ECLESIASTES em foco!

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2022


Foco em ECLESIASTES! ECLESIASTES em foco!

A busca de Salomão A grande des(ilusão) No íntimo de Salomão Laços O homem acima do sol cristoescrito@hotmail.com


Foco em Eclesiastes!

Tudo é vaidade – pelo prisma do grande rei Salomão. Em seu auge de governo, fama e sabedoria, segundo indícios de seus feitos pela narrativa do livro, o dono de toda sabedoria humana chegou a esta conclusão inusitada. Tinha tudo que um homem poderia desejar, e poucos realmente alcançaram este patamar – mas sempre faltava algo. Vou repetir sempre – a mesma Lei que os configurava como um povo único na terra, também os condenava pelo padrão infinito de perfeição divina. Foi o que Paulo arrematou. “E eu, nalgum tempo, vivia sem lei, mas, vindo o mandamento, reviveu o pecado, e eu morri. E o mandamento que era para vida, achei eu que me era para morte. Porque o pecado, tomando ocasião pelo mandamento, me enganou, e por ele me matou” (Rm 7.9-11). Começando pela sabedoria, já que ele ‘aplicou o seu coração a esquadrinhar, e a informar-se com sabedoria de tudo quanto sucede debaixo do céu’ (1.13), Salomão passou a provar seu coração com a alegria cotidiana dos mortais, se embriagou, edificou casas (inclusive a do Senhor!), teve


uma multidão de servos, amontou prata e ouro, proveu-se de músicos particulares, e, para arrematar, nas suas palavras – “Tudo quanto desejaram os meus olhos não lhes neguei, nem privei o meu coração de alegria alguma” (2.1-10). Somos como um buraco negro que tudo traga à sua frente – mas continua sendo um buraco e negro. Em meio às suas dores e incompreensão das relações do céu com a terra, ainda orienta seus leitores – ou talvez somente se justifique perante si mesmo – a uma vida íntegra com regras de ordem moral e religiosa, bem como um pequeno arsenal que sobejava em sua aljava é lançada em forma de provérbios. Ao término de seus pensamentos, um misto de desconsolação e esperança se mesclam, talvez numa última tentativa de dizer para si mesmo e a todos que queiram ouvir, que por mais que busquemos a essência de nossa existência, sempre faltará algo, exatamente pela sua prisão em vasos tão simplórios de barro. Deus nos ilumine a extrair de seus pensamentos a chave que abra as portas do mais íntimo da Sua casa celestial – único lugar onde podemos – sem nos ferir – vislumbrar a perfeição em seu grau máximo, e descansar seguros já a partir desta vida debaixo do sol.


A busca de Salomão

Quando buscamos a Deus é porque algo nos incomoda, fere, corrói, indigna...

“O Senhor olhou desde os céus para os filhos dos homens, para ver se havia algum que tivesse entendimento e buscasse a Deus. Desviaram-se todos e juntamente se fizeram imundos: não há quem faça o bem, não há sequer um” (Sl 14.2-30. Buscamos a Deus não pela glória divina que Lhe é devida, mas basicamente para responder a nossos anseios e dores. E vamos diferenciar a partir daqui um jogo de pensamentos – a busca sem resultados de Salomão de um lado, e do outro como o Novo Testamento responderia se ele tivesse tido acesso a este novo e maravilhoso cenário. A sabedoria de Salomão, presa a este mundo, não trouxe as respostas mais íntimas que seu coração exigia – diferentemente da sabedoria celestial do Filho. “O meu coração contemplou abundantemente a sabedoria e o conheci-


