega, para não haver desculpas quanto às nossas falhas e teimosias. “Em um [não há artigo definido no original] princípio era o Verbo” (Jo 1.1). O Verbo Divino também está situado em um de Seus inúmeros e soberanos princípios.
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Resumo Queríamos demonstrar, primeiramente através da lógica, e depois pela interpretação das Escrituras, que não era compatível com o caráter de Deus uma criação original cujos componentes descritos na narrativa inicial de Gênesis fossem tão negativos. Analisamos então, comparativamente, ao longo da Escritura, os quatro termos usados na narração: sem forma e vazia, trevas, face do abismo e águas inundantes. Nas cerca de 40 passagens descritas para comparação, os quatro termos estão sempre em conexão com castigo e julgamento divinos, e mais ainda, as quatro expressões são resultado físico e/ou espiritual diretos do pecado da rebeldia. Tudo o que vimos até aqui corrobora dignamente com o enunciado de Tiago: “Toda a boa dádiva e todo o dom perfeito vem do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não há mudança nem sombra de variação” (Tg 1.17). Agora deposite estas inspiradas expressões positivas – boa, dádiva, dom, perfeito, luzes – combinadas às de formato negativo – não há mudança nem sombra de variação – de um lado da balança celeste, e – sem forma, vazia, trevas, abismo, águas inundantes – do outro lado. Para qual lado ela penderá? E de que lado o leitor penderá? “Balanças justas, pedras justas, efa justo, e justo him tereis” (Lv 19.36). “O peso e a balança justa são do Senhor; obra sua são todas as 39
pedras da bolsa” (Pv 16.11). Todas as pedras de sua bendita bolsa são tão iluminadas quanto seu bendito caráter. A pedra de esquina em que foi assentado o mundo não pode ter sido retirada de outro lugar. Reforce sua fé ouvindo este mesmo testemunho sob outra perspectiva, não menos iluminada e inspirada.
“Tudo de bom que recebemos e tudo que é perfeito vêm do céu, vêm de Deus, o Criador das luzes do céu. Ele não muda, nem varia de posição, o que causaria a escuridão” (Tg 1.17 – NTLH). Ou Ele trouxe o caos porque Ele mudou, porque variou de posição, porque deixou momentaneamente de Ser o que É, ou Ele se viu obrigado a julgar o mundo de então, condenando-o às trevas e ao longo abandono, exatamente por ser Ele o Pai das luzes e não poder variar de posição. Descansados nesta mesma personalidade santa invariável, podemos aguardar confiantes que o Senhor a tudo e a todos novamente julgará, pois “o dia do Senhor virá como o ladrão de noite; no qual os céus passarão com grande estrondo, e os elementos, ardendo, se desfarão, e a terra e as obras que nela há, se queimarão” (2 Pe 3.10).
Portanto, em um princípio não definido, criou Deus os céus e a Terra, de forma pura, santa, apta para algum propósito inicial perfeito, “para que não vacile em tempo algum”. Somente alguém com personalidade marcante poderia se confrontar com Deus, a ponto de ‘forçar’ Deus a introduzir os quatro elementos de castigo. Daí uma terra sem forma e vazia, havendo trevas sobre a face do abismo, e o Espírito de Deus pairando por sobre as águas que cobriam 40
toda a Terra. Neste intervalo de tempo incomensurável, neste estado de profundo coma em que nosso futuro lar se encontrava, entre o 1º e o 2º versículos de Gênesis, é que temos de encontrar os motivos mais profundos, segundo a Lei, para tamanho julgamento. É o que faremos a seguir.
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2 Dos Ministérios
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ara aqueles que creem que a Bíblia é a Palavra ou Revelação de Deus para seus filhos, fica fácil encontrar o vilão de toda a história da criação. Para aqueles que somente creem quando contemplam com os olhos físicos, “entre as zombarias sobre o diabo e as zombarias sobre o Redentor existe apenas um pequeno passo” . ¹ Disse Jesus: “Vós tendes por pai ao diabo, e quereis satisfazer os desejos de vosso pai: ele foi homicida desde o princípio, e não se firmou na verdade, porque não há verdade nele; quando ele profere mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso, e pai da mentira. Mas, porque vos digo a verdade, não me credes” (Jo 8.44-45). Conhecemos a Jesus por sua referência histórica contida na Bíblia, mas gracejam ao ouvir o nome Satanás. A mesma Palavra que confere vida a Jesus, é a mesma que fundamenta a história espiritual do homem em seu relacionamento com Satanás, assim como com Deus. A Bíblia descreve todo o caráter positivo de Jesus, que todos certamente de alguma forma apreciam, assim como descreve todo caráter negativo de Satanás, que por sua vez torcem o nariz. Na tentação de Jesus por Satanás no deserto, os dois personagens mantêm um diálogo racional porque participam, diferindo em grau, da mesma capacidade intelectual, porém moralmente contrárias. Se um não existe, o outro também não. 42
Não discutiremos a possibilidade de Satanás, vista que ela é lógica e necessária. É a única explicação plausível para a luta moral entre bem e mal que poetiza toda a literatura antiga e a mídia sangrenta contemporânea. Além do mais, cremos na declaração da Bíblia a respeito deste personagem. Para aquele que não crê, é pena. Jamais poderá se libertar de seus medos, frustrações, ansiedades e dúvidas cruciais da existência humana. Pois quem não conhece a verdade não pode ser livre dos preconceitos. “Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”, como ensinou Jesus. Para os “bem-aventurados os que não viram e creram”, é fácil enxergar o “dragão, a antiga serpente, que é o Diabo e Satanás” (Ap 12.9), como o adversário moral e governamental de Deus. Assim como a Bíblia traça toda a personalidade de Deus e seus propósitos para o homem, ela também traça a personalidade e a carreira de Satanás. Se um é real, o outro igualmente. Não faremos um estudo prolongado sobre a carreira de Satanás, por ser uma doutrina bem conhecida entre os cristãos. Comentaremos apenas os pontos principais que se relacionam com a rebeldia celestial, devido às suas consequências mediatas e imediatas. Antes, porém, tentaremos vislumbrar a criação de Deus e Seu Reino, com seus diversos súditos nas suas devidas tarefas, para tentarmos compreender o que foi realmente perdido com a rebelião e queda de Satanás, primordialmente no céu, já que na terra conhecemos bem o resultado.
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Os Três Ministérios em Deus Todos os que se dobram ao testemunho singelo da Escritura creem na constituição Trina de Deus: Pai, Filho e Espírito Santo, ainda que não entendamos com precisão o ‘como’. Dr. Robert South (1634-1716) já dizia: “assim como aquele que a nega [a doutrina trinitariana] pode perder a sua alma, aquele que luta demasiadamente para entendê-la pode perder o seu juízo”. ² É uma questão de fé unicamente. Mas o que nos importa é a relação destas três benditas Pessoas dentro da Divindade. Cada uma destas Santas Pessoas tem um papel bem definido, ou Ministério, como a Palavra designa. Daí que observamos em toda a Bíblia estas três funções.
O Pai Vemos o Pai com uma função governamental ou de articulação sobre todo o Universo criado, com vistas ao equilíbrio. Embora Jesus seja chamado Rei, o próprio Filho reconhece a autoridade do Pai, dentro do plano ou Ordem que eles mesmos teceram na Eternidade. Quem não conhece a oração do Pai Nosso: “Venha a nós o vosso Reino...”? O Ministério do Pai está ligado ao Reino, ou Governo Geral. É o chamado Ministério de Governo. “Tua é, Senhor, a magnificência, e o poder, e a honra, e a vitória, e a majestade; porque teu é tudo quanto há nos céus e na terra; teu é Senhor, o reino, e tu te exaltaste sobre todos como chefe. E riquezas e 44
glória vêm de diante de ti, e tu dominas, sobre tudo, e na tua mão há força e poder; e na tua mão está o engrandecer e dar força a tudo” (1 Cr 29.11-12). “O Senhor reina; regozije-se a terra: alegrem-se as muitas ilhas. Nuvens e obscuridade estão ao redor dele; justiça e juízo são a base do seu trono” (Sl 97.1-2). “Mas o Senhor Deus é a verdade: ele mesmo é o Deus vivo e o Rei eter no; do seu fur or tr eme a ter r a, e as nações não podem suportar a sua indignação” (Jr l0.10). “Mas, se eu expulso os demônios pelo Espírito de Deus, é conseguintemente chegado a vós o reino de Deus” (Mt 12.28). “Mas cada um por sua ordem: Cristo as primícias, depois os que são de Cristo, na sua vinda. Depois virá o fim, quando tiver entregado o reino a Deus, ao Pai, e quando houver aniquilado todo o império, e toda a potestade e força. Porque convém que reine até que haja posto a todos os inimigos debaixo dos seus pés. Ora o último inimigo que há de ser aniquilado é a morte. Porque todas as coisas sujeitou debaixo dos seus pés. Mas, quando diz que todas as coisas lhe serão sujeitas, claro está que se excetua aquele que sujeitou todas as coisas. E, quando todas as coisas lhe estiverem sujeitas, então também o mesmo Filho se sujeitará àquele que todas as coisas lhe sujeitou, par a que Deus seja tudo em todos” (1 Co l5. 23-28).
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O Filho Dentro de todas as suas funções, a que se sobressai é a sacerdotal. Este pequeno trecho de Hebreus é bem claro: “Ora a suma do que temos dito é que temos um sumo sacerdote tal, que está assentado nos céus à destra do trono da majestade. Ministro do santuário, e do verdadeiro tabernáculo, o qual o Senhor fundou, e não o homem. Por que todo o sumo sacer dote é constituído para oferecer dons e sacrifícios; pelo que era necessário que este também tivesse alguma coisa que oferecer... Mas vindo Cristo, o sumo sacerdote dos bens futur os, por um maior e mais per feito tabernáculo, não feito por mãos, isto é, não desta criação...” (Hb 8.13; 9.11). Vemos que a função primordial do sacerdote é oferecer uma oferta pelo pecado. Ele deve ser o intermediário, levando a adoração dos adoradores ao Adorado. “Porque todo sumo sacerdote, tomado dentre os homens, é constituído a favor dos homens nas coisas concernentes a Deus, para que ofereça dons e sacrifícios pelos pecados. E possa compadecer-se ternamente dos ignorantes e errados; pois também ele está rodeado de fraqueza. E por esta causa deve ele, tanto pelo povo, como também por si mesmo, fazer oferta pelos pecados. E ninguém toma para si esta honra, senão o que é chamado por Deus, como Aarão. Assim também Cristo se não glorificou a si mesmo, para se fazer sumo sacerdote, mas aquele que lhe disse: Tu és meu Filho, hoje te gerei. Como também diz noutro lugar: Tu és sacerdote eternamente, segundo a or dem de Melquisedeque” (Hb 5.1-6). “Porque nos convinha tal sumo sacerdote, santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores, e feito mais sublime do que os céus; 46
que não necessitasse, como os sumos sacerdotes, de oferecer cada dia sacrifícios, primeiramente por seus próprios pecados, e depois pelos do povo; porque isto fez ele, uma vez, oferecendo-se a si mesmo” (Hb 7.26-27). “Tendo, pois, irmãos, ousadia para entrar no santuário, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou, pelo véu, isto é, pela sua carne, e tendo um grande sacerdote sobre a casa de Deus...” (Hb 10.19-21). “Porque há um só Deus, e um só mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem. O qual se deu a si mesmo em preço de redenção por todos, para servir de testemunha a seu tempo” (1 Tm 2.56). Ele é o único Ser de toda a história do universo que é ofertante e oferta ao mesmo tempo por dignidade própria. Por isto, cabe a Ele eternamente o Ministério Sacerdotal.
O Espírito Santo A esta Pessoa Divina ficou incumbido o Ministério da Profecia. É bom lembrar que Profecia não se refere somente aos prenúncios do futuro, mas está dentro da plenitude do Porta-Voz. É aquele que fala em nome de alguém. Ouçamos então. “As palavras do Senhor são palavras puras, como prata refinada em forno de barro, purificadas sete vezes” (Sl 12.6). “Toda a palavra de Deus é pura, escudo é para os que confiam nele. Nada acrescentes às suas palavras, para que não te repreenda e se47
jas achado mentiroso” (Pv 30:5-6). “Assim será a palavra que sair da minha boca: ela não voltará para mim vazia, antes fará o que me apraz, e prosperará naquilo para que a enviei” (Is 55.11). “Mas aquele consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas, e vos far á lembr ar de tudo quanto vos tenho dito... Mas, quando vier aquele Espírito de verdade, ele vos guiará em toda a ver dade; por que não falar á de si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido, e vos anunciará o que há de vir” (Jo 14.26; 16.13). A própria Bíblia, a quem nos reportamos, que é a voz de Deus, tem como Profeta ou Porta-Voz o Espírito Santo. “Tomai também o capacete da salvação, e a espada do Espírito que é a palavra de Deus” (Ef 6.17). “Porque a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo” (2 Pe 1.21). “Mas o Espírito expressamente diz que nos últimos tempos apostatarão alguns da fé, dando ouvidos a espíritos enganadores, e a doutrinas de demônios” (1 Tm 4.1). Portanto, o Pai administra os negócios do Ministério de Governo, o Filho advoga o Ministério de Sacerdócio e o Espírito Santo comunica o Ministério de Profecia. Mas se há governo, ou reino, subentende-se que haja súditos.
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Os Primeiros Seres Seria natural e lógico supor que se Deus é Espírito, as primeiras formas de vida derivadas Dele seriam também espirituais. Há uma vasta quantidade de declarações na Bíblia que mostram estes seres. Vejamos. “Tu só és Senhor, tu fizeste o céu, o céu dos céus, e todo o seu exército; a terra e tudo quanto nela há; os mares e tudo quanto neles há; e tu os guardas em vida a todos; e o exército dos céus te adora” (Ne 9.6). Aqui se vê um exército nos céus a adorar o Senhor. Não podem ser entendidos como estrelas, já que são objetos inanimados. “Os carros de Deus são vinte milhares, milhares de milhares. O Senhor está entre eles, como em Sinai, no lugar santo” (Sl 68.17). “Vi ao Senhor assentado sobre o seu trono, e todo o exército do céu estava junto a ele, á sua mão dir eita e à sua esquer da. E disse o Senhor: Quem induzirá Acabe, a que suba, e caia em Ramote de Gileade? E um dizia desta maneira e outro doutra. Então saiu um espírito e se apresentou diante do Senhor, e disse: Eu o induzirei...” (1 Re 22.1920). “Um rio de fogo manava e saía de diante dele: milhares e milhares o serviam, e milhões de milhões estavam diante dele: assentou-se o juízo, e abriram-se os livros” (Dn 7.10). “E, no mesmo instante, apareceu com o anjo uma multidão dos exércitos celestiais, louvando a Deus, e dizendo...” (Lc 2.13). 49
“Mas chegastes ao monte de Sião, e à cidade do Deus vivo, à Jerusalém celestial, e aos muitos milhares de anjos” (Hb 12.22). Vemos, nestas poucas passagens, seres celestiais a rodearem o trono de Deus, sempre com o propósito de servi-Lo e adorá-Lo. São chamados anjos, cuja tradução literal é mensageiros. Estão divididos em graduações ou patentes como a sua própria designação (exércitos) demanda. “Que manifestou em Cristo, ressuscitando-o dos mortos, e pondo-o à sua direita nos céus. Acima de todo o principado, e poder, e potestade, e domínio, e de todo o nome que se nomeia, não só neste século, mas também no vindouro... Porque não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas sim contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais” (Ef 1.20-21; 6.12). Nestas patentes nomeadas vemos tronos, domínios, principados, autoridades e poderes, denotando um relacionamento ‘social’. Notamos em toda a Bíblia a nomeação pessoal de apenas três anjos, a saber: Gabriel, Miguel e Lúcifer. Estes três anjos superiores estão intimamente ligados com aqueles três ministérios Divinos que vimos há pouco. Comparemos.
Miguel: “Quem é como Deus?” “Então me disse: Não temas, Daniel, porque desde o primeiro dia, em que aplicaste o teu coração a compreender e a humilhar-te perante o teu Deus, são ouvidas as tuas palavras; e eu vim por causa das 50
tuas palavras. Mas o príncipe do reino da Pérsia se pôs defronte de mim vinte e um dias, e eis que Miguel, um dos primeiros príncipes, veio para ajudar-me e eu fiquei ali com os reis da Pérsia... Mas eu te declararei o que está escrito na escritura da verdade; e ninguém há que se esforce comigo contra aqueles, a não ser Miguel, vosso príncipe... E naquele tempo se levantará Miguel, o grande príncipe, que se levanta pelos filhos do teu povo, e haverá um tempo de angústia, qual nunca houve, desde que houve nação até àquele tempo; mas naquele tempo livrar-se-á o teu povo, todo aquele que se achar escrito no livro” (Dn 10.12-13,21; 12.1). Observe como Miguel é chamado: “o grande príncipe, que se levanta pelos filhos do teu povo”, “um dos primeiros príncipes” e “vosso príncipe”. Aqui o povo é Israel, visto que Daniel pertence a ele. A esposa de Jeová, Israel, sempre é defendida por Miguel. Leia também todo o contexto de Apocalipse 12, em que Miguel defenderá Israel do Dragão na tribulação futura. “Mas o arcanjo Miguel, quando contendia com o diabo...” (Jd 9). Somente ele é chamado de Arcanjo. Somente Miguel recebe este título. A denominação Arque-anjo significa que ele é o primeiro, que tem a primazia. Visto que somente ele é contemplado a defender Israel, sendo instrumento de Jeová para implantação do Reino de Deus na terra, conclui-se que seu ministério está ligado ao Pai, que é o Ministério de Governo. Também se aceita que, à sua voz, a Igreja será chamada aos céus, conforme 1 Tessalonicenses 4.16.
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Gabriel : “O poder oso de Deus” “E aconteceu que, havendo eu, Daniel, visto a visão, busquei entendê-la e eis que se me apresentou diante uma como semelhança de homem. E ouvi uma voz de homem nas margens do Ulai, a qual gritou, e disse: Gabriel, dá a entender a este a visão... E disse: Eis que te farei saber o que há de acontecer no último tempo da ira... Estando eu, digo, ainda falando na oração, o varão Gabriel, que eu tinha visto na minha visão ao princípio, veio voando rapidamente, e tocou-me à hora do sacrifício da tarde. E me instruiu, e falou comigo, e disse: Daniel, agora saí para fazer-te entender o sentido” (Dn 8.15-19; 9.21-22). Nestas duas passagens, Gabriel é convocado para instruir e revelar a Daniel a respeito das coisas futuras. “E um anjo do Senhor lhe apareceu, posto em pé, à direita do altar do incenso. E Zacarias, vendo-o, turbou-se, e caiu temor sobre ele. Mas o anjo lhe disse: Zacarias, não temas, porque a tua oração foi ouvida, e Isabel, tua mulher, dará à luz um filho, e lhe porás o nome de João; e terás prazer e alegria, e muitos se alegrarão no seu nascimento, porque será grande diante do Senhor, e não beberá vinho, nem bebida forte, e será cheio do Espírito Santo, já desde o ventre de sua mãe; e converterá muitos dos filhos de Israel ao Senhor seu Deus, e irá adiante dele no Espírito e virtude de Elias, para converter os corações dos pais aos filhos, e os rebeldes à prudência dos justos; com o fim de preparar ao Senhor um povo bem disposto. Disse então Zacarias ao anjo: Como saberei isto? Pois eu já sou velho, e minha mulher avançada em idade. E, respondendo o anjo, disse-lhe: Eu sou Gabriel, que assisto diante de Deus, e fui enviado a falar-te e dar-te estas alegres novas” (Lc 1.11-19). Observe que o anjo foi enviado para revelar algo completamente novo a Zacarias. 52
“E, no sexto mês, foi o anjo Gabriel enviado por Deus a uma cidade da Galileia, chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um varão, cujo nome era José, da casa de Davi; e o nome da virgem era Maria. E, entrando o anjo, onde ela estava, disse: Salve, agraciada; o Senhor é contigo: bendita tu entre as mulheres. E, vendo-o ela, turbouse muito com aquelas palavras, e considerava que saudação seria esta. Disse-lhe então o anjo: Maria, não temas, porque achaste graça diante de Deus; e eis que em teu ventre conceberás e darás à luz um filho, e por-lhe-ás o nome Jesus. Esse será grande, e será chamado filho do Altíssimo; e o Senhor Deus lhe dará o trono de Davi, seu pai; e reinará eternamente na casa de Jacó, e o seu reino não terá fim. E disse Maria ao anjo: Como se fará isto, visto que não conheço varão? E, respondendo o anjo, disse-lhe: Descerá sobre ti o Espírito Santo, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra; pelo que também o santo, que de ti há de nascer, será chamado filho de Deus. E eis que também Isabel, tua prima, concebeu um filho em sua velhice; e é este o sexto mês para aquela que era chamada estéril; porque para Deus nada é impossível. Disse então Maria: Eis aqui a serva do Senhor; cumpra-se em mim segundo a tua palavra. E o anjo ausentou-se dela” (Lc 1.26-38). Nesta passagem de importância incomensurável, é Gabriel quem revela a Maria a importante e decisiva trajetória do Messias de Israel, Jesus. Por estas passagens, chega-se à conclusão indubitável que Gabriel está associado ao Espírito Santo no Ministério de Profecia, ou Revelação.
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Lúcifer: “Por tador de luz” Somente deste anjo encontramos traços de sua personalidade. A passagem central referente ao seu ministério encontra-se em Ez 28.1315, e é aceita universalmente. “Estavas no Éden, jardim de Deus: toda a pedra preciosa era a tua cobertura: a sardônia, o topázio, o diamante, a turquesa, o ônix, o jaspe, a safira, o carbúnculo, a esmeralda e o ouro: a obra dos teus tambores e dos teus pífaros estavam em ti; no dia em que foste criado foram preparados. Tu eras querubim ungido para proteger, e te estabeleci: no monte santo de Deus estavas, no meio das pedras afogueadas andavas. Perfeito eras nos teus caminhos, desde o dia em que foste criado...” Vemos então que Lúcifer era querubim, ungido para proteger, estabelecido para permanecer no monte santo de Deus. De nenhum outro anjo se fala assim, de forma tão íntima. A questão da unção, veremos mais à frente estar relacionada ao sacerdócio e escolha soberana de Deus.
As pedras do peitoral e da Nova Jerusalém Quanto às várias pedras preciosas que o ornamentavam, poderemos encontrá-las somente mais duas vezes no texto bíblico. Revestia o peitoral do sumo sacerdote Aarão e fundamentarão a Nova Jerusalém. “Fizeram também os vestidos do ministério, para ministrar no santuário, de azul, e de púrpura e de carmesim: também fizeram os 54
vestidos santos, para Aarão, como o Senhor ordenara a Moisés... Fez também o peitoral de obra de artífice, como a obra do éfode, de ouro, de azul, e de púrpura, e de carmesim, e de linho fino torcido... E engastaram nele quatro ordens de pedras: uma ordem de uma sárdia, de um topázio, e de um carbúnculo; esta é a primeira ordem: e a segunda ordem de uma esmeralda, e de uma safira e de um diamante: e a terceira ordem de um jacinto, de uma ágata, e de uma ametista: e a quarta ordem de uma turquesa, e de uma sardônica, e de um jaspe, engastadas nos seus engastes de ouro” (Êx 39.1,8,10-13). “E levou-me em espírito a um grande e alto monte, e mostroume a grande cidade, a santa Jerusalém, que de Deus descia do céu... E o muro da cidade tinha doze fundamentos, e neles os nomes dos doze apóstolos do cordeiro... E a fábrica do seu muro era de jaspe, e a cidade de ouro puro, semelhante a vidro puro. E os fundamentos do muro da cidade estavam ordenados de toda a pedra preciosa. O primeiro fundamento era jaspe; o segundo, safira; o terceiro, calcedônia; o quarto, esmeralda; o quinto, sardônica; o sexto, sárdio; o sétimo, crisólito; o oitavo, berilo; o nono, topázio; o décimo, crisópraso; o undécimo, jacinto; o duodécimo, ametista” (Ap 21.10,14,18-20). É extremamente significativo que as mesmas pedras encontradas no peitoral do sumo sacerdote Aarão e nos fundamentos da Nova Jerusalém, centro internacional e universal de adoração num breve futuro, cobriam majestosamente o Querubim ungido, Lúcifer. Mas vejamos outro texto em que se associa um sumo sacerdote humano ao anjo caído.
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O sumo sacerdote Josué “E me mostrou o sumo sacerdote Josué, o qual estava diante do anjo do Senhor, e Satanás estava à sua mão direita, para se lhe opor. Mas o Senhor disse a Satanás: O Senhor te repreende, ó Satanás, sim, o Senhor, que escolheu Jerusalém, te repreende: não é este um tição tirado do fogo? Ora Josué, vestido de vestidos sujos, estava diante do anjo. Então falando, ordenou aos que estavam diante dele, dizendo: Tirai-lhe estes vestidos sujos. E a ele lhe disse: Eis que tenho feito com que passe de ti a tua iniquidade, e te vestirei de vestidos novos. E disse eu: Ponham-lhe uma mitra limpa sobre a sua cabeça. E puseram uma mitra limpa sobre a sua cabeça, e o vestiram de vestidos: e o anjo do Senhor estava ali. E o anjo do Senhor protestou a Josué, dizendo: Assim diz o Senhor dos Exércitos: Se andares nos meus caminhos, e se observares as minhas ordenanças, também tu julgarás a minha casa, e também guar dar ás os meus átr ios, e te dar ei um lugar entr e os que estão aqui” (Zc 3.1-7). Esta profecia fala do sacerdócio levítico que se restaurará em Israel, no futuro ainda, quando ela for limpa dos seus pecados. Veremos mais à frente esta questão do sacerdócio com mais detalhes. Por hora, basta entendermos a ligação entre este sacerdote e Satanás que se lhe opunha. O anjo do Senhor, que contemplaremos à frente, declara a Satanás que ele não passava de um tição tirado do fogo. Para entendermos o que significa esta expressão, temos que ler outro juízo parecido. A respeito de Israel, o profeta declara em Amós 4.11. “Subverti alguns dentre vós, como Deus subverteu a Sodoma e 56
Gomorra, e vós fostes como um tição arrebatado do incêndio; contudo não vos convertestes a mim, disse o Senhor”. A interpretação se torna simples agora. Israel, em pecado, passa pelo fogo do juízo, sem, contudo, ser consumido por inteiro. Neste caso é para ver se a nação se arrepende e se volta ao seu Deus. No caso de Satanás, como também ainda veremos, seu juízo foi sua expulsão dos céus, sem, contudo, ser destruído. Ele continuará o seu caminho desregrado “buscando a quem possa tragar”. Como o contexto, na passagem examinada acima, trata de sacerdócio, significa que Satanás também estava ligado a ele. Isso é corroborado pela promessa do anjo a Josué: “também guardarás os meus átrios”. A palavra “também” comprova que Satanás guardava os átrios do Senhor no céu, já que os átrios do tabernáculo terreno são a sombra do celestial, que adiante comentaremos. Com tudo isto em mente, é fácil reconhecer que a este anjo glorioso e iluminado cabia o mais sublime dos ministérios: o do Sacerdócio, servindo diretamente ao Filho. É pertinente neste ponto uma pergunta inteligente. Se a Lúcifer cabia o ministério de sacerdócio nos céus, e sabendo que “todo o sumo sacerdote é constituído para oferecer dons e sacrifícios” (Hb 8:3), o que ele então sacrificava, espiritualmente falando? Porque também sabemos que, e agora falando de Jesus como sumo sacerdote, “temos um sumo sacerdote tal, que está assentado nos céus à destra do trono da Majestade, ministro do santuário, e do verdadeiro tabernáculo... que este também tivesse alguma coisa que oferecer” (Hb 8.1,3). No santuário de Deus, que está nos céus, há os mesmos elemen57
tos do tabernáculo que Moisés construíra, como está escrito. “Os quais servem de exemplar e sombra das coisas celestiais, como Moisés divinamente foi avisado, estando já para acabar o tabernáculo; porque foi dito: Olha, faze tudo conforme o modelo que no monte se te mostrou” (Hb 8.5). “Porque Cristo não entrou num santuário feito por mãos, figura do verdadeiro, por ém no mesmo céu, par a agor a compar ecer por nós perante a face de Deus” (Hb 9.24). Assim como “um tabernáculo estava preparado, o primeiro, em que havia o candeeiro, e a mesa, e os pães da proposição; ao que se chama o santuário. Mas depois do segundo véu estava o tabernáculo que se chama o santo dos santos, que tinha o incensário de ouro e a arca do concerto, coberta de ouro toda em redor em que estava um vaso de ouro, que continha o maná, e a vara de Aarão, que tinha florescido, e as tábuas do concerto; e sobre a arca os querubins da glória, que faziam sombra no propiciatório...” (Hb 9:2-5), também no “verdadeiro tabernáculo” ainda se encontram os mesmos ingredientes. Se no terrestre havia um “altar do holocausto”, também no celeste ainda há um. Mas se no terrestre um sacrifício animal era oferecido, o que, em contrapartida, se oferecia no altar celestial pelas mãos do formoso querubim ungido? Talvez alguém proponha que a resposta se encontre no mesmo tipo de sacrifícios espirituais que Deus exige hoje de seus filhos. “Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional” (Rm 12.1-2). “Portanto ofereçamos sempre por ele a Deus sacrifícios de lou58
vor, isto é, o fruto dos lábios que confessam o seu nome. E não vos esqueçais da beneficência e comunicação, porque com tais sacrifícios Deus se agrada” (Hb 13.15-16). “Vós também, como pedras vivas, sois edificados casa espiritual e sacerdócio santo, para oferecer sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por Jesus Cristo” (1 Pe 2.5). Certamente estes sacrifícios eram oferecidos, e provavelmente com muito mais majestade e integridade que jamais imaginamos. Pois ali era o ambiente original, e não a sombra. Lúcifer olhava para a face santa do próprio Deus, em seu próprio local de atuação. Não em meio a uma tenda opaca e transitória contendo utensílios feitos por mãos de barro e mal iluminados por um castiçal com sete pequenos chumaços de luz. Não como Aarão que se apresentava no lugar santíssimo “uma vez no ano, não sem sangue, que oferecia para si mesmo e pelas culpas do povo”. O que ele oferecia era de forma pura e santa, num corpo espiritual glorioso próprio para seu meio; e acima de tudo, criado e educado para oferecer tais sacrifícios com autoridade e determinação do próprio Deus. Não! Não podemos nos contentar com estes supostos sacrifícios espirituais, como que já resolvida a questão. Altar de holocausto é para holocausto. Um guarda-roupa só cumpre seu papel se guardar roupa. Um altar para holocausto só terá cumprida sua finalidade se forem oferecidos holocaustos sobre ele. Devemos colocar neste contexto duas importantíssimas e enigmáticas passagens para entendermos esta proposição. “Sabendo que não foi com coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados da vossa vã maneira de viver que por tradição recebestes dos vossos pais, mas com o precioso sangue de Cristo, 59
como de um cordeiro imaculado e incontaminado, o qual, na verdade, em outro tempo foi conhecido, ainda antes da fundação do mundo, mas manifestado nestes últimos tempos por amor de vós” (1 Pe 1.1819). “... cujos nomes não estão escritos no livro da vida do Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo” (Ap 13.8). Redobre a sua atenção agora. Até o presente momento só temos alicerçado o terreno sobre a rocha para, só então, erigir uma construção resistente e duradoura em cima. A partir de agora entraremos no celestial, antes de termos sido criados, antes do “princípio do pó do mundo”.
O sangue derramado desde... mas conhecido antes da fundação! Observe que o cordeiro foi morto desde a fundação do mundo, mas seu sangue já era conhecido ainda antes da fundação. O leitor deve entender que o sacrifício de Jesus em carne naquela cruz, em Jerusalém, é tão real na mente do Espírito quanto a morte do cordeiro desde a fundação do mundo. Não são simples forças de expressão. Aquele Espírito que nos convence de todo o pecado e nos leva a crer na morte de Jesus para a remissão das nossas ofensas é o mesmo Espírito que relata a sua morte desde a fundação do mundo e seu prévio conhecimento na mente de Deus. Se o relato da morte de Cristo neste mundo é real, então o outro relato é igualmente verdadeiro. Vamos juntar então algumas peças que já temos em mãos. Temos no céu um sacerdote “constituído para oferecer dons e 60
sacrifícios”, um altar de holocausto que serviu de modelo para a sombra construída por Moisés no deserto, e o relato do Espírito Santo de que o sangue de Cristo foi “conhecido ainda antes da fundação do mundo”; o trinômio é muito sugestivo. Se o altar que Israel erigiu no deserto era “sombra do verdadeiro”, então os sacerdotes e o sacerdócio propriamente também o eram. Temos que concluir por analogia que se Lúcifer e seus companheiros conheciam o sangue de Cristo, então, como representantes do sacerdócio, certamente sacrificavam naquele altar celeste algo que representava este precioso sangue. Da mesma maneira que Israel sacrificava seus cordeiros em claro apontamento futuro do verdadeiro cordeiro de Deus. Mas é óbvio que estes anjos-sacerdotes não poderiam compreender seu valor e significado espiritual profundo, enquanto não se introduzisse a rebelião e o pecado no Universo.
Assim como Israel, por décadas e décadas, apresentou sacrifícios sobre o altar no tabernáculo, sem pleno conhecimento de que eles apenas eram sombras, e que um dia não seriam mais necessários, a ponto de rejeitar seu verdadeiro Cordeiro, muito mais Lúcifer e os demais anjos que ainda nem haviam contemplado o pecado. Estes sacerdotes celestes conheciam o sangue do Cordeiro, de quem se escreveria bem mais à frente que “sem derramamento de sangue não há remissão dos pecados”; mas como poderiam compreendê-lo se ainda não haviam contemplado estes pecados? O reino de Deus era luz absoluta! Portanto, parece lógico associar que assim como Judas, o traidor, foi escolhido para introduzir a traição no grupo santo, Lúcifer, seu pai, também havia sido escolhido para tal propósito. Lúcifer, no seu orgulho e incredulidade infames, na tentativa de subjugar seu superior, mal sabia que suas próprias atitudes nocivas já estavam antecipadas na mente de Deus. As palavras dirigidas por Deus ao rei do Egito caem 61
perfeitamente para seu pai em trevas. “Porque diz a Escritura a Faraó: Para isto mesmo te levantei; para em ti mostrar o meu poder, e para que o meu nome seja anunciado em toda a terra” (Rm 9.17). Na verdade, constatamos que “o Senhor fez todas as coisas para os seus devidos fins, e até o ímpio para o dia do mal” (Pv 16.4).
Antes mesmo de Lúcifer se tornar o grande dragão, ele já conhecia, porém sem entendimento, o sangue que o faria definhar milênios à frente, e que ele mesmo era responsável por apresentar no altar celeste. Como está escrito: “Deus apanha os sábios na sua própria astúcia” (1 Co 3.19). Por isto mesmo, os anjos acompanharam, e ainda acompanham, com muito interesse toda a história da salvação humana, pois participaram na eternidade passada do conhecimento do sangue do Cordeiro, que eles ainda não compreendiam perfeitamente. Ainda falaremos mais sobre este assunto. “... os sofrimentos que a Cristo haviam de vir... foram anunciados por aqueles que, pelo Espírito Santo enviado do céu, vos pregaram o evangelho: para as quais coisas os anjos desejam bem atentar” (1 Pe 1.12). “Ao que está assentado sobre o trono e ao cordeiro, sejam dadas ações de graças, e honra, e glória, e poder para todo o sempre” por este intrincado Plano. O atrevido objetivo deste livro é tentar montar as complicadas peças deste imenso quebra cabeça, e tentar compreender os propósitos mais profundos da Vontade Soberana de nosso Senhor. Neste ponto, é de bom alvitre juntar algumas destas peças, 62
olhando sob outro ângulo.