mento. E apliquei o meu coração a conhecer a sabedoria e a conhecer os desvarios e as loucuras, e vim a saber que também isto era aflição de espírito. Porque na muita sabedoria há muito enfado; e o que aumenta em conhecimento, aumenta em dor” (1.16-18). “Visto como na sabedoria de Deus o mundo não conheceu a Deus pela sua sabedoria, aprouve a Deus salvar os crentes pela loucura da pregação” (1 Co 1.21). Ele também provou da alegria cotidiana para ver se podia consolá-lo. “Disse eu no meu coração: Ora vem, eu te provarei com alegria; portanto goza o prazer; mas eis que também isso era vaidade” (2.1). “Porque o reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, e paz, e alegria no Espírito Santo” (Rm 14.17) – a verdadeira alegria depende exclusivamente da atuação constante do Espírito de Cristo. A bebida também foi considerada por Salomão como alternativa ao seu enfado. “Busquei no meu coração como estimular com vinho a minha carne (regendo porém o meu coração com sabedoria) [quem já bebeu sabe que sabedoria e vinho jamais convivem juntas], e entregar-me à loucura” (2.3).


“Por isso não sejais insensatos, mas entendei qual seja a vontade do Senhor. E não vos embriagueis com vinho, em que há contenda [da carne com o espírito], mas enchei-vos do Espírito” (Ef 5.17-18). A engenharia e jardinagem também foram uma boa tentativa. “Fiz para mim obras magníficas; edifiquei para mim casas; plantei para mim vinhas. Fiz para mim hortas e jardins, e plantei neles árvores de toda a espécie de fruto” (2.45). “E aquele que ouve estas minhas palavras, e não as cumpre, compará-lo-ei ao homem insensato, que edificou a sua casa sobre a areia; e desceu a chuva, e correram rios, e assopraram ventos, e combateram aquela casa, e caiu, e foi grande a sua queda” (Mt 7.26-27). A posse das coisas materiais e a comodidade também não bastaram. “Adquiri servos e servas, e tive servos nascidos em casa; também tive grandes possessões de gados e ovelhas, mais do que todos os que houve antes de mim em Jerusalém. Amontoei também para mim prata e ouro, e tesouros dos reis e das províncias” (2.7-8). “Não junteis tesouros na terra, onde a traça e a ferru-


gem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam; mas ajuntai tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração” (Mt 6.19-21). Seu ‘home theater’ era ao vivo e particular, mas também falhou em descansar sua alma. “Provi-me de cantores e cantoras, e das delícias dos filhos dos homens; e de instrumentos de música de toda a espécie” (2.8). “Falando entre vós em salmos, e hinos, e cânticos espirituais; cantando e salmodiando ao Senhor no vosso coração” (Ef 5.19). E se ele pudesse viver em nossos dias, provavelmente acessaria a mais nova e requintada tecnologia das distrações. Mas o desconsolo dele seria o mesmo de milhões que estão sempre a buscar, mas nunca a alcançar, pela insuficiência e incapacidade de tocar na sede dos nossos problemas – o espírito. Aliás, quanto maior a distração, maior a desilusão – assunto de nossa próxima nota.


A grande (des)ilusão

Muitos estranhariam a desilusão desmedida de Salomão, exatamente por buscar desenfreadamente as mesmas coisas e jamais cogitarem que poderão ser uma armadilha ao final da jornada debaixo do sol. As frias palavras de Salomão são piores do que se pensaria ouvir de alguém que nunca as tivesse encontrado. “Assim eu disse no meu coração: Como acontece ao tolo, assim me sucederá a mim; por que então busquei eu mais a sabedoria?... Porque nunca haverá mais lembrança do sábio do que do tolo; porquanto de tudo, nos dias futuros, total esquecimento haverá. E como morre o sábio, assim morre o tolo! Por isso odiei esta vida...” (2.15-17). Quanto ao destino de todo homem, Paulo arremataria sem maquiagens. “Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus... Porque o salário do pecado é a morte” (Rm 3.23; 6.23). Mas as palavras de Salomão demonstram que seu desespero impedia sua real visão das coisas. A prova de que sua sabedoria não seria esquecida juntamente com a tolice