As exigências de um Reino Na famosa oração do Pai Nosso, o Filho coloca de forma simples a complexa doutrina “Venha a nós o vosso reino”. Esta expressão reúne em si mesma algumas necessidades. Primeiramente um Rei. “O Senhor é Rei Eterno...” (Sl 10.16). “Mas o Senhor Deus é a verdade: ele mesmo é o Deus Vivo e o Rei Eterno; do seu furor treme a terra, e as nações não podem suportar a sua indignação” (Jr 10.10). Em segundo plano, os súditos. “E vindo um dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o Senhor, veio também Satanás entre eles” (Jó 1.6). Também como já vimos, toda instituição, para sua devida organização e desenvolvimento, necessita de hierarquia nas suas várias operações. “Porque nele foram criadas todas as coisas que há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades: tudo foi criado por ele e para ele” (Cl 1.16). E exige também um local de trabalho apropriado, onde este Reino possa ser expandido. Observe esta parábola. 63
“Outra parábola lhes propôs, dizendo: O reino dos céus é semelhante ao grão de mostarda que o homem, pegando dele, semeou no seu campo; o qual é realmente a mais pequena de todas as sementes; mas, crescendo, é a maior das plantas, e faz-se uma árvore, de sorte que vêm as aves do céu, e se aninham nos seus ramos” (Mt 13.31-32). Perceba a necessidade de um campo para o desenvolvimento gradual do reino de Deus. Então, com um pouco de raciocínio intuitivo, podemos admitir que o vasto Universo criado por Deus era o campo da semeadura, e os filhos de Deus, os anjos, responsáveis pela disseminação e desenvolvimento deste Reino a partir dos três ministérios estabelecidos pelo Rei. Exemplificando de uma forma muito rude e longe de abranger todo o relevante serviço destes súditos, a vontade de Deus era proferida pelos ministros da Profecia, regida e executada pelos mordomos do Governo, regado e abençoado pelos Sacerdotes. Lúcifer, sendo o chefe dos sacerdotes, além de proteger a santidade de Deus, visto que era “querubim ungido para proteger”, tinha como ofício sacerdotal “oferecer dons e sacrifícios”, como se diz de todo sacerdote em Hebreus 8.3. Vimos que ele ministrava no altar celeste que serviria de modelo para o tabernáculo terrestre, que, por sua vez, continha, dentre outros utensílios, um altar para holocausto. Desenvolvemos nossa ideia partindo da premissa de que altar de holocausto necessite de sacrifícios, e todo sacrifício necessite de sangue. O Livro de Levítico é bem enérgico ao declarar sem rodeios que o sangue derramado deve ser sempre “espargido à roda sobre o altar” (Lv 1.5) E como a “viva e eficaz” Palavra de Deus lança luz ao declarar que o “sangue de Cristo... foi conhecido, ainda antes da fundação do 64
mundo”, só nos resta supor, com margem de erro quase nula, que algo era oferecido no altar do holocausto celeste que representasse o “sangue precioso de Cristo”. A menos que tenhamos de admitir que o altar servisse apenas de enfeite, o que não parece atender à Perfeição Divina. Mas será que temos alguma sombra em nosso meio que nos sirva de “alegoria”? Primeiramente, o tipo óbvio e já mencionado. Mas é bom relembrarmos, “e é segurança para vós”. Israel sacrificou por décadas inúmeros holocaustos animais que representavam o “cordeiro de Deus”. Se o altar era sombra, então os sacerdotes também o eram, e os seus sacrifícios igualmente. E, citando um segundo tipo, olhando para trás no tempo, para o passado, “todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este cálice anunciais a morte do Senhor... Este cálice é o Novo Testamento no meu sangue” (1 Co 11.25-26). Embora aqui se trate de um memorial, porque o sangue já foi derramado no passado, vemos que algo está sendo apresentado no lugar do sangue de Cristo como testemunho deste sacrifício. “Mas, se alguém quiser ser contencioso”, podemos também garantir a necessidade do pleno funcionamento do altar do holocausto na eternidade passada, observando o pleno funcionamento dos outros componentes do santuário celeste.
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O verdadeiro Tabernáculo no céu “E, havendo aberto o sétimo selo, fez-se silêncio no céu quase por meia hora. E vi os sete anjos, que estavam diante de Deus, e foram -lhes dadas sete trombetas. E veio outro anjo, e pôs-se junto ao altar, tendo um incensário de ouro; e foi-lhe dado muito incenso, para o pôr com as orações de todos os santos sobre o altar de ouro, que está diante do trono. E o fumo do incenso subiu com as orações dos santos desde a mão do anjo até diante de Deus. E o anjo tomou o incensário, e o encheu do fogo do altar, e o lançou sobre a terra; e houve depois vozes, e trovões, e relâmpagos e terremotos” (Ap 8.1-5). Para nos situarmos no tempo, é bom lembrarmos que o livro de Apocalipse foi escrito aproximadamente trinta anos depois do templo judaico ter sido destruído ‘pedra por pedra’ pelo Império Romano no ano 70 d.C. O que o apóstolo João contempla em sua visão é o verdadeiro tabernáculo nos céus, que servira de modelo para o tabernáculo caído em Israel. De acordo com a sombra ditada por Moisés em Êxodo 30.1-10, o incenso santo era queimado sobre o altar do incenso toda manhã e tarde. Se no caso celeste, o anjo apocalíptico retira fogo do altar para o seu incensário, demonstrando sua plena função, então somente sangue, ou algo que o representasse, poderia ser oferecido sobre o altar do holocausto no mesmo santuário celestial. Também como já lemos, Isaías teve seus lábios tocados por uma “brasa viva, que um dos serafins tirara do altar com uma tenaz” (Is 6.1-13). Se este altar estava em plena atividade, seguramente o do holocausto também, visto que são das brasas deste altar que se levava ao altar do incenso, como demonstra a sombra. Se alguém disser que estas coisas não passam de simbologia, 66
não sendo literais, então sou obrigado a responder que ele não conhece as Escrituras, nem o poder nem o caráter do Deus Vivo e Verdadeiro. Complementando, uma leitura cuidadosa deste magnífico livro indica os mesmos componentes do tabernáculo terrestre diante do Senhor, nos céus. O altar do holocausto aparece em 6.9; 11.1; 14.18; 16.7. A pia de cobre aparece em 4.6; 15.2. O átrio aparece em 11.2. O candelabro aparece em 1.12; 4.5. O testemunho aparece em 15.5. O altar do incenso aparece em 9.13. A arca do concerto aparece em 11.19. O templo de Deus, como um todo, aparece em 11.1,19; 14.15,17; 15.5-6,8; 16.1,17. O tabernáculo é visto em 13.6; 15.5; 21.3. E por todo o livro profético, sem abrir a sua boca, o motivo e a razão de ser do tabernáculo: “um cordeiro, como havendo sido morto”, em 5.6. Aleluias ao nosso Deus, “O Senhor fez todas as coisas para os seus devidos fins”! Mas se então comprovamos que um substituto era oferecido na eternidade passada, podemos questionar qual era o objetivo deste holocausto, se nem haviam ainda sido criados os “vasos de barro” que comportariam este sangue, e nem o pecado nascido para poder ser expiado por ele.
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Três Objetivos para o Holocausto Celeste O primeiro objetivo, e o mais nobr e talvez, ensina-nos o Conselho e a Onisciência do Todo Poderoso. Satanás, ao ouvir o Filho de Deus gritar – “Está consumado” –, certamente teve retiradas as “escamas” de seus olhos, e a amargura e a vergonha tomaram conta de seu ser, ao relembrar que milênios antes da criação do homem, como sacerdote que assistia diante D’Aquele que intentava destruir na cruz, já oferecia como sombra no altar celestial o “precioso sangue de Cristo... conhecido ainda antes da fundação do mundo”. A sombra do sangue já era oferecida, antes de qualquer coisa, porque Deus preparara de antemão um plano magnífico que somente Ele poderia executar, pois só Ele “chama as coisas que não são como se já fossem” (Rm 4.7). É bom deixarmos claro neste momento uma posição bem definida. Deus não foi pego de surpresa em nenhum momento de sua História. Dele se diz: “Quem operou e fez isto, chamando as gerações desde o princípio? Eu, o Senhor, o primeiro, e com os últimos, eu mesmo” (Is 41.4). “Eis que as primeiras coisas passaram, e novas coisas eu vos anuncio, e, antes que venham à luz, vo-las faço ouvir” (Is 42.9). “... o Senhor que faz todas estas coisas. Que são conhecidas desde toda a eternidade” (At 15.18). “... não há outro semelhante a mim. Que anuncio o fim desde o 68
princípio e desde a antiguidade as cousas que ainda não sucederam; que digo: O meu conselho será firme, e farei toda a minha vontade” (Is 46.10). Esta preciosa palavra, ‘conselho’, utilizada pelo Espírito Santo em sua sabedoria, tem um significado singular, se a encararmos do ponto de vista do reino de Deus: ‘Reunião ou assembleia de ministros. Reunião de pessoas que deliberam sobre negócios particulares’. Deus não simplesmente conhece de antemão. Ele só pode anunciar o fim desde o princípio porque seu Conselho será firme e Ele fará toda a sua Vontade. Deus age por Vontade e Conselho, nunca por conhecimento antecipado. A sua Vontade é Soberana, e sua Onisciência, alavanca. Não há lugar na Escritura que insinue que Deus agiu de uma determinada maneira porque previu de antemão. “Ai daquele que contende com o seu Criador! O caco entre outros cacos de barro! Porventura dirá o barro ao que o formou: Que fazes?” (Is 45.9). “Porque a palavra da promessa é esta: Por este tempo virei, e Sara terá um filho. E não somente esta, mas também Rebeca, quando concebeu de um, de Isaque nosso pai; porque, não tendo eles ainda nascido, nem tendo feito bem ou mal (para que o propósito de Deus, segundo a eleição, ficasse firme, não por causa das obr as, mas por aquele que chama), foi-lhe dito a ela: O maior servirá o menor. Como está escrito: Amei Jacó e aborreci Esaú. Que diremos, pois? Que há injustiça da parte de Deus? De maneira nenhuma. Pois diz a Moisés: Compadecer-me-ei de quem me compadecer, e terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia. Assim, pois, isto não depende de quem quer, nem do que corre, mas de Deus, que se compadece. Porque diz a Escritura a Faraó: Para isto mesmo te levantei; para em ti mostrar o meu poder, e para que o meu nome seja anunciado em toda a terra. Logo pois compadece-se de quem quer, e endurece a quem quer. Dir-me69
ás então: Por que se queixa ele ainda? Porquanto, quem resiste à sua Vontade? Mas, ó homem, quem és tu, que a Deus r eplicas? Por ventura a coisa formada dirá ao que a formou: Porque me fizeste assim? Ou não tem o oleiro poder sobre o barro, para da mesma massa fazer um vaso para honra e outro para desonra?” (Rm 9.9-21). Tudo anda “conforme o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade” (Ef 1:11), e não segundo a sua onisciência. Aquele que ler o primeiro capítulo de Efésios com o coração liberto do legalismo perceberá que tudo é regido “segundo o conselho da sua vontade”, “predestinação”, segundo o “beneplácito que propusera em si mesmo”, para um específico e determinado “propósito”. Estamos reiterando esta questão, pois somente a predeterminação e o Conselho são dignos e indispensáveis para a conclusão do Plano de Deus que nos propusemos a explicar. Deus não simplesmente conhecia de antemão, mas predeterminara que assim fosse, “porque os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis” (Rm 11.29). “Porque todas quantas promessas há de Deus, são nele [em Jesus] sim, e nele o amém, para glória de Deus por nós” (2 Co 1.20). Paralelamente à sua onisciência e conselho eterno que geram a predeterminação, caminha a sua bendita e inigualável Glória. “E a glória do Senhor se manifestará, e toda carne juntamente verá que foi a boca do Senhor que isto disse... Por amor de mim, por amor de mim o farei, porque como seria profanado o meu nome? E a minha glória não darei a outrem” (Is 40.5; 48.11). “A glória do Senhor seja para sempre! Alegre-se o Senhor em suas 70
obras!” (Sl 104.31). “Louvai ao Senhor. Louvarei ao Senhor de todo coração, na assembleia dos justos e na congregação. Grandes são as obras do Senhor, procuradas por todos os que nela tomam prazer. Glória e majestade há em sua obra, e a sua justiça permanece para sempre” (Sl 111.1-3).
O segundo objetivo diz r espeito ao ensino dos pr ópr ios anjos. Apesar de serem superiores aos homens em todos os sentidos, não possuem a onisciência Divina. E todo aprendizado de qualquer criatura finita se faz do simples para o complexo, através da observação gradual, “as quais coisas os anjos desejam bem atentar” (1 Pe 1.12). Enquanto nada de contaminado pudesse entrar no reino de Deus, seu conhecimento se limitaria ao abstrato, ao hipotético. Conheciam o “culto divino com suas ordenanças”, a santidade de Deus manifestada em justiça e juízo, a comunhão e todas as delícias resultantes de um andar contínuo e santo na presença do Eterno. Mas como poderiam conhecer a misericórdia, a graça, a redenção, o perdão e a eleição soberana, tudo que envolve o amor pronto a redimir, antes da intromissão daquilo que era oposto a Deus? Como está escrito no Salmo 62.12: “O poder pertence a Deus. A ti também, Senhor, pertence a misericórdia”. Certamente os anjos conheciam o poder de Deus, mas de que outra forma poderiam conhecer a sua misericórdia se o pecado ainda não fora conhecido? Também como está escrito em Rm 5.20: “Onde abundou o pecado, superabundou a graça”. Mas no caso dos anjos, por ainda não co71
nhecerem o pecado, a Escritura seria diferente: ‘Onde não abundou o pecado, não superabundou a graça’. Com a intromissão do pecado pelas mãos de Lúcifer, que veremos em breve, os anjos conheceriam em primeiro lugar a manifestação da Santidade de Deus de forma cristalina e prática. Mas mesmo antes de conhecerem a justiça e o juízo (ou julgamento) do Rei Celeste, a “misericórdia e a verdade” já iam adiante da face de Deus, como lemos no Salmo 89.14. “Justiça e juízo são a base do teu trono; misericórdia e verdade vão adiante do teu rosto”. Apesar de sua santidade o obrigar a ser implacável para com o pecado, Ele já demonstrava de forma alegórica, nos sacrifícios apresentados pelos Ministros Sacerdotes no altar do holocausto celestial, a sua misericórdia e graça aos substitutos que viriam, através do juízo implacável sobre um Grande Substituto. Ou o pecador paga o preço, ou um substituto capaz deverá fazê-lo. É como nos negócios humanos, quando um fiador deve ser apresentado pelo locatário, caso este não puder pagar o preço devido. Assim, Deus já deixava claro que não havia provisão de um substituto para os anjos caso pecassem, já que estes ministros sacrificavam a sombra que eles jamais participariam – o sangue. E como consequência, Deus já insinuava que um novo ser viria a ser criado, e o substituto já estava providenciado para ele.
O terceiro objetivo já foi insinuado. Tr ata da condenação completa e irremediável de Lúcifer. Assim como Adão e Eva foram avisados do resultado, caso eles pecassem, é óbvio e necessário que os anjos também fossem avisados. Essa necessidade pode ser vista de forma alegórica em Ezequiel 33.1-4. 72
“E veio a mim a palavra do Senhor, dizendo: Filho do homem, fala aos filhos do teu povo e dize-lhes: Quando eu fizer vir a espada sobre a terra, e o povo da terra tomar um homem de seus termos, e o constituir por seu atalaia, e, vendo ele que a espada vem sobre a terra, tocar a trombeta, e avisar o povo; se aquele que ouvir o som da trombeta, não se der por avisado e vier a espada, e o tomar, o seu sangue será sobre sua cabeça”.
Caso aquele que ouvisse a trombeta do atalaia, ou sentinela, não fizesse caso do ocorrido, a responsabilidade seria somente sua. Transportando para o “verdadeiro tabernáculo”, além de o Rei os ter avisado, contemplaram constantemente sacrifícios que indicavam um substituto não pertencente à sua ordem; portanto, rebelião de qualquer tipo ou grau seria cabalmente julgado. “De quanto maior castigo cuidais vós será julgado merecedor aquele que pisar o Filho de Deus”, sendo, neste caso, o Ministro maior do Sacerdócio, sendo o responsável pelo foco de infecção que se espalharia por todo o Universo e macularia nada menos que o santuário celestial do “Santo, Santo, Santo”? Pois, “a qualquer que muito for dado, muito se lhe pedirá, e ao que muito se lhe confiou, muito mais se lhe pedirá” (Lc 12.48).
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3 Da Queda
P
rovavelmente chegamos ao ponto mais complexo deste estudo. Peço a atenção do leitor neste momento, de forma redobrada, para que as possíveis dúvidas formuladas em seu coração, até o momento, sejam iluminadas pelos comentários à frente. Já passamos pela erva. Agora é o momento da espiga, e os grãos benditos que suprirão a nossa alma e espírito. Lúcifer ia bem, “até que se achou nele iniquidade” (Ez 28.l5). Seu andar despreocupado e nobre por entre os corredores celestiais chegara ao fim. O Senhor, em breve, cessaria “a voz de folguedo, e a voz de alegria”. E tudo por quê? “Elevou-se o teu coração por causa da tua formosura, corrompeste a tua sabedoria por causa do teu resplendor...” (Ez 28.17). Por assim dizer, ele retirou os seus límpidos olhos da “glória de Deus”, que resplandecia na “face de Jesus Cristo”, e olhou para si mesmo por tempo longo demais, corrompendo-os irremediavelmente. “A soberba do teu coração te enganou” (Ob 3). Mas como “aquele que comete pecado é escravo do pecado”, a soberba e o orgulho desenfreados deram lugar à violência, à injustiça e a um comércio profano. “Pela multidão das tuas iniquidades, pela injustiça do teu comércio pr ofanaste os teus santuár ios... na multiplicação do teu comér74
cio se encheu o teu inter ior de violência, e pecaste” (Ez 28.16,18). Vale a pena nos determos um pouco na expressão “comércio”. O que ele poderia estar negociando? O que ele tinha para vender? Exatamente o mesmo que o mundo “maligno” busca freneticamente: “formosura, sabedoria, resplendor”. E isto tinha de sobra o “sinete da perfeição”. Será que encontramos alguma sombra humana que nos sirva de alegoria para demonstrar os atos profanos daquele que era celestial? Não seria compatível com a Glória de Deus, nem com o seu zelo para com seus servos, não encontrarmos tal ilustração. “O segredo do Senhor é para os que o temem; e ele lhes fará saber o seu concerto” (Sl 25.14).
Absalão e Satanás Como “a história sempre se repete”, reprisa-se, como um sinal e parábola, a mesma arrogância e comércio no “tão belo e tão aprazível” Absalão. Compare a semelhança dos dotes de Absalão e Lúcifer.
“Não havia, porém, em todo Israel homem tão belo e tão aprazível como Absalão: desde a planta do pé até a cabeça não havia nele defeito algum” (2 Sm 14.25). Do anjo se diz, em Ez 28.12: “Tu és o aferidor da medida, cheio de sabedoria e perfeito em formosura”. Acompanhemos a descrição de Absalão na íntegra. 75
“E aconteceu depois disto que Absalão fez aparelhar carros e cavalos, e cinquenta homens que corressem adiante dele. Também Absalão se levantou pela manhã, e parava a uma banda do caminho da porta. E sucedia que a todo o homem que tinha alguma demanda para vir ao rei a juízo, o chamava Absalão a si e lhe dizia: De que cidade és tu? E dizendo ele: Duma das tribos de Israel é teu servo; então Absalão lhe dizia: Olha, os teus negócios são bons e retos, porém não tens quem te ouça da parte do rei. Dizia mais Absalão: Ah! Quem me dera ser juiz da terra! Para que viesse a mim todo o homem que tivesse demanda ou questão, para que lhe fizesse justiça. Sucedia também que, quando alguém se chegava a ele para se inclinar diante dele, ele estendia a sua mão, e pegava dele, e o beijava. E desta maneira fazia Absalão a todo o Israel que vinha ao rei para juízo: assim furtava Absalão o coração dos homens de Israel” (2 Sm 15.1-6). Deste texto, podemos extrair algumas comparações interessantes. Nenhum dos dois tinha direito ao trono. Além de Absalão não ser o primogênito, a escolha do Senhor foi Salomão. Conquanto Absalão represente Satanás, Salomão representa Cristo. Salomão, cujo nome deriva da palavra hebraica para “paz”, revela, em seu antítipo, a Jesus, o Príncipe da Paz, pelo ensino contido em Is 9.6. Assim como de Salomão se diz – “e o Senhor o amou” (2 Sm 12.24) –, do Filho se diz – “Este é o meu filho amado, em quem me comprazo” (Mt 3.17).
Conquanto Salomão e Jesus “não tiveram por usurpação o ser igual” ao seu devido Pai, Lúcifer e Absalão maquinaram e comerciaram na tentativa de usurpar o trono. Absalão não poderia, sozinho, tomar o reino; por isso “furtava Absalão o coração dos homens de Israel”. De Lúcifer, que inventou tal artimanha, se diz: “E a sua cauda levou após si a terça parte das estrelas do céu” (Ap 12.14). 76
Mas para se destronar alguém que é melhor que o pretendente ambicioso, só há um expediente disponível: mentiras e intrigas para subverter o coração dos ouvintes. Assim como Absalão mentia ao dizer: “não tens quem te ouça da parte do rei”, imagine as mentiras e calúnias que o “pai da mentira” apresentava aos seus companheiros a respeito daquele que é “o Santo e o Justo”. “A testemunha falsa desboca em mentiras” (Pv 14.5). “Estas seis coisas aborrece o Senhor e a sétima a sua alma abomina: olhos altivos, língua mentirosa, e mãos que derramam sangue inocente; coração que maquina pensamentos viciosos; pés que se apressam a correr para o mal; testemunha falsa que profere mentiras: e o que semeia contenda entre irmãos” (Pv 6.l6-l9).
Não há como melhorar a descrição de Satanás. Estas sete coisas tecem seu caráter e sua vestimenta de forma fidedigna. Seu comércio era a venda de uma ideia: motim, usurpação, rebelião. E quanto maior fosse o número de seguidores, mais próximo, calculava ele, confiantemente cego, estar de seu objetivo. “Eu subirei ao céu, acima das estrelas de Deus [eu] exaltarei o meu trono, e no monte da congregação [eu] me assentarei... [eu] subirei acima das mais altas nuvens, e [eu] serei semelhante ao Altíssimo” (Is 14.13-14). “O tolo espraia a sua loucura” (Pv l3.l6). Ele esqueceu que ‘justiça e juízo são a base do trono do justo Juiz’. Deus vindicaria Sua Santidade. 77
“A falsa testemunha não ficará inocente, e o que profere mentiras não escapará” (Pv 19.5). “O que usa de engano não ficará dentro da minha casa: o que profere mentiras não estará firme perante os meus olhos” (Sl 101.7). “Quem subirá ao monte do Senhor, ou quem estará no seu lugar santo? Aquele que é limpo de mãos e puro de coração, que não entrega a sua alma à vaidade, nem jura enganosamente” (Sl 24.3-4). Não havia mais lugar para Satanás no céu. “O sacrifício dos perversos já é abominação; quanto mais o oferecendo com intenção maligna!” (Pv 21.27). No último estágio de sua arrogância e impertinência, afrontava com atrevimento inédito – “Quem me derribará em terra?” (Ob 3). Qual a única resposta compatível com a santidade e justiça Divinas? “Pelo que te lançarei profanado fora do monte de Deus, e te farei perecer, ó querubim protetor” (Ez 28.16). “Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filha da alva! Como foste lançado por terra...” (Is 14.12) O Senhor Jesus, seu superior imediato, testemunhou: “Eu via Satanás, como raio, cair do céu” (Lc 10.18). Mas aquele que foi expulso do céu levou mais um terço da ordem celeste consigo, como já foi visto em Ap 12.4. “E a sua cauda levou após si a terça parte das estrelas do céu, e 78
lançou-as sobre a terra”. Deve-se fazer distinção entre este versículo e o nono, onde “ele foi precipitado na terra, e os seus anjos foram lançados com ele”. Um pouco de atenção na leitura se faz necessário em qualquer documento. Quanto mais no celestial! No v.4, é a cauda do dragão quem lança a terça parte das estrelas do céu; portanto, ele as arrasta consigo em seu castigo. No v.9, o dragão e os seus seguidores são lançados, juntamente, por terra, após a batalha com o arcanjo Miguel, mencionada no v.7. Trata-se, neste ponto, de sua expulsão definitiva do céu, que ainda se fará no período de tribulação futura e da “angústia de Jacó”, Israel. Os anjos que o seguiram se deixaram seduzir pelo comércio atraente do maioral querubim. Não seguiram o conselho da Palavra Eterna – “Não comas o pão daquele que tem os olhos malignos, nem cobices os seus manjares gostosos” (Pv 23.6).
Os 3 Céus A provável sequência das expulsões de Satanás dos céus é elucidada nas palavras de Paulo em 2 Coríntios 12.2-4. “Conheço um homem em Cristo que há quatorze anos (se no corpo não sei, se fora do corpo não sei; Deus o sabe) foi arrebatado até o terceiro céu. E sei que o tal homem (se no corpo, se fora do corpo, não sei; Deus o sabe) foi arrebatado ao paraíso; e ouviu palavras inefáveis, de que ao homem não é lícito falar”. Se o terceiro céu é o paraíso de Deus, pode-se concluir que a ex79
pulsão original de Lúcifer fosse do terceiro céu, onde está assentado o Todo Poderoso, que coincide com Ap 12.4 acima. Portanto, o seu reino ainda é vasto: todo o Universo. A segunda expulsão de Satanás, que se dará no período de sete anos de tribulação, ainda por vir, trata-se de sua expulsão do Universo, que se concentrará, com seus milhões de súditos infernais, aqui na terra, e no pequeno céu respirável que nos circunda. Será realmente um pequeno inferno quando hordas de seres corrompidos e vingativos se concentrarem num tão pequeno espaço. Chegamos assim ao ponto final da carreira de Lúcifer, o querubim-sacerdote que oferecia sacrifícios e louvor no templo de Deus, cujos caminhos, somente no mesmo templo poderão ser perfeitamente aquilatados. Começa então a carreira de Satanás, oponente incansável de Deus e de Seu Reino.
O caro leitor se lembra de que no princípio deste estudo comprovamos que os céus e a terra haviam sido criados por Deus de forma equilibrada e perfeita. O vasto cosmos, com seu incontável número de corpos celestes, seria a “habitação” (Jd 6) dos anjos criados, e também o meio de expressão dos seus devidos Ministérios para o desenvolvimento do Reino de Deus. Se havia outra ordem de seres criados na terra anteriormente ao homem, como alguns estudiosos acreditam, é muito difícil comprovar, e não entraremos no mérito, já que também não é o objetivo do presente instrumento. Também chegamos à conclusão, no estudo do estado caótico que se encontrava a terra no segundo versículo de Gênesis, que as expressões, “sem forma, vazia, abismo e águas inundantes”, eram resultado da entrada do pecado no mesmo Reino. O que parece lógico concluir é que a Terra tenha sido um importante elo entre Lúcifer e seu ministério, e bem provavelmente seu lugar de habitação. Se não, vejamos. 80
A descrição de Ezequiel 28.13, falando de Lúcifer, aponta que ele ‘estava no Éden, jardim de Deus’, antes de sua queda. Quando Deus criou o homem, colocou-o num jardim plantado no Éden, que indicava a Terra. Não há nas outras passagens das Escrituras, referentes ao Éden, noção de que este fosse celestial. Nunca o trono ou habitação de Deus é comparado ao Éden; portanto, conclui-se que, nesta passagem, o Éden é a própria Terra antes do juízo de Deus, e, portanto, o local de habitação de Lúcifer. Continuando no mesmo v.13, vemos que o “querubim ungido” estava vestido de minerais típicos do ambiente terreno, como a jaspe, safira, esmeralda e o ouro. Para encerrar esta questão, vamos verificar na sombra do sacerdócio levítico o que ocorria com o sumo sacerdote Aarão e os levitas que o serviam, estes tendo “o cuidado da guarda do tabernáculo do testemunho”, segundo Números 1.53. Assim como Lúcifer era querubim ungido para proteger o tabernáculo de Deus, os levitas guardavam “a sombra” do tabernáculo. Quando o acampamento dos judeus descansava de suas jornadas pelo deserto, não era digno de Deus que se assentassem desordenadamente, “porque Deus não é Deus de confusão” (1 Co 14.33). “Mas tu põe os levitas sobre o tabernáculo do testemunho, e sobre todos os seus vasos, e sobre tudo o que lhe pertence; eles levarão o tabernáculo e todos os seus vasos; e eles o administrarão, e assentarão o seu arraial ao redor do tabernáculo. E, quando o tabernáculo partir, os levitas o desarmarão; e, quando o tabernáculo assentar no arraial, os levitas o armarão; e o estranho que se chegar morrerá” (Nm 1.50-51). Queremos demonstrar que, embora os levitas administrassem sobre as peças do tabernáculo terreno, suas tendas ficavam de fora, vivendo em redor da mesma. Devido à sombra, Lúcifer tinha seu mi81
nistério no “monte Santo de Deus”, embora, pela necessidade da interpretação, vivesse fora do templo, precisamente no Éden, a Terra. Com sua expulsão do “monte Santo de Deus”, é fácil entender por que ele foi lançado para os domínios da terra: era sua morada original. “Por terra te lancei, diante dos reis te pus, para que olhem para ti” (Ez 28.17). A queda do anjo, embora normalmente se enfatize seu resultado nocivo em relação aos homens, teve enorme importância no Reino de Deus. Assim como Cristo divide a história humana em “antes e depois de Cristo”, a história de Deus se divide, em relação à sua atuação no Reino, em antes e depois da queda de Lúcifer, agora Satanás. Podemos perceber pelo menos quatro grandes desgraças ocasionadas no Reino de Deus por sua rebelião e queda.
A Primeira Grande Desgraça Uma das desordens, como demonstramos no início deste estudo, foi o castigo de Deus sobre todo o Universo e a deformidade da Terra, habitação do ex-sacerdote. É fácil perceber a necessidade do castigo de Deus sobre a “cobertura” de Lúcifer, examinando, pela sombra, o que ocorreu quando “homens dissolutos” se amotinaram no deserto, na tentativa de alcançar um sacerdócio que não lhes pertencia. Ouçamos. 82
“E Coré, filho de Jizar, filho de Coate, filho de Levi, tomou consigo a Datã e a Abirão, filhos de Eliabe, e a Om, filho de Pelete, filhos de Rúben, e levantaram-se perante Moisés com duzentos e cinquenta homens dos filhos de Israel, maiorais da congregação, chamados ao ajuntamento, varões de nome. E se congregaram contra Moisés e contra Arão, e lhes disseram: Demais é já, pois que toda a congregação é santa, todos eles são santos, e o Senhor está no meio deles: por que, pois, vos elevais sobre a congregação do Senhor? Como Moisés isto ouviu, caiu sobre o seu rosto, e falou a Coré e a toda a sua congregação, dizendo: Amanhã pela manhã o Senhor fará saber quem é seu, e quem o santo que ele fará chegar a si: e aquele a quem escolher fará chegar a si. Fazei isto: tomai vós incensários, Coré e todo a sua congregação; e, pondo fogo neles amanhã, sobre eles deitai incenso perante o Senhor: e será que o homem a quem o Senhor escolher, este será o santo: baste-vos, filhos de Levi. Disse mais Moisés a Coré: Ouvi agora, filhos de Levi: Porventura pouco para vós é que o Deus de Israel vos separou da congregação de Israel, para vos fazer chegar a si, a administrar o ministério do tabernáculo do Senhor e estar perante a congregação para ministrar-lhe: e te fez chegar, e todos os teus irmãos, os filhos de Levi, contigo; ainda também procurais o sacerdócio? Pelo que tu e toda a tua congregação congregados estais contra o Senhor; e Aarão, que é ele, que murmurais contra ele?” (Nm 16.1-11).
A ordem Levítica e Sacerdotal Deus havia sido claro que somente os filhos de Aarão teriam o ofício sacerdotal, e os levitas restantes estariam a seu cargo, conforme Números 3.1-9. “E estas são as gerações de Aarão e de Moisés, no dia em que o 83
Senhor falou com Moisés, no monte de Sinai. E estes são os nomes dos filhos de Aarão: o primogênito Nadabe; depois Abiú, Eleasar e Itamar. Estes são os nomes dos filhos de Aarão, dos sacerdotes ungidos, cujas mãos foram sagradas para administrar o sacerdócio. Mas Nadabe e Abiú morreram perante o Senhor, quando ofereceram fogo estranho perante o Senhor no deserto de Sinai, e não tiveram filhos: porém Eleasar e Itamar administraram o sacerdócio diante de Aarão, seu pai. E falou o Senhor a Moisés, dizendo: Faze chegar a tribo de Levi e põe-na diante de Aarão, o sacerdote, para que o sirvam, e tenham cuidado da sua guarda, e da guarda de toda a congregação, diante da tenda da congregação, para administrar o ministério do tabernáculo. E tenham cuidado de todos os vasos da tenda da congregação, e da guarda dos filhos de Israel, para administrar o ministério do tabernáculo. Darás, pois, os levitas à Aarão e a seus filhos: dentre os filhos de Israel lhes são dados em dádiva”.
Haviam se esquecido de um pequeno detalhe no versículo seguinte. “Mas a Aarão e a seus filhos ordenarás que guardem o seu sacerdócio, e o estranho que se chegar morrerá” (Nm 3.10). Qual foi o resultado óbvio deste motim? “E aconteceu que, acabando ele de falar todas estas palavras, a terra debaixo deles se fendeu. E a terra abriu a sua boca, e os tragou com as suas casas, como também a todos os homens que pertenciam a Coré, e a toda a sua fazenda. E eles e tudo que era seu desceram vivos ao sepulcro, e a terra os cobriu, e pereceram do meio da congregação. E todo o Israel, que estava ao redor deles, fugiu do clamor deles, porque diziam: Para que porventura também nos não trague a terra a nós. Então saiu fogo do Senhor, e consumiu os duzentos e cinquenta ho84
mens que ofereciam o incenso” (Nm l6.31-35). Porque cobiçaram um Ministério terreno, que representava o original, e por isso tiveram todos os seus pertences engolidos, muito mais o sacerdote que cobiçara o próprio Trono de Deus veria devastado tudo o que lhe pertencesse.
A Rebeldia de Israel e sua desolação E o que se dirá de Israel, e seu lugar de habitação, quando prevaricaram contra o Senhor e profanaram seu Santo Templo? “E dize: Ouvi a palavra do Senhor, ó reis de Judá, e moradores de Jerusalém: Assim diz o Senhor dos Exércitos, o Deus de Israel: Eis que trarei tão grande mal sobre este lugar, que quem quer que dele ouvir retinir-lhe-ão as orelhas: Porquanto me deixaram, e profanaram este lugar, e nele queimaram incenso a outros deuses, que nunca conheceram, nem eles nem seus pais, nem os reis de Judá; e encheram este lugar de sangue de inocentes... E porei esta cidade em espanto e por assobio: todo aquele que passar por ela se espantará e assobiará, por causa de todas as suas pragas” (Jr 19.3-4,8). “E disse o Senhor: Porque deixaram a minha lei, que publiquei perante a sua face, e não deram ouvidos à minha voz, nem andaram nela. Antes andaram após o propósito do seu coração, e após os baalins, que lhes ensinaram os seus pais. Portanto assim diz o Senhor dos Exércitos, Deus de Israel: Eis que darei de comer alosna a este povo e lhe darei a beber água de fel. E os espalharei entre nações, que não conheceram nem eles nem seus pais, e mandarei a espada após eles, até que venha a consumi-los” (Jr 9.13-16). 85
Assim como Israel teve sua cidade destruída e seus filhos foram lançados em cativeiro para longe de sua terra, o mesmo aconteceu com o anjo. Isto lembra o que o Senhor nos diz em Mateus 12.43-45. “Quando o espírito imundo tem saído do homem, anda por lugares áridos, procurando repouso, e não o encontra. Então diz: Voltarei para minha casa donde saí. E, voltando, acha-a desocupada, varrida e adornada. Então vai, e leva consigo outros sete espíritos, piores do que ele, e, entrando, habitam ali; então são os últimos atos desse homem piores que os primeiros. Assim também acontecerá com esta geração má”. O ocorrido é bem sugestivo. Satanás, sendo expulso de sua casa, andou como “estrela errante” pelas trevas e abandono do Universo. Ele só vai retornar em cena, quando o Senhor limpar e adornar a casa, na reformulação da Terra, mais precisamente após a posse dos novos moradores. O Salmo 109.1-11 é bem ilustrativo. “Ó Deus do meu louvor, não te cales; pois a boca do ímpio e a boca fraudulenta estão abertas contra mim: têm falado contra mim com uma língua mentirosa. Eles me cercaram com palavras odiosas, e pelejaram contra mim sem causa. Em paga do meu amor são meus adversários: mas eu faço oração. Deram-me mal pelo bem, e ódio pelo meu amor. Põe acima dele um ímpio, e Satanás esteja à sua direita. Quando for julgado, saia condenado; e em pecado se lhe torne a sua oração. Sejam poucos os seus dias, e outro tome o seu ofício. Sejam órfãos os seus filhos, e viúva sua mulher. Sejam vagabundos e mendigos os seus filhos, e busquem o seu pão longe das suas habitações assoladas. Lance o cr edor mão de tudo quanto tenha, e despojem-no 86
os estranhos do seu trabalho”. Observe que o homem fraudulento recompensa o mal com o bem, e, por isto, outro deve tomar seu ofício, e suas habitações devem ser assoladas. A conexão deste ímpio com Satanás não é incidental.
A Segunda Grande Desgraça A segunda desgraça causada pelo anjo rebelde é a mais cara do ponto de vista Divino. Comecemos examinando do nosso meio ambiente para demonstrarmos o celestial, enquanto o leitor pode ir se exercitando em seu raciocínio espiritual.
A contaminação pelo morto e pelo fluxo da mulher “Todo aquele que tocar em algum morto, cadáver de algum homem que estiver morto, e não se purificar, contamina o tabernáculo do Senhor: e aquela alma ser á extir pada de Isr ael: por que a água da separação não foi espargida sobre ele, imundo será: está nele ainda a sua imundícia” (Nm 19.13). “Também a mulher, quando manar o fluxo do seu sangue, por muitos dias fora do tempo da sua separação, ou quando tiver fluxo de sangue por mais tempo do que a sua separação, todos os dias da sua imundícia será imunda... Assim separareis os filhos de Israel das suas imundícias, para que não morram nas suas imundícias, contaminando o meu tabernáculo, que está no meio deles” (Lv 15.25,31). 87
Observe que nestes dois exemplos, apenas uma mulher com hemorragia prolongada e alguém tocando num corpo morto, sem a devida purificação, contaminavam o tabernáculo onde o Senhor aparecia numa nuvem. “Portanto, tão certo como eu vivo, diz o Senhor Jeová, pois que profanaste o meu santuário com todas as tuas cousas detestáveis, e com todas as tuas abominações, também eu te diminuirei e o meu olho te não perdoará, nem também terei piedade” (Ez 5.11). “Porquanto, havendo sacrificado seus filhos aos seus ídolos, vinham no meu santuário no mesmo dia para o profanarem; e eis que assim fizeram no meio da minha casa” (Ez 23.39). Observe também que os pecados e abominações de Israel “profanaram o santuário”, a ponto de que “a glória do Deus de Israel se levantou do querubim sobre o qual estava, até a entrada da casa” (Ez 10.4). É obvio que a glória do Senhor não poderia se retirar do Seu Santuário Eterno, mas não devemos deixar de comparar o resultado. Se uma simples mulher com uma hemorragia prolongada, sem a sua devida purificação, poderia contaminar o Santuário, que se dirá do Sacerdote Angélico que, ‘na multiplicação do seu comércio se encheu o seu interior de violência, pecando’ na casa do próprio Deus? O tabernáculo de Deus, Santíssimo, “não feito por mãos, isto é, não desta criação”, e todos os seus utensílios sagrados foram profanados pelo introdutor do pecado. Nada escapara à sua contaminação, nem mesmo uma “espevitadeira”. Tudo estaria irremediavelmente perdido se Deus já não tivesse preparado, muito anteriormente à criação dos anjos, algo que fosse suficientemente Majestoso para cobrir tamanha falha. 88
Todo o templo celestial precisaria ser purificado para poder continuar sendo digno de seu Habitante. “... a santidade convém à tua casa, Senhor, para sempre” (Sl 93.5). “Adorai ao Senhor na beleza da santidade...” (Sl 96.9).
A Terceira Grande Desgraça A terceira desgraça, resultado direto da expulsão de Lúcifer dos céus, foi um lugar vago no céu. Como ele levou consigo mais um terço dos anjos, então temos um terço das cadeiras celestes desocupadas. Podemos fazer uma aritmética ousada. Se o total de anjos criados por Deus fosse de um bilhão, teríamos trezentos e trinta e três milhões, trezentos e trinta e três mil, trezentos e trinta e três cadeiras a serem preenchidas. Se soar mal ao leitor a expressão cadeiras a serem preenchidas, vamos retornar às Escrituras. “... na cadeira de Moisés estão assentados os escribas e fariseus” (Mt 23.2). Na cadeira vaga de Moisés, ou seja, em seu lugar assentaram-se os escribas e fariseus, devendo estes zelar pelas ovelhas perdidas de Israel. Assim como estes, outros cargos e grupos tiveram sua substituição ordenada, como segue.
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O Princípio da Substituição Davi e Saul “E havia um homem de Benjamim, cujo nome era Quis... Este tinha um filho, cujo nome era Saul, mancebo, e tão belo que entre os filhos de Israel não havia outro homem mais belo do que ele; desde os ombros para cima sobressaia a todo o povo... Então tomou Samuel um vaso de azeite, e lho derramou sobre a cabeça, e o beijou, e disse: Porventura te não tem ungido o Senhor por capitão sobre a sua herdade... E o espírito do Senhor se apoderará de ti, e profetizarás com eles, e te mudarás em outro homem... e o espírito do Senhor se apoderou dele...” (1 Sm 9.1-2; 10.1,6,10). A sua extrema beleza e unção não nos lembram um personagem? Mas vejamos como ele se comporta. “Um ano tinha estado Saul em seu reinado: e o segundo ano reinou sobre Israel... E os filisteus se ajuntaram para pelejar contra Israel... povo em multidão como a areia que está à borda do mar... Vendo, pois, os homens de Israel que estavam em angústia (porque o povo estava apertado), o povo se escondeu pelas cavernas... E os hebreus passaram o Jordão para a terra de Gade e Gileade: e estando Saul ainda em Gilgal, todo o povo veio atrás dele tremendo. E esperou sete dias, até ao tempo que Samuel determinara; não vindo, porém, Samuel a Gilgal, o povo se espalhava dele. Então disse Saul: Trazei-me aqui um holocausto, e ofertas pacíficas. E ofereceu o holocausto. E sucedeu que, acabando ele de oferecer o holocausto, eis que Samuel chegou; e Saul lhe saiu ao encontro, para o saudar. Então disse Samuel: Que fizeste? Disse Saul:... Agora descerão os filisteus sobre mim a Gilgal, e 90
ainda à face do Senhor não orei; e violentei-me, e ofereci holocausto. Então disse Samuel a Saul: Obraste nesciamente, e não guardaste o mandamento que o Senhor teu Deus te ordenou; porque agora o Senhor teria confirmado o teu reino sobre Israel para sempre. Porém, agora não subsistirá o teu reino: já tem buscado o Senhor para si um homem segundo o seu coração, e já lhe tem ordenado o Senhor, que seja chefe sobre o seu povo, porquanto não guardaste o que o Senhor te ordenou” (1 Sm 13.1,5-14). “E o espírito do Senhor se retirou de Saul, e o assombrava um espírito mau da parte do Senhor” (1 Sm 16.14). O ungido do Senhor profanou seu reinado oferecendo um holocausto que só aos sacerdotes cabia oferecer, sendo assim destituído do seu cargo, e um substituto encontrado. Disse Deus: “Achei a Davi, meu servo; com o meu santo óleo o ungi” (Sl 89.20). A diferença básica de Saul para Davi, assim como de Lúcifer para Jesus, está na resposta de Samuel, o profeta, a Saul, quando este deixou de cumprir certa ordem de Deus em 1 Samuel l5.1-22. A sua resposta culmina no v.22. “Porém Samuel disse: Tem porventura o Senhor tanto prazer em holocaustos e sacrifícios, como em que se obedeça à palavra do Senhor? Eis que o obedecer é melhor do que o sacrificar: e o atender melhor é do que a gordura de carneiros”. Não se vê obediência gerada pelo amor a Deus em Saul e Lúcifer, atitudes predominantes em Davi e Jesus. De Davi, Deus diz: “Achei a Davi, meu servo... Ele me invocará dizendo: Tu és meu Pai, meu Deus, e a rocha da minha salvação” (Sl 89.20,26). 91
O Senhor Jesus diz o mesmo: “... dize-lhes que eu subo para o meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus...” (Jo 20.17). “E me disse: Tu és o meu servo...” (Is 49.3). A corrupção e contaminação de Saul e Lúcifer exigiram de Deus sua expulsão e consequente substituição já planejada anteriormente por Deus, pois como vimos, antes mesmo de Samuel conhecer a Davi como substituto, Deus já lhe havia anunciado: “... já tem buscado o Senhor para si um homem segundo o seu coração, e já lhe tem ordenado o Senhor que seja chefe sobre o seu povo... O Senhor tem rasgado de ti hoje o reino de Israel, e o tem dado ao teu próximo, melhor que tu” (1 Sm 13.14; 15.28).
Na verdade, Deus só esperava pacientemente a manifestação do erro deles, para mostrar o seu substituto cheio da Sua Graça. E assim como Jesus espera a derrota definitiva de Satanás para exercer a autoridade do seu trono, Davi teve que esperar que Saul completasse sua longa carreira antes que assumisse o cargo. “Porque Davi não subiu aos céus, mas ele próprio diz: Disse o SENHOR ao meu Senhor: Assenta-te à minha direita, até que ponha os teus inimigos por escabelo dos teus pés” (At 2.34-35). “E depois pediram um rei, e Deus lhes deu por quarenta anos, a Saul filho de Kis... E, quando este foi retirado, lhes levantou como rei a Davi...” (At l3.21-22). Vejamos um segundo exemplo da necessidade de substituição. 92
Israel e a Igreja “Pois quê? O que Israel buscava não o alcançou; mas os eleitos o alcançaram, e os outros foram endurecidos... Digo, pois: porventura tropeçaram, para que caíssem? De modo nenhum, mas pela sua queda veio a salvação aos gentios, para incitá-los à emulação [ou inveja]. E, se a sua queda é a riqueza do mundo, e a sua diminuição a riqueza dos gentios, quanto mais a sua plenitude! Porque convosco falo, gentios, que, enquanto for apóstolo dos gentios, glorificarei o meu ministério; para ver se de alguma maneira posso incitar à emulação os da minha carne e salvar alguns deles. Porque, se a sua rejeição é a reconciliação do mundo, qual será a sua admissão, senão a vida dentre os mortos? E, se as primícias são santas, também a massa o é; se a raiz é santa, também os ramos o são. E se alguns dos ramos foram quebrados, e tu, sendo zambujeiro, foste enxertado em lugar deles, e feito participante da raiz e da seiva da oliveira... está bem: pela sua incredulidade foram quebrados, e tu estás em pé pela fé: então não te ensoberbeças, mas teme” (Rm 11.7,11-17,20). “Denominou-te o Senhor oliveira verde, formosa por seus deliciosos frutos; mas agora, à voz dum grande tumulto, acendeu fogo ao redor dela e se quebraram os seus ramos. Porque o Senhor dos Exércitos que te plantou, pronunciou contra ti o mal, pela maldade da casa de Israel e da casa de Judá, que para si mesmos fizeram, pois me provocaram à ira, queimando incenso a Baal” (Jr 11.16-17). Ao formar Deus a nação de Israel através da semente de Abraão, tinha Ele em mente, através deles, a expansão do seu Reino para todas as nações, designadas “os gentios”. Devido o seu desprezo à vontade do Senhor, o Senhor mesmo os lançou fora de sua própria terra como castigo, constituindo novos servos em seu lugar.
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Na parábola dos lavradores maus, Jesus deixa esta substituição bem clara. “Ouvi ainda, outra parábola: houve um homem, pai de família, que plantou uma vinha, e circundou-a de um valado, e construiu nela um lagar, e edificou uma torre, e arrendou-a a uns lavradores, e ausentou-se para longe. E, chegando o tempo dos frutos, enviou os seus servos aos lavradores, para receber os seus frutos. E os lavradores, apoderando-se dos servos, feriram um, mataram outro, e apedrejaram outro. Depois enviou outros servos, em maior número do que os primeiros; e eles fizeram-lhes o mesmo; e por último enviou-lhes seu filho, dizendo: Terão respeito a meu filho. Mas os lavradores, vendo o filho, disseram entre si: Este é o herdeiro; vinde, matemo-lo, e apoderemo-nos da sua herança. E, lançando mão dele, o arrastaram para fora da vinha, e o mataram. Quando pois vier o Senhor da vinha, que fará àqueles lavradores? Dizem-lhes eles: Dará afrontosa morte aos maus, e arrendará a vinha a outros lavradores, que a seu tempo lhe dêem os frutos. Diz-lhes Jesus: Nunca lestes nas Escrituras: A pedra que os edificadores rejeitaram, essa foi posta por cabeça do ângulo; pelo Senhor foi feito isto, e é maravilhoso aos nossos olhos? Portanto vos digo que o reino de Deus vos será tirado, e será dado a uma nação que dê os seus frutos” (Mt 21.33-43). O auge da rebelião de Israel foi a rejeição de seu Messias prometido, Jesus, o filho herdeiro. Como Deus não encontrou “frutos dignos de arrependimento”, “alguns dos ramos foram cortados”, e enxertados em seu lugar aqueles que estavam “separados da comunidade de Israel, e estranhos ao concerto da promessa, não tendo esperança, e sem Deus no mundo” (Ef 2.12). Jesus “veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de 94
Deus; aos que creem no seu nome” (Jo 1.12). “Mas Paulo e Barnabé, usando de ousadia, disseram: Era mister que a vós [judeus] se vos pregasse primeiro a palavra de Deus: mas, visto que o rejeitais, e vos não julgais dignos da vida eterna, eis que nos voltamos para os gentios. Por que assim o Senhor no-lo mandou: Eu te pus para luz dos gentios, para que sejas de salvação até aos confins da terra” (At 13.46-47). “Fui buscado dos que não perguntavam por mim; fui achado daqueles que me não buscavam: a um povo que se não chamava do meu nome eu disse: Eis-me aqui. Estendi as minhas mãos todo o dia a um povo rebelde, que caminha por caminho que não é bom, após os seus pensamentos: povo que me irrita diante da minha face de contínuo, sacrificando em jardins e queimando incenso sobre tijolos... Eis que está escrito diante de mim: não me calarei; mas eu pagarei, sim, deitarlhes-ei a recompensa no seu seio” (Is 65.1-3,6). Deixando Deus de lado, “por um momento”, a nação de Israel, que desprezou a Sua Palavra, Ele trata agora daqueles que aceitam a salvação oferecida por Jesus na cruz do calvário, e que serão os responsáveis, neste tempo presente, em desenvolver o reino de Deus rejeitado por Israel. “Mas vós sois a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido, para que anuncieis as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1 Pe 2.9). A reunião de todos estes novos súditos que creram no Senhor Jesus passa a ser designada por Ele mesmo de Igreja, o corpo de Cristo, “para que agora, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida dos principados e potestades” (Ef 3.10). 95
“Digo pois: Por ventura rejeitou Deus o seu povo?... Deus não rejeitou o seu povo, que antes conheceu... o endurecimento veio em parte sobre Israel, até que a plenitude dos gentios haja entrado” (Rm 11.1-2,25). Quando Deus voltar a tratar com Israel, eles se lembrarão de que o Senhor já havia dito: “Por um pequeno momento te deixei, mas com grande misericórdia te recolherei... E assim todo o Israel será salvo, como está escrito: De Sião virá o Libertador, e desviará de Jacó as impiedades” (Is 54.7 / Rm 11.27). “Volta, óh Senhor, para os muitos milhares de Israel” (Nm 10.36). Comentaremos mais adiante novamente sobre Israel e a Igreja. Por ora, basta entendermos que a responsabilidade em guardar e anunciar a Vontade de Deus em Sua Palavra foi momentaneamente passada para a Igreja, devido à rejeição de Israel. Deus não pode permitir que seus Planos sejam interrompidos por quem quer que seja, pois “assim será a palavra que sair da minha boca: ela não voltará para mim vazia, antes fará o que me apraz, e prosperará naquilo para que a enviei” (Is 55.11). A substituição dos mordomos em caso de negligência é uma necessidade. Mas vejamos ainda um outro mordomo “malvado” sendo substituído por um altamente qualificado, embora fosse da mesma espécie.
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Paulo ou Matias? “Naqueles dias, levantando-se Pedro no meio dos discípulos, (ora a multidão junta era de quase 120 pessoas) disse: Varões irmãos, convinha que se cumprisse a escritura que o Espírito Santo predisse pela boca de Davi, acerca de Judas, que foi o guia daqueles que prenderam a Jesus; porque foi contado conosco e alcançou sorte neste ministério. Ora este adquiriu um campo com o galardão da iniquidade; e, precipitando-se, rebentou pelo meio, e todas as suas entranhas se derramaram. E foi notório a todos os que habitam em Jerusalém; de maneira que na sua própria língua esse campo se chama Aceldama, isto é, Campo de sangue. Porque no livro de Salmos está escrito: Fique deserta a sua habitação, e não haja quem nela habite, e tome outro o seu bispado. É necessário pois que, dos varões que conviveram conosco todo o tempo em que o Senhor Jesus entrou e saiu dentre nós, começando desde o batismo de João até ao dia em que dentre nós foi recebido em cima, um deles se faça conosco testemunha da sua ressurreição. E apresentaram dois: José, chamado Barsabás, que tinha por sobrenome o Justo, e Matias. E, orando, disseram: Tu, Senhor, conhecedor dos corações de todos, mostra qual destes dois tens escolhido, para que tome parte neste ministério e apostolado, de que Judas se desviou, para ir para o seu próprio lugar. E lançando-lhes sortes, caiu a sorte sobre Matias. E por voto comum foi contado com os onze apóstolos” (At 1.15-26). Quero que o leitor perceba a pronta necessidade humana. É absolutamente natural que eles quisessem substituir o apóstolo perdido. A base de nossa sociedade funciona pela substituição daqueles que, por motivos vários, são removidos de seu cargo. Qualquer empresário não ficaria inerte ao ver um de seus gerentes removido do cargo. A substituição é óbvia e necessária para o bom andamento da empresa. Também neste caso espiritual, a mesma necessidade é refletida. Mas 97
embora a necessidade fosse legítima, a forma da escolha foi apressada e em nada espiritual. A sorte é inimiga da oração. Os onze apóstolos primeiros foram escolhidos pelo Senhor, e o 12º faltante também era de Sua responsabilidade. É quase uma constante humana que quando o homem deve agir, ele para, e quando deve esperar, sai correndo. A resposta do Senhor é óbvia. “E respondeu Ananias: Senhor, a muitos ouvi acerca deste homem, quantos males tem feito aos teus santos em Israel; e aqui tem poder dos principais dos sacerdotes para prender a todos os que invocam o seu nome. Disse-lhe, porém, o Senhor: Vai, porque este é para mim um vaso escolhido para levar o meu nome diante dos gentios, e dos reis e dos filhos de Israel. E eu lhe mostrarei quanto deve padecer pelo meu nome. E Ananias foi, e entrou na casa, e, impondo-lhe as mãos, disse: Irmão Saulo, o Senhor Jesus, que te apareceu no caminho por onde vinhas, me enviou, para que tornes a ver e sejas cheio do Espírito Santo. E logo lhe caíram dos olhos como que umas escamas, e recuperou a vista; e, levantando-se, foi batizado. E, tendo comido, ficou confortado. E esteve Saulo alguns dias com os discípulos que estavam em Damasco. E logo nas sinagogas pregava a Jesus, que este era o Filho de Deus” (At 9.13-20). Também a voz do Espírito se ouve pela boca de Paulo. “Paulo apóstolo (não da parte dos homens, nem por homem algum, mas por J esus Cr isto, e por Deus Pai, que o r essuscitou dos mortos)...” (Gl 1.1). Não há lugar para o nome de Matias nas doze colunas da “Santa Jerusalém, que de Deus” descerá dos céus em breve. “E o muro da cidade tinha doze fundamentos, e neles os nomes 98
dos doze apóstolos do Cordeiro” (Ap 21.14). De forma muito clara e natural, vimos nestes três exemplos a substituição daqueles que, devido à sua negligência, perderam uma grande honra em seu favor. Da mesma forma, de maneira igualmente natural, assim como houve substituição para estes, que são terrenos, certamente haveria a necessidade de substituir o celestial, para o pleno funcionamento do reino de Deus. Na verdade, Deus tinha duas opções para resolver este ‘impasse’. Uma opção Ele proporia bem à frente no tempo como sombra, sugerindo a Moisés: “Tenho visto a este povo, e eis que é um povo obstinado. Agora, pois, deixa-me, que o meu furor se acenda contra eles, e os consuma: e eu farei de ti uma grande nação” (Êx 32.10).
Realmente Deus não tinha esta intenção. Em primeiro lugar “Ele conhece a nossa estrutura; lembrase de que somos pó” (Sl 103.14). Ademais, não precisa da permissão de um “caco entre outros cacos de barro!” (Is 45.9). Como Deus havia elegido Moisés para levar Seu povo à terra prometida, o que Deus fazia era revelar o que havia no coração de Moisés, para o próprio Moisés. Aquele que havia negligenciado a ordem de Deus um pouco antes, dizendo: “Quem sou eu?... eis que me não crerão... não sou homem eloquente... envia por mão daquele a quem tu hás de enviar” (Êx 3.11; 4.1,10,13), havia mudado completamente de ânimo a ponto de se preocupar com a glória de Deus e ainda interpelar pelo povo. “Porém Moisés suplicou ao Senhor seu Deus, e disse: Ó Senhor, porque se acende o teu furor contra o teu povo, que tu tiraste da terra 99
do Egito com grande força e com forte mão? Porque hão de falar os egípcios, dizendo: Para mal os tirou, para matá-los nos montes, e para destruí-los da face da terra. Torna-te da ira do teu furor, e arrependete deste mal contra o teu povo. Lembra-te de Abraão, de Isaque, e de Israel, os teus servos, aos quais por ti mesmo tens jurado, e lhes disseste: Multiplicarei a vossa semente como as estrelas dos céus, e darei à vossa semente toda esta terra, de que tenho dito, para que a possuam por herança eternamente. Então o Senhor arrependeu-se do mal que havia de fazer ao seu povo” (Êx 32.11-14).
Substituir os anjos por outros ou humilhá-los? Uma alternativa então seria destruir os anjos rebeldes e colocar outros do mesmo gabarito no lugar. Nada mais simples. Porém, nada mais indigno da Sabedoria e do Poder infinitos que Deus apregoa na Sua Própria Palavra. Talvez o melhor reflexo citado na Escritura para exemplificar o que queremos mostrar esteja numa parábola de Jesus. “Porém ele lhe disse: Um certo homem fez uma grande ceia, e convidou a muitos. E à hora da ceia mandou o seu servo dizer aos convidados: Vinde, que já tudo está preparado. E todos à uma começaram a escusar-se. Disse-lhe o primeiro: Comprei um campo, e importa ir vê -lo; rogo-te que me hajas por escusado. E outro disse: Comprei cinco juntas de bois, e vou experimentá-los; rogo-te que me hajas por escusado. E outro disse: Casei, e portanto não posso ir. E, voltando aquele servo, anunciou estas coisas ao seu senhor. Então o pai de família, indignado, disse ao seu servo: Sai depressa pelas ruas e bairros da cidade, e traze aqui os pobres, e aleijados, e mancos e cegos. E disse o servo: Senhor, feito está como mandaste; e ainda há lugar. E disse o senhor ao servo: Sai pelos caminhos e valados e força-os a entrar, para 100
que a minha casa se encha. Porque eu vos digo que nenhum daqueles varões que foram convidados provará a minha ceia” (Lc 14.16-24). Como os convidados não se achavam ‘dignos’ da ceia, o que representava uma afronta, o homem retribui-lhes, humilhando-os, ao convidar todos os desprezados da sociedade. O princípio da escolha de um menor no lugar de um maior, como forma de humilhação, encontra -se em 1 Coríntios 1.27-28. “Mas Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias; e Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes. E Deus escolheu as coisas vis deste mundo, e as desprezíveis, e as que não são, para aniquilar as que são”. Segundo este princípio então, a segunda alternativa de Deus seria formar novas criaturas para preencher a lacuna celeste, porém inferiores aos primeiros, como meio de humilhá-los, já que desprezaram a honra que tinham recebido. Deus encontrou tais seres. “Quando vejo os teus céus, obra dos teus dedos, a lua e as estrelas que preparaste, que é o homem mortal para que te lembres dele? E o filho do homem, para que o visites?” (Sl 8.3-4). “Certamente que os homens de classe baixa são vaidade, e os homens de ordem elevada são mentira; pesados em balanças, eles juntos são mais leves do que a vaidade” (Sl 62.9). “Tu reduzes o homem à destruição; e dizes: Volvei, filhos dos homens. Porque mil anos são aos teus olhos como o dia de ontem que passou, e como a vigília da noite. Tu os levas como corrente de água: são como um sono: são como a erva que cr esce de madr ugada, de madrugada cresce e floresce: à tarde corta-se e seca... A duração da nossa vida é de setenta anos, e se alguns, pela sua robustez, chegam a 101
oitenta anos, o melhor deles é canseira e enfado, pois passa rapidamente, e nós voamos” (Sl 90.3-6,10). “O Senhor conhece os pensamentos do homem, que são vaidade” (Sl 94.11). “Pois ele conhece a nossa estrutura; lembra-se de que somos pó. Porque o homem, são seus dias como a erva; como a flor do campo, assim floresce; pois, passando por ela o vento, logo se vai, e o seu lugar não conhece mais” (Sl l03.14-16). “Dá-nos auxílio para sairmos da angústia, porque vão é o socorro da parte do homem” (Sl 108.12). Mas antes de formar o homem, conforme demonstrado no começo deste estudo, havia a necessidade de uma habitação para este novo e nada promissor ser. Contudo, a Terra e o Universo encontravam-se estéreis após o juízo de Deus. Vimos que a Terra era o lugar de habitação de Lúcifer, e se Deus queria humilhá-lo, não havia lugar melhor para Deus colocar o homem senão na sua própria casa. Isto nos relembra Mateus 12.28-29, quando Cristo diz: “Mas, se eu expulso os demônios pelo Espírito de Deus, é conseguintemente chegado a vós o reino de Deus. Ou como pode alguém entrar em casa do homem valente, e furtar os seus bens, se primeiro não manietar o valente, saqueando então a sua casa?” O mais valente, Deus, expulsou Lúcifer de sua habitação, o Éden, para colocar o homem em seu lugar, e, através dele, reimplantar o seu Reino. Que humilhação! Aquele que percorria os átrios do Senhor tendo sua habitação desolada e seus pertences dados a um ser incomparavelmente menor! 102
Mas surge um pequeno problema de ordem técnica. A terra estava contaminada. Mais um motivo para a necessidade daquele intervalo imenso de desolação, depois que a terra foi julgada. Encontramos este correlato no desprezo de Israel em guardar o sábado santo do Senhor. Deus havia dito: “Quando tiverdes entrado na terra que eu vos dou, então a terra guardará um sábado ao Senhor. Seis anos semearás a tua terra, e seis anos podarás a tua vinha, e colherás a sua novidade; porém ao sétimo ano haverá sábado de descanso para a terra, um sábado ao Senhor: não semearás o teu campo nem podarás a tua vinha” (Lv 25.2-4). “Pelo seu muito amor com que nos amou”, até a terra teria direito ao descanso, para que não fosse continuamente lavrada. O leitor pode fazer a mesma pergunta que o povo hebreu: “... Que comeremos no ano sétimo, visto que não havemos de semear nem colher a nossa novidade? Então eu mandarei a minha bênção sobre vós no sexto ano, para que dê fruto por três anos. E no oitavo ano semeareis, e comereis da colheita velha até ao ano nono: até que venha a sua novidade, comereis a velha” (Lv 25.20-22). Aqui não era uma simples questão de obediência; era obediência gerada pela fé. Sempre foi e sempre será assim para aqueles que se identificam com o Deus de toda a Graça. “O justo viverá da fé” (Rm 1.17). Pois se Deus não cumprisse sua promessa de provisão abundante no sexto ano, o que se comeria no sétimo? Imagine que Deus lhe ordenasse não trabalhar no ano sétimo, pois no sexto Ele proveria o lucro necessário para passar o sétimo descansando. Este é o grau de fé que Deus lhes exigia. 103
“Mas a casa de Israel se rebelou contra mim no deserto... e profanaram grandemente os meus sábados... por isso eu disse que derramaria sobre eles o meu furor” (Ez 20.13,21). “E vos espalhareis entre as nações, e desembainharei a espada atrás de vós; e a vossa terra será assolada, e as vossas cidades serão desertas. Então a terra folgará nos seus sábados todos os dias da sua assolação, e vós estareis na terra dos vossos inimigos; então a terra descansará, e folgará nos seus sábados. Todos os dias da assolação descansará, porque não descansou nos vossos sábados, quando habitáveis nela” (Lv 26.33-35). A promessa de Deus cumpriu-se quando Israel foi levado em cativeiro para Babilônia por setenta anos. “E os que escaparam da espada levou para Babilônia; e fizeramse servos, dele e de seus filhos, até ao tempo do reino da Pérsia. Para que se cumprisse a palavra do Senhor, pela boca de Jeremias, até que a terra se agradasse dos seus sábados; todos os dias da desolação repousou, até que os setenta anos se cumpriram” (2 Cr 36.20-21). Ora, se a terra de Israel ficou desolada por setenta anos simplesmente porque violaram os seus sábados, quantos milhares de anos seriam necessários para dar descanso ao local em que habitara o adúltero e profano querubim, introdutor de todo o fermento do mal no reino de Deus? Portanto, a Teoria do Intervalo deixa de ser uma teoria, e passa a ser pela tremenda necessidade espiritual envolvida o ‘Período de Descanso’. Mas faltava ainda algo tremendo e inédito para uma perfeita descontaminação do ambiente, pois como está escrito: “E quase todas as coisas, segundo a lei, se purificam com sangue; e sem derramamento de sangue não há remissão” (Hb 9.22). 104
A Libertação da Terra no Ano do Jubileu Também é óbvio que encontramos uma alegoria no Antigo Testamento para demonstrar de forma cabal esta questão. “Também contarás sete semanas de anos, sete vezes sete anos: de maneira que os dias das sete semanas de anos te serão quarenta e nove anos. Então no mês sétimo, aos dez do mês, fará passar a trombeta do jubileu: no dia da expiação fareis passar a trombeta por toda a vossa terra. E santificarei o ano quinquagésimo, e apregoareis liberdade na terra a todos os seus mor ador es: ano de jubileu vos ser á, e tornareis, cada um à sua possessão, e tornareis, cada um à sua família... Também a terra não se venderá em perpetuidade, porque a terra é minha; pois vós sois estrangeiros e peregrinos comigo. Portanto em toda a terra da vossa possessão dareis resgate à terra. Quando teu irmão empobrecer e vender alguma porção da sua possessão, então virá o seu resgatador, seu parente, e resgatará o que vendeu seu irmão. Se alguém não tiver resgatador, porém a sua mão alcançar e achar o que basta para o seu resgate, então contar á os anos desde a sua venda, e o que ficar restituirá ao homem a quem o vendeu, e tornará à sua possessão. Mas, se a sua mão não alcançar o que basta para restituirlha, então a que for vendida ficará na mão do comprador até ao ano do jubileu: porém no ano do jubileu sairá, e ele tornará à sua possessão” (Lv 25.8-10; 23-28). Aqui temos uma provisão amorosa de Deus. Se alguém por motivo de pobreza tivesse que vender sua propriedade, esta não ficaria perpetuamente com o que a comprou. Desta sorte, o pobre não teria chances de usufruir a terra, que era essencial na antiguidade. No quinquagésimo ano, as terras voltariam para seus antigos donos, “porque a terra é do Senhor”, e nós a usamos para nosso proveito, 105
por permissão dele. Mas o mais valioso nesta provisão de Deus, no entanto, era a base legal pela qual estava sustentada: “no dia da expiação”. O dia da expiação era, continua sendo e ainda será, cumprido no seu verdadeiro caráter, o dia máximo do povo hebreu. Era o dia em que “o sumo sacerdote, uma vez no ano”, entrava no lugar santíssimo, onde estava a arca do concerto, lugar da presença de Deus, trazendo o sangue do sacrifício “por si mesmo e pelas culpas do povo” (Hb 9.7). Somente uma vez no ano, somente o sumo sacerdote entrava no lugar Santíssimo, depois do véu que separava a tenda, para apresentar o sangue por si mesmo e pelo resto do povo. Era o dia do perdão Nacional, ainda hoje comemorado pelos judeus, o Yom Kippur. A provisão do resgate da terra, no ano do jubileu, contado de cinquenta em cinquenta anos, também se baseava na provisão de Deus de um resgatador das nossas misérias. Como não podemos pagar pelas nossas dívidas para com Deus, Ele mesmo providenciou Alguém que pudesse fazê-lo por nós. Porém, no caso de Deus, como a Terra era dele mesmo, Ele teria que ser seu próprio resgatador, pois sua ‘mão alcançava o que bastava’. Além disto, não se tratava de um caso de venda da propriedade por empobrecimento, mas da contaminação da mesma. A purificação e seu resgate se deram no dia do compromisso da oferta voluntária do Filho Eterno na fundação do mundo. Voltaremos a complementar este assunto mais adiante, para uma melhor compreensão. O que importa por agora é que o resgate da terra se dava a cada cinquenta anos, mas que coincidia com o dia do sacrifício anual feito pelo sumo sacerdote Aarão. Transportemo-nos então para o passado. Deus havia dado a Lúcifer um local para a sua morada, a Terra. Devido seu pecado, a Terra contaminou-se. Naquele intervalo imenso 106
de tempo, após Seu julgamento terrível sobre a Terra e o Universo, Deus deu o devido descanso à terra. E a terra só poderia voltar às mãos do Senhor no ano do jubileu, que correspondia ao dia em que o sumo sacerdote entrava com o sangue do sacrifício no lugar mais Santo do Tabernáculo. E é exatamente isto que vemos, quando o Cordeiro foi morto desde a fundação do mundo. Lembre-se que o sangue do Cordeiro foi conhecido ainda antes da fundação do mundo, na eternidade passada, mas o Cordeiro foi morto desde a fundação do mundo. É óbvio que este sacrifício do Cordeiro apresentado no altar celeste era uma sombra, figura do verdadeiro sangue que o Filho de Deus Eterno manifestaria quando de sua encarnação e posterior sofrimento na cruz. Alguém poderia pensar que a “fundação do mundo”, aqui retratada, fosse a da criação original da Terra, antes de seu caos. Mas o próprio Senhor Jesus coloca a mesma expressão no contexto do sangue de Abel. “Para que desta geração seja requerido o sangue de todos os profetas que, desde a fundação do mundo, foi derramado; desde o sangue de Abel...” (Lc 11.50-51). Como ela está diretamente associada ao sangue de Abel, somos obrigados a enxergar, pelo prisma da sombra do jubileu, a necessidade daquele sacrifício celeste se colocar na reformulação da Terra, pois desta forma, a habitação que havia sido dada a Lúcifer retornaria para as mãos de Deus de forma legítima e incontaminada após o longo descanso da Terra. Outra passagem interessante nos auxilia a alicerçar o assunto. “Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo” (Mt 25.34). 107
Estes, que virão a possuir o reino, são aqueles que Deus “elegeu nele antes da fundação do mundo” (Ef 1.4). Observe então mais uma necessidade daqueles sacrifícios feitos na eternidade passada pelas mãos do Querubim. Só poderiam ser eleitos os novos súditos do Reino no passado remoto, se Deus já houvesse preparado um Plano de substituição anteriormente a tudo; porque Deus já premeditara a queda de Lúcifer; já premeditara um Reino e todos os súditos escolhidos com base no sacrifício, e já premeditara o conhecimento deste sangue pelos anjos no passado remoto. E também já premeditara que os substitutos cairiam em desgraça por meio dos primeiros homens criados, Adão e Eva; pois o Cordeiro havia sido morto no princípio da fundação do mundo, cujo sangue era elemento de formação do futuro homem. Com tal riqueza de detalhes neste Plano concebido por Deus, é impossível que Ele somente tenha antecipado as coisas, mas, antes, tenha determinado um Plano digno da Sua Vontade Soberana e Onisciente.