dos demais, está no simples fato de que estamos analisando suas palavras que perduraram até agora. Mas ele continua descendo em seu abismo, rebaixando a dignidade humana. “Vi mais debaixo do sol que no lugar do juízo havia impiedade, e no lugar da justiça havia iniquidade. Eu disse no meu coração: Deus julgará o justo e o ímpio; porque há um tempo para todo o propósito e para toda a obra. Disse eu no meu coração, quanto a condição dos filhos dos homens, que Deus os provaria, para que assim pudessem ver que são em si mesmos como os animais. Porque o que sucede aos filhos dos homens, isso mesmo também sucede aos animais, e lhes sucede a mesma coisa; como morre um, assim morre o outro; e todos têm o mesmo fôlego, e a vantagem dos homens sobre os animais não é nenhuma, porque todos são vaidade. Todos vão para um lugar; todos foram feitos do pó, e todos voltarão ao pó. Quem sabe que o fôlego do homem vai para cima, e que o fôlego dos animais vai para baixo da terra?” (3.16-21). Se ele tivesse se agarrado ao princípio da criação do homem em Gênesis, ele não falaria tais palavras. O Rei prometido – Jesus – vai desafiar toda conclusão ressecada pelo sol. “Mais é a vida do que o sustento, e o corpo mais do


que as vestes. Considerai os corvos, que nem semeiam, nem segam, nem têm despensa nem celeiro, e Deus os alimenta; quanto mais valeis vós do que as aves?” (Lc 12.23-24). E quanto ao destino das almas, sua sabedoria foi ofuscada mesmo diante do exemplo de Moisés, mas que Jesus sabia interpretar perfeitamente. “E que os mortos hão de ressuscitar também o mostrou Moisés junto da sarça, quando chama ao Senhor Deus de Abraão, e Deus de Isaque, e Deus de Jacó. Ora, Deus não é Deus de mortos, mas de vivos; porque para ele vivem todos [todos estes que mantiveram um relacionamento vivo com Deus, conclusão dentro do contexto maior de toda a Escritura]” (Lc 20.37-38). Mas ele desce mais um pouco, no desejo insano e egoísta da não-existência. “Eis que vi as lágrimas dos que foram oprimidos e dos que não têm consolador, e a força estava do lado dos seus opressores; mas eles não tinham consolador. Por isso eu louvei os que já morreram, mais do que os que vivem ainda. E melhor que uns e outros é aquele que ainda não é; que não viu as más obras que se fazem debaixo do sol” (4.1-3). Jó também apelou a esta injeção letal de pensamento no auge de sua dor. Mas o Consolador lhe apareceu ao final,


alternando todas as condições presentes. Podemos não entender na maior parte das vezes nossa própria condição e tudo o que nos cerca, mas a Palavra de Deus não admite tal inexistência, e não nos desculpa pela ignorância ou rebeldia. O próprio fato de que “também Cristo padeceu uma vez pelos pecados, o justo pelos injustos, para levar-nos a Deus” (1 Pe 3.18), comprova que o pensamento da ‘extinção’ é inexistente em Deus, pois somente “Deus... vivifica os mortos, e chama as coisas que não são como se já fossem” (Rm 4.17). Diante destes conceitos deturpados pela obscuridade da depressão e pela dificuldade e enfado que era tentar entender os caminhos de Deus, não restava a ele concluir se não o lema de nosso próprio tempo. “Eis aqui o que eu vi, uma boa e bela coisa: comer e beber, e gozar cada um do bem de todo o seu trabalho, em que trabalhou debaixo do sol, todos os dias de vida que Deus lhe deu, porque esta é a sua porção [ou não espere nada melhor que isto]” (5.18). Este é o conceito debaixo do sol, mas não o que está acima dele. “E Jesus lhe respondeu, dizendo: Está escrito que nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra de Deus...