O Filho é empossado Sumo Sacerdote no Reino Retornando à questão do Cordeiro, vemos também que a sua morte desde a fundação do mundo colocou-o na posição de Sumo Sacerdote que substituiria o anjo caído em suas funções no reino de Deus. É provavelmente a partir daqui que o Filho de Deus é constituído Sumo Sacerdote para completar o lugar vago entre os três ministérios de que já falamos. E isto por dois motivos básicos. Primeiro, porque já que Ele precisava de novos seres para substituir todo aquele terço de anjos expulsos, e estes seres viriam do pó da 108
Terra, nada mais lógico que sua morte simbólica, como “Cordeiro imaculado e incontaminado”, se desse a partir da fundação da habitação em que seriam colocados estes seres. Por isto, com a sua morte desde a fundação do mundo, temos um ambiente descontaminado e purificado para receber os novos e frágeis seres: o Éden. Segundo, porque na consagração de Aarão para o sacerdócio, que é a sombra, um triplo sacrifício de sangue era necessário para tal ritual. “Então fará chegar a Aarão e seus filhos à porta da tenda da consagração, e os lavarás com água... e tomarás o azeite da unção: e o derramarás sobre a sua cabeça; assim o ungirás... E farás chegar o novilho diante da tenda da congregação... E degolarás o novilho perante o Senhor... Depois tomar ás o outr o car neir o e Aar ão e seus filhos porão as suas mãos sobre a cabeça do carneiro, e degolarás o carneiro... Então tomarás do sangue, que estará sobre o altar, e do azeite da unção e o espargirás sobre Aarão e sobre os seus vestidos, e sobre seus filhos, e sobre os vestidos de seus filhos com ele; para que ele seja santificado, e os seus vestidos...” (Êx 29.4,7,10-11,19-21). Embora aqui o sacrifício de sangue fosse para purificar os ministros, e o Filho não precisasse tal purificação, visto que seria “feito tanto mais excelente do que os anjos”, Ele o apresentou na “fundação do mundo” com o objetivo de, além de purificar e retomar a posse da Terra, antecipar Sua morte na mente de Deus e tornar tal símbolo uma promessa imutável de que Ele se comprometeria em resgatar o Homem quando este pecasse, sendo então o Sumo Sacerdote no reino que estava sendo proposto aos substitutos. Provavelmente a partir daqui, o Senhor da Glória, que é o responsável pelo Ministério de Sacerdócio entre a Tri-Unidade Divina, 109
acumule o cargo de Sumo Sacerdote em relação aos súditos angélicos, e será o responsável pelo recrutamento dos futuros súditos, para preencher a enorme falha celeste. A partir daqui, Ele acumulará o cargo e atuará como “o anjo do Senhor”, despachando lado a lado, na função Ministerial, com Gabriel e Miguel.
Resumo Antes de entrarmos na questão humana, é bom fazermos um novo resumo com o que foi acrescentado. “No princípio criou Deus os céus”, os ministros em “fogo abrasador”, “e a terra”, chamada Éden. “E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era tudo muito bom”.
No Reino disposto pela Divindade, coube ao Pai e seu anjo imediato, Miguel, o Governo; ao Filho e seu anjo imediato, Lúcifer, o Sacerdócio; ao Espírito e seu anjo Gabriel, o Ministério de Profecia. Lúcifer, habitando ou tendo seu domínio na Terra, ministrava como sacerdote no Santuário celeste, cujo modelo serviria de inspiração para o tabernáculo terrestre sob as mãos de Moisés.
Como o “sangue do Cordeiro” foi “conhecido antes da fundação do mundo”, e Lúcifer era responsável por oferecer sacrifícios no altar de holocausto celeste, certamente ele oferecia algo que representava como sombra este sangue, que seria “manifestado nestes últimos tempos por amor de vós”. Assim como os sacerdotes Araônicos ofereciam sacrifícios continuamente em claro apontamento do verdadeiro “Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo”, e por causa de sua negligência foram substituídos pelos “que não eram povo”, também 110
Lúcifer oferecia sacrifícios como sombra do Cordeiro futuro, para aqueles que não eram celestiais, ou seja, para os seres que ainda seriam criados e que tinham como corrente vital o sangue, num invólucro de “barro”. Lúcifer ia bem, ‘até que se achou iniquidade nele’, e na ‘multiplicação do seu comércio’, “levou após si a terça parte das estrelas do céu”. Lançado “profanado fora do monte de Deus”, teve a sua habitação, a Terra, e todo o Universo, residência dos demais anjos, devastados, “sem forma e vazia”. “Segundo o seu beneplácito que propusera em si mesmo”, e “segundo o conselho da sua vontade”, Deus “predestinou para filhos de adoção” os novos seres, ou mordomos, que seriam substitutos de Lúcifer e toda sua comitiva. Através do sacrifício do “Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo”, Deus pôde retirar a Terra do seu profundo sono no abismo, reconstituindo-a à condição de um novo Éden, em 6 dias. No entanto, o Universo ainda continua em descanso, visto que ainda não foi restaurado. Através deste mesmo sangue, ainda como sombra, Deus já dava a entender que estes novos mordomos também pecariam, mas o valor do resgate já estava providenciado, e de forma a humilhar o anjo rebelde, oferecido por suas próprias mãos desde a eternidade passada no altar celestial. Para os “anjos que não guardaram o seu principado”, somente juízo devastador da parte de Deus; para os futuros “cacos de barro”, misericórdia e graça, “as quais coisas os anjos desejam bem atentar”. Compreendo perfeitamente que neste estudo “há pontos difíceis 111
de entender”, e aconselho ao leitor e leitora à mesma prudência de Maria, que “guardava no seu coração todas estas coisas, conferindo-as”. O dia do Senhor trará todas as coisas à mais radiante luz, e todas as obras edificadas sobre o fundamento de Cristo que se equipararem à madeira, feno ou palha serão queimadas integralmente. “Se este conselho ou esta obra é de homens, se desfará, mas se é de Deus, não podereis desfazê-la”. Ninguém se ache precipitada e desafortunadamente com pedras em mãos, como Simei ao amaldiçoar Davi. Adentraremos agora à sombra propriamente dita, para abarcarmos melhor o modelo celestial, acompanhando com detalhes o tabernáculo terrestre em Israel, que também representa o tabernáculo de carne de cada indivíduo pertencente ao corpo de Cristo, a Igreja, “multiforme sabedoria de Deus”.
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4 Da Sombra
“
Ou não me é lícito fazer o que quiser do que é meu?” (Mt 20.15).
“E disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme à nossa semelhança” (Gn 1.26). “E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou em seus narizes o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente” (Gn 2.7). “E plantou o Senhor Deus um jardim no Éden, da banda do oriente: e pôs ali o homem que tinha formado... para o lavrar e o guardar” (Gn 2.8,15). “Eis aqui o homem”. O Éden reformado, seu antigo dono despejado, e, em seu lugar, homens feitos do pó da terra. Estes novos seres eram em tudo inferiores aos anjos. Desde o intelecto, posição e honra, até a fragilidade natural do corpo. Como é que Deus poderia elevar seres tão diminutos à mesma posição dos anjos caídos? Apesar dos dois novos seres, Adão e Eva, serem íntegros e santos, pois “Deus fez ao homem reto” (Ec 7.29), ainda eram feitos de carne, e “carne e sangue não podem herdar o Reino de Deus” (1 Co 15.50). “O primeiro homem, da terra, é terreno... Qual o terreno, tais são também os terrenos... trouxemos a imagem do terreno...” (1 Co 15.4749). Portanto somos da terra, e não haveria meio de participarmos 113
Portanto somos da terra, e não haveria meio de participarmos daquele tabernáculo celeste a menos que fôssemos transformados espiritualmente. É o que provavelmente aconteceria se o homem tivesse passado no teste proposto por Deus. Mas nesse caso, nem os anjos, e nem os próprios substitutos, conheceriam a outra face de Deus. A nossa sociedade está baseada no mérito, e por isto afunda constantemente. Não há lugar para misericórdia, amor, graça e bondade. Se Deus simplesmente recompensasse o homem por seu mérito em agradar a Deus, então tais atitudes elevadas seriam meras palavras vindas da boca de Deus. Os anjos que continuaram a ministrar no céu conheceriam somente justiça e juízo de Deus, a recompensa pelo acerto ou erro. E o castigo de Lúcifer teria sido de pouco proveito. Se o Plano de Deus fosse simplesmente substituir os anjos expulsos, nada mais fácil que criar novos anjos. Deus tinha que mostrar algo melhor, algo que fosse digno daquele que se diz ser “Amor”. E por isto Satanás ainda estava solto ao ser criado o homem. Deus tornaria seu trabalho ainda mais difícil. Além de o homem projetado ser de carne e sangue, impróprios para o meio ambiente celestial, permitiria que Satanás os contaminasse da mesma forma com que se contaminou. Ao colocar o homem no Éden, Deus alerta os novos condôminos: “Mas da árvore da ciência do bem e do mal, dela não comerás; porque no dia em que dela comeres, certamente morrerás” (Gn 2.17). O que Satanás propõe aos mancebos é a continuação daquele comércio profano entre os anjos: “sereis como Deus, sabendo o bem e o mal” (Gn 3.5). “Na verdade o rebelde não busca senão o mal” (Pv 17.11). 114
“Bem-aventurado o homem que me dá ouvidos, velando às minhas portas cada dia, esperando às ombreiras da minha entrada. Porque o que me achar, achará a vida, e alcançará favor do Senhor. Mas o que pecar contra mim violentará a sua própria alma: todos os que me aborrecem amam a morte” (Pv 8.34-36). Satanás sabia que este era “o herdeiro: vinde, matemo-lo, e apoderemo-nos da sua herança” (Mt 21.38).
A Quarta Grande Desgraça Eis a 4ª desgraça que prorrogamos para este capítulo: a intromissão do pecado na esfera humana. Em seu furor cego, Satanás não enxergava que ele mesmo seria instrumento da Graça de Deus. Ele estava certo que Deus os expulsaria irremediavelmente se pecassem. E realmente foram expulsos do jardim, pois “os rebeldes habitam em terra seca” (Sl 68.6). “O Senhor Deus, pois, o lançou fora do jardim do Éden, para lavrar a terra de que fora tomado” (Gn 3.23). Satanás exultava. Quanto mais Deus castigava, mais ele estava certo de sua vitória sobre os substitutos. “E à mulher disse: Multiplicarei grandemente a tua dor, e a tua conceição; com dor terás filhos; e o teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará. E a Adão disse: Porquanto deste ouvidos à tua mulher, e comeste da árvore de que te ordenei, dizendo: Não comerás dela: maldita é a terra por causa de ti; com dor comerás dela todos os di115
as de tua vida. Espinhos, e cardos também, te produzirão; e comerás a erva do campo. No suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra: porque dela foste tomado: porquanto és pó, e em pó te tornarás” (Gn 3.16-19). Adão, numa última tentativa de se esquivar do juízo de Deus, cobriu-se com figueiras, como se pudesse ocultar toda a sua vergonha. “Então foram abertos os olhos de ambos, e conheceram que estavam nus; e cozeram folhas de figueira, e fizeram para si aventais” (Gn 3.7). “Como o caco coberto de escórias de prata, assim são os lábios ardentes e o coração maligno. Aquele que aborrece dissimula com os seus beiços, mas no seu interior encobre o engano” (Pv 26.23-24). Óbvio que Deus não aceitaria este tipo de vestimenta. Além de não cobrir nada, partia do ofensor que se escondia. “Ouvi a tua voz soar no jardim, e temi, porque estava nu, e escondi-me” (Gn 3.10). Entrou então em cena algo que Satanás ainda não conhecia na prática. Havia oferecido inúmeras vezes sacrifícios no altar celeste que representavam o “sangue do Cordeiro conhecido ainda antes da fundação do mundo”, mas provavelmente, pelo orgulho e ostentação de sua elevada e privilegiada posição, só realmente veio a entender seu significado profundo quando o novo Sumo Sacerdote, Jesus pré-encarnado, “fez a Adão e a sua mulher túnicas de peles de animais”. Dois animais precisaram ser mortos. Começa então a longa cadeia de sacrifícios constantes e repetitivos, da mesma forma que Satanás oferecia no altar celeste: ambos serviam para mostrar como sombra a vinda de um sacrifício que anularia e complementaria a todos os outros. 116
Ninguém melhor para dar início à longa cadeia de sacrifícios animais que tipificavam a Cristo no porvir, do que o próprio Filho de Deus, que passou também a ser o anjo do Senhor, responsável pelo Ministério de Sacerdócio. Apesar do texto bíblico mencionar que o Senhor Deus fizera as túnicas de peles, não devemos esquecer que o Filho, na Divindade, participa dos mesmos títulos e atributos. Também parece claro que aquele “Senhor Deus que passeava no jardim pela viração do dia” (Gn 3.8), tratava-se de Jesus pré-encarnado, pois como disse o apóstolo João: “Ninguém jamais viu a Deus” (ERA). Pela força da expressão, “ninguém” significa nem mesmo Adão e Eva antes de pecarem. Aquele que era visto no jardim é quem veremos na eternidade: é a “Glória de Deus na face de Jesus Cristo” (2 Co 4.6). Pois como ele mesmo disse: “Quem me vê a mim, vê o Pai” (Jo 14.9); e “Não que alguém visse ao Pai” (Jo 6.46).
A Divindade do Anjo do Senhor Vamos consolidar neste ponto a aparição do anjo do Senhor (que é o Filho de Deus antes de se formar homem) como Ministro do Sacerdócio, em relação aos homens. Em Gênesis 18 vemos três varões aparecendo a Abraão; mas a Escritura diz que “apareceu-lhe o Senhor” (v.1). O que Abraão via? “E levantou os seus olhos, e olhou, e eis que três varões estavam em pé junto a ele” (v.2).
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Abraão reconheceu prontamente que um deles era o Senhor, visto que Ele já lhe havia aparecido em outras ocasiões. “E disse: Meu Senhor” (v.3). Um dos varões pergunta-lhe (lembrando a mesma pergunta feita a Adão no Éden: “Onde estás?”): “Onde está Sara, tua mulher?” (v.9). “Disse mais o Senhor: Porquanto o clamor de Sodoma e Gomorra se tem multiplicado, e porquanto o seu pecado se tem agravado muito, descerei agora, e verei se, com efeito, têm praticado segundo este clamor, que é vindo até mim; e se não, sabê-lo-ei. Então viraram aqueles varões o rosto dali, e foram-se para Sodoma; mas Abraão ficou ainda em pé diante da face do Senhor” (v.20-22). Revendo 2 Coríntios 4.6 logo acima, percebe-se que a face do Senhor é Jesus Cristo. Abraão ainda vai interpelar pelo povo justo que porventura houvesse na cidade, visto que seu sobrinho Ló habitava ali. E enquanto fica disputando com um dos anjos, que ele chama Senhor, “vieram os dois anjos a Sodoma à tarde” (Gn 19.1). É bem apropriado que o Sumo Sacerdote celeste fosse verificar a questão em Sodoma, visto que era o sacerdote quem tinha autoridade, conforme a sombra da lei, para verificar a lepra na carne, nos vestidos e na casa de algum israelita (Lv 13.3,47; 14.34-35). Esta seria a função de Lúcifer se ele houvesse se guardado do pecado, pois o leitor se lembra que ele foi constituído para “proteger” a Santidade de Deus. Comparemos mais uma passagem em que o Anjo do Senhor se manifesta. “E subiu o anjo do Senhor de Gilgal a Boquim, e disse: Do Egito eu vos fiz subir, e eu vos trouxe à terra que a vossos pais [eu] 118
tinha jurado, e disse: Nunca invalidarei o meu concerto convosco. E, quanto a vós, não fareis concerto com os moradores desta terra, antes derribareis os seus altares: mas vós não obedecestes à minha voz. Por que fizestes isto? Pelo que também eu disse: Não os expelirei de diante de vós; antes estarão às vossas ilhargas, e os seus deuses vos serão por laço. E sucedeu que, falando o anjo do Senhor estas palavras a todos os filhos de Israel, o povo levantou a sua voz e chorou. Pelo que chamaram aquele lugar, Boquim (choradores): e sacrificaram ali ao Senhor” (J z 2.1-5). Observe que o anjo do Senhor diz claramente aqui que é ele mesmo quem fez subir o povo de Israel do Egito, e quanto à promessa dada a Abraão por Jeová: “Eu sou o Deus todo poderoso... E estabelecerei o meu concerto entre ti e a tua semente depois de ti em suas gerações, por concerto perpétuo...” (Gn 17.1-8), está sendo relembrada pelo anjo como sendo sua. “Aquele que lê, entenda”. Se o anjo do Senhor se coloca no lugar do Todo Poderoso, é porque o é. É o Filho Eterno da Tri-Unidade Divina, interpelando aqui como Sacerdote, por estar oficiando para Deus em favor dos homens, com a Palavra que Ele mesmo como Deus dirigira a Abraão. Assim, o anjo do Senhor é o mensageiro sacerdotal por Ofício, ao substituir Lúcifer, ao mesmo tempo em que é “Deus bendito eternamente” por Natureza. Por fim, “sacrificaram ali ao Senhor”; e o Sacerdote obviamente aceitou o sacrifício. Vejamos ainda outra passagem para concluir nosso raciocínio. “E os filhos de Israel tornaram a fazer o que parecia mal aos olhos do Senhor, e o Senhor os entregou na mão dos filisteus por quarenta anos. E havia um homem de Zorá, da tribo de Dã, cujo nome era Manué: e sua mulher era estéril, e não tinha filhos. E o anjo do Senhor 119
apareceu a esta mulher, e disse-lhe: Eis que agora és estéril, e nunca tens concebido; porém conceberás, e terás um filho... será nazireu de Deus desde o ventre: e ele começará a livrar a Israel da mão dos filisteus... e o anjo de Deus veio outra vez à mulher, e ela estava no campo, porém não estava com ela seu marido Manué. Apressou-se pois a mulher, e correu, e notificou a seu marido, e disse-lhe: Eis que aquele homem que veio a mim o outr o dia me apar eceu. Então Manué levantou-se, e seguiu a sua mulher, e veio àquele homem, e disse-lhe: És tu aquele homem que falaste a esta mulher ? E disse: Eu sou. Então disse Manué: Cumpram-se as tuas palavras... deixa que te detenhamos, e te preparemos um cabrito. Porém o anjo do Senhor disse a Manué: Ainda que me detenhas, não comerei do teu pão, e se fizeres holocausto o oferecerás ao Senhor. Porque não sabia Manué que fosse o anjo do Senhor. E disse Manué ao anjo do Senhor: Qual é o teu nome? Para que, quando se cumprir a sua palavra, te honremos. E o anjo do Senhor lhe disse: Por que perguntas assim pelo meu nome, visto que é maravilhoso? Então Manué tomou um cabrito e uma oferta de manjares, e os ofereceu sobre uma penha ao Senhor: e obrou o anjo maravilhosamente, vendo-o Manué e sua mulher. E sucedeu que, subindo a chama do altar para o céu, o anjo do Senhor subiu na chama do altar: o que vendo Manué e sua mulher, caíram em terra sobre seus rostos. E nunca mais apareceu o anjo do Senhor a Manué, nem a sua mulher: então conheceu Manué que era o anjo do Senhor. E disse Manué a sua mulher: certamente morreremos, porquanto temos visto a Deus. Por ém sua mulher lhe disse: Se o Senhor nos quiser a matar , não aceitaria da nossa mão o holocausto e a oferta de manjares, nem nos mostraria tudo isto, nem nos deixaria ouvir tais cousas neste tempo” (Jz 13.1-23). O menino da profecia em questão é Sansão, que viria a livrar Israel da opressão de seus inimigos temporariamente. Mas se o leitor 120
prestou bem atenção, percebeu que o anjo do Senhor, cujo nome é Maravilhoso (compare Is 9.6), não só aceitou o sacrifício de Manué, como “subiu na chama do altar”. Manué aterrorizado percebeu: “Certamente morreremos, porquanto temos visto a Deus”. (Se o leitor quiser saber um pouco mais sobre esta igualdade essencial entre o Pai e o Filho, pode ler um livreto deste mesmo autor, “Eu e o Pai somos Um: A primeira unidade indivisível”, abordando o Senhorio de Cristo sob os principais aspectos). Também vemos a Divindade deste anjo ao carregar o nome do Senhor. “Eis que eu envio um anjo diante de ti, para que te guarde neste caminho, e te leve ao lugar que te tenho aparelhado. Guarda-te diante dele, e ouve a sua voz, e não o provoques à ira: porque não perdoará a vossa rebelião; porque o meu nome está nele” (Êx 23.20-21). E assim, o anjo do Senhor, sacerdote por ofício e Senhor por natureza, aparecerá inúmeras vezes pelo Antigo Testamento, sempre se sobressaindo a Miguel e Gabriel, por serem apenas anjos. Mas o objetivo dos três é guiar o povo de Israel até o seu Messias, até Aquele que “foi morto desde a fundação do mundo”, para que aqueles sacrifícios, realizados na eternidade passada por Lúcifer no altar celeste, se cumprissem “corporalmente”, e a sombra fosse esquecida. Para tanto, Deus também traçou um plano para os homens. E é este plano gradual. Ele acompanha o desenvolvimento do homem como ser, tanto na sua intelectualidade quanto espiritualidade. Vale aqui novamente o princípio já citado: “primeiro a erva, depois a espiga, por último o grão cheio na espiga” (Mc 4.28). O avanço do ensino se fará necessário com o amadurecimento da criança. A criança não pode re121
ceber um ensino além de sua capacidade, nem o adulto receber um ensino infantil. Adão, lançado de seu berço, o Éden, desconhecia o novo mundo; portanto Deus não podia colocar lei e mais lei sobre suas costas.
As 7 Dispensações Na verdade Deus dividiu seu relacionamento com o homem em sete etapas, conhecidas como Dispensações. Muito resumidamente, cada Dispensação envolve um período de tempo em que Deus provará a fidelidade do homem ante uma Revelação de Sua Vontade. E é fácil constatar. A ordem de Deus para Adão antes de sua expulsão é uma, enquanto após a expulsão é outra. Pela quebra da Ordem no primeiro caso, o resultado foi sua expulsão do Éden. Na quebra da Vontade de Deus após sua expulsão, o castigo foi o Dilúvio sobre seus descendentes. Após o dilúvio, Deus dá novas ordens a Noé e suas gerações. A rebeldia dos povos culmina com a construção de uma torre em Babel, e o castigo, o embaralhamento dos povos. Aí entra em cena Abraão. Deus lhe faz promessas, que são repetidas a Isaque, a Jacó e seus descendentes. Mais uma vez, os herdeiros da promessa tropeçam, e o castigo para tal infidelidade é a opressão no Egito por 400 anos. “Não falaremos pormenorizadamente” sobre estas sete dispensações, por não ser o objetivo do livro. Além do mais, seria necessário outro livro. Vamos nos ater um pouco mais nas três últimas dispensações, que são o desfecho do Plano de nosso bendito Deus. A quinta dispensação trata de Israel e a lei concedida, permeada por sacrifícios em larga escala, numa verdadeira linha de produção 122
executada em turnos. Eu compararia esta dispensação ao período da puberdade no homem: período de extrema rebeldia, em que ele ouve muito e atende pouco. Ouçamos um inspirado resumo da história da formação de Israel em Abraão, pela boca do primeiro mártir da Igreja: Estêvão. “Varões irmãos, e pais, ouvi. O Deus da glória apareceu a nosso pai Abraão, estando na Mesopotâmia, antes de habitar em Harã, e disse-lhe: Sai da tua terra e dentre a tua parentela, e dirige-te à terra que eu te mostrar. Então saiu da terra dos caldeus, e habitou em Harã. E dali, depois que seu pai faleceu, Deus o trouxe para esta terra em que habitais agora. E não lhe deu nela herança, nem ainda o espaço de um pé: mas prometeu que lhe daria a posse dela, e depois dele à sua descendência, não tendo ele filho. E falou Deus assim: que a sua descendência seria peregrina em terra alheia, e a sujeitariam à escravidão, e a maltratariam por quatrocentos anos. E eu julgarei a nação que os tiver escravizado, disse Deus. E depois disso sairão e me servirão neste lugar. E deu-lhe o pacto da circuncisão; e assim gerou Isaque, e o circuncidou ao oitavo dia: e Isaque a Jacó; e Jacó aos doze patriarcas. E os patriarcas, movidos de inveja, venderam a José para o Egito, mas Deus era com ele. E livrou-o de todas as suas tribulações, e lhe deu graça e sabedoria ante Faraó, rei do Egito, que o constituiu governador sobre o Egito e toda a sua casa. Sobreveio então a todo o país do Egito e de Canaã fome e grande tribulação; e nossos pais não achavam alimentos. Mas tendo ouvido Jacó que no Egito havia trigo, enviou ali nossos pais, a primeira vez. E na segunda vez foi José conhecido por seus irmãos, e a sua linhagem foi manifesta a Faraó. E José mandou chamar a seu pai Jacó e a toda a sua parentela, que era de setenta e cinco almas. E Jacó desceu ao Egito, e morreu, ele e os nossos pais; e foram transportados para Siquém, e depositados na sepultura que Abraão comprara por certa soma de dinheiro aos filhos de Hemor, pai de Siquém. 123
Aproximando-se, porém, o tempo da promessa que Deus tinha feito a Abraão, o povo cresceu e se multiplicou no Egito; até que se levantou outro rei, que não conhecia a José. Esse, usando de astúcia contra a nossa linhagem, maltratou nossos pais ao ponto de os fazer enjeitar a suas crianças, para que não se multiplicassem. Nesse tempo nasceu Moisés, e era mui formoso, e foi criado três meses em casa de seu pai. E, sendo enjeitado, tomou-o a filha de Faraó, e o criou como seu filho. E Moisés foi instruído em toda a ciência dos egípcios; e era poderoso em suas palavras e obras. E, quando completou a idade de quarenta anos, veio-lhe ao coração ir visitar seus irmãos, os filhos d’Israel. E, vendo maltratar um deles, o defendeu, e vingou o ofendido, matando o egípcio. E ele cuidava que seus irmãos entenderiam que Deus lhes havia de dar a liberdade pela sua mão; mas eles não entenderam. E no dia seguinte, pelejando eles, foi por eles visto, e quis levá-los à paz dizendo: Varões, sois irmãos; porque vos agravais um ao outro? E o que ofendia a seu próximo o repeliu, dizendo: Quem te constituiu príncipe e juiz sobre nós? Queres tu matar-me, como ontem mataste o egípcio? E a esta palavra fugiu Moisés, e esteve como estrangeiro na terra de Madiã, onde gerou dois filhos. E, completados quarenta anos, apareceu -lhe o anjo do Senhor, no deserto do Monte Sinai, numa chama de fogo de um sarçal. Então Moisés, quando viu isto, se maravilhou da visão; e, aproximando-se para observar, foi-lhe dirigida a voz do Senhor, dizendo: Eu sou o Deus de teus pais, o Deus de Abraão, e o Deus de Isaque, e o Deus de Jacó. E Moisés, todo trêmulo, não ousava olhar. E disse-lhe o Senhor: Tira as alparcas dos teus pés, porque o lugar em que estás é terra santa: Tenho visto atentamente a aflição de meu povo que está no Egito, e ouvi os seus gemidos, e desci a livrá-los. Agora, pois, vem, e enviar-te-ei ao Egito. A este Moisés, ao qual haviam negado, dizendo: Quem te constituiu príncipe e juiz?, a este enviou Deus como príncipe e libertador, pela mão do anjo que lhe aparecera no sarçal. Foi este que os conduziu para fora, fazendo prodígios e sinais na 124
terra do Egito, e no Mar Vermelho, e no deserto, por quarenta anos. Este é aquele Moisés que disse aos filhos d’Israel: O Senhor vosso Deus vos levantará dentre vossos irmãos um profeta como eu; a ele ouvireis. Este é o que esteve entre a congregação no deserto, com o anjo que lhe falava no Monte Sinai, e com nossos pais, o qual recebeu as palavras de vida para no-las dar. Ao qual nossos pais não quiseram obedecer, antes o rejeitaram, e em seu coração se tornaram ao Egito, dizendo a Arão: Faze-nos deuses que vão adiante de nós; porque a esse Moisés, que nos tirou da terra do Egito, não sabemos o que lhe aconteceu. E naqueles dias fizeram o bezerro, e ofereceram sacrifícios ao ídolo, e se alegraram nas obras das suas mãos. Mas Deus se afastou, e os abandonou a que servissem ao exército do céu, como está escrito no livro dos profetas: Porventura me oferecestes vítimas e sacrifícios no deserto por quarenta anos, ó casa d’Israel? Antes tomastes o tabernáculo de Moloque, e a estrela do vosso deus Renfã, figuras que vós fizestes para adorá-las. Transportar-vos-ei, pois, para além de Babilônia. Estava entre nossos pais no deserto o tabernáculo do testemunho, como ordenara aquele que disse a Moisés que o fizesse segundo o modelo que tinha visto...” (At 7.2-44). Interrompemos propositalmente esta magnífica palestra, quando Moisés viu o modelo que serviria para a construção do tabernáculo em sombra.
Os gentios e Israel Quando os povos se reuniram na construção de uma torre em Babel, numa clara afronta contra a ordem de Deus de multiplicar e encher a terra (veja Gn 9.1 e 11.1-6), Deus espalhou os povos à sua própria sorte, por um determinado tempo, “abandonando-os”. É o que o 125
apóstolo Paulo coloca em Romanos 1.23-26. “E mudaram a glória de Deus incorruptível em semelhança de imagem de homem corruptível, e de aves, e de quadrúpedes, e de répteis. Pelo que também Deus os entregou às concupiscências de seus corações, à imundícia, para desonrarem seus corpos entre si; pois mudaram a verdade de Deus em mentira, e honraram e serviram mais a criatura do que o Criador, que é bendito eternamente. Amém. Pelo que Deus os abandonou às paixões infames”. Deus então separa a humanidade em dois grupos: os chamados gentios, for mados por todos os povos que estão “separ ados da comunidade d’Israel, e estranhos ao concerto da promessa [a Abraão], não tendo esperança, e sem Deus no mundo” (Ef 2.12); e uma nova família que ainda virá a ser a maior das nações, Israel. Através deste viria a Lei, cujo resumo se encontra nos dez mandamentos de Moisés, mas que na verdade só serviria a Israel. Quando os demais povos, ainda hoje, tentam cumprir a Lei, demonstram claramente que não compreendem a vontade de Deus, visto que estão atrasados em seu Propósito, e também desconhecem a razão da lei. No primeiro caso, “nós sabemos que tudo o que a lei diz, aos que estão debaixo da lei o diz” (Rm 3.19). A lei é para os judeus. “Qual é então a vantagem do judeu? Ou qual a utilidade da circuncisão? Muita, em toda a maneira, porque, primeiramente, as palavras de Deus lhe foram confiadas” (Rm 3.1-2). No segundo caso, quando um gentio tenta cumprir a lei de Moisés para ser justificado diante de Deus, peca gravemente. “Por isso nenhuma carne será justificada diante dele pelas obras da lei, porque pela lei vem o conhecimento do pecado” (Rm 3.20). 126
“Veio, porém, a lei, para que a ofensa abundasse” (Rm 5.20). “Sabendo que o homem não é justificado pelas obras da lei...” (Gl 2.16). Atente bem para o que diz a Escritura: “pela lei vem o conhecimento do pecado”, e “se a justiça provém da lei, segue-se que Cristo morreu debalde” (Gl 2.21). A lei, embora seja a meta ou alvo dignos da vontade de um Deus Santo para o homem, na verdade o condena totalmente, visto que está “enferma pela carne”. A lei poderia ser cumprida somente se o homem fosse puro e santo. Mas do homem, que diz a Escritura? “... tanto judeus como gregos [gentios], todos estão debaixo do pecado, como está escrito: Não há um justo, nem um sequer. Não há ninguém que entenda; não há ninguém que busque a Deus. Todos se extraviaram, e juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem, não há nenhum só. A sua garganta é um sepulcro aberto: com as suas línguas tratam enganosamente: peçonha de áspides está debaixo de seus lábios; cuja boca está cheia de maldição e amargura. Os seus pés são ligeiros para derramar sangue. Em seus caminhos há destruição e miséria; e não conheceram o caminho da paz. Não há temor de Deus diante de seus olhos. Ora, nós sabemos que tudo que a lei diz, aos que estão debaixo da lei o diz, para que toda a boca esteja fechada e todo o mundo seja condenável diante de Deus. Por isso nenhuma carne será justificada diante dele pelas obras da lei, porque pela lei vem o conhecimento do pecado” (Rm 3.9-20). “Pelo que, como por um homem [Adão] entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram” (Rm 5.12). Então, do ponto de vista Divino, “a lei é santa, e o mandamento 127
santo, justo e bom” (Rm 7.12), visto que é a vontade de Deus ao homem; mas do ponto de vista humano, é sua condenação, “porque o pecado, tomando ocasião pelo mandamento, me enganou, e por ele me matou” (Rm 7.11). “Porque o salário do pecado é a morte” (Rm 7.11), e “todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (Rm 3.23) Somente a Glória de Deus poderia resolver este impasse. Se o homem não pode cumprir plenamente nenhum ponto da lei de Deus, então só o próprio Criador da lei poderia fazê-lo. Aí entrou a necessidade de uma ordem completamente separada dentro da própria nação de Israel: uma ordem sacerdotal, em um tabernáculo, para que estes ministrassem em favor de uma nação santificada pela Páscoa, porém ainda pecadora. Santificada, porque foi separada do mundo dos gentios, para ser o veículo daquele que pudesse cumprir a lei cabalmente e Se oferecesse em lugar dos pecadores por expiação dos pecados. “Porquanto é o sangue que fará expiação pela alma” (Lv 17.11), “e sem derramamento de sangue não há remissão” (Hb 9.22). E pecadora, “porque todos pecaram”, e todos igualmente ne-
cessitam da Glória de Deus. As nações “andarão segundo o propósito do seu coração maligno” (Jr 3.17), enquanto Deus vai estabelecer uma linhagem separada a partir da promessa feita a Abraão e toda a sua descendência, para apresentar alguém que pudesse pagar pelos pecados não só de Israel, mas ainda “pelos do mundo todo” no seu devido tempo. E embora as na128
ções estejam pouco preocupadas com Deus e seu destino, Deus não os tratou segundo a sua ignorância, “porque o Senhor é bom e sua misericórdia dura para sempre”. Com a Lei para Israel, oficializa-se, mesmo através de um concerto de obras que não se pode cumprir, o desenvolvimento de um povo santo que substituirá toda aquela ordem de anjos caída dos céus, os ministros do sacerdócio. Embora este povo mesmo comece desde Adão e sua semente piedosa. “E vós me sereis um reino sacerdotal e o povo santo” (Êx 19.6). “E ser-me-eis santos, porque eu, o Senhor, sou santo, e separeivos dos povos, par a ser des meus” (Lv 20.26). “E chamar-lhes-ão: Povo santo, remidos do Senhor” (Is 62.12).
Mas antes de apresentar o verdadeiro, houve a necessidade, segundo a vontade de Deus e sua Onisciência, mostrar uma sombra rica em detalhes. Entraremos agora com “ousadia” no santuário, para observar suas belas colunas e seus santos pertences, que são a sombra do modelo que Moisés viu no monte ao receber a Lei, e que Lúcifer desprezou diante de seu Senhor e Edificador. Possamos dizer como Davi: “Senhor, eu tenho amado a habitação da tua casa e o lugar onde permanece a tua Glória... Uma coisa pedi ao Senhor, e a buscarei: que possa morar na casa do Senhor todos os dias da minha vida, para contemplar a formosura do Senhor, e aprender no seu templo. Porque no dia da adversidade me esconderei no seu pavilhão: no oculto do seu tabernáculo me esconderá: por-me-á sobre uma rocha” (Sl 26.8; 27.4-5). O estudo que fazemos tem um objetivo nobre. Analisando o tem129
plo do Senhor, podemos aprender sobre a grandiosidade da Graça de nosso Deus. No dia de nossa angústia, teremos onde nos esconder, no Templo, “como âncora da alma segura e firme, e que penetra até ao interior do véu” (Hb 6.19), e onde nos assentar, na Rocha: Cristo.
A sequência da montagem do Tabernáculo Vamos ter uma visão panorâmica do templo em primeiro lugar, sob uma descrição do Novo Testamento, coisas estas que ‘foram escritas para nosso proveito’. “Porque um tabernáculo estava preparado, o primeiro, em que havia o candeeiro e a mesa, e os pães da proposição; ao que se chama o santuário. Mas depois do segundo véu estava o tabernáculo que se chama o santo dos santos. Que tinha o incensário de ouro, e a arca do concerto, coberta de ouro toda em redor: em que estava um vaso de ouro, que continha o maná, e a vara de Aarão, que tinha florescido; e sobre a arca os querubins da glória, que faziam sombra no propiciatório...” (Hb 9.2-5), das quais coisas falaremos agora pormenorizadamente. Aqui, o escritor de Hebreus visa somente a parte coberta do tabernáculo, que é dividida em duas partes pelo véu. A parte externa da tenda que ficava ao relento foi omitida propositalmente, onde continha o altar do holocausto e a pia de cobre. Ele omite este detalhe, pois espera dos Hebreus, a quem se dirige, “coisas melhores, e coisas que acompanham a salvação” (Hb 6.9). Ele não quer ‘lançar de novo o fundamento do arrependimento de obras mortas e de fé em Deus’, mas 130
que ‘deixem os rudimentos da doutrina de Cristo, e prossigam até a perfeição’ (Hb 6.1). É isto também uma realidade para você, irmão e irmã em Cristo? Como tudo na Escritura, todos os utensílios têm uma finalidade, e a forma como foram dispostos não é aleatório. Já dissemos que a constituição deste tabernáculo é segundo um modelo visto por Moisés no Monte Sinai, como está escrito: “E me farão um santuário, e habitarei no meio deles. Conforme a tudo a que eu te mostrar para modelo do tabernáculo, e par a modelo de todos os seus vasos, assim mesmo o fareis” (Êx 25.8-9). Todos os componentes aqui descritos se encontram no santuário celestial, naquela antecipação de Deus, quando Ele já tinha por objetivo substituir os Ministros revoltosos por ministros de carne e que necessitariam de perdão e purificação no seu devido tempo para poderem adentrar com “ousadia no santuário, pelo sangue” (Hb 10.19). O Tabernáculo erigido tinha como função primordial intermediar o relacionamento entre Deus e o seu povo, através dos sacerdotes levíticos que apresentariam “dons e sacrifícios pelos pecados... a favor dos homens...” (Hb 5.1). Lembre-se de que vimos um tabernáculo celestial contaminado pelo pecado de Lúcifer, e que precisava ser purificado, da mesma maneira que seriam purificados os ministros substitutos, que também foram contaminados pelo mesmo anjo caído. Para os anjos não houve perdão, por isto a Palavra de Deus diz: “Porque, na verdade, ele não tomou os anjos, mas tomou a descendência de Abraão. Pelo que convinha que em tudo fosse semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote naquilo que é de Deus, para expiar os pecados do povo. Porque naquilo que ele mesmo, sendo tentado, padeceu, pode 131
socorrer aos que são tentados” (Hb 2.16-18). Como aprouve a Deus socorrer ao homem em pecado, para que este fosse purificado e assim habilitado para a substituição prevista, alguém teria de oferecer aquilo que o homem tinha de mais nobre: a vida. “Pois o salário do pecado é a morte” (Rm 3.23). Por isto está escrito dele: “Pelo que, entrando no mundo, diz: Sacrifício e oferta não quiseste, mas corpo me preparaste; holocaustos e oblações pelo pecado não te agradaram. Então disse: Eis aqui venho... para fazer, ó Deus, a tua vontade” (Hb 10.5-7). Um corpo seria preparado ao Filho de Deus, para que pudesse experimentar a morte pelo homem, e com seu sacrifício purificasse todos os que nele viessem a crer. Pois o princípio da substituição é: “vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé” (Dt 19.21). “Mas, antes que a fé viesse, estávamos [os judeus, pois Paulo se inclui] guardados debaixo da lei, e encerrados para aquela fé que se havia de manifestar. Mas a Escritura encerrou tudo debaixo do pecado, para que a promessa pela fé em Jesus Cristo fosse dada aos crentes. De maneira que a lei nos serviu de aio [ou instrutor], para nos conduzir a Cristo, para que pela fé fôssemos justificados” (Gl 3.22-24). A lei e todas as “ordenanças de culto divino” dadas a Israel eram o meio instrutor, a preparação, a condução, a sombra que viria ser a luz, e que seria propagada não só para Israel, mas para o mundo todo, visto a rejeição de Israel. Tudo que há no tabernáculo, tanto utensílios inanimados como os ofertantes, representam a Cristo que viria. Analisemos então a sombra, a começar pela ordem Divina na montagem do tabernáculo. 132
“E aconteceu no mês primeiro, no ano segundo, ao primeiro do mês, que o tabernáculo foi levantado; porque Moisés levantou o tabernáculo, e pôs as suas bases, e armou as suas tábuas, e meteu nele os seus varais, e levantou as suas colunas; e estendeu a sua tenda sobre o tabernáculo, e pôs a coberta da tenda sobre ela, em cima, como o Senhor ordenara a Moisés. E tomou o testemunho e pô-lo na arca, e meteu os varais à arca; e pôs o propiciatório sobre a arca, em cima. E levou a arca ao tabernáculo, e pendurou o véu da cobertura, e cobriu a arca do testemunho, como o Senhor ordenara a Moisés. Pôs também a mesa na tenda da congr egação, ao lado do taber náculo par a o nor te, fora do véu. E sobre ela pôs em ordem o pão perante o Senhor, como o Senhor ordenara a Moisés. Pôs também na tenda da congregação o castiçal defronte da mesa ao lado do tabernáculo para o sul, e acendeu as lâmpadas perante o Senhor, como o Senhor ordenara a Moisés. E pôs o altar de ouro na tenda da congregação, diante do véu. E acendeu sobre ele o incenso de especiarias aromáticas, como o Senhor ordenara a Moisés. Pendurou também a coberta da porta do tabernáculo, e pôs o altar do holocausto à porta do tabernáculo na tenda da congregação, e ofereceu sobre ele holocausto e oferta de manjares, como o Senhor ordenara a Moisés. Pôs também a pia entre a tenda da congregação e o altar, e derramou água nela, para lavar. E Moisés, e Aarão e seus filhos lavaram nela as suas mãos e seus pés. Quando entravam na tenda da congregação, e quando chegavam ao altar, lavavam-se, como o Senhor ordenara a Moisés. Levantou também o pátio ao redor do tabernáculo e do altar, e pendurou a coberta da porta do pátio. Assim Moisés acabou a obra” (Êx 40.17-33). Todas as vezes que o tabernáculo era desmontado e montado nas suas constantes andanças pelo deserto, a sequência não podia ser alterada. Começa pela arca dentro do lugar Santíssimo, que representa a habitação celeste, e vai indo até chegar ao relento, lugar do homem, 133
onde estava o altar do holocausto e a pia de cobre. “Não há ninguém que busque a Deus” (Rm 3.11). “Nós o amamos a ele porque ele nos amou primeiro” (1 Jo 4.19). A sequência de dentro para fora representa Deus vindo em nosso socorro, e Sua busca é segundo a Sua vontade e segundo os Seus meios. O relento representa a situação do homem perante Deus: “um desgraçado, e miserável, e pobre, e cego, e nu” (Ap 3.17). “E não há criatura alguma encoberta diante dele; antes todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele com quem temos de tratar” (Hb 4.13). É aí que o cordeiro é sacrificado em favor dos homens. O altar do holocausto está dentro do pátio, porém descoberto, às intempéries da vida. O “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (Jo 1.29), se quisesse participar da natureza humana, tinha de participar com todos os seus elementos: sol, chuva, frio, calor. “E, visto como os filhos participam da carne e do sangue, também ele participou das mesmas coisas” (Hb 2.14). “Porque não temos um sumo sacerdote que não possa se compadecer das nossas fraquezas; porém um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado” (Hb 4.15).
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Sua tripla divisão As três divisões do tabernáculo significam várias coisas simultaneamente. Ela tem relação com o próprio Deus, por abranger Ele três Pessoas distintas, porém idênticas. O Santo dos Santos, lugar da habitação da Glória do Senhor, tem a ver com a pessoa do Pai. “Então a nuvem cobriu a tenda da congregação, e a Glória do Senhor encheu o tabernáculo: de maneira que Moisés não podia entrar na tenda da congregação porquanto a nuvem ficava sobre ele, e a glória do Senhor enchia o tabernáculo” (Êx 40.34-35). Depois do lugar Santíssimo, separado pelo véu, o lugar Santo corresponde ao Filho, como veremos em breve. O pátio externo, em que qualquer homem podia se achegar, é o lugar de atuação do Espírito Santo, representando o mundo perdido. “... se eu não for, o Consolador não virá a vós... E, quando ele vier, convencerá o mundo do pecado, e da justiça e do juízo” (Jo l6.78). A tripla divisão também revela o nome completo de Jesus. No Santo dos Santos Ele é o Senhor. A arca, que veremos a seguir, está rodeada da glória do Senhor. No lugar Santo, vê-se o homem Jesus. “Eu sou a luz do mundo” e “Eu sou o pão da vida” (Jo 8.12; 6.14), simbolizados pelo candelabro e pelos pães da proposição. O altar do incenso fala da oração eficaz do homem Jesus, atendida pelo Pai, e também da sua ressurreição, comentada mais a frente. “E Jesus levantando os olhos para o céu, disse: Pai, graças te dou, por haveres me ouvido. Eu bem sei que sempre me ouves, mas eu disse isto por causa da multidão que está em redor, para que creiam 135
que tu me enviaste” (Jo 11.41-42). No pátio, Ele é o Cristo. A designação Cristo significa “o enviado, o messias, o ungido” para determinada tarefa. O objetivo final de Cristo é se oferecer na cruz. É o altar do holocausto que representa o ofício maior de Cristo. “Expondo e demonstrando que convinha que o Cristo padecesse e ressuscitasse dos mortos. E este Jesus, que vos anuncio, dizia ele, é o Cristo” (At 17.3). “Agora a minha alma está perturbada; e que direi eu? Pai, salvame desta hora; mas para isto vim a esta hora” (Jo 12.27). Eis o nome completo do Filho de Deus, mostrando sua Divindade, sua Humanidade e seu Ofício: Senhor Jesus Cristo. “Graças damos a Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo” (Cl 1.3). A divisão tripla representa também o homem regenerado como templo cheio do Espírito Santo. “E o mesmo Deus de paz vos santifique em tudo; e todo o vosso espírito, e alma, e corpo, sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Ts 5.23). “Não sabeis vós que sois o templo de Deus, e que o Espírito de Deus habita em vós?” (1 Co 3.16). A mesma divisão que representa o homem regenerado, representa o processo de salvação do homem durante o tempo de sua vida. No pátio, através do altar do holocausto e da pia de cobre, vemos a justificação do homem em Cristo. No Santo, o processo de santificação pelo alimento do pão, pela iluminação do candelabro e pela constante ora136
ção e advocacia simbolizadas pelo incenso. No Santíssimo, a redenção ou glorificação, destino eterno dos redimidos pelo Senhor. “Mas vós sois Dele, em Jesus Cristo, o qual para nós foi feito sabedoria, e justiça, e santificação e redenção” (1 Co 1.30). Também podemos relacionar as três divisões com a obra consumada de Cristo, sua redenção, reconciliação e propiciação.
Passemos então para a mobília santa. Conforme a sequência na montagem do tabernáculo, começaremos pelo lugar Santíssimo.
A Arca No Santíssimo encontramos a arca do testemunho, ou arca da aliança. “Também farão uma arca de madeira de cetim: o seu comprimento será de dois côvados e meio, e a sua largura dum côvado e meio, e dum côvado e meio a sua altura. E cobri-la-ás de ouro puro, por dentro e por fora a cobrirás: e farás sobre ela uma coroa de ouro ao redor; e fundirás para ela quatro argolas de ouro, e as porás nos quatro cantos dela: duas argolas num lado dela, e duas argolas noutro lado dela. E farás varas de madeira de cetim, e as cobrirás com ouro, e meterás as varas nas argolas, aos lados da arca, para se levar com elas a arca. As varas estarão nas argolas da arca, não se tirarão dela. Depois porás na arca o testemunho, que eu te darei” (Êx 25.10-16). A arca feita em madeira e revestida em ouro fala claramente da 137
humanidade de Cristo e sua realeza. De Jesus se diz: “Porque foi subindo como renovo perante ele, e como raiz duma terra seca; não tinha parecer nem formosura; e, olhando nós para ele, nenhuma beleza víamos para que o desejássemos. Era desprezado, e o mais indigno entre os homens, homem de dores, e exper imentado nos trabalhos...” (Is 53.2-3). “O trabalho de sua alma ele verá, e ficará satisfeito... Pelo que lhe darei a parte de muitos, e com os poderosos repartirá ele o despojo...” (Is 53.11-12). “E no vestido e na sua coxa tem escrito este nome: Rei dos reis, e Senhor dos senhores” (Ap 19.16). A arca, sendo do testemunho, lembra-nos do testemunho maior de Deus. “Se recebemos o testemunho dos homens, o testemunho de Deus é maior; porque o testemunho de Deus é este, que de seu Filho testificou: quem a Deus não crê mentiroso o fez; porquanto não creu no testemunho que Deus do seu Filho deu” (1 Jo 5.9-10). Leia também João 5.30-37.
As quatro argolas A arca tinha também quatro argolas de ouro puro, que eram fundidas separadamente e depois fixadas nos cantos da mesma. Talvez mostre o testemunho quádruplo dos Evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João. São de ouro puro, pois elevam seu testemunho humano ao patamar divino, formando a Palavra de Deus. Somente a fé pode 138
enxergar as argolas celestes. “As quais também falamos, não com palavras de sabedoria humana, mas com as que o Espírito Santo ensina...” (1 Co 2.13). “Pelo que também damos sem cessar graças a Deus, pois, havendo recebido de nós a palavra da pregação de Deus, a recebestes, não como palavra de homens, mas (segundo é, na verdade), como Palavra de Deus, a qual também oper a em vós, os que cr estes” (1 Ts 2.13). Também sabemos que “pela boca de duas testemunhas, ou pela boca de três testemunhas, se estabelecerá o negócio” (Dt l9.15). Deus fundiu quatro argolas que sustentam até hoje o testemunho da vida, morte e ressurreição de Jesus Cristo.
As duas varas Mas pelas quatro argolas passavam duas varas de madeira revestidas de ouro que não poderiam ser retiradas das argolas. As duas varas representam um padrão, uma mesma medida, denotando a uniformidade, a canonicidade do testemunho. Aqui há a madeira representando a parte humana com sua cobertura de ouro, que é a parte celestial, imprescindível para um testemunho coerente entre os profetas. É interessante que só as quatro pontas destas duas varas poderiam ser vistas pelo povo comum quando a arca era transportada, no demais tudo estava coberto, como veremos logo mais. “Sabendo primeiramente isto: que nenhuma profecia da Escritura é de particular interpretação. Porque a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram 139
inspirados pelo Espírito Santo” (2 Pe 1.21). As duas varas talvez simbolizem a verdade e o Espírito, pois “os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade” (Jo 4.23). O testemunho, mesmo sendo verdadeiro, sem o Espírito que lhe confere vida, passa a ser palavra meramente humana, carecendo do caráter e sanção divinos. “O espírito é o que vivifica, a carne para nada aproveita, as palavras que eu vos disse são espírito e vida” (Jo 6.63).
O Véu – o 1º Impedimento Estes elementos, no entanto, somam apenas a parte externa da arca. Seu volume e forma poderiam ser aquilatados pelo povo simples nos seus muitos momentos de viagem. Quando o tabernáculo era transportado pelo deserto, observe o cuidado do Senhor para com o símbolo de seu Filho. “Quando partir o arraial, Aarão e seus filhos virão, e tirarão o véu da coberta, e com ele cobrirão a arca do testemunho... Havendo pois Aarão e seus filhos, ao partir do arraial, acabado de cobrir o santuário, e todos os instrumentos do santuário, então os filhos de Coate virão para levá-lo; mas no santuário não tocarão para que não morram... Porém não entrarão a ver, quando cobrirem o santuário, para que não morram” (Nm 4.5,15,20). Comentaremos depois a distinção entre Aarão e seus filhos dos levitas. 140
Observemos que os levitas que carregavam os utensílios do santuário não podiam tocar ou mesmo vê-los. Aarão e seus filhos cobriam os instrumentos santos primeiro, para depois os levitas os transportarem. Ninguém conhecia “por vista” a arca do testemunho a não ser o sumo sacerdote Aarão. É extremamente simbólico que o mesmo “véu de azul e púrpura, e carmesim, e de linho fino retorcido; com querubins de obra prima” (Êx 26.33), além de fazer “separação entre o santuário e o lugar santíssimo” (v.34), cobrisse também a arca quando transportada pelos levitas. O que impedia o acesso dos sacerdotes comuns à arca e ao seu conteúdo era o véu, “isto é, sua carne”. Conforme descrição de Hebreus 10.l9-20, o véu assim disposto representa a carne de Jesus sendo oferecida por holocausto de cheiro suave ao Senhor. Se o véu fala de sua carne, a arca coberta falava de sua alma e espírito, sua essência Divina. “Dando nisto a entender o Espírito Santo que ainda o caminho do santuário não estava descoberto [ou manifestado, do grego] enquanto se conservava em pé o primeiro tabernáculo” (Hb 9.8). Apesar de ser uma ordenança de culto Divino, não passava da sombra. A primeira divisão do santuário era livre para todos os sacerdotes, mas na segunda parte só o sumo sacerdote Aarão. O que impedia era a lei, visto que estava enfer ma pela car ne que a não podia cumprir (Rm 7.14), e os “sacrifícios que quanto à consciência, não podem aperfeiçoar aquele que faz o serviço; consistindo somente em manjares, e bebidas, e várias abluções e justificação da carne, impostas até ao tempo da correção” (Hb 9.9-10). 141
“Porque é impossível que o sangue dos touros e dos bodes tire os pecados” (Hb 10.4).
O Propiciatório – o 2º Impedimento Mas além deste véu que impedia que os sacerdotes enxergassem a arca, havia um outro empecilho para o próprio sumo sacerdote avistar seu conteúdo mais íntimo. Os três objetos ali depositados para testemunho, embora fossem conhecidos do povo, jamais foram vistos novamente – pelo povo, pelos levitas, pelos sacerdotes, nem pelo sumo sacerdote Aarão e nem por Moisés – depois que o peso do propiciatório de ouro puro selou a arca. Estes três símbolos escondidos na arca no Santíssimo lugar, que representava a habitação de Deus, denotam “o eterno propósito que fez em Cristo Jesus nosso Senhor” (Ef 3.11). O propósito eterno de Deus estava guardado em seu coração, esperando somente o momento oportuno para sua manifestação. Vimos que, antes mesmo de Lúcifer pecar, ele já sacrificava no altar celeste a sombra do ‘sangue conhecido ainda antes da fundação do mundo’. O contexto do Provérbio 8 que fala da sabedoria, explica a partir do versículo 22: “O Senhor me possuiu no princípio de seus caminhos, e antes de suas obras mais antigas. Desde a eternidade fui ungida, desde o princípio, antes do começo da terra. Antes de haver abismo fui gerada...”; e ainda: “A sabedoria já edificou a sua casa, já lavrou as suas sete colunas. Já sacrificou as suas vítimas, mistur ou o seu vinho: e já pr eparou a sua mesa” (Pv 9.1-2). 142
O Espírito Santo nos apresenta a personificação desta sabedoria. “Mas falamos a sabedoria de Deus oculta em mistério, a qual Deus ordenou antes dos séculos para nossa glória; a qual nenhum dos príncipes deste mundo conheceu, porque se a conhecessem, nunca crucificariam ao Senhor da Glória” (1 Co 2.7-8). “Mas para os que são chamados, tanto judeus como gregos, lhes pregamos a Cristo, poder de Deus, e sabedoria de Deus” (1 Co 1.24). “E crescia Jesus em sabedoria, e em estatura, e em graça para com Deus e os homens” (Lc 2.52). E quais são as sete colunas lavradas em sua casa? Não seriam porventura a arca do testemunho, o propiciatório, o altar do incenso, o candelabro, a mesa dos pães da proposição, a bacia de cobre e o altar do holocausto? Assim como o tabernáculo terrestre se fundamentava nestes sete instrumentos, também o celestial, visto que é o modelo. Por isto o autor é convicto na sua explanação de que a substituição dos ministrantes celestiais é o “dedo de Deus” desde a eternidade passada. Tudo foi meticulosamente preparado, arquitetado, desenvolvido, manifestado e prestes a ser concluído. E quais as vítimas sacrificadas pela Sabedoria Eterna? Não seriam a sombra do seu sangue “conhecido ainda antes da fundação do mundo” pelo sacerdote angélico? E assim como era oculto aos sacerdotes levíticos que faziam parte da sombra, também era oculto aos anjos sacerdotes o conteúdo da arca. Este conteúdo é a personificação da misericórdia e da graça de 143
Deus, que tanto os anjos, santos e rebeldes, como os sacerdotes humanos desconheciam. Ouça mais o que se diz daqueles que receberam a lei, e de seu pai, Moisés: “Porque não chegastes ao monte palpável, aceso em fogo, e à escuridão, e às trevas, e à tempestade, e ao sonido da tr ombeta, e à voz das palavras, a qual os que a ouviram pediram que se lhes não falasse mais; porque não podiam suportar o que se lhes mandava: se até um animal tocar o monte, será apedrejado. E tão terrível era a visão que Moisés disse: Estou todo assombrado e tremendo” (Hb 12.18-21). Onde está a manifestação da misericórdia e da graça na lei? Até se um animal tocasse no monte em que se recebia a lei morreria impiedosamente apedrejado. “Quebrantando alguém a lei de Moisés, morre sem misericórdia, só pela palavra de duas ou três testemunhas” (Hb 10.28). “Todos aqueles pois que são das obras da lei estão debaixo da maldição; porque está escrito: Maldito todo aquele que não permanecer em todas as coisas que estão escritas no livro da lei, para fazêlas” (Gl 3.10). Tanto a lei se torna em maldição para o homem corrompido pelo pecado, que Jesus foi crucificado injustamente para se cumprir a lei, diante de inúmeros testemunhos falsos em seu julgamento. “Responderam-lhe os judeus: Temos uma lei, e de conformidade com a lei, ele deve mor r er , por que a si mesmo se fez Filho de Deus” (Jo 19.7). 144
A lei só podia julgar segundo a aparência externa, e não no segredo do coração. Vê-se então que a sombra em que Israel descansava era mui sombria. Tinham uma lei que desvendava “o pleno conhecimento do pecado”, e pelo pecado “a morte”, e um sacerdócio levítico que, ‘quanto à consciência, não pode aperfeiçoar aquele que faz o serviço’. Não estamos, em absoluto, dizendo que Israel não tinha salvação. A palavra de Deus é clara quanto a isto. Israel saiu do Egito como povo salvo do Senhor, mas não pela lei, mas debaixo do sangue do cordeiro colocado nas portas em sinal de fé. “E quem há como o teu povo Israel, única gente na terra, a quem Deus foi remir para seu povo...?” (1 Cr 17.21). “Crede no Senhor nosso Deus, e estareis seguros; crede nos seus profetas, e sereis prosperados” (2 Cr 20.20). “Deixe o ímpio o seu caminho... e se converta ao Senhor, que se compadecerá dele; torne para o nosso Deus, porque é grande em perdoar” (Is 55.7). O que sempre salvou, e salvará o homem, judeu ou grego, é a fé na Palavra de Deus, “sem as obras da lei”.
“Mas o justo viverá da fé” (Hb 2.4 e Rm 1.17). Abramos então a arca, levantando respeitosamente o propiciatório de ouro puro, e com os olhos espirituais abertos pela fé vejamos o corpo, alma e espírito de Deus.
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O Maná, a Lei e a Vara Florescida Se a arca, como bem se sabe, é a Pessoa de Cristo, então seus ingredientes muito mais. Primeiramente o maná. “Disseram-lhe, pois: Que sinal pois fazes tu, para que o vejamos, e creiamos em ti? Que operas tu? Nossos pais comeram o maná no deserto, como está escrito: Deu-lhes a comer o pão do céu. Disse-lhes pois Jesus: Na verdade, na verdade vos digo: Moisés não vos deu o pão do céu, mas meu Pai vos dá o verdadeiro pão do céu. Porque o pão de Deus é o que desce do céu e dá a vida ao mundo... Eu sou o pão da vida; aquele que vem a mim não ter á fome; e quem cr ê em mim nunca terá sede... Eu sou o pão da vida... Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém comer deste pão, viver á par a sempr e; e o pão que eu der é a minha carne, que eu dar ei pela vida do mundo... Porque a minha carne verdadeiramente é comida...” (Jo 6.30-58). O pão aqui representado é o corpo que seria preparado para o Filho de Deus a fim de alimentar toda a humanidade, embora primeiramente oferecido para a casa de Israel. Depois vemos a lei, em suas duas tábuas de pedra gravadas. A lei, que mostra o que o homem deveria ser, é cumprida literalmente por Jesus. “Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas: não vim abrogar, mas cumprir. Porque em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nenhum jota ou til se omitirá da lei, sem que tudo seja cumprido” (Mt 5:17-18). Se Jesus veio para cumprir a lei, e Ele veio para buscar o homem 146
jurado de morte pela lei, só lhe restava a morte como cumprimento cabal da lei. “Vemos, porém, coroado de glória e de honra aquele Jesus... para que, pela graça de Deus, provasse a morte por todos” (Hb 2.9). O Senhor Jesus provou a morte que nos era devida pelos nossos pecados. A lei, portanto, ao pecador, fala de morte. Ou do próprio pecador, ou de um substituto. Louvado seja nosso Senhor Jesus, Ele escolheu ser o nosso substituto. E a vara de Aarão que florescera? Se o leitor se lembra de Números 16 e 17, quando alguns levitas e rubenitas (16.1) intentaram “ocupar o sacerdócio” que era restrito aos filhos de Aarão (16.9-10), após o castigo dos rebeldes, Deus ordena que cada tribo coloque uma vara “perante o testemunho” (17.1-4), para demonstrar que “a vara do homem que eu tiver escolhido florescerá” (17:5). A vara, em toda a Escritura, reflete um símbolo de importância incomensurável, terno e poderoso. Foi com ela que Jacó multiplicou seu rebanho (Gn 30). Foi com ela que Moisés fez os sinais mais claros da autoridade e do poder de Deus ao devastar econômica e moralmente o maior império da época, o Egito. Foi com ela que este servo santo retirou água para o povo rebelde, porém sedento, pelas suas jornadas no deserto. Foi por ela que Josué venceu os amalequitas quando Moisés “levantava a mão”, numa figura estupenda de que aquela vara não era fruto da capacidade humana, mas era “a vara de Deus” (Êx 17.813). Mas neste caso que estamos a analisar, a vara de Aarão que fora arrancada de algum arbusto vivo, estando agora morta, já que foi cortada da seiva da árvore que a alimentava, ressuscitou milagrosamente ante o testemunho do Senhor. Ela veio de um ambiente físico, como 147
Cristo que nasceu da semente de Davi, relacionado àquilo que era humano e natural. Mas o seu florescimento fala de algo totalmente sobrenatural e Divino, pois a nova seiva da vida veio de algo novo e surpreendente. “Lembra-te de que Jesus Cristo, que é da descendência de Davi, ressuscitou dos mor tos” (2 Tm 2.8). “O Deus de nossos pais ressuscitou a Jesus, ao qual vós matastes, suspendendo-o no madeiro. Deus com a sua destra o elevou a Príncipe e Salvador, para dar a Israel o arrependimento e remissão dos pecados” (At 5.30-31). O sacerdócio corrompido pela descendência de Aarão será restabelecido definitivamente, e mais, universalmente, tendo como base eficaz a morte do substituto “pelos pecados do povo” e a sua ressurreição, esta representada na aceitação do Pai ao aspirar “a oferta de cheiro suave”. “... e o sacerdote tudo oferecerá, e o queimará sobre o altar; holocausto é, oferta queimada, de cheiro suave ao Senhor” (Lv 1.13). “Todavia, ao Senhor agradou o moê-lo, fazendo-o enfermar; quando a sua alma se puser por expiação do pecado [morte], verá a sua posteridade, prolongará os dias [ressurreição]; e o bom prazer do Senhor pr osper ar á na sua mão” (Is 53.10). Por causa desta vitoriosa ressurreição, a Igreja comprada com o sangue de Deus pode aguardar segura, ansiosa, porém pacientemente, a maior e inigualável bem-aventurança. “Ora o Deus, que também ressuscitou o Senhor, nos ressuscitará a nós pelo seu poder” (1 Co 6.14). 148
Assim, nestes três símbolos vemos o corpo preparado por Deus descendo do céu (o maná), sua morte representada pela lei, ao cumprila cabalmente, e sua ressurreição bendita na vara florescida de Aarão. “Porque primeiramente vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras, e que foi sepultado, e que ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras” (1 Co 15.3-4). Mas perceba a simbologia. Estes três elementos que davam testemunho da vida, morte e ressurreição do Filho Eterno, estavam escondidos dentro da arca, selada pelo propiciatório de ouro, e que ninguém mais poderia vê-los. Isto desvenda, como dissemos, o “eterno propósito que fez em Cristo Jesus nosso Senhor” e a “dispensação do mistério, que desde os séculos esteve oculto em Deus” (Ef 3.9,11). E se estava oculto ao povo de Israel e aos seus sacerdotes, muitíssimo mais oculto estava aos olhos de Lúcifer e seus companheiros sacerdotes que sacrificavam no altar celeste a sombra daquilo que lhes não pertencia e de que jamais participariam. E o que separava – vamos revisar – este testemunho da vista dos sacerdotes e do povo, e de Lúcifer e dos demais anjos por analogia? Primeiramente o propiciatório que cobria a arca. E depois o véu que fazia “separação entre o santuário e o lugar santíssimo”. O propiciatório, como insinua a palavra, é a propiciação de Cristo, ou seja, dele querer ser propício ou a favor de nós, pecadores. A propiciação resolve o problema do Deus santo que foi ofendido pelo pecado, quando Cristo se oferece no lugar do pecador. Essa propiciação depende de sua misericórdia e de sua graça em nosso favor. “Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, 149
segundo sua grande misericórdia, nos ger ou de novo par a uma viva esperança, pela ressurreição de Jesus Cristo, dentre os mortos” (1 Pe 1.3). “Mas Deus, que é riquíssimo em misericórdia, pelo seu muito amor com que nos amou, estando nós ainda mortos em nossas ofensas, nos vivificou juntamente com Cristo (pela graça sois salvos), e nos ressuscitou juntamente com ele” (Ef 2.4-6). “Meus filhinhos, estas coisas vos escrevo para que não pequeis: e se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o justo. E ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo” (1 Jo 2.1-2). Mas o Filho de Deus poderia querer ser propício a nós, sem, contudo, ter os meios necessários para tal. Ou poderia ter condições de realizá-lo, sem, no entanto, querer. O propiciatório fala de sua vontade a nosso favor. O “véu, isto é, pela sua carne” (Hb 10.20), fala do meio necessário para tal propiciação, pois “corpo me preparaste”. Estes dois componentes, vontade e humilhação, são comentados em Filipenses 2.6-8. “Que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus. Mas aniquilou-se a si mesmo...” Até aqui vemos sua vontade, pois, existindo em forma Divina, não se envergonhou de descer à esfera humana por amor de nós, pecadores. “... tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz”. E aqui vemos a necessidade do corpo para que “em tudo fosse semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote naquilo que é de Deus, para expiar 150
os pecados do povo” (Hb 2.17). “A quem enviarei, e quem há de ir por nós? Então disse eu: Eisme aqui, envia-me a mim” (Is 6.8). “Eis aqui venho (no princípio do livro está escrito de mim), para fazer, ó Deus, a tua vontade” (Hb 10.7). Eis o maior dos milagres de Deus, “o amor de Cristo que excede todo o entendimento” (Ef 3.19). O Filho Eterno, sendo Deus, e habitando nos “lugares celestiais” na “forma de Deus”, “pelo seu muito amor com que nos amou” e “riquíssimo em misericórdia” (Ef 2:4), “humilhou-se” ao abandonar o seu lugar legítimo de habitação com toda honra e louvor devidos, “e o verbo se fez carne, e habitou entre nós” (Jo 1.14).
Com a condescendência do Filho Eterno até nós, ou seja, sua manifestação humana entre nós, sua morte e ressurreição representadas por todos os elementos do tabernáculo terrestre e celestial em sombra, “o mistério que esteve oculto desde todos os séculos, desde todas as gerações... agora foi manifesto aos seus santos” (Cl 1.26). Este mistério vai muito além de “que os gentios são coerdeiros, e de um mesmo corpo, e participantes da promessa em Cristo pelo evangelho” (Ef 3.5-6) de que Paulo fala. “A mim, o mínimo de todos os santos [Paulo], me foi dada esta graça de anunciar entre os gentios, por meio do evangelho, as riquezas incompreensíveis de Cristo. E demonstr ar a todos qual seja a dispensação do mistério, que desde os séculos esteve oculto em Deus, que tudo criou; para que agora, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus, seja conhecida dos principados e potestades nos céus, segun151
do o eterno propósito que fez em Cristo Jesus nosso Senhor” (Ef 3.811). Observe, caro leitor, a força de tais palavras. As riquezas incompreensíveis de Cristo, oculta desde os séculos, antes de tudo ser criado, já que se trata de um eterno propósito em Cristo, que consiste da salvação perfeita, única e suficiente pelo cordeiro imaculado oferecido na cruz do calvário para gentios e judeus, é para que “a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida dos principados e potestades nos céus”, ou seja, dos anjos. Já vimos que Lúcifer e sua quadrilha celeste, ao pecar, foram banidos irremediavelmente de seu posto. Não viram a misericórdia e a graça demonstradas, embora participassem no altar celeste dos sacrifícios que representavam o “eterno propósito em Cristo”. Por isto se diz dos anjos quando da morte e ressurreição de Cristo: “E, quando vós [gentios] estáveis mortos nos pecados, e na incircuncisão da vossa carne, vos vivificou juntamente com ele, perdoandovos todas as ofensas, havendo riscado a cédula que era contra nós [judeus] nas suas ordenanças [a Lei], a qual de alguma maneira nos era contraria, e a tirou do meio de nós [judeus], cravando-a na cruz. E, despojando os principados e potestades, os expôs publicamente e deles triunfou em si mesmo” (Cl 2.13-15). A derrota cabal de Satanás, embora seja ainda futura, parte deste ponto, em que, pela morte de Cristo, “aniquilasse o que tinha o império da morte, isto é, o diabo: e livrasse todos os que, com medo da morte, estavam por toda a vida sujeitos à servidão” (Hb 2.14-15). Nisto se vê a humilhação de Satanás. Estando em posição muito mais elevada em relação ao homem, não houve lugar de arrependimento para ele. Mas, para os pequenos seres que ele mesmo corrompera 152
com sua própria doença, houve não só perdão (misericórdia), mas ainda somos colocados, falando agora da Igreja, na mesma posição de Jesus como coerdeiros e irmãos (graça). “Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a todos quantos o receberam [Jesus, como Senhor e Salvador], deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus; aos que creem no seu nome... e, se nós somos filhos, somos logo herdeiros também, herdeiros de Deus e coerdeiros de Cristo... Por que convinha que aquele, par a quem são todas as coisas, e mediante quem tudo existe, trazendo muitos filhos à glória, consagrasse pelas aflições o príncipe da salvação deles. Porque assim o que santifica, como os que são santificados, são todos de um; por cuja causa não se enver gonha de lhes chamar irmãos” (J o 1.12 / Rm 8.17 / Hb 2.10-11). E o que herdaremos? “Sendo justificados pela sua graça, sejamos feitos herdeiros segundo a esperança da vida eterna” (Tt 3.7). E mais ainda. “Seja Paulo, seja Apolos, seja Cefas, seja o mundo, seja a vida, seja a morte, seja o presente, seja o futuro, tudo é vosso. E vós de Cristo, e Cristo de Deus” (1 Co 3.22-23). “A quem vencer, eu o farei coluna no templo do meu Deus, e dele nunca sairá: e escreverei sobre ele o nome do meu Deus, e o nome da cidade do meu Deus, a nova Jerusalém, que desce do céu, do meu Deus, e também o meu novo nome” (Ap 3.12). “Quem vencer, herdará todas as coisas; e eu serei seu Deus, e ele será meu filho” (Ap 21.7). 153
“Quem é que vence o mundo, senão aquele que crê que Jesus é o filho de Deus?” (1 Jo 5.5). “Portanto convém-nos atentar com mais diligência par a as coisas que já temos ouvido, para que em tempo algum nos desviemos delas... Como escaparemos nós, se não atentarmos para uma tão grande salvação, a qual, começando a ser anunciada pelo Senhor [Jesus], foi-nos depois confirmada pelos que a ouviram; testificando também Deus com eles, por sinais, e milagres, e várias maravilhas e dons do Espírito Santo, distribuídos por sua vontade? Porque não foi aos anjos que sujeitou o mundo futuro [e gr aças a Deus por isto!], de que falamos. Mas em certo lugar testificou alguém, dizendo: Que é o homem, para que dele te lembres? Ou o filho do homem, para que o visites?” (Hb 2.1-6). “Ao que está assentado sobre o trono, e ao Cordeiro, sejam dadas ações de graça, e honra, e glória, e poder para todo o sempre”, por ter escolhido “as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias”, e as “coisas fracas deste mundo para confundir as fortes”, e as “coisas vis deste mundo, e as desprezíveis, e as que não são, para aniquilar as que são” (1 Co 1.27-28). Voltemos ao tabernáculo, interrompido momentaneamente pela empolgação do autor. Portanto, o propiciatório fala da vontade do Filho em nos ser propício, e o véu mostra a humanidade de Cristo, o instrumento eficaz da propiciação, para que, através dos três testemunhos escondidos dentro da arca – vida, morte e ressurreição – pudesse “mostrar nos séculos vindouros as abundantes riquezas da sua graça... que desde os séculos esteve oculto em Deus” (Ef 2.7; 3.9).