Eu sou o pão da vida... Este é o pão que desce do céu, para que o que dele comer não morra. Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém comer deste pão, viverá para sempre; e o pão que eu der é a minha carne, que eu darei pela vida do mundo” (Lc 4.4; Jo 6.48-51). Salomão em toda sua sabedoria não entendeu estas

coisas.

Mas Deus espera que você as entenda, pois foram “escritas para aviso nosso, para quem já são chegados os fins dos séculos” (1 Co 10.11).


No íntimo de Salomão

Como já comentamos anteriormente, Salomão não teve um bom relacionamento consigo mesmo. Toda sua sabedoria pedida e concedida por Deus serviu – poderíamos assim dizer!? – como uma armadilha para si mesmo. Algumas palavras ditas por ele em meio à sua desconsolação falam muito dele mesmo, como que um desabafo à posteridade. “Há um mal que tenho visto debaixo do sol, e é mui frequente entre os homens: um homem a quem Deus deu riquezas, bens e honra, e nada lhe falta de tudo quanto a sua alma deseja, e Deus não lhe dá poder para daí comer, antes o estranho o come; também isto é vaidade e má enfermidade” (6:1-2). Salomão recebeu seu reino ‘de mão beijada’. Não teve que travar luta contra vizinhos hostis, não teve que se submeter a um rei carnal chamado Saul por longos anos, como seu pai Davi, até que Deus o vingasse de toda a injustiça e usurpação. Não teve que fugir por terra estranha temendo pela sua própria vida. Nada sabia de noites frias e dias quentes cuidando de simples ovelhas.


Sua sabedoria era mais experimental que prática. A sabedoria deve estar alicerçada a um exercício constante sentido na carne, no medo, na angústia, na oração desesperada. Salomão não podia compreender nada destas coisas, ainda que Davi certamente tenha contado e recontado o longo drama de sua vida aos seus filhos. Mas ouvir não é viver. Como ele mesmo afirma, recebeu tudo pronto, nada lhe faltou e nada esperou, nada sofreu e nada lutou. Poderíamos parafrasear aquela palavra de Tiago – ‘a sabedoria sem provas é morta’. E o que dizer do ‘estranho que comeu do seu trabalho’? Não poderia ele estar se referindo ao seu filho e herdeiro do trono Roboão, aquele que dividiria mais a frente seu reinado com sua arrogância, falta de humildade, bom senso para ouvir conselhos...? Suas palavras ditas aos ouvidos de todo o povo mostram bem que sua intimidade com seu pai era mínima e com o Deus de Israel nem existia. “Assim que, se meu pai [Salomão] vos carregou de um jugo pesado, ainda eu aumentarei o vosso jugo; meu pai vos castigou com açoites, porém eu vos castigarei com escorpiões” (1 Re 12.11). Diferentemente de Davi que no leito de morte instruiu


Salomão na justiça que deveria executar e andar, o contexto da passagem do trono de Salomão para Roboão inexiste. Foi o povo que o levantou como rei por seu direito de primogenitura, não pela escolha voluntária de seu pai, que provavelmente já conhecia bem a incapacidade de seu filho. “E dormiu Salomão com seus pais, e o sepultaram na cidade de Davi seu pai; e Roboão, seu filho, reinou em seu lugar. E foi Roboão a Siquém, porque todo o Israel se reunira ali, para fazê-lo rei” (2 Cr 9.31; 10.1). Acho que a suma de seu sofrimento, espalhado por este seu sombrio livro de Eclesiastes, concentra-se em uma confissão, mais do que uma simples observação de algum desconhecido. “Há um que é só, e não tem ninguém, nem tampouco filho nem irmão; e contudo não cessa do seu trabalho, e também seus olhos não se satisfazem com riqueza; nem diz: Para quem trabalho eu, privando a minha alma do bem? Também isto é vaidade e enfadonha ocupação” (4.8). Certamente que tinha muitos filhos e irmãos, como bem atesta a Escritura, mas era como se não os tivesse. Sua vida se esvaiu por suas mãos, porque elas se prenderam ao material, ao visível, ao transitório, como muitos em nossa sociedade vazia têm se perdido, mesmo amontoado de bens, filhos e propriedades.