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Os dois anjos do Propiciatório Mas sobre o propiciatório, feito também de ouro puro e fundido junto a ele, dois anjos estendiam suas asas num olhar inquiridor para a tampa da arca. Parece óbvio que os dois anjos cabisbaixos representem Miguel e Gabriel olhando para o anjo do Senhor que substituíra Lúcifer e estava ali representado pelo propiciatório, como que “indagando que tempo ou que ocasião de tempo o Espírito de Cristo indicava, anteriormente testificando os sofrimentos que a Cristo haviam de vir... para as quais coisas os anjos desejam bem atentar” (1 Pe 1.11-12). E se no Santíssimo, a habitação de Deus, encontramos escondidos em simbologia aquilo que era o eterno propósito de Deus em Cristo – a vida santa, a morte sacrificial e a ressurreição gloriosa de Cristo –, passando Ele pelo véu, isto é, em se fazendo o Verbo “carne”, deveremos encontrar os mesmos testemunhos no Lugar Santo, pois que este representava o mundo judaico sob a lei, onde Jesus atuou. Perceba, leitor! No Santíssimo habitava a Glória do Senhor: esta mesma Glória ofuscada pelo espesso véu representa a Glória de Deus ‘presa’ no invólucro humano do corpo de Jesus. “E o verbo se fez carne, e habitou entre nós [judeus], e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai” (Jo 1.14).
Só Pedro, Tiago e João tiveram o bendito privilégio de testemunhar o homem Jesus transfigurar-se em Glória, ainda que parcialmente. “Porque nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade” (Cl 2.9). “... olhando nós para ele, nenhuma beleza víamos, para que o 155
desejássemos” (Is 53.2). Quando da descida do Filho de Deus em carne, este “veio para o que era seu”, ou seja, para a nação de Israel, pois como bem disse Paulo: “São israelitas, dos quais é a adoção de filhos, e a glória, e os concertos, e a lei, e o culto, e as promessas, dos quais são os pais, e dos quais é Cristo segundo a carne, o qual é sobre todos, Deus bendito eternamente: Amém” (Rm 9.4-5). Se Jesus veio para cumprir o eterno propósito que estava em Deus oculto em mistério desde as gerações, o mesmo testemunho que estava na arca deve ser encontrado no Lugar Santo, onde os sacerdotes ministravam continuamente. Se não, vejamos.
A Mesa com os Pães Entrando no Santo, à direita da porta, notaríamos a mesa com os doze pães da proposição. Sua descrição se encontra em Êxodo 25.2330. Quanto à disposição dos pães na mesa, assim lemos em Levítico 24.5-9. “Também tomarás da flor de farinha, e dela cozerás doze bolos: cada bolo será de duas dízimas. E os porás em duas fileiras, seis em cada fileira, sobre a mesa pura, perante o Senhor. E sobre cada fileira porás incenso puro que ser á par a o pão por ofer ta memor ial; ofer ta queimada é ao Senhor. Em cada dia de sábado, isto se porá em ordem perante o Senhor continuamente, pelos filhos de Israel, por con156
certo perpétuo. E ser á de Aar ão e de seus filhos, os quais o comerão no lugar Santo, porque uma cousa santíssima é para ele das ofertas queimadas ao Senhor, por estatuto perpétuo”. Devemos observar em que o concerto é “perpétuo” “pelos filhos de Israel”, embora a nação passe por dificuldades com seus vizinhos, não possua Templo algum e a própria Igreja de Cristo despreze Israel, desejando substituí-la. Já dissemos. Mas repetiremos. “Não me aborreço de escrever-vos as mesmas coisas, e é segurança para vós”. “... o endurecimento veio em parte sobre Israel, até que a plenitude dos gentios haja entrado” (Rm 11.25). “De Sião virá o Libertador... e assim todo o Israel será salvo... e desviará de Jacó as impiedades” (Rm 11.26). A mesa trata desta fidelidade do Senhor que desposou sua amada, Israel, para sempre. “Eis que dias vêm, diz o Senhor, em que farei um concerto novo com a casa de Israel e com a casa de J udá. Não conforme o concerto que fiz com seus pais, no dia em que os tomei pela mão, para tirálos do Egito; porquanto eles invalidaram o meu concerto apesar de Eu os haver desposado, diz o Senhor ” (J r 31.32).
A fidelidade do Senhor não lhe permite dar carta de divórcio a Israel, ou nossa segurança em Cristo também é mentirosa e arrogante. “Porque o Senhor Deus de Israel diz que aborrece o repúdio” (Ml 2.16). Israel está “perante o Senhor” para sempre, ainda que o mundo os odeie. O incenso puro fala deste velar constante no zelo de Deus 157
por seu povo. “E será que como velei sobre eles para arrancar, e para derribar, e para transtornar, e para destruir, e para afligir, assim velarei sobre eles, para edificar e para plantar diz o Senhor” (J r 31.28). Se o coração outrora cicatrizado de ódio e homicídio de Paulo pôde se derramar desta maneira: “... tenho grande tristeza e contínua dor no meu coração. Porque eu mesmo poderia ser separado de Cristo, por amor de meus irmãos, que são meus parentes segundo a carne” (Rm 9.2-3), quanto mais o Senhor que os formou desde o ventre! “Porque aquele que tocar em vós toca na menina do seu olho” (Zc 2.8). Os doze pães estavam continuamente perante a face do Senhor; e a cada sábado, símbolo áureo do pacto de Deus com Israel, este pão era renovado. “As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos [nós, judeus] consumidos; porque as suas misericórdias não têm fim. Novas são a cada manhã; gr ande é a tua fidelidade” (Lm 3.22-23). Mas devemos lembrar também que o tabernáculo fala a nosso respeito, aos que já se agregaram a Cristo dentre os gentios “Hoje”.
Pois quando Paulo fala aos cristãos fiéis: “Não sabeis vós que sois o Templo de Deus, e que o espírito de Deus habita em vós?”; e, “ou não sabeis que o vosso corpo é o Templo do Espírito Santo que habita em vós, proveniente de Deus?” (1 Co 3.16; 6.19), a que templo ele se refere? Além dos doze pães representarem as doze tribos de Israel apresentadas ao Senhor, este tipo fica mais claro ainda para a Igreja, já que 158
somos uma “nova massa”, sem fermento, para sermos apresentados ao Senhor cheios da justiça de Deus, e cujo fundamento são os doze apóstolos do Cordeiro. “Assim que já não sois estrangeiros, nem forasteiros, mas concidadãos dos santos, e da família de Deus; edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que J esus Cr isto é a pr incipal pedra de esquina; no qual todo o edifício bem ajustado, cresce para templo santo no Senhor. No qual também vós juntamente sois edificados para morada de Deus em espírito” (Ef 2.19-22). “Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos cor pos em sacr ifício vivo, santo e agr adável a Deus, que é o vosso culto racional” (Rm 12.1). “Alimpai-vos pois do fermento velho, para que sejais uma nova massa, assim como estais sem fermento. Porque Cristo, nossa Páscoa, foi sacrificado por nós. Pelo que façamos festa, não com o fermento velho, nem com o fermento da maldade e da malícia, mas com os asmos da sinceridade e da verdade” (1 Co 5.7-8). E por que cada bolo era de duas dízimas de farinha? Pode-se ver um sentido imediato e outro mediato (mais à frente). Apesar da lei e do culto divino terem sido dados a Israel, o estrangeiro que se achegasse ao Senhor teria os mesmos direitos dos naturais. “Uma mesma lei tereis: assim será o estrangeiro como o natural; pois eu sou o Senhor vosso Deus” (Lv 24.22). “Uma mesma lei e um mesmo direito haverá para vós e para o estrangeiro que peregrina convosco” (Nm 15.16). 159
Este tipo é límpido em sentido mediato para a Igreja. Mostra a junção dos naturais (judeus) e gentios numa mesma massa. Já mostramos a questão do enxerto em Romanos 11. “Portanto, lembrai-vos de que vós noutro tempo éreis gentios na carne, e chamados incircuncisão pelos que na carne se chamam circuncisão [judeus] feita pelas mãos dos homens; que naquele tempo estáveis sem Cristo, separados da comunidade de Israel, e estranhos aos concertos da promessa, não tendo esperança, e sem Deus no mundo. Mas agora em Cristo Jesus, vós, que antes estáveis longe, já pelo sangue de Cristo chegastes per to. Por que ele é a nossa paz, o qual de ambos os povos fez um [uma só Igreja, não denominacional, formando o corpo único dos crentes]; e, derribando a parede de separação que estava no meio, na sua carne desfez a inimizade, isto é, a lei dos mandamentos, que consistia em ordenanças, para criar em si mesmo dos dois um novo homem, fazendo a paz, e pela cruz reconciliar ambos com Deus em um corpo, matando com ela as inimizades. E, vindo, ele evangelizou a paz, a vós que estáveis longe, e aos que estavam perto; por que por ele ambos temos acesso ao Pai em um mesmo Espírito” (Ef 2.11-18). Assim, os doze pães da proposição relacionam-se em seu caráter com o maná dentro da arca, simbolizando Cristo como alimento para todo aquele que se achega a Ele. “Porventura o cálice de bênção, que abençoamos, não é a comunhão do sangue de Cristo? O pão que partimos não é porventura a comunhão do corpo de Cristo? Porque nós, sendo muitos, somos um só pão e um só corpo: porque todos participamos do mesmo pão” (1 Co 10.16-17).
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O Candelabro Diametralmente oposto à mesa ficava o “candelabro de ouro puro batido” com suas sete pontas iluminadas. Leia Êxodo 25.31-40. A única luz que havia no Santo era esta luz que emanava de Cristo: “enquanto estou no mundo, sou a luz do mundo” (Jo 9.5). O azeite que corria por suas veias (Lv 24.1-4) era a plenitude do Espírito que habitava em Cristo em obediência à vontade soberana de seu Pai. E as sete lâmpadas eram os sete espíritos que repousavam sobre Ele: “o espírito do Senhor, o espírito de sabedoria e de inteligência, o espírito de conselho e fortaleza, o espírito de conhecimento e de temor ao Senhor. E deleitar-se-á no temor do Senhor” (Is 11.2-3).
É só por este motivo que a luz natural é constituída em seu espectro por sete cores, vistas no arco-íris quando decomposta pelos infinitos cristais de chuva. Mas o candelabro diz algo mais profundo. A luz que emanava de Cristo vinha daquilo que o preenchia naturalmente: a Palavra de Deus. “Lâmpada para os meus pés é tua palavra e luz para o meu caminho... Maravilhosos são os seus testemunhos: por isso a minha alma os guarda. A exposição das tuas palavras dá luz, dá entendimento aos símplices” (Sl 119.105,129-130). “Manifestei o teu nome aos homens... Porque lhes dei as palavras que tu me deste... a tua palavra é a verdade” (Jo 17.6,8,17). “E que é manifesta agora pela aparição de nosso Salvador Jesus 161
Cristo, o qual aboliu a morte, e trouxe à luz a vida e a incorrupção pelo evangelho...” (2 Tm 1.10). A luz do candeeiro, portanto, está em harmonia com as tábuas da lei na arca, pois “a boca fala do que está cheio o coração”. A essência perfeita da Lei de Deus era emanada em todo o seu vigor na vida exemplar, idônea e celestial do Mestre. E se a lei termina com a morte, a luz que a manifesta também. “E a condenação é esta: que a luz veio ao mundo, e os homens amaram mais as trevas do que a luz, porque as suas obras eram más. Porque todo aquele que faz o mal aborrece a luz, e não vem para a luz para que as suas obras não sejam reprovadas” (Jo 3.19-20).
Atai a vítima da festa... levai-a aos ângulos do altar ! Notemos agora uma passagem intrigante no Salmo 118.22-27, em conexão com a pedra principal de esquina e o clamor de Israel por seu Messias – “a luz verdadeira”. “A pedra que os edificadores rejeitaram tornou-se cabeça de esquina. Foi o Senhor que fez isto, e é cousa maravilhosa aos nossos olhos. Este é o dia que fez o Senhor: regozijemo-nos, e alegremo-nos nele. Oh! Salva, Senhor, nós te pedimos; ó Senhor, nós te pedimos, prospera. Bendito aquele que vem em nome do Senhor: nós vos bem dizemos desde a casa do Senhor. Deus é o Senhor que nos deu a luz: atai a vítima da festa com cordas, e levai-a até aos ângulos do altar”. Glorioso será determo-nos um pouco mais neste ponto. Achado um rico veio, tolice seria desprezá-lo. “Folgo com a tua palavra, como aquele que acha um grande 162
despojo” (Sl 119.162). A versão que acabamos de ler vem da Edição Revista e Corrigida. Da outra versão, a Edição Revista e Atualizada, extraímos na sua última parte. “O Senhor é Deus, ele é nossa luz; adornai a festa com ramos até as pontas do altar”.
Há uma diferença gritante entre as interpretações. Uma fala de uma vítima amarrada nos ângulos do altar e outra de ramos nesta mesma ponta. Desnecessário dizer que uma não representa o que o Espírito da Escritura queria ensinar. E não é necessário o conhecimento da língua original para se resolver a questão. Temos todo um contexto bíblico a nosso favor. Pergunto: nos ângulos de um altar para holocaustos caberiam sangue ou ramos? Procure alguma outra passagem na Escritura em que se relacionam ramos com os ângulos do altar. Nem perca seu tempo. O altar do holocausto fala invariavelmente de sangue, em toda a sua extensão bíblica; não há lugar para ramos. Vejamos somente uma demonstração. “E degolarás o novilho perante o Senhor à porta da tenda da congregação. Depois tomarás o sangue do novilho, e o porás com o teu dedo sobre as pontas do altar, e todo o sangue restante derramarás à base do altar” (Êx 29.11-12). No entanto, não devemos desprezar a outra versão, pois seu erro representa o mesmo erro de Israel diante do Cordeiro, conforme veremos a frente. Creio que foi proposital da parte do Espírito Santo duas interpretações diferentes. A primeira, sua Vontade santa, a segunda, sua Permissão santa. Devemos notar que ambas falam de uma festa. Qual será? É só 163
observarmos o contexto. Qual a única ocasião em que os judeus declararam: “Bendito Aquele que vem em nome do Senhor”? “Foi pois Jesus seis dias antes da Páscoa a Betânia... No dia seguinte, ouvindo uma grande multidão, que viera à festa, que Jesus vinha a Jerusalém, tomaram ramos de palmeiras, e saíram-lhe ao encontro, e clamaram: Hosana: Bendito o Rei d’Israel que vem em nome do Senhor...” (Jo 12.1,12-13).
As prescrições da Páscoa Neste pequeno trecho podemos retirar grandes e preciosas pedras. A primeira, que nos diga que se trate da Páscoa. É a única ocasião em que se associa o clamor pelo Rei a uma festa. Mas se Jesus se apresenta para a Páscoa, devemos entender o que realmente estava em jogo. Percebe-se a importância de tal acontecimento ao analisarmos as forças das palavras usadas para esta ocasião. “E aconteceu que, ao se completarem os dias em que devia ele ser assunto ao céu, manifestou, no semblante, a intrépida resolução de ir para Jerusalém” (Lc 9.51 – ERA) Observe que diante da necessidade dele ser recebido ao céu, deveria passar pela morte em Jerusalém. Disto, Ele mesmo sofre e antecipa. “E Jesus lhes respondeu dizendo: É chegada a hora em que o Filho do homem há de ser glorificado. Na verdade, na verdade vos digo que se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas se morrer, dá muito fruto... Agora a minha alma está perturbada; e que direi eu? Pai, salva-me desta hora; mas para isto vim a esta hora” (Jo 164
12.23-24,27). E o tipo de morte pela qual Ele passaria já estava profetizado também. “Bem sabeis que daqui a dois dias é a Páscoa: e o Filho do homem será entregue para ser crucificado” (Mt 26.2). Agora peço a atenção e a compreensão redobradas do leitor. “A minha boca falará da sabedoria; e a meditação do meu coração será de entendimento. Inclinarei os meus ouvidos a uma parábola: decifrarei o meu enigma na harpa” (Sl 49.3-4). Analisemos em primeiro lugar a festa. Para tanto, devemos retornar à primeira festa na qual são dadas as ordens relativas a ela para as eternas gerações seguintes. “E falou o Senhor a Moisés e a Aarão na terra do Egito, dizendo: Este mês vos será o princípio dos meses: este vos será o primeiro dos meses do ano. Falai a toda a congregação de Israel: Aos dez deste mês tome cada um para si um cordeiro, segundo as casas dos pais um cordeiro para cada casa... O cordeiro, ou cabrito, será sem mácula, um macho de um ano, o qual tomareis das ovelhas ou das cabras. E o guardareis até ao décimo quarto dia deste mês, e todo o ajuntamento de Israel o sacrificará à tarde” (Êx 12.1-6). Observe que o coração da Páscoa é o cordeiro. Eis “a vítima” de que nos falava o Salmo 118. Sem cordeiro, sem Páscoa. Perceba também que esta festa marca o início dos meses, significando que todas as demais festas prescritas, e que podem ser lidas em Levítico 23, têm por base a Páscoa. O direito à entrada no descanso, 165
tanto no caso de Israel, que entraria numa terra física, quanto à Igreja, que entra num verdadeiro descanso espiritual, depende do sacrifício de um cordeiro, na Páscoa, sem mácula. Observe ainda mais que este cordeiro deveria ser tomado no dia dez e vistoriado até o dia treze; comprovado que nele não havia defeito algum, era sacrificado no dia quatorze. Portanto, são quatro dias de vistoria (dias dez, onze, doze e treze), e no quinto dia (dia quatorze), o sacrifício do cordeiro. Se Jesus era o “Cordeiro de Deus” anunciado por João Batista, então ele deveria cumprir a lei a respeito da Páscoa. Retornemos então a João 12 um pouco acima, em que o apóstolo coloca que “seis dias antes da Páscoa” Jesus estava em Betânia. “No dia seguinte” significa que Ele chega em Jerusalém faltando cinco dias para a festa propriamente. Portanto aquele dia, em que Jesus entra “triunfantemente” em Jerusalém montado num jumentinho, conforme a profecia de Zacarias 9.9, debaixo das “hosanas” da “multidão de discípulos”, aquele dia era o dia dez correspondente ao início da vistoria do “nosso Cordeiro pascal”. E realmente assim foi. Ele andou por Jerusalém e pelo templo por quatro dias, conforme a lei, esperando que fosse reconhecido como Messias de Israel, bem como o “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”. Jesus cumpriu seu papel como cordeiro apresentando-se aos sacerdotes e ao povo de Israel. Mas o que era devido à Nação? Qual sua obrigação diante de seu Cordeiro Messiânico? Se a Lei dava ordens quanto ao Cordeiro, também dava ordens “a todo o ajuntamento de Israel”. Devemos voltar novamente à Lei. “Guarda o mês de Abibe, e celebra a Páscoa ao Senhor teu Deus: porque no mês de Abibe o Senhor teu Deus te tirou do Egito, de noite. Então sacrificarás a Páscoa ao Senhor teu Deus, ovelhas e vacas, no lugar que o Senhor escolher para ali fazer habitar o seu nome... Não poderás sacrificar a Páscoa em nenhuma das tuas portas que te dá o Senhor teu Deus. Senão no lugar que escolher o Senhor teu Deus, para 166
habitar o seu nome, ali sacrificarás a Páscoa à tarde” (Dt 16.1-2,5-6). Deste lugar, Deus responde a Salomão: “E o Senhor lhe disse: Ouvi a tua oração, e a tua súplica que suplicando fizeste perante mim; santifiquei a casa que edificaste, a fim de pôr ali o meu nome para sempre: e os meus olhos e o meu coração estarão ali todos os dias” (1 Re 9.3).
“Este será o holocausto contínuo por vossas gerações, à porta da tenda da congregação, perante o Senhor, onde vos encontrarei para falar contigo ali. E ali virei aos filhos de Israel, para que por minha glória sejam santificados. E santificarei a tenda da congregação e o altar; também santificarei a Aarão e seus filhos, para que me administrem o sacerdócio. E habitarei no meio dos filhos de Israel, e lhes serei por Deus” (Êx 29.42-45). “Porei o meu tabernáculo no meio de vós...” (Lv 26.11). Este era o lugar para sacrificar a Páscoa. No templo do Senhor. Quando Israel saiu do Egito, sacrificou às suas portas, pois ainda seu templo seria construído. Mas instalada a ordem sacerdotal e o templo, os sacrifícios só poderiam ser realizados pelos sacerdotes, no lugar Santo. Este era o seu ofício sagrado, inconfundível e bem-aventurado.
E como sacrificá-lo? Retornemos à lei. Temos alguns aspectos importantes neste ponto. Na Páscoa comemorativa, tanto no deserto, quanto depois já em Canaã, um cordeiro era suficiente para cada família. “Falai a toda a congregação de Israel, dizendo: Aos dez deste mês tome cada um para si um cordeiro, segundo as casas dos pais, um cordeiro para cada casa. Mas se a família for pequena para um cordei167
ro, então tome um só com seu vizinho perto de sua casa, conforme ao número das almas: conforme o comer de cada um, fareis a conta para o cordeiro” (Êx 12.3-4). Não há lugar para desperdício ou miséria no Reino de Deus. No caso do Cordeiro Divino-Humano, seu único sacrifício seria suficiente não só para Israel, mas pelo mundo todo, e ainda o resto do Universo e do Reino de Deus. Mas acontece que aquela festa era exclusivamente judaica. Os incircuncisos romanos, bem como qualquer outra nação debaixo do céu, por mais influente, poderosa e civilizada que fosse, não tinham direito a ela. “Disse mais o Senhor a Moisés e a Aarão: Esta é a ordenança da Páscoa; nenhum filho de estrangeiro comerá dela. Porém todo o servo de qualquer, comprado por dinheiro, depois que o houverdes circuncidado então comerá dela. O estrangeiro e o assalariado não comerão dela. Numa casa se comerá; não levarás daquela carne fora da casa, nem dela quebrareis osso. Toda a congregação de Israel o fará. Porém se algum estrangeiro se hospedar contigo, e quiser celebrar a Páscoa ao Senhor, seja-lhe circuncidado todo o macho, e então chegará a celebrá-la, e será como o natural da terra; mas nenhum incircunciso comerá dela” (Êx 12.43-48). O sacrifício completo assim consistia. “... e todo o ajuntamento da congregação de Israel o sacrificará à tarde. E tomarão do sangue, e pô-lo-ão em ambas as ombreiras, e na verga da porta, nas casas em que o comerem. E naquela noite comerão a carne assada no fogo, com pães asmos; com ervas amargosas a comerão. Não comereis dele nada cru, nem cozido em água, senão assado ao fogo: a cabeça com os pés e com a fressura. E nada dele deixa168
reis até amanhã: mas o que dele ficar até amanhã, queimareis no fogo” (Êx 12.6-10). Apreciemos um memorial da Páscoa realizado pelo rei Josias, há pelo menos 600 anos antes de Cristo e pelo menos 800 após sua instituição por Moisés. “Então Josias celebrou a Páscoa ao Senhor em Jerusalém; e mataram o cordeiro da Páscoa no décimo quarto dia do mês primeiro. E estabeleceu os sacerdotes nos seus cargos, e os animou ao ministério da casa do Senhor. E disse... E imolai a Páscoa: e santificai-vos, e preparai-a para vossos irmãos, fazendo conforme a palavra do Senhor, dada pela mão de Moisés... Assim se preparou o serviço; e puseram-se os sacerdotes nos seus postos, e os levitas nas suas turmas, conforme ao mandado do rei. Então imolaram a páscoa; e os sacerdotes espargiam o sangue recebido nas suas mãos, e os levitas esfolavam as reses. E puseram de parte os holocaustos para os darem aos filhos do povo, segundo as divisões das casas paternas, para o oferecerem ao Senhor, como está escrito no livro de Moisés; e assim fizeram com os bois. E assaram a Páscoa no fogo, segundo o rito...” (2 Cr 35.1-2,6,10-13). Quando Jesus entra em Jerusalém para ser vistoriado, o povo cumpre a primeira parte do Salmo 118 clamando: “Bendito aquele que vem em nome do Senhor”.
O endurecimento de Israel e seus ramos de palmas Mas “o endurecimento veio em parte sobre Israel” (Rm 11.25) para não cumprir a maior das honras: “atai a vítima da festa com cordas, e levai-a até aos ângulos do altar”. 169
O próprio Messias, ao olhar Jerusalém do Monte das Oliveiras, já profetizara esta negligência. “E, quando já chegava perto da descida do monte das Oliveiras, toda a multidão dos discípulos, regozijando-se, começou a dar louvores a Deus em alta voz, por todas as maravilhas que tinham visto, dizendo: Bendito o Rei que vem em nome do Senhor; paz no céu e glória nas alturas. E disseram-lhe dentre a multidão alguns dos fariseus: Mestre, repreende os teus discípulos. E respondendo ele, disse-lhes: Digo-vos que, se estes se calarem, as próprias pedras clamarão. E, quando ia chegando, vendo a cidade, chorou sobre ela, dizendo: Ah! Se tu conhecesses também, ao menos neste teu dia, o que à tua paz pertence! Mas agora isto está encoberto aos teus olhos. Porque dias virão sobre ti, em que os teus inimigos te cercarão de trincheiras, e te sitiarão, e te estreitarão de todas as bandas; e te derribarão, a ti e a teus filhos que dentro de ti estiverem; e não deixarão em ti pedra sobre pedra, pois que não conheceste o tempo da sua visitação” (Lc 19.37-44). Israel cometeu um erro crasso, abominável e inigualável. Aquela festa a que Jesus se submetia era a Páscoa, e como bom Cordeiro celeste que era, deveria ser vistoriado por todos eles e ser conduzido aos “ângulos do altar” do holocausto para ser imolado pelo sumo sacerdote Caifás, “que era o sumo sacerdote daquele ano” (Jo 18.13).
Ao invés disto, como já lemos, estendem ramos de palmeiras para sua entrada, numa clara alusão à festa dos tabernáculos. Esta festa pode ser vista em Levítico 23.34-43. Vamos transpor somente a parte de interesse. “Fala aos filhos de Israel, dizendo: Aos quinze dias deste mês sétimo será a festa dos tabernáculos ao Senhor Deus por sete dias... E ao primeiro dia tomareis para vós ramos de formosas árvores, ramos 170
de palmas, ramos de árvores espessas e salgueiros de ribeiras; e vos alegrareis perante o Senhor vosso Deus por sete dias...” A festa dos tabernáculos é a última das festas do calendário judaico, representando o reinado do Messias sobre Israel. Esqueceram-se de que esta festa prometida no futuro estava ligada e dependia do cumprimento literal da primeira festa: a Páscoa. A morte do Cordeiro, atado e sacrificado no altar do holocausto, deveria estar em conformidade com o sacrifício, como um tipo a ser confirmado, de Isaque por seu pai, Abraão. O que Deus exigia de Israel na ocasião era o mesmo exemplo de fé e obediência de Abraão ao oferecer o que ele tinha de mais precioso. A única diferença era que Isaque tinha um substituto “travado pelas suas pontas num mato” (Gn 22.13); mas Jesus era o próprio substituto. Ele estaria sozinho, como dele está escrito: “E viu que ninguém havia, e maravilhou-se de que não houvesse um intercessor; pelo que o seu próprio braço lhe trouxe a salvação, e a sua própria justiça o susteve” (Is 59.16). Assim como Abraão “considerou que Deus era poderoso para até dos mortos o ressuscitar” (Hb 11.18), Israel tinha a obrigação moral e exemplar da mesma fé. Consumida a carne do Cordeiro no fogo, como prescreve a lei, e já insinuava a lenha carregada pelo próprio Isaque (Gn 22.6), Jesus ressuscitaria ao terceiro dia das cinzas como dele estava profetizado, e aí sim, poderia restaurar o reino a Israel, conforme os discípulos o interrogaram em Atos 1.6: “Senhor, restaurarás tu neste tempo o reino a Israel?”. Talvez a única porção no ritual Pascal que não pudesse ser concretizado fosse o comer da carne do cordeiro como vimos em Êxodo 12. Porque além de Jesus ser o cordeiro Pascal, era também ele a expi171
ação da culpa e do pecado. E destes sacrifícios se diz: “Porém nenhuma expiação do pecado, cujo sangue se traz à tenda da congregação, para expiar no santuário, se comerá: no fogo será queimado” (Lv 6.30). E no livro de Hebreus encontramos mais claramente: “Temos um altar, de que não têm direito de comer os que servem ao tabernáculo. Porque os corpos dos animais, cujo sangue é, pelo pecado, trazido pelo sumo sacerdote para o santuário, são queimados fora do arraial” (Hb 13.10-11). Como Jesus adentraria ao santuário celeste para purificar as coisas celestiais, como veremos à frente, sua carne não poderia ser comida, mas somente queimada no fogo. Embora vejamos este comer da sua carne e o beber do seu sangue simbolicamente na ceia instituída pelo próprio Senhor aos discípulos. “Tomai, comei, isto é o meu corpo. E, tomando o cálice, e dando graças, deu-lho, dizendo: Bebei dele todos; porque isto é o meu sangue, o sangue do Novo Testamento, que é derramado por muitos, para remissão dos pecados” (Mt 26.26-28).
A desconcertante escolha de Caifás Parece-te duro imaginar Caifás, sumo sacerdote, imolando o Deus-Homem no altar do holocausto e queimando suas carnes? Não era isto que ele mesmo fazia todos os anos como sombra nas comemorações sucessivas da Páscoa? Não era ele o representante máximo da “adoção de filhos, e a glória, e os concertos, e a lei, e o culto, e as promessas” (Rm 9.4)? Não conhecia ele o exemplo santo da maior figura 172
de um holocausto humano, o submisso Isaque? Ele mesmo não havia profetizado um pouco antes que ‘convinha que um homem morresse pelo povo, e que não perecesse toda a nação’ (Jo 11.50)? “Mas disse eu [o Senhor]: Ouvi agora vós, chefes de Jacó, e vós, príncipes da casa de Israel: não é a vós que pertence saber o direito? A vós que aborreceis o bem, e amais o mal... que abominais o juízo e perverteis tudo o que é direito. Edificando a Sião com sangue, e a Jerusalém com injustiça. Os seus chefes dão as sentenças por presentes, e os seus sacerdotes ensinam por interesse, e os seus profetas adivinham por dinheiro; e ainda se encostam no Senhor, dizendo: Não está o Senhor no meio de nós? Nenhum mal nos sobrevirá. Portanto, por causa de vós, Sião será lavrado como um campo, e Jerusalém se tornará em montões de pedras, e o monte desta casa em lugares altos de um bosque” (Mq 3.1-2,9-12).
“Depois os príncipes dos sacerdotes, e os escribas, e os anciãos do povo reuniram-se na sala do sumo sacerdote, o qual se chamava Caifás, e consultaram-se mutuamente para prenderem Jesus com dolo e o matarem. Mas dizia: Não durante a festa para que não haja alvoroço entre o povo” (Mt 26.3-5). A intenção dos sacerdotes era incriminar injustamente a Jesus, visto que “testemunho contra Jesus... não achavam” (Mc 14.55), para o matarem depois da festa da Páscoa, sem a participação de “toda a congregação de Israel”. Ao invés de um sacrifício pacífico proposto por Deus, temos um homicídio perpetrado por homens ímpios. E em vez de uma morte rápida e honrosa num lugar santo, temos uma agonia vergonhosa de seis horas na maldição da cruz, visto ser “maldito todo aquele que for pendurado no madeiro” (Dt 21.23 / Gl 3.13). 173
Desta morte pagã na cruz, Pedro declara: “A Jesus Nazareno, varão aprovado por Deus entre nós com maravilhas, prodígios e sinais... A este que vos foi entregue pelo determinado conselho e presciência de Deus, tomando-o vós, o crucificastes e matastes pelas mãos de injustos” (At 2.22-23). Sob o ponto de vista de interesse de Israel, o Cordeiro de Deus não poderia morrer daquela forma pelas mãos dos gentios, fora de sua casa, embora assim fosse profetizado. Israel desdenhou o privilégio bendito de cumprir os desígnios santos do Eterno ao desprezar o seu Cordeiro Messiânico, para nossa alegria e bênção, o privilégio aos gentios. Daí que também o Senhor passou todas as bem-aventuranças do evangelho à Igreja e momentaneamente escondeu a sua face do seu povo. Podemos também enxergar esta necessidade da morte do cordeiro no altar do holocausto no tabernáculo santo terreno, partindo da premissa que, se “o cordeiro foi morto desde a fundação do mundo” e seu sangue já era conhecido “ainda antes da fundação”, onde, como já refletimos, poderia ter sido Ele sacrificado simbolicamente nos céus? É mais que óbvio e natural tudo ter ocorrido no altar verdadeiro, no santuário da presença de Deus. Daí que também, na sombra, o único lugar plausível para o seu sacrifício seria no “lugar que o Senhor escolher para habitar seu nome”. Mas não foi assim. Israel encheu o cálice de sua negligência, rebeldia e depravação. O Senhor “padeceu fora da porta; saiamos pois a ele fora do arraial, levando o seu vitupério” (Hb 13.12-13). No entanto, mostraremos a frente, que seu sacrifício na cruz pagã foi tão aceito quanto seria se houvesse ocorrido no altar santo. Completamos assim a questão de que o candelabro com suas sete 174
lâmpadas relaciona-se com a lei das duas tábuas na arca, cumpridas na morte de Jesus. Há talvez uma única diferença crucial entre estas figuras, e isto em relação aos seus beneficiários. A Lei era implacável em suas ordenanças, gerando inevitavelmente morte para aqueles que a ouviam, enquanto a luz do candelabro só podia gerar vida, pois sua personificação, o Filho de Deus em carne, só Ele cumpriu literal e cabalmente a mesma Lei, cumprindo-a em vida e na sua morte substitutiva. “Deus é o Senhor que nos deu a luz: atai a vítima da festa com cordas, e levai-a até aos ângulos do altar” (Sl 118.27). E “o cumprimento da lei é o amor” (Rm 13.10). O clímax absoluto desta intensidade de luz amorosa está em que, o Filho, “sendo em forma de Deus, aniquilou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, e achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até a morte, e morte de cruz” (Fp 2.6-9). “Deus prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores” (Rm 5.8). “Eu sou o bom Pastor: o bom Pastor dá a sua vida pelas ovelhas” (Jo 10.11).
Em verdade, em verdade podemos dizer, profundamente agradecidos e vergonhosamente sem meios de retribuir, que “o amor de Cristo excede a todo o entendimento” (Ef 3.19).