A estes, o mesmo Salomão poderia dizer com autoridade e dor. “É melhor um bocado seco, e com ele a tranquilidade, do que a casa cheia de iguarias e com desavença” (Pv 17.1). Ou... “Melhor é o pouco com o temor do Senhor, do que um grande tesouro onde há inquietação” (Pv 15.16).

No fim, tudo é uma questão de escolha que produzirá os devidos frutos. Toda esta agonia, este vazio existencial, sua solidão final, sua falta de sintonia com seus filhos – salvo melhor juízo – deriva de seus próprios erros do passado, iniciado na escolha de suas esposas. Ele mesmo se condenará por suas palavras.


laços

Vimos de relance em nossa última análise a questão daquele filho problemático de Salomão, que, com um único lance de arrogância e falta de misericórdia, dividiria todo o reino de Israel – mantido e aumentado pelo pai, conquistado e unido com sangue pelo avô Davi. Mas creio que o problema central deste filho arruinado pelos vícios passava pelo mesmo dilema que enfrenta todas as sociedades – um casamento forjado por interesses, tanto no plano político, cultural, social, econômico, estético... Salomão dá um testemunho rápido e nada dócil. “E eu achei uma coisa mais amarga do que a morte, a mulher cujo coração são redes e laços, e cujas mãos são ataduras; quem for bom diante de Deus escapará dela, mas o pecador virá a ser preso por ela. Vedes aqui, isto achei, diz o pregador, conferindo uma coisa com a outra para achar a razão delas; a qual ainda busca a minha alma, porém ainda não a achei; um homem entre mil achei eu, mas uma mulher entre todas estas não achei” (Ec 7.26-28). Este homem entre mil talvez fosse seu próprio pai,


inigualável em seu caráter e justiça. Mas entre todas as suas mulheres nada encontrou que equivalesse ao rubi que ele mesmo descreveu em seu último capítulo de Provérbios, e que já analisamos. E olha que ele tinha material abundante para análise! – “E tinha setecentas mulheres, princesas, e trezentas concubinas; e suas mulheres lhe perverteram o coração” (1 Re 11.3) – mulheres estas “estrangeiras, além da filha de Faraó: moabitas, amonitas, edomitas, sidônias e hetéias, das nações de que o Senhor tinha falado aos filhos de Israel: Não chegareis a elas, e elas não chegarão a vós; de outra maneira perverterão o vosso coração para seguirdes os seus deuses” (11.1-2). Que comunhão poderia ter este homem com tantas mulheres, se uma vida às vezes não basta para conhecermos nosso único cônjuge?... Salomão pecou gravemente nesta área da vida, e infelizmente este erro que pareceria estar desvinculado ao seu governo, destruiu não só sua vida sentimental, mas arruinou seus filhos, o destino de sua velhice como já comentamos anteriormente, e dividiu toda uma nação. Em qualquer época, sob qualquer circunstância, governo ou sociedade – tudo o que o homem plantar, isto ele ceifará.


Por suas palavras auto condenatórias, logo na entrada desta análise, ele sabia que não havia sido bom o suficiente, só lhe restando a prisão das redes, laços e ataduras. Que o cristão moderno pondere bem nestas palavras relegadas a último plano, e no sofrimento amargo advindo delas.


O homem abaixo do sol só pode dizer: Tudo é vaidade!