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O Altar do Incenso Toda e qualquer peça que se encontrava no tabernáculo era celeste em sua concepção. Mas este, o altar do incenso, falava de algo totalmente novo, inusitado e solene. Inicialmente por sua posição. Ficava em frente ao véu. “E farás um altar para queimar o incenso: de madeira de cetim o farás... E com ouro puro o forrarás... E o porás diante do véu que está diante da arca do testemunho, diante do pr opiciatór io, que está sobre o testemunho, onde me ajuntarei contigo. E Aarão sobre ele queimará o incenso das especiarias; cada manhã, quando põe em ordem as lâmpadas, o queimará” (Êx 30.1-7). Não havia meio de Aarão entrar no lugar Santíssimo sem passar por ele. E todas as vezes que os sacerdotes, filhos de Aarão, que não poderiam jamais entrar no Santo dos Santos, mirassem em direção do véu, o incensário ali colocado já os avisava de que algo ainda faltava e os impedia de lá entrar. Mas devemos notar algo bem peculiar. Este altar de ouro estava no lugar Santo juntamente ao candelabro e à mesa com os pães, mas não era considerado como mobília deste recinto. Preste atenção agora o que diz o escritor de Hebreus, em seu capítulo 9.2-4, a este respeito. “Um tabernáculo estava preparado, o primeiro, em que havia o candeeiro, e a mesa, e os pães da proposição; ao que se chama o santuário”. Onde está a descrição do altar conforme vimos acima, em Êxodo 30? “Mas depois do segundo véu estava o tabernáculo que se chama 176
o Santo dos Santos, que tinha o incensário de ouro, e a arca do concerto...” O incensário estava no Santo, mas não era do Santo. É contado em companhia da arca que estava debaixo da glória de Deus, no Lugar Santíssimo. Alguns, por não terem ainda se aprofundado nesta questão, simplificam a interpretação destas coisas, alegando que o escritor de Hebreus se referia ao altar do incenso depois de Jesus morto, com o véu rasgado, fazendo-nos crer que o caminho para o Santo dos Santos ficou livre, pois o “véu do templo se rasgou em dois”, levando o escritor a contar este altar como pertencente ao Lugar Santíssimo. E bendito seja Deus, realmente o véu se rasgou, e podemos entrar com “ousadia no santuário, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou, pelo véu, isto é, pela sua carne” (Hb 10.19-20). Mas há um contexto que não deve ser desprezado. O último versículo do capítulo 8 de Hebreus e o primeiro versículo do capítulo 9 nos fornecem a base para a interpretação que fazemos. “Dizendo Novo Concerto, envelheceu o primeiro. Ora, o que foi tornado velho, e se envelhece, perto está de acabar. Ora também o primeiro [concer to] tinha or denanças de culto divino, e um santuário terrestre.” A descrição do tabernáculo que se segue, portanto, refere-se ao período do primeiro concerto, o período da lei, cujo término dependia da “morte do testador”. Além do mais, o leitor atento verificará a descrição dos três ele177
mentos que compunham o testemunho, dentro da arca: “um vaso de ouro que continha o maná, e a vara de Aarão, que tinha florescido, e as tábuas do concerto” (Hb 9.4). Mas se avançarmos um pouco mais no tempo, quando Salomão edificou um templo para o Senhor, “trouxeram os sacerdotes a arca do concerto do Senhor ao seu lugar, ao oráculo da casa, ao lugar santíssimo, até debaixo das asas dos querubins”, mas “na arca nada havia, senão só as duas tábuas de pedra, que Moisés ali puser a junto a Horebe, quando o Senhor fez aliança com os filhos de Israel” (1 Re 8.69). Portanto, quando Hebreus descreve o lugar Santíssimo, e a ele pertencendo o altar do incenso, que estava fisicamente no lugar Santo, separado pelo véu, o escritor inspirado considerou o tabernáculo num período ainda anterior a Salomão, quando ainda o véu estava inviolado e os três elementos da arca ainda estavam lá. Retornemos. Será que o leitor já percebeu o significado destas coisas? Ouçamos uma indicação similar. “Vós sois de baixo, eu sou de cima; vós sois deste mundo, eu não sou deste mundo” (J o 8.23). “Enquanto estou no mundo, sou a luz do mundo” (Jo 9.5). “Não são do mundo, como eu do mundo não sou” (Jo 17.16). “Respondeu Jesus: O meu reino não é deste mundo...” (Jo 18.36). “Saí do Pai, e vim ao mundo: outra vez deixo o mundo, e vou para o Pai” (Jo 16.28). 178
O Senhor Jesus saiu de seu trono, a habitação com o Pai nos céus, simbolizado pela arca dentro do Santíssimo, e veio ao nosso mundo através do “véu” de sua carne, encobrindo a sua Glória. Daria sua vida pelo mundo no altar do holocausto, mas como retornaria para seu Pai, nos símbolos do santuário? Pela fumaça do incenso no incensário, ou seja, pela sua ressurreição. Por isto este altar é contado como fazendo parte do Lugar Santíssimo, pois que representa seu retorno ao Pai em glória. Estando entre nós, no entanto, sabia que não era deste mundo, e deveria retornar ao seu lar para junto de seu Pai. Falamos muito de morte e sangue até agora, pois Israel só isto conheceria de Deus, visto sua negligência. Mas os sinais da grandiosa glorificação já estavam lá. Pergunto ao leitor. A base do perdão dos nossos pecados não está na morte de Cristo em nosso lugar? Sim, é claro. Mas que valor teria a morte sem o poder da ressurreição? Quem não nasce? Quem não morre? Mas quem ressuscita pelo próprio poder e ainda podendo dizer: “Tragada foi a morte na vitória?” (1 Co 15.54). “Cristo ressuscitou dos mortos, pela glória do Pai” (Rm 6.4). “E, se não há ressurreição de mortos, também Cristo não ressuscitou. E, se Cristo não ressuscitou, logo é vã a nossa pregação, e também é vã a vossa fé... E se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé, e ainda permaneceis nos vossos pecados” (1 Co 15.13-14,17). “Ora o Deus de paz, que pelo sangue do concerto eterno tornou a trazer dos mortos o nosso Senhor J esus Cr isto...” (Hb 13.20).
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O Sangue e a Nuvem Se o sangue de Cristo fosse o único ingrediente necessário para a nossa salvação, sem o poder da ressurreição, então Aarão poderia passar pelo véu somente com o sangue de um cordeiro. Mas o que diz a Palavra? “E Aarão fará chegar o novilho da expiação, que será para ele, e fará expiação por si e pela sua casa; e degolará o novilho da expiação, que é para ele. Tomará também o incensário cheio de brasas de fogo do altar, de diante do Senhor, e os seus punhos cheios de incenso aromático moído, e o meterá dentro do véu. E porá o incenso sobre o fogo perante o Senhor, e a nuvem do incenso cobrirá o propiciatório, que está sobre o testemunho, para que não morra” (Lv 16.11-13). Façamos uma breve apreciação desta celestial nuvem.
“E o Senhor ia diante deles, de dia numa coluna de nuvem, para guiá-los pelo caminho” (Êx 13.21). “E Moisés entrou no meio da nuvem, depois que subiu ao monte: e Moisés esteve no monte quarenta dias e quarenta noites” (Êx 24.18). “E o Senhor desceu numa nuvem, e se pôs ali junto a ele [Moisés]: e ele apregoou o nome do Senhor” (Êx 34.5). O Senhor nunca aparecia a Israel em sua essência, mas sempre a sua Glória estava envolta numa nuvem, ou ainda outros elementos que insinuassem outras facetas suas. Na visão gloriosa de Ezequiel, o profeta vê uma nuvem a se aproximar, e “do meio dela saía a semelhança de quatro animais [ou criaturas viventes]; e esta era a sua aparência: tinham a semelhança de 180
um homem. E cada um tinha quatro rostos... E a semelhança dos seus rostos era como o rosto do homem; e à mão direita todos os quatro tinham rosto de leão, e à mão esquerda todos os quatro tinham rosto de boi, e também r osto de águia todos os quatr o” (Ez 1.4-6,10). Para os que são íntimos do Evangelho, os quatro animais descritos coincidem com as quatro faces de Cristo descritas pelos quatro evangelistas: Rei, Servo, Homem e Deus – leão, boi, homem e águia – Mateus, Marcos, Lucas e João. Na transfiguração de Cristo, seis dias após sua promessa aos apóstolos, a nuvem reaparece. “Porque o Filho do homem virá na glória de seu Pai, com os seus anjos... Em verdade vos digo que alguns há, dos que aqui estão, que não provarão a morte até que vejam vir o Filho do homem no seu reino. Seis dias depois, tomou Jesus consigo a Pedro, e a Tiago, e a João... E transfigurou-se diante deles; e o seu rosto resplandeceu como o sol, e os seus vestidos se tornaram brancos como a luz... E, estando ele ainda a falar, eis que uma nuvem luminosa os cobriu. E da nuvem saiu uma voz que dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo: escutai-o” (Mt 16.27-28; 17.1-5). Conclui-se, portanto, que a nuvem é a glória do Senhor, é o Senhor Jesus, “um com o Pai”. A Glória de Deus é a manifestação de Jesus Cristo. A nuvem produzida pelo incensário para cobrir o propiciatório, portanto, mostra o regresso em glória daquele que saiu do céu para viver entre os homens e morrer por eles. E mostra indubitavelmente a aceitação do Pai de todo o serviço executado pelo Filho na sua infinita graça e propiciação pelos nossos 181
pecados. “... o qual por nossos pecados foi entregue, e ressuscitou por causa da justificação” (Rm 4.25). Como o próprio Filho disse na cruz: “Está consumado”. E antes: “Eu glorifiquei-te na terra, tendo consumado a obra que me deste a fazer. E agora, glorifica-me, ó Pai, junto de ti mesmo, com aquela glória que tinha contigo antes que o mundo existisse” (Jo 17.4-5). O incensário também mostra “o firme fundamento das coisas que se esperam” (Hb 11.1). A vitória de Cristo, tanto na vida quanto na morte, estava já prevista e assegurada pela fumaça do incensário que representava seu retorno ao Pai em Glória. Este tipo de certeza da ressurreição pode ser vista em Abraão e Isaque. “Pela fé ofereceu Abraão a Isaque, quando foi provado, sim, aquele que recebera as promessas ofereceu o seu unigênito. Sendo-lhe dito: Em Isaque será chamada a tua descendência, considerou que Deus era poderoso para até dos mortos o ressuscitar. E daí também em figura ele o recobrou” (Hb 11.17-19). Além de o incensário mostrar a glorificação de Jesus, mostra também toda a sua submissão e intercessão em favor dos pecadores. Observe como o incenso santo deveria ser misturado: “E dele moendo o pisarás” (Êx 30.36). De Cristo se diz: “Todavia, ao Senhor agradou o moê-lo” (Is 53.10). O incenso moído mostra a vontade de Cristo sendo moída na mesma proporção para satisfazer os desígnios Santos de seu Pai. “Meu Pai, se é possível, passa de mim este cálice; todavia, não seja como eu quero, mas como tu queres” (Mt 26.39). 182
“Ainda que era Filho, aprendeu a obediência, por aquilo que padeceu” (Hb 5.8). “Jesus disse-lhes: A minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou, e realizar a sua obra... Porque eu desci do céu, não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou” (Jo 4.34; 6.38). Resumindo de forma simples, a glória que habitava entre os querubins se fez carne através do símbolo do véu, que lhe encobria a glória; padeceu fora da porta, simbolizado pelo altar do holocausto no pátio, ao relento; retorna aos céus pela fumaça do incensário no dia da expiação anual, pelas mãos de Aarão, sumo sacerdote. Também concluímos que os três testemunhos escondidos dentro da arca – o maná, a lei e a vara de Aarão florescida –, representando a vida, morte e ressurreição de Cristo, simbolizavam na verdade o “beneplácito que propusera em si mesmo... conforme o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade... para louvor da sua glória” (Ef 1.9,11,14), pois estavam ocultos aos olhos dos sacerdotes e do povo pelo peso do propiciatório e pelo véu, e que, por reflexo, impediam os anjos de compreenderem todo o propósito do coração de Deus, na eternidade passada. O propiciatório nos fala da vontade do Filho em nos querer ser propício, o véu, do fundamento da sua obra: sua carne. “Achado na forma de homem”, ou seja, saindo do Pai, manifestará este mesmo “firme propósito” através dos elementos do Lugar Santo: a mesa com os pães, o candelabro e o altar do incenso. Na salutar presciência do Pai, os herdeiros originais desprezariam a sua luz, crucificando-o “pelas mãos de injustos”, “fora da porta”. “Saiamos pois a ele fora do arraial... tendo por maiores riquezas 183
o vitupério de Cristo do que os tesouros do Egito” (Hb 13.13; 11.26), “de sorte que haja o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus... para que sejais irrepreensíveis e sinceros, filhos de Deus inculpáveis no meio de uma geração corrompida e perversa... retendo a palavra da vida” (Fp 2.5,15-16).
O Altar do Holocausto Lá fora, ao relento, vemos a bacia, que não abordaremos, e o altar do holocausto, onde eram sacrificados os animais limpos.
Cobre ou Bronze? De acordo com as versões para o português, ora trazem como cobertura o bronze, ora o cobre. Podemos comprovar, com convicção serena e plena, que o material utilizado para a confecção do altar do holocausto, e também da pia, era o cobre, e jamais o bronze. Essencialmente, porque o cobre é um minério encontrado de forma bruta na natureza, assim como o ouro e a prata, os dois outros minérios encontrados no tabernáculo. O bronze é uma liga composta em sua maior parte de cobre, em associação ao estanho e outros materiais. É material produzido pelo homem através da mistura de pelo menos dois elementos diferentes. A Palavra de Deus é muito clara quanto a misturas. “Não semearás a tua vinha de diferentes espécies de semente, 184
para que não se profane o fruto da semente que semeares, e a novidade da vinha. Com boi e com jumento juntamente não lavrarás. Não te vestirás de diversos estofos de lã e linho juntamente” (Dt 22.9-11). Assim como o ouro e a prata eram materiais puros, sem mistura, somente o cobre poderia ser utilizado na construção do tabernáculo. E se pensarmos nas características físicas destes materiais, o cobre seria o material de eleição. Ele é altamente maleável e passível de ser trabalhado plasticamente, ou seja, capaz de ser batido ou forjado sobre as superfícies. Além do mais, o cobre se funde, ou se derrete, a 1.083 graus Centígrados, enquanto o bronze, dependendo da sua concentração de estanho, suporta um calor máximo aproximado de 1.000 graus. Não devemos nos esquecer de que no altar do holocausto o fogo era contínuo. Como última observação, e das mais interessantes, o cobre, a prata e o ouro estão localizados na mesma coluna da Tabela Periódica dos Elementos, devido às suas semelhanças de comportamento, que simbolizariam a Uniformidade dos Ministérios de Deus. Voltando ao altar dos sacrifícios, de cobre, ali, todo pecador podia se achegar. Era a parte que lhe cabia. Oferecer os sacrifícios pacíficos, ofertas e oblações por seus pecados, porquanto não tinham acesso às coisas celestiais enquanto não fossem lavados pelo sangue do verdadeiro Cordeiro. Está fora do tabernáculo protegido, pois Israel, como nação, rejeitaria seu Messias, e assim este direito passaria aos gentios. Por isto que Ele “padeceu fora da porta”, fora dos muros de Jerusalém. E também porque, segundo a lei, os “corpos dos animais, cujo sangue é, pelo pecado, trazido pelo sumo sacerdote para o Santuário, são queimados fora do arraial. E por isso também Jesus, para santificar o povo pelo 185
seu próprio sangue, padeceu fora da porta” (Hb 13.11-12). Mas embora o altar de cobre estivesse fora, ele era o único meio do pecador gentio ou judeu se achegar a Deus. Quando o judeu comum passasse a primeira porta do átrio, veria inevitavelmente à sua frente aquele instrumento fúnebre. Ali o sangue escorria invariavelmente, todos os dias, duas vezes ao dia, no mínimo; isso se mais ninguém da nação pecasse ou não quisesse ofertar nada. O fogo ardia ininterruptamente, pois Deus está pronto para julgar o pecado do miserável a qualquer momento. “Isto pois é o que oferecereis sobre o altar: dois cordeiros dum ano cada dia continuamente. Um cordeiro oferecerás pela manhã e o outro cordeiro oferecerás à tardinha” (Êx 29.38-39). “O fogo arderá continuamente sobre o altar; não se apagará” (Lv 6.13). O Senhor Jesus cumpriu este sacrifício contínuo ao ser crucificado desde a hora do primeiro sacrifício até sua morte no momento do segundo sacrifício, perfazendo um total de seis horas de tormento por nossas culpas e pecados, no dia da Páscoa. A respeito desses intermináveis sacrifícios, o gigante de Hebreus declara: “E na verdade, aqueles foram feitos sacerdotes em grande número, porque pela morte foram impedidos de permanecer. Mas este [Jesus], porque permanece eternamente, tem um sacerdócio perpétuo... Porque nos convinha tal sumo sacerdote, santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores, e feito mais excelente que os céus; que não necessitasse, como os sumos sacerdotes, de oferecer cada dia sacrifícios, primeiramente por seus próprios pecados, e depois pelo povo; 186
porque isto fez ele, uma vez, oferecendo-se a si mesmo” (Hb 7.23-27). O corpo de Cristo oferecido no calvário substitui e inutiliza todos os instrumentos do santuário com perfeição Sublime e Infinita. Não obstante neste altar verifiquemos que vários tipos de sacrifícios podiam ser oferecidos, tais como o de culpa, de ignorância, de manjares, de paz e de ofertas voluntárias, descritos no início do livro de Levítico, todos tinham por base aquele sacrifício anual oferecido na Páscoa. Sem o sangue da Páscoa, Israel ainda estaria sob as mãos do Egito. Assim como se o “nosso Cordeiro Pascal” não tivesse sido sacrificado na cruz do Calvário, estaríamos irremediavelmente perdidos por causa dos nossos pecados e de nossa natureza pecaminosa. “Porque Cristo, nossa Páscoa, foi sacrificado por nós” (1 Co 5.7).
Neste altar precioso também se comemoravam as sete festas solenes de Israel, descritas em Levítico 23, com suas ofertas queimadas, que descrevem como sombra a história de Israel, desde a saída do Egito sob a Páscoa até o Reino Milenial na festa dos Tabernáculos, passando pela ressurreição de Cristo na festa das Primícias, a reunião do corpo de Cristo em Pentecostes, arrebatamento desta Igreja nas Trombetas e o perdão final de Israel no Dia da Expiação. Todo cristão deveria conhecer a fundo estas sete festas, pois a nós nos diz respeito. Um excelente comentário sobre elas pode ser encontrado nas anotações da Bíblia de Scofield. Comentaremos agora somente a festa anual do Dia de Expiação, pois esta tem a ver diretamente com o templo celeste.
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O Dia da Expiação Nesse dia especial, descrito em Levítico 16, Aarão oferecia ao Senhor o sangue de novilhos e bodes primeiramente “por si mesmo” e depois “pelas culpas do povo”, trazendo este “sangue para dentro do véu”. À parte a sublimidade do sacrifício do bode do Senhor e da liberdade do bode emissário, representando respectivamente a justificação do homem no sangue de Cristo e a santificação das novas vidas pela confissão constante dos pecados, o que nos interessa aqui é sabermos duas coisas. Inicialmente, que o sangue do novilho que era para Aarão mesmo, este encenando Cristo, o verdadeiro Sumo Sacerdote, era levado para dentro do véu somado ao incenso, e com ele espargido o propiciatório. Assim vemos. “E Aarão fará chegar o novilho da expiação, que será para ele, e fará expiação por si e pela sua casa; e degolará o novilho da expiação, que é para ele. Tomará também o incensário cheio de brasas de fogo do altar de diante do Senhor, e os seus punhos cheios de incenso aromático moído, e o meterá dentro do véu. E por á o incenso sobr e o fogo perante o Senhor, e a nuvem do incenso cobrirá o propiciatório, que está sobre o testemunho, para que não morra. E tomará do sangue do novilho, e com o seu dedo espargirá sobre a face do propiciatório, par a a banda do or iente; e perante o propiciatório espargirá sete vezes do sangue com o dedo” (Lv 16.11-14). Se Cristo havia saído do céu, passando pelo véu, e com isto se encarnado, Cristo retorna simbolicamente ao céu neste momento. O 188
sangue fala de sua morte lá fora, no altar do holocausto, a fumaça do incenso mostra sua ressurreição vitoriosa e sua entrada nos céus. Significa também que todo o trabalho Maravilhoso de sua cruz foi aceito pelo Pai, e nada mais nos resta fazer, a não ser crer neste sacrifício bendito a nosso favor. Sobre isto já havíamos comentado um pouco antes. Mas preste atenção agora. O segundo ponto fala da purificação do santuário por causa dos pecados do povo. Observe: “Depois degolará o bode da expiação, que será para o povo, e trará o seu sangue para dentro do véu; e far á com o seu sangue como fez com o sangue do novilho, e o espargirá sobre o propiciatório, e perante a face do propiciatório. Assim fará expiação pelo santuário por causa das imundícias dos filhos de Israel e das suas transgressões, segundo todos os seus pecados: e assim far á par a a tenda da congregação que mora com eles no meio das suas imundícias... Então sairá ao altar, que está perante o Senhor [altar do incenso], e fará expiação por ele; e tomará do sangue do novilho, e do sangue do bode, e porá sobre as pontas ao redor. E daquele sangue espargirá sobre ele com o seu dedo sete vezes, e o purificará das imundícias dos filhos de Israel, e o santificará” (Lv 16.15-19). Esta é a questão que estamos debatendo desde o início deste livro. Este santuário terreno precisava ser santificado com sangue de bodes e novilhos; com que sangue se purificaria o tabernáculo celeste após sua contaminação por Lúcifer? “De sorte que era bem necessário que as figuras das coisas que estão no céu assim se purificassem; mas as próprias coisas celestiais com sacrifícios melhores do que estes. Porque Cristo não entrou num santuário feito por mãos, figura do verdadeiro, porém no mes189
mo céu, par a agor a compar ecer por nós per ante a face de Deus” (Hb 9.23-24). Assim como Aarão entrava com sangue alheio para santificar o tabernáculo terrestre contaminado pelo povo em redor, Cristo “entrou por nós, nosso precursor, feito eternamente sumo sacerdote” (Hb 6.20) e que “está assentado nos céus à destra do trono da majestade, ministro do santuário e do verdadeiro tabernáculo” (Hb 8.1-2), levando seu precioso sangue, e com ele santificando cada peça contaminada pelo anjo rebelde. E se cada peça do santuário, e o próprio santuário como um todo, foram santificados com o sangue de Jesus, os ministrantes e sacerdotes substitutos, nós, os que temos crido nas promessas do Pai celeste, fomos “aperfeiçoados para sempre com uma só oblação” (Hb 10.14). Assim, “Jesus, Filho de Deus, grande sumo sacerdote, penetrou nos céus” (Hb 4.14) e “está assentado para sempre à destra de Deus. Daqui em diante esperando até que os seus inimigos sejam postos por escabelo de seus pés” (Hb 10.12-13), e esperando também que o grande exército da “geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido” (1 Pe 2.9) se “revista da incorruptibilidade e da imortalidade” (1 Co15.53), e possa entrar na nova Jerusalém e completar o número dos anjos expulsos. É por isto mesmo que nos parece lógico crer que o número de homens escolhidos por Deus naquela eleição eterna no sangue do Cordeiro, é exatamente o mesmo dos anjos caídos. Se Lúcifer foi substituído por um, o Filho Eterno, então a miríade de anjos caídos, o terço das estrelas do céu, deverá ser substituída uma por uma. Graças a Deus que o número está se completando. Em breve o período da Igreja se findará, e o período de tribulação de sete anos governada pelo anticristo, filho primogênito da globalização, se instaurará; e somente mais mil anos do Reinado do Messias no trono, em Jerusalém, nos separarão, como um todo, da bendita esperança e 190
herança a nós guardada nos céus. “Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, segundo a sua grande misericórdia, nos gerou de novo para uma viva esperança, pela ressurreição de Jesus Cristo, dentre os mortos, para uma herança incorruptível, incontaminável, e que se não pode murchar, guardada nos céus para vós” (1 Pe 1.3-4). Deus ainda está chamando as pequenas pedras da grande construção espiritual para completar o sacerdócio caído, e podermos rememorar como sacerdotes constituídos o sacrifício que mudou o rumo de nossas pobres vidas. A Palavra de Deus diz que o “salário do pecado é a morte” (Rm 6.23), não só física, mas sobretudo espiritual. E Deus nos oferece vida eterna na morte de Jesus Cristo.
“E o testemunho é este: que Deus nos deu a vida eterna; e esta vida está em seu Filho. Quem tem o Filho tem a vida: quem não tem o Filho de Deus não tem a vida. Estas coisas vos escrevi, para que saibais que tendes a vida eterna, e para que creiais no nome do Filho de Deus” (1 Jo 5.11-13). Se o leitor ainda não O aceitou como Salvador e Senhor, não despreze esta tamanha oferta que é de graça. Se “Hoje ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos corações” (Hb 4.7). Porque “o Senhor não retarda a sua promessa, ainda que alguns a têm por tardia; mas é longânimo para convosco, não querendo que alguns se percam, senão que todos venham a se arrepender” (2 Pe 3.9). E é muito fácil. “Não digas em teu coração: Quem subirá ao céu? (Isto é, a trazer 191
do alto a Cristo). Ou: Quem descerá ao abismo? (Isto é, a tornar a trazer dentre os mortos a Cristo). Mas que diz? A palavra está junto de ti, na tua boca, e no teu coração; esta é a palavr a de fé, que pr egamos; a saber: Se com a tua boca confessares ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dos mortos, serás salvo... Porque todo aquele que invocar o nome do Senhor Jesus será salvo” (Rm 10.6-13).
“Bem-aventurados aqueles que lavam as suas vestiduras no sangue do Cordeiro, para que tenham direito à árvore da vida, e possam entrar na cidade pelas portas” (Ap 22.14). Em Cristo você tem a oportunidade de ser tirado da “potestade das trevas” e ser “transportado para o Reino do Filho do seu amor, em quem temos a redenção pelo seu sangue, a saber, a remissão dos pecados” (Cl 1.13-14). Admita e confesse que você é pecador, peça perdão pelos seus pecados e invoque de uma vez por todas o “nome que está acima de todo o nome” (Fp 2.9). “Porque há um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem” (1 Tm 2.5). E se você já tem Cristo, aproprie-se da realidade do seu sacerdócio eterno e “sede sóbrios. E esperai inteiramente na graça que se vos ofereceu na revelação de Jesus Cristo” (1 Pe 1.13). Pois em breve, entraremos no Verdadeiro.
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5 Do Verdadeiro
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e nós, os que temos crido em Jesus Cristo como Senhor e Salvador, somos constituídos “sacerdócio real”, “reis e sacerdotes”, “sacerdotes de Deus e de Cristo” (1 Pe 2.9; Ap 5.10; 20.6), então podemos aprender mais sobre nós mesmos examinando a conduta dos primeiros sacerdotes humanos constituídos, figura dos verdadeiros.
A Consagração de Aarão A consagração dos sacerdotes para poderem oficiar no tabernáculo é repleta de ensino. Deles, e por reflexo a nós, que ministramos através de nosso próprio tabernáculo, nossas vidas renovadas em Cristo e ungidas pelo Espírito Santo, dentro do tabernáculo maior, o corpo de Cristo, a Igreja, se diz: “Também farás túnicas aos filhos de Aarão... E vestirás com eles a Aarão teu irmão, e também seus filhos; e os ungirás, e consagrarás e os santificarás, para que me administrem o sacerdócio” (Êx 28.40-41). Estas três palavras não são sinônimas. Mas representam uma sequência de atos necessários para que os sacerdotes estivessem aptos ao serviço sacerdotal. Estes sacrifícios não representam a entrada à fé em Cristo, ou seja, nossa salvação, pois Aarão e seus filhos foram salvos 193
pela Páscoa, mas representam o serviço sacerdotal entre seus irmãos. Inicialmente há a necessidade da unção. A unção fala da escolha ou eleição, da parte de Deus, dos homens que Ele deseja para cumprir um determinado serviço. A unção parte sempre de Deus em favor de seu alvo, seja ele quem for. Embora vivamos num tempo em que os homens tomem esta honra para si, ungindo-se uns aos outros, sem a consulta ou o favor Divino, daí a convulsão religiosa que nos assola e nos confunde. “Então se achegarão os sacerdotes, filhos de Levi (pois o Senhor teu Deus os escolheu para o servirem, e para abençoarem em nome do Senhor...)” (Dt 21.5). Dos atuais sacerdotes em Cristo se diz: “Mas o que nos confirma convosco [Paulo se referindo ao seu ministério entre os gentios] em Cristo, e o que nos ungiu, é Deus” (2 Co 1.21). “Não me escolhestes vós a mim, mas eu vos escolhi a vós, e vos nomeei, para que vades [ir para o ministério de evangelização] e deis fruto” (Jo 15.16). “Mas agora Deus colocou os membros no corpo, cada um deles como quis... Para que não haja divisão no corpo, mas antes tenham os membros igual cuidado um dos outros... E a uns pôs Deus na igreja, primeiramente apóstolos, em segundo lugar profetas, em terceiro doutores...” (1 Co 12.18,25,28). Esta escolha nos garante, da parte de Deus, os recursos necessários que nos permite a entrada ao mundo espiritual e a energia eficaz para a realização da Sua Vontade. Esta unção, pois, também fala do Espírito Santo como agente capacitador. 194
Mas esta escolha do Senhor gera em contrapartida uma responsabilidade: nossa decisão em obedecer ou recusar Suas ordens. Daí a necessidade da consagração. Se a unção é elemento exclusivamente Divino, a consagração é elemento humano. Mas esta é efeito daquela, jamais o inverso, ou se tornará mera religiosidade. A consagração dos sacerdotes falava da necessidade destes homens se ofertarem ao Senhor como instrumentos em suas santas mãos. Na intersecção santa das duas, a unção para o serviço e a sua entrega voluntária, nasce a santificação prática ou separação deles. Compreenderemos melhor estes três pontos se analisarmos brevemente os sacrifícios envolvidos e necessários para tal resultado, em Êxodo 29 e Levítico 8 em conexão. “Isto é o que lhes hás de fazer, para santificá-los, para que me administrem o sacerdócio: Toma um novilho, e dois carneiros sem mácula...” (Êx 29.11). A santificação é o objetivo, passando necessária e invariavelmente pela unção e consagração, alimentada pelo sacrifício de Cristo em nosso lugar, composta pelos três animais envolvidos, e que procuraremos entender seu significado mais profundo. Antes, porém, vemos somente Aarão sendo vestido e ungido com o santo azeite. “Depois tomarás os vestidos, e vestirás a Aarão da túnica e do manto do éfode... E tomarás o azeite da unção, e o derramarás sobre a sua cabeça: assim o ungirás” (Êx 29.5-7). Neste momento, somente Aarão é ungido, pois sendo ele sumo sacerdote, representa Jesus no mesmo ofício futuramente. Em seguida, Aarão será novamente ungido junto a seus filhos sacerdotes. Neste momento há somente a unção da pessoa de Aarão com as vestimentas sagradas, como vimos, pois representa a escolha do Filho como sumo sacerdote da parte do Pai. E não há necessidade de sacrifício de sangue 195
para tal unção, pois que Cristo é sem pecado. “O Espírito do Senhor está sobre mim; porque o Senhor me ungiu par a pr egar boas novas aos mansos” (Is 61.1), falando de “como Deus ungiu a Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e a virtude” (At 10.38). “Depois, farás chegar seus filhos, e lhes farás vestir túnicas, e os cingirás com o cinto, a Aarão e os seus filhos, e lhes atarás as tiaras, para que tenham o sacerdócio por estatuto perpétuo, e sagrarás a Aarão e seus filhos...” (v. 8-9). Agora, a consagração de todos eles se fará através do triplo sacrifício, pois que serão vistos como homens pecadores, necessitando de um substituto capaz.
O Novilho e a Gordura “E farás chegar o novilho diante da tenda da congr egação, e Aarão e seus filhos porão as suas mãos sobre a cabeça do novilho; e degolarás o novilho diante do Senhor à porta da tenda da congregação. Depois tomarás o sangue do novilho, e o porás com o teu dedo sobre as pontas do altar, e todo o sangue restante derramarás à base do altar. Também tomarás toda a gordura que cobre as entranhas, e o redenho do fígado, e ambos os rins, e a gordura que houver neles, e queimá-los -ás sobre o altar; mas a carne do novilho, e a sua pele, e o seu esterco queimarás com fogo fora do arraial: sacrifício por pecado é” (v.10-14). Neste primeiro sacrifício há uma profusão de ensino. O novilho, em toda a Escritura, está ligado à servidão. A gordura queimada no altar significa o ego, com todas as nossas vontades, sendo queimada para adentrarmos ao ministério unicamente com os propósitos do Se196
nhor. Uma análise rápida desta figura nos esclarecerá. “Na sua gordura se encerram, com a boca falam soberbamente” (Sl 17.10). “... os olhos deles estão inchados de gordura... a soberba os cerca” (Sl 73.6-8). Assim como a gordura provoca o inchaço do corpo, no campo espiritual vemos Paulo falando da igreja de Corinto: “Estais inchados... E eu, irmãos, apliquei estas coisas, por semelhança, a mim e a Apolos, não vos ensoberbecendo a favor de um contra o outro... Já estais fartos! Já estais ricos...” (1Co 5.2; 4.6-8). O ego elevado também foi o motivo da contenda do Senhor com Israel. “Porque o meterei na terra que jurei a seus pais, que mana leite e mel; e comerá e se fartará, e se engordará: então se tor nar á a outr os deuses e os servirá, e me irritarão, e anularão o meu concerto” (Dt 31.20). “E, engordando-se J esur um, deu coices; engor daste-te, engrossaste-te, e de gordura te cobriste: e deixou a Deus que o fez, e desprezou a Rocha da sua salvação” (Dt 32.15). Lembre-se também de que a condenação do diabo foi a “soberba”. “... para que, ensoberbecendo-se, não caia na condenação do diabo” (1 Tm 3.6). 197
Onde há o ego gorduroso, não há, nem pode haver a vontade do Senhor. Em conexão à queima de toda gordura, são queimados do lado de fora a carne, a pele e o esterco, coisas típicas do homem do mundo que se contrapõem à vontade de Deus, de forma simbólica. “Porque bem sabemos que a lei é espiritual; mas eu sou carnal, vendido sob o pecado... Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum” (Rm 7.14,18).
“Não reine, portanto, o pecado em vosso corpo mortal, para lhe obedecerdes em suas concupiscências; nem tão pouco apresenteis os vossos membros ao pecado por instrumentos de iniquidade; mas apresentai-vos a Deus, como vivos dentr e os mor tos, e os vossos membros a Deus, como instr umentos de justiça... Não sabeis vós que a quem vos apresentardes por servos para lhe obedecer, sois servos daquele a quem obedeceis, ou do pecado para a morte, ou da obediência para a justiça?” (Rm 6.12-13,16). “Porque, se viverdes segundo a carne, morrereis; mas, se pelo espírito mortificardes as obras do corpo, vivereis” (Rm 8.13). “Mas agora despojai-vos também de tudo: da ira, da cólera, da malícia, da maledicência, das palavras torpes da vossa boca. Não mintais uns aos outros, pois que já vos despistes do velho homem com seus feitos...” (Cl 3.8-9). “Que, quanto ao trato passado vos despojeis do velho homem, que se corrompe pelas concupiscências do engano...” (Ef 4.22). Ao contrário do que nos doutrina o mundo, devemos consumir nossa vontade egoísta em favor de todo o corpo. Vemos em Cristo o exemplo maior, que, “sendo em forma de Deus... aniquilou-se a si mesmo, tomando a forma de servo... de sorte que haja em vós o mes198
mo sentimento que houve também em Cristo Jesus” (Fp 2.5-7). Ao se queimar satisfatoriamente o ego, o Espírito poderá agir livremente, segundo a sua boa vontade. Foi exatamente com esta intenção que Jesus instruiu aos discípulos que o quisessem seguir. “Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo...” (Mt 16.24).
Retornemos ao ritual.