O homem acima do sol deveria aceitar: Tudo é vosso, e vós de Cristo, e Cristo de Deus! (1 Co 3.22-23)


O homem acima do sol

O homem debaixo do sol é o homem que foi privado da luz divina pela sombra do pecado, só lhe restando então a iluminação da natureza. Por mais que ele se esforce, alcança somente – isto quando alcança! – a necessidade óbvia de um Criador inteligente e poderoso, e que o apóstolo Paulo mais a frente ensinaria. “Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem e claramente se veem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem indesculpáveis” (Rm 1.20). Mas reconhecer um Deus Onipotente e Onisciente é uma coisa – outra é alcançar, desenvolver e manter uma intimidade contínua com Ele através de Sua graça livre. “O Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos dê em seu conhecimento o espírito de sabedoria e de revelação; tendo iluminados os olhos do vosso entendimento, para que saibais qual seja a esperança da sua vocação [ou ‘do seu chamado’], e quais as riquezas da glória da sua herança nos santos...” (Ef 1.17-18). ¿O que o homem debaixo do sol – que quer provar o


coração com alegria, gozar o prazer, estimular a carne com vinho, tendo por objetivo principal comer, beber e gozar do fruto do seu trabalho – poderia entender do que foi sintetizado acima por Paulo? Salomão não foi feito para estar debaixo do sol – mas ele mesmo se colocou ali naquela baixa posição espiritual pelas suas próprias escolhas. Seus olhos se retiraram do invisível, e se permitiram flertar com o mais palpável deste mundo. Esta também não é, nem deveria ser, a nossa posição, cristão e cristã! Falando aos seus futuros discípulos, bem como a todos os que viriam a crer em suas palavras – eu e você! – Jesus divide bem o assunto. “Dei-lhes a tua palavra, e o mundo os odiou, porque não são do mundo, assim como eu não sou do mundo. Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal. Não são do mundo, como eu do mundo não sou” (Jo 17:14-16).

Devemos sempre relembrar que estamos neste mundo, mas não somos propriamente dele. Há uma medida apropriada para seu uso e satisfação. “E os que usam deste mundo, como se dele não abusassem, porque a aparência deste mundo passa” (1 Co 7.31). A ‘âncora da nossa alma já está presa no mais interior


do véu’, bem acima do sol, “onde Jesus, nosso precursor, entrou por nós, feito eternamente sumo sacerdote” (Hb 6.1920). A posição abaixo do sol arrasta à inclinação da carne para a morte – a posição acima dele garante a inclinação do Espírito para a vida e paz. “Porquanto a inclinação da carne é inimizade contra Deus, pois não é sujeita à lei de Deus, nem, em verdade, o pode ser” (Rm 8.6-7). Tudo o que está abaixo do sol nos ensina como que através de sombras – mas os que, intrepidamente, se posicionarem acima do sol, alcançarão o original, sem sombras ou retoques, pois “toda a boa dádiva e todo o dom perfeito vêm do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não há mudança nem sombra de variação” (Tg 1.17).


Não condenamos de forma alguma os erros e vícios de Salomão. Ele tinha suas condições, seu tempo e temperamento. Não temos autoridade e perfeição que nos permita tal julgamento. Mas “tudo isto lhes sobreveio como figuras, e estão escritas para aviso nosso, para quem já são chegados os fins dos séculos” (1 Co 10.11). Você está preparado e preparada para o fim que se aproxima veloz e terrivelmente? Ou diz como aquele servo mau: “O meu senhor tarde virá; e começar a espancar os seus conservos, e a comer e a beber com os ébrios, virá o senhor daquele servo num dia em que o não espera, e à hora em que ele não sabe, e separálo-á, e destinará a sua parte com os hipócritas; ali haverá pranto e ranger de dentes” (Mt 24.48-51). “Examinai-vos a vós mesmos, se permaneceis na fé; provai-vos a vós mesmos. Ou não sabeis quanto a vós mesmos, que Jesus Cristo está em vós? Se não é que já estais reprovados. Mas espero que entendereis que nós não somos reprovados” (2 Co 13.5-6). Assim devemos viver. Assim devemos esperar.


Assim devemos ser glorificados. Com esta exortação findo este assunto e partimos para o último livro de Salomão – Cantares.



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