O 1º Carneiro “Depois tomarás um carneiro e Aarão e seus filhos porão as suas mãos sobre a cabeça do carneiro, e degolarás o carneiro, e tomarás o seu sangue, e o espalharás sobre o altar em redor; e partirás o carneiro em suas partes, e lavarás as suas entranhas e as suas pernas, e as porás sobre as suas partes e sobre a sua cabeça. Assim queimará todo o carneiro sobre o altar: é um holocausto para o Senhor, cheiro suave; uma oferta queimada ao Senhor” (Êx 29.15-18). Quando formos capazes de nos negarmos, então um novo propósito será a nossa meta. O lavar das entranhas e das pernas falam desta nova vida. “E tendo um grande sumo sacerdote sobre a casa de Deus, cheguemo-nos com verdadeiro coração, em inteira certeza de fé; tendo os corações purificados da má consciência, e o corpo lavado com água limpa, r etenhamos fir mes a confissão da nossa esper ança; por que fiel é o que prometeu. E consideremo-nos uns aos outros, para nos estimularmos à caridade e às boas obras” (Hb 10.21-24). “Estai pois firmes, tendo cingidos os vossos lombos com a ver199
dade, e vestida a couraça da justiça; e calçados os pés na preparação do evangelho da paz” (Ef 6.14-15). “... E vos vestistes do novo, que se renova para o conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou... Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos, e amados, de entranhas de misericórdia, de benignidade, humildade, mansidão, longanimidade” (Cl 3.10,12). “... e vos renoveis no espírito do vosso sentido: e vos revistais do novo homem, que segundo Deus é criado em verdadeira justiça e santidade” (Ef 4.23-24). O sacrifício deste primeiro carneiro limita-se ao indivíduo, à vontade do Senhor para cada cristão nascido de novo em sua função de sacerdote. O sacrifício anterior, do novilho, não era de cheiro suave ao Senhor, pois era oferta pelo pecado, era a queima de tudo que fosse desagradável a Deus, e naturalmente agradável a nós. Este sacrifício e o próximo são de cheiro suave, pois representam a nova vontade do Senhor em nossas vidas, que naturalmente nos é contrária. Seria a continuação daquela proposição de Jesus. “Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz...” (Mt 16.24). Esta cruz que nos é oferecida não é, como se supõe, que os nossos sofrimentos e aflições nos purificarão diante de Deus. Em absoluto. Está em intimidade com a própria cruz de Cristo. Negar-se a si mesmo em prol dos outros, tanto bons quanto maus, é o próprio peso da cruz, visto que é contrário à nossa natureza egoísta. Se podemos agora aniquilar nossos desejos pecaminosos é porque Cristo venceu na cruz e ressuscitou para uma nova vida. “E também todos os que piamente querem viver em Cristo Jesus padecerão perseguições” (2 Tm 3.12). 200
O 2º Carneiro “Depois tomarás o outro carneiro e Aarão e seus filhos porão as suas mãos sobre a cabeça do carneiro; e degolarás o carneiro, e tomarás do seu sangue, e o porás sobre a ponta da orelha direita de Aarão, e sobre a ponta das orelhas direitas de seus filhos, como também sobre o dedo polegar das suas mãos direitas, e sobre o dedo polegar de seus pés direitos: e o resto do sangue espalharás sobre o altar ao redor. Então tomarás do sangue, que estará sobre o altar, e do azeite da unção e o espargirás sobre Aarão e sobre os seus vestidos, e sobre os seus filhos, e sobre os vestidos de seus filhos com ele; para que ele seja santificado e os seus vestidos, também seus filhos, e os vestidos de seus filhos com ele” (Êx 29.19-21). O sangue nas suas partes direitas, representando o ouvir, o agir e o caminhar, talvez tenha conexão com Hebreus 1.13 a respeito de Cristo: “Assenta-te à minha destra...” É um lugar de honra, e, portanto, deve ser encarado com “temor e tremor”. Se fomos despidos do velho homem queimando a carne, a pele e o esterco no primeiro sacrifício do novilho, os instrumentos fracassados de nossa vontade corrupta, neste seremos revestidos com novos trajes santificados, mas não para nós mesmos. Estas vestimentas não falam da nossa pureza moral, como no sacrifício anterior, mas estão ligadas às vestes sacerdotais específicas para o ministério entre os homens, descritas no contexto anterior (Êx 28.4-43), ou seja, falam de uma posição sacerdotal a que fomos promovidos, em nossas obrigações para com o mundo – o ministério de reconciliação – e para com a Igreja de Deus – sua edificação. “E tudo isto provém de Deus que nos reconciliou consigo mesmo por Jesus Cristo, e nos deu o ministério da reconciliação... e pôs em nós 201
a palavra da reconciliação. De sorte que somos embaixadores da parte de Cristo, como se Deus por nós rogasse” (2 Co 5.18-20). “Segundo a graça de Deus que me foi dada, pus eu, como sábio arquiteto, o fundamento, e outro edifica sobre ele; mas veja cada um como edifica sobre ele” (1 Co 3.10). “Pelo que exortai-vos uns aos outros, e edificai-vos uns aos outros, como também o fazeis” (1 Ts 5.11). O sangue espargido sobre as novas vestes mostra que esta santificação provém exclusivamente do sangue de Cristo em nosso lugar, e o azeite da unção é o Espírito que “vivificará os vossos corpos mortais” (Rm 8.11). Tanto a vestimenta como a santificação da vestimenta, tudo vem do Senhor. A única parte que nos caberia seria nossa consagração, nosso ego levado à cruz para morrer, ressurgindo o homem novo que é de Deus segundo seu Espírito. Somente o homem renovado em Cristo pelo Espírito Santo e devidamente empossado pelo Senhor em seu ministério, pode ouvir, caminhar dignamente diante dele e ainda atender-lhe em seus santos desígnios. E santificado assim, o mundo já não lhe pertence, e este mesmo mundo que vive das suas corrupções não pode entender suas atitudes e motivações que afloram do novo caráter de Cristo nele. Mas este terceiro sacrifício não para por aqui.
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O movimento da oferta “Depois tomarás do carneiro a gordura, e a cauda, e a gordura que cobre as entranhas, e o redenho do fígado, e ambos os rins com a gordura que houver neles, e o ombro direito, porque é o carneiro das consagrações; e uma fogaça de pão, e um bolo de pão azeitado, e um coscorão do cesto dos pães asmos que estiverem diante do Senhor, e tudo porás nas mãos de Aarão, e nas mãos de seus filhos; e com movimento o moverás perante o Senhor. Depois o tomarás das suas mãos, e o queimarás no altar sobre o holocausto por cheiro suave perante o Senhor; oferta queimada é ao Senhor” (Êx 29.22-25). A continuação deste terceiro sacrifício torna mais vivo o que propusemos antes, ou seja, que ele atende às necessidades do corpo de Cristo, e não a nós mesmos, visto que está em conexão com os pães asmos, ilustrado em 1 Coríntios 5.7-8. “Alimpai-vos pois do fermento velho, para que sejais uma nova massa, assim como estais sem fer mento. Por que Cr isto, nossa Páscoa, foi sacrificado por nós. Pelo que façamos festa, não com o fermento velho, nem com o fermento da maldade e da malícia, mas com os asmos da sinceridade e da verdade”. Cada crente verdadeiramente assim santificado passa a fazer parte desta nova massa, pois que estão “edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, de que Jesus Cristo é a pedra da esquina: no qual todo edifício, bem ajustado, cresce para templo santo no Senhor” (Ef 2.20-21). “Porque, assim como o corpo é um, e tem muitos membros, e todos os membros, sendo muitos, são um só corpo, assim é Cristo também. Pois todos nós fomos batizados em um Espírito formando um corpo, quer judeus, quer gregos [os dois rins com sua gordura], quer 203
servos, quer livres, e todos temos bebido de um Espírito” (1 Co 12.1213). Se cada indivíduo queimar sua própria gordura, então toda a massa terá queimado toda a gordura, representado pela queima desta nova gordura. Assim, completa-se a instrução do Mestre com o movimento da oferta. “Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me” (Mt 16.24). Todos estes sacrifícios, bem como todos os outros sacrifícios que nem chegamos a comentar, foram substituídos pelo único sacrifício eficaz, perene e celestial. “Na qual vontade temos sido santificados pela oblação do corpo de Jesus Cristo, feita uma vez... havendo oferecido um único sacrifício pelos pecados... porque com uma só oblação aperfeiçoou para sempre os que são santificados” (Hb 10.10-14). “Mas vindo Cristo, o sumo sacerdote dos bens futuros, por um maior e mais perfeito tabernáculo, não feito por mãos, isto é, não desta criação, nem por sangue de bodes e de bezerros, mas por seu próprio sangue, entrou uma vez no santuário, havendo efetuado uma eterna redenção. Por que, se o sangue dos tour os e bodes, e a cinza duma novilha esparzida sobre os imundos, os santifica quanto à purificação da carne, quanto mais o sangue de Cristo, que pelo Espírito eterno se ofereceu a si mesmo imaculado a Deus, purificará as vossas consciências das obras mortas, para servirdes ao Deus vivo?” (Hb 9.11-14). A suma de tudo que temos dito é: “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou, e se 204
entregou a si mesmo por mim” (Gl 2.20). E se somente a entrada ao Ministério é tão rica e pura, “que pessoa vos convém ser em santo trato, e piedade?” (2 Pe 3.11). Perceba, ó leitor, a profundeza de detalhes somente nesta questão da consagração de Aarão e seus filhos para o sacerdócio. E o que se dizer do ministério mesmo? E de todos os sacrifícios complicados e repletos de detalhes em Levítico? E tudo não passava de sombra. Somente apontavam para o verdadeiro sumo sacerdote, Cristo, e seus coerdeiros, o corpo de Cristo. Nisto podemos compreender melhor o motivo do enorme castigo de Satanás ao desprezar, no céu, o mais excelente dos Ministérios. E pela graça e infinita misericórdia de Deus, Ele nos convida a participar deste corpo santo, tendo o privilégio incomparável de ministrarmos associados aos anjos nos novos céus e nova terra. “Segui a paz com todos, e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hb 12.14). E a chave para a entrada a este reino de luz é Jesus Cristo, feito “sacerdote eternamente” (Hb 5.6), o qual, “sendo ele consumado, veio a ser a causa de eterna salvação para todos os que lhe obedecem” (Hb 5.9). “Ora a suma do que temos dito é que temos um sumo sacerdote tal, que está assentado nos céus à destra do trono da majestade, ministro do santuário, e do verdadeiro tabernáculo, o qual o Senhor fundou, e não o homem” (Hb 8.1-2). “E ninguém toma para si esta honra, se não o que é chamado por Deus, como Aarão. Assim também Cristo se não glorificou a si mesmo, para se fazer sumo sacerdote, mas aquele que lhe disse: Tu és meu 205
filho, hoje te gerei. Como também diz noutro lugar: Tu és sacerdote eternamente, segundo a ordem de Melquisedeque... Que não foi feito segundo a lei do mandamento carnal, mas segundo a virtude da vida incorruptível” (Hb 5.4-7; 7.16). “Mas este, porque permanece eternamente, tem um sacerdócio perpétuo. Portanto, pode também salvar perfeitamente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles” (Hb 7.2425). “Para demonstração da sua justiça neste tempo presente, para que ele seja justo e justificador daquele que tem fé em Jesus” (Rm 3.26). Não poderemos comentar tudo o que concerne ao ofício sacerdotal e substitutivo de Cristo, visto que seria necessário um tratado Teológico. Vamos apenas comentar os pontos principais, visto que é por ele que temos acesso ao Pai.
Os predicados e exigências do Ofício Sacerdotal de Cristo Primordialmente devemos lembrar que Jesus “veio para o que era seu” (Jo 1.11), ou seja, veio para cumprir as promessas de restauração da nação de Israel, através do perdão dos pecados (Jr 31.31-34), para em seguida implantar o Reino dos céus, com sede em Jerusalém e Davi como seu corregente. Leia Ezequiel 34.23-30. Israel deveria tê-lo compreendido. A implantação do Reino era necessária sim, porém, antes, era mais necessária a resolução do problema do pecado da nação. Eles se portaram exatamente como no de206
serto. Preocupavam-se exclusivamente com seus problemas carnais, depois com os espirituais, se é que pensavam nos espirituais. A nação estava invadida e sendo comandada pelo vasto e cruel Império Romano. Seria até natural que almejassem em primeiro lugar a restauração do Reino Davídico. No seu desleixo espiritual, esqueceram que “nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus” (Mt 4.4).
João Batista veio anunciando um Cordeiro, não só um Rei. Querer inverter a ordem Divina é sempre típico do homem, seja quem for. Mas vamos avaliar melhor a situação de João Batista. De quem era filho? “Existiu no tempo de Herodes, rei da Judeia, um sacerdote chamado Zacarias, da ordem de Abias, e cuja mulher era das filhas de Aarão; e o seu nome era Isabel. E eram ambos justos perante Deus, andando sem repreensão em todos os mandamentos e preceitos do Senhor. E não tinham filhos, porque Isabel era estéril, e ambos eram avançados em idade. E aconteceu que, exercendo ele o sacerdócio diante de Deus, na ordem de sua turma, segundo o costume sacerdotal, coube-lhe em sorte entrar no templo do Senhor para oferecer o incenso” (Lc 1.5-9). Em seguida, o anjo Gabriel aparece no templo e lhe profetiza o nascimento de um filho “no espírito e virtude de Elias, para converter os corações dos pais aos filhos, e os rebeldes à prudência dos justos; com o fim de preparar ao Senhor um povo bem disposto” (Lc 1.17). Ora, se Zacarias era sacerdote, João Batista também o era por sua linhagem sacerdotal. O sacerdote, como vimos, tem por função “oferecer dons e sacrifícios” (Hb 8.3), como Zacarias certamente o fazia; mas vemos João Batista “pregando o batismo de arrependimento, para o perdão dos pecados” (Lc 3.3), “vestido de pêlos de camelo, e 207
um cinto de couro em torno dos seus lombos” (Mt 3.4). Sua vestimenta era em tudo diferente da dos sacerdotes. Sua própria vida era diferente, pois, como filho de sacerdote, certamente aprendeu o ofício sacerdotal; mas perambulava pelos desertos clamando: “Arrependei-vos, porque é chegado o reino dos céus. Porque este é o anunciado pelo profeta Isaías, que disse: Voz do que clama no deserto: preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas” (Mt 3.23). Mas apesar do seu sacerdócio não ter sido vinculado às ofertas no templo do Senhor, todavia, como sacerdote que era, apresentou o verdadeiro “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (Jo 1.2). E assim como João vinculava “os frutos dignos de arrependimento” (Mt 3.8) à vinda do Reino dos céus, Jesus começou fazendo o mesmo. “Desde então começou Jesus a pregar, e a dizer: Arrependei-vos, porque é chegado a vós o reino dos céus” (Mt 4.17). A sua proposta é simples: sem arrependimento, sem Reino. E onde encontramos este arrependimento de Israel? “... endureceram as suas faces mais do que uma rocha; não quiseram voltar. Eu, porém, disse: Deveras estes são uns pobres: são loucos, pois não sabem o caminho do Senhor, o juízo de seu Deus... porque as suas transgressões se multiplicaram, multiplicaram-se as suas apostasias. Como, vendo isto, te perdoaria? Teus filhos me deixam a mim e juram pelos que não são deuses: depois de eu os ter fartado, adulteram, e em casa de meretrizes se ajuntaram em bandos. Como cavalos bem fartos, levantam-se pela manhã, rinchando cada um à mulher do seu próximo. Deixaria eu de castigar estas cousas, diz o Senhor, ou não se vingaria a minha alma de uma nação como esta?... Ne208
gam ao Senhor, e dizem: Não é ele” (J r 5.3-4,6-9,12). Israel, como nação, jamais se arrependeu de toda sua rebeldia e incredulidade. Não creram nos profetas a eles enviados, muito menos em seu Messias. Sobre esta recusa, Malaquias já colocava de forma condenadora. “O filho louvará o pai, e o servo ao seu Senhor; e, se eu sou Pai, onde está a minha honra? E, se eu sou Senhor, onde está o meu temor? diz o Senhor dos Exércitos a vós, ó sacerdotes, que desprezais o meu nome e dissestes: Em que despr ezamos nós o teu nome? Ofer eceis sobre o meu altar pão imundo, e dizeis: Em que te havemos profanado? Nisto que dizeis: A mesa do Senhor é desprezível. Porque, quando trazeis animal cego para o sacrificardes, não faz mal! Ora, apresenta-o ao teu príncipe: terá ele agrado em ti? Ou aceitará ele a tua pessoa? diz o Senhor dos Exércitos. Agora, pois, suplicai o favor de Deus, e ele terá piedade de nós: isto veio da vossa mão; aceitará ele a vossa pessoa? diz o Senhor dos Exércitos. Quem há também entre vós que feche as portas e não acenda debalde o fogo do meu altar? Eu não tenho prazer em vós, diz o Senhor dos Exér citos, nem aceitarei da vossa mão a oblação. Mas desde o nascente do sol até ao poente será grande entre as nações o meu nome” (Ml 1.6-11). O Espírito de Deus adverte aqui que Ele não aceitaria a oblação do corpo de Cristo pelas mãos de Israel, porque nunca houve arrependimento de sua parte, e assim, com esta recusa, a sua condenação seria justa e cabal. Mas das nações debaixo do sol ele aceitaria, tanto que Cristo foi oferecido pelas mãos de César. Em sua santa soberania, coube a Deus endurecer o coração de Israel para dar oportunidade de arrependimento aos gentios, e formar um novo corpo: o corpo de Cristo, a Igreja. Este período já dura apro209
ximadamente dois mil anos, e com seu término, Deus voltará a tratar com a rebelde Israel. Cumprir-se-á o que fora dito pelo sumo profeta: “Porque eu vos digo que desde agora não me vereis mais, até que digais: Bendito o que vem em nome do Senhor” (Mt 23.39).
As Luzes e Perfeições do Cordeiro Mas voltando a olhar para a cruz, ali Jesus cumpre todos os desígnios de Deus para o homem e para Deus mesmo. Na cruz, Ele é “justo e justificador”; é “Maravilhoso, Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz”; é a “virtude do Altíssimo”; é “o caminho, e a verdade e a vida”; é “a pedra principal de esquina”; é “a luz que alumia todo o homem que vem ao mundo”; é “a misericórdia e a graça”; é “a água”; é “o pão da vida”; é “a porta” e o “pastor das ovelhas”, o “bom” e “Sumo Pastor”; é a “ressurreição e a vida”; é a “videira verdadeira”; é o “Filho do homem, que está no céu”; é o “Servo”; é o “Santo”; é o “Justo”; é o “Príncipe”; é o “Salvador”; é a “semelhança da carne do pecado”; é o “Nome que está acima de todo o nome”; é a “paz de Deus que excede todo o entendimento”; é o “propósito e a Vontade de Deus”; é o “Filho amado em quem se compraz a minha alma”; é a “Sabedoria: justiça, e santificação e redenção”; é o “segundo homem, e o Senhor do céu”; é o “Sim e o Amém para todas quantas promessas há de Deus”; é a “Glória de Deus”; é a “imagem de Deus”; é a “iluminação do conhecimento da Glória de Deus”; é o “ministério da reconciliação”; é o “resgate da maldição da lei”; é a “circuncisão do coração”; é o “amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança”; é a “redenção pelo seu sangue, a remissão das ofensas segundo as riquezas de sua graça”; é o “cabeça da igreja”; é a “dispensação da graça de Deus” e a “dispensação do mistério que desde os séculos esteve oculto em Deus”; é a “couraça da justiça, o escudo da fé, o capacete da salva210
ção, e a espada do Espírito, que é a Palavra de Deus”; é o “Verbo de Deus”; é o “Senhor”; é a “Palavra de vida”; é a “vida eterna”; é o “poder de Deus, para nós, que somos filhos, e loucura para os que perecem”; é onde “estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento”; é a “palavra agradável temperada com sal”; é o “trabalho do amor e a paciência da esperança”; é o único “Mediador entre Deus e os homens”; é a “abolição da morte”; é o “despojamento dos principados e potestades”; é o “resplendor da glória e a expressa imagem da pessoa do Pai”; é o “mistério da piedade”; é a “palavra fiel e digna de toda aceitação”; é o “grande sumo sacerdote perfeito para sempre”; é o “Ministro do santuário e do verdadeiro tabernáculo”; é o “Novo e melhor Concerto”; é o “autor e consumador da fé”; é o “sangue da aspersão que fala melhor do que o de Abel”; é o “mesmo ontem, e hoje, e eternamente”; é o “sangue do concerto eterno”; é o “cordeiro imaculado e incontaminado conhecido ainda antes da fundação do mundo”; é a “pedra eleita e preciosa de Deus”; é a “propiciação pelos nossos pecados”; é a “fiel testemunha, o primogênito dos mortos”; é o “Rei dos reis e Senhor dos senhores”; é o “Leão da tribo de Judá, a raiz de Davi, que venceu, para abrir o livro e desatar os seus sete selos”; é o “verdadeiro e Santo Dominador”; é o “que era, e que é, e que há de vir”; é a porta do tabernáculo, e o átrio, e o altar do holocausto, e a bacia de cobre, e o candelabro, e a mesa dos pães da proposição, e o incensário, e a fumaça do incenso, e o véu, e a arca, e o testemunho, e o propiciatório; é o “Alfa e o Ômega, o princípio e o fim, o primeiro e o derradeiro”; é “Deus bendito eternamente”. Amém! Chegamos à página mais importante deste livro. Jesus cumpriu tudo. Nenhum outro ser, celeste ou terreno, em qualquer época remota ou futura, possui as mesmas virtudes, conquistas e direitos, seja por direito adquirido ou em sua essência.
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Solução para a 4ª Grande Desgraça “Está consumado”, como Ele mesmo proferiu na cruz. Com sua morte em nosso lugar, resolveu o maior dos problemas do homem e do Universo: o pecado; porque “Ele se fez pecado por nós”. Por Ele, temos livre acesso ao Pai, e o tabernáculo terrestre torna-se apenas uma lembrança. Pelo corpo de Jesus, poderemos, todos nós os que crermos e aceitarmos sua salvação e senhorio, caminhar pelo “meio da sua praça”; banharmo-nos no “rio puro da água da vida, clara como cristal”; achegarmo-nos com confiança e ousadia ao “trono de Deus e do Cordeiro”; maravilharmo-nos com os “doze fundamentos do muro” da “santa Jerusalém”. “E Deus limpará de seus olhos toda a lágrima; e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor” (Ap 21.4). Que gloriosa esperança! É infinitamente superior ao que nos sugere o mundo. “Cheguemos pois com confiança ao trono da graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos socorridos em tempo oportuno... Pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou, pelo véu, isto é, pela sua carne... Porque não temos um sumo sacerdote que não possa se compadecer das nossas fraquezas; porém um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado” (Hb 4.16; 10.20; 4.15). Na cruz, Ele resolveu a quarta desgraça causada por Lúcifer: o pecado da raça humana.
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Solução para a 3ª Grande Desgraça E quanto à terceira desgraça: o lugar vago no céu? Deus somente espera a morte do seu último santo, para que possa entrar em glória aos céus, na “casa do Pai”, e completar o número exato dos anjos expulsos, como já comentamos.
“Preciosa é à vista do Senhor a morte dos seus santos” (Sl 116.15). “Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas: se não fosse assim, eu vo-lo teria dito; vou preparar-vos lugar. E, se eu for, e vos preparar lugar, virei outra vez e vos levarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também” (Jo 14.1-3).
“Mas a nossa cidade está nos céus, donde também esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo” (Fp 3.20). “Porque convinha que aquele, para quem são todas as coisas, e mediante quem tudo existe, trazendo muitos filhos à glória, consagrasse pelas aflições o príncipe da salvação deles. Porque, assim o que santifica, como os que são santificados, são todos de um, por cuja causa não se envergonha de lhes chamar irmãos” (Hb 2.10-11). “E, se nós somos filhos, somos logo herdeiros também, herdeiros de Deus e coerdeiros de Cristo: se é certo que com ele padecemos, para que também com ele sejamos glorificados... para uma herança incorruptível, incontaminável, e que se não pode mur char , guardada nos céus para vós” (1 Pe 1.4; Rm 8.17). “Porque não chegastes ao monte palpável, aceso em fogo, e à escuridão, e às trevas, e à tempestade, e ao sonido da trombeta, e à voz das palavras, a qual os que a ouviram pediram que se lhes não falasse mais; porque não podiam suportar o que se lhes mandava: se até um 213
animal tocar o monte, será apedrejado. E tão terrível era a visão que Moisés disse: Estou todo assombrado, e tremendo. Mas chegastes ao monte de Sião, e à cidade do Deus Vivo, à Jerusalém celestial, e aos muitos milhares de anjos; à univer sal assembleia e igr eja dos primogênitos, que estão inscritos nos céus, e a Deus, o juiz de todos, e aos espíritos dos justos aperfeiçoados; e a Jesus, o Mediador duma Nova Aliança, e ao sangue da aspersão, que fala melhor do que o de Abel... pelo que, tendo recebido um reino que não pode ser abalado, retenhamos a graça, pela qual sirvamos a Deus agradavelmente com reverência; porque o nosso Deus é um fogo consumidor” (Hb 12.1824,28-29). “E, chegando-vos para ele – pedra viva, reprovada, na verdade, pelos homens, mas para com Deus eleita e preciosa. Vós também, como pedras vivas, sois edificados casa espiritual e sacerdócio santo, para oferecer sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por Jesus Cristo... Mas vós sois a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido, par a que anuncieis as vir tudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1 Pe 2.4-5,9). “Porque nós somos cooperadores de Deus: vós sois lavoura de Deus e edifício de Deus... no qual todo edifício, bem ajustado, cresce para templo santo no Senhor” (1 Co 3.9; Ef 2.21). “Porque sabemos que, se nossa casa terrestre deste tabernáculo se desfizer, temos de Deus um edifício, uma casa não feita por mãos, eterna, nos céus. E por isso também gememos, desejando ser r evestidos da nossa habitação, que é do céu...” (2 Co 5.1-2). E você, caro leitor, tem este mesmo desejo de abandonar este mundo tenebroso e ser revestido de uma nova habitação? Mas para isso, você deve satisfazer ao versículo 3 da passagem acima: “Se, todavia, estando vestidos, não formos achados nus.” Tenho certeza que você já sabe quem lhe pode dar novas vestimentas. Invoque-o hoje, e tenha certeza que você terá o privilégio imenso de fazer parte deste edifício que está sendo edificado para completar e substituir a ala celestial desmoronada. 214
Solução para a 2ª Grande Desgraça E quanto ao santuário profanado por Lúcifer, sua segunda desgraça, por nós citado? Tomemos como exemplo o caso do rei Ezequias. Sintamos, junto a ele em seu reinado, a miséria deplorável em que se encontrava o tabernáculo santo em Jerusalém. “Ouvi-me, ó levitas, santificai-vos agora, e santificai a casa do Senhor, Deus de vossos pais, e tirai do santuário a imundícia. Porque nossos pais transgrediram, e fizeram o que era mal aos olhos do Senhor nosso Deus, e o deixaram; e desviaram os seus rostos do tabernáculo do Senhor, e lhe voltaram as costas. Também fecharam as portas do alpendre, e apagaram as lâmpadas, e não queimaram incenso nem ofereceram holocaustos no santuário ao Deus de Israel” (2 Cr 29.5-7). Agora aprecie o que foi necessário para a sua devida santificação. “Agora, filhos meus, não sejais negligentes; pois o Senhor vos tem escolhido para estardes diante dele para o servirdes, e para serdes seus ministros e queimardes incenso... E os sacerdotes entraram dentro da casa do Senhor, para a purificar, e tiraram para fora, ao pátio da casa do Senhor, toda a imundícia que acharam no templo do Senhor... Então o r ei Ezequias se levantou de madr ugada, e ajuntou os maiorais da cidade, e subiu à casa do Senhor. E trouxeram sete novilhos e sete carneiros, e sete cordeiros, e sete bodes, para sacrifício expiatório, pelo reino e pelo santuário, e por J udá, e disse aos filhos de Aarão, os sacerdotes, que os oferecessem sobre o altar do Senhor. E eles mataram os bois, e os sacerdotes tomaram o sangue e os aspergiram sobre o altar; também matar am os car neir os, e aspergiram o sangue sobre o altar: semelhantemente mataram os cordeiros, e aspergiram o sangue sobre o altar. Então trouxeram os bodes 215
para sacrifício pelo pecado, perante o rei e a congregação, e lhes impuseram as mãos. E os sacerdotes os mataram, e com o seu sangue fizeram expiação do pecado sobre o altar, para reconciliar a todo Israel” (2 Cr 29.11,16,20-24). Pelo pecado de Lúcifer nos céus, podemos concluir por analogia que as lâmpadas foram apagadas, nem mais se ofereceram incenso e holocaustos ao Senhor Deus do Universo. As imundícias perpetradas pelo anjo, bem como ele mesmo, foram retirados do santo templo. E como se santificaram novos sacerdotes para ministrar no terreno, no celestial também houve necessidade de se formar um novo corpo sacerdotal. E se sacrifícios de sangue animal foram necessários para santificar o tabernáculo e seus utensílios, nada mais que o sangue do Cordeiro Eterno seria suficiente para purificar e santificar o celestial. Por isto mesmo já lemos: “E quase todas as coisas, segundo a lei, se purificam com sangue; e sem derramamento de sangue não há remissão. De sorte que era bem necessário que as figuras das coisas que estão no céu assim se purificassem; mas as próprias coisas celestiais com sacrifícios melhores do que estes. Porque Cristo não entrou num santuário feito por mãos, figura do verdadeiro, porém no mesmo céu” (Hb 9.22-24). Jesus, “Sumo Sacerdote eternamente”, com seu sangue precioso, purificou todo o tabernáculo celeste quando de sua entrada aos céus depois de sua ressurreição. O Senhor Jesus, ao ressuscitar, declarou a Maria Madalena que ainda não havia subido ao Pai, como está escrito em João 20.17. Isto porque, “antes tinha descido às partes mais baixas da terra” (Ef 4.8) durante os três dias de sua morte, para, em seguida à sua ressurreição, subir “acima de todos os céus, para cumprir todas as coisas” (Ef 4.10). Assim, com seu sacrifício eterno, pôde santificar tanto o santuário celeste quanto os ministrantes e sacerdotes humanos substitutos escolhidos desde a eternidade passada.
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Solução para a 1ª Grande Desgraça
E quanto à primeira desgraça, a devastação do Universo e da Terra? Embora a Terra tenha sido reconstruída naqueles 6 dias de Gênesis para a entrada do homem, Satanás, em sua oferta tentadora, conseguiu novamente profanar a habitação do novo ser. Daí haver a necessidade dos novos céus e nova terra. “O Senhor não retarda a sua promessa, ainda que alguns a têm por tardia; mas é longânimo para convosco, não querendo que alguns se percam, senão que todos venham a se arrepender. Mas o dia do Senhor virá como o ladrão de noite, no qual os céus passarão com grande estrondo, e os elementos, ardendo, se desfarão, e a terra e as obras que nela há, se queimarão. Havendo pois de perecer todas estas coisas, que pessoas vos convém ser em santo trato, e piedade, aguardando, e apressando-vos para a vinda do dia de Deus, em que os céus, em fogo se desfarão, e os elementos, ardendo se fundirão? Mas nós, segundo a sua promessa, aguardamos novos céus e nova terra, em que habita a justiça” (2 Pe 3.9-13). “Porque eis que eu crio céus novos e nova terra: e não haverá lembrança das cousas passadas, nem mais se recordarão” (Is 65.17). “E vi um novo céu, e uma nova terra. Porque já o primeiro céu e a primeira terra passaram” (Ap 21.1).
Percebe-se aqui a necessidade de se refazer a Terra por causa do pecado do homem. Pois a Escritura afirma categoricamente, falando de Adão, que “maldita é a terra por causa de ti” (Gn 3.17). Em nenhum lugar ele é responsabilizado pela maldição do restante. Mais uma evidência da contaminação de todo o Universo pelos atos tresloucados de Lúcifer, gerando a necessidade de se purificá-lo integralmente. Graças a Deus e a seu Filho Eterno que se farão “novas todas as coisas”. E somente os novos de coração e alma poderão desfrutar da novidade do Senhor. 217
“Bem-aventurados aqueles que lavam as suas vestiduras no sangue do Cordeiro, para que tenham direito à árvore da vida, e possam entrar na cidade pelas portas. Ficarão de fora os cães e os feiticeiros, e os que se prostituem, e os homicidas, e os idólatras, e qualquer que ama e comete a mentira” (Ap 22.14-15). O Senhor Jesus, pois, torna a lhe dizer: “Em verdade vos digo que eu sou a porta das ovelhas... Eu sou a porta; se alguém entrar por mim, salvar-se-á, e entrará, e sairá, e achará pastagens” (Jo 10.7,9). Não ouse ficar de fora, caro leitor e leitora, porque os de fora sofrerão “eterna perdição”. E quanto ao destino do anjo rebelde, e todos os seus seguidores, angélicos e humanos? “Então dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartaivos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos” (Mt 25.41). “E o diabo, que os enganava, foi lançado no lago de fogo e enxofre, onde está a besta e o falso profeta; e de dia e de noite serão atormentados para todo o sempre” (Ap 20.10). E quem os julgará? “Pois, assim como o Pai ressuscita os mortos, e os vivifica, assim também o Filho vivifica aqueles que quer. E também o Pai a ninguém julga, mas deu ao Filho todo o juízo; para que todos honrem o Filho, como honram ao Pai. Quem não honra o Filho, não honra o Pai que o enviou. Porque, como o Pai tem a vida em si mesmo, assim também deu ao Filho ter a vida em si mesmo. E deu-lhe o poder de exercer o juízo, porque é o Filho do homem” (Jo 5.21-23,26-27). E se nós, os que temos nascido de novo pela fé em Jesus, somos coerdeiros com Cristo, então a nós será dado também o poder para 218
exercer o julgamento, a saber: “Não sabeis vós que os santos hão de julgar o mundo?... Não sabeis vós que havemos de julgar os anjos? Quanto mais as coisas pertencentes a esta vida?” (1 Co 6.2-3). Julgaremos o mundo e os anjos, não porque mereçamos, mas porque nossos pecados já foram julgados na cruz do sofrimento do Filho de Deus por nós.
“Portanto, agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus, que não andam segundo a carne, mas segundo o espírito” (Rm 8.1). Bendita cruz! Nela reside a crucial diferença entre poder julgar e ser julgado. Não queira ser julgado por nós e nosso Mestre Jesus, pois deles se diz: “E vi um grande trono branco, e o que estava assentado sobre ele, de cuja presença fugiu a terra e o céu; e não se achou lugar para eles. E vi os mortos, grandes e pequenos, que estavam diante do trono, e abriram-se os livros; e abriu-se outro livro, que é o da vida: e os mortos foram julgados pelas coisas que estavam escritas nos livros, segundo as suas obras. E deu o mar os mortos que nele havia; e a morte e o inferno [Hades no original grego] deram os mortos que neles havia; e foram julgados cada um segundo as suas obras. E a morte e o inferno [Hades] foram lançados no lago de fogo: esta é a segunda morte. E aquele que não foi achado escrito no livro da vida foi lançado no lago de fogo” (Ap 20.11-15). Mas dos santos se diz: “... tudo é vosso; seja Paulo, seja Apolos, seja Cefas, seja o mundo, seja a vida, seja a morte, seja o presente, seja o futuro, tudo é vosso, e vós de Cristo, e Cristo de Deus” (1 Co 3.21-23). E quanto à morte? 219
“Ora o último inimigo que há de ser aniquilado é a morte” (1 Co 15.26). Sendo a própria morte lançada no lago de fogo, todas as coisas estarão sujeitas a Cristo; “então também o mesmo Filho se sujeitará àquele que todas as coisas lhe sujeitou, para que Deus seja tudo em todos” (1 Co 15.28). Recriados os novos céus e terra, e os homens santificados no lugar dos anjos sacerdotes expulsos, ter-se-á as condições iniciais projetadas por Deus. O Rei assentado em seu trono, e seus súditos vários, anjos e homens, completando o Reino para propagação de Suas “luzes e perfeições”. Não vagaremos como vagabundos pelos cantos do Universo, mas cumpriremos o propósito inicial de Deus, com Jesus eternamente Rei e Sumo sacerdote. A profecia, o governo e o sacerdócio se abraçarão santificados para sempre para cumprir os propósitos eternos do Senhor, sejam quais forem. E “das coisas passadas não haverá lembrança, nem mais se lembrarão”. “Mas folgaremos e exultaremos perpetuamente” naquilo que Deus criará (Is 65.17-18). Somente a atuação eterna de Deus pelas criações sucessivas, durante a eternidade, fará jus à complexidade de seu Ser. Mas enquanto este dia não vem, devemos andar “de acordo com o que já alcançamos”. Oro a Deus neste momento para que você, caro leitor e leitora, possa entender e aceitar tudo que aqui foi escrito. Concordo que seja complexo e de “difícil interpretação”, mas não poderia escondê-lo numa gaveta. Trouxe a pedra bruta. Espero em Deus que haja lapidadores capazes de facetá-la, para que a sua beleza interna aflore aos nossos olhos ainda mais. Ainda que este estudo não fosse editado, ou que poucos irmãos 220
tivessem acesso a ele, certa glória ninguém me poderá arrancar, poder dizer na segurança de Paulo “como me foi este mistério manifestado pela revelação como acima em pouco vos escrevi; pelo que, quando ledes, podeis perceber a minha compreensão do mistério de Cristo... porque não o recebi, nem aprendi de homem algum, mas pela revelação de Jesus Cristo” (Ef 3.3-4; Gl 1.12). “Ora o Deus de paz, que pelo sangue do concerto eterno tornou a trazer dos mortos a nosso Senhor Jesus Cristo, grande pastor das ovelhas, vos aperfeiçoe em toda a boa obra, para fazerdes a sua vontade, operando em vós o que perante ele é agradável por Cristo Jesus, ao qual seja glória para todo o sempre. Amém. Rogo-vos, porém, irmãos, que suporteis a palavra desta exortação; porque abreviadamente vos escrevi” (Hb 13.20-22).
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"Como alguém muito bem disse, ‘a história sempre se repete’, a que eu sempre replico, ‘e o homem nunca aprende’.”
Bibliografia
Prólogo ¹ “Santo Agostinho, Vida e Obra: Os Pensadores, Livro 1, pg. 37 Editora Nova Cultural
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Capítulo 1 ¹ “Merece confiança o Antigo Testamento?”, Gleason L. Archer Jr., 4ª Ed., pg. 107 – Edições Vida Nova
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² “A Bíblia Sagrada com as referências e anotações do Dr. Scofield”, 2ª Ed., pg. 717 – Imprensa Batista Regular
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³ “A Bíblia Sagrada com as referências e anotações do Dr. Scofield”, 2ª Ed., pg. 716 – Imprensa Batista Regular
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Capítulo 2 ¹ “Teologia Sistemática”, L. S. Chafer, 1ª Ed., Vol. 1, pg. 359: citação do Dr. Gerhart – Imprensa Batista Regular 42 ² “Teologia Sistemática”, L. S. Chafer, 1ª Ed., Vol. 1, pg. 237 – Imprensa Batista Regular 44
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